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FUNDAGAO EDITORA DA UNESP Presidente do Conselho Curador ‘Antonio Manoel dos Santos Silva Dinero Presidente José Castlho Marques Nexo Assessor Edtria {io Hemani Bomfim Gusierte ‘Conelhe Editorial Académico ‘Aguinaldo Jost Gongalves ‘Alvaro Oscar Campanha Antonio Celso Wagner Zanin Carlos Erivany Fantinsi Fausto Forest Jost Aluysio Reis de Andrade Marco Auréllo Nogueira ‘Marla Suli Parreira de Areuda Robero Kraenkel Rosa Maria Feieiro Cavalari Euito Execuivo Tullo ¥. Kawata Eduoras Assitentes Maria Apparecda F, M. Bussolott Maria Dolores Prades A ESCRITA DA HISTORIA Texto 19: BURKE, Peter (org.). A escrita da historia: novas perspectivas. Sio Paulo: Unesp, 1992. p. 63-95. ape (ig to UNE ORIGINAL sc PETER BURKE (Org) NOVAS PERSPECTIVAS Traducio de Magda Lopes 3° Reimpressio Katia Pozzer Editora NESP Copyright © 1991 by Basil Blackwell Limited, England “ital oviginal em inglst New Peers on Historical Writing Copyright @ 1992 da tradi brs Edita Unesp, da Findagio par o Desenvolvimento dda Universidade Estadual Paulista (FUNDUNESP) ‘Av. Bio Branco, 1210 ; 01206 - Sto Pauio- SP Fone/Fax (011) 2239560 ‘ ‘Dados Internacionais de Catalogacto na Publicagéo (CIP) SUMARIO (Camara Brasileira do Livro, SP, Brasil) ‘A Esert da historia: novas perspectvas / Peer Burke (orgh madugio de | Magda Lopes. - Sto Paulo: Edtora da Universidade Evadal Paula, 1992. ~ (Biblio bisa) | 1son 8571390274 7 Abertura: a nova histéria, seu passado e seu futuro 1. Historiografia L. Burke, Peter. IL, Série, Peter Burke [ows coo tra | : 39 A hist6ria vista de baixo indices para catalogosistemstico: Jim Sharpe 1, Escola dos Annales: Historiograia 907.2 2 Hisoriografia 907.2 63 Historia das mulheres 3. Novn hisria Hiworiograla 907.2 Joan Scott 97 Historia de além-mar Henk Wesseling 133 Sobre a micro-histéria Giovanni Levi 163 Historia oral Guyn Prins vs. anac sau yes 199 Historia da leitura —Sanataieyecoan ‘Sarin N= Robert Darnton HISTORIA DAS MULHERES Joan Scott* A hiss que se poe scever dos esudos sobre ae mulheres pertence também ao movimento; no ‘uma mealinguagem,e rd anuar tanto como um momento conservador, quanto como umn momento subversivo «nto hé uma interpreracto teoricamente neuta da histra dos eseudos sobre as mulheres, A histériatert af um papel auance. Jacques Derida, 1984 A histéria das mulheres apareceu como um campo definivel principalmente nas duas tltimas décadas. Apesar das enormes diferencas nos recursos para ela alocados, em sua reptesentacio e em seu lugar no curriculo, na posigio a ela concedida pelas universidades e pelas associacbes disciplinares, parece nao haver mais duvida de que a historia das mulheres é uma pratica estabe- lecida em muitas partes do mundo. Embora a situacio dos Estados Unidos seja tinica pelo fato de a historia das mulheres ter atingido * Profestora de Citnciae Socais no Instinuto de Eaxdos Avancados, em Princenton. 1 ""Women inthe Beehive: A serninar with Jacques Derrida", transrito do seminsrio ‘com Dertida promovido pelo Centro Pembroke para 0 Ensino e a Pesquisa, em ' Subjecs/Objects, Primavera de 1984, p. 17. NAL jets/ Objects, Primavera de 1984, p, 6 PETER BURKE ‘uma presenca visivel e influente na academia, ha evidéncia clara - em artigos ¢ livros, na autoidentificacdo dos historiadores que se pode encontrar em conferéncias internacionais, e nas redes infor mais que transmitem as noticias do mundo intelectual - da Participacdo internacional no movimento da historia das mulheres. Utilizo © termo “movimento”, deliberadamente, para distin. guir o fendmeno atual dos esforcos anteriormente disseminados por alguns individuos para escrever no passado sobre as mulheres, para sugerir algo da qualidade dinamica envolvida nos intercétm- bios no nivel nacional e nos interdisciplinares pelos historiadores das mulheres, ¢ ainda, para evocar as associagbes com a politica. Aconexio entre a historia das mulheres ¢ a politica €20 mesmo tempo dbvia e complexa. Em uma das narrativas convencionais das origens deste campo, a politica ferninista ¢ 0 ponto de partida. Esses relatos situam a origem do campo na década de 60, quando as ativistas ferninistas reivindicavam uma historia que estabelecesse heroinas, prova da atuagao das mulheres, e também explicagées sobre a opressio e inspiracdo para a aio. Foi dito que as feministas académicas responderam ao chamado de “sua” historia e dirigiram sua erudicéo para uma atividade politica mais ampla; no inicio, houve uma conexiio direta entre politica ¢ intclectualidade. Mais tarde - em algum momento entre a metade e o final da década de 70 - continua o relato, a historia das mulheres afastouse da politica. Ampliou seu campo de questionamentos, documentando todos os aspectos da vida das mulheres no passado, e dessa forma adquiriu uma energia propria. O actimulo de monografias e artigos, © surgimento de controvérsias internas e o avango de didlogos interpretativos, e ainda, a emergéncia de autoridades intelectuais reconhecidas foram os indicadores familiares de urn novo campo de estudo, legitimado em parte, ao que parecia, por sua grande distancia da luta politica. Finalmente (assim prossegue a trajetéria), © desvio para o género? na década de 80 foi um rompimento definitivo com a politica e propiciou a este campo conseguir o seu 2, Genero aqui como dvisto narural dos sexos. (NT) AESCRITA DAHISTORIA “s proprio espaco, pois género é um termo aparentemente neutro, desprovido de propésito ideoldgico imediato, A emergéncia da hist6ria das mulheres como um campo de estudo envolve, nesta interpretagio, uma evolugéo do feminismo para as mulheres e dat para o género; ou seja, da politica para a historia especializada e dai para a anil. Certamente, esta narrativa tem variacbes significatvas, depen- dendo de quem a relata. Em algumas vers6es, a evolugo éencarada positivamente como um resgate da historia, tanto de principios politicos de interesses estreitos, quanto de um enfoque demasiado exclusivo sobre as mulheres ou de suposigdes filosoficamente ingénuas. Em outras, a interpretacio é negativa, a “retirada” para a academia (para nao falar do desvio para o género e para. teoria) sendo encarada como um sinal de despolitizacio. “O que ocorre com o feminism quando 0 movimento das mulheres esti morto2” perguntou recentemente Elaine Showalter. “Tornase estudos so: bres mulheres - apenas outra disciplina académica.”’ Envretanto, apesar das diferentes valéncias colocadas no felato, a rajetria em si € compartilhada por muitas feministas e seus criticos, como se fosse, incontestavelmente, 0 modo como as coisas aconteceram. Goetaria de argumentar que a narrativa necessita de alguma teflexao critica, nfo apenas por no ser tio simples, mas também porque representa mal a historia da histéria das mulheres e seu relacionamento, tanto com a politica, quanto com a disciplina da historia, A historia deste campo ndo requer somente uma narrativa linear, mas um relato mais complexo, que eve em conta, 20 mesmo tempo, a posicéo variavel das mulheres na histéria, © movimento femninistae a disciplina da historia. Embora a historia das mulheres esteja certamente associada & emergéncia do feminismo, este n&o desapareceu, seja como uma presenca na academia ou na sociedade em geral, ainda que os termos de sua organizacio ede gua existéncia tenham mudado. Muitos daqueles que usam 0 termo género, na 43. Citadb em Karen Winkler, “Women's Soudies Afer Two Decades: Debates over Poles. New Ditections for Reseateh*, The Chronicle of Higher Education, 28 de setembro de 1988, p. AS, 6 PETER BURKE verdade se denominam historiadores feministas. [sso ndo é somen- te uma submissio politica, mas também uma perspectiva tedrica que os leva a encarar 0 sexo como um modo melhor de conceituar a politica. Muitos daqueles que escrevem a histéria das mulheres consideram:se envolvidos em um esforco altamente politico, para desafiar a autoridade dominante na profissio ¢ na universidade e para mudar o modo como a historia ¢ escrita. E grande parte da atual histéria das mulheres, mesmo quando opera com conceitos de género, esti voltada para as preocupagées contemporaneas da politica feminista (entre eles, nos Estados Unidos atualmente, 0 bem-estar, o cuidado dos filhos e o direito ao aborto). Na verdade, hha uma razao importante para se argumentar que os desenvolvi. mentos na historia das mulheres estio fortemente relacionados “a forca crescente e a legitimidade do feminismo como um movimen- to politico”, como também para insistir que esté aumentando a distancia entre o trabalho académico e o politico. Mas tomarse a historia das mulheres simplesmente como um reflexo do cresci- mento da politica feminista externa a academia, também é falho. Mais do que postular uma simples correlacio, precisamos pensar sobre este campo como um estudo dinimico na politica da produgio de conhecimento. A palavra politica & usada atualmente em virios sentidos. Primeiro, em sua definicéo mais tipica, ela pode significar a atividade ditigida para/ou em governos ou outras autoridades poderosas, atividade essa que envolve um apelo a identidade coletiva, & mobilizagio de recursos, avaliagio estratégica e a manobra titica. Segundo, a palavra politica ¢ também utiliada para se tefetir as relagdes de poder mais gerais e as estratégias visadas para mantélas ou contestélass Terceiro, a palavra politica ¢ ‘4. Nancy Fraser e Linda Nicholson, "Social Criticism Without Philosophy”, manusrito inédieo, 1987, p. 29. 5."*Politis in the profound sens, as the ensemble of human relations in cheit rel, social structure, in thee ability construct the world”, Roland Barthes, Mychlals, Patis, 1957, p. 230. Ver também Michel Foucault, The History of Serualiy, v. An Introduction, Nova York, 1980, p. 92:102. F S ¥ e ‘AESCRITA DA HISTORIA, a aplicada ainda mais amplamente a priticas que reproduzem ou desafiam o que é as vezes rotulado de “ideologia”, aqueles sistemas de convicgao ¢ pritica que estabelecem as identidades individuais e coletivas que formam as relagdes entre individuos e coletividades ¢ seu mundo, e que so encaradas como naturais, normativas ou auto-evidentes.S Essas definigdes correspondem a diferentes tipos de agdo e diferentes esferas de atividade, mas a minha uilizacio da palavra “politica” para caracterizar tudo isso sugere que os limites de definigio € espaco sto indistintos, e que, inevitavelmente, qualquer utilizagio tem maltiplas ressonancias. A nasrativa da historia das mulheres que eu desejo fazer depende dessas miiltiplas ressondncias; é sempre uma narrativa politic. “Profissionalismo” versus “politica” O feminismo tem sido, nas tltimas décedas, um movimento internacional, mas possui caracteristicas particulares, regionais € nacionais. Pareceme util focalizar os detalhes do caso que melhor eu conheco ~ 0 dos Estados Unidos ~ para fazer algumas observa- ‘cbes gerais. Nos Estados Unidos, o feminismo resvurgiu rips anos 60, estimulado em parte pelo movimento dos Direitos Civis e pelas politicas do governo destinadas a estabelecer o potencial feminino, para it ao encontro da expanséo econémica através da sociedade, incluindo as profissées e a academia. Moldou seu apelo e sua autojustificativa nos termos da ret6rica prevalecente de igualdade. No processo, o ferninismo assumite criou uma identidade coletiva de mulheres, individuos do sexo ferninino com um interesse compartilhado no fim da subordinaglo, da invisibilidade e da 6. Gaya Chakeavorty Spivak, "The Polltes of Incerpreation", em W/.T. Michell, ‘The Police of Interprxacion, Chicago, 1983, p. 347-66; Mary Poovey, Uncien Develepment: The Ideological Workof Genderin mid Viewrian England, Chicago, 1988. \Ver também "idelogia” no glossieto de Louis Althusser e Eenne Bliba, Reading Capital cad. de Ben Brewster, Londres, 1979, p. 314. 6 PETER BURKE impoténcia, criando igualdade e ganhando um controle sobre seus corpos ¢ sobre suas vidas. Em 1961, por ordem de Esther Peterson, dirigente da Divisio de Mulheres do Departamento de Trabalho, o presidente Kennedy estabeleceu uma Comissio sobre a Condicio da Mulher. Seu relatério em 1963 documentou o fato de que eram negados as mulheres americanas iguais direitos e oportunidades, e recomen- dou a criagio de cingiienta comissbes estaduais. Em 1964, quando a Comissio para Oportunidades Iguais de Emprego (Equal Em ployment Opportunity Commission - EEOC) foi estabelecida pelo Ato dos Direitos Civis, a discriminagio sexual foi incluida em sua jurisdigio (acrescentada por um legislador hostil para desacreditar © sétimo diteito do Ato). Em 1966, delegados do terceiro encontro da Conferéncia Nacional das Comissdes Estaduais sobre a Condi- sao da Mulher votaram uma resoluggo que pressionava a EEOC para fazer valer a proibicio contra a disctiminacio sexual tio seriamente quanto ela o fez contra a discriminagéo racial. As mulheres que apresentaram a emenda derrotada encontraram-se entéo para decidir sua préxima ago e formaram a Organizagdo Nacional das Mulheres.? Mais ou menos na mesma época, as jovens do grupo Estudantes por uma Sociedade Democratica e do Movimento dos Direitos Civis comecaram a articular seus agravos, exigindo reconhecimento de seu papel de mulheres como partici pantes ativos (e iguais) nos movimentos politicos para a mudanga, social.$ No reino da politica tradicional, as mulheres tornaram-se um grupo identificavel (pela primeira vez desde 0 movimento sufragista na virada do século). Durante os anos 60, também as faculdades, as escolas de graduagio ¢ as fundacSes comegaram a estimular as mulheres a ‘obterem PhDs, oferecendo bolsas de estudo ¢ um considerivel apoio financeiro. “E claro”, comentou um autor, “que as mulheres 7. Jo Freeman, *Women on the Move: Roots of Revole", em Alice S. Rossi ¢ Ann Calderwood (ed.), Academic Women on the Move, Nova York, 1973, p. 137. Ver também os ensios de Alice Ross Kay Klosburger no mesmo volume. 8. Sara Evans, Personal Polis, Nova York, 1979. AESCRITA DA HISTORIA ° constituem uma importante forca latente para as faculdades ¢ a universidades carentes de bons professores € pesquisadores.”? Embora autores to diversos quanto diretores de facaldades ¢ académicos feministas reconhecessem que tinha havido “precon- ceitos contra as mulheres nas profissdes intelectualizadas”, eles tendiam a concordar que os obsticulos cairiam por terra, se as mulheres buscassem uma formacio de nivel superior.°E interes- sante (@ luz das discussdés teéricas subseqdentes) que a atuacio das mulheres foi aqui presumida; como opcio espontinza, atores racionais, as mulheres eram chamadas para se inserirem em profissdes que previamente as havia exclutdo ou subutiizado. No espacoaberto pelo recrutamento de mulheres, 0 feminismo logo apareceu para reivindicar mais recursos para as mulheres para denunciar a persisténcia da desigualdade. As feministas na academia declaravam que os preconceitos contra as mulheres nao haviam desaparecido, ainda que elas tivessem credenciais académi- «as ou profissionais, e se organizaram para exigir uma totalidade de direitos, aos quais suas qualificagdes presumivelmente Ihes davam direito, Nas associagdes das disciplinas académicas, as mulheres formavam facgdes para pressionar suas exigéncias, (Essas inluiam maior representagdo nas associagdes e nas reuntoes de intelectuais, atengao as diferencas salariais entre homens e mulhe- res e um fim @ discriminaco nos contratos, nos titulos e nas promogées.) A nova identidade coletiva das mulheres na academia anunciava uma experigncia compartilhada de discriminacso basea- da na diferenciagio sexual e também admitia que as historiadoras, como um grupo, tinham necessidades ¢ interesses particulares que ‘nfo poderiam ser subordinados categoria geral dos historiadores. Sugerindo que as historiadoras eram diferentes dos historiadores, 9, Citagto de Barnaby Keeney, Relrora da Brown Univesity, Pembroke Alumnae 27, 14, p 1, outubro de 1962. 10. Keeney, Ibid. p. 89; Jessie Bernard, Academie Women, Cleveland, 1966; Lucille ‘Addison Pollard, Women on College and University Faculties: A Hiserkal Sumy and 4 Saudy of thelr present Academte Status, Nova York, 1977. Ver especialmente 2 p.296. ' » PETER BURKE € que seu sexo influenciava suas oportunidades profissionais, as feministas disputavam os termos universais e unitirios que em geral designavam os profissionais e lancavam a acusacio de que eles haviam “politizado” previamente organizagdes nao politicas Em 1969, o recém-formado Comité de Coordenacéo de Mu Iheres na Profissio Historica apresentou, no encontro profissional da Associacio Histérica Americana (AHA), resolucdes ditigidas a melhorar a condicéo das mulheres, o que ocorteu dentro de uma atmosfera tensa e altamente carregada, Normalmente destinada a discussoes de leis secundarias e politica organizacional - 0 papel (nao a politica) da associacéo - esses encontros eram em geral um modelo de boa camaradagem e decoro. As discordancias, quando ocorriam, poderiam seratribuidas As diferengas de opiniao pessoal, preferéncia ou mesmo de persuasio politica, & prioridade institu ional ou regional, mas nenhuma delas era fundamental, nenhuma delas a plataforma de um “interesse” identificivel, em desacordo com o todo, Por seu tom, sua prontidao para a luta e sua exigencia em representar uma’ entidade coletiva a quem sistematicamente foram negados os seus direitos, as mulheres romperam as normas de conduta e desafiaram as implicagées de “trabalho, como sem- pre”. Na verdade, acusaram que o trabalho, como sempre, era em si uma forma de politica, pois ignorava e assim perpetuava a sistemitica exclusio (em termos de género e raca) de profissionais qualificados. © ataque ao poder entrincheirado teve pelo menos dois resultados: obteve concessées da AHA sob a forma de um comité ad hoc para averiguar as questdes levantadas (um comité que publicou um relatério em 1970 reconhecendo a condiga0 inferior das mulheres e recomendando varias medidas puniti- vvas, incluindo a criagio de um comité permanente sobre as mulheres) e resultou na critica da conduta das mulheres como ‘nfo profissional. A oposicio entre “profissionalistno” e “politica” nao é uma oposicao natural, mas parte da autodefinigio da profissio como uma pritica especializada, baseada na posse compartilhada de extensivo conhecimento adquirido através da educacio. Hé dois eerie ¢ 3G AESCRITA DA HISTORIA n aspectos distintos, mas em geral insepariveis, da definicao de uma profissio. Um deles envolve a natureza do conhecimento produsi- do, neste caso do que se considera como historia. O outro envolve as fungées de barreira que estabelecem e reforcam os padroes mantidos pelos membros da profissio, neste caso os historiadores. Para os historiadores profissionais do século vinte, a historia ¢ 0 conhecimento do pasado obtido por meio de investigaco desin- teressada e imparcial (0 interesse e a parcialidade so a antitese do profissionalismo) e universalmente dispontvel para quem quer que tenha dominado os procedimentos cientifcos requeridos.! O acesso repousa entio neste dominio, cuja possessio se supde evidente aqueles que jé sio profissionais e que por si s6 podem julgar. © dominio néo pode ser uma questio de estratégia ou de poder, mas apenas de educacio e treinamento. A qualidade de membro na profissio histérica confere responsabilidade aos indi- viduos que se tornam os guardises daquele conhecimento que é 0 seu campo de acdo especial. A guarda ¢ o dominio so portanto a base para @ autonomia e para 0 poder de determinar o que conta como conhecimento e quem o possui. Ealém disso, é claro, as profiss6es e as organizagbes profissio. nais séo estruturadas hierarquicamente: os estilos e padrdes domi nantes operam para incluir alguns e excluir outros da qualidade de membros. O “dominio” e a “exceléncia” podem ambos explici- tar julgamentos de capacidade e desculpas implicitas para tendén- cias viciosas; na verdade, os julgamentos de capacidade esto com freqtigncia entrelagados com avaliagbes de uma identidade social do individuo que sio irrelevantes & competéncia profissional.!? Como separar esses julgamentos, e realmente se eles podem ser afinal separados, sio questées nfo apenas de estratégia, mas de VL, Pete Novick, That Noble Dream: The “Objecuty Question” and the Amercon Hira Profession, Nova York, 1988. 12, Sobre a questio do acesto, ver Mary G. Dies, “Conta is All: Feminism and ‘Theories of Ciienship"; il K. Conway, "Politics, Pedagogy, and Gender"; ¢ Joan W. Scot, “History and Difference", todos em Daedalis, outono de 1987, p. 124, 137-52, 93118, respecivamente n PETER BURKE epistemologia. A oposigéo entre “politica” “profissionalismo” conseguiu pouco a pouco obscurecer a questo epistemologica. Na AHA, as mulheres, os negros, os judeus, os catdlicos e os “naocavalheiros” foram sistematicamente subtepresentados durante anos.) Esta situagdo era periodicamente observada ¢ protestada, alguns historiadores combinaram esforgos para remediar a discri- minacéo, mas os termos € 0 estilo de protesto eram diferentes daqueles utilizados apés 1969. Nos primeiros tempos, seja se recusando a comparecer a uma convengo marcada em um hotel segregacionista, seja insistindo para que as mulheres fossem inclu das nos encontros profissionais, os historiadores que participavam. do protesto alegavam que a discriminagio baseada em raca, reli- giflo, emia ou sexo prejudicava o reconhecimento de historiadores qualificados. Aceitando 0 coneeito do que a profissao deveria ser, argumentavam que a politica nfo tinha espaco ali; sua acio, declaravam, estava direcionada a realizacto dos verdadeiros ideais profissionais. Em contraste, a implicagio dos protestos de 1969 posteriores era que as profissdes eram organizagées politicas (nos mitiplos significados da palavra “politica”), apesar do decoro de seus membros; e apenas a acto coletiva poderia modificar as relagdes de poder prevalecentes. Durante os anos 70, as mulheres da AHA (e de outras associagées profissionais) uniram suas lutas locais por reconhecimento e representacio as campanhas nacionais das mu- Iheres, especialmente aquela para a Emenda dos Direitos Iguais & Constituigdo (Equal Rights Amendment - ERA), ¢ insistiram em que as associagdes profissionais como um todo tormassem uma posigio nessas questbes nacionais. Rejeitavam a sugestao de que a ERA fosse irrelevante para as questoes da AHA, argumentando que ciéncia ndo era neutralidade, mas cumplicidade com discrimina- io. No interior das organizacdes, nog6es sagradas como “excelén- cia intelectual” e “qualidade da mente” foram investidas por tantas capas de tratamento discriminatério, que deveriam ser substituidas 13, Howard K. Beale, "The Professional Historian: Historical Review, 22, p. 735, agosto de 1953, is Theory and His Practice’, Pacific [AESCRITA DA HISTORIA » por medidas quantitativas de’ ago afirmativa. Os padrdes profis: sionais de imparcialidade e desinteresse estavam sendo derrubados por interesses particulates, ou assim parecia aqueles que mantt ham a visio normativa. ‘No entanto, outra maneira de ver o problema ¢ tratar 0 desafio das mulheres como uma questio de redefinicio profissio- nal, pois a presenca de mulheres organizadas contestava a nosio de que a profissao da histéria fosse um corpo unitirio. Insistindo em que havia uma identidade de historiadoras em desaccrdo com aquela dos homens (e sugerindo também que a raga separava os historiadores brancos dos negros), as ferninistas questionavam se algum dia poderia haver avaliagées imparciais do saber, sugerin- do que elas nao eram mais que aatitude hegeménica de um ponto de vista interessado, Elas nao puseram de lado os padrés profis- sionais; na verdade, continuaram 2 defender a necessidade da educagio e de julgamentos de qualidade (instituindo, entre outras coisas, concursos para trabalhos de valor sobre a histéria das mulheres). Embora certamente se possa citar evidéncia de tenden- ciosidade entre os historiadores das mulhetgs, isso nao caracteri zava campo como um todo, nem era (04 é) algo peculiar as feninistas. E mesmo o tendencioso no defendia a distorgio deliberada dos fatos ou a supressio da informacio em prol da “causa’.14 A maior parte dos historiadores das mulheres nio TA. Esta questio surgi de viias maneiras diferentes, mais recentemente em conexto com o caso da Sears, No decorter de um procesto de discriminagio de sexo, movido contra ¢ cadeia de lojat Sears Roebuck and Company, duss historadoras das mulheres, Rosalind Rosenberg e Alice Kessler Harts, estemunharam em lados ‘posts, O caso provocou uma enorme controvérsia entre os historladores a respeito das implicegbes polltias da hstria das mulheres e dos comprometimentospolicos das historiadoras feminists, Houve acusagbes de mé fe de ambos os dos, mas as lcusagGes mais recentes(e bem mais contundentes) de Sanford Levinson e Thomas Haskell em defesa de Rosenberg, insistem em que Kessler Harris distoreu delibera damente histria no interesse da politia, enquanto Rosenberg defendeu bravamen- tea"verdede". A oposiho ente“polsica”e"verdade, "ideologiae “histira” compse 1 estrutra de seu entalo (¢ the proporciona seu tom aparentements objetivo €

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