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CONTRIBUIÇÃO PARA UMA DEFINIÇÃO SITUACIONISTA DE JOGO

Internacional Situacionista
IS n°1. Junho de 1985

A notória confusão, tanto no vocábulo quanto na prática, que a noção de jogo traz
consigo só pode ser resolvida se essa noção for considerada em seu movimento. As
primitivas funções sociais do jogo, após dois séculos de sua negação provocada pela
contínua idealização da produção, já não se apresentam como meros resíduos corrompidos,
misturados com formas inferiores oriundas das necessidades da atual organização dessa
produção. Ao mesmo tempo, surgem tendências progressivas do jogo ligadas ao próprio
desenvolvimento das forças produtivas.
A nova fase de afirmação do jogo deveria caracterizar-se pelo desaparecimento de
todo elemento de competição. O fato de ganhar ou perder, até então quase inseparável da
atividade lúdica, aparece ligado a toda as outras manifestações da tensão entre indivíduos
quando buscam apropriar-se de bens. O sentimento da importância de ganhar o jogo, quer
se trate das satisfações concretas ou na maioria das vezes ilusórias, é mau produto da
sociedade má. Sentimento esse naturalmente explorado por todas as forças conservadoras,
que o utilizam para disfarçar a monotonia e a atrocidade das condições de vida que impõem
aos outros. Basta lembrar todas as reivindicações desvirtuadas pelo esporte de competição,
que se estabeleceu sob uma força moderna precisamente na Grã-Bretanha, com o
desenvolvimento das manufaturas. Não apenas as multidões se identificam com os
jogadores profissionais ou clubes, que assumem papel mítico idêntico ao dos artistas de
cinema vivendo por elas e ao dos políticos decidindo por elas, mas também a série infinita
dos resultados dessas competições continua a apaixonar os observadores. A participação
direta num jogo, mesmo nos que requerem alguma habilidade intelectual, perde todo o
interesse quando se trata de aceitar a competição em si, dentro de um quadro de regras
fixas. Exemplo do desprezo contemporâneo voltado à ideia de jogo é a pretensiosa
constatação que abre o Breviário de xadrez de Tartakower: “O jogo de xadrez é
universalmente reconhecido como o rei do jogo”.
O elemento da competição deve desaparecer em favor de um conceito mais
realmente coletivo de jogo: a criação comum das ambiências lúdicas escolhidas. A distinção
central a superar é a que se estabelece entre jogo e vida corriqueira, considerando-se o jogo
como uma exceção isolada e provisória. Segundo J. Huizinga, “o jogo realiza, na imperfeição
do mundo e na confusão da vida, uma perfeição temporária e limitada”. A vida corriqueira,
condicionada até então pelo problema da substância, pode ser dominada racionalmente –
possibilidade que está no âmago de todos os conflitos de nossa época – e o jogo, rompendo
de forma radical com um tempo e um espaço lúdico acanhados, deve tomar conta da vida
inteira. A perfeição não deve ser a sua finalidade, se tal perfeição significar uma construção
estática oposta à vida. Mas sempre é possível tentar atingir a perfeição desta bela confusão
que é a vida. O barroco, que Eugénio d’Ors qualificava, no desejo de limitá-lo
definitivamente, de “vacância da história”, assim como o que foi organizado após o barroco
vão ocupar um grande espaço no reino vizinho do lazer.
Nessa perspectiva histórica, o jogo – experimentação permanente de novidades
lúdicas - nunca aparece fora da ética, da questão do sentido da vida. O único sucesso que
alguém pode conceber no jogo é o sucesso imediato de sua ambiência e o aumento
constante de seus poderes. Enquanto em sua presente coexistência com os resíduos da fase
decadente do jogo não consegue libertar-se completamente do aspecto competitivo, seu
objetivo deve ser o de, no mínimo, provocar condições favoráveis para viver a vida de form
direta. Neste sentido, ele é também luta e representação: luta por uma vida à altura do
desejo, representação concreta da vida.
O jogo é percebido como fictício por sua existência marginal se comparada à
estafante realidade do trabalho, mas para os situacionistas o trabalho consiste precisamente
em preparar futuras possibilidades lúdicas. Talvez surja a tentação de menosprezar a
Internacional Situacionista porque ela apresenta aspectos de um grande jogo. “No entanto,
diz Huizinga, já lembramos que a noção de ‘apenas jogar’ não exclui de modo algum a
possibilidade de realizar esse ‘apenas jogar’ com muita seriedade...”

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