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05/10/2017 - 09:15 de
Pixabay
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A
Reconhecimento de Responsabilidade – PARR”, cujo objetivo é apurar a “responsabilidade
de terceiros pela prática da infração à lei consistente na dissolução irregular de pessoa jurídica
devedora de créditos inscritos em dívida ativa administrados pela PGFN”.
https://www.jota.info/artigos/portaria-pgfn-no-9482017-desrespeita-o-artigo-135-do-ctn-05102017 1/4
24/10/2017 Portaria PGFN nº 948/2017 desrespeita o artigo 135 do CTN – JOTA
A Portaria expressamente se fundamenta no art. 135 do CTN, indicando que esse é o dispositivo
que atribui a responsabilidade tributária a terceiros. Embora não o diga a Portaria, esse terceiro,
que ela chama também de “interessado”, é, em regra, o sócio legalmente obrigado à dissolução
regular da sociedade ou à notificação, ao Fisco, de sua inatividade, mudança de endereço e outros
fatores de interesse da arrecadação previstos na legislação sobre obrigações acessórias.
Ocorre que o art. 135 do CTN não é fundamento para essa responsabilidade. O caput do
dispositivo prescreve que “são pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a
obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei,
contrato social ou estatutos”.
O dispositivo é claro ao afirmar que a responsabilidade do terceiro tem por objeto “créditos
correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com infração de lei”. Leia-
se com atenção a palavra “resultante” e suas relações com as outras expressões constantes do
dispositivo: a obrigação tributária (e não o seu inadimplemento) tem que ser resultante de ato
praticado com infração de lei. A infração à lei, portanto, é contemporânea à ocorrência do fato
gerador do qual resulta a obrigação tributária à qual corresponde um crédito tributário (art. 139
do CTN) que, em razão daquela infração, passa a ser de responsabilidade daquele que a tenha
cometido.
Não é difícil verificar que, do fato “dissolver irregularmente uma sociedade”, não resulta
nenhuma obrigação tributária à qual corresponda um crédito tributário.
O caso, portanto, é de não-incidência do art. 135 do CTN sobre a dissolução irregular de sociedade
quando os créditos tributários tenham origem em obrigações tributárias surgidas antes da
referida infração.
Disso se conclui, como bem denuncia Renato Lopes Becho[1], que a Fazenda Pública, infelizmente
com a chancela da jurisprudência[2], vem aplicando uma modalidade de responsabilidade
tributária não prevista no CTN, qual seja, a responsabilidade decorrente da frustração do crédito
tributário, frustração esta que, no caso, decorre da dissolução irregular da sociedade. Em suma,
enquanto o art. 135 do CTN atribui a responsabilidade por “créditos correspondentes a obrigações
tributárias resultantes de atos praticados com infração de lei”, a jurisprudência atribui a
responsabilidade pelo “inadimplemento de créditos correspondentes a obrigações tributárias
resultante de atos praticados com infração de lei”, alterando o texto legal.
Contudo, a existência de uma jurisprudência não infirma uma conclusão singela: seja como for, a
responsabilidade em questão não encontra respaldo na letra do art. 135 do CTN, invocado pela
PGFN na mencionada Portaria nº 948.
Essa conclusão poderia levar a uma indagação que causaria perplexidade: se não se pode
responsabilizar aqueles que dissolveram irregularmente a sociedade, quem pagará pelo crédito
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24/10/2017 Portaria PGFN nº 948/2017 desrespeita o artigo 135 do CTN – JOTA
Em primeiro lugar, essa indagação poderia causar perplexidade se formulada fora do âmbito do
direito. No interior da investigação jurídica, porém, não há nenhum mal em afirmar que a lei não
previu de forma adequada essa responsabilização. O sentimento “moral” de que é errado deixar
de responsabilizar alguém não é, e nunca poderá ser, fundamento de responsabilização à margem
da lei.
Mas esse nem é o caso. Se uma sociedade é dissolvida irregularmente, podemos concluir sem
maiores dificuldades que ou seu patrimônio foi absorvido pelos sócios, ou os sócios mantiveram
formalmente a personalidade jurídica da sociedade para enganar a Fazenda Pública com a
impressão de que a sociedade continua ativa e respondendo com seu patrimônio por eventuais
créditos tributários. Isso parece ser aquilo que o art. 50 do Código Civil chama, respectivamente,
de “confusão patrimonial” e “abuso de personalidade”, e que autorizam a desconsideração da
personalidade jurídica com a extensão das obrigações tributárias aos bens particulares dos sócios
ou administradores da pessoa jurídica.
Nada impede que a Fazenda Pública instaure procedimento administrativo para apurar indícios
da dissolução irregular da sociedade e seu quase inevitável enquadramento no art. 50 do Código
Civil. Mas os elementos aí apurados servem, no máximo, como provas para embasar o pedido de
desconsideração da personalidade jurídica.
Pela redação do art. 134 do CPC/2015, esse pedido pode ser realizado em qualquer fase da
execução extrajudicial (caso da execução fiscal), sendo possível que a Fazenda Pública o formule
já na petição inicial (caso tenha elementos para tanto apurados administrativamente, residindo aí
a valia de algo semelhante ao PARR) ou durante a execução, caso verifique, ao longo do processo,
a ocorrência dessa situação.
Essa, portanto, é a única utilidade válida do PARR: colher elementos para embasar o pedido
judicial de desconsideração da personalidade jurídica na espécie aqui analisada. Tudo além disso
é ilegalidade, pois não encontra respaldo no (mal) invocado art. 135 do CTN.
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24/10/2017 Portaria PGFN nº 948/2017 desrespeita o artigo 135 do CTN – JOTA
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[1] BECHO, Renato Lopes. Responsabilidade tributária de terceiros – CTN, arts. 134 e 135. São
Paulo: Saraiva, 2014.
[2] Súmula 435 do CTN: “Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de
funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o
redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente”.
Frederico Menezes Breyner - Sócio do Sacha Calmon-Misabel Derzi Consultores e Advogados. Mestre e doutorando
em Direito Tributário (UFMG), é professor da Faculdade de Direito Milton Campos.
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