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Todos relativizamos a bíblia.

Quais são os seus


critérios?
20:43 Teologia e critérios interpretativos

Início este texto afirmando categoricamente: “Toda pessoa relativiza a bíblia; o que varia é o conjunto
de critérios adotado por cada um”. E quando digo algo óbvio assim, imediatamente os cristãos
fundamentalistas dão um pulo da cadeira me xingando de “mentiroso” e de “herege”, afinal, eles têm a
ingênua ilusão de que seguem a genuína Palavra de Deus (ou o “evangelho puro e simples”), revelada
diretamente a eles pelo Espírito Santo. Pois bem, vejamos então porque isso faz sentido e o que me leva à
convicção de que é impossível não relativizar a bíblia:

1 – A própria origem da bíblia já é fruto da relativização de textos antigos, inclusive todos aqueles tidos
como “escrituras”. Entenda o seguinte: a bíblia surgiu no quarto século da nossa era (cerca de 300 anos
após a morte de Jesus e uns 200 anos após o último livro que nela encontramos ter sido escrito). Os
segmentos dominantes (ortodoxos) da época eram os que representavam a posição oficial da Igreja e
graças a eles (por questão de preferência, conveniência e interesses diversos), após muita briga foram
escolhidos quais livros fariam parte da bíblia e quais ficariam de fora. Essa decisão nunca foi unânime (livros
como o Apocalipse de João entrou “por um triz” na bíblia e o Apocalipse de Pedro por pouco não entrou) e
até reformadores como João Calvino e Martinho Lutero, 1200 anos depois, ainda discordavam de alguns
livros considerados parte do “Canon Sagrado” (por exemplo, Lutero chamava a epístola de Tiago de “carta
de palha”). Então a seleção do que era “inspirado” ou merecedor de fazer parte da bíblia foi uma escolha
contextual e se outros grupos cristãos tivessem vencido o debate (ou se a compilação dos livros na bíblia
tivesse ocorrido um século antes ou depois), certamente hoje nossa bíblia não teria alguns livros que
conhecemos e teria outros que consideramos “não canônicos”. Percebe então que o próprio processo de
formação bíblica já é fruto de relativizar muitos textos que grupos cristãos antigos consideravam sagrados?
Relativizaram uns e absolutizaram outros. E nem entrarei na questão das diferentes tradições envolvidas
na escrita de alguns livros e que posteriormente foram compiladas, mescladas e selecionadas por alguns
autores, dando o aspecto final, semelhante ao que conhecemos. Mas é assunto mais complexo, para outro
momento.

2 – Ninguém aceita a bíblia de forma 100% absoluta ou totalmente literal. E isso evidencia que todos a
relativizamos em maior ou menor grau e de diferentes formas. E para evidenciar, darei alguns óbvios
exemplos:
- Mateus 18:08 = “E se a sua mão direita o fizer pecar, corte-a e lance-a fora. É melhor perder uma parte
do seu corpo do que ir todo ele para o inferno". Você já viu alguém amputando ou extraindo uma parte do
corpo por esse membro o “fazer pecar”? Eu também não.
- Marcos 10:21 = "Vá, venda tudo o que você possui e dê o dinheiro aos pobres, e você terá um tesouro
no céu. Depois, venha e siga-me". Não vejo praticamente nenhum cristão fazendo isso, quanto mais seus
líderes. “Ah, não era literal...” “Não significa que devemos também seguir esse ensino dado ao jovem
rico...” – são as relativizações que os que criticam os que assumem que relativizam, promovem.
- Poderia ainda citar os cristãos relatados no livro dos Atos (que nós adoramos idolatrar como sendo
“exemplares”), que colocavam tudo o que tinham “aos pés dos apóstolos” (Atos 4). Ou quem sabe a
recomendação de tomar vinho diante de problemas estomacais (o mesmo vinho que era recomendado não
consumir em excesso, a fim de não gerar embriaguez, ou seja, alcoólico) – I Timóteo 5.
Ou seja, quando convém a nós, determinado texto passa a ter sentido figurado, enquanto outros tem
que ser literais. Bem cômodo e desonesto de nossa parte.

3 – O que nos faz achar que o Velho Testamento está repleto de arquétipos, alegorias, simbolizações,
referências e profecias apontando para Jesus, senão uma releitura dele feita pela ótica
cristã/neotestamentária? Isso mesmo. Quando olhamos para o Antigo Testamento (por exemplo: para uma
palavra de um profeta) e vemos ali referência a Jesus estamos fazendo uma relativização do texto, da
intenção do autor, afirmando que ali ele queria dizer o que nós pensamos ou desejamos que seja. Não
estou entrando nos méritos se isso é historicamente correto ou não, mas que é uma relativização, isso é.

4 – Se você ignora totalmente a linguagem apocalíptica e acha que o livro descreve de forma literal
(inclusive com os monstros assustadores) acontecimentos futuros, está relativizando uma tradição judaica
antiga a fim de tirar o significado original dessa linguagem para atribuir um que você entende hoje como
correto. Se você entende o livro como uma referência a acontecimentos passados (como a abordagem
preterista), está relativizando o livro, encaixando-o exclusivamente nessa abordagem. Se você o enxerga
de forma futurista, como essa abordagem teológica recente, mas que se tornou predominante no meio
protestante, achando que ele descreve os eventos que ocorrerão nos últimos dias, está relativizando
igualmente com sua abordagem. Não tem como fugir.

5 – Se você tenta conciliar pontos até opostos nas escrituras, dizendo que são complementares, ou fazendo
um malabarismo exegético/hermenêutico (interpretativo) para que não soe contraditória, estará
relativizando a ideia original do autor e da tradição envolvida. Se tentar conciliar os ensinos de Moisés com
os de Jesus, estará fazendo uma enorme relativização. O mesmo ocorrerá se rejeitar qualquer preceito da
lei judaica (como pena de morte aos filhos desobedientes, aos adúlteros e aos homossexuais; ou ainda
rejeitar se aproximar da sua “impura esposa” nos dias de sua menstruação). Quando convém damos um
jeitinho de relativizar hipocritamente alguns trechos, não é verdade?

6 – Quando você tenta fazer com que divergências de relatos (de compreensões de diferentes autores
bíblicos) não existam, você estará relativizando o que lá está sendo dito com base em uma suposição sua.
Por exemplo, quando os quatro evangelhos descrevem diferentes seres (em número ou em essência) no
túmulo de Jesus (seriam anjos? Homens? Quantos?), para você tentar fazer com que os quatro relatos
sejam harmônicos, terá que criar uma quinta possibilidade/hipótese (que nem está na bíblia) a fim de não
haver nenhuma contradição. Pura relativização dos evangelhos...
Entenda: Qualquer parâmetro adotado para interpretar a bíblia é relativizá-la. Dizer que o Espírito Santo
revela a correta interpretação da bíblia é relativizá-la com base nessa suposição humana. Aplicá-la a um
contexto nosso é relativizá-la. Dizer que algo dela não se aplica a nós é relativizá-la. Interpretar tudo dela
literalmente é relativizar a exposição dos autores, restringindo qualquer possibilidade de intenção alegórica,
figuras de linguagem ou linguagens típicas desses povos (como a linguagem mítica ou apocalíptica).
A própria adoção da bíblia é uma relativização, pois estará restringindo o “Cânon Sagrado” ao que a
Igreja determinou a alguns séculos. Ou seja, você está absolutizando a escolha da Igreja, assumindo que
ela foi perfeita na relativização dos textos antigos, determinando o que era “escritura inspirada” e o que não
era. E aceitando as descrições da forma como a bíblia nos traz estará relativizando os fatos pela descrição
do autor (que muitas vezes nem estava presente).
Se não reparou o óbvio, resumo a você: não importa sua abordagem, não tem como escapar de
relativizar a bíblia.
Uma parte do preconceito quanto ao termo “relativo” ou “relativizar” é que as pessoas confundem com
“relativismo”, que à grosso modo, pode ser dito que é a ideia de que não há uma realidade ou verdade
objetiva. Uma ideia que nos lembra muito a abordagem pós-modernista de que “não há fatos; há apenas
interpretação de fatos”, ou seja, a ideia de que algo pode ser verdade se a pessoa em questão o tem como
verdade. Eu, ao contrário, defendo que a realidade está lá e é imutável, independentemente do que
pensamos. A verdade existe e é objetiva e, embora nunca cheguemos à compreensão total dessa realidade
objetiva, podemos chegar na verdade em muitos aspectos ou questões pontuais. E no que diz respeito à
teologia, defendo no dia a dia uma abordagem “moderada” que coloca como parâmetro o que nos é
apresentado, em linhas gerais, sobre a pessoa de Jesus Cristo. Portanto, tomo ele como modelo, como
referência de “verdade” (assumo a fala dEle: “Eu sou o caminho, a VERDADE e a vida...”). Assim, procuro
relativizar toda a escritura e a teologia nos princípios gerais que vejo nEle. Portanto, não venha me rotular
de “relativista”.
Se você afirma que “a bíblia é a Palavra de Deus, absoluta, inspirada, infalível, harmônica, inerrante e
suficiente” está promovendo uma relativização dela com base nesses princípios teológicos “recentes”. Ou
seja, cria algumas premissas e faz a bíblia se encaixar neles (relativizando inclusive todo o complexo
processo histórico de produção e formação da bíblia). Relativiza toda influência humana, as particularidades
de várias tradições e autores, a fim de que tudo ela seja o que você gostaria que fosse (embora nela mesma
nunca haja sequer uma afirmação de que ela tem essas características ou essa função). Entende agora
que até mesmo o mais fundamentalista cristão relativiza a bíblia? A única diferença entre cada um de nós
é que cada um segue critérios diferentes para promover essa relativização. Então pare de criticar alguém
apenas por ele relativizar a bíblia de forma diferente que você. Tire a trave do seu olho antes de falar do
cisco no olho do seu próximo.

Autor: Wésley de Sousa Câmara

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