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Instituto de História da Universidade Federal do Rio de Janeiro

CFCH – Centro de Filosofia e Ciências Humanas


Disciplina: Senhorio e Feudalismo

AVALIAÇÃO:
“Atividade baseada no filme L’armata Brancaleone”

Rio de Janeiro
Dezembro, ano 2017
Este trabalho, desenvolvido como parte da avaliação da disciplina Senhorio e
Feudalismo, pretende analisar alguns aspectos presentes no filme L’Armata Brancaleone ,
relacionando-os com algumas das questões debatidas ao longo do curso. Destacarei como
eixos desta redação a constituição do senhorio e as relações de vassalagem , através de
personagens cavaleirescos, a relação entre centro e periferia na produção de marginalidades
na Idade Média e as prerrogativas senhoriais e a hegemonia da Igreja, retratada pelos
personagens centrais da obra de Monicelli.

Feudalismo em Brancaleone:
O filme L’Armata Brancaleone foi lançado em 1966, sob a direção de Mario
Monicelli. Sendo originário de Viareggio, na Itália, Monicelli é considerado o pai da
commedia all’italiana , embora rejeite o título: esse gênero cinematográfico é caracterizado
pelo uso da ironia e do sarcasmo, e se tornou característico da produção cinematográfica
italiana. Contudo, um elemento que distingue Monicelli dos demais diretores do cinema
italiano de sua época é seu apelo ao passado.
L’armata Brancaleone traz como seus protagonistas um grupo de marginais movidos
pela possibilidade de, através de um golpe, reverter seu status desprestigiado. O fio-condutor
que orienta a narrativa é o resultado de um roubo: após uma batalha que abre o filme, Arnolfo
Mano-di-Ferro (Alfo Caltabiano) é nocauteado e tem seus pertences pilhados por um grupo
de pobres que o tomam como morto e decidem vender o butim. Deste modo Mangoldo (Ugo
Fangareggi), Peccoro (Folco Lulli) e Taccone (Gianluigi Crescenzi) se unem a Abacuc (Carlo
Pisacane) e partem em busca de um cavaleiro pobre que possa tomar posse do feudo de
Aurocastro em seu lugar. Assim é introduzido Brancaleone da Nórcia (Vittorio Gassman), um
nobre sem terras que vê na proposta uma chance de reabilitar seu status.
Desde o início o filme explora uma quebra de expectativa que introduz o caráter
satírico da obra: a entrada de Arnolfo em cena, derrotando sozinho um grande número de
“bárbaros” que vinham saquear a cidade, ilustra ao espectador uma imagem do ideal de
cavaleiro - esse guerreiro de elite cuja posição, segundo Duby, começa a se delinear mais
claramente no século IX, no contexto de hipertrofia do Império Carolíngio e as incursões de
magiares, sarracenos e vikings (DUBY,1994: p. 174-175). Assim o nocaute de Arnolfo, que
pode ser tomado como um representante do centro (o sistema feudal), marca a transição do
filme para aquilo que é seu objeto principal: a margem da sociedade, centrada em estereótipos
de atores sociais subalternos da Idade Média.
Arnolfo Mano-di-ferro seria a representação da elite guerreira, vassalo de Otto I,
senhor da Saxônia (912-973, Rei a partir de 936 e Imperador a partir de 962 (TOCCO, 2010,
p.190). A menção a esse personagem situaria o século X como recorte temporal do filme, mas
vemos o desprendimento da obra em relação a marcos temporais logo em seguida, quando
Abacuc menciona a titulação de Imperador do “Sacro Império Romano” - expressão que
Catia Di Girolamo atribui a um período bem mais tardio, da segunda metade do século XII
(DI GIROLAMO, 2010, p. 211-212). Nesse contexto, a cessão do feudo de Aurocastro a
Arnolfo, demonstra um dos aspectos de vassalagem na constituição das relações de senhorio.
Segundo Alan Guerreau, a partir dos séculos X e XI, constitui-se a partir da ascensão
de uma aristocracia militar, o contrato feudo-vassálico que constitui uma forma de pseudo
parentesco , gerando um relação aristocrática entre senhores independente dos laços de
consanguinidade.
Já o personagem Brancaleone pode ser visto como um anti-herói. Sua pobreza e
caráter desastrado dissolvem a percepção romântica do cavalaria que predomina no
imaginário contemporâneo. O personagem é usado para ridicularizar questões como a honra e
o ethos guerreiro dos ditos bellatores , o que é bem expresso na pomposidade do protagonista
em anunciar seu exército e suas prerrogativas senhoriais, contrastante com as atitudes e
comentários de seus seguidores. A cena em que Teofilato (Gian Maria Volontè) duela com
Brancaleone (para reparar a “afronta” de não terem cedido passagem) é outra boa amostra
dessa pretensão do filme, já que remove toda a dimensão “épica” do combate e o torna um
embate risível. A postura dos membros da Armata em preparar o jantar enquanto aguardam o
fim da luta é um recurso de que o diretor se serve para ilustrar essa elite guerreira como um
ideal caduco, compondo assim uma crítica ao heroísmo tão valorizado pela produção
cinematográfica.
Dito isso, podemos prosseguir com apontamentos sobre aspectos de marginalidade e a
questão centro e periferia examinados na obra. O filme se inicia com a retratação de uma
cidade, que podemos tomar aqui como um espaço “marginal” em relação ao ambiente rural
que é predominante na sociedade medieval.
José D’Assunção Barros destaca quatro grandes correntes historiográficas do estudo
da relação entre as cidades e o dito sistema “feudal”, sendo elas: 1) aquela que toma a cidade
como sujeita a um senhorio, não se distinguindo assim do meio rural no que tange à
perspectiva sistêmica; 2) aquela que considera as cidades como a antítese do sistema
senhorial; 3) a que toma a cidade como um sistema paralelo e aliado ao sistema senhorial; 4)
e aquela que considera que cidade e senhorio fazem parte de um sistema integrado, não sendo
pertinente estabelecer uma separação rígida entre as duas (BARROS, 2003: p. 77-78).
Este trabalho, de certo, não pretende estabelecer uma fronteira absoluta entre esses
dois espaços, mas em virtude do recorte temático - a marginalidade - será pertinente fazer
apontamentos sobre as cidades medievais.
Embora não tivessem desaparecido, as cidades observaram uma retração em sua
dimensão e importância no período que seguiu a desestruturação do Império Romano no
Ocidente, e passaram por um novo crescimento que Le Goff situou entre os séculos X e XIII,
com seu ápice no século XII. Neste contexto o autor enxerga um aumento da produção
agrícola (que gera excedentes comercializáveis) e na disponibilidade de materiais para o
artesanato, o que deu novo impulso ao comércio. Este último pôde se organizar em torno das
feiras e mercados que assumiram uma centralidade crescente nos ambientes urbanos, e o
concomitante crescimento demográfico foi determinante para o povoamento urbano. E esta
cidade em crescimento também se torna cada vez mais um lugar de exclusão e
marginalização, constituindo o que Jean-Claude chamou de “um corpo marginal”
(SCHMITT, 1990: p. 268), que aglomera sujeitos desprovidos de laços formais de ligação
com a terra - o que os colocam em uma posição periférica em relação ao sistema dominial
mais amplo, por não se encaixarem plenamente no dominium (LE GOFF, 2002: p.222).
Em outras palavras, as cidades seriam focos da marginalidade na sociedade feudal;
"Por suas atividades, sua aparência, seus habitantes, seu direito, a cidade é, antes de tudo, na
sociedade feudal, um corpo marginal" (SCHMITT, 1990: p. 13). O desenvolvimento das
cidades traz consigo novas relações sociais, pela circularidade de pessoas que fogem à norma
do centro dominial e eclesiástico.
Um segundo aspecto de marginalidade que explora a questão da hegemonia da Igreja
se encontra no personagem de Abacuc, que encarna alguns dos maiores estereótipos a
respeito dos judeus na Idade Média - o judeu avarento e desenraizado que trabalha com
comércio e usura, e que carrega tudo o que possui em uma maleta que pode carregar consigo
(e que não deixa para trás mesmo sob risco de vida, como na cena em que, fugindo da peste
negra, o grupo apressa o judeu que brada “Não abandono a arca!” ). Os judeus são um tipo
marginal complexo que foi posto à margem por não se inserir na ecclesia (SCHMITT, 1990:
p. 271) mas que, em comparação com outros outsiders religiosos, dispuseram de um espaço
relativamente maior dentro das comunidades cristãs. Isto se deu sobretudo em razão do
judaísmo compartilhar uma raiz comum com o cristianismo, e pelo trabalho de autoridades
eclesiásticas como Agostinho de Hipona que, no século V, buscou elaborar uma concepção
de história da salvação que explicasse o papel dos judeus e o motivo de continuarem
existindo. Isto o levou a conceber a ideia de “povo-testemunha”, segundo a qual os judeus
deviam ser dispersos e submetidos, mas não destruídos - sua existência cumpria com a função
de comprovar a veracidade das escrituras cristãs (FELDMAN, 2009: p. 118-119).
Esta relativa “tolerância” tendeu a se dissolver a partir da Idade Média Central, na
medida em que a instituição eclesiástica avançou seu processo de centralização e passou a
possuir uma maior capacidade de fortalecer as fronteiras identitárias entre cristãos e
não-cristãos, um processo que teve como marcos importantes a primeira Cruzada (1096 e.c.),
o IV Concílio de Latrão (1215 e.c.), dentre outros. Este último foi determinante para o avanço
de uma política de marginalização, que no caso dos judeus se traduziu na imposição do uso
de roupas distintivas e a proibição de “usuras excessivas” (o que demonstra a associação dos
judeus com ofícios considerados infames, como o de usurários), além de outras
determinações que visavam reforçar o caráter marginal judaico (DAHAN, 1983: p.358-359).
Um segundo personagem que se insere na categoria de “desprezados” é Teofilatto de
Leonzi, filho bastardo de um nobre Bizantino, que por seu caráter de estrangeiro também se
encaixa no grupo dos “excluídos”, sendo sua marginalidade definida sobretudo com base em
questões identitárias. A cena em que o grupo de protagonistas vai às terras da família, exibem
um cenário de extravagância, com pássaros exóticos e uma corte de bizantinos trajados de
maneira excêntrica.
Um terceiro personagem marginal pode ser visto em Zenone, cuja posição em relação
à marginalidade é ambígua. Poderia ser considerado marginal por fazer parte de uma
categoria de religiosos "não engajados" no corpo institucional da Igreja. Zenone é a única
autoridade religiosa de relevância no filme, já que as monjas e o religioso que entrega a hóstia
na chegada dos protagonistas à fortaleza de Guccione aparecem apenas como figurantes.
Porém, em nenhum momento o eremita se apresenta como representante da instituição
eclesiástica, sendo sua liderança reconhecida em razão de seu caráter santo. Assim, Zenone
escapa ao domínio do sagrado, desvinculando-se do centro do poder eclesial ao operar no
domínio da santidade e explorar a conjuntura das Cruzadas como forma de mobilizar a
devoção e a violência para o Oriente. Isso o torna um tipo especial de marginal, cuja
marginalidade difere dos demais grupos destacados no filme por não implicar
necessariamente numa posição desprestigiada na sociedade.
Por último, temos a invasão dos "infiéis" Sarracenos a Aurocastro, derrotados pelo
exército cristão, que os derrubam do alto do penhasco e vencem o combate. Reforçando ainda
mais a ideia de combater os infiéis, Zenone reaparece no final do filme para resgatar
Brancaleone e sua armada, que sob juramento, iriam ajudá-lo a lutar na Terra Santa.
Ao deixar Aurocastro, Brancaleone e sua armada junta-se a Zenone e seguem em
busca da salvação e a libertação dos cristãos no Oriente.

Conclusão:
O filme L’Armata Brancaleone apostou na formulação do que seria a perspectiva das
margens na sociedade medieval - através de elementos do próprio sistema feudal. Até mesmo
pela intenção política do diretor na década de 60 em criticar o lastro do regime fascista no pós
II Guerra Mundial, a narrativa explora personagens subalternos e o anti semitismo. Embora
Monicelli beba da fonte da medievalidade, não reproduz suas manifestações mais fantasiosas:
a Idade Média que a obra apresenta não é uma época de magia e nobreza, mas um cenário
crível em que há desigualdade e contradições sociais utilizando como vetor a cidade
medieval.
Os elementos fílmicos, entretanto, vão além das marginalidades do período medieval;
a não linearidade temporal em que se insere os recursos narrativos apresentam excelentes
aportes para abordar a Idade Média de forma ampla.
Este trabalho, portanto, utilizou como mecanismo de abordagem esses diversos
elementos temporais para tratar das relações entre a cidade e o sistema feudal, gerando uma
noção dialógica entre esses dois eixos e apropriando-se de diversos elementos como
dominium /feudalismo, crescimento urbano e sistema eclesial para tratar de questões
abordadas no curso “Senhorio e Feudalismo”.
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