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Exotismo e teatro jesuítico na Amazônia barroca (séculos XVII e XVIII).

DÉCIO DE ALENCAR GUZMÁN


Professor e pesquisador da Faculdade de História da UFPA.

I. EXÓTICO-EXOTISMO
No século XVI europeu, as séries de objetos que compunham as coleções dos
Cabinets de Couriosité recebiam as classificações herdadas da alta Idade Média.
Classificavam os objetos então como: exotica, mirabilia, naturalia, artificialia, e
scientifica. Era classificada como exotica, sobretudo, a parte das coleções composta
por objetos provindos de países ou domínios “estranhos”. A partir do século XVI, as
rotas marítimas abertas pelos portugueses davam passagem à circulação de objetos
raros. Em 1539, a nobreza indígena do México oferecia um mosaico de penas ao papa
Paulo III, o mesmo que, através da bula Sublimis Deus (1537), declarou-se contra a
escravidão dos índios na América 1. Em 1577, o galiciano Bernardino de Escalante
manifestava seu prazer diante dos objetos que encontrara nos armazéns de Lisboa
trazidos da China: “as camas, as mesas, os pratos, os escudos”, fabricados e pintados
com motivos vegetais, animais e aviários 2. Em Florença, os Médici curiosos e
abastados colecionavam objetos mexicanos: códex pintados e manuscritos, mosaicos
de turquesa, mitras decoradas com penas multicoloridas, objetos de jade e de
obsidiana 3. As peças denominadas pelos adjetivos indiano e moresco, especificando a
proveniência remota, eram rapidamente integradas à categoria mais geral dos
exotica. Na verdade, tratava-se de uma classificação fluida e ambivalente, visto que os
objetos poderiam referir-se às várias categorias simultaneamente 4. Contudo, no jogo
de espelhos que eram as culturas introjetadas pelas nações européias em suas
colônias americanas, como poderia ser compreendido e definido o “exotismo” da
época barroca — a partir da segunda metade do século XVII — nas conquistas

1 GRUZINSKI, Serge. Les quatre parties du monde: histoire d’une mondialisation. Paris : La Martinière,
2004, p. 45.
2 Idem, ibidem.
3 HEIKAMP, Detlef. Mexico and the Médici. Florence: Editrice Edam, 1972, p. 35, apud GRUZINSKI,
Serge. Les quatre parties du monde: histoire d’une mondialisation. Paris : La Martinière, 2004, p. 45.
4 O termo exótico indica tudo o que não é natural do país; associado ao adjetivo latino “ extraneu”,
ganha, por extensão, mais um sentido: “estrangeiro”. O caráter essencialmente político deste termo
emerge quando se desvelam os seus significados possíveis. Pela via da expressão negativa, o termo está
amalgamado às qualidades de: esquisito, excêntrico, esdrúxulo, extravagante. Neste caso, o sentido
pejorativo, a significação negativista mostra-se como atributo do que não está vinculado ao centro do
mundo — a Europa. Foi esta significação para o “exótico” que mais se difundiu no mundo europeu
durante o século XVI, por tratar-se de poderoso auxílio para a representação da identidade do Velho
Mundo. Uma identidade que se afirmou com a expansão marítima, a conquista e dominação das
sociedades americanas e a mimetização dos modos de vida e de pensamento europeus no continente
americano. O processo de “exotização” das culturas está entranhado no processo de ocidentalização
característico do Antigo Sistema Colonial. KEMP, Martin, “‘Wrought by no artist’s hand’: The natural,
the artificial, the exotic, and the scientific in some artifacts from the Renaissance”, FARAGO, Claire
(ed.). Reframing the Renaissance: Visual Culture in Europe and Latin America (1450-1650). New
Haven and London: Yale University Press, 1995, pp. 177-196; MASON, Peter. Infelicities:
representations of the exotic. Baltimore: The Johns Hopkins University Press, 1998.
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portuguesas às margens do rio Amazonas? Fora da Europa, no próprio interior dos


países americanos, no interior da floresta equatorial americana, o exotismo possuía
quais marcas? Que sentidos? Quais significações?
Para tentar responder a estas questões, pretendo analisar as relações entre
cerimônias teatrais jesuíticas e jogos de poder político na Amazônia dos séculos XVII
e XVIII. Apresentarei de modo particular, três episódios que ilustram as ligações
entre os jogos políticos e a cultura das aparências — em particular o teatro —, tal
como se produziram no Estado do Grão-Pará e Maranhão, à época na qual os padres
da Companhia de Jesus exerciam influência e controle de maior parte das aldeias
indígenas e imiscuíam-se dos negócios da sociedade colonial portuguesa na região.
II. O QUADRO INSTITUCIONAL: A COMPANHIA DE JESUS NO ESTADO DO GRÃO-PARÁ E
MARANHÃO
É a 13 de julho 1621 que uma decisão da coroa portuguesa cria o Estado do
Maranhão. O desenvolvimento de centros coloniais portugueses na ilha de São Luís
do maranhão, a partir de 1615, e na desembocadura do Amazonas a partir de 1616,
como também a possibilidade de manter comunicação direta com Lisboa, justificou a
criação desta administração separada para o território amazônico. A função deste
novo centro de governo era preservar e expandir as conquistas portuguesas ao longo
do rio Amazonas, até os confins fronteiriços dos territórios espanhóis, nos Andes
peruanos. Esta nova jurisdição é dotada de administração própria, diferente daquela
do Estado do Brasil. Antes desta transformação, a região dependia do Governo Geral
do Estado do Brasil, sediado na Bahia, que era depois de 1548, o organismo central de
todo o Brasil português.
Neste momento, o Estado do Maranhão é constituído pelas capitanias do
Maranhão (fundada em 1615), do Pará e do Ceará. Ele desaparece em 1652, para
deixar seu lugar à Capitania do Maranhão, e é restabelecido em 1654 sob o nome de
Estado do Maranhão e Pará. Até 1737, São Luís (fundada em 1612, pelos franceses) é a
sede da administração de todo o Estado. Após esta data, a sede é transferida para
Santa Maria de Belém do Grão-Pará, povoado nascido a partir de um fortim,
construído por razões estratégicas, às margens da baía do Guajará. Desde a segunda
metade do século XVII, o Pará começa a tirar proveito do crescimento econômico
fundado na exportação das especiarias da floresta, as “drogas do sertão” como eram
denominadas, e de alguns produtos agrícolas como o tabaco, o arroz e o anil.
A Companhia de Jesus acompanhou a penetração portuguesa na Amazônia,
criando postos avançados de difusão da doutrina cristã — espalhados em pontos no
interior da floresta — a começar pelas cidades de Belém e São Luís. A presença
institucional da Companhia de Jesus no Grão Pará e Maranhão segue uma curva
ascensional, ano após ano, salvo nas duas grandes “rupturas” desta curva, que são os
momentos de expulsão dos padres nos anos de 1661 e de 1684. Assim, o número de
entradas, de residências, de aldeias missionárias, de Colégios e de fazendas, é cada
vez maior ao longo dos séculos XVII e XVIII (LEITE, 1943, III).
Desde o princípio, a missão jesuítica no Maranhão e Grão-Pará contou com
líderes eficazes e suficientemente hábeis para manter estreitas ligações com as
autoridades locais e metropolitanas. O primeiro superior da Missão, o português Luiz
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Figueira, desenvolveu intensa atividade na corte de Madri, entre os anos 1637 e 1643,
para obter o apoio necessário à fixação dos padres jesuítas no Grão-Pará e Maranhão,
o que, de fato, não ocorreu antes da sua morte 5. Em junho de 1643 a missão do
Maranhão foi confiada ao padre Antônio Vieira, que, antes dessa tarefa, havia sido
confessor do rei de Portugal, João IV, e preceptor de Teodósio, o príncipe herdeiro.
Chegando ao Maranhão em 1653, Vieira usou toda a sua influência sobre o espírito do
rei e sobre sua rede de amigos na Corte portuguesa para fazer prevalecer os projetos
da Companhia de Jesus nas missões do Maranhão e Grão Pará.
Os documentos legais emitidos pela Coroa portuguesa com a intenção de
monopolizar o controle e a captura da mão-de-obra indígena na Amazônia durante os
séculos XVII e XVIII concederam à Companhia de Jesus um papel político relevante.
Coube aos superiores da missão do Maranhão a constante reivindicação da liberdade
para as sociedades indígenas escravizadas pelos portugueses. Bom exemplo disto é a
Provisão de 9 de abril de 1655. Neste documento, são apresentadas as condições
legais sob as quais poderiam ser capturados e escravizados os nativos que habitavam
a floresta. Os pontos abordados na lei confluíam para os interesses dos jesuítas. Isto
foi possível, porque o superior da missão, padre Antônio Vieira, obteve para a
Companhia — através de manobras na Corte de Lisboa — a exclusividade da ação
missionária jesuítica no Estado do Maranhão, como também obteve o direito de
controlar o repartimento dos índios livres das aldeias para trabalharem com os
moradores das fazendas e das cidades do Estado. A este bom resultado para a política
missionária dos jesuítas seguiram-se outros de igual importância ao longo do século
XVII e XVIII.

III. GUERRAS INDÍGENAS E ESPETÁCULO BARROCO NO SÉCULO XVII.


Dentro deste quadro, se realizaram as grandes festas barrocas no Grão Pará do
século XVII. Na correspondência de Vieira com o rei de Portugal Afonso VI — que não
era muito afeito aos jesuítas e a Vieira em particular — ficaram descritas as entradas
dos missionários jesuítas pelo Rio Amazonas entre os anos de 1654 a 1658. Relato
barroco, o texto de Antônio Vieira oferece ao rei Afonso VI o mínimo detalhe dos fatos
e celebrações. Ele deseja ser exaustivo na sua descrição.
As entradas eram expedições ocasionais realizadas pelos moradores
portugueses das vilas e povoados do litoral ao interior da floresta amazônica. Podiam
ser de caráter público ou privado e tinham como objetivo a busca de escravos ou a
exploração dos produtos da floresta (plantas, animais, minerais). A legislação
portuguesa deste período exigia que estas expedições fossem acompanhadas de
missionários. A eles cabia a decisão de legitimar ou não a captura de escravos índios
efetuadas ao longo do percurso.
A ilha do Marajó é o teatro deste relato. Nela viviam diferentes nações
indígenas, todas agrupadas pelos missionários sob o nome de Nheengaíbas (Mapuás,

5 O padre Luiz Figueira morre na Ilha do Marajó, em 3 de julho de 1643 , durante o naufrágio do barco
em que vinha da Europa. Entre 1580 e 1640, o reino de Portugal foi governado pelos reis espanhóis da
dinastia dos Habsburgos. É o período que a historiografia portuguesa e espanhola convencionou
chamar de “união ibérica”.
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Anajás, Paucacás, Pixispixis, Combocas, Guajarás, Joanes, Sacacas, Marauanás,


Mamayanás, Aruãs e outras). A ilha do Marajó, segundo Vieira, era “de maior
comprimento e largueza que todo o reino de Portugal” (Vieira, 1997, I : 534). De fato,
trata-se da maior ilha flúvio-marítima do mundo, com cerca de 49.000 km². A
vegetação predominante é de tipo savana, mas intercalada de áreas pantanosas e de
florestas densas. Numerosos rios e igarapés recortam o terreno formando pequenas
ilhas. No século XVII as viagens eram longas neste território e, como veremos mais
adiante, as condições naturais tornavam a região impenetrável para os europeus.
Os portugueses que haviam tido os primeiros contatos em 1654 com estas
nações indígenas em boa paz, logo fizeram sentir aos grupos indígenas as suas
violências e o cativeiro. Os Nheengaíbas, por sua vez, “tomaram as armas em defesa
da liberdade e começaram a fazer guerra aos portugueses”. As táticas da guerra
movida contra os portugueses pelos Nheengaíbas eram o bloqueio naval dos
principais caminhos e entradas (rios e canais) da ilha; e os constantes ataques aos
acampamentos e fortificações dos portugueses e das outras nações indígenas suas
aliadas (VIEIRA, 1997, I : 534). Mas foi sobretudo a destreza dos Nheengaíbas no uso
que faziam dos recursos de defesa que lhes proporcionava a floresta que frustrou os
esforços dos portugueses. Seguimos a descrição de Vieira:
“É a ilha toda composta de um confuso e intrincado labirinto de rios e
bosques espessos; aqueles, com infinitas entradas e saídas, estes, sem
entrada nem saída alguma, onde não é possível cercar, nem achar, nem
seguir, nem ainda ver ao inimigo, estando ele, no mesmo tempo, debaixo da
trincheira das árvores, apontando e empregando as suas frechas” (VIEIRA,
1997, I : 535).
Dispersando-se com suas famílias pela floresta, desfazendo as suas povoações
para que nunca fossem encontrados todos juntos pelos portugueses, os Nheengaíbas:
“(...) ficaram habitando toda a ilha, sem habitarem nenhuma parte
dela, servindo-lhes, porém, em todas, os bosques de muro, os rios de fosso, as
casas de atalaia, e cada nheengaíba de sentinela, e as suas trombetas de
rebate.” (VIEIRA, 1997, I : 535-536).
Contudo, havia outra situação que constrangia os portugueses a agirem
rapidamente. Os Nheengaíbas entretinham relações de comércio com os holandeses
que percorriam as costas das Antilhas, negociando grandes quantidades de animais
dos rios e das florestas como o peixe-boi (manati) em troca de armas outras
bugigangas. Os portugueses temiam a aliança entre batavos e Nheengaíbas, e o
grande poder militar que resultaria desta união. Vieira dirá mais tarde:
“com os Nheengaíbas por inimigos seria o Pará de qualquer nação
estrangeira que se confederasse com eles, e com os Nheengaíbas por vassalos
e por amigos, fica o Pará seguro e impenetrável a todo o poder estranho.”
(VIEIRA, 1997: 546)
Nestas circunstâncias, após quatro anos de guerras, os Nheengaíbas,
respeitados pela sua ousadia, pela cautela, pela astúcia e pela sua constância,
obrigaram os portugueses a tomarem uma decisão concreta. Reúne-se, então o
Conselho do Governador do Maranhão em 1658, decidindo-se pela guerra. Intervém,
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então Antônio Vieira, sugerindo que enquanto se realizassem os preparativos para a


guerra, ele tentaria persuadir os Nheengaíbas a aceitarem a paz. Sugestão que é
aceita pelo Conselho.
No dia de Natal de 1658, Vieira envia dois índios de sua confiança em
embaixada, com uma carta dirigida aos chefes Nheengaíbas. Estes dois índios são
também eles de nação Nheengaíba. Nesta carta Vieira explica aos chefes que os
cativeiros injustos dos portugueses havia acabado, e que daí em diante os índios não
mais serão molestados com escravidões e violências da parte dos brancos. Diz na
carta que ficaria aguardando uma resposta “para ir às suas terras”. Com certa
demora chegaram os emissários acompanhados de sete líderes Nheengaíbas,
acompanhados de muitos outros índios das mesmas nações, que desejam render
homenagens ao “Padre grande” e declarar os seus propósitos de paz. Afirma Vieira
que:
“(...) Foram recebidos com as demonstrações de alegria e aplauso que
se devia a tais hóspedes, os quais, depois de um comprido arrazoado, em que
desculpavam a continuação da guerra passada, (...) concluíram dizendo:
‘Mas, depois que vimos em nossas terras o papel do Padre Grande, de que já
nos tinha chegado fama, que por amor de nós e da outra gente da nossa pele
se tinha arriscado às ondas do mar alto, e alcançado de El-Rei para todos nós
as cousas boas; posto que não entendemos o que dizia o dito papel, mais que
pela relação destes nossos parentes, logo no mesmo ponto lhe demos tão
inteiro crédito que, esquecidos totalmente de todos os agravos dos
Portugueses, nos vimos aqui meter entre suas mãos, e nas bocas das suas
peças de artilharia; sabendo decerto que, debaixo das mãos dos padres, de
quem já hoje a diante nos chamamos filhos, não haverá quem nos faça mal.’”
(VIEIRA, 1997, I : 538)
Neste momento ficou acertado entre as duas partes que Vieira iria para a ilha
do Marajó durante as festas de São João — no mês de junho — , com o objetivo de
celar o contrato de paz efetuado com os sete chefes. Porém, Vieira só pôde viajar para
a Ilha no mês de agosto, porque adoecera em Cametá, cidade onde havia uma
residência dos jesuítas, e de onde partiria.
A viagem foi ela mesma um espetáculo: doze grandes canoas; centenas de
chefes de sociedades indígenas “convertidas” pelos missionários. Seis apenas eram os
portugueses que acompanhavam o cortejo, sendo um deles o sargento-mor,
representante das autoridades coloniais. Todos atravessaram o rio até a Ilha de
Joanes. Após cinco dias de viagem pelos rios e canais ao sul do Marajó, a comitiva de
Vieira é recebida pelos chefes dos Nheengaíbas, ainda sobre a água, duas léguas antes
do porto de chegada. Os chefes das nações de Nheengaíbas vêm recebê-los em suas
grandes canoas enfeitadas com plumas de aves tropicais vivamente coloridas. Afirma
Vieira que os indígenas demonstram a sua alegria:
“tocando buzinas e levantando pocemas, que são vozes de alegria e
aplauso com que gritam todos juntos a espaços, e é a maior demonstração de
festa entre eles; com que também de todas as nossas [canoas] se lhe
respondia.” (VIEIRA, 1997, I : 540)
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Ao chegarem à povoação, os visitantes desembarcaram das canoas e foram


levados pelos Nheengaíbas à igreja feita de palmas e se recitou o Te Deum laudamus.
Da igreja passaram a uma casa, com seu corredor e cubículos, “fechada toda em
roda, com uma só porta”, tal como era costume fazerem-se para os missionários nas
aldeias dos índios “convertidos”.
Dentre as nações convidadas para as festas de paz, os primeiros a chegar em
suas canoas foram os Mamayanás, índios respeitados pela sua agilidade e coragem
guerreira. Estes índios puseram em alarme os portugueses que haviam acompanhado
os jesuítas. Mas logo as desconfianças se dissiparam, visto que os Mamayanás se
mostraram amistosos. Misturados ao grande número de chefes indígenas
confederados para a cerimônia, tanto os padres quanto os índios cristãos explicavam
a ordem dos últimos eventos, pondo-lhes a par da razão porque todos se reuniam.
Todas as formas exteriores da cerimônia apelaram para os mesmos códigos
cerimoniais das festas européias do mesmo período no mundo ibérico. Os jesuítas
pretendiam canalizar as principais energias “caóticas” que se entrecruzavam no
espaço amazônico neste momento. A disposição e ordenação das três categorias de
atores presentes ao evento que analisamos materializa esta pretenção “canalizadora”
dos jesuítas: índios cristianizados, portugueses e nheengaíbas encontravam-se
divididos em três colunas simetricamente ordenadas diante da igreja construída para
a ocasião. Os índios cristãos estavam ao lado direito do edifício sagrado, “com os
melhores vestidos que tinham” e portavam espadas; do lado esquerdo encontravam-
se os chefes pagãos Nheengaíbas, “despidos e empenados ao uso bárbaro”, com seus
arcos e flexas na mão; e os portugueses entre uns e outros.
Vieira não deixa de observar em sua relação ao rei Afonso VI que, assim como
todas as cerimônias exteriores, estas festas celebradas com os chefes Nheengaíbas e
os soldados portugueses “valem muito com gente que se governa pelos sentidos”
(VIEIRA, 1997, I : 542). Como afirma Mario Praz, fazer impressão aos sentidos dos
espectadores, causar impacto visual e auditivo no público era a técnica da Companhia
para atingir o seu fim último: criar um estado de espírito dócil ao comando divino,
fosse este comando a vontade de Deus ou a do rei (PRAZ, p. 134-135). Obediência era o
que esperavam os jesuítas dos índios avassalados. Com efeito, o juramento de
obediência e fidelidade das diferentes nações de Nheengaíbas a Deus e ao rei de
Portugal descrito por Vieira é uma cerimônia de vassalagem:
“Depois da missa, assim revestido nos ornamentos sacerdotais, fez o
padre uma prática a todos, em que lhes declarou pelos intérpretes a
dignidade do lugar em que estavam, e a obrigação que tinham de responder,
com limpo coração e sem engano, a tudo o que lhes fosse perguntado, e de o
guardar inviolavelmente depois de prometido. E logo fez perguntar a cada
um dos principais se queriam receber a fé do verdadeiro Deus e ser vassalos
de El-Rei de Portugal. (...) Declarando-lhes (...) que a obrigação de vassalos
era haverem de obedecer em tudo às ordens de S.M., e ser sujeitos a suas leis,
e ter paz perpétua e inviolável com todos os vassalos do mesmo senhor. (...) A
tudo responderam todos que sim”. (VIEIRA, 1997, I : 542)
Ao final da cerimônia, o coroamento do espetáculo descrito ao rei por Vieira: o
chefe nheengaíba que se encontrava à frente da coluna esquerda diante da Igreja
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aproximou-se do altar onde estava o jesuíta e de joelhos e com as mãos levantadas


para colocá-las entre as mãos do padre, após lançar as suas armas ao chão, jurou:
“Eu, fulano, principal de tal nação, em meu nome e de todos meus
súditos e descendentes, prometo a Deus e a El-Rei de Portugal a fé de nosso
Senhor Jesus Cristo; e de ser (como já sou de hoje em diante) vassalo de
S.M.; e de ter perpétua paz com os Portugueses, sendo amigo de todos seus
amigos e inimigo de todos seus inimigos; e me obrigo de assim o guardar e
cumprir inteiramente para sempre” (Vieira, 1997, I : 543).
Antes de partirem, reuniram-se todos numa praça larga onde os portugueses e
os chefes Nheengaíbas cumpriram simbolicamente o que haviam prometido no
interior da igreja. Os portugueses sacaram as balas dos seus arcabuzes e as atiraram
no rio; os Nheengaíbas quebraram as flexas e jogaram os pedaços no mesmo rio.
“Arcum conteret et confringet arma” é a expressão de Vieira para resumir este último
ato da festa.
Ritual de vassalagem no meio da floresta amazônica, entre papagaios e
jaguares: descrição barroca de um ato político e submissão ritualizada dos índios do
Marajó, vencidos cerimonialmente. Esta fórmula do juramento de vassalagem
indígena no contexto de uma cerimônia festejada no meio das árvores da floresta
conjuga-se bem ao estilo afetado do barroco. Vieira descreve com superlativos a
cerimônia que dava por definitiva a rendição e redução dos Nheengaíbas. Nada mais
ilusório do que isto. A inconstância das promessas tanto de portugueses quanto de
Nheengaíbas manifestou-se continuamente até o final do século XVII. Contudo, na
mesma época em que se realizava esta grande celebração vassálica com os
Nheengaíbas do Marajó, os jesuítas continuam a estender os tentáculos muito além
do litoral.
IV. BETTENDORFF: UM JESUÍTA GALO-BELGA NO GRÃO-PARÁ E MARANHÃO.
Para sustentar o que havia sido construído e fazer avançar os trabalhos de
catequese dos índios no Grão-Pará, Antônio Vieira solicita novos missionários ao
provincial do Brasil na Bahia, ao rei em Lisboa, ao Geral da Companhia de Jesus em
Roma. De Roma pede que mandem padres estrangeiros, de outras línguas. Entre
esses últimos chegam de Luxemburgo — à época sob a administração da Província
Galo-Belga — João Filipe Bettendorff e Gaspar Misch.
Nascido em Luxemburgo em 1626, Bettendorff entrou na Companhia de Jesus
em 5 de novembro de 1647. Quando a carta de Vieira chegou às mãos de Hubert
Willheim, Provincial Galo-Belga, ele havia terminado o curso de teologia no Colégio
de Douai, “com esperanças de ir para as missões do Japão ou da China”. Porém, o
reitor do Colégio de Douai, Jacob Krek, e o Provincial decidem que ele vai para o
Maranhão e não para a Ásia. Antes de partir em direção a Lisboa, Bettendorff é
ordenado sacerdote pelo Arcebispo e Príncipe de Cambrai. De Cambrai foi para
Amsterdam e de lá para o norte, na ilha de Texel, de onde os navios partiam em
direção a Portugal. Partindo de Lisboa em 24 de novembro de 1660, chega a São Luiz
do Maranhão em 20 de janeiro de 1661. Bettendorff, juntamente com os jesuítas Luiz
Figueira e Antônio Vieira, é uma das personalidades mais importantes da Missão do
Maranhão no século XVII (BETTENDORFF, 1990: 147-149).
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Logo ao chegar a São Luiz, depois de passados alguns dias, foi enviado com
Gaspar Misch a Belém do Pará. Chegando a Belém foram recebidos por Antônio
Vieira com um sermão: “Quidem enim illorum de longe venerunt” (BETTENDORFF,
1990: 155). Começou a partir daí as suas atividades como missionário: foi professor
de curumim (menino indígena) na povoação de São João de Mortigura durante
alguns meses. No rio Tapajós fixou sua residência e escreveu as gramáticas de duas
línguas: dos Tapajós e dos Urucucus. Neste período Bettendorff já sabia falar o
francês, o flamengo, o holandês e aprendeu o português depois, como também
diversas línguas indígenas. A partir de 1661, foi missionário por quatro anos em
diferentes rios do Grão-Pará. Foi nomeado duas vezes Superior da Missão do
Maranhão: a primeira vez exerceu o cargo entre os anos 1668 e 1674; a segunda vez
entre os anos 1690 e 1693.
Em 1668, antes de ser nomeado Superior da Missão, Bettendorff trabalhava no
Colégio Santo Alexandre, de Belém do Pará. Neste momento se tornam mais visíveis
as suas relações com as autoridades locais. Ele abriu uma classe de latim onde
ensinava os clássicos antigos aos dois filhos do Governador Antônio de Albuquerque
Coelho de Carvalho, Francisco e Antônio, e ao sobrinho do Capitão-Mor do Pará,
Paulo Martins Garro. (BETTENDORFF, 1990: 280). Bettendorff foi chamado em 1673
como Superior da Missão, para receber o novo governador do Estado, Pero Cesar de
Menezes, que chegava de Lisboa em São Luiz do Maranhão. Antes que o antigo
governador, Antonio de Albuquerque Coelho de Carvalho chegasse à praia com o
senado e a nobreza da cidade para receber o governador Menezes, Bettendorff se
precipitou e subiu a bordo do navio que trazia o governador para lhe dar as boas
vindas. Este último saiu de seu camarote e o levou para dentro, onde, segundo
Bettendorff, estiveram "conversando por algum tempo com toda a familiaridade".
(BETTENDORFF, 1990: 291).
Em 1680, sendo reitor do Colégio de Nossa Senhora da Luz na cidade de São
Luiz, capital do Maranhão, Bettendorff não conseguiu chegar a tempo para a recepção
do primeiro Bispo do Maranhão que vinha de Lisboa, Gregório dos Anjos. Na
ausência dos jesuítas, os franciscanos tomaram a iniciativa de buscarem eles mesmos
o Bispo que chegava. Antes que o barco de Gregório dos Anjos chegasse ao Porto da
cidade de São Luiz, os franciscanos foram buscá-lo no mar, o transportaram para o
seu próprio barco como sinal de acolhida e o levaram para o seu convento na cidade.
Bettendorff viu-se obrigado a ir à igreja dos franciscanos, onde Gregório dos Anjos
recebia as homenagens sentado em seu trono pontifical, diante do altar principal da
igreja, abençoando a todos os que vinham beijar o seu anel. Quando Bettendorff
aproximou-se para beijar o anel do novo Bispo, este último perguntou-lhe se era ele o
reitor do Colégio do Maranhão. Com a resposta positiva de Bettendorff, o bispo
Gregório pontificou:
"Lá no reino me diziam que a primeira pessoa que me havia de vir
receber era o padre reitor do Colégio com os mais padres da Companhia, mas
vossa paternidade nem ver-me veio ao navio." (Bettendorff, 1990: 327).
De imediato Bettendorff replicou amavelmente dizendo que o Bispo havia
preferido embarcar-se na canoa dos franciscanos e por esta razão ele não o havia visto
e nem o navio dos jesuítas; e para recuperar o tempo perdido, Bettendorff punha-se
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aos seus pés juntamente com os outras demais padres. O Bispo se satisfez com a
resposta, porém Bettendorff não se contentou com ela e impôs a si mesmo o desafio
de conquistar os "bons olhos" do prelado.
Alguns dias antes da entrada oficial do Bispo Gregório na Sé episcopal,
Bettendorff enviou-lhe um cavalo com uma sela especialmente preparada para a
ocasião. Mandou construir um arco triunfal no meio do caminho por onde passaria o
Bispo em direção à Sé. Este arco ficou diante da Igreja dos jesuítas, luxuosamente
decorado com vinte "emblemas" pintados pelas mãos do próprio Bettendorff. Estes
emblemas eram acompanhados de descrições e explicações em forma de versos
heróicos que comentavam as maneiras de pescar os homens ou as almas para Deus;
maneiras que se expressam no ato da pregação episcopal. Estes versos heróicos
seriam recitados na rua e na Sé da cidade (BETTENDORFF, 1990: 327-328).
No primeiro dia de festa, a reação do prelado não se fez esperar. Após vestir-se
com sua mitra à cabeça, montou o cavalo enviado pelo jesuíta ajudado pelo irmão
Manoel Rodrigues. Seguiu cavalgando pelas ruas decoradas com adornos e folhagens,
detendo-se diante dos arcos triunfais, junto aos quais os moradores da cidade o
recebiam com músicas compostas pelos religiosos mercedários. Tudo era
acompanhado pelos "vivas" e aplausos do povo. Ao ver o arco do Colégio dos jesuítas,
o prelado "ficou todo pasmado" segundo as palavras de Bettendorff (BETTENDORFF,
1990: 328). Como se tudo isso não bastasse, ao fim de oito dias de festas pela chegada
do Bispo, as cerimônias se concluíram com um grande sermão em latim pregado por
Bettendorff na própria Igreja dos jesuítas de São Luiz dedicada a Nossa Senhora da
Luz, cujo tema eram "as qualidades da luz".
Sobre este sermão o jesuíta se prolonga num "modesto" comentário:
"Confesso que tive algum receiosinho de não poder ser tão corrente na
boa latinidade como algum dia fôra, [quando fui] cinco anos mestre em
Humanidades. Mas ajudando-me Deus no templo de sua Mãe Santíssima
Nossa Senhora da Luz, cujos louvores também fiz, achei-me logo desde o
princípio tão desembaraçado em o dizer, que não me fez abalo nenhum a
assistência do Padre Iodoco Peres e a do Padre Aluizio Pfeil, e outros nossos,
versadíssimos em latinidade. Nada de tudo isso relato para humanos. O
senhor bispo me pediu todos os emblemas pintados e escritos por minha
mão, para mandá-los para o reino de Portugal; seja tudo para maior honra de
Deus, e glória de sua Mãe Santíssima, a Virgem Senhora da Luz!"
(BETTENDORFF, 1990: 329).

V. OVÍDIO MORALIZADO NA AMAZÔNIA BARROCA.


São Luiz do Maranhão não teve nos jesuítas Antônio Vieira e João Filipe
Bettendorff os seus únicos grandes humanistas. Outros se seguiram a eles. Um
curioso exemplo deste humanismo jesuíta, um humanismo devoto representativo da
Contra-Reforma na Amazônia, foi a representação teatral "Hercules Gallicus,
Religionis Vindex. Plausus Theatralis D. Joanni Francisci Regis S.J.", publicado in-
4° em 1739. Esta "aclamação teatral" tinha como finalidade festejar a canonisação de
São Jean-François Regis, ocorrida dois anos antes.
10

A peça foi escrita pelo seminarista Aleixo Antônio, jesuíta natural do povoado
de Águeda (Portugal), e missionário no Maranhão desde 1726. Aleixo teria longa e
frutuosa carreira no Colégio Nossa Senhora da Luz, em São Luiz do Maranhão. O
Catálogo da Vice-Província do Maranhão de 1740 julga Aleixo como excelente em
humanidades, filosofia e teologia, mas não habilitado em língua brasílica. Tendo
chegado em 1726 ao Maranhão e quase vinte anos depois ainda inapto na língua local,
isto significava uma "vocação" toda dirigida para o Colégio da cidade, longe das
aldeias de índios e das aventuras da floresta. Tanto mais que

.........................................................................................

On connaît bien les styles de ces représentations. Dans les Aldeias de Índios,
dans les villages d’Indiens, les jésuites donnaient des “Autos”, ou plus exactement des
dialogues, “Diálogos” comme on les appelait à l’époque. Dans les collèges, en plus des
autos, on donnait des “Comédias” et “Tragédias”. Le père Serafim Leite, l’historien de
la Compagnie de Jésus au Brésil, est l’auteur qui nous fournit la liste de ces
productions théâtrales6.
La langue des pièces et l’imposition du latin en 1584.
La langue dans laquelle furent écrites ces oeuvres a été en règle générale
déterminée par le public auquel elles s’adressaient. C’est ainsi que l’on trouve des
pièces du XVIe siècle écrites en portugais, en tupi, ou encore en castillan. Celles qui
ont été composées en latin apparaissent en plus grand nombre au cours du XVIIe
siècle.
A la fin du XVIe siècle, se produit un débat assez révélateur sur l’introduction
obligatoire de la langue latine dans les représentations théâtrales au Brésil. C’est un
débat que je n’ai pas le temps de présenter en profondeur et que je me contenteria
d’évoquer brièvement, car la question en vaut la peine. Les choses arrivèrent dans les
années 1584 quand le Visitador, Cristóvão de Gouveia, écrivit au père Aquaviva, le
général de la Compagnie de Jésus. Il lui demandait l’autorisation d’introduire le latin
dans des représentations pour lesquelles, en partie au moins, on conserverait le
portugais. Nous nous démandons quelle était la raison pour laquelle le Visitador
Cristóvão de Gouveia insistait sur l’usage de la langue portugaise? C’était surtout
parce que si les pièces étaient jouées en latin , les spectateurs ne pourraient pas les
comprendre. Cristóvão de Gouveia ajoutait à ses arguments le fait que jusqu’à cette

6 Padre Serafim Leite, “Introdução do Teatro no Brasil”, Separata da Revista Brotéria, vol. XXIV, fasc. 4, abril
de 1937.
11

époque-là les représentations avaient toujours étaient faites de cette manière, c’est-à-
dire en langue portugaise!7
La réponse du père Aquaviva fut digne de Salomon: le portugais serait la
langue des Diálogos, tandis que le latin servirait dans les tragédies et les comédies.
Les lieux des représentations
Entre 1557, date à laquelle le Père Manoel da Nóbrega, le premier Provincial do
Brasil, écrit un diálogo sur la Conversão do Gentio, et 1597, date de la mort de
Anchieta, les jésuites possédaient des collèges à Pernambuco, Bahia, Espírito Santo,
Rio de Janeiro, São Vicente et São Paulo. Ce qui veut dire que les jésuites étaient
installés auprès des principales agglomérations portugaises du Brésil de cette époque.
Or les pièces qui nous intéressent ici étaient généralement représentées dans les
grandes salles des études générales de ces collèges; d’autres fois elles étaient données
sur la place publique; et parfois aussi dans les réductions d’Indiens.
A l’intérieur de la production jésuite pour le théâtre, on trouve toujours des
modalités locales pour l’élaboration des personnages et de la scène. Des modalités
qui étaient systématiquement restructurées en fonction de la catechèse et des finalités
de l’évangélisation. Il faut rappeler que les autos jésuites ne furent certainement pas
les premiers à être représentés. Les entremeses étaient donnés dans les collèges
jésuites au XVIIe siècle comme on peut le constater dans une interdiction promulguée
en 1610.
Les artisans du théâtre colonial
Avec le développement et l’expansion du processus de colonisation portugaise
dans l’Etat du Grão-Pará e Maranhão au cours du XVIIe siècle, la production d’objets
a été prioritairement le fait des artisans indigènes et des esclaves noirs amenés
d’Afrique et que l’on trouvait surtout dans les bourgades (vilas) et les villes coloniales
du littoral. Mais c’est aussi au cours du XVIIe siècle que s’est établi et renforcé le
système des missions religieuses en Amazonie. C’était dans le cadre de ces missions
que se formaient les artisans indiens, noirs et métis qui étaient destinés à travailler à
la décoration des églises, des collèges et des propres missions.
Dans le Catalogue de 1718, du collège de Santo Alexandre, qui appartenait aux
jésuites de Belém do Pará, nous trouvons plusieurs noms d’artisans: parmi les
apprentis-maçons on rencontre un Indien nommé Matias, qui était un esclave de la
Fazenda de Gibrié et Caetano, un Indien de la Fazenda de Mamaiacú. A côte de ces
Indiens il y avait des esclaves africains comme Francisco Maçus,et le Noir sans doute
affranchi Manuel García; parmi les forgerons, on trouve les Indiens Casimiro et
Silvestre; parmi les charpentiers, on trouve un António Guaiapi, un Raimundo
Tupinambá et un Mandu Gregório; ce sont tous des Indiens à côté du cafuzo Mandu,
qui était un esclave de l’Engenho de Ibirajuba; parmi les sculpteurs, citons les
esclaves indigènes Manuel, Ângelo et Faustino, de la Fazenda de Gibrié; parmi les
tourneurs, citons António et Clemente, des esclaves indigènes de Gibrié; il y avait
aussi des tailleurs comme l’Indien Duarte, le Noir Francisco; il y avait également un
Noir bossu,nommé Antonio; tous étaient des esclaves de la Fazenda de Jaguari. Ces

7 Cristóvão de Gouveia, Lus. 68, 403v.


12

dix-huit hommes travaillaient dans le collège des jésuites du Pará en 1718 8. Dans le
même catalogue, on rencontre aussi l’indication suivante: “En plus des artisans qui
travaillent habituellement dans le collège, les fazendas en possèdent d’autres qui
sont à leur service et dont les catalogues font mention: il s’agit principalement de
bûcherons et de fabricants de canots”9.
C’est surtout les Indiens qui furent décrits au XVIIIe siècle par le jésuite João
Daniel comme “des peintres, des sculpteurs, des forgerons et artisans de toute sorte
tout à fait remarquables”10.
Il y avait pourtant des obstacles qui empêchaient les jésuites de les conserver
sous leur direction car dès que les habitants des vilas ou les gouverneurs
connaissaient l’existence d’un Indien habile et doué, ils faisaient tout pour les attirer à
leur service. A tel point que le roi Jean V de Portugal a dû envoyer une lettre au
gouverneur du Pará, en date du 16 janvier 1727 et ordonner que “dans les Aldeias de
Índios il y ait toujours des Indiens qui soient forgerons, tisserands, charpentiers et
potiers, et que personne, quels que soient ses titres,ne puisse les en retirer sans un
ordre des jésuites”11.
Les artisans indigènes des missions étaient renommés pour leurs capacités de
reproduction des objets européens, ils déployaient une habileté qui était rarement
égalée par les artistes portugais. Le même jésuite João Daniel affirmait que les
Indiens “possédaient une telle imagination pour imiter n’importe quel objet qu’il
suffisait de leur montrer l’original ou une copie, et ils l’imitaient avec une telle
maîtrise que cela provoquait des situations équivoques puisque l’on ne savait plus
distinguer l’original de la copie”12.
Quand les jésuites voulaient réaliser quelque chose de raffiné, ils cherchaient
des artisans indigènes et métis comme ceux que nous venons de nommer au lieu de
s’adresser à des Portugais.

Este foi um ano particularmente importante para a igreja local de Belém e para
toda a Capitania, pois no dia 26 de julho deste mesmo ano chega à Belém, a capital do
Pará, o segundo bispo da diocese, Dom Frei Guilherme de São João. O novo bispo
toma posse do cargo no dia 10 de agosto e faz entrada solene na sua Catedral no dia 15
do mesmo mês. Uma catedral que havia sido Mas o bispo não era o único estrageiro a
se instalar na região.

8 Catálogo deste Colégio de Santo Alexandre [1718], Arquivo Provincial de Portugal, Pasta 177 (21).
9 Idem, ibidem.
10 João Daniel, Tesouro Descoberto no Máximo Rio Amazonas, Anais da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro,
, p. 251.
11 Biblioteca de Évora, Cód. CXV/2-12, 142.
12 João Daniel, op. cit., p. 251.
13

Em 19 de setembro de 1743, La Condamine, o naturalista francês chegaria à


cidade de Belém e deixaria registrada a sua impressão no seu diário de viagem. Ele
afirmava:
“En arrivant au Pará, nous qui venions de sortir des forêts du Marañon, nous
avions l’impression d’être arrivés en Europe. Nous étions face à une grande ville, des
rues , de jolies maisons dont certaines avaient été construites il y a plus de trente ans ,
en pierre. Il y avait aussi des temples magnifiques”13.
A cidade destes anos contava com dois bairros: Os prédios que serviam como
sedes da administração pública e os edifícios religiosos eram... As ruas eram...
Obviamente que a presença macissa destes índios e dos negros escravos vindos
da África pelas ruas da cidade nos autoriza a julgar um exagero da parte do
naturalista francês La Condamine a sua impressão de ter chagado na Europa.
Sabemos que haviam muitos moradores europeus na cidade de Belém, por estes
tempos

Bibliographie raisonnée:

AZEVEDO, João Lúcio de, História de António Vieira, 3a. ed., Lisboa: Clássica Editora,
1992.
BAENA, Antônio Ladislau Monteiro, Compêndio das Eras da Província do Pará,
Belém: Universidade Federal do Pará, 1969.
BAZIN, Germain, L’Architecture religieuse baroque au Brésil, Paris, 1956, 2 vols.
BETTENDORFF, João Felipe, Crônica dos padres da Companhia de Jesus no Estado do
Maranhão, 2a. ed., Belém: FCPTN/SECULT, 1990.
DOMPNIER, Bernard, "Les jésuites et la devotion populaire. Autour des origines du
culte de Saint Jean-François Regis (1641-1676)", In: Les Jésuites parmi les
hommes aux XVIe et XVIIe siècles, Actes du Colloque de Clermont-Ferrand,
Faculté des Lettres et Sciences Humaines de l'Université de Clermont-Ferrand II,
Nouvelle Série, Fascicule 25, 1987, pp. 295-308.
KEMP, Martin, “‘Wrought by No Artist’s Hand’: The Natural, the Artificial, the Exotic,
and the Scientific in Some Artifacts from the Renaissance”, In: FARAGO, Claire
(ed.), Reframing the Renaissance: Visual Culture in Europe and Latin America
(1450-1650), New Haven and London: Yale University Press, 1995, pp. 177-196.
LEITE, Serafim, Suma Histórica da Companhia de Jesus no Brasil (Assistência de
Portugal), 1549-1760, Lisboa: Junta de Investigações do Ultramar, 1965.
MELO JÚNIOR, Donato, “A velha Sé de Belém do Grão Pará. Alguns documentos
portugueses no Arquivo Histórico Ultramarino”, in: IDEM, Antônio José Landi,
arquiteto de Belém, Belém: Governo do Estado do Pará, 1973, pp. 11-30.
NEVES, Luiz Felipe Baêta, Vieira e a Imaginação Social Jesuítica: Maranhão e Grão-
Pará no século XVII, Rio de Janeiro: Topbooks, 1997.
13 La Condamine, 1745: 130[98].
14

PRAZ, Mario, Studi sul Concettismo, Milano: Soc. Editrice “La Cultura”, 1934.
SALLES, Vicente, A música e o tempo no Grão Pará, Belém: Conselho Estadual de
Cultura, 1980.
SOBRAL, Maria de Lourdes, As Missões religiosas e o barroco no Pará, Belém:
UFPa/SECDET, 1986.
VIEIRA, António, Cartas, 2a. ed., coordenada e anotada por João Lúcio de Azevedo,
Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1997, vol. I.

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