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MúsicaViva

CARLOS KATER
O
movimento Música Viva foi criado no Brasil em 1938,
por obra de H. J. Koellreutter, sendo suas primeiras
realizações e atividades efetivamente concretizadas no
ano seguinte.1 Assim, desde 1939 e ao longo de toda
a década de 40, vemos desenvolver-se um movimento
pioneiro de renovação, tendo por meta instaurar uma
nova ordem no meio musical, inicialmente no Rio
principais representantes, determinando diretamente
o percurso do movimento, tanto do ponto de vista
histórico quanto estético. Isto porém em quase nada
descaracterizará o impulso educacional e formador que
tão fortemente impregnou o conjunto das atividades
desenvolvidas.

de Janeiro e após em São Paulo. Suas principais MOMENTO I


características definem-se pelo ineditismo de propostas A primeira fase, integradora por excelência, é marcada
na área cultural, atualidade do pensamento musical, pela coexistência interna de tendências estéticas
convergência com tendências estéticas, filosóficas e ideológicas bastante dessemelhantes, representadas
e políticas da vanguarda internacional e assim gerador pelos membros que constituem o grupo em sua
de dinamismo junto ao ambiente da época.2 formação original. Luiz Heitor Correa de Azevedo
De maneira geral, a importância do movimento (musicólogo), Egydio de Castro e Silva (pianista e
Música Viva é ainda hoje sub-avaliada. Os jovens compositor), Brasílio Itiberê (compositor e professor),
compositores Cláudio Santoro, César Guerra-Peixe, Octávio Bevilácqua (crítico musical do “O Globo”)
Eunice Katunda e Edino Krieger, entre outros músicos, e Andrade Muricy (escritor e crítico musical do “Jornal
liderados por Koellreutter, são não apenas responsáveis do Comércio”) são algumas das personalidades mais
pela primeira fase da composição atonal atuantes e conhecidas no ambiente musical carioca,
e dodecafônica da música brasileira. Cabe a eles mais que compõem o movimento nesta primeira fase.3
precisamente a criação de uma nova perspectiva Essa tendência integradora se expressa igualmente
da produção musical, imbricada numa concepção na elaboração dos programas de concerto, nos quais
contemporânea da função social do artista. Enquanto mesclam-se músicas de Villa-Lobos e Camargo
movimento que foi, Música Viva gerou intensa dinâmica Guarnieri com aquelas de Koellreutter e Cláudio
cultural, agregando ao amplo conjunto de atividades Santoro, acrescidas nos anos seguintes pelas de vários
promovidas - concertos, audições experimentais, outros compositores, muito distantes tanto estética
conferências, cursos, programas de rádio, edição quanto ideologicamente.
de boletins e de partituras, etc – temas contemporâneos Mesmo que aparentando uma postura tradicional
para reflexão e oportunidades instigantes para debates. em razão desta constituição inicial, Música Viva
Todas essas iniciativas ofereceram-se como ricas reivindica já uma meta original: “divulgar o compositor
alternativas de participação, provocando um e sua obra, principalmente a contemporânea”,
aceleramento na compreensão da arte, do músico diferentemente das sociedades musicais existentes no
e de seus respectivos papéis na sociedade de sua época. meio carioca da época que visavam realçar “o virtuose
Música Viva foi um movimento musical concebido e o concerto”. Desde junho de 1939 têm início as
sob o tríplice enfoque: Educação (formação) – Criação “Audições Música Viva”, que inauguram publicamente
(composição) – Divulgação (interpretação, o movimento, seguindo-se meses após os Concertos de
apresentações públicas, edições, transmissões mesmo nome. A primeira edição da série dos boletins
radiofônicas), que integrados tiveram intensidades Música Viva é lançada em maio de 1940, veiculando um
proporcionais ao longo de sua existência. Podemos balanço detalhado das atividades realizadas pelo grupo
distinguir três fases em sua evolução, cada qual no ano anterior, entre textos de autores diversos,
correspondendo a momentos ideológicos relativamente enfocando temas da atualidade, problemáticas
distintos. Elas refletem as posturas adotadas por seus da música contemporânea brasileira e, como
suplemento, a modinha Sem fim, para canto e piano,
Página ao lado: Hans-Joachim Koellreutter.
FUNDAÇÃO BIBLIOTECA NACIONAL – DIVISÃO DE MÚSICA E ARQUIVO SONORO de Fructuoso Vianna.4

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A divulgação musical, sob diferentes formas, passa Idéias, porém, são mais fortes do que preconceitos!
a recobrir um vasto espectro de tendências estilísticas, Assim o Grupo Música Viva lutará pelas idéias de um
gêneros e períodos históricos, integrando ao panorama mundo novo, crendo na força criadora do espírito humano
musical internacional tanto a frente nacionalista quanto e na arte do futuro.
a nova escola composicional brasileira, ainda Aldo Parisot, Cláudio Santoro, Guerra Peixe, Egydio de Castro e Silva,
incipiente. Proposta inusitada para o período, ela João Breitinger, Mirella Vita, Oriano de Almeida, H. J. Koellreutter
se tornará uma característica constante ao longo da
trajetória do movimento, atendendo aos objetivos de O lançamento deste documento ilustra a
acesso ao patrimônio musical já constituído e daquele intensificação das atividades do movimento no Rio de
em processo de consolidação, em vista da meta de Janeiro e também a fundação de seu núcleo paulista.
revitalizar o ambiente artístico-cultural perseguida pelo No início deste ano, Koellreutter havia começado a dar
Música Viva. Isto explica melhor as transformações aulas de composição para Guerra-Peixe e logo após a
operadas nos momentos seguintes, quando as músicas Edino Krieger. Santoro, seu aluno desde 1940, obtém
compostas pelo grupo de compositores, instaurando mais um prêmio: uma significativa “Menção Honrosa”
tendência experimental e maior maturação no Chamber Music Guild, com o “Primeiro Quarteto”,
de inovações compositivas, suscitam um estilo crítico composto em 1943. Ao mesmo tempo em que
combativo particular nas comunicações do grupo. reorganiza a constituição do grupo5, Koellreutter
implanta a bem sucedida série de programas
MOMENTO II radiofônicos levados ao ar junto à Rádio Ministério
A segunda fase do movimento é inaugurada pelo da Educação e Saúde (PRA-2), a partir de 13/05/1944.6
lançamento de um importante documento, seu No entanto, o significado desse breve manifesto
primeiro manifesto. Em 1º de Maio de 1944 − vai muito além do que habitualmente se considera.
significativamente “dia do trabalho”−, o grupo Música Ele é o reflexo inaugural do que hoje chamamos
Viva divulga um dos mais concisos e brilhantes “música moderna brasileira”. Isto porque ao mesmo
manifestos brasileiros, o “Manifesto 1944”. tempo em que através dele se busca a afirmação
e a representatividade do movimento como um todo,
Manifesto: coloca-se em primeiro plano uma criação musical
O grupo Música Viva surge como uma porta que se abre de viva atualidade (original mas também em sintonia
à produção musical contemporânea, participando ativamente com correntes da vanguarda internacional), que passa
da evolução do espírito. agora a se beneficiar fertilmente das produções atonais
A obra musical, como a mais elevada organização do nacionais, compostas por Cláudio Santoro7, Guerra
pensamento e sentimentos humanos, como a mais grandiosa Peixe8 e pelo próprio Koellreutter. Em fértil
encarnação da vida, está em primeiro plano no trabalho contraponto com a produção nacionalista do período,
artístico do Grupo Música Viva. estas músicas novas contam com eficazes suportes
Música Viva, divulgando, por meio de concertos, de divulgação e têm sua qualidade artística quase
irradiações, conferências e edições a criação musical hodierna unanimemente reconhecida pelos críticos. Embora
de todas as tendências, em especial do continente americano, com estilos próprios, elas possuem em comum um
pretende mostrar que em nossa época também existe música modelo estético definido, representando a nova escola
como expressão do tempo, de um novo estado de inteligência. de composição brasileira, frente única da vanguarda
A revolução espiritual, que o mundo atualmente de seu tempo.9
atravessa, não deixará de influenciar a produção A partir desse momento Música Viva se coloca em
contemporânea. Essa transformação radical que se faz notar posição ofensiva, conquistando ainda mais espaço nos
também nos meios sonoros, é a causa da incompreensão meios de comunicação. Nos depoimentos públicos,
momentânea frente à música nova. procurando explicar pontos de vista e justificar

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Periódico Música Viva. Ano 1. Novembro 1940. Artigo assinado por Luís Heitor.
FUNDAÇÃO BILIOTECA NACIONAL – DIVISÃO DE MÚSICA E ARQUIVO SONORO

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a importância do trabalho do grupo frente à “realidade somente artística, como também ideológica; pois, não há arte
em transformação”, Koellreutter denuncia a estagnação sem ideologia.
do meio artístico e do ensino de música no Brasil.10 /.../ “MÚSICA VIVA”, adotando os princípios
Esse segundo momento ideológico é caracterizado pela de arte-acão, abandona como ideal a preocupação exclusiva
substituição do conceito corrente de “indivíduo” − nos de beleza; pois, toda a arte de nossa época não organizada
assuntos musicais elevado à categoria mítica e idealista diretamente sobre o princípio da utilidade será desligada
−, pelo contemporâneo e recém-introduzido valor: do real.
“capacidade coletiva de uma geração”. /.../ “MÚSICA VIVA” acredita na função socializadora
da música que é a de unir os homens, humanizando-os
MOMENTO III e universalizando-os.
O segundo documento significativo produzido pelo “MÚSICA VIVA”, compreendendo a importância social
Música Viva é o Manifesto 1946 ou Declaração e artística da música popular, apoiará qualquer iniciativa no
de Princípios, levando os nomes de Egydio de Castro sentido de desenvolver e estimular a criação e divulgação
e Silva, Gení Marcondes, Heitor Alimonda, Santino da boa música popular, combatendo a produção de obras
Parpinelli, Eunice Katunda, Guerra Peixe, Cláudio prejudiciais à educação artístico-social do povo.
Santoro, Koellreutter. Uma simples leitura deste /.../ Consciente da missão da arte contemporânea em face
documento, que se tornará referência oficial da sociedade humana, o grupo “MÚSICA VIVA”, acompanha
do movimento, torna evidente o grau de complexidade o presente no seu caminho de descoberta e de conquista,
com que é tratado o fato musical, mediante os enfoques lutando pelas idéias novas de um mundo novo, crendo na força
estético, social e econômico, refletindo, antes de uma criadora do espírito humano e na arte do futuro.11
coerência propriamente, um mosaico de flashes
intensos de consciência. Reproduzimos a seguir alguns Este grande painel de idéias, verdadeiro mural de
fragmentos: intenções da modernidade musical brasileira, retrata
com perfeição o papel revolucionário assumido pelo
A música, traduzindo idéias e sentimentos na linguagem movimento e o engajamento visceral com que os
dos sons, é um meio de expressão; portanto, produto da vida membros do grupo se lançam às questões fundamentais
social. da realidade social de seu tempo. No entanto, contém
/.../ A arte musical é o reflexo do essencial na realidade. já em seu bojo as contradições essenciais que
A produção intelectual, servindo-se dos meios de expressão provocarão abalos consecutivos até sua ruptura
artística, é função da produção material e sujeita, portanto, definitiva.
como esta, a uma constante transformação, a lei da evolução. Santoro, que desde Agosto de 1947 estava fora
Música é movimento. / Música é vida. do país, participa do “II Congresso Internacional de
“MÚSICA VIVA” compreendendo este fato combate pela Compositores e Críticos Musicais”, realizado em Praga
música que revela o eternamente novo, isto é: por uma arte de 20 a 29 de Maio de 1948. O contato direto com os
musical que seja a expressão real da época e da sociedade. músicos progressistas e suas teses o levarão a compartilhar
“MÚSICA VIVA” refuta a assim chamada arte fervorosamente dos ideais do “realismo socialista”.
acadêmica, negação da própria arte. Serão justamente as “Resoluções” e o “Apelo”
“MÚSICA VIVA”, baseada nesse princípio fundamental, elaborados nesse congresso – e editados em seguida no
apoia tudo o que favorece o nascimento e crescimento do novo, Música Viva nº16 (Agosto/1948), boletim que encerra a
escolhendo a revolução e repelindo a reação. série de publicações –, que conferirão substrato formal
“MÚSICA VIVA”, compreendendo que o artista é para a polarização das divergências ideológicas entre
produto do meio e que a arte só pode florescer quando as forças Koellreutter e Santoro, notadamente, deflagrando
produtivas tiverem atingido um certo nível de desenvolvimento, no grupo o processo efetivo de dissolvência.
apoiará qualquer iniciativa em prol de uma educação não Assim, se por um lado o movimento Música Viva

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“MÚSICA VIVA” acredita na função socializadora
da música que é a de unir os homens,
humanizando-os e universalizando-os.

demonstrava amplo desenvolvimento em sua empresa No entanto, apesar da dinâmica que o movimento
de divulgação e de formação musical, tanto no Rio de paulista imprimiu no meio musical local, suas
Janeiro quanto em São Paulo, por outro lado o grupo atividades não chegaram a alcançar a mesma
integrado pelos compositores − até então seu carro- magnitude verificada no Rio de Janeiro. Tampouco
chefe −, rumava a caminho da implosão. emergiu de seus participantes um grupo autêntico de
compositores, do porte de um Santoro ou Guerra Peixe
O MOVIMENTO EM SÃO PAULO (Roberto Schnorrenberg é uma das poucas exceções),
A inauguração do movimento Música Viva paulista fato que em parte justifica a importância minimizada
se dá em meados de 1944, como mencionamos. que a ele correntemente se atribui. O grupo que se
O primeiro grupo que se constituiu foi a célula base formou foi composto em grande parte por musicistas,
de um tímido movimento, sediado na residência de um muitos dos quais jovens alunos de Koellreutter
de seus participantes onde ocorriam aulas, desejosos em redinamizar o ambiente da época e
apresentações musicais e palestras de Koellreutter. bastante atuantes na promoção de conferências, cursos,
Afora seus alunos Gení Marcondes, Ruy Coelho, audições e concertos. Contudo, os núcleos paulistas de
Álvaro Bittencourt, Ducks Simon, Ulla Simon-Wolf, renovação, que vieram posteriormente a desempenhar
Eva Kovach, Lídia Alimonda, Jenny Pereira um relevante papel no desenvolvimento da música
e Magdalena Nicoll, integravam também o grupo brasileira desde o início da década de 60, permitem
vários outros artistas e intelectuais. observar na base de suas iniciativas, músicos ativos
Após breve interrupção, Koellreutter retomará no formados num terreno já fertilizado pelas realizações
ano seguinte suas aulas. Nininha Gregori, Damiano Música Viva, seja enquanto participantes diretos do
Cozzella, Roberto Schnorrenberg, Hans Trostli, Jorge movimento, seja enquanto alunos de Koellreutter
Wilheim e Eunice Katunda12, são alguns dos alunos- (de suas aulas particulares de composição e estética,
participantes que darão vigor a essa segunda e mais bem como das classes por ele ministradas na “Escola
autêntica fase do movimento. Música Viva paulista Livre de Música” de São Paulo).13
é lançado oficialmente no auditório da Biblioteca
Municipal em 05/07/1947, sendo o evento ilustrado TRANSCENDÊNCIA DO MOVIMENTO
com a conferência “Fundamentos de uma estética Em 7 de Novembro de 1950 o compositor Camargo
materialista da música”, pronunciada pelo líder Guarnieri, natural de Tietê/SP, publica sua “Carta
do Música Viva e seguida, como de praxe, por debate Aberta”, responsável por uma das maiores polêmicas já
público. Desde esta data tem início uma profícua observadas na vida musical e artística brasileira. Texto
atuação junto ao Museu de Arte de São Paulo, mediante de combate, com conteúdo fortemente polêmico,
a realização de série de cursos, conferências e dos acabou por representar um golpe direto no trabalho
“Concertos Música Viva”, que prolongaram-se até 1951. de formação musical desenvolvido por Koellreutter,

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impondo sérias limitações à atuação do movimento dissolvência intensa e progressiva, em razão da falta
na capital paulista.14 Envolveram-se na celeuma interna de consenso. No entanto, o impulso dinâmico
as facções pró e contra a música dodecafônica, de reformular, de pôr abaixo valores acadêmicos
reavivando questões políticas e estéticas já colocadas e tradicionais, de combater preconceitos, de estimular
anos antes pertinentemente pelo próprio grupo Música a criatividade e a participação se mantém vivo no líder
Viva. Como desdobramento final desse processo, do Música Viva.
deu-se um mês após no Museu de Arte um De fato já antes do encerramento completo dos
efervescente debate, que levou à desarticulação movimentos, Koellreutter implanta novos projetos que
o movimento em São Paulo e após no Rio de Janeiro. mesmo conferindo à ideologia Música Viva formas
Os eventos musicais até então ali desenvolvidos com diferenciadas, privilegiam sempre, de maneira
sucesso reduzem-se de maneira expressiva, deixando característica, a educação musical, a criação e o
de ter qualquer relação com o movimento logo “sentido coletivista da música”. Assim, entre algumas
no ano seguinte. de suas iniciativas, teremos a bem sucedida série dos
Assim como a divulgação dos manifestos “Cursos Internacionais de Férias Pró-Arte” de
de 1944 e de 1946 havia provocado fortes reações Teresópolis/RJ, que inaugurou a tradição dos eventos
na comunidade musical, a concepção destes de férias no Brasil, com início em janeiro de 1950
documentos implicou em rupturas internas no grupo (portanto quase um ano antes da Carta Aberta);
de compositores. Muito embora o progressivo a “Escola Livre de Música” de São Paulo, a partir de
engajamento partidário de alguns de seus membros 1952, apresentando um projeto de formação musical
acrescido de dificuldades relacionais internas tenham inusitado e introduzindo nas salas de aula o estudo do
comprometido uma continuidade coerente jazz e da música popular, por exemplo; os “Seminários
e harmoniosa dos princípios do movimento, deve-se Internacionais de Música” de Salvador/Bahia, lançados
no entanto mais substancialmente à questão política em 1954, e que, logo nos anos seguintes, acabou por
e de preservação de territórios em São Paulo transformar a capital baiana num dos mais importantes
o esvaziamento do Música Viva brasileiro. e inovadores centros de formação de músicos
Os produtos engendrados pelos movimentos e de educadores musicais do país.15
paulista e carioca rarefazem-se entre 51 e 52, Grande parte dos músicos de relevo no cenário
praticamente nenhuma menção à Música Viva artístico brasileiro, bem como dos grupos corais e/ou
subsistindo após estas respectivas datas. Da mesma instrumentais, espelham em sua formação uma simples
maneira que os movimentos, o grupo de compositores, influência que seja ou, mais freqüentemente, uma
a partir de sua re-orientação estética e ideológica em filiação direta com a dinâmica empresa pedagógica
1948-49, não chegou na realidade a ter um final instalada pioneiramente pelo movimento Música Viva
estanque. Deu-se sim uma desarticulação, uma e por H. J. Koellreutter entre nós.

1. Hans-Joachim Koellreutter nasceu em Freiburg, na Alemanha, inaugurando um movimento musical e nomeando assim um
a 02/09/1915 e chegou ao Rio de Janeiro em 1937. Com 22 anos, periódico musical, editado em Bruxelas de 1933 a 1936.
o jovem flautista e compositor, que havia estudado com o Os esforços desse reconhecido mestre foram consagrados à
renomado regente Hermann Scherchen, mestre de toda uma divulgação e à melhor compreensão da música nova, cabendo-
geração, traz vivo o desejo de dar continuidade no Brasil às lhe as primeiras audições de obras de compositores modernos,
participações que havia tido na Europa em grupos com certo hoje indiscutivelmente incorporados à história do século XX:
ineditismo de propostas (“Círculo de Música Nova”, Berlim 1935 P.Hindemith, A.Schoenberg, A.Berg, A.Webern, S.Prokofiev,
e “Círculo de Música Contemporânea”, Genebra 1936). I.Stravinsky, L.Dallapiccola, L.Nono, H.-W.Henze, bem como
2. A expressão Musica Viva foi originalmente cunhada pelo Koellreutter, Guerra Peixe, Eunice Katunda, entre outros mais.
músico e regente alemão Hermann Scherchen (1891-1966), 3. Diferentemente das seguintes fases nas quais os participantes

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mais ativos serão jovens alunos ou ex-alunos de Koellreutter. DISCOGRAFIA
4. A primeira fase de publicação dos boletins estende-se KOELLREUTTER PLURAL - Centro Experimental de Música do SESC
do nº1 de Maio/1940 ao nº 10/11 de Maio/1941. Cada um dos (SP,1995) (CD); “Koellreutter”, série Música Nova da América
exemplares dessa fase oferecem em suplemento a partitura
Latina - TACAPE (T0012,1983); “III Bienal de Música
de uma composição contemporânea, de pequeno porte, quase
Contemporânea”, Vol.II. FUNARTE, LP nº 3.56.404.031; “Beatriz
sempre de autor nacional. A retomada das publicações se dará
apenas em 1946, porém em outro formato e com nova política Balzi – Compositores Latino-Americanos 1, 2, 3”, série Música
editorial. Nova de América Latina – TACAPE (CD), entre vários outros
5. Por essa ocasião são membros do Música Viva no Rio de editados, sobretudo, pela FUNARTE (RJ)
Janeiro: Jaioleno dos Santos, Marcos Nissensson, Santino
Parpinelli e Loris Pinheiro, afora os signatários do manifesto.
6. Eram irradiados semanalmente programas com música ao vivo profunda incompatibilização não apenas com a própria escola,
e gravações, contando com a participação de membros do Música mas com todo o meio musical conservador carioca.
Viva e de artistas convidados, intérpretes que, em sua maioria, 11. Cf. boletim Música Viva, nº12, Jan./1947. Este documento,
desde então impuseram-se no ambiente musical. De fato, não finalizado em 1 de Novembro 1946, foi também publicado, sob
apenas a modernidade mas várias outras épocas foram o título “Manifesto Música Viva / Declaração de Princípios”, na
representadas e comentadas nos programas. As estréias mundiais, revista Paralelos, nº5 (SP, Jun./1947), p.49-51. Para sua transcrição
nacionais ou regionais cobriram então vasta gama, incidindo integral, bem como a dos demais manifestos (1944 e 1945), ver:
sobre produções ocidentais desde a Idade Média até KATER, C. Música Viva e Koellreutter, movimentos em direção à
a contemporaneidade e, evidentemente, obras do próprio grupo. modernidade (2001).
Esses programas estenderam-se até cerca de 1952. 12. Que em seguida irá integrar o grupo de compositores no Rio
7. Aluno de Koellreutter a partir de 1940 e até por volta de de Janeiro junto com Cláudio Santoro, Guerra Peixe e Edino
meados de 41, Santoro já havia efetuado em diversas obras a Krieger.
passagem do atonalismo simples ao dodecafônico, encontrando- 13. Fundada em 15 de Março de 1952, a “Escola Livre de Música
se nessa ocasião em plena maturidade composicional. de São Paulo Pró-Arte” passará a chamar-se, quatro anos após,
8. Seu colega desde inícios de 1944, este músico experiente passa “Pró-Arte Seminários de Música” e estende suas atividades até
rapidamente a conceber seus mais significativos frutos nessa 1958.
mesma direção. 14. Este documento foi muito provavelmente originado pelo forte
9. Vale observar que raras foram as músicas compostas incômodo causado no compositor nacionalista diante do
rigorosamente sob o método atonal-dodecafônico, tal como progressivo espaço que vinha sendo ocupado em São Paulo pelo
concebido por A.Schoenberg, praticado por seus discípulos movimento Música Viva, sob a coordenação do carismático
A. Berg, A. Webern e muitos dos principais seguidores, mesmo Koellreutter, de quem aliás tinha sido amigo havia quase uma
um latinoamericano como Juan Carlos Paz. As produções dos década.
compositores brasileiros foram em sua quase totalidade bem mais 15. A partir desses Seminários é que se originou a Escola de
livres do ponto de vista técnico e particularmente criativas na Música e Artes Cênicas da Universidade Federal da Bahia
incorporação de ritmos e padrões musicais regionais brasileiros, (UFBa). Para uma apresentação das principais realizações e
resultando assim em fatura fortemente original. atividades de Koellreutter, ver: KATER, C. “H. J. Koellreutter:
10. Em seu texto “A música e o sentido coletivista do compositor música e educação em movimento”, in: Cadernos de
moderno” (Diretrizes, 11/05/44, p.5) ele critica as deficiências do Estudo:Educação Musical, nº 6. SP/BH: Atravez/EM-UFMG/FEA,
curso de composição da Escola Nacional de Música (RJ), gerando Fev/1997, p.6-25.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
KATER, Carlos. Catálogo de Obras de H. J. Koellreutter. Belo ———. (Edit.) Cadernos de Estudo:Educação Musical, nº 6. SP/BH:
Horizonte: FEA / FAPEMIG − Fundação de Amparo à Atravez/UFMG, Fev. 1997 (contendo coletânea comentada de
Pesquisa de Minas Gerais, 1997. textos produzidos por H.J.Koellreutter em diferentes épocas).
———. Música Viva e Koellreutter, movimentos em direção à modernidade. NEVES, José Maria. Música Contemporânea Brasileira. SP: Ricordi,
São Paulo: Atravez & Musa, 2001. 1981.
———. Eunice Katunda, musicista brasileira. São Paulo: Annablume/ MARIZ, Vasco. História da Música no Brasil. Rio de Janeiro: Nova
FAPESP, 2001. Fronteira, 2000 (5ªed.).

CARLOS KATER
Doutor em História da Música e Musicologia pela Universidade de Paris IV (Sorbonne) e Professor Titular concursado pela UFMG, é atualmente docente
da UFSCar - Universidade Federal de São Carlos e do Programa de Mestrado e Doutorado da Universidade São Marcos (SP).

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