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INTERVENÇÕES DO PSICÓLOGO ESCOLAR:


PERCEPÇÕES DE PROFESSORES SOBRE O MAL-ESTAR DOCENTE1

Marcos Fernando de Oliveira Pereira2


Me. Simone Nenê Portella Dalbosco3

SUMÁRIO

1 Introdução. 2 Revisão bibliográfica. 3 Aspectos metodológicos. 4 Apresentação e discussão


dos resultados. 4.1 O mal-estar docente na percepção dos professores. 4.2 Os professores
falam sobre as dificuldades enfrentadas na escola. 4.3 Motivos e dificuldades para procurar
atendimento na área da saúde. 4.4 A percepção dos docentes sobre o psicólogo escolar.
5 Considerações finais. Referências. Apêndice.

RESUMO

Este artigo apresenta a percepção de oitos professores de uma escola da rede pública estadual
de Passo Fundo sobre as possibilidades de uma intervenção psicológica na escola. O
problema da pesquisa foi: como os professores de uma escola da rede pública estadual de
Passo Fundo percebem o mal-estar docente e quais as alternativas que podem ser
desenvolvidas para a melhoria da saúde mental, mediante a intervenção do psicólogo escolar?
O objetivo geral foi: entender as percepções dos professores acerca do mal-estar docente e
identificar as principais alternativas de tratamento psicológico. E, os objetivos específicos
foram: identificar as principais doenças psicossomáticas enfrentadas pelos participantes;
entender os anseios e dificuldades enfrentados pelos profissionais no trato em sala de aula;
perceber o que os professores entendem sobre o mal-estar docente; e propor alternativas de
tratamento com a colaboração do psicólogo escolar. A presente pesquisa foi desenvolvida
como um estudo qualitativo do tipo descritivo. Os dados obtidos foram organizados em
gráficos que permitem a descrição da realidade dos oito professores participantes do estudo.
Nesse sentido, buscou-se a classificação por faixa etária, gênero, estado civil, escolaridade,
carga horária, turnos de trabalho, grau de ensino em que lecionam, tipo de profissionais da
saúde que procuraram e tipos de medicação utilizada de forma contínua. As categorias
encontradas, na análise qualitativa, abordam o mal-estar docente na percepção dos
professores; as dificuldades encontradas na escola; os motivos que os levaram a procurar
profissionais da saúde; a participação do psicólogo na escola, e alternativas para a qualidade
de vida.
Palavras-chave: Psicologia escolar. Mal-estar docente. Síndrome de Bournot. Professores.

1
Trabalho de Conclusão de Curso vinculado à linha de pesquisa “Processos e Intervenções em Saúde e
Qualidade de Vida”.
2
Graduando em Psicologia pela Faculdade Meridional (IMED) – Passo Fundo. E-mail:
mfernandoop@hotmail.com.
3
Professora Orientadora.
2

ABSTRACT

This article talks about the perception of eight teachers that work at a public school in Passo
Fundo and want to know of the possibilities and limitations of psychological intervention in
school. The research problem was: how teachers of a public school of Passo Fundo perceive
the unrest and which alternatives can be developed to improve mental health, through the
intervention of the school psychologist? The overall objective was: to understand the
perceptions of teachers about teaching malaise and identify the main psychological treatment
alternatives. And, the specific objectives were: to identify the main psychosomatic illnesses
faced by participants, to understand the concerns and difficulties faced by professionals in
dealing in the classroom; realize that teachers understand about teaching malaise, and propose
alternative treatment with the collaboration of the school psychologist. This research study
was developed as a qualitative in nature. The data were organized into charts that allow the
description of the reality of the eight teachers in the study. Accordingly, we sought to
classification by age, gender, marital status, education, workload, shift work, level of
education they are teaching, type of health professionals who have sought and types of
medication used continuously. The categories found in the qualitative analysis address the
malaise in the perception of teaching teachers, the difficulties encountered in school, the
reasons that led them to seek health care professionals, the participation of psychologists in
school and alternatives to the quality of life.
Keywords: Educational psychology. Educational malaise. Syndrome Bournot. Teachers.

1 Introdução

Este estudo enfoca a percepção de oitos professores de uma escola da rede pública
estadual de Passo Fundo sobre as possibilidades de uma intervenção psicológica na escola. A
pesquisa tenta responder a seguinte pergunta: como os professores de uma escola da rede
pública estadual de Passo Fundo percebem o mal-estar docente e quais as alternativas que
podem ser desenvolvidas para a melhoria da saúde mental, mediante a intervenção do
psicólogo escolar? Assim, procura-se descrever como esses professores percebem esse
fenômeno e se têm sugestões sobre a participação do psicólogo escolar em relação à qualidade
de vida.
Pode-se definir o mal-estar docente como “uma resposta ao estresse profissional
prolongado e crônico, e pode ocorrer devido às dificuldades colocadas pela sua profissão”
(STREHL, 2010, p. 25). A manifestação do mal-estar docente se dá através de sentimentos de
angústia, desconforto e impotência, resultantes dos episódios estressantes nas relações
estabelecidas pelo professor, em situações cotidianas de sua prática com colegas, diretores e
alunos.
A hipótese considera que esses professores percebem o mal-estar docente e têm
sugestões sobre a participação do psicólogo escolar na promoção da qualidade de vida. Esta
3

problematização buscou o entendimento da relação professor-escola-psicólogo a partir das


suas dificuldades vivenciadas no ambiente escolar.
Para o Relatório da Organização Mundial da Saúde (2012, p. 30), a definição de saúde
é:

[...] não simplesmente a ausência de doença ou enfermidade, mas como “um estado
de completo bem-estar físico, mental e social”. Nos últimos anos, esta definição
ganhou um maior destaque, em resultado de muitos e enormes progressos nas
ciências biológicas e comportamentais. Estes, por sua vez, aperfeiçoaram a nossa
maneira de compreender o funcionamento mental e a profunda relação entre saúde
mental, física e social.

Com base nessas questões, o objetivo geral é: entender as percepções dos professores
acerca do mal-estar docente e identificar as principais alternativas de tratamento psicológico.
Os objetivos específicos são: identificar as principais doenças psicossomáticas enfrentadas
pelos participantes; entender os anseios e dificuldades enfrentados pelos profissionais no trato
em sala de aula; perceber o que os professores entendem sobre o mal-estar docente; e propor
alternativas de tratamento com a colaboração do psicólogo escolar.
Com o auxílio desse profissional, os professores podem ter uma ferramenta de apoio
no sentido de relatar suas angústias, medos e ansiedades no exercício da profissão docente. O
psicólogo escolar tem o papel de minimizar o estado psíquico dos professores frente às
dificuldades e conflitos existentes no trato com alunos, funcionários e colegas de profissão no
ambiente específico da escola e da sala de aula. Paula e Naves (2010, p. 61) salientam que
“[...] em um cenário de incertezas, os docentes vivem o desafio de moverem-se num contexto
em que tudo o que parecia sólido desmancha-se no ar”. Nesse sentido, pode-se afirmar que a
fala silenciada, o constrangimento, o estresse e todo tipo de mal-estar são reais no dia a dia
dos professores.
Este tema surgiu na disciplina Psicologia do Trabalho II, cursada em de 2009 em que,
naquela ocasião, percebeu-se a ausência de vários professores atuando na escola. No período
de 2011, durante o estágio profissional, observou-se também que, devido a laudo médico
decorrente de problemas psicossomáticos, houve muitas faltas de docentes que tiveram
origem na tentativa de exercer a profissão.
Os problemas psicossomáticos são os que designam alterações funcionais e
enfermidades de origem orgânica provocadas pelas características psicológicas do ser humano
e por influências derivadas do ambiente em que vive. Vale a pena ressaltar que, embora sua
origem esteja relacionada com componentes psicológicos, estes problemas precisam de
tratamento (PROBLEMAS..., 2012).
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O tema torna-se ainda mais relevante devido à quantidade de trabalhos científicos que
enfocam o assunto no âmbito da intervenção psicológica. Nota-se que esses profissionais
possuem dificuldades para trabalhar em sala de aula e que estas não são um caso isolado de
uma escola em especial, mas sim, um fato comum em qualquer ambiente pedagógico.
Justifica-se este trabalho, então, devido à demanda percebida na esfera educacional por
intervenções clínicas e por ações psicossociais na tentativa de diminuição do sofrimento
psíquico em que se encontram os profissionais da educação, principalmente na rede pública
de ensino.
Identifica-se a necessidade de entender o processo que se dá através da entrada do
professor em laudo médico a partir do seu exercício profissional em sala de aula. Este artigo
inicia com a revisão bibliográfica, segue pela descrição dos aspectos metodológicos e, por
último, faz uma interpretação dos dados de forma qualitativa.

2 Revisão bibliográfica

A psicologia escolar possui uma breve história no Brasil com contribuições isoladas,
iniciativas pioneiras e a criação de diversas instituições relacionadas a esta área. Segundo
Cassins et al. (2007), as origens da psicologia escolar iniciam no século XIX, mas somente no
século XX é que se produzem serviços efetivos às escolas, aos professores e aos educandos.
A importância da psicologia escolar está relacionada ao melhor aproveitamento
acadêmico dos educandos, a fim de que este se torne um cidadão produtivo para a sociedade.
Tem como foco o desenvolvimento emocional, cognitivo e social, utilizando-os para abranger
os processos de ensino e de aprendizagem e direcionar a equipe educativa na busca de
aperfeiçoamento deste processo.
Sua participação na equipe multidisciplinar é essencial para respaldá-la com
conhecimentos atualizados na tomada de decisões, como a distribuição apropriada de
conteúdos programáticos conforme as fases do desenvolvimento humano, a seleção de
estratégias de condução da turma, apoio aos docentes para lidar com a heterogeneidade
presente na escola, desenvolvimento de técnicas inclusivas para alunos com dificuldades de
aprendizagem ou comportamentais, programas de desenvolvimento de habilidades sociais e
outros assuntos abordados, nos quais os fatores psicológicos tenham papel fundamental.
Nesse sentido, Cassins et al. (2007, p. 17) afirmam que “[...] o psicólogo escolar
desenvolve atividades direcionadas com alunos, professores e funcionários e atua em parceria
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com a coordenação da escola, familiares e profissionais que acompanham os alunos fora do


ambiente escolar”.
Esse autor enumera os fins e objetivos da Psicologia Escolar: a escola é o espaço para
proporcionar o desenvolvimento integral do ser humano; incentivar os educadores para tomar
posições em relação aos problemas sociais; estimular a opção por uma atuação amparada em
teorias psicológicas; assessorar a escola no desenvolvimento de uma concepção educacional,
na compreensão e amplitude de seu papel, seus limites e possibilidades; desenvolver uma
concepção de psicologia enfatizando o compromisso com a sociedade; entender o fracasso
escolar não como um processo individual; mensurar os processos de reflexão sobre as ações
educativas a partir da atuação com os diversos profissionais envolvidos na educação; propor
outras alternativas sociais para auxiliar na administração de possíveis deficiências escolares;
compreender os processos de desenvolvimento biopsicossocial dos envolvidos na escola;
explanar os processos de desenvolvimento da aprendizagem de alunos e professores;
compreender a construção da subjetividade (construção do Eu) em cada ambiente
educacional; assessorar na procura de humanização educacional; cultivar o enfoque
preventivo, visando a reflexão sobre os papéis dos envolvidos; buscar ser o orientador do
processo refletivo e não o solucionador de problemas; conscientizar as pessoas da importância
de sua participação e responsabilidade nos grupos em que se inserem.
Cassins et al. (2007) também expõem as atividades que o psicólogo escolar precisa
desenvolver: assessorar a instituição escolar na elaboração do projeto político-pedagógico,
considerando as políticas públicas; apoiar a escola no resgate do valor e da autonomia do
professor; assessorar o docente na articulação entre as teorias da aprendizagem e as práticas
pedagógicas adotadas; mobilizar a comunidade educacional em torno de uma proposta de
intervenção, conscientizando pais e professores sobre as necessidades básicas de crianças e
adolescentes; e, pesquisar e aplicar os conhecimentos relacionados com psicologia escolar-
educacional. Neste estudo, optou-se pela categoria professores, embora, a relação com toda a
comunidade escolar é fundamental.
O psicólogo escolar também acompanha projetos de apoio à construção de identidade
pessoal e participação social; encaminha educandos a atendimentos especiais ao detectar
necessidades específicas; participa em reuniões com a equipe pedagógica; supervisiona os
planos de intervenção individual e/ou grupal; elabora projetos de educação sexual e de
prevenção ao uso de drogas e à violência. É no corpo docente que se focará este texto.
Ante os inúmeros desafios que o professor encontra no ambiente escolar, Strehl (2010,
p. 80) afirma que:
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[...] fica evidenciada a necessidade de um sistema de apoio para contribuir com o


bom andamento de seu trabalho, oferecendo suporte aos problemas enfrentados com
os alunos e sendo um elo entre a escola e os familiares, na organização de seu
trabalho e no apoio para a prevenção de seus problemas de saúde.

Assim, as tarefas que o psicólogo escolar poderia realizar junto ao corpo docente são,
segundo Cassins et al. (2007), apoio na definição de conteúdos e teorias de aprendizagem;
promoção de atividades de desenvolvimento profissional; orientação, intervenção e
acompanhamento para dificuldades individuais e grupais; e trabalhos direcionados à
qualidade de vida no trabalho, como relações intersubjetivas, motivação, prevenção de
estresse e os fatores que envolvem o mal-estar docente, mais, especificamente, a Síndrome de
Burnout.
Gardenal (2009, p. 1), preocupada com os motivos que levam os professores a
adoecer, fez “[...] uma pesquisa de fôlego sobre as condições de trabalho e suas repercussões
na saúde dos professores da educação básica, que começou com um levantamento de teses e
livros de toda a produção do país nos últimos dez anos”.
Voltando o olhar para a organização escolar e todo o contexto em que a educação está
inserida, percebe-se que há uma sobrecarga em grande medida aos seus agentes e,
especialmente, aos professores.
Monteiro e Soares (2010, p. 1-2) tiveram como objetivo: “[...] fazer um levantamento
através da literatura científica dos processos de mudanças ocorridas na educação e as
principais consequência destas sobre a atividade docente e a saúde, apresentando a Síndrome
de Burnout que afeta profundamente estes profissionais”.
De acordo com Mazon, Carlotto e Câmara (2008), “Síndrome de burn-out” é um tipo
de resposta prolongada ao estresse emocional e crônico no trabalho, que afeta, principalmente,
profissionais da área da educação e cuidadores. Burnout é um fenômeno psicossocial que
surge como uma resposta crônica ao estresse ocorrido no trabalho, sendo constituído de três
dimensões relacionadas, mas independentes: exaustão emocional, despersonalização e baixa
realização profissional.
O processo de desenvolvimento da Síndrome de Burnout é individual e sua evolução
pode levar anos e até décadas, não sendo percebido em sua fase inicial pelo sujeito que,
geralmente, se recusa a acreditar que está acontecendo algo errado com ele. Os estudos de
Burnout têm focado em variáveis organizacionais e contextuais. No entanto, as pesquisadoras
sugerem que altos níveis de estresse não necessariamente levam o sujeito a desenvolver
Burnout.
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Silva e Carlotto (2003) analisaram se o estresse estabelece diferenças significativas


nos níveis e no processo da Síndrome de Burnout em professores de escolas da rede pública.
Também procuraram identificar associações das dimensões de Burnout com variáveis
demográficas, laborais e comportamentais. Os resultados obtidos indicam não existir
diferença estatisticamente significativa entre os grupos nas dimensões e níveis de Burnout.
No entanto, verifica-se a ocorrência de associação diferenciada nos dois grupos entre as
dimensões de Burnout e as variáveis mencionadas.
A Síndrome de Burnout também foi pesquisada em professores da rede pública por
Levy, Nunes e Souza (2009). O índice de Burnout foi avaliado em 119 professores da rede
pública do ensino fundamental. Os instrumentos de medidas constituíram do CBP-R
questionário de Burnout para professores-R e um inventário sócio demográfico. Os resultados
indicaram que 70,13% dos participantes apresentavam síndrome, sendo que 85% se sentiam
ameaçados. Desses, 44% cumpriam jornada de trabalho superior a 60 horas semanais e 70%
situavam-se em uma faixa etária inferior a 51 anos. A partir do estudo, foram sugeridas
alternativas para a humanização do posto de trabalho docente.
Os estudos até aqui apresentados servirão de suporte à análise a ser exposta,
posteriormente, tendo como objeto os resultados obtidos por meio da pesquisa empreendida, a
qual seguiu os aspectos metodológicos relatados no próximo item.

3 Aspectos metodológicos

A presente pesquisa foi desenvolvida como um estudo qualitativo do tipo descritivo. A


pesquisa qualitativa possui como objeto “[...] o homem em seu estado natural, em seu meio,
por vezes algo modificável para evitar a interferência de variáveis que fariam ruído”
(TURATO, 2003, p. 24). Para escapar só da quantificação, o pesquisador deve ser capaz de
pensar. Sendo assim, como afirma Turato (2003, p. 25), “deverá ter outras características que
vão além da disciplina técnica: a criatividade, a capacidade de indagar, a curiosidade e a
ética”.
Na ênfase da descoberta de novas ideias e conhecimentos, Barros e Lehfeld (2000, p.
70) descrevem suas concepções acerca dos estudos descritivos: “Nesse tipo de pesquisa não
há interferência do pesquisador, isto é, ele descreve o objeto de pesquisa. Procura descobrir a
frequência com que um fenômeno ocorre, sua natureza, características, causas, relações e
conexões com outros fenômenos”.
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Limita-se, a partir do contexto apresentado, a intervenção junto aos professores em


situação de desgaste no ambiente escolar. A pesquisa foi realizada em uma escola pública da
rede estadual de ensino do município de Passo Fundo. O convite foi realizado mediante
disponibilidade de tempo e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido que foi
aprovado pelo Comitê de Ética da Imed (Anexo). Exclui-se deste trabalho a totalidade dos
professores da escola analisada, pois, nem todos necessitam de apoio psicológico, incluindo
como participantes deste estudo apenas os docentes em situação de laudo por problemas de
saúde. Esta proposta tende a priorizar o trabalho do professor que se encontra previamente
desmotivado, prejudicado ou em dificuldade de lecionar em sua plenitude e de maneira
saudável. Foram participantes da pesquisa os professores que entraram em laudo por motivos
de saúde nos últimos dois anos, num total de 8 (oito) docentes, 1 (um) do sexo masculino e 7
(sete) do sexo feminino que já haviam retornado ao serviço.
Para a coleta dos dados, utilizou-se a entrevista semidirigida que foi realizada por
meio de um roteiro específico para este tipo de entrevista (ver Apêndice). A literatura
científica, ao falar das entrevistas quanto ao seu formato, usa, classicamente, o termo
“estruturada”. No entanto, Turato (2003, p. 312) afirma que toda entrevista possui uma
estrutura e que “[...] por outro lado, quanto a serem dirigidas, estas, sim, podem ser
‘totalmente’, ‘parcialmente’ ou ‘praticamente nada’”.
Na entrevista semidirigida, o pesquisador faz perguntas concretas, mas deixando
algumas abertas nas quais o entrevistado pode expor o tema de maneira livre. Nesse sentido,
Turato (2003, p. 315, grifo nosso) fala dos motivos da escolha desse instrumento auxiliar para
a pesquisa clínico-qualitativa:

[...] dá-se então pelo motivo de que ambos os integrantes da relação têm momentos
para dar alguma direção, representando ganho para reunir os dados segundo os
objetivos propostos. Enquanto bom pesquisador, o entrevistador deverá colocar-se
tranquilamente considerando certas situações da fala do informante como elementos
relevantes, falas incompletas e falas obscuras.

Preferiu-se a utilização desse instrumento pelo fato das perguntas, em certo momento,
exigirem respostas com conteúdo livre, em detrimento da totalidade de alternativas fornecidas
pelo investigador, contribuindo para o alcance dos objetivos propostos.
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4 Apresentação e discussão dos resultados

Os dados obtidos foram organizados em gráficos que permitem a descrição da


realidade dos oito professores participantes do estudo. Nesse sentido, buscou-se a
classificação por faixa etária, gênero, estado civil, escolaridade, carga horária, turnos de
trabalho, grau de ensino em que lecionam, tipo de profissionais da saúde que procuraram e
tipos de medicação utilizada de forma contínua.

Os professores entrevistados tinham entre 36 e 59 anos, sendo 38% com mais de 51


anos, ou seja, três educadores em fase prévia à aposentadoria; 37% possuíam entre 41 e 50
anos, sendo três dos entrevistados ingressando na vida adulta média; e somente 25% tinham
entre 30 e 40 anos de idade, quer dizer, que dois participantes ainda eram adultos jovens.

Dos oito docentes entrevistados, um é do gênero masculino correspondendo ao 13%


do total e, sete, foram do gênero feminino correspondentes aos 87% do total de educadores
entrevistados. Isso se deve à grande proporção de profissionais do gênero feminino que
trabalha na área de educação.
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Dos professores entrevistados, 13 % são viúvos (uma pessoa); 25% são casados (duas
pessoas); 25% são divorciados (duas pessoas) e 37% são solteiros (três pessoas), sendo um do
gênero masculino. Os professores não comentaram espontaneamente se tinham filhos,
somente uma delas disse que tem cinco filhos e que quatro deles se drogam, e outra, que a
chegada da segunda filha provocou depressão pela sobrecarga do trabalho e os deveres
familiares.

Todos os professores entrevistados possuem graduação e o 75% fez também cursos de


pós-graduação (seis professores). Os educadores têm graduação nas seguintes áreas: uma em
História, dois em Matemáticas, uma em Letras: Português e Literatura, duas em Educação
Física, duas de Educação Artística: Habilitação em Artes Plásticas. Dos que fizeram pós-
graduação: uma fez em Direitos Humanos, uma em Teoria da Arte, uma em Psicopedagogia
Escolar, uma em Leitura e Língua Inglesa, uma das professoras realizou vários cursos de
especialização em Desporte Coletivo, Leitura de Animação Cultural, Gestão Escola, Mídia na
Educação, um docente não informou o curso realizado.
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Dos oitos professores entrevistados, 13% tem carga horária com mais de 40 horas
semanais na escola (uma pessoa), 37% tem 40 horas semanais (três pessoas) e 50% possui 20
horas semanais (quatro pessoas). É necessário esclarecer que uma das educadoras com 20
horas semanais trabalha mais 40 horas noutra escola. E, outra entrevistada que declara ter 20
horas na escola pesquisada ainda trabalha mais 35 horas, noutra escola. Seis entrevistados
lecionam somente uma disciplina: dois dão aula de Educação Física, dois lecionam Artes, dois
ministram a disciplina de Matemáticas. Entretanto, uma docente dá aulas de Inglês e de
Ensino Religioso, e outra das entrevistadas leciona cinco disciplinas, sendo elas, História,
Filosofia, Religião, Artes e Geografia.

Um professor entrevistado leciona na parte da manhã, outro na parte da tarde, outro à


noite; 13%, quer dizer, um docente leciona pela manhã e à noite; 25% dos professores, ou
seja, dois deles lecionam manhã e tarde; e os outros dois, o 25%, lecionam nos três turnos.
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Dos oitos professores entrevistados, 25% atuam no ensino fundamental; 37% atuam no
ensino médio, e 38% atuam tanto no ensino fundamental como no médio/Eja. Então, dois
professores lecionam nos primeiro e últimos anos do ensino fundamental, três professores o
fazem nos três anos do ensino médio regular, e três professores trabalham no ensino
fundamental e no ensino médio da educação de jovens e adultos.

Dos oito professores entrevistados, 13% buscaram vários profissionais de


fonoaudiologia, neurologia, cardiologia, ortopedia e traumatologia; 37% procuraram
atendimento com psiquiatra; 25% foram atendidos por médicos psiquiatras e de outras
especialidades; e 25% consultaram psiquiatra e psicólogo concomitantemente. Três
professores buscaram ajuda somente psiquiatra, dois de psiquiatria e psicologia, dois de
psiquiatra e outros médicos e um professor procurou um profissional que tratasse da voz.
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Dois professores não utilizavam medicação ao momento da entrevista. Os


medicamentos utilizados de forma contínua foram: Ciita e Atenolol; Sirbratina, Olcoadil e
Rivotril; Daforin, Rivotril e Paco Musculare; Estezaline e Benepax; Éxodus e Losartana
Potássica; um dos professores mencionou somente que eram antidepressivos e outro não
especificou o tipo de medicação. Após o laudo, três professoras tiveram delimitação da função
realizando tarefas escolares que não impliquem em atividades em sala de aula.

4.1 O mal-estar docente na percepção dos professores

Os docentes manifestaram que o mal-estar pode ser causado por diversos motivos. Os
professores falaram da sobrecarga de trabalho e a pressão da escola; da desmotivação pessoal
e da frustração; da falta de incentivo ou valorização social.
De acordo com Villela e Silva (2008, p. 111):

As queixas mais frequentes percebidas no trabalho versam sobre aspectos


contextuais: intensificação do trabalho; várias jornadas de trabalhos assumidas;
deslocamentos entre as escolas; condições materiais oferecidas; dificuldades para
acompanhar a velocidade das inovações tecnológicas; suporte técnico insuficiente;
mudança no perfil do aluno; elevado número de alunos por turma; defasagem
salarial; falta de reconhecimento do trabalho; escassez de tempo para preparação das
aulas e participação em cursos. Essa intensificação do fazer docente lhe ocasiona
conflitos, pois ao ter que arcar com essa sobrecarga, percebe reduzido seu tempo
disponível para estudos individuais ou em grupo, participação de cursos ou outros
recursos que possam contribuir para a sua qualificação, favorecer seu
desenvolvimento e sua realização profissional.

Isso se percebe na fala dos próprios docentes quando dizem: “é a situação de pressão,
estresse e sobrecarga (Luísa)”; “sobrecarga de trabalho (Marta)”; “excesso de carga horária
(Ivone)”. Uma da docente fala também sobre o estresse, mas, este tema será abordado mais
adiante ao falar dos motivos que levaram os professores a buscar atendimento na área de
saúde. “O estresse resulta de nossa reação psicológica e física às mudanças potenciais com
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que convivemos atualmente. A mente reage com ansiedade, preocupação ou medo. O corpo
reage secretando substancia químicas e hormônios.” (WEISS, 2006, p. 9).
Três professores comentaram que se sentem desmotivados: “falta de vontade de
trabalhar” (Marta); “desânimo” (Manuela); “baixa motivação para o trabalho” (Simone).
Nesse sentido, Strehl (2010, p. 120) escreve:

[...] o descaso com o professor da rede estadual está aumentando, os alunos estão
desinteressados, o número de colegas doentes, física e mentalmente, está cada vez
maior; a remuneração é baixa, não existe apoio psicológico para o professor, existem
pais ausentes, alunos, de modo geral, agressivos, desanimados, sem respeito pelo
professor; falto incentivo para o aperfeiçoamento do professor, falta material
didático, especialmente em língua estrangeira; não tem livros, não tem recursos, e o
material é caro para o professor adquirir de seu próprio bolso.

Além da motivação interna, também falta motivos externos que contribuam com a
situação vivida pelos docentes. Eles comentaram: “temos má remuneração” (Luisa); “falta de
valorização” (Ivone); “falta de incentivo” (Simone).
Sobre este assunto, Strehl (2010, p. 120) escreve que é:

[...] de suma importância a valorização do professor em seu aspecto intelectual,


social e econômico, mas nunca esquecendo que ele é, antes de tudo, uma pessoa; de
modo que se faz necessário o desenvolvimento de sua auto-individuação e a procura
de um ensino em prol de sua saúde psicológica.

Três professores mencionaram o pânico e outras síndromes/sintomas psicológicos:


“Não estar bem, não estar em condições laborais no trabalho; angustia, já tive síndrome do
pânico” (Lucas); “Que os professores estão com uma doença psicológica, e também de
enfrentar os alunos em sala de aula, sente tremor, desmaio, mal-estar” (Tânia); “Tive
problemas na disciplina, eu sentia náusea, tontura, choro constante, tristeza, gastrite nervosa e
labirintite” (Manuela); “angústia” (Simone).
A ansiedade causa, no indivíduo, alguns sintomas referidos pelos professores: angústia
constante, tontura, dores musculares, taquicardia e epigastralgias.
De acordo com Dalgalarrondo (2000, p. 26):

As crises de pânico são intensas crises de ansiedade, nas quais ocorre importante
descarga do sistema nervoso autonômico, produzindo sintomas como: náuseas,
taquicardia, e outros. As crises sejam recorrentes, com desenvolvimento de medo de
ter novas crises, preocupações sobre possíveis implicações da crise (perder o
controle, ter um ataque cardíaco ou enlouquecer), alem de sofrimento subjetivo
significativo. A síndrome do pânico pode ou não ser acompanhada de agorafobia.
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Somente uma professora falou de frustração. Isso é bastante relevante. Ela disse que
estava se sentindo desiludida, com objetivos não alcançados que “vai deixando a gente
frustrada” (Maria). Os autores que estudam o mal-estar já comprovaram este fato como se
observa na citação abaixo realizada por Strehl (apud MARCHESI, 2010, p. 28):

A desilusão e o cansaço profissional em nada favorecem a colaboração e o trabalho


em equipe. A mesma coisa ocorre, embora com menos força, com as experiências
negativas: grupo de trabalho que não cumpriram seus objetivos, que não foram
capazes de superar suas dificuldades ou nos quais as exigências superaram as
vantagens.

No próximo tópico, as dificuldades enfrentadas pela escola são relatadas pelos sujeitos
da pesquisa.

4.2 Os professores falam sobre as dificuldades enfrentadas na escola

Dois professores não atribuem as dificuldades à convivência com os alunos ou com os


colegas porque se sentem respeitados: “Não encontro dificuldades com os alunos. Eles
adoram minha disciplina e me respeitam” (Luiza) e também “Nenhuma dificuldade com
alunos, me respeitam.” (Marta).
Mas, há quem pensa o contrário porque quatro professores comentam sobre o
desinteresse e baixo rendimento dos alunos: “Falta comprometimento dos alunos” (Lucas); e
“Rendimento baixo dos alunos” (Tânia); “Desinteresse de aluno/ pois eles não têm
responsabilidades” (Maria); “falta de interesse “ (Simone).
Sobre este assunto, Bottini (2009, p. 97) escreve:

Falta de interesse dos alunos em aprender é a principal dificuldade que encontram


em seu trabalho diário. As razões desta situação costumam ser atribuídas, em
diferentes graus, às mudanças de sociedade, à falta de dedicação das famílias, às leis
educacionais, à influencia dos audiovisuais e à despreocupação dos próprios alunos.

Cinco professores falaram sobre a indisciplina e a dificuldade de domínio de classe


uma vez que os alunos “não cumprem regras, conversas paralelas, bullying.” (Tânia); “Falta
de limites nas séries do ensino fundamental, como deboches” (Simone).
Lopes Neto (2005, p. 165) estuda o bullying como um dos efeitos causadores da
violência escolar:
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A agressividade nas escolas é um problema universal. O bullying e a vitimização


representam diferentes tipos de envolvimento em situações de violência durante a
infância e adolescência. O bullying diz respeito a uma forma de afirmação de poder
interpessoal através da agressão. A vitimização ocorre quando uma pessoa é feita de
receptor do comportamento agressivo de uma outra mais poderosa. Tanto o bullying
como a vitimização têm consequências negativas imediatas e tardias sobre todos os
envolvidos: agressores, vítimas e observadores. Por definição, bullying compreende
todas as atitudes agressivas, intencionais e repetidas, que ocorrem sem motivação
evidente, adotadas por um ou mais estudante contra outro(s), causando dor e
angústia, sendo executadas dentro de uma relação desigual de poder.

Manuela, Maria e Ivone comentaram que as dificuldades enfrentadas com a disciplina


são o maior problema com os alunos: “Indisciplina, muita conversa, falta de respeito do aluno
com o professor, conversas paralelas, levantam e saem da sala de aula” (Maria); “Indisciplina
generalizada dos alunos falta de domínio em sala de aula” (Ivone). Essa falta de respeito pode
transformar-se em agressão.
Segundo Bottini (2009, p. 53):

Percebe-se que a autoridade já não representa uma ordem a ser seguida, esta é
questionada e desautorizada, e que questionamento a ser feito é como exigir respeito
à autoridade de criança e adolescente que não respeitam. Essa é uma forma das
indagações importantes, uma vez que pais têm problemas para exercer seu papel de
autoridade diante dos filhos, levando concomitantemente à falta de limites e
respeito.

Entretanto, apesar da violência na escola ser reflexo da violência social, somente um


professor diz: “Não tem estímulo por partes dos pais, negligência dos pais com a escola”.
(Lucas). Este fato foi comprovado noutras falas de professores estaduais como vemos na
pesquisa de Strehl (2010, p. 119): “não existe apoio psicológico para o professor, existem pais
ausentes, alunos, de modo geral, agressivos, desanimados, sem respeito pelo professor; falta
incentiva para o aperfeiçoamento do professor, falta material didático”.
Embora seja uma fala apenas, é bastante relevante. Cabe levantar a pergunta: por que
os demais professores nem mencionam os pais como parte da comunidade escolar? Será que
já “internalizaram” a ideia de que os pais ficam mesmo de fora? Não há comprovação através
dos entrevistados sobre a participação dos pais no ambiente escolar.

4.3 Motivos e dificuldades para procurar atendimento na área da saúde

Os professores falaram que um dos motivos que os levaram a procurar atendimento na


área de saúde foi o estresse. Estresse é qualquer reação psicológica ou física às mudanças.
Mente e corpo reagem com ansiedade, diferentes sentimentos e dor. Simone, Manuela, Luiza
17

falaram que um dos motivos que as levaram a procurar atendimento na área de saúde foi o
estresse. Seyle foi o primeiro médico a falar no assunto, para definir um conjunto de situações
que a pessoa vive para se adaptar ao mundo.
Segundo Rodrigues e França (2010, p. 117): “Na verdade, a todo instante estamos
fazendo movimentos de adaptação, ou seja, tentativas de nos ajustarmos às mais diferentes
exigências, seja do ambiente externo, seja do mundo interno [...]”. Ainda, soma-se a inclusão
de pessoas com necessidades especiais que precisam de atendimento personalizado como
vemos na fala seguinte: “Muitas turmas com necessidades” (Simone).
Observa-se, na fala dos professores, que a sobrecarga de trabalho também provoca
dificuldades de conciliar vida pessoal e serviço: “O que me levou a procurar ajuda clínica foi
o fato de sobrecarga das horas de trabalho com o nascimento da segunda filha” (Luiza);
“Excesso de responsabilidade com a escola e com a vida” (Maria). O caso de Manuela é
diferente porque ela falou da discriminação dos colegas de trabalho “por causa dos quatros
filhos que são usuários de drogas e outros problemas familiares.” Dois professores
comentaram de modo amplo em “problemas na escola e com as turmas, indisciplina, falta de
respeito”. Ao fazer a entrevista percebeu-se o cansaço no rosto desses profissionais podendo
prejudicar a relação com os alunos.
Segundo Codo e Vasques-Menezes (1999, p. 242):

A despersonalização ocorre quando o vínculo afetivo é substituído por um racional.


Podemos entender despersonalização como a perda do sentimento de que estamos
lidando com outro ser humano. É um estado psíquico em que prevalece o cinismo ou
dissimulação afetiva, a crítica exacerbada de tudo e de todos os demais e do meio
ambiente ( integração social). O professor começa a desenvolver atitudes negativas,
críticas em relação aos alunos, atribuindo-lhes o seu próprio fracasso. O trabalho
passa a ser lido pelo seu valor de troca; é a “coisificação” do outro ponto da relação,
ou seja, o aluno, em nosso caso específico, sendo tratado como objeto, de forma fria.

É necessário destacar que dos oito professores entrevistados, seis apresentaram


problemas psicológicos: “Esgotamento físico e psicológico” (Luiza); “depressão” (Lucas);
“Angústia, dificuldade de raciocínio, choro, tristeza, sentimentos de impotência, há 16 anos
que tenho depressão. Eu tive anorexia e depressão em 1990, meu sintoma era que me sentia
perseguida, pensamentos fixos na mente de que tinha gente me seguindo” (Tânia). “Me
sentia-me cansada e com desânimo. Não tinha sono, dormia duas horas por noite, sentia
tristeza, angústia, desânimo, raiva, não tinha tolerância, e sempre bem ansiosa, a primeira vez
que me aconteceu já faz 12 anos” (Maria). “Depressão (somatório de outros sintomas),
pânico, angustia, tristeza, falta de coragem para enfrentar o dia-a-dia” (Ivone); “Depressão”
18

(Simone). Professores em estado de esgotamento físico e mental podem apresentar Síndrome


de Burnout e isso pode impedir o seu envolvimento com os problemas dos alunos e suas
dificuldades de aprendizagem:
Ainda, de acordo com Codo e Vasques-Menezes (1999, p. 242):

As relações interpessoais são cortadas, como se ele estivesse em contato apenas com
objetos, ou seja, a relação torna-se desprovidas de calor humano. Isso acrescido de
uma grande irritabilidade por parte do profissional, este quadro torna qualquer
processo de ensino-aprendizagem, que se pretenda afetivo, completamente inviável.
Por um lado, o professor torna-se incapaz do mínimo de empatia necessária para a
transmissão do conhecimento e, de outro, ele sofre: ansiedade, melancolia, baixa
auto-estima, sentimentos de exaustão física e emocional.

Não somente problemas psicológicos foram relatados pelos docentes. Três apresentam
também problemas físicos, havendo uma possibilidade de somatização. Marta falou da
disfonia “dificuldade de falar e falta da voz”. Os órgãos envolvidos na produção da fala e
linguagem não têm como função precípua produzir a voz; todos se incubem de funções mais
essenciais à sobrevivência, como a respiração, a mastigação e a deglutição; nem mesmo a
laringe, trecho pequeno do tubo de passagem do ar inspirado e expirado, tem a função
exclusiva de produzir a voz (RIBEIRO, 2010, p. 59). Os profissionais de sala de aula que
seus transtornos de voz têm relação com o trabalho, como laringite crônica, pólipos, nódulos e
câncer estão sendo mais prontamente atendidos e melhoraram o acesso aos serviços médicos
para tratar os transtornos da voz.
Ivone possui variação na pressão por causa do estresse. Ela disse: “tenho pressão alta,
enxaqueca, depressão e pânico”. De acordo com Weiss (2006, p. 10): “A epinefrina e a
norepinefrina aumentam a pressão arterial e a frequência cardíaca, desviam o sangue do
sistema gastrointestinal para os músculos e aceleram o tempo de reação”. Lucas, pelo mesmo
motivo, se queixou de “dor nas mãos, tendinite no braço direito, dor nas costas e braço
esquerdo”. Para o mesmo autor (WEISS, 2006, p. 11): “Uma ativação em longo prazo do eixo
HPA4 causa doenças crônicas nocivas, físicas e psicológicas, como problemas cardíacos,
úlceras, obesidade, abuso do uso de drogas, depressão, enfraquecimento do sistema
imunológico, entre outras”.
O terceiro motivo foi dito por três professores e se refere a problemas pessoais e
familiares sejam por causa de doença ou crise financeira: “Problemas pessoais de saúde e
familiar” (Lucas); “Problemas financeiros que atingem muito” (Maria); “Problemas

4
O circuito completo de secreção de substâncias químicas e hormônios é conhecido o eixo HPA, esta sigla
indica hipotalâmico-pituitário-adrenal.
19

familiares, cinco filhos, sendo que o filho caçula não usa drogas, e os outros são usuários No
ano de 2000, tive dificuldades financeiras e também por discriminação dos colegas”
(Manuela). Os docentes falam dos seus problemas e da baixa autoestima que lhes produz
serem tão mal remunerados.

4.4 A percepção dos docentes sobre o psicólogo escolar

Todos os professores entendem que um profissional da psicologia pode lhes auxiliar.


Cinco veem o psicólogo escolar como um suporte ao professor. Suporte para ele poder lidar
com os alunos e/ou com a rotina de trabalho: “Para ajudar na pressão que sofre” (Luiza).
“Sim, porque alguns problemas enfrentados pelos alunos fogem da área da educação o que
torna o professor impotente” (Marta). “ Sim, o professor hoje necessita de acompanhamento
psicológico para suportar a carga” (Maria). “Sim, é um profissional muito importante no
quadro escolar, servindo de apoio psicológico nas crises existenciais de trabalho” (Ivone). “Se
existisse seria muito procurado por vários profissionais, pois muitos fazem uso de medicação
para depressão ou já fizeram, ele poderia nos momentos de algum período vago conversar
conosco, seria muito importante” (Simone). O psicólogo escolar poderia ajudar tanto os
docentes como os alunos nos momentos de angustia.
Sobre essas questões Cassins et al. (2007, p. 17) escrevem:

A psicologia Escolar tem como referencia conhecimentos científicos sobre


desenvolvimento emocional, cognitivo e social, utilizando-os para compreender os
processos e estilos de aprendizagem e direcionar a equipe educativa na busca de um
constante aperfeiçoamento do processo ensino/aprendizagem. Sua participação na
equipe multidisciplinar é fundamental para respaldá-la com conhecimento e
experiências cientificas atualizada na tomada de decisões de base, como a
distribuição apropriada de conteúdos programáticos (de acordo com as fases de
desenvolvimento humano), seleção de estratégias de manejo de turma, apoio ao
professor no trabalho com a heterogeneidade presente na sala de aula,
desenvolvimento de técnicas inclusivas para alunos com dificuldades de
aprendizagem e/ou comportamentais, programas de desenvolvimento de habilidades
sociais e outras questões relevantes no dia-dia da sala de aula, nas quais os fatores
psicológicos tenham papel preponderante.

Isto é reforçado por três entrevistados que afirmam ver o psicólogo escolar como um
suporte a professores e alunos concomitantemente: “Sim, acho que toda escola teria que ter
um psicólogo para contornar a situação, e prestar atendimento aos professores e alunos”
(Tânia); “Sim, o psicólogo, na escola, é muito importante. Ajudaria os alunos e os
professores” (Manuela); “Sim, um psicólogo na escola poderia ajudar muito os alunos e
professores, que o psicólogo auxiliar as dúvidas dos alunos e professores, esclarecer dando
20

palestras” (Maria). Percebe-se que os docentes necessitam de um profissional da psicologia na


escola para assessorar na construção do projeto pedagógico, apoiar o trabalho de resgate do
valor do professor, auxiliar na articulação entre a teoria de aprendizagem adotada e a prática
pedagógica, conscientizar pais sobre necessidades básicas de crianças e adolescentes e
também “[...] mobilizar a comunidade educacional em torno da proposta de intervenção com
utilização de recursos da comunidade, pesquisar, desenvolver, aplicar e divulgar os
conhecimentos relacionados com psicologia escolar/educacional” (CASSINS et al., 2007, p.
25).
Todos os professores falam da necessidade do psicólogo escolar. Mas somente um dá
ideias de como o trabalho pode ser executado: “Sim, conversando, trocando ideias
dialogando, ouvindo, interagindo, trabalhando com as turmas” (Lucas). Este docente está
preocupado com a formação dos alunos em sala de aula e com a participação da comunidade
escolar, principalmente os familiares. Assim, ele está sugerindo palestras, diálogo, orientações
a pais e familiares que cuidam das crianças, etc. O autor referido destaca a participação do
psicólogo escolar em atividades que auxiliem a escola a cumprir suas finalidades sociais, em
especial, na busca do fortalecimento do elo família-escola, através de programas que
promovam o desenvolvimento de habilidades sociais significativas e da promoção de
atividades que estimulem a criatividade e o desenvolvimento dos potenciais pessoais e
coletivos (CASSINS et al., 2007).

5 Considerações finais

Considera-se que o problema de pesquisa foi respondido porque os professores da


escola pública estadual que foram entrevistados percebem o mal-estar docente. Sentem que
precisam da intervenção do psicólogo escolar, apesar de que somente um deles ofereceu
alternativas que podem ser desenvolvidas para a melhoria da saúde mental de professores e
alunos promovendo qualidade de vida.
O objetivo geral foi atingido ao entender as percepções dos professores acerca do mal-
estar docente e identificar as principais queixas tendo como alternativa a procura por um
tratamento psicológico ou médico. E os objetivos específicos também foram alcançados uma
vez que foi possível identificar as principais doenças psicossomáticas enfrentadas pelos
participantes, assim como muitos dos problemas de tipo estritamente psíquico. Foi possível
perceber, por meio da pesquisa, de que os professores entendem o mal-estar docente como um
21

produto do estresse causado pelos anseios e dificuldades enfrentados em sala de aula, mas não
só, também incluem-se problemas familiares e financeiros.
Finalmente, ante o desafio de propor alternativas de tratamento com a colaboração do
psicólogo escolar, sugere-se que seja realizado um projeto que, além de definir atividades de
apoio educacional ou atualização pedagógica, possa propor outros momentos específicos de
intervenção para tentar resolver dificuldades individuais e grupais que contribuam com o
bem-estar dos professores e com a convivência entre eles e seus alunos. Também, seria
preciso agir mais firmemente em relação aos alunos mais vulneráveis, porque, certamente, o
acompanhamento individual ou grupal de contenção da violência, na escola, e de prevenção
ao uso de drogas, poderá ajudar no momento em que acontecem as crises para posterior
encaminhamento ao profissional competente. Isto poderá refletir na relação entre os alunos e
dos alunos com os professores facilitando o convívio de todos.
Quanto à experiência como pesquisador, foi possível perceber que, além de conhecer
mais de perto as demandas que há dentro da escola, também foi importante entender as
necessidades dos professores e atrever-se a sugerir algumas participações mais efetivas do
psicólogo escolar na rede pública estadual. Um mundo até agora, completamente,
desconhecido.

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Pedagógicos, v. 89, n. 221, p.103-118, jan./abr. 2008.

WEISS, B. Eliminando o estresse. Rio de Janeiro: Sextante, 2006.


24

APÊNDICE - ROTEIRO DE ENTREVISTA SEMIDIRIGIDA

DADOS DE IDENTIFICAÇÃO:

Nome:
Nome fictício:
Idade:
Sexo:
Religião:
Estado civil:
Escolaridade:
Magistério:
Graduação:
Pós-graduação:
Atividade:
Naturalidade:
Endereço:
Bairro;
Telefone:

A ENTREVISTA:

Local:
Peculiaridade do local:
Carga horária semanal:
Turnos de trabalho:
Níveis de escolaridade ministrados:
Disciplinas ministradas:
Número de alunos atendidos:
Atitudes do entrevistado:
Observações complementares:
Duração da entrevista:
Questões para os entrevistados:

1. Quais as dificuldades que você tem enfrentado em seu ambiente de trabalho?


2. O que você entende por mal-estar docente?
3. Qual motivo que levou você a procurar um profissional da saúde?
4. Você considera que o psicólogo escolar poderia auxiliá-lo nas suas dificuldades? Como?

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