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representações.
cientistas sociais desde fins dos anos 80. Ao final da década de 90 um balanço crítico é
realizado por uma série de autores sobre o uso de imagens nas ciências sociais. Há uma
avaliação de que se evoluiu do tratamento da imagens como objeto para indagar o que as
expressivo também o modo como uma interlocução com especialistas vem se combinar
para a apropriação de imagens nas ciências sociais haja vista a presença de profissionais
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Destacam-se algumas publicações: Desafios da Imagem de 1998 organizado por Miriam Moreira Leite e
Bela Felman-Bianco ; O Fotográfico de 1998 organizado por Etienne Samain e a Revista Cadernos de
Antropologia e Imagem da UERJ que publica semestralmente desde 1995 estudos sobre a relação imagem e
ciências sociais.
de conhecimento, este trabalho trata de um aspecto do debate que é o do uso da fotografia
na pesquisa sociológica.
a fotografia como instrumento de pesquisa são modos pelos quais a relação fotografia e
O uso da imagem como fonte produz um debate que se estrutura no problema da imagem
como “evidência aceitável”. O papel das imagens na “construção cultural“ das sociedades
lhes confere a condição “de testemunhas de arranjos sociais do passado e acima de tudo as
maneiras de ver e pensar do passado” (Burke, 2004). Portanto aqui a relação estabelecida
Estudos da Miriam Moreira Leite reunidos em Retratos de Família (2000) são uma
sociológica no Brasil.
Pierre Bourdieu, nos anos 60, como uma sociologia de grupos. Em Art Moyen (1965) o
pensamento e apreciações que diz respeito ao grupo social. Por exemplo, quando aborda a
relação que camponeses estabelecem com a fotografia ele demonstra que essa relação é, em
última análise, um aspecto da relação que esse camponês estabelece com a vida urbana. Seu
modo de ver a fotografia é um modo de afirmar valores que o definem como camponês,
porque associaria o modo de vida urbano a uma arte de viver que coloca em questão a arte
de viver no campo.
Margareth Mead e Gregory Bateson em Balinese Caracter (1942) cujos estudos foram
experimental” reconhece a força expressiva das imagens produzidas por Bateson mas alerta
para o formato perigosamente “ científico” com que foram tratadas as imagens. Essa
pesquisa.
Ao final dos anos 80 quando realizei um primeiro trabalho com fotografias, algumas
vezes ouvi de colegas sociólogos a pergunta, fotografar para quê? O que isso acrescenta ou
que sustentassem o uso de imagens na pesquisa. Eu não sabia responder para quê
o que a imagem me dava a ver? Que problemáticas poderiam ser constituídas? Tinha a
sensação que me debruçar sobre as imagens que produzia, para pensá-las de uma
perspectiva sociológica, era como quebrar um código de algo que de meu ponto de vista era
que ver é estar diante do modo como as sociedades se produzem visualmente. E isto é
imagens diz respeito ao modo como indivíduos que pertencem a um determinado contexto
Penso ainda ter compreendido que se está diante de uma problemática da construção do
conhecimento sociológico que diz respeito ao que está estabelecido como significativo e
relevante na prática científica e os estranhamentos com novos objetos. Fica clara a idéia da
que não tem uma evidência histórica imediata”. Não só afirmar a insignificância mas
Um balanço realizado sobre estudos até os anos 90 faz um diagnóstico que mostra
112). Essa banalização estaria sustentada por um conjunto de atributos que acredita-se as
evidência” da fotografia seria uma questão essencial ao cientista social. Neste caso, o que
evidência” da fotografia.
fazer uma vigilância sobre a mais forte convenção de representação com que trabalhamos, o
(Barthes, 1984) Uma fotografia é o que ela representa sob que condições?
momentos em que se expressa uma nova condição das imagens na sociedade, das formas de
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Realismo é uma categoria da estética e define uma convenção visual da cultura ocidental..
A conjunção entre uma perspectiva sociológica, uma retórica do realismo e
Becker 3(1986) e fornece elementos para se pensar a combinação de dois olhares para a
exploração da sociedade”.
A idéia de uma sociologia da ação, onde prevalece o espírito da pesquisa versus uma
e intervenção na vida social; de que pode produzir conhecimentos úteis para a solução de
problemas sociais concretos são características importantes nos trabalhos da Escola cuja
atenção converge para lidar com problemas gerados no contexto da cidade de Chicago e
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Howard Becker é considerado junto com outros sociólogos (Goffman) como herdeiros da orientação teórica
e metodológica da Escola de Chicago e continuadores de uma tradição de trabalho representada pela Escola.
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O que se designa como Escola de Chicago é um conjunto de trabalhos de pesquisa sociológica realizados
entre 1915 e 1940 por professores e estudantes da Escola de Chicago. (Coulon; data.)
Os problemas de investigação criados originam “métodos originais”5 de pesquisa com
experiências da vida cotidiana que se desenvolve uma sociologia cujos objetivos eram
O lugar que a fotografia ocupa nesse contexto sociológico é assinalado por estudos de
sociólogos pode ser assinalada por uma mudança no papel do fotógrafo diante de uma
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Becker ( data; pg) afirma que tal riqueza metodológica foi pouco problematizada, não havendo “ qualquer
traço de uma reflexão sistemática sobre métodos utilizados” .
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Segundo Maresca (s/d) “as mudanças correspondem a uma reorientação do redator em direção a um
conteúdo explicitamente “científico” . A sociologia foi chamada a sustentar sua “ démarche” sobre aquelas
das ciências puras. A revista passou a consagrar um lugar crescente às estatísticas , às discussões
metodológicas ou teóricas, eliminado os artigos que tratavam de reformas sociais” .
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De 1870-1890 o fotógrafo Jacob Riis é o primeiro a lidar com a fotografia como instrumento de crítica
social com imagens sobre bairros pobres de Nova York. ( Freund, G., 2004;98)
assumia a tarefa de expor os males da sociedade, de dar a ver o que não se queria ver e
educacional com John Dewey na Escola de Chicago, é visto como um marco dessa
associação de produção de fotografias com estudos sobre a vida urbana. Lewis Heine entre
de luta para mudanças nas condições de vida dos pobres e agiu na consciência dos norte-
significativa no modo como articula signos e das condições de recepção das imagens. É
também essa força persuasiva que impacta os discursos construídos sobre a imagem ou a
que servem para pensar essa questão. Lembro da clássica fotografia da menina queimada
com napalm na guerra do Vietnã (foto 7) e seu impacto sobre a sociedade. As condições
mãe e sua filha no ataque terrorista na escola de Beslan publicada por agências no mundo
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É somente na década de 30 que L. Heine adquire um reconhecimento como fotógrafo. A aceitação tardia é
atribuída ao fato de que seu trabalho se dava dentro de uma estrutura organizacional que não era a do mundo
da arte. O contexto do trabalho artístico de Heine era a estrutura institucional das Reformas Progressivas
(redes organizadas de associações; publicações da Escola de Chicago, etc. ). As condições de recepção à obra
de Heine serão dadas pela produção de categorias de práticas estéticas como “camera work” por Stiegletz que
possibilita o reconhecimento de Heine e lhe dá um lugar na história da fotografia. (Trachtenberg, 1994; 165).
Se a “força da evidência”, aquilo que é dado, é o perigo que ronda a análise
Olhando para uma tradição de colaboração entre sociologia e fotografia me parece que o
que funda essa colaboração é a força persuasiva das imagens oriundas da combinação de
Conflito de representações
medida que sociologia e fotografia passam a ter fronteiras mais definidas enquanto ciência
e arte. (Becker, 1986; 230). E novas questões são colocadas para pensar a prática da
Para H. Becker (1986: 241)) os problemas são complexos. Como introduzir na pesquisa
a fotografia para recortar coisas que o “senso comum fotográfico” não recortaria? Como
lidar com hábitos visuais estabelecidos? E de que modo romper com a naturalização da
prática fotográfica em contextos de estudo. Para lidar com esses problemas dois aspectos
H. Becker define arte como uma forma de ação coletiva. O seu interesse pela arte como
( ciência) representam um tipo de organização que opera com mais liberdade e menos
remete “às idéias e compreensões que as pessoas têm em comum e através das quais
efetuam sua atividade cooperativa”. Howard Becker chama a atenção para um fato
rígidas, imutáveis. Elas não especificam um conjunto inviolável de regras ao qual todo
mundo deve se referir ao estabelecer questões sobre o que fazer” (Becker; 1977; 214). A
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Grifo meu
sociológico. Outra resposta para os sociólogos aponta o problema como sendo de
enquanto você fotografa. A teoria te diz quando a imagem contém alguma coisa de valor,
ela te diz o que vale a pena ser comunicado. Ela fornece os critérios pelos quais dados e
declarações de valor podem ser separados daquelas que não contem nenhum valor. Que
distinções entre expressão estética e análise social, ainda que convenções diferentes sobre a
(1986; pg).
quando ela é feita num contexto “científico”, e parte do pressuposto de que informação e
expressão não podem estar separadas. Ele sugere aos “acadêmicos” ou cientistas sociais
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problematizar esta visualidade tem gerado debates distintos no interior dos campos de
conhecimento. Certamente haverá muitas discordâncias acerca da existência de disciplinas
como a sociologia da imagem; sociologia visual, etc. Esse no entanto não é o papel deste
trabalho, nem lidar com critérios epistemológicos mas compartilhar da idéia de que a
visualidade é tem um valor estratégico para o conhecimento da vida social e que reivindica
âmbito das pesquisas da Escola de Chicago sugere uma dimensão política e um modus
treinamento porque ele só pode ser “ apreendido no jogo científico” e o rigor exigido por
esse jogo não deve ser confundido com rigidez que é o contrário da inteligência e da
renúncias, socializar as dificuldades que me parece ser possível trabalhar para responder a
algumas questões.
Bibliografia
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Fronteira, 1984.
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1986.
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Eckert, C e Novaes, S. C ( org.) . O imaginário e o poético nas ciências sociais . São paulo,
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