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FEDERAL DO RIO
GRANDE DO SUL
Reitor
Carlos Alexandre NeUo
Vice-Reitor e Pró-Reitor
de Coordenação Acadêmica
Rui Vicente Oppermam1
EDITORA DA UFRGS
Diretora
Sara Viola Rodrigues
Conselho Editorial
Alexandre Ricardo dos Santos
Carlos Alberto Steil
lavinia Schiiler Facdni
Mara Cristina de Matos Rodrigues
Maria do Rodo Fontoura Teixeira
Rejane Maria Ribeiro Teixeira
Rosa Nivea Pedroso
Sergio Antonio Carlos
Sergio Sdmeider
Susana Cardoso
Valéria N. Oliveira MonareUo
Sara Viola Rodrigues, presidente
be . cogan
pozz1 esc
anatu das
estruturas sono s
Poz:ú compositora atuante e co-autora deste livro, é também a editora responsável pela revista
Sonus, considerada uma das revistas mais significativas para a teoria musical na atualidade.
CDU78
CIP-Brasil. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação.
(Jaqueline Trombin - Bibliotecária responsável CRBl0/979)
ISBN 978-85-386-0225-5
s
PREFÁCIO 19
APRESENTAÇÃO 21
TRANSIÇÃO 316
FORMA 511
ESTRUTURA 513
ARNOLD SCHOENBERG: CINCO PEÇAS PARA ORQUESTRA, OP. 16, CORES 524
Espaço e linguagem 524
Tempo 531
Cor sonora 535
CONCLUSÃO 540
APÊNDICES 544
16 PREFÁCIO
performance com novas tecnologias e
matemático como da espectral.
Apesar méritos já explicitados, a obra não deixa de ter seu lado polêmi-
co. Os autores, detentores de vários prêmios e enorme reconhecimento acadêmi-
co e artístico, ainda são tratados, esporadicamente, como excêntricos e incon-
sistentes. Esse tipo de reação é absolutamente comum ao longo da história. Sob
esse aspecto, Som e música: a natureza das estruturas sonoras se compara à obra
de Schenker, que só obteve o merecido reconhecimento nos anos 1980, apesar
da maior parte de seus trabalhos terem sido escritos no final do século XIX e no
começo do XX. Esse fato, entretanto, certamente não abala a convicção dos auto-
res. Certa vez, quando aluno de doutorado no New England Conservatory, levei
a Cogan minhas apreensões sobre alguns aspectos de minha tese por considerá-
-los inovadores e possivelmente polêmicos. Ele me respondeu que a quem escreve
compete somente a escrita. Se quem lê gosta do trabalho, ótimo. Se não gosta,
melhor ainda, pois o que foi passado ao leitor provocou reflexão e desconforto,
essenciais para a geração de novas idéias. Mas, de qualquer modo, veicular novas
idéias e paradigmas revolucionários requer coragem e determinação.
Essa mesma atitude, com certeza, esteve presente em Cristina Capparelli
Gerling, Fernando Rauber Gonçalves e Carolina Avellar Muniagurria, tradutores
de Som e música: a natureza das estruturas sonoras. Sem sombra de dúvida foi um
trabalho hercúleo. Eles se depararam com um sem número de novos termos que
ainda não tinham tradução para o português, nem tradição de uso em nossa aca-
demia. A começar pelo título! Pude compartilhar da ansiedade dos tradutores e
fico feliz que eles tenham abarcado essa árdua tarefa e conseguido executá-la de
forma exemplar. Que venham as críticas. E que elas possam gerar publicações e,
quem sabe, novas traduções de obras de igual calibre.
Maurício Freire
Universidade Federal de Minas Gerais
Elliott Carter
Ao instruir, verdadeiras obras de arte devem ser selecionadas a partir
de todos os estilos de composição, e devemos mostrar ao amador toda a
beleza, ousadia e inovações nelas contidas.
Carl Philipp Emanuel Bach 1
FRAGMENTAÇÃO
22 APRESENTAÇÃO
século XX, contraponto do sé-
XVI e contraponto do século XVIII;
- separação por cultura - por exemplo, música asiática em distinção à
música européia;
- separação subseqüente em música popular, folclórica ou clássica.
24 APRESENTAÇÃO
vez, cor sonora
somente de sons individuais, mas
de uma obra completa, inaugurando, um novo
campo analítico essencial;
5) apreciação das contribuições decisivas a cor sonora
dades tais como as interferências acústicas e o ruído, considerados
anteriormente como musicalmente inexistentes, irrelevantes ou
indesejáveis;
6) reconhecimento das diferentes explicações que os cientistas do
som e os compositores e teoristas, conduzidos por suas intuições,
formularam sobre fenômenos paralelos;
7) a compreensão, em última instância, dos profundos inter-relacio-
namentos entre as várias músicas ao redor do planeta e dos laços
estreitos que vinculam a música com outras artes, ciências e com as
mais variadas expressões de vida humana.
PARA OS ESTUDANTES
Este livro foi escrito para os estudantes. Ele oferece um conjunto de idéias e
observações a respeito de diversas obras musicais e, mais importante, um reper-
tório de maneiras de compreender a música. Utilizamos anteriormente a palavra
moldura para designar este repertório de idéias. Essa moldura, quando preenchi-
da, deve ser suficiente para englobar toda uma vida de percepções musicais. Este
repertório de músicas e de idéias inclui e desenvolve:
e Tibete;
em seus
ângulos em
i"OV'Ont"OC'
26 APRESENTAÇÃO
e com as novas e
Esses compositores abriram novos som
a percepção e o Atuando como teoristas, junto com outros teó-
como Schenker, refinaram maneiras anteriores de conceber a música. Mui-
tos intérpretes - Schnabel, Furtwangler, Casals, Landowska, Kirkpatrick, para
alguns - visões de inestimável valor a respeito da estrutura e da
LH•~·~~.~~ musical. Iniciando com Helmholtz na Europa, cientistas provaram
a inesperadamente rica e complexa do som. Nos Estados Unidos, psi-
cofísicos como Miller, Seashore, Stevens e Fletcher, dando continuidade a este
~~H••J· forneceram as bases para campos inteiramente novos de análise e cria-
ção musical. Músicos de variadas culturas, sejam intérpretes ou pesquisadores
(etnomusicólogos, por exemplo), direcionaram seus esforços ao som e ao sentido
de outras culturas musicais. Uma moldura com lugar para todos estes desenvolvi-
mentos, ainda freqüentemente inacessíveis aos estudantes e outros interessados
em música, faz-se necessária.
PRESENTE E FUTURO
28 APRESENTAÇÃO
informações e as neces-
é que muitos dos assuntos
são reservados atualmente para estudos avançados ou então são
omitidos no musical (psicofísica do som, espa-
análise de coleções, análise da cor sonora, música de culturas não-européias,
lH~'"'"-~ recente, entre outros).
Existem reais dificuldades para se lidar com esta complexidade. Entretanto,
toda a compreensão artística pode ser difícil e não há como fugir disso. Estamos
convencidos que essas omissões resultam não da maior dificuldade intrínseca,
mas sim da comodidade. Assim como a teoria dos números e dos conjuntos na
matemática passou do curso de graduação para a escola elementar, também as
idéias musicais podem se tornar disponíveis nos estágios iniciais de aprendizado,
nos quais se fazem necessárias por sua importância fundamental.
Este texto pretende introduzir modos frutíferos de pensamento e percep-
ção e não apresentar verdades absolutas. Ele apresenta, de forma subjacente, in-
formações (do passado e do presente) que justificam tal pensamento. Essas infor-
mações estão sujeitas a processos permanentes de crítica e aperfeiçoamento, sem
o intuito de resolver, em última análise, todas as questões propostas, mas sim de
suprir um estágio necessário de evolução contínua.
No desenrolar do livro, questões aparecem em itálico no início das seções. O
leitor que examinar essas questões poderá trazer suas próprias idéias relaciona-
das ao texto, o qual oferece maneiras de responder às questões suscitadas. Deve-
ria ser óbvio, porém sentimos necessidade de enfatizar que os exemplos musicais
devem ser escutados e executados, quando possível. A separação entre composi-
ção, execução, análise e apreciação não encontra respaldo aqui.
Os conceitos e possibilidades levantados por este texto permanecem em
aberto. Em quase todos os assuntos, ainda há o que ser pensado. Em muitos ca-
sos, evitamos conscientemente algumas sutilezas que teriam desviado a atenção
do leitor do foco principal. Cada capítulo do texto é finalizado com uma listagem
de livros e artigos relacionados. O leitor que desejar pesquisar um assunto com
mais profundidade pode fazê-lo utilizando este material, ao invés de seguir ime-
diatamente para o próximo capítulo.
Este livro será seguido por um livro de exercícios,* que fornecerá oportuni-
dades para o uso sistemático dos conceitos e técnicas apresentados neste volume.
Este livro de atividades proporá muitos problemas analíticos e composicionais que
demandam o uso imaginativo e perspicaz das possibilidades reveladas neste texto.
NOTAS
1. Transcrito de uma carta datada de 15 de outubro de 1777, contida no Essay on the True Art of Playing
Keyboard Instruments, editado e traduzido para a língua inglesa por W. J. Mitchell (New York: Nor-
ton, 1949, p. 441).
2. J. Corredor em Conversations with Casais, traduzido por A. Mangeot (New York: Dutton, 1956, p.
188-89). Copirraite (1956) E. P. Dutton & Co. Translation. Copirraite (1957) E. P. Button & Co. Inc.
e reimpresso com sua permissão.
3. Albert Einstein em Ideas and opinions (New York: Crown, 1956, p. 28).
4. J. J. Fux em The Study of Counterpoint, editado e traduzido por A. Mann (New York: Norton, 1956,
p. 17).
5. Referido em H. Cowell e S. Cowell, Charles Ives and His Music (New York: Oxford University Press,
1955, p. 180).
30 APRESENTAÇÃO
tantas
Evitar o som tornou-se, hoje em dia, uma tarefa impossível. Paradoxalmen-
ainda que a música esteja presente em todos os lugares, sua natureza fun-
damental permanece bastante desconhecida. O som organizado como música
- vibrações de ar que se propagam no invisível - é algo bastante misterioso. Di-
ficilmente encontraremos em outro campo de conhecimento maior abismo entre
os ignorantes de suas particularidades e exigências e os já iniciados em seu es-
tudo. Temos aqui por objetivos propiciar o desenvolvimento da compreensão do
som e elucidar sua formatação em obras musicais.
Por enquanto, dedicaremos um pouco de nosso tempo à outra arte, já que a
música talvez encerre algo de misterioso.
- significado;
-som;
34 PRELÚDIO
deste
Quais são estes sons? O que é esta música? Como um evento é ligado ao outro? Durante
sua audição, o que cria sentido e impacto? Se, de fato, a audição desta música evoca sen-
tido e poder expressivo? Que eventos (se algum) sobressaem e por quê?
O prelúdio é composto para piano, ou seja, esta obra utiliza os recursos deste
instrumento para formar seus sons e sua movimentação. Ao invés de cobrir toda
a extensão do piano, Láº-Dó 8 , a peça utiliza somente o espaço compreendido en-
tre Dó1 até Mi~5 - apenas metade da extensão do instrumento e menos da metade
da gama audível de dez oitavas do ser humano. 3 Uma obra musical trabalha com a
exploração e elaboração de regiões seletas da gama audível. A importância desta
escolha não pode ser subestimada, apesar de ser freqüentemente ignorada. Se o
leitor experimentasse tocar este prelúdio duas oitavas acima, tal leitura tornaria
a obra absurda, embora esta localização não esteja completamente fora da exten-
são de outras obras para piano de Chopin. A maioria dos sistemas analíticos não
leva em consideração a diferença produzida por esta transposição. A localização
* N. T. Foi feita uma adaptação da notação alfabética usada nos países anglo-saxônicos para a notação
italiana usada no Brasil, incluindo-se os sustenidos e bemóis.
36 PRELÚDIO
UH~i~ os a
'--V'·ª~~~· Faremos uso de gráficos, pictóricos e
a movimentação espacial e como uma ª"'°'""'"""
desta Os músicos se acostumaram tanto com a no-
musical européia dos séculos XVIII e XIX que já não percebem mais como
afeta sua visão das obras musicais. Examine a notação das notas Mi~ suces-
na direita no último tempo do compasso 7 e no primeiro tempo do
compasso 8. Por causa da mudança de clave, a notação sugere um grande salto
mesmo ocorre no compasso 4 e entre os compassos 8 e 9, 11 e 12 e 12 e 13).
representação gráfica do fluxo efetivo da música através da gama audível é conti-
nuamente obscurecida pela mudança de claves. A notação não fornece um mapa
visual preciso desta movimentação.
A notação também disfarça o fluxo da música através do tempo. A no ter-
tempo do compasso 1 dura três vezes mais do que a . Na impressão, esta
visualização não é respeitada visualmente. A r;;i conclusiva dura quatro vezes
J
mais do que a precedente e, mesmo assim, ambas ocupam quase o mesmo espa-
ço na impressão. É de se estranha~ portanto, que os músicos achem a execução
ritmicamente precisa tão difícil? Que, confusos pela aparência da notação, fre-
qüentemente careçam de uma idéia dara a respeito das dimensões temporais e da
movimentação espacial de uma obra musical? Apesar dos gráficos também pos-
suírem limitações inerentes, eles atenuam essas distorções da notação, expres-
sando, de modo vívido, a movimentação através do espaço e do tempo musicais. 4
A movimentação espacial de uma obra (que será discutida em detalhes no
Capítulo 1) é um assunto complexo. Somente alguns dos princípios subjacentes à
movimentação do prelúdio podem ser sugeridos neste momento. O limite espa-
cial superior (que freqüentemente é a "melodia" de uma obra) é percebido como
uma linha nesta peça, uma rede de pontos adjacentes. Esta linha inicia nos compas-
sos 1 e 2 com a linha descendente de Sol4 até Dó 4 e no seu decorrer incorpora dois
breves giros, demarcados pelas ligaduras (Exemplo P.2a). Algumas das notas des-
sa linha são especialmente importantes, porque conduzem à linha descendente
de um ponto para o outro:
N ~ nota vizinha
38 PRELÚDIO
ser
segmento,
segmento, compasso
ui.c~uAi~
e finais destes segmentos lineares - Sol, Mib e Dó -
os segmentos inicial. Mib5 - Sol4 e Dó 4 - Mib3 , entretanto,
agora nos pontos finais dos segmentos lineares, abrangendo sex-
tas ao invés de terças; portanto, o espaço linear bastante a
de oitava no Apêndice A). O mesmo acontece com o uso
registros: nos primeiros compassos, a movimentação concen-
trava-se no registro 4 (parcialmente dobrado por oitava no 3) e agora se
estende através dos registros 2-5. O florescimento do espaço linear - produzindo
imaginativos e estimulantes da original - foi atingido através
características básicas da linha original.
estas ampliadas se desenvolvem, a nota Sol4 (que no compas-
superior) é mantida constantemente em foco durante os com-
inserida na sonoridade total (Exemplo P.3b).
(compassos 1-4) é mantido agora em torno
~u"~··~~ enfatizada?
do que as acima e
como nos compassos 1-4?
--~===~== .~
b)
40 PRELÚDIO
7
ao
42 PRELÚDIO
e da organização de
existe ainda um outro aspecto
coalescem em os tempos de um compasso
CLU•~~·~ se unem em áreas extensas de tempo. Cortot discorreu
compassos cujos três planos sucessivos resultam em uma
expressiva de surpreendente simplicidade e poder emocional". 8 Os gru-
compassos são definidos três níveis de ff, p e pp. Es-
dimensões de entretanto, não são caracterizadas somente por
'~"'u~~~. No início de cada grupo de quatro compassos, por exemplo, uma
nova linear inicia-se em Sol4 , além já mencionada mudança de
registro que ocorre no compasso 5 (e novamente no compasso 9). A movimenta-
da linha e dos registros, as mudanças de dinâmicas e o fluxo temporal estão,
em um especialmente poderoso das dimensões
quatro compassos.
Os três grandes blocos da peça, bem como suas unidades menores (tempos
e compassos), têm aproximadamerfte a mesma duração. Em uma obra musical,
ª"'"""u como em uma estrutura arquitetônica, o equilíbrio e as proporções das
dimensões mais amplas constituem-se em requisitos básicos para a coerência da
em sua totalidade. No Prelúdio, também percebemos como a simetria sub-
ª'-'-"'-'- às partes pode ser sutilmente variada. Assim como o ritenuto dos com-
passos 8 e 12 causa alongamento da duração dos tempos e dos compassos,
também o compasso extra último grupo de quatro compassos causa amplia-
ção da unidade básica. Em nenhum dos casos, a identidade da unidade básica é
Descobrimos uma obra musical, mesmo uma miniatura como este pre-
lúdio, constitui-se em uma estrutura multifacetada com dimensões de tempo e
espaço, direção e velocidade características de movimentação, e registros e cores
sonoras distintas. Vimos também como um aspecto é reforçado e esclarecido pelo
que está ocorrendo, ao mesmo tempo, em outros parâmetros:
44 PRELÚDIO
e (@)no compassos 1-4
- espaço;
- linguagem;
- tempo;
- cor sonora.
comp. 3-4
Dó Sol
Dessa maneira, o segmento linear inicial, com seus dois subsegmentos, é nitida-
mente delineado. Igualmente dara é a razão para a conexão de todo o próximo
grupo de quatro compassos (5-8) em uma linha de ligadura:
46 PRELÚDIO
1. por Peter-Crossley-Holland em "The Music of the Tantric Rituais of Gyume and Gyuto", en-
carte do disco The Music ofThe Tibet (Antb.,ology of World's Music AST-4005). Sua santidade Gyalwa
é a mais alta autoridade da Ordem bKa' -(b)rgyud-pa.
n.o.uL'ªI-'ª
2. Na pronúncia dos fricativos, o ar percorre uma pequena e restrita abertura, causando uma fricção
que um ruido colorido (veja no Apêndice B a seção "Ondas complexas ou ruído"). O som é
similar ao vento e as ondas.
3. A numeração de intervalos e registros é explicada no Apêndice A. A gama audível é considerada no
Apêndice B.
4. As representações gráficas de obras musicais neste livro apresentam marcantes semelhanças com
os gráficos musicais gerados por computadores descritos em M. V. Mathews e L. Rosler, "Graphical
Language for the Scores of Computer-Generated Sounds", Perspectives of New Music (Spring-Sum-
mer, 1968, p. 96-118). As qualidades que tornam os gráficos indispensáveis para os computadores
ajudam os humanos também. Consideramos os gráficos úteis como ferramentas iniciais, como um
apoio para perceber os delineamentos mais amplos da movimentação e da distribuição espacial. Dis-
cutiremos mais, a seguir, sobre as técnicas específicas de representação gráfica e os possíveis usos e
limitações dos gráficos (veja no Capítulo 1 a nota 9).
5. Uma bordadura (returning note) não precisa necessariamente ser uma vizinha espacial:
Em nossa análise, utilizamos a letra R para indicar todas as bordaduras, sejam vizinhas ou não. A
letra N indica notas vizinhas que não retornam. Ambos os princípios, vizinhança e bordadura, são su-
ficientes para formar uma elaboração. Durante este livro, tentamos desenvolver a consciência sobre
as notas que determinam uma movimentação (seu contorno), em oposição àquelas que elaboram uma
movimentação (ou contorno). A apresentação mais completa destas formas de elaboração encontra-
-se no Apêndice D.
Frederic Chopin, 24 Preludes, op. 28, ed. Alfred Cortot, trad. David Ponsonby (Paris: Editions Sala-
bert, 1926, p. 66).
7. Ibidem, p. 66-67.
8. Ibidem, p. 65.
9. Ver Apêndice A, seção "Intervalos", para maiores informações sobre a numeração dos intervalos.
48 PRELÚDIO
Jacob Bronowski1
Casals 2
Varêse 3
Os sons consistem em ondas produzidas por vibrações. As vibrações, sejam
originadas por cordas friccionadas, palhetas sopradas ou outro meio
quer, se propagam através do ar, a partir de sua fonte sonora, por meio de ondas,
ccuu'--'-'"'-- como uma pedra atirada em um lago calmo forma ondas concêntri-
limites ap1·oxlma·dos
voz humana da música instrumental
-&
- 4,186
É curioso que tão pouca atenção tenha sido dedicada à investigação da na-
tureza e da extensão deste espaço, bem como de suas possíveis concepções e pro-
cessos de movimentação. A expansão que acabamos de descrever raramente foi
percebida, assim como suas enormes implicações para as formas musicais. Desco-
briremos que o próprio espaço musical oferece recursos e possibilidades musicais
instigantes. Além disso, o espaço afeta tanto a linguagem quanto a cor musi-
cal, o que torna uma descrição precisa desses campos dependente da consciência
espacial. O espaço será, portanto, a primeira de nossas explorações musicais e
estender-se-á pelos Capítulos 2 e 4.
52 O ESPAÇO MUSICAL
Examine a forma criada no espaço musical por esta peça como um todo. Existe um movi-
mento geral do começo ao fzm? Examine a forma das duas vozes. Quais são as similari-
dades e diferenças entre elas? Onde se detecta movimento, descreva a sua direção. Espe-
cificamente, quais notas conectam o movimento musical à forma? Todo o movimento da
música se encaminha ao mesmo tempo para a mesma direção? Existem movimentos de
longo e de curto alcance (curtos e rápidos)? A música permanece sempre fixa no espaço?
(O gráfico da música pode auxiliar na compreensão e na audição do contorno da música).
CONTORNO GERAL
54 O ESPAÇO MUSICAL
:~
SOM E MÚSICA A NATUREZA DAS ESTRUTURAS SONORAS 55
:~
Vl
°'
contraltos l e sopranos e
notas de cada
l
""'voz 2
f..lY.làUfli:$,U-U mínima l
vertical ~ uma nota dlatônlca
vozes em "Benedictus"
várias vozes diferentes, cada voz estava limitada ao espaço de um intervalo ~§::.
intenção e o efeito normal da teoria foram o de circunscrever o espaço de uma
melódica nos limites confortáveis da voz humana.
Josquin destacou-se por expandir esses limites. O teórico renascentista
Glareanus cita vários casos nos quais Josquin excede os limites "com a sua liber-
dade costumeira". 11 No "Benedictus", mesmo que as regras pareçam estar sendo
seguidas ao pé da letra quanto às vozes individuais, em espírito, o rigor da lei é
ignorado. Vincular pares de vozes em diferentes regiões para criar um único mo-
vimento espacial que ultrapasse enormemente os limites modais se constitui no
desenvolvimento espacial mais perspicaz e imaginativo de Josquin.
- o movimento '-'-'-"''-''-"'-'-'-"
nidade de retomar o movimento ascendente
com maior velocidade, mais
- mais especificamente, os gestos
- Ré 3 -+ Lá 2 , uma ao
3 3
te Ré-Lá (compassos 6-9); Ré -+ Lá
58 O ESPAÇO MUSICAL
uma
segundo gesto. Dessa
recorrem em novas direções, registros e
dades (ver Exemplo 1.5c);
- a nota Lá, meta comum (ou nota em todos estes gestos, é
3
mantida em evidência, apesar Lá ter momentaneamente
ELABORAÇÃO LINEAR
Como pode ser comparado o movimento do baixo 2 com o do baixo 1 durante a palavra
"Benedictus"? Como estão coordenados seus movimentos?
60 O ESPAÇO MUSICAL
descendentes reforçam as metas
Examine o contorno gerado no espaço musical pelos compassos 1-10 como um todo.
Existe uma direção geral nesse movimento? Quantas linhas separadas fluem simul-
taneamente nessa seção? Examine a forma de cada uma delas. De que maneira estas
linhas se unem para criar movimento e direção?
CONTORNO GERAL
- a voz do baixo, que começa com uma extensa série de graus conjuntos
ascendentes;
- uma voz interna, que alterna notas e pausas desde seu começo;
- uma voz soprano, que apresenta padrões de semicolcheias em
sucessão.
62 O ESPAÇO MUSICAL
SOM E MÚSICA: A NATUREZA DAS ESTRUTURAS SONORAS 63
as notas cada voz, suas na mesma
um
64 O ESPAÇO MUSICAL
uma va-
~.,.if.',w'"·~.2u'~.~~.~ ou complexidade. Constatamos que, no '-"''-"'"-"·'-'
passa por desvios (ou afastamentos) para logo retornar
com renovada energia. Ao examinar o contorno
seu direcionamento principal suas e des-
a)
66 O ESPAÇO MUSICAL
--------------------------------------------------
~Estrutura compassos 1-3
68 O ESPAÇO MUSICAL
as vozes realizam seu a voz
º"'-<ª''"U seus ápices (Dó-Sil., compassos 3-4; Rél.-Dó, compassos 5-6; e
Sol-Fá-Mil,, compassos 8-9), o baixo estável ou descende momenta-
º""mc,nr·p e vice-versa (compassos 7-8). Dessa maneira, a energia ascendente se
reveza entre as externas, que assumem alternadamente a ~~ucun.uuau.c
impulso linear ascendente. O ímpeto ascendente só é quando
ocorre uma descida coordenada no final da seção (compassos 9-10). O Exemplo
1.15 sintetiza o paralelismo essencial das linhas, revelando como sua coordena-
ção o contorno geral de a seção.
a) o movimento coordenado das linhas superiores, das linhas internas e do baixo nos
compassos 1-10
~ ~=-=---,...-._~ ~ ~ -
-~~_....-
70 O ESPAÇO MUSICAL
vez,
mas, no contexto
a soprano (Exemplo 1.12a).
Nesse aspecto, a técnica Bach é na em que ocorrem
Pn1r-PrnP1'irP lapsos temporais entre uma nota e sua continuação u11,ect1
72 O ESPAÇO MUSICAL
que
ª"-<''-'"--"- (mais observações sobre esta peça
3, Tempo e
Quantas linhas existem nesta obra? Qual elemento cria o contorno principal desta fra-
se? Qual é o movimento linear principal? Como podemos comparar esta frase aos exem-
plos anteriores?
Nas peças de Josquin e Bach, duas ou mais vozes com contornos distintos
são coordenadas tão intimamente na produção de um padrão de movimento que
se torna difícil escolher uma voz primária consistente. A concepção de Mozart
no "Laudate Dominum", cujo gráfico das linhas está representado no Exemplo
1.18, é bem diferente. A única voz que realiza um movimento bem formatado é a
voz do soprano, executada pelo violino L A voz interna do violino II pode parecer
ativa à primeira vista, mas trata-se somente de três linhas estáticas, sendo que
nenhuma delas se move mais do que um grau acima ou abaixo do seu nível inicial
(Exemplo 1.18). Essas vozes dão apenas uma ilusão de movimento.
As duas vozes mais graves - fagote ad libitum e o baixo (tocados pelos vio-
loncelos, contrabaixos e órgão) - geram uma certa movimentação. Suas durações,
contudo, são muito medidas e ocasionalmente são interrompidas por longos
ríodos de imobilidade. Não obstante, oportunamente será considerada a relação
movimentos das vozes mais graves com o movimento mais ativo da linha do
L Ao todo, quatro vozes formam seis ramificações lineares. dessas
ramificações se de estática ou com
74 O ESPAÇO MUSICAL
das linhas da de
vozes estão conectadas
·~ violino ll
ou contrabaixo
10
1
76 O ESPAÇO MUSICAL
eem
·····~··e~ descendente a
da elaboração
e adição significativa de movimentação cromática
longado entre Lá e Sol).
Em ambas as passagens, as notas na do soprano que funcionam como
suportes principais de toda a movimentação são Fá4 , Dó 5 , Lá4 e Fá4 - uma
de Fá maior (Exemplo 1.21). Como essas notas um papel cru-
na definição do vocabulário tonal de Fá na peça, afetam ~ .. ··-·~~···~·~
mente a elaboração dos contornos da obra e a sua linguagem (estudaremos estas
funções lingüísticas no Capítulo 2).
(as partes do violino II, fagote, cello, órgão e baixo foram suprimidas, pois essencialmente 'f
duplicam as linhas do coro)
78 O ESPAÇO MUSICAL
, voz soprano, compassos 17-32
80 O ESPAÇO MUSICAL
as outras vozes dessa
este contorno. Mesmo a em oposição do
no ascendente do soprano pela abertura de um espaço
toda expansão e contração espelham o movimento da do soprano.
EM
31, N. 3, PRIMEIRO MOVIMENTO, COMPASSOS 1-25
i.25)
Como a extensão do espaço utilizado neste trecho se compara com aquela utilizada nos
exemplos anteriores? Os saltos parecem ser uma importante característica no movimen-
to desta obra - por exemplo, nos compassos 10-16. Quais são os seus efeitos no desen-
volvimento linear?
"'"'"'"'"""1"' 1.25 - Beethoven: Sonata para piano em Mi~ maior, op. 31, n. 3, Primeiro Movi-
mento, compassos 1-25
82 O ESPAÇO MUSICAL
- Gráfico Beethoven: Sonata para piano em Mi',, maior, op, 31, n. 3, Primei-
ro Movimento, compassos 1-25
11xen1p.11.o 1.28 - Um modelo helicoidal do espaço musical: uma linha curva que, na medida
em que ascende (ou descende), continua girando ao redor de um mesmo eixo
a)
Dó
84 O ESPAÇO MUSICAL
entre
DESLOCAMENTO DE REGISTRO
Fá-Solj,-Sol-Fá-Mif,
Lá-Sol-Fá-Mi/,
> ocorrendo sucessivamente na linha do contralto, registro 4
86 O ESPAÇO MUSICAL
- Fá-Mib descendente todas as frases).
88 O ESPAÇO MUSICAL
o registro 5, o segundo de
a aparece nas extremidades
max desenvolvimento, no espaço mais longínquo que o instrumento Bee-
29
thoven pode alcançar. evolução espacial é, portanto, realizada simultanea-
mente pelos dois tipos de movimentos citados anteriormente: linear e registraL
Dessa maneira, todo o espaço registra! é aberto e explorado e a célula espacial
111."-""' explode em ampla gama de cores como resultado de seu movimento
diversos registros.
vizinha deslocamento de
123 126
É desnecessário mencionar que uma obra como esta requer um alto nível de
exigência do intérprete e que tal demanda dificilmente é alcançada, por ser esta
uma das sonatas de Beethoven mais freqüentemente sujeita a alterações e dis-
torções. Um intérprete consciente do papel dos deslocamentos de registros deve
tratar o primeiro destes, o baixo dos compassos 2-3, como um momento especial,
já que ele se constitui na semente da qual germinará toda a forma registral. Como
se Beethoven quisesse enfatizar este momento, é especificamente nesse ponto
90 O ESPAÇO MUSICAL
que está localizado o ritardando. De fato, as indicações de tempo, ataque
e dinâmicas de Beethoven são valiosas para ajudar o intérprete na projeção da
mudança de registros. Entretanto, essas indicações são freqüentemente ignora-
das ou mesmo contrariadas. 30
Apesar do movimento registra! (e a utilização criativa dos registros) já estar
presente na música européia muito antes de Beethoven, ele foi o compositor que
elevou o movimento de registros à mesma importância do movimento linear -
um desenvolvimento necessário na concepção do espaço musical. Esse assunto
não foi ignorado por seus contemporâneos. Tovey nos lembra que:
Weber pensou que Beethoven estava à beira do hospício por sustentar, na coda do pri-
meiro movimento de sua Sétima Sinfonia, a nota Mi em cinco oitavas simultâneas [...]. É
curioso que Weber não tenha mencionado então as cinco oitavas do Si~ bem no início
da Quarta Sinfonia de Beethoven, mesmo que este tenha citado anteriormente esta in-
trodução com desprezo e como uma instância de blefe, na qual Beethoven espalha uma
dúzia de notas durante quinze minutos. [grifos do original]31
Mesmo que esta avaliação seja contrária à nossa, Weber reconhece, na con-
cepção de registros de Beethoven, a cristalização (na música européia) de uma
nova arte do espaço musical. Talvez não tenhamos atribuído crédito suficiente
a estes gestos espaciais de grande envergadura e colorido como uma das princi-
pais origens da visão musical do século XIX e XX e ainda, possivelmente, como
exemplo da interconexão entre os mundos musicais e imaginativos da Europa e
da Ásia. 32 (Observações sobre esta peça, a partir de outros pontos de vista, serão
encontradas no Capítulo 2 ("O sistema tonal: conclusão") e no Capítulo 3 ("Exe-
cutando módulos, frases e seções").
Como pode ser comparado o espaço total desta peça com aquele utilizado na Sonata de
Beethoven op. 31: n. 3? Existe movimento melódico de uma ou mais linhas através do
espaço? Os saltos, que são um elemento importante desta peça, representam desloca-
mentos de registros em uma movimentação linear? Como pode ser comparado o movi-
mento espacial de Schoenberg com aquele de Beethoven?
92 O ESPAÇO MUSICAL
possa se movimentar, um espaço criado própria
34
. Schoenberg, não precisa de um "novo espaço", mas sim do
já existente em Beethoven e em seus sucessores. ampliação espaço
dlt.cu1.,.a.ua por Beethoven e confirmada nas composições século XIX) possibi-
uma concepção de movimento espacial ainda mais radical, designada total-
mente a partir de sua própria e vasta expansão espacial. Nesse novo tipo de movi-
mentação (da qual Schoenberg foi pioneiro), o design percorre amplas expansões
de registros, ao invés do desenvolvimento por graus adjacentes e lineares.
-
D
94 O ESPAÇO MUSICAL
op. 19, n. 6
campo IV
96 O ESPAÇO MUSICAL
pelas ~'-'-)~'-'-'"-
que um pode ser u.~'""''-'-V
como espaçado, nenhum espacial é
estabelecido. A utilização dos campos propicia a apresentação de intervalos com
e de disposições e nisso reside seu grande
para o movimento espacial.
campo I
campo II
(Õ----
campo IV
AMBIGÜIDADE DE MOVIMENTAÇÃO
98 O ESPAÇO MUSICAL
corno
Entretanto, nos dois campos restantes, as harmonias retornam aos seus regis-
tros originais (registros 3-5), uma ascensão que contrasta com o movimento des-
cendente dos campos melódicos em direção ao registro 1.
Várias forças são combinadas para produzir no campo conclusivo IV a maior
extensão espacial da peça, que cobre os registros 1 ao 5. Nos campos I e II, os
eventos melódicos e harmônicos apresentam similaridades quanto aos registros
e à direção descendente. Quando ocorre a separação dos movimentos harmônico
e melódico nos campos III e esses movimentos tomam direções opostas e o
espaço dos gestos melódicos característicos também se expande em um registro.
5 9
campo
campo r
Como pode ser comparado o espaço total desta peça com o dos exemplos anteriores?
O princípio formativo do design espacial constitui-se na movimentação linear ou por
campos? Quais são os limites espaciais e que instrumentos os criam? De que maneira a
densidade é variada?
\
CONTORNO GERAL
gestos aore~>er1taLdCJS
demos notar pelos exemplos
como notas curtas e isoladas. Cada gesto soa:
- em vários
- em cada do espaço
- como parte intrínseca aos e
espacial.
A MOVIMENTAÇÃO NO CAMPO B
b}
vln.II
v!n.n
* N. T. A tradução do termo não incorpora a metáfora do termo original: root (raiz). Temos a mesma
situação na palavra "tonalidade", a qual no original era key (chave).
' Alinari-Scala
Reimpresso com permissão de
Este rascunho preparatório revela de maneira vívida as funções lineares. As linhas convergentes
do piso e da estrutura principal criam a perspectiva espacial e o foco do desenho. Em uma
"Ele alcançou um perfeito domínio no equilíbrio dos volumes de luz e sombra, Sua preo-
cupação com a gradação e com o contraste, ao invés da linha, permitiu-lhe estudar os
problemas da interpenetração e da reflexão," 55
Retirado de Despite Straigt Lines de François Cucher. Reimpresso com a permissão do autor
e de Josef Albers.
A ambigüidade espacial afeta em especial o pequeno painel central compartilhado pelos cubos.
Como parte do cubo da esquerda, este parece retroceder; já como parte do cubo da direita,
este painel parece ~mergir. Como na peça op. 19, n. 6 de Schoenberg, os detalhes vibram em
várias direções simultâneas. Dois significados opostos não resolvidos estão conjuminados em
um único elemento.
Devemos cuidar para que a parte contrapontística seja variada em seus diferentes mo-
vimentos e que percorra diferentes graus, ora agudos, ora graves, ora intermediários
[... ]. E devemos zelar também para que a parte contrapontística seja facilmente cantada
e para que esta proceda, tanto quanto possível, por graus conjuntos, já que neste proce-
dimento reside parte da beleza do contraponto. 57
Nesta notação medieval japonesa, as relações espaciais são indicadas por meio de gráfi_cos.
Na Ásia, desde muito cedo, o espaço musical foi concebido de maneira mais espaçada, mais
próxima do modelo de continuum fluído do que na Europa (veja também o Apêndice C). A
notação, assim como a do canto budista tibetano, reflete esta concepção espacial.
LEITURA COMPLEMENTAR
FUX, J. J. The Study of Counterpoint. ed. e trad. A. Mann. New York: Norton, 1965.
OSTER, ERNST. Register and the Large-Scale Connection. Journal of Music Theory, p. 54-71,
1961.
SCHENKER, HEINRICH. Five Graphic Music Analyses. ed. Felix Salzer. New York: Dover, 1969.
SCHOENBERG, ARNOLD. Preliminary Exercises in Counterpoint. New York: St. Martin's, 1964.
SCHEPARD, ROGER. Circularity in Judgement of Relative Pitch. Journal of the Acoustical So-
ciety of America, 26, p. 2346-2353, 1964. [O fenômeno acústico descrito neste artigo, agora
conhecido como Shepard's Tones, pode ser ouvido nas gravações da Decca DL 710180, Voice of
the Computer].
ZARLINO, GIOSEFFO. The Art of Counterpoint. trad. G. Marco e C. Palisca. New Haven: Yale
University Press, 1968.
NOTAS
1. "Obviamente, as medições e a precisão ainda são necessárias, entretanto, agora as reconhecemos so-
mente como material bruto para a ciência. O propósito da ciência consiste em encontrar as relações
que organizam este material bruto, as formas e as estruturas dentro das quais os dados coletados se
encaixam. O segredo do código genético não está na aritmética, mas na disposição da geometria. A
perspectiva da ciência moderna não é a busca de dimensões numéricas e sim a busca de relações to-
pológicas. O público tem pouca consciência das mudanças que estes novos e revolucionários concei-
tos da estrutura lógica causam na ciência" (Jacob Bronowski, "The Discovery of Form" em Structure
in Art and Science, editado por G. Kepes - New York: Braziller, 1965, p. 56-69).
2. J. Corredor em Conversations with Casais (trad. A. Mangeot - New York: Dutton, 1956, p. 188).
3. Edgard Varese, "Spatial Music" em Contemporary Composers on Contemporary Music (ed. E. Schwartz
e B. Childs - New York: Holt, Rinehart & Winston, 1967, p. 204). Neste artigo, Varese trata do es-
paço musical formado pela extensão audível, nosso interesse imediato, e também sobre a música no
espaço arquitetural.
4. A totalidade do espaço acústico (ou musical) equivale à extensão das freqüências audíveis. A natu-
reza desta extensão, as propriedades físicas do som e os aspectos mais importantes da audição hu-
mana são discutidos no Apêndice B. Este apêndice fornece o conhecimento acústico, ou psicofísico,
necessário para a leitura do Capítulo 1.
5. Em contraste, a música da Ásia explorou, desde muito cedo, um espaço relativamente amplo. Com-
pare a análise de registros das Três variações chinesas sobre Plum biassam ("Ameixeiras em floração")
do Capítulo 4 com os exemplos anteriores europeus apresentados nos Capítulos 1 e 2 (os cantos
gregorianos e as obras de Machaut, Josquin des Prez e Lassus). O Apêndice C também observa o
espaço multirregistral reconhecido pela teoria indiana antiga.
= direção do movimento
Essas indicações não implicam valores rítmicos, somente sua função linear.
13. As notas Dó, Fá, Lá e Dó, que servem como ápices do movimento linear em todo o "Benedictus",
desempenham funções especiais na linguagem musical da peça (que serão discutidas no Capítulo 2).
Geralmente, os objetivos da movimentação são cruciais na definição da linguagem musical de uma peça.
14. Adjacente em relação ao sistema (neste caso, o sistema modal, cujas notas são Lá, Si, Dó, Ré, Mi, Fá,
Sol e Lá.
15. Esta elaboração do movimento linear foi descrita por Adrianus Petit Collico em seu Compendium Mu-
sices (Nuremberg, 1552), como "a primeira ornamentação que Josquin ensinava aos seus pupilos":
16. Surpreendentemente, a teoria da informação estabelece uma equivalência entre informação e incer-
teza. Podemos dizer que, antes da resposta, é preciso haver uma pergunta. Certas técnicas musicais
geram questões (por exemplo, o deslocamento para uma região espacial ainda inexplorada) e, pos-
teriormente, as utilizam para reconfirmar a informação inicial. A palavra entropia é o termo técnico
para a incerteza. "A incerteza, ou entropia, é entendida como a quantidade de informação expressa
por uma mensagem produzida por uma fonte. Quanto mais soubermos sobre a mensagem que será
produzida por uma fonte, menores serão o grau de incerteza, de entropia e a quantidade de informa-
ção" (J. R. Pierce em Symbols Signals and Noise - New York: Harper & Row, 1961, p. 23).
17. A repetição justaposta de uma melodia em duas (ou mais) vozes é conhecida como cânone. Neste câ-
none, a velocidade das duas apresentações melódicas apresenta a proporção 2:1. Para as implicações
rítmicas desta relação de velocidades, veja o Capítulo 3.
18. O "Benedictus", da missa L'homme armé de Dufay, predecessor de Josquin, oferece uma fascinante
possibilidade de comparação. Também escrito para duas vozes, o "Benedictus" de Dufay realiza um
movimento linear elegante em sua primeira frase (de onze compassos). Entretanto, nesse movimen-
to, esgota o espaço disponível das vozes no sistema modal. Confrontado com o problema de como
e para onde proceder, Dufay fez da necessidade uma virtude: a solução por ele encontrada consiste
em produzir um incremento na atividade rítmica enquanto o espaço é gradualmente restringido.
Contudo, comparada com a expansão espacial deliberada de Josquin, na qual cada nota do começo
ao fim participa no desenvolvimento do crescimento espacial, a totalidade da peça de Dufay parece
menos estável.
(Schoenberg).
34. H. Jalowetz em "On the Spontaneity of Schoenberg's Music" (Musical Quartetly, 30, October 1944,
p. 385-386). Na página 389 deste artigo, Jalowetz observa que "a concepção da oitava não incorpora
mais o significado de barreira limítrofe".
35. Boulez e Stockhausen também se referiram aos campos espaciais. Consulte Pierre Boulez em Boulez
on Music Today (Cambridge: Harvard University Press, 1971, p. 41). O "ruído branco" é definido no
Apêndice B.
36. O campo II prefigura a ampla movimentação registral descendente e a nota final enfatizada, Láb(veja
a discussão a seguir no texto). Sendo uma antecipação, este campo é uma elaboração do movimento
dos outros campos, que são, de fato, os principais responsáveis pela condução do movimento des-
cendente. Um campo pode elaborar outros campos, assim como certas notas elaboram outras no
movimento linear. A continuidade dos campos I, III e IV pode ser percebida ao executarmos a peça
sem o campo II.
37. Combinando as notas enfatizadas dos campos, o intervalo (z) é enfatizado,
38. O princípio da ambigüidade estrutural recorrerá em nossas observações do espaço, linguagem e rit-
mo na música do século XX. Apesar de sua importância crítica em todo o pensamento do século
XX, a ambigüidade estrutural permanece amplamente incompreendida. Veja neste capítulo a seção
"Considerações culturais e históricas" e no Capítulo 2, a nota 46.
39. A fim de abranger grandes distâncias, um movimento puramente linear deve percorrer um número
enorme de pontos adjacentes sucessivos. Por conseguinte, esta é necessariamente uma forma menos
concentrada de cobrir amplos espaços do que o movimento registral ou por campos.
40. Arnold Schoenberg em "Prefácio" para Seis bagatelas para quarteto de cordas ("Six Bagatelles for
String Quartet"), op. 9, de Webern (Vienna: Universal Edition, 1924).
41. Para maiores detalhes sobre este aspecto do campo A, veja a discussão da peça no Capítulo 2.
42. As metades inferior e superior (Lá#, Si, Ré, Mi e Fá, Sol, Láb, Réb) que formam esta simultaneidade
produzem também os grupos pan-intervalares de quatro notas, tão característicos da linguagem
musical de Carter (ver na discussão desta peça no Capítulo 2).
43. Novas dinâmicas, especialmente o ff sub (compassos 19 e 20), também definem, em uma execução,
o início do campo B, ou pelo menos deveriam.
44. Siegfried Giedion, "Space Conception in Prehistoric Art" em Explorations in Communication (ed. E.
Carpenter e M. McLuhan - Boston: Beacon Press, 1960, p. 73).
45. Veja o Capítulo 2, seção "O sistema tonal".
- o sistema modal;
- o sistema das consonâncias e dissonâncias;
- o sistema tonal;
- o sistema dodecafônico.
Além disso, a linguagem dos sistemas rãga da Índia será examinada no Apêndice
C. Apesar da limitada gama de linguagens escolhidas, acreditamos que seu estu-
do revelará o "aspecto criativo do uso da linguagem" sobre o qual Chomsky escre-
veu. Além disso, nos proporcionará a oportunidade de integrar uma variedade de
linguagens com diversas concepções espaciais - para mostrar que, de fato, estes
dois aspectos da música são inseparáveis.
ÜBSERVAÇÕES INICIAIS
As alturas de uma obra musical não determinam somente o design de seu es-
paço musical. Notamos anteriormente que um determinado intervalo pode apre-
sentar um significado especial em um contexto específico, como no caso da oita-
va. Agora, aprofundaremos nosso conhecimento sobre as relações intervalares.
Em várias culturas e sistemas musicais, o espaço musical é dividido de
acordo com certas medidas. Pontos no espaço musical, que constituem as alturas
disponíveis em uma determinada música, são selecionados de maneira que apre-
sentem determinadas distâncias entre si. Estas distâncias são conhecidas como
intervalos. Existem diversas maneiras de dividir o espaço e, conseqüentemente,
diferentes coleções de intervalos em vários sistemas. 6 Além disso, as linguagens
musicais desenvolveram maneiras distintas de utilizar coleções intervalares si-
milares. A seleção de alturas e (especialmente) as relações intervalares características
entre estas alturas criam uma linguagem musical.
Lá#-Si-Dó#-Ré#-Mi- Fá#-Sol#
Essas notas constituem a escala de Si maior (ou Sol# menor natural), de acordo
com a terminologia do sistema tonal.7 Entretanto, os agrupamentos intervalares
construídos a partir dessas notas na obra "O velho castelo" de Mussorgsky dife-
rem significativamente daqueles presentes na Mazurka de Chopin. A peça "O ve-
lho castelo" enfatiza as notas Sol# e Ré# e o intervalo ('j_) formado por estas notas
(a numeração de intervalos é explicada no Apêndice A):
adic!i:mada
pdndpalmente: acorde
passagem) elahormlnrl
- a movimentação da peça;
- a definição dos seus elementos lingüísticos.
A movimentação delineia:
A primeira frase de Syrinx não é formada somente pelas três notas que cons-
tituem a célula, mas também por notas que as conectam e as elaboram. Estas
outras alturas reforçam os elementos da célula e, ao mesmo tempo, acrescentam
Cada nota desta linha é elaborada por rápidas adjacências cromáticas, que
preenchem ainda mais a movimentação linear até Mi e adicionam vários interva-
los G) ao conteúdo intervalar:
iniciais e finais
d)
mov!mi:mtaçõea de passagem
e de saltos
e) notas de movimentação
de passagem
Q)eQ), e
' - V ' · LC.-LM-'-V
e Ib forma uma entidade lingüística nova e mais extensa (Exemplo 2.10): urna
escala 13 que preenche a oitava Sii,5 -Sii,4 .
segmento escslar de
""'
G>
:i>
t""
zo Exemplo 2.11- Segmento escalar e conteúdo intervalar de Syrinx, compassos 3-9
§2
o
tI1
s;:
s;:
e:
s a)
C/l
o
.,,.,
i::l '"'
a1i
l>jl .,
'lJ .,
o:!
b)'
"'
e)
,g ;i d)
--;t "';
~o.,,_,~
u .5
e)
f)
frase Ib uma interessante evolução lingüística
o movimento do registro 5 para novas áreas espaciais.
isso, a célula primária é reformulada nas novas regiões espaciais. As con-
exões e as elaborações dos membros da célula são similares aos utilizados na
frase Ia e seu conteúdo intervalar é idêntico. As novas notas de conexão, en-
tretanto, completam a formação escalar na metade inferior da oitava Si~5 -Sib4 •
No :final desta frase, com a ausência da elaboração cromática, as notas essenciais
da escala são enfatizadas e (também) possíveis transformações lingüísticas são
pressagiadas.
TRANSFORMAÇÃO LINGÜÍSTICA
eo são entre as
osso da linguagem assim como nossa
reação a compreensão dessas sutis transformações lingüísticas.
No compasso 16 (o início IIIa), os elementos lingüísticos '""''-":U"'
começam a se reconstituir: a célula primária e depois (nos compas-
sos 20-24) a estrutura escalar. Ao mesmo tempo, a movimentação reverte sua
começando uma ascensão gradual ao registro original. Este retorno à
linguagem e ao espaço original, bem como outras transformações posteriores
que ocorrem junto com este retorno, está resumido no Exemplo 2.8, frases III e
Esse gráfico, junto com a discussão precedente, tem por objetivo propiciar o
acompanhamento destes últimos desenvolvimentos. Embora a investigação de
cada novo estágio em detalhe seja fascinante, tal discussão nos distanciaria de-
mais de nosso objetivo essencial, qual seja, a introdução aos processos de defini-
ção e de transformação lingüística.
Apesar de sua brevidade, Syrinx é rica tanto por seus elementos lingüísticos
(célula, escala e conteúdo intervalar) quanto pelas transformações às quais eles
são submetidos. Não existem notas sem sentido. Cada nota participa na definição
e posteriormente na significativa transformação da linguagem. Como resultado,
esta obra constitui uma fonte extrâordinariamente valiosa para a introdução dos
elementos lingüísticos. Agora que estamos conscientes de alguns destes elemen-
tos, podemos examinar a evolução da linguagem musical até chegarmos em De-
bussy, bem como desenvolvimentos posteriores desta evolução. Esta investigação
nos conduzirá diretamente aos posicionamentos coletivos em relação à lingua-
gem, que dão origem ao que denominamos sistemas musicais.
1) todos os modos são formados por uma única coleção escalar de al-
turas (Lá, Si, Dó, Ré, Mi, Fá, Sol) que preenchem uma oitava por
graus conjuntos;
2) cada modo tem uma nota prioritária, chamada de f1nal. Nas pri-
meiras definições, somente Ré, Mi, Fá e Sol (as notas quadradas no
Exemplo 2.12, modos I-VIII) serviam como finais; Glareanus poste-
riormente acrescentou as nota Lá e Dó como finais (Exemplo 2.12,
modos IX-XII). A nota Si nunca foi utilizada como f1nal; 19
3) cada nota final dá origem a duas escalas modais, que são caracte-
rizadas por diferentes localizações espaciais das notas escalares e
da f1nal. Nos modos autênticos, a final é tanto a nota mais aguda
•u~·~~
é a uma oitava uma nota
cional de elaboração nos limites inferior e superior do modo.
acrescentados Glaureanus
2.13
modo modo
Qual é o modo de Veni creator spiritus? Quais são as notas, os intervalos e as células
intervalares prioritárias? Como essas se relacionam com o modo? Como a linguagem e o
design são integrados?
Veni creator spiritus utiliza todas as notas da coleção modal (e somente estas no-
tas): Lá, Si, Dó, Ré, Mi, Fá e Sol. As notas Dó e Sol são escutadas dez vezes em cada
estrofe, mais do que qualquer outra nota. Entretanto, qual dessas é a final? O
Exemplo 2.15a demonstra que a nota Sol inicia e termina o cântico e também que
ela é bastante enfatizada, pois recorre freqüentemente tanto no início quanto
no final do canto. Essa nota constitui também o foco de atenção das adjacências
nos movimentos de bordaduras (célula a, Exemplo 2.15a). Além disso, a nota Sol
predomina na frase Amen, que conclui o conjunto de estrofes com uma variante
rítmica do movimento original de bordaduras ao redor desta nota (veja a célula
a do Exemplo 2.15a). A nota Sol, portanto, domina o início e o final do design e,
durante o canto, constitui um ponto de referência freqüente, nivelando um platô
contra o qual o movimento ascendente e descendente resulta claramente delinea-
do. Em contraste, a nota Dó é utilizada como ponto intermediário e subordinado
da movimentação, cujos pontos de chegada são Sol e Ré. A nota Sol é claramente
a nota priorizada: todo o canto é construído a partir das relações de Sol com suas
alturas adjacentes, o que fica evidente na célula a.
Como Sol é a final, o modo pode ser tanto o modo VII (Mixolídio) ou VIII
(Hipomixolídio). O canto encaixa-se no campo espacial de qualquer um desses
modos (considerando as possíveis extensões através das notas de elaboração). O
papel de Fá - como p;rte da célula vital que circunda a nota final, Sol- é tão signi-
ficativo que é preferível considerar o modo como Hipomixolídio. A nota Fá é parte
integral desse modo e não mera extensão opcional. O modo VIII (Hipomixolídio)
t;x:en1pllo 2.14 - Canto gregoriano Veni creator spiritus (hino atribuído a Rabanus Maurus,
século IX)
A mesma música é repetida por mais seis estrofes. O Amen é cantado somente após a
última estrofe.
Observação: o ritmo do canto foi determinado seguindo cuidadosamente a notação e os
princípios da edição proposta pelos beneditinos da Abadia de Solesmes (Liber usualis, p.
885). Um apóstrofo (') indica um ponto de respiração opcional. O tempo para a respiração é
obtido através da diminuição do valor da nota anterior e não através do acréscimo de uma
pausa à música. A marca vertical ( 1 ) indica notas que devem ser sentidas como um início de
grupos rítmicos, porém sem aumentar seu valor ou causar um acento perceptível.
A célula a consiste em notas vizinhas ao redor da final. As células a 1 e a 2 são as duas únicas
transposições dentro da coleção modal que produzem a mesma configuração intervalar,
célula b
célula e e invertida
A célula c consiste na elaboração de uma nota por bordaduras. É uma maneira de utilizar o
intervalo (li, que é comum às células a e b. Ela é, portanto, uma suhcélula derivada.
Como os elementos modais de Kyrie Deus sempiterne (Exemplo 2.16) diferem daque-
les de Veni creator spiritus?
.t;xen:api.o 2.16 - Canto gregoriano Kyrie Deus sempiterne (da missa III, século XI)
eleíson"
Chris - te
Um apóstrofo (') indica um ponto de respiração opcional. O tempo para a respiração é obtido
através da dimin~ição do valor da nota anterior e não através do acréscimo de uma pausa
à música. A marca vertical ( 1 ) indica notas que devem ser sentidas como início de grupos
rítmicos, porém sem aumentar seu valor ou causar um acento perceptível.
Assim como em Veni creator spiritus, neste canto a célula primária também foi
transposta e essa transposição determinou o ápice do design. O caráter sonoro é in-
tensamente expresso·pela reprodução de uma característica primária da célula no
ápice do canto. Constatamos novamente que as relações intervalares específicas do
modo geram possibilidades singulares de elaboração da linguagem musical - pos-
sibilidades que apresentam características intervalares e expressivas consistentes.
Hxen:tpl.o 2.21- Guillaume de Machaut: Plus dure que un dyamant (virelai para voz tenor e
instrumento acompanhante)
76
+ 38%
soa 23 vezes
+
soa
soa 18 vezes 1%
3 vezes
.soa
INTERVALOS SUBORDINADOS
~~""~~à os
ao espaço, formam uma relação de grau conjunto com uma ou,
mais frequentemente, com ambas as notas as
circundam (por exemplo, o Sol no compasso 24
de grau conjunto com as notas adjacentes Lá, ao passo o
compasso 25, tem uma relação com as notas adjacentes Lá e Fá).
estes intervalos ser tanto notas vizinhas, bordaduras
ou notas de passagem.
MODAL
Como Stravinsky observou em uma das epígrafes deste capítulo, criar uma
linguagem musical significa estabelecer uma ordem entre alturas e intervalos.
Após definir a linguagem de uma obra, o compositor procura, na gama de alturas
disponíveis, os sons que podem se encaixar nessa linguagem definida. Quanto
mais sonoridades forem possíveis descobrir, maiores serão os recursos disponí-
veis para reconfirmar a qualidade sonora específica da linguagem. Por essa razão,
Machaut constrói sua linguagem principalmente com intervalos {Ql, que ocor-
rem freqüentemente na coleção rp.odal, oferecendo, portanto, oportunidades
abundantes de reconfirmação da qualidade sonora da linguagem. Machaut tira
proveito dessas oportunidades desde o início da peça (Exemplo 2.22c). Os inter-
valos predominantes podem ser também brevemente elaborados por adjacências
espaciais (como notas de passagens, bordaduras e notas vizinhas). Essas elabora-
ções ampliam a linguagem e a movimentação, porém sem ofuscar a sonoridade
predominante.
Os compositores, no entanto, vão ainda mais longe na exploração dessas
extensões lingüísticas. Em Plus dure, Machaut utiliza os intervalos e seus com-
plementares de forma equivalente. Dessa maneira, cada par - @ e @, @ e @,
@e@ - é utilizado de forma similar (conforme o Exemplo 2.25). Os Quadros
A e B demonstram a preferência geral de Machaut pelos complementos espaciais
mais amplos - @, @e@. As porcentagens de@, @e@ no Quadro B (8%, 7%
e 6%, respectivamente) seguem a mesma ordem de preferência que a apresentada
por seus complementares mais amplos. Em relação à freqüência de ocorrência, o
intervalo @ realiza a mesma função entre os intervalos menos amplos que seu
complemento@ realiza entre os mais amplos. A ordem da linguagem é então du-
plamente confirmada; pelo uso dos intervalos amplos e pela recorrência da mesma
ordem entre seus complementares espaciais mais restritos.
e das alterações
estabelecem sensíveis, novos elementos são incorporados à linguagem. Os ele-
mentos são escolhidos enfatizar e refinar - ao invés de e
cer - os aspectos primários linguagem: os intervalos predominantes e a nota
prioritária. A ordem lingüística é ampliada e reconfirmada (Plus dure é examina-
da sob outro ponto de vista no início do Capítulo 3).
Como os elementos modais desta peça podem ser comparados com as peças modais es-
tudadas anterior.mente? De que maneira a linguagem sonora é similar ou dissimilar do
virelai de Machaut? Como o design e a linguagem se inter-relacionam?
@=9
@=5
@=5
* N. T. Em sua totalidade.
numero de ocorrendas
35
25
14
11
11
Hl
lndui intervalos
inclui os intervalos
CHANSON
Existe uma célula inicial de sonoridades cujas relações são posteriormente reproduzi-
das? Qual é o modo da peça? O que é incomum nessa peça em comparação com as peças
estudadas anteriormente?
A única sonoridade presente nos compassos 1-2 é a tríade maior, que ocorre
em várias distribuições distintas. De fato, as três tríades maiores utilizadas (que
são construídas a partir de Sol, Fá e Dó) empregam todas as notas da coleção
modal e representam, nessa coleção, todas as possibilidades de formação deste
agrupamento.
O Exemplo 2.31 continua a análise da sonoridade no restante da primeira
frase (compassos 1-5). Nos compassos 4-5, ocorrem novas sonoridades (mar-
cadas por um Q)). Cada uma destas sonoridades resulta da elaboração de uma
tríade maior:
2.32 -A célula dos compassos 1-2 e suas reproduções nos compassos 3-5
li
Um aspecto est)ec1aln
estabelece um contorno de
célula que elabora Mi 5 no soprano), o design "''''~'"~'""'-·"-,_ aes(:eIJLue
linhas para o ponto mais grave (as que
A seguir, a célula da última frase (compassos 23-31) a célula
descendendo 4
fim até Si~ , o de origem da peça (Exemplo 2.33).
Cada evento da peça se origina a da sonoridade e gesto melódi-
co da célula Esses gestos são continuamente reapresentados, deslocados
ou elaborados. A presença da célula assegura a unidade da linguagem da peça e
sua distribuição linear garante a unidade de design e clareza de movimentação.
A célula incorpora os recursos das tríades maiores disponíveis na coleção "''"''-'-"'·'·
Por meio alterações, a célula é construída a partir de cada uma das notas da
coleção modal. Então, em última instância, os recursos disponíveis no sistema
modal para a reprodução dessa célula são completamente explorados e esgotados.
Durante essa exploração, a sonoridade da célula é continuamente amplificada e
reconfirmada durante a peça.
ainda um assunto a ser discutido: o modo da peça. Como acabamos de
constatar, a peça se origina de relações inerentes à coleção modal. Apesar das al-
terações, as notas da coleção modal são nitidamente dominantes na linguagem.
Mesmo quando as alterações estão presentes, a sonoridade predominante da tría-
de maior é construída somente a partir de notas que pertencem à coleção modal.
Ainda assim, a questão do modo, em uma peça que apresenta freqüentemente di-
versas vozes simultâneas, não é fácil de ser solucionada. Esta chanson se origina
não a partir de uma única nota prioritária, mas sim de uma sonoridade que contém
várias notas. A sonoridade prioritária é clara. Essa sonoridade é a tríade maior e,
posteriormente, a tríade construída na nota Sol. Esta tríade está presente no início
e no final da célula inicial em toda a peça: não menos do que seis apresentações da
célula (nos compassos 1-2, 6-7, 11-12, 17-20 e 28-30) enfatizam e elaboram esta
tríade, muito mais do que qualquer outra. Porém, a nota Si ocorre repetidamente
na voz soprano da célula; por conseguinte, é fortemente enfatizada na elaboração
linear. Será então Si a nota final? Ou a nota Sol? alguma outra nota?
A nota Sol é a escolha mais convincente. Essa é a nota enfatizada pelo baixo
(e dobrada em cada uma das tríades de Sol maior) e, em vários pontos cruciais,
é precedida pela sensível Fá# (compassos 5-6, 10-12, 24-25, 27-28 e 30-31). Des-
cobrimos que, durante o período modal, a utilização de uma sensível - obtida
através da alteração de uma das notas da coleção - era um procedimento
lizado para enfatizar a nota final. Esta importante função da nota Fá# remete
à terceira apresentação da célula (compasso 4-5), na qual essa alteração ocorre
pela primeira vez. Anteriormente, ponderamos que alguma variação se fazia ne-
cessária neste ponto da peça. Podemos compreender agora por que esta variação
Em uma obra como Bon jour, mon couer, os limites do sistema são alcançados.
A profusão de notas cromáticas pode obscurecer a coleção modal, assim como as
características intervalares dos modos. A profusão de vozes sugere quase neces-
sariamente uma multiplicidade de modos soando simultaneamente. Este tipo de
composição exigia uma nova formulação teórica que incorporasse as notas cro-
máticas, bem como as sonoridades formadas pelas múltiplas vozes. Bon jour, mon
couer foi parte de uma experiência composicional que estabeleceu os alicerces
para o sistema tonal que viria a seguir.
Notamos anteriormente que uma obra musical deve ser consistente e lógica.
Uma obra que atinge esses requisitos constitui uma entidade artística por si só e
apresenta bases sólidas a partir das quais podem ser feitas generalizações siste-
máticas. Bon jour, mon couer se encaixa nessa descrição. Elegante em seu design de
linguagem, ela sugere muitas novas possibilidades lingüísticas. Assim como Veni
creator spiritus, esta chanson de Lassus encontrou ressonâncias no decorrer da
série em como
tríade maior. Os parciais 1-6 dessa série formam uma tríade ....A"~~.
te espaçada. Dentro série harmônica, os sons triádicos são
proporções matemáticas (2:3 e 4:5) que eram consideradas simples que as
razões das combinações não-triádicas. Por causa dessas duas razões, a tríade
considerada um "acorde da natureza" e conclusões abrangentes fato,
praticamente imperativos morais) foram concebidas teoristas como Rameau,
26
Schenker e Hindemith.
Análises psicofísicas do som realizadas durante os últimos cem anos trou-
xeram à tona novos posicionamentos sobre estes fenômenos. da mera
especulação sobre os sons harmônicos, tornou-se possível, no século XX,
ficá-los: discernir quais parciais estão presentes em um som, e em que quantida-
de. Tornou-se também possível medir precisamente a dimensão dos intervalos e,
conseguinte, verificar se estes são de fato determinados por razões "simples"
ou mais "complexas". Os resultados dessa análise do som, ainda em andamento,
são apresentados em várias partes do livro (especialmente no Apêndice B e no
Capítulo 4). Diversos pontos emergem claramente desta análise:
iixen1pJ,o 2.35 - Todas as combinações possíveis de três notas que usam a coleção modal;
as demais são redistribuições da mesma
SISTEMA TONAL
INTRODUÇÃO
TONALIDADE
COLEÇÃO TONAL
A mesma coleção modal de notas que serve de base para o sistema un,~<U
forma o alicerce do sistema tonal. Entretanto:
estrutura
intervalar
b)
Em todos os modos, exceto o Jônico e Eólio (a escala maior e menor), as tríades que se
relacionam com a nota final por quintas não concordam em sonoridade com a tríade da final.
Portanto, estes outros modos não apresentam uma única sonoridade característica que seja
reconfirmada por todas as tríades primárias.
Vll
.l
[2
[3
[4
Is l
A distância relativa de qualquer tríade da tônica I, medida pelo número de conexões de quintas
necessárias para alcançar I.
J,
1
l
1
1
1
l
Sem conexão por
1
1
1
1
cadeia de tr.iades sec•.mdárlas em direção dominante cadeia de triades sec1mdárlas sendo conduzidas à -
IV
com:lu!ndo na tôf!lca
-função;
- distância;
- tensão (entropia) e resolução.
Qual é a movimentação espacial dos compassos 1-13? Entre quais graus da tonalidade
flui a voz solo? Esse fluxo é coordenado com a movimentação das linhas do acompa-
nhamento e com a progressão harmônica? A movimentação espacial contribui para a
definição da tonalidade?
[...] a melodia surge da harmonia; por conseguinte, é a harmonia que nos guia, não a me-
lodia; a harmonia, portanto, é gerada inicialmente e é de acordo com ela que devemos
necessariamente derivar nossas regras de melodia. Estaremos naturalmente fazendo
isso ao selecionar os intervalos harmônicos, discutidos anteriormente, que se formam
a partir da progressão fundamental. Embora o resultado ainda não constitua uma me-
lodia, ao seguirmos o curso diatónico natural delineado pelas próprias progressões, na
medida em que estas se apóiam reciprocamente, extraímos de suas consonâncias e pro-
gressões diatônicas toda a melodia de que necessitamos. 37
9-13: 5- 4- 3- 2-1
as
- a voz
-a voz
baixo combina essa função com seu papel linear mais relevante de apoio na
movimentação dos limites inferiores. A reconciliação dessas diversas funções
à voz do baixo uma estrutura complexa que consiste, de fato, em duas
linhas cujos movimentos descendentes são paralelos entre e com a linha da
voz solo (Exemplo 2.45b). A linha mais grave é especialmente - ela é o
baixo do baixo, por força de expressão - e apresenta as dos pontos
harmônicos principais.
I (V) IV V I
compassos 1-5 8 12 13 (veja o Exemplo 2.45b)
Seu fluxo linear abrange uma quinta descendente entre relações primárias (I-IV),
assim como a voz solo, que apresenta uma movimentação linear 5-i Ao descender
para IV, o baixo é posicionado de maneira a formar a cadência da canção com as
harmonias primárias (IV-V-1, compassos 11-13). O baixo unifica as funções har-
mônicas e lineares: as fundamentais das harmonias tonais primárias são enfa-
tizadas em seus pontos finais. Durante o curso da movimentação, as fundamen-
tais são incorporadas em um fluxo linear que conduz às harmonias primárias.
.l:lx:en1p110 2.46 - Compassos 9-12 recompostos como repetições dos compassos 5-8
Não pretendemos cobrir cada detalhe do sistema tonal, mas sim esclarecer
os princípios essenciais que o embasam. No Apêndice D, são mostrados alguns
procedimentos específicos para ampliar as operações lineares e harmônicas:
Esta é uma das passagens que marcaram época na história musical. Sua importância
não reside em suas maravilhosas modulações enarmônicas [...] Sem o baixo ascendente,
seu propósito seria o de meramente surpreender e não o de construir. Porém, com o baixo
ascendente e com recursos semelhantes, toda a arte da tonalidade se expande [...]40 [grifo
nosso]
Foi essa crescente consciência das funções lineares que Schenker sistematizou
em suas revisões do pensamento musical tonal.
N N
ré Ré
menor
Um aspecto a canção a
do conteúdo As linhas e progressões to-
nais inicialmente apresentadas são cada vez seção
seqüente. Cada novo desdobramento uma nova inflexão tonal e, como
resultado desses desdobramentos, as funções primárias
das. A análise nos 2.49 a 2.51 revela esta rede
A discussão, a seguir, se a esses relacionamentos.
Na introdução (Exemplo 2.49), duas irradiam-se simulta-
dominante
a1, descendente SR
A
4A
A
3
A
2
A
1
a2 , ascendente 5 6 7 8 c8=i)
I encaminhando-se para~ V I
piano
- os ~L.caVLWCUL
eia no
}
Em todos os casos, assim que a tônica é alcançada, imediatamente ocorre urna
reiteração do grau 5(através da mudança de registro, corno no elemento x). Como
nas outras seções, a última apresentação da seção II conduz a linha vocal em di-
reção à tônica - 5-4·3-2 ... - porém não a atinge. A linha vocal acaba na nota Sii,
(5) que anteriormente era sempre sucedida por um movimento descendente para
Mii,cl) (compassos 79-80). O retorno ao grau 5, que ocorreu~,,.,~~~,
ao final de cada seção precedente no piano, através
- Versão de Diabolus para a seção II, compassos 68-74, de Du bist die ruh
Diabolus: versão a
Diabolus: versão b
iix~emplo 2.53
* N. T. No original, leading through. Na mesma frase, leading through também foi traduzido como "con-
duzir".
COLEÇÕES SIMÉTRICAS
A escala de tons inteiros (Exemplo 2.54) forma uma coleção simétrica. To-
mando por ponto de partida qualquer uma de suas seis diferentes notas, a mesma
coleção - Dó, Ré, Mi, Fá#, Sol#, Lá# - produz o mesmo ordenamento de interva-
los: uma sucessão de intervalos C~\
Esclareçamos imediatamente a conexão entre a simetria da coleção e sua
ambigüidade. Na medida em que a coleção é formada pela reprodução exata de
uma única célula intervalar (nesse caso, o intervalo C~)), o mesmo ambiente inter-
valar ocorre em diversos níveis da coleção. De fato, na coleção de tons inteiros,
de seus três níveis possíveis. Uma segunda célula, a célula h - um salto (5) (Dó-
-Fá) que aos poucos é preenchido - também é reproduzida em um segundo nível.
O preenchimento da célula h revela que esta é uma expansão da célula a, com o
intervalo Dó-Mib sendo ampliado para Dó-Fá.
Cada vez que a célula é transportada para outro nível, o sentido tonal é
enriquecido em ambigüidade. Por exemplo, durante os compassos 1-8 a célula a é
apresentada em dois níveis:
Portanto, ao término da quinta e última frase, um espaço de duas oitavas (Fá# 3 -Fá#5 )
foi aberto e completamente preenchido por reproduções da célula.
Dessa forma, a coleção escalar de Mãos cruzadas fornece:
- as células da peça;
- os níveis para os quais estas se movem;
- as ênfases polares resultantes;
- os meios para expansão e preenchimento do design espacial.
Copirraite (1940) Hawkes & Son (London) Ltda, renovados em 1967. Reimpresso com permissão de Boosey &
Hawkes, lnc.
O nível original da célula é sempre distinguido por dinâmicas mais fortes e (no grá'(7.co) por
linhas mais escuras. Esse nível sempre é executado pela mão direita, ao passo que o segundo e
o terceiro níveis são executados mais suavemente pela mão esquerda. Cada nível celular ocorre
em dois registros distintos (exceto o terceiro nível da célula a). O ordenamento e o ritmo das
notas da célula são enormemente variados; as notas externas da célula são ocasionalmente
elaboradas por vizinhos adjacentes ou por bordaduras.
(@ ~ 8)
@~ 4
® ~ 4
@ ~ 8
©~ 4
(@ ~ 4
@ ~ 4
@@ 15 2
®@ 3 o
1@© 45 26 1
©@ 19 3
(@ (D 6 o
@ 16 8
'
1
250 A LINGUAGEM MUSICAL
1
u~.uu~ tentamos com os outros 49
invés
correrem a esses intervalos voltam à sua nota
origem, portanto, embora os intervalos (exceto(§)) estejam igualmente dis-
poníveis na coleção, (f: e (~) (e suas expansões espaciais) são especialmente mó-
veis: estes intervalos favorecem a movimentação fluída pela coleção. Isso explica
a preocupação (começando com Wagner e Schoenberg) com o intervalo
(1): era um novo intervalo estrutural com a característica especial de percorrer
toda a coleção cromática de doze notas e de vincular todos seus membros; em
conseqüência, ele enormemente a composição com doze notas.
Como a coleção de doze notas é distribuída na peça? Qual célula intervalar é proeminen-
temente obtida a partir da coleção e ricamente recriada?
Fá#-Sol } piano,
registro 3
Sol#-Sol nas cores. de dois registros
registros 2 e 3
distintos;
toque legato
2.66
- saltos de registro;
- instrumentação e cor tonal diferente;
- interrupções no fluxo temporal (pausas).
O resultado dessa diferenciação é a união das notas dos intervalos Wem células
homogêneas e perceptíveis e a quebra de todos os outros intervalos em notas se-
paradas. Os intervalos atomizados (ou seja, aqueles que não são o intervalo W)
introduzem incerteza - ou entropia - na linguagem musical da peça e a entropia
é sempre resolvida pela próxima célula Q).
Reproduzidos nos seis diferentes níveis possíveis, os intervalos W consti-
tuem as células essenciais da peça. A coleção dodecafônica da melodia completa é
explorada de acordo com sua capacidade de fornecer reproduções dessas células.
Dessa forma, a célula Wpode se manifestar em novas notas. A brevidade da peça
não reduz a quantidade de reproduções da célula ou sua variação e movimentação.
Ao contrário, esta peça é um vívido exemplo de produção de novas formas celula-
res e de sua transformação em relação a espaço, ritmo e cor tonal. Nela, algumas
dessas transformações se fundem, originando um design espacial de longo alcance.
De fato, a peça é ainda mais rica do que indicamos, na medida em que omi-
timos da discussão as três simultaneidades do piano. O Exemplo 2.66 revela que
cada simultaneidade do piano também incorpora ao menos um intervalo (D.
Além disso, os pares de notas destes intervalos (D repetem em eco ou antecipam
os intervalos W produzidos pelo cello. Estes intervalos são então reproduzidos
nos intervalos IDdas simultaneidades do piano, resultando em nova transforma-
ção da célula básica W- de ocorrências sucessivas para ocorrências simultâneas.
Fá Lã Ré
Sl
Sol., U1,
um e os recursos e
amplos da coleção de doze notas. estas explorações
.._o__uu.v
PARA OP. 27
Hx,emplo 2.68*
A série em sua forma original (ou prima - P) está disposta horizontalmente, da esquerda para
a direita; os retrógrados (R) estão dispostos horizontalmente, da direita para a esquerda;
as inversões (I), verticalmente, de cima para baixo, e os retrógrados das inversões (RI),
verticalmente, de baixo para cima. As doze colunas, horizontal e verticalmente, apresentam
todas as transposições de cada forma. Os números à esquerda mostram a distância (medidas
em semitons ascendentes) de cada transposição de P e R da série original (PO e RO). De maneira
análoga, os números no topo mostram a distância das transposições de I e RI de IO e RIO.
* N. T. Para facilitar a visualização desse exemplo específico, optamos pela manutenção da grafia original.
PRIMEIRO MOVIMENTO
Quais formas da série ocorrem nos compassos 1- 7? Como estão distribuídas? Quais são
as células intervalares presentes na música?
Cada nota do hexacarde 1 relaciona-se com uma nota do hexacarde 2 por um in-
tervalo @. A superposição dos dois hexacardes apresenta, portanto, um grande
potencial de gerar intervalos($). Essa superposição de hexacardes ocorre quando
as formas P e R da série são justapostas (Exemplo 2.70). Quatro intervalos C§)
diferentes são produzidos (e cada um recorre somente uma vez); um intervalo @
está presente em cada célula. Os intervalos @ocorrem inevitavelmente em uma
célula@+©:
AMPLIFICAÇÃO CELULAR
e)
* N. T. No original, forward-retrograde.
- na primeira frase;
- na segunda frase, construídas a partir dos mesmos intervalo (~)
primeira;
- na quarta frase (como no compasso 19), que acrescenta novos
valos(§).
Quais formas da série ocorrem nos compassos 1-6? Existe uma superposição con-
sistente de formas da série neste movimento? Como os intervalos e agrupamentos
intervalares deste movimento são derivados da série?
o grupo de intervalos
(Q) (~;)
(Exemplo 2.47b)
ou
SehrsdmeH
Lá
Lá Si
S1
Fá
b)
classe
intervalar
par de nota
e)
A SÉRIE NO ESPAÇO
r."'·"""""''"' 2.75 -
Inversões da série formando campos simétricos ao redor da nota Lá4 nas
Variações para piano, segundo movimento
0 TERCEIRO MOVIMENTO
Quais formas da série estão presentes nos compassos 1-12? Qual célula é amplificada?
Como a célula se relaciona com a série? Como são as células dos compassos 5-9 em com-
paração com as células dos compassos 1-5 e 9-12?
célula Q) é, pois, amplificada doze vezes, produzindo todos os intervalos (1) dis-
poníveis na coleção dodecafô nica.
A amplificação do intervalo Q) predominante da série atinge, portanto, seu
ponto máximo no último movimento. Existe, pois, uma razão clara para a esco-
lha das sucessões da série e para a maneira como as notas das duas séries estão
agrupadas: a apresentação do intervalo predominante da série, C)) em todas suas
formas possíveis.
Resumindo: tanto intrinsecamente quanto em combinação, a série forne-
ce meios de enfatizar e amplificar os recursos intervalares da coleção dodecafô-
nica. Nas Variações, a série apresenta um núcleo fundamental de relacionamen-
tos. Suas diversas facetas são refletidas de maneira distinta em cada um dos três
movimentos. A obra não amplifica somente as características mais óbvias da série.
A célula por exemplo, é sugerida somente uma vez - no centro da série original:
Sol Si
Copirraite (1937) Universal Edition. Utilizado com permissão do editor Theodore Presser Company, único repre-
sentante nos Estados Unidos, Canadá e México.
cél.ula:
J
-.·-···-···-······-·-·..
.~ ~~~l
b)
contralto
tenor
Mi Si[,
:·3-·" :·3-·"
....... )
\ .. J
Sol Dó#
(j_", <I!
'' .. ~'
Láb Ré
a)
plano
* N. T. No original, all-combinatorial.
--, '
' l
1
' 1
~-J L
2.82 - Uma série dividida em cinco células, que são multiplicadas pela célula CD
APEL, WILLL Gregorian Chant. Bloomington, Ind: Indiana University Press, 1958.
*FUX, J. J. The Study of Counterpoint. ed. e trad. por A. Mann. New York: Norton, 1965.
*ZARLINO, GIOSEFFO. The Art of Counterpoint. trad. por G. Garco e C. Palisca. New Haven:
Yale University Press, 1968.
0 SISTEMA TONAL
*BACH, C. P. E. Essay on the True Art of Playing Keyboard Instruments. ed. e trad. por W. J. Mi-
tchell. New York: Norton, 1949.
1962.
H. C Versuch einer Anleitung zur Composition. Leipzig, 1782-93.
SISTEMAS DO SÉCULO XX
BABITT, MILTON. Some Aspects of Twelve-Tone Composition. The Score, n. 12, p. 55-61,
1955.
BOULEZ, PIERRE. Boulez on Music Today. Cambridge: Harvard University Press, 1971.
BRINDLE, REGINALD SMITH. Serial Music. London: Oxford University Press, 1966.
CARTER, ELLIOTT. Shop Talk by an American Composer. Problems of Modem Music. ed. P. H.
Lang. New York: Norton, 1960.
LEIBOWITZ, RENE. Schoenberg and His School. New York: Philosofical Library, 1949.
LIGETI, GYORGI. Pierre Boulez: Decision and Automatism in Structure Ia. Die Reihe, v. 4, p.
36-62. •
XENAKIS, IANNIS. Formalized Music. Bloomington, Ind.: Indiana University Press, 1971.
Darmstadter Beitrage zur Neuen Musik (a maioria dos artigos estão em alemão)
Gravesaner Bléitter (em diversas línguas; todos os artigos traduzidos para o inglês)
Music Forum
Source
NOTAS
1. Citado por Edgar Varese em "The Liberation of Sound" em Contemporary Composers on Contemporary
Music (ed. E. Schwartz e B. Childs - New York: Holt, Rinehart & Winston, 1967, p. 196).
2. Hermann von Helmholtz em On the Sensations of Tone (quarta edição alemã de 1877, tradução A.
Ellis (New York: Dover, 1954, p. 235).
3. Igor Stravinsky em Poetics of Music (tradução A. Knodel e I. Dahl - Cambridge: Harvard University
Press, 194 7, p. 37).
4. Noam Chomsky em Aspects of the Theory of Syntax (Cambridge: MIT Press, 1965, p. 6).
5. Ibid. Não é de se surpreender que Chomsky mencione a forte tradição francesa deste pensamento,
estendendo-se de 1660 (Lancelot) a 1751 (Diderot) - período contemporâneo à vida de Rameau.
Estes quatro sons cruciais são objetivos de todas as movimentações lineares da peça, conforme ob-
servamos no Capítulo 1. Sua conjunção dá origem ao design e à linguagem de sonoridades da peça.
26. A série harmônica ou de parciais é discutida no Apêndice B. Teorias de consonância e dissonância de-
rivadas dessa série são discutidas nesse apêndice na seção "A teoria de consonâncias e dissonâncias
segundo as razões intervalares".
27. Os músicos devem muito a Milton Babbitt por suas análises matemáticas dos recursos oferecidas
pelas coleções de alturas.
28. Citado em Strunk, op. cit., p. 205.
29. Ibid., p. 209.
30. Elaborações das tríades e sua extensão em acordes de sétima são discutidas no Apêndice D.
31. Strunk, op. cit., p. 205.
32. Na análise tonal, os numerais romanos referem-se à fundamental de urna tríade, especificamente à
posição da fundamental na escala tonal. Em Dó maior, por exemplo, a nota Dó é I (quando esta é a
fundamental da tríade). Em Lá menor, a nota Dó como fundamental é III (a terceira nota da escala
de Lá menor).
35. Consulte Villiarn Mitchell em Elementary Harmony (New York: Prentice Hall, 1939, p. 59-73) ou
Roger Sessions em Harmonic Practice (New York: Harcourt, Brace, 1951, p. 73).
36. Veja o Apêndice D, seção "Acordes de sétima".
37. Citado em Strunk, op. cit., p. 210-11.
38. Numerais arábicos com um acento circunflexo(") referem-se aos graus de escala em uma movimen-
tação linear tonal importante: em Sol maior, i é Sol, Sé Ré e assim por diante.
39. Os leitores que não estejam familiarizados com estas técnicas de extensão devem consultar o Apên-
dice D antes de continuar a leitura do texto.
40. Donald E Tovey em The Forms of Music (Cleveland: Meridian, 1956, p. 219).
41. Donald E Tovey emA Companion to Beethoven's Pianoforte Sonatas (London: Associated Board, 1931,
p. 5)
42. Donald E Tovey em The Mainstream of Music (Cleveland: Meridian, 1959, p. 14).
43. A natureza e a importância da arnbigüidade estrutural foram sugeridas no Capítulo 1, Considerações
culturais e históricas. A Figura 3 demonstra que a ambigüidade estrutural não pode ser associada
à falta de clareza: simplesmente não existe uma única resolução para as implicações espaciais bi-
direcionais de seu painel central. Ao contrário, o design depende da presença da ambigüidade. De
forma análoga, existem equações matemáticas cujos termos são resolvidos por vários números (por
exemplo, por diferentes pares de números). Essas equações não são de forma alguma equivocadas
ou aleatórias. Elas não são resolvidas por qualquer número; simplesmente admitem mais do que uma
resolução. Na literatura, o início da ambigüidade estrutural foi brilhantemente anunciado por Edgar
Allan Poe; este fato demarcou o limite entre a literatura romântica e a literatura contemporânea. No
âmbito da literatura popular, a ambigüidade estrutural manifestou-se no surgimento do romance
de ambigüidade, ou seja, o mistério. Existiram, entretanto, manifestações ainda muito mais profun-
das. Um marco da crítica contemporânea é o livro de William Empsoms, Seven Types of Ambiguity
(New York: New Directions, 1930), uma análise exaustiva da ambigüidade literária. Pirandello deu
à ambigüidade forma dramática e presença. Por cristalizarem a ambigüidade, Joyce, Kafka e Borges
("ambigüidade é riqueza") são epítomes. O homem comum freqüentemente não tem consciência do
quanto a ambigüidade estrutural permeia as noções atuais também nas ciências físicas. Na física, a
Onde ocorrem pausas no f7-uxo temporal da atividade da peça? Onde ocorrem as pausas
no texto poético? Qual a duração das frases, em número de compassos, e que papel as
pausas exercem nesta delimitação? Qual é a relação entre a duração da frase musical e
a de seu texto?
estrofe I
frase 1 = compassos 1-4 = 4 compassos
frase 2 =compassos 5-10 = 6 compassos
frase 3 = compassos 11-16 = 6 compassos
frase 4 =compassos 17-22 = 6 compassos
estrofe II
frase 5 =compassos 23-26 = 4 compassos
frase 6 =compassos 27-32 = 6 compassos
As dimensões desta peça são formadas por uma sucessão de frases que duram
quatro ou seis compassos. Cada estrofe contém uma frase introdutória de quatro
compassos sucedida por uma ou mais frases de seis compassos.
Existe uma eo
-a
relações no
através:
texto, tanto
ocorrência nos
linguagem e
específicos;
- de pausas no fluxo
durações frase específica e
Quais são as seções e quais suas durações? Existe mais de uma maneira de conceber as
seções da peça?
Existe um nível rítmico mais elevado (isto é, mais amplo e mais extenso)
que a frase: a seção. No virelai de Machaut, existem duas maneiras de conceber as
dimensões seccionais de larga escala (Exemplo 3.1), ambas simétricas. Iniciare-
mos pela subdivisão seccional mais óbvia, apresentada no início do Exemplo 3.1.
Nos compassos 22 e 32 (segunda finalização), as barras duplas indicam conclu-
sões. As seções demarcadas são definidas pela substância musical e pela estrutu-
ra poética:
- ambas as vozes chegam ao intervalo cadencial de oitava e na nota
Ré do Dórico);
Apesar do nosso plano de estudo partir dos níveis rítmicos mais elevados
(seções e frases), precisamos examinar agora um nível inferior de atividade rítmi-
ca. Durante o período imediatamente anterior ao de Machaut, os detalhes rítmi-
cos eram criados pela repetição contínua de pequenos módulos conhecidos como
modos rítmicos. Os principais modos originais eram:
1) d j
2) jd
3) J jd
4) j d J
Esta ênfase é utilizada novamente para unir palavras de sons similares, cujos sig-
nificados cristalizam o conflito fundamental do poema: o amor duro como uma
pedra. No compasso 11, outra palavra de som similar, dame ("dama"), é enfati-
zada pela inversão do módulo. Essa palavra é, sem dúvida aquela que liga todas
as palavras precedentes! (Este processo é repetido na palavra amant - "amante"
- nos compassos 15-16).
A atividade rítmica total é igual à atividade de uma voz individual? Como certos pontos
de pulsações são mais enfatizados do que outros? Como os pontos de ênfase estão distri-
buídos no tempo? Dentre as diversas durações de notas, qual é a mais freqüente? Que
padrões de atividade rítmica recorrem no ritmo total? E nas vozes individuais?
IJ J J
ij J IJ J J J
J J
J
~~~
~'-
1 rr 1 r. r r r r rrr r
li
IJ
-
4
-
li rr r
- 1
i
-··
i r ir ir 1 rr r r li ii l
i i 1 li
PULSOS E IMPULSOS
50
30
d
A preponderância da é tão marcante no total na atividade das
vozes individuais. A partir som, ocorrem ataques em 94 das 111
divisões de ddo Amen:
1 J J J
i
IJ JJ
j
l:ixemp!o 3.7
módulo normal
j j i í i
1
1
1
1
---==--=--=~--~=~=---w-~
Dessa maneira, os compassos são definidos não somente por seus acentos
iniciais e suas durações recorrentes, mas também por sua atividade interna. Cada
compasso menor (~) constitui um módulo característico que integra o módulo
frase
!sorrítmlca,
talea III
~ módulo pequemo de
módulo pequeno de "normalidade"
módulo pequeno de
\_J módulo
~ variante do módulo
oco!Te no úl.t.imo
total
de módulos
dlm . e
3.10
módulo 1 dim.
RESUMO
Existem, tanto quanto entendo, dois fatores principais que devem ser distinguidos nes-
te planejamento. Um deles se manifesta nos motivos rítmicos angulares e nervosos e
que se atritam em alternações regulares de unidades métricas desiguais de acento em
acento [...] O outro fator reside no ordenamento superior das unidades e linhas métricas
em um complexo sistema de simetrias. Neste nível, a conexão da música com a arqui-
tetura e com outras manifestações artísticas de menor relevância do período torna-se
imperativa. Através de outros meios, a música demonstra a mesma atitude básica em
relação à complexa simetria de elementos por si só assimétricos [...]1°
A diferença entre j e j ~
'"--
A diferença entre CJ) e 'f·
é geralmente percebida. é geralmente imperceptível.
) =um oitavo de j (12,5%) ) = um doze avos de j (8,33%)
~a--'
360) a uma
duração básica J= MM 360, durações tão rápidas quanto = MM 2880 são per-
ceptíveis. Na percepção de durações, o contexto é fundamental.
Ainda não foi conclusivamente estabelecido se o mesmo princípio e válido
(ou inválido) para durações longas, além do limite de dois segundos estudado por
Creelman. Caso o mesmo princípio seja válido também para durações longas, a
diferença entre as seções de trinta e dois e trinta quatro compassos do Plus dure
de Machaut (Exemplos 3.1e3.2) é imperceptível, na medida em que esta diferen-
ça é de somente 9% (menos que os 10% geralmente perceptíveis). As seções são,
portanto, percebidas como iguais e simétricas em duração absoluta assim como
no número de suas frases.
O princípio de Creelman estabelece um padrão para a percepção de igual-
dades e desigualdades temporais - do mais breve pulsar às mais amplas dimen-
sões temporais. Esse princípio mostra a importância do contexto, responsável por
estabelecer o padrão a partir do qual igualdade e desigualdade são percebidas.
Quando o contexto de durações é estabelecido por j = 30, o acréscimo de
~3-'
~ = 360
não é perceptível. Esta duração menor pode, contudo, estabelecer um novo con-
texto, no qual ela própria estabeleça a escala a partir da qual as outras durações
serão percebidas. Portanto, as relações temporais (bem como as relações de altu-
ra) são, em última instância, avaliadas contextualmente.
Este princípio também explica os ínfimos desvios da regularidade metronô-
mica. Execuções, cujas pulsações são percebidas como regulares e iguais, freqüen-
temente estão longe de serem perfeitamente regulares se comparadas com um
padrão metronômico. Quando o desvio é de menos de 10%, não seriam normal-
mente perceptíveis sem o auxílio de um padrão metronômico. Devemos levar em
conta que nos referimos aqui aos desvios imperceptíveis da regularidade absoluta,
não aos desvios mais grosseiros e perceptíveis que ocorrem freqüentemente na
execução musical.
As implicações das formulações de Creelman são enormes e abrangem tan-
to os níveis mais elevados quanto os mais imediatos do fenômeno musical e tem-
poral. Espera-se que suas implicações sejam alvo de pesquisas mais abrangentes,
tanto na dimensão p~icofísica quanto na dimensão musical.
A psicofísica também revela uma relação entre a duração e a percepção das
alturas. A duração mínima necessária para a percepção de uma altura é, em mé-
dia, 0,013 segundo. Em durações mais breves, escuta-se um estalo sem altura
valor duração M
~7
~3-'
~ (0,0833 segundos) 720 (12 X 60)
~~ ~3-'
ti (0,0414 segundos) 1440 (24 X 60)
128 cps
0,09 segundos ~ 0,125 segundos altura
(aprox. Dó 3)
~7
~3-'
0,0833 segundos estalo
Quais são as frases de Veni creator spiritus? De que maneira cada uma é defmida pelo
conteúdo musical e pela notação? Quais são seus módulos? Como esses se relacionam
com a evolução do espaço e da linguagem do canto? Qual é a função da pausa? Como o
Amen se relaciona ritmicamente com o resto do canto? Por que esta seção é necessária
para a música?
frases
- duas frases, de vinte e dois e vinte e seis J\
respectivamente;
- cada frase assume metade da movimentação espacial-lingüística da
peça e conduz a um objetivo estrutural (Sol para Ré e Ré para Sol) - o
que Guido chama de "um ponto conveniente para a respiração";
- na primeira frase, a presença de uma pausa e o objetivo espacial-
-lingüístico (a nota Ré) indicam claramente que a frase termina nes-
te ponto;
- embora a segunda frase seja ligeiramente mais longa do que a pri-
meira, seu papel na estrutura espacial e lingüística é o de equalizar
e equilibrar (a variação é proporcional quando os módulos e frases,
moderadamente variados entre si, continuam a se equilibrar através
de alguma forma de semelhança).
módulos breves
- cada estágio da movimentação linear ocorre em um módulo breve
(veja o Exemplo 2.12). Os módulos breves são caracterizados por
uma duração de sete} (como nas bordaduras sobre Sol e Ré na pri-
meira frase), embora em alguns casos sejam contraídos ou amplia-
dos em uma};
- na segunda frase, cada nota da movimentação descendente (Ré-Dó-
-Si-Lá-Sol) tem a duração de um módulo, ou seja, sete} (ou suava-
riante condensada, seis}); cada módulo inicia com uma ênfase em
sua nota linear específica: Ré-Mi, Dó-Ré, Si-Dó, Lá-Si;
- os módulos de sete } do Amen são necessários para completar esta
progressão em direção à nota Sol: ao iniciar pelas notas Sol-Lá e ela-
borar a nota Sol por sete }, a seqüência dos módulos breves em dire-
ção à nota final é completada (a elaboração da nota Sol durante sete
)l é obtida pelo módulo inicial, quando o hino repete outra estrofe
do texto).
frases
módulos breves
Sol
líxen:1pJ.o 3.13 - Número de notas por sílaba em cada um dos sete módulos e no Amen
módulo
breve
* N. T. Este termo não consta no original. Entretanto, nós o incluímos aqui por ser muito utilizado no Brasil.
de ataques
conter todos esses módulos, que são cruciais de diversas maneiras para
a atividade rítmica da peça, este compasso também funciona como parte do mó-
amplo ~.· Através desta superposição de módulos, um evento rítmico muito
rico - que apresenta diversas associações rítmicas no Amen - foi formado em
um único compasso. Como os módulos são superpostos e vinculados, não ocorre
interrupção em seu fluxo. Os módulos se desdobram dentro do fluxo temporal.
As frases, assim como os módulos, compreendem durações que podem ser
semelhantes. A diferença entre uma frase e um módulo reside na maneira
separam ou articulam o fluxo musical. Uma frase conclui com algum tipo
de interrupção, pausa ou ponto de respiração. Tais interrupções não são meramente
rítmicas. O final de uma frase também é responsável pela coordenação entre os
objetivos espaciais e lingüísticos. Uma frase completa um estágio de uma movimen-
tação. O início de nova frase marca o início de nova evolução do design e/ou da
linguagem, assim como de atividade temporal.
Existem outras maneiras de criar a sensação de interrupção no fluxo tem-
poral, ou seja, existem diversas maneiras de terminar uma frase:
Os finais de seções não são diferentes em gênero dos finais de frases. En-
tretanto, estas finalizações são mais fortes, extensas e nitidamente definidas.
Espaço, linguagem, cor e ritmo unem-se para delinear a conclusão de uma seção
e o início de outra. Com freqüência, duas técnicas de interrupção do fluxo (por
exemplo, a interrupção de uma movimentação e o início de uma nova atividade)
são utilizadas em conjunto.
Exemplo 3.14 - Ludwig van Beethoven: Sonata para violoncelo e piano, op. 69, terceiro mo-
vimento, compassos 9-27
Este problema não é de maneira alguma novo. No século XI, Guido d'Arezzo de-
monstrava já estar ciente disso:
A respeito destes elementos musicais, pode-se perceber que: o módulo, em sua totalida-
de, deve ser comprimido, tanto em sua notação quanto em sua execução e a sílaba mais
ainda. O sinal para estas divisões é o prolongamento do último som. No último som de
uma sílaba, a prolongação é insignificante; no final do módulo, ela é maior e, no final de
uma frase, ocorre com a maior intensidade. 17
O grau de separação (para Guido, isso ocorria por uma nota prolongada) correspon-
de ao nível rítmico: quanto mais imediato for o nível rítmico, menor a separação.
compostos no fluxo deste movimento para definir suas partes, são dis-
torcidos quase sistematicamente.
As notas longas, que muitas vezes desempenham função análoga na in-
terrupção do fluxo, são também freqüentemente distorcidas (novamente, veja
a execução de Bernstein da Terceira Sinfonia de Mahler). Na canção Wehmut de
Schubert (Exemplo 2.47), Elisabeth Schwarzkopf e Edwin Fisher19 executam os
últimos quinze compassos em cinqüenta e oito segundos, enquanto os primei-
ros quinze compassos ocorreram em oitenta segundos. As duas frases de quinze
compassos devem se equilibrar, porém a última frase é repleta de notas longas
que são erroneamente encurtadas. Será que esta distorção ocorre devido à falha
do intérprete em compreender a expressividade desta passagem - uma passa-
gem na qual notas longas e silêncios são dispostos durante um âmbito temporal
previamente mais ativo, expressando, portanto, um sentido de vazio e desinte-
gração? Em sua execução de Syrinx de Debussy, o flautista Jean-Pierre Rampal2°
mostra a mesma incompreensão - neste caso, em relação à nota aguda Dó~ longa-
mente sustentada nos compassos 6-7 (cuja importância discutimos na subseção
"Transformação lingüística" do Capítulo 2).
Como podem tais distorções ser evitadas? Três hábitos de pensamento, de
audição e de sensibilidade devem ser desenvolvidos para assegurar a projeção
clara do fluxo temporal:
Para demonstrar a segunda virtude, devemos prosseguir adiante com nossa in-
vestigação rítmica em obras que ainda não discutimos sobre esta ótica.
seção I
seção. Após a pausa no ponto médio, a segunda frase de cada seção sempre é for-
mada pelas formas mais rápidas do módulo (m1 em~).
Cada uma das três seções emprega este mesmo acréscimo modular de ativi-
dade em frases simetricamente equilibradas. Cada seção apresenta dez módulos
neste padrão de distribuição. As seções e suas frases revelam, portanto, profun-
das similaridades subjacentes. É interessante comparar esta organização de ati-
vidade rítmica com a do Amen de Machaut. As seções, frases e módulos de Jos-
quin são todas definidas com certa elasticidade. Como acabamos de constatar,
cada seção apresenta frases simétricas, conteúdo modular e incremento de atividade
similares; contudo, cada uma dessas seções tem duração total diferente (em pro-
porções 4:3 e 2:3, conforme demonstrado no Exemplo 3.16b). Em cada seção, o
módulo básico m 1 é levemente estendido, encurtado ou variado de outra forma,
como nos módulos de aumentação e diminuição. De forma análoga, cada frase
oferece uma combinação ligeiramente diferente dos módulos do plano da peça.
Embora a formação subjacente - as dimensões interiores e o recorrente acrésci-
mo de atividade - seja tão consistente e clara quanto na música de Machaut, é
possível perceber, na música de Josquin, maiores plasticidade e possibilidade de
variação em cada elemento.
1--
i i 1
r
1
------ - - - - - - - - - - - - - - !l - - - - - - - - -
Ir r r rr 1
J
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1,,
!J r r Ir r J í r
r-
contralto <>' <>'
1 1 1º
e
contralto
1 rr 1 J
1
-3 - - --
soprano
soprano
1
r· 'r i i r i e~
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1
1 O. .......... _l_P............ '..o li
I~ J r 1i r Ir r r ~ Ir r r li
19
-- - - -
comp. 1-3
::9tiE:~==,c=:~==t~=~=3 o módulo é definido rltmkamentc,
··---··--+----____,______... ~-----~ linear e interva!icamente
comp. 1-5
comp. 3-5
variantes de m 1 :
módulos são
variados através
comp. 18-21
b) das frases
Quantos níveis de.pulsação existem? Dada a uniformidade do ritmo total, como a varie-
dade do ritmo é obtida? Quais são os módulos que criam esta variedade?
MÓDULOS E PULSAÇÕES
Exe~mpfo 3.17
para oroidu;dr
uma pu1sac:u1
* N. T. Trata-se de um trocadilho entre os nomes Bach e Bauch, que neste contexto significa pançudo
ou barrigudo, conotando um compositor sofrível.
Exemplo 3.19
ao Invés de)
um;;i eu1,vo1-aça10
adicional
3.20
Quadro A
tema
seção - menor
acel.
acel.
acel.
acel.
Além da simetria das seções I e II, existe outro nível de dimensões proporcionais. Na seção II,
a menor parte se relaciona com a parte maior com uma razão 12:19; de maneira análoga, a
parte maior se relaciona com as seções com uma razão de 19:31. Essa relação proporcional
é conhecida historicamente como "seção áurea"23 e pode ser expressa numericamente como
aproximadamente 0,618.
em conteúdo:
As características espaciais, lingüísticas e rítmicas das duas frases são a base das
variações subseqüentes.
Após a apresentação temática das duas frases iniciais, sucedem-se e
uma frases de variação, cada uma com quatro compassos (31 x 4 = 124 compas-
sos), que conduzem ao momento da mudança de Ré menor para Ré maior. Após
essa mudança, que subdivide simetricamente as variações em duas seções, mais
31 variações finalizam a obra. As duas seções são simétricas, conforme demons-
trado no Quadro A, que também detalha as dimensões interiores das seções.
A primeira seção é definida tanto pela linguagem da tonalidade prevalen-
te Ré menor quanto pelo crescimento de sua atividade rítmica. Essa atividade
forma uma movimentação rítmica unificada, que se caracteriza pelo aumento
contínuo de atividade durante vinte e oito frases (no final da primeira seção, esta
aceleração é brevemente interrompida por três frases, que retornam à velocidade
original de atividade para o início da segunda seção). Este aumento de ativida-
de, que consiste no crescimento regular de densidade rítmica, é demonstrado
graficamente no Exemplo 3.21. Constata-se não somente o aumento constante
na atividade do tema até a frase 28, mas também que a média de freqüência de
atividade se torna cada vez mais rápida. Com isso, cada frase requer mais tempo
e ênfase do que sua precedente:
VARIAÇÕES
Esta obra para cravo é um dos mais ambiciosos ciclos de variações da músi-
ca européia. Estas variações são construídas a partir de uma ária de trinta e dois
compassos (Exemplo 3.22). Muitos comentaristas têm observado que a base para
a variação não é a linha melódica da ária, mas sim sua linha de baixo, sua pro-
gressão harmônica e sua estrutura rítmica. 24 Neste momento, vamos nos deter
no estudo de sua estrutura rítmica. Uma apreciação detalhada das características
rítmicas da obra seria assunto para um livro inteiro. Entretanto, esboçar uma
resposta concisa a certas questões pode esclarecer não somente o delineamento
rítmico da obra, mas também a organização de dimensões musicais e de ativida-
de em uma escala de tempo muito vasta.
Como uma breve ária dá origem a trinta variações que, por sua vez, parecem consistir
em peças individuais, ricamente variadas quanto aos andamentos, pulsações, contornos
e caráter? Podemos descobrir nesta peça princípios que permitem que uma hora de mú-
sica - escrita para um único instrumento, em uma única tonalidade e sobre uma única
linha de baixo repetida - se desenrole com um sentido de evolução contínua?
J. di.nonç: 2
5
em modo n1cnor
16
9
!l
27
:>O quod/fbet
4
ARl4
Os números dois, três e quatro são valores de atividade derivados da ária do tema:
subdivididos em 4)
cânone sexta
Esses extremos são justapostos nas variações deste conjunto. 29 Nesse aspecto,
a "Ouverture" francesa (Variação 16, Exemplo 3.25) é talvez a variação mais
Uma abertura francesa consiste tipicamente de uma seção lenta com ritmos pontuados,
seguida por uma seção fugal rápida.
teclado
2 teclados
RESUMO
DE -TRÊS
CORDAS, SEGUNDO MOVIMENTO
Quais são as velocidades de atividade no compasso 1 e nos compassos 4-5? Como a velo-
cidade da atividade nos compassos 15, 20-29 e 49 se relaciona com a velocidade inicial?
Em que elas diferem? Como a velocidade de atividade dos compassos 13, 17-19, 33-34,
52 e 54 se relaciona com as velocidades iniciais? Em que elas diferem? De que maneira as
diversas velocidades de atividade se inter-relacionam durante a obra?
- compasso 1, tutti
No início da seção central (seção III), a pulsação MM 228 atinge sua presença
máxima, assim como sua mais diversificada transformação.
A CAMADA DA PULSAÇÃO MM 15 2
UM CALEIDOSCÓPIO RÍTMICO
O complexo rítmico, portanto, também está refletido nos complexos espacial, lin-
güístico e de cor, reforçando seu significado.
Complexos de pulsos e suas novas implicações desempenham papel essen-
cial em boa parte da música do século XX. Mahler, Debussy, Sibelius, Schoenberg,
Ives, Bartók, Webern, Berg- todos foram, em alguma ocasião, desbravadores nes-
te campo. Entretanto, nem todos receberam o devido reconhecimento. Somente
Tovey parece ter atentado para esta característica em Sibelius:
Sibelius atingiu uma capacidade de mover-se como uma aeronave, seja contra ou a favor
do vento. Ele consegue mudar seu andamento sem quebrar o movimento. Os andamen-
tos de sua sétima sinfonia abrangem desde um genuíno adágio até um genuíno prestís-
simo. É impossível, entretanto, precisar como ou quando o andamento foi alterado. 35
EXPLORAÇÕES os
pu11saçí!o comum
Este exemplo mostra por que o termo modulação de tempo é preferível ao termo
modulação métrica, mais comum. A métrica (2/4) não precisa necessariamente ser
alterada já que é a velocidade do tempo que modula.
O efeito da :modulação de tempo já foi observado na segunda peça do quarte-
to de Stravinsky. O Exemplo 3.29 detalha a modulação de tempo que ocorre nessa
obra entre os compassos 1 e 25. A geração de dois tempos diferentes (MM 76 e
MM 114) é uma variante dentro da camada de pulsação MM 228. As composições
W5
i li i li
d)
li
= 2 140=280 =93. 3
:1
velocidades dos andamentos alc:anç:ad1Ds através
da de tempo
Copirraite (1961) Associated Music Publishers. Reproduzido com permissão dos editores.
DE ATIVIDADE E
J
- a série rítmica consiste em doze durações diferentes (de a , com
cada duração uma )i mais curta do que a precedente);
- cada duração é associada com uma altura, dinâmica e tipo de ataque
específico.
Na apresentação serial, a série deve soar por completo antes que qualquer um
de seus componentes seja repetido, portanto nenhuma freqüência de pulsação
individual assume proeminência sobre as outras pulsações da série. Todas as pul-
sações ocorrem igualmente, soando uma única vez em cada apresentação da série
(ou de suas permutações, chamadas neste contexto de "interversões"). Essa série
é, portanto, um complexo de atividade rítmica formado por doze durações diferen-
tes que ocorrem e recorrem em igualdade. Assim como a modulação de tempo
elimina uma única pulsação contínua em favor de um complexo de pulsações si-
multâneas ou sucessivas, também a atividade serializada elimina a possibilidade
de uma única pulsação de atividade dominante em favor de um complexo mais
abrangente e mais variado - as doze diferentes durações da série.
Ao longo de toda a obra "Ile de Feu II", sempre estão presentes duas séries
rítmicas simultaneamente. Em conseqüência, além das duas séries rítmicas, existe
um ritmo total resultante de sua superposição (Exemplo 3.33). No ritmo total, a
anotação dos compassos e tempos são aspectos fictícios da notação, convenções
mantidas do repertório anterior para a conveniência do intérprete. No repertório
anterior, a substância musical definia os compassos através da freqüente ênfase em
seu início como ponto de ocorrência musical acentuada. Por outro lado, no Exem-
plo 3.33, geralmente nada ocorre no ritmo total do início da maioria dos compas-
sos. Em menos da metade dos compassos, podemos observar um ataque marcando
o início do compasso. Constata-se o mesmo no segundo tempo Jdos compassos.
1:1.xeu•I"'·" 3.32 - Olivier Messiaen: "Ile de Feu II" (compassos 8-27), dos Quatro estudos de
piano)
et ferocc)
Interversão ll
interversão
interversão
interversão
JV
A série para as interversões contém doze durações (os números 1-12 correspondem à duração
em )1 ), doze alturas, quatro tipos de ataque e cinco dinâmicas. A interversão I inicia no meio
da série e depois se movimenta alternada e progressivamente em direção aos limites externos.
Cada nova interversão repete o processo. A duração, ataque e dinâmica de cada altura
permanecem constantes, conforme determinado pela série. As permutações na ordem das
alturas causam, portanto, também permutações na ordem das durações, ataques e dinâmicas.
Exemplo 3.33
ritmo
total
- diversos
dividuais (indicados pequenas setas no
SOS 35-37 e 41-43);
Não somente o tempo parece mover-se em duas direções, para diante e para trás,
mas também esta movimentação ocorre em diferentes freqüências. Existe um
palíndromo mais extenso que se desenrola lentamente assim como outros de
menor duração. Essas diferentes freqüências e direções na elaboração temporal
ocorrem simultaneamente (como atesta a superposição de setas)!
Assim como em "Ile de Feu II" de Messiaen, a notação rítmica desta peça se-
gue uma convenção de pulsos e compassos, porém a substância musical do com-
plexo de palíndromos não define ou depende de pulsos e compassos. Por exem-
plo, o módulo (Exemplo 3.34, clarinete, compassos 35-38) ocorre em uma
subdivisão diferente do tempo em cada de suas quatro ocorrências. Esse módulo
não define o pulso através de uma relação fixa e, além disso, o pulso não define o
módulo. O sentido do módulo não está em seu relacionamento com os pulsos (ou
compassos), mas na relação com os vários complexos de palíndromos.
Messiaen (talvez com um toque de ironia) denomina os palíndromos rítmi-
cos como ritmos não-retrogradáveis, 39 na medida em que seu é idêntico
à forma original. Por exemplo, o retrógrado de
portanto, não existe retrógrado, pois o módulo rítmico já incorpora o retrógrado.
O Exemplo 3.35 comprova que Messiaen é também um mestre no uso dos ritmos
em padrão verso-reverso em diferentes velocidades. Esta passagem, também da
obra "Ile de Feu II", contém:
em de Feu , complexos e
palíndromos são uucuL,aucv
viola _ _ __,,
-
--
Os compassos 41-44 criam uma detalhada movimentação em padrão verso-reverso, como nos
compasso 34-37.
Exemplo 3.35 - Olivier Messiaen: "Ile de Feu II" (excerto), dos Quatro estudos de ritmo
(para piano)
3.36
ÁREA
4l
li:
e)
:li
li:
1 14 45 3,2
2 28 172 6,1
3 28 172 6,1
4 32 107 3,3
M 1, m 2 , m 3 e m 4 são pequenas variantes do módulo, cada um apresentando uma velocidade de atividade diferente.
módulo de 3
módulo de 5 Jl
5 's etc.
De fato, os detalhes das frases 1 e 4, que estabelecem uma média quase idêntica
de atividade, são extremamente diferentes.
Toda a seção é constituída por uma rede de correspondências e variantes
rítmicas, composta por associações, transformações e justaposições, cujo efeito
cumulativo é a formação de amplos complexos estatísticos que são, ao mesmo
tempo, contrastantes e correspondentes. Tendo pressagiado as modulações de
tempo (em "Putnam's Camp", da obra Three Places in New England) e os palíndro-
mos (em From the Steeples to the Mountains), nesta sonata, Ives iniciou a utilização
TEMPORAIS ABERTOS
frase 2
frase 7
Cada uma destas frases, assim como cada frase da peça, é delimitada e defi-
nida por um segundo (ou mais) de ausência de ataque. A atividade das duas frases
é amplamente contrastante:
frase 2 frase 7
- uma das mais curtas (5 segundos); - uma das mais longas (18 segun-
- uma das menos densas em relação dos);
à atividade de ataque (média de 2,6 - uma das mais densas (média de 8, 7
ataques por segundo); ataques por segundo);
- uma das mais equilibradas na dis- - atividade concentrada principal-
tribuição de atividade pelos três mente nos dois registros mais agu-
registros: registro mais agudo - 4 dos: registro mais agudo - 76 ata-
ataques; registro médio - 4 ataques; ques; registro médio - 53 ataques;
registro mais grave - 5 ataques. registro mais grave - 28 ataques.
O Quadro C amplia esta análise para o restante da obra e revela como a fre-
qüência e a continuidade da atividade (ou sua descontinuidade, resultante da au-
sência de ataque) definem frases e seções. Cada seção tem sua conclusão marcada
por uma pausa que se· constitui na mais longa ausência de ataque até o momento.
A seção I é caracterizada pela média entre 2,1 e 4,5 ataques por segundo, todos
abaixo da média de atividade da peça, de 5,1 ataques por segundo. Por outro lado,
Acreditamos que o estudo desses aspectos abrirá portas aos nossos leitores para
a compreensão do fenômeno do tempo musical, à medida que seu significado
refinado tanto por compositores e intérpretes quanto por analistas, acadêmicos
e cientistas. Também abrirá novas portas que conduzirão à natureza profunda e
singular da arte cronológica da música.
LEITURA COMPLEMENTAR
BABBITT, MILTON. Twelve-Tone Rhythmic Structure and the Electronic Medium. Perspecti-
ves of New Music, Fall, p. 49-79, 1962.
CAGE, JOHN. Defense of Satie. John Cage. ed. R. Kostelanetz. New York: Praeger, 1970.
CARTER, ELLIOTT. The Rhythmic Basis of American Music. The Score, June, p. 27-32, 1955.
COOPER, GROSVENOR; LEONARD MEYER. The Rhythmic Structure of Music. Chicago: Uni-
versity of Chicago Press, 1960.
DANIELOU, ALAIN. The Rãgas of Northern lndian Music. London: Barrie and Rockliff, 1968.
D'AREZZO, GUIDO. Micrologus. Chap. XV. trad. com comentários em J. W. A. Vollaerts, Rhyth-
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1965.
~""'''º·~ 1 ,
mas também por dois e de fornecer indicações de notaç:ao para
estas divisões. Este tratado contribuiu enormemente para o enriquecimento dos recursos rítmicos.
8. Esta edição doAmen é de Friedrich Ludwig (Guillaume de Machaut, Musikalische Werke, Vol. 4, ed. I-L
Bessler [Leipzig: e Haertel, 1957]).
9. Para aprofundamento do estudo da acentuaçào, veja Grosvenor Cooper e Leonard Meyer em The
Rhythmic Structure of Music (Chicago: Phoenix, 1960). Para observações muito interessantes sobre
acentuação, consulte Sessions, op. cit., p. 11-16.
10. Gornbosi, op. cit., p. 23-24. Compare o final desta citaçào com a nota 6.
11. Esta seção é fortemente influenciada por um importante artigo: C. D. Creelman, "Human Discrimi-
nation of Auditory Duration" no Journal of the Acoustical Society of America, 34, p. 582-593, 1962.
Somos eternamente gratos a Creelman, nào só por suas pesquisas, mas também por sua revisào
trabalhos anteriores sobre percepçào do tempo (que utiiizamos extensivamente).
12. O valor 10% é uma deduçào geralmente aceita dos dados de Creelman. Em alguns casos individuais,
a percepção foi um pouco mais (ou menos) refinada; 10% representa uma norma geralmente aplicá-
vel. Veja Leonard Doob em Patterning ofTime (New Haven: Yale University Press, 1971).
13, Carl Seashore em The Pyschology of Music (New York McGraw-Hill, 1938, p, 62).
14, Gravado em DDG 270723. A comparaçào deve ser feita com a gravaçào de Boulez (CBS 32210002),
na qual os tempos do compositor são respeitados.
15, Sumarizado em Willi Apel, Gregorian Chant (Bloomington,, Ind.: Indiana University Press, 1958, p,
126-32),
16. Guido d'Arezzo, Micrologus (por volta de 1030) Capítulo 15 ("O modo adequado de compor melodia")
traduzido em J. W. A. Vollaerts, Rhythmic Proportions in Early medieval Ecclesiasthical Chant (Leiden:
Brill, 1958), Para manter a consistência da terminologia, os termos "neuma" e "período" de Vollaerts
foram substituídos por seus respectivos sinônimos, "módulo" e "frase". O termo "sílaba" refere-se
aos módulos mais breves,
17 Ibid.
18. Columbia M2S-275.
19. Angel 35022.
20. Educo ECM 4001.
21. A execuçào de Rubinstein desta sonata está disponível em RCA LM-2311, Veja o Capítulo 1, nota 30.
22. G. S. Bauch (assim como antes, Diabolus), embora imaginário, é uma figura que tem sua presença
assegurada na vida real em todos os tempos e lugares.
23, Para mais informações sobre a seçào áurea, consulte Le Corbusier, Modular I (Lon<lon: Faber, 1951).
Para maiores informações sobre a importância desta na música de Bartók, veja Erno Lendvai, "Qua-
lity and Synthesis in the Music of Bela Bartók", em Module, Proportion, Symmetry, Rhythm (ed. G,
Kepes - New York: Braziller, 1966).
24. "Nào é a melodia da sarabanda, mas sim o baixo com todas as suas possibilidades harmônicas que Bach
elabora e desenvolve. Imutável, este baixo permanece a fundaçào a partir da qual Bach elabora suas
trinta variações" (Wan,.Ia Landowska em Landowska on Music - New York: Stein & Day, 1964, p, 215).
25. A Variaçào 11 (em~~) constitui uma exceçào; em todos outros aspectos ela encaixa-se neste conjunto.
26. O pianista Charles Rosen foi o que chegou mais próximo de perceber a existência de três conjuntos
de variações que constituem o ciclo, bem como seus diferentes papéis - no encarte da gravaçào J. S.
Bach: The Last Keyboard Works (Odissey 32360020),
J_go 18
19
402 INTERSEÇÃO
O chocalho e o tom-tom são sempre atacados simultaneamente, exceto quando são anotados
separadamente, como nos compassos 15-17.
áreas
ocorre a
notas ""~·~·~·~· Nesse único
a novas lingüísticas e rítmicas. Através nesta interseção
as notas Si-Fá a relação coleção
duas transposições.
trítono, Dó-Fá# (Soh), assume significativa das
duas transposições. Esse é comum a ambas as transposições. Ele também
sustenta uma relação especial de vizinhança com as notas Si e Fá:
uma relação de semitom (W) descendente (Exemplo L2a). Toda a linguagem mu-
sical desta dança é caracterizada ênfase nas alturas compartilhadas Dó-Fá#
(Solt,) e suas resoluções por semitom para as notas prioritárias relacionadas
trítono (Exemplo L2b).
l!xen1pllo 1.2 - O trítono Dó-Fá# (Sol~) e suas resoluções por semitom em direção ao Si e Fá
b)
404 INTERSEÇÃO
como
notas
Si-Fá
- cada nota se destaca por ser a nota de uma
- cada nota é evocada ao longo uma ampla área dança;
- as notas são justapostas uma vez na interseção central
da dançaº
Dó-Fá# (Sol~)
- ambas as notas são apresentadas nas
transposições;
- ambas as notas formam laços comuns e fixos, u1Jtu1uv os
transposicionais distintosº
dança, Si 2-Mi 4 . No início da dança (compasso 2), o salto Ré 3 -Dó 4 desloca o foco
do registro 3 para o registro 4, uma mudança surpreendente cujas conseqüências
descreveremos a seguir.
Esse início propõe um movimento linear descendente@: Ré 3 --+ Si 2 (Exemplo
I.3, compassos 1-3), logo interrompido pela mudança de registro. Toda a primeira
área movimenta-se no sentido de completar este movimento interrompido, o que
finalmente ocorre com o movimento descendente cromático no registro original
(Exemplo I.3, compassos 12-14): Ré 3 --+ Dó# 3 --+ Dó 2 --+ Si2 • O deslocamento
registro no início da dança propicia que a linha descendente seja expandida de
forma mais ampla do que o mero preenchimento local do intervalo@, Ré 3 --+ Si 2 •
Esta expansão atinge, em última instância, um âmbito que compreende Mi4 até
Si 2 . Durante seu transcurso, a linha melódica preenche não só o espaço aberto
pela mudança de registro, mas a extensão total da dança.
Esta linha descendente, interrompida e ampliada oferece oportunidade
para a reprodução de vários detalhes característicos do movimento da dança,
como por exemplo:
Essas movimentações lineares, que conduzem primeiro ao Si3 e depois ao Si2, es-
tabelecem a prioridade do Si através de todos os compassos 1-14, a área da pri-
meira transposição da coleção escalar da dança. Na área da segunda transposi-
ção, os intervalos @preenchidos de forma semelhante conduzem linearmente
ao Fá, estabelecendo sua prioridade (Exemplo I.3, compassos 18-31). As notas Si
e Fá constituem-se, portanto, nos objetivos definitivos das movimentações espa-
ciais descendentes e, como observamos anteriormente, nas notas prioritárias das
duas principais áreas.
Existem outras conseqüências de longo alcance da disposição espacial do
início, que no compasso 2 claramente destaca o Dó 4 , a nota do deslocamento de
registro. Em relação à linguagem musical, concluímos que o trítono Dó-Fá# (Soll,)
e suas relações de semitons com as notas principais Si e Fá geram as característi-
cas lingüísticas básicas da dança. É precisamente a nota Dó inicial, no inesperado
registro Dó4, que traduz a importância do significado desta nota. A nota Dó 4 (e as
notas cromáticas ao seu redor, Dó# 4 -Rél,4 e Si3) cria um elo de longo alcance entre
a primeira área (Exemplo I.3, compassos 2-4 e 9-12) e a segunda área (compassos
23-26 e 28-30). 4
406 INTERSEÇÃO
Jl:IX,'l!H•i"'" L3 - Análise espacial e teínt:1oral da Dança do búfalo dos povos indígenas Zuni,
compassos 1-31
módulos
408 INTERSEÇÃO
d'
410 INTERSEÇÃO
no ~···~"·~~ posterior (Lá~-Sol-So}b-Fá, compassos 25-31) que
corresponde ao n-n,Pn cromático (Ré-Dó#-Dó-Si, compassos 1-31
e 13-14).
Um aspecto especialmente fascinante dessas passagens consiste na podero-
sa unidade orgânica dos gestos musicais que, em sua superfície, pareciam tão dis-
similares. As coleções de notas que aparentavam ser diferentes são, no entanto,
transposições à distância do trítono da mesma coleção. Esses detalhes lineares
refletem, além disso, uma única unidade linear subjacente, apesar das diferenças
de transposição, de nota prioritária e, como veremos na continuação, no anda-
menta e no ritmo.
Zuni
comp. 15 18 24 30 31
De que maneiras podem ser comparadas as dimensões e a atividade das duas áreas de
diferentes andamentos? A que transformações são submetidos os módulos e as frases?
Em relação às dimensões e à atividade, o que o compasso 6 apresenta de notável?
412 INTERSEÇÃO
sutil, é
as Ré-Dó#-Dó-Si,
com seu deslocamento registro característico) são rememoradas em a'.
As frases a, a' e b, são similares de outra maneira: todas elas duram de treze
J ou seja, todas apresentam a mesma aproximada (nesse
as pausas das vozes no início de a devem ser contadas; como em a', a
da voz de a ocupa o espaço de a duração de b difere
significativa: 10 %
a importância da duração mais curta da frase b? Observemos ''"'~"··
a conclusão de b se entrelaça com o início da frase seguinte, a', em uma
nota Fá# Caso essas duas j do Fá# contínuo fossem consideradas
b, então b teria duração de 12 ~ j, ou seja, a mesma duração aproximada das de-
frases. Conseqüentemente, entre b e a', nos compassos 6-7, existe uma elisão
(ou seja, uma sobreposição ou encontro). A nota Fá# é o de sobreposição
e desempenha dois papéis:
do compasso 6, dura 13 J.
Com essa substituição, toda a movimentação propulsiva, linear e rítmica da se-
ção I se distenciona. A conclusão da movimentação da nota Fá# 3 ao Si3 é retida
por muito tempo. Em contraste, a elisão confere à dança um ímpeto que direcio-
na suas movimentações lineares e rítmicas para suas terminações, a chegada no
Si2 no compasso 14. Nesse ponto de chegada, o equilíbrio rítmico, momentanea-
mente desordenado pelos truncamentos das tercinas e das frases no compasso
6, é completamente normalizado pela recorrência e reintegração de todos os
elementos rítmicos anteriores. Novamente, um pequeno detalhe da atividade -
o truncamento das tercinas - espelha uma ampla característica dimensional, o
truncamento de frase. Dessa forma, o truncamento da tercina é então absorvido
pela repetição e por outras transformações dentro da atividade rítmica da dança.
Esta fascinante junção no ponto central da seção I não é, de modo algum,
um exemplo isolado dentro da dança. Outro exemplo igualmente sutil consiste na
transição interligada no ponto médio mais amplo, entre as seções I e II. A frase de
transição que ocorre neste momento, nos compassos 15-19, funde os andamentos
e as coleções escalares de ambas as seções e justapõe diretamente, pela única vez
na dança, as notas prioritárias Si e Fá (além disso, sua duração equivale a 13 J).
Os paralelismos de duração da seção I também não são singulares. Aqueles
encontrados na seção II - três frases de: 12, 12 % e 12 % semínimas - são similares.
Para concluir, uma observação referente às dimensões e às atividades. A
duração da primeira frase da seção I (quatorze J, com J= 104) e da primeira frase
da seção II (doze J, com J= 90) é de oito segundos cada uma. Em tempo real, a
duração das frases é idêntica. 5
Que idéia maravilhosa! Áreas dimensionais de mesma duração são preen-
chidas com atividades relacionadas, porém sempre em novas roupagens:
414 INTERSEÇÃO
- dois UHU.UHH-LU.V0 j 104 e
=
-duas t-o-v·ont-oc de deslocamento por tercinas incompletas,
- os intervalos ®preenchidos;
- o birregistral nota Dó;
- os deslocamentos rítmicos causados pelo truncamento das tercinas.
NOTAS
1. Claude Debussy em Monsieur Croche the Dilettante Hater (trad. B. N. Landgon Davies; reimpresso em
Three Classics in the Aesthetic of Music, New York: Dover, 1962, p.7).
2. Gyorgy Ligeti, "About Lontano", em notas de gravação para Heliodor-Wego 2549 011.
3. A dança foi gravada em Music of the American Indian, Everest 3450/3, gravação em disco 3, lado 2,
faixa 2. A transcrição é de Robert Cogan. A divisão em compassos é proposta apenas como auxílio
para a leitura; nenhum significado adicional deve ser lido na colocação das barras de compassos. O
416 INTERSEÇÃO
fragmento é quase um terço da em tempo reaL O compasso 31 foi escolhido como ponto final
porque imediatamente, no compasso 32, inicia-se uma nova idéia que recorre continuamente até 0
da dança, Sua ocorrência inicia um novo estágio no desenvolvimento da dança,
A contínua elaboração do Dó" por seu vizinho cromático, Dó#4 = Réb4, não deve ser ignorada (ver com-
passos 3, 10, 24 e 28), Junto com a crucial relação de Dó 4 com seu vizinho cromático, Si 3 , o resultado é a
inserção de Dó4 em um círculo cromático, Para outros exemplos do circulamento de Dó, ver Exemplo LS,
Isto também é quase verdadeiro em relação à duração das seções, A Seção I dura 29 segundos, e a
seção II, 28 segundos, Considerando a área coberta por um determinado andamento, a primeira
área de tempo equivale a 33 segundos e a segunda área de tempo (até o compasso 31) equivale a
34 segundos, Esses tempos são praticamente semelhantes, As pequenas diferenças encontram-se,
obviamente, circunscritas na margem de erro tanto de mensuração quanto de erro percentual (as
pequenas discrepâncias entre a cronometragem efetiva, dada aqui, e aquela resultante do cálculo do
número de tempos a partir da indicação metronômica resultam das aproximações necessárias para
se designar uma indicação metronômica),
The Next Development in Man (New York: Mentor, 1948, p, 15, Compare com a observação de que "a
forma é um resultado - o resultado de um processo" (Edgard Varêse, "Rhythm, Form and Content",
no Contemporary Composers on Contemporary Music, ed, E, Schwartz e R Childs - New York: Holt,
Rinehart & Winston, 1967, p, 203),
Não posso admitir, de maneira tão incondicional, a diferença entre timbre e altura tal e
como se expressa habitualmente. Acho que o som se faz perceptível através do timbre,
do qual a altura é uma dimensão. O timbre é, portanto, o grande território, e a altura,
um distrito. A altltra não é senão o timbre medido em uma direção. Se é possível, com
timbres diferenciados pela altura, fazer com que se originem formas que chamamos
de melodias, sucessões cujo conjunto suscita um efeito semelhante a um pensamento,
então há e também é possível, a partir dos timbres da outra dimensão aquilo que sem
mais nem menos denomina-se timbre, produzir semelhantes sucessões, relação en-
tre si atue como uma espécie de lógica totalmente àquela que nos satisfaz
na melodia de alturas. Isso parece uma fantasia futurística, e provavelmente o seja. Mas
se há algo em que acredito firmemente, é que ela se realizará. E acredito firmemente que
será capaz de elevar, de forma inaudita, os prazeres dos sentidos, do intelecto e da alma
que a arte oferece. Creio firmemente que nos levará mais próximo à miragem refletida
em nossos sonhos [...]
Melodias de cores de sons! Que sentidos refinados aqui se diferenciam! Que espírito
sublimemente desenvolvido pode encontrar prazer em coisas tão sutis! 3
Primeira classe - ondas senoidais simples, como as do diapasão colocado sobre um res-
sonador ou um tubo de órgão com registro largo, cujo som é suave e agradável, livre de
qualquer aspereza, mas deficiente em força nas alturas graves.
Segunda classe - notas acompanhadas por uma série moderadamente intensa dos pri-
meiros seis parciais, como aquelas do registro médio do piano, do tubo aberto de órgão
e dos sons mais suaves da voz humana e da trompa; são sons harmoniosos e musicais,
ricos e cheios de esplendor se comparados aos sons simples e, ao mesmo tempo, doces e
macios, quando os parciais mais elevados estão ausentes.
Quarta classe - notas dos instrumentos de arco, a maioria das palhetas do órgão, do
oboé, do fagote, do harmónio e da voz humana (certas vogais). A proeminência de har-
mônicos a partir do sexto parcial resulta em uma qualidade do som cortante e áspera. 6
É verdade que a qualidade depende da forma da onda (ou espectro: os diferentes parciais
e suas respectivas intensidades, na concepção de Helmholtz), porém também depende
da altura, do volume sonoro, do decaimento e do tempo de ataque, da variação da in-
tensidade dos parciais durante o transcorrer do tempo, do ruído do impacto do martelo,
do ruído do pedal e também da terminação característica do som causada pelo feltro da
surdina, etc. 7
mimem do
5 15 20 25 30 35 45
3()
20
10
o
30
Dôs ft ""' 65/~
.o 20 Rtaque 0,00)
"Cl
decaimento ~ 1.,26
f!
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o
iJ o
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30
.l:: 20
.::
Dó., ~ 130,8
10
o
10 l 2
Os Exemplos 4.2 e 4.3 foram retirados de Harvey Fletcher, E Donnell Blackham e Richard Stratton, "Quality
of piano tones", Journal of the Acoustical Society ofAmerica (1962), p. 753-754. Reproduzido com permissão dos
autores e do American Institute of Physics.
tempo - sei:;:·mH:tos
O gráfico mostra a variação de intensidade no transcorrer do tempo dos parciais 1-6 da nota
Dó 4 . Ao término de um segundo, o som contém apenas os parciais 1-3 e a fundamental é
consideravelmente debilitada (segundo Fletcher).
""''~m-nln 4.4 -Alguns tipos de toques do ch'in (segundo van Gulik, Levy e Tsar
Teh-yung) 11
As seções 1 e 2 incorporam vários contrastes de espaço e cor sonora. Quais são eles?
Como esses contrastes dão origem ao design e às cores de toda a peça? Na seção 1, exis-
tem áreas com diferentes características de ataque. Quais são elas? Como essas diferen-
ças de ataque ocorrem no restante da peça?
Nas Três variações sobre Plum blossom, podemos discernir um plano do mo-
vimentação registral notável em sua abrangência e complexidade. Como sugere
Frederic Liebeman, "a forma é desenvolvida a partir de uns poucos motivos bá-
sicos e por contrastes entre os registros agudos (harmônicos) e graves".14 Essa
descrição, contudo, nos dá apenas uma pequena idéia sobre a efetiva capacidade
de invenção e complexidade do design registral.
*Atribuído a Huan I, dinastia Tsin, século IV a.D.; anotação da dinastia Ming, 1425.
,,"'
.!::.
J .,104
[B] u
elemento X elemento y
Apresenta uma ordem fixa de alturas, ritmo Apresenta semelhanças com a altura e rit-
e uma cor tonal específica (harmônicos). mo da última frase do elemento x.
Após serem introduzidos na seção 1, esses ataques diferentes formam a base para
a justaposição dos ataques contrastantes que ocorrem durante as seções da movi-
mentação principal (A) em toda a peça. Áreas de ataques repetidos são consisten-
temente confrontadas com áreas de glissandos:
som
b) Ludwig van Beethoven: Sonata para violino e piano, op. 47, "Kreutzer" (1803)
Trecho de Quatro peças para violino e piano, op. 7. Copirraite (1922) Universal Edition. Utilizado com a permissão
do editor, Theodor Presse Company, único representante nos Estados Unidos, Canadá e México.
4.11-A flauta
Fa-1397
n
100
Si-494 14
Sol-392
s
parciais 5
Reproduzido de Carl & Seashore, The Psychology of Music (New York: The McGraw Hill Book Company, 1938).
Reimpresso com permissão dos editores.
94
Ult-932 70
70
Sol-784 90
95 extensão
Ré#-622 93
99 1
U#-466 l8 o 10 o 10 7
66 2 12 1
Sol-392 o 36 1 o
p: 71 l 26 l
Ré#-311 27 o 47 5 3 2 3
p: o 6
LH-232 63 19 o 10 o 2
J1: 73 o 15 o 3 o 2 o 5
Sol-195 67 o o l8 l
86 o 3 o B
Ré#-155 35 o 6 o o 2 o o
p.· 5 o 7
5 6 7 8 10 H 12 15
Mi-163
1
1
2 3 4 5 6 7 13
Sib-466 90 9
86
Lâ-440 99 l
extensão usual
26 73
Fá-349 66 29
94 6
U-220 26 31 9 2
p: 77 6 14 2
Fá-173 14 32 46 7
10 43 36 9
Dó-130 1 19 21 48 5 2
9 30 26 30 5 l
u-no 2 22 34 6 21 3
11 34 4 25 1l 9
FiH!7 l 43 22 19 3 6
o 12 7 lO 15 15 27 3 "
4
2 3 4 5 6 7 8 9 10
Sol-194
2 12
94
100
21 5
82 extensão usual
57 4 l
94 3 2
8 47 32 l 8 o o
21 50 4 l
Fá-173 5 31 12 6 .31 o 6 o
26 12 33 o 12 .2
Rê-146 16 l 4 7 37 9 4 o o o o l
p: o1 30 10 7 1 o l
6 5 27 o 9 5 5
5 19 o 17 18 o 5 l 2
F1Hl7 1 19 8 3 3 6 l 2
2 3 o 2 17 10 4 o 3
2 10 H 12 13 14 15 17
oboé o som do oboé possui duas regiões formantes fortes, uma em 1000-
1500 cps e outra em 3000-4000 cps. A ressonância intensa nessas
regiões realça os parciais mais elevados e enfraquecem a fundamental.
Conseqüentemente, os sons harmônicos são muito fortes do
segundo ao quinto parcial. Por isso, o oboé freqüentemente parece
soar em um registro mais agudo do que aquele em que realmente
está e pode literalmente se sobressair em uma textura instrumental
(como no "Prelúdio" de Tristão e Isolda de Wagner, compassos 66-
* N. T. Para Walter Piston em Orchestration (1955), cornet e trumpet são dois instrumentos diferentes
(veja o Exemplo 4.19).
tuba a região de ressonância está entre 100 e 300 cps. Existe marcante
contraste entre a primeira metade (mais grave) de sua extensão,
na qual a energia se concentra do segundo ao quarto parcial, e a
segunda metade (mais aguda), em que os sons se aproximam de
sons senoidais puros (esses sons puros são bastante incomuns para
instrumentos orquestrais na região entre 100 e 250 cps).
90
90
40 247
277
350 cps
3()
Slé - 415 çps
HJO
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2 8 6
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freqfü!nda - cps
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e
"'
40
30
20
2
100 1000 5000
freqüênda - :cps
Gráficos de J. E. Ancell, "Sound Pressure Spectra of a Muted Cornet", Journal of the Acoustical Society of America,
37, 1965, p. 857-860. Reimpresso com a autorização doAmerican Institute of Physics.
40
0~1;;:-~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~
SoJ6 - 1568
lO
30
41)
1) 2 8 lO 12 14 16 18 20 22 24 26 28 30 32 34 36
número do
Gráficos reproduzidos de H. Fletcher, E. D. Blackham e O. N. Geertsen, "Quality ofViolin, Viola, Cello and Bass-
Viol Tones:!", Journal of the Acoustical Society ofAmerica, 37, 1965, p. 857-860. Reimpresso com a autorização do
American Institute of Physics.
o 10
392
o 2 8 Hl 12 30 32 36
40
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10
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o 2 6 10 12 14 18 20 22 26 28 30 32 34 36
número do
Outro procedimento que atua como uma espécie de filtro consiste em tocar
uma nota em uma corda diferente da usual. O Exemplo 4.25 mostra que a nota
Dó 5 (aproximadamente 523 cps) produzida nas cordas Lá, Ré e Sol2 6 apresenta
diferenças marcantes em seus espectros. O Dó 5 "normal" na corda Lá tem dez
parciais, ao passo que apenas oito parciais soam na corda Ré e cinco na corda Sol.
Nas cordas Ré e Sol, a diminuição na quantidade de parciais ocorre simultanea-
mente à irregularidade na intensidade dos parciais.
Nos instrumentos de cordas, as notas denominadas "harmônicos" re-
presentam outro conjunto de sons altamente filtrados produzidos por esses
instrumentos.
Exemplo 4.25 - Espectro do Dó 5 (cerca de 523 cps) produzido nas cordas Sol, Ré e Lá do
violino (mf, arco para cima)
çorda Sol
Reproduzido de Carl Seashore, The Psychology ofMusic (NewYork: McGraw-Hill, 1938), p. 216-217. Reimpresso
com a autorização dos editores.
DE C INSTRUMENTAIS:
INSTRUMENTOS SOPROS - ARNOLD SCHOENBERG -
PEÇAS PARA ORQUESTRA, OP. 16, CORES
* N. T. Afirmação válida para a época da 1 ªedição do livro. Aconselhamos que o leitor procure conhecer
programas de computador voltados para a análise do espectro sonoro.
.txenipl.o 4.26 - Schoenberg: Cinco peças para orquestra, op. 16, Cores (terceiro movimento,
compasso 1)
Copirraite (1952) Henmar Press Inc., 373, ParkAvenue South, New York, 10016. Permissão concedida pelo editor.
Ainda que o gráfico do som combinado seja uma estimativa grosseira, ele
nos revela um importante aspecto da primeira sonoridade. A energia está con-
centrada nas fundamentais dessa sonoridade, particularmente nas notas Si3 - Mi4
- Lá 4 (a única exceção é o Sol# 3 , cuja energia está em seu segundo parcial). Cada
um desses sons se aproxima de um som puro em caráter - para citar Helmholtz,
"bastante suave", "livre de qualquer aspereza", "deficiente em força nas alturas
graves". Esta característica de unidade está vinculada também à limitação do re-
gistro: a energia está concentrada no espaço restrito compreendido entre Si3 e
Lá4 . Pelos padrões de cores sonoras de espectro e registro, a unidade da cor so-
nora é claramente definida: prevalece a qualidade do som senoidal no registro 4.
bi
ppp
SEGUNDO NTO
passo 1
4 70 A COR DO SOM
Concerto para violino, segundo movimento
BATIMENTOS
7 cps
cps
A B A
seg. l
batimento$ crista silêncio
4 72 A COR DO SOM
estimulam partes
conseguinte, em batimentos.
A separação entre as freqüências que
diversas partes da extensão. Nos registros graves, uma separação de 40 cps
entre as alturas é muito ampla para causar batimentos; em compensação, nos
registros agudos, os podem ser causados por uma separação de até
400 cps. O Exemplo 4.31 sintetiza o potencial produção de batimentos nos
31
intervalos em diversas partes da extensão. A coluna 4 do Exemplo 4.31 mostra
que os batimentos são produzidos por diferentes intervalos em partes diversas
da extensão. Nos registros 1 e 2 (96 cps e abaixo), quartas, terças, segundas e
separações ainda menores causam batimentos. A do registro 7, somente
intervalos menores que (1,5) causam batimentos.
A teoria amplamente difundida segundo a qual os intervalos consonantes
são aqueles que não produzem batimentos e os intervalos dissonantes, aqueles
que os produzem, não está de acordo com a realidade da produção de batimentos.
Para que essa afirmação seja adequada à realidade, consonâncias e dissonâncias
deveriam ser concebidas de maneira distinta em registros diferentes (e, como ob-
servou Helmholtz, também em instrumentações específicas) de acordo com as
informações anteriormente mencionadas.
Em combinações de sons compostos ou complexos, os batimentos resultam
da proximidade não apenas das fundamentais, mas também dos parciais. Os
parciais vibrantes produzem freqüentemente várias velocidades e intensidades
diferentes e simultâneas de batimentos. Além do mais, mesmo uma única nota
não combinada pode produzir batimentos, caso seu espectro inclua vários parciais
agudos muito próximos. O batimento de parciais próximos é responsável pela
qualidade de "aspereza" nos sons graves do piano, do fagote, do contra-fagote,
dos metais graves e das vozes masculinas graves.
Os batimentos soam de maneira diferente, dependendo de sua extensão e
freqüência. Os batimentos mais lentos (1-15 bps) são ouvidos com nitidez, po-
rém as alturas que os produzem não podem ser distinguidas. À medida que a
freqüência do batimento aumenta, os batimentos não podem mais ser percebidos
individualmene, mas sim como uma textura "áspera", "vibrante", ou "tremulan-
te": os batimentos individuais tornam-se cada vez menos diferenciados, ao passo
que as alturas que os produzem se tornam cada vez mais perceptíveis. Em partes
distintas da extensão audível, diferentes freqüências de batimentos têm máxima
proeminência, como'indicado na segunda coluna do Exemplo 4.31. O ponto de
proeminência máxima dos batimentos é em 40% da distância na qual os bati-
mentos não podem mais ser ouvidos (em uma altura de 96 cps, os batimentos
registro 2 96 16 41 @
registro 3 256 23 58 ©
registro 5 575 43 107 @
O diapasão I soa continuamente em uma altura fzxa (som puro), e o diapasão II inicia em
uma altura fzxa e ascende continuamente. A segunda coluna lista a separação, em cps, entre
os diapasões que produzem os batimentos mais proeminentes e a terceira coluna lista a
separação a partir da qual os batimentos desaparecem.
dos sopros
EFEITO CORAL
MASCARAMENTO
h} t'Spcctro
St'.ffil surdüna
cps bps
157
RB
83
violino !! violino 1
sem sem surd.
Sol'I
prlmc~ra
som:irid"de
das çorda:s
o o o o oo o
o
o C•
o oo o•O o
o
o o º' o ·-o o
o 00
""
N
"!'
"' N
'""' '°
""' N !'.'."II N M M ~
do som mascaraclo -
RYen1nJlo 4.35 - Hector Berlioz: Nuits d'Été ("Noites de verão"), Le spectre de la rase ("O
espectro da rosa"), compassos 1-5
Apenas o Lá6 e o Lá7 são executados pelo naipe completo das cordas, também
através de harmônicos em dinâmicas ppp. Contudo, essas notas são tão agudas
que não podem mascarar os eventos que se seguem. Nos momentos em que pode-
ria existir perigo de mascaramento dos parciais agudos de outros instrumentos
(os oboés nos compassos 15-16 e os trompetes no compasso 22) e a conseqüente
distorção da cor, o compositor temporariamente omite estas notas. O domínio
perfeito sobre como evitar o mascaramento torna possível a realização destapas-
sagem de refinada utilização do espaço e do colorido.
Outras maneiras de evitar o mascaramento incluem:
na
vlo!lno
violino
viola
violoncelo
a três
zu drel
glelcl:!en Theilen
contrabaixo
zu drel
glelcl1e11 Tliellen
As linhas verticais, da esquerda para a direita, mostram a intensidade relativa dos doze
parciais do Si!, do trompete, espectro de 466 cps.
registro - tanto o colorido intrínseco dos registros (revelado pelo som puro
em vários registros) quanto as mudanças das cores instrumentais (espectros,
batimentos, ruídos de ataque e assim por diante) em diferentes registros;
espectros de um único som e da combinação de sons - levando em consideração as
variações dos espectros durante o tempo em diversas dinâmicas e registros;
ruídos componentes - tal como o ruído de ataque e os ruídos incidentais;
fenômenos de interferência - tal como os batimentos, o efeito coral e o
mascaramento;
modulação sonora - através da alteração da altura e da dinâmica, como no
vibrato.
Ao mesmo tempo, o design sônico depende também das mais amplas movimenta-
ções e distribuições espaciais dos sons, que abrangem vários registros do espaço
e longas durações. É possível organizar tanto as forças de larga escala quanto
os mais diversos detalhes de uma obra musical de maneira que, conjuntamente,
criem um sentido de totalidade coerente, fazendo com que uma formação de lar-
ga escala, tal como as que encontramos no espaço, linguagem e tempo musicais,
seja delineada. A peça Nuvens de Debussy representa um exemplo particularmen-
te vívido deste desenho sônico totalizante.
Em Nuvens, assim como nas Três variações sobre Plum blossom, existe uma
movimentação espacial (e de cor) principal. Essa movimentação é sempre conduzi-
J
da em no início da obra, por exemplo, pelos clarinetes e fagotes dobrados em
oitavas (Exemplo 4.39). Esta movimentação através do espaço e suas mudanças
contínuas de cores sonoras instrumentais delineiam a essência do design sônico
de toda a obra:
peça (1-3).
:; l· dMdidos em
u
ient
e.st~IJ?io 8b
97
4 contrabaixos
Os instrumentos de corda
sempre tocam com surdina.
estágio 1
o espectro inicial do dobramento fagote-clarinete situa-se quase exa-
tamente no meio da extensão do espectro total da peça (veja os Exem-
plos 4.41 e 4.42). Esta localização permite as expansões ascendentes
e descendentes que ocorrem a seguir. Outra instrumentação possível
da mesma passagem - por exemplo, oboés substituindo os clarinetes
ou instrumentos de cordas no lugar do dobramento de sopros - teria
preenchido prematuramente os registros agudos do espectro, eliminando
estas possibilidades de evolução.
estágio 2
como o abafamento dos instrumentos de cordas remove os parciais
agudos, o dobramento de três oitavas nos violinos abafados (compassos
11-14) muda as fundamentais para os registros agudos (registros 4-6)
sem ativar muito a região de ressonância do registro 8. Os violinos não
estágio 3-4
o mesmo pico de parciais que é ativado no estágio 3, até o registro 9,
é ativado no estágio 4, mesmo que suas fundamentais se localizem uma
oitava abaixo. Os registros agudos no espectro do estágio 4 resultam
da dinâmica f e das vozes agudas nos instrumentos de madeira, espe-
cialmente os oboés. Estes ápices espectrais da movimentação da peça, o
compasso 29 no terceiro estágio e o compasso 42 (do breve estágio 4)
apresentam dinâmica forte. Como as dinâmicas intensas ativam par-
ciais agudos, a dinâmica forte e a instrumentação são cruciais na cria-
ção dos picos espectrais alcançados nesses pontos.
estágio 8
o abafamento do violoncelo e do contrabaixo elimina (novamente) os
parciais mais agudos, tornando possível a" descida espectral" que com-
pleta o design sônico.
compassos 33-41
as linhas inferiores do clarinete, fagote e cordas no início deste episó-
dio propiciam um contraste de registro com as cores puras e agudas
do início da movimentação principal. Esse contraste é atingido atra-
vés do emprego dos mesmos instrumentos em registros diferentes.
violinos divididos em
violinos divididos em
divididas 2
divld!doo em
ou Instrumentistas por
2 oooés, clarinetes
3 trompas
I, divididos em 2
\iíolinos II. divididos em 2
vlola, divididas em 2
cetll
(6 cordas por linha, dobradas
menos, mn instmmento
A cor inicial desta peça apresenta um espectro relativamente puro e também relativamente
(Tio, sem a presença de interferências por batimentos, tanto aqueles causados pelo efeito
coral quanto aqueles produzidos pelas (Teqüências adjacentes nos espectros. A ausência de
batimentos é resultado da escolha de registros, intervalos e espectros instrumentais. Os estágios
subseqüentes da movimentação principal produzem cada vez mais interferência, à medida que
o número de instrumentos, a densidade das sonoridades e o número de dobramento de oitava
aumenta. O incremento sistemático dos dobramentos (em uníssono ou oitava), detalhado
no quadro, cria o efeito coral. A maior densidade intervalar dos últimos estágios produzem
batimentos adicionais, causados pelas 'fundamentais e pelos parciais adjacentes (embora os
estágios iniciais utilizem apenas duas classes de altura simultâneas por semínima, a partir
do compasso 21, quatro classes de alturas simultâneas por semínima tornam-se a norma). Os
estágios anteriores evitam estas adjacências de alturas que criam batimentos, ao passo que os
últimos estágios as incluem.
violino
43-50
viola
cello
ci::mtrabruxo
PP
Cada nova característica de ataque (cordas em detaché, pizzicati, tremoli, rufar do tímpano)
aumenta a quantidade e intensidade dos ruídos de ataque até o momento (nos tremoli e no
rufar dos compassos 94-98) em que a injeção de ruído de ataque se torna contínua e onipresente.
A movimentação em direção aos registros graves, cujos espectros são mais ricos e
nos quais os complexos sonoros produzem mais adjacências e, conseqüentemente,
mais interferências, é crucial para a formação das interferências, que são HL'~H.v
importantes na progressão das cores do movimento. O início relativamente agu-
do, suave e esparso executado no clarinete e no fagote apresenta sons individuais
que se aproximam do som puro e combinações deficientes em interferência.
Esta também é uma característica importante no movimento, assim como cada
uma das características espaciais, intervalares, instrumentais e as dinâmicas no
transcorrer da peça. O design sônico compreende toda esta ampla movimentação
através do espaço, durante a qual são efetuadas profundas alterações na cor so-
nora. Este design inicia nitidamente com a primeira nota do clarinete e do fagote
e termina com o último Si grave impregnado de ruído executado pelas cordas em
pizzicati e com o tremolo dos tímpanos.
CONCLUSÃO
LEITURA COMPLEMENTAR
BACKUS, JOHN. The Acoustical Foundations of Music. New York, Norton, 1969.
COGAN, ROBERT. Toward a Theory of Timbre: Verbal Timbre as Musical Line in Purcell, Ses-
sions and Stravinsky. Perspectives of New Music, Fall-Winter, p. 75-81, 1969.
FLETCHER, HARVEY. Speech and Hearing in Communication. Princeton, New York: Van Nos-
trand, 1953.
_ _ . Quality of Piano Tones. Journal ofTheAcoustical Society ofAmerica, 34, p. 7 49-761, 1962.
FLETCHER, HARVEY; LARRY SANDERS. Quality of Violin Vibrato Tones. Journal of the
Acoustical Society ofAmerica, June, p. 1533-1544, 1967.
HELMHOLTZ, HERMANN VON. On the Sensations ofTone. Tradução da quarta edição alemã
por Alexander Ellis. New York: Dover, 1954.
LUCE, DAVID; MELVILLE CLARK, JR. Physical Correlates of Brass-Instrument Tones. Jour-
nal of the Acoustical Society ofAmerica, 42, June, p. 1232-1243, 1967.
MILLER, DAYTON C. The Science of Musical Sounds. New York: Macmillan, 1916.
OBATA, JUICHI; TAKEHIKO TESIMA Experimental Studies on the Sound and Vibration of
the Drum. Journal of the Acoustical Society ofAmerica, April, p. 267-274, 1935.
SIVIAN, L. J. et al. Absolute Amplitudes and Spectra of Certain Musical Instruments and
Orchestras. Journal of the Acoustical Society ofAmerica, p. 330-371, 1931.
VAN BERGEIJK, WILLEM et al., Waves and the Bar. New York: Doubleday Anchor, 1958.
WINCKEL, FRITZ. Music Sound and Sensation. New York: Dover, 1967.
NOTAS
1. Hector Berlioz em Treatise Upon Modem Instrumentation and Orchestration (trad. M. C. Clarke - Lon-
don: Novello, 1958, p. 243).
2. Citado em Leon Vallas, The Theories of Claude Debussy (trad. Marie O'Brien - New York: Dover, 1967,
p. 9).
3. Arnold Schoenberg em Harmonia (tradução de Marden Maluf - São Paulo: UNESP, 2001).
4. Hermann von Helmholtz em On the Sensations of Tone (traduzido da quarta edição alemã de 1877
FORMA
no sistema modal, um intervalo @ (uma décima) era a distância espacial mais ampla
disponível para a movimentação de uma voz. Nas obras musicais desse sistema, este
intervalo era considerado uma distância muito ampla. Os cantos modais que estudamos
no Capítulo 2, Veni creator spiritus ou Kyrie Deus sempiterne, mal abrangem uma oitava
(um intervalo@) do espaço total. Seus saltos mais amplos perfazem um intervalo<:/) e
mesmo assim são uma raridade. Apenas em 1638, no apagar das luzes do sistema mo-
dal, Monteverdi pode ousar:
(Extraído da peça "Hor che'l ciel e la terra", do Oitavo Livro de Madrigais, para voz de tenor).
o salto Q;~;, que aparece ilustrando as palavras son lunge ("estão longe"), é surpreenden-
te mesmo no contexto propiciado por Monteverdi. Esta mesma distância Q"§) também
representa os limites (Sib3 e Dó# 5 ) das áreas estáticas, campos A e C da "Introdução"
do Segundo quarteto de cordas de Carter, analisado no Capítulo 1. Entretanto, na for-
ma espacial de Carter, esta distância é percebida como reduzida e, naquele contexto, a
amplitude é definida pelas mais de cinco oitavas do campo B. Em uma obra cujas fun-
damentais transcorrem toda a extensão audível de dez oitavas, mesmo o espaço mais
amplo utilizado por Carter pode parecer restrito.
ESTRUTURA
- o trítono;
- o intervalo @preenchido pela movimentação linear;
- o deslocamento rítmico causado pelas tercinas truncadas;
- a natureza binária de cada um dos processos formais.
Se os temas não podem determinar a lógica da música, uma única figura também não
pode realmente formar a "idéia" de todo um movimento ou seção ... Assim como é errado
identificar uma "idéia", partindo de uma única figura recorrente, afastar-se ou dar por
terminada a ação da primeira sentença aparentemente completa, antes de ter certeza
que o problema proposto pelo seu contexto não é essencial para a sua compreensão,
configura-se como erro semelhante. 3
Os temas não apresentam conexões mais íntimas com as proporções musicais de larga
escala do que as cores dos animais com os seus esqueletos. No estilo sonata, três ele-
mentos são fundamentais e fornecem apoio para questões tais corno o equilíbrio e a
proporção. Estes elementos fundamentais consistem no sistema de tonalidades e de
frases, que podem ser submetidos a uma análise técnica e adequação drarnática. 4
na temáticos encontraram
ressonâncias no pensamento de compositores do século
"Atematicismo" e aberta", ou seja, a não consiste em padrões
temas definidos e recorrentes, são algumas das palavras-chaves na do
século
Deve-se admitir, por fim, que a teoria dos moldes temáticos não é adequada
como uma teoria geral da forma, embora tenha seus méritos. No entanto, suas
virtudes podem ser rapidamente absorvidas na teoria da forma entendida como
processos espaciais, temporais, de linguagem e de cor sonora. Simultaneamente,
esta teoria pode esclarecer a compreensão da música e de fenômenos musicais
fora do âmbito da teoria dos moldes temáticos.
Este livro está, de fato, repleto de exemplos musicais cuja unidade é incom-
preensível ou questionável, segundo os preceitos da teoria dos moldes temáticos,
mas que pode ser compreendida como processos nos parâmetros espaço, lingua-
gem, tempo e cor. A ausência de conexões temáticas, nas duas primeiras seções
da Dança do búfalo, causa a sensação de falta da unidade? Ao contrário, a maneira
como o compositor lida com espaço, linguagem e tempo revela diversas e pro-
fundas conexões que unem as seções. A introdução de Du bist die ruh de Schu-
bert (Exemplo 2.49) carece de um tema melódico. Será, portanto, que esta seção
não está unificada com o resto da canção? Pelo contrário, esta seção origina uma
movimentação linear-harmônica - um processo em espaço e linguagem - que
recorre como base estrutural de cada uma das seções posteriores da canção. Des-
cobrimos, no Capítulo 2, que cada novo aspecto da canção nada mais é do que a
transformação de algum membro desta movimentação recorrente.
Se as práticas de Haydn, Mozart e Beethoven forem tomadas como guia (a quais outros
recorreríamos?), as regras passíveis de serem descobertas da forma sonata são definiti-
vas, em relação à distribuição de tonalidades, e absolutamente indefinidas, em relação
ao número e à distribuição de temas nessas tonalidades. 6
seção I (exposição)
estabelecimento de I - modulação para V ou outro nível tonal relacionado,
tornando necessária a momentânea erradicação de I.
seção II (passagem)
movimentação que passa por regiões mais distantes da linguagem tonal e,
em última instância, prepara o retorno para I, geralmente através de V.
- áreas dimensionais;
- atividade diversificada;
- linha e registro;
- dinâmicas e cor sonora.
PROCESSO
Jo Ha Kyú
lento mais rápido correndo
introdução dispersão conclusão
Deve-se enfatizar que as improvisações melódicas (na música clássica do norte da Ín-
dia) não são variações da própria composição, mas elaborações das diferentes caracte-
rísticas do rãg(a), fraseadas contra a métrica do tãl(a). 9
Um tema pode ser composto de vários desses gestos. Por mais rico que um mo-
mento seja, e este momento pode ser incrivelmente pleno, o gesto temático ainda
se constitui em um detalhe inserido em um processo formal mais amplo. Seu pa-
pel e significado, como vimos, são definidos por estes processos e não o contrário.
De maneira análoga, não interessa o quão imaginativo sejam as transformações
de um gesto temático, tais transformações só podem ser entendidas como um
passo adiante no desenrolar dos processos formais e estruturais.
Lá-Lái,-Sii,
Q) descendente Ql ascendente
Juntos, definem o campo principal. Entre seus limites, Si 2 e Ré5, somente Fá#3 está ausente.
as notas
posições espaçlais
TEMPO
Esta peça parece iniciar de maneira muito simples tanto no tempo quan-
to no espaço. De fato, as lentas pulsações alternadas do início da peça parecem
eternas. Quase imperceptivelmente, entretanto, uma moldura é criada para um
processo temporal fora do comum em sua sutileza.
Nos compassos 1-30, ou seja, do início da movimentação principal até o
retorno ao nível original, ocorre um aumento constante de atividade em diversos
níveis temporais. Mesmo o início, aparentemente simples, superpõe três níveis
distintos de atividade, todas relacionadas por uma razão 2:1:
flautas
clarinetes
fagote fagote
Existe, entretanto, outro nível que ainda não foi abordado: a distância entre os
inícios de frase (e as dimensões das frases). Essas dimensões são mostradas, em
um modelo gráfico, no Exemplo P0.7.
De maneira fascinante, as dimensões das frases revelam as mesmas carac-
terísticas de aceleração presente em suas pulsações internas de atividade. As duas
frases internas, II e III, duram quase exatamente o mesmo que a primeira frase. 13
Isso caracteriza, de novo, uma diminuição na razão 1:2. Além disso, cada uma das
três frases iniciais é ~ucessivamente menos extensa - quase pela mesma razão:
14 9 6
(14:9 :: 64 9:6 :: 66)
Os algarismos arábicos indicam o número de compassos por frase. Um asterisco indica uma
ampliação sutil em sua duração ocasionada pela !":\. As áreas sombreadas nos fl-nais da frase I
e início da frase IV indicam justaposições.
grupo
1 harmônicos de cordas (violas, violoncelos, contrabaixos)
2 flautas
3 clarinetes
4 metais (trompa, trompetes, trombones e tuba)
5 cordas com surdina, solo
6 cordas com surdina, seção
7 metais com surdina
8 palhetas duplas (oboés, corne inglês, fagote, contrafagote)
9 cordas sem surdina, solo
10 cordas sem surdina, seção
11 cordas, sul ponticello (no cavalete)
frase I
A alternância entre uma sonoridade mais opaca e outra mais
monstrada no Capítulo 4 foi reescrita de acordo com esta escala
Podemos notar agora como a sonoridade inicial é sombria em
com as sonoridades posteriores. Esta sonoridade inicial é
dialmente pelos grupos mais inferiores da escala, 2 e 3. A segunda ú~A.A~A
de, em contraste, utiliza-se dos grupos 7 e 8. Esta alteração permeia a
frase II
A adição dos grupos 9 e 10 (cordas sem surdina, em seções e solo) aos grupos
8 e 7, utilizados na frase I, confere maior brilho à totalidade cor sonora
frase III
Na movimentação principal desta frase, as fundamentais atingem as extre-
midades e se justapõem rapidamente, preenchendo os espaços compreen-
didos entre si. Além disso, reflexões ascendentes e descendentes ocorrem
concomitantemente de maneira a magnificar, através de registros contras-
tantes, a justaposição de extremidades. Os espectros desta frase também
originam as combinações mais intensas e complexas da peça. Cores agudas
e brilhantes são combinadas neste momento com cores graves e opacas. No
final da frase (compassos 28-31), as características espectrais extremas são
justapostas. Por exemplo, o grupo 11 (o espectro mais agudo) no compasso
28 é oposto ao grupo 1 (o espectro mais grave) nos compassos 30-31. No-
vamente, três níveis - movimentação principal, reflexões e espectros - são
sincronizados. Cada um deles maximiza sua complexidade e seus contras-
tes, atingindo, por conseguinte, a maior intensificação de cor tonal.
Em outros aspectos, as cores desta frase são também as mais complexas.
Essas cores não mudam lentamente, mas sim de forma bastante rápida.
Pela primeira vez, apresentam ruídos de ataques significativos, incluindo os
tremoli nos compassos 28-29. Além disso, são preenchidas com vibrato (por
exemplo, da seção de cordas) e com batimentos (gerados tanto pela grande
quantidade de dobramentos como pelas mais densas superposições da mo-
vimentação principal e de suas reflexões). De fato, todos esses elementos,
no ponto de sua máxima intensidade (compasso 29), conferem à cor a com-
plexidade do ruído branco. O contraste direto entre esta sonoridade, que se
parece com o ruído branco, e a sonoridade semelhante a uma onda senoidal,
que ocorre a seguir (nos compassos 30-31, consistindo exclusivamente de
cores do grupo 1 e sem ruídos de ataque, batimentos ou vibrato significati-
vo), marca o clímax da obra. Esta justaposição sintetiza toda a gama disponível
de contrastes de cor tonal: em um extremo, o ruído branco e, no outro, a onda
senoidal.
ll m IV
comp~
grupo
11
9
8~~.-...,,..,_,,--~-~-~~-1-~
7
6
.5
4
3
2
- design;
- relacionamentos de linguagem;
- ritmo;
- cor.
encontra
deixa ao nosso alcance
ser analisado em níveis de
de capacidade nos
1. R. Buckminster Fuller em Operating Manual for Spaceship Earth (New York: Clarion, 1969, p. 59-60).
2. Gyõrgy Ligeti em "Abotit Lontano", encarte da gravação Heliodor-Wergo 2549 011.
3. Donald F. Tovey em The Main Stream ofMusic and Other Essays (Cleveland: Meridian, 1959, p. 278-
79).
4. Ibid., p. 275.
REGISTROS
O "Dó central" é o Dá4 . Seu registro inclui também a nota Lá4 , 440 cps, cuja
cidência do número 4 auxilia sua memorização. Os seres humanos geralmente
podem escutar um registro abaixo das notas mais graves do piano Dóº, 16
cps) e pelo menos dois registros acima da nota mais aguda do piano, Dó 8
Dó10 ,
16.744 cps). Este sistema de numeração de registros sem
toda a extensão audível dos seres humanos e pode ser facilmente ampliado de
maneira a cobrir qualquer distância desejada.
A contagem dos registros, a partir da nota Dó, é uma escolha arbitrária.
Em alguns contextos musicais, é preferível iniciar a contagem dos registros em
outra nota. Em uma peça musical na qual Si a nota mais importante,
movimentações em direção a esta nota - como uma escala (Fá#, Mi, Ré#, Dó#, Si)
- provavelmente serão formadas com regularidade. Quando a nota Si (ou qual-
quer outra) define regularmente as áreas musicais, esta nota deve ser escolhida
como o limite dos registros. Em tais situações, consideraremos todos os registros
como situados um semitom abaixo. Nos exemplos e discussões, sempre faremos
menção a este fato.
INTERVALOS
546 APÊNDICES
Os intervalos são produzidos pelo mesmo grupo de notas (Dó-
-Dó, Dó-Réi, e assim da primeira porém estão distribuídos de
maneira mais espaçada (entretanto nunca ultrapassando uma oitava). Esses in-
tervalos são chamados de complementos de oitava (ou simplesmente complemen-
tares) dos intervalos mais reduzidos.* A soma de um intervalo com seu comple-
mentar sempre equivale a 12 ((Q) + ÇÇ?;; <J) + :tp e assim por diante). Um intervalo e
seu complemento compartilham muitas características similares e são freqüen-
temente utilizados como equivalentes. A terceira linha mostra os intervalos pro-
duzidos pelas mesmas notas, contudo em uma distribuição espacial ainda mais
espaçada que a anterior. Todos os intervalos formados a partir de um mesmo par
de notas nominal constituem uma classe intervalar. Os intervalos Çf9;, <it @! e @!
integram a mesma classe intervalar. Em uma análise musical, é comum conside-
rar que os diversos intervalos de uma classe intervalar apresentam proprieda-
des similares. Geralmente, estes intervalos são identificados pela forma espacial
mais reduzida (ou pela forma mais comum) assumida pela classe intervalar em
uma obra - por exemplo, a classe intervalar ::J) - englobando os intervalos (1), <@,
@! e assim por diante.
Para propósitos de diferenciação:
sétíma ma.ior
548 APÊNDICES
mae
terça terça
menor
quarta Dó
NOTA
1. A extensão da gama audível dos seres humanos e a natureza singular da oitava são discutidas no
Apêndice B.
Você sabe que a nota não é algo simples, mas sim algo complexo!
Anton Webern1
550 APÊNDICES
psicofísica. Durante o (e mesmo antes), intensas especulações e
pesquisas no psicofísica desvendaram alguns dos mais diminutos e
invisíveis processos sonoros e de audição. 3
raios
cósmicos
ralos
gama foto-
rnio-x
ultravioleta
visual
infravermelho
radio
20.000
pressão
15.00 da
o '
cps
A ONDA SONORA
A onda sonora mais simples está representada no Exemplo B.2. Essa onda
é conhecida como onaa sinusoidal ou senoidal e pode ser produzida por um corpo
vibrante, como um diapasão ou corda.
Este exemplo é mais facilmente compreendido se as ondas forem lidas como se vibrando
interna e externamente, em um plano paralelo à superfície da terra, ao invés de cima para
baixo.
552 APÊNDICES
cons-
Embora as ondas senoidais sejam as ondas mais simples, elas nunca são
encontradas em estado puro na natureza ou na música. A razão disso é que os
corpos vibrantes tendem a vibrar por inteiro e em suas partes separadas ao mes-
mo tempo. Qualquer pessoa que já sacudiu uma corda observou um fenômeno
similar ao do Exemplo B.3a. Ao invés do contorno simples de urna onda senoidal,
a onda resultante é muito mais complexa e multifacetada. A totalidade do corpo
vibrante e cada urna de suas partes geram uma freqüência distinta. A onda do
Exemplo 3a pode ser compreendida como urna soma de diversas ondas senoi-
dais diferentes (Exemplo B.3c), sendo considerada, portanto, uma onda compos-
ta. Cada uma das ondas senoidais do Exemplo B.3c apresenta freqüência distinta,
durante o período desta onda composta: uma onda senoidal soa três vozes, outra
duas vezes e uma terceira somente uma vez. Dessa maneira, as partes de um
único corpo vibrante produzem um som composto constituído por diversas fre-
qüências simultâneas.
Muitos sons, mesmo aqueles que parecem ser um som único e simples, são
de fato compostos por uma grande variedade de freqüências. Quando tomamos
conhecimento da natureza composta das alturas, se torna fácil escutar muitos
sons diferentes em uma única nota grave do piano. Às vezes - por exemplo, no
som de um grande sino - podemos escutar facilmente as várias freqüências que
resultam de um único toque. Três grandes pesquisadores da natureza matemáti-
ca e física das ondas - Fourier, Ohm e Helmholtz - possibilitaram a compreensão
das complexidades das ondas sonoras e da natureza composta do som musical.
O princípio básico foi formulado por Helmholtz em seu livro On the Sensations
of Tone (1863), que estabeleceu o alicerce para o estudo psicofísico do som e da
audição: "A sensação de uma nota musical é composta por sensações de várias
notas individuais". 5
b)
a)
O exemplo B.3a mostra o período de uma onda composta. No Exemplo B.3c, são mostradas
as três ondas senoidais simultâneas que produzem o Exemplo B.3a. O Exemplo B.3b mostra a
soma das duas primeiras ondas (escritas em linhas sólidas) do Exemplo B.3c. O Exemplo B.3a
é a soma das três ondas senoidais.
554 APÊNDICES
·---~~·--.~.·-------------'------....;. ___
VIBRAÇÃO EM
p~rclal v
l l! 5 6 7 8 !l Hl n 12 l!I 14 1!i 115 11 Ul l!I
1!11 262 ll!lll 6!i5
!124 786 !117 1048 H 79 l!lHI 1441 1572 1711!1 UilS4 1!16!l 2096 2227 2!1!18 2489 2620
Dó> 1)64 Sol4 Dó!l Mi> So!5 S!l,5 Dó6 Réô M.ló Fá.#6 Soló Lá6 S!~il Si.6 067 06#7 Ré7 Ré#7 MF
l!ll 262 !192 52!1 659 7114 !12!1 IM6 1175 l!H!l .14!!0 l!i68 171ill 185!1 1!116 2003 2218 2!14!1 2489 26!17
A linha (a) mostra as freqüências dos vinte parciais obtidas através da multiplicação de 131
pelos números 1 a 20. A linha (b), para efeito de comparação, lista as freqüências das notas
mais próximas destes parciais no sistema de afinação temperado (veja Exemplo B.12).
O gráfico de unia onda que produz vinte parciais não é, de maneira alguma,
simples. Essa onda poderia assemelhar-se à onda do Exemplo B.5, cuja freqüência
fundamental de vibração é indicada pela recorrência dos períodos fundamentais.
556 APÊNDICES
mesma ~··~~· ~u.o~u."~" o com-
~~UUHQ
Reproduzido de Dayton C. Miller, The Science ofMusical Sounds (New York: The Macmillan Company, 1916).
Reimpresso com permissão da Case Western Reserve University.
558 APÊNDICES
A onda sonora B.6b é produzida por um sino. Como Miller ob-
servou: "não existe um comprimento de onda [ou período fundamental] aparente
[recorrente] nesta curva, e uma análise [matemática] de qualquer porção desta
onda provavelmente resultaria em uma equação contendo um número infinito
de termos". 9 O som resultante é um complexo que apresenta um vasto número de
diferentes freqüências, das quais nenhuma reforça a fundamental. Estes comple-
xos de alturas são denominados sons "sem altura definida" ou "ruídos".
O Exemplo B.7 mostra, de outra forma, o relacionamento entre altura e ruí-
do, através da comparação da nota Lá 4 (440 cps) tocada em um trompete com a
nota produzida somente por seu bocal. O trompete constituído de todas as suas
partes produz a fundamental, os próximos três parciais superiores e traços pos-
teriores de parciais até o décimo parcial. O bocal do trompete produz um som
mais complexo, cuja relação com a fundamental é de menor consistência. A linha
ondulada no quarto parcial indica uma freqüência que só aproximadamente é o
que esperaríamos (4 x 440 = 1760 cps). No décimo parcial, ao invés de harmôni-
cos simples, encontramos bandas de freqüências (indicadas pelos sombreados).
Essas não são meramente múltiplos da fundamental, mas se relacionam de ou-
tras maneiras com esta fundamental, sem que haja seu reforço. Estas bandas de
freqüências muito agudas (no âmbito de 4-7 khz, 4000-7000 cps), somadas aos
parciais aproximados 4 a 10, criam o ruído externo (o ruído da passagem do ar,
por exemplo) que integra o som de Lá4 tocado no bocal do trompete.
A maior parte dos ruídos resultam, portanto, de complexos de alturas. O
mais complexo desses é o ruído branco, um som que contém todas as freqüências
da gama audível em igual intensidade. O nome é derivado por analogia com a
luz branca, que contém todas as cores. Como som mais complexo, representa o
oposto sônico do som senoidal. Os ruídos coloridos são ruídos brancos que cobrem
somente uma banda limitada de freqüências (por exemplo, 500-2000 cps). Sons
de ondas do mar, da banda de rádio FM entre as estações e, em algumas línguas,
de chiados como shh são semelhantes aos ruídos brancos e coloridos.
Fica esclarecida, portanto, quão distinta é a realidade do som, revelada
através da análise cuidadosa, em relação às nossas concepções corriqueiras des-
ta realidade. Assim como a realidade física do livro que estamos lendo contém
moléculas e átomos, também os sons emergem como compostos e complexos de
elementos que não eram reconhecidos anteriormente. Os ruídos são sons espe-
cialmente breves ou complexos ao invés de eventos que carecem de uma altura
definida. É possível incorporar em um som aparentemente simples, como o Lá4
produzido pelo bocal do trompete, tanto elementos de ruído como de alturas de-
finidas. Os instrumentos produzem, com freqüência, ambos os elementos: por
7000
6000
50000
4000
3000
2000
o
bocal do
trompete trompete
Figura e excertos reproduzidos de Waves and the Bar, Willem A. van Bergeijk, John R. Pierce e Edward E. David,
Jr. Copirraite (1960) Doubleday & Company, Inc. Copirraite (1958) John R. Pierce e Edward E. David, Jr. Repro-
duzido com permissão da Doubleday & Company, Inc. e Heinemann Educational Books Ltda.
A audição dos seres humanos é variada. Pode ser afetada, por exemplo, pela
cultura: alguns africanos escutam sons que, para norte-americanos urbanos do
560 APÊNDICES
capazes escutar UAV"~'
somos bastante ignorantes em
relação e ambiente no e nas . . ~,_,~,_,'-,~
da audição a a seguir, não é neces-
sariamente uma descrição de humanos absolutos - estes nem sempre são
""·'-'-·''-'-'-'"' - mas sim uma descrição dos limites atualmente nas
culturas americanas e européias.
Nos mais jovens, a gama de freqüências audíveis estende-se de aproxima-
damente 16 cps até 25000 cps. Especialmente em freqüências a partir de 1000
cps, a audição declina progressivamente com a idade, resultando, portanto, em
diminuição significativa desta gama a dos 40 anos. No passado, as cul-
turas musicais geralmente selecionaram regiões distintas da extensão audível
para serem exploradas. Tais escolhas são complexas, afetadas por fatores tão di-
versos como a instrumentação disponível e o alcance da imaginação e
sônica. Por exemplo, tanto na Europa medieval quanto no Tibete budista, foram
desenvolvidas tradições de cantos vocais religiosos. O canto do Tibete freqüenta
as extremidades da gama audível: as vozes masculinas em registros surpreen-
dentemente graves (1-2) são ocasionalmente combinadas com címbalos e gongos
tremulando nas regiões mais agudas da extensão audível (registros 7-9). Os par-
ciais superiores das vozes e a percussão preenchem o espaço entre essas extre-
midades.12 O canto europeu, em contraste, movimenta-se em uma região média
e restrita (registros 3-5) - de maneira que possa ser cantado por quase todos - e
limitado de maneira que a música não desvie a atenção do foco principal, o texto
litúrgico. 13 As regiões audíveis mais graves não são exploradas e, embora as vozes
produzam alguns parciais superiores, as regiões mais agudas (4000 cps) geral-
mente também não são utilizadas. 14 Cada cultura é caracterizada pela região que
escolhe explorar. De fato, somente com a tecnologia eletrônica atual dispomos,
pela primeira vez, de uma instrumentação capaz de explorar de maneira criativa
toda a gama de freqüências audíveis de maneira equilibrada, ou seja, sem que a
instrumentação favoreça uma ou outra região desta gama por causa de suas limi-
tações intrínsecas.
Embora não seja possível examinar o mecanismo de audição do ouvido
em detalhes, devemos mencionar algumas conseqüências do processo de audi-
ção. Estas conseqüências afetam a diferenciação tanto de freqüências como de
intensidades. O ouvido escuta de maneira diferente nas várias regiões da gama
de freqüências audíveis. A pesquisa psicofísica descobriu que, à medida que a
freqüência aumenta, o ouvido torna-se cada vez mais sensível às mudanças de
freqüências. O Exemplo B.8 traça em uma curva o número total de diferenças
1400
1200
1000
800
..@;j 600
º'------===:i=::'.=-L-~L-~..L_~..L.~..L.~..L.~...1.--.~.L.........
16 31 62 125 250 500 1()00 2000 4000 8000 16000
~ 00 00 w ~ w ~ w ~ w ~
562 APÊNDICES
correlação direta e simples entre a pressão
e a a seguir, examina o caminho percorrido desde a
pressão da até a percepção e a comparação de seu volume.
Decibéis (db) são uma medida de pressão exercida por (ou, para dizer de ou-
tra forma, o poder elétrico disponível uma onda sonora. Tecnicamente, o ter-
mo para tal pressão ou poder é intensidade, o decibel é a medida de intensidade. A
gama de intensidades audíveis tem sido caracterizada da seguinte forma:
saxofone
oboé
lmrmõnka
tuba
voz masculina
feminina
caixa-dara
címbalo
db o 20 40 80 mo 120
Para um som de 1000 cps (que serve como uma referência padrão de fre-
qüência), O db de pressão produz um som praticamente inaudível. O aumento
de pressão que produz um som de O db é incrivelmente pequeno: 0,0002b de um
microbar de pressão do ar. O microbar equivale, aproximadamente, a um milio-
nésimo da pressão atmosférica normal. Três pontos na escala db têm significado
especial:
564 APÊNDICES
curva
um os sons
outros de maneira a serem inteligíveis (na u•"'"-~-~
Reproduzido de Harvey Fletcher, Speech and Hearingin Communication. Copirraite (1953), reimpresso com per-
missão da D. Van Nostrand. Co.
13 db = 2 vezes a pressão de 10 db
16 db = 4 vezes a pressão de 10 db
19 db = 8 yezes a pressão de 10 db
20 db = vezes a pressão de 10 db
22 db = 16 vezes a pressão de 10 db
Na curva de 60 fons:
são necessários 72 db para a freqüência 100 cps, ao invés dos 60 db
necessários para 1000 cps.
Na curva de 10 fons:
são necessários 45 db para 100 cps, ao invés dos 10 db necessários
para 1000 cps.
Essas curvas mostram que, nas regiões mais graves da gama audível, bem como
nas regiões mais agudas, para produzir determinado nível de intensidade, é ne-
cessária maior pressão (e, às vezes, uma pressão muito maior) do que na região
ideal de resposta do ouvido - entre 1000 e 4000 cps. Esta última região é a mais
sensível do ouvido e a que requer a menor pressão para registrar determinado
nível sonoro.
As medidas fons não são puramente físicas. As curvas de percepção igua-
litária de volume são o resultado de avaliações em testes binaurais (em ambos
os ouvidos). Nesses testes, um sujeito utilizando fones de ouvido escuta duas
* N. T. No original, loudness. É importante frisarmos a distinção entre intensidade, como medida física
(relativamente) absoluta de pressão (ou energia), e o volume, medida que se relaciona à percepção
subjetiva da intensidade.
566 APÊNDICES
uma em ouvidoº Após o sujeito em vo-
percebidos como suas intensidades (pressões) são medidas e
comparadasº Inicialmente desenvolvidos, em 1930, por Fletcher e Munson, estes
testes e curvas têm sido continuamente refinados desde entãoº
A importância da medida fan deve ser ressaltadaº Essa medida torna possí-
vel a pressão física com o volume sonoro percebido, eliminando erros
causados ao considerá-las como idênticas. Contudo, mesmo com os fans, um im-
portante aspecto do volume ainda não é medido. Fans indicam volumes equiva-
lentes, porém quando estes são desiguais, os fans não medem o grau de diferença
entre os volumes. Qual a diferença de volume entre 70 e 60 fons em 1000 cps? A
medida fan não pode nos fornecer esta resposta e os decibéis somente indicam a
diferença de pressão e não o quanto esta se traduz em volume percebido.
Para medir diferenças de intensidade percebida, um terceiro termo é utili-
zado: o sane. Sanes são concebidos como uma escala de volume percebido. O ob-
jetivo da escala sane é refletir precisamente o grau de diferença entre diferentes
volumes sonoros. Citando um dos pioneiros neste campo, "quando o número de
unidades nesta escala é duplicado, a magnitude da sensação (o volume percebido)
vivenciada por observadores típicos será duplicada". 20 Dois sanes soam no dobro
de volume sonoro de um sane.
Por definição, um sane equivale a quarenta fans. Um sane se localiza, por defi-
nição, no limiar da inteligibilidade. Foram realizadas pesquisas para determinar
qual nível de volume sonoro é percebido como o dobro de volume de um sane (ou
quarenta fans). Chegou-se à conclusão que, em quarenta e nove fans, o volume é
percebido como dobrado; conseqüentemente, quarenta e nove fans equivalem a
dois sanes. Cada nova adição de nove fans duplica novamente o volume percebido.
O Exemplo B.11 mostra, em um gráfico e em uma tabela numérica, a correlação
entre fans e sanes (no Exemplo R11b, observe que, em um volume sonoro menor
que um sane, a quantidade de fans necessários para reduzir o volume percebido
pela metade é irregular).
Diversos testes foram feitos para estabelecer e confirmar estes valores. O
mais simples consistia em reproduzir, primeiro somente em um ouvido e depois
em ambos, um som de intensidade fixa e medir o nível de volume em cada situa-
ção. Diversas verificações confirmaram que o volume sonoro registrado pelos
dois ouvidos, em comparação com o registrado em somente um, concorda com
a percepção de duplicação de volume. Na medida em que a escala sane resulta de
avaliações subjetivas: não pode ser considerada absoluta. Existe um âmbito de
variação, devido (inicialmente) às sutis diferenças na acuidade de escuta entre
dois indivíduos. Por causa dessas ligeiras diferenças e com o propósito de manter
Comparemos o seguinte:
a)
10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 no 120
volume sonoro em fons
Reproduzido de Harvey Fletcher, Speech and Hearing in Communication. Copirraite (1953), reproduzido com
permissão da D. Van. Nostrand. Co.
568 APÊNDICES
67
570 APÊNDICES
no que o obtido por dez violinos tocando juntos.
contrário do senso comum, o dobramento em uníssono de instrumentos (ou
vozes) semelhantes e o uso de amplas seções instrumentais não são os meios
primordiais para obter acréscimo no volume sonoro. 25
Confrontemos então um aparente paradoxo. Se um som de 100 cps a 70
fons ocorre simultaneamente a um som de 1000 cps a 70 fons:
A adição de um som de 100 cps de 10 sones a um som de 1000 cps com volume
equivalente produz 20 sones; o volume dobra. Nesse caso, o volume, ao invés da
pressão, é duplicado.
Em que situações o ouvido responde à pressão adicionada ou ao acrésci-
mo de volume? O ouvido responde às combinações sonoras de duas maneiras
distintas, dependendo do quão próximas ou separadas estão as freqüências. Se as
freqüências estão próximas (entre aproximadamente meia oitava ou menos), 27 os
impulsos adicionados aumentam a pressão na mesma região geral da membrana
do ouvido interno. Quando as freqüências estão mais amplamente separadas,
atuam em regiões diferentes da membrana do ouvido interno, possibilitando que
cada região desenvolva sua resposta plena ao volume sonoro. Nesse caso, além da
pressão, os volumes também são somados. A adição de sons de volume equivalen-
te em freqüências amplamente separadas produz um volume total muito maior
do que a adição de uma pressão equivalente em uma mesma freqüência.
Resumindo, em muitos aspectos o mecanismo de audição dos seres huma-
nos responde de maneira distinta às freqüências graves, médias e agudas. Nas
freqüências mais graves, o ouvido é menos sensível à mudança de freqüência e
intensidade. Nas extremidades da gama de freqüências, é necessária mais inten-
sidade para produzir um determinado volume do que em qualquer outra parte
da extensão audível. Além disso, o ouvido responde às freqüências amontoadas
de maneira distinta do que em relação às amplamente espaçadas. Portanto, as
gamas audíveis de freqüências e intensidades afetam-se mutuamente de diversas
maneiras. Embora o equipamento de recepção do ser humano seja incrivelmente
sensível à diversidade tanto de freqüência quanto de intensidade, ele não é um
mero gravador passiyo. Elementos como o impulso da onda, o aparato receptivo
do ouvido, a freqüência e a intensidade interagem entre si para determinar a per-
cepção final da altura e intensidade.
572 APÊNDICES
sistema de afinação temperado por 10 oitavas, em ciclos
277
1047
L ~·
a:m 8870
:3
3
3 5
terça maior ;5
sêti.ma maior : 11
11 12
e assim por
574 APÊNDICES
Diversos significados a estas razões entre as freqüências, desde
os tempos antigos o presente. Uma tentativa especialmente disseminada
a de derivar princípios de consonância e dissonância destas razões. De Pitágoras a
30
Rameau 29 e as razões entre as freqüências têm sido o fundamento
de abrangentes especulações teóricas. O fato desta especulação ter sido tão pre-
dominante (porém, ao mesmo tempo, tão inconclusiva e contraditória) represen-
ta motivo para minuciosa investigação.
Observemos que muitos dos intervalos (em nossa compreensão atual do ter-
mo) são expressos por diversas razões diferentes na série de parciais - na lista de
razões intervalares, isso pode ser constatado em todos os intervalos, exceto nos
dois primeiros ((!) e (~)). Se fôssemos identificar um intervalo com uma razão, não
poderíamos saber ao certo qual das diversas razões na série de parciais deveria
ser escolhida, ou seja, por que uma razão seria escolhida em detrimento de outra.
12
11
10
8
g
.·.:., 7
Ei
o
v
6
e
"''"o
"t:l
5
o
razão 2 3/2 5/3 514 413 8/5 615 36/25 9/5 9/8 15/8 27/25
intervalo 7 5 2
''
Reproduzido de Harry F. Olson, Music, Physics and Engineering (New York: Dover Publications, Inc., 1952), p. 260.
Reimpresso com permissão do editor.
576 APÊNDICES
visão.
SONORA
nx.~.u•v•1u B.14 - Espectros para Dó 4, produzido por uma voz soprano e quatro instrumen-
dos triângulos representa a intensidade relativa 35
11 13 15
12
578 APÊNDICES
exatamente no meio das áreas
uma característica instrumental mar-
cante até havia passado despercebida).
Os espectros de um instrumento são, portanto, multifacetados. De
fato, o conceito cor sonora de um instrumento deve ser substituído pelo con-
ceito de cores sonoras. Um instrumento é um recurso de cores tonais disponí-
veis. No Capítulo 4, as possibilidades musicais deste potencial de cores sonoras
são sistematicamente exploradas e a análise espectral é abordada com mais
profundidade.
O uso especialmente rico dos recursos de cor sonora de um instrumento
comum, a voz pode ser observado na linguagem falada. Cada vogal pode
ser considerada como uma cor tonal distinta com regiões formantes específicas,
demonstradas no Exemplo B.16. Embora os espectros de homens, mulheres e
crianças para uma determinada vogal sejam diferentes, as formantes são idênti-
cas, mesmo em um sussurro.
Quando a fundamental de uma voz masculina é grave, uma determinada vo-
gal produzirá um parcial superior forte na área formante desta vogal. Sem este
parcial, a vogal não pode soar. 38 Como Helmholtz revelou, existe uma escala de bri-
lho-opacidade para as vogais, que depende do nível da formante (Exemplo B.16). 39
As vogais aproximam-se dos sons compostos (compostos por uma funda-
mental e parciais superiores) em sua onda sonora. As formas complexas e tran-
sitórias das ondas das consonantes são similares àquelas associadas aos ruídos.
Entretanto, mesmo as consonantes (como o ruído) não deixam de apresentar
características gerais de altura. Algumas consonantes produzem bandas de fre-
qüência relativamente agudas, outras apresentam bandas relativamente graves.
Algumas produzem bandas limitadas e outras, bandas mais amplas. As relativas
concentrações de freqüências para as consonantes são demonstradas grafica-
mente no Exemplo B.17.
Ao aprender uma linguagem, os seres humanos aprendem a diferenciar co-
res sonoras tanto em alturas quanto em famílias de ruídos. Os seres humanos re-
velam, em sua linguagem, a capacidade de responder com precisão a uma ampla
gama de sinais de cores sonoras sutilmente variadas. 40
cps
cps
secundária
oo o o
o oo oo
o
'l-01 N o o o
N 00 ;:::
Reproduzido de Harry F. Olson, Music, Physics, and Engineering (New York: Dover Publications Inc., 1952), p. 255.
Reimpresso com permissão do editor.
580 APÊNDICES
vogais na - estas
HiluL,,uc1;:, (segundo Winckel) 37
Duas Pagais, "u" (took) e "::i" (tgck), foram omitidas. A Foga/ "u" precede "o", e";;," precede "a"
na escala de formantes das 17ogais.
Reproduzido de Fritz Winckel, Music, Sound and Sensation (New York: Dover Publications Inc., 1967), p. 14.
Reimpresso com permissão do editor.
Exemplo B.17 -As bandas de freqüências relativas das consoantes (segundo Potter, Kopp
e Kopp) 41
Reproduzido de Ralph K. Potter, G. A. Kopp e H. G. Kopp, Visible Speech (NewYork: Dover Publications, Inc.,
0
* N. T. No original, sawtooh.
582 APÊNDICES
os sintetizadores de
se encontram em entre os extremos: formas ondas quadradas
e triangulares (Exemplo 19). Alguns sintetizadores também produzem ondas
retangulares, ou pulsantes (pulse). Quando um sintetizador apresenta a capacidade
produzir ondas retangulares de amplitude variável, os espectros resultantes
apresentam variações na quantidade e relativa intensidade dos parciais, embora
sejam sempre compostos a dos integrantes da série de parciais.
Além dessas formas de onda, que oferecem sons senoidais e uma variedade
de sons compostos, os sintetizadores possuem tipicamente um gerador de ruído
branco, que produz sons complexos.
l
o
2
4
5
6
7 8
10
Reproduzido de Harry F. Olson, Music, Physics and Engineering (New York: Dover Publications, Inc., 1952), p. 260.
Reimpresso com permissão do editor.
fmt1i.H!ncia em
b)
584 APÊNDICES
t-
r-
-20 r
r-
7
9
1-
r'
.)
15
r-
J.. J.. J. l .! .1
100 400 1000 :moo
ddos por
Reproduzido de Harry F. Olson, Music, Physics and Engineering (New York: Dover Publications, Inc., 1952), p. 260.
Reimpresso com permissão do editor.
586 APÊNDICES
corresponde à sonora
mensurável externo ao corpo que o percebe).
o registro e a intensidade afetam substancialmente o som
produzido por forma de onda. Poderia se argumentar que as diversas
situações anteriormente citadas são todas excepcionais. Entretanto, a dispo-
nibilidade destes recursos, antes excepcionais ou mesmo impossíveis de serem
obtidos, constitui o dramático avanço da música eletrônica. Freqüentemente, o
resultado da produção de sintetizadores e da música eletrônica tem sido oferecer
possibilidades previamente inalcançáveis e, ao mesmo tempo, diminuí-las por
causa da imprecisão e da inflexibilidade do equipamento - eletrônico ou humano.
Quando um sintetizador suficientemente preciso e flexível está nas mãos de um
compositor que se coloca à serviço dos fatos psicofísicos fundamentais do som,
o potencial teórico da música eletrônica é realizado. Uma gama inteira de sons e
relacionamentos sonoros, previamente inatingíveis, torna-se então possível.
CONCLUSÃO
588 APÊNDICES
22. Urna análise deste teria que levar em conta ainda outro fator: o mascaramento.
Este aspecto não constitui um fator crítico para os propósitos da presente ilustração.
23. Portanto, db não são aditivos: 70 db + 70 db = 73 db, não 140 db!
24. De Siegrnund Levarie e Ernst Levy, Tone: A Study in Musical Acoustics (Kent, Ohio: Kent State Uni-
versity Press, 1968, p. 62).
25. Para saber os resultados efetivos do dobramento instrumental, veja o Capítulo 4.
26. Diferente dos decibéis, sones são aditivos.
27. Na literatura psicofísica, esta distância é denominada largura de banda crítica.
28. Batimentos acústicos, que resultam de adjacências muito próximas de alturas, são discutidos em
detalhes no Capítulo 4, A cor do som, na seção "Fenômenos de interferência". O número de batidas
por segundo (bps) é a diferença entre as freqüências muito próximas.
29. Jean-Phillipe Rameau, Cénération Harmonique.
30. Paul Hindemith em The Craft of Musical Composition (New York: Associated Music, 1937, Livro I,
p. 14-86). Além das razôes numéricas, Hindemith fundamenta sua teoria das consonâncias e dis-
sonâncias no fenômeno da combinação dos sons. O psicofisicista Plomp concluiu, entretanto, que
"sons combinados são, na prática, inaudíveis em relação aos níveis usuais de audição da fala e da mú-
sica". Por conseguinte, é "bastante improvável que sons combinados representem uma base consti-
tutiva da consonância musical, como Hindemith declarou". R. Plomp, Experiments on Tone Perception
(Soesterberg: Institute for Perception RVO-TNO, p. 44).
31. Olson, op. cit., p. 260.
32. Hemlholtz reconheceu (em 1863) que os intervalos podem mudar de significado em diferentes ins-
trumentaçôes e espaçamentos; Helmholtz, op. cit., p. 205-11.
33. Ibid., Capítulos I e II.
34. Ibid., p. 65.
35. Miller, op. cit., p. 171.
36. Olson, op. cit., p. 234.
37. Fritz Winckel, Music, Sound and Sensation, trad. T. Binckley (New York: Dover, 1967, p. 14).
38. Quando uma fundamental encontra-se sobre uma área formante, não há como uma determinada
vogal ser produzida. Por exemplo, as mulheres não podem cantar um "u" puro muito acima do Mi4
formante para esta vogal. Existem formantes secundárias; a partir destas, uma aproximação da vo-
gal pode ser atingida, porém não nos registros mais agudos das vozes femininas.
39. Hemlholtz, op. cit., p. 110.
40. Informaçôes mais detalhadas sobre as características da fala (masculina e feminina, sussurrada ou
falada, vogais e consoantes) podem ser encontradas em Fletcher, op. cit., Capítulos 1-5 e 18; R. K.
Potter, G. A Kopp, e H. G. Kopp, Visible Speech (New York: Dover, 1966); e Bertil Malmberg, Fonetics
(New York: Dover, 1963).
41. Potter, Kopp e Kopp, op. cit., p. 110.
42. Olson, op. cit., p. 212. Exemplos dos sons eletrônicos que discutimos podem ser escutados em The
Nonesuch Cuide to Eletronic Music (Nonesuch HC-73018).
43. Olson, op. cit., p. 213-214.
44. Paul Beaver e Bernard. Krause, o encarte da gravação The Nonesuch Cuide to Eletronic Music, p. 5 (No-
nesuch HC-73018).
45. Estes mesmos problemas são discutidos sob outro enfoque por Wayne Slawon, "Vowel Quality and
Musical Timbre as Functions of Spectrum Envelope and Fundamental Frequency", Journal of the
Acoustical Society of América, 43, p. 87-101, 1968.
Krishnãnanda Vyãsa1
590 APÊNDICES
•. u•.•U-HJ. ""'"'"··ª"'uv que as descrições
.,_, • • ~~. . u graus de precisão simplesmente nunca
4
na
Iniciemos com as sete notas básicas, que correspondem às notas do modo
•v•u~v europeu, também denominado ""''-cu.a
Sa Re Ga Ma Pa Dha Ni
Dó Ré Mi Sol Lá Si
(antigamente: Si~)
Entre essas notas, existem bemóis e sustenidos cromáticos. Além disso, pratica-
mente todas as notas sustenidas e cromáticas possuem diversas formas possí~
veis, sutilmente mais agudas ou graves. A seguir, a divisão em 27 notas sugere o
tipo de subdivisão da oitava geralmente utilizado nos rãgas do norte:
- Lá
60
Uma nota, Ga (Mi), por exemplo, é concebida como uma área dentro do espaço de
uma oitava, ao invés '1.e um único ponto fixo. Não é possível limitar exatamente o
número ou as afinações das variantes disponíveis.
Nitidamente, esta não é uma subdivisão da escala em partes iguais. Certas
áreas do espaço são densamente subdivididas e outras não. As alturas amontoam-se
592 APÊNDICES
- tetracordes inferiores com a nota Fá e Fá# ser combinados;
- em casos raros, mesmo as notas limites tetracarde nArlú>'n
nota inicial e final, Sa, pode atuar como sonante, consonante ou nenhuma des-
tas. Essa nota não está presente somente no início e no final, mas de maneira
contínua, como um bordão (drone note) permanente de acompanhamento, que é
característico da música indiana. Esse bordão fornece um ponto fixo, sobre o qual
todas as outras notas e intervalos são mensurados. sonante e a consonante
fornecem outros pontos de referência. Os sons não enfatizados de um rãga são
chamados de assonâncias. Sons que não pertencem ao rãga são dissonantes e não
podem ser utilizados.
A presença da sonante e consonante oferece ainda outra fonte de rãgas.
Uma coleção de notas pode se tornar um novo rãga através da seleção, a partir de
seus integrantes, de um novo par de notas predominantes. Tal escolha focaliza a
atenção, obviamente, nas relações intervalares formadas entre os sons predomi-
nantes e o restante tlo rãga. Ela destaca, conseqüentemente, certos aspectos dos
recursos intervalares de um rãga.
A estrutura tetracorda! dos rãgas fornece, portanto, um meio de forma-
ção de uma linguagem musical cujos elementos são reproduzidos e ampliados
594 APÊNDICES
(por exemplo, a âmbito de um rãga), pela complexidade crescente
das variações rítmicas e melódicas e pela aceleração do andamento ... 13
b)
-,--.-
'--=~--i--~
596 APÊNDICES
1. Krishnãnanda Vyãsa, Rãga Kalpa-drume (1843); citado em Alain Daniélou, Northern Indian Music
(New York: Praeger, 1968, p. 12). Utilizado com permissão.
2. Utilizamos dados obtidos especificamente a partir do autor Daniêlou, op. cit., e N. A. Jairazbhoy,
The Rãgs ofNorthern Indian Music (Middletown Conn.: Wesleyan University Press, 1971). O segundo
livro foi lançado posteriormente ao nosso. Apesar de divergências nos detalhes, constatamos que
este livro corrobora muitos de nossos principais argumentos. Em diversas ocasiões, incorporamos
seus pontos de vista.
3. Shãrngadeva, Sangita-ratuãkava (início do século XX, mas retirado do anterior Sangita-makaranda);
citado por Daniélou, op. cit., p. 23.
4. Esta não é urna característica exclusiva da música indiana. Na música européia, a descrição usual da
afinação temperada como doze subdivisões iguais da oitava também é uma aproximação. O piano
não é afinado pelo sistema exato de temperamento. Se afinado desta maneira, não soa corretamente
(veja o Capítulo 4 e as notas 7 e 9 deste capítulo). W. D. Ward e D. W. Martin em "Psychophysical
Comparison of Just Tuning and Equal Temperament in Sequences of Individual Tones", Journal of
the Acoustical Society ofAmerica (maio, 1961), concluíram: "As evidências indicam que a preferência
de urna pessoa, na construção de escalas, é mais determinada pela sua história individual de audição
e execução do que por considerações matemáticas a priori".
5. Danielou, op. cit. ,p. 56-57.
6. Jairazbhoy prefere descrever tetracordes de Ré-Sol e Sol-Dó; Ré~ pode substituir Ré. O princípio é
o mesmo tanto em Daniêlou quanto em Jairazbhoy: embora existam muitos rãgas diferentes, cada
um reproduz certos intervalos selecionados - os intervalos limítrofes dos tetracardes e, freqüente-
mente, também os intervalos dos preenchimentos. O ponto principal de Jairazbhoy é que os rãgas
apresentam simetrias intervalares, é a simetria (ou reprodução dos intervalos) de cada rãga que lhe
confere seu caráter específico.
7. Somanãtha, Rãga-vibodha (1610); citado em Daniêlou, op. cit., p. 62.
8. · Ibid., p. 62.
9. Daniélou, op. cit., p. 57.
10. Jairazbhoy, op. cit., p. 151. Unidades simétricas são aquelas que reproduzem relações intervalares
similares. Em nossa terminologia, estas unidades amplificam o conteúdo intervalar comum.
11. As frases foram obtidas dos exemplos presentes em Jairazbhoy, op. cit., Apêndice B. Estas frases são
notações de performances de cítara de Ustãd Vilayat Khan, que pode ser escutado na gravação que
faz parte do livro de Jairazbhoy.
12. Ravi Shanker, nas notas de gravação para Angel 35468.
13. Jairazbhoy, op. cit., p. 31.
- acordes de sétima;
- inversões;
- conexões lineares e elaboração de tríades;
- alterações cromáticas.
ACORDES DE SÉTIMA
598 APÊNDICES
V7, ou seJa,
.
li:lll:enntpllo D.2 - W. A. Mozart: Sonata para piano em Sib maior, K. 570, primeiro movimento,
compassos 125-136
""
elabo1:aci:ies através de notas de passagem bordaduras
deslocamentos de r""ldt·o
acorde de
acorde de
600 APÊNDICES
-O nona
segu.nda inversão:
lixen1pllo D.6 - W. A. Mozart: Sonata para piano em Sol, K. 283, primeiro movimento, com-
passos 8-10
602 APÊNDICES
compassos 1-3 definem a e
destes compassos. Nesse caso, a
e sexta a à definida pela nota Sol no baixo.
teoria de inversão de Rameau também é (se literalmente observa-
para em primeira inversão. Examine o Exemplo D.7. O baixo
destas duas progressões comuns apresenta I-IV-V-I: a tônica e seus rela-
cionamentos primários. Entretanto, somente a análise da primeira progressão
(Exemplo D.7a) está correta (de acordo com os princípios de Rameau). A segunda
progressão é comumente analisada como no Exemplo D.7b; tal análise ignora a
função de subdominante implicada em seu baixo. A análise do Exemplo D.7b é
tão questionável que o próprio Rameau abriu uma exceção para este caso. Ele o
considerava como uma harmonia IV com uma "sexta adicionada" - uma "adição"
triádica que contradiz a premissa fundamental (harmonias construídas em ter-
ças) de seu sistema.
Consideremos outro exemplo: a segunda harmonia do Exemplo D.6 é IV6.
Caso esta passagem fosse recomposta como no Exemplo D.8, a função seria
mais fortemente expressa pelo baixo, ainda que a harmonia substituta, que ex-
pressa o sentido de IV, não seja um IV!
604 APÊNDICES
com
em seu
606 APÊNDICES
o
nota de passagem (P) Preenche o espaço entre duas notas triádicas, cons-
(Exemplo D.lOa) tituindo uma adjacência entre elas; as notas da
tríade podem ser membros da mesma tríade ou de
duas tríades sucessivas diferentes.
Geralmente, ocorre entre os tempos do compasso;
quando ocorre diretamente no tempo, é denomi-
nada de "nota de passagem acentuada". Esta possi-
bilidade é menos freqüente do que a anterior. No-
tas de passagem são possíveis em todas as vozes.
nota vizinha (N) Uma nota adjacente a uma nota da tríade, ocor-
(Exemplo D.lOc) rendo tanto antes ou depois desta (mas não uma
P ou R).
Ocorre em posições rítmicas fracas.
É menos comum do que as notas de passagem e
retorno.
descendente.
Na música século era um
elemento expressivo e extremamente
necessitando especial de
execução:
608 APÊNDICES
locais
e)
610 APÊNDICES
a lógica das ela-
uma ou mais células que produzem um cará-
ter expressivo específico.
D.12
lu11:mo1nia tonidzada
612 APÊNDICES
Cada nova tonicização a célula V-Idos compassos 1-2 em um novo
nível (compassos 5 e - IV; IF - V). análise mostra como a "~·-.. ~·
zação transforma a ascendente da produzindo (na tonalidade de
maior) sonoridades inesperadas (Dó# e Ré#) posteriormente
retornam às suas formais originais a descendente que retorna
a frase é, ao mesmo tempo, lógica e aw-1.a<-•voa.
A tonicização ser mais elaborada as possibilidades apresenta-
das nestes exemplos. Uma pode ser tonicizada por do sua do-
podendo ser precedida por toda uma progressão que prossegue em
reção à harmonia tonicizada como se esta fosse uma tônica. No Exemplo D.14, o
II tonicizado (compassos 4-6) é apoiado pelos seus próprios IV e V, assim como o
I inicial foi estabelecido por estas mesmas harmonias primárias. Dessa maneira,
uma ampla progressão tonal por quintas em direção à dominante (VI - é
elaborada durante uma frase inteira.
A instância da tonicização consiste na modulação. Na modulação,
uma harmonia que não seja I é tratada como se fosse a tônica por um período
de tempo relativamente longo, é repetidamente atingida através das próprias
progressões de quintas e serve de objetivo para as próprias movimentações
neares. Enquanto na tonicização a progressão move-se rapidamente através da
harmonia tonicizada para a tônica original, na modulação o sentido de tônica é
temporariamente alterado. A "nova" nota (com sua própria tríade) momentanea-
mente adquire o sentido e a sensação de ser uma tônica objetivo. 6 A modulação
produz um paradoxo, na medida em que os ouvidos tonalmente educados acei-
tam a "nova tônica" como objetivo da movimentação tonal, mesmo sabendo que
esta "tônica" é, em última instância, instável e que será por fim substituída por
um movimento posterior em direção à tônica original.
616 APÊNDICES
Não ternos esforços claro o sentido das progres-
sões tonais. tonalidade resulta de uma progressão linear-harmônica em
reção à tônica. As harmonias dessas progressões podem ser ornamentadas por
notas elaboradoras adjacentes, definidas na terceira seção deste apêndice. Vimos
também que as inversões (em alguns contextos) também desempenham funções
lineares, tais corno continuar, conectar e ornamentar as harmonias mais forte-
mente definidas. Entretanto, para compreender plenamente o papel linear das
harmonias, é necessário perceber que as harmonias podem apresentar as mes-
mas funções elaboradoras e conectivas das notas simples: função de passagem,
bordadura e vizinhança. Cada um desses casos é ilustrado no Exemplo D.15. Nes-
tas passagens, certos eventos podem ser explicados de duas maneiras:
Exemplo D.15
a)
618 APÊNDICES
D.16 - V'lr A. rvfozart: Fantasia em Ré menor, K 397, compassos 1-13
620 APÊNDICES
(dois esboços lineares-harmônicos da passagem, o esboço de baixo elimina as redundâncias)
- progressões de harmonias
- movimentação (e elaboração) através
espaciais.
622 APÊNDICES
l, O arpejo é a ocorrência sucessiva das notas de uma harmonia, ao invés de sua ocorrência simultânea,
É uma técnica simples e comum para estender uma harmonia no espaço e no tempo,
2, Jean-Philippe Rameau em Traitê de l'Harmonie (Paris: Ballard, 1722), Livro II, Capítulo 18, Art,1,
trad, O Strunk; citado em O, Strunk, ed" Source Readings in Music History: The Baroque Era (New
York: Norton, 1965), p, 207,
3, C P E, Bach em Essay on the The Art of Playing Keyhoard Instruments, ed, e trad, W, J, Mitchell (New
York: Norton, 1949, p, 88),
4, Leopold Mozart, A Treatise on the Fundamental Principies ofViolin Playing, trad, E, Knocker (London:
Oxford University Press, 1948, p, 171),
5, Uma harmonia alterada de maneira a agir como uma dominante tem sido freqüentemente deno-
minada dominante secundária, Na análise, esta dominante tem sido às vezes indicada por V/V, sig-
nificando o V de V Nós preferimos nossa indicação, pois o quadrado pontilhado mostra claramente
que a harmonia que está sendo enfatizada é a harmonia tonicizada e que nenhuma alteração (ou
distorção) da progressão por quintas ocorre na progressão dos numerais romanos,
6, De fato, um elemento comum da modulação é a obliteração da tônica original através de alterações,
Portanto, uma modulação na tonalidade de Mib de I para V incluirá, em algum momento, a nota Mi~
ao invés de Mib, O Mi~ oblitera, temporariamente, a tônica Mib (veja Beethoven em Sonata para piano
em Mib, op, 31, n 3, primeiro movimento, compassos 40-45),
7, Compare as Variações para piano de Webern, terceiro movimento (discutido no Capítulo 2), Nesta
peça, o princípio mozartiano é sistematizado, de maneira que cada nota apresente dois relaciona-
mentos diferentes de semitom,