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Resenhas
Escravidão, Direito e Justiça
no Brasil Colonial
Keila Grinberg*
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Ver, entre outros, Arthur L. Stinchcombe, Sugar Island Slavery in the Age of Enlightenment: The
Political Economy of the Caribbean World, Princeton, Princeton University Press, 1995; Mimi
Sheller, Democracy after Slavery: Black Publics and Peasant Radicalism in Haiti and Jamaica,
Miami, University of Florida, 2000; Hebe Mattos, Das cores do silêncio – significados da liberdade
no Sudeste escravista. Brasil. Século XIX, Rio de Janeiro, Arquivo Nacional, 1995; Rebecca Scott,
Thomas Holt & Frederick Cooper, Beyond Slavery: Explorations of Race, Labor, and
Citizenship in Postemancipation Societies, Chapel Hill e Londres, The University of North
Carolina Press, 2000.
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Ver, entre outros, Sidney Chalhoub, Visões da Liberdade, São Paulo, Companhia das Letras,
1990, e Hebe Mattos, Das Cores do Silêncio, op. cit.
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Ver, por exemplo, Joseli Mendonça, Entre A Mão e os Anéis: a lei dos sexagenários e os cami-
nhos da abolição no Brasil, Campinas, Editora da Unicamp, 1999; Eduardo Spiller Pena, Pa-
jens da Casa Imperial: Jurisconsultos e escravidão no Brasil do século XIX, Campinas, Unicamp,
2001; Keila Grinberg, O fiador dos brasileiros: escravidão, cidadania e direito civil no tempo de
Antonio Pereira Rebouças, Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2002.
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Arquivo Nacional (Coord.), Guia Brasileiro de Fontes para a história da África, da escravidão
negra e do negro na sociedade atual, Rio de Janeiro, Arquivo Nacional/Departamento de Impren-
sa Nacional, 1988; Rebecca Scott, Thomas Holt, Frederick Cooper, Aims McGuinness, Societies
after Slavery: a selected annotated bibliography of printed sources on Cuba, Brazil, British
Colonial Africa, South Africa, and the British West Indies, Pittsburgh, University of Pittsburgh
Press, 2002; Robert Conrad, Brazilian Slavery: an annotated research bibliography, Boston,
G.K. Hall & Co., 1977.
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Silvia Lara (org.), Ordenações Filipinas: Livro V, São Paulo, Companhia das Letras, 1999.
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Ver, deste autor, principalmente, Poder e Instituições na Europa do Antigo Regime, Lisboa, 1984.
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versos grupos sociais, todos com algum locamento de sentido, realizado por ad-
grau de poder na administração colonial, vogados e aceito em várias instâncias ju-
a Coroa preocupava-se, na medida do diciais, caracterizou efetivamente, no fi-
possível, em não interferir no poder se- nal da vigência da escravidão no Brasil,
nhorial e no direito de propriedade do uma interferência do poder público nas
senhor sobre seu escravo. Quer dizer: relações entre senhores e escravos.
mesmo regulando a vida cotidiana dos Tal inversão no uso da legislação tam-
escravos (como o excesso de “luxo” de bém chama a atenção para um outro as-
certas escravas), mesmo buscando corri- pecto: a necessidade de se levar em con-
gir os abusos dos senhores, mesmo ten- ta tanto a famosa intenção do legislador
tando limitar os castigos, o governo rea- quanto a interpretação dos que aplicam
firmava a intenção de não interferir no a lei, ou seja, para se analisar a lei, é pre-
poder dos senhores sobre seus escravos. ciso levar em conta a “historicidade na
Se isto realmente ocorreu no período produção das normas legais e seus signi-
colonial, como defende a autora, o mes- ficados” (p. 46). Esta historicidade é tão
mo não ocorreu durante o Império, como mais importante quando o objeto de es-
ela mesma demonstra, ao final da intro- tudo é um fenômeno extremamente
dução. Argumentando que, mesmo sem complexo, de mais de três séculos de
que tenha havido uma tentativa explíci- duração e características distintas em di-
ta de codificação da legislação escravista, ferentes épocas e regiões.
tal como ocorreu na América espanhola,10 Com a organização de Legislação sobre
existia no Brasil uma tradição legislativa escravos africanos na América Portuguesa,
relativa à escravidão; esta tradição, ao ser Silvia Lara contribui decisivamente para
sistematizada por Agostinho Marques os estudos sobre direito e escravidão no
Perdigão Malheiro, em seu Escravidão no Brasil, e isto não só porque as fontes por
Brasil: ensaio histórico, jurídico, social, pu- ela disponibilizadas impulsionarão novas
blicado entre 1866 e 1867, foi a base ju- análises sobre o assunto. Sua análise é
rídica a partir da qual advogados e juízes fundamental por demonstrar, até mesmo
emancipacionistas e abolicionistas funda- na maneira como estrutura seu argumen-
mentaram legalmente seus argumentos to, a renovação que os métodos e as pers-
em prol da liberdade dos escravos. O que, pectivas da história social vêm proporci-
no século XVII, havia sido, por exemplo, onando ao campo da história do direito.
uma legislação relativa ao apaziguamen- Ao longo de sua introdução, a autora dei-
to de rebeliões escravas, era usado, em xa bem claro que a consulta ao texto le-
meados do XIX, para fundamentar ações gal, por si só, não permite a compreen-
cíveis de liberdade, com significado to- são da situação social à qual ele se relaci-
talmente diferente do original. Este des- ona. Para ler a lei, é preciso olhar para a
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Para a legislação escravista na América espanhola, ver, de Manuel Lucena, “Leyes para
esclavos: el ordenamiento jurídico sobre la condición, tratamiento, defensa y represión de los
esclavos en las colonias de la América española”, José Andrés-Gallego (Coord.), Nuevas
Aportaciones a la Historia Jurídica de Iberoamérica, Madrid, Fundación Histórica Tavera, 2000
(publicação eletrônica).
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