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Programa de Pós-Graduação em História da UFRRJ. Doutorando em História. FAPERJ.
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Hélio de Oliveira Silva (2010) sustenta uma interpretação diferente de Barbosa (2002).
Para ele, os argumentos de Barbosa (2002) sofrem de anacronismo, ao exigir expectativas do
presente em missionários que viveram há um século e meio atrás, quando a presença
quantitativa e qualitativa dos missionários era irrisória para a sociedade brasileira. Os
primeiros missionários presbiterianos eram contrários à escravidão, mas realmente não se
envolveram inicialmente com o movimento. No entanto, deve-se atentar para o crescimento
do movimento abolicionista e destacar o papel daqueles que endossaram e atuaram em favor
da abolição. A prioridade realmente era a instalação do protestantismo no Brasil, desde 1859,
e o envolvimento com o abolicionismo logo de início poderia comprometer todo o trabalho
missionário de implantação e expansão do presbiterianismo frente a um catolicismo oficial e
majoritário.
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Em 1888, quando a Lei Áurea foi assinada, a Igreja Presbiteriana do Brasil possuía
apenas vinte e seis anos de organização, “a igreja era jovem, inexperiente e estrangeira em
quase dois terços de seus obreiros e boa parte de seus membros” (SILVA, 2010: 47). O ano de
1888 também foi o da organização do sínodo do presbiterianismo nacional, com 3
presbitérios, 62 igrejas locais, 2.947 membros comungantes, 31 pastores, sendo 12 nacionais.
quanto ao tema devido aos empecilhos legais e sociais para sua efetiva implantação e
permanência no Brasil. No entanto, ainda assim, há exemplos claros de sua posição
antiescravista, como foi afirmado na reunião do Presbitério do Rio de Janeiro em 1886, na
ocasião o tema foi levantado e os pastores reunidos condenaram o escravismo.
Douglas Nassif Cardoso (2009) também discorda dos argumentos de Barbosa. Para
ele, a tese de Barbosa é generalizante sobre as ações dos protestantes com relação à
escravidão. Cardoso se propõe a analisar a chamada “Pastoral da Liberdade”, um parecer
elaborado por Robert Reid Kalley (1809-1888) sobre ser certo ou não um cristão possuir
escravos. O documento, de caráter normativo eclesiástico, foi emitido em 1865 a partir de um
questionamento de Bernardino de Oliveira Rameiro, um senhor de escravos que também era
membro da Igreja Evangélica Fluminense, fundada por Kalley em 1855.
Cardoso (2009) destaca que inicialmente Kalley procurou demonstrar que todos
necessitam do serviço de outros e há três formas de se prestar esse serviço, seja por amor, por
salário ou por compulsão. Sobre o direito de propriedade Kalley afirma que cada um tem
direito ao seu corpo e de dispor dele conforme sua vontade, desfrutando dos frutos obtidos
pelo exercício do seu próprio corpo. Dessa forma, a escravidão era um roubo violento. O
senhor deveria amar o escravo como sendo seu próximo, essa era a lei do cristianismo. O
senhor de escravos era inimigo de Cristo e não poderia ser membro da Igreja de Jesus.
Uma questão interessante ressaltada por Elizete da Silva (2003) é o caso de um clérigo
anglicano ter se negado a ministrar a Ceia do Senhor a anglicanos donos de escravos no
Brasil, em 1861. Entretanto, sua atitude foi repreendida pelo bispo de Londres que lhe
recomendava prudência. Era a demonstração prática da conivência da Igreja Anglicana ao
escravismo brasileiro, em oposição às convenções antiescravistas tomadas na Inglaterra.
“Será sempre uma época notável na história pátria. A nação aplaude a medida, e este
aplauso achará eco entre os povos civilizados. São talvez poucos, porém, os que não
consideram a lei muito defeituosa” (IMPRENSA EVANGELICA, 1871: 145). Esse
comentário sobre a Lei do Ventre Livre foi a primeira menção sobre o tema no jornal
presbiteriano Imprensa Evangélica. Barbosa (2002) e Silva (2010) fazem interpretações
opostas sobre esse comentário. O primeiro diz que o comentário era a demonstração da frieza
do periódico sobre a abolição, pois seu “objetivo é tolerar a manutenção e a continuidade do
sistema vigente, até que se consiga encontrar uma saída que não prejudique os interesses tanto
dos senhores como dos escravos” (BARBOSA, 2002, p. 171). Para o segundo, “essa é
claramente uma postura favorável à abolição, ainda que, concorda-se, seja tímida” (SILVA,
2010: 54).
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Segundo Alonso (2015), os opositores do projeto, como José de Alencar, embora não
defendessem a escravidão como princípio, mas apenas pela circunstância econômica e política
do país, demonstravam os benefícios da escravidão ao livrar o escravo do fetichismo da
África e da guerra. A escravidão para eles deveria acabar de forma natural assim como
começou, e não por lei. Diante da oposição, para o projeto ser aprovado, foram necessários
recuos, quais sejam: o senhor só precisava comunicar ao Estado sobre o escravo nascido sob a
Lei do Ventre Livre na sua maioridade, isto é, a lei perdia seu efeito imediato; além disso,
todas as alforrias previstas ficavam condicionadas à autorização do senhor; e os escravos de
ordens religiosas não seriam mais libertos; também ficou vedada a ingerência dos
abolicionistas na ordem privada escravista; e houve restrição para o escravo formar seu
pecúlio para compra de sua alforria, pois só poderia fazê-lo sob a permissão do senhor.
Tanto para Alonso (2015), quanto para Machado (2014) e Barbosa (2002), o
paternalismo se encontrava em todo o movimento abolicionista. Havia no movimento a ideia
de mediar os conflitos entre senhores e escravos, criando vínculos de gratidão entre eles.
Jornais abolicionistas exaltavam essa ideia de forma acrítica, ofuscando os anos de violência
do cativeiro. Joaquim Nabuco (1849-1910), por exemplo, desejava a reconstrução da nação
pela valorização do trabalho livre e a redenção moral dos senhores, para os quais era dirigida
a propaganda abolicionista, pois os escravos não teriam condições de receberem a mensagem
dentro da ordem e nem de lutarem por si próprios. A ideia de melhoramento moral dos
escravos estava presente no movimento. Joaquim Nabuco via o cativo como portador de todos
os vícios corruptores da sociedade. No Manifesto da Sociedade Brasileira contra a
Escravidão, assinado também por Joaquim Nabuco, a ideia dos senhores agindo para atender
as necessidades morais do escravo, também estava presente. Isso interessava aos senhores,
pois teriam uma mão de obra barata e grata.
Durante a década de 1870, a Imprensa Evangélica não assume uma posição clara ao
lado do movimento abolicionista, mas também não defende a manutenção da escravidão, pelo
contrário, vislumbra a iminência da abolição. No entanto, a imprensa de forma geral, de
acordo com Machado (2014), somente a partir do crescimento do movimento, quando o tema
passa a sensibilizar a opinião pública, passou a dar atenção maior à questão abolicionista,
antes não havia apoio à causa. O primeiro periódico a apoiar, de forma ambígua, o movimento
foi a Gazeta de Notícias fundada em 1876, que também publicava anúncios escravistas para
poder sobreviver.
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Alonso (2015) demonstra que o movimento pode crescer durante os governos liberais,
entre 1878 e 1885, por tolerarem manifestações em espaço público. Todavia houve reação do
escravismo que se organizou em congressos agrícolas. O movimento de início era de elite,
sem radicalismos. No entanto, a estrutura de pensamento escravista da sociedade foi se
diluindo, graças ao iluminismo, ao romantismo e ao pensamento protestante quaker, a
escravidão tornou-se obstáculo para a felicidade e pecado e o escravo passou a ser visto como
bom selvagem vítima do cativeiro. Conforme essas ideias foram se inserindo na sociedade, o
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movimento de elite passou a ser um ativismo social popular. O repertório abolicionista passou
ao senso comum em 1880.
É a partir de 1884 que a Imprensa Evangélica também assume uma posição clara de
apoio ao movimento com cerca de quatorze publicações tratando do tema. Para Edwiges Rosa
dos Santos (2009), isso se dá no momento de maior influência de pastores nacionais na
direção do periódico. De acordo com Barbosa (2002), esse posicionamento do jornal é
explicado pela percepção que os evangélicos têm do movimento, caracterizado por sua
popularidade e por se manter na ordem.
Segundo Alonso (2015) a década de 1880 foi significativa para a ascensão das novas
lideranças do movimento abolicionista, dentre os quais, destaca-se Joaquim Nabuco,
trabalhando dentro das instituições políticas, e José do Patrocínio, no espaço público. Joaquim
Nabuco defendia a criação do mercado de terras, a cessão ou venda a baixo custo de terras às
margens das ferrovias para colônias de imigrantes, especialmente europeus, além da pequena
propriedade e do imposto territorial. Nabuco buscou apoio para a causa em suas viagens pela
Europa. Sua relação com o movimento chegou a causar tensões dentro do Partido Liberal
prejudicando sua eleição para o ano de 1881, embora procurasse demonstrar a legalidade do
movimento.
Alonso (2015) destaca que a reforma eleitoral de 1881 não impediu a vitória dos
conservadores nas eleições. A saída de Joaquim Nabuco do parlamento e a ascensão do
Gabinete de Martinho Álvares da Silva Campos (1816-1887), em 1882, tirou o abolicionismo
da pauta institucional. O movimento continuou no espaço público com o avanço do
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associativismo, pois entre 1878 a 1885, foram criadas 227 associações, por todas as
províncias do Império, além de apoio de outras instituições ao movimento, como o Instituto
dos Advogados.
moral nas ruas, como a procissão de 1886, quando Patrocínio e João Fernandes Clapp (1840-
1902) andaram pelas ruas da Corte com as escravas Eduarda, quinze anos, e Joana, dezessete
anos, torturadas, a primeira tendo ficado cega e a segunda, após a procissão, tendo morrido. O
caso revoltou a sociedade, principalmente, com a absolvição da senhora torturadora, mesmo
diante de todas as provas. Com isso, aumentou a adesão da população ao acoitamento de
escravos fugitivos, isto é, aumentou a desobediência civil. O movimento cresceu nas sombras.
Alonso (2015) ressalta que com a tensão entre o Gabinete e o Exército, em 1887, o
governo perdeu suas armas contra o movimento. O clima de guerra civil na sociedade era
patente no fim do ano de 1887, com o massacre dos escravos que caminhavam para o porto de
Santos a fim de pegar o navio para a província liberta do Ceará e nenhuma menção da questão
escravista pela princesa no encerramento do ano legislativo. No ano de 1888, a Igreja também
já havia passado a apoiar o movimento, com a notícia de que o papa Leão XIII enviaria, a
pedido de Joaquim Nabuco, uma encíclica contra a escravidão, ainda que o envio do
documento tivesse sido adiado para não haver conflito entre o governo e a Santa Sé, os
prelados passaram a fazer declarações públicas em prol da abolição. O Partido Liberal aderiu
de fato em março de 1887. Saraiva passou a apoiar também em fevereiro de 1888. Senhores
passaram a libertar seus escravos entre fins de 1887 e 1888, a fim de controlar o processo,
devido ao aumento das fugas.
Houston (1884) indica as possibilidades em que um escravo poderia ser liberto: após
cumpridas as obrigações para remissão; no ano do Jubileu, quando todos os escravos hebreus
eram libertos; ou após seis anos de serviço. “Assim vemos que a servidão judaica era regulada
pela lei, de modo a não se tornar um mal para o paiz, nem uma especie de oppressão para o
servo” (HOUSTON, 1884: 6).
A respeito dos escravos gentios, Houston (1884) demonstra ser a condição deles mais
favorável que a dos escravos do Brasil, pois aquela escravidão não era nem hereditária, nem
opressiva e nem infamante. O escravo brasileiro “está completamente á mercê de seu senhor,
não tem nenhuma esperança de protecção contra a avareza e tyrannia do mesmo”
(HOUSTON, 1884: 7), as leis brasileiras haviam desconsiderado a qualidade de seres
racionais dos escravos. Só havia escravidão hereditária de gentios entre os hebreus em casos
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de prisioneiros de guerra, mas não havia tráfico de escravos, nem havia o costume de mantê-
los acorrentados em ferros. Escravos fugidos não eram entregues aos senhores, a pessoa do
escravo deveria ser protegida, eles tinham direitos que todos deveriam respeitar. O assassino
de um escravo deveria ser punido como se matasse um homem livre e um escravo ferido
deveria ser liberto. “Em geral o tratamento dos escravos era suave e brando tendo-se em vista
a justiça e equidade” (HOUSTON, 1884: 8).
Houston (1884) explica que a Lei de Moisés, dada por Deus, não estabelecia a
escravidão, mas a permitiu e a regulou a fim de evitar crueldades. Nos tempos antigos os
prisioneiros de guerra ou eram mortos ou eram reduzidos à escravidão, neste caso, a
escravidão era “sem duvida a mais moderada e portanto a preferivel” (HOUSTON, 1884: 9).
Nos tempos do Novo Testamento, já não há qualquer menção da existência de escravidão
entre os israelitas. Portanto, alguns costumes sociais eram tolerados até o estabelecimento de
um regime melhor. Assim como a poligamia que foi tolerada, mas não era lícita, assim
também foi com a escravidão.
De acordo com Houston (1884), uma vez que diante do Evangelho todo o homem
deve ser considerado irmão, não importando sua nação ou credo, a lei que condenava o tráfico
de escravos entre os hebreus, agora vale para todos os homens, quem escraviza é digno de
morte. “Não é licito agora sob as leis do Evangelho um homem escravisar o seu semelhante
contra a vontade deste, seja desta ou daquella nação, quer desta ou daquella côr” (HOUSTON,
1884: 10). Além disso, o Cristianismo é “amigo de todo e qualquer movimento que tenha por
fim alliviar os opprimidos, e facultar a todos, sem distincção de côr, o poderem fruir todas as
bençãos provenientes da verdadeira liberdade” (HOUSTON, 1884: 11). Com a expansão do
Evangelho, a escravidão tende a acabar. O Evangelho traz a libertação espiritual, mas também
cobriria a libertação da tirania e opressão, que era fruto do pecado do homem. O que é
contrário a lei suprema do amor de Deus a todos os homens não pode ser aprovado pelo
Cristianismo, por cujo princípio não há acepção de pessoas.
Ao fazer referência ao Gabinete Dantas, Houston (1884) pede para seus leitores
apoiarem a todo o movimento abolicionista, principalmente naquele momento em que ele
havia se tornado popular e nacional, tendo alcançado a alta administração do Estado. O Brasil
era o único país civilizado no continente a manter a escravidão e isso era prejudicial moral,
espiritual e materialmente.
Pereira (1886) denuncia a prática do suplício contra o escravo, comum nas fazendas do
Brasil, critica e amaldiçoa a todos os escravistas envolvidos na aprovação da Lei Saraiva-
Cotegipe. A consolação para o escravo era saber que seu sangue e seus gemidos estavam
sendo recolhidos no cálice da ira de Deus. A imprensa deveria levantar com som de trombeta
e denunciar ao povo a “monstruosidade deste peccado nacional” (PEREIRA, 1886: 7). Manter
a escravidão era ofensivo às leis de Deus. Também há uma denuncia sobre a existência de
escravistas como membros das igrejas evangélicas: “esse crime que mancha ainda o seio das
egrejas evangelicas do Brazil, com grandissimo detrimento do Evangelho” (PEREIRA, 1886:
7).
Pereira (1886) também se propõe a fazer uma análise sobre a escravidão no Antigo e
no Novo Testamento. A partir disso, declara-se que a escravidão não tem sanção divina. Entre
os hebreus havia tolerância a essa realidade do mundo antigo. No entanto, os legisladores
brasileiros do século XIX haviam legitimado o roubo sacrílego de africanos, reduzidos à
escravidão após a Lei de 1831, pois a Lei dos Sexagenários, da forma como foi aprovada, não
exigia a declaração da naturalidade da nova matrícula. Pereira (1886) lamenta que o Gabinete
Dantas tenha caído simplesmente porque queria a liberdade daqueles que já haviam passado
sessenta anos de sua vida no cativeiro. Na lei mosaica um escravo ferido deveria ser liberto,
mas na legislação brasileira, um escravo seviciado deveria ser devolvido ao seu senhor.
Pereira (1886) afirma que para Deus todos deveriam trabalhar com suas próprias mãos.
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Conclusão
Terminamos esse artigo destacando o quanto o tema da relação entre as ações dos
protestantes e a questão escravista ainda é um campo de estudos aberto para novas pesquisas,
com muitas lacunas a serem preenchidas. A principal interpretação sobre essa relação
defende, em geral, que os protestantes foram letárgicos devido a uma teologia maniqueísta, só
pensavam na salvação espiritual do negro. Outros defendem que lideranças significativas
entre os protestantes, embora tímidas e reservadas, mantiveram uma posição abolicionista
muito tempo antes de 1888.
Nosso foco neste texto foi introduzir a análise dessa relação entre os presbiterianos e o
movimento abolicionista. Percebemos que embora na década de 1870 o jornal Imprensa
Evangélica, principal porta-voz da missão presbiteriana no Brasil, tenha tratado muito pouco
sobre a questão, quando o fez, suas ideias paternalistas e reformistas dialogaram com a
retórica do movimento. Na década de 1880, principalmente em 1884, o jornal aumentou a
quantidade de publicações, tomando uma posição clara ao lado do movimento. Com a
publicação dos opúsculos abolicionistas presbiterianos ficou claro que embora se
mantivessem em sua esfera de ação, ou seja, a prioridade na evangelização e implantação do
presbiterianismo no Brasil, eles acompanharam e, de forma geral, apoiaram o movimento
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