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A Lógica Moderna começou no século XVII com o filósofo e matemático alemão Gottfried
Wilhelm Leibniz. Seus estudos influenciaram, 200 anos mais tarde, vários ramos da Lógica
Matemática moderna e outras áreas relacionadas, como por exemplo a Cibernética (Norbert
Wiener dizia que se fosse escolher na História da Ciência um patrono para a Cibernética,
elegeria Leibniz" 78).
Entre outras coisas, Leibniz queria dotar a Metafísica (aquela parte da Filosofia que estuda o
"ser" em si) de um instrumento suficientemente poderoso que a permitisse alcançar o mesmo
grau de rigor que tinha alcançado a Matemática. Parecia-lhe que o problema das interrogações
e polêmicas não resolvidas nas discussões filosóficas, assim como a insegurança dos
resultados, eram fundamentalmente imputáveis à ambiguidade dos termos e dos processos
conclusivos da linguagem ordinária. Leibnz viu surgir a idéia central de sua nova lógica
precisamente como projeto de criação de uma lógica simbólica e de caráter completamente
calculístico, análogos aos procedimentos matemáticos.
Historicamente falando, tal idéia já vinha sendo amadurecida, depois dos rápidos
desenvolvimentos da Matemática nos séculos XVI e XVII, possibilitados pela introdução do
simbolismo. Os algebristas italianos do século XVI já tinham encontrado a fórmula geral para
a resolução das equações de terceiro e quarto graus, oferecendo à Matemática um método
geral que tinha sido exaustivamente buscado pelos antigos e pelos árabes medievais.
Descartes e Fermat criaram a geometria analítica, e, depois de iniciado por Galileu, o cálculo
infinitesimal desenvolveu-se com grande rapidez, graças a Newton e ao próprio Leibniz. Ou
seja, as matemáticas romperam uma tradição multisecular que as havia encerrado no âmbito
da geometria, e se estava construindo um simbolismo cada vez mais manipulável e seguro,
capaz de funcionar de uma maneira, por assim dizer, mecânica e automática, sujeito a
operações que, no fundo, não eram mais do que regras para manipulação de símbolos, sem
necessidade de fazer uma contínua referência a conteúdos geométricos intuitivos.
Leibniz deu-se conta de tudo isto e concebeu, também para a dedução lógica, uma
desvinculação análoga com respeito ao conteúdo semântico das proposições, a qual além de
aliviar o processo de inferência do esforço de manter presente o significado e as condições de
verdade da argumentação, pusesse a dedução a salvo da fácil influência que sobre ela pode
exercer o aspecto material das proposições. Deste modo coube a Leibniz a descoberta da
verdadeira natureza do "cálculo" em geral, além de aproveitar pela primeira vez a
oportunidade de reduzir as regras da dedução lógica a meras regras de cálculo, isto é, a regras
cuja aplicação possa prescindir da consideração do conteúdo semântico das expressões.
Na visão de Leibniz a linguagem universal deveria ser como a Álgebra ou como uma versão
dos ideogramas chineses: uma coleção de sinais básicos que padronizassem noções simples
não analíticas. Noções mais complexas teriam seu significado através de construções
apropriadas envolvendo sinais básicos, que iriam assim refletir a estrutura das noções
complexas e, na análise final, a realidade. O uso de numerais para representar noções não
analíticas poderia tornar possível que as verdades de qualquer ciência pudessem ser
"calculadas" por operações aritméticas, desde que formuladas na referida linguagem universal
22, volume XI. Conforme o próprio Leibniz, "(...) quando aparecer uma controvérsia, já não
haverá necessidade de uma disputa entre dois filósofos mais do que a que há entre dois
calculistas. Bastará, com efeito, tomar a pena na mão, sentar-se à mesa (ad abacus) e (ao
convite de um amigo, se se deseja), dizer um ao outro: Calculemos!" 6.
Interessa também chamar a atenção sobre a idéia de uma linguagem artificial que já aparece
em Leibniz. Como já foi dito, ele captou muito bem as inúmeras ambigüidades a que estão
submetidas as linguagens de comunicação ordinárias e as vantagens que apresentam os
símbolos (que ele chamava notae) da Aritmética e Álgebra, ciências nas quais a dedução
consiste no emprego de caracteres. Ao querer dar à Lógica uma linguagem livre de
ambigüidades e ao procurar associar a cada idéia um sinal e obter a solução de todos os
problemas mediante a combinação destes sinais, Leibniz acabou provocando um novo
desenvolvimento da própria lógica.
Talvez se pudesse perguntar como é possível que muitos apresentem a Lógica Simbólica
como fruto do nosso tempo, enquanto teve sua origem na segunda metade do século XVII. É
que, na realidade, a aportação de Leibniz ficou substancialmente reduzida a um mero
programa, do qual só executou alguns fragmentos, muito parciais se bem que muito
interessantes também, capazes de nos dar uma idéia de como concebia sua obra. Nem sequer
seus seguidores diretos levaram para a frente a construção do cálculo lógico mais além de um
nível muito rudimentar. Provavelmente a excessiva magnitude do plano de sua characteritica
universalis o tenha seduzido, afastando Leibniz de objetivos mais modestos porém
alcançáveis, como o de construir o primeiro cálculo lógico autêntico.