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MAQUIAGEM DAS DRAGS: A ACEITAÇÃO DESSES ARTISTAS NO

AMBIENTE CIS-HETERONORMATIVO

Ana Carolina Felix Garrana Freijanes


* Estudante de Publicidade e Propaganda

RESUMO

O artigo pretende verificar se a recente popularização da arte performática drag


queen, juntamente com a difusão de técnicas de maquiagem originadas por tais
artistas estão levando a uma maior aceitação das mesmas no ambiente cis-
heteronormativo. O programa televisivo RuPaul’s Drag Race é um dos grandes
responsáveis pela divulgação do processo de montagem da drag, além de
proporcionar ao espectador temas primordiais para tal comunidade – tais como
aceitação familiar, dificuldades pessoais, etc -, fazendo com que a audiência comece
a entender quão difícil é ser drag em um mundo onde o diferente é rejeitado. Para a
produção deste texto foi realizada uma pesquisa com 57 pessoas que responderam
perguntas sobre maquiagem, com o intuito de realizar um levantamento sobre quem
se utiliza de tais técnicas e se conhecem sua origem. Além disso, foi utilizada como
referência uma bibliografia que trata de assuntos comuns ao gênero performático.

Palavras-chave: drag queen; maquiagem; queer; arte; transformismo.

UNIVERSIDADE VEIGA DE ALMEIDA


Moda e Cultura Contemporânea
Profª Orientadora: Márcia Mesquita

Rio de Janeiro – RJ
2017
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0. INTRODUÇÃO

O gênero performático Drag Queen não é algo novo na sociedade. Desde a Grécia
antiga, homens se travestem de mulheres a fim de representar personagens
femininas. No entanto, com a inclusão das mulheres aos palcos e com o crescente
ódio ao diferente, tal arte foi repudiada e jogada à invisibilidade. Foram precisos
séculos para que as drags saíssem dos guetos e retomassem seus lugares na
sociedade, uma batalha árdua que ainda hoje não foi concluída.
Atualmente, pode-se verificar uma crescente inclusão de técnicas de maquiagem
comumente utilizadas por tais artistas por pessoas cis-heteronormativas, assim, é do
intuito deste artigo observar se esta prática está ligada à aceitação das drags neste
ambiente inóspito. A fim de observar este aspecto, foi realizada uma pesquisa com 57
pessoas que responderam perguntas sobre os temas: maquiagem e drag queen; o
objetivo era analisar se as pessoas se utilizam de tais técnicas e, em caso afirmativo,
se conheciam suas origens. Foi perguntado, também, se essas mesmas pessoas
assistiam/conheciam RuPaul’s Drag Race – um programa de TV norte-americano
apontado como um dos grandes responsáveis pela diminuição da invisibilidade drag
queen – bem como se acham que o reality show estava contribuindo para uma maior
aceitação destes artistas e para a difusão das técnicas de maquiagem drag. Além do
questionário, foi utilizada uma bibliografia que trata de temas como gênero, arte
performática transformista e identidade social, com o objetivo de explicitar o que são
gênero e identidade pessoal, diferenciando com o fazer drag queen. Dessa forma,
será possível para o leitor entender melhor os termos que serão utilizados ao longo
do artigo, assim como otimizar o entendimento do que é drag queen, quais são suas
características e seu lugar, hoje, na sociedade.

1. GÊNERO E SUAS QUESTÕES

Para falar sobre gênero, é preciso, também, falar sobre identidade, pois ambos
são inerentes. Sabe-se que o indivíduo é formado a partir do meio em que se encontra,
são as suas relações com o exterior que o definem. Segundo Berger e Luckmann, em
seu livro A Construção Social da Realidade, “a identidade é um fenômeno que deriva
da dialética entre um indivíduo e a sociedade” (p.230, 1976), portanto religião, cultura,
status e origem sociais, relacionamentos familiares, profissionais e cívicos são alguns
dos inúmeros fatores que formam a identidade de um indivíduo. São eles também que
ajudam no constructo do gênero.
Segundo Butler, em seu livro Problemas de Gênero, “o gênero é culturalmente
construído: consequentemente, não é nem o resultado causal do sexo nem tampouco
tão aparentemente fixo como o sexo” (p.26, 2016), ou seja, o gênero é construído
socialmente e independe do sexo biológico e, ao contrário do último, que teoricamente
é imutável, possui fluidez, assim como a identidade, a partir das experiências vividas.
O sexo, segundo Jaqueline Gomes de Jesus em seu artigo Orientações Sobre
a População Transgênero: Conceitos e Termos, é a “classificação biológica das
pessoas como machos ou fêmeas, baseada em características orgânicas como
cromossomos, níveis hormonais, órgãos reprodutivos e genitais.” (p.13, 2012) e
gênero é a “classificação pessoal e social das pessoas como homens ou mulheres”
(p.13, 2012) ou, ainda, segundo outros autores que fogem do binarismo macho/fêmea,
como queer - conforme Sara Salih, em Judith Butler e a Teoria Queer, “o queer não
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está preocupado com definição, fixidez ou estabilidade, mas é transitivo, múltiplo e


avesso à assimilação” (p.19, 2015), ou ainda, de acordo com Jaqueline Gomes de
Jesus no seu já citado artigo é um “termo ainda não consensual com o qual se
denomina a pessoa que não se enquadra em nenhuma identidade ou expressão de
gênero.” (p.16, 2012).
Para Judith Butler o sexo também é construído culturalmente, pois a partir do
momento em que uma pessoa é assinalada com um sexo biológico é esperado
comportamentos condizentes com ele. Porém, o que diferencia sexo e gênero é que
o último está relacionado não só com a cultura, como também com a identidade e a
liberdade de escolha do indivíduo. Entretanto, para Butler, tal liberdade não é plena,
pois é limitada pelas estruturas de poder em que está situada. Salih, em seu livro,
compara o “fazer” do gênero com a escolha de uma roupa em um armário pré-
existente, limitando assim a liberdade de escolha, uma vez que o indivíduo não pode
ser inteiramente livre por estar dentro da lei ou de uma dada cultura. Ela diz que “é
bem provável que a ‘escolha’ de nossas roupas metafóricas se ajuste às expectativas
ou talvez às demandas de nossos amigos ou colegas de trabalho, mesmo sem nos
darmos conta de que estamos fazendo isso” (p.73, 2015) e, ainda, que o conjunto de
roupas metafóricas é restrito por fatores como “a nossa cultura, o nosso trabalho, o
nosso rendimento ou o nosso status e origem social” (p.73, 2015), tornando tal escolha
de gênero limitada.
Apesar das limitações encontradas socialmente, Butler continua tal ideia
questionando a coerência e a continuidade da pessoa na escolha de gênero. Ela diz
que a identidade pessoal, bem como a construção de gênero, são incoerentes ou
descontínuos e não se conformam “às normas de gênero da inteligibilidade cultural
pelas quais as pessoas são definidas” (p.43, 2016). Nessa inconformidade estão
situados os queer e a transgeneridade. Os primeiros são aqueles que não se veem
enquadrados em nenhuma definição de gênero, considerando-se - e considerados -
estranhos e totalmente fora do binarismo socialmente imposto. Já o termo transgênero
é, segundo Jaqueline Gomes de Jesus, um “conceito ‘guarda-chuva’ que abrange o
grupo diversificado de pessoas que não se identificam, em graus diferentes, com
comportamentos e/ou papéis esperados do gênero que lhes foi determinado quando
de seu nascimento” (p.14, 2012). Portanto, transexuais são pessoas que não se
identificam com a genitália de nascimento ou com o comportamento associado a ela,
vendo-se como outro que não no seu corpo. Temos, dessa forma, na sociedade
homens trans (mulheres biológicas que se identificam como homens), mulheres trans
(homens biológicos que se identificam como mulheres) e travestis, dentre outros. É
importante, ainda, salientar que transgênero é aquele que se identifica com um gênero
que não aquele assinalado ao nascimento e não aquele que realizou a cirurgia de
mudança de sexo.
Há controvérsias sobre a maneira na qual as travestis caberiam em tais
classificações - “é importante ressaltar que travestis, independentemente de como se
reconhecem, preferem ser tratadas no feminino, considerando insultuoso serem
adjetivadas no masculino” (JESUS, Jaqueline Gomes de; Orientações Sobre a
População Trans, p.10, 2012). Alguns autores as encaixam juntamente dos
transexuais e outros com a população queer por não se enquadrarem no conceito
binário de gênero e ainda serem considerados sujeitos estranhos perante a
sociedade. É necessário lembrar, porém, que mais importante que as definições
autorais são as identidades pessoais de cada sujeito, portanto, independentemente
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de como a academia as enquadra, é necessário respeitar a identidade pessoal de


cada indivíduo.
As drags, por outro lado, não se encaixam dentro do leque transexual, pois não
são um gênero e sim uma performance. Os homens e mulheres que montam drag não
veem nela sua identidade de gênero, mas uma personagem que representam,
vivenciando, nesse sentido, a inversão do gênero como espetáculo e não como
identidade. Jaqueline Gomes de Jesus diz que drag queen/king são “artistas que
fazem uso de feminilidade estereotipada e exacerbada em suas apresentações (...)
(sendo mulheres fantasiadas como homens, são drag kings)” (p.11, 2012). Indo além,
ouso dizer que a personagem drag é uma das muitas facetas da identidade pessoal
de quem a monta. Afinal, se a identidade advém da dialética entre os meios exterior e
interior, todos os indivíduos expressam várias identidades de acordo com o ambiente
em que estiverem. Citando Judith Butler, em seu livro Problemas de Gênero, “se
alguém ‘é’ uma mulher, isso certamente não é tudo o que esse alguém é;” (p.21,
2016), seguindo tal lógica: somos sempre mais do que julgamos ser. No artigo Fora
do Armário e Dentro do Closet: O Camarim como Espaço de Transformação, Anna
Paula Vencato cita Jatene que diz que “ao se montar, o drag transforma-se em sua
personagem” (p.6, 2002) e, ainda,
para as drags o território em que se opera a transformação é o corpo, não
uma espécie de passagem da natureza para a cultura, mas uma passagem
entre “dois corpos culturais” (“de um corpo cosmológico essencializado a um
corpo cosmológico não-essencializado, de uma teoria de gênero a outra
teoria de gênero”) mediada pelo desejo de se tornar outro, de se tornar uma
personagem, uma caricatura de um feminino que talvez nem mesmo exista
numa suposta “natureza feminina”. (VENCATO, Anna Paula, p.7, 2002)

Ou seja, naquele momento o indivíduo é a sua personagem e esta vivência não pode
ser anulada ou menosprezada como não sendo parte da identidade social do
indivíduo.
Por fim, para o melhor entendimento deste artigo, é importante ressaltar as
diferenças entre gênero, sexo e orientação sexual. Os três elementos não estão
interligados, porém são facilmente confundidos. Enquanto o primeiro é a identificação
social do indivíduo e o segundo a genitália biológica, o último é a atração-afetivo
sexual, ou seja, a sexualidade da pessoa. É importante entender tais diferenciações,
pois uma pessoa trans não é necessariamente gay/lésbica, assim como uma pessoa
cisgênero - aquela que se identifica com a genitália biológica, bem como o gênero
atribuído ao nascimento - não é necessariamente heterossexual. Uma mulher trans,
por exemplo, pode ser heterossexual, basta apenas se sentir atraída por homens. É
importante respeitarmos a identificação pessoal, não importando qual o gênero
atribuído ao nascer, para que se torne mais fácil o entendimento do que é orientação
sexual, e, por conseguinte, o respeito a identidade alheia.

2. DRAG QUEEN

“Todos nós nascemos nus. O resto é drag.” RuPaul Charles


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Drag Queen é uma arte performática, realizada, comumente, por homens que
se travestem de mulheres – ainda que seja possível verificar que, recentemente, há
uma inclusão das mulheres nesta categoria artística, leia-se mulheres que fazem drag
queens e não drag kings. Essa arte levanta inúmeros debates sobre gênero e
identidade pessoal, pois conflita com os conceitos binários de gênero do mundo
contemporâneo. São consideradas quase “como um palhaço, um bufão do século 21,
ou seja, ela aparenta alegria e festa, mas no fundo é reflexo da sociedade“ (VIEIRA,
Siliane; Maquiagem, Salto e Mensagem; 2017) e, hoje, levantam a bandeira LGBTTQ
(Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais/Transgêneros, Travestis e Queers), sendo
consideradas como um dos símbolos da luta homossexual, além de trazerem para a
sociedade a imagem da mulher empoderada. “A drag é arte, a arte é uma expressão,
uma representação do real, uma nova composição” (VIEIRA, Siliane; Maquiagem,
Salto e Mensagem; 2017).

2.1. UM PASSEIO POR SUA HISTÓRIA

Os primeiros registros do ato de se travestir advém do teatro da Grécia antiga.


Nesse período, mulheres eram proibidas de subir nos palcos, cabendo aos homens
se montarem como mulheres para poderem viver personagens femininas, prática que
perdurou no teatro até a Modernidade, quando, em 1674, as mulheres começaram a
atuar. Nessa época, o principal interesse para a entrada feminina no teatro deu-se a
partir do interesse sexual do público em ver mulheres “de verdade” em vez de homens
travestidos. Ainda assim, após tal inserção, homens continuaram com papéis
femininos importantes, pois tais mulheres não tinham o estudo exigido para atuar,
cabendo-lhes ser objetos de desejo para os espectadores, que muitas vezes, após a
peça, exigiam seus trabalhos como cortesãs. Somente após a plena aceitação da
mulher no palco é que a prática de homens montarem personagens femininas foi
abolida e, então, as atuais drags marginalizadas.
Ainda, porém, restava uma forma teatral que permitia a personificação de
mulheres por homens, a Ópera. Os castrati, meninos italianos com vozes
talentosíssimas que eram mutilados sexualmente pela Igreja a fim de não
desenvolverem tons graves com a chegada da adolescência, compunham cerca de
70% do corpo teatral da Ópera e muitos continuavam a se vestir de mulheres após a
idade adulta “não como uma extensão da arte, mas pelo próprio prazer de conflitar
sua dúbia sexualidade, estando em drag onde a maioria das regras sociais não se
aplicavam” (AMANAJÁS, Igor, Drag Queen: Um Percurso Histórico pela Arte dos
Atores Transformistas, p.12, 2015). Somente a partir do século XVIII se percebe a
correlação entre homossexualidade e o ato de se travestir, uma vez que homens
começam a aparecer na sociedade europeia vestidos de mulheres, em luxuosas
roupas da moda. É nessa época que o pensamento sobre vestuário aparece tal como
conhecemos hoje, “pois, na era Elizabetana, o código de vestimenta era relacionado
ao status social e ao gênero” (AMANAJÁS, Igor, Drag Queen: Um Percurso Histórico
pela Arte dos Atores Transformistas, p.11, 2015).
Com as mudanças teatrais ocorridas no século XIX, as drag queens voltaram
aos palcos integrando a parte cômica dos dramas. Começou-se, então, a enxergar tal
ator como diferente de seus colegas. Solos teatrais desenvolvidos por personagens
em drag foi uma prática que apareceu no fim deste século e ganhou cada vez mais
espaço a partir do século XX, quando, agora como damas pantomímicas do teatro,
começaram a fazer stand ups direcionados à classe média e aos problemas do
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universo feminino. É a partir daí que a drag, tal como conhecemos hoje, é inserida na
sociedade. Roger Baker, em seu livro Drag: a History of Female Impersonation in the
Performing Arts, cita que:

ele [o ator feminino] entrou no século XX com largo sorriso, as mãos na


cintura, vestindo roupas estranhas parodiando a alta moda, um ninho de
pássaro como peruca e uma maquiagem descontroladamente exagerada.
(…) seu humor era robusto e terrenamente doméstico quando ele ganhou a
confiança do público e compartilhou as provações da vida conjugal. Ele se
tornou a dama pantomímica; amplamente popular, habitada por todos os
principais comediantes da época e críticos sérios de teatro lhes deram
avaliações sérias (BAKER, 1994, p.161)

Com o advento da televisão - que se tornou, então, a fonte primordial de


entretenimento da sociedade -, tais atores perderam, mais uma vez, espaço.
Juntamente a isso, na Inglaterra começou-se um movimento anti-homossexual que se
proliferou por toda a mídia, jogando as drags ao anonimato durante os próximos
quinze anos. Contudo, os anos sessenta chegaram e trouxeram mais liberdade:

a diminuição da censura [...], a larga circulação da pílula anticoncepcional [...]


e a diminuição das restrições impostas sobre a homossexualidade (em
detrimento de sua descriminalização sob lei em 1967 na Inglaterra e do
surgimento do movimento gay nos Estados Unidos dois anos mais tarde).
(AMANAJÁS, Igor, p.16, 2015)

A partir daí começaram a existir duas vertentes de drag: as cômicas e as radicais.


Para as últimas “ser gay se tornou um ato político, assim como ser artista o é, mesmo
que não intencional”. Dessa forma, a drag queen despontou como um dos maiores
símbolos da luta pelos direitos gays” (AMANAJÁS, Igor, p. 18, 2015). Por isso hoje há
a confusão do pensamento comum de que quem faz drag é, necessariamente,
homossexual, um pensamento errôneo, visto que drag é uma arte performática e não
está ligada à orientação sexual do indivíduo. Além do movimento LGBTTQ (Lébicas,
Gays, Transexuais/Transgêneros, Travestis e Queers), a cultura pop também foi uma
das causas primordiais para a fortificação da imagem drag queen, pois as cantoras
pop tornaram-se divas da comunidade homossexual, alicerçando um imaginário
irreverente e, muitas, lançando à grande massa temas comuns aos homossexuais.
Um exemplo disso é a música Vogue da Madonna que é voltada para as antigas casas
de dança, onde as antigas drags se travestiam e desfilavam, dançando e imitando
poses de modelos.
Com o crescente ganho de espaço, as drags começaram a alçar voos maiores,
estando presentes não só nos redutos homossexuais, como também em produções
da Broadway - musicais como “Alô, Dolly!” e “A gaiola das loucas” -, e no mundo
cinematográfico, em que “não só participariam em drag, mas como tema condutor da
narrativa: Priscilla, a rainha do deserto; (...) Quanto mais quente, melhor; e Uma babá
quase perfeita são exemplos de filmes que abordam o tema drag queen” (AMANAJÁS,
Igor, p. 18, 2015). Hoje, as drags têm seu espaço alicerçado, muito por causa do
programa RuPaul’s Drag Race, programa de TV americano criado em 2009 e
comandado pela drag RuPaul, uma das mais famosas drags do mundo
contemporâneo. Ali, no espaço televisivo, pode-se acompanhar a corrida das
participantes em busca do título de America’s Next Drag Superstar. Vê-se ali não só
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o processo de montagem da drag, como também suas vidas fora dali, pois o programa
faz questão de mostrar o quão difícil é ser drag queen em um mundo heteronormativo.
Tudo isso contribuiu não só para uma maior aceitação das drags, mas também para
a sua glamourização. As participantes do programa saem de lá com milhares de fãs e
com inúmeras portas abertas para trabalhos. A drag Bianca Del Rio, por exemplo,
ganhadora da 6ª temporada, após a participação, levou seus shows para o mundo
todo, além de estrelar em filmes e programas de TV. Outro exemplo é a Sharon
Needles, ganhadora da 4ª temporada e uma das participantes mais icônicas do
programa, que possui mais de 600 mil seguidores no Instagram e já lançou músicas
que foram um sucesso, além de continuar com seus shows ao redor do globo.
O programa RuPaul’s Drag Race é um dos grandes responsáveis para a
diminuição da invisibilidade drag queen e é considerado um dos melhores programas
televisivos do mundo, já ganhou cerca de 8 prêmios, incluindo um Emmy, e foi
indicado para mais de 10 premiações. Além disso, sua audiência não se reduz
somente à comunidade LGBTTQ. Grande parte dela é composta por pessoas
cisgêneras e de orientação heterossexual que veem ali uma forma prazerosa de
entretenimento. Isso só mostra que, atualmente, as drags estão cada vez mais
integradas no mundo e não só escondidas em guetos gays ou na comunidade
LGBTTQ.

2.2. TÉCNICAS DE MAQUIAGEM

A maquiagem, da mesma maneira que a montaria - “a expressão montaria


designa aquilo que se carrega na mala, ou seja, trajes e acessórios” (Fora do Armário
e Dentro do Closet: O Camarim como Espaço de Transformação; VENCATO, Anna
Paula, p. 7, 2002) - são o conjunto de uma drag queen. É com a montaria e com as
técnicas de maquiagem que o indivíduo - aqui dando ênfase no homem que faz drag
queen - transforma seu corpo rotulado como masculino em outro não segmentarizado
pelos gêneros e, assim, transmuta-se em sua personagem. Tal como existem grupos
sociais diversos, há também, dentro do ambiente drag, inúmeros subgrupos: as
caricatas, as top-drags, as divas, as careers, dentre outras; e é por meio desse
conjunto que elas assumem não só a sua drag, mas o tipo da sua personagem.
Segundo Anna Paula Vencato, “as vestimentas teriam um valor protetor (instrumental)
tão relevante quanto sua forma (valor expressivo), sendo que ‘é por meio dos trajes e
acessórios que os acompanham que se estabelece o primeiro estágio de
reconhecimento social’” (Fora do Armário e Dentro do Closet, p. 9, 2002), portanto
este conjunto é uma representação do que é ser drag queen, tornando-se então
símbolos culturais da comunidade drag.
O reality show RuPaul’s Drag Race é um dos grandes responsáveis pela
difusão de técnicas de maquiagem originadas, ou comumente usadas, por drag
queens no ambiente cis-heteronormativo. Conforme a audiência do programa foi
aumentando, começou também a ficar em alta técnicas de maquiagem como contorno
(contornar o rosto com cores mais escuras, com o objetivo de afiná-lo – figura 1),
baking (ou cozinhar, técnica usada para a maquiagem aderir melhor à pele), aumento
de olhos e lábios (figura 2), uso de cílios postiços (figura 2), glitter (figura 3), dentre
outras. Hoje, tais técnicas estão intrinsecamente ligadas aos rituais de beleza de
inúmeras pessoas, porém os créditos, muitas vezes, não foram dados às drags. A
maquiagem de contorno, por exemplo, é atribuída à Kim Kardashian.
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Exemplos de maquiagem:

Figura 1 Figura 2 Figura 3


Fonte: Pinterest

Para a produção deste artigo, foi realizada uma pesquisa com 57 pessoas -
anexada integralmente no apêndice -, 56 dessas pessoas usam maquiagem e
somente 12 não se utilizam das técnicas originadas por drag queens. 35 sabiam da
origem dessas técnicas, 13 começaram a utilizá-las depois de assistir ao programa
RuPaul’s Drag Race e outras assistindo a tutoriais no Youtube ou em cursos de
automaquiagem e até em cursos de maquiagem drag queen. 39 acham que o
programa e a integração de tais técnicas no mundo cis-heteronormativo estão levando
a uma maior aceitação da classe, uma das pessoas disse que “com certeza [está
levando a uma maior aceitação], acho que a partir do momento que você usa coisas
de um grupo ao qual você não está inserido isso desmistifica uma série [de] seus
conceitos sobre ele porque você quer aprender práticas dele”.
É evidente que as drags, hoje, tem muito mais espaço no meio artístico do que
anteriormente. São inúmeras as drags que tem seu próprio canal no YouTube (a drag
Lorelay Fox tem um canal com 170 mil inscritos; o DRAGeek é um canal da drag
Amanda Sparks que fala sobre games e também acerca de temas LGBTTQ; Brolaska
é um canal de dois irmãos, um gay e um heterossexual, que debatem sobre suas
diferenças e é comandado pela drag Alaska Thunderfuck; Miss Fame é o vlog da drag
de mesmo nome que já foi participante do reality show RuPaul’s Drag Race e foi uma
das plataformas que fizeram o sucesso dela; dentre outros) e fazem dali um meio de
promoção pessoal, bem como de propagação de patrimônios culturais dessa arte –
maquiagem, montaria, linguajar, técnicas, etc –, além de debaterem sobre o que é ser
drag atualmente, suas dificuldades sociais, dentre outros assuntos abordados. A
Internet é um dos principais fatores para esse ganho de espaço, pois nela o conteúdo
é democratizado e mais amplo do que a mídia comum (TV, cinema, etc), portanto é
mais fácil abordar temas que seriam rejeitados pela sociedade. A Internet, atualmente,
também é um dos espaços mais utilizados para a veiculação de anúncios, logo, o
programa RuPaul’s Drag Race não teria a visibilidade atual se não fosse pelo espaço
virtual. O show era, inicialmente, veiculado somente nos Estados Unidos, sendo
transmitido no Brasil somente no VH1 – canal fechado –, até a 4ª temporada. A
Internet permitiu que vários usuários visualizassem o conteúdo, proporcionando,
assim, a fama que o reality tem hoje. Além disso, foi por meio da Internet que as
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pessoas tiveram maior acesso ao processo de montagem da drag e, por consequente,


às técnicas de maquiagem, com isso facilitando a inserção de tais técnicas ao
cotidiano das pessoas que não montam, e nem pretendem montar, drag.

3. CONLCUSÃO

Apesar do crescente ganho de espaço, tanto no ambiente virtual quanto no físico,


as drags ainda não têm plena aceitação na sociedade. No entanto o caminho para
obtê-la já foi aberto e iniciado, precisando, apenas, que a sociedade – e não só as
drag queens – o percorra. A caminhada social ainda será longa e bastante árdua,
porém será nela que as pessoas aprenderão a respeitar e apreciar o diferente.
A despeito dos dados obtidos pela pesquisa, não foi possível verificar se o princípio
da aceitação desses artistas foi obtido por intermédio da difusão de técnicas de
maquiagem originadas por eles. É, porém, evidente que esse é um dos fatores para
que a plena aceitação aconteça, tendo em vista que é por meio de vlogs e do
programa RuPaul’s Drag Race que as pessoas mais entram em contato com tais
técnicas, portanto, aproximando-se também dos dilemas e dificuldades das drags
queens perante a sociedade. Ocorre, dessa forma, a aproximação facilitada dessas
questões, bem como a simpatia por esses artistas. Espera-se que essa jornada em
prol do respeito à diversidade continue a passos largos e que, em breve, possa-se ver
as drags queens livres dos preconceitos e gozando da liberdade de expressão que
deveriam ter como cidadãs.

4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

• BUTLER, Judith. Problemas de Gênero: Feminismo e Subversão da Identidade. 12ª


edição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2016.

• SALIH, Sara. Judith Butler e a Teoria Queer. 1ª ed. Belo Horizonte: Autêntica Editora,
2015.

• BERGER, Peter; LUCKMANN, Thomas. A Construção Social da Realidade. 3ª edição.


Petrópolis: Vozes, 1976.

• JESUS, Jaqueline Gomes de. Orientações Sobre Identidade de Gênero: Conceitos e


Termos. Brasília: Publicação Online, 2012. Disponível em:
<http://www.sertao.ufg.br/up/16/o/ORIENTAÇÕES_POPULAÇÃO_TRANS.pdf?1334
065989>

• VENCATO, Anna Paula. “Fervendo com as drags”: corporalidades e performances de


drag queens em territórios gays da Ilha de Santa Catarina. 2002. 132 p. Dissertação -
Departamento de Antropologia Social do Centro de Filosofia e Ciências Humanas da
Universidade Federal de Santa Catarina. Santa Catarina. 2002.
10

• VENCATO, Anna Paula. Fora do Armário e Dentro do Closet: O Camarim como


Espaço de Transformação. Santa Catarina: Publicação Online, 2002. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/cpa/n24/n24a11.pdf>

• BERLATTO, Odir. A Construção da Identidade Social. Revista do Curso de Direito da


FSG. Caxias do Sul, vol. 3, n. 5, p. 141-151. 2009.

• AMANAJÁS, Igor. Drag Queen: Um Percurso Histórico Pela Arte dos Atores
Transformistas. Revista Belas Artes, São Paulo, vol. 7, n. 19. 2015.

• BAKER, Roger. Drag: The History of Female Impersonation in the Performing Arts. 1ª
edição. Nova Iorque: New York University Press, 1994.

• SIMMEL, George. O Indivíduo e a Liberdade. In: SOUZA, Jessé; ÖELZE, Berthold.


Simmel e a modernidade. Brasília: Universidade de Brasília, 1998. p. 109-117.

• VIEIRA, Siliane. Maquiagem, Salto e Mensagem; Clic RBS; Acesso em 03 de junho


de 2017; disponível em
<http://www.clicrbs.com.br/sites/swf/pio_ensaio_drag_queen/index.html>.

5. GLOSSÁRIO

Cis-heteronormatividade: expressão utilizada para descrever uma sociedade que


tem como norma a heterossexualidade e a cisgeneridade, marginalizando orientações
sexuais e identidades de gênero diferentes;

Montar: é uma gíria do universo drag/travesti que denota o ato de se travestir em


outro sexo. É na montação que o individuo começa o processo de “fabricação” de seu
outro “eu” ou personagem. A montagem incluiu a montaria (roupas, acessórios,
perucas, enchimentos, sapatos, etc) e a maquiagem.

6. APÊNDICE

Pesquisa realizada através do formulário do Google:


11

Pergunta 1

Pergunta 2

Pergunta 3
Pergunta 4

Pergunta 5
13

Pergunta 6
14
15

Pergunta 7

Disponível em
<https://docs.google.com/forms/d/1uHlzWRYlyFfX_245GsJuYjkTi5ANhX6bjxTy3AfhZ
LE/edit>

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