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CHARLES-HENRV CUIN/FRANÇOIS GRESLE

TRADUÇÃO

ROBERTO LEAL FERREIRA

)LÃ 05>36

/Jesus [}. ?<.anieel

MOVIMENTO
CADERNOS ENSAIO
Direção
J.Chasin íNDICE
CADERNOS ENSAIO X CADERNOS ENSAIO - MANIFESTO EDITORIAL X 11
Série Pequeno Formato
CHARLES-HENRY CUIN/FRANÇOIS GRESLE
História da Sociologia PARTE I
Título Original
Histolre de Ia Sociologie ANTES DE 1918
Tomo 1: Avant 1918/Tome 2: Depuis 1918
© Éditions Ia Découverte. 1992 INTRODUÇÃO 19
© Da Edição Brasileira: Editora Ensaio/SP/l994
Coordenação Editorial 1- DA "FísiCA SOCIAL" À "SOCIOLOGIA":
M. Dolores Prades
Capa
A DESCOBERTA DE UM NOVO
Gilberto Sato OBJETO DE CONHECIMENTO
Revisão (1790-1860)
Maria Dolores Prades e Lívia Cotrim (Originais)
e Equipe Ensaio
1. A SOCIOLOGIA. HERDEIRA DA REVOLUÇÃO 21
Diagramação, Composição e Filmes A CORRENTE TRADICIONALISTA 23
Ensaio - Editoração Eletrônica DOS IDEÓLOGOS A SAINT-SIMON _ 24
Impressão e Acabamento 2. AS MÚLTIPLAS FACETAS DO POSITlVISMO
Gráfica Editora Hamburg E DO CIENTIFICISMO 31
O POSITlVISMO DE AUGUSTE COMTE 31
Dado. Internacional. de Catalogação na Publicação (CIP)
(Cãmara 8ra.llelra do livro. SP. 8rasll)
UMA VARIANTE INGLESA DO POSITlVISMO 35
. Cuin. Charles-Henry
A ESTATíSTICA MORAL E JUDICIÁRIA _ 37
História da Sociologia I Charles-Henry Cuin. Franço~ A MATEMÁTICA SOCIAL .40
Gresle; tradução Roberto leal Ferreira. - São Paulo: En-
saio. 1994. - (Cadernos Ensaio Pequeno Formato; 10) 3. CONTINUIDADE E MUDANÇA
DA REFLEXÃO POLíTICA 44
Bibliografia.
DEMOCRACIA E REVOLUÇÃO EM TOCQUEVILLE 44
I. Sociologia - História I. Gresle. François. 11.Título. SOCIALISMOS UTÓPICOS E MARXISMO .48
11I.Série.
BIBLIOGRAFIA (1790-1860) 53
94-1439 CDD-301.09

Indlces Para Catálogo Slstemátlco


I. Sociologia: História 301.09
JI-SOCIOLOGIA
ISBN 85-85669-07-1 OU CIENCIA(S) SOCIAL(AIS)?
UMA DISCIPLINA EM BUSCA
1994 DE IDENTIDADE (1860-1890)
EDITORA ENSAIO
Rua Tupi. 784
01233-000 - São Paulo - SP
Telefone: (011) 66-4036 1. VOLUNTARISMO POLíTICO E SOCIEDADE:
Fax-Modem: (011) 66-3168 O CASO FRANCÊS .................................................... 55
CHARLES-HENRV CUIN/FRA~IS GRESLE HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA -INDICE

I A UNIVERSIDADE E AS VELEIDADES
DE REFORMA DO ESTADO IMPERIAL
FRÉDÉRIC LE PLAY E SEU MOVIMENTO
A ESCOLA LIVRE DE CIÊNCIAS POLíTICAS
2. OS "PARADIGMAS" DE ORIGEM
56
59
62
IV - A SOCIOLOGIA COMO ARTE SOCIAL

1. O SURGIMENTO DE OUTROS PÓLOS NACIONAIS


DE PESQUISA NA EUROPA 119
DA CIÊNCIA SOCIAL 64 NA BÉLGICA,
O BIOLOGISMO E SEUS EXCESSOS 65 UMA CIÊNCIA SOCIAL JÁ APLICADA 119
O ORGANICISMO 67 A RÚSSIA, ENTRE CIÊNCIA E REVOLUÇÃO 121
O CONTRATUALlSMO 68 NA ITÁLIA, DA CRIMINOLOGIA
A FILOSOFIA ALEMÃ CONTRA O POSITIVISMO 70 À SOCIOLOGIA PARETlANA 122
3. OS LIMITES DE UMA NA FRANÇA, TRANSMISSÃO E PARTILHA
CIÊNCIA DA SOCIEDADE NOS ANOS 1880 72 DA HERANÇA LEPLAYSIANA 125
BIBLIOGRAFIA (1860-1890) 73 GRANDEZA E MISÉRIA
DA SOCIOLOGIA BRITÂNICA 128
2. O REFORMISMO AMERICANO 131
111-ENTRE A, FRANÇA E A ALEMANHA, PARA UM MUNDO NOVO,
UM MAGISTERIO DISPUTADO (1890-1918) UMA CIÊNCIA NOVA 131
SMALL, EMPREENDEDOR DE SOCIOLOGIA 133
1. O DEBATE ACERCA SITUAÇÃO DA DISCIPLINA
POR VOLTA DE 1910 135
DAS CIÊNCIAS DO EspíRITO 75
WUNDT E A PSICOLOGIA CIENTíFICA 77 BIBLIOGRAFIA 136
O COMUNITARISMO DE TONNIES 79 BALANÇO DO PERíODO 139
O PSICOLOGISMO À FRANCESA 80 BALIZAS BIBLIOGRÁFICAS 141
2. A SOCIOLOGIA COMO QUADRO SINÓTICO ·146
"CIÊNCIA DOS SERES SOCIAIS" 83
SIMMEL E A SOCIOLOGIA DA FORMA 84
WEBER E A SOCIOLOGIA COMPREENSIVA 86 PARTE 11
A SOCIOLOGIA ALEMÃ:
UMA DISCIPLINA DE ESTATUTO INCERTO 90
A PARTiR DE 1918
3. A SOCIOLOGIA COMO
INTRODUÇÃO 159
CIÊNCIA GERAL DO SOCIAL 92
ÉMILE DURKHEIM: A CARREIRA 92
A OBRA 94 1- DESTINOS DESIGUAIS (1918-1945)
4. OS ESFORÇOS DE ORGANIZAÇÃO
DA DISCIPLINA NA FRANÇA 99 1. A SOCIOLOGIA FRANCESA SEM DURKHEIM 163
OS REPUBLICANOS E O ENSINO SUPERIOR 100 POSTERIDADE E DECLíNIO
O APOIO DA INICIATIVA PRIVADA 103 DO DURKHEIMIANISMO 164
AS HESITAÇÕES DO MERCADO INTELECTUAL 106 OS NÃO-DURKHEIMIANOS
A AVENTURA DE L'ANNÉE SOC/OLOG/QUE 110 DURANTE O ENTI<E-GUERRAS 171
UMA INSTlTUCIONALIZAÇÃO DESORDENADA 112 2. AS SOCIOLOGIAS ALEMÃS
BIBLIOGRAFIA (1890-1918) 11 7 ENTRE UMA E OUTRA DERROTA 174
CHARLES-HENRY CUIN/FRANÇOIS GRESLE HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA fNDICE

I o ARQUIPÉLAGO SOCIOLÓGICO
TEORIZAÇÕES SISTEMÁTICAS
POUCO FECUNDAS
A PROLIFERAÇÃO DAS ÁREAS DE PESQUISA
175

177
181
III-UMA EXPLOSÃO
DE PARADIGMAS (1968-1990) I
OS SOCiÓLOGOS ALEMÃES SOB O NAZISMO 185 1. OS NOVOS PARADIGMAS ANGLO-SAXÕES 248
3. A SOCIOLOGIA ATRAVESSOU O ATlÂNTICO 187 A SOCIOLOGIA CRíTICA 249
UMA SOCIOLOGIA "SECULAR" 187 OS AVATARES
A CIDADE COMO LABORATÓRIO DO INTERACIONISMO SIMBÓLICO ........................ 251
DA UNIVERSIDADE DE CHICAGO 191 DAS TEORIAS DO INTERCÂMBIO SOCIAL
EM BUSCA DA SOCIEDADE AMERICANA 194 ÀS DA ESCOLHA RACIONAL 255
HARVARD E A REAÇÃO TEÓRICA 196 A RENOVAÇÃO DA SOCIOLOGIA HISTÓRICA 256
4. CONCLUSÃO 198 O FLORESCIMENTO DA TRADiÇÃO
BIBLIOGRAFIA (1918-1945) 200 EMPíRICO-ANALínCA 257
2. OS DILEMAS DA SOCIOLOGIA FRANCESA 260
UM PROCESSO DE EXTENSÃO
E DE SEGMENTAÇÃO . . 260
11-0 TEMPO DAS AMBiÇÕES (1945-1968) MORTE E RESSURREiÇÃO
DE UMA SOCIOLOGIA DO ATOR 263
1. A "IDADE DE OURO"
NOS "QUATRO CANTOS
DA SOCIOLOGIA AMERICANA 205 DA SOCIOLOGIA FRANCESA" 268
AS CONSOLIDAÇÕES INSTlTUCIONAIS 207 3. E EM OUTROS LUGARES 270
O TRIUNFO DO EMPIRISMO QUANTlFICADOR 208
BIBLIOGRAFIA (1968-1990) 272
A HEGEMONIA DO FUNCIONALISMO 212
TENDÊNCIAS GERAIS E PERSPECTIVAS 279
A ASCENSÃO DAS OPOSiÇÕES 217
BALIZAS BIBLIOGRÁFICAS 283
2. A RECONSTRUÇÃO
QUADRO SINÓTlCO 288
DA SOCIOLOGIA FRANCESA 221
O PROCESSO DE EDIFICAÇÃO
INSTlTUClONA L 222
UM EMPIRISMO CONJUNTURAL 226
OS COMBATES DE GURVITCH 229
3. A INTERNACIONALIZAÇÃO DA SOCIOLOGIA 232
O PAPEl DA UNESCO E
DOS ESTADOS UNIDOS 232
RECONSTRUÇÕES E CONSTRUÇÕES
DAS SOCIOLOGIAS OCIDENTAIS 234
A HIBERNAÇÃO DA SOCIOLOGIA
COMUNISTA .............................................................. 237
O MllITANTISMO SOCIOLÓGICO
LATINO-AMERICANO 238
4. CONCLUSÃO 239
BIBLIOGRAFIA (1945-1968) 241
CADERNOS ENSAIO
MANIFESTO EDITORIAL X
1

CADERNOS ENSAIO - resultado e ampliação das


atividades da ENSAIO-Revistade Filosofia, Política e
Ciência da História - é o adensamento editorial de
um projeto teórico-prático guiado pela finalidade de
estimular e contribuir para a efetivação de um Mo-
vimento de Idéias no país.
Movimento de Idéias compreendido e praticado
como suposto necessário para uma correta e con-
creta intervenção social, exigido e orientada pela
lógica humano-societária do trabalho. Issosumariza,
no quadro nacional. forma diferenciada ou original
de conceber e vir a exercitar os atos inerentes à
prática de esquerda, matrizada pela sua própria In-
tegridade e conduzido à eficácia.
Movimento de Idéias como exigência de pressu-
posto incancelável. que deita raízes na exemplari-
dade de autores e even'os ntstónccs ~·..:a,em sua
grandeza e perenidade ou na mesquinhez e contin-
gência de sua contrafação, constituem a base para
o deciframento das revoluções dos séculos XIX e XX,
de cujo balanço emergem lineamentos para as re-
voluções do século XXI.
Movimento de Idéias afirmado como pré-requisito
da disposição e dos dispositivos sociais, legítimos e
imprescindíveis à ação lúcida e resolutiva, que ja-
mais foi atendido nos adventos dos partidos brasilei-
ros ditos de esquerda, sempre tomados nos estreitos
limites da política, e jamais compreendidos como
formas categoriais de Identificação social. Entre suas
debilidades de origem, essa é uma das fundamen-
CADERNO ENSAIO X CADERNO ENSAIO X
MANIFESTO EDITORIAL X MANIFESTO EDITORIAL X

I
tais na explicação
falências.
de seus permanentes fracassos e cação dos homens e das farmas de sociabilidade.

CADERNOS ENSAIO, realização editorial alternativa,


I
CADERNOS ENSAIO é o desenvolvimento de um na justa ambição de seu projeto global. terá que
programa editorial ativo, fundado na afirmação e na comedir sua trajetória não pelo porte ou pelas de-
polêmica. Coragem afirmativa no diálogo e diálogo mandas de seu objetivo, mas pelo tamanho de suas
de rigor na polêmica. próprias energias, que só o Interesse e a adesão ati-
Afirmação, diálogo e polêmica no próprio conju- va dos leitores, tal como ocorreu com a Revista
gado dos volumes que virão a ser integrados em Ensaio,poderão ampliar.
suas duas SÉRIES (Pequeno e Grande Formatos). eu- Assim, não inundará o mercado livreiro, nem será
jos espaços não são concebidos como simples uma nova moda em não se sabe quantos in-oitavos.
reserva de domínio para uso e abuso de seu respon- Reconforta a certeza de que nasce e será construí-
sável ou de seus editores. O leque pretendido é da, contra as limitações histórlco-societárias atuais, a
amplo, mas bem dimensionado, tendo por medidas serviço da tarefa essencial e perene da auto-cons-
o texto competente e a urgência social de sua te- trução humana.
mática. Longe, portanto, da mera vulgarização sofis- É o que poderá vir a ser festejado, caso a Inicia-
ticada ou da simples iniciação duvidosa, tanto tiva alcance reconhecimento.
quanto dos arremedos teóricos fabricados na esfera
estiolada da rnllltôncro partidária atual. Todos, estes
e aquelas, formas de desprezo pela inteligência e
pela sensibilidade do leitor, e reduzidos assim, em
graus diversos, a ferramentas da manipulação. Indús-
tria cultural, a serviço da produção do falso, e arte-
sanato partidário, mistificador de meios e fins, nada
tendo ambos a ver com o trabalho pesado de- sa- 2
ber e transformar.

HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA - Cadernos Ensaio X -


na recusa à mera vulgarização, grosseiraou sofistica-
CADERNOS ENSAIO é mais um esforço do Movi-
da, e à iniciação simplista, sempre duvidosa porque
mento de Idéias pela produção do saber e pela
redutora, é a incursão da Série pelo domínio dos po-
projeção do transformar, centrados na potência oní-
moda da. lógica humano-societária do trabalho, no radidáticos.
vir a ser do trabalho emancipado como o devenlr Tal ramificação brotou da experiência acumulada
homem do homem. com a publicação dos volumes anteriores. Grande
parte destes evidenciou. para além de sua destina-
Por conseqüência, nas duas SÉRIESterão guarida
as afirmações clássicas e contemporâneas desse ção projetada, clara serventia como Instrumento
complementar de ensino, não só universitário, mas
complexo determinativo, assim como suas tematiza-
também de grau médio.
ções e derivações em âmbitos diversos, sem exclu-
Antes de tudo, assumir essa nova dimensão pro-
são da controvérsia que o problematiza e até
gramática não oferecia qualquer dificuldade, pois,
mesmo o nega ou "desconhece", quando da expli-
em essência, para os alvos do Movimento de Idéias,
CADERNO ENSAIO X CADERNO ENSAIO X
MANIFESTO EDITORIAL X MANIFESTO EDITORIAL X

I
a serviço do qual estão os CADERNOSENSAIO,for-
mar e informar, esclarecer e instigar à consciência
crítica, em qualquer plano, são momentos vitais sem-
pre postos em relevo.
menoscabo pela universalidade. Desmantelo nada
casual. a arrematar a produção do fantoche opro-
priadO à ordem vigente, mera singularidade unilate-
ralizada à miséria do imaginário e das pulsões, ao
I
qual é consagrado o canto justificatório do irraciona-
lismo dominante.
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA - Cadernos Ensaio X - é,
sob o reinado atual das tendências que desmante- J.C.
lam a abordagem social. a pretexto de ressalvar o AGOST0/1994.
Indivíduo, a reafirmação da irredutibilidade da essên-
cia social do homem.
Reiteração aqui formulada, desde logo, Indepen-
dentemente de qualquer escola sociológica e até
mesmo do conjunto de sua história, pois verá o lei-
tor, dado o escrúpulo dos autores, que se está
diante de uma irremediável centrifugação, diante da
qual a questão de fundo diz respeito à própria natu-
reza da chamada reflexão sociológica, tal como
emergente a partir de finais do século passado.
Dificuldades de raiz, que 'Cuin e Gresle assumem
a seu modo: "A hipótese dos autores deste livro é
que sua disciplina, vinda no final do século XIX de
uma revolução multifacetada que o mundo ociden-
tal foi o único a viver, deve seu desenvolvimento a
um conjunto de condições intelectuais, sociais e lns-
tituclonais que ainda devem ser elucidadas. Conse-
qüentemente, o procedimento adotado relata a
história de um projeto e de uma prática científicas e
propõe algumas chaves de análise para ela".

HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA - Cadernos Ensaio X -


largo painel informativo em volume de proporções
reduzidas, identifica vertentes e mapeia roteiros, faci-
litando visualizações à assimilação crítica, que
demanda passos subseqüentes, interrogações e
aprofundamentos, inclusive superações corretivas.
Cumpre, portanto, o papel de seu gênero, impulsio-
nando para além dele. O que não é pouco, espe- LEIA E DIVULGUE
cialmente em uma época de franca decadência ~ns<::lic>
cultural, de esfacelamento da raclonalidade e de REVISTA
DE FILOSOFIA.
POLíTICAE CltNCIA DA HISTÓRiA
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I-
Z
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-
INTRODUÇAO
sociologia não é uma atividade puramente
A especulativa e tampouco o simples reflexo da
vida social e política de uma dada época ou cole-
tividade. Não poderíamos, portanto, reduzir sua histó-
ria nem à história de um "pensamento" que fosse
considerado como um fenômeno natural, inseparável
de seu objeto - como fazem certos economistas -,
nem à história das sociedades onde ela se desenvol-
ve, o que levaria a um relativismo histórico de pouco
fôlego.
A hipótese dos autores deste livro é que sua disci-
plina, vinda no final do século XIX de uma revolução
multifacetada que o mundo ocidental foi o único a
viver, deve seu desenvolvimento a um conjunto de
condições intelectuais, sociais e institucionais que ain-
da devem ser elucidadas. Conseqüentemente, o pro-
cedimento adotado relata a história de um projeto e
de uma prática científicas e propõe algumas chaves
de análise para ela.
Preocupados com a concisão, foi adotada uma
concepção bastante estrita da sociologia, que levou,
de fato, a excluir do campo de pesquisa a etnologia
e a psicologia social. Em compensação, evitamos re-
duzir - como acont.ece muitas vezes - o enquadra-
mento histórico à apresentação de uma tradição
nacional (a do narrador, na maioria dos casos), as-
sim como de uma época mais remota (o "tempo
dos precursores e dos fundadores"). Também não se
encontrarão as habituais referências aos filósofos da
Antigüidade, nem aos políticos do Renascimento ou
às "Luzes"do século XVIII, que são remetidos à pré-
história das ciências sociais. Esforçamo-nos igualmen-
te por não propor uma leitura parcial ou militante da
disciplina, recorrendo a um fio teórico pretensamente
diretor, que sempre se revela excessivamente redutor.
Pelo contrário, os autores tiveram a preocupação
de esclarecer o leitor e de recolocar os principais
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
PARTE I

I] atores no contexto próprio deles, ou seja, respeitando


seus esquemas mentais e comparando as estruturas
formais, sem esquecer o que estava em jogo, parcial
ou globalmente, nos períodos em questão; daí as bi-
1- DA "FíSICA SOCIAL" À
"SOCIOLOGIA":
bliografias centradas nas obras, que pontuam cada
capítulo, e os quadros sinóticos colocados no final do A DESCOBERTA
volume. De resto, o recorte cronológico utilizado e,
para cada momento, as áreas geográficas privilegia-
DE UM NOVO OBJETO
das (França, Alemanha, Grã-Bretanha, Estados Unidos DE CONHECIMENTO
da América) correspondem antes de tudo à vontade
de sublinhar os traços mais significativos dessa história; (1 790- 1860)
não Implicam necessariamente rupturas temporais ou
exclusividades intelectuais.
e um ponto de vista histórico, a disciplina, en-
Os riscos de um tal empreendimento são eviden-
tes: nivelamento - que alguns julgarão excessivo -
das diferentes correntes de pensamento e escolas;
D quanto discurso e enquanto prática, surgiu len-
tamente, e de maneira dispersa, ao longo de todo o
evocação tão fiel quanto possível dos grandes auto- século XIX. Mas o Impulso inicial proveio realmente
res - e de outros menores não r;nenos importantes - da dupla revolução, industrial e política, por que
que nos proibimos de "modernizar" demais; equilíbrio, passou o ocidente entre 1780 e 1860, aproximada-
difícil de obter, entre a exposição das doutrinas e a mente.
de suas condições de surgimento. E a lista não está
completa! Mas se os sociólogos devem estar plena-
mente conscientes das armadilhas do naturalismo e
das dificuldades constantes de objetivação do co-
nhecimento, eles certamente não têm garantias
maiores do que os outros de não cair nelas.
Enfim, por razões de agilidade, a redação da pri-
meira parte (Parte 1) coube principalmente a Fran-
1. A SOCIOLOGIA,
çols Gresle, e a da segunda (Parte 2) a Charles- HERDEIRA DA REVOLUÇÃO
Henry Cuin. No entanto, a obra aqui apresentada foi
concebida e realizada como um todo por ambos os
autores, que assumem conjuntamente a responsabili-
dade por ela. Q ue se entende por "revolução"? O termo é
mais antigo do que parece. Designa, na filo-
sofia clássica, a natureza antes de tudo cíclica das
mudanças que atingem a vida da cidade, a exem-
plo do movimento dos astros ou das estações. Este
sentido ainda é usual no século XVIII,quando se im-
põe a Idéia de que a revolução pode ser Iínear e
desembocar em conseqüências novas ou até impre-
visíveis,que já não se explicam unicamente pela lei-
tura do passado.
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA I - DA 'FfsICA SOCIAL' A 'SOCIOLOGIA'
PARTE I 1. A SOCIOLOGIA HERDEIRA DA REVOLUÇÃO

I A sensação de viver uma época revolucionária,


mesmo se permanecesse confusa e contraditória,
certamente foi sentida com intensidade por Inúmeros
contemporâneos, e não apenas pelos filósofos. Basta
ver as oposições cristalizadas dos primeiros debates
prOlOngamentode um mal multo profundo que exige
os mais amplos comentários.

A CORRENTE TRADICIONALISTA
I
sobre a economia política e mais ainda sobre demo-
grafia, que subvertem as convicções melhor estabe- O mais notável é que, desde o Início, a revolução
lecidas, como o mercantilismo e o populacionismo. suscite textos que não são apenas de circunstância.
Assim, a hipótese de uma superpopulação da espé- Na Inglaterra, Edmund Burke, embora próximo do clã
cie humana provoca medo. A opinião predominante liberal, publica um panfleto (1790) onde não se con-
agora é a do inglês Malthus, que, em seu célebre tenta em criticar a forma que os acontecimentos
Ensaio (1798), defende a tese de que o crescimento tomaram. Exprime com força a Idéia de que a revo-
espontâneo da população superaria o crescimento lução é condenável. por duas razões: em primeiro
máximo da oferta de alimentos. lugar, porque reconduz a sociedade (identificada por
Sem dúvida isso equivalia a fazer pouco caso da ele à vida "civilizada") ao estado de natureza, ao
revolução agrícola que sacudia os campos, na Euro- caos original de que a humanidade teve tanta difi-
pa. Mas para acabar com a crise social por que culdade para sair; em seg~do, porque se funda-
passam as velhas sociedades ocidentais, a indústria menta na França em teorias abstratas, idéias de filó-
não aparece a curto prazo como uma solução viá- sofos que pouco se Importam com as "realidades".
vel. Primeiro alguns consideram mais importante reivin- Para Burke, de fato, a instauração de uma nova so-
dicar a livre circulação dos produtos entre as regiões, ciedade não poderia realizar-se por decreto. As Insti-
entre os países, já que as inovações por que passam tuições que num dado momento regem a atividade
a agricultura e o comércio exigem uma ampliação dos homens são o fruto de um lento desenvolvimen-
dos espaços e dos mercados (Necker, 1775). Essas to, comparável àquele por que passam todos os
reações já demonstram a mudança das mentalida- organismos vivos. A vida em sociedade é feita de
des, que anuncia outras mutações ainda mais deci- uma trama de relações (sob forma de usos, de cos-
sivas. tumes, de regras) que se impõem a todos, indistinta-
Talvez pela primeira vez, a própria sociedade é mente. Deste ponto de vista, a sociedade não pode
apresentada e analisada como composta de indiví- se constituir como objeto de uma análise puramente
duos e não de corpos organizados. O atomismo racional, porque a coerência das Instituições e das
social predomina, subvertendo os valores estabeleci- práticas, no quadro de uma sociedade real. é sem-
dos. A igualdade política dos "cidadãos" diante da pre única. Em suma, não existem leis gerais às quais
lei, proclamada pela Declaração dos Direitos do Ho- a vida social se submeteria. Usando já argumentos
mem, não desemboca, ao contrário do que se espe- de tipo "holístico",uma vez que a sociedade aqui se
rava, na constituição de uma sociedade mais justa. antepõe aos indivíduos, Burke mostra que uma socie-
Pelo contrário, ela se torna o meio de justificar, atra- dade não existe só aqui e agora, mas aproxima as
vés da razão, desigualdades naturais entre indivíduos, gerações umas das outras e realiza uma espécie de
ao passo que o fortalecimento do "interesse pessoal" parceria entre os vivos e os mortos, que chega a en-
serve muitas vezes de álibi para a expressão dos volver os que ainda não nasceram.
mais estreitos egoísmos. Deste ponto de vista, a Re- Insurgindo-se contra o voluntarismo e o idealismo
volução Francesa aparece a seus detratores como o dos revolucionários,Burke se pretende realista quando
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
I - DA 'FlslCA SOCIAL' A 'SOCIOLOGIA'
PARTE I
1. A SOCIOLOGIA. HERDEIRA DA REVOLUÇÃO

I
lembra a natureza dos obstáculos que se erguem
contra os objetivos revolucionários. A Igreja. a famOia
e as corporações são instituições. ou seja. realidades
tangíveis historicamente. Em compensação. a vonta_
:~:::::~::::::;::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::~::::::::~:;:;::~::::::::::::::~::::::::::::::::;:::::::::~::::~:::::::::::;:::;::::::::~~~:~:x~::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::~:::::::::::::;:::;::::~::::::::::::

o PENSAMENTO
Os argumentos que serão utilizados pelos defensores da 'escola
REACIONÁRIO I
de Individual e até mesmo a vontade popular. sobre
as quais os revolucionários se apóiam. são expressões retrógrada' - para retomar a expressão de Auguste Comte. que
políticas tão transitórias quanto frágeis. que não po- aliás não deixava de reverenciá-Ios - não ficam muito distantes dos
deriam servir de fundamento para o edifício social. de Burke. O saboiano Joseph de Maistre e o francês louis de Bo-
Colob orcr para a restauração de certa autorida_ nold. em particular. são muito representativos dessa corrente.
de. dar de novo um sentido ao sagrado na vida quando exprimem a repulsa que Ihes inspira a revolução. O Antigo
social. favorecer um retorno à comunidade original. Regime. a despeito de seus erros. não merecia a sorte que o des-
estes eram. quando a tormenta amainou. os objeti- tino - ou a exaltação dos homens - lhe reservou. Segundo Maistre
vos dos contra-revolucionários. que acreditavam. (1796).a sociedade organizada em ordens deveria ter sido preser-
assim. fazer o contrário de seus adversários políticos. vada. em razão da hierarquia equilibrada das funções realizada
os liberais. por ela. da unidade orgânica e das obrigações reciprocas que ela
soubera impor aos homens. ouçorno-lo:
'Era muito razoável que os primeiros postos fossem de acesso
DOS IDEÓLOGOS A SAINT-SIMON mais difícil ao simples cidadão [sob o Antigo Regime]. Há demasia-
do movimento no estado e não há subordinação suficiente quando
Liberal. liberalismo. sem dúvida não há termo que todos podem pretender tudo. A ordem exige que em geral os em-
tenha recebido acepções tão divergentes. No Início pregos sejam graduados como o estado dos cidadãos. e que os
do século XIX. o liberalismo é político. Caracteriza em talentos. e às vezes até a simples proteção derrubem as barreiras
primeiro lugar aqueles que. como Madame de Staêl que separam as diferentes classes. Desta maneira. há emulação
ou Benjamin Constant. tentam ultrapassar a concep- sem humilhação. e movimento sem destruição / ...t: [Considérations
ção rousseauístada liberdade fundamentada na par- sur Ia France (1796). Éditions Garnier. Paris. 1980. p.91.]
ticipação coletiva dos cidadãos na vida da cidade - Em seguida Bonald. talvez em termos mais filosóficos. vai mais
como na Antiguidade - em nome da necessária In- adiante: o indivíduo levado ao pináculo pela revolução é apenas
dependência dos indivíduos diante da "vontade uma abstração. ou antes uma convenção metafísica. A sociedade
geral". na sociedade moderna; daí a escolha que fa- é formada em primeiro lugar de instituições. como a família. sem
zem - contra Rousseau - de um sistema político as quais o indivíduo seria incapaz de sobreviver. E o próprio curso
representativo. da revolução convence Bonald da exatidão de suas Idéias. Quan-
Ele caracteriza também os Ideólogos que têm rela- do o indivíduo perde seus pontos de referência em conseqüência
ções positivas mais diretas com a revolução. São libe- do desaparecimento dos elos sociais intermediários. resulta dar uma
rais. talvez. por oportunismo. se levarmos em conta instabilidade geral. prejudicial a todos. Em vez de incentivar os ho-
que eram hostis ao maximalismo revolucionário em mens a cultivar suas diferenças. conviria devolver-Ihes o gosto por
geral e a Robespierreem particular; mas também por viverem juntos. Mas este gosto supõe a reconstituição prévlo do te-
convicção. na medida em que queriam romper com cido SOCialque a revolução rasgou. Sem isso. os franceses não
o deísmo que viam despontar por trás do jacobinismo recuperarão o sentido da solidariedade. nem o sentimento de se-
dos anos 1793-1794[Copans & Jamin. 1978]*. gurança. que são. porém. ingredientes necessários a toda vida em
sociedade.
*As referências entre colchetes remetem à bibliografia no final do
volume.
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA I - DA 'F[SICA SOCIAL' A 'SOCIOLOGIA'
PARTE I 1. A SOCIOLOGIA. HERDEIRA DA REVOLUÇÃO

11 Sob O nome de "ideologia", esses homens, que


são antes de tudo cientistas, pretendem promover
uma atividade Intelectual de gênero novo, uma
ciência das idéias, que substituiria ao mesmo .tempo
ela, aos 40 anos, e de abraçar uma nova carreira,
"físico-política" desta vez. Embora pertencesse a uma
IlustrefamOia que remontava às Cruzadas, Saint-Simon
rompeu os laços com os seus, chegando a desejar a
::::~t:::
a metafíslca e a psicologia. A Ideologia, embora liqüidação definitiva da feudalidade. Ao contrário dos
centrada no estudo do homem, não pretende isolar- tradicionalistas, pensa que não se pode reinventar o
se das outras ciências, especialmente das biológicas Antigo Regime, que é preciso trabalhar para a edifi-
e naturais.~as a ambição dos ideólogos, a exemplo cação de uma sociedade nova. Devemos, porém,
de Condorcet, em quem se inspiram, é saber para contentar-nos em fazer frutificar as conquistas da re-
agir, repensar a política a partir do conhecimento] volução e poupar as transições? Salnt-Simon não é
Seus esforços para desenvolver métodos rigorosos e dessa opinião, quando aventa a Idéia, audaciosa
manter um ceticismo crítico diante das idéias e dos para a época, de que a verdadeira revolução ain-
valores melhor estabelecidos se evidenciam à luz de da está por fazer e que o século XIX assistiráa trans-
seus trabalhos, que tratam da epistemologia e da fi- formações ainda mais radicais do que as anterior-
losofia das ciências (Destutt de Tracy), da medicina mente realizadas.
(Cabanis), do estudo do oriente (Volney) ou ainda A crise das sociedades européias, portanto, não
da história, com Daunou, organizador dos Arquivos terminou. É preciso contribuir para sua maturação
de França no início do século XIX. Sob muitos aspec- através de uma crítica vigorosa da ordem existente e
tos, foram eles os verdadeiros fundadores das ciên- também pela evocação da organização social por
cias humanas, pelo menos na França. Pois ao construir.Inscrevendo sua reflexão no quadro de uma
situarem o homem no centro de suas preocupações filosofia da história que toma emprestada do século
científicas, os ideólogos abriam um caminho original anterior, Saint-Simon pressente que, na sociedade a
para a pesquisa, que seria seguida pelos inventores que aspira e que chama de sociedade industrial
da "fisiologia social", que, em seus inícios, foi conce- (1816, depois 1822), a racionalidade econômica vai
bida e apresentada como uma ciência eminente- sobrepujar o político, provocando a eliminação das
mente moral. antigas formas sociais. Mas se os fenômenos econô-
"Para acelerar os progressosda ciência, o maior, o micos são privilegiados na análise, a transformação
mais nobre dos meios é fazer experiências com o uni- em curso diz respeito igualmente aos domínios do
verso; ora, não é com o grande mundo, mas com o simbólico e do religioso. As antigas crenças, especial-
pequeno mundo, ou seja, com o homem, que pode- mente, deverão desaparecer e em seu lugar se
mos fazer experiências. Uma das experiências mais desenvolVerá um sistema positivo fundamentado no
Importantes a ser feita sobre o homem consiste em florescimento das ciências da vida. A partir daí. Saint-
colocá-I o em novas relações sociais. Ora, toda nova Simon vai consagrar o essencial de seus esforços ao
ação que resulte de semelhante experiência só pode parto de uma outra sociedade, esclarecida pela
ser classificada como boa ou má depois das observa- ciência, a que chamará também "sistema industrial".
ções feitas sobre seus resultados."[Carta ao Bureau de Mas que devemos en1ender por isso?
Longitudes,in Oeuvres de Claude-Henri de Saint-Simon, Ao contrário do Antigo Regime, que privilegiava a
An1hropos, Paris, 1966, tomo I, pp. 81-83.] "ociosidade" nobiliária e fundamentava sua ação na
Assim se expressa no início do século (1808) o guerra para melhor subjugar e oprimir seus súditos, a
conde de Saint-Simon, que, depois de ter levado sociedade industrial visa a transformar pacificamente
uma vida muito agitada, acaba de descobrir a ciên- a natureza, a garantir a cada um a satisfação de
HISTÓRIADA sociotoote, I - DA 'FlslCA saCIAL' À -sociotoow-
PARTEI 1. A saClaLaGIA HERDEIRADA nevcnuçs.o

Isuas necessidades materiais e espirituais. Industrlallsta


plenamente otírnlsto. Saint-Simanmoderará seu entu-
siasmo no final da vida, diante do espetáculo da
miséria operária, com tons já socialistas; mas nunca
abandonará a Idéia da associação necessária de to-
"A sociedade não é uma simples aglomeração de
seresvivos / ...t: pelo contrário, é uma verdadeira má-
quina organizada, cujas partes, todas elas, contri-
buem de uma maneira diferente para o avanço do
conjunto. A reunião dos homens constitui um verda-
I
dos os "trabalhadores" no ato comum de produção, deiro SER.cuja existência é mais ou menos vigorosa
só podendo essa associação se realizar, segundo ele, OU claudlcante, conforme seus órgãos desempenhem
com a adesão dos participantes que se tenham tor- mais ou menos regularmente as funções que Ihes são
nado conscientes de sua própria realidade social. E confiadas." [De Ia physialagie appliquée à /'améliora-
não estava longe de acreditar que, graças à Indús- tton des institutians sociates. ap. ctt., tomo 5, pp.
tria e pela primeira vez na história, a sociedade se 177-179.)
tornaria realmente humana, procurando satisfazer as Encontramos aqui a afirmação precoce (1813) de
necessidades coletivas. um ponto de vista holístico (que aliás oscila da me-
Embora a obra seja vasta e repetitiva, sua Impor- cânica à biologia na busca de imagens metafóri-
tância não deve ser subestimada, por quatro moti- cas), que afasta definitivamente Saint-Simon do libe-
vos, pelo menos. ralismo.
• Saint-Simon prega abertamente a constituição • Mais tarde, quando sistematiza seu pensamento
de uma ciência do homem, assim como os ideólo- sobre a "história da civilização", reexamina os fenô-
gos. Mas sua defesa se insere numa reflexão mais menos sociais a partir da atividade de produção ou
ampla sobre as ciências, seu objeto e sua evolução, _ para utilizar o seu vocabulário - da Indústria, que
onde ele sublinha que todas as ciências, que "come- lhe parece transtornar tanto a moral quanto a políti-
çaram sendo conjecturais / ...l , estão destinadas a se ca. Saint-Simon concebe então a sociedade como
tornarem positivas" (1813). A ciência do homem - ou um sistema de elementos Interdependentes. A um
fisiologia aplicada ao melhoramento das instituições dado modo de produção corresponde um modo
sociais - não foge, portanto, à regra comum que re- determinado de organização social e política, assim
za que, para se tornar positiva, ela deve apoiar-se como valores espirituais específicos.
em "fatos observados e discutidos". No entanto, exis- • A passagem de um tipo de sociedade a outro
te uma diferença maior, epistemologicamente deci- (do sistema feudal ao sistema industrial no ocidente,
siva, entre as ciências que tratam dos "corpos brutos" por exemplo) faz-se em meio à violência, através do
(como a astronomia ou a física) e aquelas que tra- enfrentamento de classes antagônicas. Os confiitos
tam dos "corpos organizados" (como a fisiologia ou a sociais nõo são, porém, anárquicos; obedecem a leis
psicologia): pelo conhecimento de si que elas permi- gerais que levam a humanidade a evoluir no sentido
tem, o homem pode elevar-se a uma visão diferente de um aumento de suas capacidades positivas de
de si mesmo e de seu modo de intervenção na na- Intervenção sobre a natureza e sobre a própria so-
tureza. ciedade.
• A ciência social propriamente dita só pode ser "Podemos afirmar como princípio de fato que, no
tardia, uma vez que se vale dos ensinamentos e das momento em que o sistema feudal e teológico foi
descobertas das outras ciências. Ela é,' sobretudo, sin- definitivamente organizado, os elementos de um no-
tética - ao passo que as outras continuam sendo vo sistema social começaram a se formar. Uma
mais ou menos analíticas. Mas de onde tira ela sua capacidade temporal positiva, Isto é, a capacidade
superioridade? Industrial, nasceu ao lado do poder temporal. que
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA I - DA 'FlslCA SOCIAL' À 'SOCIOLOGIA'
PARTE I 2. AS MÚWPLAS FACETAS DO POSITIVISMO E DO CIENTlFICISMO

I
atingia seu pleno desenvolvimento; e uma capacida_
de espiritual positiva, ou seja a capacidade

Instante em que começava a desenvolver toda a


sua atividade." [L 'Organisateur,
cientí_
fica, se elevou por trás do p o d e r espiritual no

op. cit., tomo 2, p.


I
85.) 2. AS MÚLTIPLAS FACETAS
Estamos em 1819. Nesta data, Saint-Simon conse-
guira formar um verdadeiro cenáculo ao redor de
DO POSITIVISMO E DO CIENTIFICISMO
sua pessoa e de suas idéias. Essaforma de sociabili-
dade, tipicamente romântica, será retomada por
outros e marcará de maneira duradoura a sociologia
francesa, até mesmo depois do século XIX.
E m sua acepção mais ampla, o termo positivis-
mo serve para designar toda teoria filosófica
ou científica que reivindica para si o puro e simples
Saint-Simon tinha na época como secretário Au- conhecimento dos fatos ou que pretende apoiar-se
guste Comte, um matemático de 21 anos, vindo da em certezas de tipo experimental. Positivismoe com-
Politécnica, que sucedera (em agosto de 1817) a tismo não podem, assim, ser confundidos, ainda que
Augustin Thierry,um dos pais da ciência histórica mo- as duas doutrinas estejam evidentemente ligadas.
derna. Tanto um como outro sofreram sua influência,
mesmo se - em troca - também exerceram uma real
Influência sobre seu mestre, que os explorou sem o POSITIVISMO DE AUGUSTE COMTE
muitos escrúpulos.
Tudo Isso não tira os méritos de Saint-Slmon, que o termo é uma contração da expressão "política
soube cercar-se de talentos notáveis cujo desabro- positiva", que Comte utilizou em 1824. Ele pretende
char facilitou, por mais que eles tenham dito o con- com Issodistinguir sua própria doutrina, que, partindo
trário. Comte, em particular, embora o chamasse de de uma análise das condições de evolução do co-
"enganador depravado", devia-lhe inúmeras idéias nhecimento humano, só declara admissíveisas verda-
positivas que desenvolveu, por conta próprio. depois des científicas - ou positivas - com exclusão de qual-
da morte de seu antigo patrão [Coser, 1971]. quer outra pesquisa sobre a essência das coisas. A
partir daí, surgem os temas que figuram em seu Cur-
so, que ele inaugura - em seu apartamento - em
abril de 1826, diante de um punhado de ouvintes,
entre os quais o físico Carnot, o lingüista Humboldt. o
futuro banqueiro d' Eichthal e o matemático Poinsot.
Depois de três sessões,o curso é interrompido em ra-
zão do esgotamento do professor, internado numa
casa de saúde durante alguns meses. Em janeiro de
1829, porém, Comte retoma suas conferências (have-
rá 72 ao todo, sendo que as dez últimas tratariam
da "física social"), cuja divulgação - sob o título de
Curso de Filosofia Positiva - se dará de 1830 a 1842.
Foi nessa oportunidade que, pela primeira vez, apa-
receu o termo sociologia.
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
I - DA 'FlslCA SOCIAL' A 'SOCIOLOGIA'
PARTE I
2. AS MÚLTIPLAS FACETAS DO POSITIVISMO E DO CIENTlFICISMO

I Insistamosno fato de que Comte - pensador cer-


tamente singular - não é, de maneira nenhuma, urn
autor maldito. Seus trabalhos são conhecidos. Valern_
lhe a estima de alguns de seus ouvintes, que se con-
:~:~::~::::::::::::::::::::::::::::::::::::~:::::::::::::.~;::~::::::::::::::::::::::::::::::::::::;:::;::::;:::::::::::::;:::::::::::::::::::::::::::;:x::~:::;:::;::::::::::::::::::::::~:::::::::::::::::::::::;::::~:::::::::::::::*~~~

o
NA HISTÓRIA DO ESPíRITO HUMANO
LUGAR DA SOCIOLOGIA I
tam às dezenas. Se suas opiniões republicanas o
'No estado positivo, o espírito humano, reconhecendo a impos-
Impedem (em 1831, depois em 1833) de obter urna
sibilidade de obter noções absolutas, renuncia a pro~urar a origem
cadeira de matemática na Escola Politécnica, e se
destinação do universoe a conhecer as causas Intimas dos fe-
também fracassa no Colégio de França (tambérn eôc:nenos,para empenhar-se em descobrir, pelo uso bem combl-
em 1833) na postulação de uma cadeira de história nado do raciocínio e da observação, suas leis efetivas, ou seja,
das ciências, ele POdH porém contar com a ajuda sues relaçóes invariáveisde sucessãoe de similitude.' [COUIS de phl-
moral e material de seus admiradores tanto ingleses losophie positive (1842),Schleicher editores, Paris,1908,toma I, p. 3.]
como franceses, dentre os quais o filósofo Stuart MiII Para Comte, o cientista não deve partir para a conquista de terrI-
e o lexicógrafo Émile Littré desempenham um papel tórios novos, ele é um ordenador do real que tenta explorar todas
decisivo. as suas potencialidades. Desse modo se esclarece .a significação
de seu positivismo. Comte não se limita em nenhum momento a
Pragmático avant Ia lettre, Comte estabelece de-
descrever a superioridade do empirismo sobre o racionalismo (que
liberadamente uma separação entre o estudo físico
não se deve confundir com a racionalidade, que reivindica energi-
dos fenômenos e a metafísica. Afirma que a valida- camente); tampouco se contenta em postular por princípio a uni-
de científica do saber deve se basear numa obser- dade da ciência, De maneira mais nova. tenta classificar as ciên-
vação sistematicamente conduzida e, mais generica- cias segundo o grau de positividade ou, se se preferir, em função
mente, na experiência, que supõe o recurso a uma de sua capacidade de dar conta dos fatos (de suas leis intrínse-
experimentação. Esta experimentação caracteriza as cas), fazendo abstração de suas causas possíveis,
ciências, naturais e sociais, que ele reúne num siste- Se as ciências são solidárias umas das outras, convém abordá-
ma coordenado de conhecimentos, já que todos os Ias por ordem de dificuldade crescente, indo do simples ao com-
plexo, da matemática à bioiogia, que marca um importante ponto
fenômenos da natureza são, segundo ele, submetidos
de inflexão, já que - com ela - o ponto de vista científico deixa de
a leis invariáveis.
ser analítico para se tornar sintético, Deixando deliberadamente de
No plano político, a preocupação constante mani- lado a psicologia, Comte considera que a sociologia vem coroar o
festada por Comte, e que se acentua com o passar edifício, mesmo se permanece em grande parte por fazer, dada a
dos anos, é que é preciso sair do caos em que a dificuldade de utilização de normas científicas no estudo das socie-
revolução mergulhou por longo tempo as sociedades dades humanas.
européias; daí sua adesão a LuísNapoleão Bonapar- Esseavanço muito gradual da ciência é tributário dos fenôme-
te quando do golpe de estado de dezembro de nos que pretende abordar, Se a sociologia é a mais ambiciosa, é
1851. Mas, para tanto, a ciência não é suficiente. porque estuda 'o desenvolvimento total da inteligência humana em
suas diversas esferas de atividade, desde seu primeiro e mais sim-
Parece-lhe necessário que o conhecimento científico
ples desabrochar até os nossosdias', Essemesmo desenvolvimento
se transforme num verdadeiro poder espiritual. que os
obedece a uma lei fundamental que diz que o espírito humano,
cientistas se tornem, por assim dizer, "sacerdotes" que
para dar conta dos fatos, é levado a utilizar sucessivamente três
trabalhem para a restauração da solidariedade so- métOdos diferentes (teológico ou fictício, meta físico ou abstrato,
cial. Pois a "conformidade dos interesses" entre os científico ou positivo), que se excluem reciprocamente,
homens não suscita necessariamente sua solidarieda- Comte acredita ser este um fator essencial de evolução, a fa-
de efetiva. Muito pelo contrário, esta só poderá se mosa 'lei dos três estados', graças à qual se realizariam ao mesma
efetivar através da coação de uma doutrina moral tempo a ordem e o progresso que a humanidade' espera e que
fundamentada na ciência. ele ,apresenta assim: a revelação da ordem natural cabe a uma
diSCiplinaparticular, a 'estática social', onde reencontramos alguns
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA I _ DA 'FíSICA SOCIAL' À 'SOCIOLOGIA'

:j:~:!:!:!:~:!:~:~
PARTE I

- 2. AS MÚLTIPLAS FACETAS DO POSITIVISMO E DO CIENTIFICISMO

Illill
dos princípios caros aos tradicionalistas,como o trabalho, a prOPrle-
dade, a família ou a classe, que regem a atividade do indivíduo
bem mais do que são regidos por ele: quanto ao progresso, seu
estudo remete à 'dinâmica social', que trata da evolução histórica
aplicando a lei dos três estados ao devir das civilizações, TOdaVia'
UMA VARIANTE INGLESA DO POSITIVISMO

E bora conheça - como Inúmeros britânicos de


mgeração - o essencial da produção de Comte,
sua'l 'safo Herbert Spencer vai. part·Ir d e premissas
. d'f
I~
o progresso - tal como é aqui entendido - não poderia qUestiona; I e-
o f 10 - d 'I .
a estrutura social naquilo que ela tem de permanente, rentes e se tornar o campeao e uma SOCIO agia
aniclsta, que será a corrente de pensamento do-
~::.~~~::::::~~~~::::~::~:::;:::~:::~::::::~:::~~~::::::~:i::::::~~~~::::::::::::::::~~::~:~:::i:::::::::::i:::::::::::::::::;~:;::~~::::~~~::::;:~:;:;::~~~~:;:::::;:;:::~;:::;~:::;~~:;:::;~~:;:;~::~:::;:~ org •.
Inante das cienclas soc Iais
. d urant e o u' It·Imo t erço
Com relação a seus primeiros escritos, a evoluÇão ~o século XIX. Autor que alcançou sucesso em vida,
do pensamento comtista é sensível,sobretudo a par- adulado por alguns, odiado por outros, o filósofo In-
tir de 1847, quando é lançada a idéia de uma reli- glês certamente merece algo melhor do que o
gião da humanidade, No entretempo - no outono esquecimento em que caiu depois da morte.
de 1844, mais precisamente -, Comte conheceu Clo- Como positivista conseqüente, esse engenheiro fer-
tilde de Vaux, por quem se apaixonou perdida- roviário, reconvertido ao jornalismo e filósofo nos
mente, Esseamor platônico, embora teatral, que se momentos de ócio, afasta-se da metafísica, que con-
extinguiu com a morte, de Clotilde em abril de 1846, sidera uma atividade um tonto vã. Recusando-se a
sem dúvida perturbou sua vida e seu equilíbrio, Atin- entrar no eterno debate sobre a origem das coisas,
giu também a obra, que passou por novos desenvol- afirma energicamente que os fenômenos humanos e
vimentos [Lepenies, 1990]. culturais - como todos os outros fenômenos naturais -
A partir dessa data, de fato, Comte toma certa dependem da observação, da experiência e priorlta-
distância de um cientificismo que pouco a pouco se rlamente de uma abordagem de tipo causal. Suas
vai amenizando em seus escritos. Mas isso para me- leituras, numerosas e variadas, levam-no aliás a con-
lhor subordinar a sociologia à nova religião que pre- Jugar os ensinarnentos de Smith (o grande econo-
tende instaurar, para horror de seus primeiros mista clássico) e de Lamarck (o naturalista, teórico
adeptos, como Littré, que recusam peremptoriamen- da evolução das espécies e da hereditariedade dos
te que o positivismo desemboque na religiosidade, caracleres adquiridos), e depois a formular uma dou-
ou até no misticismo, e mais ainda que se ponha a tnno evolucionista que é tida como uma das mais
serviço de uma política autoritária e reacionária, Um coerentes que a ciência social jamais elaborou (e
tal desvio está patente no Catecismo Positlvista que foi muitas vezes copiada). De Lamarck, toma
(1852), onde é desenvolvida a Idéia de que o ho- principalmente a hipótese de que todas as espécies
mem seja Incapaz de alcançar o conhecimento vivas se revelam capazes de se transformar por
supremo a não ser através da religião, podendo es- adaplação a seu ambiente e por diferenciação de
ta última ser considerada a representação sacrall- seusórgãos, estando esse processo na origem de um
zada do laço social. Tema a que Durkheim voltará mecanismo geral de evolução que pode ser histori-
algumas décadas mais tarde. Num primeiro momen- camente verificado. Em 1851, num de seus primeiros
to, não foi essa mensagem que foi recebida, e sim a trabalhos, Spencer apresenta a evolução social como
que diz respeito à visão de uma sociedade estável e fruto de uma marcha irresistível das sociedades hu-
organizada ao redor de um ritual que o sociólogo manas do simples ao complexo, do homogêneo ao
francês queria instaurar em resposta às perturbações heterogêneo. E entende por heterogeneidade a se-
impostas pela industrialização. par?ção crescente das funções que caracterizam as
SOCiedadesindustriais modernas, que chama de or-
-
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA I _ DA 'F!SICA SOCIAL' À 'SOCIOLOGIA'
PARTE I 2. AS MÚLTIPLAS FACETAS 00 POSITIVISMO E 00 CIENTlFICISMO

Igdnícas e opõe às sociedades "militares" de antiga_


mente. No seu pensamento. os mecanismos de evo_
lução têm origem na luta pela existência e na
seleção natural. que levam à submissão e às vezes à
eliminação dos menos eficientes em proveito dos
A ESTATíSTICA MORAL E JUDICIÁRIA

A expressãOcaracteriza os trabalhos de alguns ju-


rlstas e
matemáticos que. por volta de 1830. procu-

I
Introduzir no estudo das clenclas morais o
mais aptos. Como essa evolução é Inelutável. seria método das cienclas isrcos e na urors. So b a Iguns as-
rorn • . f' . turol
ainda mais inútil querer entravá-Ia. uma vez que a ectos. esseshomens aparecem como os continua-
sociedade moderna. que Spencer considerava Igua- p res da aritmética política Inglesa. que. no século
do
litária e pacífica. estaria fundada não na regulação XVII. procurava mostrar que "oa ouestõoes de governo
as ques
do estado. e sim no desenvolvimento de seus mem- odiam ser tratadas de acordo com as leis comuns
bros mais dotados. assim como no livre jogo de suas ~a aritmética" (William Petty. 1690). Inicialmente preo-
relações Interindividuais. cupada em resolver problemas demográficos. essa
Mais do que seu liberalismo radical. o naturalismo aritmética abre-se rapidamente para outros assuntos.
de Spencer e seu amoralismo ostensivo chocaram como o estudo do crescimento econômico. da rique-
muito seus contemporâneos. que preferiam as idéias za do estado - através da análise das finanças públi-
de reforma e de profiiaxia sociais. No entanto. muitas cas - ou ainda do rendimento das rendas vitalícias.
de suas hipóteses foram retomadas. inclusive por que então se desenvolvem sob a forma de emprés-
aqueles que as criticaram com maior veemência; al- timos públicos chamados na França tontines. Mas é
gumas até fazem parte ainda hoje da "vulgata' preciso esperar o final do século XVIII para que essa
sociológica. Assinalemos duas delas. entre outras. às mesma vontade de cálculo se aplique a questões
quais seu nome permanece ligado: mais precisamente sociais. E não só sociais. como
- a sociedade deve ser encarada como um siste- patológicas.
ma Instável. mas dinâmico. de funções diversificadas, Nos últimos momentos do Antigo Regime. o magis-
onde as relações entre indivíduos vão assumindo ca- trado Montyon realiza o levantamento das condena-
da vez mais importância como processo regulador. ções por crimes e delitos na comarca de Paris. nos
em detrimento das instâncias sociais tradicionais (fa- anos de 1775 a 1785. Trabalhando com os dados as-
mília. Igrejas e sobretudo estado); sim reunidos.ele divide a população de acordo com
- num plano metodológico. pelo menos nas ciên- o sexo. a idade. a profissão. a natureza e o lugar do
cias sociais. a noção de causa não induz necessaria- delito. Publicando seus resultados sob a forma de
mente uma só conseqüência; no mais das vezes. Observações sobre a Moralidade na França. chega
desemboca em múltiplas virtualidades. à conclusão de que a expansão urbana é a causa
Em suma. Spencer não foi só o propagandista do principal da proliferação dos atos criminosos.
laisser-faire em matéria social e política. nem o profe- Com o início da industrialização e seu cortejo de
ta de um darwinismo social para o qual sem dúvida danos sociais. como o êxodo rural. a ociosidade. a
contribuiu. Foi também um dos primeiros a assentar destruição da célula familiar ou a dissolução dos cos-
as bases de uma sociologia científica. que dotou de tumes - é pelo menos sob este ângulo que as
Instrumentos de pesquisa e de uma epistemologia só- mudanças sociais são encaradas -. a Incompreensão.
lidas e principalmente de um modelo de explicaçãO senão a inquietação das classes dirigentes aumen-
- o organicismo - que iria se revelar muito fecundo tam . O "bom orn" campones apaga-se por tras , do ope-
no quadro de uma renovação das teorias positivistas. rórlo "selvagem" das cidades; as classes populares.
em seu conjunto. tendem a se tornar classes perigo-
-
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA I _ DA "FfSICA SOCIAL' À "SOCIOLOGIA"
PARTE I 2. AS MÚLTIPLAS FACETAS DO POSITIVISMO E DO CIENTlFICISMO

I
sas. Assim. não é de espantar que seja não só Po
uma releitura da filosofia ou pela descoberta d~
eplstemologla. mas também pela observação dos
pobres e dos criminosos para fins curativos que as
ciências humanas atingem seu estado nascente.
q
mesrn
m 1840. Nessa obra que permanece célebre,
ca~a ~m quadro severo da Indústria têxtil. mesmo
p~~ahoje nos pareça terrivelmente moralizante. Ao
o tempo. ou quase. Porter e Engels. na Inglater-
-' . 'd
hegam a conclusoes proxirnos as o me ICO
. dl
I
Na França. desde os primeiros anos da Restaura_ ro. c ês a partir de observaçoes - t a Ivez ma I'S rlgorosa-
ção. a questão penitenciária está na ordem do dia, nonc
mente .estabelecidas sobre as "c Iasses Ia barIasas. "
Já não parece possível.realmente. confundir no mes- por toda parte. os refarmadores se,apaixonam pe-
mo opróbrio os criminosos e os loucos. as crianças e la pesquisa de campo. que permite tratar os fe~ô-
os adultos. os pequenos e os grandes delinqüentes, menos mais diversos - desde a altura dos conscritos
Antes de Iniciar a mudança da Instituição. e por as- até os crimes de sangue. passando pela alfabetiza-
sim dizer para orientar essa mudança. várias investi_ ção ou a intoxicação alcoólica nas classes pop~la-
gações são encomendadas pela Sociedade r~égla res. A opinião burguesa. em sua parcela esctorecldo.
das Prisões.Uma delas é confiada. em 1820. a Louls parece como que fascinada pelas enumerações que
Villermé. um médico filantropo de idéias reformado_ encerram toda a verdade. segundo ela. Em suma. o
ras; viagens de estudo no estrangeiro também são número basta-se a si mesmo. para além de qualquer
subvencionadas pelo ministério da Justiça. Alexls de exigência de método. que é quase nula. Restam.
Tocqueville, jovem magistrado. realiza assim urna porém. por coordenar os esforços de todos os produ-
grande viagem à América do Norte. ao final da tores de dados sociais quantitativos.
qual descobrirá sua verdadeira vocação. O assunto é ainda mais urgente porque a gravi-
Na mesma época. são elaboradas estatísticasjudi- dade dos problemas sociais não escapa aos
ciárias que apresentam várias características já 'manda-chuvas" - aliás ocíeptos das idéias utilitaristas
modernas: a coleta dos dados. a tipologia utilizada sobre o bem-estar - que vão tentar trctó-los de ma-
obedecem em toda parte aos mesmos princípios. de neira pragmática. Nc Inglaterra. por exemplo. a Sta-
modo que os materiais se tornam homogêneos no tlstical Society of London é criada no Início dos anos
plano da investigação propriamente dita; as Informa- 1830.Seus fundadores conferem-lhe Inicialmente co-
ções recolhidas são em seguida reunidas pela admi- mo rnlssôo trabalhar pela transformação dos concei-
nistração central e publicadas regularmente. a partir tos da economia política em Instrumentos políticos
de 1827-1830.com o título de Relatório Geral da Ad- concretos. Tratava-se. de fato. de colocar à disposi-
ministração da Justiça Criminal. ção do governo britânico e das Instâncias dirigentes
Insistamosno aspecto de que a estatística judiciá- os principais dados econômicos e sociais. de nature-
ria é a primeira que reúne tais qualidades. Fato sem za estatística. que a Sociedade recolhesse acerca
precedente. a prática do segredo, princípio habitual dos temas que dissessemrespeito sobretudo à popu-
de governo. é substituída por certa forma de publici- lação e à saúde. sendo que a saúde dos pobres
dade em matéria judiciária. que anuncia uma clara era objeto de uma atenção particular.
mudança de mentalidade [INSEE.1977). Mais tarde. da simples ooservoçôo. passa-se à
O zelo dos moralistas e outros reformistas abarca. vontade de intervir nos próprios fatos. na esperança
aliás. outros assuntos além da criminalidade. O doutor de melhorar a condição social dos mais carentes.
Villermé. instigado pela Academia das Ciências Mo- para melhor controlá-Ias. sem dúvida. Para tanto.
rais e Políticas recentemente criada. realiza uma urna associação é criada (The National Association
grande pesquisa sobre o mundo trabalhador. pubU- for the Promotion of Social Science) em 1857. dotada
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HISTÓRIADA SOCIOLOGIA I _ DA 'FfsICA SOCIAL' À 'SOCIOLOGIA'
PARTE I MÚLTIPLAS FACETAS DO POSfTlVISMO E DO CIENTlFICISMO

Ide uma revista trimestral - Meliora - com tiragem d


7.000 exemplares desde os primeiros momentos d:
publicação. A ciência social. tal como é aqui enten.
dlda. não procura dar conta dos fenômenos de
~
vai I co nc
eder OS títulos de nobreza à engenharia so-
Depois de uma estada em Paris (em 1823) que
ciO'deu a oportunidade de freqüentar os estatísticos
lhe s economistas mais ilustres, decide publicar um
I
pobrezo em suas múltiplas dimensões. Ela se preten. e ~ tim a que chama Correspondência Matemática
boe " . I - ,.
de "engenharia social" quando deseja explicar corno fi Física. do qual e o pnnctprn. senao_o uruco, reda-
Indivíduos - necessariamente de baixa extração _
acabam por cair na miséria por causa de seus vícios
(ocupando o alcoolismo um lugar seleto entre 08
:s
t r. O boletim compreende uma seçao consagrada
"estatísticas sociais". principalmente às estatísticas
criminais.
fantasmas da burguesia vitoriana). E que dizer do Inspirando-seem Laplace. cujos prlncfplos transpõe
vontade que ostentava de resolver os problemas so- da mecânica celeste para os fatos de sociedade.
ciais por meio de soluções morais [Abrams. 1968]? tenta descobrir os indícios revela dores - dada sua
A Inglaterra não é a única que queria assim se constância ao longo do tempo - de uma queda pa-
ocupar da questão social. Na França. quase ao mes- ra o crime nas diversas categorias da população.
mo tempo (1834). sob o estímulo de Thiers.toma-se a Quételet constata então que certos fatos se reprodu-
decisão de criar uma Secretaria de Estatística Geral. zem com regularidade. independentemente dos lndl-
com uma dupla finalidade econômica e demográfl- víduos que Ihes servem de veículo. Assim. tomado
ca que não deixa de lembrar a de seu homólogo Individualmente. todo homem parece agir livremente;
londrino. EssaSecretaria ganhará o nome de Estatísti- e no entanto. por um curioso paradoxo. "quanto
ca Geral da França em 1840 e. dentre seus primeiros maior é o número de indivíduos que observamos.
colaboradores. figurará o engenheiro Frédérlc Le Play. mais se apaga a vontade individual e deixa predo-
de que logo voltaremos a falar. minar a série dos fatos gerais que dependem das
causas em virtude das quais a sociedade existe e se
conserva". [Correspondance mathématique. 1832. to-
A MATEMÁTICA SOCIAL mo 7. p. 2.]

Se os objetos da estatística vão divertificando-se à $!~:;~:;:;:;:;:::;:::;:::::;:::;'::;:;:;:;:;';~:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:::;';:;';';:;:;:;:;:;:;:;:;':';:;';';';:;:;:;:;:;:::;::':'::;:::;:;:;:;:;:;:;:;:;';:;}:;:::;:;:;:;:;:;:::;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;':';:;:;:;:;:;:;:;:;';:"';:;:;:;:;:;:;:;


medida que se vai avançando no século. mesmo
assim não se deve perder de vista que é ao redor e A ESCOLA "CIENTíFICA" FRANCESA
acerca dos fatos criminais e de suas supostas regula-
Acorre gente de toda a Europa para ouvir o astrônomo Lapla-
ridades que muito cedo se afirmou a vontade de
ce ou o matemático Cauchy. e os contatos entre pesquisadores
extrair leis mais gerais que caracterizem o comporta-
sõo tão intensos quanto numerosos. Dentro dessa comunidade. po-
mento humano. Para alguns. que leram os filósofos rém. três orientações se destacam. Há em primeiro lugar os politéc-
do século XVIII. particularmente Condorcet. os fatos nícos. devotados principalmente à vulgarização da aritmética polí-
relativos ao homem são passíveis de uma aborda- tica. aos problemas econômicos e prioritariamente aos colocados
gem "científica". ou seja. quantificada. aberta ao cál- pela industrialização. Ao seu lado. os médicos e os higienistas si-
culo e à previsão. E sua convicção se apóia em tuam-se mais no terreno da utilidade imediata. mostrando-se preo-
notáveis inovações que atingem a maioria das ciên- CUpados com a demografia e a profilaxia sociais. as doenças
cias exatas e naturais. prOfissionaise o consumo urbano. Pensamos aqui em Vil/ermé. em
Uma figura exemplar dessa corrente é a de Adol- Benoistonde Chateauneuf. entre outros. O terceiro grupo é forma-
do Por matemáticos que gostariam de aplicar - nem sempre con-
phe Quételet. astrônomo e matemático belga. que
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
PARTE' , PLAS FAC=".AO
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~ MULTI
seguindo - 'às ciências políticas e morais o método que tão b de edificação moral. Acontece que ao querer ::))/t:
serviu nas ciências naturais' (Laplace). Com eles, porém, se cheerrt, bém b' os valores médios ao redor dos quais as sé- riM
ao esboço de uma matemática aplicada (baseada no CÓ!cUIogq descOtrlftísticas se distribuem, Quéteiet acabou por :::i:::~:~:~:::
probabilidades), que tira seus exemplos de dados estatísticos re~ rles es-Ias como normas. Ou, para ser mais . exato, eie
vos à população, à indigência ou ao consumo parisienses,
Pensá• ocomo normas as me'd' Ias est at'15 ticas que an tes
Assim, coexistem vórias abordagens dos fatos de sociedade que propos É o que
ia conscienciosamente descoberto.
se pretendem todas científicas, embora se baseiem em arquéHpoa
diferentes, Hó, por um lado, o modelo biológico proposto pelos rné:
h~~ntece com sua teoria do justo meio, na qual faz
dicos, que tomam emprestado seu vocabulório e seus conceitos Ck:í
d "homem médio" um tipo socialmente desejável,
anatomia ou da fisiologia; são eles, por exemplo, que entrevêem 0* c~m o pretexto de que as variáveis reais da estatísti-
possibilidades oferecidas pela noção de funçõo (o termo é UHliza. ca moral se repartem regularmente ao redor desse
do na época), que gostariam de estender aos' fatos da sociedade. ponto central.
O outro modelo de referência é o das matemáticas e da, física,so- Desde a origem. choveram as mais diversas obje-
bre o qual se apóia também. Cournot na economia. A preocupo. Ções contra Quétel.et: Uns o acusam de professar
ção com a tormalização é aqui mais nítida; trata-se de estabelecer uma doutrina materialista, sob o pretexto de que a
e de interpretar médias estatísticas, de refletir sobre o significado
noção de probabilidade, a que dá muita Importân-
dos elos de sucessão entre os fenômenos, das relações causais,
cia, é subversiva com relação a toda moral. Outros,
que aprendem a distinguir das simples covorícçôes.
como Auguste Comte e Jean-Baptiste sov. reprovam-
:::::::::::~::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::~:::::::::::::::::::::::::::~:~::::::::::::::::::::::::::;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:::::::::::::::::::::::;:::::::::::::::::::::::::::::~:::::::::::~::*:~ lhe seu "mecanicismo" na análise causal dos fatos so-
ciais e o caráter estreito de suas proposições de
Em outras palavras, além da "vontade", existem to-
reforma. Outros ainda suspeitam que ele pregue uma
tos sobre os quoís o homem não tem controle, que
Ideologia meramente conservadora. procurando pro-
obedecem a "leis" gerais (de tipo probabilístico). sem
mover uma pseudo-ciêncla a serviço da sociedade
dúvida próprias das sociedades humanas, mas que
estabelecido [INSEE,1977].
são concebtdcs com base no modelo das leis da 1(.
Por trás dessa críticas, surgem muitas questões às
slca. Quételet fala, assim, de equilíbrio social em
quals. cento e cinqüenta anos mais tarde, ainda não
comparação com a regulação dos fluxos, e a revo- se deu uma resposta. Passa necessariamente o estu-
lução corresponde para ele a um acúmulo perigoso
do das sociedades humanas pela análise de sua
de forças que desembocam numa explosão social.
patologia? Que lugar deve ser reservado à quantifl-
Em seguida, quando o matemático belga se en-
cação e à lógica matemática nas ciências huma-
volve na publicação sistemática de estatísticassociais
nas? Falam os fatos sociais por si mesmos ou é
ou quando procura promover a sua física social (ex·
preciso que sejam esclarecidos por teorias que os en-
pressão que toma de Auquste Comte, que, aliás,
globem? Muitos autores, em todo caso, se recusam
não compreende nada de seus trabalhos, vendo na-
a considerar a ciência social nascente como uma
les apenas certa técnica estatística!), suas Intenções
pura técnica que possa ser aplicada por cientistas
não são mais apenas científicas. São filosóficas e po-
supostamente objetivos.
líticas, já que se trata de abordar - através do cál-
culo - a verdadeira natureza do homem, e de
controlar assim certos fatos sociais considerados preo-
cupantes, com o objetivo de evitar custosas revolu-
ções (carta a Villermé de 1832).
Então, a estatística já não é apenas social; ela
pode tornar-se um instrumento de controle e tom-
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA I - DA 'F[SICA SOCIAL' À 'SOCIOLOGIA'
PARTE I 3. CONnNUIDADE E MUDANÇA DA REFLEXÃO PoUnCA

I da Igualdade, que não só favoreceria o Individualismo


como também levaria a certo nivelamento de condi-
ções. A democracia, tanto em sua forma americana ;;;;;;;;:;::
como francesa, inscrever-se-Ianesse movimento.
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tis~1[

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3. CONTlNUIDApE E M~DANÇA
TOCQUEVIUE, O ERUDITO E O POLíTICO
DA REFLEXAO POLlTICA
Essearistocrata, magistrado de profissão, descendia por li-
, nho materna de Malesherbes (o ministro de Luís XVI que
defendeu o rei durante seu processo, antes de acabar ele
E interessante frisar essa crítica anterior, pois ela
provém de homens atentos às evoluções do
mundo ocidental, quando não ligados aos diversos
próprio no patíbulo, durante o Terror). Ele se definia como
monarquista e liberal e havia aderido sem entusiasmo a Luís
Filipe em 1830. Assim, ele se valeu de suas relações no Minis-
movimentos de reforma que florescem com o início tério da Justiça para se afastar, obtendo muito cedo (maio
da revolução industrial por volta de 1830. Mas, para de 1831) a autorização de realizar uma viagem de estudos
eles, a industrialização não é encarada como a ca- aos Estados Unidos, tendo como motivo oficial analisar o sis-
racterística principal das sociedades européias, e tema penitenciário americano.
De volta à França na primavera de 1832, publica o resul-
ainda menos como o acabamento positivo de seu
tado de sua missão, antes de escrever uma obra de maior
destino histórico. Pelo contrário, ela se inscreve num fôlego sobre sua experiência: Da Democracia na América,
processo de civilização mais amplo, cuja gênese e cujo primeiro livro ("O Mundo Político") é publicado em 1835.
lógica de funcionamonto devem ser restabelecldas. Nele ressalta, sem ênfase mas com grande abundância de
A sociedade contemporânea já não é vista como detalhes, a importância da revolução democrática por que
estando em ruptura com um passado de que se passaram os Estados Unidos, uma revolução que se fez sem
tem saudades (como os tradicionalistas) ou que é re- drama verdadeiro, tendo se colocado desde o início sob a
cusado (como os saint-simonianos);as mudanças são égide do direito e da moral.
Embora não estivesseterminada (o Livro 11,"Democracia e
aqui relativizadas, porque consideradas em sua di-
Sociedade", só será publicado em 1840), a obra foi um
mensão histórica longa. Ao mesmo tempo, as interro- grande sucesso de livraria, de que Tocqueville, que tinha
gações mais fortes recaem menos sobre o passado ambições políticas, soube tirar proveito. Eleito deputado da
do que sobre o presente, que é energicamente dis- Mancha em 1839, será constantemente reelelto até 1851.
cutido, com a ajuda de argumentos mais filosóficos data de sua retirada da política. No intervalo, viaja muito
ou políticos do que "científicos", no sentido em que (Inglaterra, Irlanda, Argélia), participa ativamente da vida
parlamentar e toma corajosamente posição em favor da re-
os positivistas popularizaram o termo.
forma das prisões, assim como da abolição da escravatura.
Em janeiro de 1848, sente o vento da revolução que se
ergue de novo sobre o país. Sem ilusões quanto ao futuro,
DEMOCRACIA E REVOLUÇÃO EM TOCQUEVILLE aceita porém a proclamação da república, dá até seu pa-
recer sobre a nova constituição e defende a candidatura
Do começo ao fim, a obra apresenta uma forte de Cavaignac contra LuísBonaparte. Em junho de 1849, tor-
coerência que podemos resumir da seguinte forma: na-se ministro dos Negócios Estrangeirosno governo burguês-
conservador de Odillon Barrot. Alguns meses mais tarde, é
Tocqueville parte de uma reflexão histórica, que é
obrigado a pedir demissão sob pressão de Luís Bonaparte,
também uma hipótese, sobre a evolução das socie-
que pretendia dirigir o país à sua maneira. Depois do golpe
dades ocidentais. Desde a Idade Média, a Europa de estado de dezembro de 1851, retira-se definitivamente da
viria sofrendo uma pressão irresistívelda liberdade e vida Política.
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA I - DA 'FlslCA SOCIAL' À 'SOCIOLOGIA'

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PARTE I 3. CONTINUIDADE E MUDANÇA DA r?EFLExÃO POLfTlCA

II I
Procurando extrair ensinamentos dos acontecimentos de qUe amente iguais, essa massa confusa reconhecida co-
participou. inicia então um vasto estudo sobre o sistema feudal e o ~IO o único soberano legítimo. mas cuidadosamente
Antigo Regime. a partir do estudo dos orquivos de Tours.Publica
privada de todas as faculdades que lhe poderiam
um primeiro esboço com o título de O Antigo Regime e a Revo/u_
çõo (1856). Mas seu pensamento sobre o assunto estava longe de permitir dirigir e até vigiar ela mesma seu governo."
ser definitivamente constituído, já que ainda trabalhava no manus- [L'Ancien Régime et Ia Révolution (1856). Gallimard.
crito no momento de sua morte, em abril de 1859. porls. 1967. p. 260.]
Tocqueville volta em seguida a tratar da origem
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dessa Igualdade de condições e Insiste no paradoxo
Trabalhando com comparações judiciosas (Toeque- de uma revolução cujo radicalismo se enraíza profun-
ville não raro é considerado o criador do método damente na tradição do Antigo Regir:ne.A demons-
comparativo), dirige alternadamente seu olhar para tração. de natureza propliamente política. dá
cada uma das principais sociedades modernas, que também a entender que a sociedade democrática
lhe parecem todas afastar-se da liberdade para mais moderna passa por um real crescimento econômico.
se deixarem levar pela paixão Igualitária ou demo- que acarreta um estilhaçamento da estrutura de
crática. E Tocqueville, que é um liberal, se angustia classesem múltiplos grupos de interessese contornos
com o desenvolvimento político das sociedades de- flutuantes. Sem dúvida, Tocqueville não nega a exis-
mocráticos, que vê ameaça das pelo espectro do tência de estatutos sociais nem de níveis de riqueza
conformismo e às vezes do despotismo, mais do que muito diferentes. Mas esses desvios não criam um
pelo desencadeamento desmedido das liberdades. sentimento de pertencer a uma classe por duas ra-
"Numa sociedade democrática / ...t por ódio ao zões:porque os beneficiá rios do novo regime econô-
privilégio e por dificuldade de escolha, chegam a mico são cada vez mais numerosos; porque uma
obrigar todos os homens, seja qual for sua estatura. a luta incessante contrapõe os membros dos diferentes
passarem por um mesmo processo, e submetem-nos estratosda sociedade empenhados no acúmulo das
a todos Indistintamente a um sem-número de peque- riquezasrecentemente criadas.
nos exercícios preliminares, em meio aos quals sua "Se a igualdade de condições dá a todos os ci-
juventude se perde e sua imaginação se extingue." dadãos alguns recursos. ela impede que algum den-
[De Ia démocratie en Amérique (1840), Union géné- lre eles tenha recursos muito vastos; o que encerra
rale d'éditions, Paris, 1963, p. 337.] necessariamente os desejos dentro de limites muito
O que é verdade para os EstadosUnidos aplica-se estreitos. Entre os povos democráticos. porta nto. a
ainda mais à França, onde a centralização, Iniciada ambição é ardente e contínua. mas de ordinário
pelo estado monárquico muito antes da revolução, não pode ser muito ampla; e a vida neles se restrin-
destruiu os corpos intermediários e acentuou, em ge comumente em desejar ardentemente pequenos
compensação, a paixão igualitária dos cidadãos, objetos que se tem ao alcance das mãos." [De Ia
chegando a arruinar na opinião a própria Idéia de li- démocratie em Amérique, op. cit .. p. 336.]
berdade. Segundo Tocqueville. essesindivíduos. que formam
"f:ssaforma particular da tirania chamada de des- o elemento motor da nova sociedade - sua classe
potismo democrático, de que a Idade Média não média =, estão sem dúvida longe de estar satisfeitos
tivera nem idéia, já é familiar [aos cidadãos]. Não com sua sorte. Mas temem Igualmente serem absor-
há mais hierarquia na sociedade, não há mais clas- vidos pelas classes populares e serem rejeitados pelas
ses demarcados, não há mais situações fixas; um classessuperiores. Sua insatisfação apresenta. pois.
povo composto de indivíduos quase Idênticos e intel- dupla face e provoca desejos contraditórios que por
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HISTÓRIA
DASOCIOLOGIA I - DA'FfsICA
SOCIAL'
À 'SOCIOLOGIA'
PARTE I 3, CONTINUIDADE E MUDANÇA DA REFLEXÃO POLfTICA

conômica. Trata-se de um socialismo essencialmen-


1~1'lilili'l fim
se anulam. Em suma, em razão do desapareci_
aS::: mento progressivo da estrutura de classes, a socie_ te comunitário. que procura romper com o Individua-
~~:::::::~:
dade moderna seria naturalmente litigante, e não lismo da sociedade burguesa capitalista propondo
:!'.!!1~i
revolucionária [Nisbet, 1966]. modelos alternativos de sociedade. Na Escócia. Ro-
Estamos aquI, com certeza, nos antípodas do so- bert Owen (com as cooperativas de consumo); na
cialismo, que Tocqueville, que o identificava com o França. Charles Fourier (com o falanstério) e Pierre-Jo-
jacobinismo, odiava. seph Proudhon (com o federalismo) são figuras típicas
dessemovimento. que seus adversários chamarão de
utópico e que visa a transformar a natureza do ho-
SOCIALISMOS UTÓPICOS E MARXISMO mem agindo sobre suas formas de organização eco-
nômica e social. Mas essas doutrinas. que foram. na
A partir de 1830. na esteira de Saint-Simon. o so- época. notáveis laboratórios de Idéias e de práticas
cialismo se desenvolve. mas às custas de Inúmeras sociais para um movimento operário em busca de
dificuldades que se devem ao estilhaçamento da modelos. serão como que obliteradas por um socia-
doutrina. Para além das discordâncias que dizem res- lismo "científico" que encontrará no marxismo sua
peito menos ao cerne do que à importância que se fonte principal de inspiração.
devia conceder a um certo aspecto em relação a A contribuição de Karl Marx foi essencial para to-
outro na edificação do socialismo. todos aqueles que das as ciências humanas e sociais. Sua obra. porém.
o reivindicam consideram que a produção de bens não se reduz apenas à sociologia. Se realmente exis-
e de serviços é um dos objetivos essenciais da vida te um Marx "sociólogo". ainda que ele nunca se
em sociedade. que ela supõe um trabalho coletivo tenha considerado tal. o homem é também um filó-
que não se reduz à atividade econômica desenvolvi- sofo. um economista. um político e um sindicalista.
da pelos próprios Indivíduos. Os socialistas visam a Enquanto sociólogo. sua originalidade reside primei-
controlar a produção através da limitação. ou até ramente em conseguir fazer da luta de classes. que
da supressão da propriedade privada dos meios de ele teoriza melhor do que seus contemporâneos. o
produção. Essalimitação parece-Ihes ainda mais ne- motor da mudança histórica. Como declara no Ma-
cessária na medida em que a propriedade gera pro- nifesto Comunista (1848). escrito em colaboração
fundas desigualdades entre as diferentes formas de com Friedrich Engels. "a história de toda sociedade
atividade - ou de trabalho - que não são todas re- até hoje é a história da luta de classes". Mas de on-
muneradas em seu justo valor. Acrescentemos a isso de provêm essas "classes" a que ele atribuía tama-
que a crença na igualdade é um elemento impor- nha Importância? Elas resultam de um mecanismo
tante da doutrina socialista. Não porque os homens muito geral de divisão do trabalho. que se desenvol-
sejam idênticos uns aos outros. e sim porque seus di- veu historicamente ao mesmo tempo que a apro-
reitos e suas necessidades fundamentais são idênti- priação privada da terra e dos outros meios de
cas. Ou. para retomar o adágio famoso de Louls prOdução. As classes propriamente ditas surgem
Blanc: "De cada um conforme suas capacidades; a quando a diferenciação das tarefas e das funções
cada um conforme suas necessidades". deixa de ser aleatória para se tornar hereditária; em
O socialismo da primeira metade do século XIX outras palavras. quando estas últimas se transmitem
aparece como uma resposta à industrialização força- com e a partir do modelo da propriedade privada
da e às doutrinas que pretendem justificá-Ia; seUS dos meios de produção.
argumentos são de ordem moral muito mais do que As classes nascem. portanto. da própria diversida-
HISTÓRIADA SOCIOLOGIA I - DA 'FlsICA SOCIAL' A 'SOCIOLOGIA'
PARTE I 3. CONnNUlDADE E MUDANÇA DA REFLEXÃO POLlTlCA

!~!I:I~~1de das posições e funções que os indivíduos ocu- nunca a substituem antes que as condições materiais illl·j'·:.ill:lli
pam num dado sistema de produção. Essasposições
ê~g::: podem de existência dessas relações tenham sido criadas no :::ii:t::~
ser estimadas à luz de dois fatores primor- selo da própria velha sociedade. / .../ Esboçados em :::~::::::::::::::
diais: o "modo de produção" e as "relações sociais seus grandes traços, as relações de produção asiótl-
de produção", que são conceitos fortes da doutrina cos, antigas, feudais, burguesas modernas podem ser
marxista. designadas como épocas progressivas da formação
Tal como entendido pelos liberais, o indivíduo não social econômica. As relações burguesas de produ-
existe fora das relações sociais que condicionam ao ção são a última forma antagônica do processo
mesmo tempo seu ser e suas atividades. Dentre essas social de produção ..." [Prefóclo à Campanha pela
relações sociais, cumpre distinguir aquelas que regem constituição do Reich Alemão, de Engels (1850),Mor-
as outras, em razão de sua importância ou de sua ceaux cnolsis, Gallimard, Paris, 1934, p. 87.]
prioridade: a saber, as relações necessariamente con-
~~:;:i:~:~;:::;:::~::~:~:~~:~:::~:::::~~~::~::::~:~:~:~:~::::::~:~~::::~:;::~::::::~::::~::~:::~:::::::::;:::::~~::~:~:::::~::::~::::::~~:~~:;::~
flituais com a natureza.
De fato, Marx partilha com alguns de seus con- A LUTA DE CLASSES
temporâneos (Lamarck, Darwin, Spencer) a convic- COMO LEI DINÂMICA DO CAPrrALlSMO
ção de que a vida é uma luta permanente e de
que o homem deve arrancar da natureza o que é o fato de que os homens se encontram em posições diferentes
necessórlo para o sustento de sua própria existência. em relação aos meios de produção gera uma oposição entre seus
Mas acrescenta que o homem, levado por seu elã, Interesses.No século XIX, o princípio da sociedade capitalista exige
que os proprietários de fábricas estejam antes de tudo preocupa-
consegue - através do trabalho, considerado aqui no
dos com a busca do lucro máximo a com a apropriação privada
duplo sentido de meio técnico e de sistema de or-
da renda criada pelo trabalho do operáriO (mais-valia) que, por
ganização social - ultrapassar a vida meramente sua vez. se sente lesado por essa exploração. Além disso, a classe
natural. Assim agindo, os homens "produzem" sua vi- capitalista, detentora dos meios de produção, toma para si o po-
da, ou seja, conseguem ultrapassar sua condição de der poHtico e dele se serve para proibir aos operários qualquer
origem, respeitando porém certos limites impostos pe- manifestação pública de sua insatisfação. Mas se os capitalistas go-
lo estado das "forças produtivas", tal como este zam de um poder ilimitado, é porque os operáriOS,divididos e sem
decorre do nível dos recursos naturais, das técnicas, orçonlzoçóo, ainda não compreenderam as verdadeiras causas de
da divisão do trabalho. alcançados por uma dada sua servidão, apesar da exploração de que são vítimas. A fortíorl,
sociedade. não estão em condições de as combater.
Observe-se que Marx, ao refletir sobre o desenvol- Conseqüentemente, para que os membros do grupo operáriO
constituam uma. verdadeira classe, é preciso não s6 que enfrentem
vimento progressivo das forças produtivas e ao vincu-
uma mesma situoçôo econômica, ou que sejam as vítimas objeti-
lar esse desenvolvimento à estrutura da divisão do
vas da divisão do trabalho em vigor no modo de produção capi-
trabalho, da propriedade e das classes, acaba por talista; é preciso ainda que tomem consciência de seu papel no
Insistirna sucessão histórica dos modos de produção processo de produção e da natureza confiitual de suas relações
(sendo os principais os modos de produção patriar- com as oulras classes.
cal, feudal e capitalista) que se geram uns aos Em outras palavras, s6 a ação organizada permite a uma clas-
outros através de um movimento antagônico ou dia- se Impor a sua supremacia. Marx fala a este respeito de solidarie-
lético. dade e de associação de classe, que se exprimem em todos os
"Uma forma social nunca desaparece antes de ter campos da vida social, permanecendo claro que é somente pela
'luta' que uma classe pode ver reconhecido o que lhe cabe de
desenvolvido todas as forças produtivas que pode
direito, relativamente ao estágio de desenvolvimento histórico atin-
encerrar, e outras relações superiores de produção gido
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA I - DA 'F[SICA SOCIAL' A 'SOCIOLOGIA'
PARTE I 3. CONTINUIDADE E MUDANÇA DA REFLEXÃO POLfTlCA

I1 'As condições econômicas tinham primeiro transformado em tra-


balhadores a massa do país. O domínio do capital deu a essa
massa uma situação comum, interesses comuns. Assim, essa massa
já é uma classe em face do capital. mas ainda não para si mes-
ma. Na luta, essa massa se reúne, se constitui como classe para sl
Em face desse panorama. uma primeira conclusão
merece ser tirada. Antes que a sociologia - enquanto
diSCiplinaacadêmica reconhecida - se Imponha no fi-
nal do século XIX. as correntes que lhe deram origem
aparecem muito diversificadas. tanto em sua Inspira-
I
Os interessesque ela defende tornam-se interessesde classe. Mas a
luta de classe contra classe é uma luta política.'[Misere de Ia phl- ção quanto em seu conteúdo. Mas desde a origem
losophie (1847), Éditions sociales, Paris, 1961, pp. 177-178.] ela herda três "tradições" - positlvista. administrativa e
O conflito de classes pode ser entendido de duas maneiras. Em política - que ~e Início se Ignoram. depois se põem
primeiro lugar, remete à luta inconsciente a que se entregam. por lado a lado e as vezes se encontram. sem nunca se
exemplo, proletários e capitalistas pelo gozo de bens econômicos, fundirem. Esta heterogeneidade. longe de ser circuns-
antes mesmo da eclosão da consciência de classe; remete tam- tancial. será aqui considerada um de seus traços prin-
bém à luta organizada que contrapõe as duas classes a partir do cipais. que continua a caracterizá-Ia até hoje.
momento em que o proletariado toma consciência de seu papel
histórico e se entrega à ação coletiva. Mas essa consciência pode
ser apenas parcial (Marx fala então de 'falsa consciência'), se os
operários procuram negociar sua integração no sistema capitalista BIBLIOGRAFIA (1790-1860)
em vez de destruí-Ia. Pois, para ele, como para seus sucessores,
Louisde BONALD, (1754-1840): Teoria do Poder Político e Religioso
não podia haver compromisso com o capitalismo; este devia ne-
(1796).
cessariamente apagar-se diante de um novo modo de produção
Edmund BURKE,(1729-1797): Reflexões sobre a Revolução na França
que seria socialista. Enquanto espera o fim da história que o ad- (1790).
vento de uma sociedade comunista realizaria. Auguste COMTE,(1798-1857): Sistema de Política Positiva (1824). - CUr-
:::~~~~::~::::~::::~~::~~::::::::::~~::::::::~~::~~~::~::::::::::~::::~::::::::::::::::::::::::~::::~::::::::::::~~::::~::::~~~::~~::::::::;:::~~::~::~::::::::::::::~~~::~::::::::::::~~::~::::::::::~~::~:~
(1830-1842). - Discurso sobre o Espírito Positivo
so de Filosofia Positiva
(1844). - Catecismo Positivo (1852). - Apelo aos Consetvcaores (1855).
Percebe-se a importância dessas idéias para as Joseph de MAISTRE(1753-1821): Considerações sobre a França
ciências sociais. Muitos conceitos forjados por Marx (1796).
foram, aliás, depois de sua morte, discutidos, retoma- ThomasMALTHUS(1766, 1821): Considerações sobre a França (1796).
dos, emendados por gerações de teóricos e pesqui- Karl MARX (1818-1883): Miséria da Rlosofia (1847) - As Lutas de Clas-
ses na França (1850). - O 18 de Brumário de Luís Bonaparte(1852). _
sadores. O que não impede que sua influência sobre
O Capitd (1867-1894). - (Com Engels,F.): O Marifesfo Ccxrurista (1848).
a sociologia mereça ser matizada. e sem dúvida ml- Jacques NECKER,(1732-1804): Sobre a Legislação e o Comércio de
nimizada. por duas razões: 1) o impacto da teoria Grãos (1775).
marxista foi relativamente tardio, já que é preciso es- Adolphe QUÉTELET, (1796-1874): Física Social ou Ensaio sobre o De-
perar os anos 30 para que ela seja sociologicamente senvolvimento das Faculdades do Homem (1838).
levada a sério (ao passo que as teorias econômicas Claude H. SAINT-SIMON(1760-1825): Carta de uma Habitante de
foram debatidas na Alemanha e na Inglaterra desde Genebra a seus Contemporâneos (1803). - A Indústria (1816-1818).
- Do Sistema Industrial (1820-1822). - Catecismo dos Industriais
o Início do século); 2) mais fundamentalmente. o (1823-1824). - O Novo Cristianismo (1825).
marxismo. em sua versão científica e não doutrinária. Herbert SPENCER(1820-1903): Estática Social (1852). - O Estudo da
apresentou-se deliberadamente (em especial no se- SOCiologia (1873). - Princípios de Sociologia (1874-1896). - O Homem
gundo pós-guerra) como um substituto à sociologia. contra o Estado (1884).
que ele pretendia pelo menos englobar. senão subs- Alexis de TOCQUEVILLE(1805-1859): Da Democracia na América
(1835-1840). - O Antigo Regime e a Revolução (1856).
tituir com vantagens. Assim. de qualquer forma. é
LouisVILLERMÉ(1782-1863): Quadro do Estado Físico e Moral dos
possível discutir o próprio nome de "sociologia marxis- Operários Empregados nas Manufaturas de Algodão, de Lã e de
ta". já que o marxismo visava a ser. sozinho. toda Seda (1840).
uma sociologia.
~~,:;:::::~~::::~:::::~:~~::::::~~:~;:::~~::::~:;:::;~:::::~;:~~~:~::~::::~:::~~:;:::~~::::::~::::~i:::;:~~~~~::::~~~::::::::::::::::

li_SOCIOLOGIA OU
CIÊNCIA(S) SOCIAL(AIS)?
UMA DISCIPLINA EM
BUSCA DE IDENTIDADE
(1 860- 1890)
o finai dos anos 1850, falecem Comte e Toc-
N queville (Proudhon os seguirá pouco depois);
lermé e até Quételet - que também trabalha na
é1aboração do primeiro recenseamento da popula-
CIo na Bélgica - quase já terminaram sua obra; e
mais jovens - Marx, Spencer - iniciam trabalhos de
go fôlego que vão revelar progressivamente, mas
mais tarde.
O palco intelectual não está, porém, vazio. Inúme-
epfgonos continuam a explorar os recursos do
Hvlsmoe do organicismo. levando-os para outros
posoMas as reformas de estruturas antecipam-se
obras que são menos originais, como se Ihes fal-
o quadro necessário para se desenvolverem. A
'ervenção do estado também se faz mais premen-
nos campos econômico e social. Isso se verifica
toda parte, e não só na França.

1. VOLUNTARISMO POLíTICO
SOCIEDADE: O CASO FRANCÊS
.
E m meados do século XIX, a França continua,
porém, a ser um grande laboratório de Idéias.
e-se ver nisso,sem dúvida, a herança da filosofia
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
lOGIA OU CI~NCIA(S) SOCIAl(AIS)?
PARTE I
11- SOCIO POUTICO E SOCIEDADE: O CASO FRANC~S
VOLUNTARlSMO

I ~'~i::II:illlll das
l~~:i:
Luzes,fazendo deste país, e de sua capital
lugar de intensos intercâmbios, animado perlo,'
mente pelos sobressaltos de sua vida POlítica
repercutem em toda a Europa. Deve-se ver'
também a conseqüência da autoridade qUe
IS
- d 10 que de liberal tem só o nome, jó
Essemo edi~ociar a carreira dos universitóriosde
ten~e a erformances, não vai subsistirpor mul-
efetivas p •
o Desde meados do seculo, ele desaparece
I
terTlP' 'mpõe vinda da Alemanha, uma outra
conferem seus cientistas e filósofos, lidos e com lando se I' . b d di -
em da ciência, não mais asea a na eru rçoo,
dos quase em toda parte. Deve-se ver nisso,en
9 na pesquisd, uma noção completamente no-
e é este o motivo essencial - a conseqüêncl sim levar adiante essa pesquisa, a França não
uma tomada de consciência dolorosa por part, • para star muito bem prepara d a, pOIS . d'Ispoe
- de
elite francesa, que de repente descobre (nos Ieee e .
si t ma de formação que perdeu todo o brilho:
1860) que as figuras de proa de que se orgulha
s uondc suas forças, ollós exíguas, à colação de
não podem ocultar o atraso científico em rela, gr . id a d e tornou-
(como o bacharelado), a uruversi
aos seus rivais, dentre os quais a Alemanha flgUII
primeiro plano. Essatomada de consciência ser,
:::"'0 Instituição sem função verdadeira, oferecen-
no melhor dos casos uma cultura ultrapassada.
clalmente agravada pela derrota de 1870, result, Diante de uma concorrência internacional que se
depois em conjunto de reformas dirigidas pelo mais forte, inclusive no campo Intelectual, impõe-
do, sem equivalente em outros lugares. A "sup a Idéia de que a ciência francesa sofre de um
dade" da França, naqueles anos, apresenta parti !felto de organização que a impede de continuar
um caróter paradoxal, jó que o dinamismo do gredindo. Para remediar esse mal. é preciso re-
samento francês nada deve à sua institucionallz, ruír de ponta a ponta o ensino superior.
que é muito deficiente. diagnóstico nada tem de original. A solução
ntrada jó é mais original, uma vez que vai par-
essencialmentedo estado. Este último, esclarecido
A UNIVERSIDADE E AS VELEIDADES cientistas compreensivos, como Claude Bernard
DE REFORMA DO ESTADO IMPERIAL ErnestRenan, realmente buscaró mudar o mundo
ersltório, quando se convencer de que o nível
A universidade napoleônica - com suas fae ntlflco alcançado por uma nação pode Indicar
des e suas escolas - não foi abolida sob aRes potência e justificar sua posição entre os estados
ção e permanece organizada, em meado dernos. Foi de longo alcance, porém, o esforço
século XIX, em torno de um modelo quase pro cdo, jó que foram precisos cerca de trinta anos
nal, essencialmente normativo e repetitivo (com 'a que fosse coroado de êxito.
vê no direito e na medicina), que deixa pouco 'Nesseínterim, Victor Duruy, ministro da Instrução
para a liberdade de espírito ou para o talento, Ilca de 1863 a 1869, foi o primeiro a estabelecer
dor. A ciência ainda é considerada uma ovent domentos de uma política universitória ambiclo-
a invenção continua sendo apanógio dos gênl .ratificando a distinção de fato que se estabele-
mais das vezes isolados, quando não formam a entre o ensino e a pesquisa. Para tirar esta
culos à margem de qualquer instância acadêl de seu isolamento, manda criar a Escola Pró-
Essa concepção "romântica" da ciência caroe ~e Altos Estudos(1868), de estrutura e funclona-
aliós, tanto as matemóticas quanto a filosofia Inovadores [Verger et ai., 1986].
história, domínios em que a França tem grand
sença.
HISTÓRl!'- DA SOCIOLOGIA 11- SOCIOLOGIA OU CI~NCIA(S) SOCIAL(AIS)?
PARTE I 1. VOLUNTARISMO PoUTlCO E SOCIEDADE: O CASO FRANC~S

- ill~Itmill

I
~:::::::~::~:::::::::::::::::~::~:~::::::::::::::::~:::::::::~::::::::~::::~~::::::::::::::;::::::*:::::::::::::::::::::::::~:~:::::::::::::::::::::::::::::::::::::~:::::::::::::::::::::::::::::~:::::~::::::::::::::::::::::~:::

PRINcíPIOS DE ORGANIZAÇÃO
DA ESCOLA PRÁTICA DE ALTOS ESTUDOS
as vivas, às "classesascendentes" de que fala Gam-
~etta, oferecendo-Ihes um ensino de alto nível,
~!~f}:@
H!l§.!;
aberto às necessidades da época e que se apóie ~:::::::::::::::
na ciência, capaz, como se crê, de esclarecer a
açãO. Este tema, cientificis!a por excelência, não é
Uma das grandes novidades desta instituição é não se basear
monopólio dos positivistas. E o símbolo de toda uma
numa hierarquia previamente determinada, Para fazer parte do cor-
po docente, basta ter um nome na ciência, sem qualquer exigên- época.
cia de títulos. Além disso, a escola, ao contrário das faculdades,
não participa no colação de graus do estado. Ela se dirige a alu-
nos muito diversos,já que não é formulada nenhuma exigência em FRÉDÉRIC LE PLAY E SEU MOVIMENTO
matéria de Idade, de diploma ou de nacionalidade; alunos estes
que ela pretende formar para a pesquisa em pequenos grupos, Pela Idade (nasceu em 1806), Le Play pertence à
reunindo-os em seminários (o termo, que nada tem de clerical, é geração de Comte e de Tocqueville, dos quais mui-
de origem alemã e corresponde a uma prática universitária muito tos traços o aproximam, como a origem social e a
em vogo na Alemanha). Nessassessõessão apresentados métodos
formação. Em particular, compartilha com o primeiro
Inéditos que se baseiam menos no discurso do professor do que no
um itinerário científico que levou ambos à Escola Po-
'prática', ou seja, na aplicação concreta da pesquisa por parte
dos próprios alunos. Caí o qualificativo dado à escola.
litécnica; e, mais fundamentalmente, uma preocupa-
Acrescentemos que ao lado de três seções consagradas às ção com a ordem que esclarece mais de um
ciências exatas, é dado um lugar à história e à filologia (4a. se- aspecto de suas respectivas obras. Normando como
ção). Duruy visava com isso à criação de um outro departamento, Tocqueville, entrando na política quando este último
para as ciências econômicas e administrativas,que, em conseqüên- se retira, faz uma carreira pública que sua trajetória
cia de diversos acasos desfavoráveis, veio à luz apenas oitenta pessoal e seus primeiros trabalhos sociológicos aju-
anos mais tarde. dam esclarecer. Feito senador por Napoleão 111,
defende fielmente a política imperial e faz parte da
corte de tecnocratas que o regime produz. Mas fi-
Naquele momento, a demissão do ministro em quemos por aqui na comparação.
1869, seguida da derrocada do ImpériO depois de Le Play foi primeiro um engenheiro de minas, ou
Sedan, leva ao enterro provisório de seus projetos ps- seja, um homem de campo, que se deslocou pela
dagógicos. No entanto, a rapidez do desfecho da Europapor obrigação profissional e também por gos-
guerra franco-prussiana e, sobretudo, o episódio san- to. Ao longo de suas viagens, o metalurgista tornou-
grento da Comuna de Paris reabrem o debate sobre se etnógrafo.- Realizou e fez realizar estudos baseados
as origens da crise que abalam a nação e o esta- na observação direta dos meios populares e o esta-
do, na França. Amplas parcelas da opinião pública, belecimento dos orçamentos familiares típicos, que
tanto à direita como à esquerda, cornportllhorn ago- chamava de monografias, antes de reuni-Ias numa
ra a convicção de que as classes dirigentes têm a obra (O Trabalhador Europeu, 1855) que, desde a
responsabilidade por uma provação que não previ- PUblicação, obteve um incontestável sucesso.
ram, distantes que estavam das realidades da socle; Daí em diante, Le Play procura generalizar e codi-
da de francesa. Resultou disso que o país se deixoU ficar seu "método de observação" em torno de três
ultrapassar por seus principais rivais europeus, men rn~ios principais de investigação, que define da se-
talvez, no plano industrial do que no da formaçáo gUinte forma: "O primeiro consiste em observar os
de suas elites. fatos, o segundo em interrogar o trabalhador sobre
Para corrigir a situação, é preciso dirigir-se às for,
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 11- SOCIOLOGIA ou CltNCIA(S) SOCIAL(AIS)?
PARTEI 1. VOLUNTARlSMO poUTlCO E SOCIEDADE:o CASO FRANctS

I
as coisas que fogem a uma investigação direta. o
terceiro em tomar informações junto a pessoas do lu-
gar que conhecem há muito a família ou que
Influem sobre sua existência através de relações Pa-
tronais". [Instruções sobre o Método de Observaçõo.
ografias) são organizados no âmbito de uma Escola
~rática da Ciência Social. de nome significativo. uma
veZ que nele tornamos a encontrar, como em Duruv,
a vontade de unir a formação geral dos alunos a
considerações de método. Tardiamente. o movimen-
I
1862.] to ganha uma revista. A Reforma Social (1881). que
Para homogeneizar os levantamentos etnográficos tem por mérito principal ter precedido todas as ou-
de seus pesquisadores. e também para dar maior tras nas ciências sociais.
peso político a seu empreendimento. cria a Socieda- A Importância epistemológlca e teórica dos traba-
de de Economia Social (1856). à qual fixa COmo lhos de le Play. por longo tempo desconslderados.
objetivo "constatar através da observação direta dos hoje não é quase contestada. Partindo da hipótese
fatos a condição física e moral das pessoas ocupa- de que o estado de uma sociedade pode ser
das com trabalhos manuais [isto é. os trabalhadores. apreendido a partir do estudo de unidades sociais
na terminologia afetada de le Play) e as relações menores. considera que a família é esse microcosmo
que os ligam quer entre si. quer às outras classes".A no qual vêm refletir-se as tensões e contradições da
Sociedade planifica. por assim dizer. o estudo mono- sociedade global. O método que elabora consiste
gráfico das famílias operárias e os melhores trabalhos na observação direta. quase etnográfica. e na aná-
- em número de quarenta - dão lugar. mais tarde. a lise comparativa de dezenas de famílias trabalhado-
uma publicação no quadro de uma série Intitulada ras. Estas.de resto. não são de modo algum repre-
Os Trabalhadores dos Dois Mundos. sentativas.de um ponto de vista estatístico; são tipos
Os talentos de organizador de le Plov, que pude- Ideais que le Play constrói com base no modelo do
ram exprimir-se livremente quando da Exposição Uni- homem médio de Quételet. A atenção atribuída às
versal de Paris em 1867. encontram nova oportuni- rendas e às despesas familiares. que estão no cerne
dade de prestar serviços. Depois de Sedan. quando de todas as monografias como indícios privilegiados
da liqüidação da Comuna. redige um manifesto so- da atividade sócio-econômica. explica-se por sua
bre A Paz Social Depois do Desastre (junho de 1871). vontade de encontrar um instrumento de medida da
onde não expressa apenas o seu pavor. Pelo contró- vida social que seja quantificável e portanto aplicá-
rio. projeta promover um conjunto de reformas que vel em diferentes contextos.
se apoiariam numa rede de sociedades científicas: le Play. porém. não tem nada de pesquisador no
as Uniões da Paz Social. Em sua mente. sempre se sentido moderno da palavra. Nele. o conhecimento
trata de elucidar. através da observação. o estado é abertamente posto a serviço de um projeto ideoló-
material e moral da população trabalhadora. mas gico: "Em meio à confusão das idéias. do antago-
numa perspectiva de reforma social sem intervenção nismo das classes e da divisão dos partidos. não há
do estado. Depois de um início bastante lento. as nada mais urgente do que fundamentar a defesa
Uniões ganham impulso. chegando a contar com das verdades ·essenciais.ou a refutação dos erros fu-
três mil adeptos em 1884. Estessão. em sua maioria. nestosnum método tão fértil em seu rigor quanto os
recrutados através de um ensino. coerente em rela- procedimentos mais exatos de nossas ciências". [An-
ção a seus objetivos. que os adeptos de le riov nuaire de /'économie sociale pour les années
organizam. Conferências destinadas a um amplo pú- 1877-1878.Mame. Tours, 1878. Advertência.]
blico e cursos (de audiência propositalmente mais Trata-sede um conservador na política e. curiosa-
restrita. já que destinados aos futuros autores das mo- mente. um reformador por reação contra o mundo
HiSTÓRIA DA SOCIOLOGIA 11- SOCIOLOGIA ou CI~NCIA(S) SOCIAL(AIS)?
PARTE I 1. VOLUNTARlSMO PoUTlCO E SOCIEDADE: o CASO FRANC~S

- m1!!i{fi

I
moderno. Assim, seus trabalhos Inscrevem-se no pro-
longamento das Idéias que sempre defendeu em
matéria pública. A este respeito, observemos que ele
sonha com um mundo patriarcal cujas diferentes cé-
lulas funcionariam com base no modelo da família
lhe feito, em 1865, uma apresentação crítica. A
exemplo de Le Play, mais velho do que ele, Boutmy
é hostil à Intervenção do estado em matéria social ::::::;;:;;:
OU educatlva. Mas afasta-se do conservadorismo de
Le Play por sua oposição a toda autoridade que
i/{@
/~àr

tronco (que reúne, sob um mesmo teto, o pai e a não seja limitada e por sua recusa de um retorno à
mãe, o filho herdeiro e sua mulher, seus próprios fi- tradição. Além disso, é hostil à herança e partidário
lhos e eventualmente outros parentes que perrnona, da circulação das riquezas no Interior da sociedade.
ceram solteiros), que lhe parece o tipo melhor, supe- Deste ponto de vista, está bastante próximo dos li_
rior em todo caso à família conjugal restrita, que berais que situam o esforço moral a empreender sob
rejeita. a égide do progresso e da razão. A renovação do
Seu paternalismo - mesclado de catolicismo mili- ensinosuperior, que lhe parece necessária, é conce-
tante - é patente, mas no exato momento em que bida por Boutmy no quadro de uma "faculdade" livre
se mostra com mais vigor, Já está fora de moda. Isso de ensino superior que se centraria nas "ciências po-
porque se baseava numa concepção da vida públl, líticas", ou seja, nas ciências que tratam da vida
ca propriamente ratróqrodo. que confiava nas classes contemporânea, domínio que as faculdades tradicio-
dirigentes, em sua boa vontade, em seu senso d nais praticamente deixaram virgem. Ele é apoiado
responsabilidade para resolver as questões sociais. Da(, em seu empreendimento por homens de autoridade
a audiência do pensamento de Le Play em paíse. Intelectual reconhecida, como Guizot e Taine, e por
como a Grã-Bretanha, onde existia uma tradição d subscritoresrecrutados na alta burguesia liberal, em
patronato muito mais forte do que na França e, In particular protestante (Siegfried, Casimir-Périer,Scheu-
versamente, o descrédito que o atingiu em seu pr rer-Kestner...). O objetivo da escola é contribuir com
prio país, onde liberalismo político e conservadorism o esforço coletivo no sentido de fornecer ao país o
social nunca deixaram de caminhar lado a lado [K, que tanto lhe faltou em 1870, ou seja, uma classe
laora & Savoye, 1989]. média Inteligente, educada na consciência dos seus
deveres. Para tanto, não hesita em Introduzir discipll..
nas novas tais como história social e cultural, geogra-
A ESCOlA LIVRE DE CIÊNCIAS POLíTICAS fia humana, psicologia econômica, antropologia apli-
cada, ou até a economia social que a universidade,
Os católicos não foram os únicos a quererem tirl na época, ainda não reconhece e que ele pretende
o país da confusão em que naufragou depois d promover numa perspectiva amplamente comparati-
vo.
desastre, em 1871. Mais ao centro no tabuleiro P
c o, os protestantes também se interrogam sobre _Mesmo se a escola, especializando-se na prepara-
causas da "ignorância francesa que estava por fn çao para os concursos da administração, não favo-
da louca declaração de guerra que nos trouxe P receu a constituição de uma ciência do estado,
onde estamos". Assim se exprime o afilhado do distinta das ciências jurídicas e administrativas, como
fluente Jornalista Émile de Girardin, professor nu :~erava Boutmy, ela contribuiu para assentar a
escola particular de arquitetura, Émile BoutmY, J t a de que os fatos da sociedade podiam ser ob-
será em 1871 o fundador da Escola Livre de Ciên ~~ de uma abordagem racional e determinista,
Políticas em Paris. Seus argumentos parecem rn un,aare~idapela ciência. Essaciência, difundida por
próximos dos de Le Play, cuja obra conhece por universidade renovada, devia permitir a consti-
-
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 11- SOCIOLOGIA OU CI~NCIA(S) SOCIAL(AIS)?
PARTE I 2. OS 'PARADIGMAS' DE ORIGEM DA C/~NCIA SOCIAL

I
~~jr~1~i~!!i1l~
tulção
[!~~~t;i)i~~~ e a cmpnoçóo de uma elite, menos baseadQ o BIOLOGISMO E SEUS EXCESSOS
no nascimento do que no mérito (escolar). Pelo me.
lt~~:1
nos era esta a opinião do lobby cientificista e refor. De várias partes surgem teorias, paralelas quando
mista que se constituiu no final dos anos 1870 e ao não concorrentes, que propõem uma interpretação
qual se associou espontaneamente Boutmy [Favre aturalista dos fenômenos sociais. Destacam-se os es-
1989]. Mas quals eram, então, essas referências cien: ~ritores que se esteiam na noção de raça, que
tíficas tantas vezes referidas? acreditam fundamentada nessas disciplinas novas
que são a antropologia e a história. Augustin Thierry,
por exemplo, faz do antagonismo entre as raças um
dos motores do progresso histórico; Henrl Martin, em
sua monumental História da França, tenta mostrar a
persistência ao longo dos séculos de uma raça gau-
lesa a partir da qual se teria edificado a França
2. OS "PARADIGMAS" DE moderna. O próprio Renan vê na raça um elemento
ORIGEM DA CIÊNCIA SOCIAL Importante na gênese das sociedades. No entanto, a
tentativa mais famosa é feita por um diplomata, in-
centivado à carreira por Tocqueville, o conde Arthur

E mbora os contemporâneos nem sempre te·


nham tido clara consciência disso, podemos
dizer que dois pensamentos dominaram o século XIX
de Gobineau, que, em seu Ensaio sobre a Desigual-
dade das Raças Humanas (1855), afirma que o fator
racial é o critério essencial na expansão (ou na de-
no que diz respeito às ciências sociais: os de Augus-
cadência) das sociedades humanas. Como? Pelo
te Comte e de Herbert Spencer. Mas não houve jogo dos contatos que se travam entre "raças" supe-
entre eles um verdadeiro confronto, porque o desvio riores e "raças" inferiores, originalmente separadas.
do primeiro para o misticismo e a religiosidade eclip- Evolucionista de temperamento pessimista, o autor
sou, durante algum tempo, a importância epistemoló- acredita poder explicar o declínio da civilização oci-
gica de sua obra. De modo que, se o positivismo dental e, a longo prazo, o fim de toda civilização
ainda permaneceu muito vivo, foi sua versão spence- pela fusão das raças. Essafusão, que Gobineau con-
riana que produziu os seus mais importantes desen- sidera inevitável, levaria à degenerescência de suas
volvimentos. qualidades intrínsecas, sendo a "raça branca" a que
De resto, Spencer foi apresentado multas vezes mais perderia com essa mistura.
como um dos fundadores da escola organiclsta. A É inegável- que a obra desse aristocrata desenga-
este título, constituiria um elo decisivo na sucessão de nado, visceralmente hostil ao positivismo, carece de
teorias que antecedem o nascimento definitivo da qualquer cientificidade. Isso não impede que tenha
sociologia no final do século XIX. Embora não seja sido lida com fervor por muitos "sociólogos" que inter-
falsa, a afirmação merece pelo menos ser matizada. pretaram a partir dela os fenômenos sociais na lin-
De fato, o recurso aos conceitos, a utilização de mo- guagem da hereditariedade, da seleção às avessas
delos diretamente inspirados na biologia não foram
das espécies e do antropo-racismo. Foram nisso auxi-
coisa só de Spencer, que aparece como um mode- liados pela descoberta quase simultânea da obra de
rado na matéria. Darwin (1859), que desviaram de sua inspiração ini-
cial graças a uma série de transposições tendencio-
sos das ciências naturais para as ciências sociais.

HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 11- SOCIOLOGIA OU CltNCIA(S) SOCIAL(AIS)?

~Ú;i;:;:::: -~--'-""""'-- O DARWINISMO


PARTE I

SOCIAL
2. OS "PARADIGMAS'

o
DE ORIGEM DA C/~NCIA SOCIAL

ORGANICISMO

I
outros exemplos, de tonalidade diferente, provam
Na origem dessas teses, encontramos a obra de Ludwig Gum_ a importância dos esquemas biológicos nas primeiras
plowicz, jurista austríaco de origem polaca, Sociologista conss, 'nterpretações científicas dos fenômenos sociais. A
qüente, afirma que a ciência social não deve preocupar-se cOm :déia comum ente aceita nos meios científicos, que
indivíduos, e sim exclusivamente com grupos e com as relações poderíamos chamar de ponta, é de que o homem
que essesgrupos tecern entre si. Hostil também a toda filosofia da possui em primeiro lugar um corpo e um organismo.
história, recusa - como Gobineau - a própria idéia de progresso.De Desta forma, as leis da biologia são aplicáveis a ele.
resto, se é que algum 'progresso' possa verificar-se, ele só pOderia Além disso, como a sociedade é composta de In-
ser o produto ce fenômenos sociais maciços, de tendências univer-
divíduoSnitidamente identificáveis, o que é verdade
sais, sobre as quais os indivíduos não teriam nenhum controle.
para cada um deles se verifica no nível do grupo. A
Em duas de suas obras mais importantes (publicadas em 1875e
em 1883), Gumplowicz afirma que o motor da vida em sociedade
sociologia, portanto, tem interesse em fundamentar-se
reside na hostilidade recíproca entre grupos sociais, sendo estes na biologia, aplicando seu modelo de análise à In-
identificados com as 'raças' no sentido que Gobineau dá ao ter- terpretação dos fenômenos sociais. Este é o ponto
mo. Cada um deles luta espontaneamente por sua própria existên- de vista defendido pelo alemão Albert Schaffle em
cia e dessa luta resulta uma ampliação dos grupos sociais, através seus trabalhos (1875-1878),que são tidos como uma
de um processo forçoso de absorção, de fusão ou de submissão. das exposições mais completas do organicismo nas
O vocabulário utilizado é revelador da perspectiva adotada pe- ciências sociais e nos quais a rdentificação da socie-
lo autor. A 'luta' que põe em cena não é um jogo de soma zero. dade com um corpo (Sc hõ tf le fala de "tecidos
Dela sai necessariamente um vencedor e um vencido, e o grupo
sociais"a respeito das instituições) é explorada a fun-
vitorioso se vê no direito de explorar, com toda legitimidade, aque-
les que dominou, no direito de os transformar em escravos ou em
do.
súditos. Para melhor contê-Ias, edita 'leis' que estão na origem do Nenhum desses modelos, porém, poderia rivalizar
direito, dos estados e dos sistemas sociais de estratificação. com a doutrina de Spencer, que, de certa forma,
engloba a todas. Com maior força do que seus con-
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correntes ou êmulos, o filósofo inglês procura aproxi-
Temos dificuldade em imaginar hoje o interesse mar os seres humanos, que são seres sociais, dos
provocado por tais fábulas sobre a "guerra das ra- outrosorganismos vivos, vegetais ou animais. Sem po-
ças" como processo original de civilização, numa rém confundir uns com outros, aventa a hipótese de
época em que a sociologia era muitas vezes confun- que compartilham caracteres comuns, já que obede-
dida com a busca das origens da organização cem todos às' leis da vida, tais como a biologia as
social. Elas foram, porém, a matriz de muitas teorias descobriu. E foi principalmente essa mensagem que
racistas, antropo-sociológicas e reacionárias da virada seus primeiros leitores retiveram, mesmo se não é
do século, que floresceram na Alemanha (com Arn- aquela que hoje nos parece mais original.
mon e Chamberlain) ou na França (com Vacher de É por isso que Spencer é considerado, nos anos
Lapouge). 1870, um filósofo célebre, capaz de explorar o nú-
cleo científico do positivismo comteano, inscrevendo
as diferentes ordens da natureza em sua continuida-
de efetiva. Um dos que difundem na França o pen-
samento spenceriano é o filósofo Alfred Espinas.Toma
emprestada dele principalmente a idéia de uma
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 11- SOCIOLOGIA OU CI~NCIA(S) SOCIAL(AIS)?
PARTE I 2. OS 'PARADIGMAS' DE ORIGEM DA CltNC/A SOCIAL

I
continuidade entre os fenômenos sociais. Assim, num
livro (Das Sociedades Animais, 1877) que foi primeiro
uma tese, Espinas afirma que certos caracteres so-
ciais, por si mesmo idênticos, são discerníveis desde
os organismos biológicos até as sociedades humanas,
Interrogavam, nesses anos delicados para o regime, 1:111::I::!::'11If
s
obre os fundamentos reais e possíveisdo laço social. ::::69.::[

culo, um filósofo hoje desconsiderado, Alfred Fouillée,


lhe abrira o caminho. Esseensaísta, considerado du-
.
Antes até que se afirme o solidarismo, no final do sé- :::::::::::::::::::

passando pelos agrupamentos animais. E isso tanto e rante certo tempo o autor do best sel/er da literatura
de tal forma que essa continuidade dos caracteres pedagógica que foi A Volta da França por Duas
sociais do ser vivo justificaria a possibilidade de uma Crianças (na verdade escrito por sua mulher), conse-
"ciência da sociedade". Para esse autor, não hó dú- gue, com efeito, reinserirtemas tomados da literatura
vida de que as sociedades são "seres" como os tradicionalista numa perspectiva decididamente repu-
outros; que seus elementos estão dispostos "de ma- blicana e laica. Em 1880, com A Ciência Social Con-
neira a formar órgãos e sistemas", para retomar a temporânea, jó não mostrava que os homens de
fórmula de um outro organicista notório - de que vol- uma mesma sociedade eram organicamente solidó-
taremos a falar dentro em pouco -, René Worms; e rios uns aos outros, tanto no tempo como no espa-
esses sistemas obedecem às leis gerais da evolução. ço?
que são próprias dos seres vivos. Tema este de que Como explica ele nessa obra, contraímos dívidas
volta a tratar, pouco depois, Gustave Le Bon, em O junto a nossos antepassados, pelo simples fato de
Homem e a Sociedade (1881). A referência aqui jó que participamos dos benefícios da vida social. Co-
não é Comte, e sim Spencer e, para além dele. mo indivíduos, seríamos aliós completamente incapa-
Darwin. zesde dispensar a sociedade, jó que utilizamos conti-
Sem dúvida, a sociologia científica hoje jó não dÓ nuamente o fundo social acumulado pelas gerações
muita importância a essa identificação entre socieda- que nos precederam. Conseqüentemente, devemos
de e organismo social. Contudo, o modelo biológico a nossospredecessores as "riquezas" que nos lega-
fez com que a disciplina desse um passo decisivo n ram. Mas só poderíamos pagar-Ihes o que Ihes deve-
caminho da cientificidade. Porque, ao tomar a blolos mos Gá que estão mortos!) agindo para com nossos
gia como exemplo, a sociologia se propunha adota sucessorescomo nossos antepassados agiram para
o procedimento e os métodos que constituíram se conosco. Em outras palavras, a lei do tempo nos im-
sucesso. Ela ostentava com isso a ambição de rom põe "pagar" a nossos descendentes (Fouillée fala de
per com a filosofia social. tornando-se uma "verda 'justiça reparativa") o que nos foi transmitido por nos-
deira" ciência, no sentido experimental da palavr sosancestrais. E como eles, devemos por nossa vez
[Besnard et 01., 1981). Um objetivo que não seró es: dar o rnóxírno de nós para aumentar o fundo co-
quecido, se pensarmos que esclarece também mum das riquezas sociais. Ao fim das contas, os
empresa durkheimiana, posto de lado todo natural homens se mostram ligados, pela reciprocidade de
mo. seuscompromissos e pela consciência de suas obri-
gações, aos concidadãos e à humanidade.
Compreendamo-Io bem: as obrigações contraídas
o CONTRATUAlISMO nascem da natureza e a solidariedade que ela gera
apresenta um caróter obrigatório, que faz com que
o orçorucrsrno. revisto por Espinas,não foi a úni ~~~h~mde nós possa escapar a ela. É por isso que
teoria que obteve certo êxito na França, princiP ulllee fala de quase-contrato quando quer designar
mente nos meios republicanos, onde as pessoas o elo que une os homens entre si. Esse contrato,
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 11_ SOCIOLOGIA OU CI~NCIA(S) SOCIAL(AIS)?
PARTE I

--- 2. os 'PARADIGMAS' DE ORIGEM DA C/~NCIA SOCIAL

Icom efeito, não se baseia num ato fundador e d


berado; ele resulta das obrigações inelutáveis qU
estão ligadas à vida em sociedade, mesmo se a fOI
ma do contrato não foi determinada previament
to
que. depois de uma leitura atenta. embora
theYial de Comte, não hesitou em criticar o procedl-
parc 'e o método positivistas.usando de uma argu-
rnenntação . t·mo d a a marcar epoca.
aes .
rneNumaobra de 1883, Dilthey tenta elucidar a natu-
I
Para ele, as sociedades humanas seriam organisrn
contratuais que, submetidos primeiro apenas às le a e a condição do que chama de consciência
da natureza, evoluiriam na direção de formas de O reZ
histórica • d a e Ia b oraçao
atraves - d e uma am blreteso
.
ganlzação jurídicas e convencionais cada vez rna • tese que reconciliaria a filosofia da história. tal co-
Sln •
elaboradas, sob a ação de valores morais ou de mo era concebida por Hegel. e o metodo transcen-
déias forças" (em matéria de direito, de Igualdad dental de Kant. Querendo ultrapassar Comte. cujos
de justiça ...) que são elementos objetivos, portant, argumentos contesta explicitamente. defende a Idéia
motores, de todo processo social. Em suma, pai de que nem todas as ciências obedecem às mes-
ação de Instituições e de organismos contratuais, mos regras de funcionamento nem devem ser pensa-
sociedades modernas cessariam de estar submetid das num mesmo continuum. Considera especialmente
apenas às necessidades da natureza; por esse traba que as "ciências do espírito" passam por um desen-
lho de socialização contínua, elas se tornariam, eco volvimento diferente do das ciências da natureza e
vez mais, sensíveisao sopro da liberdade e do esp{, devem elaborar métodos certamente objetivos. mas
rito. específiCOS. que levem em conta a natureza portlou-
É Inegável o rebuscado do estilo, mas não no lar dos fatos sociais.
devemos deter muito nisso. Pois as palavras de FouJl: Issoporque. para ele. os fenômenos de que tra-
lée apenas anunciam o debate positivo sobre tam as ciências humanas têm por originalidade
direito, de que participarão homens como Durkhelm, seremsignificantes para aqueles que os vivem. A ex-
Bouglé e Duguit, na virada do século. Insistamo plicação - que sempre se resume a objetivá-Ios ao
aliás, neste ponto: o positivismo, na diversidade d procura; suas causas - não é. pois. decisiva; deve-
suas doutrinas, aparece realmente como a correnf mos nos esforçar por compreendê-Ios. isto é, reen-
dominante da pesquisa nas ciências humanas no contrar. de maneira intuitiva. a situação do ator.
anos 1880. Seu domínio, porém, não é absoluto. EI através de um trabalho de inter!orização dos com-
provoca até diversas resistências que são, por su portamentos que deve muito à psicologia. A sociolo-
proveniência, muito reveladoras de um antagonism gia é. então. considerada uma ciência que participa
latente entre as escolas nacionais de pensamento. da descrição dos processos psíquicos, que deve levar
em consideração o "estilo" de cada indivíduo ou ain-
da o de sua relação vivida no mundo [Mesure.
A FILOSOFIA ALEMÃ CONTRA O POSITIVISMO 1990).
Era este um ponto de vista fundador. que Inaugu-
A mais interessante reação veio dos filósofos e dos rava uma tradição de sociologia "compreensiva".
historiadores alemães. que, além da influência de He' alemã no essencial. que a maioria dos sociólogos di-
gel, se mostram tributários dos argumentos aventadOS tos costttvrstcs- os durkheimianos. em particular - se
por Leopold von Ranke sobre a especificidade do recusaram a examinar seriamente. sob o pretexto de
olhar histórico e a importância da relação, quase que dava importância excessiva à subjetividade. E
existencial. entre o historiador e seu objeto. Uma daS quando tiver passado o deslumbramento com a me-
figuras notáveis desse movimento é -o de Wilhelm DJI· táfora biológica. será a partir desses pontos de vista
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 11- SOCIOLOGIA OU CI~NCIA(S) SOCIAL(AIS)?
PARTE I

-- J.
os LIMITESDE UMA CltNC/A DA SOCIEDADE NOS ANOS 1880

~1;::;::.:.:::; contraditórios sobre a natureza (psicológica ou nõo:

l;l~~~~ do fato social que se organizará, no final do sécUI


XIX· sobretudo na França e na Alemanha ., o d
bate moderno sobre a construção do objeto n
sociologia.
-o de seus trabalhos, de nenhum lugar de Intercâm-
~o
bl ,
de nenhuma Instituição de ensino que lhe per-
no expandir-se. Na França . e Isto seria Igualmente
~erdade para outros países ., a única publicação
Quese abre para as suas preocupações é principal-
I
mente filosófica. Trata-se da Revue phi/osophique,
fundada por Théodule Ribot em 1876. Isto mostra a
dependência objetiva em que se encontram os so-
ciólogos,que devem aceitar submeter-se aos critérios
de julgamento dos filósofos e até compor com eles
para conseguirem ser publicados.
3. OS LIMITES DE UMA CIÊNCIA D De qualquer forma, e qualquer que tenha sido o
SOCIEDADE NOS ANOS 1880 ecumenismode Ribot, o fato de ser obrigado a pas-
sar por outros para se fazer reconhecer constituía um

A exposição das doutrinas em vigor revela se


dúvida a efervescência, e mesmo a diversld
de dos pontos de vista expressos sobre os fatos
entrave sério para o desenvolvimento de uma ciên-
cia da sociedade que a opinião aguardava e até
exigia, embora suas possibilidades reais de explica-
sociedade. Mas ainda não poderia tratar-se de • ção ou de intervenção no campo social fossem
ciologia", pois sob esse rótulo são propostos produf ainda quase nulas.
heteróclitos, muito distantes do que hoje entende
por esse termo.
Para muitos, sociologia e socialismo se confunde, W!,:,:,:,:,:,:,:,: },:,:,:,:,:,:,:,:":,:,:,:"",:,:,:,:"""""W",,:,:,:;:;:;:::;:;:;:;:,,;;n;,",,;:;,;:;:;:,,:;:;:;:;:;,;,;,;,;:;:;:;:::::;:;:,,:;,;:;:,:,:,:;:;:;:::;:::::,,;:;:;,;,;,n,,,,;:;:;,::;:;:;:;,:
Quando essa confusão não acontece, a primeira
assimilada à "ciência moral" pela qual os positivls BIBLIOGRAFIA (1860-1890)
gostariam de substituir a moral tradicional. Por seu
Cherles DARWIN, (1809-1882): Da Origem das Espécies Através da
do, por mais que o organicismo aparecesse como
Seleção Natural (1859-1862).
corrente mais original. os trabalhos que o reivindic
Wllhelm DILTHEY, (1833-1911): Introdução às Ciências do Espírito
apresentam pouca unidade e cada autor desenv (1883). - A Edificação do Mundo Histórico nas Ciências do Espírito
ve suas idéias sem se preocupar muito com as (1910). - Teoria das Concepções do Mundo (1911).
seus vizinhos. Assim, não é de espantar que na Alfred ESPINAS, (1844-1922): Das Sociedades Animais (1877).
sência de qualquer cumulatividade o território Alfred FOUILLÉE. (1838-1912): A Ciência Social Contemporânea
sociólogo permanecesse mal delimitado. A me (1880). - Os Elementos Sociológicos da Moral (1906).
que já estivesseocupado por concorrentes melhor Arfhur de GOBINEAU, (1816-1882): Ensaio sobre a Desigualdade das
RaçasHumanas (1853-1855).
ganizados, como os filósofos ou os psicólogos,
lUdwig GUMPLOWICZ (1838-1909): Raça e Estado (1875). - A Luta
pretendem dar conta - à sua maneira • dos fen <te Roças (1883). - Fundamentos da Sociologia (1885).
nos de sociedade. ;'édériC LE PLAY. (1806-1882): Os Trabalhadores Europeus (1855). _ A
Podemos formar uma idéia bastante exata da formo SocIal na França (1864). _ A Paz Social aepols do Desastre
(1871).
gil posição da sociologia no último quarto do sé
XIX, se pensarmos que • afora os leplaysianoS, Albe8
78).
n SCHAFFLE, (1831-1903)'
.
Constituição e Vida do Corpo Social
constituem um grupo ostensivamente à parte • a
ciplina não dispõe para si de nenhum órgão de
/11-ENTRE A FRANÇA
E A A~EMANHA, UM
MAGISTERiO DISPUTADO
(1890-1918)
nascimento da sociologia - como ciência es-
O pecífica do social - pode ser facilmente ras-
treado. Entre 1890 e 1900: em muitos países, são
divulgados obras maiores que reivindicam a ciência
social, depois a sociologia, ao mesmo tempo em
que são lançados revistas, criadas sociedades cientí-
ficas, cátedras de faculdade, escolas e Instituições
diversasque dão à disciplina sua primeira sustenta-
ção Instituclonal. Acompanhando esse movimento,
multiplicam-seos intercâmbios internacionais, constitui-
se um verdadeiro espaço intelectual comum - com
seustemas obrigatórios e seus primeiros objetos de
controvérsia. Participam dessas discussões, com uma
acuidade particular, cientistas franceses e alemães.

1. O DEBATE ACERCA
DAS CIÊNCIAS DO EspíRITO

A este respeito, não devemos perder de vista os


debates muito animados que se desenvolve-
ram nos anos 1890 dos dois lados do Reno, acerca
do estatuto da psicologia, embora a qualidade dos
argumentostrocados esteja longe de ser idêntica. De
UmPonto de vista teórico, as discussões mais impor-
t~ntessituam-se no sentido da distinção proposta por
Dllthey no âmbito de sua teoria do conhecimento.
--
111- ENTRE A FRANÇA E A ALEMANHA
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
1. O DEBATE ACERCA DAS ClfJNCIAS DO ESP/RITO
PARTE I

I
Elas se baseiam também nos resultados científicos
notáveis, obtidos pelos alemães em seus laborató;1
te e individualizante), onde voltamos a encontrar a distinção
J1la~itual
entre as ciências naturais e as ciências históricas.
na poro os dois filósofos,que ensinam em Heidelberg - a universida-
alemã de maior prestígio -, a oposição crucial situa-se no plano
de conceitualização do real que é abordado. conforme o tipo de
II
A RESSONÂNCIA DA CONTROVÉRSIA NEOKANTlANA d~ncia, a partir de pontos de vista simplesmente diferentes. Ir mais
c~lante, como Dilthey, e postular a existência separada de ciências
De maneira mais clara do que em outros países, as ciências ~o espíritosignificaria isolar a vida psíquica. dar-lhe um objeto dis-
ciais alemãs são o produto das ciências camerais ou administra Into do das ciências da natureza. O Inconveniente desse recorte é
vos. que desde o século XVIIIconheceram uma grande expan t ue roz a singularidade das ciências do espírito basear-se na exís-
Viu-se nisso a conseqüência de uma estrutura política complica ~ncia de um comum e quase universal fundo psicológico. Ora. o
herdada do Santo Império, que fez com que a Alemanha - essencialsem dúvida não está aí: ele concerne o sentido dos ntos
pleno século XIX - seja sem dúvida uma nação, mas formada numanos.os valores de que são portadores e que os Individuali-
39 estados, tendo cada um uma administração diferente e nee zam,questõesestas todas elas que não cabe colocar no caso das
sidades específicas em matéria de gestão. ciências da natureza.
Deve-se ver aí também a herança da cultura protestante, Emoutras palavras. as ciências se distinguem claramente confor-
seada na exegese dos textos e no livre exame. que foram ele me seusmétodos. Mas se quisermos insistirsobre suas diferenças de
tos favoráveis ao surgimento de um ensino superior de qualida conteúdo ou de materiais. melhor do que falar de 'ciências do es-
Este se distingue de seus homólogos franceses e ingleses pela pírito' é recorrer à expressão 'ciências da cultura', que tem o
lidade de seu funcionamento. que associa o curso magistral. ob méritode deslocar a cesura, de não mais fazer dos fenômenos psí-
a todos. e o 'seminário', por ocasião do qual o professor titular qucos um objeto de aposta epistemológico. Pois a psicologia cien-
de acompanhar a atividade de alguns estudantes avançados, c' tíRca será explicativà ou não será nada; e em nenhum caso será
dadosamente selecionados. Além disso. são oferecidos a essese: confundida com o uso de certos historiadores que se contentam -
dantes meios relativamente importantes. sob a forma de bibliof sob pretexto de psicologia - em basear seu trabalho no desvela-
de locais de pesquisa, de instrumentos de laboratório. que dão mento de 'processos psicológicos individuais de pessoas determina-
gor e notoriedade à pesquisa alemã. Daí também a importâncl das' [Mesure.1990].
em contraponto, dos trabalhos da filosofia da ciência.
IW-.::;~:::~::::::~::::~m:::;:;~:::::::;:i::::::::::::;:::~~::~~~:::::::::::i::;:~;:~:::::~::::~;::::;::::::::::::::~::::::::::::~::::;:~:::::::::i::::::~:::::~::::::::::::~::;i:::i::::::::::::::::::~::;::::i:i::
A crítica formulada por Windelband em 1894, depois retoma
e ampliada por Rickert em 1896, diz respeito em primeiro lugar
premissas que levam Dilthey a distinguir as ciências da natureza
WUNDT E A PSICOLOGIA CIENTíFICA
as ciências do espírito; diz respeito em seguida ao lugar da psi
logia na ligação entre elas.
Na discussão referida, Wilhelm Wundt se situa ao
Segundo Windelband. os objetos que as diferentes ciências
atribuem não são antinômicos. Conviria até fazer entre eJasap' lado de Dilthey no que diz respeito à diferença radi-
distinções de método. Umas (as ciências da natureza), porque cal entre as ciências do homem e as ciências da
tendem estabelecer leis universais. têm pretensões nomotétle' natureza. Este apoio chama ainda mais a atenção
Outras (as ciências do espírito),que visam a dar conta de fatos por Wundt ser considerado, na época, um persona-
tóricos singulares. contentam-se em descrevê-Ios; só podem gem eminente da universidade alemã.
ideogróficas. Assim. as ciências se distinguem umas das outras Esseconceituado tlsloloqisto. professor em Heidel-
por seu conteúdo. e sim pelo tratamento que dão a seu objel' berg no início dos a nos 1870, ampliou progressiva-
Windelband conclui daí que a psicologia deve ser classificada
mente o campo de suas reflexões no sentido da
to às disciplinas nomotéticas e portanto não poderia servirde
PsiCOlogiae da moral. Detentor de uma cátedra de
damento às ciências do espírito.
Rickert, por sua vez, afirma que a realidade empírica pode ~OSOfia em Leipzig desde 1875, ali fundou um institu-
lugar a diversas abordagens. que remetem a duas atitudes CI o de pesquisa, com biblioteca e laboratório, que
cas fundamentais, dois grandes modos de conhecimento (ge rapidamente adquiriu fama mundial em matéria de
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 111- ENTRE A FRANÇA E A ALEMANHA
PARTE I 1. o DEBA TE ACERCA DAS C/~NCIAS DO ESP{RITO

I
psicologia experimental e, mais tarde, de psicologia
dos povos. Seus trabalhos, que ele expõe em cerca
de trinta volumes, tratam detidamente da percepção
e da sensação e são lidos e comentados em tOda
parte.
outro são tomados numa relação conjunta que o i!ilillli'il:'I'i
psiCO-sociólogo deve explicar. Por essa proposição
podemos avaliar o fosso que separa Wundt, e mais :,:,:,:,:,:,:
geralmente os filósofos alemães, dos sociólogos posl-
tivistas do final do século. E este não é o único
rd~f

Deles reteremos sobretudo que Wundt desenvolve exemplo que podemos mencionar.
a respeito uma teoria da apercepção que não dei·
xa de ter Interesse epistemológico. Voltando por sua
vez - e depois de Spencer - ao conceito de causa· o COMUNITARISMO DE TONNIES
Iidade, que se mostra de importância primordial em
todas as discussõessobre a cientificidade das dlsclpü, Estecientista um pouco marginal. de cultura enci-
nas, ele se preocupa em distinguir duas espécies de clopédica, fez toda a sua carreira - de 1881 a 1933
causalidade: uma que se aplicaria aos fenômenos fi· _ na Universidade de Kiel, mas só se tornou professor
sicos; outra aos fen6menos psíquicos e sociais. tardiamente, por volta de 1914. Issomostra as dificul-
De fato, na apercepção psicológica é preciso le· dades que encontrou para ser admitido por seus
var em conta as duas formas sob as quais esta se pares, mesmo tendo sido um dos promotores mais
manifesta: passiva quando se contenta em reunir os ativos da sociologia dentro da universidade alemã (e
materiais da oxperlênclc: ativa quando o penscrnen- talvez por causa disso).
to se mostra ordenado desde dentro e ajuda a Filólogo e filósofo de formação, atraído pelo pen-
organizar sinteticamente a experiência para além da samento de Hobbes, que contribuiu para tornar
percepção. Da mesma forma, em matéria social, 08 conhecido na Alemanha, Ferdinand Tónnies perma-
tendências primárias dos indivíduos vêm chocar-se nece sendo essencialmente conhecido por uma obra
contra formas sociais que os obrigam a se adaptar e de juventude, Gemeinschaft und Gesellschaft [Comu-
às vezes a evoluir. Notemos a este respeito que o re- nidade e Sociedade], publicada em 1887. A primeira
curso a um modo de apresentação binário é fre- Interrogação do autor parte de reflexões sobre a filo-
qüente em Wundt, que adora basear suas demons- sofia do direito de um lado, sobre a psicologia do
trações em oposições: percepção ativa contra outro. Da mesma maneira que Wundt, de quem foi
percepção passiva; motivo afetivo contra móbil inte- aluno em Leipzig, Tbnnies distingue duas espécies de
lectual; e sobretudo vontade instintiva (Triebwille) con- 'vontade" no homem: a primeira (Wesenwille), que é
tra vontade racional (Zweckwille), que, colocadas nq,: a mais profundamente arraigada, baseia-se na natu-
escala das sociedades, fornecerão as bases do con: rezaorgânica e instintiva; a segunda, a vontade livre
ceito de comunidade, ao qual a sociologia oiernõ (Kürwil/e), írnpllc o reflexão e espírito de decisão. Esta
concederá tanta importância no início do século oposição psicológica fundamenta a oposição de ti-
[Barnes et aI., 1948]. pos sociais nitidamente estabelecidos. A vontade ori-
Examinando as relações que unem fatos psicoló ginal, de natureza quase orgânica, está na origem
cos e fatos sociais, Wundt declara que não há reto da comunidade (Gemeinschaft), a unidade de base
ção de causalidade unívoca entre os dois. U da vida social. que se caracteriza pelo espírito de fa-
mesmo quadro social pode responder a motivaçó mília, pela submissão ao costume, num ambiente
psicológicas diferentes; um mesmo complexo psicol quase inteiramente rural. e pelo ritmo de suas ativi-
gico pode exprimir-se sob formas sociais variadas. ~ades agrícolas e arfesanais. O exercício da vontade
social, portanto, não precede o psicológico; um Ivrerequer, pelo contrário, o florescimento da socie-
--
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 11I- ENTRE A FRANÇA E A ALEMANHA
PARTE I 1. O DEBATE ACERCA DAS C/~NCIAS DO ESP/RITO

I
dade (Gesellschaft) num quadro urbano que favore
ce o desenvolvimento de relações sociais certament,
mais refletidas, mas também mais abstratas e men
espontâneas. Ao espetáculo do mundo contempor6
neo, dominado pela luta sem tréguas, egoísta e cal.
nto que supõe que a vida social exprime a von-
m~e doS Indivíduos, que é o fruto de um acordo
ta e eles estabeleceram entre si. Para contornar os
q~onvenlentes que resultam de sua solidão, os ho-
Inens se associaram, criando assim a "sociedade" por
(I
culada a que se entregam indivíduos singulares, o monta própria. As leis que esta reconhece não são,
classes legalmente constituídas, T6nniesopõe, com al_ cais, de ordem biológica, e sim psicológica, uma vez
guma nostalgia, o contratipo de uma comunidade: ~ue a sociedade não remete a uma necessidade
fusional, dominada pelo orgânico e pelo afetivo, e natural. Ela resulta antes de tudo da atividade cons-
suma, solidária [Aron, 1935]. ciente de seres humanos. Mesmo assim, é preciso
Apesar da importância crucial desse livro, sob mui- esclarecer o sentido da psicologia assim designada.
tos aspectos a obra-prima da sociologia pslcologl Em seu uso corrente, o termo serve para designar
zante, Já que segundo T6nnies são os homens - por, os trabalhos de pretensão científica ou positiva que
sua vontade - que criam os laços sociais, a mensa nascem nos círculos de Hippolyte Taine e de Théodu-
gem que continha não foi muito bem entendida n te Ribot nos anos 1870. Os temas em voga tratam
época. Foi preciso esperar vinte anos para que do aprendizado das línguas e da evolução do pen-
obra encontrasse um público, no momento em qu samento,sem esquecer os estudos sobre as doenças
a Alemanha, tomada pela febre nacionalista, procu nervosase seu tratamento, de caráter mais medica-
rava na exaltação de seu passado supostament uzodo. Mas à psicologia pode também ser enten-
comunitário um antídoto contra os venenos da socle dida, num sentido menos forte, como um método e
dade burguesa, técnica e capitalista. não como uma ciência. Fazer psicologia consiste en-
Por mais que T6nnies protestasse contra as leitura. tão em admitir que os fenômenos sociais não se
tendenciosas que foram feitas de sua obra (ele visa reduzem completamente a leis biológicas e que a
va antes à edificação de um socialismo numontsto atividade mental dos homens intervém na produção
de inspiração comunitária), o tema da comunidad da sociedade.
e depois o da liga (Bund) - introduzido por schrno-
~~~:::::::::::::::: :;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:::::::::::;:;:;:;:;:;:;:;:;:::;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:; .,.:.;:;:;:::?:;:;:;:::;:;:::;:;:;:::;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:::;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:::
lenbach - como formas de organização social supe-
rior foram amplamente retomados depois pela socio- IMITAÇÃO E INVENÇÃO EM TARDE
logia alemã. '
Para ele, um fato social é em primeiro lugar um fato de imita-
çõo. como não se cansa de repetir em todos os seus escritos: 'Imi-
o PSICOLOGISMO À FRANCESA tação consciente ou inconsciente, inteligente ou estúpida, instrução
ou rotina, pouco importa. Falar, rezar, trabalhar, guerrear, fazer
qualquerobra social é repelir o que se aprendeu de alguém que
Em contraposição à pretensão dos positivistas d8l':
o havia aprendido de alguma outra pessoa, e assim por diante / .../
excluir a psicologia do campo científico, desenvolv até os primeiros autores de cada um dos ritos, de cada um dos
se na França toda uma controvérsia ora sobre a na procedimentos de trabalho, de cada um dos procedimentos de
tureza psicológica do fato social. ora sobre o lugar. guerra/ .../ que passam de homem para homem ao longo de um
do contingente ou do individual na explicação soei tempo mais ou menos longo'. [Les Transformafions du droit (1893),
lógica. Alcan, Paris, 1922, p. 1'70.]
Na tradição inaugurada por Hobbes e modifiead A sociabilidade, já sob sua forma mais primária, exige que os
por Rousseau,o psicologismo é a corrente de pensa homensestejam aptos a se compreenderem. ou seja, a comparli-
-
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 111- ENTRE A FRANÇA E A ALEMANHA
PARTE I 2. A SOCIOLOGIA COMO 'C/?NCIA DOS SERES SOCIAIS'

I Iharem os mesmos valores, os mesmos pensamentos que geram


realização dos mesmos atos.
i:}~~:;:::::~: No entanto, nem todo fato social provém da imitação ente,
da em sentido estrito. Alguns parecem provir dos Indivíduos que
realizam; são as Invenções que, embora mois raras, não deixam
N mais profundo das consciências, no quadro das

re
~ações Intermentais travadas pelos seres humanos,
Id"
ascem as elas, as regras e as normas de que se
nutre a atividade social. Para esse fundo comum,
ser decisivas. Combinando essas duas forças. que são de nature: nue caracteriza o conjunto da corrente, Tarde contri-
psicológica, Tarde esforça-se por levar em consideração os rlt ~Ui de modo original com a insistência com que
de desenvolvimento da vida social que. segundo ele, se baseia define o fato social a partir das ações e reações de
fenômenos de repetição, de oposição e enfim de adaptação Indivíduosem comunicação constante.
resolução dos contrários. Assim.sobre a transformação das líng Tarde volta continuamente a tratar desses diferen-
do direito, Tarde acredita observar uma linha de evolução cons tes assuntos no conjunto de sua obra, onde se
te: afirma com constância uma única e mesma Idéia: a
'Tudo o que vemos claramente é uma tendência ao triunfo
de tratar os fatos sociais a partir de um ponto de
uma única língua ou de um número muito pequeno de línguas.
vista estritamente psicológico ou individual. E insista-
um único direito, ou de um número muito pequeno de direit,
de uma língua ou de um direito comum a todas as classesdo
mos no fato de que, assim procedendo, ele se mos-
ciedade. Ora, essa é a dupla conseqüência inevitável da ação tra em sinfonia com o espírito da época, para além
muito tempo continuada da imitação. Quanto mais remontam de todas as clivagens políticas ou ideológicas.
passado, mais descobrimos idiomas distintos e costumes dotados
torço de lei; de sorte que na origem devemos supor tantas líl
e tantos direitos quantas fossem as aldeias. Mas à medida qUI
relações entre os homens se vão multiplicando, a maior parte
sas criações lingüísticas e jurídicas vão sendo recaicadas e d
das / .../. Por outro lado, e simultaneamente, são feitas muda
nas línguas através de empréstimos tomados das palavras 2, A SOCIOLOGIA COMO
pela linguagem vulgar, das palavras literárias pelo estilo co
empréstimos estes muitas vezes irônicos. mas sempre imitativos; "CIÊNCIA DOS SERES SOCIAIS"
sas mudanças correspondem, no direito, às mudanças produ.
pela importação do direito do primogênito pelas camadas pI'
pela extensão gradual às classes inferiores dos direitos primitiv, A-tendia
expressão é de René Worms
caracterizar assim a
que pre-
(1903),
evolução da
te reservados às classes superiores'. [Les Transformafions au IOClologiamoderna, aquela, pelo menos, que rompe-
(1893), op. cit., pp. 204-205.J Ia com o comtismo. Se o vocabulário utilizado é
A imitação é apresentada como um ato espontâneo, por
dUVidoso,acentua porém a existência incontestável,
dizer consubstancial ao laço social, que leva os seres sacio,
deacleessa época, de uma sociologia que se interes-
inferioresa copiarem aqueles que Ihes são superiores.Para o
Ia menos pela Psicologia dos Indivíduos do que
seu caráter elitista, temos aí o embrião de uma teoria difuSi
dos traços culturais de que encontramos muitos exemplOSno Pelas decisões ou ações que esses mesmos indiví-
logia do século XX. duostomam ou realizam em situações sociais típicas.
Em alguns de seus estudos de "psicologia social" _
leSSãoforjada inteiramente por ele (1898) =, Tarde
'erla passar por um eminente representante grrli.-
Para os defensores dessa teoria, à frente dOS
~dessa Corrente. Màs os trabalhos mais significa-
se destaca Gabriel Tarde, os fenômenos soei 'I SObreuma Possível sociologia da ação foram
objeto da psicologia porque se baseiam e na Alemanha.
realizados conscientemente por individuos con
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 111- ENTRE A FRANÇA E A ALEMANHA
PARTE I 2. A SOCIOLOGIA COMO 'C/~NCIA DOS SERES SOCIAIS'

I~ SIMMEL E A SOCIOLOGIA DA FORMA

Como seu colega mais velho Tbnnies, mas por ou-


tras razões, Georg Simmel teve de esperar muito
tempo antes de se tornar professor de carreira, gra-
épistémo/ogie, PUF, 1981, p. 111]
Essaconsciência aguda de um dualismo insepará-
vel da natureza humana, se não lhe é própria, o faz
perceber - melhor do que outros - a cultura como
uma coação "insuportável" para a vida, que recusa
I
ças à guerra - se ousarmos dizê-Io - que mobilizou OS a se dobrar sobre si mesma. Mas será que a vida
mais jovens para o front. Tinha, assim, 54 anos quan- poderia se desenvolver fora de qualquer disciplina,
do chegou a Estrasburgo, em 1914. fora de qualquer forma, que certamente a canali-
O atraso de sua carreira deve-se a suas origens zam, mas lhe permitem realizar-se? Para Simmel. em
judias, de que alguns de seus colegas não hesitaram todo caso, a sociologia é a ciência que, observando
em se valer para passar à sua frente no momento a "tragédia da cultura", assume como objetivo des-
da atribuição dos cargos. Ele é, porém, reconhecido crever, classificar, analisar e, enfim, explicar as formas
como um mestre na Alemanha (os cursos que dá da interação social. da socialização ou da organiza-
em Berlim são freqüentados por um auditório nume- ção, e Isso independentemente do conteúdo dessas
roso) e também no estrangeiro (na França e sobre- formas.
tudo nos Estados Unidos, onde seus livros e artigos "Para ter um sentido definido, a sociologia deve
são rapidamente traduzidos). Mente paradoxal e bri- buscar seus problemas, não na matéria da vida so-
lhante, amador de arte esclarecido, exprime-se com cial, mas em sua forma; e é essa forma que confere
facilidade sobre os assuntos mais variados, acerca seu caráter social a todos essesfatos de que se ocu-
dos quais utiliza uma vasta cultura, na fronteira das pam as ciências particulares. Baseia-senessa conside-
disciplinas constituídas. ração abstrata das formas sociais todo o direito de
Filósofo vitalista, mostra-se preocupado com a infl- existirque tenha a sociologia / .../. As formas que as-
nidade dos recursos tanto materiais quanto espirituais sumem os grupos de homens unidos para viverem ao
de que dispõe o ser humano, que contrasta com a lado uns dos outros, ou uns para os outros: é este o
finitude de sua condição, ou antes com sua incapa- campo da sociologia." [Como se Mantêm as Formas
cidade de superar o movimento contraditório que Sociais (1897), op. cit., p. 172.]
dele faz um ser único e, ao mesmo tempo, separa- E Simmel acrescenta que existem formas de socia-
do ou dividido, semelhante ou diferente [Freund lização cujo tempo de vida é Independente do
1991]. tempo dos homens, embora, no mesmo movimento,
"A semelhança com os outros não é, sem dúvida essasformas sejam constantemente renovadas pelas
de menor importância como fato e como tendêncl ações recíprocas dos indivíduos que, a todo instante,
do que a diferença entre eles, e ambas são, sob as reconstituem.
formas mais diversas, os grandes princípios de tod "É correto apresentar a sociedade como uma uni-
desenvolvimento Interno e externo, de modo que P dade sui generis, distinta de seus elementos indivi-
demos considerar a história da civilização human duais. Pois as energias que ela utiliza para se
muito simplesmente como a história de suas lutas conservar nada têm em comum com o instinto de
de suas reconciliações; no entanto, no que diz re conservação dos indivíduos / .../. Por outro lado, é
peito à atividade na esfera das relações do indivídU Certoque só existem indivíduos, que os produtos hu-
/ .../ a diferenciação com relação aos outros constltl manos só têm realidade fora dos homens se tiverem
o motor que nos provoca e nos condiciona ..." ["O ~rna natureza material, e que as criações de que fa-
vel social e o nível individual" (1917), Sociologia amos, sendo espirituais, só vivem nas inteligências
111- ENTRE A FRANÇA E A ALEMANHA

--
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
PARTE I 2. A SOCIOLOGIA COMO 'C/~NC/A DOS SERES SOCIAIS'

I
pessoais / ...l . Para um conhecimento perfeito, é pre.
ciso admitir que só existem indivíduos. Para um olhar
que penetrasse o fundo das coisas, todo fenômeno
que pore oe constituir acima dos indivíduos alguma
de Sorokln (1928). que quase sempre esquecem de
itar), Max Weber é hoje considerado - e com razão
~ o maior sociólogo que a Alemanha produziu. Em
que se baseia esta superioridade?
podemos dizer, com Parsons, que ele conseguiu
I
unidade nova e independente se resolveria na,
ações recíprocas intercambiadas pelos indivíduos,- dar à sociologia um quadro conceitual e, mais ain-
[Como se Mantêm as Formas Sociais (1897), oo. c/t da, que o formulou e sistematizou com um rigor sem
pp. 173-174.] ., Igual. Outros foram mais sensíveisao fato de que ele
Daí a atenção prestada por ele aos fenômenoa; desenvolveu uma coerente filosofia da sociologia.
mlcro-socials no que têm de evolutlvo, que fazero' Weber define a sociologia, em Economia e Socieda-
dele um precursor em matéria de sociologia da vida de, como uma ciência "compreensiva" que, por inter-
cotidiana e, de modo mais amplo, da psloo-soclole, pretação, mas sem artifício de estilo, procura analisar
gia. Daí também seu ponto de vista relativista no o sentido visado por um ou mais de um agentes em
debate aberto na Alemanha sobre a continuidade função do comportamento de outrem e, conseqüen-
ou a descontinuidade do desenvolvimento histórico: temente, pretende esclarecer o sentido de toda ati-
O essencial para o sociólogo, segundo ele, continua vidade social.
sendo isolar das realidades maciças (o estado, a smí "Chamamos sociologia uma ciência que se pro-
ciedade, as classes), que se apresentam ao se põe compreender por interpretação a atividade
olhar, a ação recíproca das partes. social e com Isso explicar causalmente seu desenvol-
Sem dúvida, mais filósofo das ciências sociais d vimento e seus efeitos. Entendemos por "atividade"
que sociólogo - no sentido moderno do termo -, Si, um comportamento humano / ...l , quando e na me-
mel sempre provocoU diferentes reações entre se dida em que o agente ou os agentes lhe comuni-
cam um sentido subjetivo. E por atividade "social", a
leitores. Inicialmente bem recebido na França, por
ciólogos de todos os matizes - Inclusive por Durkhel atividade que, conforme seu sentido visado pelo
que publicou um de seus artigos no primeiro volurn agente ou pelos agentes, se relaciona com o com-
de L'Année sociologique -, foi finalmente rejeitad portamento de outrem, relativamente ao qual se
pelos durkheimianos (a despeito dos esforços contrá orienta seu desenrolar." [Économie et société (1922),
rios de Bouglé), que o julgavam filósofo demais e P Plon,Paris,1971, p. 4.]
cólogo demais, sobretudo quando se aproximou di Podemos também observar que, em muitos cam-
Bergson no início do século. Mais tarde foi salvo di pos,Weber compreendeu as características de base
esquecimento entre as duas guerras por seus trab da civilização moderna, capitalista e burocrática, a
lhos sobre a história, mas nunca sofreu o mesmo da! menosque, como Aron (1959). se ressalte o aspecto
crédito na Alemanha ou nos Estados Unidos, onde fi romântico de sua existência, que oferece um exem-
um dos sociólogos mais comentados. por interméd plo notável da sociologia como "vocação".
Numa obra imensa pelos temas abordados e pela
da Escola de Chicago.
somados conhecimentos que supõe (mesmo se não
Isentade contradições, em grande parte, devidas à
personalidadecomplexa do autor) e que trata tanto
WEBER E A SOCIOLOGIA COMPREENSIVA
da história como do direito, da economia e da so-
clolo .
Graças aos esforços de reabilitação de parsO gla, ressaltaremos quatro aspectos, talvez mais
deter .
[1937] e de Aron [1935,1967] (e, muito antes dei mlnantes do que os outros.
111- ENTRE A FRANÇA E A ALEMANHA
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 2. A SOCIOLOGIA COMO 'C/~NCIA DOS SERES SOCIAIS'
PARTE I

simplificar - aumentando-as - as relações entre os te- l:i'ililiillil:l~

i
1.' Em matéria de epistemologia, os trabalhos de
n6menos em questão, ele aventa sutilmente a hipó- :::~$:?::!
Weber inscrevem-se plenamente no debate rieokon,
tese de que o protestantismo pôde fornecer ao capl- :;:;::::::::::::::
trono já mencionado. Para ele, a sociologia não
talismo diversos elementos essenciais (como o culto
poderia basear-se no postulado de que existem leis
do individualismo. o gosto pelo esforço levado até o
universais do comportamento humano, comparáveis
ascetismo.a racionalidade das condutas econômicas
às que regem as ciências naturais. OUo desencantamento do mundo mencionado há
2. O que não significa que a ciência social. a
pouco), que distinguem nitidamente o capitalismo
exemplo de outras ciências, não possa ser objeto de
europeu em suas origens e justificam sua superiorida-
uma abordagem racional. cujas ambigüidades não
de Intrínseca sobre os mundos concorrentes, particu-
devemos subestimar. larmente os asiáticos.
"A Intelectualização e a racionalização crescente.
não significam de modo algum um conhecimento s:~::~::::::::::::m:;:::::::::::::;::::::::::~:;::::::::::::::~::::::~~~::::::::::~:::::;::~::::~::::~:::::::;:;:;::~::~~::::::::::::::::::::::::::~:::::::::::::::::;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:::;:;:;:;:;:;:;:::::;:::;:;:;::::::::~
geral crescente das condições em que vivemos. Ela.
CIÊNCIA E POLíTICA SEGUNDO WEBER
significam antes que sabemos ou acreditamos que a
cada instante possamos, contanto apenas que quei-
Se a obra sem dúvida não apresenta a mesma unidade que a
ramos. provar que em princípio não existe nenhum de Durkheim.é porque Weber. personagem freudiano por excelên-
poder misterioso e imprevisível que interfira no curso cia. é um homem dilacerado: primeiro em sua vida. em que uma
da vida; em suma, que podemos 'controlar' todas enfermidade nervosa o deixa durante vários anos intelectualmente
coisas através da previsãO. Mas isso equivale a d Inerte;também em sua vocação. onde oscila entre duas éticas (da
sencantar o mundo." l"A Profissão e a Vocação d convicção e da responsabilidade). que lhe parecem igualmente
Cientista", in Le Savant et I~ politique (1919). Unio' possíveis.
'Toda atividade orientada de acordo com a ética pode ser su-
générale d'éditions. Paris. 1959. p. 70.]
bordinada a duas máximas totalmente diferentes e irredutivelmente
Estando a racionalização do mundo inscrita n
opostos.Ela pode orientar-se pela ética da responsabilidade ou pe-
mais profundo da civilização ocidental. o sociólog'
lo ética da convicção. Issonão quer dizer que a ética da convic-
deve explicar as origens e os caracteres de um rnu çõo seja idêntica à ausência da responsabilidade e a ética da
do que se modernizou ao se laicizar e se desemb responsabilidadeà ausência de convicção. Evidentemente. não se
roçou de seus mistérios entregando-se às mirage trata disso. Mas existe uma oposição abissal entre a atitude de
C
da razão. Weber se aproxima aqui de certas preo quem age conforme as máximas da ética da convicção - numa
pações de Marx, cuja obra conhece. linguagemreligiosa. diríamos; 'O cristão faz seu dever e. no que diz
3. Weber se distancia de Marx. porém, quan respeitoao resultado da ação. remete a Deus' - e a atitude de
aborda a questão das origens da racionalização q quem age conforme a ética da responsabilidade. que diz: 'Deve-
se apossou do mundo ocidental. e só dele. O e' mosresponder pelas conseqüências previsíveis de nossos atos.' I'A
PrOfissõo e a Vocação de Homem Político' (1919). op. cit.. p. 172.]
mento decisivo foi a mudança cultural introduzi
A argumentação de Weber aplica-se - às custas de uma imper-
pela ética protestante. Mas como o assunto oro
Ceptíveltransposição - a duas solicitações a que cede uma após
cou inúmeros debates contraditórios (seu duelo c' Outra.e não sem remorsos: a ciência e a política. E essas não fo-
seu colega Sombart tornou-se célebre), algunS es :rn questões,ePisódicas. já que tiveram conseqüências diretas na
recimentos suplementares não serão supérfluOs. t6no Instltuclonal da disciplina na Alemanha de Guilherme 11.
Weber não pretende que o protestantismo tenl
estado, historicamente, na origem do capitalismO.
ainda menos que tenha sido a sua causa. Ao pro'
um modelo (OU "tipo ideal") que tem o méritO
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
111• ENTRE A FRANÇA E A ALEMANHA
PARTE I

I
2. A SOCIOLOGIA COMO "CltNCIA DOS SERES SOCIAIS'
tfr~m~ ---..
;m:::?i;iI 4. Os trabalhos do epistemólogo e do historiador
f9i:H das civilizações não poderiam fazer esquecer que ele ::r~i~od~e~~;~~,:,~~~:que
a di,ciplino posse por um
;:;:;:;:;:;:;:;:;:;
foi. além disso. um pensador fundamental do político.
Foi assim que em 1903 Max Weber e Werner Som- ::::':":":,:""
O contexto histórico alemão (Weber cresceu em PI~.
bart. ambos prOfessoresde "economia nacional" _ o
no blsmarckismo e. em sua maturidade. é uma test
primeiroem Heidelberg. o segundo em Breslau _ fun-
munha atenta da ascensão política do Segund
dam uma revista de ciências sociais -, Archiv für
Reich na cena Internacional) basta para compree
Sozio/w/ssenschaft und Sozia/po/itik [Arquivo de Ciência
der a Importância que atribui à questão do POde social e Política Social] -. a primeira do gênero no
da "potência" - com alguns indícios nietzscheanos.
Impérioalemão. A criação dessa revista prefigura ela
vezes. que seus admiradores tendem a desconsider,
própria uma tentativa conseqüente de Institucionallza-
=, e também da violência que em troca provoca ção da disciplina, que ganha corpo em 1908,quando
Sem falar dos modos de dominação e de autorid Weber.Simmel e Tõnnies unem esforços para fundar
de a que consagra longas páginas. que perman a Associação Alemã de Sociologia. associação que
cem pertinentes; e em particular do carlsma e d o último presidirá durante muitos anos. Ao mesmo
burocracia. de que foi um dos mais brilhantes anali tempo. Weber lança uma coleção de obras. Em bre-
tas. ve. todas as condições parecem então reunidas
para que a sociologia se afirme de maneira autôno-
ma.
A SOCiOlOGIA ALEMÃ:
No entanto. brigas pessoais. que vêm recobrir _
UMA DISCIPLINA DE ESTATUTO INCERTO
como sempre - divergências teóricas. logo obscure-
cem o horizonte. Sob pretexto de divergências. aliás
Não falta agilidade ao sistema universitário.pode reais.entre sociólogos sobre a questão espinhosa da
do as mesmas disciplinas ser ensinadas em faculd neutralidade axiológica da ciência - estamos na on-
des e Institutos diferentes. Nos anos 1870. os juri$tas levéspera da guerra de 1914 -. Weber abandona o
economistas são os mais ativos na organização comitê diretor da Associação Alemã de Sociologia.
reflexão sobre as ciências sociais e sua utilidade. que sai muito enfraquecido do episódio.
sim. Alfred Schmoller. professor de economia em B Além disso. como a disciplina continua a se cho-
lim. funda um círculo de estudos intitulado Vereín car, dentro da universidade. com ásperas oposições
Sozia/po/itik [União para a Política Social]. que agru corporativistasque impedem sua autonomização e
universitários de todas as tendências. preocupad tampouco goza de apoios na sociedade civil. por ter
com as questões sociais. deixado quase completamente de lado a sociologia
Mas quando a sociologia consegue separar- aplicada. chega-se ao paradoxo de que a Alema-
não sem dificuldade. das ciências camerais. pa nha de antes de 1914 pode realmente se orgulhar
para a tutela das faculdades de filosofia. no ínte de Contar com sociólogos conceituados. dentre os
das quais sociólogos ainda jovens conseguem In de maior audiência em todo o mundo. mas é forço-
duzir-se. como Simmel em Berlim. Rickert em FribU so constatar que a sociologia alemã. enquanto
ou Windelband em Estrasburgo. Apesar de uma pl corpoConstituído. praticamente não existe.
dução Importante atestada desde o final do séo'
XIX e da multiplicação de cátedras de história. e'
nomia. filosofia e estatística que são ocupadas
autênticos sociólogos. é preciso esperar o início
--
H~ómADAsOCCLOG~ 111- ENTRE A FRANÇA E A ALEMANHA
AAR~I 3. A SOCIOLOGIA COMO CI~NCIA GERAL DO SOCIAL

I CO

VO
ncepção exigente do fato social.
Deve-se dizer que, dentre os grandes universitários
época, Durkheim certamente foi um dos que pro-
dOcoram maior.. oorxoo,
d -
- U'ns viam ne Ie um novo Des-
rtes. quan o nao o comparavam
S .
a pmoz o:
I
3. A SOCIOLOGIA COMO ~~tros,pelo contrário, denunciavam o caráter pernl-
10sOde seu pensamento, o Intelectual pago pela
CIÊNCIA GERAL DO SOCIAL ~Iemanha que ameaçava arruinar a unidade moral
da naçãol Mas como explicar tais excessos na apre-

N o final do século XIX, a concepção domlnOI


te do fato social é que "tudo o que é ge
foi primeiro individual". Considera-se que essa afir,
loção de seus concidadãos?
c Sob muitos aspectos, Durkheim é um "produto" típi-
co da Terceira República, que encoraja a ascensão
ção, aventada em 1896 por um jovem universitá Intelectual e social de seus melhores alunos. Originá-
Charles Andler. germanista de profissão, dreyfus rio dos Vosges, pertencia a ur:na família de rabinos e
por convicção e socialista por vocação, reflita de professores primários de Eplnot, de recursos mo-
sentimento geral que ultrapassa as habituais divl
destos (2.500 francos por ano, segundo Charle
de grupúsculos. Durkheim, porém, lutará contra e,
[1985]), que obrigam sua mãe a abrir uma oficina
evidência, e o fará com um ardor e um talento
de bordados. Notado pelos seus professores, ganha
rapidamente o conduzirão a aparecer como o p,
uma bolsa que lhe permite, depois do curso secun-
cipal defensor do "coisismo sociológico". Este s
dórlo, preparar no liceu Louis-Ie-Grand de Paris o
pelo menos o rótulo que os adversários lhe cola
concursode entrada na Escola Normal Superior. Mais
às costas. trabalhador do que brilhante, só foi admitido na ter-
ceira tentativa, e com uma classificação um tanto
medíocre (décimo primeiro). Mas foi nessa escola _
ÉMILE DURKHEIM: A CARREIRA onde teve por colegas Joures e Bergson, que perten-
ciam a uma classe um ano anterior, mas também
Hubert Bourgin, um dos mais ativos colaborad Brunote Janet - que sua personalidade floresceu,
de Durkheim (antes de se tornar um renegado IOb a dupla influência do historiador Fustel de Cou-
pois da morte do mestre), compreendera be longese do filósofo Émlle Boutroux, e que se Impôs
seguinte: "Desde o momento em que a escola diante dos colegas como um filósofo de grande futu-
lógica ainda contava com um só homem, seu ro, dotado aliás de uma capacidade de trabalho
dor, ela já era uma escola". A tirada tem a excepcional.
significado; ela mostra o fato incontestável de Aprovado em 1882 no exame de agregação de
aos olhos dos contemporâneos - partidários ou a ;:SOfia, Durkheim inicia o percurso habitual de um
sários -, Émile Durkheim se impôs como o cneí em prOfessornomeado para um liceu, que o leva
escola sociológica porque conseguiu apresentar "'ceSSivamente a Puy, a Sens, a Saint-Quentin e a
ciologia como uma teoria globalizante, cop es, Mais tarde, em 1885, como vários de seus co-
integrar e de sistematizar os fatos sociais melh las agregados, obtém uma bolsa de estudos que
que conseguiriam fazê-Ia as outras disciplinas,
bém fez dela uma matéria ensinável. dandO-1h
;0 à Alemanha - a Leipzlq, para seguir os cursos
1mUndt, Cuja impressão será nele duradoura _ e a
conteúdo que não mais pertence ao domínl . De Volta à França, publica diversas resenhas
senso comum, e sim da ciência, em nome de
HISTÓRIA DA SOCIOLQ.GIA 111- ENTRE A FRANÇA E A ALEMANHA
PARTE I 3. A~~~
SOCIOLOGIA COMO CltNCIA GERAL DO SOCIAL _

I~~i'i'!~'ilili'de
t~!ili
livros. seguidas de dois artigos na I?evue Pnl/,
phique acerca da situação da filosofia e das CI,
clas sociais na Alemanha. que vêm consolidar
nascente reputação. Em outubro de 1887. cos,
~a
COU . aln
em vida. cerca de oitenta artigos e mais
entas resenhas. a maior . pa rte em L'A'nnee so-
de tre~que. e sobretudo quatro livros considerados
clo/~9·cos para a disciplina. cuja cronologia merece
[I
com Louise Dreyfus. filha de um industrial do ra cononl
recordada.
metalúrgico. que o faz aceder à abastança bur ' serErn1893. Da Divisão do Trabalho Social. que foi
sa. Irnelramente apresentada à Sorbonne SOba forma
Notado provavelmente por Espinas.na época pr rna tese de doutorado; em 1895. As Regras do
fessor na Faculdade de Letras de Bordeaux. qu de U
Método SOCIO
. I'oçico,
. rapl.id amen t e seguro
ld as d e O
Indica a Liard. o muito influente diretor do ensino 'ato em 1897; e, por fim. As Formas Elementares
I
SUCI •
perlor no ministério da Instrução Pública. é nome d Vida Religiosa, publicados em 1912. Quinze anos
encarregado de cursos de pedagogia e de clê aparam.portanto. os dois últimos livros. Eles corres-
social em Bordeaux (para o ano de 1887). curso seondemà aventura de L'Année soci%gique. revista
p . ,
que a sociologia é introduzida pela primeira vez que rnobil.izOLJ, durante esse período. o essencial de
ma universidade francesa como matéria de ensl suaenergia.
Aproveitando-se do florescimento da pedagogia. No primeiro livro. Durkheim propõe não apenas um
momento decisivo em que as faculdades são reor método de abordagem sistemática dos fatos sociais
nlzadas e especializadas. Durkheim segue uma o que permanecerá sempre fieI. mas também esbo-
relra universitária clássica que. depois da defesa ça alguns dos temas aos quais voltará continua-
uma tese de doutorado em letras. o levará a ,gan mentena seqüência. Dentre eles. um é fundamental.
uma cátedra em Bordeaux. onde permanecerá /6 que diz respeito à natureza da relação entre os
1902. Depois de várias tentativas infrutíferas de v Indivíduose a sociedade ou. para cltó-lo, a natureza
a Paris. é chamado à Sorbonne para a cadeira 'das relações entre a personalidade Individual e a
ciências da educação. a fim de substituir Ferdin solidariedadesocial". Segundo ele. de fato. os indiví-
Buisson. que acabara de ser eleito deputado. duos na sociedade moderna vão aos poucos
meado titular da cadeira em 1906. deverá por ganhando autonomia em relação à sociedade. em-
aguardar até 1913 para ver seu ensino oficialme bora dependam cada vez mais dessa mesma socie-
dedicado à sociologia. dade para sobreviverem. Para dar conta dessa
A originalidade profunda de Durkheim não re contradição. Durkheim mostra que a solidariedade
evidentemente nesse percurso de "normalien. agra' Socialse transformou. passando de uma forma me-
do e doutor". que é o da maioria do professores cânica a uma forma orgânica e contratual. por inter-
faculdades literárias de sua geração. Ela se d médio e pelo desenvolvimento de uma divisão do
mais a uma produção ao mesmo tempo individu trabalho.sem dúvida inelutável. que encoraja a afir-
coletiva sobre a qual se esteiam seu prestígio a mação da Identidade individual.
autoridade. '0 desaparecimento do tipo segmentá rio. ao mes-
",-otempo que necessita de uma maior especializa-
çoo, liberta parcialmente a consciência individual do
A OBRA meio orgânico que a suporta assim como do meio
~Clal que a envolve e. em conseqüência dessa du-
À primeira vista. sua produção pessoal. por rna emanCipação. o indivíduo se torna de forma
densa que seja. não parece imensa. Durkheim pu aismarcada um fator independente de sua própria
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
PARTE I
111- ENTRE A FRANÇA E A ALEMANHA
3. A SOCIOLOGIA cnAAr. '-"~NCIA GERAL DO SOCIAL
@:rrr
conduta.A própria divisão do trabalho contribui p
@i:::::!::::::

I
m virtude da qual se impõem a efe, quer queira
f9~!:! ra essolibertação, pois as naturezas Individuais, ao euer não." [Les Regles de Ia méthode sOciologique
:\i~:::::::::::: especializarem, se tornam mais complexas e, por ~895), PUF,Paris, 1967, pp. 3-4.J
mesmo,são em parte subtraídas à ação coletiva
OS dois traços distintivos do fato social são aqui
às influênciashereditárias que só podem se exere
xplicitados: "Sua exterioridade em relação às cons-
sobrecoisas simples e gerais." [De Ia division du tn
;Iências Individuais [e] a ação coercitiva que exerce
vail social (1893), PUF,Paris, 1973, pp. 399-400.]
sobre essas mesmas consciências". Embora não hesi-
SeráIsso muito novo? Sente-se ao longo de to
te em conceder a seus adversários que "a sociologia
o livroa Influência de Spencer, que Durkhelm
não é nada mais do que uma psicologia sui gene-
preocupa em refutar longamente, quase contra
ris",para ele não há dúvida de que a singularidade
vontade. Considerando as coisas mais de perto,
da sociologia (e talvez sua superioridade) no concer-
Inovação radical de Durkheim reside, sem dúvt
to das disciplinas reside essencialmente em sua
menosna elaboração dos temas - como os da
capacidade de dar conta dos fenômenos sociais co-
dariedade, do contrato ou da divisão do trabalh
mo coisas que Podem dar lugar a uma abordagem
ou suaperspectivação - ao mesmo tempo evolu
objetiva. Em outras palavras, a sociologia deve con-
nistoe organicista -, que pertencem à atmosfera
siderar esses fenômenos como exteriores aos indiví-
época, do que no tratamento propriamente soei
duos, e seu procedimento se verá facilitado em
gico que Ihes dispensa.
relação às outras ciências humanas - como a história
É o caso de sua exposição incisiva das Regras
ou a psicologia -, que apresentam a desvantagem
Método Sociológico, que teve grande repercu
de tratar de "fatos psíqUicos [queJ se dão natural-
quando publicado. Nesse breve ensaio, que se a
mente como estados do sujeito". E. mais adiante, ele
senta como um ato de fé e de propaganda,
vai mais além nessa idéia: "Deste ponto de vista, a
kheim expõe primeiro os traços principais do fi
sociologia tem sobre a psicologia uma séria vanta-
social,que pertence ao domínio específico da
gem que não foi percebida até agora e que deve
logia e que ele se preocupa em distinguir do
acelerar o seu desenvolvimento. Os fatos são talvez
psicológico.
maisdifíceis de interpretar porque são mais comple-
"Quando desempenho minha tarefa de irmão
xos,mas são mais fáceis de atin·gir. A Psicologia,
marido ou de cidadão, quando executo os co
pelo contrário, não tem só dificuldade de elaborá-Ios,
missasque contraí. cumpro deveres que são d
mas também de apreendê-Ios". [Les Regles de Ia
dos, fora de mim e de meus atos, no direito e
máthode sociOlogique (1895), op. cito , pp. 30-31.]
costumes.Mesmo quando eles estão de acordo
O caráter Insubstituível da sociologia deve-se tam-
meus próprios sentimentos e que sinto intimame
bém ao fato de tratar das modalidades de imposi-
realidade deles, esta realidade não deixa de se Çãodos valores e dos princípios mesmos da vida em
jetiva; pois não fui eu quem os fez, mas os r lOeledade;ao fato de que ela é, no fundo, ou aspi-
por meio da educação. I ...! Eis aí. portanto, ra a ser, uma ciência moral. A isso Durkheim, fiel ao
modos de agir, de pensar e de sentir que ap(1 enSinode Comte, não renunciará jamais.
tom essanotável propriedade de existirem for,
PoA OUsadiado procedimento certamente não pára
consclênclos Individuais. r ar. Mostra-semuito típico o seu método de expo-
"Nãosó esses tipos de conduta ou de pen
~ão, em três tempos, explicitado anteriormente por
to são exteriores ao indivíduo, mas tambá
~r\ [1?67j: a) apresentação do prOblema tratado e
dotados de uma potência imperativa e coe
n Çao do assunto; b) refutação das idéias e teo-
--
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 111- ENTRE A FRANÇA E A ALEMANHA
PARTE I os ESFORÇOS DE ORGANIZAÇÃO DA DISCIPLINA NA FRANÇA
4.

I
rias anteriormente existentes sobre a questão; c) eXPI
cação sociológica do fenômeno considerado.
Essaforma de exposição ternária é perfeitamel'\~
Identificável em O Suicídio, sua obra mais célebrl
na_se
;0
sociedades primitivas. Assim, para Durkheim, tor-
5
possível fundamentar uma teoria das religiões
periores" de tipo monoteísta na análise de formas
sUcaicasa partir das quais a própria essência de to-
I
:::::::::::::::~::

ar .
onde demonstra, ao final de uma análise estatístlc, da religião se torna mais clara.
densa e de grande virtuosidade metodológica, qUI segue-se então uma precisa descrição - digna
o fato de se matar, aparentemente um fenômel'\, doSmelhores etnólogos - do sistema clânico e do to-
estritamente Individual, pode ser abordado sem fa temismo australianos, no qual esteia uma verdadeira
uso de um tratamento em termos psicológicos e qU teoria geral das religiões, de que reteremos aqui
ele se explica à luz das causas sociais que PUdera duas Idéias: 1) no totemismo - e sem dúvida em 10-
provocá-Io. Em outras palavras, os motivos do sulcfd da religião -, os homens dedicam um culto à própria
remetem a forças que emanam da sociedade sociedade, através do sagrado; 2) as sociedades,
dos grupos a que os indivíduos pertencem e que sob certas condições, podem criar deuses ou reli-
comandam sem que eles se dêem conta, no rn giões, em particular quando passam por estados
mento mesmo em que acreditam agir livremente. extremosde tensão coletiva.
as taxas de suicídio, no interior de um dado grup Ao escrever este último livro, é certo que Durkheim
apresentam uma regularidade lal que podemos ti tirava partido dos esforços desenvolvidos no quadro
má-Ias pos sintomas certos do estado normal de L'Année sociologique, onde publicara em 1897
patológico desse grupo. Tese ousada para a époc um estudo acerca da "definição dos fenômenos reli-
que provoca muitas reticências, até mesmo nas filei· giosos", seguido de uma memória mais volumosa
ras durkheimianas, com alguns discutindo seu social, sobreo totemismo em 1900, que devem ser encara-
gismo estreito (Bouglé), enquanto outros contesta dos ambos como esboços preparatórios da grande
um recurso imoderado a estatísticas não muito co obra em gestação sobre a religião.
flávels (Simiand).
Em As Formas Elementares, Durkheim torna a ab
dar essa idéia de "força", anônima e difusa, qu
pesa sobre o curso da vida social e talvez tome e
prestado de Wundt. cujos trabalhos sobre a consciê
cia coletiva (die Volksee/e) retiveram sua atençã
Tomando como objeto a religião, tenta estabelec 4. OS ESFORÇOS DE ORGANIZAÇÃO
que ela não supõe necessariamente a crença nu DA DISCIPLINA NA FRANÇA
deus transcendente. Ela é antes de tudo um "sistem
de crenças e de práticas"; umas e outras só ganha
corpo no quadro de uma comunidade que lhe!
confere sentido. A religião é, portanto, encarada O<
N a
virada do século, a amplitude dos inter-
câmbios desencadeados pelas publicações
de Durkheim, assim como de Simmel ou Tarde, não
mo um fenômeno coletivo. se deve apenas à qualidade intrínseca dos referidos
Sua existência baseia-se, em todos os casos, nu trabalhos. É preciso levar também em consideração
distinção essencial entre fenômenos sagrados e prl a realidade de que "as ciências sociais estão terrivel-
fanos, distinção que a religião exacerba por um co mente na moda. / .../ É o supra-sumo de todas as
junto de práticas e de representações que vem reuniõesmundanas, de todos os discursos, de todos
em ação tanto nas sociedades modernas quan Osjornais,e ninguém é inteligente se não for sociólo-
--
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
111- ENTRE A FRANÇA E A ALEMANHA
PARTE I 4, OS ESFORÇOS
'~:-~ ~ __
DE ORGANIZAÇÃO DA DISCIPLINA NA FRANÇA

I go". Assim se expressa o historiador Henri Hauser 1'1


relatório de 1903 sobre o ensino das ciências SOcl
Trata-se, sob muitos aspectos, de um instrumento PI
cioso, pela qualidade de sua informação, q
demonstra o estado de espírito dos meios intelectu,
dentre eles já estão associados. Assim é que
gU~~elotse torna ministro da Instrução Pública em
89r6_1887 ou que universitáriosde menor renome, co-
188Gréard ou Liard, entram na administração com
I
ro~s responsabilidades, o primeiro como vice-reitor
e sua evolução, se levarmos em conta que a aSSl, ai apoderosíssima Academia de Paris e o segundo
lação proposta entre "ciências sociais" e soclolo damo diretor d'o ensino suponor
. . . té 110.
no rrurus . Em ou-
não era evidente alguns anos antes. cOs palavras, no último quarto do século XIX, a unl-
Em que se baseia essa moda de que fala H trarsldade goza d e uma coruunçoo. - rara, que f o I
ser? No caso da França, distingue-se no pano
~:vorável ~o desenvo.lvimento de u~ e~sino e de
fundo um movimento social de boa envergadura.
roa pesquisa de qualidade: a consclencla de uma
bre o qual veio se enxertar uma conjuntura paU:
~rande obra a realizar, a presença de personalida-
que acelerou as mutações em curso.
deseminentes para dar início a ela, o concurso de
uma administração que compartilha as novas idéias
...•... e um movimento social para sustentá-Ia, assim como
...•~ OS REPUBLICANOS E O ENSINO SUPERIOR demonstrouProst em O Ensino na França [1968] .
~ Dentro do ministério da Instrução Pública não fal- ..J
Cl
Seus detratores fizeram muitos comentários ma tavamapoios à nascente ciência social. embora não
~

~
. sos sobre a Ideologia cientificista e o entusiasmo
tivista a que aderiram homens tão diferentes cal
18 soubessemuito bem o que se podia esperar dela,
tanto no plano dos métodos quanto de seus prog-
biólogo Pasteur, o historiador Fustel de Coulang nósticosou de suas soluções. Daí certas f1utuações
<I)
químico Berthelot ou o jurista Lyon-Caen, para que podem ser notadas na escolha de modelos de
::s
fi,)
só algumas das figuras de proa. Estavam todos .ferência e certas hesitações no apoio a dar às ins-
~
mados pela vontade de construir um novo e tituiçõese aos homens.
~
superior, que se mostrasse ao mesmo tempo pre Num primeiro momento, os responsáveis apoiaram
pado em transmitir um saber irrigado pela pesq cientistasque defendessem a causa republicana e
em favorecer o nascimento de uma nova cornu iua moral secular. Foi assim que Durkheim, jovem
de moral - que unisse os professores e seus olu PIOfessorde filosofia, fora enviado à Alemanha para
ao redor da ciência. É o que explica que per pletar sua formação, em 1885-1886; e quando
dades tão fortes se tenham mostrado solld u - com 29 anos de idade -, obteve nomeação
quando se tratou de levar adiante suas idéias, o encarregado de cursos na Faculdade de Le-
essa finalidade, constituiu-se uma "Sociedade p de Bordeaux.
Estudo das Questões de EnsinoSuperior", que d ,.. guinada à esquerda, senão do próprio Dur-
favorecer o surgimento de uma opinião próp elm, pelo menos de alguns de seus próximos,
mundo universitário. 'Ptosdo socialismo, explica melhor do que outros
Vai inscrever-se na referida sociedade a 'lIvos- epistemológicOSou institueionais _ a relativa
parte dos grandes nomes da universidade, I ,orado "rn t . _ .
, es re de Bordeaux" (a denomlnaçao e
nhecidos ou ainda em início de carreira, c POC,a) numa faculdade do interior onde perma-
psicólogo Janet ou o sociólogo Durkheim. O 'I qUinzeanos, a despeito de seus esforços enér-
tante, porém, é que esses homens são ouvld Para Voltar a Paris. Uma prova disso nos é
mundo político e pelo governo, a cujos trabal com a criação, estrategicamente importante,
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 111- ENTRE A FRANÇA E A ALEMANHA
PARTE I SFORÇOS DE ORGANIZAÇÃO DA DlselPUNA NA FRANÇA

I
de uma cátedra de filosofia social no Colá I
França em 1897. Depois de uma consulta
cios competentes. o ministro decidiu nomear
esse cargo. não a Durkheim. que se candld t
g
~

QualS
tuto definitivo: recrutamento maciço de professores no en-
seu esta ríor que são melhor remunerados do que antes e aos
..,0 superepública
.
oferece
.
novos locais de trabalho. E longa a lista
a mas. grandeS ou modestas. que provam a continuidade do
de ref~rempreendido a favor da universidade. numa perspectiva
I
mas sim Jean Izoulet. hoje caído no esqUeCI:'
,sforç temente política: primeiro enfrentar a hegemonia Intelectual
provavelmente porque este último apresentava61 ,vldentíficada Alemanha. tomando aliás as universidades alemãs
Ihores garantias para os homens no POder ,Clen modelo: em seguida. formar professores sob a égide da
ação defendia abertamente. E não se trata de cornolarepublicana. para melhor subtraí-Iasà tutela da religião co-
clênc
caso Isolado: em muitas ocasiões. o governo 1m
ao Colégio de França pessoas e ensinamentos I tóllC:'prioridadeconcedida a disciplinas como a história (maciça-
vinham dar apoio a suas próprias opções politl nte). a geografia ou a ciência da educação (mais moderada-
anticlericais e anti-socialistas. mente)nas faculdades de letras esclarece-se à luz das preocupa-
Ora. não é só no ensino que os poderes púb ":e morais e cívicas que não deixam de ter conseqüências
s
manifestam interesse pela ciência social. Cada ç do9ógicas,As ciências humanas são admitidas. mas apenas na
:dida em que se mostram capazes de esclarecer a ação. E isso
mais. a preocupação provocada pela extensão
continuarávalendo por muito tempo.
contestação operária leva o estado a se colocar De resto. as disciplinas solicitadas estão há muito implantadas
mo árbitro entre assalariados e patrões. Essafun nooparelho escolar e universitário. encobertas pela filosofia e pela
inédita de arbitragem faz com que nasçam n h~tóriatradicionais. Sob certos aspectos. não há. portanto. ruptura
demandas de informação sobre a produção. a o como passado. mas ampliação das competências do historiador
nização. a remuneração do trabalho ou até sobn ou do filósofo.que anexam novos territórios: a geografia no primei-
condição operária. que continua mal conhecida. rocaso:a pedagogia no segundo. que se relaciona com a moral.
ra tanto. uma Secretaria do Trabalho. subordln Emcompensação. a dificuldade principal com que se defrontam a
psicologiae sobretudo a sociologia decorre do fato de que o qua-
ao ministério do Comércio e da Indústria. é cri
drounlversitórioe suas modalidades de funcionamento foram esta-
em 1891. Inovação decisiva. pela qual o estado
belecidosantes que elas se tivessem desenvolvido. Daí as resistên-
nha pela primeira vez um instrumento perrnone ciasque provocam quando - bem no início do século XX. num
de investigação sociológica. voltado principalme: climapolítico favorável - tentarão modificar em seu próprio provei-
para a população trabalhadora. Esseínstrurnent to as 'regras do jogo' que acabavam de ser fixadas.
montado pelos sociógrafos Ieptovslonos e pelos
tísticos. Assim. tornamos a encontrá-Ios entre os e:
clalistas de que se cercam os governos da Tere
República no início do século XX. tendo como O o APOIO DA INICIATIVA PRIVADA
tivo conhecer a sociedade para melhor comand
Porseu lado. a burguesia não permanece Inativa.
Alguns.aliás. se situam nas fronteiras desses dois mun-
A UNIVERSIDADE DOS ANOS 1880 dosque se interpenetram bastante. Como Jules Sieg-
flled. grande notável protestante. deputado-prefeito
No plano institucional. são empreendidas reformas capitais: de Le Hovre, ministro do Comércio em 1892-1893.
tituição de núcleos universitáriosfortes: aumento dos poderes 8 que dá apoio a diversas iniciativas sociais ou peda-
meios concedidos às faculdades: criação de verdadeiros eu gógicas.Ele já fazia porte do grupo dos subscritores
ao redor de licenciaturas reorganizadas que começam a se
~a Escola Livre de Ciências Políticas. vinte anos an-
cializar: transformação decisiva do concurso de recrutamento
es. Eis que em 1894 ele repete a dose. dando
professores de segundo grau - a agregação -, que então a
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA

--
111- ENTRE A FRANÇA E A ALEMANHA
PARTE I
4. OS ESFORÇOS DE ORGANIZAÇÃO DA DISCIPUNA NA FRANÇA

~~:I~liiiii;~
I
apoio a Émile Cheysson, que procura fundar Um 'M
vanço da disciplina. Daí a fraca pertinência socioló-
:104: seu Social", espécie de instituto de pesquisas apllc,
tJ~::\i:::~das alca dos diversos órgãos e sociedades que fundou,
e de conselho para a classe patronal, qu
9ue supunham que a sociologia gozasse de um es-
serviria de contrapeso à Secretaria do Trabalho. Grl
~aço reconhecido, já consolidado, o que não era o
ças à generosidade de um Industrial, o conde
Chambrun, é adquirida uma mansão em Parison casa.
Até seu internacionalismo voltou-se por fim contra
se instala o museu. Este - cujo diretor é Robert Pln
ele, numa época em que se constituíam equipes na-
um jurista formado na escola metódica de Le Pia
cionais de pesquisa com perspectivas teóricas mais
é organizado por seções que correspondem aos dlfl
coerentes do que as suas e que achavam seu pri-
rentes domínios de intervenção do instituto. Um
meiroponto de apoio institucional não nos sclôes, e
delas se consagra às "missõese enquetes", sob a ri
simna universidade [Besnard et 01., 1981). E assim,
ponsabilidade de Émile Boutmy, o fundador
pelo menos, que podemos interpretar retrospectiva-
"Sciences Po". Vários estudos são confiados a autol
mente uma história que não fora escrita de ante-
de monografias, também de origem leplaysinna,
mão.
mo Paul de Rousierse Paul Bureau, que vão à G
Bretanha observar o trade-unionismo. É notável e,
orientação da pesquisa no sentido do sindicall
num momento em que a classe patronal não brl
por sua abertura social. Em todo caso, havia ali o ATIVISMO ORGANIZADOR DE WORMS

esboço de uma ciência social aplicada que Inf,


Wormstenta provocar uma demanda científica para a sociolo-
mente não foi adiante: Pinot e seus principais e gia,que. apesar de sua novidade, continua sendo concebida com
boradores foram despedidos por seus patrões baseno modelo erudito. O êxito do empreendimento depende em
1897. primeirolugar dessa prudência. cujos primeiros resultados são mais
Nessa data, a "ciência social" dá lugar à "soei do que honrosose revelam. de sua parte. dons organizacionais ex-
gia". Essa mudança de vocabulário se deve. cepcionais.Senão vejamos: 1) Em 1893. fundação da Revue inter-
parte, aos esforços de um filósofo tido então e nallona/e de soci%gie. que seu promotor quer abrir a todos os
um ardente partidário do organicismo, René Wo pontosde vista. na esperança de que se tornará a tribuna da dis-
~llna. 2) Em 1894, criação de um Instituto Internacional de Socio-
Haveria multo que pensar sobre a trajetória d
logia,com um número fixo de membros (quarenta. no Início, dos
normalien brilhante, de rico capital social. que qua/sapenas sete franceses). reunindo cientistas de renome interna-
poucos anos acumula os títulos acadêmiCOS CIonal.O Institutocompromete-se a realizar congressos anuais a fim
uma facilidade desconcertante, antes de se lonç ele estimUlaros esforços dos participantes e de encorajar os conta-
organização da sociologia. Uma disciplina que' '. pessoais;tem êxito nisto. 3) No mesmo ano, lançamento de
gostaria de ver se desenvolver à margem da u COleçãode livros - a Biblioteca Sociológica Internacional _ pe-
sidade nova, atrelada demais, segundo ele &ditarGiard & Briere.coleção na qual Worms em pessoa publica
poder estabelecido, e na qual acreditava tanto lnismoe Sociedade (1896), espécie de canto do cisne das teo-
lhe consagrou todo seu talento, e isso em prejulzl OIganicistasna França. entre cinqüenta outros títulos publicados
qUinzeanos, apesar da estreiteza do mercado. E nessa cole-
sua própria carreira.
O erro de Worms consistiu, sem dúvida, em ~a PUblicadas obras de sociólogos russos.alemães. italianos.
" anos. assim como franceses. 4) No outono de 1895. registro
garantir o concurso de cientistas e universitáriOS
~tatutos da Sociedade de Sociologia de Paris.que. no ano se-
sagrados - e portanto provindos dos mais vorl I e. realiza reuniões mensais. cada uma delas centrada num
horizontes - sem levar em conta o real gro I, de natureza exclusivamente científica. Com Worms garantin-
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 111- ENTRE A FRANÇA E A ALEMANHA
OS ESFORÇOS
PARTE I
.;- DE ORGANIZAÇÃO DA DISCIPUNA NA FRANÇA

I I
~'
do o secretariado, Gabriel Tarde aceita assumira presidência e C/eÍ' inadas por Spencer, Tarde, Fouillée, Durkheim... Isto mostra o ecu-
pois animar os debates, que são acompanhados por um pÚbllCQ a~nismo de um editor que, para se implantar bem no meio univer-
um tanto eclético e mundano. . ~óriO,se recusa a privilegiar os trabalhos de uma escola de pensa- ~::;::::::::::::::

Na França e no exterior, personalidades de renome vêm tro SI ento em detrimento de outra. Sem dúvida, L'Année sociologique
sua contribuição a um empreendimento cujo sucesso parece g~ :ró sustentada por Alcan, mas lado a lado com a 'Biblioteca Ge-
rantido. Nenhuma oulra revista além da de Worms pede gabor.••. s I das Ciências Sociais', produto de uma oficina diferente - o
de gozar do apoio do filósofo flibot (um dos fundadores da pslcQ. ~~colade Altos Estudos Sociais - de que logo voltaremos o trotar.
logia científica na França), do demógrafo Bertillon, dos sOCiólogój outros editores, como Mame, o editor de Le Play, ou Giard &
Simmel e Tónnies, dos antropólogos Tylor e Westermarck, e o Ilstà Briare,que sustentam Worms, também encorajam os ciências so-
poderia facilmente estender-se. Mas a própria enumeração desse. ciCl~,embora - de um ponto de visto financeiro - os resultados nem
nomes revela os limites da tentativa. Poucos estão realmente elllpaí sempreestejam à altura de suas expectativas. O único que parece
nhados nela. E como poderiam estar, se sua contribuição à obrq adotar na matéria um comportamento verdadeiramente capitalista
comum parece reduzida, muitos deles nõo se dizem sociólogoS41 é Flammarion,com sua 'Biblioteca de Filosofia Científico', lançado
aqueles que o são confessam ter concepções divergentes sobreq em 1902. Gustave Le Bon foi escolhido para dirigir a coleção. Le
nova ciência? son.polígrafo prolífico sem ser fecundo, tornara-se conhecido do
grande público com sua Psicologia das Multidões (1895), obra em
:::~::::}:::::::::::;:;;;:;:;:;:;:;:::;:;:;:;::~:::;:::::::::;:::::::::::::::::::::::::::::j::::::::::::;~::::::::}:::::::::::;:::::::;:::;:;:::::::::::::::::::::::::;:::::::::::::::::::::::::::::::::::;:::::;::::::::::::~::~-
que a multidão era vista como uma 'massa', mas urna massa que
ele personalizavaàs custos dos indivíduos que a compõem. Com a
novacoleção, sua ambição é pôr no mercado uma ciência vulga-
AS HESITAÇÕES DO MERCADO INTELECTUAL
rizada,acessível ao maior número de pessoas, mesmo se o maior
parte dos autores publicados - sejam eles físicos ou psicólogos - se-
Se os trabalhos dos cientistos são objeto de uma le constituída de autoridades em seus respectivos campos [Fabiani.
difusão que ultrapassa o meio dos especialistas a
1988J.
que primeiramente se dirigiam, o mundo universitórlQ. Le Bon vangloriava-se de ser 'o homem que fez Flammarion ga-
tenta sair de seus próprios muros, dialogar com a 'SOj nharmais dinheiro'. Será verdade? Sem podermos responder a essa
ciedade civil" de que depende, a longo prazo, seu perguntade maneira definitivo, observaremos que ele ajudou o in-
sucesso. As ciências sociais não fogem à regra, que troduzirna editaria científica um estilo novo, baseado na atualidade
é geral. Constatamos a existência de um mecenatft dostemas abordados e numa rotação rápida dos títulos oferecidos
privado que se exerce através de múltiplos concls, aosleitores.

~<:::::::::::::::::::::.:.:.:.:.:.:.:.:.:::.:.:.:.:.:::'.:.:.:.::::.::.:::::::.:.:::.::::.:::.:::':~':::::::::':..:.:.:.:::::::.:.:::.::::.:.:
:::':;:::::"::::::.:::::.:.:.:.:.:.:.:.:.:.:.:::.:
:.:.:::':::::::::::::::::'::::

Tirando partido da lei que deu personalidade civil


OS PROBLEMAS DE EDiÇÃO DA SOCIOLOGIA
àsfaculdades, multiplicam-se as doações aos estabe-
Poucos pesquisadores tinham uma idéia precisa - além dos dUf: lecimentospúblicos. É assim que o conde de Cham-
kheimianos, e mesmo assim... - do que devia ser essa ciência d brun,não contente em presidir os destinos do Museu
social que muitos reivindicavam. Tampouco o público, mesmo Social,e sempre apaixonado pelo desenvolvimento
suo fração esclarecido. Os próprios editares se mostravam cücu da "economia social" - outro nome de empréstimo
pectos diante de uma 'modo' cujo sentido, no fundo, não entl da sociologia - decide subvencionar cátedras com
diam bem. Vários deles, no final do século, tentaram porá eSSe nome: na Escola Livre de Ciências Políticas (pa-
explorar um filão que parecia promissor. ra Cheysson),na Faculdade de Direito de Paris (para
Félix Alcan, continuador da editora Germer Baillere, especlali
o eConomista Charles Gide) e na Faculdade de Le-
do em edições científicos, mantém a maior porte das coleç~'
lega das por seu predecessor, principalmente o prestigioso 'BibliO'
~as(para Espinas,ao final de uma batalha bastante
ca de Filosofia Contemporânea'. No catálogo encontramos Obl rdua). Nenhuma sensibilidade ideológica, nenhum
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 111- ENTRE A FRANÇA E A ALEMANHA
PARTE I ESFORÇOS DE ORGAN/ZAÇÃO DA D/se/PUNA NA FRANÇA

I clã disciplinar era, portanto, sacrificado, corno se


estivesse claro, para o doador, que a economl,
cial devesse vincular-se principalmente à ciênclQ
tica, ao direito ou às ciências humanas.
~
\,ole
W

I'IOto
skVe Eugene, d e Ro b erti"
Bruxelas - são as suas personalidades mais
te ~~eis e ambos são figuras muito conhecidas da
..
1010giapallslense, em razao
ld en-
V - e e propllo reSl

- de seu pape I nas or-


I
Outro sinal de que as posições de uns e de o SOC 'zoções dirigidas por Worms.
nas ciências sociais continuam flutuantes por VoltQ gonl De fato, não ha" na epoea uma corren t e social
1900: multiplicam-se as instituições de ensino sup política que não disponha de um Instrumento
suprimindo significativamente as barreiras levQntQ O~ucotiVO.Na extrema-esquerda, onde por muito
entre o público e o privado. Um Colégio livre e rnpo houve reticências contra uma ciência consl-
Ciências Sociais é fundado em Paris, em 1895, : rada burguesa, a "Escola Socialista" ministra um
Jeanne Weill, conhecida na época pelo pseudÔ ~sinoque não fica longe, em sua forma, do dos Ii-
de Dick Mov, que tem boas relações ao me ~eroisagrupados na "Sociedade da Ciência Social
tempo no meio patronal e na nova Sorbonne. para o Desenvolvimento da Iniciativa Privada". E Pa-
se o Colégio coloca-se sob o patrocínio do pOs! risnão é a única cidade atingida pelo fenômeno:
mo, já que é dirigido pelo Dr. Delbet, deputQd I:Ule faz o mesmo, à sombra de sua universidade ca-
executor testamentário de Auguste Comte, seu p~ tólica, e sobretudo l.von, onde foi fundada, com
grama permanece eclético, a exemplo das perSOI base no modelo do Museu Social. uma Interessante
lidades que nele ensinam e que provêm tanto secretariaSocial de Informação e de Estudos.Assim,
economia social leplavsiana quanto do meio "wo não é de espantar ouvir um conceituado sociólogo
siano" ou da Sorbonne. americano como Lester Ward declarar em 1900 que
Depois do caso Drevtus. essa unanimidade de 'é na França, berço da disciplina, que a sociologia
chada se racha perigosamente. Em 1900, '16'" exerceua influência mais forte sobre as classes pen-
membros do Colégio (os partidários de Drevtus),le' santes"l
dos por Dick MaV, decidem separar-se, em nome A oferta sociológica permanece, porém, sendo he-
uma concepção mais exigente da ciência, rnen teróclitae nenhuma força centrípeta se exerce sobre
tagarela e mais próxima dos fatos. Instalando-se um meio que continua mais dividido do que nunca.
rua da Sorbonne, criam a Escola de Altos Estudos Maspor trás dessa desordem, reveladora sem dúvida
ciais, confiantes que estão no apoio de universit6r1, de uma perturbação mais profunda que toma conta
Influentes como Boutroux e Croiset. dosIntelectuais, afirma-se uma linha divisória que fa-
O ensino ministrado no Colégio e depois na Esc rá sentirseus efeitos no século seguinte: por um lado,
Ia, dá não raro lugar à publicação de livros pe aquelesque participam, sob pretexto de reforma so-
editora Alcan, numa coleção já mencionada, dirigi cial. da elaboração dos valores da sociedade esta-
pela infatigável Dick Mov. Dentre os autores, Tar, belecida (ou que aceitam ser, ante litteram, seus
aparece lado a lado com Boutroux e o durkhelrnl Intelectuais orgânicos) e, por outro lado, aqueles -
no Célestin Bouglé, além de Pierre du Marousse, não raro mais jovens - que lutam, em nome "de
que é leplavsiano. uma ciência social distinta e tão objetiva quanto as
Nos mesmos locais da rua da Sorbonne, e com outrasciências" [Dovv, 1931]. por sua autonomia de
bênção de seus animadores, uma "Escola Russa Pensamentoe de organização tanto dentro da uni-
Altos Estudos Sociais" é criada em 1901, e dispan versidade quanto da sociedade burguesa. Muito
um ensino deliberadamente internacional. embora representativosdesta última corrente são os durkhei-
dirija prioritariamente a russosemigrados. Maxima ITllanos.
--- --
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 111- ENTRE A FRANÇA E A ALEMANHA
PARTE / OS ESFORÇOS DE ORGAN/ZAÇAO DA o/se/PUNA NA FRANÇA
4.

I
:::::::~;::::::::;
A AVENTURA DE L'ANNÉE SOC/OLOG/QUE

Não é exagero dizer que, sem L'Année SOC/%g/.


que, o grupo durkhelmiano jamais se teria constituído
InUa heterogênea. Ela se abre, então, para gente
~o Interior que não estudou na Escola Normal Supe-
I r
rO
e não é necessariamente filósofa. Na realidade,
devemoSaguardar os anos 1905-1910para que a In-
.
II
Mas então o que é L'Année? Uma revista fundad~ fluência de Durkheim, já professor em Paris, se torne
em 1896 por Durkheim, ajudado por um jovem filóso. preponderante, tanto no plano do funcionamento da
fo, Célestin Bouglé, que obtêm o auxílio do editor revistaquanto no do recrutamento.
Félix Alcan. contudo, não devemos esquecer que os subgru-
Num momento em que a sociologia porece vagar pos que se formam no interior da equipe correspon-
numa maré de sucesso, os objetivos dos fundadores dem a duas exigências. Uma é explícita: trata-se de
são de três espécies: 1) desentocar os charlatães, as- romper com as "generalidades" sobre o social e por-
sentando a disciplina em bases científicas; 2) reunir tanto organizar a sociologia nascente ao redor de
ao redor do projeto "trabalhadores" que DUlkhelm campos particulares, que constituirão outras tantas
gosta de contrapor aos amadores, numerosos nas categorias de classificação da matéria sociológica.
outras oficinas; 3) mais prosaicamente, seguir o exem. Assim,é confiada a Bouglé a sociologia geral; Mauss
pio de outros universitários (sobretudo na geografia e e Hubert ganham a sociologia religiosa; Simiand e os
na psicologia) que são objetivamente concorrentes Irmãos Bourgin, a sociologia econômica; Halbwachs,
na corrida pelo reconhecimento acadêmico. a morfologia social (a partir de 1905); Durkheim, ten-
Se Durkheim assume o comando desse combate, do Fauconnet como assistente, reserva-se a sociolo-
é porque dispõe de um crédito importante conferido, gia moral e jurídica.
ae mesmo tempo, por seus títulos, sua condição de Há poucos contatos entre as diversas seções e é
veterano e sua obra. Em suma, já é reconhecido co- nesse nível que encontramos uma outra exigência
mo um "mestre" e aqueles que o seguem se situam que, por sua vez, permanece implícita: evitar que se
perante ele, queiram ou não, como "discípulos".Aliás. constituam alianças entre grupos, que poriam em
ele não acaba de publicar As Regras do Método questão o espírito geral do projeto e talvez a autori-
Sociológico? dade de Durkheim sobre L'Année [Besnard, 1979].
Apesar da rigidez de suas posições, consegue fa- Apesar dessas nuances e das tensões reais (entre
zer com que o sigam homens que não compartilham Mauss e Bouglé, por exemplo, acerca da política
todas as suas convicções. Para sermos mais precisos, editorial), a equipe não passou por nenhuma crise
deveríamos distinguir os diferentes estratos a partir dos grave, porque todos haviam seguido uma mesma
quais se constituiu e depois se renovou a equipe de trajetória universitária e ideológica. Formados nos últi-
L'Année sociologique. mos anos do século, em plena tormenta do caso
Inicialmente, uma dúzia de universitários,a maioria Dreyfus, a maioria deles aderira à Liga dos Direitos
dos quais composta de agregados de filosofia e de do Homem e se havia aproximado do movimento
antigos normaliens, mas que, em sua maior parte, socialistasob a dupla influência de Lucien Herr, o fa-
não são "alunos" de Durkheim. De resto, este último moso bibliotecário da Escola Normal Superior, e de
não controla realmente o recrutamento dos colabO- Jean Jcurés, O paradoxo é que, dentre essesjovens,
radores da revista, pelo menos no início. Bouglé, que haviam recebido quase todos os sacramentos
Mauss, seu sobrinho, e Simiand o ajudam a fazer as universitários(fora Durkheim, dos seus colaboradores
primeiras escolhas. Ainda na virada do século, a só Bouglé, Lapie e Halbwachs tinham um doutorado
equipe, composta de cerca de vinte membros, con- de letras), a maioria teve de permanecer à margem
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
PARTE I -LU
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da universidade, por nóo conseguirem encontrar
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emprego correspondente a essa especialidade 1"10"1 al
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que tentavam Impor: a saber, a do pesquisador e
peclalizado, participante quase anônimo de ur,.:. >-~
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grande obra coletiva que a universidade ainda 1"10 Q •.... «",
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maioria dos durkheimianos fica esclarecida à luz dea; ::J~
sa submissão a um desígnio comum. Mas ela noo
poderia ocultar o formidável êxito da equipe, qu.
Impõe como legítimo o olhar lançado pelo soclólogd
sobre o conjunto dos fenômenos humanos [Karady.
1974]. Quanto ao imperialismo de que é acusada;
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ele corresponde, por assim dizer, a esse notóllel
avanço de toda uma equipe, que seus adversórloa c(a Il /~~
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franceses acabaram por identificar com a própria so-
ciologia.
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UMA INSTlTUCIONALlZAÇÁO DESORDENADA 0°
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Na aurora do século XX, todas as condições para (!)<:
que a sociologia se desenvolva parecem reunidas. ~<:
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1. A disciplina revela-se capaz de produzir obras I ::JO: o~
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reconhecidas. Só no ano de 1895, por exemplo. e


para nos limitarmos à França. Tarde publicou A Lógi-
o I
ca Social; le Bon, A Psicologia das Multidões; ízou- I
B
let, A Cidade Moderna; e Durkheim. As Regras do
Método Sociológico. E na mesma data. na Alema-
nha. Tónnies e Simmel já produziram obras importan-
tes. Cada um desses livros, num gênero e num estilo
bem distintivos. constitui uma baliza que indica um
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dos bastiões que a sociologia pretende conservar em ;;:::~ O:::;, •...


seu poder. Numa palavra, a uma demanda intelec-
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tual forte embora difusa, a sociologia nascente res-
ponde com obras significativas, mas de tom e de
orientação totalmente diferentes.
2. Ao mesmo tempo. ganha os meios de difundir
seus próprios trabalhos. Os teptovstonos, sem dúvida.
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HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 111- ENTRE A FRANÇA E A ALEMANHA
PARTE I

s-= OS ESFORÇOS DE ORGANIZAÇÃO DA DISCIPUNA NA FRANÇA

I
tinham Indicado o caminho a seguir nos anos 18
Mas as condições de difusão melhoraram deSde
tão. Periódicos como a Revue philosOPhique e
Théodule Ribot ou a recém-Iançada Revue de m<11
HISTÓRICO DO ENSINO DA SOCIOLOGIA
NAS FACULDADES DE LETRASNA FRANÇA (1887-1918)
I
~'::.'%.~::~~~~:~:~;:~::~~~::::~~:::~~~~~~::::~~:~::~:::::::::;::~::::::::::::~~~:~~~~:~::::::::::::::::::::::~::::::::::::~::~~~~~~::::::

taphysique et ,de morale, que acabam de fund


Xavler Léon e Elie Halévy em 1893, dão espaço PoQ, Em Bordeaux
a atualidade sociológica, apesar do caráter consld 'l cursO de pedagogia e de ciência social:
rado Incerto de seus resultados. Prova disso são . Durkheim.coordenador de cursos (1887-1896),
severas críticas que se seguiram à publicação do ;:
se de Durkheim (Da Divisão do Trabalho Social) Pdr o eursc é transformado em cadeira de ciência social:
parte de filósofos como Halévy, que, porém, a pr/ : Durkheim. professor (1896-1902),

ri não lhe eram hostis. Era, portanto, inevitável queq- RIChard• suplente (1902-1906).
Richard. professor (a partir de 1906),
sociologia se dotasse de instrumentos específicos.
que será feito com a Revue infemationale de Wo~ cadeira de história da filosofia:
logo seguida de L'Année sociologique de Durkhelrri. lapie, professor (1906-1911).
que abrem uma era nova, simplesmente porqu,
põem a sociologia no mesmo pé que as disclpllnaa Em Montpllllier
vizinhas, que - antes dela - dispunham todas de ór, Curso de filosofia sociot:
gãos desse tipo. O que a Alemanha só consegulr~ Bouglé, coordenador de cursos (1898-1900),
fazer dez anos mais tarde.
3. Se a Sociedade de Sociologia de Parisé a ú,* Em teuteuse
ca sociedade científica que nasce na França, oJ Curso transferido a Toulouse em 1900, depois transformado em cá-
sociólogos alemães organizam-se melhor e começa•.•• tadra:
a fazer contatos a nível internacional. Graças. Bouglé, professor (1901-1907).
Worms. evidentemente, mas também aos congressda Fauconnet, suplente (1907-1920),
que se multiplicam, às vezes no rastro de manifesta-
ções de Interesse geral (como as feiras ou as expoâ- Em Paris
ções). Conseqüência dessa internacionalização do, Cursode história da economia social:
contatos: os trabalhos mais notáveis são conhecldop Espinas, coordenador de cursos (1894-1904).
além das fronteiras e são traduzidos nos meses se!- O curso é transformado em cátedra:
guintes à sua publicação na língua original. Issl Espinas. professor (1904-1907).
aconteceu com Tarde e Simmel. evidentemente. m~ Bouglé. suplente (1907-1915).
também com outros não tão famosos. Cátedra de ciência da educaçõo:
4. Inicia-se uma tímida profissionalização, consecU- Marlon. professor (1887-1896).
tiva ao início de organização da carreira de "pesq~ Buisson, protessor (1896-1902),
sodor". São criadas algumas cátedras nas faculdadEi!' Durkheim, suplente (1902-1906).
(de letras na França. de direito na Alemanha) e nq Durkheim, professor (1906-1913).

Escola Prática de Altos Estudos (V Seção), onde sO' Ampliação da abrangência do cadeira para a sacio/agia:
ensinados elementos de sociologia. Mas o soclólo Durkheim. professor (1913-1917),
ainda não poderia impor-se enquanto tal. PreclSad
primeiro. antes de ser reconhecido. ser aprovadO c'
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 111- ENTRE A FRANÇA E A ALEMANHA
PARTE I OS ESFORÇOS DE ORGANIZAÇÃO DA DISCIPUNA NA FRANÇA
.s-=
I
mo filósofo e, mais raramente, como historiador Ou
rlsta. Uma vez nomeado, é encarregado de u
matéria: pedagogia, história das religiões, filOSOfia
rol, economia social ou nacional, devendo o ensll
~

da sociologia introduzir-se, penosamente, nos Intersu


BIBUOGRAFIA (1890-1918)
I
elos de um sistema universitário que a ignora. ' Heinrich RICKERT. (1863-1936): Os Umites do Formação de Conceitos

Nas vésperas da guerra de 1914, ainda que ai, s Ciências do Natureza (1896).
~a org SIMMEL (1858-1918): Os Problemas do Filosofia do História
guns sociólogos sejam encarregados de cursos e .
(1:92) .• Filosofia do Dinheiro (1900). - Sociologia (1908). - Sociologia
Inúmeras Instituições, trata-se na maior parte dos c~
Epistemologia (1918).
sos de situações precárias. Asseguradas, a disclpUn ~erner SOMBART. (1863-1941): O Capitalismo Moderno (1902-1927) .•
dispõe de apenas quatro cátedras nas faculdadel O Burguês (1913).
de letras e de nenhuma nas faculdades de direito Ferdinand TÓNNIES, (1855-193~): Comunidade e Sociedade (1887).
Neste estágio da exposição, convém não esqu Max WEBER. (1864-1920): A Etica Protestante e o Espírito do Capi-
cer que o "sucesso" da sociologia continua send tdismo (1905) .• O Cientista e o Político (1919). - O Judaísmo Antigo
em parte, artificial. De fato, o socilógico contlnu,~ (1921). póstumo. - Economia e Sociedade (1922). - Ensaios sobre o

sendo completamente confundido com o social, paa. Teoria do Ciência (1922). - Sociologia do Direito (1922). - História
Econômico (1923).
sando toda discussão sobre os fatos sociais por um
Wilnelm WINDELBAND, (1848-1915): História e Ciência do Natureza
discurso metódico sobre esses mesmos fatos. Quant"
(1904).
àqueles que não fazem essa confusão, tenderla"\ Wllhelm WUNDT. (1832-1920): Elementos de Psicologia Fisiológico
antes a pensar que não existem leis sociológicas an- (1874).• Elementos de Psicologia Social (1905-1920).
teriores às leis psicológicas. Para a imensa maioria Celestin BOUGLÉ. (1870-1940): As Idéias Igualitárias (1899).· Que é
dos intelectuais da época - não o esqueçamos - to; a Sociologia? (1907). - O Solidarismo (1907). - Ensaios sobre o Regi-
do ato humano deve ser primeiro encarado sob se~ me de Castas (1908).
aspecto Individual. Como o social está inscrito nQ; Émile DURKHEIM, (1868-191 7): Da Divisão do Trabalho Social (1893), -
mais profundo do homem, seria absurdo conslderé-la As Regras do MétOdo Sociológico (1895). - O Suicídio (1897). - As
como um fato exterior ao próprio homem. Issomostra FormasElementares da Vida Religiosa (1912). - Educação e Sociolo-
gia (1922), póstumo. - A Educação Moral (1925). - O Socialismo
a resistência com que toparam Durkheim e sua esco-
(1928). - A Evolução Pedagógica na França (1938), - Lições de
la em seu esforço de especificação. E o relatlv~ Sociologia (1950).
êxito de homens como Tarde, Simmel ou Weber cuJo Mauriee HALBWACHS 91877-1945): A Classe Operária e os Níveis de
propósito foi, afinal. melhor entendido pelo público Vida (1912).
culto. Gustave LE BON. (1841-1931): O Homem e a Sociedade (1881). _
As Leis Psicológicas e a Evolução dos Povos (1894). - Psicologia
CIosmultidões (1895).
Mareei MAUSS. (1872-1950) (com Hubert. H,): Coletânea de História
ClasReligiões (1909),
Gabriel TARDE, (1843-1904): As Leis da Imitação (1890). - As Trans-
formações do Direito (1893). - A Lógica Social 1895). - Estudos de
PsiCOlogia Social (1898), - A Opinião e a Muitidão (1901).
René WORMS, (1869-1926): Organismo e Sociedade (1896). - Filoso-
fia das Ciências Sociais (1907),
IV - A SOCIOLOGIA
COMO ARTE SOCIAL
-
S e as sociologias francesa e alemã - com seus
mestres reconhecidos e suas temáticas bem
distintas- constituem como que o coração da discI-
plina, existem outras tradições que não adotam.
necessariamente os mesmos modelos de referência
ou de análise. Isto vale para a Europa, onde se or-
ganizam verdadeiras escolas nacionais, menos volta-
das para aprofundamentos teóricos - embora haja
excessões- do que tentadas pelo aperfeiçoamento
de métodos de investigação capazes de levar a
aplicações sociais; vale ainda mais para os Estados
Unidos,onde se encoraja o desenvolvimento de uma
ciência social que não será um mero apêndice da
sociologia européia.

1. O SURGIMENTO
DE OUTROS PÓLOS NACIONAIS
DE PESQUISA NA EUROPA

L Imitemo-nos a alguns exemplos reveladores das


virtualidades oferecidas - e dos caminhos to-
rnados- pela sociologia em seus primórdios: os das
eSColas belga, russa, italiana, francesa - em sua ver-
são leplaysiana - e britânica.

NA BÉLGICA, UMA CIÊNCIA SOCIAL JÁ APLICADA

o impulso inicial fora dado por Quételet, um dos


Paisfundadores da análise matemática dos fatos so-
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA IV - A SOCIOLOGIA COMO ARTE SOCIAL
o oumos
PARTE I
;.- SURGIMENTO DE PÓLOS NACIONAIS DE PESQUISA NA EUROPA

I:n:::::::: --
:f:@\f ciais. Na geração seguinte, nenhuma figura notóv ais, artistas ou cientistas vindos dos quatro cantos
::126 se impõe, com exceção talvez de Guillaume dei ~a Europa, em razão de seu não-conformismo social
:::::::~::::::::::
Greef sindicalista de profissão e sociólogo de
, ,
e
Valor
u político. Fora esse o caso de Marx entre 1845 e 11~11~1
no final do seculo. ~848; foi também o caso de vários filósofos sociais
Muito cedo, de Greef se dedica à defesa d ussosque, algumas décadas mais tarde, encontrarão
classe trabalhadora, num país em que a revoluÇãa :efÚgionesse reino decididamente muito liberal.
Industrial não é apenas uma palavra. InsPirando_s~
em Proudhon, defende a idéia de mutualismo e re-
comenda a Instauração de relações sociais equilibra_ A RÚSSIA, ENTRE CIÊNCIA E REVOLUÇÃO
das entre as classes, através de sindicatos. Sua teoria
das classes não tem o caráter sistemático que aSSU- o pensamento social russo mostra-se marcado,
mirá com o marxismo. Para ele, as divisões de clas- maisdo que qualquer outro, pelas circunstâncias po-
ses, se são fundadas na propriedade dos meios de líticasque favoreceram seu nascimento. Num impériO
produção, só representam uma etapa na divisão so- dominado por uma burocracia pesada, pouco aber-
cial do trabalho. Embora o processo não esteja ter- ta às reformas, mas defensora de uma ideologia
minado, ele levará inevitavelmente a uma nova eslavófila e conservadora, parcelas importantes da
partilha entre grupos profissionais que permitirá supe- classedominante - que se recrutam entre os intelec-
rar o antagonismo entre capital e trabalho. Idéia que tuais - buscam um outro modelo de desenvolvi-
defende em 1886-1889e sistematiza em 1908. mento, tomando de empréstimo as Idéias liberais ou
Observe-se que de Greef não foi apenas um teó- socialistasque viam florescer no ocidente.
rico do movimento operário. Publicou várias mono- A intel/igentsia do país, portanto, não forma um
grafias que, com o recuo permitido pelo tempo, se grupo homogêneo. Há uma grande distância entre a
mostram tão importantes quanto suas contribuições fi- escola subjetivista de Lavrov e MikaHowsky, que se
losófico-políticas, cujo fôlego continua sendo bastante contentam em plagiar Tarde, e o grupo revolucioná-
limitado. rio,ele próprio dividido em "igrejinhas" (marxista com
A atenção aos problemas industriais é um traço Lenin,anarquista com Kropotkin). Todos, porém, acei-
capital da sociologia belga da época, sustentada e tam a idéia de um progresso que a ciência social
até subvencionada pelo patronato liberal. Prova des- ajudaria a fazer surgir. Uma ciência concebida por
sa "aliança secreta" é a criação de um Instituto de elescomo uma arma na luta travada pelas forças
Sociologia na Universidade Nova de Bruxelas em progressistas, aliadas à intelligentsia, por um lado, e a
19Ó1, por instigação de um industrial. Ernest soivcv, burocracia e as classes reacionárias, por outro. A
que conduz várias pesquisas no meio urbano, todas gravidade dessa luta certamente impediu a forma-
baseadas na observação e na pesquisa de campO, ção, na Rússia,de uma sociologia científica, despe-
O primeiro diretor do Instituto será Émile Waxweiler. lodo de bandeiras normativas ou ideológicas. Em
um organicista que mais tarde adotará um ponto de outraspalavras, a fraqueza da sociologia russa reme-
vista behaviorista quando tratar de problemas perten- te em primeiro lugar a razões políticas; em segundo,
centes mais ao âmbito da psicologia intermental do POdeser explica da à luz de motivos mais pessoais,
que da sociologia. qUe levam certos intelectuais a romper com seu
A Bélgica também merece que prestemos aten' meiode origem, e às vezes com a pátria, ao busca-
ção a ela porque foi ao longo do século XIX um rern fundar um percurso sociológico pessoal. Um
lugar de encontros e de intercâmbios entre inteleC exemplo disso nos é fornecido por Maxime Kova-
IV - A SOCIOLOGIA COMO ARTE SOCIAL
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
PARTE I
o SURGIMENTO DE oumos PÓLOS NACIONAIS DE PESQUISA NA EUROPA
!:---

I
lewsky no final do século XIX.
A vida cosmopolita desse jovem jurista não POd
ser dissociada de sua vocação de sociólogo. Dep -
de uma longa viagem à Europa ocidental. apaixone:
• '10 Mas numa universidade em que reinam o neo-
eXItlsmo e o idealismo, a sociologia é identificada
kam
O
n
o positivismo com t eano, ao qual so
C squisadores isolados como Morselil.
. se referem

peNa esfera acadêmica, alguns elementos de socio-


I
se, em seu retorno a Moscou, pela antropologia d
logia são Introduzidos por criminólogos cujo mestre é
direito, trabalhando especialmente com o direito a~~
a rn médico, Cesare Lombroso. Para ele, todo homem
no primitivo. Considerado liberal demais por seus pr •
~ rigorOSamente condicionado por sua morfologia
fessores da universidade, parte voluntariamente pa~
a pessoal e pelas particularidades da sua existência.
o exülo, a fim de prosseguir sua atividade científica
corno o comportamento de todo indivíduo é deter-
Instalado na França - na Côte d' Azur =, torna-se ~
minado, ele se tornaria previsível, portanto.
membro eminente das instituições criadas por Worma.
Tornando a criminalidade como campo de expe-
Publica então suas obras mais marcantes, onde mOI"
riência, ele desenvolveu, com seu aluno Ferri, alguns
tra um gosto pronunciado por uma forma de evolU-
Instrumentosantropométricos que deviam permitir de-
clonismo matizado de organicismo.
Nas associações de Worms, reencontra compatrio- tectar os "estigmas" do crime e. portanto. afastar os
tas, como Eugene de Roberty e principalmente Jac. Indivíduosperigosos antes mesmo que os "criminosos
ques Novlcow, que se engajara num ataque cora- natos"pudessem passar à ação. A imaginação cien-
joso contra a guerra e as teses sócio-darwinistas de tífica toca aqui fantasmas muito profundos, típicos da
Gumplowicz. No que lhe diz respeito, de volta à Rús- burguesia de qualquer época.
sia em 1905, Kovalewsky se torna professor em São Daremos um lugar à parte, porém, à obra de seu
rival mais jovem, Scipio Sighele, de registro mais am-
Petersburgo, onde se esforça por estabelecer um en-
sino racional de ciência sociai. Pouco depois, entra plo, que se empenhou em compreender a criminali-
dade dos grupos. Ao mesmo tempo que Tarde, e
na política, dando assim prai"icamente fim à sua car-
muitos anos antes de Le Bon, ele mostrava que as
reira de pesquisador [Barnes et at., 1948).
seitas,assim como as multidões, caíam na delinqüên-
cia quando se deixavam subjugar por líderes irracio-
nais ou patológicos. A psicologia das multidões
NA ITÁLIA. DA CRIMINOlOGIA
encontrava assim um primeiro corpo de hipóteses
À SOCIOLOGIA PARETlANA
que, por controvertidas que hoje nos pareçam, va-
liam mais do que as divagações a que as "massas"
No século XViiI. o grande filósofo Vico - que con-
tinua muito mal conhecido na França - já se mos- deram lugar mais tarde, especialmente na França.
trara atento à diversidade dos povos e de seuS Vilfredo Pareto nasce em Paris e será classificado,
costumes. Estesúltimos não seriam fruto de suas refle- na falta de melhor, entre os sociólogos italianos. Este
xões, e ainda menos de sua razão, e sim o produto filho de um aristocrata genovês e de uma francesa
de uma longa sedimentação histórica, cujas "leis"se- de condição modesta fez estudos de engenharia
ria possível descobrir. Estamos aqui nos antípodas de que o levaram - como Spencer - a exercer seus ta-
Descartes ou de Comte. Em compensação, as idéias lentos nas estradas de ferro, mas na Itália, onde sua
famOiase instalara durante sua infância. Tentado um
de Vico anunciam o debate alemão, assim como
momento pela política, descobre - já com mais de
parecem ter inspirado americanos como Sumner.
40 anos - a economia política, ao ler as obras de
Na Itália, a filosofia do direito é o único ramo dOS
Walrase de Cournot. Publica então vários artigos so-
ciências sociais que goza, no século XIX, de certo
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA IV - A SOCIOLOGIA COMO ARTE SOCIAL
PARTE I IMENTO DE oumos PÓLOS NACIONAIS DE PESQUISA NA EUROPA
o SUR
!;.;--- G

~Ijilililijii~~bre
124 mia
:::~~::::::::~~
com
teoria econômica;
matemática.
quem.
- é claramente
na
nesse meio
perceptível.
e especialmente
qual a influência
tempo. travou
Em 1893. passa
sObre e
de Wa~o
conheclrn
a r:~
a
..K)VOve
lmente sob a influência de soret virulento antidemocrata de

".- erdo). Pareto pretende demonstrar que os fenomenos sociais
u
,sa ecem a ciclos. que tanto o poder como as riquezas são de-
ob8~rnentedistribuídos.em proveito de elites que são obrigadas a
sJgU~rer à força ou à astúcia para defenderem uma dominação
~1
em lausanne para ocupar a ca't edra de econo •• " co
re re disputada. Sob esse especto. trazia uma contribuição origi-
política precedentemente ocupada por seu rnent
se(1'1~ teoria de classe dominante. tema predileto da politologia
Segue-se um período de cerca de dez anos rnu~ nol a
noscente.Ilustrada antes dele por Gaetano Mosca (1884) e Robert
fecundos. durante os quais publica os principais el
Michels (1911).
mentos de sua obra econômica e se abre à soclOI
$"$"":'~~:::::::::::::::::::~::::~:::;::::::::::::::~:::::::::;:;:;:;:::;:::;:;:;:;:;:;:;:;:::;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;::::~::::::::::;::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::;:::::;:;~::~:;:::::::::::::::::::::::::::::::::::::~'
gia. que nele aparece como uma vocação tardia
No fim da vida. Pareto. o antigo liberal. aderiu ao
fascismo mussoliniano. E sobreveio o descrédito ci. NA FRANÇA, TRANSMiSSÃO
uma ambição insólita. que pretendia construir urna E PARTILHA DA HERANÇA LEPLA YSIANA
sociologia científica baseada na observação dos ta
tos. mas acabou caindo no dogmatismo e na ab. Não faltam os filantropos. higienistas e outros esta-
tração. a exemplo de Comte e de Spencer. contra tlstlcos sociais que tentam unir esforços para melhor
os quais. porém. Pareto não deixou de invectlva, promover a ciência social com que sonham. Segun-
[Vala de. 1990]. Mas que se entendia exatamente P<i" do eles. essa ciência deveria unir a engenharia social
observação dos fatos na virada do sé culo? e a filosofia política. contribuindo assim para a edifi-
cação de uma sociedade regenerada. já que não
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propunham uma nova. O sucesso de um tal projeto
supunha. porém. a existência de um quadro teórico
A FíSICA SOCIAL PARETlANA
de referência suficientemente forte para ordenar as
Economista antes de ser sociólogo. Pareto não concebe ouflq ações empreendidas e até esclarecer o futuro. Ora.
modelo para as ciências sociais além das ciências exatas. que os contemporâneos não dispunham de um quadro
considera essencialmente abstratas e dedutivas. Mas se a econo- desse tipo. Ou antes. o único que estava a seu al-
mia se aproxima desse modelo. na medida em que se interessa cance - o de Spencer - não servia muito. menos por
pelos condutas humanas no que elas têm de 'lógico'. de coeren: causa de seu ostensivo evolucionismo do que por
te e de previsível.existem outras ações que não obedecem a esse seu desprezo por todo reformismo social. Assim. eles
critério. sem que possamos dizer porém que sejam absurdos ou 'lló- se voltaram para le Play. que parecia oferecer-Ihes
gicas". essa teoria sociológica da reforma social que tanto
A sociologia seria. portanto. essa "ciência" que se preocupa
Ihes faltava [Kalaora & Savoye. 1989].
com os ações não lógicas. onde os fins buscados não estõo clara·
É orectso dizer que. no início dos anos 1880. o
mente ligados a meios definidos. A idéia desenvolvida por Pareta
em seu monumental Tratado (1916) é que as ações não lógicas re- movimento leplaysiano está em seu apogeu: qual-
metem à parte obscura da natureza humana. que é feita de Instin- quer que seja o critério adotado (número de adep-
tos. de pulsões. de necessidades que ele chama de resídUOS. tos. qualidade dos trabalhos. difusão das idéias).
porque variam de acordo com os indivíduos e as civilizações.Sobre nenhum outro grupo goza de tão grande notorieda-
esses resíduos vêm enxertar-se derivações que correspondem à' de. Mas a situação muda nos meses seguintes à
construções pseudo-racionais (crenças. teorias. até ideologias) pelaS morte de le Play. em 1882.
quais as condutas humanas se vêem justificados [Aron. 1967]. A crise estoura justamente em dezembro de 1885.
Passando do estudo da natureza humana ao da sociedade (e
qUando o redator chefe de La Réforme sacia/e. Ed-
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA IV - A SOCIOLOGIA COMO ARTE SOCIAL
PARTE I

---- o
!:---
SURG/MENTO DE oumosPÓLOS NACIONAIS DE PESQUISA
.
NA EUROPA

I
mond Demolins. é demitido de suas funções pelo
mitê diretor da Sociedade de Economia Social (S~
a Instância principal do movimento leplaysiano. ~
motivo era que Demolins - e com ele Henrl de Tou.
ram rapidamente. Em 1886. Tourvilie Ionço novas
Z~SquisaS e uma revista (La Science socia/e selon Ia
p éthode de Le Play) em que afirma sua ambição
;e precisar o método do mestre. ao mesmo tempo
ue o livrava de seus elementos mais estereotipados.
I
vllie. outro discípulo de Le Play - queria renovar ( r
aos olhos de seus adversários. trair) o método e e, ~ arrasta para o seu combate jovens monógrafos de
ensinamento da ciência social tais como eram pra; formação jurídica ou literária. como Demolins. Rousiers
cados há trinta anos. de modo um tanto rotineiro. A oU sureou. que realizam um trabalho considerável
corrente clnde-se em duas: os legitimistas conservam sob sua direção.
o controle da SES;os dissidentes constituem o grupo para resumir em algumas palavras vinte anos de
chamado da "Ciência Social". Mas o que proPõem trabalhoS.Insistamos sobre as emendas feitas ao fa-
os dois grupos? moso método de pesquisa de Le Play. Os fatos
Apesar de certo enrijecimento das posições doutrl. sociaissão primeiro reunidos numa só nomenclatura.
nais. os leplaysianos ortodoxos não permaneceram depois divididos em vinte e cinco grandes classes.
Indiferentes às críticas de seus rivais. que Ihes censu, elaspróprias subdivididas em rubricas. O trabalho. por
ravam o conformismo intelectual. Guiados por Émile exemplo. é uma das classes da nomenclatura. que o
Cheysson. antigo estudante da Politécnica. engenhel. monógrafo reparte conforme a natureza da força
ro civil. estendem o método monográfico à oficina e motrizutilizada (braço. vento. água ...) e conforme a
à comuna. que ganham tanta importância em seus forma das relações de produção (trabalho domésti-
trabalhos quanto a família. Procuram principalmente co. oficina artesanal. grande oficina ...). O método de
combinar monografia e estatística. que são. segundo classificação é. na realidade. concebido num espírito
eles. métodos de abordagem complementares. sem- próximo ao dos estatísticos atuais. sendo a observa-
pre pela Iniciativa de Cheysson. conduzido - em 1881 ção ampliada para o conjunto da sociedade.
- à presidência da Sociedade Estatística de Paris, mesmo se a família continua sendo um campo de
questionam o núcleo mesmo da investigação leplav· estudo privilegiado.
siana. a análise dos orçamentos familiares; eles o Contudo. a tipologia famiiial de Le Play é objeto
substituem pelo estudo do poder de compra das fa- de severas críticas. que questionam a prioridade con-
mílias. que supõe o conhecimento dos salários e dos cedida à família tronco. Mais do que a tcrnfllc. são
preços. e não só das despesas. Ora. como conhecê- as questões educativas que retêm a atenção dos
los sem um instrumental estatístico seguro? Assim.não membrosde La Science socia/e. Para estudá-Ias. eles
é de espantar reencontrar Cheysson entre as perso- se voltam para o mundo anglo-saxão que os meios
nalidades favoráveis à constituição de uma Secreta- liberais- de que fazem parte - opõem ao modelo
ria do Trabalho (janeiro de 1891). cuja função não é alemão. que goza do favor dos republicanos. Demo-
só estatística. já que será o primeiro embrião de um linsé um dos primeiros a desenvolver um discurso
ministério do Trabalho de verdade. que surgirá em antiestatista que faz dele um adversário declarado
outubro de 1906. Nessa secretaria colabora. a tftulo do solidarismo dominante. Conseqüente consigo mes-
temporário. um dos melhores monógrafos leplaysianos. mo. aplica suas idéias educativas em Verneuil-sur-
Piene du Maroussem. autor de uma interessante obra Avre.no Eure. onde funda a Escola des Roches. que
sobre As Enquetes. Prática e Teoria. publicado pela Setornará um centro de formação para as crianças
editora Alcan em 1900. dos classes dirigentes durante o primeiro terço do sé-
Os leplaysianos dissidentes. por sua vez. se organl CUloXX.
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA IV - A SOCIOLOGIA COMO ARTE SOCIAL
PARTE I

--- o SURGIMENTO DE oumos PÓLOS NACIONAIS DE PESQUISA NA EUROPA

I Após a morte de Tourville (1903) e de Demoli


(1907), acentua-se a guinada liberal e a corrente, ~
seu conjunto, acaba por se afastor das forças Vlv
da sociedade francesa, inclusive do catolicismo SOCle:
que, no entanto, estava pronto para acolher sUa
:;:nies, 1990].
[ AO mesmo tempo, outros pesquisadores se defron-
am com o discutido problema da m etho ro da ::::::::::::~:::::
IOPulação de um ponto de vista biológico. Francis
~alton, primo de Darwin, é o primeiro a se debruçar
~~'i':'I'!':'~~l
(j'i§:

Idéias. Com o tempo, a qualidade científica dos tra~ sobre as aptid_õesmentais e sua reprodução ao lon-
balhos devia também sofrer com essa marginalização go das geraçoes, procurando mostrar que essasapti-
detida por um instante com a criação, em 1904,d~ dões seriam hereditárias e até poderiam ser melho-
uma Sociedade Internacional da Ciência Social, qUe radas por uma judiciosa escolha dos cônjuges ou,
suspenderá suas atividades pouco antes da guerra, mais simplesmente, pela generalização de exames
médicos pré-nupciais. Acreditando trabalhar para a
melhora da espécie humana, institui uma nova disci-
G.RANDEZA E MISÉRIA DA SOCIOLOGIA BRITÂNICA plina, a eugênica e, através de uma revista cha-
mada Bíometríka, difunde suas idéias, que Imediata-
No mesmo momento em que. na França, a cor- mente provocam um interesse enorme, despropor-
rente leplaysiana perde o fôlego, encontra na Grã- cional aos resultados obtidos. Mas com seus estudos
Bretanha um novo vigor, atestado pelos trabalhos de biodemográficos, faz também progredir os métodos
Charles Booth (1903), de Patrick Geddes (1915) e de estatísticos,que praticamente ajuda a criar, com a
Victor Branford (1914). Todos os três - e muitos outros ajuda de Karl Pearson, estudando, por exemplo, os
com eles - retomaram a tradição de pesquisa Inau- desvios com relação à média, ou se Interessando
gurada por Le Play, que misturaram à aritmética po~- pela distribuição binomial e, sobretudo, formulando a
tica e à estatística social de origem britânica. Mas. chamada lei de regressão, que ainda hoje não per-
ao contrário de seu modelo francês, seus campos deu em nada seu valor, enquanto técnica de estatís-
prediletos foram o mundo industrial e a cidade. uma tica descritiva. Em suma, Galton mostra repetidas
cidade, em particular, que consideram como um la- vezesuma real inventividade metodológica, cuja im-
boratório de primeira importância para a compreen- portância para a sociologia e a demografia britâni-
são das sociedades modernas e sua transformação cas não podemos subestimar.
possível. Devemos-Ihes,entre outras coisas. a idéia de Não podemos dizer o mesmo de Leonard Hobhou-
planificação urbana e a de "cidade-jardim". que se- se,que, no entanto. era visto pelos seus contemporâ-
rão retomadas no entre-guerras por muitos países.Dai neoscomo o único sociólogo "sistemático" que podia
a atenção muito concreta que dispensam aos fenô- sercomparado aos maiores. Por seus trabalhos (1901)
menos econômicos e sociais, para os quais seria pre- e em profundo consonância com sua época, conse-
ciso preparar os futuros administradores, quer selam gue simplesmente mostrar que um filósofo evolucio-
empresáriOSou dirigentes operáriOS. Este é, em todo nisto,próximo de Spencer, podia pôr-se a serviço da
caso, o estado de espírito reinante na fundação da democracia e das reformas sociais. De resto, desem-
London School of Economics, em 1895, da qual par- penhou um papel institucional essencial que merece
ticipam intelectuais socialistas como Sidney e BeatrlZ serassinalado.
Webb, que tentam aliar a economia clássica e o se- Mas, divididos em múltiplos clãs, dilacerados por
clcllsrno. ao mesmo tempo que se mostram preoCu- ambições contraditórias, na falta de um consenso mí-
pados em dotar a classe trabalhadora de InstrU- nimosobre o conteúdo da disciplina [segundo Abrams
mentos de defesa tanto doutrinários quanto prátiCOS (1968),sessenta e uma definições da sociologia foram
IV - A SOCIOLOGIA COMO ARTE SOCIAL

- -
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
PARTE I 2. O REFORMISMO AMFRlCANr>

I
propostas entre 1905 e 1907, por exemplo!]. é com.
preensível que os sociólogos brltôrilcos

o rnut
ao contrárl
>

dos etnólogos e apesar de seus notáveis trabalhoO


de campo . tenham demora do multo tempo Para S
I
se "profissionalizarem",o que certamente não ocorreu
antes do fim da Segunda Guerra Mundial. 2. O REFORMISMO AMERICANO

AS VICISSITUDES DA SOC/OLOG/CAL SOCIETY P ara melhor compreender as condições de nas-


cimento da sociologia americana, devemos
reportar-nos à situação do país depois da Guerra de
Durante o verão de 1903 se forma, por iniciativa de Bran-
ford e de filósofoscomtistas, a Sociological Society, a primeira Secessão. De certa maneira, a ciência social dos
associação sociológica nacional que existiu.A disciplina reúne anos 1870 é apenas a tradução acadêmica dos ím-
então homens vindos de todos os horizontes, que em suo petos sociais dos antigos abolicionistas e dos movi-
maior parte são amadores esclarecidos sem notoriedade uni- mentos reformadores que denunciavam o vício, o
versitária, mas quase todos ricos e às vezes muito velhos. divórcio, a intemperança e a depravação da juven-
A constituição dessa sociedade, nesse momento, parece tude. Como na Grã-Bretanha, o moralismo protes-
paradoxal. se tivermos em mente que a socioiogia não dis- tante é aqui todo-poderoso.
põe - ainda menos do que na França ou na Alemanha - A solução dessas questões, que dependia antes
de nenhuma base sólida. Graças, porém, à intervenção de
da Iniciativa privada, ganha agora um contorno mais
um mecenas, J. Martin White, é criado um departamento de
político: leis são promulgadas, exige-se uma interven-
sociologia em Londres em 1907 (na London School of Econo-
mies) com uma cadeira de professor que cabe a Hobhouse,
ção dos poderes públicos em campos como a instru-
O departamento e a associação vivem durante algum tem- ção das crianças e o desenvolvimento urbano, que
po em boa harmonia, como testemunha a fundação, em Interpelam a sociedade inteira.
1900, de uma revista específica, The Socio/ogicol Review, cu-
jo diretor é Hobhouse. Rapidamente, degenera o clima entre
os sociólogos da London School, que pretendem afirmar suas PARA UM MUNDO NOVO, UMA CIÊNCIA NOVA
ambições acadêmicas, e os da Sociological Society, que.
em sua maioria, permanecem apegados a uma visão mais
Assimcomo alguns de seus homólogos europeus .
pragmática da disciplina. Em 1911, rompem-se as relações:
como Durkheim " os fundadores da disciplina primei-
Hobhouse pede demissão da direção da revista e os parti-
dários da ciência social aplicada encontram refúgio na Uni- ro viveram sua vocação como um sacerdócio: no
versidade de Liverpool, que cria para eles uma seção de sentido próprio do termo, no caso de William Sumner
sociologia. Por seu lado, os eugenistas (que eram membros e Albion Small (o primeiro começou como pastor da
com plenos direitos da Sociological Society) haviam instaladO Igreja episcopal, o segundo como pregador e estu-
seu próprio laboratório de biometria, graças a Galton, que dante de teologia protestante); num sentido figurado
garantia assim seu próprio mecenato. Forçados a tomar par- no caso de l.ester Ward, enquanto técnico do gover-
tido no debate que opunha Hobhouse e seus adversárioS. no, e de FranklinGiddings, jornalista de profissão, que
eles, por sua vez, distanciaram-se dos sociólogos da LondOn muito cedo se interessaram, profissionalmente falando,
School. E como gozavam de um incontestável prestígio nOS
pelos problemas sociais. No início, todos viam a so-
meios científicos, levaram consigo os membros da StatisticoI
Ciologia como uma maneira laica . sem dúvida
Society, ligados· como eles - à idéia de uma sociologia
melhor adaptada ao mundo moderno • de satisfazer
que continuasse vinculada à biologia.
sua primeira vocação. Mas os caminhos que toma-
-
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA IV - A SOCIOLOGIA COMO ARTE SOCIAL
PARTE I 2. O REFORMISMO AMERICANO

I
:·;·:·:·;·:·:·:·x
ram foram multo diferentes: se todos encaravam o
sociologia como uma disciplina concreta, uns se incli_
naram para o Intervencionismo, enquanto outros se
mantiveram num liberalismo bastante estrito, forte_
"profissional"[Simon, 1991], esse filósofo social foi antes
de tudo um notável professor que atraiu para a so-
ciologia auditórios de estudantes tão numerosos
Quanto fiéis. Em Yale, deixou até uma duradoura re-
11
mente Inspirado em Spencer. cordação, atestada pela existência de um clube
Dentre os intervencionistas, Ward é o primeiro o Que, muito depois de sua morte, continuava a reve-
propor uma visão coerente da ciência social. Sem renciar a memória do homem e de sua obra. Esta,
dúvida, esse botânico de formação permaneceu porém, se reduz a um único livro, publicado ainda
sensível à necessidade de unir as ciências sociais e em vida, em 1907, no qual se descobre o tema pre-
naturais, mas nunca deixou de insistir na distânclo dileto de Sumner, e até sua motivação intelectual
existente entre a evolução biológica e a evolução mais profunda: dar conta da origem, da natureza e
social. Afirma até que esta última devia passar paro da persistência dos "usos", regras ou normas que go-
o controle dos homens e da sociedade. Daí suas vernam as ações dos homens. O mais original diz res-
propostas sobre a intervenção necessária da autori- peito aos costumes, definidos por ele como maneiras
dade pública em matéria educativa; ou, ainda, o de agir que contribuem para o bem-estar da socie-
apoio dado por ele ao movimento reformista. O so- dade e que - quando adotados por todos - favore-
ciólogo torna-se então um técnico que deve pôr-se cem a extensão da lei. tornando-se eles próprios
sem complexos a serviço do progresso e do bem-es- elementos do código jurídico formal. Mas há também
tar social. em Sumner uma teoria da mudança social. que ele
Essa Identificação entre a sociologia e a técnica atribui, numa perspectiva evolucionista estrita, à trans-
social se impõe - e não por acaso - no momento formação automática dos costumes e não a um
em que a urbanização, a industrialização e uma imi- intervencionismo social cuja inanidade é denunciada
gração maciça obrigam os poderes públicos a por ele.
Inventarem em matéria social. Ela responde além dis- De fato, Sumner nada tem de um especialista e
so a um esforço coletivo dos intelectuais para expli- se um início de profissionalização é visível. no final do
carem esses fenômenos e participarem de sua século XIX, é para Nova York e para Chicago que
gestão. devemos dirigir nosso olhar.
A maior parte dos sociólogos da época adere à
visão de Ward sobre a disciplina. Um bom exemplo
disso é dado por Giddings, que, em Nova York, é SMALL, EMPREENDEDOR DE SOCIOLOGIA
muito ligado aos meios reformadores, graças aos
quais obtém uma cadeira de sociologia em Colum- Enquanto seus colegas da Nova Inglaterra não
bia. Aliás, é dessa universidade que são lançadas as têm muita estima por ele, o homem não destoa no
famosas enquetes de comunidades (community so- concerto acadêmico. Durante dois anos universitários
cial survey), que terão um peso decisivo no reconhe- (de 1879 a 1881), reside na Alemanha, em Leipzig e
cimento científico da sociologia americana no entre- em Berlim, para seguir o ensinamento, não de filóso-
guerras. fos, mas de economistas sociais como Schmoller e
Talvez o único que destoe nesse concerto seja Wagner. Volta convencido de que o desenvolvimen-
Sumner, o mais spenceriano de todos, e também o to social só pode ser desencadeado por grupos
mais europeizado. Embora tenha sido recentemente organizados que, enfrentando-se uns aos outros, con-
apresentado como o primeiro sociólogo americano seguem levar a sociedade na direção do progresso.
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
IV - A SOCIOLOGIA COMO ARTE SOCIAL

-
PARTE I
2. O REFORMISMO AMERICANO

IA Influência de Gumplowicz e de um outro sociÓlog


austríaco. Ratzenhofer. que estudou minuciosamente
é evidente. Todavia. a obra acadêmica
°
de Srnalí
conta certamente menos do que sua ação militante
a favor da sociologia [Barnes. 1948].
anos mais tarde na origem da American Sociological
society, que nasce em Baltimore em 1907, com Sum-
ner na presidência. Habilmente. Small dispõe as coi-
sas para que sua revista se torne o órgão oficial da
li
nova associação, que difunde igualmente algumas
Graças a fundos privados, um departamento de publications consagradas ao relatório anual de suas
sociologia fora criado em Chicago em 1892. Small foi
atividades.
seu primeiro diretor e permaneceu no cargo por tre-
ze anos. Por seu departamnento passaram personali_
dades tão importantes para o futuro da disciplina SITUAÇÃO DA DISCIPLINA POR VOLTA DE 1910
quanto Lawrence J. Henderson (psico-sociólogo indus-
trial. um dos fundadores da escola das relações Insistamosna seguinte particularidade: ao contrário
humanas) e Wiiiiam Thomas, que - com mais de 30 da Europa, a institucionalização da disciplina não se
anos - foi ali um estudante tardio, antes de voltar choCOUnos Estados Unidos contra "tradições" doutrl-
para lecionar de 1897 a 1918. Foi. aliás, em Chicago nais ou mandarinais, que teriam podido frear seria-
que Thomas iniciou, em 1908. sua famosa enquete mente sua expansão. No plano teórico, os soció-
sobre o "camponês polonês", que assumirá toda sua logos americanos situam seus trabalhos na linha do
amplitude quando passar a contar com o concurso liberalismo spenceriano (Sumner), quando não no
de Florian Znaniecki. Smaii teve ainda como alunos darwinismo social (Small), ou ainda no prolongamen-
Charles Eiiwood e Edward Hayes, que mais tarde se to da psicologia tardeana. Mas com muita rapidez
notabilizaram com seus trabalhos inovadores na psl- os social scientists foram convidados a se pôr a servi-
co-sociologia. ço da sociedade americana; e foram convocados
Professoraplicado, preocupado em dotar seus es- enquanto tais a inúmeras universidades do país onde
tudantes de sólidas referências teóricas e, mais ainda, não se desdenhava consagrar uma parte do tempo
de instrumentos metodológicos diretamente utilizáveis, à especificidade social. quando não se tratava de
publica um manual com Georg Vincent (1894). o pri-
formar trabalhadores sociais.
meiro. de uma longa série. que posteriormente pas- Certamente não se tratará de sociologia crítica,
sará a constituir uma especialidade americana. Ao
com exceção de Veblen (1899), que permanecerá
mesmo tempo, lança no mercado uma revista de toda a vida na contra-corrente dos meios Intelec-
especificidade definida: The American Journal o, so- tuais. E fora de Vale - que segue mais o modelo
ciology (1895), que recebe uma acolhida moderada europeu e onde leciona Sumner -, os outros departa-
por parte de seus pares. É que a publicação não mentos de sociologia, que se multiplicam por todo o
provoca o entusiasmo de certos filósofos e outros es- país, põem-se a sondar as necessidades sociais e as
tatísticos sociais, que não só possuíam seus próprios instituições (tanto no nível dos estados como no das
órgãos de difusão, como também acreditavam cobrir municipalidades) que são encarregadas de satisfazê-
o campo reservado ã ciência social. Ias. É isso que ocorre em Chicago (1892), em Colum-
De forma alguma desencorajado pelos obstáculos bia - onde leciona Giddings (1894) -. em Ann Arbour
que barravam seu caminho. Small torna-se uma es- - onde ensina Charles Cooley (1894), um pioneiro na
pécie de caixeiro viajante da sociologia, para a qual abordagem interacionista dos fenômenos sociais -, na
reivindica uma completa autonomia intelectual e Universidade do Missouri - com Ellwood (1900) =, e na
acadêmica. Assim, tornamos a encontrá-Io alguns
de lilinois - com Hayes (1907).
-
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA IV - A SOCIOLOGIA COMO ARTE SOCIAL
PARTE I

--- 2. O REFORMISMO AMERICANO

I Fato revelador: já antes de 1914, é nos Estado


Unidos que diplomas e teses de sociologia são maiS
numerosos. Issoé, sem dúvida, conseqüência de u~
sistema universitárioorganizado de maneira ágil, onde
as "humanidades" não esmagam as disciplinas noVOS
DoiS: Ensaio de Psicologia
(1898).
Charles BOOTH, (1840-1916):
(1889-1902).
Victor BRANFORD, (1864-1930): Interpretacões e Previsões (1914).
Mórbida (1893). Psicologia das Seitas

Vida e Trabalho do Povo Londrino I


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com o peso de sua notoriedade, proporcionando sobre as Faculdades Humanas (1883). Herança Natural (1889).
portanto, um ensino incontestavelmente mais coeren: pairick GEDDES, (1854-1932): Cidades em Evolução (1915).
te e melhor ordenado do que em outros lugares. LeOnard T. HOBHOUSE, (1864-1929): Mente en Evolução (1901). Mo-
Acrescente-se a isso que devemos ver aí sobretUdo o rais em Evolução (1906). Desenvolvimento e Objetivo (1913).
fruto de um enraizamento cultural na sociedade civil. Sidney WEBB, (1859-1947): (com B. WEBB) A Democracia Industrial
que não tem equivalente na velha Europa, onde os (1897).
sociólogos - a despeito de todos seus esforços para Charles H. COOLEY, (1864-1929): Natureza Humana e Ordem Socid
"se porem a serviço da sociedade", como queria (1902). Organização Social (1909). Processo Social (1918).
Charles ELLWOOD, (1873-1946): A Sociologia em seus Aspectos Psi-
Durkheim - continuam sendo vistos como ensaístas.
cológicos (1912).
ou, no melhor dos casos, como teóricos, mas certa-
franklin GIDDINGS, (1855-1931): Princípios de Sociologia (1896). Socio-
mente não como práticos sociais [lurner & lurner, logia Indutiva (1901). Leituras de Sociologia Descritiva e Histórica
1990]. (1915).
::!::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::;:::::::::::::;:::::::::;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::;:::::::;:::;:::::;:;:;:;:;:;:;:;::::::::::::::::::::::::::::::::::~
Edward C. HAYES, (1868-1928): Introdução 00 Estudo da Sociologia
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BALANÇO DO PERíODO
,
E preciso reconhecer que, por volta de 1914, a
sociologia está longe de apresentar uma ima-
gem uniforme. Na Alemanha, continua sendo muito
confundida com a economia política e a estatística
aplicada sob o nome de "economia nacional"; na
França ou na Inglaterra, pelo contrário, tenta afirmar-
se uma ciência específica do social - com sucessos
desiguais -, à margem do direito e da economia; só
nos Estados Unidos, talvez - já que as questões de
precedência hierárquica intelectual não têm ali o
mesmo papel - a sociologia consegue impor sua pre-
sença na paisagem acadêmica. Mas essas diferen-
ças institucionais não poderiam fazer esquecer outras
clivagens mais cruciais, que dividem profundamente
a jovem comunidade dos sociólogos.
1. Para alguns (Simmel), a sociologia só pode ser
uma ciência social particular, que se consagra ao
estudo das formas concretas da vida social; para ou-
tros (Worms ou Tarde), a sociologia deveria ser consi-
derada uma "filosofia" das ciências sociais, uma
espécie de quadro geral em que viriam inscrever-se
disciplinas particulares; para outros ainda (Durkheim),
o estudo bruto dos fatos sociais caberia a disciplinas
particulares, sendo a sociologia concebida como
uma teoria· integrativa e sistemática desses mesmos
fatos.
2. Mas há outras diferenças que não se mostram
menos significativas, pois condiclonam em boa parte
o futuro da disciplina: as que contrapõem os defen-
Soresde uma sociologia descritiva, voltada para a
satisfação de uma demanda social mais ou menos
imperiosa, de tipo cameralista, aos defensores de
uma sociologia teórica, animados pela vontade de
produZirum saber específico, de rendimento camera-
listapequeno, mas de grande rendimento cognitivo.
Oitenta anos mais tarde, será que a disciplina conse-
gUiurealmente superar esse dilema?
BALIZAS BIBLIOGRÁFICAS
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Pierre BOURDIEU.Jean-Claude PASSERON.Jean-Clau_
de CHAMBOREDON. Le Métier de socio/ogue. Mou-
Jean-Michel BERTHElOT.Lo Consfruction de Ia sociolo-
ton/Bordas. Paris. 1968.
gie. Presses universitaires de France. Paris. 1991.
Terry CHARK. Prophets ond Potrons: the French Univer-
Christophe CHARLE. Hisfoire biogrophique de /'enseig-
sity ond the Emergence of the Social Sciences. Har-
nement. CNRS. Porls, 1985-1988 (4 volumes publica-
vard University Press. Cambridge. Mass.• 1973. dos)
Jeon COPANS. Jean JAMIN. Aux origines de ronthro-
Christophe CHARLE. Noissonce des "intellectuels"
po/og/e trariçaise, Le Sycomore. Paris. 1978. 1880-1900. Éd. de Minuit. Poris, 1990.
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rature, /'avenement de 10 sociologie. Éd. de Ia Mai-
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Paul LAZARSFELD.Qu'est-ce que 10 sociologie? GolII-
Pierre-Jean SIMON. Histoire de Ia sociologie. Presses
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Paul LAZARSFELD. Phi/osophie des sciences socialeS.
Stephen TURNER; Jonathan TURNER. The Impossible
Gallimard. Paris. 1970.
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Robert NISBET.La Tradition socio/ogique, Presses unlver-
logy. Sage Public. Newbury Park. Calif .• 1990.
IV - A SOCIOLOGIA COMO ARTE SOCIAL HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
BAUZAS BIBUOGRAFICAS PARTE I

I
Jacques VERGER et 01.. Histoire des universités en
France, Privat, Toulouse, 1986.

ALGUNS PONTOS DE VISTA CONTEMPORÂNEOS SOBRE:


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Wolfgang MOMMSEN, Max Weber et Ia politique alle-
mande (1890-1920), Presses universitaires de France,
Paris, 1985 (edição alemã, 1959).
I
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Comte 1982.
Pierre ARNAUD, Sociologie de Com te, Presses univers!-
talres de France, Paris, 1969.
ENCICLOPÉDIAS E DICIONÂRIOS ÚTEIS
O urkheim
Steven LUKES,Émi/e Durkheim: his Ufe and his Work, Encyc/opaedia universalis, Hatier, Larousse, Nathan,
Harper & Row, Nova York, 1972. Penguin.
José PRADES,Durkheim, Presses universitaires de Fran-
ce, Paris, 1990.

Marx
Jon ELSTER,Making Sense of Marx, Cambridge Univer-
slty Press/MSH, Cambridge/Paris, 1985.

Pareto
Bernard VALA DE, Pareto. La naissance ci'urie autre
sociologies, Presses univers!taires de France, Paris, 1990.

Saint-Simon
Pierre ANSART, Sociologie df3 Saint-Simon, Presses unl-
versitaires de France, Paris, 1970.

Simmel
François LÉGER, La Pensée de Georg Simmel, Kimé,
Paris, 1989.

Spencer
Jonathan H. TURNER, Herbert Spencer: a Renewed
Appreciation, Sage Publ., Beverly Hills, 1985.

Tocqueville
Jean-Claude LAMBERT,Tocqueville et les deux démo-
craties, Presses universitaires de France, Paris, 1983.
Soint-Simon: Catecismo dos
1823-1624
Induslriais.

I
França: Comte vende o Sistema !
de PoIitica Positiva o Soint-Simon
que o publica sem o nome do
autor. Briga entre os dois.
1825 Morre Saint-Simon.
1826 Soint-Simon:O Novo Cristianismo.
França: Comte inauguro seu
Curso de filosofia positivo em
sua casa. no bairro de Mont-
martre. em Paris.
1826-1827 Internação de Comte
por estafa mental.
1827
1830 França: os TrêsGloriosos de- Fourier:O Novo Mundo Industrial.
põem Corlos X. luis Felipe I Comte: Inicio da publicação do
torna-se ~rei dos franceses",
Curso de Filosofia Positiva.
1831-1832 EUA: Tocqueville viaja pela
América do Norte com seu
amigo Beaumont para estudar
sistema penitenciário american
1834
França: fundação do Estatístico
Geral da França, antepassada
do INSEE.
1835
TocqueviUe: Da Democracia na
1837 Grã-Bretanha: k'lício do reinado
América, tomos I e 11.
de Vitória.
1838
Quételet: A Fisica Soolal. Cournot: PrincípiosMatemáticos
1838-18481 Inglaterra: importante og~oção da Teoria das Riquezas.
operária em resposta à industri-
alização acelerada do país.
1840 Morre Bonald. Tocqueville: Da Democracia na
América, tomos 11I
e IV.
Villermé: Quadro do estado físico
e morol dos trabalhadores.
1841 Grã-Bretanha: criação da Asso- Proudhon: Que é o propriedade,
ciação dos Mineiros, certidão
de nascimento das trade-untons.
1853-1855 Gobineau: Ensaio sobre a Desigual-
dade dos Roças Humanas.

Comte: Fim da publicação do


1855 Trotado de Sociologia.
1856 Le Play: O Trabalhador Europeu.
Le Play funda a Sociedade de Tocqueville: O Antigo Regime
Economia Social. e o Revolução.
1857
Inglaterra: fundação da
National Association for the
Promotion of Social Sciences .:
Morre Comte.
1859
Morre Tocqueville. Marx: Critica da Economia Darwin: Da Origem das Espécies,
1861-18651 EUA: Guerra de Secessão nos política
Estados Unidos.
1862 Alemanha: Bismarcktorna-se
presidente do Conselho do Reino
da Prússia.
1863
Morre Villermé.
1864 Marx redige os estatutos da pri-
meira Associação Internacional Fustelde Coulanges: A Cidade
dos Trabalhadores. fundada Antiga.
em Londres.
1866
Mil!: Sistema de Lógicas Dedutiva
1867 e Indutiva.
França: Dury funda a Escola Pró- Ma",: O Capital. livro I.
tica de Altos Estudos. inicialmen-
te consagrada às ciências
exatas e natura is, ela se abre
para a história e para a filologia
1869 (IV seção) em 1868.
EUA: primeira linha ferroviária entre
o Atlântico e o Pacífico. Galton: Gênio Hereditário.
1870 Guerra entre a Prússia e a
França.
Queda do Segundo imperio francês.
1871 Alemanha: Proclamação do
Segundo Reich em Versalhes.
I França: Criaçôo da Escola livre
de Ciências Politjccs em Paris.
Ma",: A Guerra Civil Tylor: A Civilizaçóo PrimltiVf1.
França: liquidação da Cornuno na França.
dQ Paris. Le Play:A Paz Social Depois do
Desaslre.
a Democracia

França: Criação da V seção Gumplowicz: Fundamentos da


da EPHE (ciências religiosas). Sociologia.
Divisão do movimento leplaysiano
em duas facções rivais: a
·Ciência social- e a ·Sociedade
de Economia socíor.
Criação do Conselho Superior
de Estatistica.
1885-1886 Estada de Durkheim na Alemanha.
1886 França: o grupo da Ciência Social Nietzsche: Além do Bem e do Mal.
cria sua própria revista: La Scien-
ce sociale selon Ia méthode de
Le Piav, que pouco depois
se torna La Science sociale sul-
vant Ia mêlhode d' observal/on.
1887 França: Durkheim é encarregado Tónnies: Comunidade e sociedade fundação da Revue d'économie
de um curso de pedagogia
ciência social na faculdade
e de
de
I paI/tique por Gide,
Villev, Jourdan e Dugu~.
letras de Bordeaux. Pela primeira

1888 Guilherme li, imperador da Alemanha.


~i~~~~~~~~g~a~~~~ t: ~~~7ne~~i

1889 Ga~on: Herança Natural.


1889-1902 Booth: Vida e Trabalho do
Povo Londrino.
1890 Alemanha: Bismarck é demitido Tarde: As Leisda Imilação. Frazer: O Ciclo do Ramo de Ouro.
de suas funções por Guilherme 11. Marshall: Princípios de Economia
EUA: Completa-se a marcha Política.
para o oeste.
1891 França: Criação da Secretaria Reapa rec mente de L'Année philo-
do Trabalho. encarregado de cole sophique (fundada em 1868,
tar e preparar estatisticas sociais. eie desaparecera com o final do
império francês).
A Estatística Geral da Vidal de La Biache funda
França é vinculada à Secretaria Os Anais de Geografia.
do Trabalho.
Criação da Escola de Ciências
Políticas e Sociais na Univer-
sidade Livre de Bruxelas.
1896-1897 Durkheim funda L' Année soe/olo-

- -
~
1897 glque na editora Alcen.
Durkhem: O Suicídio.
De~olins: A Que SQ Deve a Supe-
florldade dos Anglo-Saxões?
1897-1901 Webb: A Democracia Industrial.
França: Weber, vítima de
grave d?~nça nervosa. interrompe
1897-1903 suas atividades.
Tourvil\e:HistÓl'iada Fam11a
1898 França: A publicação de J'Accuse Particularista.
França: Criação de uma cadeira Tarde: Estudos de Psicologia
de Zola no jornal L'Aurore
de filosofia social no Collége Social.
reativa o caso Dreyfus.
de ~rance. zoulat é nomeado,
e nao Durkheim, que se
candidatara.
Demolins, leplaysiano dissidente
funda a Escola des Raches '
E~(e. que se tornará uma i~strtu.
çao educativa muito concertuada
1899 entre a el.it~burguesa do séc ulo XX.
França, Vórios durkhemianos
Bouglé: As Idéias Igualitárias.
partICipam da criação do
Veblen: Teoria da Classe
Grupo d" Unidade Socialista. Ociosa.
ema.naç~o da Sociedade Nova
dE! tivrorlo e de Edição,
1900 dirigido por Péguy.
Grõ-Bretanha: Formação do Partid França; Primeiro Congresso Inter.
Trabalhista. o Sirrmel: Filosofia do Dinheiro.
n~c.lOnal do ensino das ciências so- Freud: A Ciência dos Sonhos.
cioe, em Paris.
Tarde é nomeado para o College de
France. na cátedra de filosofia
moderna.
Criação da Escola Socialista
par~ <? qual contribuem o~ dur-
I<he::~lanos Mauss. Fauconnet
e Slmlond.
Congresso da Educação Social. em
ParIS. Durkhem exige a
multiplicação dos cursos de
Francês (SFIO).
\905-\920 Wundt: Elementos de Psicolo-

-- -- - -- -- -- -- - -- -- - ,- -
- --

1906
França:. Durkhem ganha a glaSoolal.
cadeira .de titular de Ciência da Fouillée: Os Elementos Soclológlc
da Moral. o Manto~x: A Revolução Industrial
Educaçao na Sorbanne.
1907 no Seculo XVI/I.
Hobhouse: Morais em Evolução.
Paret~: Manual de Economia
Na Sorbonne: lévv-Bruhl é Pol/hca.
nome9~o professor titular e Worm~:filosofia das Ciências
SOC/O/S.
Bougle e chamado; os dois são
Sumner: Folkways.
pessoas próximas de Durkheim
Reorganização de L 'Année . Thomas: Sexo e Sociedade.
sociologique.
A SG F lança sua primeira pesquisa
de consumo junto a 800
famrllas operárias em Paris
Grã-Bretanha: Fundação de'
um departamento de sociologia
na london School.
EUA: Criação da American
Saciological Saciety.
1908 Morre Demolins.
Alemon'!a: Weber organiza.
Bouglê: Ensaios sobre o
c?m Sm~1 e Tônnies, a Associa-
ç co Alem.ade Sociologia. Regime de Castas (O livro inau-
ChIcago: inICIO da pesquisa de gura a coleção dos "Trabalhos
do Ano Socjológico~ na editora
Alcan).
Thom~s sobre o ·camponês
perenes'. Simmel: Sociologia
1909
Ingla~erra: Fundação da Socio- Sorel: Reflexões sobre a Violêncl
toçicat Review Hubert & Mauss: Miscelônia a
1910 Morre GumpJowicz de história das religiões
França A SGF se torna novo-
mente a~tônoma; situando-se sob a Diffhev: A Construção do
Mundo Histórico nos Ciências lévy-8ruhl: As Funçóes Mentais
i~~~'~,~~.eta do ministério do do Espírito nas SOCiedades Inferiores
1911 Morre Summer
França:. s.;miand é enCarregado
de mr~lStrar conferências na
Boas: A Mente do Homem
IV seçao do EPHE. Primitivo
Michels: Os Partidos polmcos
»
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»/-0
~ »
;V ;V
--I
Olm
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--'

--'
CX>
INTRODUÇAO
-
Ogo após a Primeira Guerra Mundial. a sociolo-
L gia era ao mesmo tempo um proclamado pro-
Jeto Intelectual. um lugar Identificad~ de .elab?raçÕes
teóricas originais e um conjunto de mvestlçoçôes em-
pírlcas.
Raros,porém, são os casos em que sua produção
demonstra a aplicação de um programa teórico e
metodológico num procedimento empírico. O Suiddio
de Durkhelm e a Etica Protestante e o Espírito do
capitalísmo de Weber são, sob este aspecto, em-
preendimentos tão exemplares quanto isolados. Sem
dúvida, as contribuições da disciplina para o conhe-
cimento positivo da realidade social já são considerá-
veis. Porém, quando não são meramente descritivas,
mostram-semais como brilhantes perspectivações so-
ciológicas de questões há muito tempo já objetos de
estudo (direito, religião, moral. política, economia) do
que como conquistas originais de fatos novos, cons-
truídos conforme princípios novos e tratados de
acordo com métodos novos. A sociologia, portanto,
continua sendo rica em elaborações teóricas que
permanecem ainda, em sua maior parte, especulati-
vos; rica também em uma grande quantidade de
fatos de pesquisa que, se por um lado aumentaram
consideravelmente o conhecimento empírico de al-
guns domínios limitados, por outro lado não amplia-
ram por pouco que seja a inteligência do social.
Contudo, o essencial do projeto possível já foi
quase totalmente explicitado. Existemverdadeiros pro-
gramas de pesquisa: o determinlsmo dos "fatos
SOciais" em Durkheim, a compreensão da ação social
em Weber, a lógica das condutas não racionais em
Pareto, as formas das interações micro-sociais em
SI.mmel.a transformação dos tipos de sociedade em
Tonnles... E, sem dúvida, não há mais muito o que
acrescentar a essas construções parciais do objeto
geral da sociologia.
Dir-se-áque se trata de um belo traje de Arlequim
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA

li
PARTE /I INTRODUÇÃO

rlil~~~~~
e que ninguém ou quase ninguém está de acordo

I~~ sobre como confeccloná-Io. Mas Weber acaba de


responder que esta disciplina não é daquelas que,
tendo só um ponto de vista, só têm um objeto; que
:;'~i~~:a~' um 'e"m retorrntsto. ela [ó é uma ciência
ão podericimos_nos espantar com o fato de que :::::~::::::::::::
a história mo.eterna desta disciplina nascida~na virada
a apreensão das significações ("por que razões?") e do século tenFiOSido pontuada pelas duas guerra~
das explicações ("por que causa?") não se excluem, mundiais e, mais tarde, no final dos ano~ pelo
mas se sustentam e se completam. Vl~conômlco e cultural assumido pelas sociedades
As questões pertinentes para o historiador de uma ocidentais - apresentando assim três períodos bastan-
disciplina que se pretende científica são - aparente- e diferenciado~aremos responderàsperguntas
mente - bastante simples. Onde, quando, em que levantadas acima percorrendo essesdiferentes perío-
condições e como as teorias contribuíram para des- dos - sem, p'orém, Ignorarmos que, nurncdornínlo
cobrir, ou até para prever, novos fenômenos? Permi- como~o das ciências humanas, ambiçõe~Rrocedl-
tiram os fatos testar hipóteses sistematicamente formu- mentos às vezes se mostraram bem distantes dos do
ladas? Trataram os métodos eficazmente seus ~oohecimento clenfíflco ...
objetos? A pesquisa aumentou cumulativamente o
saber?
A escola francesa foi a primeira a conseguir, com
os durkheimianos, constituir um autêntico "paradigma":
um conjunto articulado de postulados de base, um
campo bem delimitado, um método original. pesqui-
sadores com pouca rivalidade entre si, pesquisas de
resultados cumulativos. Mas sua falta de gosto pela
investigação empírica impede que as sociedades
contemporâneas se conheçam realmente, ao passo
que em Le Play, pelo contrário, o interesse exclusivo
pelos fatos torna esse conhecimento rapidamente
obsoleto. O mesmo pode ser dito da sociografia bri-
tânica, que, considerando inútil ou até impossível o
conhecimento sistemático do social. se limita a co-
nhecimentos parciais, que supostamente bastam para
esclarecer reformas tão parciais quanto conjunturais.
Os alemães filosofam brilhantemente sobre o cotidia-
no (Simmel) ou então escrutam as leis da mudança
social (Tbnnies) - ou então, independentemente de
qualquer preocupação teórica, empreendem vastas
enquetes econômicas e políticas; mas o mais conse-
qüente deles (Weber) não faz escola. Quanto a
Pareto e seus discípulos, permanecem completamen- Noto do editor: as datas indicados entre parênteses e precedidas
de um nome de autor remetam a uma obra citada nas bibliografias
te isolados numa Itália de juristas e de filósofos que
anexadas a cada capítulo. As referências indicados por um número
rejeitam a sociologia. Nos Estados Unidos, em com- entre colchetes remetem à bibliografia geral ('Balizasbibliográficas')
pensação, afastada dos debates escolásticos e ani- situada no final do livro; o número que se segue é o número do
Página citada (o. ex.: [ 1: 100]).
1- DESTINOS DESIGUAIS
(1918-1945)
o
C om o período de entre-guerras, a história ofe-
rece-nos uma oportunidade privilegiada de
observar os efeitos de condições políticas, econômi-

,
cas e sociais tão dramáticas quanto variadas sobre
os destinos de uma disciplina recentemente nascida.
A instalação do comunismo soviético, o estouro de
uma crise econômica mundial. a ascensão dos fas-
cismos europeus constituem os quadros no interior
dos quais a sociologia deve enfrentar provas cruciais.
Como, na França, onde estabeleceu sua primeira
verdadeira "escola", sobrevive ela ao falecimento de
seu fundador? Na Alemanha, que foi seu outro ber-
ço, como sobrevive à derrota e ao desmantela-
mento do império? Nos Estados Unidos, para onde
acaba de imigrar, como sobrevive a seu Impressio-
nante êxito institucional?

1, A SOCIOLOGIA FRANCESA
SEM DURKHEIM

A o término do conflito mundial, a sociologia


francesa enfrenta uma situação difícil. A mor-
te prematura de Durkheim aos 59 anos de idade
(1917) e a de promissores discípulos nos campos de
batalha a privam de seu único líder e hipotecam
sua renovação demográfica. Além disso, se a legiti-
midade é forte e seu prestígio está no auge, suas
bases de apoio Institucionais são frágeis, tanto na
área do ensino (ela só conta, desde 1919, com que-
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA I - DESTINOS DESIGUAIS (1918-1945)
PARTE /I 1. A SOCIOLOGIA FRANCESA SEM DURKHEIM

I
tro cátedras universitárias) quanto na da pesquisa.
Por fim, ela só é ensinada (a partir de 1920) nas fa-
culdades de letras, associada à moral num dos qua-
tro diplomas da licenciatura em filosofia.
Graças aos durkheimianos, ela consegue sobreviver
também pelo tratamento de novos objetos que ha-
viam sido desdenhados ou mesmo rejeitados por Dur-
kheim: a psicologia (Halbwachs, 1925, 1938b, 1950), a
economia (Simiand, 1932), a geografia humana
(Halbwachs, 1928). Além disso, essa diversificação é
I
por algum tempo. Mas rupturas Internas e a evolu- acompanhada de um processo de difusão da pro-
ção do clima político e social acelerarão um declínio blemática durkheimiana e da metodologia geral de
sem dúvida Inexorável. já que atingirá, para além de seu fundador no conjunto das disciplinas do campo
suas diferentes escolas, a disciplina inteira. das ciências humanas.
Enfim, a sociologia é Introduzlda em 1920 no pro-
grama das escolas normais de professores primários,
POSTERIDADE E DECLíNIO DO DURKHEIMIANISMO graças aos esforços de Paul Lapie (1923) e de Bou-
glé, que também estão na origem da criação, no
Os anos 20 ainda foram um bom período para a mesmo ano, de um Centro de Documentação Social
escola francesa de sociologia, cujo primeiro em- vinculado à Escola Normal Superior e financiado pe-
preendimento foi restabelecer de imediato uma ativi- lo banqueiro Albert Kahn.
dade editorial que muito rapidamente se tornou
Intensa. Elesassistiramà publicação de trabalhos ter- ;:;:;:;:::::;:::;:::;:;:;:;:::;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:::;:;:;:; :::::::::::::::::::;::::::::=:::::::::::::: :::::::'::::::':':""'" ;:;::;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:::::::::::::;:;:;:;:;:;:;:;:;:::::::::::::::::::::~-
minados nas vésperas da guerra (Fauconnet, 1920;
Davy, 1922; Granet, 1922), assim como manuscritos A SOCIOLOGIA E AS CIÊNCIAS HUMANAS
do mestre (Durkheim, 1922, 1924, 1925, 1928) ou de
'[A sociologia francesa] nunca se considerou uma disciplina iso-
discípulos mortos no campo de batalha (Hertz, 1928);
lada. trabalhando em seu próprio domínio, mas antes um método
durante toda a década, essa atividade conservará
e uma atitude perante os fenômenos humanos. Assim,não é preci-
um ritmo intenso entre os durkheimianos, Cgraças es- so ser sociólogo para fazer sociologia. Realizam-sena França. com
~cialmen& a.B.ouglá,_D--9.Y.Y,
Granet e Halbwachs. sucesso, sob o nome de outras disciplinas, muitos estudos que em
Apesar do fracasso do restabelecimento da publica- outros países lhe seriam confiados. Este é, em particular, o caso da
ção (interrompida em 1913) da revista Année sociolo- escola francesa de 'geografia humana', cujos representantes, em-
gique, que é relançada em 1925 mas desaparece bora formados unicamente em Geografia, fizeram, porém, uma
de novo dois anos mais tarde, o movimento durkhei- obra sociológica, geralmente sob forma de monografias consagra-
miano consegue formar uma sociedade científica das aos aspectos humanos e ecológicos de uma região ou de um
país. / .../
muito fechada, mas aberta ao conjunto das ciências
'O universalismodo sociologia francesa permitiu-lhe contribuir pa-
sociais: o Instituto Francês de Sociologia, criado em ra a renovação de vórias ciências humanos. Falaremos / .../ da
1924 por Mauss. contribuição de Simiand para a ciência econômica. Mos disciplinas
No entanto, a vitalidade da sociologia durkheimia- aparentemente muito distantes beneficiaram-se do mesmo elã: é o
na não é só ilustrada pela fecundidade dos discípu- caso da lingüística, cujos mestres europeus modernos, Ferdlnand de
los e de sua fidelidade aos grandes temas tradicio- Saussure/ .../ e Anfoine Meillet / .../ reconheceram repetidas vezes
nais, que são a moral (Bayet, 1925; Bouglé, 1922), a estarem de acordo com o ensinamento de Durkheim e sua dívida
religião (Granet, 1934; Mauss, 1950), o direito (Davy, para com ele.
1922), a educação e a pedagogia (R. Hubert, 1949; 'Daí certa empófia da sociologia francesa. que não deixou de
ser notada pelos representantes dos outras ciências sociais e de ne-
Laple, 1923) ou ainda a "morfologia social" (Davy e
les provocar certa irritação. Como a sociologia francesa foi capaz
Moret, 1923; Halbwachs, 1938a). Ela se manifesta
de avaliar cedo toda a extensão de seu campo teórico - muito
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA I - DESTINOS DESIGUAIS (1918-1945)
PARTE /I 1. A SOCIOLOGIA FRANCESA SEM DURKHEIM

I
tempo antes de esgotá-Io -, era inevitável que outras disciplinas,
agindo de acordo com seus próprios métodos, a encontrassem no
meio do caminho. Essesencontros teriam sido úteis a todos (e o fo-
ram em muitos casos) se, de tempos em tempos, o sociólogo não
assumisseum ar de mãe que assisteaos primeiros passosde seus fi-
republicano e. portanto. mais sensíveis à dimensão
moral da sociologia. ao empirismo racionalista dos se-
gundos, mais versados nos estudos de "morfologia
social" (isto é, no sentido durkheimiano. relativos ao
I
lhinhos e Ihes prodiga seus conselhos. Isso nem sempre agradou a substrato demográfico. econômico e estrutural das
gente que trabalhava duro, plenamente consciente de estar reali- "representações coletivas" que constituem o objeto
zando um trabalho original. Eles algumas vezes expressaram sua essencial da sociologia). Ora. os "professores"gozam
impaciência, e não sem certa decepção. / .../ de uma maior visibilidade social do que os "pesquisa-
'Em pelo menos dois casos - além do dos lingüistas-, a coope- dores": publicam mais livros. mas produzem pouca
ração e a dívida mútua foram aceitas por ambas as partes, e sem pesquisa original e se dedicam mais ao trabalho de
reservas. O primeiro foi o de Henri Hubert. trabalhando simultanea- vulgarização enfatizando o alcance filosófico e os
mente no campo da sociologia da religião (em colaboração com usos sociais da sociologia (Heilbron. in [40]). A preca-
Mauss) e no da história e da arqueologia / .../. O segundo foi o de
riedade de sua implantação na universidade. por-
Mareei Granet. cujos livros são uma emanação direta da escola
tanto. não é a única culpada por uma crise de
durkheimiana. / .../ Assim. não só a lingüística e a geografia, mas
também a arqueologia européia e a história antiga do extremo- recrutamento que se deve também ao fato de que
oriente foram fecundadas pela influência sociológica. Essainfluência as personalidades capazes de formar discípulos te-
atingiu até a 'vanguarda'. Durante os anos que precederam ime- nham pouco prestígio e estejam. por sua condição
diatamente a Segunda Guerra Mundial, o 'Colégio de Sociologia', de pesquisadores, mais distantes do grande público:
sob a direção de Roger Caillois, tornou-se um ponto de encontro Mauss. Hubert e Granet estão na Escola Prática de
para os sociólogos, de um lado, e poetas e pintores surrealistasde Altos Estudos (EPHE).onde o próprio Simiand perma-
outro. A experiência deu certo. Essaestreita colaboração entre a
necerá até 1920 - e Halbwachs. professor em Estras-
sociologia e todas as tendências ou correntes de pensamento que
burgo até 1935. sem dúvida permanecerá por longo
tivessem como objeto o homem e o estudo do homem, é um dos
tempo distante de Paris.A sociologia iria a partir daí
traços mais característicos da escola francesa.'
afastar-se da etnologia, à qual se consagravam es-
CI. LÉVI-STRAUSS.
'A Sociologia Francesa' (in G. GURVITCH,E. MOO- sencialmente os "pesquisadores". à frente dos quais
RE WILBERT,(org.), Lo Sociologie ou XX siec/e, Paris, PUF,1947). Mauss. que faz com que essa disciplina realize pro-
gressosdecisivos e a quem também cabe ter. desde
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muito cedo. alerfado seus companheiros para os limi-
tes de seus procedimentos: "É pouco útil filosofar
Algumas ameaças. porém. obscurecem o quadro. sobre a sociologia geral quando temos tanto que
Em primeiro lugar. os durkheimianos do pós-guerra Ja- conhecer e que saber, e quando temos tanto a fa-
mais conseguirão ter um verdadeiro líder que permi- zer para compreender" (Citado por Lévi-Strauss in [8]).
tisse manter a coesão do grupo de /'Année socloio- Em seguida. desde a guerra secara a fonte de
gique. A causa disso é ao mesmo tempo institucional estímulo intelectual e de reconhecimento Instituclonal
e doutrtncl. uma vez que as clivagens nessesdois ní- que antes constituíra uma exigência política forte. em
veis se sobrepõem claramente. Entre professores uni- busca de legitimação científica para os Ideais demo-
versitários e pesquisadores estoura realmente um cráticos e laicos do regime republicano. Uma vez
"conflito de interpretação" do durkheimianismo e. de realizada essa obra, a exigência iria centrar-se prlorl-
maneira mais ampla, da vocação de sua disciplina. tariamente nos domínios da economia e da adminis-
Esseconflito contrapõe o neo-espiritualismo dos pri- tração - e se dirigir antes aos juristas e aos econo-
meiros. ligados por seu estatuto ao esfablishmenf mistas que a organização universitária reunira nas
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA I - DESTINOS DESIGUAIS (1918-1945)
PARTE /I 1. A SOCIOLOGIA FRANCESA SEM DURKHEIM

I
faculdades de direito: a criação. em 1933. pelo eco-
nomista Charles Rist.sob a égide da Escola Livre de
Ciências Políticas. do Instituto Científico de Pesquisas
Econômicas e Sociais ilustra isso. assim como o fato
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RETRATO DE DURKHEIM

• 1.. ./ Mas Durkheim não é apenas o interlocutor de um diálogo


COMO "CÃO DE GUARDA"_ I
de que a EstatísticaGeral da França passe a se en- travado por professoresda Sorbonne; tudo se passa realmente co-
carregar das pesquisas sobre a conjuntura econô- mo se o fundador da sociologia francesa tivesse escrito a Divisão
mica e social [63]. do Trabalho Social para permitir que obscuros administradores com-
Enfim. essa crise de legitimidade foi reforçada pe- pusessem um ensino destinado aos professores'primários. A Introdu-
la Imagem de filosofia oficial assumida pela sociolo- ção da sociologia nas escolas normais consagrou a vitória adminis-
trativa dessa moral oficial. Houve anos em que Durkheim edificou
gia durkheimiana aos olhos da "geração dos anos
sua obra e difundiu seu ensinamento. com grande obstinação. com
30" - e que P. Nizan exprimiu cruelmente em Os
um grande rigor autoritário. dando a essa obra aparências venerá-
Cães de Guarda (1932). De fato. o debate intelec-
veis de ciência: em nome dessa aparência. em nome dessa ciên-
tual francês desiocava-se então do terreno da filoso- cia. professoresprimáriosensinam as crianças a respeitarem a pátria
fia social para o da ideologia política: "Durante todo francesa. a justificarem a colaboração entre as classes. a aceita-
esse período. os franceses não sentiam curiosidade rem tudo. a comungarem no culto da bandeira e da democracia
por sua própria sociedade. estavam presos a um re- burguesa. 1.../ Pois essesmanuais. dentre outros textos. manifestam
flexo conservador. habituados às práticas da Terceira o poder de difusão dessa doutrina de obediência. de conformismo
República. de que não gostavam o bastante para e de respeito social que com os anos foi ganhando tão grande
transfigurá-Ia. mas não a odiavam o bastante para a crédito. audiência tão numerosa: na caminhada durkheimiana. a
burrice socialista vai lado a lado com a burrice radical, e a tolice
despedaçarem analiticamente ou para se revoltarem
do sr. Déat não cede à do sr. Fauconnet. Durkheirn,enfim, ao mor-
contra ela. Foi apaixonada a discussão política. de
rer, realizou e levou à perfeição a tarefa de conservação burguesa
caróter Ideológico. nesse anos 30; ela teve um curio-
que empreendera durante a vida. Tanta ciência, tanta crítica e
so caráter de "alienação". já que as Ideologias de tantos documentos floresceram como propaganda. O sucesso de
Importação. comunista e fascista. não davam conta Durkheim veio justamente do propaganda moral que era capaz de
exatamente das realidades nacionais". (Aron in fundamentar, das medidas de defesa social que ele era o primei-
[43:5].) Por todas essas razões. "para quem quer que ro a conceber com tanta segurança.'
examinasse a profissão por volta de 1930. a sociolo-
P. NIZAN,Les chiens de gorde, 1932 (citado de acordo com a edi-
gia francesa / .../ dava - em contraste com o entu-
siasmo que animava os jovens sociólogos por volta ção F. Maspero, 1976, pp. 97-98). ~ ",tb~a. <-li -';> k~
de 1900 ou com a atmosfera de abundância que se :::::::::::::;:::::::::,::::,::,:,::,:::,::,:::,:::::::,:,::::",:::,:,:",:,:":::,,::,,,::;:,,;;;:;,;;,,;:;:,":"""",;,,,,;:,;;,;,;,;:;:;:;:::;:;,;:;:;,:,:,,:;,:::"",:,::::,:;:,:;:;:,:::;,,:::;;,:,:,:;:;:;:;:,,::::':"':':':;:':;:':;;;:;:;"'c' :> •.
podia sentir por volta de 1920 - uma Impressão de
respiração difícil. senão de esgotamento" (Stoetzel in digma inicial (Halbwachs. 1924. 1930). o enraizamen-~~
[3:636]). to da sociologia na pesquisa empírica e. sobretudo. ~
Foi. no entanto. graças à ação de dois durkhel- seu interesse pela realidade social contemporânea'~1A
mia nos - Halbwachs e Bouglé - que a sociologia Ultrapassando o anátema durkheimiano pronunciado ~
conservou. ao longo dos anos 30. sua presença no contra. de direito senão de fato. a psicologia e a ~ __
cenário intelectual. economia (e precedido. neste último caso. por SI-
O primeiro. único pesquisador realmente ativo da miand). ele renova e aprofunda a análise. dos fatos
escola durkheimiana. garante a conservação de de "representações coletivas". estudando as condi-
uma produção científica de qualidade. que indica ções sociais da memória. tanto coletiva quanto ir.di-
ao mesmo tempo um certo distanciamento do para- vidual .(1925. 1941. 1950). e de "morfologia social".
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA I - DESTINOS DESIGUAIS (1918-1945)
PARTE /I 1. A SOCIOLOGIA FRANCESA SEM DURKHEIM

I
desenvolvendo pesquisas na área de demografla so-
cial e de geografia humana (1928, 1938a) - ao
mesmo tempo que reabilita o emprego da estatística
e dos métodos quantitativos. Elabora também uma
teoria da estratificação social (1927) que aplica a im-
seu resultado mais eficaz nas manobras - via Conse- ~~i:i:i:~:i·.::~:
lho Universitário da Pesquisa Social (1935-1940),presi-
dido pelo reitor Charléty, e em colaboração
~~j::tj:
com ::::::::::~::::~
Mauss - para obter e repartir as generosas bolsas da
Fundação l.S. Rockefeller.fExplicitamente destinados
portantes trabalhos sobre as condições de vida da apenas à "pesquisa induti~" sobre "problemas con-
classe operária (1913, 1933). Ele ali mostra, contra o temporâneos", esses financiamentos americanos per-
holismo radical de Durkheim, a Importância da clas- mitiram, a partir de 1932, que os cientistas sociais
se social na definição das condutas Individuais, ao franceses ganhassem novo alento e que a sociologia
mesmo tempo que ressalta o caráter de "representa- subsistisse,ao mesmo tempo que preparava o futura
ções coletivas" das necessidades que, em particular, (Mazon in [40])[59]: as primeiras subvenções foram
subjazem aos comportamentos de consumo. Deve- bolsas de pesquisa conferldas a Raymond Aron [37],
mos-lhe também ter apresentado ao público francês Georges Friedmann (1934), Robert Marjolin (1936),
autores estrangeiros até então desconsiderados: We- Raymond Polin (1934) e ainda Jean Stoetzel (1943);
ber, Pareto, Veblen, assim como os da escola de as seguintes deram um segundo alento ao Instituto
Chicago, que, aliás, vai visitar. Sua chegada tardia à Francês de Sociologia, assim como ao Centro de Do-
Sorbonne em 1935 (depois ao Colégio de França em cumentação Social. sob a égide do qual foi reali-
1944) e sua morte no campo de Buchenwald em zada a publicação, interrompida pela guerra, dos
1945 privaram a sociologia durkheimiana da única três primeiros volumes de Inventaires (Bouglé, 1936,
personalidade que talvez pudesse, transfigurando-a, 1937, 1939)J
permitir-lhe sobreviver à Segunda Guerra Mundial. Na época, não só a escola durkhelmiana desapa-
Georges Gurvitch, que já se destacou por trabalhos recera fisicamente, como também o próprio para-
de sociologia moral e jurídica (1938, 1940) alheios ao dígma de seu fundador caíra em abandono.
paradigma durkheimiano, será seu sucessorem Estras-
burgo, antes de se refugiar nos Estados Unidos
durante a guerra. OS NÃO-DURKHElMIANOS DURANTE O ENTRE-GUERRAS
Foi no plano institucional que a ação de Bouglé
foi mais eficiente. Sua posição de diretor adjunto Das duas escolas sociológicas que coexistiam com
(1927) e mais tarde de diretor (1935-19""40) da Escola a de Durkheim na virada do século - a escola fun-
Normal Superior, assim como uma grande abertura dada por Le Play e a dirigida por R. Worms -, só a
para as diferentes expressões da sociologia e das primeira conserva um lugar de destaque.
ciências sociais o fizeram desempenhar um papel • De fato, com a morte de Tarde (1904) e de Es-
decisivo no ensino, na organização e na evolução pinas (1922), o Instituto Internacional de Sociologia e
da sociologia trancesa (Bouglé, 1935, 1937). Sua a revista do mesmo nome criadas por Worms em
ação no Centro de Documentação Social durante 1893 perderam os dois mais eminentes pesquisadores
esse período permite a criação dos Anna/es soctoto- franceses do grupo, que aliás só representa uma rnl-
giques (1935-1942),no qual o recrutamento, aos seus norlo de sociólogos, da qual os durkheimianos estão
cuidados, de colaboradores vindos de diversos hori- ausentes. O ecletismo teórico de Worms, por um la-
zontes abre a disciplina a correntes distintas do dur- do, e a institucionalização crescente da disciplina em
kheim!anismo, ou até opostas a ele. Mas essa ativi- numerosos países, por outro, são fatores capitais do
dade de promoção da pesquisa teve, sem dúvida, afastamento do meio sociológico internacional do IIS
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA I - DESTINOS DESIGUAIS (1918-1945)
PARTE /I 1. A SOCIOLOGIA FRANCESA SEM DURKHEIM
:~{:t:~:~:
!t~:!:!:::::í e de sua revista, cujas atividades perderam sua ra- bois (1934), que aparece como precursor da sociolo- !:~I:::,~li:i:~::[
!!,'ii,2! zão de ser na ausência de um quadro unlflc,ador gia das organizações (1937). No entanto, apesar de ht~
:::::::::::::::::::
que Worms (1921) jamais conseguiu elaborar. Apenas um esforço de mobilização de seus recursos (La Ré- :,:,:,:,:,:,:,:::,
alguns sociólogos (Duprat, 1919; Essertier, 1927; Ri- forme socia/e e La Science socia/e se reúnem em
chard, 1937; Maulnier, 1929) reivindicarão, durante os 1935 para formarem Les Études socia/es, órgão único
anos 20, uma instituição cujo papel não foi desprezí- da Sociedade de Economia Social e da Sociedade
~L~vel na popularização da disciplina no final do século Internacional de Ciência Social), é Irrelevante o pa-
XIX, mas que "é muito pouco provável que tenha pel do movimento leplaysiano na reorganização instl-
~ contribuído com o que quer que seja [para seu] de- tuclonal da sociologia francesa às vésperas da
l:.,~senvolvimento Intelectual" (Geiger, in [39]). Quando Segunda Guerra Mundial. Reqlmente, só mantém sua
~w...;da morte de Worms em 1926, quem garantiu a su- Influência graças às suas estreitas relações com os
f'M cessão à frente de seus empreendimentos foi o "dur- meios dirigentes da área agrícola, que se vincularão
, ~kheimiano apóstata" Richard - ao qual já coubera a nos anos 40 ao regime de Vichy - e que mais tarde
~ cadeira de Durkheim em Bordeaux . comprometerão sua Imagem.
~ • O entre-guerras, porém, não foi mais favorável No plano teórico, porém, um reconhecimento tão
~. aos leplayslanos do que aos durkheimlanos, cuja simbólico quanto tardio lhe veio do establishment so-
~ oposição aos primeiros manifestou-se mais como um ciológico francês: o próprio Bouglé, em 1937, preco-
~ ostracismo do que como um conflito aberto (como niza "casar a tradição de Le Play com a de
S'~'fOi o caso para com Tarde) [33]. As sociedades cien- Durkheim" (citado in [40: 270]). Assim,a sociologia le-
íficas e as revistas que são os órgãos oficiais dessa playsiana deve sem dúvida o essencial de seu papel
escola (La Réforme socia/e. La Science socia/e e Le histórico à influência que teve junto a inúmeras esco-
Mouvement social) vêem sua atividade e sua au- las estrangeiras (nos Estados Unidos, na Inglaterra, ou
diência declinarem em razão da diminuição das até na Turquia e na Romênia), a maior parte das
encomendas do estado e, de um modo mais geral, quais ignoraram por muito tempo o durkheimianismo.
da crise do cristianismo soolol. consecutiva à ascen- Nas vésperas da Segunda Guerra Mundial, a so-
são do movimento operário. Apesar disso, sua produ- ciologia francesa está Irreconhecível: no espaço de
ção continua sendo considerável. Os trabalhos de vinte anos, perdeu o prestígio e a influência que, pe-
Paul Bureau, Joseph Wilbois e Paul Descamps de- lo menos na França, antes a cercavam, viu esgotar-
monstram a vitalidade do programa leplaysiano de se uma produtividade üorescentg,e estagnar-se uma
pesquisas,cujo objetivo permanece intacto (o estudo Institucionalização ainda frágil.l!- vitória da escola
direto dos fatos sociais com o objetivo de esclarecer durkheimiana na virada do século não era, portanto,
as manobras reformadoras da ação política e social), apenas o triunfo de um grupo talentoso organizado
mas que doravante se abre para a dimensão psíqui- por um mestre insubstituível.mas antes de tudo a vi-
ca dos fatos sociais e ambiciona recolocá-Ios na tória de uma doutrina política e moral cuja hora his-
perspectiva mais totalizante da sociedade global. tórica já se for0 Na falta de demanda social (que
aproximando-se assim do durkheimianismo (Bureau, ela sem dúvida não tinha meios de suscitar), e em
1923). Esta superação do método monográfico por razão de um gosto mais voltado para a síntese do
um procedimento mais sintético é particularmente que para a análise, essa sociologia não foi capaz
clara em Descamps (1924, 1930), cuja contribuição nem de estender seu campo de investigação à rea-
para a edificação da sociologia portuguesa e do so- lidade social contemporânea, nem de consertar uma
lazarismo é aliás notável (1935), assim como em WiI- metodologia ao mesmo tempo ambiciosa demais em
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA I - DESTINOS DESIGUAIS (1918-1945)
PARTE /I 2. AS SOCIOLOGIAS ALEMÃS ENTRE UMA E OUTRA DERROTA

I
seus objetivos e estreita demais em seus procedimen-
tos - como auguraram os últimos alunos de Durkheim,
cujos esforços permitiram, porém, que a disciplina es-
boçasse in extremis o indispensável processo de
mutação capaz de fazê-Ia reencontrar a dimensão
ções entre a sociologia e as ideologias progressistas, 1:11111111111111
que a República de Weimar não tenha recebido o ::)':75
apoio dos sociólogos alemães - com exceção dos Ir- rà:;~~::::::
mãos Weber, dos autores judeus e do próprio Ton-
nle s, que, apesar de sua visível predileção pela
empírica que a caracterizara em sua tradição leplay- "comunidade", sempre se opôs à utilização política
siana. que fizeram de sua obra (1935); quanto a outros, co-
mo Sombart, Michels ou ainda Geiger, a experiência
social-democrata acabou por desapontá-Ios cruel-
mente, de tal modo a nova ordem republicana
parecia concretizar a vitória da medioCridade bur-
guesa e de um socialismo ainda mais desprezado do
que o capitalismo, que pelo menos era temido
2. AS SOCIOLOGIAS ALEMAS [9:175].
ENTRE UMA E OUTRA DERROTA
o
A o contrário do caso francês, o fim da Primei-
ra Guerra Mundial assinala na Alemanha o
lnlclo de uma era burguesa, e não seu declínlo. A
ARQUIPÉLAGO SOCIOLÓGICO

Num país onde os principais "luminares" da discipli-


derrota de 1918 encerra uma ordem política de que na não gostavam de se definir como sociólogos e a
a maioria da intel/igentsia alemã temia menos a Sociedade Alemã de Sociologia (DGS) designava a si
transformação do que o desaparecimento dos fun- mesma como um "grupo esotérico de cientistas", não
damentos culturais e sociais. Assim, é significativo que é surpreendente que a sociologia, gozando de pou-
a obra de Tônnies só inicie sua carreira intelectual ao co reconhecimento e prestígio, fosse pouco ensinada
terminar a guerra e que a oposição conceltual por ou o fosse em ligação com outras ciências humanas,
ele forjada entre "comunidade" e "sociedade" domine quando não com a filosofia. Além disso, ela oferece,
a história da sociologia alemã ao longo de todo o ao término da guerra, um espetáculo de dispersão
período. Realmente, essa problemática exprime muito tanto geográfica quanto Intelectual.
bem a Inquietação aiemã perante o processo de ra- Entretanto, graças à proteção e aos esforços do
cionalização que atinge as sociedades modernas e ministro Becker, criam-se novas cátedras e a pesqui-
põe em perigo (a ascensão do socialismo o prova) sa se concentra ao redor de alguns teóricos, ao
a organização comunitária e seus valores. mesmo tempo em que surgem várias revistas. Leo-
Aliás, essa problemática encontra seus acentos pold von Wiese garante a publicação dos Kólner
mais ideológicos nessa oposição entre a "cultura" e a Vierteljahrshefte tür Soziologie [Cadernos Trimestraisde
"civilização", como prova o imenso sucesso obtido SociOlogia de Colônia] (1921), e Richard Thurnwald,
em sua publicação, em 1918, de O Declínio do Oci- de Zeitschrift tür Vólkerpsych%gie und Sozi%gie [Re-
dente de Spengler. De fato, a propaganda de vista de Psicologia Social e Sociologia] (1925), que
guerra pintou o último conflito como opondo os altos terá o título de Soci%gus e será publicado em edi-
ideais da Alemanha (a cultura) ao materialismo e ao ção bilíngüe (alemão/inglês) em 1932 - duas publica-
Igualitarismo anglo-saxões (a civilização). Assim, não é Ções de vocação Internacional e amplamente
surpreendente, mesmo se original na história das reto- abertas, p crttculorrne nte a segunda, à sociologia
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA I - DESTINOS DESIGUAIS (1918-1945)
PARTE /I 2. AS SOCIOLOGIAS ALEMÃS ENTRE UMA E OUTRA DERROTA

I UMA DlselPUNA

'A República de Weimar foi uma época de numerosos partidos


DE MARGINAIS
americana; em Berlim, o teólogo protestante K. Dunk- 1.:li·i·i:i·i·~
:::~::::::~~~::::::::::::::;:~~::~~::~::~~::~::~:~::::::::::::::::::::~::::~::::~::::~::::::::~:;:~;:~;:~~;:::~::~:~~:~::::~::::::~::::::::::::~::::::::~~::::~~::~~:::::~:~~~:::!::::~::::~~::~::~~::~~
mann edita Archiv für angewandte soüotoçte
quivo de Sociologia Aplicada] (1928). consagrado à ~:::::::::::::::
ação social. Além disso, inúmeros periódicos científi-
[Ar- ':l::fi
cos publicam trabalhos sociológicos: Jahrbuch für
e de numerosas sociologias. Existiamnúcleos regionais de concen- Sozi%gie (1925-1927). Zeitschrift für Sozia/forschung
tração - dentre eles. principalmente. Heidelberg. Frankfurte Colônia
[Revista de PesquisaSocial] (1932-1933).Archiv für So-
-', mas nenhum centro: é impressionante que Berlim nunca tenha si-
zia/wissenschott und Sozia/politik [Arquivo de Ciência
do uma espécie de capital do ensino ou da pesquisa sociológicas.
Enquanto órea universitória. a sociologia só ganha uma identidade
Social e Política Social] ou ainda Schmollers Jahr-
debilmente marcada: só existiam poucas cadeiras de sociologia re- bucho Ao mesmo tempo, a DGS promove regular-
servadas unicamente à sociologia. Apesar dos progressosdos anos mente congressos nas diferentes capitais germanófo-
20. que permitiram superar a concorrência raivosa de sociólogos nas.
isolados em beneficio de uma concentração frutuosa de grupos de Isto mostra a vitalidade da atividade sociológica.
teóricos rivais. predominava a impressão de dispersão. Entre sociólo- mas também sua disparidade sob todos os aspectos
gos. nada havia que se parecesse com a solidariedade de pessoas (Mühlmann, in [3]). Na falta de paradigmas e de
ligadas à mesma disciplina. Alguns elaboravam linguagens pessoais
conceitualizações compartilhadas. a maioria dos teó-
que ninguém mais entendia: geralmente. os monólogos respondiam
ricos alemães desse perlodo sem dúvida só têm em
aos manólogos. A Alemanha era um país que não tinha sociologia.
mas apenas sociólogos. como deplorava um deles. Como cada
comum sua concepção da sociologia como "ciência
um deles queria ser original. tornaram-se marginais. nem mais nem do espírito" (no sentido de Dilthey). que privilegia os
menos - um verdadeiro salão de recusados. como disse um dia. métodos "compreensivos". sua busca apaixonada dos
ironicamente. Max Weber. descrevendo seu próprio círculo. caminhos de volta a uma cultura "comunitária". assim
'Dentre todas as técnicas elaboradas para excluir concorrentes como seu quase desinteresse pelo estudo de uma
mal vistos. a imitação servil dos estilos de argumentação rivais uns sociedade alemã agitada. porém. por movimentos
dos outros tornou-se uma verdadeira moda. Os antimarxistas revela- de uma amplitude e de uma gravidade extremas ("A
vam a classe a que pertenciam seus adversórios. e os partidórios única verdadeira ciência é a das noções". escrevia
da escola formalista desprezavam a sociologia do saber. ressaltan- Tónnies).No entanto, notáveis pesquisasempíricas são
do. por exemplo. que os pensamentos de Mannheim só poderiam
conduzidos. mas sem laços com as preocupações
ter nascido no ambiente romântico de Heidelberg. propício à obs-
dos teóricos e com seus conceitos - em contraste
curidade da argumentação. aos excessos de refinamento dialético
e às idéias sublimes. Os colóquios da Sociedade Alemã de Sociolo- com a obra tão energicamente integrada de Max
gia confirmavam plenamente o que se chama de lei de Herring. Weber.
segundo a qual os adeptos de uma determinada disciplina sempre Assim. na Alemanha pré-hitleriana. fica mais fácil
são particularmente nulos no que diz respeito exatamente à sua identificar sociólogos do que ver uma sociologia -
órea de competência: os historiadoresesquecem-se do passado. os embora a profunda ambivalência de seus propósitos
psicólogos não conseguem dominar suas emoções. os economistas muitas vezes dificulte a distinção entre sociólogos e fi-
quebram o orçamento e os sociólogos são incapazes de organizar
lósofos. ou até ideólogos.
suas relações sociais.'

W.LEPENIES(in Les TraisCu/tures. Entre science et littérafure tove-


nement de /0 sociotoçs», Ed. de Ia Maison des sciences de TEORIZAÇÓES SISTEMÁTICAS POUCO FECUNDAS
l'bornme. 1990).
Dos três "pais fundadores", Simmel, Weber e
:~~:::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::!::::;:::::::::::::::::::~ :;::":;:::' -x-; ::::::::':;::::.:.:.::;:;:;:;:;:;:::;:::::;:;:;:::::::;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;":;:;!::::;:::.:;:;:;:;:::;: Tónnies. só esse último prossegue sua obra sob Wei-
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA I - DESTINOS DESIGUAIS (1916-1945)
PARTE /I 2. AS SOCIOLOGIAS ALEMÃS ENTRE UMA E OUTRA DERROTA

I
mar. elaborando uma teoria da opinião pública
(1922) e. Independentemente. levando adiante pes-
quisas empíricas sobre a patologia social (1925-1929).
Em Heidelberg. Marianne Weber anima um salão In-
fluente e estudioso. além de dirigir a publicação das
mérito de representar. como o Dicionário (1931). eu- ii.:"!!I:!·I!":
[o publicação ele dirigiu: muitos aspectos do pensa- iMt9.
mento sociológico dominante sob Weimar - e. mais :;:;:;:;:;:::::::;
particularmente. uma Importante corrente fenomeno-
lógica Ilustrada também pelos trabalhos de Max
obras póstumas de seu marido. que. antes de morrer Scheler (1923a). de Theodor Litt (1923) ou ainda de
em 1920. participara da elaboração da nova consti- Siegfried Kracauer (1922).
tuição alemã. Dentre os numerosíssimosconstrutores Mas quem será considerado o verdadeiro seguidor
de "sociologias sistemáticas" [37]. destacam-se alguns do formalismo de Simmel e o teórico "sistemático"
autores que tentam explorar. como Alfred Vlerkandt. mais conseqüente dessa geração é von Wiese. De
a herança de Simmel e de Tónnies na perspectiva sua cátedra de economia criada em 1919 em Colô-
fenomenológica aberta por Husserl,ou então opera- nia. professa uma teoria do social como conjunto de
cionalizar. como L. von Wiese. a sociologia "formal". relações interindivlduais cuja cristalização produz as
Outros. como Hans Freyer ou Othmar Spann. caracte- "formas" essenciaisde todo fenômeno observável. Co-
rizam-se mais por especulações doutrinárias e norma- mo seu mestre. ele se recusa a toda concepção
tivas estritamente ligadas à ideologia em ascensão - realista do social: o objeto da sociologia é o estudo
ou. no caso de Franz Oppenheimer. opondo-se a dos processos que associam ou dissociam e opõem
ela. os indivíduos e os grupos. Essesprocessos podem ser
Os trabalhos de Vierkandt situam esse universitário analisados como os produtos de uma atitude Indivi-
berlinês originário da etnologia (Vierkandt. 1896) na dual. fruto ela própria das tendências hereditárias (H)
encruzilhada de influências múltiplas cuja síntese ele e das experiências passadas do ator (E). e de uma
tenta fazer. Com Simmel. ele atribui à sociologia a situação constituída pelo meio natural (M) e pelos
tarefa de definir as "formas" primordiais do social. mas comportamentos de outros atores. segundo a fórmu-
rejeita o Individualismo e o positivlsmo. Recusa-se a la: P = (HxE)x{Mx(HxE)}(Wiese. 1924-1929).A sociolo-
reduzir o social à ação recíproca dos elementos e gia tem. portanto. um estatuto intermediário entre as
prefere ver sua essência não no próprio grupo. mas "ciências do espírito" e as ciências da natureza. De-
sim nas "disposições sociais" (tais como o Instinto de signando no indivíduo a unidade de observação
submissão ou de busca do reconhecimento de ou- empírica do sociólogo. von Wiese dá ao seu procedi-
trem) que o indivíduo atualiza por e no grupo: essas mento uma orientação positivista tanto mais original
disposições são instintos socializados que assumem (e. por Issomesmo. marginal) na época (Wiese. 1926)
aparências históricas variadas. e portanto só podem na medida em que Inclui veleidades de pesquisa
ser apreendidas por uma abordagem fenomenológi- empírica e de aplicação prática sob a forma de
ca (Husserl).única capaz de apreender sua essência teoria da organização. Tendo permanecido à mar-
(1928). De fato. as relações sociais nascem não das gem do nazismo. ele se viu. portanto. bem situado
condições materiais. e sim de uma união das almas para presidir. depois de 1945. aos destinos da discipli-
que só se exprime plenamente na "comunidade". for- na.
ma ideal de organização social. Abrandando a dlco- Com Freyer e Spann. a teoria confina com a
tomia de Tónnies. Vierkandt prefere considerar socie- ideologia. O primeiro. em Leipzig. combate ao mes-
dade e comunidade como os extremos de um mo tempo a sociologia formal e o nominalismo
contínuo ao longo do qual se escalonam as sociabi- weberlano (Freyer. 1930a e b), e defende um hlstori-
lidades concretas (1922). Sua obra. assim. tem o cismo radical. segundo o qual a irreversibilidade da
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA I - DESTINOS DESIGUAIS (1918-1945)
PARTE /I 2. AS SOCIOLOGIAS ALEMAS ENTRE UMA E OUTRA DERROTA

I
passagem da "comunidade" para a "sociedade" im-
plica o desenvolvimento de um estado tanto mais
autoritário uma vez que deve integrar múltiplas clas-
ses sociais heterogêneas (1933). Convencido
papel histórico de uma sociologia cuja vocação é
do
A PROLIFERAÇÃO DAS ÁREAS DE PESQUISA

Apesar da admiração Intelectual que provoca, a


obra de Max Weber não teve verdadeiros continua-
dores. Nada mais estranho, realmente, ao mestre de
li
permitir a atualização dos valores coletivos, ele se Heidelberg do que essasgrandes síntesesteóricas on-
mostra favorável ao nazismo. Em Viena, a mesma de o cientista se diferencia tão pouco do ideólogol
preocupação leva Spann a contrapor o individualis- De fato, o que acontece é que o racionalismo é
mo das sociedades de classes, portador de anarquia abertamente posto de lado para dar lugar a uma
ou de maquiavelismo, ao universalismo das socieda- apreensão imediata do mundo vivido, à qual a feno-
des de ordens (Stende), cujas comunidades espirituais menologla husserlianavem conferir legitimidade cien-
são as únicas que permitem que o homem se realize tífica [10:376-379].No entanto, nas áreas de pesquisa
(1914). Ele espera ver restauradas essascomunidades mais delimitadas, a marca - por vezes a influência -
(1931). Há de se compreender que os trabalhos de weberiana se faz notar.
Freyer e de Spann tenham na época encontrado • A especificação de uma sociologia das obras
uma repercussão respeitável. Em contra partida, os de de cultura (Kultursoziologie) - em contraposição à dos
Oppenheimer, que inaugura em 1919, em Frankfurt,a fatos de estrutura social - deve-se a Scheler (1926) e
primeira cátedra de sociologia criada na Alemanha, "se apresenta inicialmente como uma teoria científica
permanecem praticamente ignorados: na esteira de da realidade histórica" [37:35]. Alfred Weber nela dis-
Gumplowicz, ele vê o estado como um Instrumento tingue, de acordo com o método de seu irmão Max
forjado pelos vencedores para subjugar os vencidos, e retomando a oposição de Spengler, dois tipos
mas que pode desaparecer sob sua forma autoritária ideais: a "civilização" (que inclui a ciência positiva e
se a grande propriedade fundiária, responsável pelo a técnica) universal e transmissívelde uma sociedade
capitalismo e pela luta de classes, for abolida - le- para outra, e a "cultura" (por exemplo: a religião)
vando a um liberalismo social inspirado em Proudhon que é, pelo contrário, única e intransmissível,pois es-
(Oppenheimer, 1923-1933). tá ligada a um povo e a uma época [portanto, ela
"Se perguntassem", escreverá então Aron, "para só pode ser estudada por si mesma, pois foge ao
que serve a sociologia sistemática, talvez devêssemos evolucionismo histórico (1927-1935)]. Em oposição a
responder: para nada. Se, pelo contrário, nos pergun- esse procedimento essencialmente filosófico, Thurn-
tassem: que Ihes ensinou ela?, responderíamos: a wald desenvolve a tradição comparatista inaugurada
renunciarmos a fórmulas simples como coerção ou por M. Weber, explorando sua ampla cultura etnoló-
imitação, a compreendermos melhor as formas infini- gica (1931-1935).
tamente diversificadas das relações entre pessoas, os Mas, nesta área, os trabalhos mais significativos
tipos opostos das relações sociais, as trocas incessan- são os de dois pesquisadores que só mostrarão todo
tes entre indivíduos e entre indivíduos e formações seu valor no período seguinte. O trabalho do austría-
sociais, a presença dos indivíduos até na coisa social co Alfred Schutz (1932) é, sem dúvida, o mais promis-
mais compacta, a presença da coletividade até nos sor; ele recorre à fenomenologia husserliana para
contatos individuais mais fugitivos" [37:44]. tentar prolongar, retificando-a, a sociologia "com-
preensiva" proposta por Weber.
Aliás, o jovem Norbert Elias redige em 1933 seus
primeirostrabalhos sobre a corte de LuísXIV (1969) e
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
I - DESTINOS DESIGUAIS (1918-1945)
PARTE /I

I
2. AS SOCIOLOGIAS ALEMAS ENTRE UMA E OUTRA DERROTA

~iy publica em Basiléia suas pesquisas


autocoerção individual
sobre o papel
e do desenvolvimento
da !:ll'll!!:':!:::]:
~:l:~~
do es-
tado no "processo de civilização" (1939a e b), com :::::::::::::::::::
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referências explícitas a Weber, a Marx e - exceção
OS INDiVíDUOS CONSTROEM notável - a Freud. Ali já são severamente critica das
O MUNDO SOCIAL COMO SOCiÓLOGOS as reduções totalizantes ou, inversamente, Individualis-
tas que dividem entre si, na época, o campo teó-
A contribuição essencial de Schutz é mostrar que a pes- rico; o acento é colocado, de maneira muito webe-
quisa dos significados que sua ação assume para o ator
ria na, no aspecto dinâmico e Instável das configu-
não é própria só do sociólogo que deseja explicó-Ia, mas é
rações históricas que os indivíduos constroem no
um procedimento constante dos atores sociais na vida co-
próprio processo de suas interações, e no Interior das
mum - portanto, como Weber bem o vira, que toda ação é
significativamente orientada pela ação do outro. ~ra, a ob- quais eles determinam seus comportamentos. Depois
servação dos procedimentos cotidianos de interpretação da da guerra, suas concepções farão escola na Inglater-
realidade social por parte dos atores mostra que, com exce- ra e nos Países Baixos.
ção das relaçóes face a face entre íntimos (os "consocia- • A sociologia do conhecimento (Wissenssoziologie)
dos"), os meros "contemporâneos" constroem - através da nasce durante esse período, sob os auspícios do filó-
"tlpificação" - modelos Ideais dos comportamentos do outro sofo Scheler e do germano-húngaro Karl Mannheim.
que Ihes permitem ao mesmo tempo interpretar esses com- Em Colônia, o primeiro reage contra o historicismo
-&./portamentos e definir seus próprios comportamentos. Trata-se positivista e o determinismo marxista distinguindo vá-
~e processos de construção de regras típicas de comporta-
rios tipos de conhecimento, nenhum dos quais é
~ mento (porque idealizadas através da redução de experiên-
superior aos outros; a "essência" deles permanece
---..)U\ cios pessoais ou de conhecimentos transmitidos) que devem
_ constituir o objeto de uma sociologia compreensiva - que Imutável sob a pluralidade e a variabilidade dos fa-
'- ~ portanto não pode fundamentar-se na empalia e, por isso, tores sociais que determinam suas formas históricas e,
~ permite superar a oposição clóssica entre objetivismo e sub- por isso, não definem nem seu conteúdo, nem sua
o ~ Jetivism0 validade (1925). Para Mannheim, que vai de Heidel-
It~... No plano propriamente teórico, devemos, portanto, a berg a Frankfurt, a determinação social dos conteú-
Schutz ter sublinhado a importância do "projeto" na interpre- dos do saber não científico nem por isso é duvidosa.
tação dos comportamentos, ter distinguido entre as finalida- Influenciado ao mesmo tempo pelo relativismo webe-
des de uma ação e suas causas (toda interação só é
rlano e pelo marxismo, afirma que, segundo a
possível porque estó fundamentada na hipótese de que os
época, cada grupo humano produz, em função de
"motivos em-visto-de" do ator se tornarão "motivos porquê"
sua posição social, um conhecimento original. Assim,
de seu parceiro e vice-versa), ter mostrado o papel central
da linguagem na transmissão dos saberes sociais e, portanto, as classes dominantes destilariam "ideologias" que le-
na construção coletiva da realidade social. gitimam a ordem existente, ao passo que as "utopias"
Assim, ele prefigura certas orientaçóes maiores das socio- das classes dominadas as orientariam para a modifi-
logias da ação, da inserção e do cotidiano (cf. o capítulo cação dessa ordem. Só uma intellígentsia liberada
11I). -\7 ~ c;:]L '11
~Ll- Y' de seus laços sociais seria capaz de fazer a síntese

N~@J"'JII_"I~~~"J'l-,~;: entre
muito
essas verdades
aquém, no entanto,
parciais
do
(1929). Seu relativismo,
de seu compatriota
Georg Lukács, para o qual só o proletariado pode
~~1 Chegar
valerá
à consciência
a Mannheim
da
os anátemas
totalidade
do
histórica
mundo
(1923),
literário
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
PARTE /I I - DESTINOS DESIGUAIS (1918-1945)
2. AS SOCIOLOGIAS ALEMÃS ENTRE UMA E OUTRA DERROTA

I
[31:311-330].
• O campo da sociologia política é objeto de im-
portantes tentativas teóricas e empíricas. Ele é domi-
nado por Michels, que explorou continuamente os
seus aspectos, tanto na Alemanha, onde nasceu,
OS SOCiÓLOGOS ALEMÃES S08 O NAZISMO

A Instauração do Terceiro Reich encerra brutal-


mente esse movimento. A DGS promove seu último
I
quanto na Itália, para onde o levou a evolução de congresso em 1934, sob o controle de Ideólogos na-
suas Idéias políticas (do socialismo ao fascismo). Mui- zistas, sendo em seguida posta a pique por Freyer.
to cedo, seu estudo clássico (1911) sobre os partidos Desaparece a maioria das revistas de sociologia. Emi-
políticos havia revelado uma famosa "lei de bronze" gram os sociólogos de origem judaica - a partir de
que leva toda organização de massa a gerar e em 1933 na Alemanha, depois do Anschluss na Austrto:
seguida a perpetuar uma oligarquia profissional. Seus Mannheim para a Inglaterra, Oppenheimer para os
trabalhos posteriores sobre o nacionalismo (1929) e a Estados Unidos via Paris e Jerusalém, Elias para a In-
circulação das elites (1934) se inserem na mesma glaterra via Suíça e França. Theodor Gelger, que
problemática de análise dos fenômenos críticos da corajosamente criticou a política racial nazista (1933,
democracia - a exemplo dos que inúmeros sociólo- 1934), refugia-se na Dinamarca. Os filósofos neomar-
gos alemães da época consagram aos partidos xistas do Institut für Sozialforschung [Instituto de Pes-
(Thurnwald, 1929), à ação coletiva (Geiger, 1926), à quisa Social]. criado em 1923 em Frankfurt pelo
psicologia das massas (Sulzbach, 1923; Lederer, 1940) governo, exilam-se nos Estados Unidos, onde essa "es-
ou ainda ao imperialismo (Eckert, 1932; Schumpeter, cola de Frankfurt"será acolhida pela universidade de
Columbia. antes que seus membros, em sua maioria,
1951).
retornem à Alemanha em 1950. Os austríacos Schutz
• Por fim, um grande número de trabalhos injusta-
mente negligenciados (por causa de seu empirismo e e Schumpeter se Instalarão nos Estados Unidos e o
de sua autonomia relativamente às especulações húngaro Lukács encontrará refúgio na União Soviéti-
teóricas da época) e referentes, no essencial. aos fe- ca, depois voltará a Budapeste em 1944. Alguns
nômenos de classes e de estratificação, revelam a outros, como René Kbnig, exilam-se temporariamente.
Influência da corrente socialista sobre a análise socio- Outros, enfim, se encerram em áreas de estudo me-
lógica do capitalismo e da sociedade industrial - Ini- nos visadas (e mais apreciadas!), como a etnologia,
ciada anteriormente por Weber e. sobretudo, por o folclore ou a geografia humana (Mühlmann, ín [3]).
Sombart [12]. O recenseamento profissional de 1925 Com exceção dos colaboradores abertos do regime
forneceu o material de base de pesquisas importan- (Freyer, Ipsen, entre outros) - que, em oposição à
tes sobre a classe operária (Woldt, 1926; Jost, 1932) e DGS e à Associação Internacional de Sociologia
as "novas classes médias", seu estatuto social e sua (1949),se associarão depois da guerra ao Instituto In-
ideologia (Kracauer, 1930; Dreyfuss, 1933; Lederer, ternacional de Sociologia (fundado antes por Worms
1937), assim como trabalhos pioneiros na área da e reaberto em 1949) (Weiss. ln [52]) -, os sociólogos
mobilidade social (Mitgau, 1928; Geiger, 1932). Inde- que permaneceram no país foram Individualmente
perseguidos, mas a sociologia enquanto tal não foi
pendentemente dessa corrente, na Áustria, o econo-
prOibida: não acariciavam alguns a esperança de
mista liberal Joseph Schumpeter prossegue seus
trabalhos teóricos sobre as classes sociais (1951) e Uma "ciência" social que seria posta a serviço da re-
volução alemã [31:331]? Realmente, a história da
Paul Lazarsfeld, então socialista, leva adiante pesqui-
SOciologiaalemã vai prosseguir, quanto ao essencial,
sas empíricas sobre a juventude (1931) e sobre o
nos Estados Unidos...
desemprego (1933).
I- DESTINOSDESIGUAIS (1918-1945)
3. A SOCIOLOGIA ATRAVESSOU O ATLÂNTICO

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-o." especulativa dos construtores de grandes sistemas
teóricos em proveito da elaboração de conhecimen-
tos realmente "positivos" - ou seja, totalmente libertos
de ideologias políticas e sociais. baseados na pesqui-
sa empírica indutiva. permitindo aplicações sociais
Imediatas. A crença no progresso continua. portanto.
fundamental na sociologia americana do segundo
período; só que esse progresso não passa mais pela
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA I - DESTINOS DESIGUAIS (1918-1945)
PARTE /I 3. A SOCIOLOGIA ATRAVESSOU O ATLANTlCO

II
reforma moral. e sim pela ação social cientificamen-
te conduzida (Bramson, in [16]).
Assim, num primeiro momento, os esforços vão
concentrar-se no estudo da mudança social e dos
desarranjos que ela acarreta (Ogburn, 1922) - e se
ricana. longe, porém, de rejeitar qualquer orientação ·li·!:!·:I:·::I!~:
teórica, ele se caracteriza antes por sua desconfian-
ça de um procedimento hipotético-dedutivo
parta de um corpo sistematizado de postulados, pre-
ferindo estudar cada fenômeno social particular no
::jià9.
que :;:;:;:;:;:;:;:::;

norteiam mais pela descoberta de terapêuticas para quadro de problemáticas construídas segundo "roolo-
os "problemas sociais" do que pelo entendimento dos nalidades" específicas. Estasúltimas mais definem fór-
princípios gerais de funcionamento e de evolução do mulas originais de investigação empírlca de fatos a
sistema social. O financiamento dado pela família que o pesquisador permanece Inteiramente submeti-
Rockefeller à sociologia até o início dos anos 30 será do, do que abstrações conceituais por meio das
determinante na definição e no prosseguimento (se- quais essesfatos sejam construídos e Interpretados. Es-
não na realização) desse objetivo, por intermédio de se empirismo, portanto, é naturalmente pluralista:
fundações como o Conselho da Pesquisa em Ciên- cada escola elabora a sua problemática, tomando
cias Sociais (SSRC)e o Instituto de Pesquisa Social e emprestado das tradições científicas exteriores ele-
Religiosa (ISSR),criado em 1922 para "aumentar a efi- mentos teóricos e conceituais que ela seleciona e
cácia da ação empreendida em favor do bem reinterpreta muito Iivremente.lAssim, a racionalidade (
pelas forças sociais e religiosas do mundo, em parti- "ecológica" caracteriza a orienToção teórica da esco-
cular pela cristandade protestante" (citado in [70:42]). la de Chicago e a racionalidade psicanalítica a do I
Numerosas universidades no país beneficiam-se dele. culturalismo de Columbia - como, mais tarde, o mo-
Além disso, em 1925, o Purnell Act institucionaliza o delo organicista orientará o funcionalismo ou a teoria
apoio governamental à sociologia rural que, a partir dos jogos, o, interaci~sm~~ ....) --
daí, ganha sua autonomia. -----oe-tãlo, e manifesto o desejo de romper com o
O SSRC,ao financiar em Chicago (cuja universida- passado sócio-filosófico e puramente especulativo da
de é mantida pelos Rockefellers) um Local Commu- disciplina. Os sociólogos europeus do final do século
nity Research Committee, está na origem dos XIX são parcialmente ignorados: desde a origem, pre-
problemas que vão ocorrer no departamento de so- fere-se Le Play e Tarde a Comte e Durkheim, Simmel
ciologia - e, de um modo mais geral. no interior da a Marx e a Weber. Farão com que os estudantes
disciplina e de seus órgãos. A American Sociological leiam coletâneas de textos consagrados a um objeto
Society (ASS) sofre, de fato, a partir de 1930, uma empírico particular, ou então, no caso de obras teó-
queda brutal do número de membros, devida, por ricas, de um ecletismo cuidadosamente seletivo - a
um lado, à multiplicação de associações regionais e, exemplo da volumosa /ntroduction to tha Se/anca of
por outro lado, à clivagem que se abre entre os "an- Soci%gy [Introdução à Ciência Sociológica). de Ro-
tigos", ligados à tradição teórica e reformista dos pri- bert E. Park e Ernest W. Burgess (1921), o taxtbook
meiros tempos de Chicago (Eliwood, 1933, 1938), e mais utilizado até a publicação do primeiro livro de
os "modernos", arautos da pesquisa estatística de fi- Talcott Parsons (1937). Mas serão sobretudo os esfor-
nalidade prática (Ogburn, 1922): o American Journa/ ços de William F. Ogburn, que se transferiu de
of Soci%gy de Chicago, acusado de haver traído Columbia para Chicago em 1927 (e passou à dire-
os primeiros, perderá em 1936 seu estatuto de órgão ção da ASSem 1928), que farão a sociologia ameri-
oficial da ASS,em proveito da American Socicioçica' cana ingressar na era de uma metodologia estatís-
Review [70). tica cuja sofisticação será crescente. Por fim, uma
O "empirismo" domina, portanto, a sociologia ame- característica notável dessa sociologia essencialmen-
1- DESTINOS DESIGUA IS (1918-1945)
3. A SOCIOLOGIA ATRAVESSOU O ATLANTlCO

te pragmática é que ela atribui a si mesma, como


missão primeira, a elaboração de "tecnologlas sociais"
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capazes de resolver as questões que geram as suas ~:~:!:~~
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problemáticas: o tratamento dos fenômenos de mar-
~ ginalidade, de criminalidade e de segregação social
~ -o será objeto dos Urban Area Ptojects, a que se atrela-
p o
co rão os pesquisadores de Chicago, ao passo que os
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-o de Columbia se aprofundarão mais tarde na tecnolo-
(1)

C11
s gla das sondagens pré-eleltorals e das pesquisas de
.:53 marketing. Por isso, pôde-se descrever essa geração
-o de pesquisadores como a dos primeiros profissionais
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da sociologia: "Dos europeus, podemos dizer que são
m sociólogos regulares; os americanos foram os primeiros
I \.
Cf)
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sociólogos seculares" [55:8].
Durante esse período, duas "escolas" dominam su-
s: cessivamente: a chamada "escola de Chicago" nos
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anos 20, depois aquela - de caráter menos Instituclo-
nal - que se desenvolve ao redor da universidade de
a.
o Columbia durante a década seguinte. Mas, ao mes-
~~ I ro ) Io mo tempo, em Harvard, prossegue e se reforça uma
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» reflexão teórica que, na virada dos anos 40, come-
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> çará a desafiar o empirismo dominante [32].
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A CIDADE COMO LABORATÓRIO
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(J1 A sociologia americana não só nasceu em Chica-
go como também constituiu ali a primeira verdadeira
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"escola" de sua história - ainda que sua integração
teórica possa parecer menor do que sua unidade
-o
empírica [45]. Sua firme implantação numa grande
'"
(Xl

cidade industrial, onde as últimas ondas de Imigra-


-o ção multiplicaram os guetos que ameaçam graves
~ "problemas sociais", explica que ela tenha desenvolvi-
do uma tradição de sociologia urbana e, de um
-o
b modo mais amplo, de pesquisa sobre as ações recí-
b
procas dos indivfduos e de seu ambiente.
A cidade é, de fato, considerada por essessoció-
logos não apenas como um laboratório privilegiado
de análise da mudança social e dos fenômenos de
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA I - DESTINOS DESIGUAIS (1918-1945)
PARTE /I 3. A SOCIOLOGIA ATRAVESSOU O ATLANTICO

mIili~ljili

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A CIDADE COMO LABORATÓRIO SOCIAL

'Uma das razões que fazem da cidade um lugar especialmen-


te propícia ao estudo das instituições e da vida social em geral é
sa concepção "espacializada" do social e. reclproca- W((ii
mente. socializada do espaço. característica da
escola de Chicago. tem claramente suas origens em ::::::::::::
sua própria tradição behaviorista e na sociologia for-
mal alemã. Seus promotores - Pork, aluno de Windel-
;119$.

band e de Simmel. chegado a Chicago em 1915


que. nas condições da vida urbana. as tnstítuiçóes se desenvolvem
diante dos nossosolhos: os processos de seu desenvolvimento são depois de uma carreira de jornalista. e Burgess.um
acessíveisà observação e. definitivamente. à experimentação. geógrafo - muito cedo a desenvolverão em sua In-
'O que também faz da cidade um lugar favoróvel ao estudo trodução e a aplicarão no estudo das Interações do
da vida social e lhe confere o caróter de um laboratório social é meio urbano e dos comportamentos humanos (Pork,
que. na cidade. cada característica da natureza humana é não só Burgess.McKenzle e Wirth. 1925). Mas o fundador da
visível. coma aumentada. nova orientação pode ser considerado um artigo
'Na ~berdade própria da cidade. todo indivíduo. seja qual for a
programático de Park ("A cidade: propostas de pes-
sua excentricidade. encontra em algum lugar um meio onde se
quisa sobre o comportamento humano em meio
desenvolver e onde exprimir de certa maneira a singularidade de
urbano". 1916) (cf. [25 : 79-126]).
sua natureza. Uma comunidade mais reduzida às vezes tolera o ex-
centricidade. mas a cidade muitas vezes lhe concede um prêmio.
Essaproblemática inspira e norteia. para além da
Sem dúvida nenhuma. um dos atrativos de uma cidade é que ca- sociologia urbana. inúmeras pesquisas sobre os fenô-
da tipo de indivíduo - tanto o criminoso e o mendigo quanto o menos de marginalidade (Anderson. 1923; Cressey.
homem de gênio - pode encontrar em algum lugar a companhia 1932; Wirth. 1928). de segregação étnica (Zorbaugh.
que lhe convém. de mado que o vício e o talento. que eram su- 1929; Frazier. 1939; Hughes e Hughes. 1952; Park.
focados no círculo mais íntimo da família ou nos Umitesestreitosde 1950). de crlminalidade (Shaw e McKay. 1929; Shaw.
uma pequena comunidade. acham aqui um cjrno moral onde po- 1930; Sutherland. 1937. 1949). de delinqüência juvenil
dem florescer. (Shaw e McKay. 1939; Thrasher. 1927) ou ainda de
'O resultado é que. na cidade. todas as ambições secretas e
doença mental (Faris e Dunham. 1939). Os métodos
todos os desejos reprimidos encontram expressão em algum lugar.
privilegiados são o estudo do meio. as monografias
A cidade amplificada exibe e ostenta as mais variadas manifesta-
ções da natureza humana. É issoque torna interessante.e até fas- sobre bairros. a observação participante e a análise
cinante. a cidade. É isso.aliás. que faz dela o lugar por excelência de histórias de vidas. à qual Thomas e Znanieckl
da descoberta dos segredos do coração humano e de estudo da (1918-1920) concederam títulos de nobreza e que
natureza humana e da sociedade.' deve revelar as relações entre um indivíduo e seu
ambiente (Thomas. 1923; Znanieckl. 1936). A maior
R.E. PARK.'A cidade como laboratório social' (1929). Citado in parte desses trabalhos. sem dúvida. permanecem
[25:179J. amplamente descritivos e não raro só reivindicam a
"ecologia urbana" para ganhar um estatuto acadê-
mico. Mesmo assim. eles demonstram. por sua preo-
desorganização e de reorganização mQrfológicas e Cupação em situar seu objeto empírico numa proble-
culturais que ela gera. mas também como uma "co- mática mais global. a autonomização da pesquisa
munidade ecológica" que reúne elementos heterogê- empírica em relação a um reformismo de obtuso - a
neos (espaciais. sociais e culturais) em permanente fim de Inscrever a intervenção política no âmbito do
interação. Cada comunidade é a resultante de for- conhecimento científico de uma realidade social eu-
ças diversas. de equilíbrio precário. e cujo desequilí- Ia harmonia deve ser restaurada sem subverter suas
brio gera fenômenos de desorganização que atingem estruturas [44). \ T;'\. \ \ (\ ,.
o espaço. a coletividade e a personalidade [25]. Es- - Â2-. .r: ~ ~ ~'\w <, "'"" \':~\..'v.
JIh. - ~ ~- --r---'" 'S-t- "~~ ~.
\~\u'O~~ kL~~l~ ~~~' "'- ~
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA I - DESTINOS DESIGUAIS (1918-1945)
PARTE 11 3. A SOCIOLOGIA ATRAVESSOU o ATLÁNTlCO

*~8l\\\~
,l',~,~,~,f',~No entanto, na virada dos anos 30, a estrela de ainda mais tanto essa realidade quanto sua percep- :11,:,\:111'1111
!j\~4.Chicago jó começa a empalidecer. Uma nova gera- ção. Se podemos, no caso dessa tradição de peso. ij:i:~
:;~,::::::::,::
ção (a "segunda escola de Chicago") mobiliza-se ao quisa, falar de "escola culturalista", é na medida em :,:,:,:,:,:,:m
redor de Herbert Blumer ou de Everett C. Hughes. O que sua problemótica original é a dos efeitos do
primeiro, trabalhando ali desde 1928, desenvolve o ambiente cultural - e, particularmente, das subcultu-
alcance sociológico dos ensinamentos do psico-soció- ras de classes - sobre a formação das personalida-
logo George H. Mead (1934) e torna seus próprios des sociais e dos comportamentos Individuais [55).
estudantes atentos aos fenômenos da interação so- Realmente, Columbla é a fortaleza de uma escola
cial. O segundo, aluno de Pork. rompe com os obje- de antropologia cultural onde se destacam, na épo-
tivos reformistas de seus predecessores e convida a ca, na esteira de Boas, Kroeber e Benedict, as Mar-
~,,~procedlmentos empíricos melhor controlados - em garet Mead, Linton e demais Kardiners.
~~partlcular no campo da sociologia do trabalho, de Essa série de pesquisas foi Inaugurada em 1924
'(Vque é o principal fundador e que enriqueceró com pelo casal Lynd, que, sem formação sociológica an-
.\ numerosas e célebres monografias [46]. Mas seus es- terlor e com objetivos confessos de reforma social,
o. '3 I tudantes é que melhor ilustrarão suas orientações Ino- realiza graças aos financiamentos do ISSRa mono-
r....
"'J, vadoras (cf. capo. 111).Em compensação, sobe a grafia de uma cidade industrial média de Indiana,
~ - estrela de Columbia, cujo "operacionalismo" sal por batizada por eles como Middletown e considerada
.' um momento vitorioso de um conflito que talvez in- supostamente um microcosmo significativo da socie-
~\ cldisse menos nos métodos do que na orientação de dade americana inteira (Lynd e Lynd, 1929). Levada
~ _ uma sociologia [ó menos reformista e mais utilitórla. A adiante de acordo com um procedimento calcado
~':.. escola de Chicago, de fato, se abrira amplamente à no da antropologia cultural anglo-saxã e com méto-
\,~.. diversidade metodológica; seus resultados, porém, ho- dos retomados de Chicago [32], a pesquisa aborda
" viam desapontado seus clientes, que esperavam "so- meticulosamente a totalidade das dimensões sociais,
luções" próticas para os problemas urbanos. Sob o econômicas e culturais da comunidade, sem outra
2 choque da grande depressão, a sociedade ame rlca-
, na sem dúvida exigia mais de sua sociologia ...
ambição além da descritiva. A obra, espelho voltado
para uma América desiludida que busca sua Ima-
gem, conhece imediatamente um imenso sucesso
público. Ela valeró a Robert Lynd herdar em 1931 a
EM BUSCA DA SOCIEDADE AMERICANA cadeira de sociologia deixada vacante por Giddings
na Universidade de Columbia. Sucederó a essa pes-
Enquanto Park e os seus desmontavam o fato ur- quisa aquéla levada adiante por W. Lloyd Warner
bano, surgira um Interesse novo na Universidade de (vindo diretamente da antropologia) e sua equipe
Columbla pelos "estudos de comunidades". sobre Yonkee City (1941-1959): Iniciada em 1930 com
A Industrialização arruinou a Gross Root Society e meios consideróveis, ela vai durar cinco anos e a
a profunda integração das coletividades locais tradi- pUblicaç~ de seus resultados compreenderó cinco
cionais, que se diferenciaram em bairros socialmente volumes.~arner dela deduziró - entre outras - uma
homogêneos, onde aparecem mais claramente as definição da estrutura social em termos de hierarquia
distinções de classe, ameaçando a crença america- esfratificada de status, onde a dimensão do prestígio
na na unlcidade do sistema de valores e na "Igual- prevalece sobre a da riqueza, que marcaró a socio-

socior-\;n'1:::::dt ~n~~~\, ~
dade de oportunidades". A crise de 1929 e a grave logia americana e segundo a qual uma "classe
depressão que se seguiu evidentemente aguçarãO
serlo

~~c. \)
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA I - DESTINOS DESIGUAIS (1918-1945)
PARTE /I 3. A SOCIOLOGIA ATRAVESSOU O ATLÂNTICO

I
declaram dela fazer parte e são reconhecidos como
tais.)
Essasprimeiras pesquisas provocarão outras, em
Columbla e em outros lugares, valendo-se de méto-
dos que Irão se tornando cada vez mais quantitati-
tram Igualmente a preocupação que se tem, em
Harvard, de inscrever explicitamente a pesquisa em-
pírica em quadros teóricos diversificados, já que
Mayo (1933) toma o cuidado de situar seus resulta-
dos tanto em relação às teses de Durkheim e de
vos e sofisticados, tendo todos eles a pretensão de Pareto quanto aos trabalhos de Piaget, Freud ou Ja-
descrever ,a sociedade global através de uma de net - deixando boas esperanças sobre o papel que
suas comunidades (Doiiard, 1937; Davis e Doiiard, essa universidade vai desempenhar no desenvolvi-
1940; Davls e Gardner, 1941; Whyte, 1943; West, mento da teoria sociológica.
1945). Seu principal mérito é ter sublinhado a existên- O fundador do departamento de sociologia de
cia de classes sociais, ou até de verdadeiras castas Harvard foi PitirlmSorokin.Tendo Imigrado aos Estados
(em particular entre brancos e negros), e o declínio Unidos em 1924, ele ocupa um lugar original na so-
da relativa igualdade das oportunidades característi- ciologia americana - mais particularmente até a
ca das soo.edo des pioneiras. Quando, no final dos Segunda Guerra Mundial. Marcado por sua experiên-
anos 3D, os Lynd voltarem ao seu campo de pesqui- cia política (foi banido da União Soviética depois de
sa para avaliarem os efeitos da grande depressão, ter sido secretário de Kerensky) (Sorokin, 1925), em-
suas conclusões serão mais pessimlstasainda (1937) - preende uma reflexão aprofundada sobre a
a exemplo de um grande número de pesquisadores mudança histórica, que ele analisa sob seus três as-
cada vez mais críticos para com a organização só- pectos: social, cultural e psíquico (1947).rõ conceito
cio-econômica e a cultura norte-americana, e que de "civilização" desempenha aí um papel central:
ressaltam a contradição agora existente entre os va- designa um grupo de sociedades de orientações cul- ((_
lores do Amerícan Creed e a realidade (Horney, turais e de instituições sociais semelhantes, que pas- ~
1937; Lynd, 1939; Warner, 1941; Laskl, 1948). sam por uma história cíciica ao longo da qual sua J<J.'I.-
civilização se desenvolve, declina e desaparece, ao
mesmo tempo que se exacerbam o hedonlsmo e a ~
HARVARD E A REAÇÃO TEÓRICA violência (1937-1941). Sua oposição a todo evoluclo-
nlsmo (1943), suas preocupações macro-soclológicas ~ \)
Antes mesmo que nela seja fundado, em 1930, e históricas, suas constantes referências aos autores I ~
um departamento de sociologia, a Universidade de europeus [15], assim como suas críticas ao empirismo ~~
Harvard lá tinha se destacado por uma vasta pesqui- dominante, explicam sua posição um tanto marginal ~ • ~
sa experimental, levada a efeito de 1927 a 1932 por na sociologia americana, que no entanto lhe deve
Elton Mayo junto aos trabalhadores da Western Elec- seu primeiro e magistral estudo teórico na área da
tric em Hawthorne (Chicago) - sob os auspícios do mobilidade social (1927) [23D
laboratório de estudo da fadiga (criado por L.J. Hen- Em 1944, ele é preterido na Universidade de Har-
derson, Introdutor da obra de Pareto nos Estados Uni- vard em favor de Parsons,que criará ali, dois anos
dos) e, mais tarde, do departamento de pesquisa mais tarde, o novo e pluridisciplinar Department of
industrial. Considerados os fundadores da "sociologia Social Relations (ao passo que Sorokin dirige em Har-
Industrial", essestrabalhos ressaltam, contra o tayloris- vard o Center in Creative Altruism), antes de ser
mo dominante, a Influência determinante das rela- eleito para a presidência da ASSem 1949. Também
ções sociais na fábrica sobre a produtividade dos Parsons,porém, manifesta pouco interesse pelas pes-
trabalhadores (Roethiisberger e Dickson, 1939). Mos- quisas de campo, e desdenha não menos do que
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA I - DESTINOS DESIGIJAIS (1918-1945)
PARTE /I 4. CONCLUSÁO

. , ~j~[i~

I
seu predecessor os clássicos americanos. Mas. sem
dúvida. seu projeto inteiectual e suas orientações só-
cio-filosóficas seduzem mais. Em seu primeiro trabalho
(1937). Pareto. Weber e Durkheim são os três autores
(com o economista inglês Marshall) cujos pontos de
com a filosofia e sua fascinada angustia diante dos ~:~:~(:)~:~
dilemas da história entravam seu caminhar pelas vias H:~9.
que acabam de lhe ser magistralmente traça das; e ::~::::~::~::
o que a peste marrom vai fulminar serão apenas bri-
lhantes promessas. Quanto à sociologia inglesa.
convergência ele busca. numa concepção original observemos que eia só deve uma sobrevida precária
da ação que se pretende distante ao mesmo tempo (ao lado de uma sociografia que prossegue à parte)
do utllltorlsrno. do culturalismo e do positivismo [13). aos esforços solitários de Morris Ginsberg. que ocupa
Assim. a "estrutura da ação sociai" será definida co- na london School of Economics a única cátedra
mo consistindo em modelos culturais de significações. concedida por um esfablishmenf universitário e políti-
institucionalizadosno sistema social e na cultura. e in- co que lhe é francamente hostil [56).
teriorizados por indivíduos que os atualizam em seus Assim. ela vai precisar ultrapassar suas fronteiras
comportamentos. em função das situações com que natais para atingir uma maioridade que. do outro la-
se deparam. do do Atlântico. já foi aicançada quando a Europa
Mas somente depois da guerra Parsonsdesenvol- se ressente da derrota das democracias. Sem dúvida.
verá uma teoria geral que se tornará dominante na o novo anfitrião americano não podia ser mais gene-
sociologia americana. Enquanto isso. Harvard se pre- roso: transformações sociais aceleradas. ética protes-
para para se tornar o epicentro de uma socioiogia tante de racionalização do saber e das práticas.
americana reconciliada com as preocupações teóri- pragmatismo orientado para a eficiência e que des-
cas de seus "pais fundadores". que alguns autores confia das ideoiogias. capitalismo convencido de seu
importantes tentaram conservar vivas contra o empi- dever de mecenato científico e social. universidades
rismo dominante da época (Maciver. 1917; Ross. que acolhem bem os inovadores - são outras tantas
1920; Giddings. 1924; Cooley. 1930; Eubank. 1932; boas fadas que os berços europeus da sociologia ja-
Mead. 1934). mais viram reunidasl

4. CONCLUSÃO
o próprio interior das sociedades que aca-
N bam de dá-Ia à luz. a jovem disciplina socio-
lógica passará. portanto. por destinos muito dife-
rentes. Na França. o desaparecimento de um mestre
a deixa inconsoiávei e em seguida sem recursos -
como se a sociedade francesa agradecesse a uma
velha criada. que se tornou inútil depois de ter servi-
do tão bem. Na Alemanha. assim que se mobiliza
para assistir um novo estado. seus laços ambíguos
I - DESTINOS DESIGUAIS (1918-1945)
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
BIBUOGRAFIA (1918-1945)
PARTE /I

I
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çou - mesmo que timidamente - a inscrever Impo-
nentepesquisas empíricas em quadros teóricos
novos<lE0ravante, o debate incide menos sobre a le- ~~ ~
gitimidaâe dos métodos do que sobre sua eficiênci~I\-ti~
A sociologia americana acaba, portanto, de -I \ '\ ar,J
cançar um estágio de maturidade que, seja qual for ~ 1
a maneira como o julguemos, lhe permite nutrir - pa- '-'.~
ra si mesma e, de modo mais amplo, para o destino '\
internacional da disciplina - grandes ambições. ~

~~~~

1. A "IDADE DE OURO"
DA SOCIOLOGIA AMERICANA

E
m 1945, os Estados Unidos entram por cerca
de vinte anos num período de grande prospe-
ridade econômica e de relativa paz social, que, na
conjuntura política internacional, Ihes permite desem-
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 11- o TEMPO DAS AMBiÇÕES (1945-1968)
PARTE /I 1. A 'IDADE DE OURO' DA SOCIOLOGIA AMERICANA

~'~I~'I'il
ti penhar com firmeza um papel de primeira potência
mundial. Essa supremacia os leva a se colocarem
como modelo político. econômico e social. além de
protetor ativo do "mundo livre" - tanto no plano exte-
rior ("guerra fria") quanto no Interior (maccarthlsmo).
AS CONSOLIDAÇÕES INSTITUCIONAIS

Desde o início da guerra, a sociologia americana


esboçara um processo de desenvolvimento Instituclo-
nal que, acelerando-se nos anos 60, conhecerá um
:19:1

A sociedade americana readqulre confiança em fim brutal na virada dos an.os 70. A principal causa
seus valores e representações tradicionais abaladas disso é o aumento de uma demanda social cada
no começo dos anos 30; pôde-se observar (Lipset. vez mais pródiga. diferenciada e refinada.
1963) o quanto. com um intervalo de vinte anos, a A fundação Rockefeller - e, ao mesmo tempo. o
reflexão social se modificara completamente - pas- Social Science Research Councll - perde seu mono-
sando do pessimismo ao otimismo e. conseqüente- pólio de fato em matéria de financiamento: ao lado
mente, de certo radicalismo a um conservadorlsmo dos novos mecenas privados (Carnegie. Ford, Rand
que critica os valores igualitaristas que Inspiraram o etc.) aparecem financiadores públicos (ministériosdas
New Deal. Assim. não mais se trata. para a sociolo- Forças Armadas. da Agricultura, da Saúde) que pro-
gia americana, de analisar e de conjurar os fenôme- porcionam à disciplina recursos de progressão expo-
nos sociais de desvio e de desorganização, e sim de nencial e permitem multiplicar os centros de
estudar as possibilidades de uma mudança social pesquisa, as sociedades científicas e as revistas, ex-
dentro de condições de estabilidade: de fato, consi- plorar novos domínios e empregar um número cres-
dera-se que todas as sociedades industriais conver- cente de sociólogos profissionais(70). Assim nascem a
gem para um mesmo tipo. cujas características cultu- Secretaria de Pesquisa Social Aplicada (BASR)de Co-
rais, sociais e políticas dependeriam estreitamente dos lumbla. o Instituto de Pesquisa Social (ISR) de Michl-
Imperativos técnicos e organizacionais ligados ao pró- gan, o Laboratório de Relações Sociais (LSR) de
prio processo de industrialização [9:242). Harvard ou ainda o Centro Nacional de Pesquisa so-
Assim. o olhar se volta essencialmente para os de- bre a Opinião (NORC) do Colorado - todos de cará-
terminantes sociais dos comportamentos individuais ter privado. A ASS. que perdera um terço de seus
em todas as suas formas (eleitorais, profissionais. de membros desde a grande depressão, vê seus efetivos
consumo, familiares. sexuais, de vizinhança etc.), a tornarem a crescer. decuplicando o número de
fim de discernlr as exigências que entravam a reali- adeptos entre 1945 e 1970. Fato significativo, ela mu-
zação dos ideais de universalism (a igualdade formal) da de nome - American .Soclologlcal Assoclation -
e de achlevement (o sucesso) que devem caracteri- em 1963, depois de ter rnudodo sua sede sucessiva-
zar a ordem social Industrial e nortear os comporta- mente para Nova York (1953) e para Washington.
mentos dos agentes. A este respeito, o Interesse Num contexto de crise de .recrutamento (a maioria
agudo dirigido nesse período ao estudo da mobilida- dos sociólogos da geração de antes da guerra estão
de social (Lipset e Bendix. 1959; Blau e Duncan, 1967) aposentados), universidades e centros de pesquisa
revela a importância atribuída a esse fenômeno. ao apelam quer para jovens colegas (é o caso de Ro-
mesmo tempo por seu papel de legitimação da de- bert K. Merton. nomeado professor titular aos 32
sigualdade das condições, em razão da igualdade anos). quer para pesquisadores estranhos à disciplina
das "oportunidades" que supostamente indica, e por (como o psicólogo e matemático Paul F. Lazarsfeld,
sua suposta eficácia como antídoto contra a rigidez o estatístico Leo Goodman, o advogado Davld Rles-
das estruturas sociais e. portanto. contra os conflitos rnan ou ainda o jornalista WiIIlam H. Whyte). ou até
sociais (23). a estrangeiros (como o economista sueco Gunnar
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 11- o TEMPO DAS AMBiÇÕES (1945-1968)
PARTE /I 1. A "IDADE DE OURO" DA SOCIOLOGIA AMERICANA

I Myrdal). Essascontratações traduzem o afastamento


crescente entre pesquisa empírica e pesquisa teórica,
ao passo que a autoridade de Merton se deverá em
grande medida aos seus esforços para aproximá-Ias.
orientação decididamente individualista, quantitativa
e nominalista. As razões para tanto são Indissoluvel-
mente econômicas (os flnanciadores exigem resulta-
dos concretos e aproveitávels) e pragmáticas (a
sociologia só pode se tornar positiva se suas asser-
ções forem emplricamente verificáveis).
o TRIUNFO DO EMPIRISMO QUANTIFICADOR Ora, só dados quantificáveis podenorn ser objeto,
graças aos Instrumentosestatísticos,de análises rigoro-
Os trabalhos dirigidos por Myrdal (1944) sobre a si- sas e de testes de verificação, e os únicos fatos que
tuação dos negros no Início dos anos 40, ou por se podem ao mesmo tempo quantiflcar e testar são
Riesman (1950) sobre a evolução do caráter social aqueles que são diretamente observávels, e em
dos americanos (ambos financiados pela fundação grande número. O Indivíduo, assim, é considerado
Carnegie) não são, apesar de seu sucesso, represen- um acesso privilegiado às "estruturassociais" que, por
tativos do novo empirismo em vigor: antes fecham o um lado, determinam os seus comportamentos e, por
cicio da tradição das grandes enquetes qualitativas outro, resultariam da reunião dessescomportamentos.
do entre-guerras. Quanto ao estudo levado a efeito A explicação desses comportamentos, tanto quanto
em Berkeley por Theodor Adorno (1950) . refugiado dos fenômenos coletivos estruturais que eles produ-
de Frankfurt· sobre as atitudes antidemocráticas, seu zem, passa, portanto, pela identificação de "variáveis"
ecietismo metodológico o situa na junção das duas • Individuais ou coletivas . em correlação com as ati-
tr<)dições. tudes que subjazem a esses comportamentos.
LA nova orientação é, de fato, Inaugurada pelos Além disso, porque esses comportamentos são, na
primeiros trabalhos dos dois futuros representantes prática, menos acessíveisdo que os discursosde seus
:t:>_principaisda sociologia empírica contemporânea, autores, o Instrumento de observação privilegiado é
tJ.:que são Samuel A. Stouffer e Lazarsfeldl0 primeiro a pesquisa por questionário, junto a populações cui-
:' dirige durante a guerra um laboratório rntIitar para o dadosamente amostradas. Em seguida, resta medir as
~ estudo do moral das tropas; sua gigantesca enquete ligações estatísticas entre as variáveis construídas a
~~sobre as atitudes dos soldados americanos (Stouffer e partir dos dados coleta dos para efetuar Inferênclas
'~ "c ol., 1949-1950) é o protótipo da nova geração de causais (análise de correlação, regressõeslineares ou
_ pesquisas quantitativas pesadas (Merton e Lazarsfeld, não), testar sua legitimidade (análise multivariada) e
1950), e a prova concreta da nova respeitabilidade avaliar sua Intensidade (análise fatorial ou de depen-
de que goza a sociologia. O segundo, com sua ex- dência): daí a Indução de generalizações empíricas,
periência austríaca em psicologia aplicada e com ou mesmo de "leis". Por esse motivo, os conceitos ex-
~'\ sua formação baseada nas Idéias do Círculo de Vie- traídos são meramente nominais, como o demonstra
na, funda muito rapidamente o BASR,que é dirigido a multiplicação de tipologias originárias da combina-
Jt~por ele, com êxito, em Columbia, a partir de 1941; ção de medidas variadas. Essa sociologia empírica
l"'t,}' ali conduziu numerosas e célebres pesquisas sobre os tem um parentesco muito grande com uma psicolo-
meios de comunicação de massa (1944, 1948), a for- gia social de inspiração behaviorista . ao mesmo
~\Y'mação das escolhas eleitorais (1943-1948, 1954) e das tempo por seu método individualizante e pelo papel
.' atitudes políticas (1958), ou as decisões de consumo atribuído às "atitudes" (inferidas das opiniões emitidas)
(1955). na explicação dos comportamentos. Para seus pro-
Essanova geração distingue-se da anterior motores (s]~'àfa!a todos os seus utilizadores), um

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HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
PARTE /I
11- o TEMPO DAS AMBIÇÓES (1945-1968)
1. A "IDADE DE OURO" DA SOCIOLOGIA AMERICANA

I
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OS AMERICANOS
A "SOCIOLOGIA
NÃO
AMERICANA"
INVENTARAM
ação que evidentemente restava por teorízar.
O vlenense Lazarsfeld, que viera estudar nos Esta-
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dos Unidos em 1932 graças a uma bolsa Rockefeller, !f:i!}\l
Instalou-se definitivamente nesse país em 1935. Inicial-
'/ .../ praticamente todas as técnicas empíricas modernas - nos- mente trabalhando na Universidade de Newark, tor-
sos amigos da América Latina às vezes as resumem em duas pala- nou-se rapidamente o principal líder da tradição
vras: sociologia americana - nasceram na Europa. As técnicas de empirista e quantitativa que se desenvolve em Co-
amostragem foram desenvolvidas em conseqüência da pesquisa de lumbia, para onde é nomeado em 1940, ao mesmo
Booth sobre a vida das trabalhadores londrinos. A análise fatorial foi
tempo que Merton. Ele se dedica. então, à codifica-
inventada pelo inglês Spearman. A socialogia da família desenvol-
veu-se numa ótica quantitativa graças ao mineralogista francês Le
ção dos procedimentos metodológicos da Investiga-
Play. Gabriel Tarde tornou-se o campeào das pesquisas sobre a ção, à elaboração de técnicas de coleta e de
medida das atitudes e sobre a psicologia social das comunicações. análise dos dados (pane/, análise multivariada) sem,
(Ao olharmas rapidamente o cenário francês. não é exagerada fa- contudo. desprezar uma reflexão epistemológica
lar de sua vitória póstuma na épica bafalha contra Durkheim.) A aprofundada [29]. Muito rapidamente, seu nome
idéia de aplicar métodos matemáticos à análise das eleições foi aparece Indissociável da representação que vai se
objeto de trabalhos muito aprofundados de autoria de Condorcet Impor - de maneira abusiva - no mundo inteiro co-
durante a Revolução Francesa. Seus contemporâneos. Laplace e mo a própría essência de uma "sociologia america-
Lavoisier.empreenderam pesquisassociais por conta do governo re- na", para cuja exportação ele contribuiu significativa-
volucionário e seu aluno. o belga Quételet. funda a sociologia mente [64].
empírica. de maneira firme e definitiva. com o nome de 'física so-
Acima de tudo, Lazarsfeldquis demonstrar que era
cial'. / .../ Na Itália. durante a primeira metade de nosso século.
Niceforo enunciou algumas proposições claras sobre o problema da
possível conferir ao conhecimento sociológico todas
medida na sociologia e na psicologia. Ele fez uma brilhante expo- as características de um conhecimento científico,
sição do assunto em seu livro sobre a medida do progresso. Os desde que o procedimento do investigador respeitas-
alemães podem reivindicar alguns pais fundadores: Max Weber foi. se certas normas. Em primeiro lugar, é preciso passar
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por certo tempo. um entusiasta da quantificação e fez ele próprio da linguagem dos conceitos à linguagem dos "indi-
inúmeros cálculos; Tónnies inventou um coeficiente de correlação cadores", ou seja, de fatos obseNáveis. únicos a per-
inédito; e. nos feriados de Páscoa. von Wiese levava seus estudan- mitir "operacionalizar" as hipóteses mobilizando esses
tes para as aldeias. a fim de tozê-tos estudar ao vivo seus concei-
conceitos - condição necessária de sua verificação
tos sobre as relações sociais.
empírica através de métodos tanto quantitativos
'E no entanto. antes de 1933. em nenhum lugar da Europa oci-
quanto qualitativos. Em seguida. é preciso, a partir
dental a pesquisa empírica adquirira o menor prestígio.'
dessesindicadores sempre parciais, Construirquer "ín-
P.F. LAZARSFELD (1962); dices" sintéticos, quer "tipologias" qualitativas que per-
(traduzido para o francês in Philosophie des mitam medir e, às vezes, identificar a ausência ou a
sciences socia/es. Gallimard. 1970). presença, a magnitude ou ainda a intensidade do
fenômeno social considerado: essesíndices (ou esses
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"tipos") constituirão outras tantas "variáveis" de um sis-
tal procedimento se pretende pragmático. Posto co- tema explicativo hipotético que a obseNação (ou a
mo o único possível e eficaz. ele nem rejeita o pro- rnensUração) empírica deverá necessariamente testar
cedimento teórico, nem o exclui por princípio: (em termos probabilísticos, evidentemente). É preciso,
simplesmente o ignora. Não raro fecundo, contribuiu enfim, certificar-se de que as correlações observadas
para a elaboração de uma sociologia empírica da entre variáveis não são nem fictícias (devido à estru-
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
PARTE 1/ o
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I tura da amostragem analisada). nem fala ciosas (de-


vido a variáveis "intermediárias". ou a uma variável
"explicativa" comum às variáveis consideradas). nem
provindas de estruturas "causais" mais complexas no
Interior das quais essasvariáveis estão em "interação"
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HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 11- o TEMPO DAS AMBiÇÕES (1945-1968)
PARTE/I 1. A "IDADE DE OURO· DA SOCIOLOGIA AMERICANA

I
tativo), psíquico (instrumental) e cultural (expressivo),
que constituem seu ambiente, apenas um subsistema
de ação. Ele é analisável em elementos estruturais
estreitamente ligados uns aos outros: os "papéis" que
adaptam a ação social ao ambiente, por Intermédio
mudança social - através da análise comparativa da
história das sociedades globais (1966) - o leva a re-
conhecer entre as sociedades
aquelas que manifestam
mais avançadas
maior capacidade
(o-.-wadaptação inovadora, conduzindo-se por si mesmas
de
I
dos organismos vivos, as "coletividades" que definem a uma diferenciação funcional maior. Assim, ele
e controlam esses papéis, as "normas" que Integram com pactuava tardiamente com um evoluclonlsmo
essas coletividades. Deste ponto de vista, a sociologia Lantes execrado.
é apenas uma ciência da ação social entre outras - Teórico por longo tempo Incontestado, Parsonsnão
com a economia, a ciência política e a psicologia
social (Parsonse Smelser, 1956; Parsons,1969; Parsons
f deve sua preeminência apenas a sua flliação à pres-
tigiosa Universidade de Harvard, à ausência de con-
e Bales, 1955) - e deve colaborar com essas outras corrência no campo teórico e conceltual, à sua
ciências humanas. grande tolerância para com os empiristas de Colum-
Quanto à própria ação, ela se vê confrontada bia, ou ainda ao feliz casamento entre suas orienta-
com escolhas relativas ao juizo que o ator faz sobre ções sócio-filosóficas e a ideologia dominante; ele a
o objeto de sua ação, assim como com a atitude O deve também à riqueza de um "paradigma", na
que ele deve ter diante desse objeto: no primeiro I...••.
~~poca o único capaz de fornecer um quadro a
caso, seus critérios de julgamento serão "unlversalistas"
ou "partlcularlstas" e se fundamentarão na "perfor-
mance" ou na "qualidade" do objeto; no segundo
r1l.....
(O<"""análisesmacro-sociológicas - embora, em razão de
seu caráter mais conceitual e analítico do que pro-
prlamente teórico (20). sua fecundidade heurístlca
caso, suas relações com o objeto serão definidas em 9'- "permaneça limitada. De fato, seus discípulos precisa-
termos de "especificidade" ou de "difusão" e marca- "pão de muita engenhosidade para explorarem seus
dos pela "neutralidade afetiva" ou pela "afetividade". recursos e, ao mesmo tempo, renovarem e amplia-
Essasvariáveis estruturais (patterns-variables) permitem rem, com um êxito garantido, a abordagem da
tanto a análise de ações individuais quanto, conju- maioria das áreas da realidade social (Barber, 1952;
gadas com a hierarquia - "cibernética" - dos Impera- Dreeben, 1968; Johnson, 1966; Keller, ) 963; levy, 1953;
tivos funcionais, a análise das estruturas coletivas (das Smelser, 1963) - em particular na sociologia política
profissões aos tipos de sociedades globais, passando (Deutsch, 1963; Easton, 1965; Etzioni.1968; lIpset, 1960;
pela estratificação social. pela economia, pela famí- Mitcheil, 1967), muitas vezes inspirada numa reformu-
lia ou pelos partidos políticos) (Parsons, 1949, 1960J lação do funcionalismo no quadro da "teoria geral
t.
1964, 1967, 1969). Assim, em nossassociedades Indus-
triais onde prevalece a função de "adaptação", nos-
sos valores dominantes são o unlversalismo e a
r. · dos sistemas" (Buckley, 1968) [65].
O paradigma da análise funcional - Em Colum-
bla, a ambição de Merton, discípulo de Parsons, é
performance (achievement), ao passo que nossas re- ~t:;:.diferente: consiste em propor ao procedimento empf-
lações interpessoais são geralmente assinaladas pela (.tt~ rico um programa de pesquisa operaclonal e, assim,
especificidade e pela neutralidade afetiva; daí, por 1fI..\ -permitir a Integração da teoria e da prática socioló-
exemplo, a valorização das profissões científicas ou r~ glcas, cujo divórcio na sociologia americana da
técnicas, a busca e o reconhecimento do sucesso In- ~ época ele denuncia.
dividual. o desenvolvimento da família nuclear, ou O modelo funcionalista da antropologia anglo-saxã
ainda a predominância da vida econômica. Ao lon- r,,-. (Malinowskl. Radcliffe-Brown) parece-lhe capaz - feitas
go dos anos 60, a reflexão de Parsons sobre a Importantes modificações - de fornecer um método
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
11- o TEMPO DAS AMBIÇ6ES (1945-1968)
PARTE 11
1. A 'IDADE DE OURO' DA SOCIOLOGIA AMERICANA

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r;\\t: de Interpretação dos fenômenos sociais. Esse método clols) ou de razões (utilitárias ou culturais) e sim de ~li;!!:;:;:;::I~
;:,:\6. consiste em evidenciar as contribuiçôes observávels
funções, cuja necessidade reside no próprio cerne de :~;Et
::;~";::";:
que alguns fenômenos fazem à manutenção e ao
uma ordem social de que o que é problemático já :;:;:;:;:;~:;:;:;:
funcionamento de sistemas sociais mais amplos, no
não é a gênese, e sim a conservaçõo: daí o aban-
Interior dos quais eles estão em interação com outros
dono da abordagem histórica e o surgimento de um
fenômenos. Esse funcionalismo "relativizado", porém,
ponto de vista estrutural que só se interessa pelo
está atento ao caráter por vezes afuncional. ou até
agente social enquanto lugar de Interlorização e de
disfuncional, ou, pelo contrário, plurifuncional de cer-
exercício de mecanismos de regulação e de contro-
tos elementos de um sistema social; convida também
le próprios do sistema; daí a referência tanto ao
à busca de seus equivalentes funcionais e, principal-
estruturalismo de Durkheim quanto ao Individualismo
mente, à busca da função "latente" que pode
de Weber, à biologia de Cannon e à antropologia
esconder do observador ou dos próprios agentes
de linton, à psicanálise de Freud e à cibernética de
+- uma função "manifesta" (Merton, 1949). Wiener ...
~~ Sua aplicação em diferentes áreas permitiu a Mer-
ton elaborar com sucesso inúmeras dessas teorias "de
médio alcance" (middle-ranged) que ele tanto dese-
A ASCENSÃO DAS OPOSIÇÕES
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[ou. em particular na área da anomia e do desvio
}.~k> (Cloward e Ohlin, 1960; Merton e Nisbet, 1961; CU- A hegemonia parsoniana e, para além disso, do
- nard, 1964), da relação entre status e papéis, da
funcionalismo, são objeto, no final dos anos 50, de
~ Influência nos grupos, da personalidade e dos com-
violentos ataques. Num primeiro momento, esses ata-
portamentos burocráticos ou ainda dos efeitos con-
ques poderão ser contidos; mais tarde, com a preci-
tra-intuitivos da ação coletiva (Merton, 1949; Merton
~ pitação de graves episódios que os políticos não
e col., 1959), assim como no campo da sociologia
mais controlam (fracasso do programa de combate
~\.;) da ciência (Merton, 1938, 1973). O tema da burocra-
à pobreza, agitação racial, revolução cubana, Início
cia suscitou especialmente importantes trabalhos, que
da guerra do Vietnã), a própria crise da sociedade
se Inscrevem numa ótica mertoniana (Selznick, 1949;
americana fará sucumbir esse tipo de sociologia [9].
Blau, 1952; Gouldner, 1954). Mas os funcionalistas
Mas antes disso algumas pessoas se perguntam sobre
americanos geralmente esqueceram a prudência de
a validade dos postulados funcionalistas, questões es-
Merton, que sempre recusou os postulados de unlcl-
quecidas reaparecem, como as do p o cíe r (Dahl,
dade e de Integração funcional do sistema social
1961; Lenski. 1966) e do conflito (Dahrendorf, 1957) _
global recomendados por Malinowski. Isso geralmente
mesmo quando se propõe uma interpretação funclo-
levou a reduzir a estrutura social à das profissões e nalista (Coser, 1956).
os comportamentos individuais ao simples desempe-
nho de papéis determinados pelo estatuto profissional
·r No entanto, é na própria Universidade de Colum-
t!> bia, onde se encontra Merton, que a "sociologia crí-
de agentes que supostamente partilham uma única
~ [Ice" da década seguinte encontra seu principal
c u I,!!.LI a . r1~sPirador: c. Wright Mills. A origem universitária perifé-
som o funcion~I!'0..l-c.a_~,:~:Ólise sociológica torng
c nco (Wisconsin) desse sociólogo (morto prematura-
encontrgr .uma vei<:l-sQcio-fiiõsófica que remonta
~mente em 1962) sem dúvida o autoriza a desafiar
~éculo XVII (Hobbes) e não dá ganho de causa
Um establishmenf de que estigmatiza ao mesmo tem-
~~hum dos ~~~o soclol9gia clássicO'~\NãO
po as teorizações sistemáticas (Harvard) e as práticas
está mãis erilousca ãe causas (sociais ou eda-so-
empiristas (Columbia), sem deixar de denunciar seu

~ ~kV\) ~Ó ~k M~L.~"~
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 11- o TEMPO DAS AMBiÇÕES (1945-1968)
PARTE 11 1. A 'IDADE DE OURO' DA SOCIOLOGIA AMERICANA
~~~:::~::~~:

I~~~[:~ij
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esoterismo e sua falsa neutralidade Ideológica. Ele re-
corre à utilização de uma "Imaginação sociológica"
pírlco da pesquisa é muito falha: prova disso é que
a teoria parsoniana é mais analítica do que sintética.
I1I11
~~~~i.~~
(1959) que relaciona as "experiências pessoais"vividas Mas podemos observar que prótlcos e teóricos coe-
na realidade cotidiana e os "objetivos coletivos de xistem muito pacificamente - uns parecendo acomo-
estrutura social", ilustrados por seus próprios trabalhos dar-se com os princípios, objetivos e procedimentos
sobre a alienação das classes médias (1951) e, so- dos outros, e reciprocamente [70] -, e que as acusa-
bretudo, acerca do poder colusórlo das elites econô- ções feitas provêem da periferia e visam Indiferente-
micas, políticas e militares nos Estados Unidos (1956). mente a ambos os tipos de pesquisadores. De fato,
Desse modo ele reata, aliás, com a vela histórica e não compartilham Implicitamente uma mínima con-
crítica da sociologia clássica européia (Marx, Weber, cepção comum da ação social e do sistema social
Mosca) e americana (Veblen). Mas se as críticas de os "operaclonalistas" de Columbla e os teóricos de
Sorokln contra a "quantofrenla" da sociologia ameri- Harvard? Pelo menos é essa a impressão que nos fi-
cana [67] e as de Merton contra sua esquizofrenla ca, no domínio particular dos estudos de "mobilidade
(1949) permaneceram sem grande incidência (em ra- social", diante da espantosa congruêncla entre teo-
zão da marginalidade do primeiro e da Integração rias explicitamente funcionalistas e procedimentos
do segundo ao sistema), as de Milis inauguram uma empíricos demasiado facilmente denunciados como
corrente que vai crescer e se radicalizar no final dos meramente técnicos [23]. Enfim, o sucesso internacio-
anos 60, com a agitação dos campi universitários. nal obtido pela "sociologia americana" (e a que nos
Simultaneamente, em Chicago e em Harvard apa- referiremosmais adiante) não é o menor sinal de seu
recem orientações teóricas que, depois de terem êxito - por mais radicais que jó se anunciem os
constituído uma rude oposição à sociologia dominan- questionamentos do período posterior.
te, se Imporão como as mais importantes do "pós- ~~~~~~::~::::~::::::::::::~~:;::~~:::::::::;;:::::::~~::::::~::~::~~::~~::~;:~~:::~::::::~::~::::::::::~::~;:~::~:::;::~:::;~~;:::::::::~:::::::::::~:~::::::~::~
Parsons"(por essa razão, só as examinaremos e apre-
sentaremos sua bibliografia no próximo capítulo). OS GRANDES MALES DA SOCIOLOGIA AMERICANA
Por enquanto, contentemo-nos em afirmar que a
• 'fJ... história recente da teoria sociológica pode resumir-se em
sociologia americana dos anos 50 e 60 realizou mui-
duas tendências opostas. Por um lado, vemos sociólogos que pro-
tas de suas ambições. No plano da pesquisa empí- curam antes de tudo generalizar e chegar o mais rápida possível a
rica, ela atingiu um nível de formalização que formular leis sociológicas. No afã de dar um sentido ao trabalho so-
confere a seus procedimentos um caráter quase roti- ciológico, eles preferem analisar as áreas formais de suas generali-
neiro e que a faz aceder a um autêntico estatuto zações a verificar empiricamente a validade delas. Desprezam a
de "ciência normal" (Kuhn). No plano teórico, ela dis- tarefa obscura das observações detalhadas em pequena escala e
põe, com o "estrutural-funcionalismo" parsoniano, de tentam alçar-se até sínteses de conjunto. No outro extremo está o
três trunfos de que vai valer-se amplamente: um sis- grupo ousado dos que pouco se preocupam com as conseqüên-
cias de suas pesquisas. mas têm total confiança na exatidão de
tema conceitual partilhado, graças ao qual muitos
seu relatório. Os fatos expostos por eles são verificá'leis e freqüente-
intercâmbios se tornaram possiveis;um quadro analí-
mente verificados. mas não procuram muito ligar esses fatos entre
tico abstrato e geral o bastante para organizar os s/,ou mesmo explicar por que optaram por fazer essasobservações
conhecimentos acumulados; e - Jast but not Jeastl - e não outras. A divisa do primeiro grupo parece ser:'lgnoramos se
um esquema de racionalização em forma científica o que dizemos é verdade, mas sabemos que tem sentido'. E a dl-
do complexo ideológico-cultural que domina a socie- visa do empirista radical é: 'Não sabemos se o que dizemos tem
Sentido. mas sabemos que é verdade'.'
dade americana.
Sem dúvida, a integração dos pólos teórico e em- R.K. MERTON(1949); (Irad. francesa Merlon, 1965 : 27).
11- O TEMPO DAS AMBIÇÓES (1945-1966)
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
2. A RECONSTRUÇÃO DA SOCIOLOGIA FRANCESA
PARTE /I

I • 'Sob a égide dessa epidemia de quantofrenia, qualquer um


'se tornava pesquisador científico ou investigador erudito se pegas-
se algumas folhas de papel. as enchesse de perguntas de todo
tipo, enviasse esses questionários a todos os correspondentes possí-
I
veis, recebesse respostas, as classificasse de uma ou de outra
maneira, tabulasse o resultado com uma máquina de calcular e 2, A RECONSTRUÇÃO
dispusesse os resultados em tabelas (indicando porcentagens obti-
das por assim dizer maquinalmente, coeficientes de correlação, índi- DA SOCIOLOGIA FRANCESA
ces, correções para os desvios normais e outros erros prováveis) e,
enfim, se escrevesse um artigo ou um livro recheado de números,
de tabelas, de fórmulas e de índices, provas tangíveis de uma pes-
quisa 'objetiva, sistemática, precisa e quantitativa', Criaram-se ver-
D urante a Libertação. a sociologia faz seu ba-
lanço: no plano da organização universitária
e do ensino. praticamente nada mudou desde o Iní-
dadeiros rituais na pesquisa contemporânea em sociologia, em
cio do século e se continuou a não formar sociólo-
psicologia e nas outras ciências psico-sociois; essesrituais podem ser
gos; a pesquisa. que conheceu uma retomada de
realizados mecanicamente por uma multidão de oficiantes mais ou
atividade e uma nova orientação ao longo da dé-
menos preparados para executá-Ios.'
cada precedente. continua sendo coisa de indiví-
P.A. SOROKIN(1956); [trad. francesa in 67 ; 220-221]. duos de fora da universidade. institucionalmente
Isolados e de referências teóricas disparatadas. Uma
• 'Numa palavra, o que podemos chamar de análise sociológi- constatação se impõe a todos: há um duplo atraso
ca clássica é, a meu ver, composto de um conjunto de tradições em relação ao nível de desenvolvimento e de reco-
que podemos definir e utilizar. Ela se distingue essencialmente por nhecimento das ciências da natureza e em relação
seu gosto pelas estruturas sociais históricas, seus problemas que in- aos Estados Unidos. que. agora. são tidos como a
cidem diretamente nos objetivos coletivos urgentes e nas experiên- nova pátria das ciências sociais,
cias humanas dolorosas. Creio também que essa tradição se choca
A esse respeito. o processo que se inicia em 1945
hoje com obstáculos consideráveis, tanto no interior das ciências so-
ciais quanto em seu contexto político e universitário - mas que,
aparece tanto como a "construção" de uma sociolo-
porém, as qualidades de espírito que lhe são inerentes estão a gia moderna quanto como uma "reconstrução".
ponto de se tornarem o denominador comum de toda a nossa vi- mesmo se se trata de reanimar. mas segundo um
da cultural e, enfim, que sob seus aspectos desconcertantes, a des- projeto completamente diferente. uma disciplina mo-
peito de sua imprecisão, elas estão se tornando uma necessidade. ribunda. De um ponto de vista institucional. esse pro-
Um grande número de sociólogos, especialmente nos Estados Uni- cesso compreende duas fases diferentes. correspon-
dos, parecem-me pouco dispostos a aceitar o desafio que Ihes é dentes às duas repúblicas que se Instauram na
lançado. Muitos se furtam às tarefas políticas e intelectuais da aná- França nesse período: primeiro. marginal em relação
lise histórica; outros, é claro, não estão à altura do papel que lnes
às outras ciências sociais e mantendo-se à tona gra-
é atribuído. Acontece por vezes serem eles surpreendidos recorren-
ças à ação de alguns pioneiros decididos. a sociolo-
do, quase que sem querer, a velhos subterfúgios, ou se fazerem de
tímidos. Apesar dessa má vontade, eles têm ali uma oportunidade
gia deve aguardar 1958 para realmente desabro-
única, porque seu campo social. aquele que devem estudar, é vl- char. Em compensação. no plano de suas orien-
giado com grande atenção pelos intelectuais e pela coletividade. tações. muito cedo se afirma uma ambição
Ali é que estão a grande esperança intelectual das ciências so- apaixonada de conhecimento da realidade social
ciais, as aplicações culturais da imaginação sociológica, e a francesa. mais sensível aos objetivos empíricos do
dimensão política das ciências do homem e da sociedade.' que às sereias teóricas..,
C.W. MILLS(1959); (trad. Mills, 1967 ; 25-26),
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 11- o TEMPO DAS AMBIÇ6ES (1945-1968)
PARTE /I 2. A RECONSTRUÇAO DA SOCIOLOGIA FRANCESA

I o PROCESSO DE EDIFICAÇÃO INSTITUCIONAL

No contexto da Ideologia de "reconstrução" eco-


nômica e administrativa que caracteriza os anos de
pós-guerra, Importa identificar os obstáculos sociais ao
(EPHE),assim como a ação financladora de Institui-
ções Internacionais (CEE e UNESCO)- sem esquecer
os financiamentos americanos da Ford, Rockefeller ou
Kodak. Essareconstrução, porém, está longe de go-
zar de um ambiente intelectual propfclo. O muito
ili::;'li"')~
i~i~
~:~:::~::::i::

crescimento e à modernização [68]. Também as Infiuente Partido Comunista, ao qual aderem ou com
ciências econômicas e políticas são priorltárlas: em o qual simpatizam (até 1956) inúmeros sociólogos, ar-
1945, por exemplo, são criados o Instituto Nacional rasta à execração pública uma disciplina cujo tríplice
de Estudos Demográficos (INED) e a Fundação Na- crime era o de fazer concorrer com o marxismo,
cional de Ciências Políticas (FNSP) e, depois, em considerado como a única ciência social possível,ser
1946, o Instituto Nacional de Estatística e de Estudos de Inspiração norte-americana e promover práticas
Econômicos (INSEE)- outros tantos Instrumentos de "policiais" a serviço da classe dirigente. Da parte da
observação e de análise que se revelarão preciosos filosofia, a acolhida não é muito melhor: nem o exls-
para a pesquisa sociológica. Mas a sociologia não tenclalismo nem o personallsmo perdoam à sociolo-
será esquecida, mesmo se as novas instituições em gia ter proposto "considerar os fatos sociais como
que ela se insere E; os trabaihos que nelas serão le- coisas" - excluindo assim os sujeitos e sua liberdade.
vados adiante devam mais a iniciativas individuais do Quanto à universidade, seus professores desprezam
que a uma vontade política explícita. Assim, os no- uma disciplina infinitamente ambiciosa que pretende
mes dos três principais reconstrutores da sociologia emancipar-se da filosofia e da história. Nesse contex-
francesa estão ligados a cada uma das Instituições to de "ignorãncia sustentada por suspeitas" (Heilbron,
que surgem na época: o de Jean Stoetzel (professor in [41:368]. não é exagerado dizer que os sociólogos
em Bordeaux), à reativação de um organismo priva- aparecem como fracassados, ingênuos ou traidores.
do, o Instituto Francês de Opinião Pública (IFOP)(e à Não é de espantar, portanto, que no pós-guerra a
sua revista Sondages), que ele fundara em 1938; o atividade sociológica institucional se tenha concentra-
de Georges Gurvltch (professor na Sorbonne), à cria- do em três objetos pouco acadêmicos: o trabalho e
ção, em 1946, do Centro de Estudos Sociológicos as relações proftssíonoís(Frledmann, 1947, 1954, 1964;
(CES), laboratório do Centro Nacional de Pesquisa Frledmann e Navilie, 1961-1962; Naville e cot., 1961;
Científica (CNRS),que surgiu às vésperas da guerra, Reynaud, 1963; Touraine, 1955), a cidade e a urbani-
assim como ao lançamento dos Cahiers internatio- zação (Chombart de lauwe e col.. 1952, 1959-1960;
naux de soc/ologie (1946), única revista sociológica Chombart de lauwe, 1965; Friedmann, 1953), a práti-
até a publicação da terceira série do Année sociao- ca religiosa (le Bras, 1955-1956). A primeira orienta-
gique (1949-1953);o de Georges Friedmann (inspetor ção é de longe a dominante: ela corresponde à
geral do ensino técnico, mais tarde professorno Con- complexa interferência da problemática sócio-econô-
servatório Nacional de Artes e Ofícios), à organizaçãO mica da época, do magistério exercido por Fried-
e à direção do CESaté 1952, e à criação do Institu- mann (que se encontra com Hughes em Chicago
to de Ciências Sociais do Trabaiho (ISST),em 1953. em 1949) e da sensibilidade ideológica - socializante,
Nessa obra de organização e de incentivo à pesqui- ou de inspiração cristã apoiada pelo movimento
sa, deve-se ressaltar o papel dos historiadores da Economia e Humanismo - de um grande número de
escola dos Anna/es, que estão na origem da cria- pesquisadores, desejosos de se porem à escuta e a
ção, em 1947, da 6° Seção (dita de ciências econô- serviço de uma classe operária da qual a maioria
micas e sociais) da Escola Prática de Altos EstudoS deles ignorava tudo (Chapoulie, in [41D. Essaspesqui-
11- O TEMPO DAS AMBiÇÕES (1945-1966)
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
2. A RECONSTRUÇÃO DA SOCIOLOGIA FRANCESA
PARTE /I

11 ::~:::;::::::::::::;::;;:::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::~::::::::~:::::::;:;:;:;:;:;:::;:;:::;:::::::::;:;:::::::;:::::::::;::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::;:::~::;::::::::;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;

'Como Friedmann me prometera, entrei no CNRS. Era 1950. Éra-


SERSOCiÓLOGO EM 1950
sas são conduzidos graças aos cuidados eficientes li:l'j'j'I'j:;ll
de Friedmann e dos jovens talentos que ele atrai pa- '22:5
ra o CES.No início dos anos 50, muitos dessesJovens :,:::,:,:,:,:::,:~
talentosos vão passar um tempo nos Estados Unidos,
um país certamente condenável por sua política
mos poucos na seção de sociologia. Quase tudo pertencia ao
(tanto interna quanto externa), mas que se Impõe
Centro de Estudos Sociológicos, primeira pequena célula que fora
como a pátria da sociologia moderna.
criada pela direção do CNRSe dirigida primeiramente por Georges
Friedmann e Georges Gurvitch. EsseCentro de EstudosSociológicos Sem dúvida, então, a oferta precede a procura
consistia numa grande sala cortada em duas por uma cortina e mais do que responde a ela; de qualquer forma, ela
dois degraus, numa casa do bulevar Arago, quase em frente à pri- se casa muito bem com a sensibilidade de um pe-
são da Santé. Quem presidia como uma avó às nossas atividades ríodo cujo problemática central é a das condições e
era a sra. Halbwachs, cujo marido, grande sociólogo, morrera du- das conseqüências sociais da "modernização".
rante a deportação e que era filha de Victor Basch, ele próprio Com o gaullismo, a sociologia francesa vai passar
assassinado durante a guerra. Essepequeno centro, sob Georges pelo período sem dúvida mais rico de sua história
Friedmann, era dirigido por um grupo de quatro pessoas: Edgar Mo- [57]. O intervencionismo de um estado modernizador
rln, Paul-Henri Chombart de Lauwe, Paul Maucorps e eu mesmo.
e a ação de algumas personalidades decididas ofe-
Nós não tínhamos nenhuma referência teórica ou empírica particu-
recem-lhe oportunidades de desenvolvimento sem
lar. Maucorps e Chombart foram os primeiros a constituir equipes
de trabalho, Morin já escrevia sobre assuntos diversos com um ta-
precedentes. As "planificações", com efeito, abrem-
lento sempre muito grande. Mais jovem e mais desajeitado, eu me lhe novas oportunidades: "Doravante o social apare-
esforçava ao mesmo tempo por dar seqüência a pesquisas e por ce quer como um resíduo que devemos nos esforçar
me orientar teoricamente. Materialmente, a vida dos [ovens pesquí- por compreender para termos influência sobre ele,
sadores não era fácil. As carreiras eram lentas e os salários baixos. quer como uma dimensão suplementar que é preci-
Só aos poucos os sindicatos conseguiram obter melhores condições. so integrar nas previsões econômicas para aumentar
Morei durante esse períodO perto da ponte de Billancourt, num sua eficiência" [49]. A criação, em 1958, graças aos
bairro operária, do lado da fábrica Renault, o que não acontecia
esforços de Raymond Aron, 'professor na Sorbonne,
totalmente por acaso. / .../
da licenciatura e do doutorado de sociologia no
'O grupinho dos sociólogos ficava à margem da universidade.
Ser sociólogo era - e ainda é - menos decente do que ser historia- quadro das novas "faculdades de letras e de ciên-
dor, filósofo ou latinista. Éramos marginais ou atípicos. Maucorps, cias humanas", seguida do lançamento de três
que morreu muito jovem, era um oficial da marinha, ex-aluno de Importantes revistas científicas - Sociologie du travoil
Escola Naval. e provavelmente um dos únicos a ter passado para (Friedmann, Stoetzel) em 1959;Revue françoise de so-
a França livre. Chombart de Lauwe vinha da etnologia, mas tam- ciologie (Stoetzel); e Archives européennes de socio-
bém da RAF. Morin correra grandes riscos e levara uma vida logie (Aron, de Dampierre) em 1960 -, enfim, a
errante durante a guerra. Nós não éramos apenas marginais com fundação da Sociedade Francesa de Sociologia (que
relação à vida universitária, mas também com relação ao esque- substitui o Instituto Francês de Sociologia) em 1962
ma comunista que nos cercava. Não discutíamos com os intelec-
dão à disciplina sólidas bases institucionais. Ao mes-
tuais comunistas daquela época; eu, pessoalmente, nunca o fiz.
mo tempo, a pesquisa diversifica-se e desenvolve-se
Mas os sociólogos eram acusados de ser agentes da burguesia,
pois seu pensamento livre ameaçava o dominio autoritário do PC.'
rapidamente. Criam-se numerosas equipes dentro do
CES (CNRS) ou no âmbito da EPHE,que abordam
A. TOURAINE(jn Un désir d'Histoire, ed. Stock. 1977). novos campos: o mundo rural (Mendras, 1967b), a
educação e o ensino (Bourdieu, 1964; lsambert-Jama-
=:=:=:;:=:::=:=~::~::;:::::::::::::::::~:::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::;:;::~::::::::::::::: :::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::~:::~:~:::~~:::~;:~::::::::::~:::~:::::::::::::::~~m~
ti, 1970), os lazeres (Dumazedier, 1962), as organiza-
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
PARTE /I
11- o TEMPO DAS AMBIÇÓES (1945-1968)
2. A RECONSTRUÇÃO DA SOCIOLOGIA FRANCESA

I
ções (Crozier, 1955, 1963, 1965), os meios de comuni-
cação de massa (Morin, 1956, 1969), as doenças
mentais (Bastide, 1965),a condição feminina (Guilbert
e Isambert-Jamatl, 1956; M.-J. Chombart de Lauwe,
1963).
ecletismo". (Bourricaud, in [49:9].)
O "empirismo" praticado nada tem do caráter mi- :""2:,ot
litante que muitas vezes assumiu na sociologia ame- ~t~::;~tl
ricana. Ele se vincula de preferência às condições
iliillil~~I~l

em que a sociologia francesa ganha seu novo Im-


Importantes institutos se consagram a uma pesqui- pulso: uma demanda social decerto ambiciosa
sa mais fundamental: o Laboratório de Sociologia demais, o desejo de superar o desconhecimento de
Industrial (1958) de Alain Touraine (1961. 1965b, 1966), uma realidade social em plena crise, o desejo de
o Centro de Sociologia Européia (1959) de Aron. ou utilizar os métodos americanos de observação e de
ainda o Grupo de Sociologia das Organizações análise, a obsessão de romper com a orientação es-
(1966) de Michel Crozier. Esseformidável desenvolvi-
sencialmente especulativa da sociologia clássica, a
mento é apoiado pela política da Delegação Geral
monopolização do debate sócio-político pelos filóso-
pora a Pesquisa Científica e Técnica (DGRST)que, a
fos, a hostilidade aberta do marxismo então domi-
partir de 1959 e por intermédio das "ações combina-
nante para com as ciências sociais "burguesas".Pres-
das" de seu Comitê de Análise do Desenvolvimento
sionados pelos planificadores e outros dirigentes a se
Econômico e Social (CADES),se torna o principal fI-
tornarem "auxiliares de ação", os sociólogos aspiram
nanclador das ciências sociais. a romper com a tradição sintética e histórica de
Começa, portanto, a ser possívelfazer carreira de
seus predecessores e a se diferenciar dos procedi-
sociólogo: um pouco no ensino, mas sobretudo na mentos dos filósofos, de quem acabam justamente
pesquisa (em 1968, existem 26 centros que empre- de se separar academicamente. Assim, nem o dur-
gam 582 pesquisadores e assistentes [63]). No kheimianismo,que representa um passado a conjurar,
entanto, o balanço dessa década permanece mo- nem o materialismo histórico, que os atrai Intelectual-
desto: a sociologia sem dúvida utilizou as oportunida- mente mas os rejeita politicamente [68). podem ote-
des oferecidas para adquirir uma indispensável base recer-Ihes mais do que fontes de Inspiração, e de
InstituclonaL mas não conseguiu (será que o deseja- modo algum verdadeiros quadros teóricos e concel-
va realmente?) se impor como a ciência de auxílio
tuais. A obra de Weber continua, apesar dos esfor-
à tomada de decisões que lhe pediam que fosse -
ços precoces e constantes de Aron (1935, 1967) e
não sem ambigüidade.[49) de Julien Freund (1966), amplamente desconsiderada
e muito pouco traduzida (será preciso esperar 1971
para dispor em francês da primeira parte de Econo-
UM EMPiRlSMO CONJUNTURAL
mia e Sociedade); além disso, ela encontra em Gur-
vltch um oponente quase tão feroz quanto Durkhelm
A atividade da sociologia francesa durante esse
[27]. Quanto a Parsons,apresentado ao público fran-
último período contrasta energicamente com a era
cês por François Bourricaud em 1955,seu aspecto sis-
durkheimiana da disciplina, na virada do século: "Em temático decepciona um ambiente que, aliás, ainda
vez de um mestre, uma pluralidade de 'patrões', de não está preparado para "reler" Durkheim. Só Merton
formação, origem e Idades diferentes, funcionando (traduzido por Henri Mendras em 1953) torna-se uma
em coalisões instáveis de associados rivais; em veZ referência tanto mais apreciada por ser pouco defini-
de um paradigma unificador, uma variedade de da filosoficamente.
orientações muitas vezes incertas e mal esboçadas, O deslumbramento pela pesquisa empírica é tal
acumulando os Inconvenientes do sectarismo e do que os fenômenos sociais mais diversos são objeto
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 11- o TEMPO DAS AMBiÇÕES (1945-196B)
PARTE /I 2. A RECONSTRUÇÃO DA SOCIOLOGIA FRANCESA

I
;::::::::::::::::::::~::::::::::::::::::::::::::::::::::;:;:::::;::::::::::::::.::::::::::~::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::;::~:::::::::::::::::::~:::~~::::~::::::::::::::::::~:::::::::::::::::::::::::~:::;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;::

'No fim das contas, porém, é preciso admitir. Não queremos


ESQUECER DURKHEIMI
da família. o funcionamento da democracia.
A preocupação com a "cientificidade" é um traço
marcante do desenvolvimento da pesquisa nos anos
60. Em contra posição à orientação essencialmente
I
mais, não podemos mais aceitar o espírito com que Durkheim co- descritiva dos trabalhos do pós-guerra, e estimulados
meçou a convidar seus alunos a trabalhar nestes mesmos lugares, por sua ambição praxiológica. os pesquisadores In-
há sessenta anos exatos. Não nos importa mais estabelecer a im- vestem uma parte considerável de sua energia na
portância das Influências sociais. Não procuramos mais construir sis- definição de critérios de validade para as diferentes
temas doutrinários. Não temos mais a preocupação de isolar o etapas de seu procedimento. Se as técnicas da ob-
social do psicológico ou do orgânico. E se o aperfeiçoamento das servação empírica são convenientemente dominadas
técnicos de pesquisa continua sendo uma palavra de ordem per- (graças às tradições leplaysiana e etnográfica), cum-
manente, deixamos aos filósofos o cuidado de redigir, no sentido
pre controlar. por um lado. a operacionalização das
que o engenhoso Lalande atribui a este termo, os 'princípios' do
hipóteses e, por outro, a verificação dos resultados.
método sociológico. Entre Durkheim e nós, houve um deslocamen-
to completo dos pontos de vista. / .../
Volta-se. portanto. naturalmente para os recursos
'Ao contrário da sociologia durkheimiana, inteiramente inspirada americanos: traduz-se em primeiro lugar. em 1959, o
em Comle e, para além de Comte, na dialética germânica, a so- livro de Festingere Katz (Os Métodos de Pesquisa nas
ciologia contemporânea é decididamente empírica. Ela aborda os Ciências Sociais) ~. por iniciativa de Raymond Bou-
problemas, não porque eles venham a abrir perspectivas sobre o don e de P. Lazarsfeld (professor convidado na Sor-
processo de socialização, e sim porque são interessantesem si mes- bonne em 1962-1963). é publicada uma tradução
mos. Uma emissão radiofônica dramática proporcionará a oportuni- corrigida e aumentada de contribuições francesas de
dade de estudar a psicologia coletiva do pânico. Um fenômeno
The Language of Social Research - o textbook dos
como a guerra será o ponto de partida de pesquisas sobre o mo-
metodólogos de Coiumbia (Boudon e Lazarsfeld,
ral dos civis e dos militares. Temos a írnpressáo agora de que Dur-
1965, 1966; Chazel e col. 1970). Os esforços de Bou-
kheim foi ambicioso e impaciente demais. Ele inventou uma flogís-
fica sociológica, estéril e paralisante. Podemos nos perguntar se não don (1967, 1969) para desenvolver essa orientação
é melhor pôr as jovens gerações de futuros pesquisadores ao abri- matemática, ressaltando os métodos de análise cau-
go de sua influência.' sal, são acompanhados de uma preocupação epis-
temológica mais ampla de análise crítica dos proce-
J. STOETZEL
(Bordeaux, 1946); fonte: [41: 443-451]. dimentos de pesquisa (Boudon, 1968; Bourdieu e col.,
~::::::~::::~~::::::~::::::::::::::::::::::~~::~::::;::::;:::::::::::::::i:::;:::::::::;:::::;:::::::;:::;::::::::::::::::::::::::::::::::::~::::::::::~::::::::::::::::::::::~~~;:::::::::::::::::::::::::::::::~::::::::::::::::~~~~~
1968).

de Investigações sociográficas de qualidade: mono-


OS COMBATES DE GURVITCH
grafias locais (Bettelheim e Frere. 1950; Bernot e Blan-
cart, 1953; Lefebvre, 1954; Isambert-Jamati, 1955;
Essa orientação amplamente emplrista logo ga-
Rambaud e Vincienne, 1964; Morin, 1967), pesquisas
nhou as simpatias de Gurvitch, cuja preocupação
sócio-demográficas (INED. 1950; Girard e Stoetzel.
, constante foi esconjurar os dois perigos do empirismo
1954; Girard, 1961, 1964; Touraine e Ragazzi, 1961), G meramente analítico, de que Stoetzel era na época
análise de comportamentos políticos (Dogan e Nar-
o porta-voz (cf. Blondiaux, in [41D, e da teorização
bonne, 1955; Fauvet e Mendras, 1959; Rémond. 1965)
meramente especulativa. Assim. ele designa à socio-
- são outros tantos trabalhos que manifestam o inte-
logia seus dois adversários: seu avatar americano (ele
resse dos sociólogos franceses pelas questões sociais
cria, com esse objetivo. em 1956, a Associação Inter-
candentes do momento: o êxodo rural. a evolução
11- o TEMPO DAS AMBiÇÕES (1945-1968)
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
2. A RECONSTRUÇÃO DA. SOCIOLOGIA FRANCESA
PARTE /I

I
nacional de Sociólogos de Língua Francesa - AISlF-
com o belga Henri Janne) e suas grandes sistemati-
zações teóricas (o durkheirnianismo, o marxismo, o
estrutural-funcionalismo e o estruturalismo) cujo noml-
nalismo, determinismo, dogmatismo e - exceto no
~
í longe de estar ausentes: o conflito que logo contra- 1IIIi::ili~;
põe Aron a Gurvitch [27:112] é prova disso, assim '<'j3:l
como os trabalhos de Bourricaud sobre a autoridade 1t:;::)j)
(1961) e de Crozier sobre a burocracia (1964), ou as
tentativas de Touraine (1965a) de fundar uma "socio-
último caso - historicismo ela deve combater. Icgla da ação". Em todos estes casos, e em graus
Sua concepção pretensamente realista e plurallsta _diversos, é patente a referência weberlana - mesmo
do social empenha-se em distinguir os diversos "pata- ~. \ se acompanhada, no último desses autores, de uma
mares de profundidade" que, sob a superfície ernpí- , referência que se esteia em Marx. Testemunham, en-
rica dos fenõmenos, o sociólogo deve descobrir e
revelar sem nunca' congelar sua "efervescência" nem r-.
,1,"11I fim, os esforços empreendidos a partir de 1958 para
publicar tratados e manuais e assim fornecer aos fu-
sua contingência através de urna conceitualização
definitiva, e relacionando-os constantemente com o
~ turos sociólogos bases teóricas e conceituais para sua
prática (Ourvítoh, 1958-1960,1962; Frledmann e Navll-
le, 1961-1962; Stoetzel, 1963; Mendras e Reynaud,
"fenômeno social total" (Mauss).·Também reivindica
um "hiper-empirismo dialético e relativista" que vincu- I 1963; Aron [2]; Mendras, 1967). Mas, com a exceção
laria estreitamente a experiência a sua teorlzação, a ~\; notável de Gurvitch, essa reflexão continua ampla-
explicação à compreensão, numa "reciprocidade de mente aberta, correndo às vezes o risco de ecle-
perspectivas" que proíba qualquer oposição entre o tismo. A este respeito, não é pequeno o mérito de
Individual e o social (Gurvitch, 1950, 1955, 1962). Mas Aron por ter aliado análise dos fatos e sínteseteórica
o impressionante edifício teórico assim elaborado [sob desde seus primeiros cursos na Sorbonne sobre as so-
a benevolência flutuante (lefebvre, 1959) de um ciedades contemporâneas (Aron, 19620, 1964, 1965).
marxismo que preferia ver o espaço sociológico ocu- No cômputo total, a sociologia francesa adquiriu
pado por um discurso socializante, anti-durkheimiano, nos anos 60 certa maturidade, testemunhada tanto
anti-americano e de capacidades heurísticasduvido- por seu reconhecimento social quanto pela qualida-
sas] não será o paradigma que esperava ser, por de de seus trabalhos empíricos. Seu relativo déficit
não ter jamais efetivamente orientado os procedi- teórico explica-se ao mesmo tempo por sua preocu-
mentos teóricos e metodológicos de pesquisadores pação em conjurar seus velhos demônios sócio-filosó-
que na época o reverenciaram mais do que lhe de- ficos e pela importância e urgência do trabalho a
ram crédito (Gurvitch, 1958-1960).E se, desde os tra- realizar numa sociedade onde a mudança se acele-
balhos de Claude lévi-Strauss sobre o parentesco ra (Darras, 1966; Reynaud, 1966); pagará caro esse
déficit. com sua incapacidade de prever um movi-
(1949), a etnologia e a antropologia possuem seu
próprio paradigma, no meio sociológico, em com- mento - o de maio de 68 - que teve origem entre
pensação, o "estruturalismo"provoca na época mais seus próprios estudantes, e com as conseqüências
um debate sócio-filosófico inútil do que práticas cien- dessa precariedade sobre seus caminhos futuros.
tíficas efetivas; mas este é, sem dúvida, o sinal de
uma disciplina carente de teoria e em busca de
quadros intelectuais. De fato, será preciso esperar o
fim dos anos 60 para que essa corrente filosófica fe-
cunde, em slncretismo com o marxismo, um pensa-
mento sociológico (cf. capo ill).
No entanto, a reflexão e o debate teóricos estão
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
PARTE"
11- o TEMPO DAS AMBiÇÕES (1945,1968)
3, A INTERNAC/ONAUZAÇÃO DA SOCIOLOGIA

I bre o desarmamento,
cação, na
do mundo,
Europa (ocidental
Ela tenta também
pel de difusão dos conhecimentos
o desenvolvimento
e do leste) e no resto

e de homogenel-
desempenhar
e a planlfi-

um pa- ::~::::::::::::~:
11!,!!'!'!I!'!I!I!
:2~:,
zação da linguagem científica, através da publi-
3. A INTERNACIONALlZAÇÃO cação de bibliografias internacionais ou ainda de um
DA SOCIOLOGIA Dicionário de Ciências Sociais (1964, em Inglês), Enfim,
ela não deixa de promover, desde sua criação, nu-

dade
P or volta de 1970, é inegável o sucesso Interna-
cional da sociologia;
Industrializada
não só não existe socie-
que a Ignore, mas também
merosas e importantes

palmente, sobre
pesquisas sobre as mentalida-
des, os conflitos internacionais, a imigração
o racismo,
e, princi-
A partir de 1970, publi-
muitos países em vias de desenvolvimento a acolhe- cam-se, por sua iniciativa, as Tendências Principais da
ram generosamente, No entanto, essa internacionali- Pesquisa nas Ciências Sociais e Humanas, cujo volu-
zação não deixa de apresentar diferenças e desi- me consagrado à sociologia é redigido por lazarsfeld
gualdades importantes, que traduzem os efeitos de 8],
contextos sócio-históricos aparentemente lrreslstívels, Os países ocidentais contaram também, da parte
das grandes fundações americanas e com o apoio
do governo federal, com uma ajuda financeira con-
o PAPEL DA UNESCO E DOS ESTADOS UNIDOS siderável que, no caso, foi concedida antes de qual-
quer solicitação - e unicamente para o desenvolvi-
Num primeiro momento, o papel desempenhado mento da pesquisa empírica, Com isso, estavam
pela UNESCO foi decisivo [21], tanto para permitir a politicamente completadas as finalidades econômicas
retomada da disciplina ao final da última guerra, do plano -Marshall, cujo intervencionismo visava a
quanto para garantir sua promoção em inúmeros "substituir por abordagens empiristas racionais as tradl-
países do "terceiro mundo", Sob seus auspícios, será ~ções 'ídeológicas' dos europeus e as tentativas glo-
criada, em 1949, a Associação Internacional de So- \ balizantes e, com isso, [a] fortalecer a propensão ao
ciologia (ISA) (que publicará primeiro um Boletim e pragmatismo e à investigação das possibilidades de
depois, a partir de 1959, a Revista Internacional de compromisso entre forças sociais opostas, o que, a
Ciências Sociais), assim como o Conselho Internacio- -llongo prazo, devia contribuir para aproximar os siste-
nal de Ciências Sociais, Devemos-lhe sobretudo a mas políticos europeus, considerados autoritários e
criação de institutos universitários de ciências sociais, hierarquizados demais, do 'ideal' americano" [64:58],
tanto em Colônia (em 1952) quanto em Atenas ou Evidentemente, se as orientações (em particular as
em Teerã (no início dos anos 60), do Centro de Pes- metodológicas) da sociologia americana gozam de
quisas sobre o Desenvolvimento Econômico e Social um estatuto privilegiado numa metade do mundo,
na Ásia Meridional (instalado em Calcutá em 1956, na outra metade quem se impõe é a concepção
depois em Nova Delhi), sem falar de importantes ins- comunista das ciências sociais, Mas essa clivagem
tituições internacionais de ensino e de pesquisa na não é rígida: por um lado, o pensamento marxista
América latina (CENTRO brasileiro, FlACSO em San- está muito vivo em vários países ocidentais (Alema-
tiago do Chile) e na África (CAFRAD de Tânger), A nha, Itália, América latina) ao passo que alguns paí-
partir de 1964, a UNESCO ganha o Centro de Viena, ses do leste conseguem conservar certa originalidade
cuja missão é coordenar pesquisas comparativas so- (Polônia, Hungria, Iugoslávia); por outro lado, Instau-
11 - o TEMPO DAS AMBIÇÓES (1945-196B)
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 3. A INTERNAC/ONAUZAÇÃO DA SOCIOLOGIA
PARTE /I

I
elites, de W.G. Runciman (1966) sobre a percepção 'i':::"':';:'1
ram-se pOUCOa pouco intercâmbios científicos atra-
vés da "cortina de ferro", como prova a multiplica-
das desigualdades, da equipe dirlglda por John H. :ii.\'
Goldthorpe (1968-1969) sobre a classe operária, ou ~:::::::::::::::
ção das traduções estrangeiras e de publicações em ainda de Basil Bernstein (1971) na sócio-lingüística. O
Inglês ou alemão nos países socialistas, ou a realiza- que orienta na época essas primeiras reflexões teóri-
ção, em 1970, do Sétimo Congresso do ISA em cas são as referências a Weber (traduzido em 1947)
Varna, na Bulgária. e, sobretudo, a Marx. Correlativamente, Parsons e o
funcionalismo são objeto de críticas que, no final dos
onos 60, são renovadas pela boa acolhida rapida-
RECONSTRUÇÕES E CONSTRUÇÕES mente reservada à etnometodologia e à corrente
DAS SOCIOLOGIAS OCIDENTAIS
fenomenológica americanas - testemunho da extre-
ma desconfiança dos britânicos diante dos sistemas
No ocidente, o status da sociologia difere forte-
teóricos gerais [50,56].
mente de uma nação para outra - e lal diferença
O caso alemão não é menos contrastado. A der-
não reside apenas na época do seu aparecimento
rota de 1945 correspondeu à da orientação sintética
ou no grau de modernização sócio-econômico [28].
do período anterior, que dá lugar a um "ceticismo"
No país de Spencer e de Hobhouse, por exemplo,
geral a respeito dos sistemas teóricos e conceituais
a sociologia britânica passa por uma dificuldade crô-
[10:399]. No entanto, a dedicação a uma pesquisa
nica de ser considerada algo diferente de uma prá-
empírica - à qual a sociologia alemã sempre se con-
tica empírica de objetivos aplicados: desde a guerra,
sagrou, mas que a Intervenção maciça dos Estados
foram necessários os esforços tenazes de Ginsberg, Unidos renova e amplia - deixa Intacta, mesmo entre
Marshall, Mannheim ou ainda, desde os Estados Uni- os mais "positivistas",a ambição de fazer da sociolo-
dos, de Shills,para abalar as resistênciasacadêmicas gia uma doutrina moral sob a forma de teoria das
a um reconhecimento mínimo, promovendo o ensino condições da liberdade humana (Geiger. 1952; Dah-
da sociologia (até então reduzido somente à london rendorf. 1958; Schelsky, 1959; Kónig, 1964), e se
School of Economics) e ampliando as bases Instituclo- espera da pesquisa empírica que ela forneça o ma-
nals da disciplina (criação do British Journal of Socio-
terial descritivo que permita fundamentar cientifica-
logy em 1950 e da Associação Britânica de Socio-
mente uma tal teoria. Por um momento, a própria
logia no ano seguinte). De um modo mais eficaz,
escola de Frankfurt [34] será seduzida pelos trabalhos
dez anos de política trabalhista (1945-1955)muito ce-
da sociologia americana. Mas Adorno, que, de volta
do suscitaram Inúmeras pesquisas ligadas à instaura-
de Columbia, se tornou o arauto da escola, logo se
ção do Welfare State, dentre as quais encontramos
torna seu acusador, num debate que atinge a socio-
alguns dos mais importantes trabalhos empíricos con-
logia alemã ao longo de todos os anos 60 e opõe a
temporâneos - essencialmente nas áreas da estratifi-
"teoria crítica" não só a Popper, mas, para aiém de-
cação (Marshall, 1950; Rowntree e lavers, 1951) e da le - através da escola de Colônia (René Kónlg, Hel-
mobilidade social (Glass, 1954), da educaçào (Floud mut Schelsky) =, a tudo o que se assemelhe a um
et 01., 1956), da famflia (Young e Willmott, 1957). Mas "positivismo"(Adorno et ot.. 1969). O aspecto mais no-
essas pesquisas inscrevem-se numa tradição "came- tável desse debate é que ele promoveu à categoria
ral", estritamente sociográfica, que só se voltará para de pseudo-paradigma uma "teoria sociológica crítica"
uma maior teorização nos anos 60, com os trabalhos que - pela menos até uma época recente (cf. capo
de John Rex (1961; Rex e Moore, 1967) sobre os con- 111) - nunca procju~ ~a.menor sociologia! O espírito
flitos sociais, de Thomas B. Bottomore (1964) sobre as
rt \ ~" ~ t\"L...1A~ >.MA-""~ ~ ,
M~\)\ QY-)h ~ r
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 11- o TEMPO DAS AMBIÇÓES <1945-1968)
PARTE /I 3. A INTERNACIONAUZAÇÃO DA SOCIOLOGIA

~~~f!jr~]
de Weber, portanto, não sopra mais sobre os recons- !!i:!IIIII!!~
II!!~
A HIBERNAÇÃO DA SOCIOLOGIA COMUNISTA
trutores da sociologia alemã do que sobre seus
coveiros do entre-guerras: a idéia de um conheci- A União Soviética e os "paísesdo leste" constituem
:!g:~
mento sociológico liberto de qualquer juízo de valor um caso particularíssimo.
e de qualquer projeto político é sempre igualmente Na União Soviética [58], a revolução de 1917 Ini-
Incongruente. Assim, a disciplina oferece, na virada cialmente favoreceu o surgimento de uma sociologia
dos anos 70 e no momento mesmo em que seu su- relativamente livre (Sorokin dirigiu o primeiro Instituto
cesso Institucional parece Irresistível.o espetáculo dos de Sociologia, criado em 1919 na Universidade de
mais violentos conflitos que jamais se produziram em Petrogrado). Mas, em 1924, o regime encerrava a ex-
qualquer lugar, com todas as suas conseqüências periência dessa "pseudo-ciêncla burguesa", que foi
desastrosas para uma imagem pública tão ardua- proibida. Foi preciso aguardar a "desestalinlzação"
mente conquistada (Weiss,in [52]). para que a disciplina fosse reabilitada e considerada
Com a queda do fascismo mussoliniano,a sociolo- pelo poder como um instrumento político útil: em
gia desapareceu quase que completamente do 1958, foi fundada a Associação Soviética de Sociolo-
cenário intelectual e científico italiano: nem a famo- gia, que ressaltava a necessária lealdade dos pesqui-
sa criminologla positivista do fim do século passado, sadores para com os princípios do marxismo-Ienl-
nem a escola de sociologia política de Pareto têm nlsmo, ao mesmo tempo que se dedicava à crítica
descendência num universo ideológico fundamental- da sociologia ocidental. Depois de um breve período
mente hostil, amplamente dominado pelo marxismo. de liberalização (no final dos anos 60), acompanha-
Apenas o apoio da intelligentsia católica milanesa a do de uma "tomada de consciência metodológica"
faz conservar um sopro de vida, que a universidade [66] e de uma abertura internacional (VI Congresso
(Iaica) de Turim e a fundação Olivetti vão contribuir Internacional de Sociologia de Evian), os anos 70 as-
para ampliar. Os pioneiros contemporâneos da disci- sistirãoa uma enérgica retomada do controle da dis-
plina a orientam, durante os anos 50, para uma pes- ciplina: o Instituto de Pesquisas Sociológicas da
quisa empírica cujo objeto privilegiado é - e conti- Academia de Ciências (IRS), criado em 1968, será
nuará sendo - o estudo das conseqüências sociais significativamente rebatizado como "Instituto de Pes-
do progresso tecnológico (Ferraroti. 1958: Gallino, quisas Sociais Concretas" (isto é, que utilizam a teoria
1960: Pizzorno,1960). No entanto, será preciso aguar- oficial) em 1972. Sua revista Pesquisas Sociológicas
dar o fim dos anos 60 para que a sociologia italiana, (1974) detém o monopólio das publicações: lemos
cujo campo se estende então aos fenômenos de mi- ali: "O laço orgânico entre teoria e prática, ciência e
gração (Alberoni, 1960), à vida política (Galli, 1967) Ideologia, a abordagem de classe a serviço dos Inte-
ou ainda aos problemas da sociedade de massa (AI- ressesda classe operária, na solução dos problemas
beronl. 1961), se estruture institucionalmente. Sua evo- atuais do desenvolvimento social. aparecem como os
lução, aliás, continuará muito ligada às vicissitudesda princípios fundadores da atividade científica e de
vida política italiana: sua consolidação atual só foi propaganda dos sociólogos..." (Citado in [58:139].) Es-
adquirida ao final de compromissos Ideológicos pro- sa sociologia soviética conta, apesar de tudo, com
fundos e de ampliações temáticas frutíferas - em numerosas contribuições empíricas (Ivanov e Osipov,
particular na área da ação coletiva e dos movimen- in [52]), algumas das quais de qualidade. No período
tos sociais (Alberoni, 1968) [61]. recente da glasnost e da perestroika e sob a autori-
dade liberal de T. Zaslavskaia, ela passa por uma
ampliação de suas áreas preferenciais (o trabalho, a
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
11- o TEM~O DAS ÁMBIÇÓES (1945-1968)
PARTE /I
4, CONCLUSAO

I
Indústria, os modos de vida, a cultura) para áreas
até então "sensíveis"(estrutura e estratificação sociais,
família, juventude, educação) sem que, todavia, se-
jam transgredidos os tabus relativos ao estudo da
"patologia social", da religião ou do poder.
I
Nas outras democracias populares, o desenvolvi-
mento da sociologia permanece muito desigual e
4. CONCLUSÃO
parece corresponder ao nível de desenvolvimento só-
cio-econômico e à existência de uma tradição pré-
revolucionária (RDA, escola neo-Ieplayslana de D. N as duas décadas que se seguiram à Segun-
da Guerra Mundial. em toda parle onde a
sociologia chegou a se Impor como prática científica
Gustl na Romênla, empreendimentos pioneiros de S.
Czarnowskle F. Znaniecki na Polônia, de T. Mazaryk e reconhecida, ela parece dever Isso mais ou menos
E. Benes na Tchecoslováquia, influência de G. Lukács diretamente à influência norte-americana. Financia-
na Hungria...). Em todos estes casos, foi preciso espe- mentos de pesquisas, intercâmbio de pesquisadores,
rar o fim do stalinismo para ver (re)constituirem-sedis- traduções, apoio a instituições nacionais ou Interna-
ciplinas nacionais que se aplicam a investigações cionais constituem apenas o aspecto material dessa
originais segundo orientações teóricas por vezes hete- dívida. De maneira mais decisiva, a sociologia ame-
rodoxas - como demonstra a obra sob todos os ricana ofereceu, por sua organização, seu proflssiona-
aspectos notável do polonês StanislasOssowskl. lismo e seu reconhecimento social no principal país
vencedor, o único modelo de referência possível pa-
ra uma disciplina em pleno canteiro de construção
o MllITANTlSMO SOCIOLÓGICO LATINO-AMERICANO ou de reconstrução intelectual no mundo ocidental.
É inegável que esse modelo tenha suscitado tanto
A América Latina possui, desde o início do século, atração quanto rejeição, e isso é totalmente explicá-
uma tradição sociológica alimentada por contribui- vel. No entanto, e em giande parte por Isso mesmo,
ções norte-americanas e européias (particularmente ele se impôs como um motor potente das orienta-
francesas) que continuam a enriquecer uma pesqui- ções da sociologia internacional, até e inclusive em
sa viva dentro de instituições internacionais fundadas certos aspectos empíricos da sociologia dos países
e mantidos pela UNESCO.Durante os anos 50 e 60, do leste. Seus detratores mais virulentos fracassaram
a retlexóo dominante está centrada no tema do de- repetidas vezes em fazer adotar um modelo alterna-
senvolvimento e da modernização social e política tivo, consagrando assim sua vitória ou, pelo menos,
(Furtado, 1966; Germani, 1962); o retorno de regimes sua hegemonia. Esta corresponde, de fato, ao aban-
autoritários e a crise econômica provocam por um dono quase geral ou ao fracasso das tentativas de
momento o abandono da problemática do desen- grandes sistematizações teóricas ou conceituais em
volvimento para dar lugar a análises em termos de proveito unicamente do funcionalismo, através do
dependência, inspiradas num marxismo radical (Gun- qual a sociedade americana parece autoglorificar-se:
der-Frank, 1968). Mais tarde, se desenvolverá uma adotado, desdenhado ou rejeitado, ele ocupa o es-
sociologia crítica das condições de constituição de sencial de um campo em que nos situamos obriga-
atores sócio-políticos (Cardoso, 1969;'Germanl. 1977; toriamente com relação a ele. Sem dúvida, seu prin-
Stavenhagen, 1969) [69]. cipal adversário, o marxismo (que, aliás, não deixa
ele próprio de ter reflexos teleológicos), optou por se
abster de uma disciplina à qual. como outros siste-
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 11- o TEMPO DAS AMBiÇÕES (1945-196B)
PARTE 11 BIBLIOGRAFIA (1945-196B)

~~~
mas filosóficos contemporâneos, não reconhece legi-
timidade. Sem dúvida, também, imagina-se, quando
da reconstrução e do desenvolvimento, que o co-
nhecimento do social requer mais análise empírica
do que especulação sintética. Em outras palavras, a
~::::~::::::::::::::::::~::::::::::::::::::::::::::::;;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:::;:::;:;:;:;::::::::::::~::::::::::::::::::::::::

Obras Norte-Americanas
BIBUOGRAFIA (1945-1968) i
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um tal modelo sem dúvida contribuiu fortemente pa- Status and Power (1953).
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anos 60, vão traduzir a profunda crise cultural do
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mundo ocidental. a dimensão teórica desse modelo
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já está em grande medida esgotada. Se a fórmula
Marshall B. ClINARD (Org.), Anomy and Deviant Behavior
de pesquisa empírico-analítica elaborada em Colum- (1964).
bia adquiriu uma autonomia que parece preservá-Ia R. A. CLOWARD, L. E. OHlIN, DeJinquency and Opportunity
de modo duradouro dos altos e baixos da disciplina, (1960)
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11- O TEMPO DAS AMBIÇÓES (1945-1968)
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA BIBUOGRAFIA (1945-1968)
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I
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HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
PARTE 11

I
~:;:;:;~:;~:;:;:;:;:;:;;;:;:;:;:;;;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;~:;:;:;:;:;:::::;::~::~:;~:;:;;;:;;;:;:;:~;:;:;;;:;:;:;:;:::::;:~;:;:;:;~;:;;;;;;;;;;;;~:;;;;;~:;;;:;:;:;:::;:;:::::::;:;:;~~;;~~~~;;~;;:;;;;;;;;;:;:;~::::::::~~~~
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111-UMA EXPLOSAO
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Luciano GALLlNO, Progresso tecno/ogico e evo/uzione organiz-
zotiv a negli stabilimenti Olivetti (1960).
1
968 nãa foi apenas o ano de uma fulgurante
série de agitações nos campi ocidentais, au
ainda do esmagamento da "primavera de Praga"
Alessandro PIZZORNO, Communità e razionalizzazione (1960).
pelas tropas do pacto de Yqrsóvia. Ele marcou, a
Obras Latino-Americanas oeste, o início de um período de viva contestação
cultural. política e social que, na juventude universitá-
Fernando H. CARDOSO. Sociologia do Desenvolvimento na ria e na infelligenfsia, se nutriu menas das afrontas à
América Latina (1969). liberdade nos países comunistas do que das formas
Celso FURTADO, Desenvolvimento e Subdesenvolvimento
mais radicais da ideologia marxista e tercelro-mundis-
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América Latina (1968). mar de "sociedades de consumo" (Baudrillard, 1970),
Rodolfo STAVENHAGEN, As Classes Sociais na Sociedade de "abundância" (Galdthorpe e col., 1968) ou ainda
Agrória (1969). de "apartunidades" (Blau e Duncan, 1967), mas cujo
madela cultural perdera a legitimidade, Iria avolumar-
;::~::~::~:=:=:::::;:;:::::;:;:;:;:;~:;:::;:;:;:;:;:;:;:;:;~~~;;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;~:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;~:;::~:;:;:;:;:;:;:;:;:;;;:;:;:;~:;:;:;:;:;:;~:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;~:;:;:;:;:;:;~:
se a onda de denúncias ferozes da desigualdade e
da opressão sob todas as suas formas (política, eco-
nômica, cultural. social, sexual, racial).
A sociologia não podia, evidentemente, passar in-
cólume. Interpelada e mobilizada, ela ocupou em
toda parte, num primeiro momento, um lugar central
nos debates intelectuais. Mas foi nos Estados Unidos
(e, de um modo mais amplo, no mundo anglo-sa-
xão) e na França que ela canheceu, com graus
diversos, as efervescências e reestruturações teóricas
mais notáveis, sob a forma de uma verdadeira ex-
plosãa de paradigmas.
111- UMA EXPLOSÃO DE PARADIGMAS (1968/1990)
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 1. OS NOVOS PARADIGMAS ANGLO-SAXÕES
PARTE /I

I
por volta de 1975, os financiamentos federais retoma-
ram seu crescimento até os "anos Reagan", que
reduziram de novo por algum tempo a disciplina a
certa penúria. O que permitiu limitar as conseqüên-
cias dessa degradação da solicitude federal por
I
uma sociologia aplicada considerada pouco rendosa
1. OS NOVOS PARADIGMAS foi a abertura, em 1982, num rápido reflexo de defe-
ANGLO-SAXOES sa, de um Consórcio das Associações de Ciências
Sociais (COSSA).

N o início dos anos 70, a sociologia americana


passa por uma aceleração brutal de seu re-
crutamento e de seu financiamento público (que trl- A SOCIOLOGIA CRíTICA
plica entre 1970 e 1973, quando atinge 120 milhões
de dólares por ano), seguida de uma regressão ain- lo trabalho de Alwin Gouldner sobre a crise da so-
da mais rápida. Em 1973, a ASA conta com mais de [r""'\- ciologia americana (1971) não é apenas uma crítica
vinte comitês, o número de seus membros dobrou f;v~ marxizante do parsonismo: ele se pretende também
em menos de dez anos, para atingir a cifra de ilv. um apelo à tomada de consciência por parte dos
15.000, e mantém uma considerável burocracia dirlgl- A'\.\,,~"\.,'SOCiÓlogos da dimensão política, ou até moral. de
da por um lobista muito bem remunerado. Além , ~b suas práticas. Nisso,ele se insere numa corrente geral
disso, existem cerca de quarenta associações nacio- \ de crítica tanto de ordem social quanto da soclolo-
nais e regionais com as razões sociais mais variadas, ~ gia (Birnbaum, 1971), que se exprime Já há alguns
e cerca de duzentas revistas sociológicas [70].ÃMas ~U - anos na revista)TranS-Action Magazine, aberta às opí-
esse período "triunfante" corresponde sobretud~ao I ~ niões "liberais". Nela são denunciadas tanto certos
apogeu de uma crise social nascida vários anos an- escritórios (como o. Hudson Institute de H. Khan e ou-
tes e que fez aumentarem as expectativas com rela-1 tras lojinhas de "futurologia") quanto o sistema carce-
ção à instituição sociológica - da parte do estado rário, escolar ou médico americano, ou ainda certas
federal. para que o ajude, da parte dos estudantes, 10 políticas governamentais que comprometem a socio-
para que se transforme em instrumento de luta. Real- rnH logia - como o famoso "projeto Camelot", que tinha
como objetivo inibir as lutas revolucionárias no mun-
mente, a recessão econômica de 1973 acabará ~
com a solvabilidade do primeiro e o fim da guerra t. do e que os protestos de inúmeros pesquisadores
do Vietnã (e da contestação política e cultural que ~U.\,t fizeram que fosse abandonado (Horowitz, 1967). No
a acompanhara), com a demanda dos segundoS] J campo dos "radicais", a denúncia visa à própria so-
Mas aos efeitos da crise social somam-se os da -~ ciologia, suas instituições e sua produção: ela se ins-
crise de uma disciplina cuja inflação institucional lndi- ~ ••, creve no contexto ideológico da "teoria crítica" da
ca mais a segmentação do que o florescimento. escola de Frankfurt sobre o papel sócio-político que
mais os conflitos internos do que a integração. Com cabe aos intelectuais (Gouldner, 1979): a "sociologia
o final da hegemonia parsoniana, a sociologia ame- da sociologia" torna-se um campo de análise privile-
ricana (e, de um modo mais amplo, anglo-saxã) viu, giado (Friedrichs, 1970; Gouldner, 1971. 1976).
de fato. multiplicarem-se,paradigmas hostis a um fun-
cionalismo cuja legitimidade tinham contribuído a t\~I, s;
minar durante os anos 60.
Acrescentemos que depois de -seu esboroamento. ~'t~v-~t
(L\~ h-~ J, ~ S~~"'~~\
111
- UMA EXPLOSÃO DE PARADIGMAS (1968/1990)

I
1, OS NOVOS PARADIGMAS ANGLO-SAXÕES

O. AVATARE' DO INTERACIONISMO SIMBÓLICO

Contra o behaviorismo da época e sob a Influên:-«~:::::':~:


cla do pragmatisrno, G. H. Mead mostrara, nos anos c:~ h
ÉVOLUÇÃO DOS EFETIVOS
DA ASA: 1965-1986 20, que os efeitos do ambiente social sobre os com- '), ',
14900 portamentos individuais passavam pela Interpretação ~
14290 por parte dos atores dos símbolos originários da Inte-
13680 ração e traduzidos nos papéis (C. H. Cooley), cuja
13070 Interiorlzação permitia ao "si" (Self) construir-see dom~ 1-
12460 nar esses processos de Interação. Seu sucessor n5!-J
l3 11 850 Universidade de Chicago, Herbert Blumer, for,nulara~
1i 11 240 em 1937 o paradigma do "interacionismo simbólico"
~ 10 630 em termos individualistas: a realidade social seria al""t..
~ 10020 soma de ações individuais construídas por atores em. <. Y.

9410 situações sociais que eles interpretam por referência <-" .•""'-1
8800 l..L 1.1 I I ! , I , , , , I , , , , ,~ não a uma cultura comum e estável, e sim ao curso~
1965 1967 1969 1971 1973 1975 1977 1979 1981 1983 1985 do próprio processo de interação - ou seja, em fun~'\.-,,~
ANO ção dos comportamentos dos outros atores. A ordem ~ _
social. portanto, é Instável e contingente: perpetua- (11 \....';'j
FINANCIAMENTOS
FEDERAIS
(1965-1985) mente reconstruída pelos atores, ela é o produto''> ,'"'}
temporariamente institucionalizado de Interações que '"
130
ela jamais determina (Blumer, 1969). .---l
117
Blumer denuncia, assim, o aspecto determinista do
:s 104


'o
O
91
78
funcionalismo, e acusa Parsons de não ser nem indi-
vidualista nem voluntarista o bastante. Sob sua
Influência e a do sociólogo do trabalho E. C. Htr-
~ 65
ghes, a "escola de Chicago" ganha novo ânimo, e
•• 52
convida à realização de monografias (geralmente
,~ 39
baseadas na observação participante) cujos objetos
~ 26
continuam sendo, na grande tradição de Chicago,
~ 13
I. , I , I , I , , I I ! , , , , , , , I 1 I
os fenômenos de desvio. Seus autores chamam-se:
01965 1967 1969 1971 1973 1975 1977 1979 1981 1983 1985
Ervlng Goftman, Howard S. Becker, Anselm Strauss,ou
ANO
ainda Harold Garfinkel. No início dos anos 60, esse
paradigma se afirmara como concorrente dos méto-
F?nte: (70.135 e 141), dos teóricos e empíricos dominantes; no final da
década, ele sucede - sob diversas formas - ao fun-
cionalismo.
• A teoria da "etiquetagem" - Os trabalhos de Ed-
Win Lemert (1967), de Joseph Gusfield (1963), de
David Matza (1969) ou ainda de Aaron Cicourel
(1968) contribuíram para sua elaboração, e H. S.
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 111
- UMA EXPLOSÃO DE PARADIGMAS (1968/1990)
PARTE /I 1. os NOVOS PARADIGMAS ANGLO-SAXÕES

1l]ri~
f}(mm Becker a sistematizou (1963). Essa teoria constrói o enfrentam, desembocando em renegociações per- :lil':i':li::'i::;
I:$!â são
desvio menos como um ato individual de transgres-
,~:~:,:::::::::do que como o resultado do processo coletivo
manentes da ordem social (Goffman, 1961; Glaser e ~~$~
Strauss, 1965, 1968; strouss. 1978). Transposta para õ"*~:::::::::::
de criação e de Imposição de normas, ao final do nível da sociedade global, essa análise opõe-se, por-
qual o estatuto de anormal é conferido a um indiví- ~ tanto, à concepção funclonalista de um ator cuja F~;,,)
duo (ou a um grupo) por aqueles que o assinalam e c.Jrn cultura e estatuto explicam os comportamentos, e d~,l:;
Q tratam. A mesma problemática orienta as análises ~ um sistema social integrado ao redor de valores I'---~
do estatuto dos doentes mentais (Goffman, 1961) ou compartilhados e de normas reguladoras: a "teoria (f'N' -..
dos moribundos no hospital (Glaser e Strauss, 1965), dos papéis" de Ralf Turner (Rose, 1962) mostra, de \li,_
gue estudam em termos de "carreira" esse processo preferência, como estes são produzidos pela rotiniza- 11 :l
de etiquetagem. ção de certos comportamentos. Além disso, é funda-~I
"" • O modelo dramatúrgico - Para o canadense 1 mentalmente antipositivista, ao se recusar a conferir à ~
l,1- . Goffman, que lecionou em Berkeley, os processos de ação social um sentido diferente do que é produzido
•. ~ ••••I' Interação são analisados através de um modelo durante a própria ação. --:f
~.- (1959) segundo o qual todo ator social procura, po- • A corrente "etnomefodológica" - Neste caso, o ~
~ ~ ra além dos papéis institucionalizados, oferecer a paradigma interacionista radicaliza-se ainda mais, j<!: ~
outrem uma imagem de si próprio que lhe garanta o que a própria ordem simbólica se torna contingent~.... _
controle dessa interação. As estratégias assim elabo- (22). Garfinkel, seu fundador na Universidade da Ca-
radas envolvem comportamentos físicos (1963b) ou lifórnia em Los Angeles (UClA), reteve do ensino
verbais (1981), e são tanto mais necessárias quanto nova-iorquino de Schutz (1967) que a realidade social
mais ameaça da estiver a Ldentidade pessoal. o "si" seria a construção coletiva de atores que, apesar da
(1969). Alqurnos situações limites são especialmente especificldade de suas experiências pessoais, concor-
Instrutivas: nas "instituições totais", como os asilos dam tacitamente sobre uma definição Intersubjetiva
(1961), Goffman não só mostra que os internos po- do mundo (Berger e Luckmann, 1966). Impressionado
dem escapar às normas mais tirânicas, mas sobre- com a semelhança entre a sociologia "científica" e a
tudo que as "adaptações secundárias" anormais a sociologia implícita dos atores sociais, Garfinkel define
que o sistema os reduz testemunham estratégias deE,.JI a etnometodologia como a ciência empírlca dos
resistência do "si"; no caso das relações entre defl- '\l. métodos graças aos quals os indivíduos conferem
cientes e indivíduos "normais", ambos devem perma- '" sentido às suas ações cotidianas (1967). Assim, a in-
nentemente administrar a distância entre identidade terpretação da realidade social já não passa por
social "virtual" (imputada) e "real", para ocultar um uma "compreensão" sociológica dos comportamentos,
estigma virtual ou real (1963a). Essesprocessos de in- mas reduz-se à coleção dos discursos feitos sobre
teração face a face revelariam o caráter cínico dos suas ações por atores considerados aptos a explicá-
atores, assim como sua alienação, que Ihes impede Ias (postulados de "reflexivldade" e de "descritibilida-
ter autenticidade e espontaneidade (1967) - visão de"), em suma, capazes de "um relatório dos relctó-
pessimista que traduz, talvez, a crise de uma con- rios" (Cicourel, 1964).
cepção liberal da sociedade nessesanos 60 [1:233.lJ Esseparadigma norteou inúmeras pesquisas empí-
Essagrade de análise se aplico às Instituições so- ricas em áreas institucionais "problemáticas" tão varia-
ciais consideradas como sistemas de recursos que os das quanto a justiça (Cicourel, 1968), a educação
atores em interação procuram mobilizar em seu pro- (Cicourel e col., 1976), as práticas médicas (Sudnow,
veito, constituindo coalisões cujas estratégias se 1967; Tumer, 1974) ou ainda a pesquisa científica. A
111- UMA EXPLOSÃO DE PARADIGMAS (1966/1990)
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 1. OS NOVOS PARADIGMAS ANGLO-SAXÓES
PARTE /I

I
:..~:::::::::::::::::~::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::;;:::::::::::::::::::::::;::::~:;;;::::::::::;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:::;:;:;:;:;:;:::;:;:;:;:;:;:;::::::::::::::::::::::::::::~:::::::::;::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::~

A REVOLUÇÃO ETNOMETODOLÓG/CA

'Quando fazemos sociologia, profana ou profissional, toda refe-


"análise de entrevista" criada por Harvey Sacks repre-
senta uma prática privilegiada, na medida em que
a linguagem é ao mesmo tempo Instrumento de
construção da ordem social e objeto da análise des-
se processo; aqui, a pesquisa se Interessa pelos efei-
I
rência 00 'mundo real', mesmo se diz respeito a acontecimentos tos do contexto ("indexicalidade") sobre a coerência
físicos ou biológicos, é uma referência às atividades orçonízcdos da e a Inteligibilidade dos Intercâmbios verbais. Com a
vida corrente, Por conseguinte, contrariamente a Durkheim, de que "sociologia cognitiva" (Clcourel, 1973), o que permite
certas formulaçóes ensinam que a reolidade objetiva dos fatos so- a "competência Interacional" dos locutores estudados
ciais é o princípio fundamental da sociologia, nós afirmamos, a
são os procedimentos Interpretatlvos extra-lingüístlcos
título de política de. pesquisa, que a realidade objetiva dos fatos
(ct. Chomsky),
sociais, enquanto realização contínua [ongoing accomplishment] de
atividades articuladas da vida cotidiana - sendo dado que os
Violentamente atacada por Lewis Coser em nome
membros conhecem, utilizam e consideram óbvias as maneiras co- da ASA em 1975, a etnometodologia nem por Isso
muns e engenhosas de a realizar - é um fenômeno fundamental deixa de prosseguir uma brilhante carreira nos Esta-
para os membros que fazem sociologia. Pois na medida em que se dos Unidos, onde ela se expande na direção da
trata de um fenômeno fundamental de sociologia prática, ele é o costa leste, assim como na Inglaterra (Heritage, 1984),
tema dominante das pesquisas da etnometodologia, Estaspesquisas na Alemanha (na Universidade de Bielefeld) e, recen-
analisam as atividades de todos os dias enquanto métodos dos temente, na França (cf. [22]).
membros para tornarem essas mesmas atividades visivelmente-
racionais-e-contáveis*-para-fins-práticos, ou seja, observáveis e d9S-
critíveis [accountable], enquanto organização das atividades
DAS TEORIAS DO INTERCÂMBIO SOCIAL
comuns de todos os dias, A retlexlvldode desse fenômeno é uma ~
atividade singular das açóes práticas, das circunstâncias práticas, ÀS DA ESCOLHA RACIONAL
do conhecimento comum [common sense knowledge] das estrutu-
ras sociais e do raciocínio sociológico prático. O que nos permite Com George Homans, o parsonismo enfrenta, na
balizar e examinar a ocorrência deles é essa reflexividade: enquan- própria Harvard, um duplo questionamento. O primei-
to tal, ela funda a possibilidade da sua análise. / ...t ro se refere a uma sistematização teórica que, em
'As pesquisas etnometodológicas não têm como objetivo formu- razão de sua generalidade, não estaria em condi-
lar ou justificar retificaçóes. Não têm nenhuma utilidade particular ções de explicar os comportamentos reais de atores
quando praticadas como ironia. Embora sirvam para preparar ma-
concretos. O segundo atribui essa Incapacidade à
nuais sobre os métodos sociológicos, elas não são de formo
função concedida a um sistema normativo de que
alguma um acréscimo aos procedimentos 'standard'; por essência,
são duas coisas diferentes. Elas não pretendem propor um remédio não podemos postular ao mesmo tempo tanto o ca-
para açóes práticas, como se pudéssemos achar que as açóes ráter institucionalizado quanto a capacidade de
práticas fossem melhores ou piores do que se pretende habitual- regular os comportamentos em condições diversas e
mente. Da mesma forma, não estamos à cata de argumentos rnutóveís. Assim, Homans propõe encontrar os funda-
humanistas, assim como não iniciamos ou encorajamos discussões mentos "infra-Institucionais" dos comportamentos,
teóricas 'permissivas'.' numa concepção utilitarista do comportamento hu-
mano inspirada na economia clássica e no behavio-
* No sentido de que as podemos relatar (N.d. T. francês).
rismo (Skinner). Sua "teoria do Intercâmbio social"
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nal das perdas e ganhos: assim, a ordem social

~k~0:~~~%;~~"*~%"'
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HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 111- UMA EXPLOSÁO DE PARADIGMAS (1968/1990)
PARTE fi 1. OS NOVOS PARADIGMAS ANGLO-SAXÕES

I
nasceria da satisfação sentida por Indivíduos que jul-
gam que suas "retribuições" equilibram suas "contribui-
ções", e os conflitos sociais, da "frustração relativa"
(Runciman, 1966) nascida da falta desse equilíbrio.
Aplicado às organizações, este esquema dava conta
quer se trate de trabalhos monográficos de "sociolo-
gia do passado", quer de tenlativas de teorização
de processos de longa duração. No primeiro caso,
estuda-se tanto a marginalidade na Nova Inglaterra
colonial (Erikson,1966), a Vendéia conlra-revolucioná-
~;~:r
da "lealdade" dos indivíduos que conhecem esse ria (Tilly,1970), a alta sociedade vitoriana em Londres
equilíbrio, de sua defecção (exit) ou de seu protesto (Davidoff, 1973) quanto a mobilidade social em Mar-
(voice) no caso contrário (Hirschman, 1970). Peter selha no século XIX (Sewell. 1985). Mas as "grandes
Blau o utilizou no estudo do surgimento de "normas estruturas, amplos processos e vastas comparações"
de reciprocidade" na distribuição diferencial do po- (Tilly, 1984) são sem dúvida favorecidas: origens so-
der entre os grupos sociais (1964), e William Goode, ciais das ditaduras ou das democracias (Moore,
para explicar a distribuição do prestígio (1979). 1966), sinergia de micro-desigualdades Iniciais na di-
Esseparadigma - que volta a concepções histori- ferenciação das sociedades (Wallerstein, 1974-1980),
camente "pré-sociológicas" da ação social [11] - teve processos revolucionários na França, na Rússiae na
uma vasta descendência no mundo ocidental. sob a China (Skocp ol. 1979); estas são, evidentemente,
forma de teorias neo-utilitaristas da "escolha racional" áreas onde alguns marxistas podem mostrar o seu
(Heath, 1976; Elster,1986) ou do "individualismo meto- valor (Anderson, 1974a e b). Mas o que antes de tu-
dológico" (O' Neill, 1973), para as quais as preferên- do caracteriza essa renovação é a recusa de qual-
cias e/ou as coerções (inclusive recursos) dos atores quer filosofia da história e um interesse acentuado
explicam seus comportamentos. Enriquecidas pela pelos fenômenos de mobilização coletiva. Na área
teoria econômica e pela teoria dos Jogos (Schelling, próxima da sociologia da cultura e da religião, subli-
1963), elas penetraram no campo da sociologia po- nharemos a importância dos trabalhos neo-parsonia-
lítica (Buchanan e Tullock, 1962), da sociologia da nos de Clifford Geertz (1973, 1983) e Robert Bellah
ação coletiva (Olson, 1966; Hardin, 1982) - e até da (1970).
sociologia de inspiração marxista (Elster, 1979).

O FLORESCIMENTO DA TRADiÇÃO
A RENOVAÇÃO DA SOCIOLOGIA HISTÓRICA EMPíR1CO-ANALíTlCA

Além do desinteresse do funcionalismo pela dia- Essa abundância de novos paradigma.s não nos
cronia, os sociólogos tiveram de superar os anátemas deve fazer esquecer do prosseguimento, na melhor
anti-historlstasdo estruturalismofrancês e anti-historicls- tradição americana, de n ob olh os em que dados
tas da filosofia analítica (Popper), para reatarem com empíricos são construídos e Interpretados segundo
uma problemática fundamental dos pioneiros da dis- procedimentos rigorosos,que levam à formulação de
ciplina. Podemos também pensar que, ao lado da teorias "de médio alcance". Seus domínios são tão
Influência crescente do marxismo no pensamento an- variados quanto o gerenciamento das organizações
glo-saxão, as restrições financeiras impostas à pes- públicas (Blau e Schoenherr, 1971), a desigualdade
quisa de campo nas duas últimas décadas favore- de oportunidades (Jenks e cot., 1972; Featherman e
ceram esse retorno às boas graças (Mennel. in [17]). Hauser, 1978), a mobilidade social na Grã-Bretanha
A descoberta recente da obra de N. Elias (cf. capo (Goldthorpe, 1980), os efeitos individuais da mudança
1.2) pelos anglo-saxões demonstra essa renovação, social nos Países Baixos (Gadourek, 1982), a difusão
111- UMA EXPLOSÃO DE PARADIGMAS (1968/1990)
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 1. OS NOVOS PARADIGMAS ANGLO-SAXÕES
PARTE /I

I
seqüentemente, a ambigüidade da interpretação dos li::::!. ii':i:i:
das Inovações (Rogers, 1983) ou ainda as relações
entre grupos sociais (Blau e Schwartz, 1984). Os pro-
resultados (Abell, in [17]). :~$.9
No fim dos anos 80, a paisagem sociológica an- :::::::::;:::::
gressosrealizados no campo estatístico e, em particu-
glo-saxã está extremamente cindida. A considerável
lar, da análise causal são aí amplamente explorados.
segmentação institucional. intelectual e temática da
Prova disso é o sucesso obtido nos anos 70 por um
disciplina certamente constitui uma riqueza potencial
modelo de análise multivariada baseado na técnica
para seu desenvolvimento extensivo. Todavia, os re-
de regressão múltipla (Path Ana/ysis) e, mais recente-
cursos teóricos existentes não Impedem que a pes-
mente, pela generalização do modelo linear (L1SREL).
quisa empírica continue sendo essencialmente Indu-
Mas essa sofisticação tecnológica esconde mal uma tiva. Demasiados trabalhos teóricos, mesmo quando
precariedade crônica das hipóteses utilizadas e, con- se referem a objetos limitados, são realmente de um
formalismo abstrato que os torna heuristicamente
pouco férteis (e.g., Blau, 1977; ou ainda, Berger e Zel-
ditch, 1985). Inversamente, as contribuições "teóricas"
A ASA SE ZANGA
propostas pelos pesquisadores de campo muitas ve-
'A anólise 'path' é um método que foi rapidamente adotado zes são apenas generalizações empíricas dificilmente
por amplos círculos da disciplina sociológica, pois oferece meios Integráveis aos saberes já constituídos - contrariamen-
técnicos para medidas mais precisas de que não dispúnhamos até te ao credo "incrementalista", que pretende que a
então; a etnometodologia, em contrapartida, só foi adotada por
acumulação de dados seja o principal caminho pa-
um pequeno número de próticos aglutinados ao redor de um líder
carismótico e seus apóstolos. A primeira se expandiu amplamente ra a extensão do conhecimento (Turner, in [52]).
graças às variadas redes de informação, simultaneamente pessoais Além disso, essa obsessão empirista induz muitos efei-
e impessoais, de que dispunham os sociólogos; a segunda desen- tos perversos: construção nominalista de "fatos" que
volveu códigos de comunicação particularistas que tiveram como devem muitas vezes a sua especificidade, ou até
resultado restringiro acesso apenas aos iniciados. No entanto, am- sua existência, aos métodos de acordo com os quais
bas têm em comum uma hipertrofia do método às custas de uma
são observados e analisados; identificação da cientl-
verdadeira teoria. A primeira foi utilizada como um encorajamento
ficidade e do valor cognitivo dos resultados com o
a pôr de lado consideróveisóreas de investigação. mesmo se con-
duz a uma maior precisão em outras óreas, importantes para rigor e a sofisticação das técnicas; convicção da
alguns deles, triviais para outros. A segunda se presta, no rnóxírno. neutralidade axiológica dos produtos da formalização
a descrições, vazias de teoria, de categorias cognitivas, e evita de- matemática; enfim - como a necessidade dos méto-
liberadamente abordar a maior parte dos temas que estão no pró- dos estatísticos é lei -, concepção individualista dos
prio cerne da sociologia desde Auguste Comte. Em ambos os
fenômenos estruturais.
casos, acho que a preocupação metodológica levou a se negli-
Porém, ao lado dessas características recorrentes
genciar a significação e a substância do social. E no entanto, a
nossa disciplina seró julgada, em última onólise. pela sua capacida- da sociologia americana, devemos sublinhar a ten-
de real de elucidar as estruturas sociais que nos rodeiam e condi- dência à diversificação que age em favor do
cionam em ampla medida o curso de nossasvidas. Se deixarmOS microscópico e, na medida em que a interação indi-
de lado esta tarefa maior, se nos furtarmos ao desafio dessasques- vidual não seja mais referível senão a si mesma, do
tões, trairemos nossa vocação e degeneraremos numa dispersãode
estritamente descritivo. Numa tal situação, alguns
seitas rivais e de pesquisadores especializados que saberão cada
vêem uma saída recorrendo a um neo-parsonismo
vez mais sobre cada vez menos coisas.'
(Alexander, 1982-1984), ao passo que outros (e.g.,
COSER. troduzldo da 'PreSldenllal Addrass Two Malhods in Search 01 COllins,1975; ou ainda Turner, 1988) tentam explorar
Subslanca'. Amerrcan Sociolo çic ol Ravlaw, 40(6). 1975. pp. 691-700. essa diversidade recorrendo a uma ampla síntese
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HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 11I- UMA EXPLOSÃO DE PARADIGMAS (1968/1990)
PARTE /I 2. OS DILEMAS DA SOCIOLOGIA FRANCESA

I
teórica que Integre os pensamentos clássicos. Essa
síntese deveria permitir a superação da oposição es-
téril e falsa entre macro e micro-sociologia. entre o
ponto de vista das estruturas e da coerção. de um
lado. e o ponto de vista dos atores e da subjetivida-
:~~~~~(~~S~e~~.UI,a
sobre a, Sociedade, cantempa-I

Ao mesmo tempo. favorecidos pelo afluxo de pes- ::::::::~::~:::


quisadores agora oficializados (depois de dez anos
de existência de um curso universitário de sucesso
de. de outro [1]. A audiência americana dos traba- público crescente e até hoje não desmentido. ape-
lhos Ingleses de Anthony Giddens (1979. 1984). que sar da relativa Insuficiência de sua Implantação
tenta estabelecer um continuum que vai da etnome- nacional) e por uma política de contratos de pesqui-
todologia ao marxismo. revela bem essa tomada de sa com o governo (em particular sobre a administra-
consciência. ção e o urbanismo). laboratórios e equipes se multi-
plicam no CNRS. nas universidades. na Escola dos
Altos Estudosde Ciências Sociais (que rompeu com a
EPHEem 1973). Eles não mais se constituem apenas
ao redor de um tema específico. mas também. com
freqüência. ao redor de uma problemática própria
2. OS DILEMAS [57].
A disciplina vê seu campo estender-se às formas
DA SOCIOLOGIA FRANCESA novas de consumo (Baudrillard. 1970). de cultura. de
marginalidade (Labbens. 1978; Schnapper. 1981) de

o s acontecimentos de maio de 1968 explo-


dem numa França que está saindo de um
período de crescimento econômico. de reestrutura-
protesto (Adam e Reynaud. 1978; Durand. 1981) etc ..
ao passo que se diversifica sua reflexão teórica. Mas
ela não tem muito peso no mercado científico onde
ção social e de organização administrativa sem pre- se negociam os financiamentos. e sim no mercado
cedentes. Elesrevelam fortes sentimentos coletivos de Intelectual e editorial. onde se conquista o prestígio
exclusão. de dominação e de alienação - como se social. Assim. ao longo dos anos 70. a "década dos
"os atores e o sistema já não se correspondessem" livros" [57:283]. a sociologia conhecerá o formidável
(Touraine. in [53]). Na sociologia. explode outra crise: acolhimento de um público visivelmente mais seduzi-
acerca da interpretação da crise social e. mais fun- do pela natureza dos temas abordados e pela
damentalmente. acerca das concepções relativas à impertinência de seu tom do que mobilizado pelo
natureza do sistema. à ação dos atores. às relações valor cognitivo compreendido e pelo rigor dos proce-
entre o primeiro e os segundos. dimentos.
Durante a década seguinte, as formações superio-
res se diversificam e tentam oferecer um saber apli-
UM PROCESSO DE EXTENSÃO cável (DEA. DESS),ao mesmo tempo que sofrem a
E DE SEGMENTAÇÃO concorrência das novas especialidades da Informa-
ção e da comunicação. O ministério da Pesquisa
É preciso. então. renunciar às esperanças de unifi- (que sucedeu à DGRSTem 1981) acentua seu domí-
cação que antes haviam sido depositadas no Centro nio sobre a pesquisa, preferindo a uma política de
de Estudos Sociológicos. cujas equipes vão tornar-se contratos uma política de encomendas diretas, via
autônomas. Depois de muitos sobressaltos.ele acaba- CNRS,que titulariza seus inúmeros auxiliares. Este últi-
rá por ser substituído. em 1986. pelo muito federativo mo acaba por acolher um número de pesquisadores
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 111- UMA EXPLOSÃO DE PARADIGMAS (1968/1990)
PARTE /I 2. OS DILEMAS DA SOCIOLOGIA FRANCESA

~~~[i~[~~~~i
I
muito superior ao dos universitários - situação que,
com exceção da etnologia, não tem equivalente no
setor das ciências humanas e sociais. No entanto, a
decentralização administrativa do país estimula e di-
versifica a demanda, contribuindo para uma nova
Os anos 70 vêem viver e morrer o "estrutural-mar-
xismo", que dominou por um breve período senão
MORTE E RESSURREiÇÃO
DE UMA SOCIOLOGIA DO ATOR
I!~
extensão do campo na direção de "problemas so- toda a sociologia francesa, pelo menos sua expres-
ciais" agudos: políticas sociais e culturais (Maurlce et são mundana, e nascerem orientações teóricas que
ol., 1982; Chczel, 1987). vida local (Lautman e Men- se afirmarão plenamente na década seguinte. Com
dras, 1986), velhice (Guillemard. 1986), imigração (Ta- o desmoronamento do pensamento marxista e da
boada-Leonettl, 1987; Tripier, 1990), delinqüência forma Ideológica do estruturalismo, esse paradigma
juvenil (Dubet, 1987), educação (Cherkaoul. 1982), extingue-se rapidamente no final dos anos 70, sem
pobreza e exclusão (Gruel e col., 1984) etc. Ao mes- dúvida arruinado tanto por seu próprio fechamento
mo tempo, dentre os temas tradicionais. os da estra- Intelectual quanto pelas novas perspectivas ofereci-
tificação social (Verret. 1979; Gresle, 1981; Boltanski, das pela vida política (isto é. a conquista do poder
1982; Thelot, 1982; Lavau e col., 1983; Bidou. 1984) e
da família (Pitrou. 1978; Segalen, 1981; Singly, 1987; :~::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::;:;:;:;:::;:::::::::;:::;:::;:::;:;:;:;:;:;:;:;:::::;:;:;::::=;:;:;:;:;:;:;:;:::::;:;:::::::::::::;:;:::;:::::::;:;:::;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:::::::::;:::::::::;:::::::::::::::::::;:;:::;::::!:::
Roussel. 1989) são privilegiados. A França pode, as-
sim, em meados da década de 80, contar com A EPOPÉIA ESTRUTURAL-MARXISTA
cerca de 1.500 sociólogos igualmente divididos entre
o ensino (que se ampliou para os liceus e para as
o paradigma em busca do qual a sociologia francesa estava
há cerca de trinta anos. alguns acreditaram tê-Io encontrado num
escolas do ramo de saúde, de trabalho social. de
avatar marxizante de um estruturalismo que na época floresceu nas
arquitetura etc.), a pesquisa pública e um setor cres- ciências humanas (Lévi-Strauss.Lacan. Barthes. Foucault). O filósofo
cente de "práticos" (nas empresas. nas administrações Louis Althusser desempenha um papel decisivo nessa promoção:
e num número cada vez maior de escritórios espe- sua leitura de Marx (1965) o leva a revelar uma 'ruptura epistemo-
cializados) (Sainsaulieu.in [60)). lógica' que permite que uma análise em termos de dominação
Entretanto, ao mesmo tempo que se afirma seu vi- das estruturas sócio-econômicas se destaque de uma filosofia idea-
gor intelectual. a sociologia francesa sofre uma rela- lista: na sociedade capitalista. os indivíduos não são sujeitos da his-
tória do mesmo modo que não são senhores de suas alianças em
tiva perda de prestígio social. devida. em parte, à
matéria de parentesco. São 'suportes' de 'estruturas' cujo processo
sua perda de audiência cultural enquanto Instrumen-
de reprodução e de transformação é apenas atualizado pelos
to do debate ideológico (em proveito da "nova filo- comportamentos individuais. Só resta. então, denunciar uma ordem
sofia"?) e de auto-análise da sociedade (em proveito essencialmente não negociável (Foucaull. 1975).
da história e da antropologia). Ela aparece, sem dú- Esseesquema inspira uma série de trabalhos polêmicos; cujos
vida, mais tecniclzada do que antigamente e, por- objetos prediletos são o estado e a política (Poulantzas, 1974: Ber-
tanto, menos carregada de sentido. Entre o toux 1977), o sistema escolar (Baudelot e Establet. 1971). a cidade
"ensaísmo" especulativo ou Impressionista(que conti- e o urbanismo (Castells, 1972). Elestêm em comum identificar o es-
nua ativo porque socialmente gratificado) e a "espe- tado à 'burguesia', cuja dominação (ao mesmo tempo econômica,
cialização de curto alcance" (demasiado descritiva e política e ideológica) sobre uma estrutura de classe assimilada à
rotineira, embora politicamente cortejada), o caminho das relaçóes de produção comandaria a existência de 'aparelhos'
capazes de controlar a reprodução dessa dominação. No mundo
é bastante estreito para uma sociologia explicativa.
anglo-saxão e na América Latina. esse quadro de pensamento
isto é. teórica e empiricamente instruída [47). continuará contando. nos anos 80, com uma audiência segura.
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HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 111- UMA EXPLOSÃO DE PARADIGMAS (1968/1990)
PARTE /I 2. OS DILEMAS DA SOCIOLOGIA FRANCESA

iiiiii~]1pela esquerda). Tornamos, então, a encontrar o Inte- ativo dos agentes, Numa tal perspectiva, o papel !"i','i:'1iil'l
ii.i$.i. resse pela diacronia, pela ação e o local. num afas- desempenhado pelo sistema educativo na reprodu- 1265
:~::::~::,<.,~ tamento geral do determinismo, ao passo que o ção e na legitimação da ordem social é evidente- :::~::::::::::::~
fundo Ideológico do debate teórico (aliás, pouco mente decisivo (1964, 1970, 1989), Nos conflitos -
animado) se torna mais discreto [47]. entre classesou no interior de um "campo" particular:
r---- Quatro paradigmas dividem hoje o essencial do científico, político etc. - gerados pela aquisição ou
t campo sociológico [36]. Se todos eles reintroduzem pela conservação dos Instrumentos de dominação
S\J;.~ explicitamente o ator, lsto se faz concedendo-lhe um que são os diferentes "capitais" (econômico, mas
lugar maior ou menor na análise. Numa das extreml- também cultural, social e simbólico), os agentes de-
~ dades deste quase-contínuo, em Pierre Bourdieu, ele senvolvem "estratégias" (que não são necessaria-
r"'to.. ainda não passo de um "agente"; no outro extremo, mente nem conscientes nem racionais) comandadas
~~em Raymond Boudon, ele se torna o "átomo" do so- pela atualização de seus habitus em situações parti-
Co \. - clot: entre os dois, em Michel Crozier, ele se trons- culares,
~v.~ forma em "estratego" de um jogo tnstltuctonot. O estudo das atitudes e práticas culturais (1979;
Quanto ao ator de Alain Touraine, compartilha com Bourdieu et. ai" 1965, 1966) é, portanto, privilegiado
.'\
o de Bourdieu uma situação de conflito nascido de em razão das estratégias que ali se desenvolvem pe-
\~: _ relações de dominação, e com o de Crozler um es- lo domínio de um capital simbólico que confere a
O"' tatuto de ator coletivo que se reconhece a si todos os outros sua eficácia social. A revista Actes
~ mesmo interessese um projeto próprios; mas ele age de Ia recherche en sciences socicües, criada por
4 para a transformação de uma ordem que permane- Bourdieu em 1975, constitui o órgão de defesa e de
ce transcendente ao "agente" de Bourdieu, e que o kt Ilustração desse paradigma, cuja evolução, de um
ator de Crozier só pode negociar. D"determinismobastante estrito a uma concepção mais
• O estruturalismo genético - Em reação contra o "estratégica" da ação social (Bourdieu, 1987; Boltans-
determlnismo mecanicista do estruturalismovlgente'lf· A kl, 1982; Dobry, 1986) é representativa da evolução
Bourdleu (pro.fe.ssOL.dD-,CoJágio.de França) procUra Por que passou a sociologia francesa na última dé·
explicar os processos através dos quais as estruturos
sociais são, ao mesmo tempo, reproduzldas peló~
l ~
cada,
• O accionalismo - Convencido de que as socte-
comportamentos Individuais e produtoras dessescom- dades pós-industriais (1969) se caracterizam pela
po~~mentos,.;..1- ~",-capacidade de agir sobre si mesmas, A, Touraine (dl-
Nesta perspectiva, o conceito de "habitus" torno-se • retor de estudos na EHESS)designa à sociologia o
central: designa um sistema estável de disposições a ~~ estudo da ação social e não mais apenas o de seus
perceber e a agir inculcadas por socialização nos in- ~ determinantes (1965). A questão da "produção da
divíduos, e geradoras, conforme as situações encon- sociedade" por si mesma (1973) e, portanto, a ques-
tradas, de uma infinidade de práticas sociais cuja tão do processo de constituição dessa capacidade
espontaneidade, assim, não passa de ilusão (1974, \ de ação (a "historicidade") tornam-se en1ão centrais,
198Õ}.'A reprodução e a manutenção das relações O domínio dessa historicidade sobre as práticas de
sociais são tanto mais garantidas quanto mais a ln- uma sociedade (o "sistema de ação histórica") é fun-
culcação das arbitrariedades de classe se faz sob a ção do modo de conhecimento da realidade, do
máscara de um discurso ideológico (a "violência sim- processo de acumulação e de investimento da pro-
bólica") que fundamenta a dominação social e a dução, e do modelo cultural segundo o qual essa
desigualdade das relações .soclois no consentimento sociedade percebe sua criatividade, O domínio des-
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 111- UMA EXPLOSÃO DE PARADIGMAS (1968/1990)
PARTE /I 2. os DILEMAS DA SOCIOLOGIA FRANCESA

~rr~~t~~
§:::\:):~:~
sas três dimensões constitui, mais do que a proprle- outras tantas fontes de poder pelas quals eles con- ;;:!~!::;:~:!:![
I$.$. dade do capital econômico, o que está em jogo no servam ou aumentam suas vantagens. Ao contrário :i6.~t
:::::::::::::::::::
conflitos de classes, que contrapõem menos grupos de uma concepção funcionalista ou estruturalista,es- :::::::::::::.~
concretos do que atores coletivos em luta pela ges- ta sociologia descreve toda organização (e, de um
tão da historicidade. Nas sociedades "programadas", modo mais geral, todo "sistema concreto de ação")
onde a acumulação do saber científico e técnico se como um "construto social" resultante das "estratégias"
tornou o modelo cultural dominante, o controle social de seus participantes, e que também os gera, mas
e político desse modelo torna-se o objetivo principal de maneira "contingente", ou seja, segundo uma
de conflitos constituídos menos pela defesa de Inte- causalidade sistêmlca e não linear. Essasestratégias,
resses econômicos do que pela contestação da que não são necessariamente nem conscientes nem
apropriação da historicidade pela classe dominante. racionais, são função dos recursos e das coerções
São prova disso os "movimentos sociais" contemporâ- de que o ator crê dispor e dos objetivos perseguidos
neos estudados por Touraine e seus colaboradores na utilização ou na transformação das regras em
(1978, 1980, 1981); eles não reúnem mais atores de proveito próprio; o modelo do "jogo" aparece, assim,
classe (1984), e sim atores individuais que reconhe- como o mais apropriado à análise da ação. Os con-
cem uma identidade comum na consciência de sua flitos que geram essas relações de (e para o) poder
oposição a um modelo cultural ao qual contrapõem provêem do caráter "limitado" das condições desse
um projeto próprio. jogo - quer se trate da interdependência dos atores,
A "intervenção sociológica" praticada no âmbito da racionalidade de seus comportamentos ou da le-
do Centro de Estudo dos Movimentos Sociais (1970) e gitimidade reconhecida às metas da organização.
depois, a partir de 1979, do Centro de Análise e de Tendo partido de uma análise crítica da organiza-
Intervenção Sociológica (CADIS)é apresentada como ção burocrática e dos "círculos viciosos" que ela
~~""tum método de análise que permite que os atores gera, a propositura de Crozier estendeu-se à socieda-
descubram os significados de suas práticas sociais e de global (1970, 1979, 1980, 1987) para Identificar
aumentem suas capacidades de ação coletiva seus "bloqueios" e as condições de desenvolvimento

L (1978).
• O modelo estratégico - Depois de ter estudado
das capacidades coletivas de inovação. (Ver tam-
bém: Gremion, 1976; Sainsaulieu,1977; Dupuy e Thoe-
o funcionamento das organizações administrativas e nig, 1983; Reynaud, 1989.)
Industriais (1963, 1965, 1974) e verificado o domínio • O individualismo metodológico - Segundo R.
cada vez maior das organizações na vida social. M. Boudon (1979; Boudon e Bourrlcaud, 1982) (membro
Crozier (que dirige um dos maiores laboratórios do do Instituto e professorda Sorbonne), esse paradigma
CNRS na área de ciências humanas) propôs propor pode ser resumido na fórmula M = M{m[S(M')]}: ela
um paradigma dos fenômenos sociais concebido em quer dizer que todo fenômeno social M é uma fun-
termos de relações entre "sistemas"e "atores" (Crozier ção da agregação das ações individuais m que
e Friedberg, 1977), ultrapassando assim a sociologia dependem da estrutura da situação S em que se
das organizações em nome de uma sociologia da encontram os atores, ela própria afetada por dados
"ação organizada". macro-soclais M'.
De fato, as normas e papéis sociais mais formaliza- Com Isso, Boudon opõe-se decididamente a uma
dos nunca determinam totalmente os comportamen- tradição "holista" e determinista. De fato, ele afirma
tos individuais: a organização mais burocrática que a explicação sociológica implica levar em con-
reserva "zonas de Incerteza" que são, para os atores, ta a racionalidade que atores "intencionais" desenvol-

~. ~~"--~ ~ ~f, (6)\~~~)


HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 11I- UMA EXPLOSÃO DE PARADIGMAS (1968/1990)
PARTE 1/ 2. os DILEMAS DA SOCIOLOGIA FRANCESA

I
vem em situações de Interação, cuja estrutura pode
ser tanto a de um sistema "funcional" (cujos papéis
geralmente dão margem às estratégias Individuais),
quanto a de um sistema de "interdependêncla". Nes-
te último caso, muito freqüente na vida social, o eixo
"dinamizado" de Bourdieu, a de Marx também se en-
contra na sociologia da dominação deste último e,
mais ainda, na sociologia dos conflitos de Touraine.
Em ambas, Weber também deixa sua marca: como
te6rico da legitimação no primeiro caso, como te6rl-
I
que organiza a interação é o fato de que, como a co das orientações culturais da ação no segundo; e
conduta de cada ator tem conseqüências sobre os se Crozler lhe deve o material conceltual de sua crí-
efeitos da conduta dos outros, os atores devem levá- tica da burocracia, Boudon o reivindica expressa-
Ias em conta ("dilema do prisioneiro") e, então, s6 mente - ao mesmo tempo pelas premissasIndividua-
dispõem de uma racionalidade limitada. Daí o surgl- listas que nele descobre, por seu nomlnallsmo funda-
mento de efeitos de agregação "perversos", não mental e por um procedimento "compreensivo"
desejados ou contrários às expectativas Individuais recolocado no quadro utilitarista anglo-saxão. Além
(1977), que constituem uma classe numerosa de fe- disso, o "individualismo metodológico" reanima o Tar-
nômenos sociais - dentre os quais a evolução da de anti-sociologista, encontra em Durkheim um prá-
desigualdade de oportunidades escolares e sociais, tico envergonhado do método compreensivo, reco-
cujo estudo Boudon privilegiou (1973) antes de apli- nhece em Pareto a intuição dos efeitos perversos e
car esse paradigma ao estudo da mudança social faz justiça ao formalismo de Simmel. Será que tudo
(1984). Isso não traduz, da parte da sociologia francesa,
Evidentemente, é em defesa do postulado utilitaris- uma grande abertura, ou até uma reinterpretação
ta - aliás não necessário (Padioleau, 1986) - do para- cumulativa, senão da história da disciplina, pelo me-
dlgma Individualista que Boudon dirige o melhor de nos das condições de seu progresso?
seus esforços; no entanto, sua análise das "boas ra- Se nem sempre podemos falar de verdadeiras "es-
zões" para se aderir a idéias falsas (1986) vai além colas", podemos afirmar que a grande maioria dos
de uma concepção utilitarista da racionalidade e trabalhos atuais se vinculam mais ou menos direta-
abre novos caminhos na sociologia do conhecimen- mente a um ou outro dessesparadigmas, e os discu-
to. Esse paradigma, aparentado ao da "escolha tem. A este respeito, a sociologia francesa mostra-se
racional" dos anglo-saxões, tem muita Influência, nos notavelmente mais integrada do que sua homóloga
anos 80, sobre a sociologia política (Birnbaum e Le- anglo-saxã, que, mais fragmentada ainda no plano
co. 1986). paradigrnático, padece a existência de uma grave
dicotomia entre elaborações teóricas e procedimen-
tos empíricos. Ela possui. desse modo, para além das
NOS "QUATRO CANTOS DA SOCIOLOGIA FRANCESA" divisõese das querelas de escolas, uma personalida-
de, uma densidade e uma diversidade a que uma
Nos pontos cardeais da disciplina (Touraine, In bibliografia forçosamente sumária não poderia fazer
[53)), portanto, os grupos se distinguem por postula- justiça (cf. [36,53,60)).
dos te6ricos, conceitos, métodos e campos de inves-
tigação originais. Nessa divisão de trabalho de facto,
que nasce da diferença das perspectivas, ou até
das divergências s6cio-filosóficas, também os manes
dos ancestrais da disciplina são repartidos. Se a des-
cendência de Durkheim é reduzida ao estluturalismo
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 111- UMA EXPLOSÃO DE PARADIGMAS (1968/1990)
PARTE /I 3. E EM OUTROS LUGARES ...

I ensinada. os temas de pesquisa estão estreitamente


ligados à evolução política e aos problemas econô-
micos e sociais do país (Alberonl. 1977; Ferrarotl.1971;
Meluccl. 1974). e a referência marxista é predomi-
I
nante (Plzzorno, 1978).

3. E EM OUTROS LUGARES ...

As tendências gerais que se depreendem da


observação dos casos americano e francês
caracterizam igualmente. mutatis mutandis. a evolu-
ção recente da disciplina nos principais países que a
acolhem: crescimento e segmentação institucionais.
diversificação das referências teóricas. "rotinização" da
pesquisa aplicada. Ao longo das duas últimaS déca-
das. o destino do empreendimento sociológico
parece. portanto. mais coletivamente partilhado do
que antes - à imagem do das sociedades ociden-
tais.
Todavia. se as crises atravessadas são compará-
veis. sua expressão é diversa. Na Grã-Bretanha. onde
o estatuto da sociologia ainda permanece muito
controvertido. apesar de um inegável desenvolvimen-
to Institucional. acolheram-se e exploraram-se todas
as expressões teóricas - e hoje se acalentam espe-
ranças de síntese. que ainda não estão à vista na
França. Na Alemanha. os conflitos teóricos foram
agravados pelas oposições sócio-filosóficas subJacen-
teso e a disciplina continua assinalada por fortes
especificldades regionais que contrapõem especial-
mente (como no caso holandês) as tradições positl-
vista. marxista e fenomenológica (Albert. 1987); entre-
tanto. um herdeiro da "escola de Frankfurt" como
Jürgen Habermas [cuja controvérsia com o neo-par-
sonlano Luhmann (1971) ficou famosa] renuncia à crí-
tica neomarxista da "razão instrumental" para
procurar. à luz dos mais diversos sociólogos clássicos.
os fundamentos lingüísticosda comunicação Intersub-
letlvo, sem a qual não existiriaação social (1981). Na
Itália. onde agora a sociologia já é reconhecida e
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 111- UMA EXPLOSÃO DE PARADIGMAS (1968/1990)
PARTE /I BIBUOGRAFIA (1968-1990)

I
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"
TENDENCIAS GERAIS
E PERSPECTIVAS
C
onfigurações culturais, orientações e natureza
do poder político e dos conflitos sociais, si-
tuação geopolítica, nível de desenvolvimento cientf-
fico, organização universitária, natureza dos "pro-
blemas sociais" dominantes, modalidades de Inaugu-
ração da disciplina são outros tantos parâmetros da
equação histórica da sociologia. A interpretação
aprofundada dessa história requer, portanto, uma so-
ciologia da sociologia, de que apresentamos alguns
dos materiais, mas que ultrapassa as ambições deste
livro. Assim, nos contentaremos em frisar algumas ten-
dências da evolução recente da disciplina, que
constituem apenas hipóteses de observação, e não
prognósticos.
No plano epistemológico, notamos uma vontade
geral de ruptura da sociologia com a filosofia social.
Essaruptura, porém, está longe de estar consumada,
e sem dúvida não pode sê-Io totalmente, a acredi-
tarmos em Weber, que distinguia entre o caráter
científico possível de um procedimento de interpreta-
ção ou de explicação e o caráter Inevitavelmente
"Ideológico" (ou, de um modo mais amplo, social-
mente orientado) da problemática que o suscitou e
construiu o seu objeto. Correlativamente, os sociólo-
gos parecem cada vez mais convencidos tanto das
possíveisinterferências de seu estatuto de atores so-
ciais com seu papel de pesquisadores, quanto do
caráter sempre parcial e provisório de seus resultados.
É cada vez maior o seu desejo de respeitar critérios
de cientificidade; infelizmente, essescritérios são obje-
to de definições múltiplas, não raro contraditórias,
como prova, por exemplo, a oposição entre fenome-
nólogos e positivistas.
No terreno teórico, a tendência mais significativa é
para a decomposição do modelo clássico, segundo
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA 111- UMA EXPLOSÃO DE PARADIGMAS (1968/1990)
PARTE /I TEND~NCIAS GERAIS E PERSPECTIVAS

o qual o sistema social e os indivíduos se correspon- se então um instrumento de "problematização" do so- 1:1::'1:'1'1'1111
'11111111:1~ll'll
deriam como o todo e as partes. a causa e o cial e suscita as questões que a sociedade se :!ã;~:
:!~:2 efeito. A "volta ao ator" é geral depois do fim do es- coloca a si mesma. Alguns p eríodos de "crise" são :;:::::::::;:;:~,
trutural-funcionalismo: o "holismo" é o Inimigo e a inte- particularmente favoráveis a esse desabrochar da ati-
ração. a célula germinal do social. Esse aggiorna- vidade sociológica; o risco. então. é que a sociologia
mento assume formas radicais em certas correntes se torne um Instrumento de racionalização Ideológica
do interacionismo simbólico e do individualismo meto- das atitudes e dos comportamentos dos atores (co-
dológlco. a ponto de decretar a Inexistência do "sis- mo na Alemanha do entre-guerras. nos Estados Uni-
tema". Sem dúvida. podemos então aguardar o dos ou na França do final dos anos 60). Não se
surgimento de modelos mais complexos e matizados produziria a "melhor" sociologia quando ela. em posi-
do que os propostos até agora. ção forte. consegue controlar uma demanda social
No plano da metodologia. as tendências observa- mais ou menos explícita através de seus próprios es-
das ganham o aspecto de verdadeiros progressos. quemas teóricos (Chicago nos anos 20. a sociologia
Em primeiro lugar. sea distinção entre métodos qua- americana do pós-guerra. ou francesa dos anos 80)?
litativos e quantitativos contínuo valendo. esses dois
tipos de procedimento tendem a se completar mu- ;:::;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:::;:;:::::::;:;:;:;:::;:;:;:;:;:;::::::::::~:::::::::::;:::::::::::::::::::::::::::::::: :;:;:;:;:::;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:::;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:
tuamente nos trabalhos empíricos. Em segundo lugar.
os métodos quantitativos penetram nas pesquisas de A PRODUÇÃO SOCIOLÓGICA NO MUNDO EM 1990
nível macro-sociológico. que durante muito tempo
Uma sondagem do número de agosto de 1990 dos Soc;olog;col
Ihes foram hostis (exceto no caso de análises estatís-
Abstracts, que faz o recenseamento das publicações sociológicas
ticas secundárias). Enfim. as técnicas e Instrumentos no mundo (livros e artigos), mostra as seguintes porcentagens:
de coleta e de processamento de dados atingiram.
graças aos progressos da estatística e do cálculo in- Origem geográfica
formático. um alto grau de performance e de preci-
América do Norte 59.91. Japão 0.38
são. Ao mesmo tempo. os métodos qualitativos se
Europa oco (menos RU) 18,16 Ásia (outros) 0,32
diversificaram e tecnicizaram. No entanto. essas ca-
Reino Unido 11.46 Caraibas 0.21
pacidades. com sua sofisticação. muitas vezes con-
Europa do leste 3,38 Oriente Médio 0,21
trastam com a modéstia das hipóteses de que fndia 1.87 China 0,12
devem tratar - como provam os estudos anglo-saxões URSS 1.63 América Central 0,07
dos anos 60 e 70 na área tão facilmente quantificá- Pacífico 1.18 África 0,06
vel da mobilidade social. América do Sul 0,62 Oceania 0,03
Quanto à definição do terreno da sociologia. ela
depende de um processo complexo de interação Línguas
entre a oferta e a demanda. assim como do nível Inglês 79.17 Português 0,36
de institucionalização da disciplina. A demanda so- Francês 5.93 Europa (outras) 4,56
cial explícita conduz sobretudo a trabalhos empíricos Alemão 3,19 Japonês 0.18
nos campos que constituem objetivos sociais ou polí- Espanhol 2,14 Chinês 0,06
ticos e cuja definição é por natureza conjuntural. Italiano 2,09 Árabe 0.01
Mas a própria instituição sociológica desempenha um Russo 1.57

papel decisivo ao mesmo tempo na mobilização e Fonte: Current sccioioç». 39 (1), 1991. pg. 14.
na promoção de novos campos. A sociologia torna- :;:;:;:;:;:;:;:;: ..,:'::.::;:::.:;.;.;.;.:.;.;:;.;.;:;:;:;:;:;:; :;.;:;:;:;:;.;:;:;:;: ..;..... -;.;:;:;:;:;: :::: ..:.:.:::::.;:::; ..:;:;:;:;:;:;::".: ..... ::;:;:;:;:;:: ..... :.::;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:;:::::::::::::::::::~:::::::::
HISTÓRIA DA SOCIOLOGIA
PARTE /I
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li Enfim. é. preciso constatar


talvez mais do que antigamente).
permanece estreitamente
ternacionais.
o quanto. ainda hoje (e
o debate teórico
local e os intercâmbios
desiguais.
quisas anglo-saxãs só lentamente
in-
Assim. os resultados
atingem
das
uma socio-
pes-
BALIZAS BIBLIOGRÁFICAS
logia francesa cujos aspectos principais eles. em OBRAS GERAIS
compensação. parecem ignorar. E se a sociologia
alemã continua. por razões históricas. aberta ao mar- [1] Jeffrey C. ALEXANDER. Sociologlcal Theory Slnce
xismo e à fenomenologia. o primeiro não tem mais 1945. Hutchinson. Londres. 1987.
curso na França e a segunda ainda tem uma aco- [2] Raymond ARON. Les étapes de Ia pensée sociolo-
lhida restrita. Em contrapartida. a pseudo-sociologia gique. Gallimard. Paris. 1967.
francesa "da suspeita" (Althusser. Foucault) é conside- [3] Howard BECKER e Alvin BOSKOFF. Modem
Soclolo-
rada chiquérrima na Inglaterra do final dos anos 80. gical Theory in Contlnulty and Change. lhe Drysden
No conjunto. reconheçamos que muitos trabalhos de Press. Nova York, 1957.
história ou de apresentação da disciplina ignoram [4] Daniel BELL The Social Sciences Slnce the Second
mais ou menos totcímente (cf. [1] e [36]) os traba- World War. lransaction Books. New Brunswick. 1982.
lhos estrangeiros à nação de seu autor. [5] Jean-Michel BERlHELOT. La Constructlon de Ia so-
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