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Educação e Pesquisa, São Paulo, v.37, n.1, 220p. 15-33, jan./abr. 2011 15
The contribution of quality early childhood education and
its impacts on the beginning of fundamental education1
Abstract
16 Educação e Pesquisa, São Paulo, v.37, n.1, 220p. 15-33, jan./abr. 2011
Os novos marcos legais, instituídos a no caso das creches. As pesquisas revelam tam-
partir da Constituição Federal de 1988, re- bém que as diferenças de qualidade se combinam
forçaram e deram legitimidade aos processos com as diferenças sociais e regionais, fazendo
de expansão do atendimento educacional às com que, tal como o acesso, a qualidade do
crianças entre 0 e 6 anos, que já vinham atendimento seja distribuída desigualmente entre
ocorrendo em anos anteriores, passando a diferentes segmentos da população (Ipea, 2009).
ser, a educação infantil (EI), definida como Do ponto de vista do currículo e da
primeira etapa da educação básica. A res- orientação pedagógica, o que se observa é uma
ponsabilidade atribuída aos municípios, de grande heterogeneidade nas condições de fun-
oferecer esse atendimento com prioridade, cionamento e nos métodos de trabalho adotados
apressou uma tendência que também já vinha com as crianças, com repercussões na qualidade
se delineando no período anterior. Embora do atendimento oferecido. A situação encon-
sem caráter compulsório, a EI foi definida trada nas creches é geralmente pior do que nas
como um direito das crianças e das famílias, pré-escolas (Unesco/OECD, 2005a; 2005b).
sendo o Estado obrigado a ofertá-la de acordo Levando em conta esse cenário da EI no
com a demanda. Brasil, que comporta tantos desafios para as
A partir de 2000, diversas mudanças políticas públicas, esta pesquisa foi planejada
foram introduzidas nesse quadro legal, fazendo de maneira a contemplar os seguintes objetivos:
com que as redes educacionais, que ainda esta-
vam se ajustando aos parâmetros definidos na I. Avaliar a qualidade de 150 instituições de
Lei de Diretrizes e Bases (LDB) de 1996, tivessem EI em seis capitais brasileiras: Belém, Campo
de, ao mesmo tempo, implantar significativas Grande, Florianópolis, Fortaleza, Rio de Janeiro
mudanças na organização da educação básica. e Teresina (estudo da qualidade).
Entre as medidas previstas na LDB, que estavam II. Estimar o impacto da frequência a creches e
apenas parcialmente implantadas, estão a incor- pré-escolas no desempenho dos alunos no início
poração das creches aos sistemas educacionais do EF em três dessas capitais: Campo Grande,
e a formação dos professores em nível superior Florianópolis e Teresina (estudo de impacto).
ou, no mínimo, no nível médio. III. Caracterizar a política municipal de EI nas
Esta pesquisa foi desenvolvida justa- seis capitais mencionadas.
mente nessa fase, em que sucessivas mudanças
legais impactaram diretamente a EI, a qual Neste artigo, será focalizado, em especial,
ainda não havia consolidado nem mesmo a o estudo de impacto (objetivo II). No entanto,
organização definida na LDB. A uma transição para compreender os caminhos percorridos pelo
em processo, vieram se somar: a antecipação da estudo de impacto, se inclui uma descrição do
idade de ingresso na primeira série de 7 para 6 estudo de qualidade, destacando aqueles aspectos
anos, a implantação da escola de nove anos, a que serviram de suporte para a realização e aná-
criação do Fundeb e a nova definição da obri- lise de dados do estudo de impacto (objetivo I).
gatoriedade escolar a partir dos 4 anos de idade. Introduzindo o relato da pesquisa, o ar-
A despeito dos avanços conquistados pelo tigo apresenta uma revisão da literatura sobre o
país na EI, tanto no que se refere à expansão do impacto da EI no EF; em seguida, descreve os
acesso, como nas orientações legais, que defi- principais procedimentos e resultados do estudo
niram padrões de atendimento mais exigentes de qualidade e do estudo de impacto, finalizando
para creches e pré-escolas, os dados disponíveis com considerações acerca dos resultados da pes-
indicam que muitas dessas diretrizes não estão quisa e indicações consideradas relevantes para
plenamente traduzidas na prática, especialmente as políticas educacionais.
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O impacto da frequência à educação mas de inovação no ensino básico adotados na
infantil nos resultados de aprendizagem rede estadual de São Paulo a partir da década
no ensino fundamental de 1980. O estudo acompanhou uma amostra de
3.600 crianças durante três anos, a partir de seu
A oportunidade de acesso à EI de qua- ingresso na primeira série. A análise de regres-
lidade é um direito da criança e constitui um são múltipla mostrou que a variável “frequência
benefício que não pode ser medido somente por à pré-escola” foi a que mostrou maior impacto
resultados futuros, mas principalmente pelas sobre as notas obtidas pelas crianças nas provas
vivências que proporciona à criança naquela de linguagem e matemática, em três momentos
fase de sua vida. Entretanto, do ponto de vista da trajetória escolar (Fundação Carlos Chagas,
das políticas públicas, especialmente em um país 1995, apud Campos, 1997, p. 124).
como o Brasil, onde os indicadores educacionais Barnett e Boocock (1998) organizaram
revelam a persistência de déficits importantes na um conjunto de textos que relatam pesquisas
escolaridade básica da população, o debate sobre realizadas em diversos países, sobre os efeitos da
o impacto da EI na escolaridade futura ganha frequência a programas de educação e cuidado
sentido e compõe uma gama de questões a serem infantil no desenvolvimento cognitivo e social de
mais bem pesquisadas no contexto brasileiro. crianças pequenas, avaliando os impactos sobre
A literatura especializada registra um seus resultados escolares e desempenho social. Os
grande acervo de pesquisas que procuraram capítulos do livro cobrem, em detalhes, estudos
avaliar o impacto da EI na continuidade da es- realizados nos Estados Unidos, em outros países
colaridade. A maior parte procurou medir os re- desenvolvidos e também em países em desenvol-
sultados da frequência a programas de educação vimento, como, por exemplo, a Índia.
pré-escolar, e um número menor desses estudos Muitos desses estudos procuraram não só
incluiu também as creches em suas avaliações. medir os impactos da frequência a programas
Em artigo publicado em 1997, Campos diversos, mas também exploraram as diferenças
(1997) resumiu os resultados de várias dessas nos resultados que podem ser atribuídas ao for-
pesquisas, realizadas em países da América Latina, mato, ao modelo pedagógico, às modalidades de
Europa e Estados Unidos. Na maioria das inves- apoio às famílias, aos fatores associados à qua-
tigações, foi constatado o impacto positivo da lidade – formação dos professores, razão adulto/
frequência à pré-escola sobre os resultados obtidos criança, infraestrutura – entre outros aspectos.
pelas crianças na continuidade de sua escolari- Na maioria das pesquisas citadas, foi
dade. A duração desse impacto variou, conforme registrado um impacto positivo no desempenho
o estudo considerado, desde os primeiros anos cognitivo das crianças ao final dos programas
da escola primária até a vida adulta, segundo o e também posteriormente, ao longo de sua
conhecido estudo longitudinal que acompanhou carreira escolar. Esses efeitos puderam ser
os egressos do projeto Perry Preschool. comprovados tanto em programas-piloto, cria-
Para as creches, os resultados de duas pesqui- dos especialmente para o desenvolvimento das
sas longitudinais desenvolvidas nos Estados Unidos pesquisas, como em programas governamentais
mostraram o impacto positivo da frequência a creches de larga escala, nos Estados Unidos (Barnett,
de boa qualidade e a importância das relações da 1998) e em outros países (Boocock e Larner,
instituição com as famílias para se alcançar bons re- 1998). O impacto é mais acentuado para os
sultados com as crianças (Campos, 1997, p. 117-121). grupos de crianças de nível socioeconômico
Um dos estudos cobertos nessa revisão, a mais baixo (Frede, 1998).
pesquisa realizada na Fundação Carlos Chagas Os resultados do Programme for Interna-
com apoio do Banco Mundial, avaliou progra- tional Student Assessment – PISA 2003 mostram
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apresentadas pela escola primária para acolher impacto não foi realizado, isto é, Rio de Janeiro,
adequadamente as crianças egressas da EI (Moss, Fortaleza e Belém, 20 instituições municipais,
2008). Outra importante mudança em relação ao privadas e conveniadas foram selecionadas
entendimento que se tinha sobre a prontidão se para a avaliação de qualidade, totalizando 60
deve à influência das teorias de Vigotski, segun- instituições; e nas cidades onde o estudo de
do as quais, no lugar de se esperar que a criança impacto ocorreu (Campo Grande, Florianópolis
atinja determinado nível de desenvolvimento e Teresina), 30 instituições municipais foram
para introduzi-la a novas etapas educacionais, selecionadas, totalizando 90 instituições.
deve-se oferecer a ela oportunidades de participar A seleção destas instituições foi realizada
de ambientes educativos onde seus pares e os por meio de amostragem utilizando o banco de
adultos alimentem seu desenvolvimento e sua dados do Censo Escolar de 2008, fornecido pelo
aprendizagem (Kagan, 2007). MEC/Inep (Brasil, 2008), e dados do IBGE sobre
Tudo isso reforça a importância de se as áreas de localização das escolas, levando em
considerar a qualidade das experiências educa- consideração as seguintes variáveis: dependência
tivas vividas pelas crianças na etapa anterior ao administrativa da instituição; tipo de estabele-
EF, o tipo de transição que ocorre no momento cimento; número de alunos; período de aten-
do ingresso na primeira série e a qualidade da dimento; localização em bairros/distritos e Ideb
educação oferecida pela escola de EF no mo- médio das escolas de EF situadas no entorno das
mento da avaliação dos resultados escolares. instituições de EI.
Assim, hoje, a prontidão é entendida Foram avaliadas 147 instituições (três não
como um conceito multidimensional, engloban- puderam participar e não houve tempo para subs-
do a prontidão de famílias, escolas e comuni- tituí-las), sendo 102 (69,4%) municipais, 23 (15,6%)
dades (Kagan, 2007). Como indica Moss (2008), privadas particulares e 22 (15,0%) privadas con-
não importa somente exigir da EI que prepare veniadas com o poder público. Quanto ao tipo de
as crianças para a escola primária, mas também atendimento, 93 (63,3%) atendiam exclusivamente
pedir às escolas que se tornem receptivas às crianças da EI e 54 (36,7%) tinham matrículas
crianças que nelas ingressam. também nos demais segmentos do ensino.
Essas são questões que afetam direta- Em cada instituição era sorteada uma turma
mente a transição da EI para o EF, especial- de creche e/ou uma turma de pré-escola, onde foram
mente agora no Brasil, com a antecipação da aplicadas as escalas de observação selecionadas e
idade de início da primeira série de 7 para 6 adaptadas para a pesquisa; além disso, foram entrevis-
anos, com a implementação do EF de nove anos tadas as professoras responsáveis pela turma sorteada,
e com a adoção da obrigatoriedade a partir dos as coordenadoras pedagógicas – quando existentes no
4 anos de idade. estabelecimento – e os diretores ou diretoras.
Quadro 1 – Critérios de classificação e pontuação adotados A maior parte das turmas de pré-escola
avaliadas (42,0%) obteve pontuações entre 3 e
Classificação Total de pontos
5 pontos, correspondente ao nível de qualidade
Inadequado 1 |-------3 básico. Uma porcentagem significativa (30,4%)
Básico 3 |-------5 apresentou pontuações entre 1 e 3 pontos, cor-
Adequado 5 |-------7 respondente ao nível de qualidade inadequado.
Como adequado foram classificadas 23,9% das
Bom 7 |-------8,5
turmas e como bom, apenas 3,6% das turmas
Excelente 8,5|-------10 pesquisadas (Gráfico 2).
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Gráfico 2 – Distribuição percentual das turmas de pré-escola crianças; as crianças conhecerem bem as regras
com pontuações nos diferentes níveis da escala ECERS-R de segurança; haver bom equilíbrio entre o falar e
o ouvir; não se trabalhar matemática de maneira
45,0% mecânica e repetitiva; a expressão individual ser
42,0%
40,0% mais respeitada; brinquedos, materiais, equipa-
35,0% mentos e roupas estarem mais acessíveis para as
30,4%
30,0% crianças brincarem de faz de conta; haver maior
25,0% 23,9% quantidade de materiais para motricidade fina;
20,0%
não haver espera longa por parte das crianças en-
tre os acontecimentos diários e existirem maiores
15,0%
oportunidades para as crianças escolherem seus
10,0%
pares nas brincadeiras e atividades.
5,0% 3,6%
0,0% O estudo de impacto: metodologia e
1a3 3a5 5a7 7 a 8.5
Inadequado Básico Adequado Bom principais resultados
A Provinha Brasil
Nas capitais onde foi realizado o estudo
de impacto, a média de pontuação na escala foi um A Provinha Brasil é uma avaliação diag-
pouco mais alta do que a média geral: 3,7 pontos, nóstica do nível de alfabetização das crianças
com variação entre os três municípios (Tabela 1). matriculadas no segundo ano do EF das escolas
públicas brasileiras, aplicada no início e no final
Tabela 1 – Média geral para turmas de pré-escolas nas do ano letivo. O instrumento é elaborado pelo
três capitais Inep, sendo composto por 24 questões de múltipla
escolha, com quatro opções de resposta cada uma.
Turmas A prova é distribuída pelo MEC/FNDE para
Capitais
de pré-escola todas as secretarias de educação municipais, esta-
Campo Grande 3,6 duais e do Distrito Federal. Os objetivos principais
da aplicação dessa prova, conforme o Inep, são
Florianópolis 4,7
o de avaliar o nível de alfabetização dos alunos/
Teresina 2,7 turma nos anos iniciais do ensino fundamental e
diagnosticar possíveis insuficiências das habilida-
Média das
3,7 des de leitura e escrita. Para orientar a correção das
3 capitais
respostas e a interpretação dos resultados, o Inep
elabora e distribui para as secretarias um Guia de
Na comparação entre os municípios, deve- interpretação. Este permite estabelecer uma relação
se levar em conta as características regionais, que entre o número ou a média de acertos de um ou
são bem desiguais quanto ao financiamento e mais alunos e sua correspondência com os níveis
condições gerais de funcionamento das instituições. de desempenhos descritos da prova. Espera-se que
os resultados possibilitem intervenções com vistas
Uma análise dos itens que compõem as à correção de possíveis insuficiências apresentadas
subescalas indicou que, tanto nas creches como nas áreas de leitura e escrita.
nas pré-escolas que obtiveram as pontuações Os critérios definidos pelo Inep para iden-
mais altas, haveria maiores possibilidades de: tificar os níveis de desempenho dos alunos, em
a supervisão ser adequada durante o sono das 2009, estão resumidos no quadro 2.
a) pais dos alunos que cursavam o segundo ano • o rganização, a partir dos dados do Censo
do EF e haviam frequentado uma turma de EI de Escolar de 2008, de uma listagem contendo
uma das instituições avaliadas pela pesquisa, ou a relação nominal das crianças que haviam
de instituições de EI não avaliadas; frequentado, em 2007, uma das instituições de
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EI pertencentes à amostra do estudo, e identi- Considerando-se que uma das questões de
ficação das escolas de EF onde essas crianças interesse do estudo era verificar se não apenas a
estavam matriculadas em 2009; frequência, mas também a qualidade da EI estaria
• obtenção, junto às secretarias de educação associada ao desempenho do aluno no EF, alguns
dos municípios selecionados, dos resultados ajustes na amostra tiveram que ser feitos. Como
da aplicação da Provinha Brasil relativos aos a medida de qualidade da EI a ser utilizada foi
alunos das escolas de EF de interesse para o a da escala de pré-escola (ECERS-R), as crianças
estudo (escolas de “destino” das crianças); que fizeram apenas creche (115 casos) não foram
• identificação, em cada escola de EF, das tur- incluídas no estudo. Além disso, foram excluídos
mas que concentravam um maior número os alunos que frequentaram pré-escolas que não
de alunos que haviam frequentado a EI em haviam sido avaliadas pela pesquisa (279 casos).
uma das unidades da amostra (escolas de Sendo assim, a amostra final do estudo de impacto
“origem”) e tinham notas na Provinha Brasil; foi constituída por 762 alunos de 2º ano, de 55
• identificação do número de turmas por es- escolas de EF. Destes 762 alunos, 605 haviam
cola de EF onde os questionários deveriam frequentado uma pré-escola avaliada no estudo
ser distribuídos, definindo-se que em cada da qualidade e 157 formavam o grupo contro-
escola pelo menos duas turmas deveriam ser le, isto é, o grupo de crianças que nunca tinha
selecionadas e que todos os alunos dessas frequentado a EI (nem creche, nem pré-escola).
turmas receberiam um questionário para ser Participaram do estudo de impacto 68 escolas
respondido por seus pais. Com essa estraté- de EI, uma vez que os alunos provenientes das
gia, buscava-se obter maior diversificação outras 20 escolas avaliadas estavam dispersos em
das famílias a serem consultadas. um número grande de escolas de EF, não sendo
possível incluir todas elas na pesquisa.
Com os resultados desse conjunto de pro-
cedimentos, foram enviados questionários para Análise dos dados e resultados
134 turmas de 58 escolas de EF, totalizando
4.020 instrumentos. Após um minucioso pro- Resultados na Provinha Brasil
cesso de avaliação de consistência, a base final
ficou constituída por 1.156 questionários, com A Tabela 3 mostra que o grupo de crian-
uma distribuição bastante variada por município ças que frequentou pré-escola alcançou uma mé-
(Tabela 2). Os questionários foram respondidos dia mais alta na prova do que o grupo controle.
pelos pais dos alunos que frequentavam 58 Os resultados de alunos egressos de pré-
escolas públicas de EF, a grande maioria delas escolas avaliadas como de boa, intermediária e
(95%) pertencente às rede municipais. baixa qualidade encontram-se na Tabela 4, que
mostra os alunos egressos de pré-escolas de boa
Tabela 2 – Número de questionários considerados válidos, qualidade com melhores resultados na Provinha
por município Brasil, em comparação com os outros grupos.
Seus resultados são melhores mesmo quando
Município N % comparados com a média de todo o grupo de
Campo Grande 616 53,3 alunos aqui considerados.
Teresina 356 30,8 Confirmando resultados de outras pesqui-
sas, verificou-se que as meninas alcançaram me-
Florianópolis 184 15,9
lhores resultados, com a média 18,0, enquanto os
Total 1156 100,0
meninos obtiveram uma média mais baixa, 16,5.
Qualidade da
N % Média DP*
pré-escola
18,5 18,3
18,0
17,5 17,4
17,2
17,0 16,9
16,5 16,4
16,0
15,5 15,5
15,0
14,5
14,0
6,5 anos 6,5|---7,0 anos 7,0|---7,5 anos 7,5|---8,0 anos 8 anos ou mais Grupo Total
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Questionário para a família seu contexto familiar associadas à obtenção de
diferentes resultados na Provinha Brasil.
A análise das informações fornecidas pelos A Tabela 5 mostra a distribuição dos
pais dos alunos do segundo ano do EF envolveu grupos de alunos conforme a renda familiar.
a tabulação das respostas dadas pelos integrantes Nos dois grupos, cerca de dois terços dos alunos
dos dois grupos de interesse – grupo que havia pertencem a famílias com renda mensal inferior
frequentado uma turma de EI e grupo controle a dois salários mínimos (74,7% do grupo EI;
– e o estudo das características dos alunos e de 64,3% do grupo controle).
SM – salário mínimo
A Tabela 6 demonstra o nível de escolari- de 35%. O número de pais e de mães que chega-
dade dos pais e das mães. Mais de 40% dos pais ram a completar curso superior é insignificante
nos dois grupos e de mães do grupo controle nesta amostra. Por outro lado, uma porcentagem
não completaram o EF ou não estudaram. Para maior de mães completou o ensino médio em
as mães do grupo de EI, essa porcentagem foi comparação com os pais.
% % % %
Variável Descrição
Nível 1 – aluno
Renda familiar Renda familiar: até 2 salários mínimos ou mais de 2 salários mínimos
Nível 2 – escola de EF
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Análise estatística3 • idade correspondente à esperada para o segundo
ano escolar;
O objetivo da análise estatística foi o de estu- • nunca foram reprovados;
dar a contribuição da frequência à EI aos resultados • frequentaram uma pré-escola de boa qualidade;
da aprendizagem no EF, medidos pela Provinha Brasil, • vivem em famílias com renda familiar superior
levando-se em conta características das instituições de a dois salários mínimos;
EI e de EF e algumas variáveis do aluno, obtidas com • a escolaridade da mãe é, no mínimo, o ensino
a aplicação dos questionários para a família. médio completo;
A análise utilizada foi a multinível/hierárquica • estudam em escolas de EF localizadas em bair-
com classificação cruzada (Raudenbush, Bryck, 2002). ros cuja proporção de responsáveis pelo domi-
A análise hierárquica é uma análise de regressão na cílio com 15 anos ou mais de escolaridade é de
qual se considera uma estrutura de agrupamento pelo menos 5%;
ou hierarquia entre os dados. O modelo hierárquico • o Ideb das escolas de EF que esses alunos fre-
cruzado leva em consideração que os alunos podem quentam é alto.
ser agrupados de duas maneiras dentro do nível 2
(nível escola): de acordo com a instituição de EI onde Para identificar as variáveis de maior influ-
haviam frequentado a pré-escola ou pela escola de ência no desempenho do aluno na Provinha Brasil,
EF que estavam cursando. Por ser um modelo hie- partiu-se do último modelo. Os resultados dessa
rárquico, a variável resposta deve ser uma medida etapa da análise estão sintetizados na Tabela 8.
do nível 1 – o nível do aluno –, que foi a nota de
seu desempenho na Provinha Brasil. Já as variáveis Tabela 8 – Variância residual do modelo hierárquico cruzado final
explicativas foram de três tipos: características do
aluno, da instituição de EI e da escola de EF. Variável excluída do Redução na
Variância
Foram utilizados cinco modelos para es- modelo variabilidade
tudar o impacto da pré-escola nos resultados de NÍVEL 1 – aluno
aprendizagem dos alunos no EF. Fazendo um
Renda familiar 24,053 2,0%
resumo das análises dos quatro primeiros mode-
los, conclui-se que existe efeito do EF, ou seja, Escolaridade
23,855 1,2%
diferenças entre as escolas de EF influenciam no da mãe
desempenho do aluno na Provinha Brasil; existe Idade 24,078 2,2%
efeito da EI, ou seja, a frequência à EI influencia
Repetência 23,914 1,5%
o resultado obtido pelos alunos; e existe efeito da
EI e do EF, quando considerados simultaneamente, NÍVEL 2a – EI
no desempenho dos alunos. Quando considerados
Qualidade da
simultaneamente, existe efeito do EF e da qualidade 23,866 1,3%
pré-escola
da pré-escola nos resultados de aprendizagem me-
didos pelas notas na Provinha Brasil. Os melhores NÍVEL 2a – EI
desempenhos são alcançados, em média, por alunos Instrução 15 anos
que frequentaram pré-escolas de boa qualidade. 24,029 2,0%
ou mais
O último modelo ajustado foi um modelo
hierárquico cruzado com dois níveis, com a pre- Ideb 2007 23,774 0,9%
sença de variáveis explicativas em ambos os níveis.
TOTAL 11,1%
Por meio da análise estatística, pode-se concluir
que os melhores desempenhos na Provinha Brasil 3. Para maiores detalhes sobre o tratamento estatístico, consultar Fundação
foram alcançados por alunos com o seguinte perfil: Carlos Chagas (2010).
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quando nos municípios investigados ainda se valoriza a iniciativa da criança, oferecendo uma
registrava uma situação bastante conturbada multiplicidade de situações de experimentação,
em relação à transição da pré-escola para o EF, de aprendizagem e de expressão no cotidiano da
confirmou essas conclusões: controlando-se o EI, sem deixar de enfatizar a importância dos di-
efeito de outros fatores, o acesso a uma pré- versos tipos de conhecimento importantes nessa
escola de boa qualidade faz, sim, diferença nos fase do desenvolvimento da criança. Uma escola
resultados de aprendizagem no segundo ano, tal que não oferece condições para as brincadeiras
como medidos na Provinha Brasil. Note-se que de faz de conta, para atividades de arte e de mo-
a amostra foi composta por crianças de escolas vimento, para o desenvolvimento da curiosidade
públicas, a maioria delas com renda familiar e da capacidade de exploração da criança – o
abaixo de dois salários mínimos. que inclui o trabalho com as diversas áreas do
Também a qualidade da escola de EF conhecimento – e que não associa o cuidado à
medida por seu Ideb e as condições de renda, educação, não é bem avaliada por essa escala
de escolaridade e as atitudes das famílias em de observação. Ora, o que o estudo de impacto
relação à educação dos filhos contribuem para revelou é que o tipo de orientação curricular
resultados positivos, como era de se esperar. associada ao melhor desempenho em uma prova
Outra conclusão importante para as polí- voltada para a aprendizagem da leitura e escrita
ticas públicas emerge dessa investigação: a idade no início do EF é justamente o modelo valorizado
em que a criança ingressa no primeiro ano e chega no instrumento de avaliação adotado.
ao segundo está associada às notas na Provinha Alguns estudos têm procurado aprofun-
Brasil, sugerindo que alunos muito jovens e alunos dar as mediações que existem nessas relações
com algum atraso escolar apresentam desempenho entre modelos curriculares e tipo de trabalho
pior do que os demais, nas escolas públicas. desenvolvido pelos professores junto a seus
Mas existe outro aspecto interessante a ser alunos de EI e o desenvolvimento cognitivo e
ressaltado sobre os resultados obtidos na pesquisa. socioemocional das crianças na continuidade
Com efeito, há um debate aberto sobre o tipo de de sua vida escolar. Estudos de caso realizados
currículo que deve ser adotado na EI. As propostas no contexto do projeto EPPE, no Reino Unido,
se diferenciam em relação ao espaço que deve procuraram investigar mais de perto as interações
ser reservado para as brincadeiras, as atividades entre adultos e crianças nas instituições de EI
criativas e a livre expressão da criança, em com- que tiveram egressos com melhores resultados na
paração com as atividades dirigidas de leitura escola primária. São resultados muito instigantes
e escrita e ensino de conteúdos disciplinares. A do ponto de vista pedagógico, que sugerem que
forma de organização do tempo e do espaço nas as situações onde existe equilíbrio entre ativi-
pré-escolas também varia bastante conforme as dades de iniciativa das crianças e a intervenção
diferentes orientações curriculares: em um extre- do adulto, no sentido de estimular a curiosidade
mo encontra-se o modelo de escola tradicional, infantil sobre diversos tipos de conhecimento4,
no qual a professora se dirige ao grupo todo, de levam a melhores resultados de aprendizagem
forma que todos os alunos se dediquem às mes- (Siraj-Blatchford et. al., 2003, p. 123-142).
mas tarefas ao mesmo tempo e, no outro, existem Estudos que focalizem mais de perto essas
as propostas que focalizam quase exclusivamente dinâmicas que acontecem no “coração das salas
a garantia dos espaços para brincadeiras e ativi- de aula” (Carvalho, 1999) seriam oportunos
dades livres de iniciativa das crianças. no Brasil, para conferir maior objetividade ao
O instrumento utilizado na pesquisa para
4. O estudo refere-se a interações adulto-criança que levem a processos
medir a qualidade das turmas de pré-escola compartilhados que mantenham o pensamento ativo (sustained shared thinking)
fundamenta-se numa proposta curricular que tanto em situações iniciadas pelas crianças, como propostas pelos professores.
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Maria Malta Campos (mcampos@fcc.org.br), Eliana Bahia Bhering (ebhering@fcc.org.br), Yara Esposito (yesposito@fcc.
org.br), Nelson Gimenes (ngimenes@fcc.org.br), Beatriz Abuchaim (babuchaim@fcc.org.br), Raquel Valle (rvalle@fcc.org.
br) e Sandra Unbehaum (sandrau@fcc.org.br) fizeram parte da equipe da pesquisa “Educação Infantil no Brasil: avaliação
qualitativa e quantitativa” e são membros do Departamento de Pesquisas Educacionais da Fundação Carlos Chagas, São Paulo.
Educação e Pesquisa, São Paulo, v.37, n.1, 220p. 15-33, jan./abr. 2011 33