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(P-515)

OS GUARDIÕES
DA SOLIDÃO

Autor
WILLIAM VOLTZ

Tradução
AYRES CARLOS DE SOUZA

Revisão
ARLINDO_SAN
(De acordo, dentro do possível, com o Acordo Ortográfico válido desde 01/01/2009)
Na Terra os calendários registram princípios de novembro do ano
3.441. Com isso, passou-se praticamente um ano desde o dia em que a
catástrofe atingiu quase todos os seres inteligentes da galáxia.
Ainda continuam reinando a miséria e o caos na maioria dos
planetas ou bases de apoio planetárias e ainda continuam chegando
pedidos de socorro do cosmo. E homens que não foram atingidos pela
radiação de imbecilização continuam realizando trabalhos sobre-
humanos para dominar o caos e para prover as massas de seus
concidadãos, dignos de pena, com o necessário para viver.
Perry Rhodan e sessenta companheiros, entre os quais Atlan,
Gucky e muitos outros velhos conhecidos, porém, colocaram para si
mesmos uma tarefa ainda mais difícil. Apoiado pela Intersolar, a nave-
capitânia de Reginald Bell, o Administrador-Geral tenta investigar o
misterioso “Enxame”, que inexoravelmente penetra cada vez mais na
galáxia, e cujos condutores também misteriosos são responsáveis pela
modificação da constante gravitacional e o retardamento das
inteligências, de âmbito galaxial, originado por isto.
No momento, Perry Rhodan está estacionado com sua pequena
Good Hope II nas proximidades do “Enxame”, para colher mais
informações preciosas.
O quanto um empreendimento destes é perigoso, fica logo
demonstrado. Milhares de gigantescos objetos voadores de repente
irrompem de dentro do “Enxame”, e as ondas estruturais ocasionadas
pela hipertransição quase destroem a nave de Perry Rhodan.
Ainda assim, a Good Hope imediatamente empreende a
perseguição dos objetos de dentro do “Enxame”. Um planeta é
rapidamente escolhido, pois os desconhecidos também voam para ele —
e um pequeno comando de desembarque da Good Hope encontra Os
Guardiões da Solidão.

======= Personagens Principais: = = = = = = =


Perry Rhodan — O Administrador-Geral manda examinar
um planeta estranho.
Alaska Saedelaere — Rastreador-chefe da Good Hope II.
Dalaimoc Rorvic — Um homem é acordado de modo pouco
cuidadoso.
Tatchcr a Hainu — Um nativo de Marte.
Cucula Pampo — Um musicista “progressista”.
Sandal Tolk — Um homem fica para trás, por causa da
vingança.
1

Era pouco antes das sete horas quando cheguei ao convés-B da Good Hope II, para
visitar Dalaimoc Rorvic em sua cabine. O serviço de Rorvic começava às sete, mas o soar
da instalação de intercomunicação não devia ter sido, absolutamente, suficiente para
acordá-lo. Eu também me havia atrasado e corri pelo corredor, para não chegar tarde, de
modo algum.
Diante da cabine de Rorvic eu parei, para escutar. Estava quieto como numa
sepultura, mas isso não era anormal, pois Rorvic também se destacava em estado
acordado, por absoluto silêncio.
Eu bati com o punho fechado contra a porta da cabine. Vinte metros distante de
mim, uma porta foi aberta, e um astronauta, bêbado de sono, olhou para o corredor.
— O senhor, outra vez! — gemeu ele.
Era evidente que ele deixara o seu serviço há poucos instantes, e tinha sido
acordado pelas minhas batidas na porta. Ele vestia apenas as calças, e logo saiu para o
corredor, indeciso, se devia chegar às vias de fato ou se devia se contentar com alguns
palavrões. Felizmente decidiu-se pela segunda possibilidade.
— Seu anão marciano! — gritou-me ele. — Tem que fazer um barulhão desses,
cada vez?
Eu apontei com o polegar para trás de mim.
— Experimente acordar Rorvic de outra maneira!
Ele pensou nessa sugestão, sacudiu a cabeça, e retirou-se, praguejando, para a sua
cabine.
Eu dei um pontapé na porta da cabine de Rorvic. No interior da cabine, isso devia
parecer uma explosão, mas Rorvic ignorou até mesmo esse barulho.
Lancei um olhar ao relógio.
Faltavam três minutos para as sete!
Eu cometi uma indiscrição não comum a bordo de espaçonaves terranas, e abri a
porta, sem esperar por uma autorização. Era como eu já esperava.
O Capitão Dalaimoc Rorvic estava sentado, de pernas cruzadas, no chão, no meio
da cabine, e meditava. Ele tinha apenas uma toalha enrolada na cintura. Os olhos estavam
abertos, mas olhavam distâncias desconhecidas. Rorvic era um albino de mais de dois
metros de altura, que se dizia a si mesmo ser musculoso, mas que na realidade era
realmente muito gordo.
Eu fechei a porta atrás de mim.
— Dalaimoc! — chamei, suave. — Poderia, por favor, levantar-se daí?
Naturalmente ele não reagiu.
Em cima da mesa havia uma cafeteira. Ela estava vazia. Eu peguei na mesa e bati
com ela na cabeça de Rorvic.
Ele fechou os olhos, o que nele era bom sinal. Depois ele bocejou. Quando começou
a piscar os olhos eu tive esperanças de que acordaria definitivamente. Eu coloquei a
cafeteira de lado, pois temia que um dia ele poderia ficar sabendo por que sempre tinha
galos na cabeça quando eu o acordava.
Ele abriu os olhos. Desta vez seu olhar não estava dirigido a universos distantes,
mas sim a mim. Para mim sempre fora desagradável ter que aguentar o olhar desses olhos
vermelhos, mas neste instante eu temia que ele pudesse me trespassar com os mesmos.
— Bom dia! — disse eu, amigável.
Eu sabia que ele não gostava de minha voz. Ela afirmava que eu berrava. Como,
mesmo sentado, ele era mais alto do que eu, eu sempre me encontrava numa posição um
tanto desfavorável psicologicamente, quando me encontrava diante dele.
— Desapareça! — gritou-me ele.
Não é um exagero quando afirmo que no tempo que ele levou para dizer essa
palavra, eu já dera uma dúzia de pulos. Mas não era a lentidão de seu modo de falar,
sozinha, que cada vez aumentava a minha pressão sanguínea, mas também o tom de sua
voz. Eu poderia jurar que, ao contrário das outras pessoas, Rorvic falava com o peito. Sua
voz vinha das profundezas do seu peito, e quando ele pronunciava um “R”, aquilo parecia
o trovejar de uma tempestade.
Eu olhei, demonstrativamente, para o relógio.
— Já são sete horas, Rorvic!
Ele ignorou-o. Eu gostaria de poder irritá-lo, só uma única vez. Mas ele não se
agitava nunca. Pelo tempo que eu podia lembrar-me, ele não se chateara uma única vez.
Ele era fleumático, um sujeito mal-educado, sem qualquer senso de tato e sem uma
centelha de ambição.
— Dê-me minha camisa! — ordenou ele.
Eu fechei um olho.
— Eu não me lembro de ter-lhe dado essa intimidade, capitão!
Ele levantou-se. Em qualquer outro homem esse seria um processo que não
necessitaria de uma descrição.
Mas não com Dalaimoc Rorvic!
O engenheiro de ultrafrequência fazia do ato de erguer o seu corpo uma cerimônia.
Primeiramente ele flexionava os braços, depois gemia com um fervor, como se tivesse
que suspender objetos de algumas toneladas. Ao mesmo tempo ele girava a cabeça de um
modo que era um milagre que no processo não quebrava uma vértebra cervical. Depois
espichava as pernas, metia a cabeça entre os braços, e nesta posição rolava o corpo para
ficar de barriga para baixo.
Curiosamente as paredes do pequeno recinto não tremiam, com todo esse
procedimento.
Depois dessa demonstração de inacreditável flexibilidade, um espectador
desacostumado talvez esperasse que Rorvic agora começaria a girar sobre sua barriga.
Mas nada disso aconteceu. O próximo ato de Rorvic, entretanto, não era menos incomum.
Flexível, como se o seu corpo estivesse sem peso, Rorvic levantou-se num movimento
ondulante, sacudiu-se uma vez, rapidamente, e depois deixou cair os ombros.
Agora parecia novamente como se ele, no momento seguinte, fosse adormecer outra
vez. Ele arrancou a gigantesca toalha do seu corpo e a jogou sobre minha cabeça.
Ele me sorriu, superior, quando eu comecei a sapatear furiosamente sobre a toalha
no chão.
Ele arrastou-se pela cabine e pescou, de um monte de roupa jogada
desordenadamente, a sua cueca. Eu jamais entenderei como um único homem poderia
preencher uma cueca daquele tamanho, mas Rorvic o conseguia sem grandes esforços.
Depois passou uma camiseta, do tamanho da vela de um barco, pela cabeça, vestiu uma
camisa verde-clara, e depois entrou numa calça, que, ao que diziam os boateiros, dois
alfaiates-robôs tinham levado uma semana inteira para confeccionar. Eram seis minutos
depois das sete.
— Capitão! — implorei-lhe. — Apresse-se um pouco. Nós vamos ser repreendidos.
Esta perspectiva apenas provocou um rosnado de Rorvic, e quem o visse neste
momento seria capaz de jurar que em todo o Universo não havia um só homem capaz de
repreender um homem como ele.
Ele começou, passando óleo na sua careca. Este era outro de seus repugnantes
hábitos. Ele jamais explicou se passava óleo na sua careca para conseguir um crescimento
de cabelos — ainda que rarefeito — ou se gostava de ver a careca brilhando no espelho.
Finalmente ele vestira a jaqueta do seu uniforme.
— Tatcher a Hainu! — disse ele, lentamente. — O que ainda está esperando?
Ele veio ao meu encontro como uma montanha, que repentinamente começara a
andar. Eu corri para o corredor, e me preparei para as coisas desagradáveis que dentro de
poucos minutos passaria a escutar.
Alaska Saedelaere, que a bordo da Good Hope II funcionava como chefe do
rastreamento, geralmente era um chefe tratável, mas ele fazia questão de que os seus
colaboradores fossem pontuais. Mas aquilo que ele teria para dizer me chateava menos do
que a perspectiva da discussão com os dois homens, que Rorvic e eu deveríamos ter
rendido às sete horas.
Diante do elevador antigravitacional parei novamente.
— O senhor novamente vai culpar a mim! — disse eu, com raiva. — Cada vez sou
eu que tenho que escutar os desaforos.
Ele sorriu largamente e deu um pontapé na minha espinha prolongada. Eu dei um
grito e caí dentro do elevador. Os ataques de Rorvic eram pérfidos, porque seus
movimentos nunca podiam ser reconhecidos antes. Ou ele se arrastava como um
hipopótamo cansado, ou ele explodia numa ação bem objetiva.
Eu precisei de alguns segundos para corrigir minha queda sem gravidade. Rorvic
pairou para baixo, do meu lado. Ele cruzara os braços no seu peito enorme. Ele parecia
muito meigo. Pessoas que não o conhecessem poderiam ver nele o protótipo de um
benfeitor.
No convés-E saímos do elevador.
— O senhor me deu um pontapé! — gritei-lhe. — Um dia ainda vou me vingar de
todas as coisas que fez comigo.
A expressão do seu rosto mostrava claramente o que ele pensava a respeito de
sentimentos de vingança. Rorvic sabia, como nenhuma outra pessoa, expressar desprezo,
apenas deixando cair os cantos de sua boca.
Enquanto nós nos aproximávamos da central de rastreamento, Rorvic abriu a bolsa
do seu cinturão, tirou dali um cubo de concentrados e meteu-o na boca.
— Cada vez temos que desistir de uma refeição quente! — resmunguei. — Se o
senhor acordasse mais cedo, como os outros, também poderíamos comer na cantina.
Ele olhou-me, acusador.
— O senhor dá valor demais aos prazeres da carne!
— Seu hipócrita! — gritei-lhe. — Na verdade o senhor é o homem que mais come a
bordo!
— Isso não é verdade — retrucou ele, calmo. — Toronar Kasom come mais que eu.
Eu silenciei, porque na verdade não se podia ganhar dele.
Nós agora nos encontrávamos diante da entrada para a central de rastreamentos. Eu
juro que tentei de tudo, para deixar que Rorvic entrasse antes de mim, porém ele me
agarrou na nuca, levantou-me diante da porta, e me empurrou, com sua barriga, para
dentro do recinto do rastreamento.
— Bom dia! — Alaska nos saudou, no seu modo de falar meio gaguejado.
Eu abaixei os olhos, pois conhecia esse tom de voz.
— Então, Capitão a Hainu? — Saedelaere estava parado diante de uma tela de
vídeo, na qual se podia ver o “Enxame”.
Como se tudo aquilo não lhe dissesse respeito Rorvic passou por mim,
aproximando-se do seu lugar habitual, onde um técnico furioso já o esperava.
— O senhor está vinte minutos atrasado! — gritou-lhe o técnico.
O gigante bateu-lhe tranquilamente no ombro, com o que o homem quase se
ajoelhou, recuando sem maiores protestos.
E então ocorreu um daqueles acontecimentos fenomenais, que sempre despertavam
grande admiração nas redondezas de Rorvic.
O engenheiro de ultrafrequência sentou-se numa poltrona, que havia sido construída
para um homem de compleição normal.
Primeiramente Rorvic estava sentado apenas nos braços, depois escorregou,
milímetro a milímetro, mais para baixo, até finalmente estar encravado na poltrona, e
somente ainda poder mexer a parte superior do seu corpo. Um astronauta certa vez
contara que Rorvic, ao levantar-se, tinha arrancado a sua poltrona da ancoragem,
carregando-a consigo. Eu achei aquilo exagerado, mas quando vi o albino sentado desse
jeito, poderia recear algo muito semelhante.
— Estou esperando! — Isso era novamente Saedelaere.
Eu olhei para ele. Através das fendas dos olhos e da boca da máscara para a luz do
fragmento-cappin. Saedelaere me era sinistro, apesar de nunca ter feito alguma coisa que
me pudesse amedrontar. Eu simplesmente não conseguia abafar o meu mal-estar, quando
me encontrava nas proximidades do lesado por transmissor. Provavelmente muitas outras
pessoas deviam sentir a mesma coisa.
— Eu peço desculpas — disse eu. Depois olhei na direção de Rorvic. — Nós... eu...
eu não o acordei em tempo.
— O Capitão Rorvic não precisa de um despertador — retrucou Saedelaere. — Ele
é responsável por si mesmo.
Eu tinha certeza de que somente o fato de que eu fazia parte dos poucos imunes me
poupava de uma repreensão disciplinar. Desde a modificação da constante gravitacional,
que havia provocado a onda de imbecilização, usavam-se novas medidas. Elas também
eram válidas para Dalaimoc Rorvic, porém Saedelaere provavelmente já notara que não
fazia sentido pedir explicações ao albino.
Antes da catástrofe, Rorvic trabalhara para uma estação de solo, em Tahun.
Provavelmente ninguém teria a ideia de requisitá-lo para servir a bordo de uma
espaçonave, se não se precisasse de todos os mentalmente estabilizados. Eu, ao contrário,
poderia afirmar com orgulho já pertencer à tripulação da Marco Polo, participando do seu
voo para Gruelfin.
Sem dúvida Rorvic era um excelente engenheiro de ultrafrequência, sendo um dos
homens mais capazes da central de rastreamento. Eu, como galato-geólogo, somente
recebera novo treinamento depois da catástrofe, pois precisavam muito de técnicos de
rastreamento. Ninguém, na ocasião, se interessou por um galato-geólogo.
Eu sentei-me na minha poltrona. Ao contrário de Rorvic, não tinha dificuldades
com o assento, pois tenho apenas metro e meio de altura e sou magro. Como todos os
nascidos em Marte, eu tenho um peito abaulado, como um barril. O meu rosto é
entrecortado de milhares de rugas e pregas.
Eu observo os aparelhos que fazem parte do meu âmbito de serviço. Dentro de
pouco tempo eu aprendi a interpretar corretamente amplitudes nos oscilógrafos e avaliar
marcas de impulsos nos monitores de vídeo.
Este trabalho não me agradava muito, mas eu compreendi que as consequências da
catástrofe somente poderiam ser vencidas se cada um desse o melhor de si.
O meu olhar caiu no calendário automático.
Era o dia 5 de novembro de 3.441 — tempo terrano!
Há seis dias atrás eu completara cinquenta e três anos de idade.
Eu esquecera completamente o meu aniversário.
Eu olhei para onde estava Dalaimoc Rorvic. Ainda me lembrava exatamente da
primeira vez em que nos encontramos. Ou seja, eu me encontrei com ele, pois naquela
ocasião ele me ignorou solenemente.
Eu estava embaixo de uma ducha nos banheiros da tripulação, quando Rorvic
entrou, para também tomar um banho. Eu levei um susto quando ele veio ao meu
encontro, através do vapor. A sua pele branca luzia com o suor. Ele me empurrou para o
lado, sem mais nem menos.
— Esta ducha é minha! — chamei-lhe a atenção.
Ele começou a girar embaixo do jato de massagem, parecendo que se sentia muito
bem.
Controle nunca foi uma das minhas maiores forças.
Eu saltei em cima dele. Fui catapultado de volta, como se tivesse batido numa
parede de borracha.
— Ó! — fez Rorvic. — Será que eu pisei no senhor?
Desse momento em diante eu decidi que algum dia eu me vingaria dele. Mas a cada
semana que se passava as minhas esperanças ficavam menores, pois um homem como
Rorvic era invencível — mesmo pelo fato de que lhe era totalmente indiferente se
ganhava ou se perdia.
***
Nós voávamos, com nosso cruzador, a Good Hope II, ao longo do “Enxame”.
Nunca antes nós ousáramos nos aproximar tanto dessa formação exótica. Perry Rhodan
queria, em qualquer circunstância, obter melhores resultados de rastreamento.
Naturalmente o escudo hiperenergético e o escudo paratrônico de nossa nave estavam
ligados, mas a maioria de nós duvidava de que isso era uma proteção suficiente.
Apesar de tudo, tivemos sorte. Nós conhecemos melhor o caráter do escudo
energético que envolvia o “Enxame”. O que da distância parecia uma reunião cristalina e
brilhante de bolhas da sabão era, na realidade, uma formação totalmente alcantilada! Nós
descobrimos que quase todas as unidades que se encontravam dentro do “Enxame”
também eram produtores de energia para a sustentação do escudo de proteção. Entretanto
ninguém sabia o que eram realmente as “unidades” mencionadas. Poderia tratar-se de
sóis, planetas, luas, astronaves, estações e quaisquer outras coisas. Como todos estes
corpos celestes e voadores muito diferentes dentro do “Enxame”, mantinham posições
evidentemente aleatórias, o escudo em volta do “Enxame” tinha esquisitos abaulamentos
para fora e irregularidades.
A estrutura do escudo protetor resultava do posicionamento dos produtores isolados
de energia. Em muitos lugares tinham-se englobado de dez a cinquenta unidades
originadoras de energia. Deste modo tinham sido criadas formações estranhas que,
interligadas, pareciam peças de esferas, ou como picos rochosos erguendo-se no espaço.
Há um par de horas nós estávamos ocupados em goniometrar fragmentos isolados
do escudo, para medi-los e catalogá-los. Deste modo, nós esperávamos poder descobrir se
o escudo era submetido a algumas modificações ou se sua forma se mantinha constante.
Era um empreendimento muito cansativo, mas nós tínhamos que nos ater àquilo que
realmente podia ser medido.
O fato de estarmos voando tão perto do “Enxame” provocou na tripulação muita
tensão e agitação. O exotismo do objeto que nós examinávamos era a mais forte razão
para a situação psíquica da tripulação.
A bordo o assunto era discutido intensamente, apesar de ninguém poder esquecer-se
da situação geral funesta, com todas as adivinhações que se faziam. Como antes, vinham
de todas as partes da galáxia notícias arrasadoras. Da existência do Império Solar só se
podia falar no condicional ainda.
Eu trabalhava oito horas seguidas na central de rastreamento e depois tinha cinco
horas livres. Este ritmo valia para quase todos os membros da tripulação. Somente os
portadores de ativadores celulares ficavam excluídos do mesmo. Eles praticamente não
precisavam de sono.
Pouco antes da meia-noite, contagem de tempo terrano, houve um acontecimento
que nos obrigou a desistir provisoriamente da tarefa que nos havíamos colocado.
Para mim, este acontecimento ainda deveria ser de significação bem maior do que
para a maioria dos outros membros da Good Hope II.
2

Um acaso pouco benévolo quis que Amo Muluren, pouco antes das vinte e três
horas, tivesse um ataque de cólica dos rins, que não foi possível debelar com remédios
comuns. Amo Muluren teve que ser ligado por duas horas no rim artificial de um medo-
robô. Todos que viam um mau presságio neste incidente acabaram tendo razão.
Amo Muluren tinha ordenado as tiras de avaliação da positrônica da central de
rastreamento, passando todos os resultados para o computador de cálculos de bordo. Este
era um trabalho que qualquer pessoa a bordo poderia liquidar.
Porém, apesar de já termos que aturar Dalaimoc Rorvic na central de rastreamento,
ainda nos mandaram Cucula Pampo.
Antes da catástrofe, o músico-favalo tinha trabalhado a bordo de luxuosas
astronaves de passageiros.
Cucula achava que era um grande artista, mas eu afirmo que ele está sozinho com
esse ponto de vista. As pessoas, a quem se apresentava, apenas não encontravam a
coragem de dizer-lhe o que ele era na realidade — um diletante insuportável, com um par
de espantosas capacidades artísticas.
Quando Cucula Pampo entrou na central de rastreamento, para tomar o lugar de
Amo Muluren, eu instintivamente retive a respiração. Pampo tinha a altura de Rorvic e a
magreza de Saedelaere. Esta mistura infeliz era arredondada pior uma cabeça de formato
oval, da qual caíam até o seu traseiro algumas madeixas de cabelos louros desgrenhados.
A principal característica de Pampo, entretanto, era um maxilar superior muito saliente,
do qual sobressaíam dois dentes enegrecidos, da grossura de um dedo, num ângulo de 45
graus. Pampo não conseguia tapar estes dentes com os lábios.
Outras pessoas teriam mandado arrancar dentes como estes; Pampo entretanto os
cultivara, porque precisava deles em seu trabalho de músico-favalo. Com eles, ele
aparava os seus exóticos instrumentos, lançando-os novamente no ar. Cada dente
conseguia tirar um som especial desses instrumentos.
Cucula Pampo ficou parado na entrada da central de rastreamento, olhou em torno,
constrangido, e torceu timidamente o seu corpo. Jamais eu tinha visto um homem mais
feio.
Pampo disse com voz rangente:
— Eu estou aqui no lugar de Amo Muluren!
Qualquer outro teria mandado Pampo de volta, porém Saedelaere levantou-se,
conduziu Pampo para o lugar de Muluren e explicou-lhe o que tinha para fazer. Pampo
começou a trabalhar e depois de algum tempo nós o tínhamos esquecido. A constante
concentração, que era necessária no nosso trabalho, não nos permitia ocupar-nos com
outras coisas por muito tempo.
E então aconteceu.
Repentinamente ocorreram violentos abalos estruturais, que estavam acima da
capacidade de nossos aparelhos. Milhares de unidades, até então membros do gigantesco
“Enxame”, saíram de dentro do escudo protetor e entraram, juntas, em hipertransição.
As ondas de choque pentadimensionais ocorridas com isto teriam destruído a Good
Hope II, se todos os seus escudos de proteção não estivessem ligados.
Apesar disso, a nave foi sacudida violentamente. Todos os sensores estruturais a
bordo foram desligados pelos computadores positrônicos, desta maneira sendo poupados
de uma destruição.
Honrou a tripulação que, mesmo nesta situação muito tensa, ela permaneceu
inteiramente calma, nestes segundos. Ninguém a bordo abandonou o seu lugar, apesar do
cruzador ser violentamente sacudido. Mais tarde verificou-se que os escudos protetores
quase tinham ruído.
Tudo passou tão depressa como tinha acontecido.
Eu estava sentado na minha poltrona, com o coração batendo forte, e segurando-me
firmemente nos braços do cadeirão.
Eu esquecera completamente dos meus instrumentos. Somente agora voltei-me
novamente para eles. Como eu, todos os outros na central de rastreamento também
tinham reagido.
Só Dalaimoc Rorvic não!
Um par de minutos mais tarde, ele nos forneceu todos os dados sobre a zona de
reentrada dos objetos voadores estranhos.
***
Poucos minutos depois que Rorvic entregara todos os documentos a Saedelaere,
Perry Rhodan e Atlan apareceram, para se informarem corretamente.
— O senhor demonstrou uma assombrosa presença de espírito — Rhodan elogiou o
albino. — Estes dados são extremamente valiosos para nós.
— Sim — disse Rorvic, lacônico.
Aparentemente ele estava sentado, indiferente, na sua poltrona, olhando fixamente
para os instrumentos. Sua careca luzia à luz das inúmeras lâmpadas.
— Eu estou certo de que a região-alvo dos objetos voadores estranhos saídos do
“Enxame” não foi escolhida aleatoriamente, mas já estava fixada previamente — disse
Saedelaere. — Alguns milhares de objetos abandonaram o “Enxame”, para executar uma
tarefa qualquer.
— Eu concordo com o senhor — respondeu Rhodan. — Geralmente o surgimento
de objetos voadores de dentro do “Enxame” vem ligado a dificuldades para nós. Pense
apenas nos Manips e nos Discoverers.
— O senhor acha que se trata, novamente, de Manips? — perguntou o Professor
Waringer, que agora também apareceu na central de rastreamento, para o lesado por
transmissor.
Saedelaere encolheu os ombros.
— Parecem ser objetos voadores decisivamente maiores — ouviu-se a voz de
Rorvic.
Rhodan ergueu as sobrancelhas.
— O senhor parece ter certeza de que está dizendo.
Rorvic bateu com a vértebra de um dedo indicador nos instrumentos. Para um
homem como ele, isso já podia ser comparado com um gesto temperamental.
— Eu observei e rastreei essas coisas.
Um dos técnicos do rastreamento trouxe os primeiros resultados dos cálculos e
entregou-os a Rhodan.
O Administrador-Geral olhou para as tiras das avaliações.
— A região da reentrada dos objetos voadores fica nas regiões periféricas do sul da
galáxia. Os objetos formam ali um quarto de círculo imaginário. Nenhum deles afastou-
se mais de três mil anos-luz do “Enxame”
— Eu espero dificuldades — interveio Atlan. — Certamente os habitantes do
“Enxame” pretendem executar novamente algumas manipulações.
— Espero que você esteja enganado — respondeu Rhodan. — De qualquer maneira
precisamos interromper o trabalho que vínhamos fazendo até agora.
Cada um de nós sabia o que Rhodan pretendia fazer.
— Nós vamos avançar, com a Good Hope, para a região de reentrada — prosseguiu
ele. — Talvez possamos entrar em contato com os estranhos, ou então fazermos
interessantes observações.
Eu acredito que ninguém a bordo estava exatamente ansioso para voar para uma
região na qual vagavam muitos milhares de objetos voadores saídos do “Enxame”. Por
outro lado, cada um de nós via a necessidade de um empreendimento semelhante.
— Os documentos, que se baseiam nos resultados das medições do Capitão Rorvic,
permitem-nos reconhecer claramente onde se encontra o sistema mais próximo, que
recebeu uma visita dos objetos do “Enxame”. — Rhodan olhou de modo aprovador para
Rorvic. — Vamos chamar este sistema solar de Estrutura-Alfa. Ele fica a novecentos e
trinta e sete anos-luz daqui. Um objeto voador grande, saído do “Enxame”, está a
caminho de lá. Nós v amos chamar o mundo, pelo qual os estranhos se interessam, de
Teste Rorvic.
Rorvic estava sentado numa poltrona como um sapo gordo e anuiu satisfeito.
Assim que Rhodan e Atlan tinham deixado a central de rastreamento, eu rolei com
minha poltrona para o lado de Rorvic.
— O senhor certamente nunca, nem em sonhos, pensou que um dia pudessem
chamar um planeta com o seu nome.
Rorvic pigarreou repetidamente. As banhas no seu corpo começaram a se mexer.
— Era apenas uma questão de tempo.
Eu o olhei fixamente.
— O senhor agradece este fato assombroso a uma feliz circunstância. Cada um de
nós pensou em fuga, no momento dos pesados tremores, somente o senhor ficou sentado,
olhando fixamente os seus instrumentos, porque sabia que para o senhor não havia
escapatória, caso a nave explodisse.
Rorvic retrucou, calmamente:
— Se quiser, modificamos o nome do planeta em questão para Teste a Hainu.
Talvez se trate de um mundo deserto.
— Eu não estou muito interessado em que um mundo qualquer leve o meu nome —
afirmei.
Neste momento, Saedelaere interveio.
— Por favor volte para o seu lugar, Capitão Tatcher a Hainu. Logo vamos partir
para Estrutura-Alfa.
Só me restou atender à ordem de Saedelaere.
***
Estrutura-Alfa era um sol amarelo pequeno, orbitado por cinco planetas. De acordo
com critérios humanos, somente um desses cinco planetas era interessante. O planeta
número dois era o único que possuía uma atmosfera de oxigênio. Nossos rastreamentos
demonstraram que Teste Rorvic evidentemente ainda era importante por outras razões.
Nas investigações da superfície do planeta nossos sensores de massa e de energia
responderam decisivamente mais que nos outros quatro mundos.
Os valores-padrão eram excedidos em muito, o que podia significar que em Teste
Rorvic existia uma civilização com desenvolvimento técnico. Mas também poderia
significar que estranhos haviam acabado de chegar a este mundo.
Perry Rhodan deu ordens para que se levasse a Good Hope II mais para perto do
planeta. A nave deu início a uma órbita larga, e nós na central de rastreamento agora
tínhamos possibilidade de examinar a superfície do planeta pormenorizadamente.
— Raramente eu vi um mundo que correspondesse tanto a nossas noções ideais —
anunciou Saedelaere, já pouco mais tarde, da central de comando. — Teste Rorvic tem
um diâmetro de vinte e dois mil quilômetros e possui uma gravidade de praticamente um
gravo. A temperatura média é de vinte e nove graus centígrados, e para uma rotação o
planeta necessita de pouco menos de vinte e quatro horas.
As imagens nos nossos monitores ainda contribuíram para reforçar estas
impressões.
Em Teste Rorvic havia imensos mares mornos, dois polos cobertos de gelo,
montanhas, florestas e savanas. Por enquanto, entretanto, não podíamos encontrar
qualquer traço de astronaves grandes pousadas, vindas do “Enxame”. Porém quando
passamos do lado noturno para o diurno, descobrimos uma outra coisa.
Em Teste Rorvic havia inúmeros espaçoportos gigantescos, que davam a impressão
de estarem completamente abandonados. As imensas pistas de pouso estavam vazias. Os
edifícios em volta não pareciam habitados. Mesmo assim, os espaçoportos pareciam
intactos e limpos. Parecia que tinham sido evacuados há muito pouco tempo.
As imagens que nós captávamos eram transferidas para a central de comando.
— Lá embaixo reina uma ordem exemplar — verificou Saedelaere. — Eu apenas
me pergunto a quem devem servir estas condições.
Os espaçoportos abandonados despertaram um mal-estar em mim. Se em algum
lugar houvesse traços de decadência, a explicação seria simples. Deste modo, porém, nós
não sabíamos o que havia acontecido com os donos destas instalações.
— Talvez eles tenham fugido, quando o objeto do “Enxame” chegou aqui —
raciocinou Cucula Pampo.
— Neste caso, nós os teríamos, forçosamente, rastreado — retruquei.
— Hainu tem razão — concordou Saedelaere. — Além disso, nós ainda não
descobrimos o objeto voador que veio do “Enxame”.
A Good Hope II rodeou Teste Rorvic mais algumas vezes, em órbitas diferenciadas.
Foram descobertos ainda outros espaçoportos, todos nas mesmas condições que os que já
haviam sido registrados.
Também na central de comando não se tinha uma resposta para a pergunta que
ocupava a todos nós.
Teste Rorvic, visto do cosmo, parecia um belo quadro a óleo. Somente os
espaçoportos abandonados nos incomodavam naquele quadro paradisíaco.
Finalmente Alaska Saedelaere desenvolveu uma teoria.
— Não é possível que estes espaçoportos foram construídos para mais tarde
poderem receber visitantes?
— O senhor está pensando em visitantes do “Enxame”?
— Por que não? — Saedelaere apontou para as telas de vídeo. — Agora apenas
precisaríamos saber como estão as coisas nos outros mundos, se objetos do “Enxame”
chegaram ali.
Rhodan, que escutou pelo intercomunicador, ponderou:
— Isso significaria que alguém na galáxia sabia da chegada do “Enxame”, e fez
preparativos correspondentes.
— Tem razão — concedeu o homem da máscara. — Porém lembre-se da teoria de
que o Homo superior é uma reação da Natureza à chegada do “Enxame”.
— Eu não acredito muito nisso — declarou Rhodan.
— Mesmo assim — Saedelaere defendeu suas reflexões — Esta ideia vale a pena
uma reflexão. Se os novos homens realmente são uma reação natural, o “Enxame” deverá
surgir em nossa galáxia, em longos espaços de tempo, mas recorrentemente.
Eu olhei para a tela de imagem no alto, onde se desenhava o rosto de Rhodan.
O Administrador-Geral sorria.
— Com essa teoria temos que contar com bilhões de anos. Quem é que poderia
manter em ordem, neste espaço de tempo, instalações como a dos espaçoportos em Teste
Rorvic? Não, eu não acredito numa relação entre estas instalações e os habitantes do
“Enxame”. Provavelmente é um acaso termos topado com estes espaçoportos e com
habitantes do “Enxame”.
Eu vi nitidamente que Saedelaere não estava convencido, ele se apegaria à sua ideia,
até que lhe provassem o contrário.
Havia um outro problema que me preocupava: Onde estava aquele, entre os muitos
milhares de objetos voadores, que penetrara no sistema Estrutura-Alfa?
Rhodan tomou uma nova tática, em minha opinião, ainda mais perigosa. Ele
mandou irradiar mensagens de rádio, todas destinadas a eventuais habitantes de Teste
Rorvic.
Entretanto não recebemos uma resposta, apesar de terem sido empregados símbolos
usuais em toda a parte na galáxia. Rhodan mandou repetir as mensagens de rádio, durante
cinco órbitas, sem que houvesse qualquer reação.
Teste Rorvic parecia abandonado por seus ex-habitantes inteligentes.
Mas por que eles tinham ido embora?
E para onde?
Uma coisa que chamava atenção era a falta de cidades e de campos plantados.
Havia apenas enormes espaçoportos, em volta dos quais se agrupavam inúmeros edifícios
de diversos tamanhos.
Talvez Teste Rorvic era um mundo, no qual as naves de um povo desconhecido
faziam escala. Mas para este fim, um espaçoporto teria sido suficiente.
Quanto mais eu refletia, mais ficava convencido de que ainda estávamos muito
longe da solução do enigma.
Por seis horas orbitamos Teste Rorvic, sem que acontecesse alguma coisa. A
superfície do planeta continuou sem modificações. Nas telas dos monitores nós víamos as
pistas de pouso que pareciam sinistras na sua limpeza esterilizada, e na qual não se via
uma única cosmonave pousada.
Depois de seis horas, Perry Rhodan decidiu mandar uma missão de comando para
Teste Rorvic.
O Capitão Dalaimoc Rorvic apresentou-se voluntariamente, e observou que ele,
como descobridor deste mundo paradisíaco, tinha um certo direito de ser o primeiro a pôr
os pés naquele solo estranho.
Perry Rhodan concordou e recomendou a Rorvic que levasse dois ou três homens de
confiança consigo. Sandal Tolk, o guerreiro bárbaro, que perdera seus pais, seu avô e sua
mulher através dos Pequenos Purpurinos, devia acompanhar Rorvic em qualquer caso.
Nestes últimos dias, Sandal estava ficando cada vez mais rabugento. Rhodan receava que
o jovem acabaria mergulhado em melancolia, se não tivesse uma oportunidade de ocupar-
se com uma atividade qualquer. Sandal não permitia que ninguém o fizesse desistir de
sua ideia de uma vingança. Apesar de já ter várias sessões de hipno-análise atrás de si,
não queria entender que não fazia sentido que ele lutasse solitariamente contra um poder
como o do “Enxame”.
Rhodan tinha esperanças do que, em Teste Rorvic, Sandal encontrasse oportunidade
para se acalmar. Isso o ajudaria por algum tempo.
Eu só ouvia a conversa de Rhodan com Rorvic com meia atenção, pois continuava
atraído pelas imagens da superfície do planeta.
De repente Rorvic estava atrás de mim.
Como sempre ele se aproximara silenciosamente. Eu vi a sua imagem refletida na
tela apagada de um monitor de vídeo.
— Levante-se, capitão! — disse ele.
Eu lancei um olhar por cima do ombro.
— Para quê? Eu estou sentado muito comodamente aqui.
Rorvic olhou para mim como se quisesse me hipnotizar, e dos seus olhos vermelhos
realmente saía uma espécie de força que me impressionava.
— Eu estou reunindo minha equipe — anunciou ele.
— Muito bem! — disse-lhe eu. — Desejo-lhe muita sorte no seu empreendimento.
Ele colocou a mão no meu ombro, e com isso quase quebrou-me a clavícula.
— O senhor vai me acompanhar.
Eu estremeci, como se tivesse sido atingido por um choque elétrico.
— Não vai conseguir nada com isso, Rorvic. Rhodan não vai permiti-lo. O senhor
precisa de Kasom ou Tolot, ou talvez de Fellmer Lloyd.
Rorvic me levantou de dentro da poltrona como outros homens teriam erguido uma
caixa de papelão.
— O senhor vai me acompanhar.
Alguma coisa na expressão do seu rosto me fez reconhecer que eu não tinha
nenhuma chance de lhe escapar. Ele faria a sua vontade. Enquanto eu ainda estava
pensando, cheio de horror, o que vivenciaria com esse gigante gordo, Rorvic me deu o
segundo choque.
— Cucula Pampo também vai me acompanhar — disse ele. Talvez, de vez em
quando, ele poderá nos divertir um pouco.
Eu fechei os olhos e esperei ansiosamente que a voz de Rhodan, pelo
intercomunicador, colocasse Rorvic no seu devido lugar. Mas nada aconteceu. Para
Rhodan parecia que a tarefa que nós teríamos que solucionar não era perigosa, caso
contrário ele teria intervindo neste momento.
Em pensamentos eu já me via a bordo do Special-Space-Jet com oito metros de
diâmetro. Rorvic estaria comigo, o fleumático fatalista. Um homem que não sabia nada
mais do que fazer uma música maluca nos acompanharia. Para completar a catástrofe,
Rhodan nos dava para levar também um guerreiro semi-selvagem, que atirava suas setas
em tudo que era vermelho e se mexia.
Eu repuxei a cara, dolorosamente.
Toda a responsabilidade recairia sobre os meus ombros estreitos.
3

Cucula Pampo entrou no hangar sobre suas pernas finas, como um feio pássaro
gigante e descarregou seu equipamento diante da eclusa. Ele olhou de Rorvic para mim e
sorriu, acanhado.
— Eu estou pronto — grasnou ele.
Eu virei a cara, pois se olhasse para ele mais de um par de segundos, provavelmente
acabaria chorando aos berros. Rorvic parecia não conhecer estas aversões, pois ele
saudou o músico-favalo como a um velho amigo.
Sandal estava acocorado perto da estreita eclusa. Seus olhos dourados brilhavam na
semi-escuridão. Diante dele havia uma aljava oval, para a guarda de cem flechas, que ele
mandara confeccionar a bordo da Good Hope II. As flechas consistiam de uma matéria
plástica que não se deixava dobrar, nem influenciar por quaisquer condições ambientais.
As pontas das flechas consistiam de aço-terconite e tinham o comprimento de um dedo.
Atlan nos contara que Sandal ficava deitado sobre estas flechas, enquanto dormia. O
semi-selvagem não queria perder nenhuma dessas armas, para ele muito valiosas.
Dalaimoc Rorvic coçou-se atrás da orelha.
— Vamos partir — disse ele.
Ele apanhou o amarrado do seu equipamento do chão e arrastou-o na direção da
eclusa. Fascinado, eu fiquei olhando como ele se esgueirou através da eclusa, com o seu
corpo obeso, sem ter dificuldades para isso.
Atlan, que se encontrava no hangar, para se despedir de nós, apontou para um bule
que se encontrava perto do meu traje protetor.
— Isso lhe pertence?
— Sim, sir!
Ele olhou-me, estranhando.
— Para o que o senhor precisa de um bule, nesse empreendimento?
Eu gostaria de poder dizer-lhe a verdade, mas calculei que Rorvic me escutaria,
através da eclusa aberta.
— Eu sempre o levo comigo — declarei, desconversando. — Afinal, cada um tem
consigo alguma coisa da qual não gosta de se separar.
Atlan olhou para o bule. Evidentemente ele estava refletindo que tipo de
especialidade poderia destacá-lo. Felizmente ele não fez maiores perguntas.
Sandal levantou-se silenciosamente, e com passadas oscilantes dirigiu-se para a
eclusa. Ele oferecia uma imagem de força integrada, mas o seu rosto sombrio mostrava
nitidamente em que estado psíquico ele se encontrava.
— Ele vai nos causar dificuldades! — profetizei.
— É bem possível — concordou Atlan. — Mas se ele ficar mais tempo a bordo da
Good Hope, ele criará dificuldades ainda maiores. Rhodan e eu já estamos temendo, há
dias, que Sandal pudesse perder o controle sobre si mesmo. Ele precisa de uma válvula
para o seu ódio represado. Retê-lo a bordo significaria matá-lo espiritualmente.
Eu compreendi. O semi-selvagem nos acompanharia, não importando o que eu
pudesse contra-argumentar. Rorvic meteu a cabeça pela eclusa e nos sorriu.
— Nós estamos prontos!
Eu lancei-lhe um olhar significativo, que ele entretanto não correspondeu. Ele e
Rhodan pareciam achar que Rorvic era um sujeito formidável, porque, por acaso,
rastreara um sistema planetário, no qual penetrara um objeto voador vindo do “Enxame”.
— Está na hora! — disse o Lorde-Almirante.
Hesitante eu entrei no pequeno disco voador espacial. Rorvic se metera dentro do
assento do piloto, e manipulava os instrumentos com seus dedos parecendo salsichas.
— Não vá quebrar nada! — disse eu, venenoso.
Pampo riu melodicamente. Nos bolsos do seu cinturão tilintaram seus instrumentos-
favalo.
Eu senti um frio na espinha.
Sandal estava acocorado junto do assento do navegador e olhava fixamente para
fora da cúpula de plástico blindado.
Eu tomei lugar diante da aparelhagem de rádio. Atlan ainda nos acenou uma vez, e
abandonou o pequeno hangar, no qual havia dois space-jets com um diâmetro de oito
metros.
No mesmo instante foi feita a ligação de rádio com a central de comando. Nos
monitores apareceu o rosto de Perry Rhodan.
— Vamos ficar em constante contato pelo rádio! — ordenou ele. — Os senhores
apenas têm a tarefa de fazer algumas investigações, todo o resto será feito por comandos
que irão mais tarde. Uma câmara-robô, com capacidade de voo, os acompanhará.
Eu fiquei aliviado, porque não esperava coisas impossíveis de nós.
Rorvic estava dependurado molemente no assento do piloto, parecendo dormir.
Com as pálpebras semicerradas ele observava os controles. O músico-favalo Cucula
Pampo ao contrário parecia nervoso demais. Ele tateava nos fechos do seu uniforme.
O jato pairou sobre seus campos antigravitacionais para diante da eclusa do hangar,
que poucos instantes depois se abriu. Como capitão da Frota Solar, Dalaimoc Rorvic
possuía um treinamento completo de piloto, mas mesmo assim eu me perguntava se ele
saberia voar direito aquele jato.
Nós nos afastamos bem da Good Hope II. Não havia razões para reclamações.
Rorvic se mantinha silencioso como uma ostra. Talvez ele voava a micronave meio
que dormindo.
Sandal estava acocorado no chão, abraçado com o seu arco. Os seus músculos se
destacavam sob a sua pele moreno-clara. Os seus antepassados eram saltadores,
ertrusianos, aconenses, arcônidas de Glynth e terranos. Para noções de beleza humanas,
Sandal era um homem muito bonito, e na Terra ele certamente teria atraído muitos
olhares.
Ele pareceu sentir que eu o estava olhando, pois ergueu a cabeça e respondeu ao
meu olhar.
Eu li um ódio indomável, mas também orgulho e uma certa bondade, no seu rosto.
Em outras circunstâncias, Sandal poderia ter-se tornado um bom amigo nosso. Mas o
bárbaro não tinha vontade de fazer amizades. Tudo que o interessava era a sua vingança.
Eu senti pena dele.
Ele era apenas um simples semi-selvagem, sem qualquer chance de encontrar, ou
mesmo justiçar, os assassinos dos seus amigos. Mas seria um esforço inútil querer
explicar-lhe isto. Ele pensava e julgava apenas de conformidade com os valores do seu
povo.
Eu abaixei a cabeça, pois os seus olhos cor de ouro não queriam mais me soltar.
— Eigon! — disse Sandar, no seu idioma.
Ele cuspiu no chão, e jogou a cabeça para trás.
Ninguém perguntou a ele o que esta palavra queria dizer.
Rorvic parecia não notar nada do que acontecia. Ele pilotava o space-jet numa
órbita em tomo do Teste Rorvic.
A voz de Rhodan que saía do alto-falante do rádio normal arrancou-me dos meus
pensamentos.
— Em Teste Rorvic tudo permanece calmo. Prepare tudo para uma aterrissagem.
Já havia sido combinado que devíamos descer na beira de um espaçoporto.
Naturalmente também poderíamos pousar em algum deserto ou nas margens dos grandes
mares, mas ali dificilmente poderíamos descobrir alguma coisa.
Eu olhei para a tela de vídeo do rastreador. Nós sobrevoávamos um dos dois
grandes continentes, no qual tínhamos rastreado três espaçoportos. Dalaimoc Rorvic fez o
jato mergulhar na atmosfera. A nave-auxiliar sacudiu um pouco, mas Rorvic compensou
estes movimentos oscilatórios sem maiores esforços.
Quando pairávamos por cima de um dos espaçoportos, o meu mal-estar
transformou-se numa surda sensação de medo. A visão daquele espaço sem vida, no qual
os construtores do espaçoporto haviam pintado inúmeros lotes, parecia fantasmagórico. A
pista de pouso era de cor cinza-clara, e a pintura dos edifícios agrupados em volta
mudava de um branco brilhante dos pavilhões baixos para um azul-escuro nas torres e
nos edifícios altos. A arquitetura não era especialmente estranha. Podia-se pensar que
antigamente, em alguma ocasião, seres humanos tivessem vivido lá embaixo.
Para onde eles tinham sumido?
Os espaçoportos davam a impressão de que seus construtores voltariam a qualquer
momento.
Existiam entre os habitantes do “Enxame” e os gigantescos espaçoportos de Teste
Rorvic determinadas conexões?
A câmara-robô pairava acima da nacele do space-jet. Suas imagens, junto com
nossa câmara externa de bordo, eram transmitidas para a central da Good Hope II, de
modo que também ali eles podiam ter uma imagem exata dos arredores.
— Tudo permanece calmo! — avisaram da nave-mãe. — Continua não havendo
indícios da existência de seres vivos.
— Continuam vigilantes! — advertiu-nos Rhodan.
O space-jet agora voava numa altura de mil metros acima da beira do espaçoporto.
Entre as edificações do espaçoporto, e uma extensa floresta de árvores imensas com
folhagem marrom-clara, corria um rio para o mar que ficava cerca de mil milhas distante.
Era de manhã cedo, o sol devia ter-se erguido há cerca de uma hora talvez. O céu estava
praticamente sem nuvens.
Mesmo assim, alguma coisa me irritava nessa imagem de completa paz, apesar de
não saber dizer o que era.
Eu olhei para Rorvic, para verificar se ele mostrava alguma demonstração de
nervosismo. O engenheiro de ultrafrequência, entretanto, não mostrava qualquer reação.
Com Cucula Pampo era diferente. Suas mãos estavam constantemente ocupadas
com alguma coisa. Ele olhava, inquieto, de um lado para o outro.
Os meus olhos seguiram adiante e ficaram presos em Sandal. O semi-selvagem dava
a impressão de estar muito tenso.
Eu me recostei na poltrona. Eu esperava que depois do pouso não tivéssemos
dificuldades. Não conseguia imaginar que meus acompanhantes poderiam ser de grande
ajuda.
— Vamos pousar junto ao rio — declarou Rorvic.
Eu transmiti sua resolução aos homens da Good Hope II.
— Uma boa ideia — disse Rhodan. — Então estarão bastante próximos do
espaçoporto, sem pousarem diretamente nas pistas de aterrissagem. Além disso, têm a
possibilidade de investigarem o rio e a floresta próxima.
Eu ergui os ombros, pois não podia imaginar que havia alguma coisa para se
examinar no rio ou na floresta.
O space-jet desceu rapidamente para a superfície do planeta. Eu já estava temendo
que acabaríamos tendo uma aterrissagem forçada, porém Rorvic colocou o disco voador
suavemente na beira do rio. Bem perto do nosso local de pouso havia um declive
íngreme, no qual cresciam gramíneas altas. A floresta, do outro lado do rio, parecia
sombria. Alguns animais, que se adiantavam alternadamente voando e saltando,
chamaram minha atenção por um instante.
Rorvic virou-se para trás.
— Chegamos!
— Vamos desembarcar logo? — quis saber Pampo, agitado.
Sandal ergueu-se do lugar onde estava acocorado para olhar através da cúpula da
nacele. No seu rosto via-se uma notável modificação. A floresta e o rio pareciam lembrar-
lhe a sua pátria. Ele ergueu-se nas pontas dos pés e emitiu um queixume. Depois colocou
um punho fechado junto do peito e pôs-se em movimento na direção da eclusa.
Eu me pus no seu caminho.
— Um instantinho ainda, amigo! Ainda não recebemos autorização para deixarmos
o jato.
Ele empurrou-me para o lado, sem me dar atenção, e quis acionar o mecanismo da
eclusa.
E então Rorvic estava do seu lado. Eu olhei, espantado, para o assento do piloto,
onde o albino há pouco ainda estivera sentado, aparentemente dormitando.
Sandal esticou um braço, querendo empurrar Rorvic para o lado, exatamente como
fizera comigo.
Ele poderia ter tentado, do mesmo modo, empurrar uma montanha para o lado.
Sandal emitiu um som de espanto e olhou para Rorvic. Depois baixou a cabeça.
Parecia que ele ia iniciar um ataque, porém logo relaxou-se e ficou parado ao lado da
eclusa, esperando.
— Vamos esperar até termos certeza de que não haja ninguém nas proximidades —
disse Rorvic, com sua voz arrastada.
— Está havendo dificuldades? — perguntou Rhodan, pelo rádio.
— Não, sir! — respondi. — Está tudo em ordem.
Pampo disse:
— Eu mal posso esperar para chegar lá fora.
Eu olhei através da cúpula. Entre edifícios na beira do espaçoporto, eu podia ver
trechos da pista de pouso abandonada. Chamaram minha atenção algumas elevações
parecidas com pedestais, que surgiam do solo por toda a parte.
— Fellmer Lloyd acaba de me dizer que está captando fracos impulsos mentais —
informou Rhodan, pelo rádio. — Entretanto ele não consegue localizá-los, nem sabe de
onde eles vêm. De qualquer modo devem ter muito cuidado.
Nós fizemos as medições costumeiras. Depois examinamos nossos trajes de
proteção. Os capacetes não precisavam ser fechados, pois o ar do lado de fora do space-
jet era respirável.
— Vamos desembarcar! — decidiu Rorvic.
Eu peguei o aparelho de rádio portátil, com o qual pretendíamos manter contato de
rádio permanente com a Good Hope II.
Rorvic abriu a eclusa. Um ar relativamente fresco penetrou na cabine.
O albino abandonou o jato e foi o primeiro a pôr os pés em solo estranho. Da eclusa
eu pude observar como Rorvic olhava em volta. Eu o segui, fogo depois.
Ele me contemplou com um sorriso fraco.
— Tudo em ordem, capitão!
Eu anuí.
Pampo saiu da eclusa, depois veio Sandal. O bárbaro não nos deu atenção, mas
passou correndo por nós, pelo declive da margem abaixo, jogando-se, junto com as suas
armas, de cabeça no rio.
— Sandal! — gritei.
Eu quis ir atrás dele, porém Rorvic segurou-me pelo braço.
— Deixe-o!
Eu vi Sandal ressurgir das águas. Os seus braços fortes nadavam jogando água para
todos os lados. Ele nadou para a margem que ficava de fronte.
— Ele não pode afastar-se de nós — disse eu, agitado. Eu quis me livrar das garras
de Rorvic, porém suas mãos se fecharam em tomo de meus braços como algemas de aço.
— Ele vai voltar, quando se acalmar — profetizou o engenheiro de ultrafrequências.
— Nós agora temos que nos interessar pelos edifícios na beira do espaçoporto.
Entrementes Sandal alcançara a margem oposta. Ele ficou parado por um instante,
olhando para onde nós nos encontrávamos. Depois ergueu o braço e sacudiu o arco. Isso
podia ser uma saudação, mas também um gesto ameaçador.
Repentinamente Sandal virou-se e saiu correndo para a floresta sombria. Poucos
instantes depois ele tinha desaparecido entre as primeiras árvores.
Rorvic colocou o escudo protetor em tomo do space-jet para que, em nossa
ausência, ninguém pudesse aproximar-se da nave-auxiliar.
— Vamos! — disse ele.
Cucula Pampo lançou-me um olhar infeliz. Eu apontei para Rorvic.
— Pergunte a ele! Ele é o chefe.
Rorvic apenas resmungou e saiu na direção do espaçoporto. Eu olhei
instintivamente para o chão, pois de um homem como Rorvic se esperava que deixasse
rastros profundos.
Os instrumentos-favalo nos bolsos do cinturão de Pampo tilintaram baixinho,
quando nos aproximamos dos primeiros edifícios.
— Não pode dar um jeito de desligar esse barulho? — perguntei a Pampo. — Se
existirem seres viventes aqui, eles poderão nos ouvir a milhas de distância.
— Eu preciso de contato constante com meus instrumentos retrucou Cucula Pampo,
ofendido. — Caso contrário não posso me apresentar, quando for necessário.
Eu fiz um gesto que tudo englobava.
— Ninguém quer ouvi-lo aqui!
Ele repuxou os lábios, e com isso parecia ainda mais feio.
— O senhor não possui nenhum conhecimento básico da música-favalo —
censurou-me ele. — Um bom músico-favalo tem que estar sempre pronto para
apresentar-se. Quem perde o contato com seus instrumentos, mais cedo ou mais tarde
toma-se um remendão. Na música-favalo dificilmente acontece que...
— Silêncio! — interrompeu-nos Rorvic, asperamente. — Eu não tenho nenhuma
vontade de ficar escutando isso.
No silêncio que se seguiu eu me senti inconfortável. O solo mole abafava nossos
passos. Também agora não havia qualquer indício demonstrando a presença de seres
inteligentes. As aberturas das edificações mais próximas estavam trancadas. Mas em
nenhum lugar havia sinais de decadência.
De repente eu ouvi um ruído de água. Eu me virei rapidamente. A superfície do rio
se dividira. Um pedestal faiscante de metal surgiu de dentro da água. Em cima do
pedestal movimentava-se um par de figuras cintilantes de metal, das quais a água
escorria.
— Dalaimoc! — gritei.
A cena era irreal, mas então o pedestal começou a sair de dentro da água. Para isso
servia-se de um dispositivo parecido com pernas, com articulações e pés em forma de
ganchos. Toda a formação balançava fortemente, e eu fiquei espantado em ver que
nenhum dos robôs cintilantes caía de cima do pedestal. Agora pude ver que os autômatos
em cima do pedestal possuíam braços em formato de pás.
O andaime caminhou pelo solo, sem se interessar por nós. Seu destino,
indubitavelmente, era o espaçoporto. Retendo a respiração, ficamos olhando, enquanto o
pedestal se aproximava de um dos pavilhões mais baixos. Ali ficou parado, até que o
portal se abriu. Finalmente desapareceu dentro do pavilhão. O portal deslizou, fechando-
se novamente.
Pampo gemeu baixinho.
Perry Rhodan, que com os outros membros da tripulação da central da Good Hope
II tudo observava através da câmara-robô voadora, chamou pelo rádio.
Rorvic me tirou o aparelho de rádio portátil das mãos.
— Na minha opinião, isso é uma espécie de draga fluvial, sir — disse ele. — Por
que e por ordem de quem essa coisa trabalha dentro do rio, naturalmente é difícil de
adivinhar.
— O senhor acha que foi por acaso, que essa coisa saiu da água, justamente durante
nossa chegada? — perguntou Pampo.
— Espero que sim — retrucou Rorvic. — Pois se houvesse uma conexão, nós
teríamos que... olhem ali!
Um grito desses era incomum para Rorvic. Segundos mais tarde eu vi o que o tinha
levado a este grito temperamental. Por entre os edifícios saía uma coisa que parecia uma
gigantesca grua com muitos braços. Era uma armação metálica de cerca de sessenta
metros de altura, com inúmeras excrescências metálicas móveis. Eu vi braços
agarradores, pás, tentáculos, sensores e outras extremidades, todas elas em movimento.
Toda aquela formação oscilava de um lado para o outro, parecendo que ia ruir a qualquer
instante. Curiosamente esta catástrofe não aconteceu, mas o gigante metálico se
aproximou de nós numa velocidade espantosa.
— Fujam! — gritou Rhodan, pelo rádio.
Pampo já se pusera em movimento. Com seus braços remadores, aquele homem
magro parecia uma edição menor do guindaste.
Eu liguei meu aparelho de voo, mas ele não funcionou.
— A energia foi bloqueada — verificou Rorvic, calmamente.
Ele puxou o seu desintegrador.
Eu não me interessei mais por ele, mas saí correndo na direção do space-jet. A
sombra do guindaste corria diante de mim no chão, depois escutei um ruído estalante.
Duas garras metálicas se fecharam em volta dos meus quadris. Fui arrancado do chão,
para o alto. O chão girava embaixo de mim. Por segundos eu não vi nada mais que braços
metálicos rodopiando entre si. A parte central do guindaste rangia e estalava. Eu passei
pairando por Rorvic, que estava dependurado dentro do aperto de um tentáculo enrolado,
como um inseto gordo, tentando inutilmente fazer fogo com o seu desintegrador.
Em diagonal, abaixo de mim, Pampo corria. Ela caiu ao chão, foi juntado por um
braço semelhante a uma pá da grua gigante e arrancado para o alto. A pá fechou-se com
estrondo, e ele estava trancado dentro de uma prisão de aço. Eu tinha esperanças de que
ele conseguiria respirar.
A grua gigante estacou por um momento. Ou esperava por ordens de uma central
ainda desconhecida para nós, ou precisava desta pausa, para esclarecer a si mesmo acerca
de outras ações. Eu me perguntei por que não tínhamos descoberto essa coisa já mais
cedo. Havia apenas uma explicação: O robô ficara dentro de uma das inúmeras
edificações em formato de torre, ao redor do espaçoporto. Isso podia significar que cada
edifício era o local de estadia de autômatos.
Um solavanco atravessou o guindaste gigante. Ele girou sobre si mesmo, e saiu
marchando na direção do espaçoporto. Eu vi como a câmara-robô, que circulara em torno
da grua gigante até então, foi agarrada e segura por um tentáculo que avançou
rapidamente sobre ela. Ela tentou escapar, mas quando foi envolvida por um segundo
braço de pegar, seus movimentos morreram.
Uma coisa globular, que parecia uma bola de vidro cortada e aberta num dos lados,
e que estava dependurada na extremidade de um braço metálico móvel, pairava para cima
e para baixo diante de mim. Parecia que estava me inspecionando.
— Desapareça! — gritei-lhe.
Ela assobiou, e aproximou-se um pouco mais. A grua oscilava como um mastro que
estivesse em vias de cair, mas as suas articulações centrais, evidentemente eram capazes
de interceptar todos os movimentos laterais e compensá-los. Eu já desistira de qualquer
movimento de defesa, pois quanto mais eu lutava contra as garras, mais elas se
apertavam.
Nosso raptor alcançou as primeiras edificações. Era quase um milagre que ele não
ficasse dependurado em alguma coisa. Nós nos aproximamos de um pavilhão comprido,
que era limitado por torres, nas duas extremidades. Nas laterais podiam ser reconhecidos
prédios menores.
A bola de vidro cortada havia desaparecido novamente, em seu lugar, porém,
encontrava-se nas minhas proximidades um aspirador de pó, que, assobiando e tossindo,
executava uma tarefa incompreensível. Era um braço articulado com extremidade
alargada e diversas aberturas redondas, através da qual era sugado o ar. A sucção era tão
forte que o meu traje de proteção foi negativamente influenciado. Aquela coisa estranha
aproximava-se cada vez mais, e finalmente deslizou por cima de todo o meu corpo. Cada
vez que tinha sugado o meu traje, parava por um instante, cuspindo as partes que havia
sugado. O processo não era doloroso, mas desagradável, e além disso eu não sabia nunca
o que ia acontecer no instante seguinte. A grua gigante parecia ter um repertório
inesgotável à sua disposição, pois enquanto eu ainda concentrava minha atenção no
aspirador de pó, o robô tinha guiado um receptáculo exatamente por cima de minha
cabeça, da qual foi despejado em cima de mim um líquido escuro e malcheiroso. Eu
praguejei e fiquei com falta de ar. Um pouco daquele caldo penetrou no meu nariz, ardeu
terrivelmente, irritando-me e provocando espirros. Aquela coisa começou a secar
imediatamente, mas neste estado fedia ainda mais. Eu tossi. Os meus olhos lacrimejaram.
E então apareceu novamente o aspirador de pó. Entretanto, os reatores haviam sido
invertidos. Em vez de sugarem me sopravam uma poeira avermelhada na cara. A
substância cobriu o meu corpo. Eu não conseguia me livrar da impressão de que, de um
modo bastante robusto, eu estava sendo desinfetado.
De vez em quando eu via Rorvic. Ele estava longe de mim cerca de sessenta metros.
Ele não estava passando muito melhor do que eu. Isso me tranquilizou um pouco, e eu
estava curioso em saber como ele comentaria estes acontecimentos, se algum dia nós
ainda chegássemos a nos reunir.
De Cucula Pampo não se via nada, evidentemente ele ainda estava metido dentro da
pá gigante, que o havia suspenso. Em silêncio, eu felicitei Sandal, que fizera a única coisa
certa, metendo-se dentro da floresta. Talvez ele estivesse observando, da borda do mato,
o que estava acontecendo conosco, e preparava nossa libertação.
Mas o que é que ele poderia empreender com arco e flecha contra o monstruoso
robô?
Nossa única esperança no momento era a Good Hope II, porém eu conhecia Perry
Rhodan muito bem, para saber que ele ainda representaria o papel de observador por
algum tempo. Enquanto a nossa vida não estivesse em perigo iminente, Rhodan não
mandaria nenhuma missão de comando atrás de nós.
Houve um clique atrás de mim. Eu vi uma gigantesca bocarra metálica, que se
atirava na minha direção. Rapidamente meti a cabeça entre os ombros e logo tudo
escureceu à minha volta. Um ruído barulhento indicava a continuação do processo, porém
eu não podia ver mais nada. Eu não era mais seguro, porém me encontrava dentro de um
recipiente metálico, que era tão pequeno que eu mal podia me mexer.
Um forte solavanco demonstrou-me que eu estava sendo colocado em algum lugar.
A grua gigantesca rangia nas suas articulações, e portanto ainda estava ocupada conosco.
Mais uma vez um grande barulho. Perto de mim um segundo recipiente bateu no chão.
— Dalaimoc! — gritei eu, esperançoso.
Eu escutei o tilintar característico dos instrumentos-favalo, depois Pampo perguntou
com voz chorosa:
— É o senhor, a Hainu?
— Sim — respondi, irritado. — Onde está?
— Bem próximo! — retrucou Pampo.
— Muito elucidativo! — zombei. — Controle-se. Temos que refletir como vamos
sair daqui.
— Eu não consigo ver nada! — lamentou Pampo. — Minha Instalação energética
não funciona mais.
Sem dúvida ele se encontrava numa armadilha semelhante à minha.
Um tremor à direita de minha caixa metálica me fez suspeitar que agora também
Rorvic havia chegado.
Eu ouvi o albino bufar. Involuntariamente tive que rir. O gigante gordo, numa caixa
metálica, que não era maior que minha prisão!
— Dalaimoc! — gritei. — É o senhor?
Ele não respondeu, mas eu o ouvi respirar com dificuldade. À minha esquerda,
Pampo começou a usar alguns instrumentos-favalo na sua prisão. Aquilo tinha um som
pavoroso.
— Pampo! — gritei-lhe. — Pare com isso.
Eu procurei pelo meu aparelho de pulso, mas verifiquei logo que o mesmo estava
sem energia.
— Dalaimoc! — gritei. — O que vamos fazer agora?
Eu não recebi qualquer resposta. Talvez o albino estivesse ferido. Apesar da
mobilidade que ele já demonstrara em ocasiões de emergência, afinal de contas ele não
era nenhum homem-borracha. Se os robôs o tivessem metido à força dentro dessa caixa
apertada, talvez ele estivesse meio inconsciente.
Pampo fazia tilintar seus instrumentos. Ele não tinha lugar exatamente para dar um
concerto, mas a coisa já era bastante terrível mesmo assim.
De repente a caixa em que eu estava aprisionado pôs-se em movimento.
Suavemente e quase em silêncio, ela rolou para longe, sobre uma superfície lisa.
A música de Pampo foi interrompida abruptamente.
Depois de algum tempo houve um ligeiro choque. O caixote metálico parou. Eu
imaginei que tínhamos chegado ao nosso destino.
— Nós nos encontramos dentro de um dos edifícios — disse Rorvic, de repente.
Ele falara com total calma, como se quisesse provocar uma discussão, para a qual
ninguém tinha um interesse genuíno.
— Eu pensei que o senhor estava ferido! — gritei, com raiva. — Por que não reagiu
aos meus chamados?
— Eu não posso responder permanentemente à sua verbosidade desqualificada —
revidou ele, amigavelmente. — Além do mais, qualquer discussão não fazia sentido, uma
vez que ainda estávamos sendo transportados. Agora chegamos ao destino.
Eu me ergui, furioso, e bati com a cabeça contra a cobertura de minha prisão.
— Fique sentado! — recomendou-me Rorvic, que classificara corretamente aquele
ruído oco. — Vamos refletir no que podemos fazer. A situação está clara. Para os robôs
deste espaçoporto nós somos objetos estranhos, que eles removeram. Eles, para isso,
apenas seguiram uma ordem que lhes foi dada por alguém. Esta determinação
naturalmente é que eles devem manter em ordem o espaçoporto e as instalações
pertencentes a ele.
— Como sabe disse? — perguntei, espantado.
— Se o fino ar marciano não tivesse ressecado o seu cérebro, o senhor
provavelmente também poderia pensar logicamente — opinou Rorvic.
— Eu ainda o mato, algum dia! — jurei-lhe.
Mas ameaças semelhantes não eram capazes de fazê-lo tremer. Eu comecei a refletir
sobre suas afirmações. Não era de se excluir que ele estava com a razão. A maneira como
os robôs nos tinham afastado me fazia supor que eles avançavam contra tudo que pudesse
afetar a ordem e a limpeza costumeiras no espaçoporto.
Nosso destino, daqui para a frente, era incerto. Ou nós teríamos que permanecer
nestes caixotes e morrer, ou então nos levariam para uma remoção definitiva, jogando-
nos dentro de um conversor de lixo. Ambas as perspectivas eram assustadoras.
— O que mais podemos fazer? — perguntou Cucula Pampo, baixinho.
— Eu estou pensando — declarou Rorvic.
Ele não chegou mais a dar-nos o resultado de suas reflexões, pois poucos instantes
depois a tampa de minha caixa abriu-se. Antes que eu pudesse reagir, fui agarrado por
uma espécie de aranha metálica, que me puxou para fora. Enquanto pairava por cima de
minha caixa, pude reconhecer meus arredores. Eu me encontrava no interior de um
grande pavilhão, que estava cheio até quase o teto de lixo e rejeitos. Havia três grandes
montes, cujas superfícies pareciam vitrificadas. Alguém, provavelmente robôs, tinha
derramado uma massa líquida por cima do lixo, que então tinha congelado. Deste modo
os montes de lixo no interior dos pavilhões eram fechados hermeticamente. Medidos pela
quantidade de lixo, os construtores do espaçoporto já deviam ter desaparecido há muitos
séculos.
Enquanto eu observava, a aranha metálica pôs-se em movimento. Ela estava fixa no
fim de um braço metálico, comprido e provido de articulações, que por sua vez estava
preso a uma aranha móvel, fixada sob o teto. A aranha podia alcançar qualquer ponto do
pavilhão. Eu me mantive bem quieto, para evitar medidas defensivas mais duras do robô.
Atrás de mim, Pampo e Rorvic foram puxados para fora dos caixões por outras duas
aranhas metálicas. Pampo gritava e agitava os braços, sem nada alcançar com isso.
Bem em cima de um monte de lixo que ainda estava crescendo, e não fora ainda
vitrificado, a aranha metálica parou e se abriu. De três metros de altura, eu caí sobre os
detritos e afundei um pouco neles. Rapidamente eu me libertei.
Rorvic caiu barulhentamente perto de mim nos destroços e foi quase que
completamente soterrado por eles. Antes que ele pudesse libertar-se, Cucula Pampo caiu
em cima dele.
— Bem-vindos! — gritei para os meus dois acompanhantes. — Agora devia estar
claro que qualquer tentativa de contato não faz sentido. Estão nos tratando como se
fôssemos lixo.
Rorvic esgueirou-se para fora do ajuntamento de objetos malcheirosos para a
superfície e se sacudiu todo. Depois puxou o músico-favalo pelas pernas.
Por cima de nós pairavam as três aranhas. Eu me perguntei se elas tinham suficiente
juízo robótico para nos atacarem, se fugíssemos do monturo. Provavelmente estávamos
seguros, enquanto permanecêssemos no depósito de lixo. Se abandonássemos o pavilhão,
os comandos de limpeza nos atacariam novamente e nos trariam de volta para cá.
Os olhares de Rorvic rebuscavam as redondezas.
— Um lugarzinho pouco amistoso! — verificou ele. — Vamos desaparecer daqui,
antes que nos cubram de geléia vermelha.
A massa vitrificada por cima dos outros montes realmente se parecia com um
mingau vermelho.
Nós escorregamos e trepamos do monte de lixo abaixo, fazendo tanto barulho que a
cada instante eu contava com um ataque dos robôs.
Mas nada aconteceu.
— Felizmente os robôs neste planeta não se diferenciam das construções de outros
mundos — refletiu Rorvic em voz alta. — Eles estão limitados em sua liberdade de ação
pela sua programação. Esta programação parece limitar-se à manutenção da ordem das
instalações do espaçoporto. Infelizmente estes robôs são muito metódicos neste seu
trabalho.
— Isso significa que vamos ser atacados novamente, logo que abandonarmos este
pavilhão — acrescentei.
Pampo olhou-me, assustado.
— Neste caso é melhor ficarmos aqui, esperando que nos mandem ajuda da Good
Hope.
Rorvic fez uma cara como se quisesse dizer alguma coisa significativa, mas depois
apenas sacudiu a cabeça. Também ele, evidentemente, não sabia o que fazer.
— É importante que não nos comportemos como lixo — disse eu.
— Ó! — fez Rorvic. — A ideia não é má, mas como vamos transformá-la em
realidade?
— Se os robôs acreditam que pertencemos às instalações do espaçoporto, vão nos
deixar em paz.
Pampo rangeu seus dentes feios e fez tilintar seus instrumentos.
— E como vamos fazer isso?
— Esta realmente é a pergunta determinante — concordou Dalaimoc Rorvic. —
Mas precisamos tentá-lo mesmo assim. O mais seguro naturalmente seria se
encontrássemos um veículo que pertence ao espaçoporto. Mas não vamos ter esperança
disso, uma vez que também não temos certeza se somos capazes de dirigi-lo.
Nós nos movimentamos através da parte livre do pavilhão, sem sabermos
exatamente pelo que devíamos procurar. Finalmente Rorvic conduziu-nos até o grande
portal.
— Aqui se coloca mais um problema — disse ele. — Não sabemos como sair daqui.
Nossas armas não funcionam porque a energia está bloqueada. O portal é movimentado
automaticamente.
Ele sentou-se perto da saída no chão e cruzou os braços sobre o peito.
— Vamos ter que esperar até que chegue um novo carregamento de lixo. Então
talvez podemos nos esgueirar para fora. — Ele fechou os olhos. — Me acordem, quando
chegar a hora.
Cucula Pampo olhou primeiro para ele, depois para mim.
— Mas... mas ele não pode dormir agora!
— Ele não dorme, ele medita — disse eu, furioso. — Ele é discípulo de algum
método, que deve ajudá-lo no seu bem-estar espiritual.
A respiração por igual de Rorvic era inaudível. Depois de algum tempo ele puxou as
pernas, cruzou-as e abriu os olhos. O seu olhar, porém, era dirigido à distância.
Eu me virei, fui até o monte de lixo, e peguei uma barra metálica retorcida.
— O que quer fazer com isso? — perguntou Pampo, confuso.
— O senhor não ouviu ele dizer que o devíamos acordar quando chegasse a hora. —
Eu apontei para o albino. — Infelizmente eu deixei o bule a bordo do space-jet.
— Que bule? — Pampo não entendeu nada.
— Não adianta querer explicar-lhe isso.
— E o que é que nós vamos fazer, enquanto isso?
— Esperar? — disse eu.
O que devíamos fazer, se os robôs somente viessem dentro de alguns dias, para
depositar lixo?
Ou se eles apenas aparecessem a cada terceiro ou quarto mês?
***
Depois de algumas horas, Cucula Pampo tirou seus instrumentos-favalo dos bolsos
do seu cinturão. Eram placas e bastõezinhos de metal de formatos diferentes. Pampo
espalhou-os nas palmas de suas mãos e depois jogou-os contra a parede. Os instrumentos
começaram a tilintar compassadamente. Pampo apanhou-os, atirou-os para o alto, para
que se tocassem no ar, e depois apanhou-os novamente com mãos, pés e dentes. Deste
modo, formava-se um constante turbilhão de instrumentos que se chocavam entre si.
A música não me agradava, mas eu admirei Pampo, que dominava a técnica-favalo
como nenhum outro. Ele deixou-se cair ao chão, sem que os seus instrumentos se
detivessem. Certa vez, a bordo da Good Hope II, eu assistira a um espetáculo do artista,
onde ele ainda colocara, por perto, garrafas, recipientes e mesas, contra os quais seus
instrumentos eram lançados.
Cucula Pampo tocava apenas composições próprias, que ele variava durante a
apresentação. Um músico-favalo completo precisava ter dons parapsíquicos, para captar a
multidão de possibilidades que se apresentavam dentro da fração de segundos. Cucula
Pampo conseguia adivinhar seus instrumentos, portanto era um mutante, apesar de sua
capacidade, no melhor dos casos, apenas poder servir para divertir alguns passageiros
esnobes a bordo de astronaves de passageiros de luxo.
Mas, desde o começo da catástrofe, isso também tinha acabado. Eu podia imaginar
que Pampo sofria muito por isso. Certamente o ajudava poder apresentar os seus
instrumentos mais uma vez agora. Eu notei que ele esqueceu-se de tudo que lhe ia em
volta.
Depois de algum tempo os instrumentos se juntaram numa bola no ar e caíram de
volta para as mãos de Pampo. Ele os colocou nos bolsos, limpou o suor da testa, e sorriu
encabulado.
— Formidável! — disse eu. — O senhor realmente é um artista.
— Está brincando comigo.
— Eu o invejo! — retruquei. — Durante alguns momentos o senhor esqueceu-se de
todas as nossas dificuldades. Ele, — e apontei para o albino, — também consegue isso.
Pampo olhou para o gigante gordo, pensativo.
— Quanto tempo ele ainda pretende ficar sentado assim?
Eu ergui os ombros.
— Durante dias, se for o caso.
Rorvic parecia ainda mal respirar.
Eu vigiei a porta. Lentamente comecei a duvidar de que ela se abriria novamente.
Talvez os robôs precisassem de meses até novamente terem enchido três caixas com lixo.
Certamente não acontecia todos os dias que três astronautas cuidavam de sujar os
arredores esterilizados.
Pampo foi até a porta e começou a examinar o mecanismo. Eu não me preocupei
com ele, pois estava convencido de que ele não teria êxito.
Quando fiquei com sono, deitei-me no chão, ao lado de Rorvic.
— Eu vou ficar vigiando — prometeu Pampo. — De qualquer modo, não vou
conseguir dormir.
Também eu não conseguia dormir. Eu me irritei com a capacidade de Rorvic de
poder meditar na situação atual.
De repente escutamos ruídos metálicos. Eles vinham do lado de fora.
Alguma coisa estava do outro lado da porta.
— Atenção! — gritei para Cucula Pampo.
Eu agarrei a barra de metal e bati com ela no crânio sem cabelos de Rorvic.
— O senhor vai matá-lo! — gemeu Pampo, horrorizado.
— Não tenha medo — acalmei-o. — Ele está acostumado a coisa pior.
Rorvic acordou bocejando. Eu levei minha cabeça junto do seu ouvido e gritei:
— A porta vai ser aberta!
Isso ajudou. Ele estremeceu e levantou-se rapidamente. Sua mão direita tateou a
careca, sentindo o galo que crescia rapidamente. Ele franziu a testa.
— O que é isso? — quis ele saber, desconfiado.
Eu tinha colocado o cano de metal contra a parede, atrás dele, de modo que ele não
pudesse vê-lo. Mesmo assim fiquei contente que a porta, deslizando para um lado e se
abrindo, me livrou de uma resposta.
Lá fora estava um veículo em formato de funil, carregado até em cima com raízes
de árvores.
— Para fora, depressa! — gritou Rorvic.
O veículo rolou ao nosso encontro, mas de um lado havia espaço suficiente para
podermos nos esgueirar para fora. Rorvic ficou bem junto da parede do pavilhão. Nós
seguimos o seu exemplo, porque tínhamos que recear um ataque dos robôs, logo que
puséssemos os pés no ar livre.
Atrás de nós a porta se fechou. O veículo robotizado agora estava ocupado em
entregar a sua carga às aranhas metálicas, que por sua vez a jogariam num monte de lixo.
Pampo olhou, amedrontado, para o espaçoporto, que alcançava o horizonte.
— Fiquem sempre logo atrás de mim! — ordenou Rorvic.
Nós nos movimentávamos junto à parede do pavilhão. A cerca de cem metros
distante de nós um enxame de objetos voadores globulares passou em altíssima
velocidade.
— Certamente são robôs de reconhecimento — observou o albino. — Eles
naturalmente estão revistando o espaçoporto à procura de lixo.
Isso significava que nós devíamos prestar muita atenção nesses objetos pequenos.
Com a velocidade que eles mantinham, me parecia impossível escapar deles
continuamente.
Nós chegamos ao fim do pavilhão. Rorvic espreitou pelo canto. Depois tateou
novamente sua cabeça.
— Antes de prosseguirmos, eu gostaria de saber o que significa isso — disse ele,
com uma voz que parecia de alguém adormecendo. — Capitão a Hainu, fale o senhor!
— Por que pergunta a mim? Não tenho a menor ideia. Talvez o senhor tenha um
metabolismo especial. Afinal de contas, não é a primeira vez que o senhor descobre galos
misteriosos nau sua cabeça.
— Antigamente eram apenas galos pequenos — corrigiu-me Rorvic. — Isso eu
ainda podia entender. Mas essa coisa, — ele esfregou o galo com a ponta dos dedos, —
pode arrebentar a qualquer momento.
— Eu disse que o senhor devia ter cuidado! — lastimou Pampo.
O seu medo de que Rorvic pudesse se virar contra ele o transformara num traidor.
Eu lhe joguei um olhar furioso.
— Eu fiz isso no seu próprio interesse — disse eu ao albino. — Se eu não tivesse
batido com força, o senhor agora ainda estaria sentado no pavilhão, meditando.
Felizmente Rorvic decidiu-se a tratar, em primeiro lugar, de nossas dificuldades. Eu
sabia, entretanto, que ganhara apenas um prazo de clemência. Rorvic voltaria novamente
a falar do seu galo.
— Até o próximo edifício são mais ou menos duzentos metros — avaliou o
engenheiro de ultrafrequências. — Nós não temos outra escolha que não recuarmos, de
edifício a edifício, até alcançarmos o space-jet. Ali devíamos ficar mais ou menos em
segurança, pois o toque de ordem dos robôs se limita ao espaçoporto.
Eu me lembrei daquela coisa que tinha saído de dentro do rio. Este acontecimento
foi o que me fez duvidar da convicção de Rorvic. Entretanto não falei nada.
— Não precisamos, todos os três, correr um risco ao mesmo tempo — continuou o
grande terrano. — Eu agora vou tentar alcançar o próximo edifício. Se der certo, vocês
me seguem um pouco mais tarde. Caso contrário, vão ter que pensar em alguma maneira
de como conseguir chegar ao space-jet, por um outro caminho.
Estas eram palavras sem consolo, pois como nossos aparelhos energéticos não
funcionavam, somente havia o caminho sugerido por Rorvic.
Dalaimoc Rorvic saiu correndo.
Apesar de ter que carregar todo o seu equipamento, ele conseguiu uma velocidade
surpreendente e em poucos instantes alcançara o seu destino. Ele nos acenou, da sombra
do próximo edifício. Isso significava que tudo estava em ordem.
— Agora chegou a sua vez, Cucula Pampo — disse eu para o músico-favalo.
Ele me olhou, amedrontado.
— Vamos — eu o estimulei, enquanto os meus olhares procuravam nos céus os
robôs de busca voadores. — O senhor vai conseguir.
Era evidente que ele não dividia comigo a confiança demonstrada, mas verificou
que não tinha outra escolha. Ele saiu correndo, deslocando estranhamente o seu corpo
magro. Ele jogava suas pernas compridas para a frente, para poder dar passadas bem
grandes. Apesar disso, precisou de muito mais tempo que Rorvic, que certamente já
esperava impaciente por nós.
Mal Pampo tinha alcançado o edifício próximo, quando eu também abandonei
nosso esconderijo. O lugar que eu tinha que atravessar me parecia muito grande,
gigantesco. Eu esperava ouvir o ruído característico dos robôs amantes da ordem, porém
consegui chegar, sem ser molestado, junto dos outros dois homens.
Rorvic estava sentado em cima de um dos pedestais, que saíam do chão por toda a
parte.
— Parece que vai dar certo — verificou ele, satisfeito. — Desta maneira poderemos
alcançar nossa nave-auxiliar.
Neste momento ele se dissolveu diante dos nossos olhos. Ele desapareceu como se
jamais tivesse existido. Pareceu-me que sobre o pedestal em que Rorvic estivera sentado
o ar estava cintilando.
Pampo e eu olhamos, horrorizados, para o lugar de onde Rorvic acabara de nos
falar.
Eu estendi ambas as mãos, para verificar se inesperadamente o microdefletor de
Rorvic tinha começado a funcionar, porém minhas mãos não tocaram em nada.
— Ele desapareceu! — gemeu Pampo, respirando com dificuldade.
— Capitão Rorvic! — gritei. — Onde está? Pode me ouvir?
— Pelo amor de Deus! — lastimou-se o músico-favalo. — Se o senhor grita desse
jeito vai chamar a atenção dos robôs para nós.
Eu parei imediatamente.
— Mas isso é impossível! — Pampo girou sobre seu próprio eixo. — Ele não pode
simplesmente dissolver-se no ar.
Eu engoli em seco. Somente agora eu me dei conta de quanto Pampo e eu
confiávamos no Capitão Dalaimoc Rorvic e nas suas decisões.
4

Depois que eu me restabeleci da minha surpresa e do meu susto, comecei a pensar


intensamente. O desaparecimento de Rorvic devia ter ligação com o pedestal sobre o qual
estivera sentado.
Comecei a examinar a coisa mais de perto. Parecia uma bota invertida, e sobressaía
meio metro do solo. Na superfície havia duas depressões em formato de funil. Nas
laterais sobressaíam duas pontas cônicas, em cujas extremidades havia uma bola dupla.
Isso era tudo.
Em nossa proximidade havia centenas destes pedestais. Medidos pelos seus
números eles deviam ter uma significação especial. Eles estavam espalhados por todo o
espaçoporto.
— Aí vem alguma coisa! — veio a voz de Pampo aos meus ouvidos.
Eu me virei rapidamente.
De um dos pavilhões perto de nós um grande robô saíra para o ar livre. Ele se
assemelhava a uma pequena ponte que de repente começara a andar. Do centro da ponte
pendiam objetos em formato de discos, que praticamente arrastavam no chão. O robô
movimentava-se sobre os “pilares” da ponte, o que dava a impressão de que ela poderia
ruir a qualquer momento. Mas isso era uma ilusão.
Pampo respirou fundo.
— Essa coisa não parece estar vindo para cá. Eu coloquei um dedo sobre os seus
lábios.
Nas proximidades de um dos pedestais que sobressaíam do chão o monstro metálico
finalmente parou. Eu fiquei observando, muito tenso, pois dos acontecimentos em
seguida eu esperava poder tirar conclusões sobre o destino de Rorvic.
O robô estendeu um par de cabos, que se ligaram com as lentas que sobressaíam do
pedestal. Dois outros cabos, com extremidades engrossadas, mergulharam nas aberturas
em formato de funil do soquete. Depois disso, o robô não se mexeu mais.
— O senhor tem alguma ideia do que isso significa? — perguntou Pampo.
— Parece que o robô está recebendo ordens — refleti eu. — O procedimento,
porém, também pode ter outro significado. Talvez o robô esteja sendo abastecido de
energia, para que ele volte a ser capaz de funcionar por algum tempo. Há muitas
possibilidades.
— Vamos fugir! — sugeriu Pampo. — Eu não gostaria de desaparecer, do mesmo
jeito que o capitão.
— Escute-me bem! — gritei-lhe. — Rorvic desapareceu aqui. Se quisermos ajudá-
lo, temos que começar com nossa busca também aqui.
Ele riu, irônico.
— E onde vamos começar? O senhor pretende cavar a terra, ou revistar o edifício?
— Eu não sei o que vamos fazer, mas de modo algum deveríamos recuar ainda
mais. Tenho a sensação de que Rorvic ainda está vivo.
Os instrumentos-favalo nos bolsos do cinturão do artista tilintaram, quando ele fez
um movimento violento.
— Isso eu não acredito! Rorvic foi vitimado por alguma máquina de fazer limpeza
deste mundo. E isso também ainda acaba acontecendo conosco, se não prestarmos
atenção.
Eu não lhe dei atenção, mas continuei olhando o robô, que parecia uma ponte.
Passou-se mais ou menos meia hora, e então o autômato desfez sua ligação com o
pedestal, e afastou-se de nossa proximidade. Talvez ele estivesse em vias de executar
alguma tarefa.
Eu me perguntei onde estaria a central, da qual estes robôs eram comandados. Era
difícil de pensar que todos eles tivessem uma positrônica de ordens autônoma ou
qualquer coisa semelhante.
— Vamos reconstruir como tudo aconteceu — sugeri a Pampo. — Sente-se em
cima do pedestal, do mesmo modo como Rorvic estava sentado. Eu vou ver se então
consigo pensar em alguma coisa.
— Por acaso acha que eu estou maluco?! — opôs-se Pampo.
— Sem Rorvic não vamos mais conseguir sair daqui! — supliquei-lhe. —
Certamente existe uma solução simples. Ajude-me a encontrá-la.
Ele se aproximou, hesitante, do pedestal. Para dar-lhe coragem, eu bati com as mãos
espalmadas contra a superfície metálica.
— Está vendo? Não acontece nada!
Finalmente ele sentou-se sobre o pedestal. Ele parecia muito infeliz. Sua atitude não
podia comparar-se com a de Rorvic.
— O senhor não está sentado em cima de uma bomba, que poderá explodir a
qualquer momento, — eu o admoestei.
Ele tentou relaxar-se, mas não conseguiu.
— Eu não fico sentado aqui por muito mais tempo.
Eu tinha uma certa suspeita, mas ela não se confirmou.
— Está sentindo alguma coisa? — quis eu saber.
— Está brincando? O que é que eu deveria sentir?
— Um formigamento!
— Um formigamento?
Eu repuxei a cara.
— O senhor é um homem sensível, com dons parapsíquicos. Deve sentir se o
pedestal conduz energia, ou se alguma outra coisa acontece dentro dele!
Pampo levantou-se. Era evidente que ele já tinha demais.
— Sente-se! — ordenei.
Ele deixou-se cair novamente sobre o pedestal. Os seus olhos ficaram muito
redondos.
— Agora estou sentindo alguma coisa! — gritou ele.
— Pois então! — Eu estava satisfeito. — Descreva-o!
Ele desapareceu!
Ele dissolveu-se como Dalaimoc Rorvic. Novamente o ar por cima do pedestal
cintilou. Eu estava sozinho.
Por dez minutos fiquei parado, como que congelado, diante do pedestal. Apesar de
ter contado com um desaparecimento de Pampo, o acontecimento, mesmo assim, veio de
modo surpreendente. Eu comecei a me censurar, por ter utilizado Pampo, dessa maneira,
para um experimento. Mas o que é que o artista teria feito, se eu tivesse desaparecido, no
seu lugar, e ele ficasse para trás aqui? Eu tenho certeza de que ele teria fugido, em pânico
cego.
Agora ele se encontrava no mesmo lugar em que também Rorvic estava.
Minha teoria, que eu desenvolvera sobre os pedestais, parecia confirmar-se. Eles
eram os locais de ligação com a central. Os robôs eram alimentados de energia através
deles, e provavelmente também recebiam, desse modo, suas ordens.
Apesar de tudo se encaixar perfeitamente num quadro lógico eu precisei de meia
hora, até finalmente ter reunido coragem bastante para também me sentar sobre o
pedestal.
Eu não sabia o que aconteceria então, mas calculava que mais cedo ou mais tarde eu
me dissolveria.
Porém a princípio nada aconteceu. Fiquei sentado sobre o soquete observando os
arredores. Tudo permaneceu quieto. Não se viam robôs. No horizonte pareceu-me ver um
bando de objetos de observação passarem voando. Eu me perguntei onde teria ficado o
objeto que saíra de dentro do “Enxame”. Uma ideia fantástica nasceu na minha cabeça.
Não seria possível que o objeto voador saído de dentro do “Enxame” tivesse pousado em
Teste Rorvic, sendo então imediatamente removido pelos robôs sedentos de arrumação?
Este pensamento nem me parecia tão absurdo. Se ele estava correto, os restos do objeto
voador estranho deviam encontrar-se nos montes de lixo de Teste Rorvic.
Os responsáveis, que tinham enviado este objeto voador, ficariam sem fazer nada,
enquanto um dos seus mensageiros era destruído desse modo?
Eu pensei em todas as informações que tínhamos a respeito do “Enxame”. De
acordo com elas, pareceu-me improvável que um objeto voador de dentro do “Enxame”,
não possuísse possibilidades defensivas contra os robôs desse planeta.
Por isso eu deduzi que, por alguma razão, nós não tínhamos descoberto o objeto
saído do “Enxame”, ou que ele ainda não tivesse pousado.
Fui arrancado dos meus pensamentos, quando, de um prédio próximo, se aproximou
um robô. Ele se movimentava sobre um tripé. Por cima deste estava um corpo em
formato de tonei, do qual saíam inúmeros braços de agarrar e tirantes. Toda a construção
tinha oito metros de altura.
Meu primeiro impulso foi de fugir imediatamente. Mas então pensei em algo
melhor. Se eu abandonasse o pedestal agora, logo muitos robôs estariam atrás de mim.
Não era certo que aquela máquina em forma de tonei já tivesse me descoberto. Ela estava
se aproximando de mim, mas o seu alvo também podia ser a pedestal.
Eu olhei fixamente na direção do robô.
De repente tive a sensação de que o meu corpo estava sendo trespassado por uma
corrente elétrica. Os impulsos saíam do pedestal. Eu tive que me obrigar a ficar sentado
em cima do pedestal.
O que ficava ao redor de mim começou a se dissolver, mas antes de definitivamente
perder a consciência eu senti uma dor de desestruturação, como a conhecia de saltos por
transmissores.
TRAJE DE PROTEÇÃO E DE COMBATE TERRANO
COM CAPACIDADE DE VOO
Generalidades:

Com capacidade de voar no espaço


cósmico e na atmosfera. Feito de material elástico
e resistente. A mochila, levada às costas, é
comandada através da peça de comutações no
cinturão do uniforme. O traje oferece proteção
contra sobrecarga e perda de pressão, bem como
contra armas primitivas e energéticas. A mochila
levada às costas é um produto da microtécnica
siganesa.

Dados Técnicos:

1. Mochila com propulsor plasma-atômico


para voo no espaço cósmico e radiação
represada intermitente para voo na
atmosfera. Além disso, geradores de
campos energéticos, alimentação energética
de projetores antigravitacionais, oxigênio e
aparelhagem de climatização,
micropositrônica, geradores de campo
energético para a construção de um escudo
de sobrecarga de alta potência (Escudo-
SAP), defletor e jato giratório dirigível.
a) Peça de aprovisionamento.
b) Peça de propulsão.
c) Antena de hipercomunicador. (Alcance:
30 milhões de quilômetros)

2. Cinturão de uniforme com fivela compacta, na


qual se acham embutidas todas as unidades de
comutação.

3. Antena para rádio falado normal e de capacete.


a) Microfone embutido.

4. Arma combinada (para disparos energéticos e


de projéteis).
5

Eu rematerializei dentro de um pavilhão gigante, diretamente sobre um pedestal,


que não se diferenciava em nada daquele que eu acabara de deixar.
A primeira coisa que percebi foram alguns seres anões, que corriam por ali, e que, à
primeira vista, pareciam tartarugas terranas.
Depois eu vi Rorvic e Cucula Pampo.
Rorvic estava acocorado, em posição de meditação, ao lado de um pedestal, no
chão, e o músico-favalo procurava desesperadamente falar com ele. Ele tentou,
inutilmente, acordar o albino.
Os meus dois acompanhantes pareciam estar fora de perigo.
Eu tinha saído dentro de um gigantesco pavilhão de máquinas. Meu primeiro
pensamento foi de que talvez se tratasse da central de comando dos espaçoportos de Teste
Rorvic. Eu vi que centenas daqueles seres anões, parecidos com tartarugas, corriam de
um lado para o outro dentro do pavilhão, outros estavam sentados diante de instrumentos
de controle, fazendo ligações de cabos e executando outros trabalhos. Aqueles pequenos
seres nos ignoravam completamente. Eles se preocupavam exclusivamente com seus
trabalhos. Quando um dos pequenos seres passou correndo bem junto de mim, eu notei
que não se tratava de robôs. O que à primeira vista tinha parecido a couraça de uma
tartaruga revelou ser uma espécie de mochila, que a criatura carregava nas costas. A pele
muito negra do anão parecia coriácea. Na cabeça pontuda havia dois olhos sobre antenas,
bem luminosos. Chamou minha atenção que o anão tinha mãos muito finas, com um
grande número de dedos de diversos comprimentos e grossuras. Parecia que as pequenas
criaturas não podiam movimentar-se devagar, pois corriam de um lado para o outro,
como se qualquer perda de tempo fosse uma catástrofe irreparável.
Em toda a volta viam-se máquinas, aparelhos e paredes com controles. Todas as
instalações comutadoras estavam adaptadas ao tamanho físico dos anões.
Eles seriam os construtores dos espaçoportos?
Eu duvidava disso.
Também aqui neste pavilhão havia inúmeros daqueles pedestais-transmissores,
como os que nós havíamos visto no campo de pouso.
Eu olhei para o teto.
Não havia janelas nem outras aberturas, através das quais se pudesse olhar para
fora. Gigantescas luminárias, que também forneciam calor, me deram a ideia de que nos
encontrávamos sob a superfície de Teste Rorvic.
Somente agora eu me voltei para meus dois acompanhantes. Pampo estava tão
ocupado com Rorvic que somente me viu quando eu já me encontrava do seu lado.
Ele estremeceu e recuou.
Depois me reconheceu.
— O senhor! — gritou ele, aliviado. — O senhor veio para cá da mesma maneira
que eu?
Eu não lhe dei atenção, mas olhei em volta, à procura de um objeto que fosse
suficientemente duro para bater com ele na cabeça de Rorvic.
— Onde é que nós estamos aqui? — gritou Pampo. — Que criaturas horríveis são
essas? Eu quero sair daqui.
— Silêncio! — gritei com ele.
Ele parou imediatamente de se lamuriar. Com uma cara teimosa, ele ficou parado do
lado de Rorvic. Neste momento eu ouvi o meu aparelho de pulso zunir. Surpreso,
verifiquei que também a minha mochila funcionava novamente. O bloqueio de energia,
que na superfície paralisara nossos equipamentos, aqui não tinha efeito.
Aliviado, eu liguei meu aparelho de pulso, mas não consegui completar uma
ligação, pelo rádio, com a Good Hope II.
Inúmeras influências perturbadoras o tornavam impossível.
Como não conseguia encontrar nada melhor, puxei o meu desintegrador do cinturão
de armas e me aproximei de Rorvic.
— Não outra vez! — suplicou Cucula Pampo. — Ele vai matar o senhor!
Eu me coloquei atrás do engenheiro de ultrafrequência e me pus nas pontas dos pés.
Depois bati com a coronha da arma de fogo manual na sua cabeça.
Rorvic acordou lentamente, pegou na cabeça e fechou os olhos. Depois de algum
tempo, ele resmungou, de má vontade, e colocou-se de pé. Mais uma vez ele passou a
mão espalmada pelo crânio careca. Perto do inchaço que mal tinha baixado, originado
pelo meu golpe anterior, ele agora descobriu as consequências de um novo golpe.
Ele olhou para mim fixamente.
— Este foi um novo ataque traiçoeiro! — gritou Pampo. — Eu tentei de tudo para
evitar que ele o fizesse.
Rorvic agarrou-me no fecho do meu traje protetor e me suspendeu sem fazer a
menor força.
— Eu não preciso de um despertador particular, seu maldito cabeça-oca marciano!
— Mesmo agora a sua voz soava calma, sem a menor raiva.
— Qualquer dia desses o senhor vai acordar tarde para sua própria morte! —
profetizei-lhe.
A minha voz soava rouca, pois ele me segurava tão fortemente, que me faltava o ar.
Ele me sacudiu de um lado para o outro. Depois me colocou no chão com tanta
força, que quase me quebrou as pernas.
— Muito bem, — anunciou ele, — agora vamos dar uma olhada aqui embaixo.
— Será que estas criaturinhas não vão achar ruim? — perguntou Pampo, hesitante.
— Se a coisa ficar séria, o senhor poderá apresentar-lhe uma prova da sua arte —
sugeriu Rorvic.
Pampo deu mostras de querer tirar do bolso seus instrumentos-favalo.
Pela primeira vez, depois que nos encontrávamos em Teste Rorvic, a voz de Rorvic
assumiu um tom penetrante.
— Foi só uma piada, Pampo.
O artista parecia decepcionado.
— Eu fiz diversas verificações — disse-nos o nosso chefe. — Nós nos encontramos
agora sob a superfície do planeta, presumivelmente embaixo do espaçoporto, no qual
fomos atacados pelos robôs. Ambas as instalações estão ligadas com estes pedestais, — e
ele bateu na construção, — de modo energético. Os pedestais servem de alimentadores de
energia dos robôs que trabalham na superfície. Eles precisam ser recarregados, em
intervalos regulares. Para isso, evidentemente, são responsáveis essas criaturas. Elas são
responsáveis para que todos os robôs possam alimentar-se de energia a qualquer
momento. Os pedestais, entretanto, ainda têm uma segunda utilidade e função. Eles
trabalham como transmissores de matéria, e podem trazer objetos da superfície para cá e
daqui para a superfície. Como este mecanismo funcional é posto em andamento, ainda é
totalmente misterioso. Ele suspirou.
— Entretanto nós somos obrigados a descobri-lo, se quisermos sair daqui.
— Nossos aparelhos energéticos funcionam novamente — disse eu.
Ele me contemplou com um olhar melancólico.
— O senhor é uma pessoa tão simpática — achou ele, com ternura. — Pena é que
sempre chega tarde demais.
— Quer dizer que o senhor sabe! — Eu fiz um esforço para ficar bem calmo. —
Agora podemos fazer uso de todo nosso equipamento.
Rorvic olhou em torno.
— Eu não sei se isso seria recomendável, aqui embaixo. Os anões podiam achar
ruim se nós ligarmos nossa aparelhagem. Isso poderia levar a dificuldades no seu
complicado equilíbrio de energia.
Ele abriu os braços.
— Precisamos ter cuidado. Sobretudo não devemos tocar em nada.
Nós nos pusemos em movimento. Era quase ridículo ver como Rorvic colocava,
cuidadosamente, um pé adiante do outro. Pior ainda era o comportamento de Cucula
Pampo, que admirava o albino, e procurava imitar seus movimentos.
Rorvic olhou para nós, para trás.
— Mais cuidado! — gritou ele com Pampo.
Entrementes eu tentara verificar quantos anões havia aqui embaixo. O seu número
era difícil de avaliar, porque constantemente chegavam outros, saindo de aberturas em
formato de canos, para dentro do pavilhão, enquanto outros desapareciam, pelo mesmo
caminho. Em média deviam trabalhar aqui embaixo seiscentas dessas criaturas. Também
agora eles não nos deram nenhuma atenção, mas continuaram a trabalhar, aferradamente,
nos controles, nas máquinas e nos outros aparelhos.
— Essas são as criaturas mais trabalhadoras que eu já vi, até hoje — observei.
— E as mais estranhas — resmungou Rorvic.
Nós atravessamos o pavilhão. Em nenhuma parte havia uma passagem que fosse
suficientemente grande para permitir que alcançássemos os recintos e os pavilhões
vizinhos. Que, além desse pavilhão, ainda havia outros recintos, comprovava o ir e vir
dos anões.
Finalmente Dalaimoc Rorvic parou na frente de uma parede de controles, diante da
qual se via uma dúzia de anões, sentados em pequenas poltronas, e executando
incessantemente um sem-número de conexões. Suas mãos passavam tão rapidamente por
cima dos controles, que meus olhos mal podiam segui-las. Através de inúmeros
monitores de vídeo — nenhum deles maior que uma caixa de fósforos — os anões
observavam os acontecimentos na superfície.
Eu me curvei para ver melhor alguns pormenores.
Nas pequenas telas de vídeo podia ver-se robôs, que estavam em ligação com os
pedestais na superfície, abastecendo-se de energia. Este procedimento, evidentemente,
era controlado aqui de baixo.
— Como é que nós vamos conseguir sair daqui? — perguntou Pampo. — Todas as
saídas têm apenas tamanho suficiente para deixar os anões passar.
Rorvic apontou para um pedestal.
— Nós ainda temos o transmissor.
Isso ele dizia apenas para esconder sua perplexidade. Para demonstrar-lhe o pouco
que os pedestais poderiam nos ajudar agora, eu me sentei no que estava mais próximo e
esperei. Pampo e o gigante gordo ficaram olhando, na expectativa, mas nada aconteceu.
Depois de alguns minutos eu me levantei novamente.
— Nada feito! As instalações, por alguma razão, nos trouxeram até aqui, mas não
têm a intenção de nos transportar de novo para a superfície.
Rorvic coçou o queixo gordo.
— Eu gostaria de saber se os anões do abastecimento têm alguma coisa a ver com o
“Enxame” ou com os objetos voadores do “Enxame”.
— Anões de abastecimento? — perguntamos, Pampo e eu, ao mesmo tempo.
Ele sorriu, com o que os seus olhos quase desapareceram.
— Eles precisam ter um nome — e este é tão bom quanto qualquer outro.
— Talvez o senhor queira falar com eles? — perguntei irônico.
Ele olhou do alto para mim, embaixo, como um pai bondoso olharia um filho
desobediente.
— O senhor vai abrir as negociações.
— Eu? Por que exatamente eu?
Desta vez o seu olhar ficou avaliador.
— O senhor é quem se parece mais com os anões abastecedores, o senhor tem
apenas metro e meio de altura, Capitão a Hainu. Os anões certamente aceitarão o senhor,
melhor que qualquer um de nós, como interlocutor.
Ele retirou o tradutor do seu cinturão e me entregou o mesmo.
— O senhor tem que fazer uma tentativa.
Eu peguei o aparelho, apenas hesitantemente, pois para mim parecia impossível
entrar em contato com criaturas que não tinham outra coisa em mente a não ser o
trabalho.
Além disso o tradutor não funcionaria, se os anões continuassem tão mudos como
até agora.
Mesmo assim, eu pretendia fazer uma tentativa, para demonstrar a Rorvic que não
me faltava boa vontade.
Eu me curvei bem para baixo, para os anões abastecedores, que estavam sentados
diante dos controles.
Instintivamente eu falei baixinho.
— Nós gostaríamos de negociar com vocês, como amigos.
Os anões abastecedores nem sequer se viraram. Aferrados, giravam botões e
manipulavam alavancas.
Eu perdi a paciência e toquei um daqueles pequenos seres suavemente com o dedo.
Depois disso aconteceram várias coisas ao mesmo tempo.
Os doze anões nos controles saltaram em cima de mim, como que a um comando
secreto, abandonando suas poltronas. Nenhuma das criaturas tinha mais de quarenta
centímetros. Eles se movimentavam com uma velocidade espantosa. De alguma maneira
eles conseguiram aterrissar em cima do meu peito. Parecia que tinham uma inacreditável
força para pular. O choque comum das doze criaturas fez com que eu perdesse o
equilíbrio.
Ao mesmo tempo, os meus acompanhantes foram atacados por dúzias de anões
abastecedores, que vieram correndo, vindos de todas as partes do pavilhão. Enquanto eu
perdi definitivamente o equilíbrio, caindo para trás, ainda vi que as criaturas se atiravam
em cima de Rorvic e de Pampo. O músico-favalo remava como louco com os braços e
cambaleou de um lado para o outro. Suas reações defensivas pareciam cheias de pânico.
Rorvic, ao contrário, estava parado de pernas muito abertas, e movimentando seus
braços gordos como formidáveis clavas. Ele martelou em cima dos estranhos atacantes,
limpando-os às dúzias de cima do seu traje protetor.
Eu amorteci minha queda com os braços e tentei me rolar para o lado. Os anões
abastecedores estavam em toda a parte. Eles rastejavam pelas minhas pernas acima, e se
acocoravam sobre o meu peito. Eles metiam as garras nos meus braços e nas minhas
pernas, segurando-se firmemente. Dentro de poucos segundos eu estava condenado à
imobilidade, pois sessenta ou setenta anões me seguravam.
Eu consegui virar a cabeça para o lado. Vi Cucula Pampo, dependurado
transversalmente sobre um pedestal, enquanto os anões abastecedores jogavam lençóis
semelhantes a redes por cima dele, nos quais ele se enredava cada vez mais. Já agora suas
pernas, o peito e a cabeça tinham sumido quase que completamente.
Todos os outros anões estavam ocupados com Rorvic. Eles se atiravam sobre ele,
jogavam-se em cima dele, agarravam-se a ele com suas garras, e batiam com seus
pequenos punhos no seu corpo. Às vezes não se via mais nada do albino, de tal maneira
estava envolto pelos atacantes.
Apesar de tudo ele se mexia.
Ele empurrou seu corpo gordo através das massas dos seus adversários, como se
nada neste mundo pudesse detê-lo.
Era uma visão que eu não vou esquecer jamais. Saindo das aberturas dos tubos,
brotavam outros atacantes para dentro do pavilhão. Sem olhar muito em volta, também
eles correram na direção de Rorvic. Também o albino agora foi atacado com as redes,
que já tinham sido fatídicas para Pampo. Ele as arrebentou, atirou-as para longe e passou
por cima delas.
Não demorou e eu só conseguia ainda ver, de vez em quando, a cabeça de Rorvic,
ou os braços que sobressaíam da massa dos anões.
E então Rorvic caiu.
Mas o engenheiro de ultrafrequência da Good Hope II ainda não estava batido. Ele
arrastou-se para a frente, de joelhos e nas palmas das mãos, puxando meia centena de
atacantes atrás de si. Mais uma vez ele conseguiu libertar sua cabeça. Ele sacudiu-se
como um animal cansado, depois arriou definitivamente sob o peso dos atacantes.
Esta visão me deixou furioso, e me deu novas forças. Com um puxão violento eu
me soltei. As redes, que entrementes também haviam colocado sobre mim, rasgaram.
Consegui pôr-me de pé. Os anões, que até então tinham reagido muito rapidamente,
pareciam surpresos. A pausa que eles fizeram nos seus esforços deu-me oportunidade de
puxar o meu desintegrador. Eu disparei um tiro de advertência, por cima das cabeças dos
meus adversários.
Os anões abastecedores ficaram rígidos. Eles se juntaram num só lugar, como uma
manada de animais assustados. Eu balancei a arma.
— Soltem meus amigos!
Os que me tinham segurado recuaram ainda mais, enquanto os outros, que
seguravam Pampo e Rorvic, ainda não me davam atenção.
Eu disparei mais dois tiros, um na direção de Rorvic, o outro por cima do pedestal
sobre o qual seguravam Pampo.
Desta vez os pequenos seres entenderam imediatamente. Rorvic e Pampo
conseguiram libertar-se e rasgaram as redes dos seus corpos. O albino também puxou sua
arma e apontou-a para seus adversários, que lentamente recuaram até a parede.
— Excelente! — elogiou-me Rorvic, que não parecia afetado na sua autoconfiança,
nem parecia cansado.
Nós estávamos parados um ao lado do outro, observando os anões. Nenhum de nós
dois tinha razão para triunfar. Tudo que tínhamos alcançado foi uma pausa para respirar.
Mais cedo ou mais tarde nós precisaríamos beber, comer e dormir. Os anões, no final,
acabariam vencedores — a não ser que conseguíssemos sair aqui debaixo.
— Fechem seus trajes de proteção! — ordenou Rorvic, e fechou seu capacete. —
Ligar escudos de proteção. Não sabemos o que ainda poderá acontecer. A partir de agora,
vamos nos entender através do rádio de capacete.
Quando ele ficou pronto, ativou seu aparelho de rádio de pulso. Para nossa surpresa
conseguimos contato com Sandal Tolk, que também usava um aparelho de pulso. A
ligação era muito ruim, mas acima das interferências conseguimos escutar a voz do semi-
selvagem, que chamou.
— Sandal! — chamou Rorvic, e desta vez podia-se ouvir claramente um alívio na
sua voz. — Onde é que está metido agora?
— Estou esperando pelos meus adversários, para poder me vingar deles! — foi a
resposta violenta.
— Está bem — retrucou Rorvic. — Sobre isso ainda podemos falar mais tarde.
Agora precisa tentar entrar em contato com a Good Hope, para informá-los do que
aconteceu.
Rorvic fez um curto relato a respeito dos acontecimentos ocorridos depois de nossa
última conversa pelo rádio com Perry Rhodan.
— Eu só o entendo muito mal — respondeu Sandal. — Mas eu quero... — A sua
voz perdeu-se num forte ruído.
— Sandal! — chamou Rorvic.
Desta vez ele não teve sorte. Ele praguejou, o que nele correspondia a um ataque de
loucura furiosa.
— Parece que ele entendeu o que queríamos dele — disse Pampo, esperançoso.
— É possível — concedeu Rorvic. — Mas nós não conseguimos falar a respeito de
medidas de salvamento. Além disso, ele não entendeu tudo. Nós continuamos metidos
numa esparrela. De qualquer maneira, agora vamos tentar entrar em contato com ele, em
intervalos regulares. Parece que ele não está nas proximidades do espaçoporto, caso
contrário o seu rádio de pulso não funcionaria. Espero que ele seja suficientemente
esperto, e também procure entrar em ligação conosco novamente.
Eu voltei minha atenção aos anões do abastecimento.
Eles tinham formado um largo círculo à nossa volta, e nos observavam. Nenhum
deles falava. Talvez eles fossem mudos. Com isso se colocava a pergunta de como eles se
entenderiam entre si. Quanto mais eu olhava para eles, mais convencido ficava de que
eles nada tinham a ver com aquele objeto voador do “Enxame”, que nós esperávamos
encontrar aqui. Talvez eles também não tinham ligação com os construtores das
instalações dos espaçoportos, mas trabalhava, tal como os robôs da superfície, para os
misteriosos proprietários dos edifícios e dos campos de pouso.
Mas para onde tinham desaparecido essas criaturas?
O que os tinha levado a uma fuga?
A amplidão dos espaçoportos indicava que eles estavam previstos para manobras de
partida e pouso de algumas centenas, talvez até de milhares de espaçonaves.
Por que a Humanidade até agora nunca tivera contato com um povo que possuía
uma frota desse tamanho?
Esse povo não existiria mais?
Ele desaparecera ou tinha desaparecido com suas naves?
Ou até agora tinha evitado qualquer contato com a Humanidade?
Estas perguntas eram difíceis de serem respondidas, especialmente porque os
homens que se tinham conservado inteligentes, em primeira linha precisavam preocupar-
se com o “Enxame”.
Mesmo se conseguíssemos escapar daqui, provavelmente nunca solucionaríamos o
mistério dos anões.
Mas era bem possível que as pequenas criaturas trabalhavam para um império
secreto dentro da Via Láctea. A ideia de que poderia haver um gigantesco reino estelar,
que nós homens até agora nunca tínhamos descoberto, me fascinou.
— Pare de sonhar! — veio a voz de Rorvic, pelo alto-falante do meu capacete. —
Precisamos refletir no que vamos fazer agora.
Não havia muitas possibilidades para nós — isso Rorvic sabia tão bem quanto eu.
Negociações com os anões do abastecimento não pareciam possíveis.
— Em caso de necessidade vamos ter que abrir um caminho para o alto, na base de
tiros energéticos — disse Rorvic.
— O senhor sabe o que então pode acontecer? — perguntei. — Não levando em
conta de que os anões podem ficar malucos, pode haver explosões e incêndios, com os
quais não teríamos chances de escapar. Além disso, não sabemos a que distância estamos
da superfície. Talvez alguns quilômetros. Neste caso, jamais o conseguiríamos.
— Suas objeções são justificadas — concedeu Rorvic. — Mas parece que os
pedestais-transmissores só funcionam em uma direção. Não há saídas. Eu não sou
homem para ficar esperando pelo meu fim sem fazer nada.
— Talvez os anões se acalmem novamente, depois de algum tempo, e voltem para o
seu trabalho — interveio Pampo, hesitante.
— Isso é possível, mas não é certo — respondeu o albino.
Nossa discussão foi interrompida por um acontecimento, que provava nitidamente o
que tínhamos pela frente nas próximas horas.
Através de um pedestal de transmissor apareceu um robô da superfície.
O ar começou a cintilar, e então materializou uma dessas máquinas parecidas com
tonéis, dos quais eu já observara um exemplar na superfície.
No seu tripé, o robô estava de pé sobre o pedestal do transmissor, de modo que
parecia quase improvável que ele tivesse vindo para cá pelo caminho do transmissor.
Ou os anões o haviam chamado, ou ele fora atraído por alguma instalação de
alarme.
De qualquer modo ele estava aqui.
Quanto às intenções do monstro mecânico, não havia dúvidas.
Ele estendeu braços de agarrar, cabos e tentáculos e cambaleou em nossa direção.
Os anões recuaram ainda mais, olhando para o robô no alto, que para eles devia ser um
gigante.
Nós recuamos devagar. Eu sabia que não tínhamos chances de escapar. Não havia
saídas pelas quais pudéssemos fugir.
Rorvic ergueu o braço e fez mira com o seu desintegrador em cima do robô, que se
aproximava cada vez mais.
— Pare! — gritei. — Não se esqueça de que os anões podem trazer para cá quantos
robôs quiserem, através dos pedestais-transmissores.
Ele hesitou apenas um momento, depois sacudiu a cabeça com raiva. Um tentáculo
do robô atirou-se para a frente e enrolou-se na perna de Pampo. O artista deu um grito e
caiu. A máquina logo o puxou para si.
Rorvic atirou. No corpo-tonel do robô apareceu um buraco do tamanho de um prato.
Uma nuvem de fumaça subiu ao teto. Rorvic atirou uma segunda vez.
Ele separou o tentáculo que segurava Pampo, do corpo do autômato.
Como se tivesse ficado surpreso com nossa resistência o robô parou e baixou seus
braços de pegar. Pampo pôs-se novamente de pé, e levantou sua arma. Antes que Rorvic
ou eu o pudéssemos impedir, ele deu vários tiros no robô.
O corpo do autômato ficou destroçado. Com um barulho enorme a formação
metálica ruiu sobre si mesma. Dentro de poucos segundos se transformara num monte de
sucata fumegante. Peças isoladas ainda se mexiam, mas elas não significavam perigo para
nós.
— Ele está liquidado! — conseguiu Pampo dizer aos trancos. — Ele não pode mais
nos atacar.
Rorvic olhou-o com pena.
— Provavelmente o senhor, com seu feito maravilhoso, providenciou para que logo,
aqui embaixo, haja um bando de robôs.
Eu olhei em volta.
— Precisamos destruir os pedestais do transmissor — disse eu, decidido. — É nossa
única possibilidade.
— E como vamos escapar depois? — perguntou Pampo.
— Por enquanto trata-se de salvar nossas vidas!
Nós olhamos para Rorvic. Ele teria que tomar a decisão.
O albino anuiu.
Ele fez mira sobre o pedestal mais próximo e disparou um tiro. Um fantástico
relâmpago de descarga superficial saiu de dentro do pedestal e me ofuscou. Depois
seguiu-se uma explosão. O pedestal foi literalmente arrebentado. Apesar dos trajes de
proteção e dos escudos energéticos ligados, fomos atirados para o chão pela onda de
choque. Somente Rorvic conseguiu manter-se de pé. Eu vi que os anões de
abastecimento, no fundo do pavilhão, foram soprados para todos os lados, como um
monte de folhas murchas. Línguas de fogo subiram pela abertura no chão, aparecida no
lugar onde estivera o pedestal do transmissor.
— Parem! — gritou Rorvic. — Não atirem mais nas instalações do transmissor.
Eu levantei a cabeça.
Através da fumaça e das chamas eu vi os corpos disformes dos robôs avançando,
balouçantes, para nós. Eles tinham descido através dos pedestais-transmissores ainda
intactos e nos atacavam.
Sem refletir, rapidamente me esgueirei para o buraco no chão. As chamas não eram
perigosas para mim. O meu escudo energético me protegia também do calor.
Eu deixei-me escorregar através da abertura no chão. O braço de agarrar de um robô
me tocou. Abaixo de mim não se conseguia ver nada. Eu deixei-me cair.
Alguns metros abaixo, eu me choquei contra o solo e rolei para o lado. Estava
escuro, mas bem ao fundo pareceu-me poder ver algumas luzes pálidas.
— Capitão! — gritei.
— Onde está o senhor, por todos os planetas? — respondeu o nosso chefe.
— Aqui embaixo, num recinto mais no fundo. Eu saltei através do buraco no chão.
— Adiante, Cucula! — gritou Rorvic, estimulando-o. — Vamos segui-lo!
Eu me joguei rapidamente para o lado, para que nenhum dos meus acompanhantes
caísse em cima de mim. Eu tinha esperança de que os robôs ainda não tivessem cercado o
buraco.
Liguei o meu holofote de capacete. Através de muita fumaça eu vi um chão
cinzento, de pedras, no qual viam-se calhas e buracos. Ergui a cabeça. A abertura não
podia ser vista, devido à fumaça. As chamas, aparentemente, se alastravam mais por
baixo do teto. Certamente os anões, na medida em que tinham escapado da explosão,
tinham impedido que o fogo se alastrasse. Rorvic aterrissou perto de mim, no chão. Ele
chocou-se com o mesmo como um saco muito cheio, de modo que, quem não o
conhecesse, certamente o daria como morto. Porém Rorvic levantou-se logo novamente,
sacudiu-se e me acenou. Ele olhou para cima, ligou o seu holofote de capacete e gritou:
— O que ainda está esperando, Pampo?
A fumaça espalhou-se um pouco. Nós podíamos ver Pampo. Ele estava meio
dependurado no buraco da explosão, tentando inutilmente soltar-se das garras de um
robô, que o queria puxar para fora novamente.
Rorvic pegou a sua arma.
— Isso é perigoso! — disse eu rapidamente. — O senhor mal pode vê-lo, através
dessa fumaça toda.
O capitão apenas resmungou e atirou. Ele acertou imediatamente. Pampo caiu perto
de nós no chão, e gemeu baixinho. Rorvic o puxou, para que ele se colocasse de pé.
— Tudo em ordem?
— Sim — confirmou Pampo. — Obrigado.
Lá em cima, em volta da abertura, alguns robôs haviam se reunido, e nos
observavam. Eles estenderam seus braços para nós, mas não conseguiam alcançar-nos.
— É melhor sumirmos daqui — decidiu Rorvic.
Também Pampo agora ligara seu holofote de capacete. Logo depois de alguns
passos, não havia mais fumaça, e nós pudemos ver melhor.
Rorvic olhou fixamente para aquele chão estranho.
— O que é isso? Pedra talhada? Isso não está absolutamente de acordo com as
perfeitas instalações técnicas do andar acima.
— Talvez sejam cavernas de nativos mortos de há muito — retruquei.
Nós continuamos em frente. As luzes fracas que eu descobrira ao fundo agora
podiam ser vistas nitidamente. Quando chegamos mais perto topamos com um fenômeno,
que eu jamais havia visto antes.
A parede, diante da qual estávamos, consistia de uma rocha talhada e aparelhada.
Em diversos lugares havia nichos cavernosos. Nestes buracos da parede subia uma água
luminosa, turbilhonando. As forças que mantinham o líquido em movimento e impediam
que ele escorresse de dentro da caverna eram inexplicáveis.
Rorvic emitiu um assobio baixinho. Era difícil impressioná-lo, mas desta vez
certamente alguém o conseguira.
Cucula Pampo desligou seu escudo energético e levou um braço para dentro da
caverna de água. Quando ele o puxou de volta, a fazendo do seu traje protetor estava
molhada. Água pingava ao chão, mas a mesma perdera sua capacidade luminosa.
— Em algum lugar deve haver projetores de gravidade — achou o músico.
Rorvic riu guturalmente.
— Aqui embaixo não há reatores, nem qualquer instalação técnica comparativa. Ou
nós nos encontramos diante de una fenômeno natural, ou então os habitantes desta
caverna, mortos há muito tempo, possuíam forças mágicas.
Eu lhe lancei um olhar de esguelha.
— Desde quando o senhor acredita em magia?
Ele ergueu os ombros.
— Eu acredito na força do espírito. Durante minhas meditações, eu muitas vezes me
perguntei se, para isso, realmente existem limites.
Eu sabia que Rorvic se ocupava com antigas ciências fronteiriças. Ele tinha um par
de dons, que outras pessoas não dominavam. Um deles era sua capacidade de submergir
completamente em si mesmo.
Nós seguimos ao longo da parede. Nela encontramos oito cavernas de água, de
diferentes tamanhos.
Atrás da caverna maior encontramos uma saída. De ambos os lados havia colunas
rochosas, nas quais estranhas figuras haviam sido entalhadas. Os desenhos mostravam
círculos, linhas e pontos. No meio, repetidamente, surgia um triângulo com um pendão,
que sempre se encontrava no centro de diversos círculos. O simbolismo era totalmente
exótico, e não se podia entendê-lo. Mas aqui embaixo, em algum tempo, tinham vivido e
trabalhado criaturas inteligentes.
— Talvez estes desenhos sejam uma advertência, de que devemos seguir este
caminho — refletiu Pampo.
— Eles podem também ser um desafio — retruquei, de má vontade.
Rorvic colocou-se atrás de uma coluna e se abaixou. Ele ergueu um osso de formato
estranho e segurou-o diante da luz do seu holofote.
— Acho que Pampo tem razão — disse ele. — Mas seja qual for a coisa da qual os
desenhos devem nos advertir, o perigo provavelmente já não existe mais há séculos, ou
mais que isso.
Eu olhei com uma sensação de insegurança para o corredor escuro. Senti um certo
desconforto. O que nos esperava na outra extremidade do corredor?
— No que está pensando? — perguntou Rorvic.
Eu não respondi, mas fiquei escutando, tensamente. Da parte da caverna de onde
tínhamos vindo pareceu-me ouvir um tilintar metálico. Era bem possível que os robôs
tivessem descido pelo buraco para a caverna, e nos perseguissem.
Mas talvez eu apenas ouvira um dos instrumentos de Pampo.
Rorvic, que às vezes tinha a incomum capacidade de se meter nos pensamentos das
outras pessoas, disse:
— O senhor receia que os robôs possam estar nos seguindo.
— Eu escutei alguma coisa.
O albino fez um gesto convidativo na direção do corredor escuro.
— O que ainda estamos esperando?
***
Nós penetramos no corredor.
Eu me perguntei a que profundidade nos devíamos encontrar, abaixo da superfície
de Teste Rorvic. Se levássemos em conta que os antigos habitantes destas cavernas
tinham necessitado de oxigênio para viver, não podíamos estar muito fundos. Isso me deu
esperanças. Talvez houvesse uma saída natural, através da qual poderíamos chegar à
superfície, longe de um espaçoporto.
Concentrei minha atenção nos nossos arredores. A luz de nossos holofotes,
repentinamente, pareceu-me curiosamente muito fraca. O corredor estava livre de
fumaça, mas alguma substância dentro do corredor parecia sugar a luz.
Eu apertei os olhos.
A diminuição da força luminosa de nossos holofotes apenas podia ser uma ilusão,
pois os aparelhos energéticos de nossa mochila funcionavam sem problemas.
O chão agora era liso, até um rego num dos lados. Através dele antigamente
provavelmente escorrera água servida. As paredes estavam decoradas com grandes
desenhos cinzelados. Praticamente nenhum dos desenhos parecia-nos compreensível.
Com muita imaginação, de vez em quando, podia reconhecer-se criaturas de aspecto
estranho, que jamais se suspeitaria existirem num mundo como Teste Rorvic. Talvez
fossem imagens saídas da fantasia de artistas de há muito desaparecidos.
Um desenho que era recorrente mostrava um gigante de oito pernas, em posição
acocorada. Ele possuía olhos salientes e um rosto contorcido num esgar. Eu achei que
devia tratar-se de uma deidade malévola.
E então descobrimos as primeira sepulturas.
Pampo chamou nossa atenção para uma abertura na parede. Ela era triangular, e
numa das pontas mostrava uma fenda, que me lembrava dos desenhos nas colunas da
entrada.
Os feixes de luz de nossos holofotes de capacete passearam pela parede.
Encontramos outras aberturas. Na maioria dos casos, havia três consecutivas.
Eu me aproximei mais da parede e iluminei dentro de uma das aberturas. Além de
um montezinho de poeira cinzenta, não se via mais nada.
De repente saiu da abertura um ruído que parecia um queixume humano. Eu recuei
e peguei minha arma.
— Vamos sumir daqui! — sugeriu Pampo, nervoso.
— Devagar, devagar! — admoestou-nos Rorvic. — Não devemos deixar nos
impressionar por esse barulho. Eu creio que ele é causado pelo vento dentro da caverna
ou então pelo rochedo. Talvez também alguns animais se arrastam por aí.
Eu não estava pronto para aceitar isso, mas fiquei parado com a arma, pronta para
atirar, na mão.
Novamente saiu um gemido da abertura, diante da qual estávamos de pé. Dos outros
buracos na parede ecoou o eco. Aquilo se parecia com uma resposta.
— Isso é sinistro! — murmurou Pampo.
— É apenas estranho — retrucou Rorvic. — Eu suponho que nos encontramos
diante das tumbas de um povo de há muito desaparecido. Tudo indica isso.
— E esses uivos? — perguntei.
Rorvic sorriu, superior.
— Eu sugiro que agora nós calemos a boca a cada cinco minutos, e então o senhor
vai ter uma grande surpresa.
Por alguns minutos ficarmos em silêncio diante da abertura, esperando. Os uivos
emudeceram finalmente.
— Exatamente como eu adivinhei — disse Rorvic, triunfante. — O gemido foi
provocado por nossas vozes e pelo ruído de nossos passos. No interior das sepulturas é
provocado uma espécie de eco, que reproduz todos os ruídos distorcidos. Essa parede de
sepulturas provavelmente foi uma espécie de muro das lamentações para os estranhos.
Poucos instantes depois o gemido começou novamente e com isso parecia confirmar
a teoria de Rorvic.
— Como é que o senhor descobriu isso? — perguntei, espantado.
— Eu reconheci a sua voz nos ruídos do eco — disse ele.
Eu sabia que ele mentia. Mas ele não pudera evitar de mencionar a minha voz
estridente. Calmamente ele retribuiu o meu olhar furioso.
— Como o nosso grande místico descobriu o que se passa aqui, podemos prosseguir
— disse eu para Cucula Pampo, que ficou feliz em poder se afastar do cemitério.
Rorvic assumiu novamente a ponta. O corredor parecia ser infinitamente comprido.
Depois de termos caminhado por ele por mais meia hora, encontramos nas paredes
grandes quadros. De cada lado, quatorze quadros haviam sido cinzelados na pedra. Cada
quadro era envolvido por uma espécie de moldura.
— Uma história em quadrinhos — disse Rorvic, que, como sempre, rapidamente
tinha uma explicação para tudo. — Talvez possamos interpretar os quadros isoladamente.
Porém os desenhos das rochas eram tão exóticos, que apenas podíamos adivinhar.
Representações isoladas, além do mais, estavam tão pouco nítidas e confusas, que não se
podia mais reconhecer pormenores. Eu achei que estes desenhos já tinham sido feitos há
milênios.
Quando continuamos em frente, topamos com um grupo de plantas parecidas com
cogumelos, muito grandes, que cobriam o chão em toda a largura do corredor.
Rorvic ergueu um braço.
Nós iluminamos mais profundamente o corredor. Por toda a parte havia cogumelos.
Se quiséssemos prosseguir teríamos que calcá-los com os pés. Eles tinham cerca de meio
metro de altura, possuíam o formato de uma pêra, apresentando diversas grandes
excrescências globulares.
— Plantas! — disse eu.
— Aqui embaixo? — Apesar de não poder ver o seu rosto, eu tinha certeza de que
ele estava sorrindo ironicamente. — Não tenho tanta certeza disso.
— Não devemos deixar nos deter! — Pampo continuamente olhava para trás, no
corredor, evidentemente temendo que os robôs pudessem nos seguir até aqui.
Rorvic bocejou audivelmente.
— Nós devíamos descansar um pouco, primeiro.
Essa observação me irritou.
— Justamente aqui? Pelo menos devíamos tentar chegar ao fim do corredor.
O homem gordo apontou para os cogumelos.
— Isso não me agrada. Eu preciso refletir sobre essas coisas. Uma sensação muito
forte me diz que seria errado marcharmos por cima desse canteiro de plantas.
— De que está com medo? — Eu me aproximei do primeiro cogumelo e dei-lhe um
pontapé. Ele arrebentou, e um dos anões parecidos com tartaruga caiu para fora. A
pequena criatura ainda estava atordoada, mas rapidamente pôs-se de pé e saiu correndo
pelo corredor, antes que pudéssemos fazer alguma coisa.
Eu senti o olhar de Rorvic sobre mim, e praguejei.
— Isso o senhor não poderia saber!
— É claro que não! — confessou ele.
— O senhor acha que os anões vivem em simbiose com essas coisas? — perguntou
Pampo.
Eu encolhi os ombros. Talvez os anões dormissem aqui embaixo. Mas como é que
eles conseguiam chegar daqui, lá em cima? Afinal de contas somente com a explosão de
um pedestal de transmissor criara-se um buraco no chão do pavilhão de máquinas.
As criaturas semelhantes a tartarugas eram os descendentes do povo que em outros
tempos construíra os espaçoportos de Teste Rorvic?
— Se marcharmos através do canteiro de cogumelos, temos que contar com que
todos os anões saiam dali — refletiu Rorvic.
— Nós vamos ter que nos esgueirar cuidadosamente para a frente — disse eu. —
Existem bastante aberturas.
Rorvic acocorou-se no chão, e encostou-se na parede.
— O senhor não pode dormir agora, capitão. — gritei-lhe.
— O senhor é terrivelmente chato, capitão! — gritou-me ele de volta.
Eu estava decidido que desta vez não afrouxaria, e acenei para Pampo.
— Venha, vamos tentá-lo sem ele! Preste atenção para passarmos por lugares onde
os cogumelos não crescem muito juntos.
O artista hesitou. Ele parecia refletir sobre onde estaria mais seguro, e decidiu-se
por Rorvic.
— Eu fico com o Capitão Rorvic.
Eu olhei para os dois, furioso.
Neste caso eu o experimentaria mesmo sem eles. Quando comecei a andar na
direção dos cogumelos, Rorvic de repente estava do meu lado, segurando-me pelo braço.
— Vamos tentá-lo com nossos aparelhos de voo!
— Neste corredor estreito? Isso não vai muito bem.
— Como assim? — Ele me segurava com uma de suas mãos e manipulou alguma
coisa no seu cinturão de comutações. — O perigo de destruirmos alguns cogumelos
durante o voo é muito menor que marchando a pé.
— Voe o senhor na frente! — exigi dele.
Ele anuiu e ligou sua aparelhagem. Elevou-se do chão e pairou na direção dos
cogumelos. Pampo e eu o seguimos. Imediatamente houve problemas.
Pampo novamente tomou uma posição esquisita e tocou um par de cogumelos com
os pés, que imediatamente arrebentaram. Eu vi um par de anões caírem para fora. Este
acontecimento teve como consequência uma reação em cadeia. Por baixo de nós todos os
cogumelos se abriram. Centenas de anões conseguiram sair. Depois de um curto espaço
de estupefação, eles tinham se orientado.
Rorvic reagiu rapidamente e acelerou. Mesmo assim um par de anões saltara até o
alto, e se agarrara nas suas pernas e nos seus braços. Eu também acelerei. Como,
entretanto, eu me encontrava atrás de Rorvic, fui alcançado por muito mais anões.
O pior aconteceu com Cucula Pampo.
Ele não acelerou, de modo que logo os anões estavam dependurados nele aos
magotes, tentando puxá-lo para o chão.
— Acelerar! — gritou Rorvic, pelo rádio de capacete. — Temos que sair daqui.
Já era tarde demais.
Pampo desceu numa curva rasa para baixo e caiu em cima de diversos cogumelos,
que ruíram sobre si mesmos. Imediatamente o corpo de Pampo estava coberto de
centenas de anões.
— Vamos voltar! — comandou Rorvic. — Temos que tirá-lo dela.
Eu parei e tentei tirar com as mãos todas as criaturas que se seguravam em mim.
Rorvic veio velejando como um urso voador, puxando atrás de si uma corrente de
anões de abastecimento. Eles não pareciam incomodá-lo.
Ele bateu contra mim, com o que me livrei de alguns atacantes.
Nós deixamos nos cair até onde se encontrava Pampo. Ele procurava se defender
dos estranhos, mas não conseguia pôr-se de pé. Finalmente conseguimos chegar até uma
perna, apesar de constantemente pularem em cima de nós.
— Aqui! — gritou Rorvic. — Agarre junto comigo!
Nós pegamos, juntos, a perna do músico e ligamos aceleração máxima. Pampo foi
literalmente puxado para fora do ajuntamento de anões abastecedores. Nós voamos
velozmente através do corredor. Os anões pulavam às cegas, tentando alcançar nossos
braços e pernas, mas não nos alcançavam, na maioria dos casos.
E então o corredor estava livre outra vez. Nós ainda continuamos voando por
algumas centenas de metros, porque contávamos com perseguidores. Depois largamos
Pampo.
— O senhor está bem?
— Sim — disse o músico-favalo. — Eles teriam me amassado, se a Hainu e o
senhor não tivessem intervindo.
Rorvic iluminou o corredor abaixo.
— Eu tenho a sensação de que, por este caminho, jamais vamos conseguir sair.
— Por quê? — quis eu saber.
Ele fez um círculo com um braço.
— Eu verifiquei que o corredor é levemente curvo. Ele corre como um anel em
tomo de algum centro. Mais cedo ou mais tarde vamos sair novamente naquela caverna,
da qual partimos.
— Neste caso, podemos voltar logo — opinou Pampo.
Rorvic sacudiu a cabeça.
— Eu tenho certeza de que existem corredores laterais e aberturas no teto.
Precisamos apenas encontrá-las.
— E se penetrarmos no centro, em cuja existência o senhor acredita? — perguntei.
Eu iluminei diretamente a sua cara, mas ele nem piscou.
— Eu não acho isso bom — recusou ele. — Ali só teríamos dificuldades ainda
maiores.
Nós continuamos adiante, sem saber o que nos esperava. De vez em quando Rorvic
tentava conseguir ligação pelo rádio com a Good Hope II ou com Sandal, mas não teve
sorte com isso. Uma vez escutamos um fraco rumorejar, que devia vir do aparelho de
pulso de Sandal, mas isso foi tudo.
Finalmente vimos diante de nós, de ambos os lados da parede, rochas salientes, que
iam do chão até o teto.
Rorvic bateu com a coronha de sua arma contra uma das rochas alisadas, depois
passou os dedos ao longo das fendas.
— Eu aposto que descobrimos dois corredores laterais, amigos. — Ele deu um
passo para trás. — Vamos, ver se não tenho razão.
Ele fez a mira e disparou com seu desintegrador contra o rochedo do lado direito do
corredor. A rocha transformou-se em gás. Apareceu um buraco do tamanho da cabeça de
um homem. Rorvic interrompeu os disparos e aproximou-se do local.
— Uma rocha grossa — verificou ele, laconicamente, e começou a disparar
novamente.
De repente a fumaça que subira do lugar do alvo foi sugada pelo buraco, sinal
seguro de que Rorvic tinha atravessado o rochedo com seus disparos.
Desta vez eu me aproximei e iluminei o buraco criado. Não pude ver muita coisa,
atrás do rochedo parecia haver uma galeria larga, que mal se distinguia do corredor no
qual nos encontrávamos.
— Temos que destruir a rocha completamente, — disse Rorvic, — pois dificilmente
vamos poder movimentá-la com as mãos. — Sua voz tomou um tom pensativo. — Eu me
pergunto como as criaturas que antigamente viviam aqui a mexiam do lugar.
Isso me provava que ele também pensava nos misteriosos estranhos, que tinham
construído este sistema de cavernas e os espaçoportos na superfície. Ou antigamente
tinham existido dois povos em Teste Rorvic?
E o que é que os anões abastecedores tinham com isso?
Nós disparamos, os três, em cima do rochedo e o dissolvemos.
Sem hesitar, Rorvic entrou na galeria lateral.
Nos fundos brilhava uma luz mortiça.
Eu mantinha minha arma pronta para atirar, pois não era de se excluir, que nós
novamente íamos chegar a um pavilhão, ocupado por anões abastecedores e robôs.
A galeria alargou-se. Nós entramos num pequeno pavilhão, em cujo centro havia
uma esfera luminosa. Ela tinha cerca de dois metros de diâmetro e estava montada em
cima de um pedestal em formato de disco. Não se podia ver se no interior da esfera havia
um núcleo escuro.
Nós ficamos parados e olhamos fixamente para aquela formação.
— E então? — perguntei eu finalmente, voltado para Rorvic. — O senhor também
tem uma explicação para isso?
Ele ignorou minha observação.
Eu verifiquei que a luz da esfera estava sendo sugada do mesmo modo misterioso
que a de nossos holofotes de capacete.
Apesar da esfera atrair meus olhares, como por forças mágicas, eu me obriguei a
concentrar minha atenção nos arredores. O chão era liso, mas consistia de pedra dura. O
teto não podia ser visto nitidamente, pois estava encoberto pela névoa. As paredes
pareciam negras, como se tivessem sido pintadas, posteriormente, com tinta preta. Em
alguns lugares rolhas saíam de aberturas redondas.
Eu ousei chegar mais perto da esfera, apesar de Rorvic me advertir para tomar
cuidado. O pedestal sobre o qual aquela formação misteriosa repousava consistia de um
material desconhecido. Ele não refletia a luz da esfera.
A luz que se sobrepunha ao brilho de nossos holofotes parecia ser fria. Quando
toquei a bola, ela parecia fria.
— Essa coisa não se adapta às cavernas e aos desenhos rupestres que nós
encontramos — verificou Rorvic. — Talvez tenha sido colocada aqui posteriormente
pelos anões abastecedores ou pelos robôs. Poderia ser uma instalação energética.
A minha impressão, que nestes casos só raramente me enganava, me dizia que os
pensamentos de Rorvic não estavam certos. A esfera era tão velha quanto o sistema de
cavernas e ela tinha alguma relação com o mesmo.
— Não poderia ser um lugar de culto dos antigos habitantes das cavernas? — quis
saber Cucula Pampo.
— Isso me parece mais provável que sua teoria — declarei a Rorvic.
De repente ele saiu do chão e pairou para o teto. Praticamente todo o seu corpo
desapareceu na névoa.
— Pode ver alguma coisa interessante? — perguntei.
Neste instante formou-se por cima da esfera uma forte coluna luminosa que ia até o
teto e envolveu Rorvic. Rorvic alongou-se. Parecia que ele estava enfiado dentro de um
tubo.
— Dalaimoc! — chamei, alarmado.
Ele não respondeu. Ele também não se mexeu mais.
E então o seu corpo ficou transparente. Seu traje protetor, sua pele, suas carnes e
músculos pareciam dissolver-se. Finalmente somente se podia ver ainda os contornos de
Rorvic.
— Por todos os planetas! — gritou Pampo. Ele ficara pálido. — Temos que fazer
alguma coisa.
Eu ergui minha arma, mas hesitei em atirar em qualquer coisa dentro do pavilhão,
porque as consequências disto, criadas para Rorvic, eram imprevisíveis.
— Espere aqui embaixo! — ordenei ao artista. — Se me acontecer alguma coisa
semelhante ao que ocorreu com Rorvic, o senhor precisa tentar nos libertar.
Eu hesitei.
— Em caso de necessidade, vai ter que atirar no globo.
Ele me olhou fixamente, como se já estivesse diante de um morto.
Eu liguei minha aparelhagem de voo. Lentamente voei para o alto, para o teto. Os
véus de neblina tinham sumido. O teto da caverna era liso. No seu centro sobressaíam
três bastões inclinados, de cujas pontas saíam faíscas.
Eu me concentrei em Rorvic. Evidentemente ele se encontrava dentro dessa curiosa
coluna de luz. O seu corpo era apenas ainda um fantasma.
— Capitão Rorvic! — gritei.
Não veio nenhuma resposta. A ligação de rádio com o albino fora interrompida.
Eu não ousei voar para mais perto da coluna de luz, pois era possível que então eu
também seria agarrado por ela.
Enquanto eu ainda refletia, tudo ficou brilhantemente claro à minha volta.
Espantado, olhei para baixo. Ao mesmo tempo minha capacidade de me movimentar
diminuiu. Antes de dar-me conta de que tinha caído numa armadilha semelhante à de
Rorvic, forças desconhecidas já tinham paralisado o meu corpo.
— Hainu! — ouvi Pampo gritar. — Volte aqui!
Eu não podia responder. Agora eu sabia em que situação Rorvic se encontrava.
— Concentre-se — disse Pampo. — Levará apenas alguns minutos, e então terá
novamente a necessária imunidade para poder sair para fora.
Isso não era Pampo.
Eu não tinha escutado voz alguma, mas captara um sinal telepático.
A instalação, fosse lá o que fosse, me transmitira uma mensagem. Era evidente que
ela me confundia com um dos seres que antigamente tinham vindo para cá.
Os estranhos tinham vindo para cá, para se deixarem imunizar contra alguma coisa.
Eu me lembrava...
— ...e então terá novamente a necessária imunidade para poder sair para fora.
Para fora.
Será que com isso estavam querendo dizer à superfície? Uma outra explicação era
pouco provável.
Mas para que eram necessários diversos preparativos, para poder-se pôr os pés na
superfície de um mundo como Teste Rorvic? Durante nosso voo de aproximação não
pudemos constatar quaisquer radiações perigosas. Se há milênios atrás tivesse existido
uma radiação perigosa, nós pelo menos teríamos encontrado indícios ou traços da mesma.
Contra o que os habitantes das cavernas tinham que se imunizar?
Contra inimigos perigosos?
Com a noção de “lá fora” eles queriam dizer o cosmo?
Os meus pensamentos foram interrompidos, quando a voz telepática novamente
soou. Desta vez havia um laivo de raiva na mesma.
— Concentre-se. Caso contrário o tratamento terá o menor efeito.
Eu respirei aliviado. Em poucos instantes Rorvic e eu estaríamos novamente livres,
armados contra um perigo desconhecido.
Porém então lembrei-me, horrorizado, de Cucula Pampo, que ficara para trás no
chão, com a ordem de abrir fogo sobre a esfera luminosa, se eu e Rorvic não voltássemos.
Por quanto tempo Pampo esperaria?
— O senhor tem que se concentrar!
Eu tentei esquecer Pampo e todo o resto, pois esta parecia a única possibilidade de
sair o mais rapidamente possível novamente de dentro desta coluna luminosa. Eu
esperava que Pampo não perdesse o controle, atirando imediatamente sobre a esfera. Isso
poderia ter sérias consequências. Eu abafei esse pensamento.
De repente comecei a descer dentro da coluna. O meu corpo parecia ter ficado sem
gravidade. Eu me aproximava da esfera.
Se Pampo agora abrisse fogo...
Eu não podia vê-lo, pois continuava não podendo me mexer. Além do mais, a luz
clara da coluna me ofuscava.
Eu penetrei na esfera. Na minha cabeça eu senti calor. Depois um estremecimento
passou por todo o meu corpo. Eu fui empurrado para a frente e caí no chão. A paralisia
diminuiu. Eu pude pôr-me de pé.
Perto de mim estava Dalaimoc Rorvic e Cucula Pampo. Chamou minha atenção que
Rorvic tinha duas armas nas mãos, a dele e a de Pampo. Evidentemente ele voltara no
último instante, tendo impedido que Pampo disparasse.
Rorvic olhou para o relógio e sacudiu a cabeça, condescendente.
— Eu imaginei que o senhor fosse demorar um pouco mais, mas nunca uma hora...
— Uma hora! — gemi eu, com dificuldade. — Aquilo me pareceu minutos apenas.
— O problema é que o senhor não sabe relaxar nem se concentrar — censurou-me
ele.
— O senhor tem calma — retruquei. — Afinal Pampo tinha ordens de atirar na
esfera, caso eu desaparecesse.
Pampo estava parado ali, de cabeça baixa.
— E foi o que ele quase fez — informou Rorvic. — Mas eu ainda consegui intervir
em tempo.
Eu respirei fundo.
— O senhor tem alguma ideia, contra o que agora estamos imunizados? —
perguntei a Rorvic.
Ele fez um gesto preguiçoso.
— O tratamento foi totalmente sem sentido para nós. O perigo contra o qual os
estranhos tinham que se proteger, não poderá nos prejudicar, porque desde o começo
estávamos imunes contra ele.
— Do que está falando, afinal de contas?
— Da onda de imbecilização — retrucou ele, calmamente.
6

Dalaimoc Rorvic adorava dar às conversas um rumo surpreendente. Por trás da


máscara de fleumático, ele escondia uma inteligência marcante, que trabalhava
logicamente.
Desta vez, entretanto, a sua observação apenas tinha o sentido de nos surpreender.
— Que bobagem é essa? — Eu fiz um gesto depreciativo. — Desde o começo da
catástrofe não se passou nem sequer um ano ainda. As criaturas, que aqui foram
imunizadas, já morreram há milênios atrás, ou então emigraram. A esfera, portanto não
pode imunizar contra a modificação da constante de gravitação.
— Do jeito que o senhor o visualiza, naturalmente tem razão. Mesmo assim,
antigamente, criaturas de nós desconhecidas vinham para cá para se protegerem contra a
imbecilização do espírito.
Eu arqueei as sobrancelhas.
— Como sabe disso?
— Sim! — Agora Pampo parecia ter ficado desperto novamente. — Como sabe
disso?
— É muito simples! — O albino apontou para a esfera. — Afinal de contas a
instalação possui a possibilidade de entrar em ligação telepática com as criaturas que a
utilizam.
— E daí? — insisti, curioso.
— Eu conversei com a esfera! Eu perguntei-lhe a respeito de suas possibilidades.
Eu sorri, chateado.
— E ela respondeu-lhe?
— Não a respeito de tudo. Mas perguntas que têm relação com a sua atividade, ela
pôde responder.
Eu não acreditei que Rorvic fosse nos mentir numa situação dessas. Mas de
qualquer modo era possível que ele estivesse enganado. Quem poderia saber, tudo que ele
pôde escutar naquela voz telepática?
— Por que me olha tão fixamente? — quis saber Rorvic, irônico. — Estou falando a
verdade. Afinal de contas, minha afirmação significa apenas que as criaturas que viviam
aqui antigamente tinham que proteger-se contra uma ameaçadora imbecilização, quando
abandonassem o sistema de cavernas.
— Mas naqueles tempos ainda não havia nem o “Enxame” nem os Manips —
protestei.
— O perigo de uma imbecilização não precisa necessariamente ter partido de uma
formação como o “Enxame” — retrucou ele. — Naturalmente existe a suspeita de que se
tratava de um “Enxame”.
— Eu admiro a sua imaginação! — gritei-lhe.
— O senhor já ouviu falar, alguma vez, dos Conquistadores Amarelos? — quis ele
saber.
— Boatos — respondi. — Dizem que por toda a parte em nossa galáxia existem
traços e indícios de um povo que desapareceu há tempos muito remotos. Toda essa coisa
foi mistificada. Muitas coisas foram pressagiadas baseadas nisso. Descobertas isoladas
provavelmente não têm nenhuma ligação entre si.
O olhar de Rorvic assumiu aquela fixidez que eu conhecia de suas meditações.
— Eu gostaria de poder reconhecer mais claramente as conexões — ele suspirou. —
Talvez eu também apenas imagine ter descoberto conexões. De qualquer maneira a coisa
é mais do que surpreendente.
Da esfera foi atirada uma coluna luminosa que agarrou Cucula Pampo.
— Agora chegou a vez dele — verificou Rorvic, dando um passo para trás. —
Espero que ele seja suficientemente inteligente para não se opor ao tratamento. Neste
caso logo ele estará de fora novamente. Vamos partir, logo que Pampo estiver imunizado.
— Duplamente imunizado — disse eu, irônico.
Ele notou que eu dava pouco crédito às suas teorias. Mas isso não o incomodava.
Ele jamais se importara com as opiniões de outras pessoas.
Depois de cerca de meia hora, Cucula Pampo foi liberado novamente. Ele estava
confuso, mas não se ferira.
Rorvic não lhe deixou muito tempo.
— Venha! Vamos prosseguir nosso caminho.
Pampo ganhou sua arma de volta. Eu gostaria de examinar melhor a estranha esfera
e o pavilhão no qual ela se encontrava, mas verifiquei que não podíamos ficar ali por
mais tempo. Talvez, num exame mais profundo, poderíamos descobrir se as teorias de
Dalaimoc Rorvic tinham base.
Nós entramos na galeria, que do outro lado do pavilhão novamente ficava mais
estreita. Logo não pudemos mais ver a luz da esfera. Em circunstâncias normais, nós
deveríamos poder ver a esfera ainda mais nitidamente, mas aqui embaixo ondas
eletromagnéticas aparentemente não podiam expandir-se de forma usual.
Depois de termos marchado mais uma hora, fizemos uma pausa. Pampo sugeriu
que, de agora em diante, devíamos voar com nossos aparelhos energéticos, mas Rorvic
não aceitou a sugestão.
— Temos que voar lentamente, porque não podemos ver muito longe. Além do
mais eu acho que devemos ligar nossos aparelhos o menos possível, para escaparmos de
um eventual perigo de rastreamento.
Contra isso não se podia objetar.
Eu estava sentado no chão, encostado na parede.
— O senhor pode dormir um pouco — sugeriu Rorvic. — Eu ficarei de guarda.
A sua oferta, feita de boa vontade, não me serviu de muita coisa. Os meus
pensamentos voltavam constantemente para a estranha esfera e às criaturas, que
antigamente a haviam utilizado.
Quando partimos, nenhum de nós tinha dormido. Apesar disso, Rorvic não parecia
cansado. Desde que tínhamos abandonado o space-jet ele não mudara em absolutamente
nada. Sua capacidade de aceitar os acontecimentos com indiferença era impressionante,
mas para Pampo e para mim, seus acompanhantes, também era um pouco de uma carga.
Algum tempo mais tarde escutamos um rumorejar.
Rorvic ergueu o braço.
— Parece um rio — disse ele. — Será que ele atravessa o sistema de cavernas?
Um rio poderia levar-nos à superfície. Esta perspectiva no deu novas forças. Nós
aceleramos nossos passos. O rumorejar ficava cada vez mais alto.
Ver, ainda não podíamos nada. Passamos por alguns desenhos rupestres, que
entretanto estavam tão gastos pelo tempo, que mal ainda se reconheciam pormenores.
E então o corredor acabou, de repente.
Diante de nós havia uma parede rochosa, de pedras normais, não trabalhadas.
Podíamos ouvir ainda o rumorejar. Parecia vir do alto, mas isso também podia ser uma
ilusão.
Rorvic soltou uma imprecação.
— Era só o que ainda nos faltava! Como é que os estranhos não continuaram a
construção do corredor aqui?
— Talvez devido ao rio! — refleti.
— E onde está o rio? Será mesmo o rumorejar de água, o que estamos ouvindo?
— Isso vem diretamente de trás da parede rochosa — interveio Pampo. Rorvic
puxou sua arma e bateu com a coronha na parede, em diversos lugares. Em todos os
lugares o som era igual.
— Nada — disse o engenheiro de ultrafrequência. — Mas eu não tenho a menor
vontade de voltar novamente pelo mesmo caminho.
— E existe alguma outra possibilidade? — quis eu saber.
Ele continuou com o exame do paredão. Para isso abriu o seu capacete e colocou o
ouvido junto da rocha.
— O ar é muito fino e fresco — explicou ele para nós, depois de ter fechado o
capacete outra vez. — Eu não sei se o rumorejar realmente vem de um rio. Também
poderiam ser máquinas, ou outra coisa qualquer.
Ele coçou a barriga.
— Por que o corredor termina aqui? Isso não é lógico.
— Talvez os estranhos tiveram um motivo, para terminarem a construção aqui.
— Neste caso eles não teriam começado com ele — retrucou ele. — Não, eu sei a
razão. Os desconhecidos foram interrompidos em seu trabalho aqui. O corredor nunca foi
completado, onde quer que ele deveria levar.
— Isso significa que vamos ter que fazer todo esse caminho mais uma vez —
lamentou-se Pampo.
— Em determinadas circunstâncias — concordou Rorvic. — Primeiramente,
entretanto, vamos tentar verificar de onde vem esse barulho.
Rorvic, que afirmava poder ouvir besouros caminhando, finalmente observou que o
barulho vinha de cima.
— Sim — disse Pampo. — O senhor tem razão, capitão. A mim também parece a
mesma coisa.
Ele não teria dito nada diferente, se Rorvic dissesse que o barulho vinha de baixo.
— Eu não sei dizer se vem de cima ou de baixo — disse eu, furioso. — Mas isso
também é indiferente.
— Vamos fazer um teste — ordenou Rorvic.
Ele puxou o seu desintegrador e ajustou o raio para um efeito mínimo e
enfeixamento fino.
Depois apertou o gatilho.
Ele fizera mira contra o teto. O raio da grossura de um lápis fez um buraco cujo
diâmetro não era maior que uma moeda. Rorvic continuou os disparos.
De repente um jato de água atirou-se através da abertura feita pelo disparo. A
pressão era tão forte que a água que entrava rapidamente alargou o buraco. Pedaços de
rocha vieram abaixo.
— O que foi que o senhor arranjou aí! — gritei para Rorvic. — Todo o teto vai
desabar, e então a água penetrará nos corredores, carregando tudo consigo — inclusive
nós.
— Ligar os escudos protetores! — ordenou o albino. — Vamos nos deitar no chão e
tentar nos segurar. Se não formos arrastados para longe, provavelmente teremos uma
chance.
— E as pedras que estão caindo? — objetei.
Ele já estava deitado bem perto do paredão. A água penetrava trovejante para dentro
do corredor, através de uma abertura que agora já era de metro e meio de largura. Ela
carregava pedras e rochedos consigo, e ainda conseguia escorrer pelo corredor, mas isso
se modificaria dentro de pouco tempo.
Pampo foi ao chão, ao lado de Rorvic.
Eu já me encontrava até os joelhos dentro da água.
— Ainda podemos fugir! — gritei.
— Se quisermos escapar, precisamos esperar até que a água encha todo o corredor
— retrucou Rorvic. — Então poderemos nadar para cima, através do buraco no teto.
Eu duvidava de que tudo seria tão simples, quanto ele o imaginava. Eu já estava
decidido a voltar atrás sem os meus dois acompanhantes, quando fui atingido no ombro
por um pedaço de rocha. O choque me jogou no chão. Rolei para o lado, e fiquei deitado
bem perto da parede. Com os nossos trajes de proteção estávamos protegidos de morrer
afogados.
O trovejar da água ficou cada vez mais forte. Certamente já se fizera um buraco
maior, através do qual o rio podia jogar aqui para dentro suas massas de água.
Dificilmente se podia ver alguma coisa. Entretanto eu já estava completamente coberto
pelas águas. Eu me segurei, o melhor que pude.
— Não se impacientem! — admoestou Rorvic. — Nossa chance vai chegar.
Eu imaginei como a enchente rolava através das galerias, arrastando tudo consigo.
Para os anões de abastecimento a entrada da água poderia tomar-se uma catástrofe.
Também a esfera luminosa e outras instalações interessantes podiam ser destruídas
pelas águas. Isso significava que elas talvez não pudessem mais ser examinadas, apesar
de poderem ser interessantes para a Humanidade — caso a teoria de Rorvic estivesse
certa.
A correnteza da água ficou mais forte.
— Hainu! — gritou Rorvic. — Procure chegar perto de mim, então poderá segurar-
se em meu corpo.
Eu estava deitado mais para trás, onde a correnteza era mais forte. Além disso, eu
era fisicamente o mais fraco de nosso pequeno grupo.
Mesmo assim fiquei no meu lugar, pois temia encontrar dificuldades, se me
afastasse da parede.
Nós esperamos pacientemente.
— Eu agora vou dar uma olhada o quanto a água já subiu — anunciou Rorvic.
Eu girei a cabeça. Apesar dos holofotes de capacete ligados, mal podia reconhecer-
se alguma coisa nas águas turbilhonantes. Um par de metros acima de mim vi deslizar
uma sombra escura, que talvez fosse Dalaimoc Rorvic.
— Venham para cima! — veio a voz do albino, no meu alto-falante de capacete. —
Mas prestem atenção para não chegarem diretamente abaixo do local da abertura, caso
contrário serão arrastados pela correnteza.
Eu dei um empurrão com os pés. Logo me vi metido numa correnteza mais forte.
Imediatamente liguei minha aparelhagem de voo. Ela funcionava também embaixo da
água, e me empurrou de volta para o meu ponto de saída. Lentamente nadei para o alto.
Quando surgi das águas, somente ainda estava a meio metro de distância do teto do
corredor. O buraco, através do qual entrava a água, agora tinha quase a largura do
corredor. Eu girei sobre meu próprio eixo. Com isso descobri Rorvic. Ele estava nadando
a poucos metros de mim, observando a água que entrava aos borbotões.
A luz do seu holofote dançava sobre a superfície inquieta das águas.
— Tudo parece estar a nosso favor! — gritou-me ele.
Uma terceira luz saiu de dentro da água.
Era Pampo!
A água agora subia rapidamente. A correnteza diminuía
— Agora vamos tentá-lo! — ordenou Rorvic.
Nós nadamos na direção do lugar do buraco. Quase sem esforço deslizamos através
da abertura, para cima. Poucos instantes depois fomos alcançados por uma correnteza
forte, que nos arrastou.
— Não se oponham à correnteza! — gritou Rorvic. — Vamos deixar que a água nos
leve. Em algum lugar vamos sair. Precisamos ficar juntos.
Isso não era tão simples, apesar dos holofotes de capacete ajudarem a manter Rorvic
e Pampo no meu campo de visão.
O rio devia arrastar-se por muitas milhas abaixo da superfície de Teste Rorvic, pois
não conseguimos descobrir qualquer indício de que ele deixaria o seu leito nas
profundezas, em breve.
Mesmo assim, não tínhamos outra chance, do que nos deixar levar pela correnteza.
Em algum lugar o rio sairia para a superfície.
***
Deixar-nos levar pela correnteza não era nem cansativo nem perigoso. O rio, aqui
embaixo, tinha uma respeitável largura e profundidade, de modo que o perigo de
ficarmos enganchados em algum lugar era mais que diminuto.
Finalmente — certamente já se passara mais de uma hora — ficou claro à nossa
frente.
A correnteza diminuiu.
— O rio agora vai sair na superfície do planeta — declarou Rorvic. — Nós
realmente tivemos muita sorte.
Por cima de nós a luz do sol refletia-se na superfície das águas.
— Subir à superfície! — ordenou Rorvic.
Nós deslizamos lentamente para o alto. Quando surgimos das águas, nos
encontramos no meio de um grande lago. Na margem havia edifícios isolados, entre
árvores.
E então eu vi os grandes robôs.
Eles estavam sobre pés gigantescos dentro da água, pescando sujeira e lama do lago.
Um deles encontrava-se bem perto de nós.
— Dalaimoc! — gritei, numa advertência.
— Já vi! — retrucou ele. — Vamos mergulhar e assim tentar chegar até a margem
do lago.
Neste momento meu escudo energético ruiu. Eu sabia o que isso significava.
Mesmo assim quis mergulhar. Porém isso ficou só na tentativa, pois todos os três fomos
pescados de dentro das águas, por uma bolsa parecida com uma rede, que estava
dependurada na extremidade de um grande braço agarrador, e puxados para um dos
robôs.
7

Sem refletir, arranquei minha arma do cinturão, fazendo mira em cima do


gigantesco robô. Depois disparei, porém a energia do magazine estava bloqueada, do
mesmo modo que de minha mochila às costas. Nós estávamos metidos numa armadilha.
Eu praguejei baixinho.
— Silêncio! — ordenou Rorvic. — Eu não acredito que os robôs nos associam com
os acontecimentos abaixo da superfície. Se nos mantivermos espertos, talvez sejamos
apenas levados para um monte de lixo.
Eu me ergui, e fui cautelosamente até a borda da rede. Antes que Rorvic ou Pampo
pudessem intervir, eu saltei para fora. Caí na água, de barriga. Apesar do traje protetor,
senti dores. Quando tentei rapidamente mergulhar, o robô levou os agarradores
novamente por baixo de mim, e me puxou para fora da água.
Rorvic, com água escorrendo pelo corpo, observou pouco amistoso:
— Eu não gostaria de ser mergulhado constantemente. Portanto reflita no que vai
fazer!
Eu não estava conseguindo respirar direito. Como nossos aparelhos energéticos
estavam novamente bloqueados, tivéramos que abrir nossos capacetes.
— Não podemos escapar dessa coisa — acrescentou Rorvic. — Vamos esperar,
para ver o que ela vai fazer.
O robô havia-se ancorado numa espécie de tripé no fundo do lago. Cada uma das
pernas tinha dez metros de grossura. As pernas se reuniam numa base em forma do disco,
sobre o qual se assentava o corpo propriamente dito. A parte superior do robô tinha forma
de tonel. Do mesmo sobressaíam inúmeros braços-ferramentas, com ajuda dos quais a
máquina podia rebuscar o fundo do lago, em busca de qualquer tipo de objeto. Em cima
desse tonel metálico encontravam-se três excrescências em forma de bolas, cada uma
com um metro de diâmetro. Eu achei que ali deviam encontrar-se os órgãos de comando
do autômato.
Toda a formação tinha, na certa, cinquenta metros de altura. Eu avaliei o alcance
dos tentáculos metálicos em duzentos a trezentos metros. No mar havia sete desses robôs.
Um deles ficava olhando, na margem, sem nada fazer. Provavelmente devia intervir
adicionalmente, em ocasiões especiais.
Eu me perguntei quem podia estar interessado em manter o lago livre de todos os
corpos estranhos. Toda a maquinaria que funcionava em Teste Rorvic possuía apenas a
meta de manter todo o planeta sem modificações. Isso poderia significar que os
construtores dos espaçoportos e das instalações abaixo da superfície algum dia desejavam
voltar.
Quando seria isso?
Meus pensamentos foram interrompidos, pois o braço de agarrar agora convergiu
em direção da margem. O robô deu dois passos, e com isso avançou pelo menos cem
metros. Nós pairávamos a dez metros acima da superfície da água. A margem não estava
mais longe.
Entre as árvores eu vi um monte de lixo. Ali certamente era reunido tudo que era
pescado do lago. Alguns pequenos robôs de transporte estavam carregando suas
superfícies de transporte com lixo, para levá-lo dali.
O robô novamente estendeu o braço de agarrar.
Eu esperei que ele nos descarregaria por cima do monte de lixo, então teríamos uma
chance de escaparmos dos robôs. O autômato entretanto parecia entender que nós éramos
diferentes dos objetos mortos que ele retirara da água até então. Ele dirigiu o seu braço de
agarrar diretamente por cima de um recipiente em formato de concha e nos jogou dentro
do mesmo. O recipiente voou dali, antes que nós pudéssemos nos pôr de pé novamente.
Numa velocidade de perder o fôlego, ele pairou por cima das árvores. Saltar agora
seria o mesmo que suicidar-se. O vento nos assobiava nos ouvidos.
Ficou mais escuro. O sol desapareceu por trás das árvores. A noite se aproximava.
Rorvic estava acocorado na concha como se estivesse sentado numa poltrona. Ele
estendera pernas e braços e parecia dormitar.
Eu gritei-lhe:
— O senhor não pretende fazer nada?
Ele piscou os olhos.
— O que é que o senhor sugere?
— Eles vão levar-nos novamente para o pavilhão do lixo — receou Cucula Pampo.
— Eu não sei se vamos escapar de lá uma segunda vez.
Rorvic arrastou-se até a borda da concha e olhou para baixo. Depois acenou-me
para que me aproximasse.
— O senhor tem coragem? — quis saber ele.
— Por quê? — Eu olhei-o, desconfiado. — O que devo fazer?
— Se o senhor se espichar mais para a frente poderá ver os órgãos de comando do
robô — disse ele.
Eu me debrucei por cima da borda do transporte em formato de concha. Fiquei
tonto. A terra passava velozmente embaixo de nós. Eu fechei os olhos.
— Olhe bem para lá! — exigiu Rorvic. — São aquelas duas saliências semi-
redondas entre os rolos retraídos.
— Não vamos conseguir chegar ali, Dalaimoc! — Eu escorreguei cautelosamente
de volta para o interior da concha. — O senhor tem que concordar com isso.
Ele me olhou como se quisesse me hipnotizar. Talvez ele até pudesse influenciar
outras pessoas. De Dalaimoc Rorvic eu esperava quase tudo.
— Há uma possibilidade! — murmurou ele. — Eu sou forte e posso segurá-lo, com
apenas uma de minhas mãos.
— O senhor não pode pedir isso dele, capitão! — gritou Pampo, horrorizado.
Eu sorri, acanhado. Justamente o músico vinha em meu socorro.
— O senhor vai trepar por cima da borda, enquanto eu o seguro — continuou
Rorvic, sem deixar se impressionar. — Deste modo, certamente poderá alcançar os
órgãos de comando. Eu não sei se poderá danificá-los com a coronha de sua arma, mas
nós temos que tentá-lo.
Eu engoli em seco.
— Venha! — exigiu ele. — Eu vou segurá-lo tão bem que nem notará que está
dependurado do lado de fora do transportador.
Tinha que ser. Se não quiséssemos aterrissar novamente num monte de lixo, dentro
de algum pavilhão, teríamos que arriscar tudo. Qualquer chance, por menor que fosse,
tinha que ser aproveitada.
Eu me coloquei de barriga para baixo perto de Rorvic, e me empurrei com as pernas
por cima da borda da concha metálica, de dez metros de diâmetro.
Meu olhar encontrou o de Rorvic. Ele não encontrou nem algumas palavras de
estímulo, nem me olhou de modo especialmente esperançoso.
— O senhor precisa fazer essa cara indiferente, justamente agora? — quis eu saber,
furioso. — Imagine-se agora em meu lugar, tendo que descer até lá embaixo.
— O senhor não consegue me segurar — retrucou ele, calmamente, estendendo um
braço.
Eu peguei a sua mão e ele aproximou-se lentamente um pouco mais para a borda do
robô. Ao mesmo tempo eu escorregava cada vez mais para fora. Minhas pernas
bambolearam para baixo.
O rugido do vento me irritava.
— Como está indo? — perguntou Pampo.
— O senhor, por alguns minutos, cale a boca! — recomendou Rorvic,
amavelmente. — Tatcher a Hainu agora precisa concentrar-se.
Eu conseguia apenas olhar ainda por cima da borda, para dentro da concha metálica.
Rorvic sorriu-me, irônico. Parecia não precisar fazer nenhum esforço, segurando-me com
apenas uma de suas mãos.
— Eu agora vou deixá-lo descer ainda mais! — anunciou ele.
Eu não disse nada.
Ele movimentou-se na direção da borda da concha. Eu afundei mais um metro. O
vento assobiava nos meus ouvidos. Eu não ousava olhar para a terra, lá embaixo.
Agora a parte superior do corpo de Rorvic apareceu por cima da borda do robô
voador.
— Ótimo! — elogiou ele. — O senhor tem uma boa posição de partida.
Os órgãos de comando ficavam pelo menos a metro e meio de distância de mim.
— Eu agora vou balançá-lo! — anunciou Dalaimoc. — Estique um braço e se
agarre, quando chegar suficientemente perto.
Ele me balançou de um lado para o outro. Em silêncio eu o amaldiçoei. Mesmo
assim, fiz o que ele mandava. A minha mão estendida aproximava-se cada vez mais da
saliência semi-arredondada por baixo da concha.
Rorvic curvou-se ainda mais por cima do recipiente. E então ele me balançou, com
um movimento mais forte do seu braço, na direção do centro, por baixo da concha.
Instintivamente eu levei a mão para a frente. Consegui pegar um dos órgãos de
comando e me agarrei ali.
— Solte-se! — gritou Rorvic. — Está querendo me arrancar o braço?
Eu me soltei. Por segundos eu pairei por cima da profundidade, sem fazer alguma
coisa. Parecia-me impossível conseguir colocar também minha outra mão no lugar
seguro. Mas então eu reagi quase que mecanicamente. Eu me segurei com ambas as
mãos, e flexionei as pernas. Os meus pés eu enganchei em peças salientes.
— Tudo em ordem? — perguntou Rorvic, calmo.
Eu agora estava dependurado quase exatamente por baixo do centro da concha. Para
mim estava claro que eu não poderia voltar novamente para cima. Ou eu teria que esperar
até que a concha chegasse ao seu destino, ou teria que danificar um dos órgãos de
comando de tal maneira, que nosso transportador sofreria uma queda.
Em ambos os casos minha vida estaria em perigo.
Eu me segurei, tão bem quanto pude.
— Comece logo de uma vez! — estimulou-me Rorvic.
Ele me observava por cima da borda da concha. Parecia que não se preocupava
absolutamente comigo.
Eu soltei uma de minhas mãos e puxei minha arma do cinturão. Depois virei-me
para o lado. Eu agora estava dependurado, de alguma maneira seguramente por baixo da
concha, mas um golpe forte contra um dos órgãos de comando poderia me fazer perder o
equilíbrio novamente.
Eu agarrei a arma pelo cano e golpeei forte na saliência arredondada, que nós
pensávamos que alimentava o robô transportador com ordens e energia.
— Isso não é suficiente! — admoestou Rorvic. — Mais forte!
Desesperado, eu continuei batendo. Eu não podia ver exatamente se realmente
estava acertando corretamente.
— Assim está bem! — gritou Rorvic. — Continue assim!
Minhas forças enfraqueceram rapidamente. Eu me concentrava completamente no
trabalho. Agora tive que me segurar novamente com ambas as mãos, para descansar.
E então o transportador deu um solavanco. Ele mudou de rota, perdeu velocidade e
caiu rapidamente de encontro ao solo.
— Conseguimos! — escutei Pampo gritando. — Essa coisa está caindo!
Esse idiota! Será que ele achava que iria sobreviver a uma queda, nesta velocidade
toda?
Mas mesmo que ele e Rorvic tivessem uma chance de sobreviver à queda — o que
seria de mim?
O robô me sepultaria debaixo dele.
— Capitão! — gritei. — O senhor tem que me tirar aqui de baixo!
O seu rosto apareceu por cima da borda da concha. Pareceu-me ver como ele
encolhia seus ombros gordos, sem saber o que fazer.
— Eu agora não posso fazer nada pelo senhor! Salte antes que o transporte bata no
chão!
O robô transportador agora caía rapidamente. Ele perdeu velocidade, mas eu
continuava não vendo nenhuma possibilidade de me salvar.
O robô agora estava voando velozmente por cima de uma floresta. Muito ao fundo
eu via surgir as primeiras edificações do espaçoporto. Porém a máquina não chegaria
mais até lá. Ela voava apenas a poucos metros acima das copas das árvores. Quando a
distância até a superfície do planeta diminuiu mais ainda, eu decidi arriscar tudo.
Alguns galhos já raspavam no meu corpo, quando finalmente me deixei cair.
Como uma bala viva, eu fui atirado por entre as árvores que aqui cresciam muito
juntas. Galhos quebraram, ramos fustigaram o meu rosto.
E então eu bati contra uma coisa dura. Sangue espirrou do meu nariz. Eu capotei por
cima de mim mesmo.
Senti que ia perder os sentidos. Minhas mãos agarraram-se instintivamente em
alguma coisa mole.
Eu estava deitado no chão, entre as árvores. Com este reconhecimento, perdi os
sentidos.
***
Quando voltei a mim, deviam ter passado apenas alguns instantes, pois o meu nariz
continuava sangrando, e também não escurecera mais. Um bicho parecido com uma lebre
estava acocorado a poucos passos de mim, observando-me. Uma dor pontiaguda no meu
peito impediu-me de me mexer. Eu me apoiei nos cotovelos e fiquei escutando.
Somente conseguia ouvir o rumor do vento nas copas das árvores e o barulho de
alguns animais.
O que tinha acontecido com Rorvic e Pampo?
O transportador, entrementes, despencara?
Eu controlei meu equipamento, e verifiquei aliviado que todos os aparelhos
energéticos funcionavam novamente.
— Dalaimoc! — gritei no microfone de capacete. — Pode me escutar, capitão!
— É claro que posso escutá-lo — retrucou a voz do albino. — Onde é que está?
— No meio do mato. Eu saltei. O senhor e Pampo estão em ordem?
— O músico quebrou um braço — respondeu Rorvic. — Além disso, não há
dificuldades conosco. Eu receio, entretanto, que logo vão aparecer alguns robôs, para nos
caçar. Nós caímos exatamente entre a borda do mato e as primeiras construções do
espaçoporto.
— O que vamos fazer agora?
— O senhor pode se mexer?
Eu experimentei. As dores eram tão fortes que quase desmaiei outra vez.
— Nós vamos buscá-lo! — gritou Rorvic, que evidentemente me ouvira gemer. —
Nestas circunstâncias, será melhor se interrompermos o nosso empreendimento. Além
disso, dentro de poucos minutos será noite. Vamos chamar Sandal Tolk de volta para o
space-jet e sumimos daqui!
Eu nem pensara mais no semi-selvagem.
— Fique onde está! — recomendou Rorvic. — Eu vou buscá-lo. Pampo vai tentar
chegar ao space-jet.
Eu me recostei. Já escurecera bastante. Entre as árvores, eu parecia ver sombras. Eu
liguei o meu holofote de capacete e girei o botão de um lado para o outro. Já tinha
colocado o desintegrador, pronto para atirar, no meu colo. Era possível que por aqui
houvesse animais perigosos. Além disso, eu queria estar preparado para um eventual
ataque dos robôs.
Enquanto Rorvic se aproximava de mim, ele chamou Sandal pelo rádio de capacete.
O bárbaro respondeu imediatamente.
— Volte para o space-jet! — ordenou Rorvic. — Nós vamos abandonar este
mundo.
— Eu fico aqui! — retrucou Sandal, decidido. — Eu ainda não encontrei os meus
inimigos.
Por algum tempo fez-se o silêncio. Rorvic parecia refletir, como poderia demover o
jovem guerreiro.
— Os meus inimigos ainda virão — Sandal Tolk quebrou o silêncio. — Minhas
flechas perfurarão os seus corpos. Eu vou destruir todos eles.
— Eu compreendo os seus sentimentos, Sandal — disse Rorvic. Ele tratava o semi-
selvagem muito cautelosamente. — Mas um problema dificilmente é solucionado pela
força. Além disso, os seus inimigos são muito mais fortes.
— Ninguém é tão forte quanto Sandal, o Vingador!
— Hum! — fez Rorvic. A presunção do bárbaro parecia impressioná-lo. Então ele
perguntou. — Onde é que se encontra agora?
Sandal riu baixinho.
— Por que não me procura?
Antes de Rorvic poder responder, alcançou-nos um sinal de alarme da Good Hope
II. Nossos aparelhos de pulso deram sinal. Com o sinal de alarme em código da frota, a
conversa pelo rádio de capacete era automaticamente interrompida.
Rorvic respondeu, fazendo um rápido relato da situação.
— Eu fico contente porque temos contato novamente — disse Rhodan, aliviado. —
Vocês terão que voltar imediatamente. Um grande objeto voador aproxima-se, em alta
velocidade, deste sistema solar. O seu destino é, sem dúvida alguma, Teste Rorvic.
Parece tratar-se daquele objeto saído de dentro do “Enxame”, que nós esperávamos
encontrar em Teste Rorvic.
— Ainda temos dificuldades, sir — explicou o albino. — Tatcher a Hainu e Cucula
Pampo estão feridos. Sandal Tolk desapareceu na floresta e não quer voltar.
Na pausa que ocorreu eu escutei, bem perto, galhos se quebrando. Ou havia animais
nas proximidades, ou era Rorvic que passava pelo mato baixo.
— Volte com Pampo e a Hainu! — ordenou Rhodan agora. — Mais tarde nos
preocuparemos com Sandal Tolk. Eu não gostaria que o space-jet ainda se encontrasse
em Teste Rorvic, quando o objeto vindo do “Enxame” pousar aí.
Uma luz surgiu na floresta — o holofote do capacete de Rorvic.
Eu mexi minha cabeça, para chamar sua atenção para a minha luz. Ele modificou a
direção e se aproximou de mim.
Ele apontou para cima.
— Eu voei um bom pedaço por cima das árvores. O bloqueio energético não tem
efeito em todos os lugares. — Ele pareceu lembrar-se de que eu estava ferido, e curvou-
se, preocupado, para mim. — O senhor pode levantar-se?
— Ajude-me! — Eu estendi-lhe ambos os braços. — Mas seja cuidadoso.
Ele me levantou, praticamente sem esforço. E me olhou, cético.
— Eu acho que vou ter que carregá-lo. — Ele olhou em volta. — Lá na frente há
uma pequena clareira, da qual podemos sair voando. Depois que estivermos acima das
árvores, o resto vai ser brincadeira de criança.
Ele me ergueu nos seus braços. Eu mordi os lábios, para abafar um grito de dor.
— Nem os anões abastecedores nem os robôs têm alguma coisa que ver com o
“Enxame” — disse Rorvic, enquanto me carregava para a clareira. — O objeto voador,
que nós procuramos inutilmente, somente agora está voando para cá.
Eu o olhei, espantado.
— Até agora o senhor sempre andou procurando conexões, e até tinha certeza de
havê-las encontrado, capitão.
— Tem razão — concedeu ele de má vontade. — Mas as conexões, se realmente
existem, são muito vastas. Além disso, precisamos nos lembrar dos intervalos de tempo,
o que sempre é muito difícil. Eu não consigo pensar logicamente, em espaços de
milênios.
— Eu não o compreendo. — Suas palavras realmente eram mais do que um enigma.
Nós tínhamos alcançado a clareira. Rorvic ligou sua aparelhagem e saiu voando.
Poucos segundos mais tarde, nós pairávamos bem pouco acima das copas das árvores. No
horizonte o céu estava claro.
— São os holofotes, que circundam toda a região dos espaçoportos — explicou
Rorvic, que mais uma vez adivinhara meus pensamentos.
Eu emiti um assobio, espantado.
— Poderia pensar-se que o espaçoporto estava sendo preparado para a chegada do
objeto voador saído do “Enxame”.
— Esse certamente não é o caso — negou o engenheiro de ultrafrequência. — Eu
estou convencido que este espetáculo se renova noite após noite. Os espaçoportos de
Teste Rorvic esperam pelo regresso dos seus construtores. — A sua voz parecia triste. —
Eles provavelmente jamais voltarão.
Se ele tivesse razão o trabalho dos anões abastecedores e dos robôs não tinha
sentido. Que destino tinham levado os desconhecidos? Para onde eles teriam ido?
Os espaçoportos abandonados de Teste Rorvic seriam um mistério para sempre?
Rorvic modificou a direção do voo, sem comentar este processo. Ele parecia saber
exatamente onde estava o space-jet. Eu confiava nele.
— Entrementes Cucula Pampo já deve ter alcançado a nave-auxiliar — achou ele.
— Vamos partir, logo que pusermos os pés na nave.
Ele parecia estar com muita pressa. Estaria temendo a chegada da astronave saída
de dentro do “Enxame”? Mais isso não era do feitio de Rorvic.
Mais uma vez Perry Rhodan chamou.
— Apressem-se! — pedia ele. — Essa coisa está se aproximando rapidamente. E é
gigantesca.
— Ouviu isso, Sandal? — gritou Rorvic. — Nestas circunstâncias, não quer voar de
volta conosco? Ainda está em tempo.
— Eu vou ficar — retrucou o bárbaro. — Agora finalmente meus inimigos estão
chegando.
Eu apertei o braço de Rorvic.
— Não devemos permitir que Sandal inicie uma guerra particular contra o objeto
desconhecido saído do “Enxame”. Isso levará à sua morte.
— É bem possível. — Mal podia se ouvir a voz de Rorvic.
Nós alcançamos a borda do mato. Eu podia ver o rio. Por trás dele estava o space-
jet. Ele era iluminado pelos holofotes de alguns robôs gigantescos, que formavam um
círculo à sua volta, e evidentemente ainda não tinham chegado a uma conclusão de como
transportarem um objeto estranho, daquele tamanho. Rorvic praguejou em voz alta.
— Pampo! — gritou ele. — Onde está?
— Eu me escondi na beira do rio — veio a voz do artista. — Não vamos conseguir
chegar na nave-auxiliar.
Rorvic aterrissou na margem do rio. Eu contei um total de sete robôs bem grandes.
Uma superioridade numérica, mesmo com nossos aparelhos funcionando.
— Passe uma mensagem para Rhodan! — sugeri.
O gigante gordo sacudiu a cabeça.
— Nós vamos dar um jeito nisso sozinhos — afirmou ele. — O senhor e Pampo
esperam aqui. Eu vou distrair a atenção dos robôs, para que os senhores possam entrar no
space-jet sem serem atacados. Depois, então, tratem de me tirar da enrascada. Se não der
certo, terão que sair voando mesmo sem mim.
Antes que Pampo e eu pudéssemos protestar, Rorvic ergueu-se do solo e saiu
voando.
— O que é que ele pretende fazer? — perguntou Pampo, retendo a respiração. Ele
colocara o braço quebrado numa tipóia provisória, que Rorvic aparentemente
confeccionara com o cinturão do uniforme.
Eu não respondi.
Dalaimoc Rorvic voou diretamente na direção dos robôs. A cerca de cinquenta
metros de distância dos robôs, Rorvic estacou e disparou um par de tiros. Os robôs
viraram-se lentamente. Eu sabia que estes movimentos eram enganadores. Os autômatos
podiam movimentar-se rapidamente. Além disso, eles podiam pedir a ajuda de
exemplares capazes de voar.
Rorvic virou-se e saiu voando em frente. Mas ele voava devagar,
premeditadamente. Todos os sete robôs correram atrás dele com suas três pernas.
Eu fiz um sinal para Pampo.
— Agora!
Nós saímos voando. O space-jet parecia estar a uma distância infinita.
— Ele está louco! — gritou Pampo, mas a sua voz era de admiração. Ele
evidentemente estava se referindo a Rorvic, que voava algumas manobras enganadoras na
borda da floresta. Ele podia ser visto claramente à luz dos holofotes dos robôs. Os robôs
quase o viam cercado, e estendiam os seus tentáculos. Rorvic poderia escapar deles, sem
esforço, se voasse numa altitude que as máquinas não pudessem alcançar. Porém não fez
isso.
— Atenção! — gritou Pampo. — Dois deles estão voltando. Eu mordi os lábios.
Eles, portanto, também nos tinham descoberto. Rapidamente liguei meu aparelho de
pulso, e fiz com que o escudo protetor em volta do space-jet ruísse.
Pampo aterrissou diante de mim e cambaleou para dentro da eclusa. Imediatamente
deixou-se cair numa poltrona. Ele parecia completamente exausto.
Eu fechei a eclusa, fazendo deslizar suas portas, e puxei-me para dentro da nacele.
Cada respiração me doía. Os controles pareciam desaparecer diante dos meus olhos.
Através da cúpula eu vi um robô se aproximando do jato. Ele tinha seus tentáculos
estendidos. Eu achava que ele tinha capacidade de agarrar o jato, e levá-lo dali. Para isso
o remédio apenas era uma partida-relâmpago. Eu me joguei na poltrona, e dei partida nos
propulsores. Minhas mãos seguraram firmemente o manche de comando. Lá fora escutei
os tentáculos do robô arranharem a superfície externa da nave-disco.
— Segure-se! — gritei para Pampo.
A nave-auxiliar atirou-se velozmente, em diagonal, para o alto. Um dos tentáculos
do robô foi acertado violentamente, e atirado para um lado. A pequena nave foi atirada
para fora de sua rota pelo choque, aproximando-se novamente do solo. Eu puxei o
comando para cima. O jato ainda obedecia.
Meus olhos procuraram Rorvic. Ele se afastara dos robôs e agora pairava acima das
árvores. Ele acenava furiosamente.
Eu voei na sua direção e liguei os projetores antigravitacionais. Na borda do mato,
os robôs andavam de um lado para o outro, evidentemente não sabendo exatamente o que
fazer.
Rorvic entrou voando pela eclusa aberta do jato e jogou o seu capacete a um canto.
Ele entrou na cúpula e se meteu, com certa dificuldade, dentro da poltrona.
Mais uma vez ele chamou Sandal Tolk. O bárbaro não respondeu. Sua decisão de
ficar neste mundo parecia ser irreversível.
Pampo esgueirou-se para dentro da cúpula, para junto de nós. Na tela de vídeo do
rastreamento cósmico aparecia um objeto informe, que se aproximava de Teste Rorvic.
A Good Hope II ao seu lado parecia diminuta.
— Vamos voar de volta para nossa nave-mãe! — decidiu o albino.
Ele recostou-se e fechou os olhos.
— Dalaimoc! — admoestei-o. — Pampo e eu estamos feridos. Seria melhor que o
senhor pilotasse o jato.
Ele não respondeu. Sua cabeça caiu para a frente. Depois ele abriu os olhos
novamente. Eles tinham aquela coisa fixa, que eu já conhecia.
— O senhor não pode meditar agora! — gritei, furioso.
Ele não me ouviu.
— O que está acontecendo? — perguntou Pampo. — O senhor não consegue
manejar os controles?
As dores faziam tremer todo o meu corpo, mas eu tinha que segurar o manche de
pilotagem. Nós ainda nos encontrávamos na atmosfera de Teste Rorvic.
— Cucula Pampo! — murmurei. — O bule!
— O bule?
— Sim, maldição! Ele deve estar em algum lugar junto com meu equipamento.
Eu escutei Pampo esgueirando-se nos fundos, procurando. Finalmente ele suspirou,
aliviado, e me trouxe o bule.
— O que quer fazer com isso?
Eu sorri, acanhado, e me ergui no meu assento. Depois reuni todas as minhas forças,
e bati com o bule na cabeça de Rorvic. Quase ao mesmo tempo perdi a consciência.
***
Quando voltei novamente a mim, Cucula Pampo estava justamente sendo tirado do
hangar por um medo-robô da Good Hope II. O space-jet de oito metros de diâmetro,
portanto, alcançara a nave-mãe. Eu levantei a cabeça, com muito esforço, e verifiquei que
estava deitado sobre uma maça antigravitacional, diante do jato.
Eu ouvi a voz de Atlan. O arcônida parecia estar muito próximo. Talvez um novo
comando de ação estava sendo preparado ali. Por enquanto eu tinha que chega de
planetas como Teste Rorvic.
Dois homens apareceram e me sorriram. Um deles ligou a propulsão da maca e quis
me empurrar para fora dali.
— Só um momentinho! — gritou alguém.
— Tirem-me daqui, depressa! — implorei aos dois homens. — Eu não quero falar
com ninguém.
Eles hesitaram.
E então apareceu Dalaimoc Rorvic, dentro do meu campo visual. Numa das mãos
ele segurava um bule amassado, e com a outra esfregava o crânio careca, no qual via-se
um enorme galo.
— Para onde o estão levando? — perguntou Rorvic, aparentemente indiferente.
— Para a enfermaria — declarou um dos homens.
Rorvic aproximou-se bem da maca e sorriu-me de toda a sua altura. Os seus olhos
vermelhos faiscavam.
— Onde é que ele está ferido?
— Ele quebrou duas costelas.
Rorvic curvou-se bem para mim.
— Não quebrou só isso — murmurou ele. — Não só isso...
Depois levantou bastante a mão, na qual segurava o bule...

***
**
*
O comando de reconhecimento da Good Hope
recebeu ordens para regressar, e os homens
obedeceram — exceto um deles.
Este, que tem planos muito especiais, é Sandal, o
Vingador...
Sandal, o Vingador — é o título do próximo
número da série.

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