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julho
xXI 84 2014
ANO XXI - Julho 2014 - nº84
ANO XXI - edição 84
CAPA
julho 2014
26-Jun-14 7:15:33 AM
Marc Chagall, 1917
Carta ao leitor
Tishá b´Av, o nono dia do mês hebraico de Menachem finanças, medicina também estão fora de proporção com
Av, é o dia mais triste do calendário judaico – a data em seu pequeno número. Têm feito uma luta maravilhosa no
que foram destruídos ambos os Templos de Jerusalém. mundo, em todas as épocas; e o têm feito com as mãos
Desde a queda do Segundo Templo, vários eventos atadas nas costas (...)”.
trágicos – tanto para o Povo Judeu como para o restante
da humanidade – ocorreram nessa data. As palavras de Mark Twain reverberaram ao longo dos
séculos. O que ele escreveu a respeito do Povo Judeu
O nono dia de Av e as Três Semanas de Luto que o vale especialmente para a geração que sobreviveu ao
precedem são dias de autorreflexão, em que devemos fazer Holocausto, reconstituiu um Estado Judeu na Terra de
um exame de consciência, tanto individual como coletivo. Israel e fez com que o judaísmo voltasse a florescer.
Contudo, o judaísmo não vê com bons olhos a tristeza. “Somos a geração de Jó e de Jerusalém”, escreveu Elie
Diz um ensinamento judaico que tudo que ocorre na vida Wiesel. De fato, a geração do Holocausto sofreu mais
é para o bem e que devemos nos esforçar para enxergar a do que qualquer outra. Mas foi ela que liderou o retorno
luz. Mesmo em meio à escuridão. Qual, então, o aspecto a Israel e Jerusalém e reconstituiu um Estado Judeu na
positivo da data mais triste do ano judaico? Terra de Israel.
Tishá b’Av é também uma data que simboliza a Tishá b’Av é o dia de Jó e de Jerusalém. Por um lado,
eternidade judaica. É a própria evidência de que, apesar é a data mais difícil do calendário judaico. Por outro,
de todas as adversidades e tragédias que vivenciou, o Povo celebra a imortalidade do Povo Judeu. No nono dia de
Judeu não apenas sobreviveu, mas floresceu. Qualquer Av, jejuamos, lamentamos e nos enlutamos – tanto pela
pessoa que tivesse presenciado a queda do Segundo destruição da Casa de D’us como pelo exílio e sofrimento
Templo de Jerusalém, o poderio romano e a destruição de nosso povo. Mas Tishá b’Av contém uma centelha sutil,
da pátria judaica, poderia apostar que o poderoso Império mas muito poderosa: a constatação de que sobrevivemos
Romano duraria para sempre e que o Povo de Israel aos assírios, aos babilônios, aos romanos, aos inquisidores,
logo desapareceria da Terra. Ocorreu o inverso. aos nazistas e a todos aqueles que lutaram, em vão, contra
O Império Romano desapareceu, tendo sido relegado a eternidade dos Filhos de Israel.
aos livros de História. Já o Povo de Israel, apesar do
exílio, das perseguições, dos massacres, da assimilação Há uma tradição que ensina que Tishá b’Av, o dia em que
e do genocídio, permanece uma nação forte e vibrante. caíram os dois Templos, será a data na qual o Terceiro
Um povo que foi expulso de sua pátria há dois milênios, Templo será erguido. A partir de então, o nono dia de Av
a ela retornou, construiu um estado moderno e, em deixará de ser o dia mais triste do calendário judaico e
66 anos, tornou-se um oásis de democracia, tecnologia e passará a ser o mais feliz.
progresso no Oriente Médio. Esperamos que essa era de paz se inicie em breve, para o
Mark Twain,um dos grandes escritores norte-americanos, Povo de Israel e para a humanidade toda.
escreveu o seguinte a respeito dos judeus: “Se as
estatísticas estão corretas, os judeus constituem apenas
um por cento da raça humana (...). Adequadamente,
jamais se ouviria falar dos judeus; porém se fala, e sempre
se ouviu falar deles (...). Suas contribuições aos grandes
nomes do mundo na literatura, ciência, arte, música,
TANACH
A Terra de Israel:
Pátria Eterna do Povo Judeu
“O Eterno D’us disse a Avram: ‘De onde você se encontra, olhe
para o norte e para o sul, para o leste e para o oeste. Eu darei
a você e aos descendentes, para sempre, toda a terra que você
está vendo... Agora vá e ande por esta terra, de norte a sul e
de leste a oeste, pois Eu a darei a você’” (Genesis 13:14-17).
o
primeiro comentário de Rashi sobre a importância da Terra de Israel – para o Criador do
Torá merece a devida atenção. Universo, para a Torá – que é a Sua Vontade e Sabedoria
“No princípio, D’us criou os céus e a – e para o Povo Judeu.
terra...” (Genesis, 1:1). “No princípio”:
Declarou Rabi Yitzhak: a Torá não deveria O que é intrigante sobre esse primeiro comentário é o seu
ter começado por nenhum outro verso a timing. Rashi viveu há quase mil anos: um milênio após
não ser: “Que este mês (Nissan) seja para vós o primeiro a destruição do Segundo Templo Sagrado de Jerusalém e
dos meses do ano” (Êxodo, 12:2), que é a primeira mitzvá o subsequente exílio do Povo Judeu da Terra de Israel, e
que o Povo Judeu recebeu como mandamento. Qual quase um milênio antes da criação do moderno Estado de
a razão, então, para a Torá iniciar o relato da Criação Israel. Quando Rashi escreveu seu comentário, os judeus
com Bereshit? Porque – “Ele revelou a Seu povo o poder já viviam no exílio há mil anos e não podiam retornar
de Seus feitos, para lhe conceder a herança das nações à sua pátria legítima. Naquele então, o assim-chamado
(Salmos, 111:6). Pois caso os povos do mundo dissessem Novo Mundo nem sequer havia sido “descoberto”. Seu
a Israel, “Vocês são ladrões, pois tomaram pela força primeiro comentário, portanto, é um anacronismo – um
as terras de sete nações (de Canaã)”, Israel poderia assunto que deixou de ser relevante mil anos antes de sua
responder-lhes: “A terra toda pertence ao Santo, Bendito vida – ou profético – uma questão que seria extremamente
é Seu Nome. Ele a criou – e a deu àquele que a Seus relevante quase um milênio após seu falecimento. Como
olhos Lhe pareceu apropriado. E Ele a deu a eles (as Rashi viveu uma vida sobrenatural e sua obra foi guiada
nações de Canaã) por uma expressão de Sua vontade; e pela Divina Providência, podemos seguramente pressupor
Ele a retirou deles e a deu a nós por uma expressão de que suas palavras foram proféticas. De fato, seu primeiro
Sua vontade”. Rashi comentário sobre a Torá é hoje mais relevante do que
nunca.
Rashi é o “pai de todos os comentaristas” e Genesis é
o primeiro dos cinco livros da Torá – a única obra de Posse da Terra
autoria Divina conferida ao ser humano, transmitida
por D’us a Moshé no Monte Sinai. O fato de Rashi Um judeu que crê na Torá e um cristão que acredita na
iniciar seu comentário sobre a Torá da forma como o Bíblia Cristã não necessitam de convencimento de que a
faz é altamente significativo, pois ressalta a inestimável Terra de Israel é a pátria do Povo Judeu. Se há um tema
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que ecoa ao longo de todo o Tanach – a Torá, os Nevi’im três vezes ao dia, para que D’us nos tire do exílio
(os Profetas) e os Ketuvim (os Escritos), é o fato de que e nos leve de volta à Terra de Israel. Ao término de cada
a Terra de Israel é o presente eterno de D’us ao Povo evento judaico significativo, como Yom Kipur e o Seder de
Judeu. Na Torá, vemos que D’us repetidamente reafirma Pessach, proclamamos: “No ano próximo em Jerusalém”
essa promessa a nossos Patriarcas e a Moshé, e lemos – Bashaná haba’á b’Yerushalaim”, para nos recordar que
sobre o Êxodo do Povo Judeu do Egito e sua jornada a vida judaica e o cumprimento de seus preceitos não
através do deserto a caminho da Terra Prometida. Os estão completos se estivermos fora de Eretz Israel e se
Nevi’im relatam como o Povo Judeu conquistou a Terra o Templo continuar em ruínas. Durante dois mil anos,
e lá estabeleceu um país. Os Livros de Josué e dos Juízes nem um dia sequer transcorreu em que o Povo Judeu se
detalham as guerras travadas e vencidas. O Livro de tivesse esquecido da Terra de Israel ou tivesse renegado
Samuel relata que o Rei David fundou e deu o nome seu direito à mesma.
à cidade de Jerusalém, que estabeleceu como a capital
de Israel, e onde reinou por 33 anos. O Livro dos Reis A alegação de que o Povo Judeu retornou a
narra que o Rei Salomão, filho do Rei David, construiu Eretz Israel em virtude do Holocausto ou que o
o Templo Sagrado de Jerusalém, e que a Terra de Israel Movimento Sionista influenciou os judeus a retornarem
foi dividida em dois reinos – o Reino de Israel (Malchut à sua Pátria ancestral, portanto, é um absurdo. Durante
Israel) e o Reino da Judeia (Malchut Yehudá). dois mil anos, dia após dia, temos ansiado pelo retorno
à nossa Terra e orado a D’us para permitir que tal
Historicamente é indiscutível que houve um Estado acontecimento ocorra. Fomos exilados de nossa
Judeu na Terra de Israel durante mais de mil anos e que Terra não por opção, mas porque foi conquistada por
a cidade de Jerusalém foi fundada e nomeada pelo maior nações estrangeiras, que exterminaram milhões de
dos reis judeus, David. Outrossim, é inegável que a Terra judeus e escravizaram e exilaram a grande maioria
de Israel é um dos pilares do Judaísmo. É verdade que dos sobreviventes. Através dos séculos, muitos judeus
continuamos judeus mesmo tendo vivido no exílio por tentaram retornar à sua Pátria, mas foram impedidos
dois milênios, mas muitos dos mandamentos da Torá não pelas nações que a ocupavam. É importante observar que
podem ser cumpridos se a Terra de Israel não estiver sob todo judeu que crê na Torá não duvida que a Terra de
soberania judaica. Por essa razão, nos últimos dois mil Israel seja nossa herança eterna. A diferença entre
anos, os judeus, em todo o mundo, oram, no mínimo, os judeus que apoiam o Estado de Israel e aqueles que
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TANACH
não o fazem não é que os judeus antissionistas negam O “Testamento de Adão e Eva”
nosso direito à Terra de Israel, mas apenas acreditam que e a posse da terra
um Estado Judeu somente deveria ser estabelecido após
a vinda do Mashiach. Mas, nenhum judeu que acredite A quem pertence o mundo? A D’us ou aos homens?
na Torá pode negar que Eretz Israel é a herança eterna do Quem estipula os limites territoriais dos países? Será
Povo Judeu. a Organização das Nações Unidas – um organismo
fundado apenas em 1945, cujo Conselho de Segurança é
A presença judaica na Terra de Israel também é um controlado pelas potências mundiais e cuja Assembleia
dos pilares do Cristianismo, pois Jesus foi um judeu Geral é composta praticamente por países que não são
que vivia na Judeia, assim como os demais fundadores democráticos e que não respeitam os direitos humanos?
do Cristianismo. Não surpreende, portanto, o fato de Questões de posse territorial são muito complexas e
milhões de cristãos de todo o mundo – não apenas os controversas porque o mundo não foi criado com linhas
evangélicos, mas também os católicos – serem ardorosos divisórias. A humanidade nunca chegou a um acordo
defensores do Estado de Israel. sobre como dividir o mundo.
O Cristianismo se originou na Terra de Israel e seus Um incidente histórico envolvendo o Brasil serve
seguidores creem que um dos pré-requisitos da Redenção de excelente exemplo de quão complexos os direitos
Messiânica seja o retorno do Povo Judeu à Terra de territoriais podem ser. Nos idos de 1500, quando
Israel.Como veremos abaixo, o comentário de Rashi não Espanha e Portugal “descobriram” o Novo Mundo,
se dirige a judeus e a cristãos que acreditam na Bíblia – dividiram-no por meio do Tratado de Tordesilhas. Mas,
estes não necessitam de serem convencidos – mas àqueles já por volta de 1504, os franceses marcavam sua presença
que questionam o direito dos judeus à Terra de Israel. no litoral da América Portuguesa, por duas razões: eles,
Rashi ensinou aos judeus e aos nossos aliados cristãos também, estavam interessados no pau-brasil,
a responder àqueles que desejavam – e que D’us não o mas, o mais importante, eles desejavam desafiar a
permita – apagar a presença judaica da Terra de Israel. política de Mare Clausum (“Mar Fechado”) acertada entre
Portugal e Espanha pelo Tratado de Tordesilhas.
Para se entender o comentário de Rashi e sua profunda O rei da França, Francisco I, insistia no “direito de
relevância para os nossos dias, precisamos definir navegar no mar de todos”. Os portugueses sentiram
adequadamente certos conceitos históricos e geopolíticos. que suas possessões territoriais recém-adquiridas
estavam sendo ameaçadas pelos franceses. O rei de
Portugal, D. João III, queixou-se à sua contraparte
francesa, que lhe replicou: “Gostaria muito de ver o
testamento de Adão e Eva dividindo as terras do
Novo Mundo entre Portugal e Espanha”. Com
tal declaração, o rei francês expressava seu não
reconhecimento do Tratado de Tordesilhas. Afinal,
quem ou o que determinara que esses territórios
pertenciam à Espanha e Portugal? Por que teriam esses
dois países mais direito ao Novo Mundo do
que as demais nações europeias? A Coroa portuguesa,
percebendo que corria risco de perder a posse dos
recém-descobertos territórios para outras nações,
decidiu ocupar o Brasil. Percebeu que se não ocupasse o
país e o desenvolvesse, os franceses certamente o fariam.
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mapa desenhado por abraham bar yaaqov para uma hagadá, impressa em amsterdã entre 1695 e 1696, foi um dos primeiros
exclusivamente em hebraico. a rota do êxodo e a subdivisão das tribos de israel são claramente indicadas
Tratado de Tordesilhas? Portugal alegava que as terras milhares de anos, mas nunca construíram um país.
recém-descobertas lhe pertenciam, mas se não se tivesse Nunca houve governo central nem jurisdição central.
apressado em habitá-las e as desenvolver em um país, Os ingleses não invadiram um país e o dominaram: não
arriscava perdê-las aos franceses. havia país constituído. Ademais, pode-se argumentar que
o território foi adquirido pela guerra e não por roubo, pois
A propriedade territorial talvez seja uma das questões as tribos nativas do Novo Mundo haviam conquistado os
geopolíticas mais complexas porque são inúmeros os territórios de outras tribos. Os ingleses fizeram com as
critérios que podem ser utilizados para determinar tribos indígenas o que estas faziam umas com as outras.
quais territórios pertencem a que países. Com efeito, Pode-se, então, argumentar que conquista e ocupação de
qual deveria ser o principal critério para decidir a quem território são formas legítimas de uma nação adquirir um
pertence uma terra? A seus habitantes originais, àqueles território. Pertenceriam, então, os Estados Unidos à
que a habitam por mais tempo, àqueles que lutaram e a Grã-Bretanha, que lutou com muita garra para conquistar
conquistaram ou àqueles que a desenvolveram? e ocupar o território e estabelecer as bases do país?
Falemos dos Estados Unidos, como exemplo. Antes Evidentemente, a maioria dos americanos não
da chegada dos europeus ao que hoje é o território acreditam que estejam vivendo em território roubado
americano, milhões de pessoas, a “população nativa”, e que devam abandonar o país e devolvê-lo aos
habitava aquela terra. Os europeus exterminaram quase descendentes das populações nativas daquela terra. E,
todos – milhões de pessoas – ativa ou passivamente. Os apesar de o país ter começado como colônia inglesa, os
poucos que sobreviveram foram expulsos de sua terra e americanos achariam ridícula a ideia de que seu país
submetidos às leis do novo país estabelecido onde eles pertence à Inglaterra. Afinal, os americanos deram
e seus ancestrais viviam há milhares de anos. Será que tudo de si para construir uma nação. Declararam a
esse fato histórico indiscutível significa que os Estados independência da Grã-Bretanha e lutaram uma guerra
Unidos pertencem à população nativa daquela terra? longa e difícil para obter sua liberdade. Cultivaram a
Serão os Estados Unidos um país ocupado? Será o terra e construíram suas instituições. Redigiram uma
governo americano ilegítimo? Se a população nativa dos Constituição e criaram um código de leis e sistema
Estados Unidos exigisse suas terras de volta, teria direito jurídico. Construíram fazendas e fábricas, estradas e
a recebê-las? serviços públicos, casas e edifícios, escolas e hospitais.
Adotaram uma bandeira e compuseram um hino, criaram
Pode-se argumentar, contudo, que os habitantes nativos uma moeda nacional, ergueram um sistema de governo
da América do Norte viviam no território, mas não e foram atrás, com sucesso, do reconhecimento de outros
eram seus legítimos proprietários. Eles lá habitavam há países.
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e destruíram nossas cidades e nosso Templo Sagrado. à Terra de Israel como uma nação preparada para fazer
Durante milhares de anos, nós, judeus, sonhamos por o que fosse necessário para erguer um país em um
nosso retorno ao nosso Lar. Nunca deixamos de ansiar território onde nenhum estado fora estabelecido desde a
pelo retorno à Terra de Israel e particularmente à queda do Reino de Yehudá. Após quase dois milênios, a
Jerusalém. Através dos séculos, sempre que possível, os terra do Povo Judeu se tornou novamente um país – um
judeus retornaram à sua Pátria. Mas, ao se estabelecer estado independente – e, Jerusalém, novamente a capital
uma analogia com a fundação dos Estados Unidos, de um país.
os judeus podem ser comparados não apenas com
as tribos nativas, mas com os colonizadores ingleses A transformação espiritual da Terra
e com os cidadãos americanos. Como os ingleses,
nós conquistamos o território – primeiro na época Os argumentos acima apresentados – religiosos,
de Yehoshua ( Josué) e, novamente, nas guerras que históricos e geopolíticos – são refutações claras a
o Estado de Israel moderno teve que lutar contra os qualquer alegação de que o Povo Judeu não tem direito
países vizinhos que almejavam destruí-lo. Finalmente, à Terra de Israel. O Estado de Israel é um dos poucos
como os americanos, expulsamos os colonizadores que países no mundo cuja legitimidade não pode ser refutada.
ocupavam nossa terra (ironicamente em ambos os casos, Contudo, nenhum outro país tem que lutar por seu
os ingleses), declaramos a independência e construímos direito à existência como Israel. Além de lutar contra
um belo país. países que querem destruí-lo fisicamente, Israel tem de
justificar sua identidade judaica e seu direito à terra que
O Povo Judeu na Terra de Israel transformou o deserto é sua. Por que Israel, entre todos os países, é acusado de
em um pomar, construiu a única democracia do roubo – de se apossar de território que não lhe pertence?
Oriente Médio e desenvolveu as mais bem treinadas Por que essa acusação é levantada contra Israel – e não
forças armadas no mundo. O Estado do Povo Judeu contra países da Europa, Ásia e todos os países que foram
desenvolveu um dos melhores sistemas educacionais fundados nas Américas? O primeiro comentário de Rashi
do mundo, provê atendimento de saúde gratuito para sobre a Torá nos dá essa resposta.
todos os seus cidadãos, judeus ou não. O Estado de
Israel também construiu uma economia sólida e estável A proibição contra roubo é um dos sete mandamentos
e conquistou não apenas reconhecimento internacional, que se aplicam a todos os seres humanos – a todos os
mas também a admiração de países em todo o mundo, descendentes de Noé. Se a conquista territorial por meio
que se voltam a Israel em busca de auxílio em questões da guerra é sinônimo de roubo, por que não encontramos
tecnológicas, médicas, de defesa e na luta contra o em nenhum lugar na narrativa bíblica menção à punição
terrorismo. Divina a uma nação por conquistar a terra (e seus
habitantes) de outro povo? É claro que a conquista
É fato que os judeus apenas se tornaram maioria na Terra militar não está incluída na definição de roubo segundo a
de Israel após o Holocausto. Isso porque as potências que Torá (V. Shulchan Aruch HaRav, 649:10).
a ocupavam apenas permitiam que um número muito
limitado de judeus fizesse aliá. Na verdade, se os ingleses No entanto, a conquista da Terra Prometida pelos judeus
não tivessem imposto o Livro Branco, milhões de judeus e sua transferência de posse dos cananeus, nação que
teriam ido a Eretz Israel e o Holocausto não teria custado originalmente a habitava e que já não existe, para o Povo
a vida de quase sete milhões de judeus. Judeu constituiu uma mudança muito mais profunda e
de longo alcance do que qualquer outra transferência de
É um fato histórico e incontestável que havia um antigo terra por conquista. Quando o Povo Judeu conquistou a
país judeu na Terra de Israel. Mas o fato de que nós Terra que D’us lhes legara, modificou a própria essência
éramos os habitantes originais daquela terra e que fomos da Terra. O potencial espiritual da Terra Prometida se
expulsos de nossa pátria foi ignorado pelo mundo por tornou realidade – passando por uma transformação:
quase dois mil anos. Como nossas legítimas alegações e tornou-se Eretz Israel, a Terra do Povo Judeu – para todo
reivindicações foram ignoradas – e tiveram consequências o sempre. Nunca mais essa terra poderia essencialmente
catastróficas –, tivemos que retornar ao nosso Lar pertencer a qualquer outro povo. Como está escrito
não apenas como seu povo nativo, mas também como no Livro de Levítico (26:32), “E eu assolarei a terra, e
guerreiros – prontos para resgatar nossa Pátria – e como se espantarão disso os vossos inimigos que habitarem
os construtores de um novo estado. Os judeus retornaram nela”, o que significa que nenhuma outra nação poderá
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1. Vista aérea da Cidade de David e, ao norte, o Monte do Templo, Jerusalém 2. Nos restos de um jarro na Cidade de David uma
inscrição: “Jerusalém”, 4º seculo a.E.C. 3. Moedas datadas da época da Grande Revolta encontradas em Silwan, em Jerusalém
viver nela de forma pacífica e bem sucedida. A terra achar que essa explicação espiritual é pouco convincente
não pode, em tempo e forma alguma, ser removida de para tanto sentimento anti-israelense. Nossa resposta a
seu relacionamento intrínseco com o Povo Judeu. Por tais céticos é que o fenômeno da transformação espiritual
essa razão, mesmo em nosso exílio, quando “estivemos da Terra de Israel foi corroborado pela História: desde
exilados de nosso país, e afastados de nossa terra”, ainda quando o Povo Judeu foi expulso da Terra de Israel até
nos referíamos a ela como “nosso país” e “nossa terra”. quando para lá retornou – quase dois mil anos depois –
aquele território nunca se tornou um país independente.
Essa é a razão mais profunda, espiritual, para tantos países Foi conquistado muitas vezes pelas potências mundiais,
odiarem o Estado de Israel – para sermos acusados de nos mas nunca se tornou o país-sede de outra nação. A Terra
termos apossado da Terra e para que as Nações Unidas de Israel somente foi um estado independente quando
condenem Israel mais do que a qualquer outro país. Os foi o país do Povo Judeu: durante templos Bíblicos, como
inimigos do Povo Judeu se ressentem de Israel pelo fato detalha o Tanach, e desde o estabelecimento do Estado
de alegarem que não tínhamos o direito de conquistar e de Israel.
transformar a essência da Terra Prometida, impedindo
permanentemente as outras nações de dela se apossarem. Quanto a Jerusalém, a cidade somente foi capital de dois
Para os nossos antagonistas, essa transformação constitui países – do Israel antigo e do Israel moderno. Vemos o
um ato de roubo, de apropriação indébita. mundo proclamar, hoje, seu amor por Jerusalém – muitos
querem internacionalizar a cidade – mas, estranhamente,
Não precisamos nos intimidar com tais acusações. Rashi nenhum país que a tenha conquistado a fez sua capital.
nos ensinou muito bem como responder a elas: “Toda a Os líderes muçulmanos alegam que a cidade é sagrada
terra pertence ao Santo dos Santos, Bendito Seja; Ele a para o Islã e, contudo, nem o Império Otomano nem a
criou”. Em outras palavras, a Terra de Israel é a herança Jordânia a fizeram sua capital enquanto a cidade esteve
eterna do Povo Judeu porque D’us assim o decidiu. em seu poder. Consideremos: Amã não tem significado
Se alguém não estiver satisfeito com essa situação, as para o Islã e, mesmo assim, quando a Jordânia conquistou
reclamações devem ser dirigidas ao Criador, Dono dos a metade de Jerusalém na Guerra de 1948, não transferiu
Céus e da Terra. Muitas pessoas podem achar essa linha sua capital de Amã para Jerusalém. O mesmo se aplica a
de argumentação absurda. Podem não acreditar ou se todos os seus demais conquistadores: o Vaticano organizou
importar com o que dizem a Torá ou Rashi, e podem as Cruzadas para conquistar Jerusalém, mas nunca a fez
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1. Vista aérea de Cesaréia 2. Vista aérea da cidade antiga de Cesaréia e do anfiteatro romano 3. Do Palácio de Herodes,
no extremo norte de Massada, uma vista privilegiada do Mar Morto
sua capital; preferiu permanecer em Roma, mesmo tendo Santa. Por outro lado, se o Povo Judeu fosse abrir mão de
o Cristianismo se originado na Terra de Israel. partes da Terra de Israel, seria em vão: a terra não perderia
As palavras de Rashi foram, de fato, proféticas. Muitas sua santidade nem receberia seus novos habitantes.
nações podem negar nosso direito à Terra de Israel, mas As decisões dos seres humanos – das Nações Unidas,
como ela pertence a D’us – que a legou ao Povo Judeu da União Europeia, dos Estados Unidos – mesmo do
como uma herança eterna – e como a essência da terra foi Governo de Israel – não mudarão jamais essa realidade.
transformada em Eretz Israel, não há nada que algum ser
humano possa fazer para mudar essa realidade. A Terra Aqueles que desejam desmembrar a Terra de Israel
de Israel, em sua totalidade, pertence ao Povo Judeu, e – expulsando os judeus de sua legítima Pátria –
Jerusalém é sua capital, eterna e indivisível. Durante dois particularmente de Jerusalém e da Judeia e Samaria
mil anos, tanto a Terra Santa quanto a Cidade Santa (Yehudá v’Shomron) – estão na contramão da História.
aguardaram pelo retorno de seus filhos. O desabrochar do Não terão êxito. Após dois mil anos de exílio, finalmente
deserto e o crescimento de Jerusalém é uma indicação de voltamos para casa, para nunca mais sermos exilados.
que a Terra e sua capital estão exultantes com a volta de Como o Primeiro Ministro Binyamin Netanyahu
seus filhos ao lar. declarou perante as Nações Unidas: “Em nossos dias,
as profecias Bíblicas estão-se realizando. Como disse o
Um ponto final e importante precisa ser esclarecido sobre profeta Amós: ‘Eles reconstruirão cidades arruinadas e
a Terra de Israel: suas fronteiras foram demarcadas por nelas habitarão. Eles plantarão vinhedos e beberão seu
Aquele que criou e detém o mundo todo. As fronteiras de vinho. Eles cultivarão jardins e comerão seu fruto. E eu
todos os demais países estão sujeitas a discussão: podem os fincarei sobre seu solo para jamais serem novamente
ser conquistadas pela guerra, compradas ou renunciadas. expulsos’. Senhoras e senhores, o Povo de Israel voltou
As de Israel, não. Pela lei Bíblica, os limites de Eretz para casa para nunca mais ser expulso de lá”.
Israel não podem ser aumentados nem diminuídos.
Explicando: como muitas leis da Torá se aplicam apenas
à Terra de Israel, é imperativo que sejam estipuladas
BIBLIOGRAFIA
corretamente. Isso significa que se o Povo Judeu fosse
The Lubavitcher Rebbe - Rabi Menachem Mendel Schneerson,
conquistar territórios além das fronteiras da Terra de Studies in Rashi: The Land of Israel (Genesis 1:1) - by , Kehot
Israel, o território conquistado não seria parte da Terra Publication Society
13 JULHO 2014
nossas festas
C
omo tanto o primeiro de ter de lutar guerras por sua Tishá b’Av não é um dia apenas de
quanto o segundo sobrevivência, o Estado de Israel tristeza, mas também um dia em
Templo Sagrado de sempre foi alvo de covardes atos que devemos fazer um balanço em
Jerusalém tombaram terroristas, que visam a assassinar nossa consciência, um Cheshbon
em Tishá b’Av, esse dia indiscriminadamente civis inocentes, Ha’Nefesh. Além de jejuar e observar
simboliza o exílio do Povo Judeu inclusive bebês e crianças, mulheres as restrições e costumes do dia,
da Terra de Israel e todos os e idosos. Mesmo após termos relatamos os pecados e erros que
problemas e sofrimentos daí retornado à nossa Pátria ancestral, levaram à destruição e ao exílio – o
decorrentes. Milhões de judeus foram não encontramos paz. ódio infundado entre os judeus e
massacrados quando o antigo estado a guerra civil que eles enfrentaram
judeu desmoronou e outros milhões Tishá b’Av é o dia mais triste no mesmo quando lutavam contra
foram exterminados pouco antes do calendário judaico, mas não é o Roma. No nono dia de Av, nós
moderno Estado Judeu renascer. No único dia de luto para o nosso povo. também recordamos os pecados
meio tempo – quase 2.000 anos – o Em Israel, o Yom HaShoá – Dia da que levaram à queda do Primeiro
Povo Judeu continuamente sofreu Recordação do Holocausto – ocorre Templo: idolatria, violência,
horrores indescritíveis: discriminação no dia 27 de Nissan. Nessa data, imoralidade e flagrante desrespeito
e demonização, expulsão em massa recordamos os quase sete milhões pela Torá.
e pogroms, conversões forçadas e de judeus (não seis milhões, como
Inquisições – tudo isso culminando muitos pensam) exterminados pelos O processo de Cheshbon
no Holocausto. vilões mais diabólicos da história da Ha’Nefesh é sempre benéfico:
humanidade. Alguns dias mais tarde, sempre podemos melhorar, individual
Mesmo a fundação do Estado Judeu no quarto dia do mês de Iyar, Israel e coletivamente. No entanto, uma
não significou um fim ao violento observa o Yom HaZikarón – Dia autocondenação excessiva não o é.
antissemitismo. Israel é o único da Recordação. Este ano, o Estado Não podemos culpar-nos por todas
país no mundo cujos inimigos Judeu recordou suas 23.169 vítimas as tragédias que se abateram sobre o
conclamam à sua aniquilação. Além de guerra e terrorismo. nosso povo. Não temos o direito de
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julgar-nos e a outros judeus Talvez estejam além do escopo A resposta não reside, como muitos
de forma tão desfavorável. Nossos de todas as palavras que já foram creem, na criação do Estado de Israel.
antepassados que viveram no antigo pronunciadas por seres humanos. Os triunfos militares do Estado
Israel podem ter feito escolhas A Torá, que é o projeto Divino Judeu não removem a dor inexorável
insensatas e erros graves – alguns para o mundo e uma fonte pura do Holocausto. É por isso que o país
cometeram mesmo pecados e não adulterada da Sabedoria inteiro para e observa dois minutos
terríveis – mas nada justificou Divina, provê as respostas a todas as de silêncio em Yom HaShoá e discute,
2.000 anos de exílio e sofrimento. perguntas, exceto a uma – a questão ano após ano, quais as lições que
Nada do que eles fizeram justifica do sofrimento humano. De fato, D’us devemos aprender do Holocausto.
os pogroms, as humilhações e as não nos forneceu respostas a tais
expulsões em massa, as fogueiras da questões. Não podemos reescrever a História.
Inquisição, as câmaras de gás e os As palavras, por mais bonitas ou
diabólicos experimentos médicos À luz do silêncio da Torá, como nós, inspiradoras que sejam, não podem
do Holocausto. Nada justifica o judeus, podemos lidar com mudar o passado: elas servem
assassinato de sete milhões de as questões levantadas por de pouco conforto para aqueles
pessoas, inclusive de quase dois Tishá b’Av? O que dizer a nossos que sofreram ou perderam entes
milhões de crianças, durante a Shoá. filhos quando eles nos perguntam queridos. Só se pode mudar o
sobre o Holocausto? O que dizer presente e o futuro. Há apenas uma
As inúmeras perguntas acerca a nós mesmos? Como continuar a coisa que podemos fazer acerca do
da razão para os sofrimentos ser um judeu que tem confiança passado: mudar a maneira como o
desproporcionais do Povo Judeu não em D’us e orgulho de seu povo, percebemos. Não podemos desfazer
são novidade, naturalmente. Estão apesar dos dois milênios de as tragédias ocorridas em Tishá b’Av
bem além do escopo deste artigo. sofrimento? ou as que ocorreram em virtude de
destruição de jerusalém pelos romanos comandados por tito, david roberts, 1850
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nossas festas
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Rabi Akiva foi o maior mestre do e graças aos ensinamentos que Vejamos este relato talmúdico sobre
Talmud – pilar da Lei, Tradição e transmitiu a seus discípulos sua execução. Enquanto o carrasco
Sabedoria Judaicas. Ademais, ele, principais – entre eles, Rabi Shimon romano realizava a pavorosa execução
sozinho, salvou o judaísmo. Moshé bar Yochai – autor do Zohar – – e seu corpo era rasgado, em
Rabenu trouxe a Torá dos Céus à e Rabi Meir Ba’al HaNess – pedaços – Rabi Akiva sorria – quase
Terra, mas foi Rabi Akiva quem o Mestre dos Milagres – a Torá não rindo, mesmo. Ninguém entendia
assegurou que não fosse perdida. O se perdeu. o que se passava. O governador
judaísmo existe hoje graças a Rabi romano, não acreditando no que via,
Akiva. Por ter ensinado a Torá em público, virou-se para ele e disse: “Você deve
Rabi Akiva foi preso e encarcerado ser um demônio! Não é possível que
Como Rabi Chanina ben Teradyon, pelas autoridades romanas, que o um ser humano possa suportar tanto
Rabi Akiva também viveu na Terra sentenciaram à morte. O governador sofrimento e fique sorrindo!”. Os
de Israel durante tempos muito romano na Terra de Israel não alunos de Akiva, chocados com o que
difíceis, quando o Império Romano se contentou com meramente viam, perguntaram-lhe: “Rebe, o que
fez de tudo para extirpar o judaísmo executar o maior Sábio judeu. Por está acontecendo? Como pode sorrir
da face da Terra. Percebendo que ter frustrado os malignos planos de num momento destes?”.
a Torá corria o risco de se perder, Roma, por ter salvo o judaísmo e,
Rabi Akiva organizou e sistematizou assim, assegurado a sobrevivência do Prestemos atenção às palavras finais
seus ensinamentos para que fossem Povo Judeu, Akiva seria torturado até de Rabi Akiva – dirigidas tanto a
adequadamente transmitidos de uma a morte. Roma escolheu para ele a seus carrascos quanto a seus alunos.
geração a outra. forma mais excruciante de execução: “Este é o momento mais glorioso
ele seria rasgado, pedaço por pedaço, de minha vida!”, declarou. “Todos
Ensinam nossos Sábios que até morrer, com rastelos de ferro. os dias, de manhã e à noite, recito
“Toda a Torá está de acordo com Como Rabi Akiva reagiu à sua o Shemá: proclamo minha fé em
os ensinamentos de Rabi Akiva”. morte? Protestou ao Mestre do D’us, proclamo a unicidade de D’us,
Isto porque graças ao seu trabalho Universo, como Moshé havia feito proclamo como devemos amar a
incessante em prol do judaísmo por ele? D’us, assim como está escrito:
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‘E amarás o Eterno, teu D’us, com teste ainda mais difícil do que o de que dançavam em Simchat Torá
todo o teu coração, com toda a tua Avraham e Itzhak. enquanto eram conduzidos à morte,
alma e com toda a tua força’. Sempre o que levou seus carrascos nazistas
entendi a parte ‘com toda a tua alma’ Diz-se que “morre Al Kidush Hashem” a comentarem, entre si, o que o
como sendo ‘às custas de tua alma’, um judeu morto pelo simples fato carrasco romano disse à Rabi Akiva:
e sempre me perguntei quando teria de ser judeu. Tal morte significa a “Não podem ser seres humanos.
a oportunidade de cumprir este maior das elevações espirituais. No É impossível que um ser humano
mandamento – sacrificar minha alma entanto, nem o judaísmo nem o Povo aguente tanto sofrimento e se alegre
em favor de D’us”. Judeu glorificam o martírio e a morte. desta forma...”
Valorizamos a vida acima de quase
“Hoje isso está acontecendo”, Rabi tudo. Grande parte do destino de Durante o Holocausto, quando a
Akiva concluiu. “Hoje estou sendo nosso povo não foi escolhido por nós. escuridão caía sobre o mundo e nosso
morto por ser judeu. Hoje estou Não buscamos nem provocamos um povo era consumido em chamas, os
sendo morto por minha fé em D’us ataque a nosso povo e a nosso estilo de Céus estavam lotados com milhões
e por fortalecer esta fé entre os vida. O Povo Judeu nunca constituiu de judeus que chegavam. Quando
demais. Não é, então, este, o grande ameaça aos países onde viveu. pensamos naquela geração de judeus
momento de minha vida – quando – no que passaram e sobreviveram e
posso renunciar à minha vida em A grande maioria dos judeus como foram capazes de reconstruir
favor de D’us?”. assassinados no Holocausto eram o Povo Judeu e restabelecer a
pobres e religiosos. Não eram Pátria Judaica na Terra de Israel e
A seguir, Rabi Akiva recitou o verso ameaça para ninguém – política revigorar o Judaísmo – torna-se claro
inicial do Shemá: “Escuta, ó Israel, ou economicamente, muito menos que a capacidade de nosso povo é
o Eterno é nosso D’us, o Eterno em aspecto belicoso. Eles não praticamente ilimitada.
é Um”, e sua alma ascendeu à esperavam nem provocaram uma
Eternidade. confrontação com o mal. Mas, diz-se A era do Holocausto foi uma era
que a verdadeira medida da força de de heróis e mártires judeus e eles se
Assim ensina o Talmud: no ponto um povo é como eles se alçam para alçaram mais alto do que as estrelas
mais alto dos Céus reside a alma de dominar o momento quando – eles ascenderam à Eternidade.
Rabi Akiva, bem como as almas de surge a confrontação. Apesar de Eles fizeram o impossível. Eles
todos os judeus de todas as gerações seu indescritível sofrimento, conseguiram o impensável. E se
que foram mortos pelo simples fato o Povo Judeu manteve-se judeu alguém se perguntar como o Estado
de serem judeus. durante os 2.000 anos de sua de Israel pôde vencer a Guerra da
Diáspora, e, mais notadamente, Independência – como os judeus
Uma nação de mártires durante o Holocausto. de Israel venceram contra grandes
adversidades – foi porque eles não
A história de Rabi Akiva não é Há inúmeras histórias de judeus lutaram sozinhos: lutaram ao lado de
apenas a história de um único que deram sua vida para salvar a de uma legião Celestial de quase sete
homem, mas de uma nação. O maior outros. Apesar de viverem à sombra milhões de judeus.
de nossos Sábios personificou seu de seus carrascos, eles não perderam
povo. Através de nossa história, mas a coragem nem a dignidade. Havia O Legado de Joseph
especialmente durante o Holocausto, judeus nos campos de morte que Trumpeldor
muitos caminharam para a morte colocavam diariamente os Tefilin,
com o Shemá em seus lábios. Muitos que comiam Matzá em Pessach, que Através da História Judaica, muitos
caminharam para as câmaras de gás acendiam velas de Shabat. Havia judeus renunciaram à sua vida em
não apenas rezando, mas cantando. judeus famintos – verdadeiros favor de D’us e do Judaísmo. Mas
No Holocausto, quase sete milhões esqueletos humanos – que se sempre houve judeus que arriscaram
de judeus foram assassinados, recusavam a comer em Yom Kipur; e até renunciaram à vida pelo Povo
morreram Al Kidush Hashem – pela outros que abriam mão da ração Judeu e por nosso direito de viver
santificação do Nome de D’us. Eles semanal para conseguir emprestado em liberdade e dignidade. Um dos
pagaram o preço supremo por serem um livro de orações, para poderem maiores mártires modernos do nosso
judeus. Eles foram submetidos a um recitar algumas rezas. Havia judeus povo foi Joseph Trumpeldor.
19 julho 2014
nossas festas
Nascido em 1880, ele era um judeu a seus irmãos-em-armas que não abençoados por pertencer a uma
russo destemido – um socialista chorassem pela forma de sua morte: nação de heróis e mártires – do
ardente e precursor do sionismo – ele lhes reassegurava que aceitava passado e do presente. Neste último
que perdeu um braço no cerco de sua morte com bravura. Trumpeldor Yom HaZikarón, o Primeiro Ministro
Port Arthur durante a guerra russo- entendeu que seu sacrifício Binyamin Netanyahu fez uma
japonesa. Trumpeldor mudou-se para contribuiria, ao menos em parte, para declaração sobre os 23.169 mártires
a Terra de Israel, tornando-se líder o restabelecimento de uma Pátria do Estado de Israel que se aplica
da Legião Judaica – precursora das judaica, e, portanto, para a salvação também a todos os judeus de todas
Forças de Defesa de Israel. Em 1o de do Povo Judeu. Em seus últimos as gerações que morreram por serem
março de 1920, centenas de árabes momentos de vida, esse herói judeu judeus. “Não estaríamos aqui se
atacaram o assentamento de Tel percebeu que sua vida e sua morte não fosse pelo seu sacrifício. Não
Hai, na Alta Galileia. Trumpeldor não tinham sido em vão: seu legado estaríamos aqui não fosse por sua
foi seriamente ferido na sangrenta contribuiria para a eternidade de seu disposição em entregar sua vida para
batalha que se seguiu. Quando povo. De fato, ele foi saudado como que pudéssemos estar aqui”. D’us
chegou um médico, era muito tarde. herói nacional por todos os lados abençoe sua memória. D’us abençoe
Trumpeldor, ciente que estava prestes do espectro político antes e após a o Povo Judeu, e D’us abençoe o
a deixar este mundo, confortava o criação do Estado Judeu. Estado de Israel.
médico e seus irmãos-em-armas
dizendo: “Ein davar, tov lamut be’ad Como Rabi Chanina ben Teradyon Tishá b’Av: O Dia da
artzeinu” (Não faz mal, é bom morrer e Rabi Akiva, Joseph Trumpeldor Redenção
por nossa terra). teve uma morte famosa. Milhões de
judeus na Diáspora e mais de 20.000 Agora concluiremos com uma
As palavras finais de Joseph judeus no Estado de Israel também história do Talmud sobre Rabi
Trumpeldor se tornaram o lema deram sua vida pelo judaísmo e Akiva, que sempre insistiu que tudo
oficioso do Estado de Israel. Mas pelo seu povo, mas suas mortes não que D’us faz é para o bem e que foi
não visavam a promover a morte foram famosas e seus nomes não são aquele que enfrentou sua morte com
para a Pátria. Ele estava dizendo encontrados no Talmud nem nos júbilo e orações.
livros-texto das escolas de Israel.
Após a destruição do segundo
O tema do último Yom HaShoá em Templo Sagrado, quatro Sábios –
Israel foi, “Toda pessoa tem um Rabban Gamliel, Rabi Elazar ben
nome”. De fato, cada um deles teve Azariá, Rabi Yeshoshua e Rabi Akiva
seu nome. Eram filhos e filhas, pais – estavam a caminho de Jerusalém.
e mães, irmãos e irmãs, maridos e Quando chegaram a Har HaTzofim
mulheres, professores e amigos. e viram a cidade de Jerusalém
O fato de seus nomes não se terem destruída, rasgaram suas vestes em
tornado famosos torna seu martírio sinal de luto. Chegando ao Monte do
ainda mais significativo. Talvez não Templo, viram uma raposa surgir do
saibamos seus nomes, mas jamais os local onde era o Kodesh HaKodashim.
esqueceremos. Este era o local mais sagrado do
Templo, onde apenas o homem mais
Neste Tishá b’Av, o Povo Judeu, a santo de Israel, o Cohen Gadol, podia
mais antiga nação que vive na face da entrar, e apenas no dia mais sagrado
Terra, se prostrará de luto e recitará do ano – Yom Kipur. Ao presenciar
a Meguilat Eichá – as Lamentações essa cena, Rabban Gamliel, Rabi
de Jeremias. Jejuaremos e rezaremos, Elazar e Rabi Yeshoshua começaram
e, ao lembrarmos os sofrimentos a chorar, mas Rabi Akiva pôs-se a
de nosso povo, lamentaremos e sorrir. Eles então lhe disseram: “Por
choraremos – abertamente ou que sorris?” Ao que ele respondeu:
em nosso coração. Mas ao fazê- “Por que estão a chorar?” E eles
Joseph Trumpeldor lo, também devemos sentir-nos disseram: “É um local sobre o qual
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está escrito: ‘o não-Cohen que se Rabi Akiva conclui, então: Ainda não há paz em Jerusalém
aproximar, morrerá’ (Números 1:51) “Enquanto a profecia de Uriah não nem no restante do mundo, mas
e agora ‘raposas vagueiam por lá’ tinha sido realizada, eu temia que está prestes a vir. Todos os judeus se
(Lamentações 5:18). Não é para a de Zechariah tampouco o seria. reunirão na Terra de Israel, o Terceiro
chorarmos?” Agora que a de Uriah foi realizada e eterno Templo será construído e o
– e Jerusalém e o Monte de Templo sofrimento e a morte serão varridos
Rabi Akiva replicou: “Por essa estão totalmente devastados – é da face da Terra. Mais milagroso
exata razão, estou sorrindo. Pois certo que a profecia de Zechariah – a ainda: todos os mortos retornarão à
está escrito: ´Buscarei para Mim construção do Terceiro Templo – vida – todos os entes queridos que
testemunhas confiáveis, Uriah, será realizada”. Então os Sábios lhe perdemos retornarão a nós.
o Cohen, e Zechariahu ben disseram: “Akiva, tu nos confortaste.
Yeverechiahu´ (Isaías 8:2). Qual a Akiva, tu nos confortaste”. Que seja a Vontade de D’us que esse
ligação entre Uriah e Zechariah? dia ocorra muito em breve, em nossos
Uriah profetizou na época do Há dois milênios, em Tishá b’Av, dias – Bekarov BeYamenu Mamash –
Primeiro Templo, enquanto caiu o segundo Templo de Jerusalém. Amén, ken yehi ratsón.
Zechariah o fez durante o Segundo Fomos exilados de nossa Pátria.
Templo. Por que, então, são Quatro milhões de judeus foram
mencionados junto?”. Rabi Akiva, massacrados apenas na cidade de BIbliografia:
então, explica: “Ao mencionar os dois Bethar. A profecia de Uriah de fato Talmud Bavli: Tratados Berachot,
profetas junto, as Escrituras tornam se cumpriu. E agora esperamos Menachot, Avodá Zará, Makot
a profecia de Zechariah dependente o cumprimento da profecia de Talmud Yerushalmi: Tratado Berachot
da de Uriah. Na profecia deste Zechariah. Há uma tradição de que
último, está escrito: ‘Portanto, por Tishá b’Av é a data de nascimento do Palestra do Rabi Dr. Schochet, Jacob
Immanuel, Judaism: Discourse - Questions
sua causa, Tzion será arado como um Mashiach e a data na qual ocorrerá a and answers with Immanuel Schochet -
campo’. Na profecia de Zechariah Redenção Messiânica. E quando isso www.youtube.com
está escrito: ‘Os idosos e as idosas ocorrer, o 9 de Av se transformará do
Blum, Ruthie, Trumpledor Revisited
sentar-se-ão, novamente, nas ruas de dia mais triste para o mais jubiloso
Jerusalém’. do nosso calendário. www.israelhayom.com
21 julho 2014
homenagem
N
o dia 15 de junho de à sociedade síria. Nos anos de 1920, trabalhou no ramo de importações e
2014 a comunidade Jacob E. foi enviado a Beirute, onde exportações, mas, em 1957, a família
judaica de São Paulo se estabeleceu. Casou-se com sua Safra formou uma financeira que
perdeu um dos seus prima Esther e tiveram oito filhos: viria a se tornar o Banco Safra e
principais pilares, Elie, Eveline, Edmond, Arlette, fundou a Filobel, uma das maiores
fundador de importantes instituições; Moise, Huguette, Gaby e Joseph. indústrias têxteis do país.
o mundo das finanças perdeu uma Na cidade onde constituiu família,
importante personalidade e o mundo Jacob E. foi um grande benemérito e Em 1969, Moise casou-se com
da benemerência judaica e não um dos líderes comunitários, exemplo Chella Cohen e teve cinco filhos:
judaica perdeu uma alma nobre, um seguido pelos seus descendentes, que Jacob, Azuri, Edmundo, Esther e
homem generoso, sempre disposto se espalharam pelo mundo. Olga. Apesar dos inúmeros negócios,
a apoiar as causas dignas e a atender obrigações sociais e comunitárias,
os que necessitassem de sua ajuda. Na década de 1950, como Moise e Chella sempre dedicaram
Moise deixa uma grande lacuna consequência do cenário político tempo à sua família, a seus filhos,
ou, como diria Rabi Nachman de no Líbano decorrente da genros, noras e netos. Eles sempre
Bratislav, “uma Cadeira Vazia”. independência do Estado de Israel, foram sua prioridade.
a família Safra deixou o país rumo à
Nascido em Beirute, Líbano, Itália. Essa não foi a última parada Em 1998, ele fundou um Family
Moise era o quinto dos oito filhos do clã, que começou a se espalhar Office, M. Safra & Co., com
de Jacob E. e Esther Safra. Seu pai pelo mundo. Em 1954, três filhos sede em Nova York e São Paulo,
nasceu em Alepo, em 1891, na Síria, de Jacob E., Edmond, Moise e independente do império bancário
então parte do Império Otomano. Joseph, escolheram o Brasil para familiar. Em 2006, Moise vendeu sua
Ali vivia uma florescente e estável recomeçar a vida, constituir família parte ao irmão Joseph e começou a
comunidade judaica, com instituições e erguer um dos grupos empresariais diversificar seus interesses comerciais.
culturais, educacionais e religiosas mais sólidos do País, com ênfase Em 2012, Moise comprou o prédio
sólidas, integrada economicamente no setor bancário. No início, Moise comercial Plantantion Place, em
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Londres, e, em 2013, em parceria como o crescimento do Netzah, Conhecido por fazer doações
com a gigante chinesa Zhang seu movimento juvenil. Foi também regulares no Brasil e no exterior,
Xin, adquiriu 40% de participação um dos fundadores da Escola Moise jamais esqueceu suas raízes
no edifício General Motors, em Beit Yaacov. familiares na Síria, apesar de nunca
Manhattan, Nova York. ter vivido no país. Em homenagem
Não havia projeto comunitário de ao seu passado, destinou recursos
Atuação comunitária que não participasse, junto com sua para a construção de um centro
esposa Chella, não apenas em São comunitário para judeus oriundos da
O nome Safra está inserido na Paulo e Rio de Janeiro, mas em todo Síria em Nova York. Com previsão
história da comunidade judaica o Brasil e no exterior. Em Nova de inauguração no final de 2014,
paulista em suas mais diversas York, Miami ou Israel, Moise não o projeto será nomeado Centro
manifestações – educação, assistência limitou sua atividade filantrópica às Comunitário Moise Safra.
social, saúde, cultura. Com seus comunidades judaicas.
irmãos Edmond e Joseph, Moise Foram muitas as outras obras em
foi, em 1959, um dos fundadores Chella e Moise Safra estão entre que o casal esteve envolvido além das
da Congregação Beneficente os principais mantenedores do mencionadas. Durante a Mishmará,
Sefardi Paulista, conhecida como Hospital Israelita Albert Einstein, os rabinos afirmaram que é difícil
Beit Yaacov. A primeira Sinagoga em São Paulo. Em 2010, a instituição enumerar os inúmeros atos de
da Beit Yaacov está localizada inaugurou um sofisticado auditório bondade que Moise realizou durante
na rua Bela Cintra. Como com seu nome. O casal esteve sua vida.
presidente da instituição durante envolvido na reforma da unidade
anos, acompanhou de perto o seu neonatal do Hospital São Paulo, O rabino Efraim Laniado disse
desenvolvimento e fortalecimento, ligado à Universidade Federal de São que quando a pessoa termina sua
a fundação de novas sinagogas, Paulo (Unifesp), para a ampliação de missão na Terra, D’us manda os
como a sinagoga do Guarujá, sua estrutura e instalação de novos anjos ao mundo para ouvir o que
a Beit Yaacov Veiga Filho, bem equipamentos. dizem sobre a pessoa. E não houve
23 julho 2014
homenagem
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Moise e Chella Safra e seus filhos (da esq. para direita) Azuri, Olga, Edmundo, Esther e Jacob, São Paulo, 2013
o Mundo Superior. Não há dúvida “Moise Safra deixa um legado difícil descrever o sentimento de
de que uma enorme legião de anjos importante para o sistema financeiro perder um irmão. A perda de meu
recebeu Moise Safra no dia em que nacional e internacional”, disse irmão Moise deixa um vazio em meu
ele retornou sua alma ao Criador. Roberto Setubal, presidente do Itaú coração”. Joseph Safra
Todas as bênçãos das quais ele Unibanco.
usufruiu na Terra foram apenas um Por ocasião do seu 75o aniversário,
vislumbre das recompensas eternas Para Lázaro de Mello Brandão, sua esposa, filhos, noras, genros
e imensuráveis que o aguardam no presidente do Conselho de e netos lhe fizeram uma linda
Mundo da Verdade. Administração do Bradesco, homenagem, em que disseram:
“Moise foi um dos mais respeitados
Manifestações nomes do mundo das finanças “Moise Safra, um grande homem,
nacional e internacional. Acreditou um grande marido, pai e avô está
Para Cláudio Lottenberg, e investiu no Brasil, representando sempre em nosso coração. Obrigado
presidente do Hospital Albert a melhor tradição do setor bancário por fazer parte de nossas vidas. Sua
Einstein, “Moise era uma pessoa brasileiro”. história é um exemplo para todos
dotada de uma sensibilidade nós. Você é um mestre na arte de
instintiva, para quem a palavra “Pessoas do mundo inteiro têm viver, suas palavras são sempre sábias
amor era um exercício do cotidiano. feito declarações sobre seu papel e carinhosas, seu lema é honestidade
Ele conseguia conciliar a visão no setor financeiro, sobre suas e sensatez, sua compaixão com o
de um empresário com a de um contribuições. Amigos mais próximos próximo sempre nos emocionou.
humanista. É uma perda muito compartilham lembranças e atributos Você sempre usou justiça e respeito
grande. Moise era um grande pessoais que fizeram dele uma pessoa em suas decisões, seu olhar sempre
doador do Einstein e eu o maravilhosa. Nesse momento, só verdadeiro e amoroso, seu sorriso
considerava meu conselheiro. posso pensar nele como meu irmão contagiante iluminado, a vida inteira
Muitas vezes conversei com ele querido, com o qual compartilhei nos ensinou e cativou com seu jeito
sobre questões do Hospital e ele nos durante toda a vida momentos humilde e grandioso de ser. Este é o
apoiava em todas as nossas obras”. felizes, sucessos e dores. É muito seu legado”.
25 julho 2014
personalidade
A
certa altura de sua dos judeus mesmo porque ele era repórter, cobrindo os mais variados
fascinante trajetória, antes de tudo um patriota americano. assuntos. Depois da 1ª Guerra
Hecht empenhou-se Hecht não se abalou e fez-lhe uma Mundial foi mandado para Berlim
com devoção em angariar proposta: “Então, telefone para como correspondente do jornal
fundos destinados cinco amigos seus, que não sejam Chicago Daily News. Permaneceu
aos judeus que confrontavam os judeus, e pergunte se você é judeu durante dois anos na Alemanha e
mandatários ingleses na antiga ou americano. Se responderem ali escreveu seu primeiro romance,
Palestina. Nessa tarefa, decidiu americano, você ganha 20 mil intitulado Erik Dorn, que alcançou
obter doações, talvez vultosas, dos dólares; se disserem que é judeu, significativo sucesso. Depois de três
magnatas judeus que eram donos eu recebo uma contribuição de 20 peças encenadas na Broadway,
dos maiores estúdios de Hollywood mil dólares”. Dito e feito: os cinco que tiveram pouca repercussão, a
porque o admiravam e respeitavam. disseram que Selznick era acima de fama chegou em 1928 quando
(No decorrer de sua prolífica carreira, tudo judeu e Hecht, com o cheque lançou a peça The Front Page (A
Hecht teve quatro indicações e duas no bolso, partiu feliz em busca de Primeira Página), em parceria com
vitórias nos Oscars). novos doadores. Charles MacArthur. O espetáculo
teve 276 apresentações e, desde
Na ida para a Califórnia, tinha como Ben Hecht nasceu no Brooklyn, então, tem tido frequentes novas
primeiro nome da lista o produtor Nova York, em 1894, filho de versões tanto nos Estados Unidos
David O. Selznick, seu amigo imigrantes russos. O pai, alfaiate como em palcos de todo o mundo.
de longa data, responsável, entre no ramo de confecções, mudou-se É uma engenhosa e cativante
muitos outros, pela realização do depois com a mulher e o único filho, comédia que já foi vista no Brasil
filme E o Vento Levou, cujo roteiro Ben, para Wisconsin. O menino e sua versão para o cinema, com
foi escrito pelo próprio Hecht. costumava passar o verão em Jack Lemmon e Walter Matthau
Não foi uma conversa agradável. acampamentos perto de Chicago, nos principais papéis e direção de
Irritado, Selznick disse que não cidade aonde acabou se fixando e Billy Wilder, também alcançou
queria nem ouvir falar das agruras onde começou no jornalismo como expressivo êxito.
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Ben Hecht foi um dos primeiros face do que estava acontecendo que optara por combater e sabotar
homens de letras a perceber o perigo na Europa. Também conclamou os ingleses na Palestina. A Irgun
do nazismo desde a sua tomada do os governos dos Estados Unidos não julgava que as ações políticas e
poder, em 1933. Passou a escrever e da Inglaterra a fazerem algo diplomáticas de líderes como Chaim
em sua coluna diária, publicada em favor dos judeus e sua ira foi Weizmann e Ben-Gurion poderiam
em diferentes jornais americanos, aumentando na mesma proporção fazer com que a Grã-Bretanha
dezenas de artigos contra o regime em que suas palavras estavam sendo abdicasse do seu mandato na Terra
instalado na Alemanha e também ignoradas. Santa.
contra o fascismo que crescia na
Itália. Pouco depois da invasão da Em 1941, Hecht recebeu uma visita Bergson instou Hecht a atuar em
Polônia, em 1939, e já sabendo dos que iria mudar os caminhos de sua duas frentes: usar de sua influência
massacres contra os judeus, sentiu, vida. O recém-chegado, vindo da nos meios jornalísticos e artísticos
como ele mesmo escreveu, “ferver o antiga Palestina, apresentou-se como americanos no sentido de obter
meu sangue judaico”. Assim anotou Peter Bergson, mas seu verdadeiro apoio para a causa revisionista e
em suas memórias: “O assassinato nome era Hillel Kook, sobrenome endossar a coleta de fundos para
em massa de judeus estava apenas que preferiu esconder porque era as atividades da Irgun. Hecht
começando e todo o meu judaísmo sobrinho do então rabino-chefe abraçou as duas tarefas com intenso
veio à superfície. Não sei se senti de Jerusalém e assim evitava fervor. No dia 16 de fevereiro de
pena das vítimas, mas sei que rugia comprometer sua família. Bergson 1943, já ciente do Holocausto,
em mim um enorme impulso de fora discípulo de Vladimir Jabotinsky redigiu um anúncio que foi
violência contra os criminosos (falecido em Nova York no ano publicado em página inteira no
nazistas”. anterior), fundador do movimento New York Times, provocando
revisionista no âmbito do sionismo, inusitado furor. O texto dizia:
Ao mesmo tempo, passou a escrever que deu origem à “À venda para a humanidade: 70 mil
ácidos textos dirigidos aos judeus Irgun, organização clandestina judeus. Garantia de que são seres
americanos que se alienavam em chefiada por Menachem Begin, humanos. 50 dólares por cabeça”.
27 JULHO 2014
PERSONALIDADE
No mesmo mês escreveu para a uma noite só contou com a presença Ellen, filha de Stella, a fundadora
publicação American Mercury um de 40 mil emocionados espectadores. do célebre Actor’s Studio, que
artigo intituladoO Extermínio dos O espetáculo foi produzido por namorou Brando durante alguns
Judeus, dramático relato ainda dois grandes nomes: o cineasta anos, recordou: “Num dos ensaios,
desconhecido pelos americanos Ernest Lubitsch e o legendário o desempenho de Marlon foi tão
sobre os horrores do Holocausto. produtor Billy Rose, com direção intenso que Luther, o patriarca de
O texto foi reproduzido na revista geral de Moss Hart, e tendo como nossa família, chegou a chorar.
Reader’s Digest, a de maior circulação mestres de cerimônia dois dos mais
nos Estados Unidos. A partir de seu famosos atores do cinema daquela Na verdade, Brando não estava
prestígio pessoal, organizou uma época, ambos judeus, Paul Muni apenas representando. Ele se
reunião de jornalistas a escritores no (pseudônimo artístico de Meshilem preocupava com o destino dos
apartamento do famoso autor teatral Meir Wiesenfreund) e Edward refugiados judeus, assim como
e romancista George S. Kaufman. G. Robinson (pseudônimo de anos mais tarde se empenhou na
Em sua autobiografia, A Child of the Emmanuel Goldenberg). Em julho, campanha dos direitos civis e dos
Century, escreveu: “Compareceram o espetáculo foi apresentado no direitos dos índios”. (No meio da
30 pessoas, alguns amigos, alguns Hollywood Bowl, em Los Angeles, temporada, em virtude de outro
inimigos, todos judeus. Disse-lhes e transmitido pela televisão. compromisso já assumido, Marlon
como seria importante se todos Brando foi substituído por Sidney
nos uníssemos para denunciar os Entretanto, o grande êxito teatral de Lumet, que se tornaria um dos
crimes do nazismo. Se juntássemos caráter sionista da autoria de Ben maiores diretores do cinema
nossos talentos talvez fossemos Hecht ainda estava por vir. No dia americano). Em princípio a peça era
capazes de impedir os massacres. 5 de setembro de 1946 estreou no para ficar apenas um mês em cartaz,
Quando terminei minha fala, não teatro Alvin, na Broadway, a peça o tempo disponível do teatro, mas
houve nenhum aplauso e eu nem A Flag is Born (Nasce uma Bandeira), acabou se prolongando por quase
esperava que houvesse. O que me tendo nos principais papéis Paul um ano e depois percorreu diversos
espantou, foi que uma dúzia dos Muni, Celia Adler (da aclamada estados americanos, e chegou,
convidados se levantou e foi embora dinastia teatral dos Adler) e um inclusive, aos campos de refugiados
sem sequer se despedir. Na saída, ator principiante chamado Marlon da Europa tendo sobreviventes do
Beatrice, a mulher de George, disse Brando. O filho de Celia Adler Holocausto como intérpretes.
que estava muito sentida com o que conta que quando a mãe chegou em
tinha acontecido e chamou a minha casa, voltando do primeiro ensaio Um dos momentos mais
atenção para o fato de eu ter tocado da peça, disse: “Tem um rapazinho emocionantes da peça ocorria quando
no ponto fraco daquelas pessoas: eles no elenco, nem me lembro do nome o personagem David, interpretado
se consideravam mais americanos dele, que é um grande talento”. por Marlon Brando, dizia o seguinte
do que judeus. Preferi não discutir. monólogo: “Judeus, onde estão
Entretanto, Moss Hart (diretor de vocês? Onde vocês estavam enquanto
teatro que veio a contar entre seus prosseguia a matança? Onde vocês
grandes sucessos o musical My Fair estavam enquanto seis milhões de
Lady) aproximou-se de mim e disse judeus eram assassinados? Onde
que estava disposto a colaborar de estavam suas vozes para impedir os
todas as formas. O mesmo me foi massacres?
repetido pelo compositor Kurt Weil”.
Não houve voz nenhuma. E vocês,
Entusiasmado com aquelas adesões judeus da Inglaterra? Judeus fortes,
de tamanha relevância, Hecht judeus ricos, judeus aristocráticos,
concebeu e promoveu um colossal poderosos e geniais. Onde estavam
evento artístico na arena do Madison seus protestos que poderiam ter
Square Garden de Nova York, sob o apagado os incêndios? Em lugar
título Nós Jamais Morreremos. Com nenhum! E isto porque vocês não
música de Kurt Weil e texto do queriam se expor como judeus.
próprio Hecht, a apresentação de Ben Hecht, 1944 Vocês deixaram os judeus morrerem
28
REVISTA MORASHÁ i 84
Tuxedo Park, NY. “Blue Moon”, com Ben Hecht ao piano e Jimmy Salvo cantando
contanto que vocês mesmos não adolescente, ao fim dos espetáculos fundos complementares, serviu para
fossem identificados como judeus. percorria a plateia com uma cesta na que Hecht e Bergson comprassem
Seu silêncio merece a maldição. Vocês qual os espectadores depositavam uma embarcação dos anos 1930,
se esconderam atrás de seus sotaques quanto dinheiro quisessem para caindo aos pedaços, chamada Argosy,
britânicos, um bom disfarce para não a causa sionista. Anos mais tarde, incorporada depois da 2ª Guerra
serem vistos como judeus”. Anos já bem-sucedido, ele escreveu: à Guarda Costeira dos Estados
depois, Brando lembrou que em uma “O público assimilou com grande Unidos, rebatizada como Abril, e
das apresentações, quando terminou o entusiasmo a mensagem da peça. em seguida descartada como sucata.
monólogo, uma senhora levantou-se Valeu-me como um despertar A Tyre Shipping Company, uma
na plateia e gritou, dirigindo-se a ele: político para a questão de os judeus empresa de fachada do movimento
e você, onde estava? “Quis responder conquistarem sua pátria”. Walter revisionista, comprou o navio de
que quando a guerra começou eu Winchell, o mais famoso e respeitado 400 toneladas que começou a
tinha apenas 15 anos de idade, mas jornalista americano daquele tempo, ser reformado para transportar
preferi me calar para não interferir na assinalou: “É uma peça que deve passageiros, ou seja, imigrantes ilegais
profunda emoção daquela mulher”. ser vista, ouvida e lembrada. Vai para a Palestina. Itzhak Ben Ami, um
O clímax do espetáculo acontecia mover seus corações e fazer derramar dos colaboradores de Bergson, foi
quando a música de Kurt Weil torrentes de lágrimas dos seus olhos. incumbido de contratar a tripulação.
entrava com vigor e o elenco agitava Aconselho que levem muitos lenços
uma bandeira azul e branca parecida para o teatro”. O texto continha uma Anos mais tarde, ele recordou:
com a atual bandeira de Israel. corrosiva crítica quanto à atuação dos “Eu tinha que encontrar idealistas
ingleses na Palestina. Em Londres, o e aventureiros dispostos a enfrentar
A escritora americana Miriam jornal The London Evening Standard aquela dura missão. Acabei reunindo
Chaikin, uma das colaboradoras enfatizou: “Jamais um espetáculo tão 20 homens com 20 razões diferentes
de Bergson, escreveu: “É um canto anti-britânico foi apresentado num para se juntarem a nós. Não eram
de esperança que dá lugar a um palco dos Estados Unidos”. todos judeus.
sentimento de força e de orgulho
destinado a acordar os corações O volume de dinheiro arrecadado A maioria era composta por católicos
adormecidos dos judeus americanos”. pela cesta de Navasky no Alvin e em irlandeses dispostos a entrar em
O escritor Victor Navasky, então outros teatros americanos, a par de qualquer briga contra a Inglaterra”.
29 julho 2014
PERSONALIDADE
A função de capitão coube ao como mostrado no filme Exodus. O A Flag is Born foi devastadora.
veterano comandante Robert Levitan, navio Ben Hecht foi incorporado à O governo britânico ficou
que chamou para ser seu imediato nascente marinha do Estado de Israel particularmente revoltado com um
o experiente marinheiro Walter em 1948. artigo de Hecht sob o título
Greaves, sobrevivente de três ataques O Ataque É a Melhor Defesa, no qual
de torpedos durante a 2ª Guerra. Um Voltando a A Flag is Born, a comparou a luta da Irgun à luta dos
dos marinheiros, de 33 anos de idade, peça estava programada para americanos contra os colonizadores
era um negro do Brooklyn chamado representações no National Theater, ingleses. Lord Rothermere, dono
Walter Cushenberry: “Como negro, em Washington, mas Hecht do jornal Daily Mail, escreveu
eu sabia o que era a perseguição rescindiu o contrato porque o teatro que Hecht “é um vulcão sionista
e não me conformava com o fato não permitia a entrada de negros. vitriólico”. A embaixada britânica
de os judeus refugiados da guerra Ele soube, então, que o Maryland em Washington tentou convencer
estarem sendo perseguidos”. Ainda Theater, na mesma região da capital, o presidente Truman a ordenar a
com o nome de Abril o pequeno aceitava negros, contanto que se deportação de Peter Bergson, mas
navio zarpou para o porto de Bouc, acomodassem no balcão. Na noite seu pedido não foi atendido. Mais
na França, em dezembro de 1946. da estreia, Ben Hecht sentou-se na uma vez, Winchell saiu em defesa de
Rumou para a Palestina em março de plateia acompanhado de dois amigos Hecht evocando o mesmo exemplo.
1947, com 600 pessoas a bordo, e em negros. Em face disso, a direção Os jornais ingleses reagiram, dizendo
alto mar recebeu o nome definitivo de do teatro liberou ingressos para os de uma forma ou de outra que
SS Ben Hecht. No mar Mediterrâneo, negros em quaisquer assentos. O caso Hecht e Winchell não passavam
a embarcação foi interceptada por teve tanta repercussão, que a cidade de “uma praga de dois idiotas”. Em
um destróier britânico e escoltada de Baltimore aboliu as restrições 1948, a Associação dos Exibidores
até o porto de Haifa. Os refugiados aos negros em todas as suas casas de Cinematográficos da Inglaterra
foram levados para a ilha de Chipre espetáculos. proibiu que qualquer filme que
e a tripulação foi encarcerada na tivesse a participação de Ben Hecht
fortaleza de Acre, de onde escapou Entretanto, enquanto Hecht era fosse levado às telas de cinco mil
durante o célebre e espetacular ataque aplaudido e admirado nos Estados cinemas do país. Foi uma medida que
conjunto da Haganá e da Irgun, tal Unidos, a reação inglesa à peça doeu em seu bolso. Os produtores
de Hollywood, aos quais havia
proporcionado lucros de centenas
de milhões de dólares, nem mais lhe
atendiam seus telefonemas.
Não queriam correr qualquer
risco que lhes levasse a perder o
importante mercado inglês. Para
minimizar seu prejuízo, Hecht
concordou em receber a metade
do que costumava receber por seus
roteiros e inclusive concordou que
seu nome não constasse nos créditos
dos filmes de sua autoria. Essa
proibição só foi levantada quatro
anos depois e Ben Hecht fez o
seguinte comentário:
“Que coisa impressionante! Um
grande império declarou guerra
contra um homem só e depois fez a
paz!” Mas a animosidade de Hecht
com relação aos ingleses foi de tal
natureza que, em 1972, oito anos
Anne Sargent, Richard Kneeland E Terry O’Quinn NA TEMPORADA DE 1980-81.
PEÇA ESCRITA POR BEN HECHT E CHARLES MACARTHUR depois da sua morte, o crítico teatral
30
REVISTA MORASHÁ i 84
Kenneth Tynan, então diretor do mais numerosos do que nós, mais viver lado a lado com as demais
National Theater de Londres, decidiu bem equipados e contam com nações do mundo. Sou obrigado a
encenar uma nova montagem da recursos ilimitados. Por mais que recorrer à imagem da luta de David
peça A Primeira Página. A atriz isto não nos agrade, esta é a verdade. contra Golias. Eu lhes peço, judeus,
Helen Hayes, viúva de Charles Vocês talvez me perguntem o que comprem uma pedra para a atiradeira
MacArthur, aceitou de imediato, os judeus americanos têm a ganhar de David!”.
porém Rose, a viúva de Hecht, e com o renascimento da nação de
portanto herdeira meio a meio Israel. Eu lhes respondo com outra Ben Hecht abandonou o
dos direitos autorais, recusou-se a pergunta: o que vocês perderam ativismo sionista pouco depois do
dar permissão para a realização do quando seis milhões de nossos estabelecimento do Estado
espetáculo “em um país que tanto irmãos estavam sendo assassinados de Israel por ocasião do polêmico
perseguiu meu marido”. Foram na Europa? Se nossa vontade e episódio do afundamento do navio
necessárias muitas idas e vindas e nossos espíritos forem despertados Altalena. Para quem não está a par,
rendas diplomáticas por parte dos decerto venceremos! Uma nação vale lembrar que o Altalena foi
britânicos até que ela permitisse o judaica há de permitir que possamos uma embarcação carregada de armas
projeto. que seriam entregues à Irgun
casa de ben hecht, construída
quando as forças de defesa de Israel,
Há pessoas nos Estados Unidos, em 1888 embora já empenhadas na guerra
notadamente em Nova York, que pela independência, ainda não
até hoje se lembram dos peculiares estavam organizadas em uma só
e inflamados discursos que Hecht unidade e sob um comando central.
costumava fazer para convencer os O julgamento de Ben-Gurion era
alienados ou para angariar fundos: no sentido de que o país deveria
”Vou dizer-lhes algumas coisas que contar com um só exército e que a
vocês talvez não gostem de ouvir. Irgun não poderia constituir-se
Eu recebi um telegrama de Tel Aviv, como um exército em separado.
assinado por Menachem Begin, no Em face da obstinação da Irgun
qual ele me pede que façamos o de não entregar os armamentos
possível e o impossível para ajudar em seu poder, só restou a Ben-
os judeus que estão lutando na Gurion a amarga decisão de mandar
Terra Santa e enfrentando enormes bombardear e afundar o Altalena,
dificuldades. Os inimigos são muito ancorado próximo à costa de
31 julho 2014
personalidade
jamais se fechou. deportação dos judeus da Hungria “Ben Hecht: The Man Behind the Legend”,
de William MacAdams, editora Scribner,
para Auschwitz. Hecht deixou, ainda, EUA, 1990.
Entretanto, seu judaísmo um projeto inacabado sob o título
permaneceu atuante. Em 1954 Shylock, My Brother. “A Child of the Century”, de Ben Hecht,
editora Primus Plume, EUA, 1985.
escreveu sua autobiografia A Child of
the Century, aclamada pelo público Trata-se de um estudo sobre a ZEVI Ghivelder,
e pela crítica. Em 1961 publicou o personalidade do personagem judeu ESCRITOR E JORNALISTA
32
ATUALIDADEs
O avanço do
racismo na Europa
POR JAIME SPITZCOVSKY
E
m 24 de maio, um atirador ao nacionalismo exacerbado, com 0,74% dos votos, capitaneando um
disparou no Museu Judaico plataforma anti-imigração e rechaço partido formado, entre outros, por
de Bruxelas, em uma à integração do continente. ultracatólicos e colaboracionistas
das principais capitais franceses do nazismo. Na eleição
diplomáticas do planeta, “É um terremoto político”, comentou presidencial de 2012, Marine
e ceifou a vida de quatro pessoas. Manuel Valls, primeiro-ministro alcançou a marca de 18%, avançando
No dia seguinte, eleições para o francês, sobre os resultados inéditos sobre o voto de operários e da
Parlamento europeu produziram em seu país. A Frente Nacional, de classe média cercada pela crise
contornos claros de um fenômeno extrema direita, amealhou 26% dos socioeconômica e por um horizonte
temido há anos: o avanço da extrema votos, deixando para trás a oposição sombrio de futuro. O desemprego na
direita, com raízes historicamente de direita, o UMP, e o governista PS, França orbita na casa dos 10%.
fincadas na xenofobia e no do presidente François Hollande.
antissemitismo. A líder do partido, Marine Le Pen, A herdeira de Jean Marie Le
persegue a estratégia de levar a Pen se esforça para reconstruir
A votação para uma das instituições organização fundada por seu pai, a imagem do partido, tentando,
mais opacas da União Europeia, Jean Marie, aos holofotes principais por exemplo, afastar o rótulo de
geralmente condenada às margens da política francesa, ambicionando antissemita. Mas as conexões
do noticiário, ganhou destaque nada menos do que conquistar a familiares e as raízes históricas de
inaudito. Serviu para uma miríade presidência do país em 2017. seu movimento alimentam uma
de análises e interpretações, levando caudalosa desconfiança. Em nota
em consideração as especificidades Negacionista contumaz do oficial, o Conselho Representativo
de cada um dos 28 países que Holocausto, Jean Marie Le Pen das Instituições Judaicas da França
integram o bloco sediado em liderou a FN de sua fundação, em (CRIF), organização “guarda-
Bruxelas. No entanto, um fenômeno 1972, até 2011. Tentou a presidência chuva” da comunidade francesa,
inquestionável repousa sobre o do país pela primeira vez em declarou: “A História nos ensinou
avanço das forças políticas ligadas 1974, quando obteve escassos que crises econômicas promovem
33 JULHO 2014
ATUALIDADEs
nacionalismo e isolacionismo, que Na Alemanha, Grécia e Hungria, “The Jerusalem Post”. Interessante
são acompanhados pela rejeição grupos abertamente antissemitas notar sua mudança de posição. Antes
ao outro, por sentimentos racistas, e embebidos no neonazismo da eleição de maio, Karagounis havia
xenófobos e antissemitas”. registraram conquistas. O Partido classificado a proibição do grupo
Nacional Democrático alemão neonazista de “contra- produtiva”.
O fotógrafo e pintor francês Ron recebeu 1% dos votos, responsáveis
Agam, expoente da comunidade por uma entre as 751 cadeiras do Vários líderes do Aurora Dourada já
judaica, desenhou um quadro Parlamento europeu. Udo Voigt, líder foram presos, depois do assassinato
desolador: “A democracia da França do partido, tem enfrentado diversas de um militante esquerdista,
corre perigo”, afirmou em entrevista tentativas de banir o partido, criado acusados de “dirigir uma organização
ao site algemeiner.com. “Judeus na em 1964 e que nunca conseguiu criminosa”. Uma batalha jurídica se
França estão agora ensanduichados juntar eleitores em número suficiente iniciou, e a Justiça grega terminou
entre um crescente antissemitismo para participar do Parlamento liberando a participação dos
dos elementos do islamismo radical alemão. Agora, no entanto, o neonazistas gregos na eleição para o
francês e, uma crescente extrema neonazista Voigt frequentará a sede Parlamento europeu.
direita que acabará revelando sua do legislativo da União Europeia.
face verdadeira mais cedo ou mais Depois de apuradas as urnas, Marine
tarde”. O húngaro Jobbik contabilizou 15% Le Pen se apressou a anunciar a
dos votos, transformando-se na formação de um bloco de extrema
Além da FN, cruzando o canal segunda maior força política do país. direita no Parlamento europeu, ao
da Mancha, o Partido pela Outro partido antissemita, o grego lado de aliados vindos da Bélgica,
Independência do Reino Unido Aurora Dourada, ultrapassou a marca Holanda, Áustria e Itália. Brandiam
promove ações para rejeitar o de 9%. Os dois grupos também como prioridade impedir o avanço
rótulo de antissemitismo. Seu líder, alimentam racismo em relação a da integração continental. Do lado
Nigel Farage, prefere descrever o ciganos e outras minorias. de fora do Legislativo, em Bruxelas,
ideário como “anti-imigração e manifestantes gritavam “fascistas na
anti-integração europeia”, e pode “Acredito firmemente que deve ser prisão”.
atualmente gabar-se de um feito banido”, afirmou sobre o Aurora
histórico: com 27% dos votos, deixou Dourada o vice-ministro da Justiça, Embora os partidos tradicionais
para trás os tradicionais trabalhistas e Transparência e Direitos Humanos ainda mantenham a maioria dos
conservadores, que monopolizam há da Grécia, Konstantinos Karagounis, votos na Europa, a extrema direita e,
décadas a vida política britânica. em entrevista ao jornal israelense em geral, novos partidos à esquerda
abocanham fatias crescentes do
eleitorado, apoiados num discurso
de mudanças. Na Espanha, o
Podemos, criado a partir dos
protestos de rua, quase chegou à
marca de 10% dos votos, enquanto
na Grécia, com 26,6%, o vencedor
foi o Syriza, cujo líder, Alexis
Tsipras, qualificou de “catastróficas”
as condições impostas pela União
Europeia e pelo Fundo Monetário
Internacional em seu auxílio
financeiro a Atenas.
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REVISTA MORASHÁ i 84
1 2
3 4
1. Gabor Vona, líder do Jobbik húngaro 2. marine Le Pen, A herdeira de Jean Marie Le Pen 3. Ronald Lauder fala com
jornalistas à saída do museu judaico de bruxelas 4. cerimônia religiosa pelas vítimas do museu judaico
índice do sentimento racista, excetuando de mais diálogo sobre como combater o ódio,
Oriente Médio e norte da África. Segundo a xenofobia e o antissemitismo”, exortou
o levantamento, 69% dos entrevistados comunicado das lideranças comunitárias
sustentaram visões antissemitas. Um exemplo: búlgaras.
registrou-se 85% de aprovação ao mito “os
judeus detêm poder demasiado no mundo dos
negócios”. Pululam no continente outros episódios de
intolerância. No dia 4 de maio, num subúrbio
Em Tessalônica, no final de maio, vândalos de Bruxelas, a polícia recorreu a jatos d´água
atacaram o cemitério judaico. Hoje restam para dispersar cerca de 500 participantes
na cidade 1,5 mil judeus, enquanto antes da “Primeira Conferência Europeia da
do Holocausto a comunidade reunia 50 mil Dissidência”, arquitetada pelo antissemita
pessoas. Após o ataque, Evangelos Venizelos, belga Laurent Louis e que havia sido proibida
ministro das Relações Exteriores da Grécia, pelas autoridades locais. Entre os convidados
declarou que seu governo “fará tudo o que do evento, o infame artista francês Dieudonné
for possível para encontrar e prender os M´bala M´bala, um dos principais porta-vozes
perpetradores desse ato antissemita e odioso, do antissemitismo contemporâneo.
que vai de encontro aos valores democráticos e
de tolerância da sociedade grega”. Dias depois, e às vésperas das eleições para
o Parlamento europeu, o atentado contra o
Enquanto o governo grego promete reagir, Museu Judaico de Bruxelas. A Europa do
JAIME SPTIZCOVSKY, na Bulgária a comunidade judaica local pediu século 21 não pode tolerar a volta da mácula
foi editor às autoridades mais proteção e a prisão do do antissemitismo, do racismo e da xenofobia.
internacional e
correspondente responsável pelas pichações antissemitas Cabe às autoridades europeias agir, com vigor
da Folha de S.
Paulo em Moscou
feitas no muro da sinagoga da capital, Sofia, e rapidez, para que a intolerância retorne à lata
e em Pequim. no começo de junho. “Precisamos, também, de lixo da História.
35 JULHO 2014
BRASIL
N
a rua central do bairro No endereço onde hoje funciona Antes disso, ainda nas últimas
do Bom Retiro, a José uma loja de roupas de proprietário décadas do século 19, o Bom Retiro
Paulino, funcionou o coreano, um grande balcão de teve uma participação mais bucólica
Bar Jacob, único madeira revestido com mármore na história de São Paulo. As margens
endereço que muitos dividia espaço com poucas mesas dos rios Tietê e Tamanduateí, que
viajantes traziam no bolso no onde clientes se revezavam circundam o bairro, abrigaram
longo trajeto entre o Leste europeu para alimentar o corpo com as chácaras e fazendas da elite
e o porto de Santos, no litoral da especialidades iídiches e o espírito paulistana que para lá se dirigiam em
capital. das tradições que remontavam às busca de momentos
suas origens. Era no Bar Jacob que de lazer.
Aberto em 1928, o bar e mercearia muitos imigrantes judeus recém-
de Jacob Givertz já era um ponto chegados ao Brasil recebiam as cartas A vocação pacata do bairro
estabelecido quando as maiores dos parentes que haviam deixado mudou com a chegada da
ondas migratórias de judeus para trás. estrada de ferro construída pela
chegaram a São Paulo, no fim dos São Paulo Railway, que ligava
anos 1930, em decorrência da eclosão Nessa época, o Bom Retiro já estava o porto de Santos ao interior
da 2ª Guerra Mundial na Europa. consolidado como principal destino paulista produtor de café. Nas
Parentes e amigos informavam em final de judeus vindos da Europa proximidades da Estação da Luz,
cartas aos interessados em cruzar atraídos pela presença de parentes foram construídos galpões para
o oceano Atlântico que, quando e conterrâneos. A formação da armazenar a carga a ser escoada
chegassem a São Paulo, procurassem colônia judaica no bairro intensificou ao porto, dando início, assim, ao
um judeu simpático, sempre atrás a atividade comercial praticada na desenvolvimento econômico do
do balcão do estabelecimento região, impulsionada, no início do bairro que, na década de 1930,
administrado por Givertz, a mulher século 20, pela construção da Estação teve seu ápice com a consolidação
Anna, natural de Odessa, na Ucrânia, da Luz, entre outras obras viárias, do comércio através dos imigrantes
e as quatro filhas. que trouxe prosperidade ao bairro. judeus.
36
REVISTA MORASHÁ i 83
No Bar Jacob, os recém-chegados O então rapaz de 18 anos, que produtor de trigo da América do
encontravam crédito para comprar deixou a família para encontrar o Sul, o que fez da capital portenha a
os primeiros insumos, recomendação irmão mais velho, estabelecido há segunda cidade mais importante das
de emprego e fiador para assinar alguns anos em Nova York, já não Américas, atrás somente de Nova
o contrato de aluguel, no caso, o teve muita sorte logo no início. York.
próprio Jacob Givertz, que ajudou, Diagnosticado com conjuntivite,
ao lado de muitos conterrâneos, a Givertz foi proibido pela vigilância No mesmo período, impulsionada
estabelecer o primeiro polo judaico sanitária de desembarcar na cidade pela riqueza vinda do campo, a
na cidade de São Paulo. Em 1934, americana, que sofria de um surto de população de Buenos Aires saltou,
o primeiro censo do estado de São tracoma, doença oftalmológica mais entre 1895 e 1914, de 660 mil para
Paulo estimou em 4,5 mil os judeus agressiva do que a branda inflamação 1,5 milhões de habitantes, sendo que
do bairro do Bom Retiro, número que o acometeu. Mesmo assim, ele um terço eram estrangeiros. Entre
que representava 36% dos moradores foi obrigado a seguir para a próxima os 94 mil russos e poloneses que
do distrito. parada do transatlântico: a cidade de moravam na Argentina nas primeiras
Buenos Aires. décadas do século 20, Givertz logo
A disponibilidade de estender a definiu o destino que parecia carregar
mão a desconhecidos, além de Às margens do Rio da Prata, o junto com o próprio nome. Givertz
representar um dos valores judaicos jovem imigrante polonês encontrou é uma corruptela da palavra em
mais valiosos, era uma forma uma cidade pujante, com uma elite polonês que significa condimento.
desse imigrante da cidade polonesa disposta a desfrutar da recém- Ele conseguiu emprego como
de Rubishoff, localizada a 18 adquirida prosperidade econômica. garçom em um bar à beira do rio
quilômetros da fronteira com a Em 1914, um ano antes de o futuro da Prata, na região da cidade muito
Ucrânia, multiplicar a prosperidade fundador do Bar Jacob desembarcar procurada, na época, para passeios
que conquistou, apesar de tantos em Buenos Aires, a Argentina havia em família. Lá foi inaugurado o
quilômetros distantes de suas acabado de passar, em menos de 30 primeiro passeio público de Buenos
origens. anos, de importador para principal Aires, o Alameda.
37 JULHO 2014
BRASIL
Sem dominar o idioma, ele soube Além do trabalho de garçom, Givertz Diante da escolha entre a Sibéria e a
se destacar no trabalho ao treinar e encontrou na cidade de Buenos Aires América, Moshe Rabinovitch achou
conseguir equilibrar no mesmo braço a companheira de toda a vida e mãe que o segundo destino seria melhor
até cinco pratos de uma só vez. Anos de suas quatro filhas: a judia natural para sua família. Ele dera como certo
depois, já dono do Buffet Jacob, o de Odessa, Anna Roubinovitch. Eles o envio da família para as terras
imigrante polonês soube perpetuar a se conheceram entre uma celebração isoladas no norte do Cazaquistão ao
lição aprendida para atrair a atenção e outra da comunidade judaica descobrir o envolvimento da filha
dos clientes ainda no primeiro polonesa em Buenos Aires e se mais velha, Feigue, com grupo de
emprego em terras americanas. casaram quando Anna completou rebeldes comunistas contrários à
16 anos. Jacob tinha 21 anos. ditadura czarista.
Nos Bar Mitzvot e casamentos
que iria servir muitos anos depois, Assim como o marido, Anna imigrou Anos depois, em 1913, saudosa da
Givertz ensaiava uma espécie de para a cidade de Buenos Aires em primogênita e ansiosa para conhecer
coreografia com seus garçons para meio a circunstâncias determinadas os netos nascidos no além-mar, a
anunciar o começo dos serviços. por terceiros. Caçula, Anna era então futura sogra de Jacob Givertz
Enfileirados e vestidos em ternos ainda criança quando embarcou embarcou rumo à Argentina com a
brancos, os garçons atravessavam o em um navio rumo à América do filha caçula. Já em terras portenhas,
salão de festas carregando bandejas Sul acompanhada da mãe, Fany Fany foi informada sobre o
na altura dos ombros recheadas Roubinovitch, para reencontrar a falecimento do marido e decidiu não
com gefilte fish e enfeitadas por velas irmã mais velha, Feigue, que havia voltar mais a Odessa.
reluzentes. O efeito espetaculoso era imigrado para a Argentina para fugir
ainda maior quando as luzes do salão da perseguição da polícia czarista. Em Buenos Aires, Jacob e Anna
eram apagadas e a iluminação era geraram as filhas Rebeca e Olga.
feita apenas pelo fogo que vinha das Por influência do namorado, Feigue Mais uma vez, o casal seria afetado
bandejas. Roubinovitch pertencia a um grupo por circunstâncias externas que os
de comunistas que enfrentavam a empurrariam a se mudar novamente.
estrutura política russa totalitarista.
O ativismo político da primogênita A partir de janeiro de 1919,
era algo inimaginável por seus Buenos Aires foi afetada pelo
pais, até o dia em que o namorado seu primeiro pogrom contra os
comunista lhe confiou a guarda de judeus durante evento histórico
sua arma quando percebeu o cerco conhecido como Semana Trágica.
do exército czarista se fechar ao Uma série de motins foi deflagrada
seu redor. Os oficiais chegaram a na capital portenha por integrantes
vasculhar a casa de Fany e seu marido do movimento socialista contra
em busca de armas e panfletos as autoridades policiais e grupos
propagandistas da causa comunista. paramilitares.
Para a sorte de todos na família,
sua mulher pensou rápido e, diante Neste período, Buenos Aires se
do alarde dos vizinhos sobre a tornou palco da deflagração de uma
invasão dos oficiais no vilarejo em greve organizada por trabalhadores
que moravam, escondeu o revolver de diversos setores da economia
dentro do sutiã. Passado o susto, o para exigir redução da jornada de
simples vendedor de frutas de Odessa trabalho e validação dos direitos
decidiu pelo bem de todos embarcar trabalhistas. A força policial, então,
a filha e o namorado comunista para dirigiu seus contingentes a combater
se casarem na América do Sul. Na o que a população acreditava ser a
Rússia pré-comunista, os cidadãos razão do caos argentino no início do
que ousassem se opor ao regime século 20: a conspiração comunista
czarista eram enviados a cumprir arquitetada por imigrantes judeus
Jacob Givertz penas perpétuas na Sibéria. vindos da Rússia que viviam no país.
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REVISTA MORASHÁ i 84
39 julho 2014
BRASIL
cavalo transmitidas pelo rádio. Era idas ao barbeiro. Jacob levava a e, mesmo nesses momentos, a
no mesmo canto do Bar Jacob que terceira filha e também a caçula para autoridade imposta pelo carisma de
a filha mais nova Carlota passou os cortar os cabelos no estabelecimento Givertz convencia os beberrões a
primeiros meses de vida, acomodada voltado apenas para homens. deixar as confusões da porta do bar
dentro de uma caixa de maçãs, para fora. “Vamos brigar lá fora”,
forrada por cobertores, e sempre sob Enquanto de dia o Bar Jacob repetiam os mais exaltados.
o olhar atento da mãe Anna, que funcionava como mercearia,
assumia a dupla função de trabalhar comercializava conservas e outros Foi justamente por ser pai de quatro
no bar e cuidar das quatro filhas. produtos importados, à noite o filhas que Jacob deixou o Bom
local virava ponto de encontro Retiro por volta de 1938. Nessa
No nascimento de Carlota, Jacob de atores e atrizes do teatro época, o prefeito de São Paulo era
tinha esperança de que seu desejo iídiche, que forravam as paredes Prestes Maia que, empenhado em
de ser pai de um filho homem – do estabelecimento com cartazes concluir as obras de alargamento da
para perpetuar seu sobrenome nas escritos no alfabeto hebraico para Avenida Ipiranga, parte integrante
gerações anteriores – finalmente seria divulgar as peças que encenavam. de seu Plano de Avenidas, que
atendido. Assim que a mulher Anna Era lá também que os grupos de visava expandir o centro, proibiu as
começou o trabalho de parto na casa teatro vendiam ingressos para as prostitutas de trabalharem na avenida
da família, um sobrado a poucos apresentações. o que empurrou o meretrício para as
metros do bar, Jacob colocou sobre pacatas ruas do Bom Retiro.
o balcão do bar todas as garrafas de Tanto as filhas quanto Jacob
bebida que dispunha e prometeu e Anna se habituaram a fazer as A transformação do bairro em
uma rodada grátis aos clientes se a refeições no próprio bar e, como polo de prostíbulos se deu pela
parteira voltasse com a notícia de que lembra sua filha caçula Carlota, proximidade com a linha de trem da
ele seria pai de um menino. a única ainda viva, sempre após ferrovia Santos-Jundiaí e também
os empregados. Ela conta que o devido à própria formação pouco
Diante da frustração, Jacob guardou pai sempre colocava em prática planejada das vias, que desenhou
calmamente as garrafas de volta nas a máxima de que é preciso antes muitos becos e ruas sem saída,
prateleiras e os clientes perderam garantir a alimentação daqueles que onde qualquer atividade podia ser
a chance de tomar um trago grátis. dependem de você para só depois praticada de forma escondida, longe
Mesmo assim, ele conseguiu sentar-se à mesa. dos olhos de quem estava ao redor.
suprir o desejo de ser pai de um
homem através da terceira filha, Apesar do clima familiar do bar Assustado com a nova vizinhança
Aida, de personalidade destemida Jacob, não eram poucas as vezes que passou a circundar o Bar
e companhia constante do pai nas que clientes bebiam além da conta Jacob, seu fundador decidiu partir
com a família para a cidade de
Santos, no litoral paulista. Todas as
economias juntadas ao longo dos
foto: Arquivo Histórico Judaico Brasileiro - AHJB
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As festas do Buffet Jacob, sendo que a foto do meio é a do Barmitzvá de Sergio Ferd o primeiro neto de Jacob
As primeiras festas foram realizadas vivo ficava a cargo de Samuel e Com a saúde cada vez mais
em um salão no subsolo da sinagoga sua Orquestra, conjunto musical debilitada pela evolução da
localizada na Rua Newton Prado, especializado em canções típicas diabetes, que acometia seus pés com
no Bom Retiro. As iguarias do Leste judaicas, liderado pelo barbeiro que infecções recorrentes, Jacob foi aos
europeu eram servidas à francesa se transformava em violinista após poucos deixando os negócios sob
por garçons trajados de branco. O o expediente. Samuel dividia as a responsabilidade do genro e da
próprio Jacob acompanhava o serviço cadeiras na barbearia e também o filha Olga, porém, nunca deixou de
de perto e se tornava inconfundível palco nas festas com um rapaz que trabalhar. Alguns anos depois, ele
no salão graças à gravata borboleta tocava acordeom. Além de músico ainda abriu a Mercearia e Buffet
que sempre usava e se tornou sua e barbeiro, ele também fazia bicos Jacob na Rua Prates, em frente ao
marca registrada. O requinte do como eletricista. Parque da Luz.
bufê era sempre finalizado com
a distribuição aos convidados de Os anos foram passando e Jacob viu Alguns anos depois de sua morte, as
maçãs devidamente arrumadas em uma a uma suas quatro filhas casarem festas no salão Maison Suisse, um
bandejas de prata. Importadas e e também se despediu tristemente dos últimos endereços onde o Buffet
caras na época, as maçãs sempre de sua companheira de vida, Anna, Jacob atuou, não tiveram mais forças
acabavam antes mesmo de os garçons que faleceu jovem após sofrer cinco para continuar e cessaram. Mesmo
alcançarem o centro do salão com ataques cardíacos. assim, a história de Jacob Givertz e
suas bandejas. seu Bar Jacob ecoam na memória dos
Após a perda irreparável, Jacob se muitos imigrantes que frequentaram
Aos poucos os negócios foram associou ao genro Leopoldo, marido o estabelecimento e experimentaram,
prosperando, apesar de Jacob sempre de sua filha Olga, para abrir o Salão além dos pratos lá servidos, a
receber os pagamentos de seus Israel, em 1951. A nova empreitada simpatia do senhor sempre de
clientes de forma parcelada. levou Jacob a voltar à mesma Rua gravata borboleta.
Nessa época, o Buffet Jacob dividia José Paulino que o acolheu quando
as atenções dos convidados de desembarcou com a família em
seus clientes com outra atração São Paulo e também onde ele se mariana pollara zylberkan,
obrigatória nas celebrações da consolidou como referência de é bisneta de Jacob Givertz.
Baseou-se em relato e guardados de
comunidade judaica. A música ao comida e solidariedade judaica. ILDA KLAJMAN, neta de Jacob Givertz
41 julho 2014
PERSONALIDADE
Sergey Brin,
o homem por trás da Google
Aos 40 anos de idade, Sergey Mikhaylovich Brin é
cofundador e Diretor de Projetos Especiais na Google Inc.
Sergey é dono de uma fortuna pessoal avaliada, hoje,
em US$ 30 bilhões. Na lista da Forbes de 2013, ele estava em
21º lugar entre as 100 pessoas mais ricas do mundo.
b
rin recebeu vários prêmios pela contribuição Em 1979, quando ele tinha apenas seis anos, Sergey
que deu ao mundo, juntamente com Larry deixou a então União Soviética junto com os pais
Page, também sócio cofundador da Google. e seu irmão mais novo, Samuel, rumo aos Estados
Em novembro de 2009, ainda segundo a Unidos. A decisão de deixar a Rússia tinha sido tomada
revista, Brin e Page estavam em 5º lugar por seu pai, desgostoso de como eram tratados os
entre as pessoas mais poderosas do mundo. Seu invento judeus na União Soviética. Oficialmente, não havia
literalmente mudou a forma como o mundo funciona antissemitismo. Em 1931, o próprio Stalin escrevera que
e vem influenciando a vida de bilhões de habitantes do “o antissemitismo era um fenômeno profundamente
planeta. Pode-se afirmar que a Google indiscutivelmente hostil ao regime soviético”. Mas, na realidade, o milenar
entrou na cultura predominante – o verbo “to google” antissemitismo russo permeava toda a sociedade e os
foi recém-incluído no Oxford English Dictionary. judeus eram muito discriminados.
A missão da Google Inc. com receitas de mais de O pai, Michael Brin formara-se em Matemática
RS$ 6 bilhões ao ano é “Organizar o mundo da na Universidade Estadual de Moscou; sua esposa,
informação e torná-lo universalmente acessível e útil” Genia, também se formara na Escola de Mecânica
e seu lema é “Não seja perverso”. e Matemática de Moscou. Apesar das dificuldades
que teve que enfrentar por causa do antissemitismo,
Deixando a União Soviética Michael conseguiu concluir seu doutorado, mas sua vida
acadêmica estava estagnada.
Sergey nasceu em 21 de agosto de 1973, em Moscou,
na Rússia. Era o primeiro filho de dois matemáticos Tentando impedir os judeus de ocuparem postos na
judeus, Michael e Eugenia, ou Genia como é alta hierarquia profissional, os dirigentes comunistas
chamada. Em Moscou os Brin viviam em um pequeno dificultavam e, em certos casos, negavam-lhes a
apartamento de três quartos, com 35 metros quadrados, entrada às universidades. No Departamento de Física
no centro da cidade, que compartilhavam com a avó da Universidade de Moscou, por exemplo, não eram
paterna de Sergey. aceitos porque líderes soviéticos não confiavam neles
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2 3
1 MIchael BRIN e euGENIA EM COLLEGE PARK, MARYLAND 2. SERGEY COM O PAI EM WASHINGTON, 1980 3. SERGEY BRIN
para trabalharem na pesquisa de fazer parecer. Preocupava muito aos Soviética antes da era de Gorbachev.
foguetes nucleares. O próprio pai pais que seus filhos enfrentassem a Com a ajuda da HIAS – Hebrew
de Sergey teve que abandonar seu mesma discriminação que eles, caso Immigrant Aid Society, estabeleceram-
sonho de se tornar um astrônomo. permanecessem na Rússia. se nos Estados Unidos. No decorrer
Ainda na Universidade de Moscou, de sua história, a instituição ajudou
as admissões de alunos para outros Em setembro de 1978 seus pais milhares de judeus a deixar países
departamentos eram decididas solicitaram formalmente um visto onde eles corriam risco de vida e
através de exames. Os judeus eram de saída. Michael foi imediatamente a construir vida nova no mundo
avaliados em salas diferentes das de demitido e Genia também foi livre. Em reconhecimento, em
outros candidatos – morbidamente obrigada a deixar seu emprego. Nos 2009, Sergey doou US$ 1 milhão à
chamadas de “câmaras de gás” – e oito meses seguintes, sem qualquer instituição, onde sua mãe, Eugenia, é
eram avaliados com severidade ainda renda fixa, eles viram-se forçados hoje membro do Conselho.
maior. a aceitar empregos temporários
enquanto esperavam, não sabendo A vida na América
Numa entrevista, Sergey conta que, se seu pedido de visto seria
em 1977, após ter participado de concedido. Foi nesse período que Quando a família finalmente
uma conferência de Matemática Michael começou a ensinar a Sergey aterrissou na América, em outubro
em Varsóvia, seu pai disse à sua programação de computadores. de 1979, os Brin foram recebidos no
mãe que era hora da família Aeroporto Kennedy, em Nova York,
deixar o país. Na conferência, ele Muitos judeus soviéticos nunca por amigos de Moscou. A primeira
havia interagido livremente com conseguiram obter vistos de saída, lembrança que Sergey guarda dos
os colegas dos Estados Unidos, mas os Brin tiveram sorte e, em maio EUA foi seu deslumbramento, sentado
França, Inglaterra e Alemanha e de 1979, a família foi autorizada a no banco de trás de um carro, com
descobrira “que os intelectuais do deixar o país. Eles estavam entre os veículos gigantescos voando pela
Ocidente não eram monstros”, os últimos judeus que tiveram autoestrada, enquanto seus anfitriões
como a propaganda soviética queria a permissão de deixar a União os levavam para Long Island.
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1 3
que, fixados em um dos olhos, Vida fora da Google interesse pessoal nessa Fundação e
disponibiliza uma pequena tela na descoberta da cura para o Mal de
acima do campo de visão. A pequena Brin casou-se em 2007 com Anne Parkinson. A seguir, explicamos a
tela apresenta ao seu usuário mapas, Wojcicki, numa cerimônia íntima razão para tal.
opções de música, previsão do em uma ilha particular nas Bahamas,
tempo, rotas de mapas e, além disso, totalmente não convencional. Em 2006, sua esposa Anne fundou
efetua chamadas de vídeo ou tira uma empresa de genômica e
fotos de algo que esteja dentro do Os noivos estavam num banco de biotecnologia chamada 23andMe
raio de visão e compartilha a foto areia e os convidados os alcançavam que a produz kits para testes de
imediatamente pela Internet. Para nadando. O traje dos noivos era um DNA. Quem estiver interessado em
tirar uma foto usando os óculos basta maiô branco e uma sunga preta, mapear seu genoma precisa apenas
dizer “Tirar foto”. E pronto! respectivamente. Eles ficaram enviar pelo correio o kit com uma
casados até 2013 e têm dois filhos. amostra de saliva e, em pouco
Segundo Sergey, a ideia que motivou tempo, recebe 600 mil marcadores
o desenvolvimento do Google Glass Os interesses de Sergey vão além genéticos. O preço do kit da
foi que os smartphones inerentemente da Google. Ele e Anne fundaram e 23andMe é US$ 99, enquanto em
nos distanciam das experiências dirigem a Fundação Brin Wojcicki. outros lugares pode chegar a
no mundo real – e ele queria um Classificada em 2012 como a quinta US$ 1 mil. O kit foi considerado
dispositivo que nos permitisse organização beneficente dos Estados pela revista “Time” como a maior
obter informações digitais sem nos Unidos. Naquele ano de 2012, a invenção do ano de 2008.
desconectar das demais pessoas. fundação destinara mais de
Incomodava-o o fato de que o futuro US$ 223 milhões para seus projetos. Como testador da versão alfa,
significava um mundo em que as Brin teve a oportunidade de analisar
pessoas andariam olhando para baixo, A fundação tem doados recursos seu genoma, descobrindo que
mexendo nos seus smartphones. para as mais diversas causas e tinha uma mutação genética com
A Google X também está projetos. Entre essas, a Michael altas possibilidades de ser vir a sofrer
desenvolvendo carros sem motoristas, J. Fox Foundation para a cura do do Mal de Parkinson. Seu teste
entre outros. Mal de Parkinson. Brin tem um deu positivo para o gene LRRK2.
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PERSONALIDADE
Gigante da internet
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israel
c
om uma equipe multidisciplinar de alto Quem responde a essa pergunta é Joe Hyams, atual
nível, utiliza todos os recursos tecnológicos e CEO da organização, em sua visita ao Brasil em maio
informações precisas para mostrar quem são último quando concedeu uma entrevista à Morashá:
os verdadeiros vilões da história. “Mostrar a realidade de Israel e do Oriente Médio
através de fatos, dados e análises para defender o Estado
Israel está no meio de uma batalha para ganhar a de Israel, país demonizado pela mídia internacional nas
opinião pública – travada principalmente através da últimas décadas, não é uma tarefa fácil. Especialmente
mídia. Para garantir uma cobertura justa da mídia quando sabemos que uma parte dos profissionais e
internacional sobre Israel a HonestReporting foi criada empresas do setor têm posições preconcebidas em
em 2000, em Israel, por dois estudantes britânicos. relação a Israel, independente do tema em questão,
Trata-se de uma organização não-governamental, sem e a outra tem um grande desconhecimento sobre o país
fins lucrativos, e sem vínculos com nenhum instituição e as questões ligadas ao Oriente Médio, em geral.
judaica da Diáspora ou do Estado Judeu, partidos ou
movimentos políticos. Esta desvinculação de qualquer A nossa preocupação é a influência e o impacto que
esfera oficial lhe tem garantido credibilidade junto à esses segmentos têm na opinião pública, de modo geral,
opinião pública e, também, à mídia. Fundada por inclusive a juventude judaica. Por isso, este trabalho
Joe Hyams e Simon Ploske, em Yom Kipur, logo após exige perseverança, determinação e vigilância contínua”.
a eclosão da segunda intifada na Cisjordânia e na Durante sua permanência em São Paulo, ele participou
Faixa de Gaza, pretende desmascarar o que considera de encontros com pais e alunos da Escola Beit Yaacov
uma sistemática tendenciosidade em relação a Israel e com outras instituições da comunidade, explicando o
na mídia ocidental. Como fazer isso, com tanta pressão trabalho realizado pela organização, sua importância para
dos inimigos de Israel? Israel e a Diáspora.
53 JULHO 2014
israel
Simon Plosker, editor no Media Center, apresenta o projeto “Combatendo a tendenciosidade da mídia”
Um levantamento de dados realizado sugerindo pautas e intermediando nossos inimigos estão nela há mais
pela organização indica que, desde o contatos para as matérias. Este de 40 anos – e a nossa desvantagem
ano 2000, já foram obtidos mais de trabalho é realizado através do é imensa. Mas nós acreditamos que
centenas de pedidos de desculpas, Media Center, sediado em Jerusalém, podemos diminuir os prejuízos e
retratações e revisões de notícias. que conta com uma equipe reverter esse quadro desde que se
“Nossos esforços estão mudando o multidisciplinar de profissionais tenha consciência da realidade e da
perfil da mídia e as reportagem sobre preparados para cumprir esta tarefa, gravidade da situação”, diz Hyams.
Israel em quase todo o mundo. Nós assessorando jornalistas baseados Ressalta, ainda, que é preciso ter a
nos dedicamos a defender Israel em Israel ou apenas em visita ao percepção e a convicção de que este
contra o preconceito dos meios de país e aos territórios palestinos. Isso é um trabalho importante e deve ser
2
comunicação e, também, a fornecer garante o livre fluxo de informações. realizado.
ferramentas educativas e recursos O Centro recebe, em média, mais
para quem estiver interessado em de mil solicitações, por ano, de Para ganhar pontos nessa guerra
trabalhar em prol de Israel ”. jornalistas interessados em cobrir a não basta conquistar o coração
região. do público, é preciso, também,
A organização busca assegurar a conquistar sua mente. Apresentar
realização de reportagens honestas “A guerra entre Israel e seus fatos concretos, dados plausíveis e
e transparentes sobre o país, através inimigos não está mais sendo explicações coerentes que façam as
de um monitoramento constante travada apenas nos campos de pessoas prestarem atenção, ouvirem
dos veículos de comunicação, batalha. Tanques e bombas não e analisarem a situação sob novas
procurando detectar informações são as únicas munições capazes de óticas, aprendendo a identificar as
erradas e, também, deturpadas. causar danos irreversíveis. Palavras e calúnias, as distorções, as mentiras.
Simultaneamente, presta assessoria a imagens, quando bem manipuladas, Para Hyams, o apoio de um público
jornalistas estrangeiros na cobertura têm efeitos igualmente nocivos. bem-informado é fundamental para
do Oriente Médio, tanto fornecendo Infelizmente, esta é uma guerra na o fortalecimento do Estado de Israel3
informações, dados e fatos, quanto qual Israel entrou há pouco tempo – no cenário internacional. Neste
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REVISTA MORASHÁ I 84
processo, não basta a correção dos do país. “Que não se deixem Nós nos dedicamos
fatos distorcidos nem a exposição enganar pelos que deturpam a
das falhas da ética jornalística. É imagem do país, com ou sem a defender Israel
necessário, também, incentivar intenção”. Nos Estados Unidos, a contra o preconceito
a publicação de reportagens organização trabalha dentro das
dos meios de
positivas e não apenas de correção universidades, através das Hillel
de fatos. “Nossa luta é contra a House, que congregam os estudantes comunicação e,
desinformação e a manipulação de judeus. também, a fornecer
fatos e imagens que dão às pessoas
uma falsa impressão sobre o conflito Como parte de sua agenda anual, ferramentas
no Oriente Médio. Infelizmente, HonestReporting organiza, ainda, educativas e recursos
notícias negativas sempre ganham missões a Israel para judeus e não
manchetes lidas por grandes públicos judeus de vários campos de atuação, para quem estiver
e, quando há retratação, geralmente que incluem uma passagem pela interessado em
ninguém presta muita atenção e o sede em Jerusalém, com palestras
espaço dedicado não é o mesmo”, e várias outras atividades, que
trabalhar em prol
ressalta Hyams. permitem aos visitantes terem uma de Israel.
noção concreta da realidade do país.
Apesar de existir há apenas “A experiência nos mostrou que
14 anos, alguns números revelam uma viagem a Israel é, muita
a força e a credibilidade vezes, mais eficiente do que várias
da organização, cujo site – conferências, pois, quando estão no
www.honestreporting.com – tem país as pessoas conseguem visualizar
mais de 140 mil assinantes. Cerca de a geografia da região, sua extensão e
70% de seus recursos é decorrente a complexidade regional. Elas têm
de doações particulares, 23% de a oportunidade de ver de perto a
federações e fundações privadas e integração entre os grupos étnicos
1% de investimentos bancários e que compõem a sociedade israelense,
anúncios. O orçamento anual incluiu a coexistência de diferentes
investimentos para manutenção culturas,começando, assim, a ver de
do Media Center, monitoramento outra maneira as notícias divulgadas
da mídia, direitos digitais, relações pela mídia”.
públicas, construção de comunidades
online, conferências internacionais Nos últimos tempos, a
e despesas gerais. No ano passado, HonestReporting tem-se dedicado
HonestReporting obteve a graduação a lutar contra a campanha
4 estrelas do Charity Navigator internacional denominada Boicote,
para gerenciamento fiscal e Desinvestimentos e Sanções – BDS
compromisso com responsabilidade e (em inglês, Boycott, Desinvestment
transparência. and Sanctions) cujo objetivo é, em
última instância, deslegitimar o país.
Dentro dessa perspectiva, o Lançada pelos palestinos e seus
HonestReporting organiza, também, aliados em 2005, propõe a adoção
programas específicos para grupos de embargos a produtos e serviços
judaicos, tão suscetíveis à influência de empresas israelenses produzidos
da mídia internacional quanto os nos territórios ocupados. Na verdade,
demais. Segundo Hyams, é muito gradativamente foi ampliando seu
importante que os jovens conheçam alvo para Israel como um todo. Isto
a realidade para que possam se é o que a HonestReporting tem
sentir orgulhosos de Israel e, procurado mostrar através de um
consequentemente, atuem em defesa trabalho constante. Joe Hyams, São Paulo, 2014
55 JULHO 2014
personalidade
Reuven Feuerstein,
além dos limites da mente
“Imagine um método além de limites, que melhora o
aprendizado das crianças pequenas com Síndrome de
Down e dos superdotados e de qualquer indivíduo entre
estes padrões; que abre as portas das universidades para
estudantes menos privilegiados e pode, também, evitar
demência nos idosos. pois Este é o Método Feuerstein”.
A
o afirmar que funcionamento. Os resultados Suas teorias vêm sendo aplicadas
“a inteligência não é uma obtidos em seu Instituto, ao longo de tanto em salas de aula quanto em
estrutura estática, mas um décadas, e a aplicação de suas teorias clínicas e consultórios. Em 1992,
sistema aberto, dinâmico, em mais de 80 países, demonstram recebeu o Prêmio Israel para Ciências
que pode continuar a que ele tinha razão. Arrancando Sociais e, em 2012, foi um dos nomes
se desenvolver ao longo da vida”, aplausos efusivos sempre que falava indicados para o Nobel da Paz.
o psicopedagogo judeu-israelense, em público, Feuerstein era dono de
romeno de nascimento, revolucionou um bom humor contagiante. Em seu velório, no pátio do Instituto
os conceitos e dogmas vigentes nas Feuerstein, foi homenageado como
décadas de 1950 e 1960, relativos Ao morrer em abril último, aos o grande homem que inovou o
ao desenvolvimento de indivíduos 92 anos, Feuerstein – cuja marca processo de educação de pessoas com
com dificuldades de aprendizagem, registrada eram a barba espessa e necessidades especiais, mudando
portadores ou não de necessidades a boina que usava para substituir a sua vida. “Ele foi o Einstein da
especiais. Ele foi o pioneiro na kipá – deixa como legado a gratidão educação”, disse a professora Pnina
criação e aplicação do conceito de e o reconhecimento de milhares Klei, da Universidade Bar Ilan. Pai
que a Inteligência Humana pode ser de pessoas que viram sua vida de quatro filhos – o rabino Refael
trabalhada e desenvolvida. se transformar por acreditarem Feuerstein (que continua sua obra,
nas teorias que ele criou, além no Instituto), Daniel Feuerstein,
O fundamento básico do pensamento de seguidores em todo o mundo, Aharon Feuerstein e Noa Schwartz
de Feuerstein é que todos os seres inclusive no Brasil. Atualmente, mais –, o psicopedagogo tinha vários
humanos – independentemente de duas mil pesquisas estão sendo netos, dois dos quais falaram em
de sua idade, limitação ou realizadas inspiradas e baseadas em seu funeral. Um deles é portador da
condição socioeconômica – têm a seus trabalhos, com indivíduos das Síndrome de Down.
capacidade de melhorar de forma mais variadas faixas etárias – de
significativa seu aprendizado e, crianças a idosos, com diferentes O Instituto Feuerstein está presente
consequentemente, seu nível de perfis, em diversos países. em mais de 26 países, através
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REVISTA MORASHÁ i 84
prof. reuven
feuerstein
de 70 Centros de Treinamentos não conseguia aprender a ler e eu lhe como esqueletos. Eram totalmente
Autorizados (Authorized Training ensinei a ler em hebraico. Como? analfabetas aos oito, nove anos de
Centers – ATC), que atuam sob a Ensinei-lhe a ler uma prece. E não idade. Eu não podia aceitar a ideia de
supervisão do Instituto em Israel parei mais”. que fossem mentalmente limitadas.
e são gerenciados por especialistas Passei mais de sete anos trabalhando
treinados e certificados em Israel. Quando jovem estudou na Escola com essas crianças. Não conseguiam
de Professores de Bucareste. Na organizar o pensamento, nem suas
Sua vida época em que a Alemanha invadiu ações. Uma noite, em Jerusalém, um
o país, frequentava o curso de dos meninos, de oito anos, deitou-se
Reuven Feuerstein nasceu em 1921, Psicologia no Onesco College, ao meu lado e então começamos a ler
em Botosani, na Romênia, no seio tendo que interromper sua formação Filosofia juntos”. Este foi o começo
de uma família chassídica, sendo o educacional. Durante a 2ª Guerra de uma longa carreira centrada
quinto de nove irmãos. Desde cedo Mundial, o jovem Reuven foi no atendimento das necessidades
já dava sinais de ser dotado de uma prisioneiro um ano em campo de psicológicas e educacionais dos
personalidade especial. Começou concentração e depois em prisões imigrantes, refugiados e outros
a ler aos três anos, em três línguas: nazistas. Ao término do conflito, em segmentos especiais da população
iídiche, o idioma materno; hebraico, 1945, emigrou para a então Palestina israelense.
o paterno; e em romeno, o de sua sob Mandato Britânico, onde
terra natal. Sua habilidade era tanta começou a lecionar para crianças Feuerstein retornou à Europa para
que ensinava outras crianças, até mais sobreviventes do Holocausto. completar seus estudos em Psicologia
velhas, a lerem. Certa vez, Clínica e Geral na Universidade
em uma das milhares de palestras “Elas foram para Israel depois de Genebra, onde foi aluno de
que proferiu ao longo de sua vida de passar três a quatro anos nos acadêmicos como Andre Rey e
– contou o seguinte episódio: campos de concentração. Seus pais Jean Piaget, assistindo seminários e
“Quando eu tinha oito anos, haviam morrido nas câmaras de palestras proferidos por intelectuais
mandaram-me um garoto de 15 que gás. Algumas chegaram a Israel como Carl Jung e Karl Jaspers.
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PERSONALIDADE
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história
H
á quatro décadas, do Mediterrâneo entre 1580 e específicas vinculadas à arte
aproximadamente, a 1640, época em que Espanha e da medicina. Primeiramente,
pesquisa dos cristãos Portugal constituíam um único encontramos o physicus ou medicus,
novos ibéricos vem Reino. Muitos deles são lembrados responsável por detectar diversos
fazendo avanços rapidamente nas fontes inquisitoriais. tipos de lesões e doenças (sejam
consideráveis. Valiosos trabalhos No Arquivo Nacional da Torre do estas físicas ou psicológicas). Mas,
já foram publicados sobre a Tombo conserva-se uma lista de a partir do século 13, começou-se
dinâmica dos tribunais do Santo médicos cristãos novos que fugiram a exigir do physicus o diploma de
Ofício, o modo de vida judaico e o de Portugal em 1614, no auge da cirurgicus, um especialista formado
cumprimento de preceitos por parte união hispano-lusitana. Esta lista nas universidades europeias,
dos cristãos novos, a difusão de uma nominal (ANTT, maço 7, Mss. profissional capacitado para operar
literatura antijudaica em Portugal 2578-2644) inclui minibiografias de fraturas, realizar cirurgias de órgãos
durante os 300 anos em que atuou quase 70 médicos cripto-judeus que vitais e efetuar qualquer tipo de
a Inquisição e a inserção desses abandonaram o país rumo a “nações procedimento médico. Em Portugal,
conversos em suas novas comunidades livres”, como Marrocos, França, contrariamente aos países da
da Europa e do Novo Mundo. Holanda, Inglaterra, o Império Turco- Bacia do Mediterrâneo, tais como
otomano e, também, em direção ao Grécia, Itália, Creta, Espanha e
No entanto, é bastante escasso “Novo Mundo”, esquivando-se às sul da França, o médico clínico e
o material histórico acerca dos constantes perseguições organizadas o cirurgião portavam o título de
itinerários e rotas de fuga escolhidos pelo Santo Ofício. magister ou mestre. O farmacêutico
pelos cristãos novos, principalmente era o boticarius, mas a manipulação
aqueles que exerciam profissões Physicus, cirurgicus e dos medicamentos era feita pelo
necessárias para a sociedade ou a boticarius apothecarius. Uma profissão menos
corte real. Médicos de origem cristã valorizada em Portugal era a de
nova trabalhavam diariamente É comum fontes medievais barbeiro, o responsável pela extração
na Península Ibérica e na Bacia portuguesas elencarem profissões de dentes, infusões de sangue e
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Boticario Judeu nas Cântigas de Santa Maria de Alfonso X, o Sábio. Miniatura do Manuscrito del Escorial. séc. 13
raspagem do paciente antes das certas vezes, encontramos exceções, judeus, atingindo 63% da população
cirurgias. como os médicos cristãos novos médica do país. Este dado estatístico
Gaspar Lopes, que abriu uma loja derruba o preconceituoso mito
Em Portugal regiam as mesmas de fios de seda, ou Manuel de Mello, de que os médicos judeus tinham
normas que vigoravam em outros que atuou como cônego na cidade repulsa pelas cirurgias, autópsias ou
países da Europa. Neles havia uma francesa de Nantes. por procedimentos cirúrgicos mais
rígida fiscalização das atividades delicados nos quais era necessário
médicas e os profissionais que Como especialistas da saúde, os abrir o corpo do paciente.
atuavam nessas áreas recebiam suas médicos deviam comunicar aos
licenças dos próprios governos, governos os nomes dos pacientes QUEM ERAM OS MÉDICOS?
entrando automaticamente nas doentes ou feridos sob seus
guildas (associações de profissionais) cuidados, o tipo de tratamento A “Lista de 1614” fornece valiosa
destinadas aos médicos. Tanto por eles recomendados e as etapas informação acerca da origem, lugar
médicos como cirurgiões constituíam sugeridas para sua recuperação. de nascimento, moradia e idade dos
“comissões especializadas”, cujo Também deviam informar todos os médicos cristãos novos. Seus nomes
objetivo era testar as aptidões casos de óbito. Quando as brigas de e sobrenomes aparecem sob a grafia
daqueles que desejavam ingressar rua causavam a morte de um dos hispano-portuguesa, sendo possível
nas especialidades médicas. A envolvidos, as partes sobreviventes desvendar os motivos que levaram
maioria dos judeus fazia parte dessas eram punidas. Este tipo de legislação seus ancestrais nos séculos 12-13 a se
comissões, que outorgavam aos era bastante comum em países assentarem em terras lusitanas.
candidatos a tão almejada “licentia mediterrâneos, tais como Espanha,
practicandi” ou “licentia curandi”. Itália, Grécia, Sicília e Creta e sul da O estabelecimento do Santo Ofício
França. da Inquisição em Portugal, em
Segundo a tradição europeia, era 1536, após longa negociação entre
proibido aos médicos lusitanos Na Idade Média, os médicos o Estado e o Papado, gerou uma
mudar de área de trabalho. Porém, portugueses eram na sua maioria violenta onda de perseguições com
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história
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história
CONCLUSÕES FINAIS
BIBLIOGRAFIA
A “Lista de 1614” não fornece nunca uma empreitada coletiva. Azevedo, Pedro, Médicos cristãos novos
que se ausentaram de Portugal no princípio
informações sobre os perigos Segundo a “Lista de 1614”, na hora do século Xvii. Arquivo Histórico da
eminentes encontrados pelos da partida é possível detectar cinco Medicina Portuguesa, N.S, Vol. 5 (1914),
foragidos rumo às novas itinerários ou rotas de fuga: das págs. 153-172.
comunidades. Tampouco cidades de Portugal rumo às regiões Gonçalves, I., Físicos e cirurgiões
menciona os falsos “salvo-condutos” da Galícia e Madri (norte e centro da quatrocentistas: As cartas de exame. Do tempo
obtidos pelos médicos conversos Espanha); via Espanha rumo a Nantes, e da história I (1965), págs. 69-112.
ou faz qualquer referência aos no sul da França; rumo à Itália (por Lemos, M., História da Medicina em
familiares que fugiam junto terra ou via marítima); até os Países Portugal. 2 vols. Lisboa 1889.
com eles. Os médicos levavam Baixos: Flandres e Antuérpia; ou ainda
Pines, J., Essai sur l’Histoire des Medicins
consigo bens materiais, como do porto de Lisboa rumo ao “Novo au Portugal. Imprensa Médica XVII (1953),
ouro e prata, no entanto, isto não Mundo”: Brasil, Peru e Nova Espanha págs. 265-274.
é mencionado na documentação (região do México).
Roth, C., The Qualifications of Jewish
pesquisada. Physicians in the Middle Ages. Speculum 28
Driblando a presença permanente (1953), págs. 834-843.
Tudo indica que as condições para dos corregedores (policiais que
Shatzmiller, J., On Becoming a Jewish Doctor
abandonar o território luso rumo vigiavam portos e fronteiras), os in the High Middle Ages. Sefarad XLIII 2
à Europa eram difíceis e nem médicos conversos conseguiam (1983), págs. 239-250.
todos os médicos cristãos novos ingressar nas pequenas cidades e
estavam dispostos a se aventurar por fugir das perseguições inquisitoriais. Prof. Reuven Faingold é historiador
itinerários geralmente desconhecidos. Os pequenos vilarejos eram “postos e educador, PHD em História Judaica pela
Universidade Hebraica de Jerusalém.
A saída destes, com ou sem bens intermediários” nessa longa jornada É sócio fundador da Sociedade
materiais, foi sempre um projeto rumo às grandes metrópoles da Genealógica Judaica do Brasil e membro
do Congresso Mundial de Ciências
pessoal de cada profissional, mas Europa. Judaicas de Jerusalém.
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COMUNIDADES
é
difícil traçar a história o comércio marítimo, e nas terras da E.C., a dinastia real, as classes
dos judeus que viveram férteis da Península de Taurica ou dominantes e, em seguida, parte
nesse território, pois Tauris (atual Crimeia). Desde o da população se converteram ao
esta se entrelaça com início dessa colonização havia judeus judaísmo.
a da região. Ao longo vivendo nas cidades-estados gregas.
dos séculos, a Ucrânia foi cobiçada, Inscrições datadas do ano 80 da O século seguinte foi marcado
conquistada e dividida entre inúmeras E.C., descobertas no Bósforo, uma pela prosperidade. Uma das mais
nações. Khazares, varegues, mongóis, das principais cidades-estados gregas, importantes rotas de comércio da
lituanos, poloneses, russos, austro- testemunham a existência de uma época, que conectava as três partes
húngaros e soviéticos dominaram, em comunidade judaica estruturada, já do mundo até então conhecido,
algum momento de sua história, parte possuidora de uma casa de orações. atravessava os domínios khazares.
do território ucraniano. Assim como Atraídos pela prosperidade e pela
o território, seus habitantes passavam No século 7 da E.C., os khazares, possibilidade de viver numa nação
de uma soberania à outra. No caso da um novo poder militar vindo do onde o judaísmo era a religião dos
população judaica, isso significava que Cáucaso e da região Cáspia, subjuga governantes, um grande número de
esta teria que se sujeitar à postura e às as tribos eslavas e conquista a região. judeus se estabeleceu no Império
discriminações e restrições do novo O Império Khazar (ca. 650 – ca. Khazar. Muitos vinham dos
poder dominante relativas aos judeus. 965/968), que chegou ao seu apogeu domínios bizantinos para escapar
no século 8, durante o reinado às constantes discriminações,
Gregos e Khazares de Būlān, estendia-se das estepes perseguições e conversão forçadas
ucranianas às terras que se avizinham ao cristianismo grego-ortodoxo.
A partir do século 7 antes da ao Rio Ural, e da região do Meio No século 9, havia judeus em todas
Era Comum (a.E.C.), os gregos Volga ao Cáucaso do Norte, na cidade as regiões que hoje constituem o
instalaram colônias na parte norte de Astrakhan, no Mar Cáspio. território ucraniano, principalmente
da costa do Mar Negro (sul da atual Acredita-se que durante o reinado às margens do rio Dnieper e no leste
Ucrânia), uma área estratégica para de Būlān, por volta do ano de 740 e sul da Ucrânia.
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COMUNIDADES
A existência de um reino judaico no para o Rus’ Kievana (Kyivan Rus’), particular: o de Kiev e o da Galícia-
Cáucaso desperta, em meados do o primeiro estado eslavo oriental. Volínia. Em 1187, a palavra Ucrânia
século 10, o interesse de Rabi Hasdai A criação desse estado é de suprema (Ukrayina) é usada pela primeira vez
ibn Shaprut, médico pessoal dos importância para a região, pois, para descrever o principado de Kyiv
califas de Córdoba, Abd-al-Rahman do ponto de vista historiográfico, (Kiev) e o da Galícia.
III, e seu filho, Hakam II. Rabi estabeleceu as bases da identidade
Ibn Shaprut era, também, ministro nacional dessas três nações. O Principado de Kiev
da corte e diplomata encarregado,
entre outros, das negociações Em 877, os rus’ conquistam Kyiv O Principado de Kyiv, que ocupava
com delegações estrangeiras que (Kiev) e fazem dela a capital de seu a área da Ucrânia da margem direita
chegavam ao Califado. estado – Kyivan Rus’. Essa localização do rio Dnieper, foi o mais importante
estratégica da nova capital, situada principado de Kyivan Rus’. Desde a
Por volta do ano de 950, Ibn na confluência de dois rios, Dnieper fundação de Kiev, mercadores judeus
Shaprut envia uma missiva ao rei dos e Pripyat, e no cruzamento das haviam sido atraídos à cidade, que
khazares indagando sobre a história principais rotas comerciais Norte-Sul era um próspero centro comercial
de seu povo. A carta chega às mãos e Leste-Oeste, vai ser fundamental situado nos cruzamentos das rotas
de Joseph, o rei khazar, através dos para a rápida ascensão de seu império. de comércio, que uniam, de um lado,
bons ofícios de dois judeus que Kyivan Rus’ atingiu seu apogeu nos a Europa Ocidental, e, de outro, as
haviam acompanhado uma delegação séculos 10 e 11, com um território de províncias do Mar Negro, a Europa
a Córdoba. Em sua resposta, o rei 800 mil km2, que se estendia desde Oriental e o continente asiático.
Joseph relata o início da história as montanhas dos Cárpatos até o rio
dos khazares e sua conversão ao Volga, e do Mar Negro até o Mar Uma carta escrita por judeus de Kiev,
judaísmo. A troca de correspondência Báltico. encontrada na Guenizá do Cairo,
entre Rabi Ibn Shaprut e o rei revela que havia judeus vivendo na
Joseph, que ficou conhecida como Um dos grandes pontos de inflexão cidade e em outras partes na Ucrânia
a “Correspondência Khazar”, é um da história ucraniana foi a conversão, central já no século 10. Sob o governo
dos poucos documentos conhecidos no século 10, do povo ao cristianismo do príncipe Svyatopolk II (1093-
de autoria khazar e uma das poucas greco-ortodoxo. Essa conversão 1113), os judeus eram protegidos
fontes primárias da história desse vai ser crucial, também, para a e usufruíam de total liberdade em
império. história dos judeus da Ucrânia, por termos comerciais, tendo mesmo
ser marcada por um profundo e confiado a alguns deles a cobrança de
Por volta de 966, tribos eslavas endêmico antijudaismo. Logo após a impostos do principado.
lideradas por príncipes russos conversão, o clero ortodoxo passou a
invadem o Império. Os khazares incitar o povo contra os judeus. Em Já era marcante a dicotomia entre
retiram-se para seus domínios na Kiev, por exemplo, Theodosius (1057- os interesses dos governantes e
Península da Crimeia, a Khazaria, 1074), abade do Mosteiro Pechersk o antijudaismo do povo, funesta
como era chamado seu estado, e Lavra, pregava a necessidade de “viver herança do cristianismo greco-
mantêm sua independência até em paz com os amigos e inimigos, ortodoxo. Em 1113, logo após
meados do século 11, quando são mas com seus próprios inimigos, não a morte de Svyatopolk, os
conquistados pelos russos e pelos os inimigos de D’us: os judeus e os judeus de Kiev foram vítimas do
bizantinos. hereges”. Em Chernigov, uma das primeiro pogrom. Mas, apesar das
mais antigas comunidades judaicas, dificuldades, continuaram a viver lá
Estado Rus’ Kievana e a também os judeus passaram a ser alvo e em outros locais do principado,
identidade ucraniana da hostilidade da população. tendo sido fundamentais para seu
desenvolvimento comercial, ajudando
Varegues da Escandinávia – A partir de 1054, as lutas entre a conectar a região com os centros
chamados de Rus’ – conquistam, príncipes de Rus’ levaram à mais desenvolvidos da época.
no século 9, o território que hoje fragmentação do Kyivan Rus’ em
engloba três nações eslavas orientais 13 principados. Dois deles são de Com o crescimento econômico da
modernas: a Ucrânia, a Bielorrússia e grande importância na história da região, aumenta o influxo de judeus
a Rússia Ocidental, lançando as bases região, em geral, e na judaica, em oriundos da Khazaria, do Império
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Bizantino e da Europa Ocidental, de dois principados distintos, Kiev, foi caindo em mãos da
particularmente da Renânia (em Volínia (região oeste da Ucrânia) e Lituânia.
alemão, Rheinland), uma região no Galícia (hoje, Ucrânia Ocidental).
oeste da Alemanha. Em crônicas da Durou 150 anos e foi um dos três A expansão do Grão-Ducado da
metade do século 12, há frequentes estados mais importantes que Lituânia atingiu o seu auge em
citações do “Portão Judaico” de Kiev. emergiram da desintegração de meados do século 14, quando
E os rabinos alemães do período Kyivan Rus’. este incluía o território da atual
referem-se, em seus escritos, a judeus Bielorrússia e da maioria dos
que viajam com suas mercadorias territórios ucranianos, além de parte
para a “Russ”. Há referência a Kiev, A Galícia-Volínia atingiu o apogeu da Polônia e Rússia.
também, nos relatos de viajantes nos séculos 12 e 13. Um grande
judeus da época, entre os quais, número de judeus alemães se Os grão-duques concederam
Benjamin de Tudela e do Rabi estabeleceu na Galícia e em outras privilégios a todos os judeus em seus
Petachiah de Ratisbon (Regensburg, cidades na parte oeste da Ucrânia, domínios. Em Kiev, o número de
na Bavária). a partir do século 12. Em Lviv1 judeus aumentou consideravelmente
estabeleceram-se logo após a e eles desfrutavam de muita
No início do século 13, os mongóis cidade ter sido fundada, em meados prosperidade.
invadem a região semeando terror, do século 13. Por causa de sua
morte e destruição, e os judeus localização mais no oeste da atual Em 1386, o casamento entre Jogaila,
sofrem amargamente, assim como Ucrânia, a Galícia-Volínia não foi grão-duque da Lituânia, e Edviges
o restante dos habitantes. Em 1240, invadida por hordas nômades vindas I, rainha da Polônia, vai ser de
liderados por Batu, neto de Genghis do Leste mantendo um considerável extrema importância na história
Khan, os mongóis tomaram Kiev grau de independência até 1340. Mas, da região. Além de o casamento
pondo fim à independência do acabou sendo presa de seus vizinhos ter sido condicionado à conversão
principado, que passa a fazer parte do católicos: a Polônia ficou com a de Jogaila e outros nobres lituanos
Império Mongol. Galícia e a Lituânia, com a Volínia. ao catolicismo, criou-se uma
união dinástica entre a Polônia e a
Principado de Galícia- A Comunidade Polaco- Lituânia.
Volínia Lituana
No decorrer do século seguinte, em
O Principado de Galícia-Volínia Enfraquecidos por conflitos internos todo território sob a união dinástica
surgiu em 1199, resultante da união e invasão dos mongóis e dos tártaros, da Polônia e a Lituânia aprofunda-
os principados ucranianos ofereceram se o processo de “polonização”.
pouca resistência à hegemonia Quando passa a ser necessário ser
1
Lviv – Quando a cidade foi tomada pela
lituana. Progressivamente, a maioria católico para fazer parte da cúpula
Polônia, seu nome mudou para Lvov. das terras de Rus’ Kievana, inclusive governamental e militar, a maior
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COMUNIDADES
parte da elite ucraniana e lituana se Vida judaica tolerandis Judaeis. Em Kiev, em 1619,
converte ao catolicismo. conseguiram, pela primeira vez,
No final da Idade Média, milhares expulsá-los.
Durante longo tempo, os judeus de judeus de várias partes da Europa
sob o domínio dos grão-duques Ocidental se haviam estabelecido na Em meados do século 17, estavam na
lituanos gozavam de direitos sociais Polônia. As Cruzadas, as expulsões, Ucrânia 45 mil dos 150 mil judeus
e econômicos mais favoráveis do os pogroms, a Peste Negra os haviam que viviam nas terras sob o domínio
que os vigentes na Polônia. Por isso, forçado a buscar refúgio no leste da polonês na margem direita do Rio
em 1389, com a união da Polônia e Europa. A grande maioria instalou- Dnieper, nas províncias de Volínia,
Lituânia, para assegurar aos súditos se nos domínios da Coroa Polonesa, Podólia, Bratislaw, Ruś Czerwona
judeus os seus direitos, outorgou- que, a partir do final do século 13, e Kiev. A população judaica era
se lhes uma carta-privilégio. O concedera condições favoráveis organizada em kehilot (congregações)
documento não só lhes garantia ao seu assentamento, com amplas dirigidas por um conselho
participação em pé de igualdade garantias jurídicas. comunitário composto de rabinos
com os comerciantes cristãos como, e personalidades da comunidade.
também, assegurava-lhes a compra e Os direitos concedidos pela Coroa Na Polônia, um nível adicional foi
o uso de terras. Polonesa lhes haviam aberto novas acrescentado: um conselho nacional,
oportunidades econômicas tanto da o Conselho das Quatro Terras (Vaad
Cem anos mais tarde, em 1495, os zona rural como nas cidades onde Arba’ah Aratzot), composto pela
judeus são expulsos da Lituânia, lhes era permitido viver. Na medida maioria dos rabinos proeminentes e
causando a emigração de muitos para que prosperavam, a população líderes leigos da época.
a Crimeia, mas serão readmitidos cristã se ressentia da competição.
em 1503. Em fins do século 15 Repetidamente, em inúmeras O ídiche era o idioma utilizado
havia judeus ocupando importantes cidades, durante os séculos 17 e por todos os judeus. A vidas girava
posições financeiras em Lvov e 18, acumulavam-se os pedidos à em volta de suas sinagogas. Sua
Kiev, sendo que na corte circulavam Coroa para que esta determinasse profunda religiosidade lhes era
médicos, banqueiros, grandes que, naquela cidade, não podiam fonte de consolo e determinava
comerciantes e arrendatários judeus. viver judeus. Era o famoso non todos os aspectos de seu cotidiano.
O estudo judaico era de primordial
O processo de “polonização” foi importância. A fama de uma cidade
concluído em 1569 com a União de não residia em sua importância
Lublin, que transformou o Reino econômica, mas no número de
da Polônia e o Grão-Ducado da suas ieshivot e na reputação de seus
Lituânia em um único estado, rabinos. Em meio à população
a Primeira República da Polônia, polonesa, na qual só o clero e uma
conhecida, também, como a minoria da alta nobreza eram
Comunidade Polaco-Lituana ou educados, e 90% do povo não
das Duas Nações. Oficialmente, a sabiam nem ler nem escrever, era
Polônia era uma república governada praticamente nulo o analfabetismo
por um rei eleito pela nobreza entre os judeus.
polonesa, a szlachta.
O Sistema Arenda
Nos séculos seguintes, o estado
polonês continuou a se expandir para A partir de1569, quando foi criada
o Leste, tornando-se um dos maiores a Primeira República da Polônia,
e mais populosos países da Europa. A foram disponibilizados aos judeus
República abrangia os territórios do amplos lotes de terra, na Ucrânia,
que são hoje a Polônia e a Lituânia, a pertencentes à alta nobreza
Bielorrússia e a Letônia, grande parte polonesa. Judeus vindos de toda a
da Ucrânia e Estônia, além da região Europa foram para essa região. Os
Coroa em prata para enfeitar a Torá,
ocidental da atual Rússia. Ucrânia, primeira metade do século 19 nobres poloneses lhes arrendavam
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COMUNIDADES
Reprodução do teto da Sinagoga de Chodorow, Ucrânia. Pintado por Israel Lisnicki em 1714 . Museu da Diáspora Tel Aviv
por onde passavam. Ao capturar porque os poloneses não permitiram mães (...). Atrocidades semelhantes
as cidades e os vilarejos poloneses, que se refugiassem na fortaleza. foram perpetradas em todos os
judeus e padres católicos eram Segundo a tradição, os túmulos lugares por onde passavam...”.
cruelmente assassinados, sendo estavam localizados próximos ao
poucos os que se salvaram. Apesar de muro oriental da Grande Sinagoga, É muito difícil determinar o número
serem os poloneses o principal alvo, onde era costume orar pelos mortos total de vítimas judias dos massacres
foi sobre os judeus que se abateu durante o jejum de Tishá B’Av. de 1648 e 1649, conhecidos entre
toda a sua fúria. Estima-se que havia os judeus como Gzeyres takh vetat
150 mil judeus vivendo no território O pesadelo chegou praticamente ao (Malignos decretos). As crônicas
da atual Ucrânia. fim em agosto de 1649, quando um judaicas dizem que foram 100 mil,
tratado assinado entre Chmielnicki mas há relatos de que foram 300
Judeus das áreas rurais dirigiram- e a Coroa Polonesa restabeleceu o mil e que mais de 300 comunidades
se às cidades procurando proteção. domínio do governo polonês nas foram destruídas. Foi decretado um
Milhares deles batalharam ao partes da Ucrânia onde vivia a maior dia de jejum (20 de Sivan) e preces
lado dos poloneses nas cidades população judaica. especiais foram compostas em
fortificadas, que se transformaram memória das vítimas.
para eles em armadilhas mortais. Na Uma das crônicas judaicas da época
hora do perigo, os poloneses sempre descreve a devastação e a obscena No entanto, apesar da magnitude do
abandonavam os judeus sozinhos. brutalidade: “Muitas comunidades desastre, muitos judeus retornaram
além do Dnieper, como Pereyaslaw, à Ucrânia após ter sido restaurada a
A literatura martirológica judaica Baryszowka, Piratyn e Boryspolê, calma, mas décadas se passaram até
da época recorda o massacre de Lubin, Lachowce (...) tiveram novamente se tornarem importantes
comunidades como Nemirov, Ostrog morte cruel e amarga. Alguns de no contexto do judaísmo polonês.
e Narol. Em Tulchin, soldados seus integrantes foram esfolados A história da Ucrânia daria mais
poloneses entregaram os judeus vivos e sua carne atirada aos cães; uma guinada quando Chmielnicki
em troca de suas próprias vidas; outros tiveram as mãos e membros procurou a ajuda dos russos, que
em Tarnopol impediram os judeus decepados e seus corpos atirados na invadiram o nordeste da Polônia
de entrar, apenas para dar alguns estrada só para serem destroçados e a Ucrânia. Em 1655, os suecos
exemplos da barbárie. Em Dubno, pelos carros e esmagados pelos invadiram a Polônia Ocidental.
dois mil judeus que viviam na cidade cavalos (...). O inimigo massacrou Ao final daquele ano, quase toda
e redondezas foram massacrados mulheres crianças no colo de suas a Polônia estava ocupada por
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cossacos, russos e suecos. No ano sentimentos, aglutinada por uma único vilarejo judaico na Ucrânia e
seguinte, todavia, o exército polonês debilitante pobreza, serviu de pano no resto da Europa Oriental que não
foi reorganizado e fez recuar de fundo para o surgimento dos estivesse sob a influência do Baal
os invasores. Mas a Polônia se movimentos chassídicos. Shem Tov e de seus ensinamentos.
encontrava em estado caótico e era
grande a deterioração econômica. O fundador Rabi Israel Ben Eliezer, Com sua morte, a liderança do
o Baal Shem Tov (o Besht), nasceu movimento passa para o discípulo
No século 18, o ódio acumulado na Podólia, em 1700. Na época, que lhe era mais próximo – o
pelas massas ucranianas volta à tona. as comunidades judaicas estavam Maguid, Rabi Dov Baer (1710-
A desordem geral e a agitação dos afundadas em desespero, com a 1772), que se estabeleceu na cidade
padres greco-ortodoxos levaram à intensificação dos pogroms e das de Mezeritch, na Volínia. Rabi Dov
formação de bandos conhecidos acusações de assassinato ritual Baer enviou discípulos para espalhar
como Haidamacks, compostos por contra os judeus. Ademais, a Polônia os ensinamentos do Baal Shem Tov.
cossacos da Rússia, Ucrânia e servos enfrentava graves dificuldades
fugitivos. econômicas e tensões sociais que A cidade de Berditchev, localizada na
afetavam o dia-a-dia e sustento das atual Ucrânia, está inexoravelmente
Os Haidamacks atacaram a Ucrânia populações judaicas. Esses fatores, ligado ao nome de Rabi Levi Yitzhak
em 1734, roubando e destruindo aliados à desilusão decorrente do – “o advogado do Povo Judeu
muitas cidades e vilarejos, episódio de Shabetai Zvi – um perante o Trono Celestial”. Rabi
assassinando grande número de pseudo-cabalista que alegara ser o Levi Yitzhak foi dos mais famosos
nobres poloneses e milhares de Mashiach –, reforçaram a procura de alunos de Rabi Dov Baer. Este foi
judeus. O comandante das forças sinais da redenção messiânica.
Haidamacks, Wasski Washchilo,
proclamara que o objetivo da revolta Os líderes religiosos, à época
era “destruir o Povo Judeu para traumatizados pelo episódio de
proteger o cristianismo”. De acordo Shabetai Zvi, baniram o ensino do
com o censo oficial de 1764 viviam misticismo judaico, ficando o estudo
no território da atual Ucrânia da Torá restrito à elite. Deve-se
258 mil judeus, mas acredita-se que lembrar que, naquele então, somente
eram mais de 300 mil. Bandos de a erudição da Torá era considerada
Haidamacks acabaram destruindo o caminho do judaísmo, mas eram
comunidades em Fastov, Granov, poucos os que podiam dar-se ao luxo
Zhivotov, Tulchin e Dashev. Em de estudar. Os livros sagrados eram
1768, os judeus de Uman foram alvo raros e caros e a maioria trabalhava
de um terrível massacre. Segundo dia e noite para sobreviver. Barreiras,
relatos de testemunhas, entre 50 mil incluindo diferentes sinagogas,
e 60 mil judeus foram cruelmente separavam os cultos dos incultos,
assassinados. os ricos dos pobres, os líderes dos
homens do povo.
Os massacres não interromperam
a imigração judaica para a Ucrânia Grande parte da vida do Baal Shem
apesar das tensões entre os judeus e Tov foi dedicada a aliviar a sensação
as populações ucranianas ao longo do de desespero – tranquilizar os judeus,
século 19. animar seu espírito deprimido e
eliminar temores e ansiedades.
Chassidismo Para os judeus da Europa Central
e Oriental, especialmente aqueles
O Chassidismo apareceu que viviam na miséria e sofrimento,
primeiramente nos povoados da ele passou a ser a materialização
Ucrânia no início do século 18. da esperança. Quando deixou esse Judeus ucranianos na sinagoga,
Uma mistura de sofrimentos e mundo, em 1760, não houve um na visão do pintor Robert Guttman
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COMUNIDADES
o Rebe dos Rebes foi o mestre dos russo, o antissemitismo era uma a queda do regime czarista, em 1917.
pilares espirituais do Chassidismo: política oficialmente sancionada Nos território da atual Ucrânia os
Rabi Shneur Zalman de Liadi – o pelo governo, algo que não acontecia judeus ainda viviam em cidades
fundador do movimento Chabad- em outros países europeus. Dentre em shtetls, onde eram a maioria da
Lubavitch –, o Vidente de Lublin todas as minorias que viviam sob o população. De acordo com o censo
e os dois “irmãos sagrados”, Rabi jugo czarista, a mais hostilizada era a oficial de 1847 por volta de 600 mil
Elimelech de Lizensk e Rabi Zusia judaica; os maus-tratos, a hostilidade judeus viviam no território da atual
de Anipoli. e o desprezo eram uma constante. A Ucrânia, mas acredita-se que eram
política czarista era uma mistura de mais de 900 mil. Suas vidas não
O domínio russo desprezo e medidas discriminatórias, haviam mudado, continuavam a falar
e de esforços para “regenerá-los”, o iídiche e seus filhos estudavam
Os 20 anos de guerra que colocaram “russificando-os” e os obrigando a se nos cheders2. A vida ainda girava
a Polônia contra invasores suecos “amalgamar” com a população cristã. em volta das sinagogas, dos Rebes,
e russos resultaram em uma das leis judaicas e das festas do
deterioração econômica e em tensões Por breve tempo, depois de 1772, calendário judaico. No decorrer
sociais, e no final do século 18, a a czarina Catarina II, a Grande, do século 19, progressivamente, os
Polônia deixa de existir como país expressou certa benevolência em judeus dos vilarejos migraram para
soberano, sendo dividida entre seus relação aos novos súditos judeus, povoados e cidades maiores, onde,
poderosos vizinhos em 1772, 1793 concedendo-lhes o direito de em muitos casos, se tornaram um
e 1795. A Prússia ficou com a parte residência. No entanto, pressionada amplo segmento das classes pobres
ocidental até o Mar Báltico, a Áustria por negociantes cristãos de Moscou, trabalhadoras.
com um pedaço central que incluía que queriam impedir a atuação
a Galícia, mas coube à Rússia ficar de comerciantes judeus, em 1791 Súditos dos czares, os judeus
com a maior parte do território- a a Czarina proíbe os judeus de se dos territórios ucranianos (com
Ucrânia, Lituânia e Polésia. estabelecerem na Rússia Central, exceção dos judeus da Galícia que
no “solo da Mãe Rússia”. Uma estavam sob o domínio austro-
Centenas de milhares de judeus exceção foi feita no antigo território húngaro) estavam sujeitos a todas
se tornam súditos indesejáveis dos do sul da Ucrânia. Esta região, a as leis e imposições promulgadas
czares, antes disso não lhes era “Nova Rússia”, foi aberta aos judeus pelo governo imperial. Em 1804,
permitido se estabelecerem nos e outras minorias com o intuito Alexandre I promulga o “Estatuto
domínios dos czares. Sua história foi de povoar a área e desenvolver dos Judeus”. Grande parte das
bem diferente, mais sofrida do que sua economia. A cidade principal, medidas visava sua “russificação”.
a daqueles que ficaram sob domínio Odessa, tornou-se rapidamente Outro estatutos atacava as bases
austro-húngaro, bem como das importante centro de vida judaica. econômicas da população judaica,
populações judaicas que viviam na proibindo-a de arrendar terras,
Europa Ocidental e Central. Em 1775, a Czarina promulgou comercializar bebidas alcoólicas,
O regime czarista foi um dos um decreto determinando o inclusive dirigir tabernas. Milhares
exemplos mais persistentes de confinamento dos judeus – dessa de judeus ficaram de um dia para
autocracia da História. Os soberanos vez não em guetos, mas numa parte outro sem meios de sustento. O
exerciam poder absoluto e, no século de seu Império, a chamada “Zona governo czarista queria convencer
19, ainda existia uma ordem pré- de Residência” ou “Território do os servos de que sua vida miserável
moderna de classes sociais: de um Acordo” – em russo, Cherta Osedlosti. e sofrida era “consequência” das
lado, privilégios aristocráticos, e, atividades econômicas dos judeus,
de outro, um sistema legalizado de Na área que incluía a antiga Polônia, e não de sua exploração por nobres
servidão. No final do séc. 19 e início Ucrânia, Bielorrússia e Lituânia latifundiários.
do séc. 20, em todo o território passaram a viver mais de 90% dos
judeus do Império. Eles só podiam É difícil dizer qual dos czares russos
se aventurar fora da área delimitada foi pior para os judeus. Mas, não há
2
Cheder - Quarto, em hebraico. Pequena com permissão especial, de curta dúvida de que Nicolau I foi um dos
escola onde se ensinava aos meninos
os fundamentos do judaísmo, da língua validade, de difícil obtenção. Esse piores. Odiava todas as minorias mas,
hebraica e das orações. confinamento forçado prevaleceu até em particular, os judeus. Entre outras
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REVISTA MORASHÁ i 84
73 julho 2014
COMUNIDADES
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CARTAS REVISTA MORASHÁ
Felicito toda a equipe da Morashá, Muito obrigado pelo envio da Frequentei por muito tempo o
uma revista que honra a tradição Morashá. Gostei muito da Carta Shil Da Vila, (Adat Yschurum) no
de bem educar do judaísmo. ao Leitor e que belo o suplemento Bom Retiro, depois me mudei para
O número de abril com o anexo para o Seder. Vale destacar, entre Joinville e passei a frequentar o
dedicado ao Seder de Pessach está outros, Os fundamentos do Judaísmo, SIP Curitiba. Fiz aliá, fiquei dois
realmente irretocável. O capricho As 20 Crianças de Hamburgo e o anos e meio em Beer Sheva, e
não é só nos aspectos primordiais artigo sobre Moacyr Scliar. frequentava a Beit Knessset Ohel
da divulgação religiosa associada à Rachel e a Yeshivah Orot Ysrael, na
Marcio Shmuel Gomes
qualidade cultural. A impressão é Rio de Janeiro - RJ
mesma cidade. Regressei ao Brasil há
belíssima, a arte visual de alto nível dois meses e provavelmente retorne
e a impressão em excelente papel. Parabéns à Morashá. Quero agradecer ao Shil da Vila mais para festas e
Fazendo parte da pequena kehilá de à equipe da revista pela felicidade alguns shabatot por mês. Não vi
Vitória, Espírito Santo, gostaria de de poder receber esta relíquia, um até hoje uma revista tão bem editada
saber da possibilidade de me tornar tesouro de ensinamentos que como a Morashá, feita com amor
assinante, pois os números a que enriquecem a nossa identidade judaica. e carinho, nos exemplares que
ocasionalmente tenho acesso são do sempre recebia de amigos pode-se
Inês Rosenthal
meu filho. Rio de Janeiro - RJ
notar o nível de empenho em sua
Renato Guéron
produção. Ela traz sempre temas de
Vila Velha - ES
A Morashá é uma revista muita importância para nós. E sem
maravilhosa e impressionante a cada dúvida para meus filhos será mais
Quero agradecer por esses anos edição. uma fonte constante de informação
todos de rica instrução que a equipe e ligação com nossas tradições e
Fernando Boldrin.
de Redação da Morashá tem-nos Ribeirão Preto - SP
interesses.
proporcionado. Nossa gratidão não
Vangelis Maciel Lopes
pode ser expressa em palavras, nem Gostaria muito de agradecer o Votuporanga - SP
mesmo um gadol assir tová, nem um recebimento da Morashá de Pessach.
TODÁ RABÁ em letras maiúsculas Parabéns pela excelente publicação Nós, da Biblioteca “Olíria de Campos
podem descrever como é bom receber que muito honra ao povo judeu. Barros”, agradecemos a doação da
tantas informações sobre nosso povo Choil Plosk
revista e suplemento da Morashá,
e sua herança milenar. Em especial Rio de Janeiro - RJ edição 83, abril 2014. Será um
agora, com a chegada do meu neto prazer incluí-los em nosso acervo
Isaac, terei motivos adicionais para Desejamos parabenizar, mais uma e disponibilizá-los à população de
continuar amando a publicação e, junto vez, pela excelência dos artigos da Diadema.
com a Hagadá, estudar cada mitzvá e publicação e agradecer pelos envios Fabio Orsi Meschini, Bibliotecário
nossa Torá com meu pequenino. que recebemos faz muitos anos. Prefeitura do Município de Diadema
Secretaria de Cultura, Serviço de
Ivan Liñares David Gerzvolf Gubin Biblioteca e Documentação
Por e-mail Manaus - AM Diadema, SP
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