Disciplina de Direito Civil V Discente: Othon Luís Sales Fortunato
Da responsabilidade civil do transportador em caso de assaltos aos
passageiros O transportador possui com os passageiros uma relação de consumo regida pelo Código de Defesa do Consumidor, e por isso tem responsabilidade pela incolumidade do passageiro, devendo garantir que o levará a seu destino são e salvo. Infelizmente a violência é rotina em todos os Municípios brasileiros, visto em menor ou maior proporção, mas sempre presente. Retrata a realidade da falta de segurança pública, sendo fato que tira a paz social e alimenta o medo entre a população. Dentre as espécies de violência mais notadas estão os roubos (realizado mediante violência ou grave ameaça à pessoa) e furtos (subtração para si ou para outrem de coisa alheia móvel, de forma sorrateira, sem ser percebido). Ocorrem das formas mais variadas e até por vezes inusitadas, demonstrando a audácia de seus agentes ativos (aquele que realiza a conduta criminosa). Uma forma de roubo que causa grande pânico é a realizada dentro de transporte coletivo, seja urbano, intermunicipal ou interestadual, pois deixa as vítimas fragilizadas e sem qualquer possibilidade de defesa, haja vista estar ‘presa’ dentro de um veículo. Mas de quem é a responsabilidade quando ocorrem os roubos dentro de veículos coletivos? A empresa de transporte possui responsabilidades? No tocante a responsabilidade civil, consta no art. 14 do CDC que: “O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”. Assim, certo que a responsabilidade do transportador é, via de regra, objetiva e, para que o passageiro receba indenização, deve provar que a incolumidade não lhe foi garantida, que o dano ocorreu, que o acidente se deu durante o transporte e que há nexo de causalidade entre o dano e o transporte. Entretanto, há exceções. Pelas disposições do Código Civil de 2002 e do Código de Defesa do Consumidor, percebe-se que são causas excludentes da responsabilidade civil do transportador: caso fortuito ou força maior (art. 734, CC e § 3º, art. 14, CDC), fato causado por terceiro (art. 735, CC) ou culpa exclusiva da vítima (art. 738, CC), e, ainda, a inexistência do dano (§ 3º, art. 14, CDC). O caso fortuito é classificado em interno e externo. Em breves palavras, por fortuito interno entende-se aquele decorrente da realização da atividade regular da empresa, se relaciona com os riscos naturais da atividade e, por outro lado, o fortuito externo, no qual se enquadra o roubo, é aquele totalmente alheio à organização da empresa e suas atividades. O fortuito externo, ao contrário do interno, afasta a responsabilidade do transportador, por ser estranho à atividade desenvolvida pela empresa. Pois bem, por mais injusto que possa parecer, a vítima não terá êxito em cobrar da empresa de transporte reparação pelo roubo de seus objetos durante uma viagem, posto que a empresa não possui como finalidade a proteção patrimonial e, no caso, será considerada tão vítima quanto os passageiros.
Extravio de Bagagem gera responsabilidade Civil?
A perda ou extravio de bagagem causa prejuízos de ordem material e moral, atraindo o
dever de reparação pelo transportador. O dano moral, em razão de sua natureza in re ipsa, afasta a exigência de sua comprovação, bastando a demonstração do fato, cujos efeitos são capazes de violar a dignidade, a privacidade, a imagem ou a moral da pessoa ou de produzir abalo psicológico relevante. Dessa forma, o extravio de bagagem não pode ser considerado mero dissabor, uma vez que configura situação capaz de ensejar violação aos direitos da personalidade do consumidor, porquanto experimentou transtornos e aborrecimentos indevidos que extrapolam a frustração cotidiana.
Extravio de Bagagem em viagem internacional é regido por qual
legislação?
Conflitos relativos à relação de consumo em transporte internacional de passageiros
devem ser resolvidos segundo as regras estabelecidas nas convenções internacionais que tratam do assunto, tais como as convenções de Varsóvia e Montreal, e não pelo CDC. Isso ficou definido, por maioria, no plenário do Supremo Tribunal Federal ao julgar dois REs com repercussão geral reconhecida. O julgamento conjunto havia sido suspenso em 2014 após pedido de vista da ministra Rosa Weber e foi retomado no dia 25 de maio de 2017. Seguindo o que estabelece o art. 178 da CF, prevaleceram as teses dos relatores, ministro Gilmar e ministro Barroso. Inicialmente, nos casos de extravio ou destruição de bagagem, só ficam as companhias obrigadas a indenizar pelos danos materiais, e não também pelos danos morais, como prevê o CDC. Também pela tese fixada, o prazo de prescrição é de dois anos, e não os cinco previstos na norma consumerista.
O relator votou, em 2014, no sentido de que, por se tratarem de relação de
consumo específica – transporte internacional de passageiros –, as convenções internacionais ratificadas pelo Brasil têm status de norma especial, tendo prevalência sobre o CDC, que ganha contorno de norma geral por tratar de relações genéricas de consumo.
Segundo o ministro Gilmar Mendes, o preceito da defesa do consumidor não é o
único mandamento constitucional que deve ser examinado neste caso. Ele lembrou que a CF também prevê a manutenção da ordem econômica e a observância aos acordos internacionais. Seguiram o entendimento os ministros Luís Roberto Barroso e Teori Zavascki.
MARQUES, Claúdia Lima. Superação das Antinomias pelo Diálogo das Fontes. O modelo brasileiro de coexistência entre o código de defesa do consumidor e o código civil de 2002. In Revista da ESMESE. Aracajú, n. 07, doutrina.pdf