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MÓDULO II - ELETROFISIOLOGIA
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Figura 10 - Geração de potenciais de campo no meio extracelular de uma sinapse excitatória ativa.
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piramidais do córtex gera um dipolo elétrico que aponta para a superfície cortical em um ângulo
reto (figura 13). Quanto maior o número de neurônios simultaneamente ativos por esta aferência,
maior a magnitude do dipolo.
Figura 13 - A atividade sináptica cortical pode ser modelada como dipolos elétricos.
Como aferências sinápticas não atuam de maneira homogênea por todo o córtex, dipolos
elétricos são gerados com direções e magnitudes distintas ao longo das colunas da superfície
cortical. Isso provoca o aparecimento de dipolos longitudinais (dL - paralelos ao plano cortical), de
orientação e magnitude dependentes da diferença entre os dipolos transversais (dT -). A figura 14
ilustra esse conceito. Na coluna A, um dipolo que aponta para a superfície cortical é gerado por
uma aferência excitatória superficial que se traduz por um acúmulo de cargas negativas no local.
Já na coluna B, um dipolo com direção oposta é gerado por uma aferência sináptica inibitória
superficial, acarretando em acúmulo de cargas positivas. Assim, aparece um dipolo horizontal que
aponta da coluna B (mais positiva superficialmente) para a coluna A (mais negativa
superficialmente).
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Eletroneurografia
Desmielinização do nervo.
Bloqueios de condução por lesões traumáticas ou neurodegenerativas.
Diminuição do calibre do nervo por morte celular.
Neuropatias importantes como a eslerose lateral amiotrófica, miastenia gravis e distrofia
muscular, ou ainda efeitos secundários da diabetes miellitus ou o alcoolismo.
Assim, o eletroneurograma auxilia no diagnóstico dessas doenças e na avaliação da
gravidade do quadro instalado.
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Ademais, o ENG pode servir como fonte de comando eletro-mecânico para algumas neuro-
próteseses motoras ou ainda como fonte do sinal de neuro-órteses da medula espinal ou de
nervos periféricos.
Descreveremos estas tecnologias com mais detalhes em suas respectivas seções.
Para uma revisão mais ampla sobre a eletroneurografia, vide Webster, 2006.
Eletroencefalografia
Note, na figura 15, a diferença nítida entre o EEG obtido de um indivíduo saudável e de um
paciente com epilepsia durante a crise (período ictal) e mesmo sem crise (período inter-ictal).
Nesse último caso, o traçado apresenta espículas de alta amplitude e de curta-duração,
indicativas de disparos síncronos de grandes populações de neurônios corticais, típicos nas
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Figura 15 - Comparação entre os traçados eletroencefalográficos de um indivíduo saudável e de uma paciente com
epilepsia, tanto no período ictal, quanto no inter-ictal.
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até duas horas. Entretanto, no caso de monitoração pré-cirúrgica de pacientes com Epilepsia, o
registro pode durar mais de cem horas ininterrupto.
A localização e a nomenclatura de cada posição de eletrodo no escalpo do indivíduo são
padronizadas, sendo o sistema de padronização mais amplamente usado o denominado sistema
10-20 (figura 16). Via de regra, 19 eletrodos mais um de referência e outro para aterramento são
usados. A forma em que os sinais coletados em cada eletrodo são amplificados determina a
montagem. De fato, as montagens estão para o EEG assim como as derivações estão para o
ECG. Na montagem bipolar, os sinais de dois eletrodos vizinhos são amplificados
diferencialmente (ou seja, é amplificada a diferença algébrica entre os dois sinais). Já na
montagem referencial, amplifica-se cada sinal de eletrodos em relação a uma referência comum.
Esta é, geralmente, uma média dos sinais obtidos de eletrodos posicionados nos lóbulos das
orelhas, representado, a priori, uma referência neutra e inativa. Há ainda outras montagens que,
no entanto, transcendem o escopo desse texto.
Figura 16 - Diagrama esquemático do sistema padrão 10-20 de posicionamento de eletrodos e um indivíduo com os
eletrodos.
O espectro de potência do EEG tem maior conteúdo na faixa que vai até cerca de 20 Hz e
muito da prática médica concentra a análise, sobretudo dessa faixa. Entretanto, há ainda
considerável informação até cerca de 300 Hz, estando essa atividade de mais alta freqüência
relacionada a uma série de processos cognitivos. De fato, desde os estudos seminais de Berger
em 1929, até os dias de hoje, médicos e cientistas buscam correlacionar ritmos e ondas do EEG
com distintas funções cerebrais, bem como a alteração dos ritmos normais com neuropatologias.
Assim sendo, convencionou-se a seguinte nomenclatura para as faixas de freqüência em que as
ondas cerebrais se apresentam:
Delta: até 4 Hz.
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Teta: 4 a 8 Hz
Alfa: 8 a 12 Hz
Beta: 12 a 30 Hz
Gama: acima de 30 Hz
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Figura 19 - Brinquedos controlados por EEG ("força do pensamento"): Force Trainner da Uncle Milton (em cima à
esquerda), MindPlex da Mattel (em cima à direita) e NeuroBoy da NeuroSky (embaixo à esquerda) juntamento com o
headset com sensor para captação de EEG (embaixo à direita).
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dar bem no jogo. O nível de irritabilidade do prisioneiro é, na verdade, o seu nível, conforme é
medido pelo sensor acoplado a cabeça.
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Ainda assim, o ECoG não é capaz de captar atividade gerada por núcleos profundos. Por
exemplo, durante o sono REM, o hipocampo de primatas humanos e não humanos, bem como de
roedores, assume um ritmo teta bastante intenso, demarcando com nitidez essa etapa do sono.
Ritmo teta hipocampal não é revelado por EEG e nem por ECoG. Dessa feita, há uma terceira
modalidade de EEG no qual eletrodos, em formato de espaguete (figura 21), são posicionados via
cirurgia estereotáxica dentro do encéfalo do indivíduo. Essa modalidade se denomina EEG intra-
cerebral, ou intra-cefálico (ic-EEG) e é considerado o padrão ouro da eletrofisiologia cerebral.
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Figura 21 - Eletrodos para EEG intra-cerebral (à esquerda, com detalhe) e neurocirurgia para implante dos mesmos
(à direita).
do filamento é da ordem de 35 a 50 m, o que faz com que a atividade por ele captada seja
relativa à de uma vizinhança muito próxima, ou seja, de alguns poucos neurônios. Após o
condicionamento do sinal, um equipamento especial (denominado de maneira geral Processador
de Aquisição Multi-unitária – Multi-unit Acquisition Processor), também originalmente
desenvolvido por engenheiros da equipe de Nicolelis, realiza o processamento digital para a
classificação da atividade registrada em atividade unitária, conforme a amplitude e o formato das
espículas (referentes a potenciais de ação) tipicamente registradas (figura 23). Todo esse
processamento é feito em tempo real, o que permite que se conheça a atividade de cada
neurônio registrado enquanto o animal realiza uma dada tarefa.
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Figura 23 - Atividade unitária multi-sítio tipicamente registrado no sistema MAP (Multi-unit Acquisition Processor) da
Plexon Inc., desenvolvido a partir de trabalhos originais do Prof. Miguel Nicolelis.
Uma vez considerada a teoria que afirma que cada comando motor, ou sensação, ou ainda
memórias residam em códigos espaço-temporais de disparos neuronais, tornou-se possível o
desenvolvimento de interfaces entre o cérebro e a máquina com função e desempenho até então
inéditos. Em 1999, Chapin e sua equipe foi capaz de fazer um rato controlar um braço robótico
para lhe trazer água usando apenas a força de seu pensamento, sem nem mesmo precisar
executar o comando motor através de seus membros. Da mesma forma, foi usando essa
tecnologia que Nicolelis fez a macaca Aurora controlar um braço robótico em busca de sua
recompensa em 2000 e a macaca Goya residente nos E.U.A. controlar a caminhada do robô i-1,
em Kyoto no Japão, no ano de 2008.
A possibilidade de, enfim, nós sermos capazes de acessar de maneira irrestrita o código
que nosso cérebro usa para executar cada uma de suas funções, bem como de interpretar esse
código e o traduzir de maneira inequívoca em seu real significado, representa o verdadeiro santo
gral da Neuroengenharia, uma vez que isso implicaria na viabilidade de se transferir todo um
universo mental para a máquina e vice-versa.
Entretanto, ainda há uma série de barreiras metodológicas e tecnológicas a serem
vencidas.
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Os eletrodos são os mais variados possíveis, conforme já deixou claro outras seções deste
texto. No ENG ambulatorial é comum usar eletrodos de metal encapsulados em gel condutor e
espuma auto-adesiva, para fixação na pele (figura 18). Para nervos mais profundos, podem ser
usados eletrodos em forma de agulha. Por fim, em se tratando de implantes crônicos, onde o
nervo é dissecado, os eletrodos têm formato de cilindros ocos, ou espirais planas, que envolvem
a fibra nervosa. Já o EEG de escalpo usa eletrodos de metal na forma de discos, afixados com
uso de pasta condutora. EEG intra-cefálico usa os eletrodos de profundidade, constituído de
anéis metálicos posicionados ao redor de uma haste de material plástico. Por fim, como já foi
mencionado, as matrizes de eletrodos são constituídas de um arranjo regular de micro-filamentos
de tungstênio recobertos por Teflon.
O sinal de tensão elétrica gerado pela indução da corrente elétrica através do eletrodo
segue então para o próximo estágio do sistema: o condicionamento do sinal. Seu objetivo é,
essencialmente, aumentar a relação entre a potência do sinal de interesse e a de ruídos
contaminantes (aumentando aquele e diminuindo esse), tais como artefato de movimento, ruído
da rede elétrica (50 ou 60 Hz), potenciais de meia-célula (Half-cell potential) ou ainda atividade
bioelétrica indesejada (p.ex. eletromiografia no EEG).
Isso é feito, basicamente, através de circuitos eletrônicos para amplificação e filtragem do
sinal (figura 25). Amplificar um sinal significa multiplicar sua forma de onda por um valor constante
denominado ganho. Em uma amplificação simples, denominada monopolar, ambos os sinais, o
de interesse bem como os espúrios são multiplicados pela mesma constante. Apesar disso, tal
amplificação é vantajosa por deixar o sinal mais potente antes das próximas etapas de
processamento que também podem introduzir ruídos. Sob essa lógica, a primeira etapa de
amplificação deveria se dar o quanto antes possível. De fato, em sistemas de registro de EEG em
roedores em livre movimento, o primeiro estágio de amplificação se encontra na cabeça do
animal, junto com o implante de eletrodo (figura 26). Esse estágio é denominado headstage
(dificilmente esse tipo de dispositivo é usado em sistemas de registro em seres humanos).
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Figura 27 - Ilustração didática dos efeitos da amplificação e da filtragem sobre o sinal de entrada.
Uma vez condicionado adequadamente, o sinal pode ser visualizado e/ou armazenado. Em
instrumentos mais antigos, os polígrafos, o sinal comanda um estágio eletrônico de potência para
fazer mover uma caneta que risca o traçado do sinal em um papel deslizante. Trata-se de uma
forma antiga, mas ainda útil, de visualização e armazenamento, nesse caso físico, do registro
eletrográfico. O sinal também pode ser visualizado em visores eletrônicos, tais como os tubos de
raios catódicos, em que um feixe de elétrons atinge uma tela de fósforo (e com ela interage em
uma reação que libera luz). A posição que o feixe atinge na tela é determinada verticalmente pela
amplitude do registro e horizontalmente pelo tempo de registro.
Entretanto, modernamente, o registro é digitalizado para armazenamento e visualização
em sistemas computacionais, incluindo computadores pessoais comuns de mesa e mesmo
portáteis. Isso permite que o sinal possa ser visualizado ou tratado com toda a gama de
possibilidades que o mundo digital permite. Só assim, através de programas de computadores
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amplificadores e filtros distintos em paralelo. Isso é importante quando o canal transmite mais de
uma informação (ou sinal) de interesse, cada uma em uma faixa de freqüência distinta. Por
exemplo, em registros unitários, as espículas (ou spikes) referentes aos potenciais de ação dos
diversos neurônios estão na faixa de 150 Hz a 9 KHz, enquanto que o sinal referente aos
potenciais de campo intra-cefálicos estão entre 0,7 e 300 Hz. Assim, costuma-se separar esses
sinais por dois conjuntos de condicionadores de sinais diferentes, sendo ambos digitalizados e
armazenados separadamente. A figura 28, extraída do datasheet do sistema MAP da Plexon,
ilustra esse conceito. Observe como o mesmo sinal é condicionado por duas vias em paralelo no
bloco “PREAMP” (correspondente ao bloco de condicionamento de sinal da figura 24): “Spike
Waveforms” e “Low-Frequency Analog”.
Por último, o sinal pode ser processado digitalmente antes de ser armazenado na memória
do computador. Novamente, no caso de registros unitários, o sinal que contém spikes é
alimentado em sistema DSP (Digital Signal Processor) para que o sistema classifique, em tempo
real, cada espícula em categorias morfológicas distintas, correlacionados com cada determinado
neurônio. Assim, é possível saber quando cada neurônio disparou um potencial de ação.
resposta do tecido encefálico às correntes elétricas externas. De qualquer maneira, faremos aqui
um apanhado do que é conhecido até o momento.
Através das mesmas reações químicas que transformam corrente iônica no tecido em
corrente elétrica nos eletrodos e condutores do sistema de registro, a corrente elétrica nos
condutores e eletrodos do sistema de estimulação geram uma corrente iônica no tecido
estimulado.
Pela Lei de Ohm (V = rI), uma corrente circulando em um meio resistivo gera uma
diferença de potencial elétrico entre dois pontos no caminho do fluxo de cargas (ou circuito).
Assim, uma vez criada uma corrente iônica no tecido neural eletricamente estimulado, através
dele se estabelecerá um potencial elétrico, já que sua resistividade é diferente de zero.
O valor do potencial em cada ponto do tecido, bem como sua distribuição e orientação
espacial dependem da geometria do eletrodo, dos parâmetros do estímulo (amplitude da
corrente) e das propriedades elétricas do tecido. É possível descrever analiticamente o potencial
elétrico gerado em um tecido isotrópico (ou seja, propriedades iguais em todos os sentidos da
propagação) estimulado eletricamente por uma ponta muito fina e com uma referência no infinito
– é importante ressaltar que alguns casos reais se aproximam desta situação teórica e ideal. O
valor do potencial é descrito pela relação abaixo:
I
V
4r
Onde I é a amplitude da corrente, é a condutividade elétrica do tecido e r é a distância
entre a ponta do eletrodo e o ponto considerado no tecido. A direção do potencial, nesse caso, é
radial, com centro na ponta do eletrodo, e sentido definido pela polaridade da estimulação.
Potenciais elétricos oriundo da estimulação por eletrodos com geometria diferente se
propagam de maneira distinta, sendo apenas aproximadamente radial. Nesse caso, a relação de
valores e a distribuição de linhas de equipotenciais são obtidas apenas por simulações
computacionais.
A condutividade do tecido neural varia conforme o tipo de substância. A substância
cinzenta, onde se localizam, sobretudo, corpos celulares, tem característica isotrópica. Portanto,
seu valor é igual em todas as direções: aproximadamente 0,20 S/m, segundo Sances e Larson,
1975. Já a substância branca, onde se encontram axônios em sua maioria, é anisotrópica e,
portanto, seu valor depende da direção de propagação: 0,6 S/m transversalmente e 0,083 S/m
longitudinalmente (Ranck e BeMent 1965).
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Uma vez conhecida a relação entre intensidade da corrente de estímulo com o potencial
elétrico gerado em um ponto a uma distância r do eletrodo, segundo a condutividade do tecido, é
possível calcular todas as forças elétricas às quais cada neurônio espacialmente definido no
tecido está submetido durante a estimulação. Por outro lado, para determinar o efeito destas
forças na célula, é necessário compreender os mecanismos biofísicos da resposta celular a
potenciais elétricos.
Isso é feito através da modelagem do neurônio em termos de um circuito elétrico. Tal
abordagem é possível uma vez que as propriedades e parâmetros elétricos da célula são
conhecidos experimentalmente. O modelo em sua forma clássica consiste em dividir os
processos neuronais (axônios e dendritos) em compartimentos cilíndricos de comprimento
uniforme e a cada compartimento atribuir o circuito elétrico da figura 29 abaixo.
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Figura 30 - Circuito equivalente do neurônio, levando em conta as diversas condutâncias iônicas e a atividade da
bomba sódio-potássio.
Os parâmetros acima podem ser ajustados para modelar adequadamente as três principais
partes constituintes do neurônio, ou seja: dendrito, soma e axônio. Mais ainda, a mielinização
axonal também pode ser modelada alterando-se adequadamente a resistência e capacitância da
membrana. Por último, a geometria das diversas espécies neuronais é modelada, de maneira a
adequar os potenciais elétricos gerados pela estimulação a serem computados nos nodos de
entrada de cada compartimento do modelo, conforme regras descritas mais acima.
Em particular, deve-se lembrar que os padrões de estimulação elétrica, tanto na clínica
quanto na pesquisa científica, consistem de seqüências (ou trens) de pulsos quadrados de
corrente, conforme mostra a figura 31 abaixo.
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Similarmente, a distância guarda uma relação inversa com a corrente de limiar. Ou seja,
quanto mais distante se encontra o sítio de disparo do potencial de ação, maior deve ser a
corrente para ativar esse neurônio. A equação abaixo define essa relação:
I th I r Kr 2
Onde Ir é a corrente limiar absoluta (quando a distância entre eletrodo e o sítio de disparo
do potencial de ação é zero) e o parâmetro K (inclinação) é a razão das diferenças entre o
quadrado do aumento da distância com o aumento da corrente de limiar.
Conforme já foi mencionado anteriormente, a polaridade do pulso tem efeito direto na
ativação diferencial de distintos elementos neuronais. Assim, uma estimulação elétrica monopolar
na substância cinzenta ativará mais ou menos fibras de passagem em detrimento ou benefício de
células locais, conforme a polaridade do pulso.
De fato, as simulações computacionais mostram que a estimulação catódica tem corrente
de limiar menor para a ativação de fibras de passagem do que para as células locais. Ao
contrário, a estimulação anódica tem corrente limiar para fibras de passagem maior do que para
as células locais.
A estimulação monopolar com apenas uma fase (ou monofásica, catódica ou anódica),
entretanto, tem uma grave limitação que impede seu uso amplo. Dado o sentido único da
corrente, tal padrão gera um desbalanço de cargas indesejável, tornando-se bastante grave no
caso de estimulações crônicas. Esse desbalanço pode causar danos ao tecido estimulado, bem
como acarretar na degradação do eletrodo, tornando a estimulação ineficiente. A solução para
isso é balancear a carga através do uso de pulsos bifásicos, onde ambas as polaridades estão
presentes, uma após a outra. Mais ainda, a seletividade quanto a fibras de passagem ou células
locais pode ser preservada, mesmo no pulso bifásico. Basta, para isso, que o pulso supra-limiar
de polaridade adequada, curto e de maior amplitude, seja precedido de um pré-pulso da
polaridade contrária (indesejada), mas longo e de baixa amplitude, portanto sub-limiar e capaz de
balancear a carga.
Por fim, há alguns efeitos indiretos da estimulação elétrica que levam a uma resposta
polifásica do neurônio estimulado. A estimulação elétrica pode excitar neurônios pré-sinápticos
espacialmente próximos, que reagem com liberação de neurotransmissores. Nesse caso, se a
célula pré-sináptica for inibitória, o neurônio pós-sináptico primeiro se ativará e depois diminuirá
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O último item, nos sistemas mais antigos, é controlado pelo estágio de saída, conforme
será visto mais baixo.
O estágio seguinte no diagrama de blocos da figura 32 é essencial, mesmo em se tratando
de estimuladores elétricos de uso em experimentos com animais: o acoplamento óptico. Trata-se
de um circuito muito simples: acopladores óticos com seus circuitos externos de polarização
(resistores e capacitores). Conforme mencionado na seção que trata dos sistemas de registro
eletrofisiológico, a função desta etapa é separar eletricamente a parte do circuito eletrônico que
está ligada à rede elétrica daquela que está em contato com o paciente ou com o animal
experimental.
Entretanto, diferentemente do caso anterior, aqui o acoplamento óptico se presta a duas
importantes funções. A primeira é, assim como anteriormente, proteger o paciente de anomalias
da rede elétrica. O acoplador ótico não só dá um sentido único para a transferência de energia
entre as duas partes (que nesse caso está invertido: da rede para o paciente), bem como limita
dramaticamente este fluxo a limites inócuos para o a fisiologia humana. Isso se deve ao fato de
que a comunicação no acoplador ótico é feita, como o próprio nome sugere, através de luz. No
interior do chip, um diodo emissor de luz (LED – Light Emitting Diode) emite fótons em quantidade
controlada pela magnitude da corrente que o percorre. Do outro lado do componente, um foto-
transistor (transistor cuja corrente de base é controlada por luz) recebe o sinal luminoso e ativa a
corrente de coletor para emissor conforme sua polarização. Como a corrente máxima do lado do
foto-transistor só depende de sua polarização, configurada em limites inócuos, o paciente fica
protegido contra as anomalias da rede.
A segunda importante função do acoplamento ótico é isolar todo o circuito em contato com
o paciente no que se refere a possíveis caminhos elétricos para a fuga de corrente. Como o
estágio de saída se trata, em essência, de um gerador de corrente, é importante que todo o
sistema físico constituído de estágio de saída + tecido estimulado não contenham nenhum ponto
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de contato com o aterramento, percurso pelo qual a corrente pode descarregar. Isso garante que
toda corrente elétrica gerada percorra o alvo da estimulação, evitando todo tipo de fuga (ou
“vazamento de corrente” – current leakage) e, portanto, ineficiência do equipamento.
Uma vez que todo o circuito eletrônico em contato com o tecido está separado
eletricamente daquele em contato com a rede elétrica, é necessário providenciar um sistema de
energia para ativação dos componentes desacoplados. Naturalmente, esta energia não pode vir
da rede elétrica diretamente, pois, assim, haveria uma falha na separação. Existem duas
soluções para esse problema. A primeiro delas consiste no uso de um banco de baterias ligadas
em paralelo (as tensões de saída atingem até 100 V). Entretanto, essa abordagem exige um
sistema gerenciador de energia para acusar quando as baterias estão descarregadas. Se isso for
ignorado, a estimulação elétrica pode parar de funcionar sem sinais claros para o profissional de
saúde ou pesquisador, uma vez que as baterias descarreguem. A segunda alternativa, preferida
em sistemas mais modernos, usa conversores DC-DC, do tipo boost. Tais componentes são os
análogos dos transformadores de tensão AC (Alternating Current – corrente alternada) para o
caso de corrente contínua (DC – Direct Current). No interior destes chips, a tensão DC de entrada
é chaveada em alta freqüência (aprox. 400 KHz). Esse sinal chaveado passa então por um
pequeno par de micro-bobinas cuja relação de número de espiras faz com que a tensão de saída
seja maior (daí o tipo do conversor: DC-DC boost – do inglês incremento). Basta uma simples
filtragem capacitiva do sinal chaveado e o uso de reguladores de tensão para se obter os valores
de tensão desacoplados.
Por fim, há o estágio de saída. Sua função é responder aos pulsos de comando vindos da
central de controle com pulsos de corrente de mesma duração e amplitude ajustável. Seu circuito
é, via de regra, uma montagem de eletrônica de potência, pois as tensões e correntes envolvidas
no estímulo são de valores consideravelmente maiores do que aqueles envolvidos na micro-
eletrônica comum do resto do equipamento. A título de ilustração, a maioria dos estimuladores
comercialmente disponíveis são capazes de gerar pulsos com até 500 mA de amplitude em
tensões de até 100 V. Assim, é necessário o que denominamos de um circuito para ganho de
potência, ou seja, multiplicação da corrente e da tensão de entrada por fatores maiores que um.
Essa mágica é feita usando-se elementos de potência como transistor de potência ou par
Darlington. Uma outra possibilidade bem menos comum é o uso de amplificadores operacionais
de alta tensão, quando as correntes envolvidas não são de valores muito altos.
Toda a parte de acoplamento ótico e estágio de saída, bem como de gerência de energia
desacoplada é comumente denominada de isolation unit (ou unidade de isolamento). De fato,
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diversos fabricantes vendem esse equipamento separadamente da central de controle, uma vez
que essa pode ser um software em seu computador ou outro dispositivo de geração de pulsos.
Um exemplo prático dessa situação são experimentos de auto-estimulação de recompensa em
roedores, em que os pulsos são disparados pelo próprio comportamento do animal.
Em outros casos, toda a eletrônica do estimulador se encontra do lado desacoplado da
rede elétrica, inclusive central de controle. Apenas as entradas de sincronização externa podem
ser conectadas com a rede elétrica, sendo que, nesse caso, o sinal de entrada passa por um
acoplador óptico. Nessa situação, todo o circuito deve ser alimentado com o sistema gerador de
energia desacoplada, seja ele o banco de baterias, sejam os conversores DC-DC. Ainda assim,
são denominados, nesse caso, unidades de isolamento.
Referências
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