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A pedagogia da conquista do espaço público pelas mulheres

A pedagogia da conquista do espaço público pelas


mulheres e a militância feminista de Bertha Lutz

Rachel Soihet
Universidade Federal Fluminense
Programa de Pós-Graduação em História

Um foco sobre o contexto inicial um parecer jurídico afirmativo acerca da legalidade da


medida. Trabalhou na secretaria do Museu, passando,
Líder do movimento que conseguiu significativos posteriormente, para o quadro científico. Segundo afir-
sucessos na conquista de direitos para as mulheres, mou em entrevista, a situação brasileira em relação às
Bertha Lutz inicia sua campanha no Brasil após seu re- mulheres não lhe agradava... o que a fez retomar contatos
torno da Europa, em 1918. Na Inglaterra, interessou-se feitos em Paris, objetivando o início de um movimento
e manifestou o desejo de participação na campanha fe- pela participação das mulheres no espaço público.
minista, ali desenvolvida antes da guerra, sendo impedi- De qualquer forma, no Brasil, desde o protesto de
da por sua mãe, natural daquele país, que a alertou so- Nísia Floresta, na década de 1830, manifestaram-se com
bre sua condição de menor e estrangeira. Em seguida, mais força insatisfações femininas. Constituiu-se aqui
radicou-se na França, onde estudou biologia na uma imprensa feminina, cujo primeiro periódico, O Jor-
Sorbonne, conhecendo naquele país Jerônima Mesqui- nal das Senhoras, data de 1852, seguindo-se outros,
ta, que se ofereceu para uma união de esforços no Brasil como o de Josefina Álvares de Azevedo, que conjugava
com vistas a fazer qualquer coisa pelas mulheres. Em duas lutas: a do abolicionismo e a do feminismo. Algu-
aqui chegando, causa curiosidade, repercutindo na im- mas eram mais moderadas nas suas reivindicações, en-
prensa, sua participação no concurso para o Museu Na- fatizavam a importância da educação da mulher, lem-
cional. Um dos candidatos chegou a enviar uma carta brando o seu papel de mãe, ou por uma “questão de
para o diretor do Museu, reclamando da participação de requinte espiritual” (Hahner, 1981, p. 35). Nesse parti-
uma mulher, o que considerava contra todas as boas cular, lembre-se que era proibida a educação comum dos
normas da moral e da família, e, revoltado, desistiu ele dois sexos, não só devido à rígida moral católica como,
do concurso. Mas Bertha foi classificada em primeiro igualmente, devido à certeza da ciência hegemônica na
lugar, constituindo-se na segunda mulher a entrar para o época acerca das diferentes aptidões entre homens e
serviço público no Brasil, em que pese a necessidade de mulheres. Daí a diversidade de currículos a eles desti-

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nados, ocasionando diferenças flagrantes no ensino dos afirmavam que a mulher foi formada para sentir, como o
jovens. Enquanto os homens cursavam o ensino secun- homem foi criado para pensar e “aquelas que têm apre-
dário, que visava o acesso aos cursos superiores, as sentado uma inteligência superior, tem sido à custa de
moças em sua maioria encaminhavam-se para as esco- suas qualidades femininas”. Doenças, comportamento
las normais, destinadas à profissionalização e/ou ao pre- aberrante, esterilidade, degeneração racial eram alguns
paro para o lar. Na Escola Normal de Niterói, primeira dos perigos decorrentes da inversão desse princípio, in-
do gênero da América do Sul, fundada em 1835, as alu- clusive porque, do desenvolvimento do cérebro femini-
nas não estudavam álgebra e a geometria limitava-se no, resultava a atrofia do útero (Lombroso & Ferrero,
“às noções mais elementares e de mais freqüente apli- 1896).
cação aos usos elementares da vida” (Júdice, 1994). Igualmente, o direito de voto e de elegibilidade foi
Mas havia também aquelas que exigiram uma edu- reclamado, pois, como afirmava Josefina Álvares de
cação qualificada não em nome da sua responsabilidade Azevedo, no jornal A Família, em abril de 1890, “não
familiar, mas porque consideravam-se tão capazes “como se poderá impunemente negar à mulher um dos mais sa-
o homem para o estudo das ciências”, apesar da cons- grados direitos individuais”. Também, reivindicava di-
tante repetição contrária; afirmavam, inclusive a exis- reitos civis e o divórcio, considerando a indissolubilidade
tência de mulheres superiores a muitos homens cientis- do casamento um “absurdo insuportável, como uma sen-
tas; e que escreveram trabalhos que são citados por tença de iniqüidade sobre uma consciência resgatada de
médicos insignes. A profissionalização como fruto da culpa”. Assim, mulheres brasileiras, como aquelas da
instrução era apontada como uma necessidade, reivindi- Europa e dos Estados Unidos, reclamavam direitos, re-
cando algumas, ainda de forma tímida, a título de com- agindo contra a condição a que estavam submetidas. Al-
plementaridade, pois “nem sempre o trabalho do homem gumas se rebelaram abertamente, enquanto a maioria se
é suficiente para proporcionar à sua família todas aque- valia de maneiras mais sutis na ânsia de subverter sua
las comodidades...”. Outras, mais lúcidas, manifestavam situação. Lançavam mão de táticas que lhes permitiam
tal necessidade com vistas a que as mulheres atingissem reempregar os signos da dominação, marcando uma re-
uma posição simétrica no relacionamento com os ho- sistência.1
mens, tornando-se dignas, capazes de uma escolha li- Observa-se, porém, forte resistência às pretensões
vre, o que as levaria a desprezar “as adulações pueris de uma alteração nos papéis de gênero. O século XIX
de que ainda se mostram ávidas”; não tendo que enfren- teria em toda parte acalentado uma crença nas esferas
tar dúvidas quanto a sua fidelidade “porque acabar-se-á isoladas da feminilidade e da masculinidade que chega-
a necessidade de fingir e transigir com a artimanha mas- ria aos extremos de uma fé religiosa, e sempre que es-
culina; e só então poderá se assentar ao lado do homem
como sua companheira e jamais como sua serva”. Ha-
1
via também aquelas que nem mencionavam o casamen- Vários historiadores descartam a visão unilateral do poder so-

to como alvo, ao apontarem a importância do trabalho bre os dominados passivos e impotentes. Como frisa Michel de
Certeau, torna-se necessário desvendar as sutilezas engendradas cria-
assíduo e o seu fortalecimento “para as provas da liber-
tivamente pelos dominados, com vistas a reagir à opressão que sobre
dade e para os combates da vida” (Bernardes, 1989,
eles incide. E. P. Thompson, embora não estabeleça as mulheres como
p.138-139, 145, 159).
objeto específico, dedica especial atenção às manifestações cotidia-
Não lhes faltava consciência de que assumir tal
nas de resistência dos subalternos. A noção de resistência torna-se,
postura representava um pesado ônus. E o depoimento
dessa forma, fundamental nas abordagens sobre as mulheres e inú-
de uma das mais ativas militantes demonstra-o, ao re- meras historiadoras têm se baseado nesse referencial no esforço de
gistrar que “a mulher que estuda, que pensa, ...é objeto reconstrução da atuação feminina (Ver Michel de Certeau, 1994, p.41;
de críticas e censuras à sua própria dignidade, e faz par- Thompson. Tradición, revuelta y consciencia de clase. Estudios so-
te das distrações, dos cafés e dos bilhares...”. Afinal, os bre la crisis de la sociedad preindustrial. Barcelona, Ed. Critica,
médicos com seu domínio do conhecimento científico 1979, p. 51.

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sas fronteiras foram ameaçadas, argumentos em defe- A partir dessa ambigüidade, a advogada Myrthes
sa das absolutas diferenças entre os sexos foram en- de Campos, primeira mulher aceita na Ordem dos Ad-
fiados na brecha aberta. Por outro lado, o processo de vogados, requer seu alistamento eleitoral, argumentan-
agitação, a redefinição da questão sexual, próprio da do que a Constituição não negava este direito às mulhe-
virada do século, não se limitou às mulheres nas culturas res. Seu requerimento foi indeferido, o que não a impediu
patriarcais. A crise da identidade sexual afetou também de continuar a sua luta por este direito. Mas foi a profes-
os homens, o que explicaria a sua reação desmesurada sora Leolinda Daltro aquela que primeiro reivindicou o
às postulações femininas de participação na sociedade voto de forma organizada. Usando do mesmo argumen-
(Showalter, 1993, p. 21-22). to sobre sua constitucionalidade, requereu seu alistamen-
Tais temores não deixaram de se fazer presentes no to, que lhe foi igualmente negado. Voltou-se, em decor-
país, nas discussões da Assembléia Constituinte de 1891, rência, para o campo político, fundando em 1910 o
contribuindo para que fossem rejeitadas as emendas ao Partido Republicano Feminino, a fim de fazer ressurgir
artigo 70, visando a explicitar o direito da mulher ao no Congresso o debate sobre o voto feminino. Em no-
voto. Alguns concluíram pela sua inconstitucionalidade. vembro de 1917, organizou uma passeata com 84 mu-
Outros, porém, alegavam que o elemento feminino esta- lheres, surpreendendo a população do Rio, o que pode
va incluído na categoria “cidadãos brasileiros”. Pelo que ter contribuído para que, no mesmo ano, o Deputado
é dado verificar, conclui-se que o espírito da Assem- Maurício de Lacerda apresentasse na Câmara um proje-
bléia foi o de deixar uma abertura para o tema. Não to de lei estabelecendo o sufrágio feminino, que nem
ousou a referida Assembléia expressar claramente o di- chegou a ser discutido. Na sua exposição de motivos, o
reito eleitoral às mulheres, numa época de tantas restri- Deputado, além de acentuar a comprovada capacidade e
ções à sua participação; por outro lado, não permitiu eficiência das mulheres ao participarem em todos os ra-
também que esta concessão fosse assinalada “expressa- mos de atividade, manifesta-se, igualmente, contrário à
mente a cidadãos varões”, como em alguns estados da interpretação restrita e errônea que excluía as mulheres
União Norte-Americana. Infere-se, portanto, que optou do termo “cidadãos”, presente na Constituição. Em 1919,
por uma fórmula vaga, imprecisa, que impediria fosse com o encaminhamento de projeto similar pelo parla-
contestada, radicalmente, a capacidade política das mu- mentar Justo Chermont ao Senado, Leolinda Daltro fez-
lheres. Sabiam os legisladores que se fosse argumenta- se acompanhar por um grupo grande de mulheres a fim
da a fórmula masculina empregada no direito eleitoral, de seguir a votação, tática que continuou a ser adotada
ter-se-ia, igualmente, que isentar as mulheres de obri- pelo movimento feminista posteriormente (Alves, 1980,
gações civis ou de responsabilidade criminal, porque as p. 95-96).
leis penais sempre se referem aos delinqüentes e crimi- Porém a trilha para as mulheres seria espinhosa.
nosos e não às delinqüentes e criminosas.2 Autoridades, políticos em geral, juristas negam-se a con-
siderar positivamente as pretensões de autonomia femi-
nina. Respaldam-se na ciência da época, sinônimo, na-
2
Eis os artigos da Constituição Brasileira de 1891 que se refe-
quele momento, de verdade absoluta. Apelando para tais
rem à questão da cidadania: Art. 69 – São cidadãos brasileiros: 1o)
convicções e para os prejuízos acarretados à família, já
Os nascidos no Brasil, ainda que de pai estrangeiro, não residindo
que este era visto como o seu espaço prioritário, buscam
este a serviço da nação. Art. 70 – São eleitores os cidadãos maiores
de 21 anos que se alistarem na forma da Lei. 1º) Não podem alistar-
se eleitores para as eleições federais ou para as dos Estados: 1º) Os dadãos não alistáveis. Art. 72 – A Constituição assegura a brasileiros
mendigos, 2o) os analfabetos; 3o) as praça de pré, excetuados os alu- e a estrangeiros residentes no país a inviolabilidade dos direitos
o
nos das escolas militares de ensino superior, 4 ) os religiosos de concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos
ordens monásticas, companhias, congregações ou comunidades de termos seguintes: 1o) Ninguém pode ser obrigado a fazer ou deixar
qualquer denominação, sujeitas à obediência, regra ou estatuto que de fazer alguma coisa senão em virtude da lei. 2o) Todos são iguais
o
importe a renúncia da liberdade individual. 2 ) São inelegíveis os ci- perante a Lei.

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limitar as mulheres nas suas ações, desejos e emoções, so, fator decisivo no amadurecimento da personalidade
naturalizando determinações histórica e socialmente es- feminina, ajudando-a a “disciplinar a vontade e educar
tabelecidas. Também através de peças teatrais, da lite- o pensamento”. A educação seria o veículo para a con-
ratura, de crônicas e por diversas matérias na imprensa, secução desse objetivo. Complementando suas suges-
observa-se oposição ao seu atendimento, inclusive atra- tões, Bertha propunha a formação de associações, im-
vés da ridicularização das militantes. Representam-nas prescindíveis para funcionarem como elementos de
como masculinizadas, feias, despeitadas e, mesmo, amo- pressão e para fazer frente às reações surgidas, garan-
rais; no que conseguiam grande repercussão, não sendo tindo “o êxito no rompimento dos tabus e preconceitos
poucos os homens comuns e, também, mulheres que en- relativos à libertação da mulher”.
dossavam tais opiniões, através de depoimentos e cartas O cuidado em demonstrar sua moderação estava
aos jornais. presente ao afirmar que não pretendia uma associação
de “suffragettes”, que ameaçassem quebrar as vidraças
A escalada pelo voto da Avenida, demonstrando sua oposição a certas medi-
das que caracterizaram o feminismo inglês e norte-ame-
E é nesse ambiente que Bertha Lutz e um pequeno ricano em determinadas fases. Apressa-se em esclare-
grupo de companheiras farão a sua campanha que assu- cer que sua proposta era:
me caráter hegemônico naquele momento. Organizam-
uma sociedade de brasileiras que compreendessem que a mu-
se em associações, fazem pronunciamentos públicos,
lher não deve viver parasitariamente do seu sexo, aproveitando
utilizando-se fartamente da imprensa, buscam o apoio
os instintos animais do homem, mas que deve ser útil, instruir-
de lideranças nos diversos campos, constituindo grupos
se e a seus filhos e tornar-se capaz de cumprir os deveres políti-
de pressão visando garantir apoio de parlamentares e de
cos que o futuro não pode deixar de repartir com ela.
outras autoridades, da imprensa, da opinião pública. Ape-
sar disso, em sua maioria, buscam revestir o seu discurso Contrapõe-se à intocável divisão de esferas entre
de um tom moderado. Não apenas porque talvez conside- mulheres e homens, ao enfatizar o exercício do trabalho
rassem que esta seria a forma adequada de expressão fe- extradoméstico, mesmo para as mulheres casadas, inde-
minina, mas, especialmente, por razões táticas. pendentemente da condição do marido. E aí depreende-
Ainda em fins de 1918, Bertha envia uma carta à se sua concepção de que o eterno sustento da mulher no
Revista da Semana, na qual se observa este duplo mo- casamento corresponderia a uma espécie de comércio
vimento. Critica os homens pelo tratamento dispensado sexual, ao recomendar que a mulher “não deve viver
às mulheres, que, sob a capa do respeito, tentavam mantê- parasitariamente do seu sexo, aproveitando os instintos
las em permanente estado de infantilização. Exige o di- animais do homem”. Nesse sentido, propõe uma refor-
reito de ser respeitada como ser humano e não como mulação na organização da família, que naquele mo-
objeto de luxo ou agrado, incapaz de pensar por si. Re- mento constitui-se em algo inovador. Um outro aspecto
conhece, porém, não serem eles os únicos responsáveis que se depreende de suas declarações é a crença de que
pelo estágio em que se encontrava a condição feminina, a ascensão feminina resultaria não só em benefícios pes-
embora tivessem uma grande parcela, já que “a legisla- soais, deixando de ocupar “uma posição social tão hu-
ção, a política e todas as instituições públicas” estão em milhante para elas como nefasta para os homens e dei-
suas mãos. Cabia, contudo, às mulheres lutarem pela xariam de ser um dos pesados elos que atam o nosso
sua emancipação, como o fizeram as inglesas e as ame- país ao passado para se tornarem instrumentos precio-
ricanas. E tal luta demandava requisitos básicos, tais sos do progresso do Brasil” (Soihet, 1974, p. 9).
como espírito de iniciativa, exercício do trabalho e edu- Já em 1919, verifica-se a colaboração de Bertha
cação. O exercício do trabalho era determinante, por- Lutz na seção “Rio Femina” do Rio Jornal, anunciada
que lhes propiciava meios de subsistência, livrando-as como uma das representantes das novas idéias de eman-
de uma “dependência humilhante”. Constituía, além dis- cipação do feminismo europeu e norte-americano. Em

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A pedagogia da conquista do espaço público pelas mulheres

seus artigos, Bertha expõe suas idéias sobre diversas tuais em dar ao país uma face nacional e moderna atra-
dimensões do feminismo, abrindo um espaço considerá- vés da valorização de uma cultura que integrasse as di-
vel para as questões ligadas às condições de vida das versidades. E o movimento em busca do reconhecimen-
mulheres trabalhadoras. to de direitos das mulheres inseria-se neste bojo.
Apesar da multiplicidade de atividades que conse- Em 1922, assiste-se à participação da líder femi-
guiu empreender, abrindo várias frentes de luta, a con- nista na Primeira Conferência Interamericana de Mu-
quista do voto, de acordo com espírito da época, mere- lheres, realizada em Baltimore. O feminismo brasileiro
ceu prioridade. Acreditava que o acesso aos direitos torna-se, a partir daí, intimamente ligado ao norte-ame-
políticos eram essenciais à obtenção de garantias com ricano, no caso, à NAWSA – National American
base na lei. Em 1919, Bertha funda com um grupo de Woman’s Suffrage Association –, vertente conservadora
companheiras a Liga para Emancipação Intelectual da que assumira a liderança naquele país. Terminada a Con-
Mulher, que se dispunha a fazer reconhecer os direitos ferência, as representantes latino-americanas fundaram
da mulher e sua ampla participação na vida pública, a Associação Pan-Americana de Mulheres, estabelecen-
dando arrancada a um movimento no qual se manteve do-se que em cada país latino-americano haveria uma
sempre à testa, em que a tenacidade foi a sua marca prin- Associação Nacional subdividida em associações esta-
cipal. Esta seria, ao mesmo tempo, segundo uma das his- duais, de acordo com a constituição dos referidos países.
toriadoras do movimento, uma das razões da força e da Bertha Lutz recorreu à líder americana, Carrie
limitação do referido movimento, na medida em que nele Chapman Catt, presidente da NAWSA, solicitando aju-
predominou sua forte personalidade. E começam, Bertha da para a elaboração dos estatutos da nova associação
e suas companheiras, a exercer a citada tática de movi- no Brasil, a Federação Brasileira para o Progresso Fe-
mentar a opinião pública e a fazer pressão direta sobre minino – FBPF –, que substituiu a Liga fundada pouco
os membros do Congresso. Aproveitavam-se dos laços antes. A associação foi oficialmente inaugurada a 9 de
de amizade existentes entre seus familiares e muitos dos agosto de 1922, sob a presidência de Bertha Lutz e com
grupos que ocupavam posição de poder para obter simpa- a presença de Carrie Chapman Catt, a quem Bertha se
tia para sua causa e fazer avançar o debate acerca da dirigiu mais tarde como a “mãe espiritual” da entidade.
causa sufragista. Além disso, a capacidade, o brilho inte- Mas também estiveram presentes as representantes Ana
lectual que muitas apresentavam, subsidiando os parla- de Castro Osório, de Portugal, e Rosa Manus, da
mentares que defendiam suas demandas, igualmente con- Holanda. Conforme seus estatutos, eram seus objetivos:
tribuíram na sua maior aceitação (Alves, 1980, p. 105). coordenar e orientar os esforços da mulher no sentido de
Nesse contexto, inaugura-se a década de 1920, que elevar-lhe o nível da cultura e tornar-lhe mais eficiente
polariza inúmeros descontentamentos que se vinham a atividade social, quer na vida doméstica quer na vida
manifestando ao longo da República e que se expres- pública, intelectual e política.
sam em vários movimentos: o Tenentismo, a criação do O Art. 3º discriminava como atingir tais objetivos
Partido Comunista, o Modernismo, como também o cres- gerais:
cimento do Feminismo. Esses movimentos revelam in-
satisfações –, relacionadas com o nível econômico, a 1. Promover a educação da mulher e elevar o nível de instru-

esfera política – marcada, especialmente, pelo descon- ção feminina.

tentamento com a corrupção característica do sistema 2. Proteger as mães e a infância.

eleitoral vigente, postulando um governo realmente re- 3. Obter garantias legislativas e práticas para o trabalho feminino.

presentativo –, mas também no que tange ao terreno das 4. Auxiliar as boas iniciativas da mulher e orientá-la na esco-

idéias, do comportamento, dos valores. Em suma, foi lha de uma profissão.

um momento de grande efervescência e busca de solu- 5. Estimular o espírito de sociabilidade e de cooperação entre

ções para os problemas do Brasil nos mais diferentes as mulheres e interessá-las pelas questões sociais e de alcance

âmbitos, observando-se o empenho de inúmeros intelec- público.

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6. Assegurar à mulher os direitos políticos que a nossa Consti- por interpretação da Constituição, o que resultaria na
tuição lhe confere e prepará-la para o exercício inteligente des- adesão de outras unidades da Federação. “Os homens
ses direitos. são como carneiros”, disse o Senador, “quando um vai
7. Estreitar os laços de amizade com os demais países ameri- na frente, outros vão atrás” (Soihet, 1974, p. 27).
canos, a fim de garantir a manutenção perpétua da Paz e da Surgem filiais da FBPF em diversos estados, assim
Justiça no Hemisfério Ocidental. (Soihet, 1974, p. 13) como outras associações assistenciais e profissionais
unem-se à referida entidade. Conferências, crônicas de
A preocupação com a educação e instrução femini-
Bertha e de outras líderes procuram manter a questão do
na constitui o primeiro dos objetivos; dois deles acentu-
voto feminino na ordem do dia. Em maio de 1923, Bertha
am o empenho em estimular e garantir o exercício do
Lutz representou FBPF no 9o Congresso Internacional
trabalho para as mulheres, inclusive através de medidas
pelo Sufrágio, reunido em Roma, participando o Brasil
legislativas; quanto aos direitos políticos, constata-se a
pela primeira vez de uma reunião internacional femini-
defesa de que as mulheres estavam incluídas na catego-
na, abrangendo países dos dois hemisférios. Bertha Lutz
ria “cidadãos” presente na Constituição de 1891, ca-
sugeriu a substituição das expressões “igualdade dos
bendo a FBPF assegurar a concretização desse direito;
sexos” e “direitos da mulher” respectivamente por “equi-
a maternidade e a infância deveriam ser alvo de prote-
valência dos sexos” e “novas responsabilidades da mu-
ção; a presença do último item num documento concer-
lher”, deixando entrever uma tática nova mais comedi-
nente a questões próprias das mulheres brasileiras tal-
da, que ela acreditava mais adequada à consecução dos
vez signifique a pretensão dos Estados Unidos de que os
objetivos visados. Acrescentou, em seguida, que a par-
países da América se constituíssem num único bloco sob
ticipação da mulher não implicava competição e sim
sua direção.
colaboração (Soihet, 1974, p. 28).
Os Estatutos estabeleceram eleições bienais, em-
O debate acerca do voto feminino tomou grande
bora nada explicitassem quanto às reeleições, o que ex-
impulso, pronunciando-se juristas conhecidos favoravel-
plica a presença permanente de Bertha Lutz à frente da
mente à sua constitucionalidade, além de constituir ma-
organização, o que não parece ter incomodado boa par-
téria de comentários nos jornais da época, nos quais
te de seus membros. É sintomática a declaração de uma
Bertha Lutz era personagem requestada. Numa dessas
das militantes, reconhecendo que “Bertha Lutz dirigia
matérias, no jornal A Notícia, a 5 de abril de 1924, la-
integralmente a campanha”, aspecto que não se discu-
menta-se a demora do Brasil na adoção da medida, numa
tia, pois ela “era a mais dedicada”, prejudicando a sua
época em que mulheres afirmavam-se profissionalmen-
carreira profissional na ocasião já que “devotava quase
te, atuando nas profissões liberais em diversas ativida-
todo seu tempo à luta pelo voto” (Alves, 1980, p. 113).
des que lhes eram anteriormente vedadas. Nesse parti-
Algumas, porém, como Nathércia da Silveira, saíram
cular, estávamos atrás da Turquia “da tradicional
mais tarde, criando a Aliança Nacional de Mulheres.
escravização feminina”, que já buscava “conceder à
Bertha promoveu em dezembro de 1922 o Primeiro
mulher esse direito”. O que não impede ao articulista,
Congresso Internacional Feminino, ao qual esteve pre-
mesmo num espaço que se mostrava favorável às pre-
sente Carrie Chapman Catt, além de representantes de
tensões femininas, de fazer uma crítica. Acentua que o
outros países. Seguindo os conselhos daquela líder, con-
aspecto físico entre mulheres e homens chegava a con-
vidou políticos de prestígio para o evento, entre eles, o
fundir: “com o costume da cara masculina raspada, a
senador Lauro Müller, Vice-Presidente do Senado, que
praga do almofadismo e a nova moda de cabelo curto
encerrou a Conferência, reafirmando em seu discurso
das senhoras e senhoritas”, fato que impossibilitava “sa-
que a Constituição de 1891 não proibia direitos políti-
ber distinguir os sexos se não fossem as calças e as sai-
cos às mulheres. Confessava, porém, que, na época, o
as...” Aliás o perigo da indistinção entre os sexos era
Governo Federal não era favorável às reivindicações fe-
algo que causava pânico desde há algum tempo... Infor-
ministas. Aconselhou às líderes que procurassem um Go-
mava a seguir que o feminismo no Brasil, estava se ar-
vernador de Estado disposto a instituir o voto feminino

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A pedagogia da conquista do espaço público pelas mulheres

regimentando para um grande movimento de propagan- lei”. Conseguiu, antes de ocupar o poder, incluir na Le-
da em favor de seus direitos eleitorais e eletivos. gislação do Estado do Rio Grande do Norte um disposi-
A campanha manteve-se acesa, embora não fosse tivo estabelecendo igualdade de direitos políticos para
fácil a empreitada. No Senado, projeto do Senador Justo os dois sexos. Seguiram-se vinte alistamentos femini-
Chermont foi aprovado pela Comissão de Constituição, nos. O precedente aberto deu margem a ampla movi-
em maio de 1921, recebendo parecer favorável do Sena- mentação da FBPF, que enviou ao Senado uma mensa-
dor Lopes Gonçalves, ao identificar as mulheres como gem contendo duas mil assinaturas. Nela reivindicava-se
atingidas pela cidadania a que se refere a Constituição. o voto feminino, acentuando que “desde que uma só exis-
Foi encaminhado, posteriormente, à Comissão de Justi- ta não há motivo para que não sejam eleitoras todas as
ça, que deveria opinar sobre a oportunidade da medida. mulheres habilitadas no Brasil”.
Diante da composição da Comissão, em sua maioria con- Posteriormente, nas eleições realizadas para pre-
trária ao reconhecimento do voto feminino, os seus enchimento da vaga criada no Senado com a renúncia
mentores julgaram mais apropriado aguardar melhor de Juvenal Lamartine, votaram algumas das eleitoras.
oportunidade para a continuidade da discussão.3 Nesse Embora o candidato eleito fosse empossado, a Comis-
ínterim, dois novos projetos foram apresentados, respec- são de Poderes do Senado considerou nulos os votos fe-
tivamente, à Câmara e ao Senado.4 O projeto apresenta- mininos. Alegou que pretendia evitar o “prejulgamento
do em 1924 à Câmara, embora incluindo a mulher entre quanto à sua conveniência e oportunidade”, pois o pro-
os eleitores, estabelecia uma cláusula restritiva, exigin- jeto que reconhecia, especificamente, a habilitação po-
do a autorização do marido para a mulher casada. As lítica da mulher estava ainda em andamento naquela casa.
feministas protestaram, argumentando Bertha Lutz a res- A FBPF reagiu com um “Manifesto Feminista” à nação
peito da inconstitucionalidade e ilogismo do mesmo, pois no qual eram reclamados os direitos da mulher. Enume-
o voto constituía um dever “não podendo ficar na con- rava o citado Manifesto as injustiças a que estava sub-
tingência de uma permissão”, além do que cabia à mu- metida a mulher, negado o reconhecimento de sua exis-
lher “orientar a sua conduta por si própria conduzindo- tência como ser livre e autônomo, impedida por uma série
se pelo seu próprio cérebro”. de estereótipos de se desenvolver plenamente, coagida a
Adquiriu novo impulso a questão do voto com a obedecer a leis e a pagar impostos em cuja elaboração
candidatura e eleição do Senador Juvenal Lamartine para lhe era vedado intervir. Nesse sentido, acentuava a con-
Presidente do Rio Grande do Norte. Lamartine foi um dição de interdependência entre os sexos e os prejuízos
dos primeiros políticos conquistados para a causa femi- recíprocos acarretados pela supressão dos direitos de um
nista e manifestou em sua plataforma política, divulgada deles, prejuízos extensivos a toda a Nação. Terminava
em abril de 1927, o propósito de contar “com o concur- por reivindicar para a mulher o livre exercício de seus
so da mulher não só na escolha daqueles que vêm repre- direitos e deveres individuais e, especificamente, o voto,
sentar o povo como entre os que elaboram e votam a único meio legítimo de defender aqueles direitos.
No Rio Grande do Norte, as mulheres, posto que
3
Baseavam-se no fato de que a Lei estabelecia que, para mu-
incapazes de exercerem os direitos políticos no plano
dança de matéria constitucional, o projeto de reforma deveria passar
federal, continuaram a exercê-lo no âmbito estadual. Não
por três discussões nas duas casas. Discutido e aprovado em 1921
só atuaram como eleitoras, como também foram eleitas.
pelas duas casas, voltou a ser debatido pelo Senado somente em 1927,
Destacou-se a prefeita Alzira Soriano, do município de
sem chegar a ser votado, e foi instituído por decreto em 1932, sendo
Lajes. Como antecipara o Senador Lauro Müller, mu-
confirmado pela Constituinte em 1934.
4
Respectivamente, os projetos de Basílio de Magalhães e do
lheres de outros estados passaram a requerer e obter o
Senador Moniz Sodré. Este último incluía explicitamente a mulher alistamento eleitoral. Sobrevindo a Revolução de 1930,
no termo “cidadãos”, devido ao argumento daqueles que se opunham dez estados já aceitavam o alistamento eleitoral femini-
à medida de que, com relação ao sufrágio, as mulheres não estavam no. Contava, então, a FBPF com filiais em treze unida-
inseridas nessa generalização. des da Federação, o que comprova seu esforço na inten-

Revista Brasileira de Educação 103


Rachel Soihet

sificação da campanha para a consecução dos direitos para criar uma nova lei eleitoral. Mas, apesar da pres-
políticos. são das feministas, o anteprojeto estabelecia inúmeras
A indicação de Júlio Prestes para suceder a Wa- restrições ao voto feminino, o que provocou o protesto
shington Luís na Presidência da República descontenta manifestado por outra liderança do movimento, a
Minas Gerais, que se sentiu prejudicada, segundo a ló- engenheira Carmen Portinho.5 Ante a afirmação de Vargas
gica do revezamento tradicional da política do “café com de que era ele próprio feminista, porque às mulheres se
leite” da Primeira República. Este processo de ruptura devia metade da Revolução, ela retrucou: “Sr. Presiden-
entre as oligarquias que detinham o poder constituiu-se te, é por isso que só querem dar a metade do voto? [Ao
na brecha para a emergência dos descontentamentos que que Vargas, manifestando estranheza, teria perguntado]
se vinham acumulando, em torno da moralização do pro- Metade como? [E Carmen] Sim, o voto qualificado a de-
cesso eleitoral e da emergência de outros segmentos so- terminadas categorias de mulheres. Nós não queremos as-
ciais desejosos de participação na vida política. E estes sim. Ou tudo ou nada!”.
irromperam com a Revolução de 1930. Com o Decreto 21.076 de 24 de fevereiro de 1932
Até então, as demandas feministas pelo voto não estabeleceram-se o voto feminino e o voto secreto. Fal-
tinham sido atendidas. A FBPF, diante do novo quadro tava agora a incorporação desse princípio à Constitui-
político, decide-se pela realização do II Congresso In- ção a ser elaborada, o que foi feito com a inclusão do
ternacional Feminista, em junho de 1931. Destacaram- artigo 108 na Constituição de 1934. A FBPF e entida-
se nesse Congresso as decisões relativas às mulheres des autônomas filiadas indicaram Bertha Lutz como re-
trabalhadoras, e que atendiam às aspirações da classe presentante na Comissão de Elaboração do Anteprojeto
operária, propondo medidas protetoras do trabalho, como à Constituição de 1934. Visando mobilizar as mulheres
o estudo de uma fórmula adequada à concessão de licen- para a campanha eleitoral, além de buscar instruí-las
ça remunerada à mãe operária ou empregada no comér- politicamente, a FBPF forma a Liga Eleitoral Indepen-
cio por ocasião do parto; salário mínimo; férias; paga- dente, a qual promove um curso de Educação Política,
mento igual para trabalho igual; rigorosa execução das constante de conferências de renomados juristas.
exigências das autoridades de Saúde Pública e do Traba- Todo o trabalho desenvolvido pela Assembléia
lho quanto à higiene e à adequação das instalações dos Constituinte foi atentamente acompanhado pelas lide-
estabelecimentos fabris e comerciais; e a criação do ranças da FBPF para evitar qualquer retrocesso nas con-
“Bureau” da mulher e da criança, que centralizaria os quistas obtidas, ou que alguma nova medida as pudesse
problemas relativos ao trabalho do menor e da mulher. prejudicar. Empenharam-se, por outro lado, na aprova-
Por outro lado, ao encaminharem as conclusões do ção de determinadas questões que consideravam bási-
Congresso ao Chefe do Governo Provisório, as repre- cas.
sentantes da FBPF enfatizaram sua reivindicação quan- Na verdade, os seus temores não eram infundados.
to aos direitos de votar e de serem votadas, de influírem Representantes havia, como o Sr. Aarão Rebelo, que
na vida pública do país em condição de igualdade para combatiam ferrenhamente o voto feminino, entre outros
ambos os sexos. Também acentuaram a importância de argumentos, “porque ela segue o pai e o marido”. Com-
suprimir a incapacidade civil da mulher casada. Em se- pletava o Sr. Zoroastro Gouveia – “Pior que isso; segue
parado, Bertha Lutz comunicou o apelo, segundo voto o confessor. O voto feminino foi apenas manobra da di-
por aclamação, do 2o Congresso Internacional Feminis-
ta no sentido de permitir a colaboração da mulher brasi- 5
O exercício do voto era limitado às mulheres maiores de vinte
leira nos trabalhos da Subcomissão Legislativa, na qual e um anos, solteiras, viúvas e casadas que auferissem renda própria;
fossem tratadas questões que interessassem diretamente àquelas que, por declaração judicial da ausência do marido, estives-
às mulheres. sem na direção dos bens do casal; às desquitadas e àquelas que tives-
A fim de atender a uma das principais reivindica- sem sido deixadas pelo marido por um período maior que dois anos,
ções da Aliança Liberal, Vargas nomeara uma comissão encontrando-se este “em lugar sabido”. Ver Rodrigues, 1962, p. 78.

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A pedagogia da conquista do espaço público pelas mulheres

reita para se garantir contra o surto esquerdista”. Ou- panha o apoio do Bispo de Niterói, aspecto expressivo
tros, como o Sr. Morais Leme, propunham o voto obriga- das táticas utilizadas por ela e as lideranças da entida-
tório apenas para os homens, argumentando que a “mu- de, no sentido de buscar alianças entre os grupos que
lher ensaia os seus primeiros passos na vida política, e, tradicionalmente a elas se opunham, e inúmeros eram os
por isso, o voto dado pelo representante da Sociedade Con- católicos adversos ao feminismo (Soihet, 1974, p. 50).
jugal deve corresponder ao voto da família”. Nas eleições de 1933, apesar de receber 39.008 votos,
Uma emenda que propunha a prestação do serviço Bertha Lutz ficou como suplente do deputado Candido
militar feminino como condição para o exercício do voto Pessoa, a quem substituiu em 1936, diante do faleci-
(assinada inclusive pela Deputada Carlota Pereira de mento deste. Integrando a Câmara Federal, destacou-se
Queiroz, única mulher eleita para aquela Assembléia), pela sua intensa e profícua atuação.
ensejou forte reação. As feministas opuseram-se enfati-
camente às restrições que queriam impor aos seus direi- Tradicionalismo ou tática?
tos, distribuindo publicações, estabelecendo contatos po-
líticos com parlamentares, ou junto ao chefe do governo. Não são poucas as críticas à maneira como Bertha
Além disso, romperam nesse momento com o seu com- Lutz e suas companheiras da FBPF encaminharam a luta
portamento usualmente moderado e vaiaram os deputa- por direitos das mulheres. A brasilianista Susan K. Besse,
dos que apoiavam a emenda. Esta foi por fim rejeitada. de forma similar a June Hahner, outra historiadora nor-
Ao final da luta, as feministas tiveram suas reivin- te-americana, considera que numa sociedade autoritá-
dicações concretizadas na Constituição de 1934. Nela ria, patriarcal e capitalista, elas contribuíram, no máxi-
foram incorporadas muitas das sugestões de Bertha Lutz mo, para a modernização das relações de gênero. As
como membro da comissão que elaborara o anteprojeto. feministas dessa vertente teriam evitado assumir posi-
Através delas constata-se que a referida líder revela in- ções radicais de contestação em relação aos homens,
teresse marcante pelos aspectos básicos da sociedade mantendo-se numa atitude contemporizadora, em nada
brasileira, ao mesmo tempo que se preocupa em propi- alterando os padrões da dominação sexual. Assim, bus-
ciar às mulheres condições de se integrar nos vários pla- caram transformar as mulheres em ativas “colaborado-
nos da vida nacional e internacional. A título de suges- ras” dos homens, evitando assumir posições ou adotar táti-
tões, reuniu suas propostas numa publicação: Treze cas que fossem interpretadas como “segregacionistas”.
Princípios Básicos, em que defende o direito de todo Aceitando os valores e normas da sociedade capitalista
indivíduo ao trabalho dignamente remunerado, à saúde burguesa, na verdade, teriam ajudado as mulheres a nela
e à educação, sob a responsabilidade do Estado, que deve se integrarem mais plenamente. Embora, individual e
promover o bem-estar social e a proteção do indivíduo coletivamente, as mulheres dos segmentos médios e ele-
através da criação de órgãos de previdência.6 vados colhessem benefícios, para a maioria das mulhe-
Bertha Lutz foi a candidata indicada para repre-
sentar o movimento feminista, liderado pela FBPF, na instituição do lazer necessário, liberdade de reunião e de associação
Câmara Legislativa Federal, concorrendo pela Liga Elei- para os trabalhadores. Determinavam a participação dos mesmos no
toral Independente, Seção Feminista do Partido estabelecimento da legislação e condições de trabalho. Também as-
Autonomista do Distrito Federal. Obteve em sua cam- seguravam medidas de Previdência Social, reconheciam a maternida-
de como fonte de direitos, devendo ser amparada pelo Estado. Propu-
nham que os assuntos referentes à maternidade, infância, lar e traba-
6
Figuraram nas sugestões os artigos que estipulavam a igual-
lho feminino fossem tratados por mulheres habilitadas. Tais suges-
dade de direitos, sem distinção de sexo, à nacionalidade, ao voto, à
tões foram incorporadas à Constituição de 1934, no Capítulo da Or-
elegibilidade e ao exercício de cargos públicos. No que tange ao tra-
dem Econômica e Social. Estas propostas expressam as preocupa-
balho, estabeleciam inúmeras garantias, tais como: a proibição de
ções de institucionalização das reivindicações feministas, mas tam-
diferença salarial para um mesmo trabalho por motivo de idade, sexo,
bém a adesão às idéias reformistas, presentes no terreno econômico,
nacionalidade ou estado civil; mínimo de conforto, segurança econômica;
no político e no social.

Revista Brasileira de Educação 105


Rachel Soihet

res pobres os ganhos teriam sido inexistentes. Em suma, ção desse recurso revela uma das táticas próprias a su-
as feministas contribuíram para fortalecer e legitimar a jeitos submetidos a relações desiguais de poder, que per-
nova ordem burguesa, em que pese a conquista de al- cebem sua incapacidade, em um dado momento, de ques-
guns direitos. (Besse, 1996, p.198). tionar as prerrogativas da vontade dominante. Pelo
Branca Moreira Alves, cujo trabalho destaca-se por contrário, reverenciam as regras estabelecidas, embora
exaustiva pesquisa, tece igualmente inúmeras críticas busquem perseguir objetivos próprios. Nesse sentido, im-
ao referido movimento, entre elas, a ênfase atribuída ao possibilitados de lutar abertamente por seus objetivos,
papel das mulheres como mães e colaboradoras dos ho- tentam alcançá-los fazendo crer aos dominantes que é
mens para justificar a importância na aquisição de di- vontade deles fazer o que eles, dependentes, querem que
reitos. Nesse sentido, o movimento não desenvolveu uma seja feito e, para conseguir seus objetivos, recorrem a
crítica que possibilitasse às mulheres criar sua autocons- alguns signos consagrados por aqueles (Chalhoub, 1998,
ciência, que as levasse a questionar as raízes de sua p. 98).
inferiorização – as relações de poder dentro da família. Numa outra linguagem, as feministas, com Bertha
Na perspectiva de Branca, a conquista do voto não teria Lutz à frente, valeram-se de uma tática que mobilizou
alterado significativamente a condição da mulher (Alves, para os seus próprios fins uma representação “imposta
1980, p.155). e aceita”, mas desviada contra a ordem que a produziu.
Entre outros problemas dessas interpretações, está Portanto, longe de estarem se vergando a uma submis-
o de acreditar no poder de uma vanguarda capaz de são alienante, construíram recursos com vistas a sub-
conscientizar de “fora para dentro” as massas incapa- verter a relação de dominação (Chartier, 1995, p. 41).
zes de desvelarem por si sós sua falta de consciência do Assim, as referidas feministas, ao se utilizarem dessas
processo de dominação. Aliás, o historiador marxista imagens, embora aceitando certas diretivas estabeleci-
E.P. Thompson é implacável na crítica aos que enaltecem das para as mulheres pela ordem vigente, buscam sua
tal vanguarda, que sabe mais do que a própria classe instrumentalização com vistas a ampliar seu espaço de
quais devem ser seus verdadeiros interesses. Na situa- atuação, o que acreditavam inviável de outra forma. Este
ção em pauta, ou seja, no que tange às contradições de pressuposto confirma-se ao examinarmos a análise de
gênero, as feministas focalizadas não teriam sido capa- Moreira Alves com relação ao movimento norte-ameri-
zes de perceber a conexão existente entre a mística da cano. Referindo-se às táticas violentas das suffragettes,
“missão natural da mulher” e sua inferiorização... E, por cita William O’Neill, cuja opinião é de que, com sua
força dessa sua incapacidade, foram as grandes respon- falta de tato, atrasaram a obtenção do sufrágio e, como
sáveis pelo fato de a maioria das mulheres brasileiras resultado, outras organizações buscaram dissociar-se de
não terem atingido a consciência de gênero. Aliás, con- tais métodos (Alves, 1980, p. 138).
cordar com tal suposição seria considerar tais mulheres Moreira Alves, ao examinar os debates no Congres-
simples massa informe, capaz de ser influenciada por so acerca do voto feminino, desde a Assembléia Consti-
qualquer guia que surgisse, independentemente de suas tuinte de 1891 até os anos trinta, acentua a recorrência
condições concretas de existência (Thompson, 1998). ao argumento da significação do papel das mulheres na
Por outro lado, tais historiadoras, uma das quais família quer pelos opositores, quer pelos defensores da
militante do movimento feminista no Brasil da década participação feminina. Fato que demonstra o peso desta
de 1970, incorrem no pecado do anacronismo ao anali- questão, sendo algo suicida uma atitude de confronto
sar muitas das dimensões da questão de gênero, presen- direto com grupos que aprovariam as medidas aspira-
tes no movimento em foco, a partir das experiências pro- das e que expressavam o pensamento dominante naque-
piciadas e decodificadas por um outro momento histórico. la sociedade.
Criticam, particularmente, nas feministas focalizadas, a Juridicamente, a questão já estaria resolvida na
mitificação da maternidade na argumentação em prol da Assembléia Constituinte de 1891, quando o constituinte
aquisição de direitos. Na minha interpretação, a utiliza- Almeida Nogueira refutou a interpretação restrita do

106 Set/Out/Nov/Dez 2000 Nº 15


A pedagogia da conquista do espaço público pelas mulheres

artigo 70, afirmando o direito das mulheres ao voto, pois, Acentou a situação real da mulher que, dominando o
para ele, elas estavam incluídas entre os “cidadãos” bra- homem, dominava o mundo, para, enfim, encerrar: “Man-
sileiros. Mas assim não foi decidido, exigindo-se três tenha ela o lugar que já tem na família e na sociedade” e
discussões em cada Casa, consumindo tempo e esforço nada faltará para a sua felicidade que é também a nossa.
consideráveis e atrasando-se em 41 anos o reconheci- Igualmente, também os partidários do voto femini-
mento desse direito. Na verdade, os opositores do voto no, tais como o Senador Adolpho Gordo, reiteravam a
feminino nessa mesma Assembléia desconsideraram a devoção ilimitada da mulher ao marido e aos filhos, o
questão jurídica, alegando que o reconhecimento desta que só reforçava a certeza de que o voto não se consti-
reivindicação representaria “a dissolução da família bra- tuiria em obstáculo para a continuidade de sua missão.
sileira”. E é em nome da defesa dessa instituição e dos Assim, não pairava qualquer dúvida sobre a sua capaci-
valores a ela ligados que se desenvolve o debate. dade de conciliar o cumprimento de seus deveres políti-
Serzedelo Correia, mesmo constatando “sua capacida- cos com os do lar (Alves, 1980, p. 143-149).
de intelectual e aptidão para exercer o direito de voto”, Susan K. Besse, que tantas restrições faz ao movi-
considera que as mulheres não deveriam exercê-lo já que mento, em determinado momento de sua narrativa, re-
sua missão residiria “em ser o anjo tutelar da família”. conhece que as táticas desenvolvidas pela FBPF foram
Este tipo de argumentação, repetida anos a fio, se- cuidadosamente adaptadas ao contexto em que a orga-
gundo a própria Moreira Alves, obrigava as sufragistas nização operava. E, mais uma vez, lembro E. P.
a reiterarem, a todo momento, a intenção de garantir o Thompson, com uma citação exemplar: “a história é a
desempenho adequado, pelas mulheres, dos papéis fa- disciplina do contexto e do processo: todo significado é
miliares. Como juridicamente não se sustentava a argu- um significado-no-contexto”. Portanto, se assumirmos
mentação contrária ao voto feminino, na década de 1920, esta premissa como base do fazer histórico, considera-
alguns políticos alegavam, para fortalecer sua posição, mos que aquelas mulheres, conscientes do tempo e do
que, diante do Código Civil, a mulher casada era depen- espaço em que estavam inseridas, seguiram a trilha mais
dente do marido, não tendo a indispensável liberdade adequada para atingir seus alvos. E, continua Besse,
para o exercício do voto. As sufragistas recorriam a im- nunca a entidade atacou explicitamente a família e a do-
portantes juristas que reafirmavam, por sua vez, a cris- mesticidade como fonte de opressão feminina (embora
talina constitucionalidade do voto. O que não impediu alguns de seus membros assim pensassem, individual-
que, em 1921, embora reconhecendo a constitucionali- mente); pelo contrário, a organização buscava encora-
dade, o Deputado Heitor de Souza se afirmasse contrá- jar as mulheres a observar sua competência no manejo
rio ao voto feminino em nome de uma lei natural que da economia doméstica como valor a ser utilizado na
destina o homem à vida pública, cabendo à mulher “a atividade profissional, assim como na participação polí-
guarda e o zelo do lar doméstico e a tarefa capital da tica. O discurso de Bertha Lutz ao entrar para a Câmara
primeira educação da infância...”. de Deputados é dado como exemplar: “O lar é a base da
Em 1927 travou-se intenso debate na Comissão de sociedade, e a mulher estará sempre integrada ao lar.
Justiça do Senado, com a última discussão do projeto Mas o lar não limita-se ao espaço de quatro paredes. O
Justo Chermont, emitindo o Senador Aristides Rocha lar é também a escola, a fábrica, o escritório. O lar é
parecer favorável em discurso assessorado pela FBPF, principalmente o parlamento, onde as leis que regulam a
que também acompanhou a discussão. O Senador família e a sociedade humana são elaboradas”. Admite
Thomás Rodrigues, obstinado opositor do voto femini- Besse que tais declarações implicitamente rejeitavam os
no, deu voto em separado, adiando o final do debate. papéis de esposa e mãe como uma fonte adequada de
Após inúmeras alegações, recorreu ao sentimentalismo, auto-realização, status social e segurança econômica,
lembrando sua filha “jovem, casta e pura, cujo carinho, sem diretamente atacar a família ou as mulheres que
cuja meiguice são as suas únicas alegrias...”, para con- estavam felizes com sua identidade doméstica. Além
trapor-se àqueles que o viam como inimigo da mulher. disso, numa tentativa consciente de prevenir ataques

Revista Brasileira de Educação 107


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hostis, os membros da FBPF enfatizavam freqüentemente para com ela, evidenciado no voto consciente nas elei-
sua feminilidade. Utilizavam estereótipos acerca das di- ções. Afirma que a experiência demonstra que, nos paí-
ferenças “naturais” entre os dois sexos como justifica- ses em que as mulheres conquistaram direitos políticos,
ções das mais efetivas para a entrada das mulheres nas elas manifestam grande maturidade, evidenciada no fato
novas áreas de participação social e política. Finalmen- de que o eleitorado feminino e as representantes desse
te, diante da importância desempenhada pela religião na sexo no Parlamento “se mantêm alheias às paixões par-
vida da maioria das mulheres, a FBPF também tinha tidárias e às lutas estéreis, dedicando-se às medidas le-
grande cuidado em evitar confronto com a Igreja católi- gislativas eficientes e o aperfeiçoamento dos processos
ca (Besse, 1996, p. 176). de administração”. Finalmente, argumenta que o exer-
A entrevista de Bertha Lutz, a 17 de dezembro de cício do sufrágio deve ser considerado mais um dever
1924, ao jornal A Vanguarda, na qual faz uma exposi- para com a Nação do que um direito, devendo tanto as
ção de motivos acerca da importância do voto feminino, mulheres como os homens cumprir livremente essa obri-
é expressiva deste quadro. Destaca a falta de coerência gação.
num regime que se considere democrático, “único regi- Arguta peça política. A autora articula um discurso
me de governo aceito pelas nações civilizadas”, excluir no qual mais uma vez busca demonstrar, num meio hos-
as mulheres de participação. Assim, torna-se injusto, de til, o caráter moderado do feminismo local. Apesar dis-
acordo com tal regime, que não lhes assista o direito de so, a competência das mulheres, adquirida no exercício
participar na organização das leis e na fixação de im- de suas funções tradicionais, é ressaltada para enfatizar
postos, elegendo seus representantes, ou fazendo parte sua maior habilidade na esfera pública no trato de deter-
do Poder Legislativo. Inclusive porque as mulheres são minadas questões próprias de sua experiência cotidia-
obrigadas à observância das leis e ao pagamento de im- na, pois, embora a mulher seja equivalente ao homem,
postos, do mesmo modo que os homens. Além disso, em possui contudo uma orientação diferente. Disso depre-
todos os terrenos e em todos os países, quando lhes é ende-se que não estaria disputando aos homens os mes-
dada a oportunidade de demonstrá-lo, as mulheres evi- mos espaços de atuação, além de enfatizar o caráter pa-
denciam capacidade idêntica à do homem, sendo ilógico cífico e maduro da participação feminina despojada de
mantê-las em posição subalterna. Abre nesta questão paixões partidárias, o que estaria de acordo com sua na-
um parêntese, assegurando que, embora a mulher seja tureza. Nesse sentido, não há que impedir sua participa-
equivalente ao homem, possui contudo uma orientação ção que iria enriquecer o panorama político-partidário,
diferente. Volta-se, no domínio das questões públicas, não se justificando mantê-la numa posição subalterna.
principalmente, com muito maior interesse que os ho- Vale-se da tática, ação calculada, segundo Michel
mens, para as problemáticas sociais: a assistência à in- de Certeau, daquele que “não tem por lugar senão o do
fância, o combate do alcoolismo, a pacificação do mun- outro e por isso deve jogar com o terreno que lhe é im-
do e as boas relações internacionais. Sendo tais questões posto tal como o organiza a lei de uma força estranha”
“importantíssimas na fase atual da civilização”, é de toda (Certeau, 1994, p.100). Ou seja, nas condições em que
conveniência a contribuição das mulheres na sua solu- se desenvolvia a luta feminista no país, como tem sido
ção. Por outro lado, muitas questões estudadas pelo po- apresentado ao longo deste trabalho, não havia, naquele
der legislativo, câmaras municipais etc., relacionam-se momento, espaço para uma outra opção. Havia que exal-
diretamente com o lar, devendo ser levado em conta o tar a maternidade, valor uníssono na sociedade brasilei-
ponto de vista da dona-de-casa, aproveitando-se sua ex- ra, especialmente para aqueles que ocupavam posições
periência de mãe de família, dotada de “conhecimentos de poder e que tinham acesso aos meios de comunicação
preciosos, desconhecidos por outros elementos represen- na época. Aliás, a própria Branca Moreira Alves, ape-
tados”. Ainda, apelando para o papel de educadoras dos sar de criticar a todo tempo a trilha escolhida pelo refe-
filhos, acentua que as mães conscientes dos destinos da rido movimento, admite, numa aparente contradição, que
Pátria podem inculcar em seus filhos a noção de dever este feminismo, assim domesticado, era o único possí-

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A pedagogia da conquista do espaço público pelas mulheres

vel para garantir o reconhecimento das suas reivindica- querer se emancipar... coitadas! as bonitas não”, porque
ções quanto às reformas básicas. Era o único “que po- a elas nunca faltará um adorador. E, sem mais delongas:
deria ser aceito pelo sistema político que procurava in- “Que nos importa as feias! Salvem-se as belas, que a
fluenciar e que era veículo para a realização de seus humanidade se aperfeiçoará”.
objetivos” (Alves, 1980, p.138). Aliás, é recorrente a preocupação em acentuar o
Mas não apenas entre os parlamentares manifesta- caráter imprescindível da beleza para as mulheres. A
vam-se acirradas manifestações de oposição à partici- ausência desse atributo representa um pesado ônus, já
pação feminina. Na imprensa a situação não se afigura- que, infalivelmente, serão rejeitadas pelos homens, im-
va mais favorável ao feminismo. Ao longo do tempo, possibilitando a realização daquela que é considerada a
este vinha sendo objeto de grosseiras caricaturas em crô- única aspiração legítima para as mulheres – o casamen-
nicas e charges, nas quais se buscava passar a mensa- to. O feminismo não deixará de ser utilizado como amea-
gem do terror e do grotesco que representaria a partici- ça à concretização de tal anseio. Um outro cronista, após
pação de mulheres em esferas consideradas próprias dos discorrer sobre uma prática existente na antigüidade,
homens. Uma das conseqüências seria a desordem fa- destinada a possibilitar o casamento de moças bonitas
miliar, mulheres passariam todo o dia no escritório ou mas também das feias, através de leilões, assim termina
em assembléias, vendo-se os maridos envolvidos nos cui- seu arrazoado: “Talvez fosse esse o único, excelente,
dados com os filhos, atividade para a qual não apresen- maravilhoso meio de acabar duma vez com as sufragistas,
tariam quaisquer habilidades, daí decorrendo a péssima as literatas, as neurastênicas, as cochichadeiras e as be-
qualidade da alimentação, não cumprimento de horários, atas, horríveis espécies femininas nascidas da classe
o caos doméstico... imensa, descontente, vingativa e audaz das ‘vieilles-
Via de regra, tais crônicas enaltecem a dimensão filles’...” (Fon-Fon, 1918).
sacralizada das mulheres, representada pela maternida- Depreende-se desta colocação que as mulheres que
de, acentuam a sensibilidade, específica da mulher, atra- se decidem à luta pelo reconhecimento de direitos e bus-
vés da qual “dominando o homem, guia as crianças e cam disseminar suas idéias fazem-no apenas por frus-
governa o mundo”. Ressalta-se, afinal, o caráter especí- tração. Ou seja, não sendo privilegiadas com a beleza,
fico das qualidades femininas, que não passam pela ati- vendo-se relegadas à triste situação de vieille-fille, vis-
vidade intelectual ou política. ta na época como extremamente humilhante para as
mulheres, buscam vingança através do questionamento
Não concebo a mulher fora do seu ciclo, apostrofando
de sua condição. Em nenhum momento preocupam-se
os deuses ou discutindo a origem das espécies. Ela foi feita
os “donos destas verdades” em lembrar que o casamen-
para domar o homem. Que será da humanidade o dia em que
to e a maternidade, vistos como obrigatórios para as
ela, rasgando o peignoir de rendas, envergar o grosso capotão
mulheres, constituem-se numa construção predominan-
masculino e sair para a rua, não mais com a leve sombrinha de
temente masculina. Através da religião, da filosofia, das
seda, mas com o humilhante cacete do capanga eleitoral? De-
ciências, os formuladores desses saberes buscaram de-
saparecerá o encanto dos salões, a alma da paisagem, o amor
monstrar a vocação “natural” e única das mulheres para
do lar... (Careta, 1919)
tal forma de existência. E seus herdeiros passam a
Repetem-se velhos estereótipos acerca da impor- apresentá-las como “caçadoras de homens” incautos,
tância de serem respeitados os diferentes atributos dos ridicularizando-as a todo momento quer por essa atitu-
homens e mulheres, concepção presente na religião, atua- de, quer por seu fracasso, mantendo-se “solteironas”.
lizada e sofisticada pelos filósofos iluministas e utiliza- E, com o passar do tempo, o tom das crônicas não
da pela ciência. O tom da crônica caracteriza-se pela se abrandava. Em uma delas, já em 1930, na Folha da
sisudez, em que pese sua excessiva melosidade, até che- Noite, o autor, que não se identifica, procura explorar a
gar ao seu final, quando lança mão de um artifício por suposta masculinização das mulheres que reivindicavam
demais vulgar, aquele de que “só as muito feias hão de direitos, um dos estereótipos que lhes era mais atribuí-

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do. Informa que essas esquisitas “senhoras que estão deboche:...a não ser que o Senhor enviasse à terra “um
levantando pelo mundo todo o clamor pela conquista dos miserável Adão com disposição para servir como escra-
‘direitos da mulher’, não se deveriam chamar ‘feminis- vo a tantas rainhas...”.
tas’. Dever-se-iam chamar ‘masculinistas’”. Isto por- Este pensamento, apresentado de forma picaresca,
que, essas ousadas pioneiras vestem-se como homens. manifestara-se com toda força entre os médicos da vira-
Segundo ele, masculinizam-se no traje que passa a des- da do século e parecia manter crédito nos anos de 1930.
crever: A inteligência, o interesse profissional, o desejo de par-
ticipação na esfera pública, longe estavam de ser um
As sufragistas inglesas, vistas de repente, ou de longe,
traço peculiar às mulheres. As mulheres dotadas de for-
são figuras ambíguas. A gente custa a saber se a heteróclita
te inteligência, característica masculina, eram incapa-
criatura de chapelinho de palha, punhos e colarinho duros,
zes da abnegação, da paciência, do altruísmo que carac-
gravatinha borboleta, jaqueta igual aos paletós do sexo barbado,
terizam a maternidade, função primordial da mulher e
sapatos rasos etc. deve ser chamada “miss”, “misteres” ou
garantia da sobrevivência da espécie humana, que tais
“mister”.
articulistas buscam reafirmar como ameaçada...
Em seguida, detém-se no aspecto físico: Nesse particular, outro cronista, sob o pseudônimo
de “Marmanjo”, deplora os desmandos das feministas
...os modos incisivos, os gestos secos, a voz roufenha, acres-
que exigem direitos, sendo poucas as que, “invadindo o
cente-se a circunstância dos cabelos cortados e a moda dos
raio de ação do sexo ‘besta’, queiram acarretar com
homens rasparem barba e bigode, e reconhecemos natural o
iguais obrigações”. E, valendo-se de uma série de situa-
equívoco, naturalíssimo a confusão.
ções-limites, faz uma caricatura das inúmeras vantagens
Todo esse intróito se justificava para atacar aquele antigas e novas que elas querem manter; entre outras:
que era o objetivo visto por muitos como o mais perigo- prioridade em assentos nos locais públicos, total sub-
so subversor da ordem social. “Masculinizadas no tipo, missão do marido, invertendo a ordem vista como natu-
querem masculinizar-se nos direitos”. Propugnam a ral. Ao mesmo tempo, em meio aos seus inúmeros com-
igualdade política e jurídica dos dois sexos, e está claro promissos, fúteis todos eles, acentua o problema da
que propugnariam também a equiparação proliferante. própria sobrevivência da sociedade, seriamente
Os mesmos encargos, os mesmos deveres, para marido ameaçada, já que “não tem tempo de dar um filho – um
e mulher. E, aí vinha um outro perigo há muito temido só – à pátria” (O Jaguaribe, 1930).
nestas mudanças: “de muito marido sabemos que já ser- À primeira vista, esta maneira burlesca de apre-
ve de ama-seca aos filhos, enquanto a esposa trabalha sentar as mulheres empenhadas na luta por direitos não
nas repartições públicas ou alhures”. guardaria maiores conseqüências, visando apenas di-
vertir o público leitor. Na verdade, porém, percebe-se
Insensível para as coisas do coração, inacessível às ruí-
um aspecto perverso nessas insinuações, o que me faz
nas e superior às pequeninas vaidades próprias do seu sexo –
enquadrar tais colocações numa das modalidades de
a mulher moderna sem que o perceba se masculiniza para as-
violência simbólica. Isto porque a reiteração da
sombro nosso, que espreitamos estupefatos a brusca transfor-
comicidade na abordagem das reivindicações das fe-
mação verificada nos últimos anos. O tipo incrível da Virago –
ministas tende a difundir uma imagem em voga: a do
aí temo-lo agora, multiplicado e espalhado por todos os cantos
despropósito das preocupações femininas, ao contrá-
da terra... [....] Mulheres nos governos, nas repartições públi-
rio das masculinas. Por outro lado, muitos, inclusive
cas, nos exércitos, nas fábricas – em tudo, enfim, onde havia
mulheres, tendem a incorporar esse discurso, divulga-
homens antigamente...
do nos diversos meios de comunicação, identificando
A recorrência de tal discurso torna-se uma cons- as feministas, quer como “viragos”, feias, frustradas,
tante, inclusive buscando apontar para uma iminente quer como fúteis, esbanjadoras, amorais, desprovidas
catástrofe, o fim da humanidade, com um inevitável do sentimento de mãe e descumpridoras das obriga-

110 Set/Out/Nov/Dez 2000 Nº 15


A pedagogia da conquista do espaço público pelas mulheres

ções de esposa. Imagens que se contrapõem ao ideal preconceitos sem vantagem senão para a vaidade femi-
feminino, constantemente reatualizado, de beleza, mei- nina” (Carmen Dolores, O Paiz, 1910).
guice, delicadeza, paciência. resignação, o que não Mas, também, no período focalizado, mulheres de
poucas vezes leva as mulheres a rejeitar sua inserção expressão mantêm-se contrárias à plena participação fe-
no feminismo e até a combatê-lo.7 minina na vida pública. Um exemplo é o da escritora
Esta seria uma das explicações para a reticência e, Francisca de Bastos Cordeiro, que emite sua opinião,
mesmo, rejeição de mulheres de prestígio em assumi- em 1927, ao Correio da Manhã: “a mulher pode votar,
rem o feminismo. No primeiro caso, lembro Júlia Lopes mas não ser votada...”. Seu argumento é aquele de mui-
de Almeida que, posteriormente, já na década de 1920, tos dos parlamentares, aqui já apresentados, o de que a
integrará a FBPF. Ela foi jornalista e autora de livros de responsabilidade máxima da mulher consiste na “edu-
sucesso por mais de quarenta anos, desde fins do século cação dos homens do futuro: – os seus filhos!”. Esta,
XIX até a primeira metade dos anos 1930, momento em seria a mais nobre e melhor maneira pela qual “pode e
que muitas eram as dificuldades para as mulheres fir- deve contribuir para a grandeza da nação”. A política
marem-se no universo das letras. Numa de suas crôni- militante deveria ser praticada apenas por aquelas que
cas, censura aqueles que riem da aspiração feminina ao já alcançaram “certa idade, a que não constituiu lar, ou
direito de voto, explicitando sua confiança na conquista a viúva, sem preocupações de filhos a criar quando já
pelas mulheres do direito em votar nos homens para os passou a idade trágica dos 35 anos”.
supremos cargos da administração pública. E completa: Não via, porém, no voto feminino, nenhum resulta-
“A questão é de tempo mais nada”, apelando para uma do prático, quer para a mulher, quer para o feminismo,
das qualidades consideradas como femininas: “as mu- pois todas as vantagens a serem obtidas o serão em con-
lheres [...] saberão esperar, porque nas luctas da sua vida seqüência de natural e lenta evolução. Por outro lado,
intima aprenderam à sua custa a adquirir paciencia, que opunha-se a qualquer participação das mulheres nas lu-
é a magna virtude para se suportar essas crises”. tas ásperas dos parlamentos, por força da incompatibili-
Termina, porém, ela própria, abrindo mão desse di- dade com suas qualidades naturais. Ali “ela se sentirá
reito: “por ter empenhado o meu às letras, desistirei, se sempre deslocada ou acabará por perder toda a delica-
algum dia tal liberdade for às mulheres concedida no deza que é a sua melhor arma”. Já a diplomacia era um
Brasil ainda em minha vida de o oferecer à politica eter- campo que se adequava às suas qualidades, “onde en-
namente incognita aos meus olhos” (Lopes de Almeida, trarão em jogo todos os seus elementos de perspicácia,
O Paiz, 1908). de sutilezas”. Também, num Ministério de Beneficênci-
Carmem Dolores, outra literata do início do século, as, de proteção à criança e aos desvalidos estaria a mu-
vista por muitos como feminista, assume posição con- lher no seu elemento... Assim, buscava atribuir o exer-
trária a muitas das reivindicações daquele movimento, cício de atividades para as mulheres, de acordo com
especialmente quanto ao direito de voto, considerando características acreditadas como decorrentes de razões
inútil a incorporação feminina à política, “forma apenas naturais e não fruto do estilo de socialização. E, obser-
grotesca de um exibicionismo sem necessidade, que fere ve-se sua ênfase no papel da mulher na educação dos
homens do futuro, descartando as filhas mulheres...
7
Outra das mais conceituadas escritoras da época,
O historiador Roger Chartier identifica a “violência simbóli-
Albertina Bertha, autora do livro Exaltação, admite “que
ca” como aquela que supõe a adesão pelos dominados das categorias
ninguém melhor do que a mulher será capaz de
que embasam sua dominação. Nesse sentido, acentua que definir a
submisão imposta às mulheres como uma violência simbólica ajuda
desmaranhar a trama de um caso político”. E o explica
a compreender como a relação de dominação – que é uma relação através da crença nas qualidades inatas deste sexo: “sua
histórica, cultural e linguisticamente construída – é sempre afirmada intuição maravilhosa do concreto, do imediato; o seu
como uma diferença de ordem natural, radical, irredutível, universal. espírito de observação [...] a sua presteza em resolver
Ver Chartier, 1995, p. 41. repentinamente qualquer questão...”.

Revista Brasileira de Educação 111


Rachel Soihet

Considera, apesar disso, que o voto somente cria lizadas pelos dominados na defesa de seus interesses,
novas injustiças, desafia rivalidades, suscitando um mun- pois, a condição prévia essencial para a eficácia da lei,
do de irritações e mesquinharias. Diante disso, “a mu- em sua função ideológica, é a de que mostre indepen-
lher deve repudiar essa generosidade tão pouco genero- dência, diante de manipulações flagrantes e pareça ser
sa e tão pouco aquém de seus merecimentos”. E completa, justa.8
interrogando: “o que de mais surpreendente poderia advir Além da sua presença efetiva nos meios políticos
à mulher, senão a sua capacidade de aprisionar o ho- liderando um pequeno grupo, como tão bem colocam
mem ao ritmo de beleza e ao senso de deslumbramen- várias autoras citadas, sucediam-se entrevistas de Bertha
to?”. contra-argumentando as diversas colocações contrárias
Diante desse quadro, e retomando recomendações à participação política feminina. Tratava de criar uma
de historiadores(as) acerca da significação do exame do imagem positiva para as propostas tão ferrenhamente
contexto, reitero o anacronismo e contradições presen- combatidas. Aos que aludiam à falta de preparo de al-
tes em muitas das críticas formuladas contra certas li- guns elementos femininos para o exercício do voto, lem-
mitações do movimento liderado por Bertha Lutz e pela brava que existiam “muitos homens em semelhantes con-
FBPF. A começar por repetidas afirmações de que, ao dições”, sem esquecer das mulheres que “pelo trabalho
movimento, por sua natureza burguesa, bastavam con- e pelo estudo” tornaram-se aptas, dotadas de “tirocínio
quistas no plano jurídico-político, justificando o seu dis- e experiência suficientes de elevar as suas vozes a bem
tanciamento das mulheres da classe trabalhadora. Mas do país”. Quanto à idealização da mulher como o “anjo
os dados que se seguem, alguns deles presentes na pró- do lar”, do qual o voto a afastaria irremediavelmente,
pria obra de Branca Moreira Alves, são testemunhos de provocando inúmeros prejuízos, respondia num misto de
que não era bem este o pensamento da militância daque- ironia e lucidez, no artigo “É uma questão de tempo”:
la entidade.
Nenhum homem se lembraria de considerar as suas em-
Em 14/08/1934, a FBPF publica um manifesto
pregadas ou uma mulher do povo, operária e sobrecarregada
conclamando as mulheres a elegerem representantes que
de filhos, como um anjo do lar. O anjo é apenas a mulher cujos
defendam seus interesses. Ao referir-se às conquistas
meios lhe permitam dedicar-se unicamente ao homem e, quando
alcançadas diz: “Isto entretanto foi apenas o começo,
é mãe aos filhos, não dispensando contudo outras mulheres –
porque de muito mais necessita a mulher brasileira...”.
talvez menos divinas – para executar os trabalhos menos
Também, segundo a ativa militante Maria Luíza Dória
angélicos e diurnos do lar. (A noite, 11/10/1921)
Bittencourt: “O voto nunca foi para nós um fim e sim
um meio... A campanha começava quando tivéssemos o E completava esclarecendo que o afastamento da
voto” (Alves, 1980, p. 168). Aliás, a própria Bertha Lutz, mulher do lar não se deveria ao pouco tempo necessário
logo após a conquista do voto, afirmava: “o sufrágio ao exercício do voto. O que afasta a mulher do lar é a
feminino não é um fim em si mas um instrumento a ser necessidade, são as dificuldades materiais da vida, as
usado para melhorar o status das mulheres”. Acrescen-
tava que os ganhos recentes eram precários e a real ba-
8
Para E.P. Thompson a retórica e as regras de uma sociedade
talha ainda estava à frente: “as mulheres ainda não ti-
são muito mais que meras imposturas. [...] Podem disfarçar as verda-
nham entrado na Terra Prometida!” (Besse, 1996, p. 71).
deiras realidades do poder, mas ao mesmo tempo podem refrear esse
Por outro lado, questiona-se hoje o desapreço ma-
poder e conter seus excessos. E muitas vezes é a partir dessa mesma
nifestado para com as conquistas jurídicas. Não há como
retórica que se desenvolve uma crítica radical da prática da prática da
negar que estas acarretam princípios de igualdade e uni- sociedade... A existência dessas regras e a retórica impuseram histo-
versalidade que forçosamente têm que se estender a to- ricamente algumas restrições ao poder imperial. E lembra neste par-
dos os indivíduos. Além da impossibilidade de se con- ticular as atuações de Gandhi e Nehru, que delas se valeram na sua
ceber uma sociedade complexa sem leis, sua existência luta pela independência da Índia. Ver Thompson, 1987, p. 356-357.
garante que, numa sociedade de classes, elas sejam uti-

112 Set/Out/Nov/Dez 2000 Nº 15


A pedagogia da conquista do espaço público pelas mulheres

horas prolongadas nas oficinas, o trabalho mal remune- trabalhadoras e a sua necessidade de auto-suficiência
rado, a falta de conforto nos ateliês e nas fábricas, a econômica que garantisse sua emancipação, as militan-
ausência de tentativas de pôr os seus trabalhos de acor- tes da FBPF defendem o estabelecimento de creches. Por
do com a sua função de mãe. Não é o fato de a mulher sua vez, Bertha Lutz reconhece que a sociedade não te-
ser legisladora que causa as circunstâncias atuais, pelo ria condição de sobrevivência sem o nascimento e a so-
contrário, é a sua ausência. cialização das novas gerações. Assim, exige que não
Por esse discurso, verifica-se a consciência de recaia apenas sobre a mulher a responsabilidade dos fi-
Bertha dos problemas sociais, que não hesita em apon- lhos, requerendo também a garantia, pelo Estado ou pela
tar, buscando desmascarar os preconceitos e os pretex- Sociedade, dos seus filhos pequenos, “independentemen-
tos para impedir a participação das mulheres na políti- te dos caprichos do indivíduo que não pode ou não pro-
ca. Sua última frase, de certa forma, justifica a prioridade cura sustentá-los”.
que em dado momento deu à conquista do voto. Acredi- Durante toda a República Velha, inutilmente, a
tava que a prática legislativa por parte das mulheres se- FBPF solicitou por várias vezes à Câmara de Deputa-
ria um elemento-chave na mudança de condição desses dos um projeto sobre os dispositivos da Conferência
segmentos e mesmo do país. E, como ela, mesmo mu- Geral do Trabalho de Washington, realizada em 1919,
lheres engajadas mais à esquerda, como Elena Rocha, referentes ao trabalho da mulher na indústria. Tal rei-
consideravam que “primeiro se devia conquistar o voto, vindicação implicava a regulamentação de todo o traba-
devia-se ir por partes, e na época talvez fosse a única lho e o estabelecimento de Leis de Previdência e Assis-
coisa possível”. tência, o que só se concretizaria após 1930. Ainda com
base nos referidos acordos internacionais, a FBPF plei-
Batalhando por outras conquistas teou também para as operárias representação proporci-
onal feminina, entre os membros do Conselho Nacional
A participação de Bertha como membro da Comis- de Trabalho, instituído por Arthur Bernardes. Sua mo-
são de Elaboração do Anteprojeto da Constituição em, ção recebe apoio, assinando o documento cerca de 700
1932, e as medidas que postulou como parlamentar, com- mulheres trabalhadoras, representantes das 6.000 em-
provam seu interesse por outras questões que dificulta- pregadas no comércio, fábricas, ateliês etc. Embora a
vam às mulheres sua plena inserção na sociedade. Na idéia fosse recebida com aplausos, a falta de vagas foi
verdade batalhou em várias frentes, sendo injusto consi- uma das evasivas de que se lançou mão para rejeitar o
derar sua atuação apenas com relação ao voto. apelo (Soihet, 1974).
O trabalho feminino, inclusive aquele das mulhe- Como parlamentar, a partir de 1936, desdobrou-se
res pobres, constituiu uma preocupação forte na na criação da Comissão do Estatuto da Mulher, da qual
militância de Bertha Lutz que, também nesse âmbito, foi a presidente, visando a regulamentação dos artigos
sugeriu a criação de associações de classe para as di- constitucionais relativos aos assuntos femininos. Bertha
versas categorias profissionais. Bertha, no começo de Lutz, escolhida presidente da Comissão, ficou encarre-
sua atuação, segundo o Rio Jornal, aparece como uma gada de reunir documentação sobre o assunto, do que
das fundadoras da “Legião da Mulher Brasileira”, que resultou a publicação de O Trabalho Feminino – A Mu-
deveria ser uma “Associação das Mulheres que por ne- lher na Ordem Econômica e Social. Também lhe foi
cessidade ou por princípio já trabalham, afrontando atribuído o encargo de elaborar o anteprojeto. Este, se-
indômitas a luta”. Sua participação efetiva, em 1922, guindo a orientação do II Congresso Nacional Femini-
fez-se sentir em favor das empregadas no comércio, in- no, instituiu o Departamento da Mulher, abrangendo os
tercedendo junto ao Conselho Municipal para a redução assuntos relativos ao Trabalho Feminino, ao Lar, à As-
do horário de trabalho dessa categoria, que era de treze sistência à Mulher, à Infância e Maternidade e à Previ-
a quatorze horas diárias, para oito horas. Ainda nesse dência Social em todo o território. O referido Departa-
mesmo ano, reconhecendo as dificuldades das mulheres mento teria funções técnico-orientadoras, consultivas e

Revista Brasileira de Educação 113


Rachel Soihet

executivas. Era previsto um seguro maternal para toda rejeitava a substituição do Departamento da Mulher pelo
mulher que trabalhasse, entre 18 e 45 anos. Departamento de Amparo à Mulher e da Criança, afir-
O debate travado com a outra parlamentar, Carlota mando que a “necessidade de amparo não é inerente à
Pereira de Queiroz, sobre algumas das questões propos- condição da mulher”. Afirmava que a finalidade do mo-
tas por Bertha Lutz, afigura-se dos mais relevantes, po- vimento feminista não era a de tornar a mulher
dendo aferir-se a maior lucidez desta última com rela- beneficiária passiva do Estado, mas colaboradora ativa
ção às problemáticas vividas pelas mulheres, mormente do progresso do país. Contestava a localização da defe-
aquelas dos segmentos populares. sa da mulher no Ministério da Educação e Saúde, argu-
A deputada Carlota Pereira de Queiroz, divergindo mentando que os dispositivos constitucionais que esta-
do espírito da criação do Departamento da Mulher, con- beleciam garantias para o lar, trabalho feminino e a
forme o anteprojeto, apresentou voto em separado. Não maternidade, inclusive o artigo 141, que lhe concedia
via razões para que se isolassem as questões femininas verba, constavam do Título da Ordem Econômica e So-
num departamento, depois de conseguida a integração cial. Se o legislador constituinte considerasse a ativida-
feminina através da concessão do voto e de sua admis- de feminina e os problemas correlatos como simples
são ao exercício de todos os cargos públicos. Criar-se- expressão de necessidades educativas e sanitárias teria
ia uma situação de exceção, isolando-se administrativa- incluído a matéria no título concernente à Família, à Edu-
mente os interesses femininos e obrigando os homens de cação e à Cultura (Soihet, 1974, p. 43).
Estado a deles se afastarem. Discordava a deputada Apesar desse empenho em garantir conquistas para
Carlota Pereira de Queiroz da autonomia imprimida ao os trabalhadores, particularmente, às mulheres, estas não
Departamento Nacional da Mulher, atribuindo-lhe fun- se somaram às campanhas da FBPF, em termos de parti-
ções de verdadeiro Ministério. Considerava indispensá- cipação na luta pelo voto ou comparecendo aos congres-
vel sua subordinação a um dos Ministérios existentes, sos e convenções. Nas entrevistas realizadas por Bran-
sugerindo sua dependência ao Ministério da Educação e ca Moreira Alves com militantes simpáticas a uma
Saúde. Não considerava, ainda, que a regulamentação transformação social mais ampla, estas referiram-se às
do trabalho feminino fosse o problema de maior interes- distâncias sociais entre Bertha Lutz e demais compa-
se para a mulher brasileira, dando prioridade às ques- nheiras, em sua maioria profissionais liberais ou mem-
tões sanitárias. Nesse sentido, propunha a criação, no bros da burguesia, e as trabalhadoras, dificultando psi-
Ministério da Educação e Saúde, do Departamento de cologicamente um maior contato. Além desse fator,
Amparo à Mulher e à Criança, primeiro passo para a destaca-se uma falta de maior interesse destas últimas,
futura criação de um Departamento de Assistência So- preocupadas com a sobrevivência e sofrendo a carga da
cial. dupla jornada, com a questão do voto. Através das en-
A deputada paulista revelava-se distante da reali- trevistas, verifica-se que nem todos os membros da FBPF
dade brasileira ao considerar o trabalho um problema eram conservadores, havia mulheres de esquerda, afir-
secundário para a nossa população feminina. O cunho ma a líder Maria Luíza Bittencourt, ela própria uma de-
assistencial que pretendeu imprimir ao Departamento las. Não queriam, porém, contrariar Bertha Lutz, que
instituído por Bertha Lutz demonstrava uma mentalida- temia que uma orientação aberta nesse sentido pudesse
de conservadora e tradicional. Preferia “amparar” a prejudicar o movimento que já não era dos mais bem
mulher carente de recursos a proporcionar-lhe os meios vistos. (Alves, 1980, p. 174).
de alcançar a independência através do trabalho. A segunda parte do trabalho da Comissão compre-
Bertha apresentava uma visão mais realista dos fa- endeu a elaboração do Estatuto da Mulher, que consis-
tos, ao replicar que de pouco adiantaria a assistência tiu na codificação dos direitos femininos, decorrentes
médica gratuita em ambulatórios a pacientes desprovi- do princípio de igualdade incorporado à Constituição. A
dos de meios de se locomoverem da casa ao hospital e matéria foi dividida em diversos títulos correspondentes
de adquirirem o medicamento receitado. Por outro lado, aos estatutos político, econômico-social, cultural, civil,

114 Set/Out/Nov/Dez 2000 Nº 15


A pedagogia da conquista do espaço público pelas mulheres

comercial e penal da mulher. Através do estatuto econô- Uma avaliação


mico regulamentava-se o trabalho feminino, estando nele
expressos seus princípios básicos na época. De forma similar aos diversos movimentos inter-
As questões ligadas à educação mereceram, igual- nacionais do gênero, o feminismo aqui focalizado pade-
mente, a atenção de Bertha Lutz, que se mobilizou para ceu de inúmeras limitações no que tange ao alcance de
garantir a entrada de elementos do sexo feminino no seu objetivo: a liberação feminina. Escaparam aos ideais
ensino secundário oficial, reivindicação vitoriosa em feministas do momento vários dos fatores que impedi-
1922. Pleiteou para a mulher “direitos à instrução idên- riam, plenamente, tal liberação, alguns visíveis apenas
ticos ao homem, a fim de que esta dispusesse dos mes- a partir da década de 1970. Continuava-se a aceitar o
mos meios para o exercício do trabalho e a mesma re- exercício de certas atividades como mais adequadas à
muneração”. Por outro lado, enquanto membro da mulher, por extensão de suas funções maternais. Fato
Câmara Federal, revela a manutenção das concepções que continuava a reproduzir a concepção acerca da in-
acerca da divisão sexual de trabalho. Demonstrava não clinação de cada gênero para as tarefas compatíveis com
ter conseguido libertar-se das representações e práticas sua natureza. Sem esquecer que aquelas consideradas
que impõem a divisão das atribuições entre os gêneros, mais adequadas ao gênero feminino eram as menos re-
apesar de pretender a emancipação feminina. Assim é muneradas. Mantinha-se, em grande medida, a força das
que, por iniciativa sua, é criada no Ministério da Educa- representações e práticas que impõem a divisão das atri-
ção e Saúde uma Divisão de Ensino Doméstico e Voca- buições entre os gêneros, comprometendo radicalmente
cional. E ainda foi mais longe no seu ideal de assegurar a total emancipação feminina.
a domesticidade feminina, ao sugerir a criação de uma Uma forte crítica de Moreira Alves a este movi-
Faculdade de Ciências Domésticas e Sociais destinada mento foi a de não ter polarizado suas críticas contra a
à formação de “especialistas nos problemas domésticos família patriarcal e as relações de poder dentro da famí-
e sociais e do treinamento de organizadoras futuras para lia, optando pelo caminho menos contundente da luta no
Serviço Federal de Ensino Doméstico e professoras de nível jurídico. Na verdade, matizo esta afirmação, pois
escolas secundárias”. Além disso, o Estatuto Cultural, considero que muito foi questionado. Destaco as pro-
presente no Estatuto da Mulher, previa “a educação e a postas de estímulo e reconhecimento da atividade pro-
orientação feminina, cultural, doméstica, profissional e fissional feminina e aquela relativa à instauração de com-
cívica procurando indicar o caminho do preparo da mu- pleta igualdade civil de homens e mulheres, mesmo
lher para o lar, o trabalho e a vida”. Já quanto aos direi- quando casadas, a qual não chegou, infelizmente, a se
tos civis, sua postura foi das mais avançadas. Afirmava concretizar.
a necessidade de a “mulher [...] ter dentro ou fora do A conquista dos novos direitos de participação na
casamento personalidade civil completa, igual à do ho- esfera pública não implicaram, porém, uma reformula-
mem”. Através do Estatuto da Mulher, portanto, reco- ção no âmbito das obrigações familiares entre os dois
nhecia-se às mulheres a plenitude dos direitos civis, afir- gêneros. Todavia, exigir daquelas militantes, naquele mo-
mando-se a instauração de completa igualdade civil de mento, o questionamento da atribuição às mulheres da
homens e mulheres, o que se contrapunha ao Código Civil responsabilidade total pelas atividades domésticas e pela
vigente, estabelecido em 1916, que impunha a subordi- socialização dos filhos seria algo anacrônico de minha
nação da mulher casada ao marido. O pátrio poder seria parte. É claro, porém, que considerar o espaço domésti-
exercido por ambos os cônjuges, e a mãe, como o pai, co como inerente à mulher, mantendo sua posição desi-
transmitiria o nome aos filhos, proposição que até hoje gual na sociedade, constituiu-se em fonte de um proces-
não se estabeleceu. A dissolução do Congresso em 1937, so de violência contra a sua pessoa. Resultaram daí
antes da aprovação do projeto, impediu que o Estatuto mulheres divididas, culpadas, quando obrigadas a tra-
entrasse em vigor, embora algumas, de suas sugestões balhar fora do lar; considerando sua atividade profissio-
fossem adotadas posteriormente. nal como algo secundário em relação à atividade princi-

Revista Brasileira de Educação 115


Rachel Soihet

pal de esposa e mãe, dando lugar à discriminação sala- que possibilitassem sua realização como membro ativo
rial, profissional e sindical. da sociedade. Bertha não se restringiu às reivindicações
Fourier, dado como “socialista utópico”, preconi- feministas, interessando-se vivamente pelos diversos as-
zou, ainda no século XIX, a liberação feminina através pectos da vida pública. Partilhava das idéias reformis-
da instauração de estabelecimentos coletivos acessíveis – tas postuladas pela vanguarda da época, conforme se
restaurantes, creches, lavanderias –, que possibilitassem depreende das sugestões constitucionais que elaborou e
às mulheres partilhar as tarefas que se cristalizaram como mesmo de sua atuação pública. Representou a nova cor-
suas, além da educação comum aos dois gêneros e a li- rente de idéias que contribuiria para modificar o país, a
berdade sexual para ambos. Não se observa, porém, das partir de 1930, e, nesse sentido, acreditava na interação
feministas em pauta, sequer menção à sexualidade fe- entre a ascensão feminina e o progresso do país. É in-
minina, alegando algumas que este era um assunto de contestável a validade de sua obra. A partir de 1920,
foro íntimo. assistimos ao avanço das mulheres em áreas como o tra-
No que tange ao último aspecto, reconheço a difi- balho extradoméstico, a educação e a participação na
culdade, naquele momento, de mulheres dos segmentos vida social em geral.
médios elevados assumirem uma postura dessa nature- Enfim, não há como concordar com a afirmação de
za, quanto a um assunto considerado como tabu. Havia que a luta pelos direitos políticos tenha se constituído
a questão política, pois consideravam as outras deman- numa luta inglória, limitada às reivindicações formais
das como prioritárias. E diante das preocupações com a do liberalismo burguês, reduzindo-se esta conquista a
aceitação do movimento pela opinião pública, não ou- uma concessão, quando assim interessou à classe domi-
saram sequer mencionar tal questão. Maria Lacerda de nante, em seu confronto com as massas urbanas que
Moura, que logo se desligou do movimento, é uma ex- ameaçavam o equilíbrio do jogo político liberal. Uma
ceção nesse quadro. Miriam Moreira Leite trouxe à tona, posição desta natureza desdenha as lutas empreendidas
em rica biografia, suas reflexões sobre os diversos as- por várias gerações de mulheres já preocupadas com a
pectos da condição feminina. Assinalou suas posições questão. E, particularmente, quanto a Bertha, importa
avançadas, em muitos aspectos similares àquelas das ressaltar sua ação num momento decisivo, marcando uma
feministas da década de 1970. Mostra-a como uma se- ruptura, em meio aos preconceitos nos mais diversos
vera crítica da dupla moralidade vigente, da hipocrisia âmbitos, a começar pelo Congresso, nas páginas da im-
reinante na organização da família, com seu complemen- prensa, nos teatros etc. Afinal, penetrar na esfera públi-
to: a prostituição. Preocupava-se com questões interdi- ca era um velho anseio por longo tempo vedado às mu-
tadas na época, como a sexualidade e o corpo. Tal diver- lheres. Significava uma conquista, possibilitando-lhes,
sidade de posições revela a flexibilidade da “jaula”, segundo Hannah Arendt, assumir sua plena condição
representada pela cultura, possibilitando aos agentes humana através da ação política, da qual, por longo tem-
sociais o exercício de uma relativa liberdade, conforme po, permaneceram violentamente excluídas. Passavam
a articulação que estabeleçam dos elementos historica- as mulheres a garantir sua transcendência, pois o espa-
mente à sua disposição. O que é sumamente confortador! ço público, afirma aquela filósofa, não pode ser cons-
As idéias de Maria Lacerda de Moura, consideradas truído apenas para uma geração e planejado somente para
muito radicais, aliadas ao seu aguçado espírito crítico e, os que estão vivos: deve transcender a duração da vida
principalmente, ao seu excessivo individualismo, con- dos homens mortais, à qual, acrescentamos, também à
tribuíram, segundo Moreira Leite, para sua posição algo das mulheres mortais.
marginal (Leite, 1984).
De qualquer forma, apesar de tais limitações, co- RACHEL SOIHET é professora do Programa de Pós-Gradua-
muns aos demais movimentos feministas do gênero na ção em História da UFF e pesquisadora do CNPq. Autora de artigos
época, a atuação de Bertha Lutz e da FBPF girou em e livros: Condição feminina e formas de violência – mulheres po-
torno de propiciar às mulheres brasileiras os elementos bres e ordem urbana (1890-1920) (Forense Universitária, 1987); A

116 Set/Out/Nov/Dez 2000 Nº 15


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