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SANDRA JATAHY PESAVENTO

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9 ^EDIÇÃO

MARTINSLIVREIRO • EDITORA
Sandra Jatahy Pesavento permane
ce muito viva entre nós. Com um
currículo admirável, a atestar uma
vida de dedicação e entrega ao
aprendizado e ao ensino, tomou-se
exemplo e referência, em nosso meio
cultural, nos estudos históricos,
literários, sociológicos, econômicos.
Com uma vasta bibliografia, ao lado
do magistério proficiente e de
inúmeras atividades correlatas, em
sua pródiga existêncianão se permi
tiu descansos e lazeres. Esta História
do Rio Grande do Sul, de tanta utilida
de e proveito, tomou-se fonte de
pesquisa indispensável para aqueles
que pretendem enriquecer o espírito
com o conhecimento pleno das
nuanças históricas de uma gleba
abundante em acontecimentos e
episódios marcantes e instigantes.
Nada escapa à sua observação crítica
e nada esconde aos destinatários do
seu esforço intelectual. Amestra que,
em sala de aula, sempre se revelou
atenta, abnegada, inteligente e
solícita, quando escreve, com a
mesma lucidez, deixa fixada, para â
posteridade, a seiva enriquecedora
de tantos saberes. Metódica, objetiva
e concisa, sua obra há de continuar
servindo de guia confiável aos
estudiosos de nossa história. Com
esta reedição, tantas vezes reclama
da, prestamos reverente homena
gem à memória da autora e contribu
ímos para comprovar que seus
ensinamentos persistem firmes,
muito vivos e sempre profícuos.

Martins Livreiro Editora


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SANDRA JATAHY PESAVENTO

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9- Edição

MARTINS UVRElRO.EDnDRA

Porto Alegre, RS, Brasil


2014
© Sandra Jatahy Pesavento

EDITORA-CHEFE MARCIA MARTINS


CAPA ROBERTO DOS REIS FRANCISCO
DIAGRAMAÇÃO E PROJETO GRÁFICO JARDSON CORRÊA
PREPARAÇÃO DOSORIGINAIS DANIELATASSONI
REVISÃO CAREN CAPAVERDE

Martins Livreiro Editora LTDA.


AV.Venâncio Aires,169 Sala 101
CEP: 90040.191
Porto Alegre- RS- Brasil
Fone/fax: (55) (51) 3224-4798
Site: www.martinslivreiroeditora.com.br
E-mail: martinseditora@terra.com.br

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CPI)


(Biblioteca Pública do estado do RS, Brasil)

P472h Pesavento, Sandra jatahy.


História do Rio Grande do Sul. 9.ed. / Sandra jatahy Pesavento.
—Porto Alegre : Martins Livreiro Editora, 2014
138 p.

978-85-7537-169-5
1. Rio Grande do Sul — História. I. Título.

CDU: 94 (816.5)

Catalogação elaborada pela Biblioteca Pública do Estado

Évedada a reprodução desta obra, por quaisquer meios, sem a autorização do editor.
âPtt/nict/Uiy

I o RIO GRANDE DE SÃO PEDRO 9


Uma tardia integração 9
A expansão rumo ao Sul: o Prata 11
A expansão rumo ao Sul: Os SetePovos das Missões 12
A expansão rumo ao Sul: a economia subsidiária 14
A apropriação militarda terra 20

IIA PROVÍNCIA DE SÃO PEDRO 35


A Revolução Farroupilha 35
A pecuária gaúcha: apogeu e crise 39
A economia colonial imigrante 44
A política rio-grandense no II Império 50

IIIA REPÚBLICA POSITIVISTA 63


A implantaçãodo regime 63
A crise do "celeiro do país": agropecuária e indústria 68
A consolidação da República 76
A crise dos anos 1920 e a Revolução de 30 81

rV o RIO GRANDE NO PÓS-30 101


A Revolução de 30 101
A República Nova (1930-1937) 104
O Estado Novo (1937-1945) 1\2
O Rio Grande no período populista 119

REFERÊNCIAS
Dedico esta edição aos meus queridos netos Nina,
Lorenzo, Rosa, Pietra, Joaquim e Luca, para que sempre te
nham orgulho da Vovó Sandrinha.
Para Rodrigo e Ana Paula com carinho.
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Rio Grande do Sul integrou-se tardiamente ao restante do Brasil
colonial. Foi descoberto no início do século XVI, a partir de expe
dições litorâneas de exploração e comércio de pau-brasil, típicas dafase
pré-colonizadora, que chegaram até o litoral do extremo sul do Brasil.
Dessas viagens, resultaram registros e descrições da costa gaúcha, as
sim como a generalização do nome "Rio Grande de São Pedro" para
toda a area. Entretanto, a região permaneceu inexplorada por mais de
um século, enquanto que no restante daAmérica portuguesa sedesen
volviam os engenhos de açúcar. Desvinculado da agricultura colonial
de exportação diretamente integrada ao mercado internacional, o Rio
Grande do Sulcarecia de sentido no contexto do processo de acumula
ção primitiva de capitais que se verificava nos quadros do Antigo Sis
tema Colonial.
No plano geral europeu, desencadeava-se o processo detransição
do feudalismo para o capitalismo, proporcionando uma primeira acu
mulação de capitais. Um dos mecanismos que contribuíram para que
esse processo se desse foi a exploração colonial, que permitia extrair
excedente econômico produzido nas colônias a fim de ser acumulado
na metrópole. Aexploração colonial assentava-se basicamente em pro
dução já existente nas áreas coloniais (as riquezas minerais, por exem
plo) ou em formas de produção agrícola aqui instaladas segundo os
interesses e as necessidades do capitalismo nascente (caso do açúcar).
O Rio Grande do Sul não se enquadrava em nenhum dos dois
casos, daí a sua tardia integraçãoao sistema colonial.
No decorrer do século XVII, verificaram-se as primeiras tenta
tivas de expansão rumo ao sul. Durante o domínio espanhol (1580-

^
1640), os holandeses não somente ocuparam o nordeste brasileiro como
também apoderaram-se daquelas zonas da África fornecedoras de mão
de obra negra, ocasionando a falta de escravos para o restante do Brasil
não holandês. Tal ocorrência fez com que São Paulo, área desvinculada
do processo agroexportador e que, na ausência de recursos para compra
de mão de obra negra, já utilizava o índio nas atividades de subsis
tência, se lançasse no apresamento dos selvagens. São Paulo tornou-
-se uma área especializada no apresamento dos índios para vendê-los
como escravos nas zonas açucareiras. Esgotadas as possibilidades de
caça aos índios mais próximos, as bandeiras paulistas que se consti
tuíram laçaram-se contra as "reduções" indígenas estabelecidas pelos
missionários da Companhia de Jesus, na região de Itatins e Guairá, à
margem esquerda do Rio Paraná, em território castelhano.
As missões jesuíticas se apresentavam, assim, como uma impor
tante fonte de mão de obra, onde os índios já se achavam aldeados pelos
padres e adestrados para o trabalho e a obediência. Sendo atacadas as
reduções do Paraguai, os padres, para fugirem dos paulistas, penetra
ram em território rio-grandense, em 1626, estabelecendo reduções na
chamada zona do "Tape". Essa área estendia-se pela bacia do Jacuí,
limitando-se, por um lado, com os contrafortes das serras do Mar e
Geral e com o Rio Uruguai, por outro.
A fundação das reduções jesuíticas do "Tape" representou uma
dilatação das missões do Paraguai para o Rio Grande do Sul, e, por
tanto, uma penetração que se fazia sob bandeira castelhana. Antes dos
padres da província do Paraguai, já jesuítas portugueses haviam pene
trado no Rio Grande do Sul, a partir de 1605, estabelecendo reduções
desde o Mampituba até a zona do Gravataí. Todavia, tanto por falta
de apoio das autoridades jesuíticas da Província do Brasil, com sede
em Salvador, quanto pela hostilidade dos bandeirantes, esse "ciclo por
tuguês" de penetração missionária no Rio Grande não deixou marcas
duradouras. Já com relação aos jesuítas que penetraram sob bandeira
espanhola, estes ocuparam a área que se estendeu pela zona de Ijuí,
Piratini, Jacuí, Taquari, Ibicuí, Guaíba, Rio Pardo, fundando reduções,
onde dedicaram-se à agricultura e formaram estâncias de criação de
gado trazido da província argentina de Corrientes.
Descendo no encalço dos índios aldeados, os bandeirantes pene
traram, por sua vez, no Rio Grande do Sul, atacando as missões para
disputarem a posse da mão de obra aborígene.
Por volta de 1640, registrou-se o combate final, que resultou no
abandono jesuíta da área e no apresamento de muitos índios. A partir
dessa data, os paulistas não mais desceram ao Rio Grande com inten
ções de prear índios. Isso se deu, basicamente, porque com o fim do
Domínio Espanhol, os portugueses conseguiram expulsar os holan
deses da África, restabelecendo-se a normalidade do tráfico negreiro.
Com isso, desativou-se a atividade de caça ao índio, que havia sido
sempre uma mão de obra alternativa ao negro escravo.
Os jesuítas, por seu lado, retiraram-se para a outra margem do
Uruguai, levando os índios, mas deixando o gado que criavam nas re
duções. Esses rebanhos, abandonados no pampa e reproduzindo-se à
solta, tornaram-se bravios e formaram uma imensa reserva de gado,
conhecida como "Vacaria Dei Mar".

Estava lançado o fundamento economico básico de apropriação


da terra gaúcha: a preia do gado xucro.

dé âPtiyl:
Apartir do fim do Domínio Espanhol, Portugal teve seu Império
Colonial reduzido e voltou-se para o Brasil, base desustentação princi
pal do Reino. O Império português sofreuperdas no Oriente e na África
em face das concessões feitas a holandeses e ingleses. Objetivando lu
crar mais com a exploração de sua colônia, voltou-se para áreas ain
da não exploradas, como o extremo sul. Em especial, a zona do Prata
apresentava-se como o principal foco de atrações. Em Buenos Aires, os
portugueses já haviam lançado suas bases desde o início do Domínio
Espanhol, quando a burguesia comercial lusa, em recompensa por ter
apoiado ocandidato espanhol ao trono português, recebeu licença para
estabelecer-se no Prata e lá comerciar (prática do "asiento").
Findos os 60 anos de Domínio Espanhol, os portugueses passa
ram a ser hostilizados na cidade portenha, numa fase em que já tinha
interesses consolidados no comércio da região. Começaram, então, os
comerciantes lusos a pressionar a Coroa para que fundasse um estabe
lecimento português no Prata. A intenção lusitana era furar o mono
pólio espanhol na área, recolhendo a prata de Potosi e oferecendo em
troca artigos coloniais (açúcar, negros) e manufaturados ingleses. Por
trás dos interesses lusos no contrabando do Prata, achava-se a presença
britânica, buscando mercados. Concretizando essas ambições, em 1680
foi fundada, fronteira a Buenos Aires, a Colônia de Sacramento. Várias
vezes cercado, tomado e reconquistado, o núcleo português no Prata
representou um interesse estratégico-militar de conservação da área.
Economicamente, além da preservação do vantajoso comércio ilícito,
implicou o conhecimento, por parte dos portugueses, das imensas re
servas de gado da "Vacaria dei Mar". Nesta passou a se desenvolver
uma intensa atividade de caráter predatório. Caçava-se o gado xucro
para dele extrair o couro, que era exportado para a Europa por Buenos
Aires ou Sacramento. A preação do gado foi objeto da atenção de dife
rentes grupos sociais: portugueses de Sacramento, índios aldeados que
vinham vaqueirar para os padres, "acioneros" de Santa Fé, Corrientes
e BuenosAires, que preavam os animais com permissão das autorida
des espanholas, e aqueles indivíduos que, "sem rei, sem fé e sem lei",
vaqueiravam por conta própria, vendendo os courosa quem lhe pagas
se mais. Até os ingleses estabeleceram na área um entreposto ligado à
"South Sea Company", para lucrarem com o negócio da courama.
Nesse período, a carne não era considerada um bem econômico,
sendo consumida no local aquela necessária à subsistência por ocasião
do abate e a restante deixada apodrecer. A chamada "preia de gado
alçado" para a comercialização do couro movimentou o extremo sul,
atraindo as atenções para a região, que se tornou conhecida pela sua
riqueza pecuária.

A atividade predatória sobre o gado da Vacaria Dei Mar, com seu


abate indiscriminado, devastava o rebanho.
Tal tendência não passou despercebida aos padres jesuítas, que,
desde 1682, haviam começado a retornar ao Rio Grande do Sul, fun-
dando os chamados Sete Povos (São Borja, São Nicolau, São Miguel,
São Luiz Gonzaga, São Lourenço, São João Batista e Santo Ângelo).
Além da atividade de prear o gado xucro, os jesuítas separaram parte do
rebanho e o levaram para o nordeste do Rio Grande do Sul, formando
uma nova reserva de gado chamada Vacaria dos Pinhais ou Campos de
Vacaria.

Paralelamente, os padres estabeleceram, junto às reduções, es


tâncias para criar o gado. Além da extração do couro, exportado por
Buenos Aires, os Sete Povos tinham sua base econômica assentada na
produção da erva-mate.
Quando em suas aldeias, os índios viviam em regime de comuni
dade primitiva. Arregimentados pelos padres, passaram a trabalhar sob a
orientação e fiscalização dos jesuítas em regimecomunitário.A terra, assim
como todos os meios de produção, pertencia à comunidade. Demarcavam-
se lavouras para as famílias e outras para a comunidade. Nestas últimas,
todos eram obrigados a trabalhar determinados dias da semana a fim de
garantir sustento dos incapacitados (órfãos, viúvas e doentes) e ocupantes
de cargos de administração. Toda a colheita era arrecadada para armazéns
públicos e daídistribuída porfuncionários paraasfamílias.
Os Setes Povos tornaram-se importantes centros econômicos,
onde, além de erva-mate e criação de gado, realizavam-se trabalhos
de fiação, tecelagem, metalurgia, ofícios vários e trabalhos artísticos,
com destaque na arquitetura e escultura. Usando de habilidade, num
processo de adaptação da cultura indígena anterior ao aldeamento, os
missionários nomearam seus caciques como chefes de setores de servi
çosadministrativos. Aos poucos,com o florescimento dos Setes Povos e
odesenvolvimento dos quadros administrativos necessários à organiza
ção de cada redução, os novos cargos, agora eletivos, foram substituin
do as antigas lideranças.
No decorrer do século XVIII, essas reduções, criadas em terri
tório rio-grandense, vieram a se constituir numa linha de expansão
rumo ao Sulpraticamente independente daquela lusitana ou espanho
la propriamente dita, que se entrechocavam na fronteira pela disputa
do gado, da terra e do comércio platino.
Criando unidades economicamente desenvolvidas, praticamente
autônomas, exportando para a Europa, enviando tributos ao Geral de
Companhia, em Roma, com influência política dentro dos estados ca
tólicos da Europa, a Companhia de Jesus tornou-se pouco a pouco uma
ameaça. Generalizou-se o boato de que a ordem jesuíta se constituíra
num "Estado dentro do Estado" e que os padres estariam com intenção
de fundar um "Império Teocrático na América".
Zona economicamente rica e constituindo ameaça política à
segurança das monarquias ibéricas, a região dos Sete Povos foi colo
cada em pauta nas disposições do Tratado de Madrid, acertado entre
Portugal e Espanha em 1750.
Posteriormente, com a generalização do ambiente hostil à
Companhia de Jesus, uma vez que ameaçava o absolutismo monár
quico dos Estados europeus, os jesuítas acabaram sendo expulsos de
Portugal (1759), Espanha (1767) e América (1768), efetivando-se o
confisco de suas propriedades.

€^X^€í4t&€l€y Ct^ €t/e^y€}4tOrn4€i^


Ao findar o século XVII, o contexto colonial brasileiro sofreu um
processo de renovação. A decadência do açúcar foi compensada pela
descoberta das minas na zona das Gerais. Interiorizou-se o polo eco
nômico de atração da colônia portuguesa. A mineração, atividade alta
mente especializada, concentrando densas massas populacionais, com
grande poder aquisitivo e localizadas a distância do litoral, fez com
que surgisse um mercado interno no Brasil. E nesse momento que as
sumiram relevância osrebanhos degado no Sul do país, conectando-se
o Rio Grande do Sul à zona das Gerais, como economia subsidiária da
economia central de exportação.
Para o Rio Grande começaram a descer paulistas e lagunistas,
objetivando prear esse gado xucro para levar até a zona mineradora.
Em especial. Laguna, fundada em 1676 pelo paulista Domingos de
Brito Peixoto, tornou-se o foco de irradiação dadescida para o Sul, num
movimento espontâneo que, contudo, teve o incentivo da coroa portu
guesa. Enquanto que o interesse popular fixava-se na preia do gado, a

AfiliaPtrle f/o
perspectiva da Coroa orientava-se para o povoamento das terras ao sul
de São Vicente até Sacramento. O Rio Grande, no caso, apresentava-se
como possuindo uma função estratégica, como ponto de apoio para a
conservação do domínio luso no Prata.
Oficialmente, quem primeiro penetrou no Rio Grande a pedido
das autoridades coloniais portuguesas foi Francisco de Brito Peixoto, fi
lho do fundador de Laguna, que recebeu em 1721 a patente de guarda-
-mor, devendo descer ao Sul para fundar povoações e cuidar para que
o comércio do gado não recaísse nas mãos dos castelhanos, lesando o
interesse fiscal da Coroa. Essa descida oficial dos lagunistas se efetivou
em 1725, quando um grupo chefiado por João Magalhães (a chamada
"frota dos 31 lagunistas") penetrou no Rio Grande. Todavia, desde o
início do século, a Vacaria dei Mar era percorrida por tropeiros e con
trabandistas de gado que visavam abastecer as Gerais.
O tropeio do gado fazia-se em termos de fornecimento de ani
mais para o corte (gado em pé) e para o transporte na região das mi
nas. Nesse último caso, não se objetivava o rebanho bovino, mas, sim,
o muar. Foi preciso penetrar na área platina, buscando a criação de
mulas que se fazia em território argentino e que abasteciam as minas
de Potosi. Ora, a mineração espanhola estava caindo na época em que
surgia a mineração brasileira, e o comercio desses animais orientou-se
para o fornecimento das Gerais. Tratava-se, contudo, de uma atividade
quese fazia de armas na mão, uma vez que, para conquistar rebanhos,
era preciso enfrentar oscastelhanos.
O tipo social por excelência desse período - o tropeiro - era ne
cessariamente um chefe de um bando armado. Essa fase do tropeio foi
marcada pela abertura de vias de comunicação do Rio Grande do Sul
com orestante do país (estrada do litoral, 1703; estrada da serra, 1727)
ao longo dasviagens dos tropeiros.
O Rio Grande português da época constituía-se numa estreita
faixa de terra entre Laguna e Sacramento. Os campos apresentavam-
-se sem divisa e sem dono na fase do tropeio. Os bandos realizavam as
"arriadas" (arrebanho do gado solto) e reuniam os animais em currais
e invernadas. Apartir desses pontos de concentração de gado, os reba
nhos eram levados ate São Paulo, pagando imposto nos registros, onde
se exerciao fisco da Coroa. Nas feiras de Sorocaba, o gado era vendido
a outro grupo de tropeiros, que realizava o transporte dos animais até
as Minas. O incremento tomado pelo negócio do gado, associado ao
seu abate para extração do couro, acabou por apressar a devastação do
rebanho. Tornava-se, pois, necessário que se pusesse fim a uma ativi
dade predatória e que se cuidasse da reposição dos animais. Além disso,
tropeiros que haviam sido bem-sucedidos nos negócios do gado viram
possibilidades de aumentarem seus lucros se investissem na criação.
Por outro lado, a Coroa portuguesa, vendo as dificuldades de conservar
Sacramento, considerou ser conveniente que o vasto território entre o
Prata e Laguna fosse ocupado.
Ao redor da terceira década do século XVIII, teve inícioo proces
sodedistribuição de sesmarias, definindo-se a posse da terra e do gado,
com o abastecimento de estâncias. A Coroa distribuiu terras aos tropei
ros que se sedentarizaram ou aos militares que deram baixa e se afa-
zendaram. Há, aqui, uma diferença entre processo de concessão de ter
ras sob a forma de sesmarias no Nordeste e no Rio Grande. Enquanto
que na área açucareira a capitalização prévia era um requisito básico
para obtenção da terra, no Rio Grande esse não era o critério definidor.
Embora não se desprezando a ocorrência da disponibilidade de recur
sos por parte dosfuturos estancieiros, sesmarias eram concedidas como
retribuição a serviços militares prestados.
As sesmarias eram terras devolutas, medindo em regra 3 léguas
por 1 légua (cerca de 1.300 hectares), e foram concedidas primeiramen
te na região que seestendia deTramandaí aos campos de Viamão, pas
sando por Gravataí e um pouco mais ao sul, acompanhando o cami
nhodos tropeiros no exíguo Rio Grande português da época. Em 1732,
deu-se a primeira concessão ao lagunista Manuel Gonçalves Ribeiro,
na parada das Conchas, emTramandaí. Muitas vezes, a ocupação an
terior de terra precedia a legalização da posse, como se deu no caso de
Jeronimo de Ornellas, que habitava a zona de Porto Alegre há alguns
anos, recebendo a área como sesmaria em 1740.
As estâncias de gado, que se constituíram, realizavam uma cria
ção extensiva do rebanho, utilizando como mão de obra os peões. Estes

€Í<y (/o âPu//


eram elementos subalternos do antigo bando armado que tropeava
gado ou índios egressos das missões. Embora se registrasse o uso de
escravos nas estâncias, a atividade de criação, subsidiária da economia
centrai do país, não foi capaz de propiciar uma acumulação que per
mitisse a introdução regular de negros na região. Estes não se constitu
íram na mão de obra fundamental no processo de trabalho.
No final do século XVIII, com a decadência das minas, deu-se
um retraimento da procura deanimais paracorte e transporte. Talfenô
meno, contudo, não havia de causar a decadência da economia sulina,
uma vez que, nesse momento, dois novos produtos gaúchos apareciam.
Através do trigo e do charque, mercantilizava-se a economia rio-gran-
dense, com uma produção especializada de determinados produtos que
objetivavam o mercado interno brasileiro.
Com relação ao trigo, sua produção deve-se à entrada de casais
açorianos no estado.
Chegados na metade do século XVIII com o fim de irem povoar
as Missões, que pelo Tratado de Madrid passariam a ser possessão por
tuguesa, estavam destinados também a dar início a uma economia de
subsistência que abasteceria as tropas sediadas no Rio Grande do Sul.
Todavia, os "casais d'El Rey", uma vez chegados, espalharam-se irre
gularmente, ficando quase 20 anos sem receber as terras prometidas.
Somente no governo de José Marcelino de Figueiredo (1764-1780) é
que foram cumpridas as promessas da Coroa, concedendo-lhes uma
data (372 hectares), a fim de que começassem, através de uma agri
cultura com base em mão de obra familiar, a suprir as necessidades de
subsistência da colônia.
Núcleos açorianos apareceram em Mostardas, Estreito, São
José do Norte, Taquari, Santo Amaro, Porto Alegre, Santo Antônio da
Patrulha, Cachoeira e Conceição do Arroio.
Aparecendo expressivamente nas exportações gaúchas a partir
de 1780, otrigo foi capaz de promover ariqueza de alguns, que se ex
pressou na compra de escravos negros para a ampliação das lavouras.
Todavia, ocultivo tritícola enfrentou uma série de dificuldades, advin
das tanto da precariedade técnica e dos critérios extensivos quanto de
sua inserção num mercado extremamente competitivo. Por outro lado,
a ausência de amparo governamental também se fez sentir: a Coroa
ora requisitava a produção para o alimento das tropas com promessas
de pagamento futuro, ora fazia um recrutamento militar forçado nos
açorianos, furtando mão de obra da lavoura.
No plano do mercado, o trigo gaúcho encontrou a competição
dos produtos provenientes dos Estados Unidos, da Prússia e da França,
que abasteciam o mercado brasileiro protegidos porbaixas taxas de im
portação. Por outro lado, a presença do trigo rio-grandense no Reino,
concorrendo com a produção das ilhas atlânticas, fez com que a Coroa,
em 1793, proibisse aentrada do produto gaúcho em Portugal, perdendo
com isso o Rio Grande um mercado seguro.
Embora tais medidas da Coroa portuguesa possam parecer contradi
tórias —por umlado incentivava a agricultura tritícola, concedendo datas, e
poroutro tolhia seu desenvolvimento —, elas encontravam sentido dentroda
lógica do Antigo Sistema Colonial: pela política econômica mercantilista, a
economia metropolitana não podia sofrer concorrência da economia colo
nial. ORio Grande do Sul era ainda encarado pela metrópole mais como um
baluarte fronteiriço militarizado do que como um núcleo produtor.
Poroutrolado, Portugal, como naçãoempobrecida e dependente
entre as potências européias, era compelido a assinar tratados em con
dições desvantajosas, rebaixando as tarifas alfandegárias.
A incidência da doença da "ferrugem", que assolou ostrigais gaúchos
em 1814, sem que houvesse condições tecnológicas de impedir seu alastra
mento, veio completar esse quadro dedesestímulo às novas plantações.
Além disso, ao mesmo tempo em que sedesenvolvia o trigo, teve
início a mercantilização da pecuária através do charque. Revelando-se
uma atividade lucrativa, fez com que aqueles açorianos que haviam
conseguido acumular um pouco com o trigo se orientassem para a pe
cuária. O charque veio transformar-se num polode atração muito forte,
ao criar um mercado regional parao gado, conferir um novo valor para
a carne e ligar-se a um mercado que independia das flutuações da eco
nomia nacional (servia de alimento para a escravaria). O governo, por
sua vez, auxiliou em parte o desenvolvimento da economia pecuária.

fl€y P/Íío f/o


Em 1777, teve lugar o Tratado de Santo Ildefonso entre as
duas Coroas ibéricas, estabelecendo que tanto Sacramento quanto as
Missões ficariam para terras de Espanha. Entre as possessões de ambas
as nações, seria criada uma área neutra - os Campos Neutrais - entre
a Lagoa Mangueira e a Lagoa Mirim e a costa marítima. Essa "terra
de ninguém transformou-se logo numa área de intenso contraban
do de gado, justamente numa época em que a pecuária se desenvolvia
com o charque. Ocorreu então uma verdadeira corrida para obtenção
de sesmarias. Interessava a Coroa que fossem distribuídas terras nas
areas de jurisdição indecisa, alem dos Campos Neutrais, para garantir a
posse da area. De 1780 ate 1801, aproximadamente, processou-se uma
nova política de distribuição de terras, sob ogoverno de Veiga Cabral.
Açorianos foram expropriados de suas terras em favor dos pecuaristas.
O charque rio-grandense, proporcionando riqueza, foi capaz de intro
duzir em grande escala o escravo no Rio Grande do Sul.
Asrelações escravistas de produção estabeleceram-se assimde forma
decisiva no Sul, constituindo-se o negro na mao de obra por excelência
das charqueadas rio-grandenses. Acharqueada sulina foi, no período colo
nial, beneficiada pelas atribulações sofHdas pelos concorrentes doPrata. As
charqueadas platinas ( saladeros ) levavam vantagens na medida em que
utilizavam mão de obra livre e recebiam todo o amparo governamental,
uma vez que a pecuária era a atividade fundamental do Vice-Reinadodo
Prata. Assim, os "saladeros" gozavam da isenção dos tributos de exportação
e dos direitos deimportação doSal deCádiz. Foi também criada naBanda
Oriental (Uruguai) uma milícia para evitar o contrabando.
Mas, a partir de 1810, as guerras de independência no Prata de
terminaram a crise dos "saladeros", desorganizando as atividades char-
queadoras da região. Ogado platino foi encaminhado então para as
charqueadas rio-grandenses, que se viram beneficiadas com a desor
ganização dos concorrentes. Posteriormente, com a vinda da família
Real para oBrasil, D. João empreendeu uma campanha contra aBanda
Oriental, anexando-a com o nome de Província Cisplatina (1820).
Solidificaram-se com isso os interesses dos rio-grandenses na campa
nha uruguaia, estabelecendo estâncias na região erecolhendo matéria-
-prima para suas charqueadas.
Internamente, o charque foi capaz de constituir no Rio Grande
uma camada senhorial enriquecida, sem que, contudo, se repetisse no
Sul a aristocratização da sociedade açucareira nordestina. Muito mais
do que propriamente o tipo de atividade econômica, a capitalização
mais baixa da pecuária gaúcha é que foi a responsável pelo menor refi
namento dos hábitos e costumes, bem como pelo menor distanciamen
to social. Isso, todavia, não indica que padrões autoritários de mando
não tenham existido e se exercido violentamente, numa sociedade
composta de senhores de terra, gado, charqueadas e escravos.

RK) GRANDE DO SUL


NO período colonial

Figura 1. Rio Grande do Sul no período colonial

tjé nUlUa^i/ Ict/iet/


Paralelamente a esse processo de apropriação econômica da ter
ra, continuavam as controvérsias em torno da Colônia do Sacramento,
não desistindo os espanhóis de atacá-la. Fundada em 1680, foi no mes-

20 fl<yfi/íio <r/o .%/


mo ano a Colônia tomada e arrasada pelos espanhóis com auxílio de
índios aldeados nas missões jesuíticas,sendo reerguida pelos portugue
ses em 1683.

Em 1706, aproveitando-se do conflito europeu da Guerra da


Sucessão Espanhola, que colocava as monarquias ibéricas em campos
opostos, os castelhanos invadiram e ocuparam Sacramento até 1715,
quando, pelo Tratado de Utrecht, a devolveram a Portugal. Os espa
nhóis, contudo, procuravam preservar seu monopólio no Prata, blo
queando o contrabando que se fazia por Sacramento. Para tanto, fun
daram, em 1726, Montevidéu, na mesma margem do estuário em que
se achava Sacramento. Com Buenos Aires de um lado e Montevidéu
na outra margem, podiam os espanhóis melhor controlar o comércio
platino, cortando a expansão dos portugueses na região e isolando-os
dos núcleos do domínio luso mais próximos. Completando essa ação,
os castelhanos sitiaram Sacramento de 1735 a 1737.
Em face desse estado de coisas, evidenciou-se para a Coroa por
tuguesa que se tornava necessário tomar oficialmente posse da terra
compreendida entre Laguna e o Prata. Para consolidar seu domínio
na área e preservar o comércio na região, a Coroa portuguesa enviou
a expedição do Brigadeiro José da Silva Pais, que, em 1737, fundou a
fortaleza-presídio de Jesus-Maria-José em Rio Grande. Ao mesmo tem
po em que se convertia em posto militar que estabelecia oficialmente a
posse portuguesa da área. Rio Grande representava uma garantia para
a manutenção do comércio do gado.
Completando sua ação, a Coroa criou em 1738 a Comandância
Militar do Rio Grande de São Pedro com sede em Santa Catarina e su
bordinada ao Rio de Janeiro, promovendo avinda, para a região, de um
regimento de Dragões que contribuíssem para a defesa da área. Apar
tir de Rio Grande, continuou o processo de distribuição das sesmarias,
incrementando-se o povoamento da zona com o afluxo de elementos
de outras regiões do Brasil (Bahia, Minas, Rio de Janeiro). Foram, in
clusive, distribuídas datas (1/4 légua) de terra próximas a Rio Grande,
com o fim de incrementar o povoamento. Para a defesa militar da terra,
destacaram-se guardas avançadas no Taim e no Chuí para impedir a
aproximação dos castelhanos.
Todavia, os desentendimentos e acertos entre as duas monar
quias ibéricas em torno do sul da América prosseguiram. Em 1750, foi
firmado entre as duas nações o Tratado de Madrid, que estabelecia que
Portugal entregaria Sacramento à Espanha em troca das Missões, que
passaram para o domínio luso.
A proposta, que fora encaminhada por Alexandre de Gusmão,
secretário do rei lusitano D. João V, argumentava que para Portugal
mais valia a posse de um território contínuo, garantindo o comércio do
gado (infraestrutura da mineração que estava no auge), do que conti
nuar insistindo na manutenção de um posto de contrabando no Prata,
onde os que maislucravam eram os ingleses.
A demarcação dos limites do Tratado foi interrompida pela re
belião dos índios missioneiros, que se recusaram a entregarsuas terras,
motivando a "Guerra Guaranítica" (1754-1756).
O conflito entre os índios rebelados e as tropas luso-castelhanas
estendeu-se até o combate final de Caiboaté, com a derrota dos pri
meiros. Como elemento de destaque, ressaltou-se a atuação de Sepé
Tiaraju, na chefia dos índios.
Os conflitos resultantes da demarcação de limites implicaram o
reforço militar da área. Mais do que nunca, precisava a Coroa portu
guesa do concurso de estancieiros com seus homens para a defesa da
terra. Foi, com isso, obrigadaa transigir com os senhores de terra no Rio
Grande do Sul, outorgando-lhes poder e autoridade.
Ao mesmo tempo em que incrementou o processo de distribui
ção das sesmarias pela bacia do Jacuí, dilatando a ocupação pelo inte
rior, distribuiu cargos entre os estancieiros.
Esse poder dos estancieiros, exercido muitas vezes na defesa de
seus interesses privados, entrou seguidamente em choque com a auto
ridade dos comandantes militares que representavam os interesses da
Coroa. Todavia, a importância do estancieiro-soldado com suas forças
irregulares fez com que a Coroa permitisse uma certa autonomia do
poderlocal em relação à administração lusa.
A crescente importância militar da zona proporcionou que, ad
ministrativamente, a região fosse elevada, em 1760, à condição de ca-
pitania —a "Capitania do Rio Grande de São Pedro" —, desvinculada
de Santa Catarina, com sede em Rio Grande e subordinada ao Rio de
Janeiro.
Paralelamente à expansão das sesmarias e dos fortes militares
(Rio Pardo, Santo Amaro), a Coroa portuguesa promoveu a vinda para
o Rio Grande de casais açorianos, com o objetivo de povoar a zona das
missões, que por direito caberia a Portugal, garantindo assim a posse da
terra. Chegando em grandes levas a partir de 1752 (ponto alto da imi
gração), os "casais d'EI Rey" foram distribuídos pelo Porto de Viamão
ou do Dornelles (Porto Alegre) e pela beira do Jacuí (Rio Pardo, Santo
Amaro, Triunfo, Taquari), não recebendo terras de imediato, ante a
possibilidade de serem transferidos para as Missões.
O Tratado de Madrid não chegou a se efetivar na prática, sendo
anulado em 1761 pelo Tratado de El Pardo. Os Sete Povos, contudo,
haviam sido abandonados pelos padres, ficando a região sob a admi
nistração espanhola leiga. A zona entrou em decadência, e os índios
que haviam ficado começaram a abandonar as Missões, indo trabalhar
como peões nas estâncias gaúchas.
As disputas coloniais ibéricas, contudo, iriam prosseguir. Por
ocasião da guerra dos Sete Anos na Europa, que novamente colocou
em campos opostos Portugal e Espanha, ocorreu um novo ataque dos
castelhanos; em 1763, D. Pedro de Cevallos, governador de Buenos
Aires, após conquistar Sacramento, invadiu a capitania de São Pedro,
conquistando Rio Grande e inaugurando um domínio que se estendeu
até 1776. Embora a paz na Europa oportunizasse a imediata devolu
ção de Sacramento, o Rio Grande do Sul permaneceu bipartido. Uma
segunda ofensiva castelhana deu-se em 1773, quando o governador de
Buenos Aires Vertiz y Salcedo foi detido na fronteira do Rio Pardo por
Rafael Pinto Bandeira.
O permanente estado de alerta propiciava a renovada militariza-
ção da sociedade gaúcha, onde todo o homem válido era um soldado
em potencial. Na realidade, para a defesa da terra mais contavam as
forças irregulares da campanha rio-grandense do que as tropas de li
nhas enviadas pelo Reino. Isso se verificou, por exemplo, por ocasião da
reconquista do Rio Grande e expulsão dos espanhóis, quando, ao lado
de tropas do Reino, oficiais estrangeiros contratados, tropas de Minas,
Rio e São Paulo, destacou-se a ação das milícias locais.
Em 1777, registrou-se a terceira ofensiva castelhana, quando o
Vice-Rei do Prata, D. Pedro de Cevallos, tomou Sacramento e a Ilha
de Santa Catarina. Nesse mesmo ano, teve lugar o tratado de Santo
Ildefonso entre as duas Coroas Ibéricas. Aproveitando-se de um mo
mento de fraqueza de Portugal —decadência das minas conjugada com
a morte de D. JoséI e queda do ministro Pombal —, a Espanha impôs ao
Reino a perda de Sacramento e das Missões, estabelecendo-se em troca
que Portugal recuperaria Santa Catarina.
O períodode paz que se seguiu, estendendo-se até 1801, foi mar
cado pelograndedesenvolvimento da economia pecuária sulina, basea
da agora no charque e com o fortalecimento dos clãs patriarcais.
O enriquecimento propiciado pelocharque contribuiu para acirrar
os desentendimentos entre a camada senhorial local e os representantes
da Coroa. Na mesma medida em que se adonaram de cada vez maiores
extensões de terras, além dos Campos Neutrais, os latifundiários gaúchos
apropriaram-se monopolisticamente dos cargos, passando a agirmaisem
proveitopróprio, em detrimento dos interesses coloniais lusitanos.
Com a conquista das Missões Orientais,em 1801, por Manuel dos
Santos Pedroso (um estancieiro/soldado) e José Borges do Canto (de
sertor dos Dragões e contrabandista), com o beneplácito das autorida
des portuguesas, o Rio Grande do Sul conquistou sua fronteira oeste. As
missões, que se achavam em decadência sob a administração espanhola
leiga, transformaram-se emnova área para expansão das sesmarias.
A conquista da Cisplatina por D. João, em 1820, abriu para o
Rio Grande uma nova fronteira entre o Ibicuí e o Quaraí, dilatando a
concessão de sesmarias por mais essa região, e permitiu a intensificação
das ligações econômicas no Prata. A importância da área cresceu de tal
forma que, em 1807, o Rio Grande foi promovido a "Capitania Geral",
independente do Rio de Janeiro e subordinada diretamente ao Vice-
Rei do Brasil. Todo esse processo de apropriação militarda terra, como
se viu, foi acompanhado da expansão econômica da pecuária sulina,
oportunizando o enriquecimento de sua camada senhorial. O forta-

24 9Í€i/f/o !?Âio^ fl<y


lecimento dos pecuaristas, contudo, tendeu a se expressar também no
plano político-administrativo.
Nos momentos finais do domínio colonial português no Brasil,
começaram, assim, a surgir áreas de atrito cada vez maiores entre os
representantes da Coroa na região e a camada senhorial sulina, enri
quecida pela pecuária.

S. Nícoiau S. Ângelo
LA 1^. João
S. Borja/y Kstm *•^ \

Rioj>ardo Porto Alegre


Alegrete
Caiboaté
O • Caçapava

riratiní

St. Tecla

r
I
Rio Grande

do Sacramento

Montevidéu

Sto. Hiidefonso

Madrid . . . . . .

Divisão atual do RS

Figura 2. Tratados

Fonte: LAZZAROTTO, Danilo. História do Rio Grande doSul. Porto Alegre:


Sulina.

l<y 25
Oi Quadro-resumo 1
Disputascoloniais ibéricas e suavinculação com o processo de apropriação econômico/militar da terra

Data Situação Ibérica Brasil Extremo Sul

Decadência do
Império Colonial Fundação da Colônia do Sacramento na margem norte do Prata
Decadência do
Português. Interesse pelos portugueses; atacadae arrasada no mesmo ano pelos
Açúcar. Quilombo
1680 anglo/luso de penetrar espanhóis.
de Palmares resiste
no mercado platino. Gado xucro na Vacaria dei Mar; pilhagem sobre o rebanho para
aos ataques.
Contrabando luso x extração de couro (exportado por Buenos Aires para a Europa).
monopólio espanhol.
Tratado Provisional
entre as nações
1681
ibéricas; Colônia fica
para Portugal.
í
Retorno da Colônia para Portugal em função do T. Provisional;
1683 intensificaçãodo contrabando no Prata e pilhagem do gado da
Vacaria dei Mar.

Retornodos jesuítas ao RS; fundação dos "7 povos" e formação de


1687
Vacaria dos Pinhais.
V Situação Ibérica Extremo Sul
I- "Guerra da Mineração;
Sucessão forma-se nas
Valorizaçãoeconômica do gado sulino; integração da área à economia
1701 Espanhola" aliança Gerais mercado
colonial de exportação como subsidiária.
anglo/lusa x para gado de
hispano/ francesa. corte e tração.

Ataque dos espanhóis a Sacramento; domínio castelhano da Colônia


1704 (1704-1715).
Tropeiode gado por bandosarmados; lutas constantes com os espanhóis.

Tratado de Utrecht;
fim da Guerra de
Sucessão; ascensão Retorno de Sacramento para mãos portuguesas (1715-1736); reforço
de Felipe V ao militarda região; início do povoamento regular de Sacramento; grande
1715
trono espanhol; contrabando no Prata (ação anglo/lusa).
Inglaterra potência RS: estradas para o tropeirodo gado; currais; invernadas.
hegemônica na
Europa.

Revide espanhol no Prata: fundação de Montevidéu; 1^ sesmaria


1726 concedida no RSa ManuelGonçalves Ribeiro, em Tramandaí; sesmarias
sãoconcedidas noscampos de Viamão; surgemestâncias de criação.

N
Qo
1 Data Situação Ibérica Brasil Extremo Sul

Novo ataque espanhol a Sacramento; D. Miguel de Salcedo, governador


1735
de Buenos Aires, sitia a Colônia de 1735 a 1737.

Paz de Paris entre as


nações ibéricas com
Expedição do Brigadeiro Joséda SilvaPaes que fiinda a fortaleza de
mediação francesa;
1737 Jesus, Maria e José em Rio Grande (posto militar avançado; garantia do
Portugal não desiste de
comércio do gado e contrabando do Prata).
manter-se no extremo sul
e envia uma expedição.
Criação da Comandância Militar do Rio Grande de São Pedro vinculada a
Santa Catarina e subordinada ao Rio de Janeiro; caráter militar do mando;
1738 aumento de defesa da área; guardas avançadas do Chuí e Taim.
Continua o processo de distribuição de terras: sesmarias e datas em torno
de Rio Grande.
1741 Fundação da Capela Grande de Viamão.
Tratado de Madrid entre
I Portugal e Espanha;
Portugal fica com as Reações ao Tratado de Madrid; militares da colônia; índios aldeados;
s Auge da
s
Missõese Espanha com jesuítas; comerciantes da região.
1750 mineração
1- Sacramento; Início do Concentração de tropas no RS para dar inícioaos trabalhos de demarcação
do ouro.
reinado de D. José I; do Tratado de Madrid.
Marquês do Pombal
(secretário de estado).
i Data Situação Ibérica Brasil Èxtremo Sul |
¥ Vindados açorianos para povoarem as Missões; distribuídos porViamao e
1752
portodo Dornelles; não recebem terras de imediato.

Guerra Guaranítica (1754-1756); índios das missões resistem às tropas


luso-castelhanas para não abandonar as terras.
1754 Intensa campanha militar; fundação dos fortes de SantoAmaro e Rio
Pardo.
Sesmarias concedidas a soldados na bacia do Jacuí.

Gera-se um ambiente
hostil à Companhia de
Jesus; acusações quanto Combate a Caiboaté põefim à guerra Guaranítica coma derrota dos
1756
às suas pretensões índios.
tempprais às terras
americanas.
1 Data Situação Ibérica Brasil Extremo Sui

Criação da Capitania de Rio Grande de São Pedro para


1760 atender à maior defesa da área (desvinculação de Santa
Catarina e subordinada ao Rio).

Tratado de El Pardo anula o de


Madrid; retorna Sacramento para
Início da
Portugal e Missões para Espanha.
1761 decadência da
Desde de 1757 as duas nações
ibéricas lutam em campos opostos na mineração.
guerra dos Sete Anos (1757-1763).

1762 Sacramento é tomada por D. Pedro de Cevallos,


governador de Buenos Aires.

I 1^ invasão castelhana no Rio Grande do Sul; Cevallos


Transferida
conquista o forte de Santa Tereza, Rio Grande e São
a capital
José do Norte; com o fim da guerra na Europa, volta
1763 T. Paris; fim da guerra do SeteAnos. para o Rio
de Janeiro;
Sacramento paraPortugal; migração da população de Rio
Grande para Viamão; transferência da capital para Viamão
criação do
em função da guerra; desentendimento entre chefes
Vice-Reino.
militares locais e comandantes da tropa de linha.
1Daita Situação Ibérica Brasil Extremo iSul
Governador do Rio Grande, José Marcelino de Figueiredo, passa a
i intervir sistematicamente na colonização; distribui datas (1/4 de légua)
aos açorianos; estímulo ao povoamento e à agricultura de subsistência;
1764 núcleos se formam em Mostardas, Estreito, Santo Amaro, Taquari, Santo
Antônio da Patrulha, Porto Alegre, Cachoeira, Conceição do Arroio;
I novas sesmarias concedidas na fronteira do Rio Pardo (interesse militar
estratégico).
I 1769 Missões sob administração leiga espanhola.
2^ invasão castelhana no Rio Grande do Sul por VertizY Salcedo,
1773 governador de Buenos Aires, detido em Rio Pardo por RafaelPinto
Bandeira.

Reconquista do Rio Grande pela ação conjunta das tropas locais e


1776
portuguesas.
Morte de D. José I;
queda de Pombal e
ascensão de D. Maria O Vice-Rei do Prata, D. Pedro de Cevallos realiza a 3° ofensiva
I. Fraqueza política e castelhana: toma Sacramento e Santa Catarina e ameaça retomar Rio
econômica do reino; Grande. Em face do Tratado de Santo lldefonso, devolve Santa Catarina
1777
assinatura do Tratado para Portugal. Portugal fica sem Sacramento e Missões.
de Santo lldefonso entre Estabelecimento dos Campos Neutrais (entre Lagoa Mangueira, Lagoa
as duas nações ibéricas; Mirim e a costa marítima) para separar os domíniosde ambas as nações.
Colônia e Sacramento
paraa Espanha.
Situação ibérica Brasil Extremo Siil

Mercantilização da economia gaúcha; expansãodo trigo


e do charque; desenvolvimento do contrabando de gado
nos Campos Neutrais; concessão de sesmarias na fronteira
junto aos espanhóis ("corrida pelas sesmarias"); governador
1780 Sebastiãoda Veiga Cabral e Câmara (1780-1801) expropria
açorianos de suas terras em favor da concessão de sesmarias
para criação de gado.
Dinamização das charqueadas; afirmam-se as relações de
produção escravistas.
França Napoleônica e Inglaterra
disputam mercados; envolvem nas
Ofensiva de Manuel dos Santos Pedrosoe José Borges do
hostilidades Espanha e Portugal;
1801 Canto; conquista das missões para o domínio português;
Tratado Badajoz na Europa
nova área se abre para concessão de sesmarias.
nada estabelece sobre as Missões,
consagrando o domínioluso.

I
Daütã ;
i- RSelevado à condição de Capitania Geral
¥ 1807 Junot invade Portugal. (Capitania de São Pedro),independente
do Rio de Janeiro e subordinado ao Vice-
Rei do Brasil.
Permanência das hostilidades França x
Chegada da Corte
Inglaterra;queda da monarquia espanhola
portuguesa à Bahia.
1808 sobreo domínio francês; Napoleão invade
Abertura dos Portos às
Portugal; transmigraçãoda Corte para o
Nações Amigas.
Brasil.

tentativa de ofensiva de D. João no


Prata (interesse anglo/luso no mercado
platino).
D. João ocupa a Guiana
1809 Domínio napoleônico na Península Ibérica. Inglaterra ganha permissão para
Francesa.
comerciar em Buenos Aires e desinteressa-
se do plano; desacertos de Carlota
Joaquina com revolucionários platinos.

Independência das Províncias Unidas do


Tratado de 1810
1810 Rio da Prata sobre hegemonia de Buenos
(Portugal e Inglaterra).
Aires e influência Inglesa.
&
Ifeítai Situação Ibérita Brasil Exlrèmó Siíl'

2^ tentativa de D. João no Prata; lutas entre o "Exército


Pacificador" (tropasgaúchas e portuguesas) x Artigas;
1811
Inglaterra intervém como mediadora (não interessa a invasão,
pois já domina economicamente o Prata).

3^ ofensiva de D. João no Prata; conflitos locais: unitarismo de


1816 Buenos Aires x federalismo de Artigas; nas lutas as estâncias
gaúchas são atacadas (pretexto para invasão luso/brasileira).

Derrota Final de Artigas; anexação da Banda Oriental


Notícias da Revolução com o nome de Província Cisplatina; desorganização das
1820 Revolução do Porto. do Porto provocam charqueadas uruguaias; gado Oriental é encaminhado para
agitaçõesno Brasil. as charqueadas rio-grandenses; grande desenvolvimento de
economia pecuária gaúcha.
I-
I
II
ele/

processo de independência do Brasil inseriu-se na crise mais am-


pia da desagregação do Antigo Sistema Colonial. Vencida a fasede
acumulação primitiva de capitais, tudo aquilo que fora o mecanismo
de sustentação do colonialismo - escravismo, monopólio - tornou-se
um entrave à constituição plena do capitalismo nas economias cen
trais. A emergência da fábrica moderna, o aumento da produtividade
pela aplicação da ciência à tecnologia e a produção em série exigiam
tanto a abertura de mercados quanto a difusão de relações assalariadas
de produção. A nova classe burguesa, responsável poresse processo de
transformação, encontrou, a nível político, a solução no Estado Liberal
Contemporâneo (monárquico ou republicano), constitucional e repre
sentativo.

A crise se manifestou no centro e na periferia, sob a forma de


contradições que não mais encontravam saída dentro dos quadros do
sistema. A vinda da família real para o Brasil, em 1808, veio agravar
as tensões dentro de uma situação estruturalmente desequilibrada,
contribuindo para a conscientização das camadas dominantes agrárias
na sua luta contra os monopólios. O período joanino, além disso, en
caminhou o processo de independência para um tipo determinado de
solução: a constituição de uma monarquia unitária e centralizada. A
independência, seguiu-se o Primeiro Reinado, marcado pela crise eco-
nomico-financeira herdada do período colonial (perda de mercado dos
principais produtos brasileiros) e pela instabilidade política, quando a
própria autonomia do país foi ameaçada pela presença de grupos por
tugueses favoráveis à recolonização. Ao mesmo tempo, parte da clas
se dominante agrária, com posicionamento político diferente daquele
grupo empresário da independência, era adepta de formas de governo
descentralizadas, tendenciaimente republicanas (caso da Confederação
do Equador de 1824).
A abdicação, seguida pela instituição da regência, marca o mo
mento em que a camada dominante nacional assumiu de fato o contro
le do processo político do país. Esse momento coincide com a ascensão
do café como primeiro produto de exportação no Brasil, reintegrando
a economia nacional nos quadros do mercado internacional. O vale do
Paraíba do Sul, zona responsável por esse dinamismo, determinou um
superávit na balança comercial brasileira. No seu bojo, constituiu-se
a segunda aristocracia brasileira, "os barões do café", que passaram a
controlar o poder político nacional. Latifundiários escravistas, os seto
res responsáveis pelo surto cafeicultor defendiam uma monarquia uni
tária e centralizada nos princípios da carta constitucional de 1824. Do
centro emanavam ordens para as províncias do Império, e das regiões
periféricas afluíam recursos para o Rio de Janeiro. No Rio Grande do
Sul, o período pós-independência foi marcado pelo desenvolvimento
da pecuária orientada para o charque, consagrando-se a produção pe
riférica e subsidiária da economia sulina, fornecedora do mercado in
terno brasileiro.

Politicamente, já desde o Primeiro Reinado faziam-se sentir os


efeitosdo centralismo. O presidente de província era nomeado pelo cen
tro e governava em função dos interesses da aristocracia cafeeira. Nesse
sentido, a aristocracia sulina teve seus interesses duplamente contraria
dos: no plano político, os grupos locais requeriam participação na vida
governamental do país. Em 1825, a Banda Oriental sublevou-se contra
o domínio brasileiro que vinha se exercendo desde a anexação realiza
da por D. João em 1820. O movimento de independência iniciou-se
com a atuação de um grupo de orientais chefiados pelo caudilho Juan
Antônio Lavalleja ("los treinta y tres orientales"), que desembarcaram
na praia de Agraciada, conclamando todo o Uruguai a revoltar-se. A
Argentina logo declarou apoiar o movimento, com o fim de reincorpo-
rar a Banda Oriental às Províncias Unidas do Rio da Prata. Tal atitude
levou o Império brasileiro a declarar guerra à Argentina, iniciando-se
a Guerra Cisplatina pela posse da Banda Oriental. O conflito mobi
lizou novamente o Rio Grande, numa intensa campanha militar que

36 f l o ^ f / o S/h/
durou até 1828. Formou-se o "Exército do Sul" na província a fim de
lutar na Banda Oriental. Em 1828, foi assinada a paz com mediação
inglesa, e o Uruguai tornou-se uma nação independente. Para o Brasil,
e particularmente para o Rio Grande, a perda da Província Cisplatina
significou a perda do gado uruguaio, que não mais foi dirigido para as
charqueadas rio-grandenses, e sim para os "saladeros" platinos que se
rearticulavam. Além disso, durante a campanha militar, novos conflitos
surgiram entre os chefes locais e aqueles designados pelo centro.
As tensões se acumulavam, não só no Rio Grande do Sul, como
também em outras regiões do país, de economia periférica, dando mar
gem à eclosão de rebeliões provinciais, marcadas pelapresença de idéias
federativas e republicanas e da insatisfação das oligarquias regionais.
No Rio GrandedoSul,em 1835, eclodiu aRevolução Farroupilha,
que durante dez anos enfrentou o governo central. Em manifesto lan
çado às "nações civilizadas" por ocasião da Proclamação da República
Rio-Grandense em 1838, o líder Bento Gonçalves justificou a posição
assumida, enfatizando que a Proclamação da República fora o último
recurso tentado ante o esgotamento das possibilidades de entendimen
to com o Império. Dentro da percepção que os "farrapos" tinham dos
acontecimentos, o centro era acusado de "má gestão dos dinheiros pú
blicos", de realizar gastos supérfluos sem aparelhagem material do país
(abertura de estradas, construção de portos) e de onerar o Rio Grande
do Sul com impostos, sem indenizá-lo por danos sofridos. Por trás
dessas acusações, vê-se a percepção de que o Rio Grande do Sul era
explorado economicamente pelo centro.
Pela carta de 24, se estabelecia que, do montante das vendas ar
recadadas pela província, era o centro que determinava qual a parte
que lhe reverteria e qual a que permaneceria na província. Era, evi
dentemente, uma forma de canalizar recursos para o centro do país,
para a economia cafeeira em ascensão. Poroutrolado, osgastos que, no
centro, eram feitos em proveito do café e da Corte eram considerados
pela oligarquia local como supérfluos.
No tocante aos impostos, enquanto que o charque sulino era
onerado com altas taxas de importação sobre o sal, os pecuaristas eram
obrigados a pagar pesadas taxas sobre a légua de terra. Por outro lado,
o charque platino, concorrente do gaúcho, pagava baixo imposto nas
alfândegas brasileiras. Por trás desse tratamento preferencial ao pro
duto estrangeiro, que forçava a baixa do preço do artigo rio-grandense,
manifestavam-se os interesses do centro e norte do país, que queriam
comprar o alimento para seus escravos a baixo custo.
Além disso, tornava-se claro para os gaúchos que o Rio Grande
era relegado à posição de "estalagem do Império": fornecia soldados,
cavalos e alimento durante as lutas fronteiriças; a guerra desorganiza
va sua produção, mas não recebia indenização por danos sofridos. Da
mesma forma, os altos comandos das tropas só eram dados a elementos
do centro, enquanto que, na realidade, era o Rio Grande que susten
tava a guerra.
Desde o ponto de vista local, a parcialidade do Império impli
cava o desprestígio da camada dominante gaúcha. A concessão, pelo
Ato Adicional de 1834, de poder legislativo às províncias, não resolveu
os problemas regionais, tais como a pouca representatividade do Rio
Grande no legislativo central e a presença de presidentes de província
desvinculados da realidade local.

Eclodido em 1835, o movimento teve um ritmo ascensional até


mais ou menos 1839, com a conquista de Pelotas e Rio Pardo e a inva
são de Santa Catarina. Em Laguna, Garibaldi e Davi Canabarro fun
daram a República Juliana.
A rebelião era sustentada pelos estancieiros gaúchos que mo
bilizaram a sua peonada. Em 1838, foi proclamada a República Rio-
Grandense. O que os revolucionários almejavam era a independência
política com relação ao domínio do centro, mantendo, contudo, os la
ços econômicos com o resto do país, através da continuidade do forne
cimento do charque ao mercado interno. Nessa medida, propunham
federar-se às demais províncias que, como eles, quisessem adotar a
forma republicana. E nesse sentido que deve ser entendida a projeção
do movimento revolucionário até Santa Catarina, revelando ainda o
interesse na aquisição de um porto (Laguna) para o escoamento da
produção por via marítima. A barra do Rio Grande permaneceu, du-

'38
rante todo o tempo da revolução, fechada aos farrapos, ficando a cidade
em mãos dos "legalistas". Em face dessa situação, foi só através das
ligações com o Prata, das exportações por Montevidéu e dos contínuos
reforços em munições e cavalos, que chegavam da Banda Oriental, que
os farrapos puderam sustentar 10 anos de lutascontrao Império.
Após um período de relativa estabilização da guerra (1840-
1842), seguiu-se, a partir de 1843, o declínio farroupilha. Em nome do
Império, Caxias ofereceu aos farrapos uma anistia geral e "paz honro
sa", resultando na assinatura, em 28 de fevereiro de 1845, da "Paz de
Ponche \^rde". Essa atitude doImpério deve serinterpretada com base
no rumo que tomava a política no Prata.
Na Argentina, desenvolvia-se o conflito entre as forças represen
tadas pelo setor rural (Rosas) contra a burguesia portenha, aliada da
Inglaterra. No Uruguai, por instigação e apoio de Rosas, Manoel Oribe
vencera as forças de Frutuoso Riviera, na intenção de levar o país ao
domínio argentino. Ao avizinhar-se o conflito noPrata, oImpério, com
necessidade de apoio militar e econômico gaúcho, ofereceu uma paz
na qual os farrapos conseguiram elevação de 25% da taxa alfandegária
sobre o charque importado e o direito de os estancieiros escolherem
naquele momento seu presidente de província (foi escolhido o próprio
Caxias). Por outro lado, ficou acertado que as dívidas contraídas seriam
pagas pelo governo central, e que todos os farrapos poderiam passar
para o exército brasileiro com os mesmos postos com que lutavam nas
forças rebeldes.
Mais uma vez entrara em cena o poder militar do Rio Grande
do Sul como elemento de barganha frente aopoder central. Iniciou-se,
após a revolução, umperíodo de apogeu da dominação regional dos pe
cuaristas sulinos, embora se confirmasse, a nível nacional, a submissão
da província periférica aos interesses do centro do país.

fV^-atí^y/ta/: a^io^euyc c
Apos a Revolução Farroupilha, a economia pecuária sulina foi
beneficiada tanto pelos acertos econômicos entre o governo central e a
província como pelas perturbações ocorridas no Prata.
A prosperidade dos "saladeros" platinos foi interrompida, no pe
ríodo colonial, pelas lutas de independência e, após, pela dominação
luso-brasileira, quando a região tornou-se abastecedora de carne para
os exércitos em luta e de matéria-prima para as charqueadas brasileiras.
Com a independência da Banda Oriental, começou, a partir de
1830, o reerguimento dos "saladeros" da região. O bloqueio imposto a
Buenos Aires, pela esquadra francesa, tornou Montevidéu o eixo das
operações comerciais platinas, o que permitiu que a região se moderni
zasse com a introdução de nova tecnologia. Em 1838, foi introduzida a
máquina de vapor, possibilitando a exploração dos subprodutos da car
ne, como a graxa. Por outro lado, os saladeros começaram a localizar-
-se no litoral, próximo ao local de embarque de produção, levando ao
barateamento desta e a melhorias sanitárias, como a canalização dos
resíduos diretamente para o mar.
Todavia, esse surto de desenvolvimento foi interrompido pela
"Guerra Grande", entre as forças platinas de Oribes (Uruguai) e Rosas
(Argentina) contra o Brasil aliado a Urquiza (governador de Entre-
Rios) e Artigas (chefe uruguaio, "colorado"). Durante o conflito, o
gado uruguaio foi contrabandeado para as charqueadas sulinas, sendo
alvo das chamadas "califórnias" promovidas por estancieiros gaúchos.
O tratado de 1851, que assinalou a derrota de Oribes, sedimen
tou a desorganização da atividade saladeiril uruguaia: estabeleceu que
o gado uruguaio não pagaria imposto nas alfândegas brasileiras, en
quanto que o charque platino seria onerado com taxas para entrar no
país. Dessa forma, beneficiavam-se as charqueadas sulinas, com a pos
sibilidade de obtenção de matéria-prima a baixo preço, tendo por outro
lado dificultada a entrada do concorrente no mercado interno.
Dentro dessas condições específicas, marcadas pela perturbação
nas economias concorrentes e pela possibilidade de barganhar com o
poder militar em face das necessidades do poder central, a charquea-
da rio-grandense teve relativas condições de prosperar. Considerando,
ainda, que a oferta de mão de obra antes de 1850 revelava-se elástica,
que era possível obter-se gado a baixo preço e que a aquisição de terra
era gratuita (regime de concessão de sesmarias), pode-se concluir que
os custos da produção eram relativamente baixos.

^yítò/ótirÂ/f/o 'imitir/4?^
A crise das charqueadas rio-grandenses iria se revelar a partir da
década de 1860.
A partir de 1850, com a lei Euzébio de Queiroz, foi extinto o trá
fico negreiro, coincidindo essa medida com o movimento ascensional
do café e a abertura de novas frentes pioneiras. Em face da impossibi
lidade de obtenção de novos negros da África, a mão de obra escrava
excedente que havia no Brasil foi deslocada para a zona do café, eixo
central da economia brasileira.

Tal mecanismo se dava dentro de um processo mais amplo, de


senvolvido ao longo do século XIX, que faria o Brasil transitar de uma
economia escravista para uma economia baseada na mão de obra li
vre. No Rio Grande do Sul, esse processo manifestou-se, na perspectiva
dos grupos escravistas locais, como "uma crise de braços". Economia
subsidiária da economia central de exportação, a sulina tinha parte de
seus ganhos captados pelo centro. Diante da dificuldade de obtenção de
mão de obra e da elevação do seu preço, a maior parte dos gastos incidiu
na reposição da força-trabalho.
Todavia, pelo seu próprio funcionamento, o sistema escravista
apresentava-se como uma "economia de desperdício" de força de tra
balho. Na escravidão, é só através do aumento do número de horas de
trabalho ou pelo aumento de número de escravos que se obtém maior
produção. O escravo, por seu turno, só é levado a trabalharmais através
da coerção física. Ora, o aumento da vigilância e da repressão tendia a
desgastar mais rapidamente as forças do trabalhador, encurtando sua
vida média. Dessa forma, mais rapidamente se fazia necessária a re
posição de mão de obra escrava nas charqueadas sulinas, conhecidas
como "purgatório dos negros". A cada nova compra, todavia, se exi
gia maior desembolso de capital para a aquisição de um "artigo" que
rareava no mercado. Por outro lado, na medida em que o escravo só
trabalhava mediante o emprego da violência física, intensificar seu tra
balho significava aumentar o número de feitores, funções essas sempre
remuneradas, o que implicava mais gastos para o charqueador.
A própria escravidão contribuía para que a capitalização da eco
nomia sulina fosse mais baixa: o trabalho escravo apresentava-se como
um freio de especialização e divisão do trabalho e impossibilitava uma
maior racionalização de produção, recrutando mão de obra segundo as
necessidades da empresa.
Uma vez comprado o negro, este, dentro da concepção escravis
ta, devia trabalhar sempre, para o mais breve possível reembolsar seu
dono da quantia paga na sua aquisição. Isso criava sérios problemas
num tipo de atividade produtiva como a charqueadora, que se reali
zava por safra. Tais contradições, inerentes ao escravismo enquanto
sistema, tenderam a se agravar quando se apresentou uma conjuntura
desfavorável, ou seja, quando se revelou a "crise dos braços", a partir da
segunda metade do século XIX, e quando os concorrentes platinos se
rearticularam.

A partir da década de 1860, o saladero platino passou a experi


mentar uma série de inovaçõesno sentido da configuração de uma ver
dadeira empresa capitalista. Os estabelecimentos saladeiris, empregan
do mão de obra assalariada, intensificaram a divisão social do trabalho
com operários executando tarefas cada vez mais especializadas, sendo
recrutados segundo as necessidades da empresa. Generalizou-se o uso
de máquinas a vapor, demandando a inversão de mais capital.
Intensificou-se o aproveitamento regular do boi, coma obtenção
de uma gama variada de subprodutos: couros salgados e secos, graxa,
sebo, sangue, esterco. Melhorias sanitárias, aparelhamento dos portos,
construção de vias férreas e intensa propaganda, na Europa, dos pro
dutos uruguaios foram manifestações dessa renovação. Por outro lado,
como economia central do país, gozava do mais amplo amparo gover
namental, com legislação protecionista.
O resultado final dessa empresa tecnificada e assalariada foi o
incremento de produtividade e a possibilidade de colocação, no mer
cadointerno brasileiro, de um artigo a preço mais baixo que o charque
rio-grandense.
No mercado interno brasileiro, defrontavam-se os produtos de
uma economia subsidiária escravista (rio-grandense) em crise e os de
uma economia central assalariada (platina) em ascensão. A forma que
o Rio Grande do Sul teria para poder vencer o concorrente seria pelo
controle dos mecanismos decisórios de poder, subordinando a orienta-

42 (/<y cio
çâo da política econômica nacional aos interesses sulinos. Entretanto,
as pretensões rio-grandenses esbarravam no fato de que aeconomia
do estado estava subordinada aos interesses do centro do país, o que
limitava a autonomia e a determinação política da aristocracia sulina
em assuntos considerados de "interesse nacional .
O interesse do centro, no caso, era baratear o charque, do qual
era comprador. Ksporadicamente, pôde oRio Grande do Sul fazer valer
a nível político os seus interesses, conseguindo a limitação da entrada
do artigo estrangeiro. Todavia, não conseguiu manter uma constância
nessa linha de ação.
Tabela 1. Exportação do Rio Grande do Sul (contos de Réis)

Q: 1894
ií' 408Õ0
Principais produtos da criação
Charque 5,940 (37,7%) 11,663 (28,6%)
Couros 5,856 (37,2%) 5552 (13,6%)

mm
Principais produtos de lavoura e
pequena criação
Banha 6.183 (15,2%)
Farinha de mandioca 221 (1,4%) 3.419 (8,4%)
Feijão 627 (4,0%) 2866 (7,0%)
Feno 736 (1,8%)
13204 (32,4%)

Fonte: Relatório do Presidente da Província. Ps. 1861. RODRIGUES A. F. Notícia


histórica e descritiva do Rio Grande do Sul. Rio Grande, 1896. In: SINGER, Paul.
Desenvolvimento econômico e evolução urbana. São Paulo: Nacional, 1968.

No plano de consciência de agentes de uma economia descapi


talizada como a charqueadora gaúcha, os problemas surgiram porque
"faltavam negros" e porque o Rio Grande do Sul era "dominado pelo
centro".A descapitalização tanto atuavano sentido de não possibilitar a
compreensão total dos problemas enfrentados quanto limitava também
as soluções possíveis de serem achadas para o caso rio-grandense.

r^aHf/'rct 43
Nos quadros do Império, os charqueadores buscavam resolver
seu problema pela antecipação da abolição da escravatura, o que se
deu em 1884. Entretanto, o princípio adotado foi o da libertação com
a "cláusula de prestação de serviços", o que implicava que o senhor
permanecesse com o trabalhador à sua disposição, para uso de acordo
com suas necessidades reais e repassando os gastos de manutenção para
o próprio liberto, agora chamado de "contratado".
Significava, em última análise, extinguir a escravidão sem ex
tinguir os escravos. Limitava-se, com isso, a própria generalização das
relações assalariadas de produção nas charqueadas sulinas, comprome
tendoo desenvolvimento do capitalismo na região.

eco^^€}^rlt€M/

A vinda de imigrantesestrangeiros para o Brasil no século XIX é


um movimento que se insere no processo mais amplo da expansão do
capitalismo a nível mundial. No plano europeu, o desenvolvimento do
capitalismo em países como a Alemanha e a Itália foi capaz de gerar
um excedente populacional sem terra e sem trabalho, que se converteu
num foco de tensão social intenso. Aacumulação de capital de um lado,
a concentração da propriedade do solo e a emergência da indústria tive
ram como contrapartida a expulsão do camponês da terra e a desarticu
lação do trabalho artesanal. Entretanto, o estágio de desenvolvimento
industrial (etapamanufatureira) não se revelava capaz de absorver essa
mão deobra excedente. Além disso, tais países vinham experimentando
conturbações políticas internas que haveriam de resultar no seu pro
cesso de unificação. A presença de uma massa populacional excedente
em termos de ocupação vinha, de uma forma ou de outra, ameaçar
a estabilidade interna das nações. Dessa maneira, o envio dessa mas
sa imigrante para os chamados "países novos" tornou-se um negócio
vantajoso, ainda mais que se descortinavam perspectivas de retorno de
capitais, pela formulação de núcleos de nacionais no exterior que se
vinculariam por laços comerciais à pátria de origem.
Do pontode vista dasnações que receberam os fluxos migratórios,
como o Brasil, a entrada dos imigrantes possibilitou que, internamente.
se desse o processo de transição de mão de obra escrava para a mão de
obra livre. Em especial, São Paulo, com a sua frente pioneira no oeste,
revelou-se a área por excelência para atração de mão de obra europeia.
No que toca à inserção do Rio Grande do Sul nesse processo, é
necessário explicitar os interesses do centro cafeicultor com relação a
uma província periférica. Há dois momentos fundamentais: o primeiro
diz respeito à imigração alemã, iniciada em 1824, e o segundo à
imigração italiana, que se desenvolve a partir de 1875.
Com referência à vinda dos imigrantes alemães, prepondera-
vam, ao que parece, os interesses relacionados com o povoamento e
a colonização de áreas ainda virgens e a possibilidade de que núcleos
de pequenos proprietários agrícolas pudessem vir a neutralizar, pelo
seu peso, o poder da oligarquia regional. Não pode ser desconsidera
da, também nessa época, a perspectiva da diversificação da estrutura
produtora, contribuindo para o abastecimento interno do país e ame
nizando o desnível da balança comercial causado pelogrande peso das
importações de alimentícios.
Já com referência à vinda dos italianos, o interesse do centro,
ao que parece, se prenderia primordialmente a dois fatores básicos:
promover o abastecimento do mercado interno brasileiro gerado pelo
complexo cafeeiro e formar no Sul núcleos coloniais imigrantes bem-
-sucedidos que pudessem servir como foco de atração à imigração es
trangeira para o país. Uma vez chegados no país, muitos imigrantes,
que pensavam tornarem-se pequenos proprietários, acabavam sendo
desviados para o trabalho nas fazendas de café de São Paulo.
O que deve ser considerado, todavia, é que do ponto de vista da
oligarquia regional a imigração não atendia aos seus interesses nem vi
nha solucionar seus problemas, uma vez que osimigrantes vinham tra
balhar para si e não resolver problemas de falta de braços na pecuária.
A partir de 1824, começaram a chegaros imigrantes alemães, es-
tabelecendo-se como pequenos proprietários em terras que, originaria-
mente doadas, passaram depois a ser compradas a longo prazo a partir
de 1854. Por outro lado, as propriedades diminuíram de tamanho: de
77 ha em 1824, passaram a 48 ha em 1848.
É possível dizer que, desde sua chegada até mais ou menos 1840,
os imigrantes puderam apenas sobreviver às custas de uma agricultura
de subsistência, praticamente sem receber auxílio. Cultivaram variados
produtos através da mão de obra familiar e agregados e socorreram-se
com os vizinhos nas suas necessidades. Prosperaram exatamente aquelas
colônias que, melhor localizadas no que diz respeito às possibilidades de
escoamento da produção de excedentes, puderam fazer chegar seus pro
dutos até o centro urbano mais próximo. E de destacar o exemplo de São
Leopoldo, que, por ocasião da Revolução Farroupilha, começou a abas
tecer o mercado de Porto Alegre com o excedente da produção agrícola.
A partir da década de 1840 até 1870, é possível apreciar o desen
volvimento de uma agricultura comercial de gêneros de subsistência
para a capital da província. Dos anos 1870 em diante, a agricultura
colonial alemã já atingia uma fase de poder exportar para o centro do
país, abastecendo o mercado interno gerado pelo café.
Paralelamente aos gêneros agrícolas exportados (milho, feijão,
batata, mandioca, trigo), as colônias especializaram-se também na pro
dução de toucinho e da banha, artigos de alto valor unitário em face da
precariedade dos transportes da época.
Entretanto, todo esse desenvolvimento da agricultura colonial
alemã não veio beneficiar diretamente o pequeno proprietário, mas,
sim, aquele que realmente acumulava capital através das atividades de
abastecimento do mercado interno: o comerciante.
O comércio realizava-se em etapas, desde a "picada" aberta na
mata ao longo da qual se delimitavam os lotes agrícolas até a venda ru
ral, no entroncamento das picadas. Daí os produtos seguiam até a casa
comercial do núcleo (São Leopoldo), sendo, após, levados até o centro
do país, Buenos Aires e até mesmo Hamburgo.
O comerciante alemão foi o elemento que se destacou no mun
do colonial. Lucrava sobre a produção agrícola mediante a diferença
obtida pelos produtos na colônia e em Porto Alegre; lucrava com o
transporte das mercadorias da colônia à capital e da capital à colônia;
lucrava ainda comas operações financeiras de empréstimos e guarda de
dinheiro, o que lhe oportunizava um capital de giro para investir.

f/o //et/
É possível observar sua marcha ascensional em termos de
acumulação de capital, desde a venda rural até a constituição de grandes
casas de comércio de importação e exportação em Porto Alegre. A acu
mulação de capital ocasionada pelo grande comércio foi responsável
por duas alterações básicas: por um lado, a importação de produtos do
exterior contribuiu para desestimular um artesanato de base familiar
que se fazia ao nível dos núcleos coloniais para suprir as necessidades
essenciais. Por outro lado, o surgimento da indústria se liga também à
presença da acumulação de capital.
Ajites da década de 1880, contudo, a indústria concentrou-se
preferencialmente em Rio Grande e Pelotas, visando mais ao abasteci
mento do mercado nacional do que às necessidades locais.
O comerciante enriquecido diversificou paulatinamente suas
atividades, aplicando capital não só na indústria como em empresas de
navegação, bancos, companhias de seguros, loteamentos, hotéis.
Dentro de uma realidade onde o poder regional era dominado
por latifundiários da pecuária, as possibilidades de atuação política dos
imigrantes foram quase nulas. Destacou-se aqui, além da figura do co
merciante, a elite cultural alemã. Juntas controlavam as câmaras de ve
readores a nível municipale, a partir de 1881, a deputação estadual. Em
1881, a Lei Saraiva estendeu o direito de votar aos acatólicos e aos es
trangeiros naturalizados. Os elementos enriquecidos da Colônia alemã
atuaram como uma ponte entre a massa de pequenos proprietários e a
oligarquia pecuarista. Em troca do apoio à situação política vigente era
possível conseguir algum atendimento às necessidades dos imigrantes.
No que diz respeito aos italianos, que ingressaram a partir de
1875, chegaram à província em uma situação de desvantagem se com
parada com à dos alemães, 50 anos antes. As melhores terrasjá se acha
vam ocupadas e coube aos italianos receber lotes ainda menores (25ha)
na encosta da serra. O lote era vendido a crédito, e o prometido subsí
dio para alimentação que seria concedido por um ano foi cancelado. A
única ajuda com que o imigrante italiano contou foi aquela advinda do
trabalho remunerado de 15 dias por mês na abertura de estradas.
Os italianos,ao chegarem, já encontraram uma rede de comercia
lização montada pelos alemães à sua espera para o escoamento do que
viessem a produzir. Se, de um lado, isso facilitava a comercialização de
seus produtos, de outro os tornava submissos ao capital alemão. Além
disso, todos os artigos da policultura, que poderiam produzir, teriam de
enfrentar a concorrência dosprodutosalemães. A saída encontrada pelos
novos imigrantes foi a especialização de determinadas zonas coloniais
italianas num só tipo de artigo: o vinho, que encontrou um amplo mer
cado deconsumo no centro do país, entrea população de origem italiana.
De um modo geral, os núcleos italianos ainda se dedicaram ao plantio do
milho e à criação de suínos parafabricação de banha.
No conjunto, globalmente, o advento de imigração estrangeira
parao Rio Grande do Sul foi capaz de atenuar, no que tange à econo
mia provincial, a relativa estagnação que atravessava a pecuária sulina.
O progressivo crescimento dos produtos coloniais na pauta das expor
tações, nas quais continuavampreponderando os tradicionais produtos
pecuários, contribuiu para que, na virada do século, o Rio Grande do
Sulfosse cognominado de "celeiro do país".

d€y r/c S/tt/


RS IMPÉRIO —Mapa das colônias
Curva
m m

N. Pr«u

Cidade» luio-braiiiclrat
O Antioas eoldnlas lUliana»
Viranôpolli Coianiat ofielii» Curva 7»0 m
Chavi»)
• Ceianla» partkuUrci
•••Ulmite dat antlg» colônia»
teuto«braillelra» Curva 300 m

Caxiai
Ceeala 9 » M"
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J. da Caatlltio»
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MOVA X/ -V / •CONVENTOS Z-^lTO
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Paula

c^ventosb-^caeÍ^ U >—jJ ^-•"'TRtS rORQUILHAS


V. ^LAJEADO •- BOMA •E8CADINHAB MUNDO
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SANTO . , . . , VÇNANCIO y / y MARQues na hbrval
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Rio Pardo ÍTIÂMICO
Rio (/racolaô Traman
KVIamIo

Figura3. RSImpério Mapa das Colônias


Fonte: Jean Roche. A colonização e o RioGrande doSul. Porto Alegre, Globo, 1969.
No plano geral do país, o II Império assistiu à ascensão da hege
monia da aristocracia cafeicultora do vale do Paraíba do Sul. Nucleada
no Rio de Janeiro, reduto do Partido Conservador, organizou a cen
tralização e impôs o unitarismo de mando. Entretanto, o domínio do
centro cafeeirose fazia através de um jogo dual partidário, que permitia
a circulação do poder político no interior de toda a classe dominante
nacional. Dessa forma, proporcionando-se a participação da oposição
no governo, pela alternância dos partidos, impedia-se que os liberais
fossem às armas pela revolução (caso do incidente farroupilha) ou rea
lizassem ligações perigosas com as massas (caso da revolução Praieira
de 1848em Pernambuco). De uma ou de outra maneira, eliminava-se o
perigo de a oposição vir a ameaçar a estabilidade do regime monárqui
co e da estrutura social excludente. O II Império legitimou a aliança no
interior da classe dominante, dentro de um processo político/partidário
excludente que, pelo voto censitário, colocava o povo à margem.
Persistiam, contudo, diferenças de caráter regional. No Rio
Grande do Sul, deve ser destacada como elemento característico a
grande força do Partido Liberal, que com suas reivindicações de fe
deralismo e descentralização respondia aos interesses dos pecuaristas
locais. A formação do Partido Conservador no Rio Grande do Sul, que
só se deu em 1848, deve ser entendida, antes de tudo, como uma ação
política destinada a permitir que, pelo apoio ao poder central, parte da
oligarquiaregional pudessetornar-segoverno e usufruir dos benefícios
resultantes.

Dentro do mesmo espírito de oportunismo, se realizavam, no


plano nacional e local, governos de "conciliação" interpartidária, "li
gas", em que setores de ambosos partidos se uniam com o fim de terem
acesso ao poder.A base das aliançasera a identidade de classee a neces
sidade de fazer circular o poder no interior das camadas dominantes,
deixando o povo à margem e mantendo a ordem vigente.
No contexto sulino, essa articulação partidária surgira, já na dé
cada de 1850 com a formação da "liga", integrada por elementos de am-

õO rlfy r/o //n/


bos os partidos, mas com predomínio dos conservadores e da "Contra
também reunia elementos de dois partidos, mas sob a he
gemonia dos liberais. Deve-se acentuar que, no caso gaúcho, tais arti
culações da classe dominante eram favorecidas e mesmo exigidas pela
necessidade de concórdiae união de esforços para enfrentarosconflitos
platinos.
De 1848 a 1851, desenvolveu-se a luta contra Oribe no Uruguai
e, de 1852 a 1853, a luta contraRosas, da Argentina. A esses conflitos se
seguiram outros, na décadaseguinte, quando o Brasil ingressou na luta
contra Aguirre, que, no Uruguai, se opunha ao governo de Venâncio
Flores (1864-1865). Tal conflito desembocou na Guerra do Paraguai,
desenvolvida entre os anos de 1865 e 1870. Durante todos esses confli
tos, o Rio Grande do Sul atuou segundo seu tradicional papel de guar
dião da fronteira, fornecendo contingentes militares para a luta.
No início da década de 1860, parte dos liberais, que se autocon-
sideravam "puros", reagiu contra as coalizões partidárias, organizan
do o Partido Liberal Histórico. Tendo como principais líderes as figu
ras de Osório e Gaspar Silveira Martins, o Partido Liberal Histórico
apresentou-se como capaz de superarindefinições partidárias e ganhar
adesões. Levantava a bandeira da descentralização administrativa e da
representação das minorias. Propunha-se defender os mais legítimos
anseios de 1835 (a "epopeia farroupilha") e responder de mais perto
às necessidades da província. Com um cunho reformista e combativo,
apontava os vícios do sistema eleitoralvigente, que permitia a fraude.
Aos poucos, através de uma campanha agressiva, foi ganhando
cada vez mais adeptos, agregando dissidentes das coalizões partidárias
formadas, assim como dos próprios conservadores, que se haviam cin
dido. O Partido Liberal Histórico foi adquirindo tal força na província
que, em 1872, em pleno período de domínio do PartidoConservadorno
Brasile na Província, conseguiu ganhar nas eleições para a Assembléia
Legislativa local. Teve início, então, um período de antinomia, em que o
presidente da Província era do Partido Conservador, mas a Assembléia
era Liberal. Nesse momento (1873-1877), a atuação dos liberais foi de
cunho acentuadamente inconformista, criticando os vícios do sistema.
Em 1878, com a ascensão do Partido Liberal ao poder, o domí
nio dos liberais no Rio Grande do Sul se tornou inconteste. Todavia,
uma importante alteração registrou-se em seu comportamento: uma
vez encastelados solidamente no poder, de atacantes da ordem e das
instituições, tornaram-se defensores da situação vigente, adotando uma
conduta de marcado conservadorismo.

Numa tentativa de ampliar sua atuação política, o líder Gaspar


Silveira Martins, senador do Império, bateu-se pela concessão do di
reito de voto aos acatólicos e estrangeiros naturalizados, o que se con
cretizou com a aprovação da Lei Saraiva, em 1881. Através dessa lei, os
pecuaristas liberais estabeleceram uma aliança política com a ala mais
representativa da comunidade alemã colonial: os comerciantes e a elite
intelectualizada, que forneceram os deputados que realizaram a me
diação entre o mundo colonial e a política dos senhores rurais. Em
troca de favores à sociedade colonial, arregimentavam-se votos para os
liberais.

Contra a atuação do Partido Liberal e seu conservadorismo ha


viam de levantar-se os republicanos no Rio Grande do Sul, num mo
vimento que se generalizou na década de 1880, provocados por um
grupo de recém-formados profissionais liberais (advogados e médicos,
filhos de fazendeiros), que retornavam de seus estudos em São Paulo.
Em 1882, fundava-se no Estado o Partido Republicano Rio-
Grandense, que, nos anos subsequentes, começou uma intensa propa
ganda na província, dentro de um contexto político gaúcho dominado
peloPartido Liberal, porém em desgaste pelo seu imobilismo.

52 €Í€y e/o S/íi/


Quadro-resumo II

IBMísíÍ.
¥
Domínio brasileiro sobre a Desenvolvimento da pecuária com a
1822 Província Cisplatina; governo de Independência do Brasil - 7/9. produção do charque; gado da Cisplatina
Lecor. abasteceas charqueadas rio-grandenses.

José Feliciano Fernandes Pinheiro, 1°


Outorgada a U Constituição presidente da Província do Rio Grande do
1824
brasileira. Sul; chegada dos primeiros colonos alemães
a São Leopoldo.

Início da sublevação da Banda


Brasil declara guerra à Tropas rio-grandenses mobilizam-se para
Oriental contra o domínio
Argentina. Início da Guerra lutar na Cisplatina. Ação do "Exército do
1825 brasileiro; chefia de Juan A.
Cisplatina pela posse da Banda Sul"; conflitos entre os chefes locais e os
Lavalleja; apoio de Buenos Aires
Oriental. representantes do centro do país.
ao movimento.

Paz com mediação inglesa.


Uruguai surge como nação
independente. Início do O Império perde a posse da
reerguimento dos "saladeros" e Província Cisplatina. Café
1828
do aproveitamento locai do gado coloca-se como o 2° produto de
oriental. exportação brasileira.
Disputas internas pelo poder entre
Lavalleja e Rivera.
{ feta- Frata Brasil Rio Grande do Sul (período imperial) |
Constituição uruguaia. Perdade prestígio do Imperador;
1830 Frutuoso Rivera como 1° conflitos com a aristocracia agrária
presidente. brasileira.

Abdicação de D. Pedro I; Regência


Concorrência do charque platinoao charque
Trina Provisória é substituída
rio-grandense; disputa pela colocação no mercado
Reerguimentodos pela Regência Trina Permanente.
1831 interno brasileiro.
"saladeros" uruguaios. Café é 0 1° produto de exportação
Colônias alemães produzindo em termos de
brasileira. Expansão das plantações
autossubsistência gênerosagrícolas.
peloVale do Paraíba do Sul.

Desenvolvimento Reclamações contra o centralismo político da


Ato Adicionai confere poder
1834 comerciai de Regência; acusações a Bento Gonçalves de ligações
legislativo às províncias.
Montevidéu. com políticos uruguaios.
i;
Ditadura de Rosas na
Argentina; Oribe sobe ao Eclosão da Revolução Farroupilha no RSa 20/9;
1835 Eclosão da "Cabanagem" no Pará.
poder no Uruguai com a rebeldes conquistam PortoAlegre.
ajuda de Rosas.
BrSsil

Batalha do Seival; a 11/9 Antônio Souza


¥ Neto proclama a República Rio-Grandense;
Formação dos partidos
prisão de Bento Gonçalves no combate da
1836 políticos brasileiros; Partido
ilha do Fanfa, sendo levadopreso para a
Conservador e Partido Liberal.
Bahia; os farrapos perdem Porto Alegre para
I astropas legalistas.
Regência Una de Araújo Lima.
Fuga de Bento Gonçalves da prisão na Bahia
1837 Início da revolta "Sabinada" na
e seu retorno ao RS.
Bahia.

Bloqueio do porto de Buenos Tomada de Rio Pardo pelos farrapos; os


Aires pela esquadra francesa; rebeldes mantêm ligações com o Uruguai,
Eclosão da "Balaiada" no
1838 melhorias técnicas no "saladero" por onde exportam o charque e de onde
Maranhão.
platino; introdução da máquina recebem reforços em armas, cavalos e
a vapor. soldados.

Governo de Oribe no Uruguai;


desenvolvimento do "saladero" Farrapos levam a revolução até Santa
1839 oriental e da atividade comercial Catarina; em Laguna fundam a República
do porto de Montevidéu em face Juliana, confederada à rio-grandense.
do bloqueio de Buenos Aires.
Si
Brasil Rio Grande do Sul (período imperial)

Início do II Reinado, com a


Colônias alemãs desenvolvem uma
antecipação da maioridade de D.
1840 agricultura comercial de subsistência,
Pedro. Grande desenvolvimento da
exportando o excedente para Porto Alegre.
cafeicultura no Vale do Paraíba do Sul.

Declínio farroupilha; Caxias,nomeado


Charque rio-grandenseé presidente e comandante de armas do RS,
1843
exportado via Montevidéu. obtém vitórias sobre os rebeldes.

Fim dos Tratados de 1810 com a


1844 Inglaterra; Brasil impõe protecionismo
alfandegário (Tarifa Alves Branco).

Lutas no Uruguai entre


Inglaterra promulga o BillAberden, 18/2: Paz de Ponche Verde estabelece o
Oribe (blanco) e Rivera
1845 ameaçandoo tráfico de escravos final da Revolução Farroupilha.
(colorado); apoio de Rosas a
I realizadopelo Brasil. Predomínio do Partido Liberal no RS.
Oribe.

"Guerra Grande": Uruguai Forma-se no RS o "Exército Libertador"


(Oribe) x Brasil, Urquiza Irrompe a Revolução Praieira em para lutar contra Oribe; ação das
1848
(Entre Rios) e Artigas Pernambuco. "califórnias" de Chico Pedro.
I- (uruguaio, colorado). Criado o Partido Conservador no RS.
I
1: Data Prata Btasil Ko Grande dò Sul (período I
r Lei Eusébio de Queiroz extingue
0 tráficonegreiro. Lei de Terras
1850 Fundado o Estaleiro Só em Porto Alegre.
no Brasil extingue o regime de
concessão de sesmarias e datas.

Fim da "Guerra
Grande", com derrota
de Oribe e ascensão de
Venâncio Flores ao poder O Brasil entra em guerra contra Finda a guerracontraOribe, inicia a luta contra
(colorado); o Tratado de Rosas, da Argentina. Começa Rosas, permanece a mobilização militar.
1851 1851 no Brasil estabelece a substituição da mão de obra Em face dos Tratados de 1851, anulam-se as
condições desfavoráveis escrava pelalivre nas plantações de condições de concorrência uruguaia com o
para a economia pecuária café em São Paulo. charque rio-grandense.
uruguaia.
Início da guerra entre
Argentinae Brasil.

Derrota de Rosas na batalha Conciliações interpartidárias no RS; forma-se a


de Monte. Liga, sob hegemonia do Partido Conservador,
1852 e a Contra-Liga, sobhegemonia do Partido
Caseros pelas tropas
brasileiras aliadas a Urquiza. Liberal.
Si
1; P^aita Praita Brasil Rio Grande do Sul (período imperial)
Política de Conciliação no
1853
Brasil.

Lotes de terras passam a ser agora vendidos aos


1854 colonos imigrantes.
1858 Formação do Banco da Província.
Presidente Bernardo Berro,
no Uruguai, torna sem Reorganização do Partido Liberal no RS:
Decadência do café no Vale do
efeito os Tratados de 1851; formação do Partido Liberal Histórico; liderança
Paraíba do Sul. Expansão das
1860 desenvolvimento do "saladero" de Osório. Restabelecem-se as condições de
lavouras no Vale do Tietê, no
uruguaio como uma empresa concorrência entre o charque platino e o rio-
oeste paulista.
capitalista, dirigida para grandense.
exportação.
Guerra civil no Uruguai entre
I? Manifesto do Partido Liberal Histórico, com um
1863 Venâncio Flores (colorado) e
cunho combativo e reformista.
Atanásio Aguirre (blanco).

f
|; Data Prata Brasil Rio Grande do Sul (período imperial)
Aguirre depõe Flores
Brasilentra em guerra contra o
¥ no Uruguai. Ligação de RS participa da luta contra Aguirre;
1864 Uruguai, auxiliando Venâncio Flores a
Aguirre com Solano Lopez, reativação da mobilização militar na região.
voltar ao poder.
do Paraguai.
Início da guerra do Paraguai.
Aguirre é vencido no Grande desenvolvimento da lavoura
Assinada a Tríplice Aliança entre
1865 Uruguai; pede auxílio de comercial de subsistência na área colonial
Brasil,Argentina e Uruguai contra o
Lopez, ditador do Paraguai. alemã.
Paraguai.
Fundada no Uruguai a
Desenvolve-se a imigração estrangeira
1866 Liebig, fábrica de extrato de
para as lavouras de café em São Paulo.
carne, de capital inglês.
Crise das instituições monárquicas; Surge 0 jornal A Reforma, órgão oficial do
1868
queda do Gabinete Zacarias. Partido Liberal.

Crise da charqueada sulina, manifestada


Final da Guerra do Paraguai. na falta de mão de obra escrava e na
Mantém-se a concorrência
Grande desenvolvimento da lavoura concorrência com o Prata.
platina do saladero
do café em São Paulo, utilizando mão Grande desenvolvimento da lavoura
1870 uruguaio com a charqueada
de obra livre de origem imigrante. colonial, abastecendo o mercado interno do
gaúcha pela conquista do
Surge o ManifestoRepublicano, no centro do país.
mercado interno brasileiro.
Rio de Janeiro. O PartidoLiberal fez grande propaganda de
aliciamento no RS.
§
Data Prata Brasil Rio Grande do Sul (período imperial)
Partido Liberal consegue dominar a Assembléia no RS,
Manifesto Republicano de Itu (SP). num período dedomínio do Partido Conservador.
1873 Campanha abolicionista em curso Atuação dos liberais; inconformismo com a ordem
no país. vigente e críticos das instituições.
Surge a Fundição Berta em Porto Alegre.

1874 Eclode 0 conflito dos Mucker no Ferrabras.

Inícioda imigração italiana para o RS; colônias de Conde


1875
D'Eu e Princesa Isabel.
Ascensão do Partido Liberal ao governoda Província do
Rio Grande, ao mesmo tempo que domina a Assembléia.
1878 Mudança de atuação: defensores da ordeme das
instituições.
Líder: Gaspar Silveira Martins.
I Concessão do direito de votar e ser Alemães podem participardo processo político-
1881 votado aos acatólicos e estrangeiros partidário, sendo cooptados pelo Partido Liberal.
naturalizados (Lei Saraiva). Campanha abolicionista em curso.

1°Convenção Republicana no RS.


1882
Fundação do Partido Republicano Rio-Grandense (PRR).
P frigorífico
inglês na Declínio das instituições
1°Congresso Republicano no RS; destaque: Júlio de
1883 Argentina: The monárquicas; prossegue a campanha
Castilhos.
i River Plate Fresh abolicionista.
Meat Company.

2° Congresso Republicana do RS
Fundação do jornalA Federação^ órgãooficial do PRR.
1884
RS extingue a escravidão mediante a cláusulade
prestaçãode serviços.

Ligação dos militares com o PRR; ação de Júliode


1887 Castilhos com a "questão militar" precipita a queda da
monarquia.

LeiÁurea extingue a escravidão no


1888
Brasil.

Derrubada dos liberais do poder,seguida do exíliode


1889 Proclamação da República.
Silveira Martins.

5
111

instalação da República no país representou um ajustamento


do nível político —mudança do regime —às novas necessidades
geradas na economia e na sociedade brasileiras.
Ao longo do século XIX, o desenvolvimento da agroexportação,
baseada no café, foi capaz de gerar uma série de transformações na
estrutura tradicional montada no país desde os tempos da coloniza
ção. Dominando o mercado mundial, as exportações nacionais do café
foram capazes de fazer o Brasil acumular divisas, que se distribuíram
internamente em efeitos multiplicadores e dinamizadores da estrutura
econômica. Tais transformações econômico-sociais acabariampor pro
mover a internalização do capitalismo no Brasil. O país já se achava
conectado, por laços comerciais, a um mercado capitalista desde a fase
colonial, mas se tratava, agora, da penetração do capitalismo na estru
tura interna brasileira. Fatores indicadores desse processo foram a acu
mulação de capital, a introdução de relações assalariadas de produção,
a constituição de um mercado interno, a urbanização, o surgimento da
indústria, a construção de estradas de ferro, aparelhamento de portos,
criação de bancos, companhias de seguro e novos serviços públicos para
fazer frente ao volume dos negócios.
No bojo desse processo de transformações, surgiram novos gru
pos sociais, que passaram a pressionar o sistema instalado: a burgue
sia agrária cafeeira, na liderança da renovação econômica, segmentos
médios urbanos e um "novo exército", com aspirações de participação
política. As classes emergentes —burguesia e classes médias - associa
das ao grupo funcional descontente (exército) articularam a queda do
regime.
Para todos esses elementos, a monarquia se apresentava como
obsoleta, incapaz tanto de responder aos anseios de descentralização
administrativa e federalismo reivindicados pela burguesia paulista
quanto de promover a incorporação dos setores médios emergentes aos
partidos políticos tradicionais. Quanto aos militares, no quadro ins
titucional vigente, tornava-se impossível sua participação no processo
decisório de poder.
O poder político no Império se achava controlado pelo grupo
dos cafeicultores escravistas do Vale do Paraíba do Sul, enquanto que
as transformações econômico-sociais advindas do complexo cafeeiro
tinham seu centro irradiador em São Paulo. Em suma, revelava-se a
incompatibilidade entre a estrutura monárquica tal como se achava
constituída e as novas alterações surgidas.
O regime caiu através de um golpe militar, mas foi a burguesia
agrária paulista que acabou submetendo a máquina política aos interes
ses do setor dinâmico da economia central de exportação, que exigia tal
mudança em face da continuidadedo processo de acumulação de capital.
No Rio Grande do Sul, essa transição do regime monárquico
para o republicano não fiigiu desse contexto geral de transformações
que atravessava o país, mas obedeceu a uma conotação específica para
a área.

O Rio Grande, desde sua formação, constituíra-se nos moldes


de uma economia agropecuária, subsidiária da agroexportação, voltada
para o abastecimento do mercado interno brasileiro com a exportação
de gêneros alimentícios, pelo que era conhecido pelo cognome de "ce
leiro do país". O processo de internalização do capital, que se desenvol
veu no país a partir de 1870, assumiu no estado feições particulares na
medida em que se tratava de uma economia dependente de uma área,
por sua vez, dependente, produzindo artigos de baixo valor para um
mercado competitivo. Em suma, nesse momento-chave de acumulação
capitalista no país, o Rio Grande do Sul revelava um poder de acumu
lação mais baixo.
Apesar de o setor agrícola colonial (zona de imigração alemã e
italiana) apresentar-se como o mais dinâmico, com mais capacidadede

f/o t^tt/
capitalização, proporcionando o surgimento do grande comércio e de
indústrias, era o setor pecuarista o predominante no estado, fazendo-se
representar na política. O Partido Liberal, majoritário no Rio Grande,
dominado por pecuaristas, barganhava com o poder central através da
atuação de seu líder, Gaspar Silveira Martins, para obtenção de favo
res para a província. No conjunto, a dependência do Rio Grande em
relação ao centro expressava-se em termos econômicos e políticos: da
sede do poder, no Rio de Janeiro, traçavam-se as diretrizes da política
econômica, cobravam-se tributos e emanavam ordens.
A parcela de classe dominante que se encontrava descontente vi
sualizava a questão da dependência através da subordinação política
do centro sobre o sul e da pouca autonomia que o Rio Grande deti
nha para resolver seus problemas. Na esfera econômica, considerava
ser o principal entrave ao desenvolvimento da economia rio-grandense
a questão dos transportes: um precário e oneroso sistema ferroviário,
uma barra obstruída, que dificultava o acesso dos navios de grande ca
lado, e a ausência de um porto. No plano de ação, sua conduta se orien
tava para a crítica das instituições monárquicas do país. Na província,o
domínio do Partido Liberal apresentava-se como incapaz para resolver
os problemas que afligiam a economia gaúcha.
Para as novas camadas sociais médias urbanas que surgiam, os par
tidos políticos do Império não representavam seus interesses e também se
revelavam ineptos na remoção dos entraves ao desenvolvimento sulino.
Tais setores, no caso, apresentavam-se como politicamente disponíveis
paraserem arregimentados por uma nova proposta partidária que surgisse.
Diante da conjuntura que se apresentava, a República foi nova
alternativa política, e o Partido Republicano Rio-Grandense (PRR), o seu
instrumento partidário no nível estadual. Tratava-se, contudo, da emer
gência de um novo partido dentro dos quadros de uma situação política
dominada pelo Partido Liberal. Era preciso, pois, que, além de realizar
uma propaganda intensa, o PRR se propusesse a oferecer novas soluções
para velhos problemas, assim como efetivasse alianças vantajosas.
A base social do PRRfoi constituída por elementos do latifúndio
pecuarista (ala jovem do Partido Liberal ou conservadores), descon-
tentes com o regime, em associação com setores médios urbanos. Se
comparado com o Partido Liberal, o novo partido realizou um alarga
mento social da sua base política. Preocupou-se em incorporar setores
do colonato italiano e cooptar aqueles elementos egressos do complexo
colonial que enriqueciam: comerciantes e industriais. Por outro lado,
o PRR foi capaz de realizar uma união vantajosa com o exército. Essa
união deu-lhe a força suficiente para se impor. A ligação, no caso, foi
facilitada tanto pela forte tradição do militarismo, que o Rio Grande
apresentava desde a sua formação, quanto pela presença do componen
te ideológico positivista, adotado pelo PRR, e que tinha grande pene
tração nos meios militares.
O positivismo, adotado como ideologia pelo novo grupo dirigen
te gaúcho, veio conferir uma feição "sui-generis" à "República Velha"
rio-grandense, oferecendo, além disso, uma série de respostas aos pro
blemas gaúchos. Em primeiro lugar, é preciso que se compreenda que
a apresentação dos problemas e suas soluções foram colocadas, pelo
grupo que ascendia ao poder, em termos ideológicos.
No contexto europeu, a ideologia positivista surgiu como defenso
ra da sociedade burguesa em ascensão e do desenvolvimento capitalista.
Para conservar a ordem burguesa, era essencial que se acelerasse o de
senvolvimento industrial. Dessa forma, a ordem era a base do progresso;
o progresso era a continuidade da ordem. Assim, a visão positivista era
progressiva e conservadora ao mesmo tempo, ou seja, pretendia conciliar
o progresso econômico com a conservação da ordem social.
No contexto gaúcho, tratava-se, antes, de implantar o capitalis
mo, para o que se apresentava uma série de entraves. Ante tais proble
mas que se antepunham, o PRR propunha-se a realizar a moderni
zação econômica exigida. A ideologia importada, posta a serviço das
condições histórico-objetivas locais, fornecia os elementos básicos que
norteariam a ação do grupo no poder: desenvolver as forças produtivas
do Estado, favorecer a acumulação privada de capital e propiciar o pro
gresso harmônico de todas as atividades econômicas.
A posição do governo era de que a solução dos transportes do es
tado, se efetivada, viria atender a todos os setores da economia gaúcha.

66 ^{€á/4Í^Í€l fl<y PJíic f/o


correspondendo ainda, no plano da política, à aliança buscada pelos
republicanos entre vários setores sociais.
A parcelada classe dominante que subiu ao poder com a instala
ção da República precisava manter afastada do governo a outra parcela
da classe dominante derrubada. Para tal, tanto se valeu do recurso à for
ça (Brigada Militar, guardas municipais) quanto realizou uma amplia
ção social de sua base política, realizando alianças com outros grupos
sociais, tais como as "classes médias", o colonato, os comerciantes da
fronteira etc. O preço dessa aliança era pago pelo governo ao procurar
atender aos vários interesses econômicos presentes no estado, e não só
os da pecuária. Portanto, desenvolver os transportes, permitir ("fechan
do os olhos) o contrabando na fronteira, amparar a agricultura e conce
der incentivos fiscais à indústria nas suas solicitações eram formas de o
governo positivista legitimar sua dominação e ficar coerente com seus
postulados teóricos, que afirmavam que o Estado era "o representante
de todos os grupos sociais". Para as camadas médias urbanas, o posi
tivismo ainda oferecia um cunho de moralidade política e austeridade
dos governos, tão caro ao universo ideológico desses grupos sociais e
que, em termos de comportamento público, os governantes procura
vam perseguir.
Todavia, o princípio de "viver às claras", transposto para o pla
no eleitoral, onde se praticava o voto a descoberto, permitia a prática
de fraude. A constituição positivista, por seu lado, tanto assegurava a
supremacia do poder executivo sobre o legislativo quanto permitia a
sucessiva reeleição do governante, desde que obtivesse três quartos da
votação total. Tal situação, associada à fraude eleitoral, assegurava a
continuidade do governante no poder.
O próprio autoritarismo do mando, presente na prática política
positivista, não era algo estranho ao contexto sulino, onde práticas de
violência e arbitrariedade se fizeram sentir desde o período formativo
de sua história. Dessa forma, a exigência de modernizaçãoda economia
periférica, a necessidade de incorporação de setores sociais emergentes
e a busca de renovação político-administrativa encontraram resposta
na importação e adaptação de um aparato político-ideológico de cunho
autoritário, progressista e conservador.

veri/o S7
c^dáey€Í<y ^/ a^^/io^i€^>u€Í^Í4Z'e/ Ineítí^
A República veio confirmar a posição gaúcha de tradicional for
necedor do mercado interno do país, com sua economia subsidiária de
base fundamentalmente agropecuária.
Em especial, os produtos pecuários (charque e couros), apre-
sentavam-se com grande vulto na pauta das exportações. Todavia, a
criação continuava a desenvolver-se em moldes extensivos, pelo que
o aumento da produção só se obtinha pela expansão quantitativa dos
dois fatores básicos: terra e gado. O crescimento do rebanho revelava-se
diminuto, resultado tanto da falta de higiene e tecnologia adequadas,
responsáveis pela alta incidência de doenças, quanto do abate indiscri
minado, que sacrificava novilhos e vacas prenhes. Além disso, os pou
cos cuidados na seleção genética do gado e a pequena importação de
reprodutores selecionados davam como resultado um animal de pouco
peso e muito chifre, com baixo rendimento de carne. Não se achava
ainda completo o processo de cercamento dos campos. Era muito pou
co generalizado o uso de balanças para a pesagem do gado, tendo este
o seu peso calculado "a olho".
Dentro da economia gaúcha, o estancieiro era o fornecedor de
matéria-prima para a charqueada e, como tal, achava-se na depen
dência dos preços oferecidos pelos charqueadores. Estes, por sua vez,
como aliás toda a economia gaúcha, achavam-se na dependência da
economia central de exportação brasileira e das necessidades geradas
pelo mercado interno. Os lucros ficavam, efetivamente, com as casas
consignatárias da venda do charque nos mercados do centro, as quais,
por sua vez, redistribuíam as mercadorias para o norte e para o nordes
te. O charqueador procurava ressarcir-se dessa exploração às custas do
criador, oferecendo o preço mais baixo possível pelogado.
A charqueada operava como uma manufatura, produzindo um
gênero de baixa qualidade e mau aspecto, com precária tecnologia para
um mercado altamente competitivo. Durante a República Velha, com
as crises de superprodução do café, alguns estados voltaram-se para a
economia de subsistência, como foi o caso de Minas, que, estando mais

68 f/o
próximo do Rio de Janeiro e de São Paulo, tinha vantagem na disputa
do mercado central. Tal como Minas, outros estados começaram a con
correr, ao lado do charque platino, com o produto gaúcho, no abasteci
mento do mercado interno brasileiro.

Por outro lado, as altas taxas cobradas pelo governo central so


bre a importação do sal de Cádiz oneravam mais o produto, o mesmo
acontecendo com os altos fretes cobrados pelos transportes ferroviários
e marítimos. A obtenção de maiores lucros através do aumento de pre
ços, que compensaria o aumento dos custos de produção, era inviável
em virtude do baixo poder aquisitivo do consumidor brasileiro. O char
que, antes alimento da escravaria, era agora consumido pelas camadas
populares urbanas, que a qualquer elevação do preço restringiam o
consumo. Da mesma forma, a alta do preço do charque gaúcho favo
recia os concorrentes nacionais e platinos, que podiam melhor colocar
seu artigo no mercado.
Se o Rio Grande do Sul tivesse acesso aos mecanismos decisórios
de poder na República Velha, poderia neutralizar esse efeito, elevando
as taxas de importação sobre o charque platino e impedindo, dessafor
ma, a concorrência estrangeira. Entretanto, a dependência política do
Rio Grande do Sul com relação ao centro não lhe permitia influir sobre
a política econômica imposta ao país. Prevaleciam os interesses liga
dos ao centro, aos quais convinha baratear os gêneros de subsistência
dos trabalhadores nacionais, reduzindo com isso a tensão social que se
agravava pela política inflacionária de defesa do café.
Para enfrentar essas dificuldades, o charqueador encontrou duas
formas: pagar uma baixa remuneração para o operário da charqueada
e manipular os preços do gado. A charqueada sulina, tal como se acha
va constituída, apresentava um grande descompasso tecnológico diante
dos mais modernos processos de conservação da carne, utilizados, já
nessa época, no Prata: os frigoríficos.
No períodoque antecedeua guerra,a dura competição pelos mer
cados, os lucros reduzidos, a exploração dos estancieiros pelos charque-
adores e o exemplo da renovação tecnológica vinda do Prata levaram os
criadores gaúchos a iniciarem um movimento de congregação de clas-
se, do qual resultou a fundação, em 1912, da União dos Criadores. Esse
órgão de classe passou a trabalhar pela renovação da pecuária gaúcha,
difundindo novas técnicas, promovendo congressos e debates e objeti
vando, como meta máxima, a formação de um frigorífico com capitais
locais. O Estado gaúcho apoiou o projeto de renovação idealizado pelos
criadores, que permitiria a adoção dos mais modernos processos de con
servação de carne pelo frio, permitindo o aumento da produtividade e o
aproveitamento integral do rebanho.
A eclosão da Primeira Guerra Mundial veio proporcionar um
períodode euforia para a pecuáriagaúcha, em face das amplas perspec
tivas de mercado que se ofereceram. As necessidades de abastecimento
dos países beligerantes, no que diz respeito à população civil e às tro
pas, elevou extraordinariamente os preços dos gêneros de consumo, en
tre os quais a carne frigorificada. O aumento da demanda e dos preços
foi acompanhado de uma alteração nos padrões de consumo: exigiam-
-se grandes quantidades de carne em desfavor de sua qualidade. Tais
alterações impeliram as grandes empresas frigoríficas estrangeiras, que
já se achavam instaladas no Prata, a penetrarem no Brasil (São Paulo,
Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul), que possuía rebanhos, se bem que
de qualidade inferior.
No Rio Grande do Sul, os estancieiros, através de seu órgão de
classe e com o apoio do governo do estado, intentavam criar um frigo
rífico nacional —o Frigorífico Rio-Grandense —numa campanha que
movimentou todo o estado. O governo gaúcho, ao mesmo tempo que
apoiava o projeto dos criadores, facilitou a entrada do capital estran
geiro, que promoveria a renovação tecnológica da pecuária, através de
uma legislação protecionista. Beneficiados por tais incentivos fiscais, as
empresas norte-americanas penetraram no estado: Armour e Wilson
em Santana do Livramento, em 1917 e 1918, respectivamente, e Swift
em Rio Grande, em 1917. Em face da instalação desse último em Rio
Grande, local que era de preferência da maioria dos estancieiros para
estabelecerem seu frigorífico, a empresa gaúcha foi obrigada a transfe
rir-se para Pelotas. As boas perspectivas de mercado criadas pela guerra
e a entrada dos frigoríficos estrangeiros representaram um grande im
pulso para o desenvolvimento da pecuária gaúcha. Para os criadores, a
empresa estrangeira aqui estabelecida trouxe uma série de vantagens:
conferiu um maior valor ao gado, deu um impulso ao seu refinamento
e aos métodos de criação e proporcionou um aproveitamento indus
trial para o rebanho ovino. Frente a essas expectativas, os estancieiros
passaram a contrair dívidas para renovação da criação. Os charqueado-
res, por seu lado, também se viram beneficiados com as perspectivas de
mercado, uma vez que o desenvolvimento da frigorificação de carne no
Prata fez com que se reduzisse na região o abate para charque. Nessa
medida, pôde o charque rio-grandense encontrar melhor colocação no
mercado interno brasileiro, pela diminuição da concorrência, assim
como até penetrar no mercado cubano, do qual se retiravam os platinos.
Paralelamente a essa crise e desafogo da pecuária, a agricultura
colonial praticada pelos imigrantes teve, ao longo dos primeiros anos
da República, de enfrentar uma série de problemas que levaram a uma
crise por volta de 1910.
Com o desenvolvimento da economia de subsistência em zo
nas até então cafeeiras, outras regiões passaram a competir com o Rio
Grande do Sul no abastecimento do mercado interno com produtos
agrícolas. Melhor situadas em relação ao centro do país, pagando me
nores fretes, podiam colocar seus artigos em condições mais vantajosas.
Paralelamente a essa concorrência, a agricultura colonial ainda
enfrentava problemas, tais como o rápido esgotamento do solo associa
do ao contínuo fracionamento da terra. Normalmente contando com
numerosos descendentes, o colono dividia a terra, como herança, entre
seus filhos. As progressivas subdivisões do solo, explorado com técnicas
rudimentares, conduzia a uma diminuição crescente da produtividade
da terra. O fracionamento do minifúndio era levado até o momento
em que se tornava impraticável nova divisão, com o que verificava-
-se o processo de "enxamagem", ou migração dos descendentes para as
novas áreas, dilatando a fronteira agrícola gaúcha. Esse mecanismo de
expansão da região cultivada compensou, em parte, a decadência das
áreas, já esgotadas, até mais ou menos 1920.
RS; RÈP'IJ;BLIÈ)'Ãv ^ iFrfeip.ã-fei tpMdúMS] í&xp

íSrcXdÚftÕS) >.^feiii51â4^j
Charque 132.500 contos
Couros 68.225 contos

Banha 44.192 contos


Sebo 21.413 contos
Lã 13.078 contos
279.408 contos

Frõdút^j Vegetal^
Farinha de mandioca 16.909 contos
Fumo 13.895 contos
Feijão 11.744 contos
Erva-mate 11.002 contos
Vinho 5.082 contos
Arroz 4.877 contos
Cebola 4.221 contos

67.730 contos

Quadro I: RS República Velha - Principais produtos exportados (1908-1912)

Fonte: Mensagem do presidente do Estado enviada à Assembléia dos


Representantes do Estado do Rio Grande do Sul, 1913.

Outro fator que contribuiu para agravar as condições de produ


ção do pequeno agricultor colonial foi a atuação dos grupos comercian
tes, que monopolizavam os lucros, pagando baixos preços ao produtor
direto. O fato de enfrentarem, no mercado interno, a concorrência de
outros produtores nacionais levava-os a se ressarcirem do prejuízo so
bre os agricultores da colônia. Tal processo afetava não somente a agri
cultura policultora de gêneros de subsistência como também aquele se
tor de economia colonial que fornecia matéria-prima para a indústria.
Por exemplo, o vinho produzido na zona colonial italiana enfrentou
problemas de uma superprodução em 1911, tendo, além disso, que en
frentar a concorrência do produto importado. Alegava-se que o vinho
gaúcho era de baixa qualidade e que sofria um processo de falsificação
no momento de sua venda no centro do país. Problemas reais, eram.

72 fyfiò2ótÍ€t/(/o r/^ T/til


contudo, o baixo nível técnico da produção, a presença de concorrentes
e a ação dos comerciantes, que controlavam a compra e fixavam o pre
ço. As tentativas de escapar ao controle dos comerciantes foram a base
do surto cooperativista que ocorreu na área colonialitaliana entre 1911
e 1912, congregando pequenos produtores com o fim de valorizarem
seus produtos. O movimento, que se iniciou com o apoio do governo
do estado recuou e desorganizou-se em 1913, quando os grandes co
merciantes e produtores de vinho da colônia se opuseram à iniciativa
dos pequenos produtores. O governo estadual, no caso, posicionou-se
aolado daqueles setores que seachavam acumulando capital, retirando
seu apoio ao movimento cooperativista.
Uma forma de a agricultura colonial de gêneros de subsistência
superar a concorrência interna de outras regiões do país foi conquistar
novos mercados, como o Prata. Através da exportação para essa área,
principalmente de feijão, a agricultura colonial encontrou uma forma
de recuperação. Outro poderoso estímulo foi dado pela situação criada
com a eclosão da Primeira Guerra Mundial, quando o Rio Grande viu-
-se a braços com a tarefa de abastecer não só o mercado brasileiro (já
que o fornecimento exterior ficara paralisado), como também suprir
as necessidades das nações aliadas. A guerra, portanto, não só se con
verteu num incentivo poderoso à produção de gêneros agrícolas, tendo
em vista as necessidades de mercado, como também trouxe consigo a
elevação do preço das mercadorias. Instalou-se um verdadeiro período
de euforia com a elevação da demanda e do preço. O otimismo levava
a pensar que as economias afetadas pelaguerra dos países combatentes
levariam muito tempo para se recuperar e com isso a conjuntura favo
rável se estenderia ainda por um bomtempo após terminado o conflito.
Na verdade, até cerca de 1920, o Rio Grande ampliou cada vez
mais sua produção no setor, aumentando tanto a área de produção
quanto a tonelagem exportada.
A partir da Primeira Guerra Mundial, com a elevação dospreços,
verificou-se também a expansão de cultura do arroz no estado. Esse
produto, contudo, constituiu, desde o seu surgimento, uma cultura
específica, diferente do resto da produção agrícola gaúcha. Medidas

fo 7S
protecionistas tomadas pelo governo federal, elevando as tarifas de im
portação nos anos de 1896, 1903 e 1906, propiciaram uma elevação in
terna do preço e a possibilidade de produtores nacionais abastecerem o
mercado brasileiro.

Se é verdade que o governo federal assim agia com o objetivo de


obter mais divisas através do aumento das taxas de importação, no Rio
Grande do Sul a conseqüência imediata de tais medidas foi a expansão
do cultivo do arroz, em particular na região de Cachoeira, onde gran
des proprietários já aplicavam técnicas de irrigação e utilizavam alguns
implementos agrícolas mais modernos. Via de regra, estando as terras
ocupadas pelo latifúndio pecuarista, o arrendamento para o cultivo foi
uma prática muito usada. Nessa atividade, lançaram-se comerciantes
e banqueiros de origem alemã e pecuaristas (criadores e charqueado-
res), embora se tenha registrado também a presença de elementos de
camadas médias urbanas. O arroz do Rio Grande do Sul pôde penetrar
na Argentina e no Uruguai, uma vez que com a guerra estavam para
lisadas as remessas do arroz italiano para a área. Com o comércio do
arroz para a área platina, incrementaram-se as vendas de trigo daqueles
países para o Rio Grande, aproveitando para tal fim os fretes de retorno.
Com relação ao processo de industrialização, o Rio Grande do
Sul apresentava determinadas condições estruturais que lhe permitiam
uma arrancada inicial não muito diversa da que ocorria então em São
Paulo. A atividade dos comerciantes de origem imigrante permitia uma
razoável acumulação de capital; formara-se um mercado regional para
manufaturados na zona colonial e nos centros urbanos; a agropecuá
ria fornecia matéria-prima, e a mão de obra imigrante que deixava a
lavoura colonial em demanda das cidades era da melhor qualidade.
A essas condições internas acrescentavam-se, no início da República,
as conseqüências de uma política emissionista posta em prática pelo
governo federal e conhecida como "Encilhamento".
Essa medida, embora atendesse primordialmente os interesses
de uma economia agroexportadora em expansão, beneficiou também
a indústria, uma vez que pela emissão e conseqüente desvalorização
da moeda tornou-se difícil a importação de produtos manufaturados

^Íjt4in</ey
estrangeiros. Por outro lado, o crédito bancário tornou-se mais fácil, o
que gerou uma proliferação de empresas em vários setores. Adécada de
1890 assistiu a um verdadeiro surto industrial no Rio Grande do Sul,
centralizado na produção de conservas, têxteis, banha, vinho, cerveja
e calçados. Embora essa produção visasse, fundamentalmente o abas
tecimento do mercado local, algumas empresas como Renner, Wallig e
Berta atingiram o mercado nacional, especializando-se em artigos de
superior qualidade.
Nessa fase pré-guerra, aindústria gaúcha ficou de uma certa for
ma resguardada da penetração da indústria paulista, tendo em vista
tanto o alto custo dos transportes quanto a alta concentração de capi
tais no café em São Paulo. Durante a Primeira Guerra Mundial, com
o bloqueio do comércio internacional, eliminou-se a concorrência dos
manufaturados estrangeiros. Internamente, seguiu-se no país a infla
ção e desvalorização da moeda.
Diante de tais estímulos, ocorreu um segundo surtoindustrial no
Rio Grande do Sul, com a implantação de novas fábricas. Entretanto,
aquele tipo de empresas, que trabalhavam com matéria-prima impor
tada, teve dificuldades em obtê-la. Esse foi o caso daWallig e Berta, que
utilizavam o ferro da Alemanha, e das cervejarias, que importavam o
lúpulo e malte da Boêmia. Setorialmente, a indústria apresentou uma
grande diversificação nesse período, mas geograficamente mostrou-se
concentrada em Porto Alegre, Rio Grande, Pelotas, Caxias e Vale dos
Sinos.

Embora esses fatores apontados apareçam como incentivos ao


desenvolvimento industrial no estado, obstáculos também se antepu
nham ao processo gaúcho de industrialização. A indústria ocupava
uma posição subordinada num estado agropastoril. Aqui a pecuária
não desempenhou, tal como o café no centro do país, o papel de me
canismo gerador de capitais que pudessem ser transferidos para o setor
industrial num processo de diversificação da economia.
Ainda não arregimentados num órgão de classe, os industriais
gaúchos apresentavam, individualmente, petições particulares ao po
der constituído, que era praticamente monopolizado pelos represen-

t9^an///ia 7^
tantes do setor da pecuária. Se o governo os atendia, às vezes, em suas
solicitações, era mais no sentido de estabelecer uma barganha, para
conquistar apoio político e fortalecer-se, do que no sentido de uma po
lítica claramente a favor da industrialização.
De um modo geral, contudo, o período da Primeira Guerra
Mundial veio criar no estado uma conjuntura ótima de mercado e uma
perspectiva de euforia, atenuando tensões, marcando crises e fomen
tando ilusões ao "celeiro do país".

ccm^oíleía^ã^ rlet/
A instalação da República no Rio Grande do Sul implicou a ado
ção de uma forma de governo autoritária, inspirada na república dita
torial do Comte. Adotando uma perspectiva de promover o progresso
econômico sem alteração da ordem social, assegurava o domínio das
"classes conservadoras" no estado.
Júlio de Castilhos, o ideólogo e estadista máximo desse período
inicial de implantação da República, foi praticamente o único autor
da Constituição Estadual de 14 de julho de 1891. Nela se estabelecia a
presença de um legislativo estadual com poderes limitados a questões
orçamentárias (aprovar a receita e despesa do estado) e de um executivo
forte com poderes de legislar por decreto sobre matérias não financei
ras. Além disso, a Constituição postulava que o vice-presidente seria
nomeado pelo presidente estadual e que este podia continuamente re
eleger-se, uma vez obtidos 3/4 partes dos votos. Tal princípio associado
ao mecanismo do voto a descoberto, vigente na República Velha, per
mitia que um presidentede estadopudesse permanecerno poder prati
camente por tempo indefinido. A tomada de poder pelos Republicanos,
contudo, não se fez sem contestação.
Já por ocasião das eleições para a constituinte estadual em 1891,
republicanos dissidentes, ex-liberais e ex-conservadores formaram o
Partido Republicano Federal, que concorreu com o Partido Republicano
Rio-Grandense (PRR), sem, contudo, lograr eleger seus deputados.
Em novembro de 1891, a oposição gaúcha liderada por Juca
Tavares depôs Castilhos, anulando a Constituição de 14 de julho

7S ^iá/ótía/€/<y fio//tU
e fazendo cair os governos municipais. Iniciou-se o período do cha
mado "governicho". Em 1892, o PRR, tendo realizado aproximações
vantajosas com o exército, conduziu Castilhos novamente ao poder.
Entretanto, a maior contestação ao governo gaúcho deu-se por oca
sião da Revolução Federalista, que assolou o estado de 1893 a 1895,
registrando atos de extrema violência de ambas as partes. Os ex-liberais
rearticularam-se em torno do seu líder Gaspar Silveira Martins, que
em 1892 retornava do exílio na Europa, formando em Bagé o Partido
Federalista Brasileiro. Deles afastaram-se os republicanos dissidentes,
que não aceitaram aliderança do velho chefe liberal. Adotando aidéia
parlamentar, os federalistas opuseram-se, no plano local, a Castilhos, e
no plano Federal, ao governo de Floriano Peixoto. Nessa linha de con
duta, aproximaram-se do movimento eclodido na marinha, conhecido
como Revolta da Armada, que reunia elementos da elite da época do
Império, inconformados com a instalação daRepública.
As oposiçÕes, coligadas no plano nacional e regional, fortalece
ram os laços que uniam o PRR a Floriano e ao Exercito, o que, sem
dúvida, contribuiu para avitória de Castilhos no Sul. No início do ano
de 1893, quase imediatamente após a subida de Júlio de Castilhos ao
poder no estado, o Rio Grande foi invadido, pela fronteira de Bage,
por tropas federalistas. Do lado rebelde, destacavam-se importantes
figuras da campanha gaúcha, como o general João Nunes da Silva
Tavares, Joaquim Pedro Salgado, Rafael Cabeda, os coronéis Juca Tigre
e Ulisses Reverbel. Amaior parte desses líderes eram estancieiros e ha
viam ocupado cargos políticos no Império. Alguns poucos, como Rafael
Cabeda, eram comerciantes na fronteira. Os revolucionários contaram
com a presença do Coronel Gumercindo Saraiva, caudilho uruguaio,
e seu irmão Aparício, ambos tendo-se destacado nas lutas contra os re
publicanos. A revolta federalista notabilizou-se pelos atos de violência,
sendo a degola a forma preferida deexecução. Acada ato debarbarismo
cometido contra um dos grupos rivais, o opositor respondia com novas
atrocidades.

Os federalistas (alcunhados de "maragatos") depuseram as ar


mas em 1895, conseguindo do governo a promessa de que seria revista
a constituição, no sentido de que se impedisse a reeleição sucessiva do
presidente do Estado (promessa que não se efetivou). Na etapa que se
seguiu após a luta pelo poder entre as duas facções políticas (republi
canos e federalistas), o PRR consolidou seu domínio no Rio Grande do
Sul. O final do conflito implicou tanto o fortalecimento da máquina
política situacionista quanto a polarização partidária do Rio Grande
do Sul.

A República se achava consolidada, o PRR monopolizava o go


verno. Filiados a um partido extremamente disciplinado e organiza
do, os "coronéis" gaúchos, que ocupavam os principais cargos políti
cos, eram homens de confiança do presidente do Estado. Entretanto,
a Revolução Federalista demonstrara a cisão presente no interior da
classedominante estadual: "maragatos" eram "os de fora", "pica-paus"
eram "os de dentro".
Em 1898, Castilhos passou o governo a Borges de Medeiros, que
herdou uma hierarquizada máquina político-administrativa. Com a
morte de Júlio de Castilhos em 1903, Borges sucedeu-o também na
direção do partido. Apoiando-se nas tradições positivistas, Borges deu
seguimento à obra de Castilhos, consolidando no estado o regime repu
blicano autoritário e centralizado.
Na medida, porém, em que a facção da classe dominante no
governo precisava manter afastada do poder a outra metade da classe
dominante, era necessário manter um equilíbrio exato entre coerção
e consenso. Quanto à coerção, as ligações com o Exército, a Brigada
Militar e os "corpos provisórios", a nível municipal, cumpriam seu pa
pel. Todavia, o PRR não se manteve no poder por 40 anos mediante o
uso exclusivo de coerção. O grupo dirigente necessitava realizar alian
ças com outros setores sociais, a fim de legitimar sua posição hegemô
nica. Assim, o governo borgista era obrigado a atender os variados in
teresses, pois precisava do apoio de segmentos sociais bastante diversos
entre si, como os setores enriquecidos no comércio e na indústria, as
camadas médias urbanas e os pequenos proprietários rurais.
Os anos que se seguiram, até o final da Primeira Guerra Mundial,
foram os melhores momentos do domínio republicano no estado. Nesses
anos, o PRR sofreu menos contestação em âmbito estadual, além de con-

7S f/o *9a/
seguir do governo central autorização para encampar a Viação Férrea e o
Porto de Rio Grande, que passaram para a esfera estadual.
A guerra criou grande demanda para os produtos gaúchos, com
o que se ativaram as exportações estaduais. O período de euforia pelos
bons preços contribuiu para solidificar a imagem de que o "celeiro do
país" saíra de sua crise. Nessa conjuntura, o estado gaúcho agia como
incentivador de melhorias, difundindo novas técnicas, aconselhando,
exortando à união, concedendo incentivos fiscais, apontando cami
nhos. Em suma, realizando a tarefa de facilitar a acumulação privada
de capitais e a realização do desenvolvimento global da economia rio-
-grandense. Todavia, quando se tornava necessário, o governo inter-
vinha diretamente no processo econômico para eliminar o monopólio
estrangeiro, como no caso dos transportes.
À medida que os interesses econômicos da classe dominante es
tadual (situação e oposição) se encontravam satisfeitos, e que o governo
procurava atendê-los, arrefeciam-se as divergências de caráter político.
O período de guerra, evidenciando uma conjuntura ótima de mercado,
foi o que se pode chamar o momento áureo do governo de Borges de
Medeiros, quando menos oposição sofreu.
No plano social, contudo, a situação não se apresentou tão cal
ma. Durante os anos da guerra, ondas de greve agitaram o estado, cul
minando com a greve geral de 1917, que paralisou a capital. O ope
rariado se achava organizado em sindicatos profissionais. Ao lado da
presença de tendências socialistas e anarquistas, registrava-se a atuação
do grupo predominante da época, o anarcossindicalista.
Os anarcossindicalistas lideravamo operariadogaúcho e contro
lavam a Federação Operária do Rio Grande do Sul, fundada em 1906.
Essegrupo considerava a greve uma expressão das reivindicações ope
rárias, que se revelava eficiente para solucionar desajustes existentes
entre o capital e o trabalho. Além de legitimar a greve, os anarcossindi
calistas eram favoráveis a negociações diretas entre patrões e emprega
dos, rejeitando a interferência do governo nessas questões. Além disso,
aconselharam o não engajamento político-partidáriodo operariado. De
certa forma, essa orientação vinha dar legitimidade ao sistema político
excludente, característico não só do Rio Grande do Sul como de todo o
país no período da República Velha.
O Estado positivista, baseado nos princípios de Comte, se dis
punha a "incorporar o proletariado à sociedade moderna", o que, em
última análise, traduzia-se, na prática, em fazê-lo trabalhar para o
progresso econômico de forma ordenada. Considerava também que as
questões que surgissem deveriam ser solucionadas entre patrões e em
pregados. O Estado deveria interferir, como mediador, quando se difi
cultasse o acerto, ou como órgão repressor, quando a segurança fosse
ameaçada. A ideologia positivista no Estado desempenhava o papel de
contornar o conflito social a fim de possibilitar o desenvolvimento de
acumulação privada de capital.
Com relação à greve geralde julho a agosto de 1917, Borges cum
priu um papel de conciliador, impedindo o agravamento do conflito e
intercedendo junto aos industriais para que elevassem os salários dos
operários. Já na greve dos ferroviários, de outubro de 1917, a atitude de
Borges de Medeiros foi de apoio, considerando o movimento legítimo
em suas reivindicações. Agindodessa forma, o governosolidificava seus
argumentos no sentido de que a companhia concessionária estrangeira
que explorava a Viação Férrea operava com deficiência e deveria ser
encampada pelo Estado.
Nas greves de 1918e 1919, contudo, a repressão do governo foi
violenta, na medida em que os movimentos de contestação social, pela
sua amplitude, ameaçavam a ordem vigente. Ao longo de todos esses
anos, nas relações com o centro do país, o Rio Grande continuava na
sua posição periférico-dependente, atuando fundamentalmente como
fornecedor degêneros de subsistência. Adependência econômica gera
va, como resultado inevitável, a dependência política.
O Rio Grande não tinha acesso aos mecanismos decisórios do
poder nacional, não influindo sobre a política econômico-financeira a
ser seguida pelo país. Essa beneficiava especialmente o café, através de
um programa de valorizações e de emissões. Todavia, o Rio Grande
conseguia atenuar o domínio do centro cafeeiro através de uma política
de "barganha". Nos quadros da República Velha, o Rio Grande do Sul

80 f/o SJu/
era o que se considerava um "grande eleitor". Com numerosa bancada
no Congresso, o estado tinha grande peso nas decisões parlamentares;
o que era um trunfo para barganhar atitudes do centro a seu favor.
Além disso, até 1915, a atuação do senador Pinheiro Machado, que
controlava a comissão parlamentar incumbida de reconhecer ou não a
eleição dos membros do Congresso, era outro dado que favorecia o Rio
Grande. Jogando com os interesses das oligarquias. Pinheiro Machado
chegou a controlar as representações dos pequenos estados do nordeste,
fazendo com que votassem segundoos interesses do Rio Grande.
Da mesma forma que o Exército, o Rio Grande do Sul atuava
como um elemento alternativo no jogo de disputa política nacional.
Assim, por exemplo, o Rio Grande do Sul foi capaz de endossar as can
didaturas de Campos Sales e Rodrigues Alves, apoiando as pretensões
paulistas. Entretanto, quando surgiam desentendimentos na aliança
de São Paulo-Minas Gerais, o estado sulino entrava em cena, posicio
nando-se nas eleições disputadas para a Presidência Nacional. Quando
ocorreu a primeira cisão das oligarquias —a "campanha civilista" de
1910 -, o RioGrande do Sul surgiu ligadoa Minas Geraise ao Exército,
apoiando a candidatura de Hermes da Fonseca e posicionando-se con
tra o candidato paulista (Rui Barbosa). Até então, o Rio Grande do Sul
atuava mais como um peso na balança da luta pelo poder. Com sua
economia voltada para o mercado interno, era obrigado a defender o
consumidor nacional, e não os interesses dos grandes exportadores.
Todavia, opor-se completamente à política do café significava
romper com o poder federal. Nesse sentido, a dependência política em
relação ao centro fazia, muitas vezes, o estado periférico apoiar medi
das contráriasa seus interesses para conseguir, em troca dessa solidarie
dade, uma legislação protecionista para seus principais produtos.

r fiftoú J920 e a/

No pós-guerra, a recessão econômica, a rearticulação daeconomia


européia e o recuoda demanda mundial repercutiram negativamente so
bre a economia rio-grandense. Em especial, o início da década de 1920
representou para o estado um momento de crise, externa e interna.
Com relação à pecuária gaúcha, o finai da guerra trouxe um re-
traimentodo consumoeuropeu de carnes exatamente no momento em
que as empresas frigoríficas se achavam operando em larga escala e
a nível mundial. Em conseqüência, os frigoríficos diminuíram a ma
tança e baixaram os preços do gado. No Prata, o refluxo da atividade
de frigorificação determinou uma retomada do abate para o charque,
desalojando o produto gaúcho tanto das praças brasileiras quanto do
mercado cubano.A crise dos frigoríficos estrangeiros e dos charqueado-
res repercutiu sobre os criadores, que ficaram sem condições de colocar
o rebanho.

O Frigorífico Rio-Grandense, inaugurado auspiciosamente em


setembro de 1917, em Pelotas, revelou-se carente de capitais. Sem con
dições de operar em larga escala, em inícios de 1921 foi vendido à firma
inglesa Westey Brothers, que, posteriormente, o poria a funcionar com
o nome de "Frigorífico Anglo".
V

A crise econômica do pós-guerra seguiu-se a crise financeira: de


um períodode inflação e ampla concessão de empréstimos, passou-se à
recessão e ao recuo dos créditos.
O governo, empenhado no seu programa de transportes, havia
conseguido encampar o porto do Rio Grande em 1919 e a Viação Férrea
em 1920, passando ambos para o controle estadual. Para fazê-los fun
cionar a contento, o governo retirou dos bancos os saldos do Tesouro
que lá havia depositado. As casas bancárias, que haviam distribuído
esse dinheiro aos criadores para que, no período de guerra, investissem
em melhoramentos para a criação, determinarama imediata devolução
desse capital num prazo de 90 dias. Sem ter para quem vender seus
gados e tendo de pagar, num momento de crise, empréstimos contraí
dos em momentos de euforia, muitos criadores foram à falência. Sem
condições de solucionarem seus problemas, os estancieiros voltaram-se
para o governo do estadual pedindo medidas de defesa para a pecuária.
Borges, contudo, não abriu mão de sua política de solucionar a "ques
tão dos transportes" no estado. Apesar de se encontrar com os cofres
cheios, em virtude de um empréstimo contraído com banqueiros de
Nova York para fazer frente ao problema dos transportes, o presidente

S2 fl€y PJíic f/o


do estado não emprestou aos criadores. Ofereceu-se, contudo, para ser
o intermediário e o advogado de suas pretensões ao presidente do país,
numa petição endereçada ao Congresso pelos criadores.
Entretanto, externamente, ou seja, nassuas relações com o poder
central, processou-se o agravamento das condições de dependência do
Rio Grande. A partir da terceira operação valorizadora do café em 1921,
o grupo cafeicultor impôs sobre o restante da nação o ônus da política
de sustentação do produto. Isso implicava que, para que o principal
artigo de exportação do país fosse defendidoe tivesse colocação no mer
cado a bom preço, toda a nação contribuiria. Coerentemente, a oposi
ção gaúcha apoia Bernardes, negando-se a votar em Nilo Peçanha, o
candidato apoiado pelo PRR. Todavia, o Rio Grande foi vencido nas
urnas com as oligarquias estaduais dissidentes, ascendendo ao poder o
mineiro Artur Bernardes, apoiado pelo grupo cafeeiro. A oposição gaú
cha havia-se colocado ao lado de Bernardes, posicionando-se contra o
situacionismo rio-grandense que apoiava Nilo Peçanha.
No plano estadual, a impossibilidade de o governo contornar a
crise econômica fez com que a parcela da classe dominante fora do po
der considerasse insuportável o domínio republicano no estado. Assim,
passaram a exigir do governo Borges de Medeiros que se empenhasse
numa política de defesa exclusiva da pecuária. Nesse momento de cri
se, Borges optou pela continuidade da política econômica de "desen
volvimento global" da economia gaúcha. Rapidamente a crise extra
polou os limites do econômico e alcançou o plano político. A parcela
oposicionista da classe dominante arregimentou-se sob a liderança de
Assis Brasil e foi às armas na Revolução de 1923.
Os pecuaristas de oposição exigiam do estado um posicionamen
to de classe: se a pecuária era o setor predominante no Rio Grande e se
encontrava em crise, o governo deveria primordialmente socorrê-los.
Queriam de Borges, fundamentalmente, uma política de salvação da
pecuária, e só a incapacidade de visualização de todo o processo vivido
fez pensar que, por uma mudança de homens, pudesse sersolucionada
a questão de uma pecuária descapitalizada.
O movimento de oposição reuniu republicanos dissidentes e anti
gos federalistas, que formavam a Aliança Libertadora. A nível político, o
processo revolucionário expressava duas formas diferentes de condução
da máquina política estadual: uma, libertadora, pugnando pelo libera
lismo e democracia; outra, dos "chimangos" (partidários de Borges de
Medeiros), defendendo formas centralizadoras e autoridades do governo.
Os episódios relacionados com a eleição estadual de 1922 preci
pitaram a eclosão dos incidentes revolucionários. Borges candidatou-se
ao seu 5® mandato para a Presidência do Rio Grande, ao que a oposição
revidou com a indicação do nome de Assis Brasil.
Entretanto, como já se podia prever, as urnas deram a vitória à
situação. Inconformados, os oposicionistasalegaram fraude e tomaram
em armas contra o governo estadual, através de uma série de levan
tes regionais. Os rebeldes acalentavam a esperança de uma interven
ção federal no estado a seu favor, uma vez que Borges, nas eleições de
1921, havia negado apoio ao candidato do governo para a Presidência
da República. Os rebeldes não apenas exigiram a derrubada de Borges
do poder como também a revisãoda constituição estadual de inspiração
positivista que permitia as reeleições consecutivas do governante.
Os combates realizados deram projeção a toda uma nova gera
ção de republicanos que começaram a surgir com maior força no ce
nário político, como José Antônio Flores da Cunha, Osvaldo Aranha,
Getúlio Vargas, Firmino Paim Filho. Do lado federalista, ressaltou a
figura de Batista Luzardo.
Em vez de realizar uma intervenção federal no Rio Grande —
para o que pesava muito o apoio que os gaúchos poderiam lhe dar no
Congresso—, o presidente Bernardes optou por enviar ao Sul o general
Setembrino de Carvalho como mediador.
O movimento acabou num acordo entre os detentores do poder e
os de fora dele. Pelo Pacto das Pedras Altas, em dezembro de 1923, ficou
estabelecido que seria revisada a constituição positivista e que Borges,
uma vez completado seu quinto mandato, não mais se reelegeria.
A conjuntura depressiva do pós-guerra colheu a pecuária em cri
se, mas não toda a economia gaúcha. O surto arrozeiro, desencadeado
a partir da Primeira Guerra, tomara novo impulso. Em 1920, o produto
atingia o terceiro lugar na pauta das exportações do Estado. Isso de-

84^ fl(y f/o


monstra que a economia estadual começava a diversificar-se, apresen
tando alguns setores novos em expansão, do que resuitavam não ape
nas recursos financeiros como também apoio político para o governo.
A conjuntura favorável do arroz estendeu-se até 1924, quando re
duziram-se as vendas do produto gaúcho no Prata em virtude da concor
rência dos produtos paulistas e italianos que atingiam o mercado consu
midor em condições mais favoráveis. A safra colossalde 1926veio agravar
ainda mais a crise ao provocar a baixa do preço do produto no mercado.
Com relação à indústria, a década de 1920 assistiu à concentra
ção empresarial no Rio Grande do Sul. No período de recessão que se
seguiu, fecharam-se as pequenas indústrias, absorvidas pelas maiores
empresas. Paralelamente a esse processo, as indústrias que subsistiram
aplicaram em modernização os lucros obtidos no período de guerra. O
aumento de capital das empresas pode ser apreciado através da intensi
ficação do uso de tecnologia.
Por outro lado, acirrou-se a competição entre as empresas, na
disputa do mercado nacional e regional. Nesse momento é que fi
cou evidente a capacidade de concorrência da economia paulista. São
Paulo, no decorrer da década de 1920, tivera um crescimento indus
trial acelerado, evidenciando uma maior capacidade de acumulação e
distanciando-se dos demais estados. No Rio Grande do Sul, por exem
plo, os tecidosde lã da indústria Renner encontravamdificuldades para
ampliar seu mercado fora do estado.
Com relação à lavoura colonial, a década de 1920 anunciou tanto
o fim da conjuntura favorável de mercado quanto o esgotamento das
terras disponíveis para agricultura. Nesse momento, os fatores de crise
evidenciados no período pré-guerra acentuaram-se. O final dos "anos
vinte" assinalou, no Rio Grande, um florescimento do espírito associa
tivo, através do qual os produtores procuravam encaminhar e resolver
problemasnão superados. Borges de Medeiros, que vivenciava seu últi
mo mandato presidencial, deu força ao movimento.
O governo estadual, ao apoiar o movimento de sindicalização
dos produtores, procurava defender os setores que, de um lado, tinham
condições de acumular capital e, de outro, serviam como importante
base de apoio político.
Embora cada sindicato apresentasse particularidades de cada se
tor, de um modo geral essas entidades se notabilizaram por serem con
troladas pelos comerciantes e grandes produtores, o Sindicato Arrozeiro
era controlado pelos donos de engenho e grandes comerciantes, todos
interessados em aumentar a exportação do produto. O Sindicato da
Banha, que na teoria se propunha a agregar todos os produtores e refi-
nadores do estado, era, na verdade, controlado pelos comerciantes ex
portadores. O Sindicato do Vinho era formado, basicamente, pelos
grandes exportadores, que se colocavam como os únicos compradores
do produto dos colonos italianos. Mesmo o Sindicato dos Charqueadores,
que agrupava os produtores do artigo interessados na eliminação dos
intermediários (comerciantes) para a venda do seu artigo, não deixou
de abrigar comerciantes. Além disso, alguns membros do Sindicato
tornaram-se os maiores exportadores de charque do estado, com preju
ízo para as demais casas comerciais.

Incidentes de fraude eleitoral e violência polftlca


relatados ao Governador do Rio Grande do Sul, 1913-27.
15T
Revolução
de 1923

Figura 4. Incidentes de fraude eleitoral e violênciapolítica relatados ao governador


do Rio Grande do Sul (1913-1927)
Fonte: Joseph Love. O regionalismogaúcho. São Paulo, Perspectiva, 1975.

se f/o /^/lify ^ÍHforu/e^ f/^M


Com o fim do longo governo de Borges, ascendeu ao poder, em
1828, Getúiio Vargas, da segunda geração de republicanos no estado.
Vargas empreendeu uma política orientada para o atendimento
direto e imediato dos interesses dos produtores estaduais. Em especial,
sua política orientou-se para a salvação da pecuária gaúcha. Criou o
Banco do Estado do Rio Grande do Sul, que concedeu aos pecuaristas
crédito fácil, a juro baixo e prazo longo; conseguiu a redução das tarifas
ferroviárias; coibiu o contrabando de charque pelo Uruguai e apoiou o
renascimento da idéia de criar um frigorífico nacional.
Uma vez atendidos os interesses de ambas as facções políticas
da classe dominante estadual, tornou-se mais fácil uni-las, o que se
concretizou na formação da Frente Única Rio-Grandense em 1928. A
Frente Única reunia no estado o PRR e o Partido Libertador, fruto,
este último, da antiga Aliança Libertadora que fora às armas contra
Borges de Medeiros na Revolução de 23. O atendimento pelo governo
aos interesses econômicos da classe dominante atenuou, em parte, o
antigo problema da não circulação do poder político no interior daque
la classe.

Com relação ao envolvimento do Rio Grande do Sul na política


nacional, a união entre as duas facções políticas gaúchas preparou o
caminho para a "Aliança Liberal". Unidos politicamente, os rio-gran-
denses lideraram a dissidência oligárquica que se opôs ao governo cen
tral nas eleições sucessórias de Washington Luís. Wncidos nas urnas,
os integrantes da Aliança Liberal foram às armas, na Revolução de 30,
depondo o presidente paulista e inaugurando um novo período na
História do Brasil.
Qo Quadro-resumo III

Brasil! íÜxí; Grahdle SM


Governo Provisório:
Deodoro da Fonseca
Expansão colonial:
(presidente) e Floriano Sucessão de governos militares: Pelotas, Frota e Costa.
disputas imperialistas
Peixoto (vice-presidente). Eleições para a Constituinte: PRR concorre sozinho.
na Ásia e África;
1890 Eleições para a Constituinte Primeira oposição organizada ao PRR: União Nacional
acordos coloniais entre a
Federal. Política econômica (UN).
Inglaterra,Alemanha e
encilhamentista: emissão, Surto industrial no estado.
França.
ampliaçãodo crédito,
protecionismo alfandegário.
Promulgada a U Demissão do gen. Costa: assume o vice-presidente Fernando
Constituição republicana Abbott.
do Brasil (fev.). UN transforma-se em Partido Republicano Federal (PRF).
i; Eleições para Constituinte Estadual: só são eleitos
EUA: maior comprador Tratado Brasil/Estados deputados do PRR.
do café brasileiro. Unidos: café x trigo, cereais Instalação da Assembléia Constituinte Estadual e aprovação
1891 Inglaterra: era vitoriana. banha, manufaturados. da Constituição de 14de julho, de inspiração positivista.
Encíclica Rerum Júlio de Castilhos eleito presidente do Estado.
Novarum Deodoro decreta o RS posiciona-se contra o Tratado Brasil/Estados Unidos.
fechamento do Congresso; Castilhos apoia o golpede Deodoro; deposto pela oposição.
renúncia de Deodoro e sua Instala-se o "governicho": Assis Brasil, Barreto Leite e
substituição por Floriano Barros Cassai.
Peixoto. Expansão industrial: Neugebauer, Cia. Fiação e Tecidos PA.
Pliaiio Iriitêrnádím^ M^SMnÍte'(dÍQjSM!
í
Volta de Gaspar SilveiraMartins
do exílio: formação do Partido
Federalista Brasileiro (PFB) em Bagé;
1892 deixa de existir o PRR
r
Continuidade da expansão
V
manufatureira: calçados,farinha,
chapéus,confecções, papel, papelão.

Volta de Júliode Castilhos ao poder.


Crise econômica nos Queda do preço do café. Política emissionista Eclosão da Revolução Federalistano
Estados Unidos, principal leva à desvalorização da moeda brasileira; RS contra o governo de Castilhos.
1893
consumidor do café inflação. Eclosão da Revolta da Armada contra União da Revolta da Armada com a
brasileiro. o governo de Floriano Peixoto. Federalista.
Perturbações na economia pecuária.

Itália invade a Abissínia.


Guerra na China; os
japoneses invadem a
Coréia.
1894 Sobe ao poder Prudente de Morais. Forma-se a Cervejaria Ritter e Filhos.
Acordo Rússia-França;
prenúncio da Tríplice
Entente.
M-õ;©Eâja.díÊ Éõ;SwÍÍ

Final da Revolta da Armada e Revolução


Ataque ao arraial de Federalista.
1895
Canudos, na Bahia. Consolida-se no sul o domínio do PRR;
burocratização do partido.

Destruição de Canudos.
1897 Crise de superprodução do
café.

Campos Sales presidente Borges de Medeiros sucede Júlio de Castilhos na


da República. Presidência do Estado.
Senador Pinheiro Machado representa no
Guerra entre Espanha e
% Acerto do 1° "funding Congresso a expansão do poder no RS; Castilhos
1898 Estados Unidos.
I loan"; início da política chefe do PRR.
Independência de Cuba.
de recuperação da moeda Expansão da lavoura colonial.
brasileira (valorização do Forma-se a associação rural no Estado, em
mil réis). Pelotas: Sociedade Agrícola e Pastoril do RS.
Fltop 'MtM#iáQíiií ^

Lutas dos "bõers" com os Início da "política dos governadores";


1900 Otero Gomes (refinaria de banha).
ingleses naÁfrica. desenvolvimento do coronelismo.

Fim da era vitoriana: morte


1901 João Gerdau (fábrica de pregos).
da rainha Vitória.

Theodore Roosevelt,
1902
Ascensãode Rodrigues Alves à
presidente dos Estados
Unidos.
Presidênciada República.

1903 Morte de Júlio de Castilhos. Borges de


Medeiros assume a chefia do PRR.

Guerra russo-japonesa. Desenvolvimento das usinas de açúcarno Governo do Estado introduzo imposto
1904 "Entente Cordiale": França- nordeste, da borracha na Amazônia e do territorial.
Inglaterra. cacau na Bahia. Firma JoãoWallig (camas e fogões).

Arrendamento da rede ferroviária federal


1905 no estado para a Cia. Auxiliaire des
Chemins du Fer au Brèsil.
Plano Internacional Rio Grande do Sul

Assinatura do Convênio de Taubaté


(política de valorização do café)
Criação do Banco Pelotense.
(março).
Início da expansão da lavoura do
Acordode Algeciras para resolver a Ascensão de Afonso Pena à Presidência
arroz na zona de Cachoeira.
1906 questão do Marrocos entre França (nov.).
Greve operária; criação da
e Alemanha. Início da política do "cafécom leite".
Federação Operária do RS
Minas progressivamente volta-se para a
(FORGS).
economia de subsistência, em face das
crises do café.

Eleições disputadas para a


sucessão de Borges de Medeiros.
Cia. Swift se estabelece na
Carlos Barbosa (PRR) vence
Argentina com um frigorífico.
i; 1907 Fernando Abbott (R Republicano
Acordo Inglaterra e Rússia: início
Democrático).
da Tríplice Entente.
Bloco Acadêmico Castilhista apoia
o PRR.

Criadores promovem congressos e


r Morte de Afonso Pena; assume o vice-
1909 debatem os principais problemas
presidente Nilo Peçanha.
da pecuária sulina.
PiaiíiblMíem
r RS apoia a candidatura de Hermes da Fonseca
Campanha "civilista" para a
Queda da monarquia em
¥ sucessão presidencial: Rui Barbosa x e seu programa de estabilização econômica e
1910 Portugal.
Hermes da Fonseca. orçamento equilibrado.
Revolução no México.
Vitória de Hermes. Crise da economia colonial imigrante.
Cia. Swift se estabelece no
Ligação ferroviária entre o RS e SP
Uruguai com um frigorífico.
1911 Revolta da Chibata. Início do movimento cooperativista dos
1^ Estados Unidos invadem a
pequenos produtores na zona colonial italiana.
Nicarágua.
Fábrica de tecidos de lã A. J. Renner, em Caí, e
de fiação em Porto Alegre.
Início das Guerras
1912 Forma-se a União dos Criadores, que leva
Balcânicas.
adiante a campanha de reerguimento da
pecuária gaúcha.
É proposta e vetada a candidatura de Pinheiro
Machado à Presidência da República.
Fim do movimento cooperativista na zona
1913
colonial italiana.
Borges estabelece o Plano de Viação Geral do
Estado.
5?
Mano íiitiernacibnal Rio Grándiç db Sul
Recuperação da lavoura colonial; aumento dospreços e
Eleição de incremento das vendas para o país e exterior.
Venceslau Brás para Expansão da lavoura arrozeira; conquista do mercado
Eclosão da Primeira Guerra a Presidência da nacional e platino.
Mundial. República. Elevação do preço da carne.
1914
Aumento da demanda mundial Expansão industrial. União dos Criadores,com o apoio do governo estadual,
de gêneros alimentícios. Emissão de mil-réis lança-se na campanha de formação de um frigorífico com
para auxiliar o café. capital local.
Inflação. Nova expansão industrial: desenvolvimento das fábricas de
banha, vinho, cerveja e têxteis.
Assassinato de Pinheiro Machado.
Potências aliadas concentram
Debates em torno da criação do frigorífico nacional.
sua luta contra a Alemanha.
1915 Assume no governo do estado o vice-presidente Salvador
Estados Unidos ocupam o
AiresPinheiro Machado, em função do afastamento de
Haiti.
Borges pormotivos de saúde.
Estados Unidos invadem São
1916
Domingos.
Revolução Russa.
Borges retorna à Presidência do Estado.
Início da guerra submarina; Segunda valorização
Alemanha desencadeia a
Greve geral de Porto Alegre; greve da Viação Férrea.
do café: acordo do
ofensiva.
Inauguração do Frigorífico Rio-Grandense, em Pelotas,
governo paulista
1917 com capital local.
Estados Unidos rompem com a com o governo
Alemanha.
Swift e Armour, empresas norte-americanas, fundam
federal, que emite
Fuzileiros norte-americanos
frigoríficos no Estado.
para auxiliar o café.
ocupam Cuba. O charque brasileiro penetra no mercado cubano.
|5 ifelgíli

Fim da Primeira Guerra Empresa norte-americana Wilson se instala no estado


¥ Mundial. para operar em frigorificação de carnes.
í Fundação da Liga das Nações;
assinatura do Tratado de
Epitácio Pessoa O RS indica o nome de Epitácio Pessoa à Presidência.
Versalhes.
1919 na Presidência da Borges encampa o porto de Rio Grande.
Início da III Internacional.
República. Greves operárias.
Início da República de Weimar
na Alemanha.

Encampação da Viação Férrea pelogoverno do estado.


1920
Início da crise econômico/financeira do pós-guerra;
recuo do abate e das vendas das charqueadas e
frigoríficos; crise bancária.
Oi Rio Grande do Sul
Plano Iriternaçional
Crise política: o episódio das
Venda do Frigorífico Rio-Grandense para o
"cartas falsas".
grupo inglês Vestey Brothers.
Terceiraoperação valorizadora do
Crise da pecuária gaúcha.
1921 café.
Governo estadual nega-se a realizar uma
Adoção da política de valorização
política exclusiva para a pecuária, insistindo
do café associada à desvalorização
em dar prioridade à questão dos transportes.
da moeda.
Segunda cisão das oligarquias;
reação republicana; Artur
Bernardes x Nilo Peçanha. RS apoia Nilo Peçanha (programa de
Ascensão de Bernardes à estabilização econômica, orçamento
Desenvolvimento do fascismo
1922 Presidência. equilibrado).
na Itália; Mussolini no poder.
Semana de Arte Moderna. Precipita-se a crise da pecuária no Estado.
Eclosão do movimento tenentista Expansão do arroz.
(RJ).
I- Fundação do Partido Comunista.
Eleições disputadas na sucessão estadual;
Golpe de estado de Primo de Borges de Medeiros obtém vitória sobre Assis
íS
Rivera na Espanha. Brasil,candidato da Aliança Libertadora.
1923
Hitler tenta o "Putsch" de Criseeconômico-fmanceira degenera em crise
Munique. política: eclosão da Revolução de 23.
Dezembro: assinatura da paz em PedrasAltas.
I Bernardes: retorno à política deflacionária
¥ Levante tenentista; ligação dos revoltosos
federal.
1924 Morte de Lenin. com os opositores de Borges no estado.
r Eclosão de novo movimento tenentista (SP)
Surgimento da Cervejaria Continental.
contra o governo de Bernardes.
Crise na pecuária: paralisação de
Criação do Instituto do Café de São Paulo,
frigoríficos, redução do abate nas
que mantém a políticade defesa do produto
charqueadas.
em nível estadual.
Ascensão de Washington Luís à Presidência Superprodução do arroz: formação do
1926
Sindicato Arrozeiro.
do Brasil.
Criação do Partido Democrático em São
Levante tenentista, associado à Aliança
Libertadora.
Paulo.
Borges aceita a política do "café com leite"
Coluna Prestes em marcha pelo interiordo
Brasil.
e endossa a candidaturade Washington
Luís.
íe
Qc Rio Grande do Sül
M^aíno Internacm

Oposição paulista (Partido Formação da Federação das Associações Rurais do Rio


Democrático) e gaúcha
Itália: "Carta dei Grande do Sul (FARSUL) e do Sindicato do Vinho.
1927 (Aliança Libertadora) formam Getúlio Vargas ocupa o cargo deministro daFazenda,
Lavoro" de Mussolini.
o Partido Democrático
de Washington Luís.
Nacional.

Getúlio Vargas sucede a Borges de Medeiros na


Presidência do estado.
Ascensão de Hoover nos Política de defesa do setor agropecuarista; criação do
Articulações em torno do
Estados Unidos. Banco do Rio Grande do Sul; formação do Sindicato
problema sucessório.
1928 Início da Guerra do Continuidade da política dos Charqueadores e do Sindicato da Banha.
Chaco: Paraguai x Fundaçãodo Partido Libertador.
federal deflacionista.
Bolívia.
Unificação política interna: formação da Frente Única
Rio-Grandense.
Superprodução do café.
Governo Federal nega crédito
ao Instituto do Café.
Crise da Bolsa de Nova
Colapso financeiro.
York.
1929 Articulação da Aliança Liberal
Recuo do crédito
(RS, MG e PB) em favor
mundial.
da candidatura de Getúlio
Vargas - João Pessoa para a
presidência.

teteíia^oííà®
Vitória do candidatosituacionista,
¥ Júlio Prestes, na disputa eleitoral pela
Presidência.

Aumento do poderio do partidonazista. Articulações entreas oligarquias dissidentes


1930 e os tenentes.
Formação do Centro da
"Grande Depressão" nos Estados Indústria Fabril do Rio
Unidos.
Assassinato de João Pessoa desencadeia a
Grande.
revolução; deposição deWashington Luís
(3/10).
Forma-se a Junta Militar Pacificadora, que
entrega o poder a Getúlio Vargas (3/11).
IV
0 êRdcy ^ó^-30

fpú/- e/e 30

^/7 Revolução de 30 éproduto, por um lado, da falência do mode-


Io agroexportador enquanto forma de acumulação de capital e,
por outro, da reação das oligarquias periféricas que, associadas a insa
tisfação das camadas médias urbanas e ao Exercito, puseram em xeque
a hegemonia do grupo cafeeiro.
Aoligarquia cafeicultora, no decorrer da Republica \felha, ligara a
sobrevivência deprincipal produto de exportação brasileiro as emissões
ou ao financiamento externo. Tanto uma pratica quanto outra tinham
como contrapartida a intensificação das condições de dependência da
economia brasileira e a alta do custo de vida. Com isso, agravavam-se
3s condições de sobrevivência das camadas urbanas eviam-se prejudi
cadas aquelas economias regionais voltadas para o abastecimento in
terno do país. Em suma, para que ocafe fosse vendido esustentado seu
preço, anação inteira pagava. Aliás, oproprio poder de acumulação do
grupo cafeicultor —e, consequentemente, do pais —via-se diminuído,
na medida em que o capital estrangeiro que sustentava oproduto con
sumia os maiores lucros. No plano político, e que se manifestava esse
desajuste da infraestrutura brasileira, pois os cafeicultores monopoliza
vam os centros decisórios de poder e ditavam a política a ser seguida.
A partir dessa perspectiva é que se pode entender a articulação
das oligarquias periféricas —Rio Grande, Minas Gerais e Paraíba —na
coalizão que levou o nome deAliança Liberal. Adissidência partiu jus
tamente daqueles grupos oligárquicos desvinculados da agroexporta-
ção: o Rio Grande, tradicional "celeiro do país", Minas, que progressi
vamente abandonava o café e passava para a economia de subsistência,
e a Paraíba, cujos produtos básicos (açúcar e algodão) destinavam-se
agora ao mercado interno.
A Aliança Liberai articulou-se contra a monopolização do poder
por São Paulo. Os aliancistas identificavam o voto a descoberto —"a
cabresto" —como responsável pelas fraudes eleitorais que ocorriam.
As reivindicações de participação política por parte das oligarquias re
gionais articularam-se com o descontentamento dos setores médios,
que viam num jogo político partidário excludente e num mecanismo
eleitoral fraudulento as razões de sua marginalização. Paralelamente,
a ala jovem do Exército, inconformada com o regime, já vinha se pro
nunciando em movimentos de rebelião ao longo da década de 1920. O
suporte dado pelo tenentismo ao movimento dotou a dissidência oli-
gárquica de meios efetivos de dar o golpe, uma vez evidenciado que
não tinha condições de assumir o poder através dos processos eleitorais
vigentes.
Nas eleições para a sucessão de Washington Luís, defrontaram-
-se Getúlio Vargas, pela Aliança Liberal, e Júlio Prestes, apoiado pela
situação presidencial. Funcionando o sistema eleitoral vigente, as urnas
deram a vitória ao candidatodo governo.
No Rio Grande do Sul a unificação política interna que se dera
em 1928, com a formação da Frente Única Rio-grandense, foi o ins
trumento que possibilitou à oligarquia regional participar da articula
ção contra o regime. Verdadeiro polo da dissidência oligárquica, o Rio
Grande assumiu um papel fundamental no movimento, opondo-se à
dominação exercida, pela agroexportação no país.
Ante a vitória de Júlio Prestes, a conspiração tramou-se com o
objetivo de derrubar o governo pelas urnas. O incidente que, contudo,
serviu como elemento catalizador da revolta foi o assassinato do políti
co paraibano João Pessoa. Na medida em que Washington Luís apoia
ra, na Paraíba, o grupo político ao qual se achava ligado o assassino, o
episódio precipitou o movimento contra o governo, que eclodiu a 3 de
outubro.

Dos três estadosaliancistas partiram grupos armados em direção


ao Rio de Janeiro, onde um grupo de generais, chefiados pelo chefe do
Estado-Maior do Exército, gen. TassoFragoso, depôs Washington Luís.
Formou-se uma Junta Militar, que a 3 de novembro entregou o poder
para Getúlio Vargas, que assumiu como chefe do Governo Provisório.
Vitoriosa a Revolução, iniciou-se o período da chamada
República Nova, que se estendeu até 1937, quando se instalou a dita
dura no país.
No plano geral da economia brasileira, a falência do desenvolvi
mento capitalista baseado na agroexportação implicou a busca da reor-
denação do sistema produtivo.
O novo governo teve de enfrentar, em caráter de emergência,
os problemas que afetavam a economia brasileira. A crise do café não
representava apenas uma conjuntura de superprodução do principal
produto do país. Revelava, fundamentalmente, a falência de todo um
modelo de desenvolvimento do capitalismo baseado na agroexporta
ção. A crise de 1929, atingindo em cheio a economia brasileira, veio
demonstrar a necessidade de reordenação do sistema produtivo nacio
nal. Era preciso que se eliminasse a dependência quase que absoluta,
de toda a economia do país, de um só produto de exportação. Isso não
queria dizer que o café não merecesse mais atenção, pois continuava
a ser o principal produto, sustentáculo do país. Entretanto, ao lado da
continuidade de uma política de proteção ao café, o governo pós-30
teve de auxiliar também a produção das economias periféricas, também
afetadas pela crise de 1929.
Do conjunto de medidas emergenciais dogoverno, resultou uma
relativa diversificação da economia brasileira. Eranecessário, dentro de
uma conjuntura depressiva, que o Brasil continuasse a exportar —mas
não mais sóo café - para que sepudessem adquirirdivisas paraimpor
tar. Foi incentivada a produção de outros gêneros como o algodão, que
adquiriu importância nas exportações brasileiras.
Aos poucos, ao longo da República Nova, a indústria foi-se im
pondo como a nova forma de acumulação que nortearia o desenvolvi
mento do capitalismo no Brasil. Enquanto que, no plano econômico,
o país atravessava esse importante momento de transição, entrava em
falência a estrutura de poder oligárquico, tal como se achava compre
endida nos marcos da República Velha. A oligarquia cafeicultora fora
derrubada do poder e sua hegemonia contestada sem que, contudo,
qualquer das elites agrárias pudesse substituí-la no poder. Da mesma
forma, a burguesia industrial ainda não se achava suficientemente or
ganizada, coesa e forte para que pudesse tomar o poder. Igualmente
não havia condições objetivas que permitissem uma maior tomada de
posição dos setores médios internos.
Se, portanto, nenhuma classe social se encontrava em condições
de ocupar a posição hegemônica dos cafeicultores paulistas, os interes
ses básicos a preservar continuavam a ser aqueles identificados com
os setores que acumulavam capital. Em certa medida, o Estado que
se constituiu no pós-30 representou uma forma de compromisso ou
coalisão entre as diferentes frações da burguesia nacional (agrária, co
mercial, industrial, financeira).
Formou-se uma elite dirigente, composta por elementos da bur
guesia agrária não exportadora em coalizãocom segmentos médios ur
banos. Ocupando o centro da estrutura do poder, passou a governar
em defesa dos interesses da burguesia como um todo, bem como da
continuidade do processo de desenvolvimento do capitalismo no país.
No decorrer da República Nova, o Rio Grande do Sul ocupava a
posição periférico-dependente mais importante do país. Desde o ponto
de vistada oligarquia gaúcha, contudo, a sua participação na Revolução
de 30e a ascensão de um gaúcho ao posto mais altodo paísdeveria, for
çosamente, implicar a orientação da política nacional em favor do Rio
Grande do Sul. Em suma, para setores da classe dominante regional,
os gaúchos deveriam alçar-se na posição outrora ocupada pelos paulis
tas. Inconformados com a não realização de suas pretensões, parte dos
pecuaristasgaúchos iria se voltar contra o poder central, unindo-se aos
paulistas num movimento contrarrevolucionário em 1932.

f^930-^937j
Na República Nova, o Rio Grande do Sul manteve um tipo de
desenvolvimento baseado na agropecuária. A mesma classe continuou
no poder, e a problemática básica do Rio Grande pós-30 foi encontrar
saídas para a crise da agropecuária gaúcha.
o governo central, nascido a partir de 1930, procurava de todas
as maneiras resolver os problemas das regiões econômicas periféricas,
desde que os interesses destas não entrassem em contradição com os
"objetivos mais gerais" do país como um todo. Esses objetivos eram
fundamentalmente dois: a integração do mercado pela articulação das
economias regionais e a diversificação da estrutura produtiva da nação.
Ambos, em última instância, se resumiam em um único: garantir a
continuidade do processo de acumulação capitalista no país.
Dentro desse contexto, o governo da União via o Rio Grande do
Sul como destinado a complementar a economia central em seu papel
de fornecedor de gêneros de subsistência para o mercado consumidor
nacional. Nesse sentido, a manutenção da estrutura agropecuária es
tadual ia ao encontro dos interesses do governo central, com o que se
coadunavam as duas perspectivas (a do centro e a regional). Todavia,
o esquema de dependência econômica que tal integração e comple
mentaridade pressupunham não era claramente percebido pela classe
dominante local.
O charque continuava a ser o principal produtosulino de expor
tação, mas seu sindicatonão conseguia impedira oscilação do preço do
produto num mercado interno extremamente competitivo. Os frigorí
ficos estrangeiros estabelecidos no estado também haviam concentrado
parte de suas atividades no charque, enquanto que seus congêneres
estabelecidos no Prata concentravam atividades na frigorificação.
Em pouco tempo se tornariam evidentes, mais uma vez, as di
vergências de interesses entre os pecuaristas sulinos e o governo cen
tral. Por exemplo, enquanto os charqueadores solicitavam a redução
das taxas de importação sobre o sal de Cádiz, a administração central
procurava forçar o consumo do sal nacional proveniente do Rio Grande
do Norte. Por outro lado, enquanto os charqueadores continuavam in
teressados em manter afastados do mercado os produtos uruguaios, o
governo central assinava o Tratado de Livre-Câmbio com o país vizi
nho. A argumentação a favor desse tratado procurava acentuar que o
mesmo destinava-se a incentivar o comércio entre as duas nações e pro-

"JOS
porcionar, pela entrada do produto estrangeiro a baixo preço, alimento
barato para o consumidor nacional.
Apesar dessas divergências com o centro do país, o governo da
União deu seu apoio à iniciativa dos criadores gaúchos que retornaram
à idéia de frigorificação das carnes. A idéia tinha um cunho nacionalis
ta, na medida em que se propunha a eliminar as manobras baixistas dos
frigoríficos estrangeiros no estado. Por outro lado, o frigorífico nacional
era uma "indústria natural", que utilizaria matéria-prima local e que,
portanto, devia ser incentivada.
Paralelamente a esse movimento de renovação da pecuária, di-
fiindia-se, aos poucos, no estado, a idéia de que a agricultura era mais
rendosa que a pecuária, propiciando maior rendimento. Ao lado do
arroz, desenvolvia-se no estado a cultura do trigo, da cebola, das frutas
de sobremesa e do milho, este último associado à suinocultura como
ração. Apesar desse desenvolvimento, o arroz enfrentou no imediato
pós-30 uma queda de preços, tal como os produtos pecuários, acompa
nhada de acentuação da concorrência no mercado.
Flores da Cunha, interventor federal no estado, concedeu em
préstimos aos setores da agropecuária atingidos pela crise. No que diz
respeito à indústria, o maior apoio do governo foi dado para aquelas
que eram consideradas "naturais", por beneficiarem matéria-prima
local: vinho, banha, conservas de frutas, óleos vegetais, produtos têx
teis, farinha de trigo etc. Os industriais achavam-se, já, organizados
no Centro da Indústria Fabril do Rio Grande do Sul, que reunia as
maiores empresas do estado e que objetivava tanto possibilitar o maior
crescimento industrial quanto harmonizar as relações entre patrões e
operários. Além disso, o centro buscava entrosar mais a classe empresa
rialcomos poderes públicos, ampliando a sua participação no governo.
Atendendo às reivindicações do centro, o governo estadual isentou do
pagamento de impostos muitos produtos industriais, beneficiando o
setor.

Embora pudesse haver concordância entre os governos federal


e estadual quanto à necessidade de integração do Rio Grande do Sul
no mercado nacional, parte da classe dominante local não aceitou as

"JOG *yfiA/ória/(/ya í!/lio


medidas centralizadoras postas em prática pelo executivo federal no
pós-30. Na realidade, o atendimento aos problemas econômicos das
regiões periféricas por parte do governo central tinha como contrapar
tida a submissão política das oligarquias regionais. Entretanto, parcela
dos pecuaristas gaúchos tinha pretensão à hegemonia política do país
ou desejava, no pior dos casos, resguardar a independência do poder da
oligarquia regional frente ao centro.
Essa "ala regionalista" da classe dominante gaúcha, na qual
se achavam nomes como Assis Brasil, Borges de Medeiros e Batista
Luzardo, apoiou as exigências de rápida constitucionalização do país
feitas pelo grupo paulista, que fora derrubado do poder. Essa diver
gência teve como efeito cindir a oligarquia gaúcha, ficando uma ala
contra o governo central e aliada a São Paulo, e outra, liderada pelo in
terventor Flores da Cunha, mantendo seu apoio à Vargas. A Revolução
Constitucionalista de 1932 findou com a vitória de Vargas sobre as for
ças de oposição gaúcha e paulista.
Pacificado o Rio Grande, Flores da Cunha organizou, em no
vembro de 1932, um novo partido, o Partido Republicano Liberal
(PRL), que se tornou o porta-voz, a nível político-partidário, da cor
rente da oligarquia gaúcha que ficara ao lado de Vargas. O PRL acei
tava a tutela do centro, que era entendida como "colaboração", e não
"subordinação". Identificava-se com as diretrizes impostas à economia
brasileira porVargas, sendo o Rio Grande concebido como cooperador
do progresso nacional". O PRL tinha para o âmbito regional um pro
grama reformista, que buscava desenvolver economicamente o estado,
amparando a produção, incentivando asexportações e integrando o Rio
Grande ao mercado nacional. Foi formado, basicamente, por elemen
tos do PRRque viam no apoio a Flores da Cunha uma condição mais
vantajosa do que a manutenção de fidelidade ao velho Borges. Com
menor expressão, registrou-se a adesão de elementos do PL ao novo
partido, destacando-se a figura de Antunes Maciel.
Socialmente, o PRL abrigou elementos da burguesia rio-gran-
dense nas mais diferentes frações: agropecuaristas, comerciantes e in
dustriais, além de profissionais liberais egressos das classes médias. E

ta tfe/i 'J07
digna de ser ressaltada a adesão do Centro da Indústria Fabril do Rio
Grande do Sul ao programa partidário do PRL e a boa acolhida que o
gesto mereceu da parte dos pecuaristas no poder. Registrava-se, nesse
momento, uma coalizão das classes dominantes, onde a pecuária em
crise buscava o apoio político daqueles setores mais enriquecidos da
sociedade. Os representantes da burguesia industrial gaúcha, por seu
turno, viam, no apoio à situação política no estado e na sua participa
ção ativa no congresso de instalação do partido, a oportunidade de se
tornarem coparticipantes do poder.
Sob o comando do PRL, processou-se a reconstitucionalização
do estado e foram tomadas medidas para enfrentar a crise econômica.
Em 1934, findava no país o governo provisório, que vigorava desde a
Revolução de 30. Getúlio Vargas permaneceu no poder como presiden
te, foi elaborada uma nova constituição e, no âmbito regional. Flores
da Cunha passou de interventor a governadordo estado. O PRL man
teve-se como o partido da situação, constituindo-se na base de apoio
fundamental de Flores no Legislativo do estado. A Frente Única Rio-
Grandense, que associava elementos do PRR e do PL, ficou na oposi
ção. Politicamente, situação e oposição estadual divergiam, na medida
em que a Frente Única demonstrava um maior apego a formas tradi
cionais de mando, no estilodas práticas oligárquicas vigentes na época
da República Velha. Por seu lado, o PRL, numa posição que pode ser
classificada como "modernizadora", aceitava a presença de um esta
do central regulador. Legitimava, portanto, a hipertrofia de executivo
central que se deu no período p6s-30. Apesar dessa divergência, ao ini
ciar seu mandato constitucional em 1953, Flores da Cunha procurou
aproximar-se da Frente Única, convidando seus líderes para integrarem
o secretariado estadual.

No plano econômico, a década de 30 no Rio Grande foi marcada


pelo desenvolvimento do sindicalismo cooperativista. A sindicalização
foi incentivada pelo governo como uma forma eficaz de encaminha
mento dos problemas econômicos e de mediatizar as relações entre as
classes sociais e o Estado. Os produtores sindicalizados, em troca dos
favores recebidos, prestavam apoio político ao governo. Tentava-se as
sim, dentro dessa prática, eliminar qualquer manifestação política das

^08 *yftxi/ória^€/<y&lio ^fJ^€liu/e


classes dominantes no sentido do retorno às práticas oligárquicas. Para
com as classes subalternas, a sindicalização objetivava também anular
o seu potencial político, mantendo-as submissas e controladas pelo go
verno.

No setor da pecuária, parte dos criadores passou a formar co


operativas para beneficiar, eles próprios, seus rebanhos, eliminando a
figura dos charqueadores tradicionais. Outro grupo, por seu lado, le
vava adiante a idéia de formação de um frigorífico com recursos locais.
O governo gaúcho amparou e incentivou tanto um como outro grupo
de pecuaristas. Apesar das divergências no plano especificamente polí
tico, situação e oposição mostravam-se favoráveis à idéia máxima que
catalisava as atenções dos pecuaristas gaúchos: a construção de um fri
gorífico nacional. O Instituto Sul-Rio-Grandense de Carnes,criadoem
julho de 1934, procurava,entre outras metas, tornar realidadeno estado
o projeto da frigorificação.
Além de conceder empréstimos para possibilitar a realização
desse projeto, o governo estadual construiu um matadouro-modelo na
Serraria e um entreposto frigorífico no cais do porto da capital. Alem
disso, encomendou vapores frigoríficos, resolvendo assim o problema
de um transporte adequado para as carnes. Por essa época, os proprios
charqueadores acabavam por voltar-se também para a idéia da frigori
ficação. O sindicato dos charqueadores optou pela sua transformação
paralela, mas não integrada ao Instituto de Carnes, cogitando na for
mação de um Instituto do Charque. Paralelamente a toda essa conju
gação de esforços por parte de pecuaristas e do governo, frigoríficos já
operavam no estado na transformação da carne suína e na produção da
banha. Em 1937, porexemplo, a firma Oderich inaugurava emCanoas
os "Frigoríficos Nacionais Sul-Brasileiros".
O empreendimento evidenciava, tal como o estabelecimento de
Renner em Montenegro, o maior poder deacumulação daárea colonial
sobre a pecuária extensiva. Em suma, o comerciante da área colonial,
atuando como intermediário na colocação dos gêneros agropecuários
no mercado, fora capaz de capitalizar mais que o pecuarista. Uma das
formas de aplicação desse capital dera-se justamente na produção da
banha e dos demais produtos suínos.
Os grandes produtores e comerciantes de banha, agrupados no
Sindicato Sul-Rio-Grandense da Banha, representavam um dos ex
pressivos setores de acumulação de capital no estado, acumulação esta
que se dava sobre os suinocultores coloniais. Processo idêntico dava-se
no âmbito da fabricação do vinho, onde os grandes comerciantes e in
dustriais, também organizados em Sindicato, controlavam a produção
de uva no estado.

Como forma de reação aos sindicatos que contavam com a pro


teção do governo e gozavam de isenção no pagamento de impostos,
desenvolveu-se entre as populações coloniais um surto cooperativista.
As cooperativas de pequenos produtores buscavam encontrar formas
de quebrar o monopólio da produção e comercialização dos produtos
estabelecidos pelos Sindicatos. Nesse sentido, objetivavam beneficiar a
matéria-prima por eles produzida e comercializar o produto acabado.
Tratando-se de pequenos proprietários, consideravam que só pela con
jugação de esforços conseguiriam competir com os grandes sindicatos.
Politicamente, a redemocratização no país levou o governo estadual a
enfrentar sérios problemas. Flores da Cunha manobrara para aproxi
mar-se da oposição, mas encontrara a desaprovação de Getúlio Vargas.
A marcha para a ditadura, processada a partir das articulações do
governo central, via na "pacificação política" realizada pelo governador
gaúcho um sério obstáculo. Dessa forma, o governo central provocou
a cisão política no Rio Grande, fazendo com que o partido de Flores
—o PRL —deixasse de ter maioria no legislativo local. Por instigação
de Getúlio, integrantes do PRL - entre os quais o próprio irmão do
presidente, Benjamin Vargas - desligaram-se do partido, formando a
"dissidência liberal". Na medida em que se separavam de Flores, op
tavam por uma ligação mais vantajosa com o governo central. Por sua
vez, elementos da Frente Única viram na aceitação da política deVargas
uma forma de ascender política e economicamente. Foram, por isso, fa
cilmente levados a se oporem ao governo de Flores, em vez de com ele
colaborarem. Dessa forma, não só regionalmente, mas em todo o país.

HÍlio r/o t^Ju/


parcelas das diferentes facções da burguesia nacional foram dando seu
aval à marcha para o fechamento político.
A aceitação da ditadura dava-se em nome de princípios tais
como "segurança nacional", "aceleração do progresso econômico" ou,
simplesmente, pela perspectiva de obtenção de cargos na política de
favoritismo manejada habilmente por Vargas. A seu favor, o governo
tinha o argumento da radicalização política que se processava no país,
com o aumento dos extremismos de esquerda e de direita. Um dos pon
tos capitais da política do governo brasileiro nos pós-30 foi a legislação
social, que regulou as relações entre empregados e empregadores. A
legislação social era a contrapartida do processo capitalista em curso.A
pressão das classes subalternas e sua manifestação através de grevesfora
uma constante ao longo da República Velha.
Em face da pressão "desde baixo", o Estado pós-30 como que
se adianta e, "desde cima", elabora uma legislação social que tem o
efeito imediato de fazer amainar o movimento operário. As primeiras
medidas, nesse sentido, traçadas pelo ministro do Trabalho —o gaúcho
Lindolfo Collor —, foram saudadas pelo operariado gaúcho com entu
siasmo. Entretanto, à medida que iamsendo aplicadas e que serevelou
o seu conteúdo coercitivo, bem como a intenção de estabelecer o con
trole governamental sobre os sindicatos operários, a reação se fez sentir.
Recrudesceu o movimento proletário no estado, denunciando o caráter
das leis sociais. O acirramento da "questão social" conjugava-se com a
acentuação da alta do custo de vida e do desemprego. Ainflação afetava
não apenas o operariado, mas, também, os setores médios.
Enquanto, porumlado, recrudescia aação doPartido Comunista,
outras organizações, contestadoras do regime vigente, apareciam no
cenário nacional, encontrando repercussão no Rio Grande. No estado
manifestava-se tanto a ação da Aliança Nacional Libertadora quan
to da Ação Integralista Brasileira, esta última granjeando adeptos no
meio da população da zona colonial. O governo estadual, consciente
da marcha para o fechamento político, preparou-se materialmente para
reagir ao centro. Todavia, ogoverno central cortou-lhe as possibilidades
de articulação, nomeando para os principais postos militares no estado
elementos afins com o golpe. Por outro lado, tanto exigiu que Flores
devolvesseos armamentos cedidos ao Rio Grande do Sul por ocasião da
Revolução de 1932 quanto decretou a federalização da Brigada Militar
gaúcha.
Impossibilitado de reagir, Flores da Cunha renunciou e fugiu
para o Uruguai a 19 de outubro de 1937. Foi nomeado como inter
ventor Federal no Rio Grande do Sul o general Manoel de Cerqueira
Daltro Filho, que assumiu em 20 de outubro.
A convocação de políticos gaúchos para ocuparem secretarias do
estado, de uma certa forma, fez passar para o segundo plano a preocu
pação com "autonomia estadual", uma vez que implicava o acesso ao
poder político. Economicamente, Getúlio tinha uma política de gover
no que os atendia e, politicamente, na nova correlação de forças que se
estabelecera, a classe dominante gaúchasó tinha a lucrar.
Na medida em que renovou os cargos do governo, Daltro Filho
desmantelou a máquina político-administrativa construída por Flores.
O golpe de 10de novembro de 1937, dissolvendo o poder legislativo no
âmbito nacional, veio finalizar o processo de fechamento da sociedade
brasileira. Começava o Estado Novo.

0 f^9S7-^945j
A implantação do Estado Novo, no Brasil, implicou a submissão
política das diferentes frações da burguesia nacional, que abriu mão de
suas pretensões ao poder, em nome da "paz social", da segurança e do
progresso econômico. Tais perspectivas, identificadas como interesses
coletivos da nação, forneceram a base da legitimação do regime auto
ritário. O governo foi exercido por "uma elite dirigente" que, apoiada
pelo exército, promoveu o golpe. Essa elite dirigente era constituída
por elementos egressos tanto dasdiversas frações da burguesia nacional
quanto das classes médias. Contudo, exercia o poder em nome dos in
teresses da burguesia e da preservação do capitalismo no país.
Instalou-se, em 1937, um Estado autoritário-corporativo.
Buscava-se canalizar para o Estado, através de órgãos representativos
da classe, os interesses econômicos das "burguesias nacionais", tentan-

d€f ^íhfirtf/e f/o 9a/


do neutralizá-las como força política. Através da oficialização de sindi
catos operários e da legislação trabalhista, o Estado se dispunha a con
trolar a questão social. Numa perspectiva modernizante, consagrou-se
a intervenção do Estado na economia. O Estado Novo foi o momento
em que se processou, de forma mais clara, a substituição do modelo de
desenvolvimento baseado na agroexportação para aquele baseado na
indústria.

Para o Rio Grande do Sul, essa passagem significou seu atrela-


mento ao novo padrão de acumulação que se inaugurava: a ele cabia
fornecer alimentos baratos para o trabalhador nacional. Se, parao estado
sulino, representava a consagração de sua dependência e posição sub
sidiária, para o país, como um todo, possibilitava o estabelecimento de
um salário mínimo, uma vez que permitia o barateamento dos gêneros
alimentícios. Tal processo beneficiava particularmente ao industrial do
centro do país, que, por sua vez, já atuava na principal área de acumu
lação desde o surto do café. Cada vez mais processava-se o aumento do
distanciamento entre o processo da industrialização gaúcha e paulista.
A instalação do Estado Novo não provocou alterações funda
mentais na estrutura econômica do estado. O Rio Grande continuou
na suaposição tradicional defornecedor degêneros agropecuários para
o mercado nacional. Nosetor dapecuária, predominava ainda acriação
extensiva de gado em campo nativo. O estancieiro colocava no campo
tanto gado quanto o pasto pudesse suportar. Uma seca prolongada ou
um inverno rigoroso, comprometendo o pasto, ocasionava grandes per
das no rebanho. Os frigoríficos estrangeiros continuavam controlando
os preços da carne, forçando a sua baixa.
Em 1941, a enchente ocorrida em Porto Alegre danificou seria
mente as instalações do Matadouro Modelo na Serraria. Parte das ins
talações foram transferidas para o frigorífico nacional, velho sonho dos
criadores e que estava sendo construído na serra, em Tupanciretã. Sua
construção prolongou-se ao longo do Estado Novo. Nodecorrer da dé
cada de 1940, desapareceram as velhas charqueadas, transformando-se
em cooperativas, que procuraram utilizar processos mais modernos de
transformação da carne.

'9a.ru//^/tj^ i/Pesareri/o / /S
No tocante à agricultura, persistiam os efeitos de um sistema
agrícola inadequado, com os produtos gaúchos competindo com os do
centro em condições pouco vantajosas. Acentuava-se a crise do mini
fúndio colonial, pois o alto índice de nascimentos entre os pequenos
proprietários conjugava-se ao esgotamento do solo e escassez de terras.
Paralelamente, começou a expandir-se a cultura do trigo, que, porém,
necessitava, para o seu cultivo, técnicas e maquinarias modernas.
Tanto no setor agrícola como no pecuário, era muito baixa a re
muneração do trabalho. Na fazenda de criação, os peões não recebiam
uma remuneração sistemática. Parte do salário era pago não em dinhei
ro, mas através do direito à moradia e ao uso de pequenas extensões de
terra para produção de gêneros de subsistência. Entretanto, o completo
cercamento dos campos e a introdução de alguma tecnologia nos mé
todos criatórios foi fazendo com que houvesse menor necessidade de
braços paraa criação. Acentuou-se, com isso, o processo de êxodo rural,
que já se manifestava desde os anos 30. Uma vez fora do latifúndio,
esse trabalhador buscava as cidades. Todavia, constituía-se uma mão
de obra que era jogada no mercado de trabalho sem ter especialização
nenhuma, pois suas habilidades na vida campeira nada valiam para a
vida urbana. Por outro lado, o desenvolvimento industrial do estado
não permitia a absorção de toda essa mão de obra nas fábricas. Dessa
forma, as vilas marginais da periferia das cidades passaram a abrigar
todo esse contingente populacional egresso do campo, que sobreviveria
em um nível de subemprego.
Na zona colonial, o êxodo rural tambémseprocessava. Contudo,
esses contingentes populacionais não foram apenas para a cidade em
busca de emprego. Uma parcela considerável da população exceden
te dessas zonas passou a emigrar para Santa Catarina e Paraná, onde
havia disponibilidade de terras. No setor industrial, o Rio Grande con
tinuou a produzir os seus tradicionais artigos, fruto da transforma
ção de gêneros agropecuários: vinho, banha, conservas, tecidos de lã.
Entretanto, as metalúrgicas gaúchas expandiram-se durante o Estado
Novo em função da Segunda Guerra Mundial. A necessidade de apa-
relhamento da FEB (Força Expedicionária Brasileira), por exemplo.
levou a que a produção da indústria Eberle passasse a ser considerada
de interesse militar-estratégico.
Durante o período do Estado Novo, o governo criou, em 1938,
o Departamento Autônomo de Estradas e Rodagens (DAER), órgão
destinado a desenvolver o sistema rodoviário gaúcho e que propiciou
uma maior integração regional do mercado.
Assim como em todo o país, a instalação da ditadura fez o Rio
Grande aplicar uma série de medidas complementares decretadas pelo
Executivo central.Tais medidas objetivavam desmantelaro esquema po
lítico anterior, aniquilar os regionalismos e acelerar o processo de cen
tralização do poder. Foram extintos os partidos, queimadas as bandeiras
estaduais e banidos os escudos, hinos e outros símbolos regionais. Muitos
dos poderes dos municípios e estados foram transferidos para a órbita
federal. No campo tributário, a União reservou para si os tributos mais
significativos em termos do montante da receita, o que tornou os muni
cípios e os estados mais dependentes da administração federal.
Politicamente, os estados passaram a ser governados por inter
ventores nomeados pelo centro. A interventoria de Daltro Filho no
Rio Grande, que tivera início com a fuga de Flores da Cunha para o
Uruguai, teve curta duração. Comsua morte, em janeiro de 1938, assu
miu interinamente Maurício Cardoso, Secretário do Interior, do antigo
PRR. Entretanto, Getúlio logo nomeou como interventor no estado o
general Cordeiro de Farias, gaúcho, porém sem ligações políticas com
as velhas máquinas estaduais.
Flores da Cunha, que se exilara no Uruguai após a decretação
do Estado Novo, procurou coordenar no exterior uma tentativa de gol
pe contra o regime de Vargas. Para neutralizar sua atividade no exílio,
Getúlio teve o auxílio de seu embaixador no Uruguai, Batista Luzardo.
Durante a interventoria de Cordeiro de Farias, processou-se no esta
do uma verdadeira campanha difamatória contra a figura de Flores.
Foram realizadas investigações sobre sua vida, acompanhadas de acu
sações tais como enriquecimento ilícito às custas do cargo exercido,
mandato de assassinatos políticos etc. Ao retornar ao país, em 1943,
Flores foi preso.
antigos seguidores do PL, atuava pela imprensa através de numerosos
artigos pró-democracia.
A redemocratização deu-se com a fixação das eleições e a for
mação de partidos políticos no país. As principais forças anti-Vargas
alinharam-se na União Democrática Nacional (UDN), que seguiu
uma linha de "liberalismo democrático", no estilo da velha política
tradicional, mas com poder de atração sobre as classes médias. Para a
UDN afluíram os principais nomes que haviam se posicionado contra
Vargas, como Osvaldo Aranha, Flores da Cunha e o velho líder e ex-
-presidente de estado, Borges de Medeiros. Pilla, por sua vez, numa há
bil campanha de aliciamento, conseguiu o número de votos suficientes
para tornar o PL um partido nacional, uma vez que não seriam mais
aceitos partidos regionais. O PL posicionou-se pela idéia parlamentar.
Reunindo seus antigos adeptos, teve mais forças que a UDN no Rio
Grande do Sul.
A formação do Partido Social Democrático (PSD) no estado re
presentou o interesse básico de os políticos tradicionais continuarem
no poder. Nele se agregaram elementos do PRR e do PRL, embora te
nha contado com a participação de membros da "dissidência liberal",
como Protásio Vargas (organizador do PSD no Rio Grande), ou de ex-
-libertadores, como Valter Jobim. O PSD manifestou-se por uma linha
de conservadorismo e "tradição de mando".
Como elemento inovador no processo de redemocratização,
surgiu o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), sem raízes no passado
político do Rio Grande. O PTB apoiou-se na estrutura sindical organi
zada pelogoverno após 30 e nas massas trabalhadoras. Destacou-se na
liderança do mesmo, porsuas idéias a respeito da condição do processo
econômico e social, a figura de Alberto Pasquallini.
Como partidos menores, cabe citar a presença do Partido
Comunista Brasileiro (PCB) e do Partido de Representação Popular
(PRP), de Plínio Salgado, vinculando velhos integralistas.
A deposição de Vargas pelo ministro da Guerra, general Góes
Monteiro, veio dar-se em plena campanha eleitoral. Com a queda do
Estado Novo, tanto no nível nacional como regional, o poder foi ocu-
pado por representantes do poder judiciário. O presidente do Supremo
Tribunal Federal, José Linhares, assumiu no centro do país, enquanto
que, no Rio Grande, Ernesto Dornelles foi substituído pelo desembar
gador Samuel Silva na interventoria estadual.

O éí/ífO'

Com o fim do Estado Novo e a redemocratização, iniciou-se o


período da história do Brasil conhecido como "democracia populista".
A nível nacional, afirmava-se o novo padrão de acumulação capitalis
ta baseado na indústria. O eixo da economia nacional passara defini
tivamente a centrar-se no processo de industrialização, mantendo-se,
contudo, apoio ao setor agroexportador. Garantindo as exportações, o
Brasil assegurava divisas para manter a sua capacidade aquisitiva ex
terna.

Em termos de desenvolvimento do processo capitalista do


país, apresentavam-se duas principais tendências: aquela que pre
tendia a constituição de um capitalismo nacional, autônomo, com
entrada cautelosa de capital estrangeiro, regulada pelo Estado, e
aquela do "capitalismo associado", que propugnava pelo fortaleci
mento da iniciativa privada, aceitando a associação com o capital
estrangeiro.
Como regra geral, acentuou-se a tendência já manifestada no
período p6s-30 de maior atuação do estado na economia, dirigindo o
desenvolvimento, assim como se consolidou a hipertrofia do Executivo
sobre os demais poderes. Na medida em que se afirmava o processo de
industrialização no país, dentro dos marcos de um esquema político
democrático, a emergência das massas urbanas começou a pesar nos
destinos eleitorais do país.
A base da barganha presente no consenso era, pelo lado da mas
sa, o voto e, pelo lado do estado, o reconhecimento de sua cidadania.
Através do apoio aos candidatos de um partido, os eleitores podiam
obter favores pessoais e acesso a empregos, benefícios estes concedidos
"desde cima" pelo líder populista.
Tabela 2. RS PÓS-30 —Produção Industriai
1 Rrpdtiçãò —
MÊÊÍê — m
Rio DF 33,1% 20,8% 14,2% 11,2%
São Paulo 16,5% 31,5% 43,2% 53,2%
Rio Grande do Sul 14,9% 11,0% 10,7% 8,1%
Minas Gerais 4,8% 5,5% 11,3% 5,7%
Outros Estados 30,7% 31,2% 20,6% 21,8%
Brasil 100,0% 100,0% 100,0% 100,0%

Fonte: Paul Singer. Desenvolvimento econômico e evolução urbana. São Paulo,


Nacional, 1968.

As eleições presidenciais, realizadas em dezembro de 1945, de


ram a vitória ao gen. Eurico Gaspar Dutra, ex-ministro da Guerra do
Estado Novo. A ascensão de Dutra representava o "continuísmo sem
Vargas", ou seja, a permanência no poder dos mesmos elementos que
ocupavam altos cargos durante o Estado Novo, mas sem Getúlio na
presidência. Seu governo teve um cunho acentuadamente antiesquer-
dista. Com o apoio do Exército e da UDN, o governo Dutra usou a
repressão para combater a atuação do Partido Comunista Brasileiro. A
Constituição de 1946, que previa para os "partidos antidemocráticos"
a proibição de participar do jogo político, permitiu que o PCB fosse
considerado ilegal. No Rio Grande do Sul, Cylon Rosa foi nomeado
por Dutra interventor federal no estado, permanecendo no cargo até a
realização das eleições para governador em 1947.
A agropecuária, que até então era o centro das atenções da política
estadual, permanecia em crise. O latifúndio agropecuarista apresentava
pouquíssima rentabilidade. A criação, que continuava predominante
mente extensiva, permanecia quase estacionária quanto ao crescimento
do rebanho. A concentração da propriedade da terra mantinha áreas
improdutivas. A descapitalização levava a um círculo vicioso: a baixa
renda da atividade implicavaa baixa aplicaçãode capitais na renovação
da estrutura produtora, o que, por sua vez, dava como resultado um
baixo rendimento.

Í20 f/o ^fjiwrrif/o f/o /jf^tt/


Desde a década anterior, as charqueadas tinham-se dirigido para
a formação de cooperativas para produção de charque, e ao longo dos
anos 1950 tenderam a rumar para a frigorificação. Frigoríficos de capi
tal nacional surgiram no Rio Grande para a transformação do rebanho
bovino e ovino, ao lado daqueles preexistentes que operavam preferen
cialmente com suínos (Oderich, Renner). Todavia, as empresas nacio
nais não conseguiram obter o "padrão de qualidade" que as levasse a
atingir o mercado internacional. Nesse ponto, lideravam as empresas
estrangeiras (Swift, Armour, Wilson, Anglo), que mantinham a pecu
ária gaúcha em permanente tensão quanto às manobras para rebaixar
o preço da carne. Muitos estancieiros e charqueadores foram à falên
cia em face das manobras executadas pelos frigoríficos estrangeiros. As
propriedades, ante a insolvência por dívidas dos pecuaristas, passavam
para a esfera bancária, sendo depois arrematadas por outros grandes
fazendeiros, com o que se incrementou o processo de concentração da
propriedade da terra.
No tocante à agricultura gaúcha, ao lado da lavoura capitalista do
arroz, despontou a agricultura mecanizada do trigo. Desenvolvendo-se
especialmente na área colonial serrana, mas também aparecendo na
campanha, foi cultivado em pequena e média propriedade. Tal como
o arroz, o trigo utilizou-se largamente do arrendamento. O surto de
ambas as lavouras, conjugadas, implicou um encarecimento do preço
da terra e dos arrendamentos, fenômeno que repercutiu sobre toda a
estrutura agropecuária gaúcha. Enquanto o preço da terra se elevava, o
mesmo não acontecia com o do gado. Como opção, restava ao produtor
a elevação da produtividade na pecuária pela renovação dos métodos
criatórios. Pastagens artificiais, vacinas, banheiros, carrapaticidas e re
produtores estrangeiros demandavam muito capital, e este se revelava
escasso no contexto pecuário.
Quanto à lavoura colonial, o baixo nível técnico dos minifún
dios, que limitava a produtividade, vinha associar-se a uma política de
baixos preços para os produtos agrícolas, imposta pelo capital comer
cial e/ou industrial. As máquinas se apresentavam muito caras para
os pequenos proprietários, que não tinham condições de obter credito
fácil para poder adquiri-las. Além de tais problemas, a crescente con-

Za J
centração da propriedade das terras no estado limitava as chances de
expansão da área agrícola policultora, O Rio Grande, nos anos 1950,
apresentava-se como o estado que mais população emigrante fornecia
para os outros estados, enquanto que era também a unidade da fede
ração que menos brasileiros recebia. Tal constataçãoindica a saída uti
lizada para aqueles colonos que demandavam terra num estado onde
se fizera grande a concentração da propriedade do solo: a emigração
para Santa Catarina e Paraná. Parte dessa massa rural ia concentrar-se
nos núcleos urbanos em busca de trabalho, engrossando a corrente do
êxodo rural. Nas cidades, iam localizar-se nas vilas populares da peri
feria urbana, misturando-se àqueles elementos egressos do latifúndio
pastoril ou agrícola.
A relativa mecanização de alguns setores agrários como o arroz,
o completo cercamento dos campos, a finalização dos incidentes revo
lucionários da campanha estavam pondo para fora da grande proprie
dade ruraltrabalhadores queiam para ascidades embusca deemprego.
Dessa forma, tais camadas recém-chegadas do campo iam-se associar
a um proletariado urbano de vida citadina mais antiga, contribuindo
para agravaros níveisde tensão social. Ocorriam pressões no sentido da
obtenção de terra, trabalho e melhores condições de vida. Com o final
do Estado Novo, recrudescia o movimento grevista.
No tocante à industrialização, permanecia o Rio Grande com
as suas empresas centradas predominantemente na transformação dos
produtos agropecuários, envolvendo muitas vezes uma elaboração sim
ples. Arroz descascado, moagem de trigo, vinho, banha, conservas de
frutas e doces eram os elementos mais representativos na área da ali
mentação, excetuando-se a sofisticada linha dos produtos frigoríficos,
monopolizada pelas empresas estrangeiras. O Rio Grandeaindasedes
tacava no ramo têxtil, de calçados, fumo e produtos químicos simples,
além de contar com a expressiva produção metalúrgica da Eberle.
Os produtores gaúchos como um todo —pecuaristas, arrozeiros,
industriais—enfrentaram problemas quanto à colocação de seusartigos
no mercado interno brasileiro. A própria indústria frigorífica gaúcha
enfrentava as subsidiárias estrangeiras estabelecidas no centro do país.
produzindo para omercado nacional. Por um lado, ovinho ealã apre
sentavam problemas de superprodução e, por outro, o arroz enfrenta
va forte concorrência de outros produtores nacionais, melhor situados
junto ao mercado consumidor.
Com relação ao parque industrial gaúcho, o Rio Grande apre
sentava grande distância com relação ao eixo Rio-São Paulo. Apar da
maior disponibilidade de capital que essa região já possuía desde épo
cas anteriores (através do café), o eixo do centro-sul havia-se tornado o
polo do investimento nacional. AUnião tinha as suas atenções voltadas
para essa área onde estavam se realizando as principais transformações
econômicas, permanecendo oRio Grande do Sul à margem dos planos
do poder central. Para a concentração industrial que se processava no
centro do país, exigia-se a obtenção de alimento barato.
Na medida em que o trabalhador tinha menores gastos com ali
mentação, possibilitava-se a generalização de um salário mínimo ao
operariado. Tal prática propiciava um elevado lucro para o empresa
riado nacional, possibilitando a ampliação do parque industrial. Nesse
sentido, a agricultura das regiões periféricas contribuía para a acumu
lação de capital que se processava na indústria. Desde o ponto de vista
rio-grandense, a identificação dos principais problemas enfrentados
pelo estado pode sersintetizada em três questões fundamentais: a) in
dustrialização; b) êxodo rural; c) transportes e energia. Tais questões
envolviam diretrizes político-partidárias, que por sua vez se revelavam
associadas aos programas de desenvolvimento econômico que se apre
sentavam para o Brasil.
O PSD, representado no Sul pelos governos de Walter Jobin
(1947-51) e de lido Meneghetti (1955-59 e 1963-64), identificava o
problema da industrialização como a meta necessária a atingir. Porém,
considerava que a indústria a incentivar e proteger deveria ser aquela
que beneficiasse os produtos oriundos da agropecuária. Tal identifica
ção demonstra as fortes ligações com o ruralismo gaúcho.
O PL, que representava no Rio Grande o setor rural mais apega
do à estrutura agrária, defendia ser a agropecuária a forma mais correta
de conduzir o progresso econômico gaúcho.
o PTB, por seu lado, identificava a industrialização não apenas
como o problema crucial do estado, como considerava imprescindível
assegurar o primado da sociedade urbano-industrial sobre a agrária tra
dicional. O PTB teve o seu maior líder em Alberto Pasquallini, que
concorreu em 1947 contra Jobin para governador do estado e em 1955
contra Meneghetti. Foram do PTB os governadores Ernesto Dornelles
(1951-55) e Leonel Brizola (1959-63). Dentro da visão petebista, cabia
fazer o Rio Grande passar para etapas mais avançadas do processo de
industrialização, atingindo a produção de intermediários e criando um
polo industrial no estado.
No que toca ao segundo problema crucial do Rio Grande —o
êxodo rural —, a posição do PSD era a de "conter a massa no campo".
A permanência do trabalhador no campo era, segundo a perspectiva do
PSD, tanto um fator de progresso para o setor primário e, por extensão,
para o secundário, quanto era um fator de estabilidade social. Em con
trapartida, a evasão para as cidades era conhecida como um elemento
que contribuía para a perturbação da ordem.
A emergência da massa, tanto a urbana como a rural, era um
dado político novoque se apresentava frente à democratização do voto.
Os partidos, na sua busca de respaldo político, preocupavam-se com a
presença da massa e buscavam controlá-la. O PTB tinha a clara inten
ção de incorporar as massas, principalmente as urbanas, à sociedade
industrial. Nesse sentido, defendia a elevação do seu nível de vida e a
criação de oportunidades de trabalho para todos. Conceitos como "jus
tiça social" e "regeneração do capital pelo trabalho" estavam presentes
na idéia de Pasquallini.
No que toca à mobilização das massas, um ramo do PTB
mostrou-se muito mais radical do que as proposições de Pasquallini.
Brizola representou a tentativa de incorporar as massas dentro de uma
perspectiva de redistribuição do capitale da terra, que alertou as classes
dominantes regionais. A ala de Brizola afastou-se da de Pasquallini,
demonstrando uma tendência socializante mais nítida. Tanto o PSD
quanto as duas vertentes do PTB, na sua perspectiva de promover o
desenvolvimento do Rio Grande, voltaram-se para a questão do capital
estrangeiro. Este estava também presente no Rio Grande do Sul, embo
ra em menor escala que no centro do país.
Fora do tradicional setor da carne frigorificada, o estado contava
com a presença estrangeira na indústria do fumo (Cia. Souza Cruz,de
capital inglês), na moagem do trigo edo arroz (Bunge and Bom, capital
americano, presente nos Moinhos Rio-Grandenses e na Brasilarroz),
energia elétrica (The Rio-Grandense Light and Power Syndicate eCia.
de Energia Elétrica Rio-Grandense, subsidiária da Eletric Bond and
Share, americana) etelefones (International Telephone and Telegram,
americana).
O PSD posicionou-se pela aceitação do capital estrangeiro, en
tendido como elemento renovador. Tal perspectiva ligava-se à tendên
cia em curso na sociedade brasileira conhecida como do "capitalismo
associado". Essa tendência aceitava a colaboração do capital estrangei
ro como participante do desenvolvimento econômico brasileiro, aolado
do capital nacional. De uma forma geral, a tendência do "nacionalismo
desenvolvimentista" ou do "desenvolvimento capitalista autônomo",
delineado já por Vargas no período do Estado Novo, com a redemocra-
tização encontrou sua expressão política no populismo. Essa tendência
buscava reformular as condições de dependência da economia brasilei
ra eestimular a industrialização nopaís. Além disso, tinha uma postura
cautelosa com relação à interferência do capital estrangeiro.
A posição do PTB gaúcho (Pasquallini, Dornelles) implicava a
aceitação criteriosa do capital estrangeiro desde que controlado pelo
estado. Tal posicionamento alinhava-se junto ao "nacionalismo desen
volvimentista", que buscava coibir os excessos do capital alienígena.
Por seu lado, a ala de Brizola posicionava-se frontalmente contra a pre
sença do capital estrangeiro, repudiando-o. O posicionamento radical
de Brizola aproximou-o das tendências de esquerda, que o apoiaram.
A ruptura Pasquallini-Brizola, no interior do PTB, teve como
motivo fundamental a aproximação da ala radical com a esquerda bra
sileira (socialistas e comunistas). A eletrificação do estado foi uma meta
perseguida tanto pelo governo Jobin (PSD) quanto pelo de Dornelles
(PTB). A preocupação com relação à energia continuou no governo de
Brizola (PTB), mas já com um cunho marcadamente anti-imperialista.
Em 1947, fora criada a Comissão Estadual de Energia Elétrica (CEEE)
para corrigir as falhas do atendimento prestado pelas companhias es
trangeiras que operavam no estado. A instalação da CEEE elevou a
capacidade geradora do Rio Grande e reduziu a ação das companhias
estrangeiras.
No governo Brizola, procedeu-se a encampação das empresas
estrangeiras que ainda operavam no setor da eletricidade, bem como
a da Companhia Telefônica Rio-Grandense. No tocante a transportes,
toda a produção gaúcha se fazia ainda preferencialmente pela navega
ção de cabotagem.
Ao longo da década de 1950, foi impulsionado no estado o sis
tema rodoviário. Foram construídas várias estradas de rodagem, assim
como foi inauguradaa rodovia BR-116. Igualmente, a criação, em 1947,
do Departamento Autônomo de Carvão Mineral possibilitou a sua ex
tração em maior escala no estado, objetivando a obtenção de combus
tível para a Viação Férrea. O DAER, criado em 1938, em colaboração
com a Secretariade Obras Públicas, construiu, no governo Meneghetti,
a ponte sobre o rio Guaíba. No governo Brizola, foi iniciada a constru
çãoda Estrada da Produção, que fez escoar até a capital os produtos da
região do Alto Uruguai. Aos poucos, o esquema rodoviário suplantou
a navegação de cabotagem para atender às necessidades de transporte
da produção gaúcha.
Havia, pois, uma consciência praticamente comum, por parte
dos governantes do Rio Grande, quanto às fontes de estrangulamento
básico da economia gaúcha. As formas de atacá-las, contudo, envol
viam estratégias diferenciadas quanto ao projeto de desenvolvimento,
adotadas pelos partidos políticos em jogo.
Ao longo do período da chamada democracia populista, o Rio
Grande do Sul apresentou uma alternância partidária no que diz res
peito aos governadores de estado, ora ascendendo o PSD, ora o PTB.
Ao governo de Jobin (PSD, 1947-51), seguiram-se os de Dornelles
(PTB, 1951-55), Meneghetti (PSD, 1955-59), Brizola (PTB, 1959-63)
e novamente Meneghetti (1963-64). Realizada a Revolução em 1964,

^^26 clcy f/o /7if/


Meneghetti foi confirmado no governo estadual, onde permaneceu até
1967. Os demais partidos menores atuavam mediante coligações com
os partidos dominantes, reforçando está bipolarização. É o caso, por
exemplo, da candidatura Meneghetti em 1955, onde o PSD se associou
à UDN e ao PL, ou da candidatura Brizola em 1958, quando o PTB
se uniu ao PRP (Partido de Representação Popular) e ao PSP (Partido
Social Progressista).
Paralelamente, processava-se a cisão dentro do próprio PTB,
com as alas de Pasquallini e Brizola. Em face a esse distanciamento,
caracterizado pela ligação com as esquerdas e pela radicalização da ala
de Brizola, sua postura foi sendo considerada pelos demais como fora
das perspectivas daqueles projetos de desenvolvimento capitalista no
estado. Aos poucos, sua posição foi identificada por alguns como nega-
dora do capitalismo, ou seja, socialista.
Em termos gerais da realidade brasileira, o período da democra
cia populista foi marcado pelas oscilações, a nível das esferas governa
mentais, entre uma e outra tendência de desenvolvimento para o capi
talismo brasileiro: "nacionalismo desenvolvimentista" ou "capitalismo
associado . A variante socialista, ou negadora do capitalismo, perma
necia como uma constante ameaça à estabilidade do regime. A rigor, a
partir do governo de Juscelino Kubitscheck (1955-60) o "nacionalismo
desenvolvimentista" se achou comprometido. Inaugurando uma po
lítica de industrialização acelerada (Programa de Metas), acabou por
resultar na abertura da economia brasileira ao capital estrangeiro.
No plano econômico, tornava-se cada vez mais difícil reformu
lar as condições de dependência e tornar a nação autossuficiente. Os
princípios do nacionalismo econômico chocavam-se com osavanços do
imperialismo estrangeiro e com as necessidades de capital e tecnologia
para a indústria brasileira atingir novas etapas. No plano político, o
próprio aumento da massa operária, propiciado pelo desenvolvimento
da industrialização, e a sua nascente politização ameaçavam rompero
equilíbrio do pacto populista. Proliferavam as greves, as agitações so
ciais e os comícios. Contra esse estado de coisas, que punha em risco a
estabilidade do capital e do próprio Estado, começavam a articular-se
alguns setores da sociedade brasileira: latifundiários, industriais, co
merciantes, banqueiros, militares e mesmo parte das camadas médias
urbanas. Entrava em falência o modelo do capitalismo autônomo e a
sua contrapartida no plano da política, que era o populismo.
O governo do presidente João Goulart foi uma demonstração
desse desequilíbrio. A posse de Jango (apelido pelo qual era conhe
cido) foi contestada por alguns setores. Sendo vice-presidente do go
verno Jânio Quadros, com a renúncia deste em agosto de 1961, devia
assumir a Presidência do Brasil. Gaúcho, elemento atuante no PTB e
nos meios sindicais, Jango era tanto considerado o "herdeiro de Vargas"
quanto tinha fama de "saber lidar" com a esquerda brasileira. A UDN
e certa ala do Exército tentaram impedir a sua posse, considerando-a
inaceitável em termos de segurança nacional. Todavia, o gen. Machado
Lopes, comandante do III Exército, sediado no Rio Grande do Sul, e o
governador do estado, Leonel Brizola, tomaram a defesa de Jango para
garantir a sua posse.
O incidente, que ficou conhecido como da "Legalidade", mobi
lizou o Rio Grande do Sul. Brizola, que era cunhado de Jango, orga
nizou demonstrações populares e orientou a opinião pública em favor
da causa da "Legalidade". A divisão no seio do Exército e a posição do
governo gaúchogarantiram que Jango assumisse o poder em nome da
defesa dos princípios constitucionais. Foram tomadas, contudo, algu
mas garantias para que se pudesse exercer um certo controle sobre o
presidente. Em 2 de setembro de 1961, o Congresso aprovou a emenda
constitucional que instituía o parlamentarismo no Brasil.
Na vigência do parlamentarismo, um gaúcho ocupou o posto
de primeiro-ministro: Brochado da Rocha, filiado ao PSD e que fora
secretário do Interior e Justiça no governo de Brizola. Brochado con
vocou um plebiscito antecipado —pois o mesmo estava previsto para
1965 —a fim de decidir sobre a continuidade ou não do parlamentaris
mo no Brasil. Ante a indecisão do Congresso, influíram novamente as
posições do governador gaúcho Leonel Brizola e do então comandante
do III Exército, gen. Dantas Ribeiro, que pressionavam pela imediata
convocação do plebiscito. O plebiscito foi realizado em 6 de janeiro de

f/o r^if/
1963, tendo o povo votado contra o parlamentarismo e pelo retorno ao
presidencialismo. Os últimos momentos do governo de João Goulart
foram marcados pela radicalização de posições. Jango aproximou-se
cada vez mais daqueles grupos interessados em aprofundar as reformas
sociais e econômicas. Aproximações eram realizadas com as organiza
ções de esquerda, e através de grandes comícios o governo anunciou a
intenção de realizar reformas de base, entre as quais a reforma agrária.
A crescente inflação aumentava os níveis de tensão social. Para muitos
grupos da sociedade brasileira, dentre os quais parte do Exército e os
grandes proprietários de terra, o governo Goulart estava ameaçando as
próprias bases sobre as quais se assentava o modelo de desenvolvimen
to capitalista brasileiro. O receio de uma aproximação cada vez maior
do governo com a esquerda levou esses setores a se organizarem num
movimento civil-militar que derrubou Jango em 31 de março de 1964.
No bojo desses acontecimentos, mais uma vez destacou-se a atuação
do ex-governador gaúcho Leonel Brizola, então deputado federal da
Guanabara. Defendendo a política das reformas de base e mesmo assu
mindo uma atitude mais radical que a de Jango, a atuação de Brizola
vinha solidificar a opinião de que o governo dera uma guinada em de
finitivo para a esquerda.
No Rio Grande, vencera nas eleições para a sucessão de Brizola
o candidato do PSD, lido Meneghetti, que já uma vez governara o es
tado. O novo chefe do governo manteve uma posição contrária àquela
de Jango. Por outro lado, o grupo gaúcho da UDN e o PL também
opunham-se à política do governo central.
Com o deflagrar do movimento armado de março/abril de 1964,
o III Exército aderiu à revolução, deixando os líderes gaúchos Brizola
e Jango sem base de sustentação, obrigando-os a se refugiarem no
Uruguai.

PI ia //a/a/it^' a r^'Pi ía J2,9


I Quadro-resumo IV

Plano Intemadõnãl

Flores da Cunha como interventor


federal no RS.
Medidasdo governo provisório: decreto sobre Criadores gaúchos retornam com a
a sindicaiização; suspensão do pagamento da idéia de montagem de um frigorífico
Encíclica
dívida externa; política do café passa a nível com capitais locais.
1931 "Quadragésimo anno"
federal: criação do Conselho Nacional do Café; Auxílio do governo estadual à lavoura
(Pio XI).
tenentes ocupam várias interventorias estaduais; arrozeira.
incentivo à diversificação da economia nacional. Reafirmação do caráter agropecuarista
da economia da região; incentivo às
indústrias naturais.

i; Cisãoda oligarquia gaúcha: a


"alaregional" representada pela
Eleição de Franklin Revolução constitucionalista de SãoPaulo; Frente Única endossa a Revolução
I' Delano Roosevelt Frente Única Paulista (PRP + PD) alia-se à Constitucionalista, enquanto a "ala
1932
para a Presidência dos Frente Única Rio-Grandense (PRR + PL); nacional",liderada por Flores, dá
Estados Unidos. vitória do governo central sobre os revoltosos. apoio a Getúlio.
Flores organiza o Partido
Republicano Liberal (PRL); apoio dos
5^
industriais à agremiação.
Data Plano Internaeional PÜò Graridb (d®
I
Promulgada a nova
¥ constituição brasileira.
Acordo de reciprocidade
í Criação do Instituto Sul-Rio-Grandense de Carnes.
Brasil/Estados Unidos.
PRL mantém maioria na Assembléia do Estado; Flores
Brasil incentiva relações
Fortalecimento dos indicado como governador.
comerciais com Itália e
1934 governos de Hitler e início A Federação Operária do RS, que vinha mantendo uma
Alemanha.
do III Reich. políticapró-organização trabalhista, parte para uma
Desenvolvimento da Ação
estratégia de conscientização do operário para repudiar a
Integralista Brasileira.
legislação social.
Getúlio Vargas eleito
presidente constitucional do
Brasil.
Radicalização da política
brasileira.
Formação da Aliança
Nacional Libertadora
(ANL). Flores busca aproximação com a Frente Única
Governo dá início promovendo a "pacificação do Rio Grande"; governo
1935 à repressão: Lei de estadual reprime os movimentos extremistas:ANL e
Segurança Nacional: movimento grevista.
fechamento da ANL. Surto cooperativista na região da agropecuária colonial.
Intentona Comunista em
novembro.
Repressão do governo sobre o
V
movimento.
i ©ata Plano Internacional Brasil íRiò Gfande do Sul

Hitler ocupa a Renânia militarmente.


Execução do "Estado de Continuidade da "pacificação interna do
1936 da Guerra Civil Espanhola.
Pacto Anti-Kominter entre Alemanha Guerra" no país. RS", sob a liderança de Flores e do PRL.
e Japão.
Formação da dissidência liberal; Flores
Campanha de sucessão perde a maioria parlamentar; federalização
Intensificação da Guerra Civil na presidencial; descoberta do da Brigada gaúcha; fuga de Flores para o
1937 Espanha. Plano Cohen; fechamento Uruguai; nomeação de Daltro Filho como
Bombardeio de Guernica. do Congresso e instalação interventor.
do Estado Novo. Formação do Instituto Sul-Rio-Grandense
do Arroz.
Com a morte de Daltro Filho, assume como
Intentona integralista.
interventor Cordeiro de Farias.
Brasil exporta algodão
Anexação da Áustria pela Alemanha, Criação do DAER.
1938 para Alemanha e Itália.
questão dos Sudetos. Acentua-se a crise da pecuária; decadência
Continuidade da política de
das charqueadas; intensificaçãodo êxodo
defesa do café.
I rural; criseda lavoura colonial.
Fim da Guerra Civil Espanhola:
Franco no poder.
1939
I- Alemanha invade a Polônia.

t- Início da Segunda Guerra Mundial.


Manpj Inliern^ei^

Forças alemãs tomam Paris; Acordo Brasil/Estados Unidos Desenvolvimento da indústria


Alemanha liquida a guerra possibilita compra de material bélico e metalúrgica.
1940
no Ocidente e bombardeia a garante a instalação de uma indústria Campanha da "brasilianização" na
Inglaterra. de base. zona de imigração alemã.

Exilado no Uruguai, Flores


Invasão da Rússia; Estados Unidos
desencadeia do exterior uma
1941 entram em guerra. Criação da Cia. Siderúrgica Nacional.
campanha contra o regime de
Ataque japonês a Pearl Harbour.
Vargas.

Brasil entra na guerra ao lado dos Interventoria de Ernesto Dornelles.


Alemanha perde a guerra na
1942 aliados e cede bases do nordeste aos Flores da Cunha volta do exílio e é
África.
Estados Unidos. preso.

1943 Queda de Mussolini. Declínio do Estado Novo.

Desembarque dos Aliados na ^ ^ .


1944 Europa Atuação da FEB na Itália.

S
I Plano Internacional Rio Grande do Sul

Redemocratização: formação Organização dos partidos políticos no Rio


Queda de Berlim. Final dos partidos políticos brasileiros; Grande.
da Segunda Guerra o "queremismo"; deposição de Inauguração do frigorífico de Tupanciretã.
1945
Mundial. Getúlio Vargas; assume o poder Ernesto Dornelles é substituído pelo
Criação da ONU. José Linhares, presidente do desembargador Samuel Silva, presidente do
Supremo Tribunal. Tribunal de Justiça.
Governo Dutra.
Instalação da Assembléia Samuel Silva é substituído por Cylon Rosa.
Prenúncios da Guerra
1946 Constituinte. Eleições dão vitória ao candidato do PSD, Walter
Fria.
Repressão ao Comunismo. Jobin, derrotando Pasquallini (PTB).
Liberação das importações.
Governo de Walter Jobin considera ser a
industrialização a principal meta a atingir
Plano SALTE.
i; ("indústrias naturais"); política de conter o
1947 Guerra Fria. Tratado de Assistência Recíproca
êxodo rural; aceitação ao capital estrangeiro;
Brasil/Estados Unidos.
criação da CEEE e do Departamento Autônomo
de Carvão Mineral.

Instalação da República
1949
Popular na China.
1^
V Plano Internacional

Guerra na Coréia Getúlio Vargas (PTB) eleito Governo de Ernesto Dornelles (PTB):
¥ sofre contraofensiva presidente. industrialização como meta para assegurar o
1951 americana. Início da campanha pela primado da sociedade urbano-industrial sobre a
Macartismo nos instalação da Petrobras; agrária tradicional; tendência à incorporação das
Estados Unidos. nacionalismo econômico. massas ao processo político.

Suicídiode Vargas; o vice Café


Derrota francesa no
1954 Filho assume a Presidência da Cautela na aceitação do capital estrangeiro.
Vietnam.
República.

Medidas de abertura e concessões


ao capital estrangeiro. Meneghetti (PSD) como governador do Rio Grande
Conferência de
Eleições para Presidência dando do Sul, derrotando o candidato do PTB, Alberto
1955 Genebra; criação do
vitória a Juscelino Kubitschek Pasquallini.
Pacto de Varsóvia.
(PTB/PSD). Política de desenvolvimento dos transportes.
Golpe de Estado de Lott.
Governo JK (política
Início da Revolução
1956 desenvolvimentista); Revoltas de
Cubana.
Jacareacanga e Aragarças.
I j Brasil Riõ Grande do Sul
França: início da V República; De
Desenvolvimento do Programa de Metas
Gaulle no poder. Eleições dão vitória a Leonel
1958 e da construção de Brasília; expansãoda
Criação do Mercado Comum Brizola (PTB).
indústria.
Europeu.
Governo Brizola: acentuação da
JK rompe com o FMI e dá política populista; preocupação
prosseguimento a seu programa de com a redistribuição da renda e da
Fidel Castro assume o poder em
1959 investimentos e industrialização terra; acusação-ao imperialismo e
Cuba.
acelerada; crescimento do surto início da política de encampação
inflacionário. de empresas estrangeiras que
operavam no Estado.
Governo Jânio Quadros (UDN);
"Carta de Punta dei Leste" Brizola coordena a "Campanha da
% renúncia em agosto; ministros militares
fornece as bases da Aliança para o Legalidade", defendendo a posse
tentam impedir a posse do vice-
I 1961 Progresso. de Goulart; mobilização do Rio
|- presidente João Goulart.
Estados Unidos: governo Kennedy. Grande e apoio do III Exército.
Adoção do parlamentarismo; João
Construção do muro de Berlim. Vitória da causa da Legalidade.
Goulart assume.
I
Plebiscito da nação determina o fim do
parlamentarismo e o retorno ao regime Greves e movimento de colonos
presidencial. sem-terra no último ano do
Governo Goulart: reformas de base governo Brizola.
I- 1963 Assassinato de Kennedy. e plano trienal; ataque às empresas Eleições dão vitória a Meneghetti
estrangeiras; crescimento da inflação e do (PSD).
movimento grevista, incidentes assinalam Continuidade do movimento
a quebra de hierarquia e disciplina nas grevista.
Forças Armadas.
B|o)^raiide
WMê FlÊS® ^MM^útúMM iBràsií

Movimento de 31 de
Intensificação da março (civil/militar)
1964
Guerra do Vietnam. derruba o presidente
João Goulart.

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Impressão e acabamento

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LIVROS PUBLICADOS
ORGANIZADOS OU EDIÇÕES
^ Os sete pecados da capital
(2008).

Visões do cárcere (2003).

^ História Si história cultural


(2003).

^ Imagens urbanas (1997).


A imagem conta a história
(1994).

O espetáculo de rua (1992).

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Memória Porto Alegre; espaços


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Sandra Jatahy Pesavento


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ISBN 978-85-7537-169-5

9 788575 371695

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