Académique Documents
Professionnel Documents
Culture Documents
Giovani Clark1
1. Introdução
E
ntre os vários louros colhi- Até então, os discentes dos
dos pela Faculdade de Direito cursos de Direito da nação estudavam
da Universidade Federal de Economia Política e não possuíam uma
Minas Gerais em seus 120 anos de visão jurídica dos assuntos econômicos.
ensino, pesquisa e extensão no Brasil, Nem a referida disciplina, nem os ramos
não podemos deixar de exaltar o seu tradicionais do Direito, versavam sobre
pioneirismo em introduzir no país a a juridicização das políticas econômi-
disciplina Direito Econômico, nos seus cas que resultavam, por exemplo, em
cursos de Graduação e Pós-Graduação controle de preços, criação de empresas
(Doutorado), ainda no fi nal dos anos estatais, legislação planejadora e incen-
sessenta do século passado. tivos ao capital estrangeiro.
Ademais, tais ações estatais
1 Doutor em Direito Econômico pela acima descritas eram típicas de uma
Universidade Federal de Minas Gerais.
Professor de Direito Econômico na Faculdade realidade enfrentada por um mundo
de Direito da Universidade Federal de Minas
que tinha passado por duas guerras
Gerais e do Programa de Pós-Graduação em
Direito da PUC-Minas. mundiais (1914-1918 e 1939-1945), e
Revista Brasileira de Estudos Políticos | Série “Estudos Sociais e Políticos” 143
Edição Comemorativa dos 120 anos da Faculdade de Direito da UFMG (1892 - 2012) | n. 40 | p. 59 a p. 77 | 2012
O pioneirismo da Faculdade de Direito da UFMG: a introdução do Direito Econômico no Brasil
Após incansáveis debates sobre Direito no país, como nos dias de hoje.
Pelo contrario, elas eram em número
a importância da disciplina, conseguiu-
reduzido e se concentravam geralmente
se a primeira vitória, em 1969:2 o Direito
nas capitais dos Estados, realidade exis-
Econômico passou a ser lecionando na
tente até meados dos anos 90, quando o
UFMG. O Professor Washington Albino
serviço público de educação, incluindo
foi o primeiro professor da disciplina no
o superior, passou a ser encarado como
Brasil e o grande timoneiro das batalhas
“atividade econômica de consumo pas-
pela sua consolidação em nossa nação.
sível de obtenção de lucro” pelo setor
A disciplina foi introduzida
privado, inclusive pelo capital estrangei-
na Faculdade de Direito da UFMG no
ro.4 Portanto, a missão naquela época
curso de Graduação nos 2º e 9º perío-
era difundir o Direito Econômico nas
dos – Direito Econômico I e II, respecti-
principiais Escolas de Direito do Brasil
vamente –, bem como no Programa de e persuadir professores e comunidades
Pós-Graduação, com tempo de duração acadêmicas a introduzirem a disciplina.
de um ano. Logicamente, a produção Assim foi feito em São Paulo, Rio de
intelectual no intuito de consolidar a Janeiro, Ceará, Santa Catarina etc.
disciplina se fazia indispensável,3 e os Temos que lembrar ainda da
Cadernos de Direito Econômico fo- criação, em 1972, da Fundação Brasileira
ram um dos meios utilizados. As Teses de Direito Econômico5 – FBDE, com a
Em toda sua vida acadêmica pleno século XXI, que negam a autono-
e intelectual, o Professor Washington mia da disciplina, incluindo o seu objeto
Peluso Albino de Souza foi uma ban- como conteúdo dos ramos tradicionais
deira do Direito brasileiro e da América do Direito; ou então a chamam de di-
Latina, construindo diuturnamente os reito da economia, quer dizer, estudo
pilares teóricos do Direito Econômico, articulado da legislação sobre assuntos
tendo também laborado na elaboração/ econômicos. Tais estudiosos ainda não
interpretação de sua legislação e lançan- conseguiram ou não desejam identificar
do luzes na edificação da jurisprudência. o objeto do Direito Econômico, seja por
Ele faleceu em 2011 aos 94 anos, lúcido, falta de profundidade jurídica, seja por
defendo as teses do Direito Econômico conservadorismo ou receio em conceder
e denunciando os efeitos nefastos do destaque a outra disciplina.
neoliberalismo de regulação, tais como O dilema da autonomia do
a subordinação dos Estados nacionais Direito Econômico já foi sepultado
ao capital privado internacional, o aban- pela ciência do direito na atualidade.
dono do planejamento enquanto técnica Entretanto, persistem as correntes que
de ação estatal no domínio socioeconô- divergem quanto ao seu objeto. Aliás,
mico em nome das políticas setoriais e, confl ito inerente a qualquer ramo do
ainda, a implementação do crescimento Direito.
modernizante em detrimento do desen- Alguns doutrinadores pregam
volvimento. 8
que o Direito Econômico é ramo do
Direito Privado por normatizar o com-
4. A autonomia do Direito
portamento do poder econômico priva-
Econômico
do. De forma diversa, com muito mais
A partir do século XX, a au- adeptos, outros estudiosos advogam a
tonomia do Direito Econômico é evi- tese de que se trata de ramo do Direito
denciada mediante sua legislação, juris- Público por versar sobre a intervenção
prudência e doutrina.9 Todavia, ainda estatal na vida econômica e, automa-
existem doutrinadores do direito, em ticamente, na esfera social. Por outro
lado, existe uma terceira corrente que
8 BERCOVICI, 2005.
amplia o objeto da disciplina à legislação
9 CAMARGO, 1993.
150 Revista Brasileira de Estudos Políticos | Série “Estudos Sociais e Políticos”
Edição Comemorativa dos 120 anos da Faculdade de Direito da UFMG (1892 - 2012) | n. 40 | pp. 143 - 155 | 2012
Giovani Clark
Referências
AUGUSTO, Ana Maria Ferraz. Sistematização para consolidação das leis bra-
sileiras de direito econômico. Belo Horizonte: Fundação Brasileira de Direito
Econômico, 1975.
SOUZA, Washington Peluso Albino de; CLARK, Giovani (orgs.). Direito eco-
nômico e a ação estatal na pós-modernidade. São Paulo: LTr, 2011.