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Imprensa de Ciências Sociais

U LISBOA UNIVERSIDADE
DE LISBOA

Instituto de Ciências Sociais


da Universidade de Lisboa

Av. Prof. Aníbal de Bettencourt, 9


1600-189 Lisboa - Portugal
Telef. 21 7804700 - Fax 21 7940274
Índice
www.ics.ulisboa.ptlimprensa
E-mail: imprensa@ics.ul.pt
Os autores 13

Apresentação 19

Capítulo 1
Corporativismo, ditaduras e representação política autoritária . .. 27
Instituto de Ciências Sociais - Catalogaçâo na Publicação António Costa Pinto
A ,:a~a co~orativa : corporativismo e ditaduras na Europa
e na Amenca Latina / org. António Costa Pinto Francisco Palomanes
Martinho. - Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 2016. Parte I
ISBN 978-972-671-368-5 As experiências europeias
CDU32

Capítulo 2
O corporativismo na ditadura fascista italiana . . . . . . . . . . . . . . .. 41
Goffredo Adino!fi

Capítulo 3
«Estado corporativo» e ditadura autoritária: a Áustria
de Dollfuss e Schuschnigg (1933-1938) . . . . . . . . . . . . .. 61
Gerhard Botz
/
Capítulo 4
A Câmara Corporativa e o Estado Novo em Portugal (1935-1974):
competências, interesses e políticas públicas 101
Nuno Estêvão Ferreira eJosé Luís Cardoso
Capa e concepção gr4fica: João Segurado
Revisão: Levi Condinho
Impressão e acabamento: Manuel Barbosa & Filhos, Lda. Capítulo 5
Depósito legal: 408312/16 O corporativismo na ditadura franquista 129
1. a edição: Abril de 2016 Glicerio Sanchez Recio
Capítulo 6 Capítulo 12 . .
O corporativismo na França de Vichy 147 Corporativismo, ditadura e populismo na ArgentIna .... . . . . . . 307
Olivier Dard Federico Finchelstein

Parte 11 Capítulo 13
Brasil e a América Latina Um projeto corporativo na Colômbia: Laureano Gómez
entre os grémios económicos e o dero (1934-1952) 327
Capítulo 7 Helwar Hernando Figueroa Salamanca
Estado corporativo e organização do trabalho no Brasil
e em Portugal (1930-1945) 173
Francisco Palomanes Martinho

Capítulo 8
A representação profissional na Constituição de 1934
e as origens do corporativismo no Brasil 199
Cláudia Maria Ribeiro Viscardi

Capítulo 9
Uma apropriação criativa. Fascismo e corporativismo
no pensamento de Oliveira Vianna 223
Fabio Gentile

Capítulo 10
O integr~smo de Plínio ~algado e a busca de uma proposta
corporatrvista para o Brasil 255
Leandro Gonçalves

Capítulo 11
Ditadura e corporativismo na Constituição de 1937: o projeto
centralizador e antiliberal de Francisco Campos 285
Rogério Dultra dos Santos
r-eaIldro Pereira Gonçalves

Capítulo 10

O integralismo de Plínio Salgado


e a busca de uma proposta
corporativista para o Brasil
Numa aldeia indígena da Amazônia, uma índia se casa com um im-
portante cacique. No princípio, não havia noite - ela estava adormecida
no fundo das águas - mas somente dia. A filha da Cobra-Grande (pajé)
casou-se com um cacique muito bom e bonito que possuía três servos
muito fiéis. Como a moça não queria dormir com o marido - pois a
noite jamais chegaria - o moço ordena aos três servos que se dirijam,
pelo rio, à casa do pai dela, o qual tinha o poder de criar as trevas. Ao
chegar à habitação da Cobra-Grande, ele lhes entrega um caroço de tu-
cumã, bem fechado, com proibição expressa aos condutores de não o
abrir. Mas o caroço emitia diversos ruídos e sons de animais que viviam
nas trevas. Não suportando a curiosidade, um dos índios resolve abrir o
coco. Imediatamente tudo se transforma em trevas. A índia percebe o
que ocorreu, retira um fio de seus cabelos e, segurando nas suas extremi-
dades, atravessa com ele a escuridão e consegue dividir o dia e a noite.
Como castigo, os servos são transformados em macacos por toda a eter-
nidade.' Essa lenda indígena tupi, proveniente do Norte do Brasil, conta
como se deu o nascimento da noite e mostra as consequências da deso-
bediência humana.
Quando se investiga a Ação Integralista Brasileira (AIB), é necessário
recorrer a lendas e mitologias por uma razão: os líderes integralistas diri-
giam-se à sociedade supondo que, entre os cidadãos, existiam pessoas
apavoradas e eles teriam a solução para salvar essa sociedade. Seus dis-
cursos eram sempre mitológicos. Os integralistas não teriam existido sem
a criação de inúmeros mitos sobre o medo.

I José Coutinho Oliveira, FolcloreAmazônico: Lendas (Belém: São José, 1951), 9-11.

255
A ~ga Corporativa o integralismo de Plínio Salgado e a busca de uma proposta corporativista para o Brasil I1

Para compreender o discurso dos integralistas, é fundamental ter em adotou o modelo do partido único e o corporativismo de Estado. Dentro
mente que eles falavam para um público considerado inseguro e à espe dessas conceções, aliadas ao autodidatismo nacionalista-cristão, além da
de um grande líder que lhes oferecesse proteção. Posicionavam-se con:~ influência familiar de Plínio Salgado e a necessidade de um discurso de
se soubessem as causas dos males do mundo moderno. Supunham pod vanguarda, nasceu a AIB.3
. di
Impe Ir que a nação entrasse num futuro perigoso. Como na lenda i _
er Em resposta ao caos generalizado, Plínio Salgado, propõe a ordem.
dígena, os integralistas achavam que as trevas estavam sobre o Brasil n A ordem normatizadora, que suprime as vontades individuais em prol
caroço de tucumã estava aberto e os males imperavam sobre a sociedad o de um bem maior: a unidade do Brasil, sob um Estado Integral. Para
E eles, os integralistas, em tom profético, colocavam-se como os únic~~ tanto, seria necessária a criação de estratégias de arregimentação de massas
capazes de fechar o coco e colocar ordem no país. Para os integralistas através de recursos propagandísticos. Recursos, então avançados para a
o caroço de tucamã havia sido aberto no Brasil. Quando isso aconteceu' época, que além de englobarem a oratória e a retórica tradicionais dos
espalharam-se os males: o liberalismo e o comunismo, responsáveis po; comícios, um complexo organismo de propaganda e uma imprensa pró-
todos os desvios da humanidade. pria,4 também contava com a ação do segundo grande nome do movi-
A formação do integralismo brasileiro deu-se no início da década de 1930 mento, o Presidente da Academia Brasileira de Letras e fundador do
sob a liderança de Plínio Salgado. Em outubro de 1932, divulgou o Manifes~ Museu Histórico Nacional, Gustavo Barroso, além do jovem advogado
de Outubro, propondo a formação de um grande movimento nacional e Miguel Reale, terceiro nome do integralismo, responsável pela doutrina
expondo seus propósitos para o Brasil. O autor e político deixou explícita do movimento e pela organização da Juventude Integralista.
no Manifesto sua posição política: um nacionalismo baseado no conserva- E como ápice dessa estrutura, apresentavam-se os apoteóticos desfiles
dorismo, tendo a manutenção da propriedade como forma de organização dos «camisas-verdes», que representavam, por si só, a sociedade coesa e
social e a aversão ao cosmopolitismo como sustentáculo da defesa de uma organizada proposta pelo integralismo, reproduzindo em suas paradas
sociedade forte e organizada dentro de um contexto autoritário.' cívicas a estrutura hierárquica firmada na autoridade, pela qual almejava-
A AlB, resultante de um contexto permeado pelas mais diversas ten- -se tomar o Brasil «integral». Importante frisar que dentro do próprio
sões políticas, sociais e econômicas das décadas de 20 e 30 no Brasil, não movimento as opiniões divergiam sobre os contornos que deveria tomar
pode ser vista ou estudada como um movimento de origens doutrinárias o «Estado integral» a ser implantado. Correntes de pensamento eram
uniformes e monolíticas; no entanto, não há dúvidas de que a principal criadas a partir dos escritos dos três principais formadores de opinião:
composição política do movimento integralista esteve presente no pen- Salgado, Barroso e Reale, ainda que a doutrina fosse virtualmente incon-
samento do líder, Plínio Salgado. Pertencente a uma família conservadora testável pelos membros, emanando de uma só fonte, o Chefe Nacional,
e tradicional do interior paulista, nasceu em 1895, na cidade de São conforme o art. 11.° dos ProtocoUose Rituaes?
Bento do Sapucaí. Ainda jovem foi para São Paulo onde se destacou nos As vertentes, obviamente, convergiam para uma mesma finalidade.
anos de 1920 no modernismo; para posteriormente formar, na década Buscavam, através do integralismo, uma saída para o liberalismo desen-
seguinte, o primeiro movimento de massa do Brasil: a AlB. freado, para a ameaça comunista, para a perda da tradição e da hierarquia.
O pensamento de Plínio Salgado nasceu da influência do Integralismo Defendiam a disciplina, a reconquista do espírito em face ao materia-
Lusitano (IL): um movimento de cunho nacionalista da direita radical lismo, defendiam o retomo de posturas éticas, conservadoras, naciona-
que teve sua formação embasada na precursora do conservadorismo, a listas, exaltavam a unidade, a supremacia do Estado, a obediência a Deus,
Action Française, que, assim como todos os grupos políticos do princípio a ligação com a família. Portanto, esse resgate não significava uma con-
do século xx, estabelecera uma resposta prática à teoria proferida pelo
Papa Leão XIII, em 1891, através da Rerum Novarum, bem como de al- 3 Leandro Pereira Gonçalves, «The integralism ofPlínio Salgado: luso-brazilian rela-
guns aspetos da doutrina e prática do Fascismo italiano, regime do qual tions». Portuguese Studies, vol. 30 (2014), 67-93.
4 C( Leandro Pereira Gonçalves e Renata Duarte Simões, orgs., Entre TIpos e Recortes:

Histórias da Imprensa Integralísta, 2 v. (Guaíba: Sob Medida, 2011-2012).


2 Plínio Salgado, Manifesto de Outubro de 1932 (Rio de Janeiro: Secretaria Nacional de 5 Plínio Salgado, Protocollm eRítuaes: Regulamento (Niterói: Edição do Núcleo Municipal

Propaganda, 1932). de Niterói), 1937.

256 257
A l-'llga Corporativa
o integralismo de Plínio Salgado e a busca de uma proposta corporativista para o Brasil

tinuidade com a política republicana em questão, mas sim uma rutu Barroso, longe de condenar o sionismo por seu carácter étnico-racial, ?
ao modo integralista de reflexão. 6 ra,
acusava das influências econômicas que os judeus promoveram no Brasil
Assim sendo, seus i?telectuais mantinham suas particularidades. Plínio desde a sua independência, relacionando a situação precária dos anos de
Salgado, o Chefe Nacional, detentor do maior posto dentro da hierar . 1930 com um passado de dívidas e empréstimos aos banqueiros judeus,
mtegrahsta, se apre~entav~ .através ~o carácter doutrinário católico,q~~ chegando até mesmo a traduzir Os Protocolos dos Sábios de Sião, um possível
fendendo a revoluçao espiritual, agindo no compromisso de revig
alma b ras ilei orar a plano de dominação mUfoldialrealiza~o pelos jude~s,. ide~tificada como
erra e resgatar as raízes nacionais.
«a melhor tradução do mito de conspiração mundial judaica»."
Em Miguel Reale 7 a reflexão jurídico-política do intelectual se faz . A quase totalidade das obras integralistas de Gustavo Barroso foram
d ente, o que o rez1:" dí
imprescm ível ao movrrnenm e ao momento b
eVI-
dedicadas à difusão de um discurso antissemita e da tentativa de com-
c.an.do,através do inte~~ismo, um~ meditação sobre os problem;s b~:~ preender as ramificações e os dilemas dessa questão na ,e~pecificid:de
sileiros em suas especiricidades, FOI na doutrina do jovem de 22 an
brasileira, fosse como aspeto central ou plano secundano. Questões
quando aderiu à AIB, que residiu a principal matriz no que tange a os~ como a organização dos trabalhadores, o papel de um possível Estado
. - d E d or
galll~açao o sta o, entretanto, a opção da investigação caminhou no integralista, ou, mesmo, as finalidades do corporativismo para a nação
sentl~o de compreender o pensamento de Plínio Salgado por ter sido brasileira, passam, necessariamente, na visão de Barroso pela instância
doutrmação central no movimento dos anos 30. a
do saneamento da atividade perniciosa dos judeus no Brasil.
~o ~orporati~ismo de Miguel Reale é possível perceber um aspeto Não há dúvidas de que a matriz política do movimento integralista es-
mais técnico, ate por razão de seu papel enquanto fundamentador da
teve presente no pensamento do líder, Plínio Salgado. Após a influência
questão no movimento, ele assume carácter diferente nos outros dois lí-
primária lusitana na formação do pensamento pliniano e na idealização
deres integralistas. Dessa maneira, a questão do corporativismo acaba
do integralismo, novamente Portugal foi um destaque na organização
por ser uma matriz e variação das especificidades de cada líder-intelectual
doutrinária de Plínio Salgado, quando passou os anos de 1939 a 1946 no
que assumiam também correntes internas, como é possível notar no as~ exílio, durante o período do Estado Novo getulista, momento que utilizou
peto espiritualista estabelecido em Plínio Salgado e no sentido e funda-
para reordenar o seu pensamento, ações e articulações políticas, tendo a
mentação profundamente militante e antissemita em Gustavo Barroso." vertente do espiritualismo católico como força central. Após o fim do pe-
ríodo ditatorial varguista, retomou para o Brasil com a afirmação de ser
um luso-brasileiro, passando a ser um defensor supremo da política de
6 ~an.d:o Pereira Gonçalves e Pedro Ivo Dias Tanagino, «O Homem Integral: uma
contribuição para a construção do conceito através da análise dos Protocollos e Rituaes António de Oliveira Salazar, imagem que o seguiu até o fim da vida. 10
da Ação Integralista Brasileira (1937»>,Revista Portuguesa de Ciência Política: PortugueseJour- Pautado no conceito de transnacionalismo, entende-se a relação entre
nalqfPoliticalScimce, vol, 2 (2012): 61-74.
os dois países e a trajetória de Plínio Salgado no âmbito da circularidade
7 Sob~e o pensamento ~~egralista de Miguel Reale, cf Ricardo Benzaquen de Araújo,
In MedlO Vz!tus: U'!1a :4,!állse da Obra Integralista de Miguel Reale (Rio de Janeiro: FGV,
cultural. Verifica-secomo um processo pelo qual os imigrantes constroem
1988): Rodngo MarollmI Re.bell<;> Pinho, MiguelReale: Política e História (1931-1969), dis- campos sociais que vinculam seu país de origem com o de assentamento,
sertaçao de mestrado em Históna [São Paulo: Pontificia Universidade Católica de São considerando transimigrantes aqueles que constroem estes campos so-
Paulo (PUC-SP), 2008J; Alexandre Pinheiro Ramos, «Estado, corporativismo e utopia
ciais, mantendo múltiplas relações e unindo fronteiras entre países. 11
no pensamento integralista de Miguel Reale (1932-1937»>, InteUectus, voI. 7 (2008): 24,
32,98-100,208,366,414,421,464,477,497, 523-535, 552, 658, 728-730; Manuel Palácios
da Cunha e Melo, «O Integralismo de Miguel Reale», Dados: Revista de Ciências Sociais,
voI. 37, n.? 1 (1994): 125-152.
9 Marcos Chor Maio, Nem Rotschild nem Trotsky..., 65. .
8 Sobre o pens~ento integralista de Gustavo Barroso, cf Roney Cytrynowicz, lnte- 10 CE Leandro Pereira Gonçalves, Entre Brasil e Portugal: Trajetóriae Pensan:m,t~ de Plím.o
gralismo eA'!tl-:e:n1t1Sm,Onos. Textosde c..ustavo Barroso na Década de 30, dissertação de mes- Salgado e a Influência do Conseruadonsmo Português, tese de doutorado em H~stona (Ponti-
trado em Histona, Universidade de .Sao Paulo (1992); Marcos Chor Maio, Nem Rotschild fícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2012); Leandro Pereira Gonçalves
nem ?r?tsky: O Pe'!sammto A,ntl-Semlt~ de G~stav? !l.arroso (Rio de Janeiro: Imago, 1992); «Plínio Salgado e a Guerra Fria: uma análise entre Brasil e Portugal no âmbito das Guerras
Antomo ~go FI~O, A Critica Romant~ca,a.Mlsena Brasileira: O Integralismo de GustaVO Coloniais» Cahiers desAmériques Latines, voI. 79 (2015): 31-54.
Barroso, dissertação de mestrado em HIstona (Pontificia Universidade Católica de São 11 Nina Glick Schiller, Linda Basch e Cristina Szanton BIanc, «Frorn immigrant to trans-
Paulo, São Paulo, 1989).
migrant: theorizing transnational migration», Anthropological.f2!tarter!y,voI. 68 (1995): 48-63.

258 259
A Vtzga Corporatiua o integralismo de Plínio Salgado e a busca de uma proposta corporativista para o Brasil

. A ~e~ação.estabelecida c?m Portugal em tomo da circularidade en defendido por ele para alcançar o poder, principalmente nos primeiros
vida .e identificada pela. cna5ão de um espaço social transnacional, voí, anos de AlB, já que em 193~ o ~~o atingiu a posição de partido polí-
consiste em uma combmaçao prolongada de laços sociais e símb 1 qUe tico, visando às eleições preSIdencIaIs.
rrorça d os, seus conteuidos.uosi - em re d es e organizações que O od
os, pOSlçoes os re• A revolução integralista tinha, como alvo de combate, elementos
encontrar-se em numerosos Estados." p em ruo o materialismo, que passou a ser a principal crítica do movimento.
CO .
Definia: «o inconsClente - erra-" sen d.o que «na.o
nao -"de mOVI o por ~ma
O poder de uma criação mística em tomo da política passou a
r' , . l'd d . ser Um tade interior, mas pela vontade extenor de um mterferente, que e de
rator VIStOcomo necessano para o 1 er o mtegralismo. Percebe- '10 n . h 16E di
. d . . se qUe rn modo absoluto, Deus e, de um modo relativo, o ornem». sse lS-
d etermma as teonas estiveram presentes no pensamento pliniano. Vc .
fica-se que o autor não seguiu uma linha lógica de raciocínio e p en- uurso tinha como propósito criar um mecanismo intelectualizado para
c . . .
, . d id . ensa- chegar ao mesmo ponto, a luta contra o comu~l1smo, ~OlS, ao cnar uma
mento teonco em to a a sua VI a mtelectual. O que se viu foi um
'fi' pen- defesa de aversão materialista e uma defesa do inconsciente pautado em
samento marca d o por rami cações, ou seja, o autor, por possuir u
ci~cul~dade de apropriação, ~3 foi utilizando uma série de ideias coleta: Deus, o espiritualismo, que era a defesa do integralismo, seria alcançado
e identificadas ao longo da vida para criar e segmentar uma doutrina d _ na sociedade. O autor dizia que: «A ideia revolucionária, portanto, trans-
fendida por ele como inovadora, única e autêntica. e cende ao materialismo histórico e ao determinismo evolucionista.» 17
Os integralismos (IL e AIB) não possuem a mesma significação, nem Nessa conceção, utilizou um discurso baseado no intelecto e na cul-
tampouco podem ser colocados como similares de forma totalizante. No tura, pois para ele: «O movimento armado pode ser simplesmente re-
entanto, é visível que o movimento lusitano serviu de abertura para o flexo; o movimento das ideias é sempre consciente> 18 Vê-se, assim, a
pens:une~to do congênere brasileiro. O conservadorismo português es- causa da defesa educacional para o Brasil, pois, com a leitura e reflexões,
tava msendo em uma série de circularidades de ideias e práticas que pro- enxergava o combate do liberalismo e do materialismo no campo das
moveu a sua inspiração política. Através de uma associação entre as ma- ideias, alcançando, assim, a vitória integral: «No Brasil não se lê, é essa a
trizes vindas da infância, da juventude e da interlocução com os razão do nosso atraso, agravado pela confusão estabelecida pelos homens
modernistas, o autor iniciou uma série de apropriações de ideias que es- de meias letras, metidos a dar opinião, a conquistar lugares relevantes,
tavam disponíveis no seu tempo. Havia uma circularidade cultural em que o oligarquismo da liberal-democracia facilita» 19
que o conservadorismo português e o brasileiro estavam inseridos. Com Afirmou que a revolução de base espiritualista se opera «segundo os
essa relação, vê-se a constituição da trajetória histórica do sujeito político impositivos do Pensamento e este processa sua evolução segundo ~eu
que foi Plínio Salgado. 14 plano próprio, e seu próprio ritmo, conquanto aparentemente se revista
Um elemento de ligação entre os movimentos conservadores radicais de formas estruturadas pelas próprias características de um período con-
foi o aspeto religioso e espiritual. O discurso de um movimento revolu- siderado»." O pensamento e a prática cultural eram a saída revolucioná-
cionário de cunho cristão esteve presente com mais clareza no período ria para o autor que afirmava ser a revolução
da AIB e o pensamento de Plínio alcançou um processo de consolidação
[...] o dom da palavra das Nacionalidades. Quando uma Pátria aprende a
na década de 1930. A denominada revolução espiritual era o caminho
falar, dá-se uma revolução. Foi o que aconteceu agora. A revolução de 30
era apenas uma voz desconexa. O Integralismo é uma palavra. Em 30, ti-
1~ Thomas Faist, The Volume and Dynamics qf Intemauonal Migration and Transnational

Social Spaces (Oxford: Oxford University Press, 2000).


15 Plínio Salgado, Psycologia da Revolução, 2: ed. (Rio de Janeiro: José Olympio, 1935),
13 Para Roger Chartier, entre o texto e o sujeito que lê, coloca-se uma teoria da leitura

capaz de compreender a apropriação dos discursos, a maneira como estes afetam e o 20.
conduzem a uma nova forma de compreensão. Cf. Roger Chartier, Formas e Sentido: Cul- 16 Ibid., 20.
tura Escrita, entre Distinção e Apropriação (Campinas/São Paulo: Mercado de letras/Asso- 17 Ibid.
ciação de Leitura do Brasil, 2003); e Roger Chartier, A História Cultural: Entre Práticas e 18 Ibid., 42. . • . - I (Ri d J . . J '
19 Plínio Salgado, "O paiz que não lê», m Despertemos a Naçdo. o e aneiro: ose
Representações (Lisboa: Difel, 1990).
14 Para uma análise mais detalhada, cf. Leandro Pereira Gonçalves, Entre Brasil e Portu- Olympio, 1935), 177.
20 Plínio Salgado, Psycologia da Revolução ..., 21.
gal ...

260 261
A lilga Corporativa o integralismo de Plínio Salgado e a busca de uma proposta corporativista para o Brasil

nhamos a onomatopeia. Em 33, temos a proposição com sentido lÓgico volução cultural. Há no lntegralisrno uma revolução subjetiva e outra
O Brasilaprendeu a falar.21 •
objetiva».2s .
A base de todo o seu processo revolucionário foi desenvolvida na obra
Com a c~ação e ascensão do integralismo, Plínio S~lgado definiu que Psicologiada Revoluçifo, que possui UI~a nota d~ rodapé :sc~t: pelo au~or a
«A revoluçao começou-v e que o inconsciente, atraves do movimento partir da segunda edição: «Bem depois de publicada a 1. edição deste hvro,
estava sendo preparado para a revolução espiritualista. Tais questõe' e após Miguel Reale ter explanado com clareza este pensamento, estu-
foram objeto de reflexões no romance lançado em 1933, O Cavaleiro ~ dando o «mundo do ser» e o mundo do «deve ser» em «O Estado Mo-
Itararé. A obra que foi lançada dois meses após a divulgação do Manifesto demo», encontrei a mesma conceção em M antam». .. 26M'ais uma vez, o tom
de Outubro tem como enredo questões unicamente políticas. O romance mimético e de influências pode ser observado. Plínio não admitiu inicial-
marca o momento de abandono da literatura, ou seja, a obra é um pan- mente, mas, a partir de uma observação interna de Miguel Reale, assumiu
fleto político, cujo propósito é analisar as revoluções existentes até então matrizes semelhantes à de Jacques Maritain," elemento que figurou o seu
com o objetivo claro de mostrar que a verdadeira revolução, a espiritual: novo modelo a partir do exílio em Portugal no componente da Democra-
deve ser consolidada.P
cia Cristã, e que antes havia sido representante da Action Française.
O romance tem como enredo duas crianças, trocadas no nascimento , O seu pensamento revolucionário espiritualista foi analisado inicial-
uma delas aristocrata e a outra pertencente a uma família modesta e hu-
mente, em 1931, em Conferência pronunciada na Faculdade de Direito
milde e, a partir dessa tragédia, o autor inicia uma série de críticas à so-
de São Paulo, palestra que está inserida na obra A Q]tarta Humanidade,
ciedade brasileira, explicitando o carácter destruidor que está por trás das
com o título «Politeísmo-Monoteísmo-Ateísmo- Integralismo». Nessa re-
revoluções armadas no Brasil. Em entrevista o autor disse que:
flexão, a ideia do autor é que a humanidade produziu três tipos de so-
ciedade: «A Primeira Humanidade veio da caverna até a criação do Poli-
O Cavaleiro de ltararé é um fantasma que aparece de madrugada e bate
nas portas das fazendas e onde ele vai, no dia seguinte vem a peste, vêm as teísmo; a Segunda vem do Politeísmo ao Monoteísmo; a Terceira vem
moléstias, todas as desgraças.Então eu simbolizo nele as revoluções brasi- do Monoteísmo ao Ateísmo.»28 Uma quarta humanidade precisava ser
leiras. É o fantasma. Tem sido constantemente o fantasma. Como análise,é construída, a integralista, para isso reflete:
o melhor dos meus livros."
Dissemos que a Primeira Humanidade, Politeísta, Panteísta, teve um ca-
O Cavaleiro de ltararé passou a ser apontado como uma antítese a ráter de adição.A Segunda,Monoteísta, tem um carácterde fusão.A Terceira,
Luís Carlos Prestes, o Cavaleiro da Esperança, no sentido visível de a Ateísta,tem uma índole de dissociação,de desagregação.[...] não há etap~s
cronológicas para estas três humanidades. [...] E não podemos negar hoje
contrapor o integralismo ao comunismo. Para Plínio Salgado, a saída
que foi o Ateísmo que construiu o mundo moderno. Sim, foram os 'filhos
revolucionária caminhava em direção aos aspetos educativos, que nada
do homem', e não foram os «filhos de Deus»."
mais eram do que catequizadores. Na obra ficcional, o autor demons-
trou que as revoluções existentes até o momento tinham como único
propósito a derrubada de governos, e ele se apresentava, assim, como
o líder de um novo processo revolucionário: «a revolução interior, a 25 PlínioSalgado, «Sentidoe rythmoda nossarevolução»,in A Doutrina do Sigma (São
revolução espiritual. Nós sabemos que ela se processará devagar porque Paulo:RevistadosTribunais,1935), 18-19.
26 PlínioSalgado,Psycologia da Revolução ..., 17. .. _ .
estamos encharcados dos vícios de uma educação materialista [...] Re- TI Filósofofrancêsde orientaçãotomistateverelevanteparticipaçaona ActionFran-

çaise,masapósdivergênciascomCharlesMaurrase con:o ~er:sam~nt<? doutrinário,ini-


ciounovasorganizaçõesteóricasemtomo da democraciacnstae principalmenteemde-
21 PlínioSalgado,«Revolução Integralista»,in Palavra Nova dos TemposNovos (Riode fesa dos direitoshumanos. No contexto brasileiro,cf. OlivierCompagnon,jacques
Janeiro:JoséOlympio,1936),44. Maritain et I./1mériquedu Sud; le modele malgré lui (Villeneuve-d
'Ascq:PressesUniversitaires
22 Ibid., 45.
du Septentrion,2003). " ..
23 HélgioTrindade,Integralismo: O Fascismo Brasileiro da Década de 30,2. a ed.(portoAle- 28 PlínioSalgado,«Politeísmo-Monotelsmo-Atelsmo-Integrallsmo», mA .QJtarta Hu-
gre:DifeIlUFRGS,1979),65. manidade, 5.' ed. (SãoPaulo:GRD, 1995), 9.
24 PlínioSalgado(entrevista),in Trindade..., 67. 29 Ibid., 23-24.

262 263
A Vága Corporativa
o integralismo de Plínio Salgado e a busca de uma proposta corporativista para o Brasil

Segundo Plínio, o ateísmo construiu o mundo moderno send ederam ao integralismo, principalmente em relação à trilogia Deus, P~-
' . , o ne
~essano retomar o período áureo da sociedade, o medievalism - ~ia e Família, que era vista como elemento central da fé ,c~stã no BrasI!.
ti h .- . - o, qUe
n a a cornposrçao cnsta como máquina de desenvolvimento d h Em praticamente todas as suas obras e dos outros teoncos do mOVI-
niid a d e. O aIvo central das suas críticas faz afirmar que: «O a t Utna-
O Gapzt. . ai· . au or d mento, havia menções ou citações à Igreja Católica, exemplo a obra In-
espera o Messias, que não é um homem mas uma I e
E ra preCISO . h 'c asse »30 tegralismo e Catolicismo 35do integralista ?ustavo Ba~?so que tev~ a pre-
um ornem para salvar a sociedade e segundo Plíni· SaI .
Tc . H . 'o gado tensão de realizar reflexões entre o movimento político e o movImen~o
«a erceira umamdade que encerra o seu cido. [...] Que doloroso u' onselVador brasileiro, além de diversos materiais editados pela Secretana
dro o dessa triste Humanidadsj;» e apontava que «Das trevas d q a-
Id d M 'do d . essa nova Nacional de Propaganda da AIB, como Os Catholicos e o Integralismo 36 de
a e e Ia, e que Nicolas Berdieff (Un nouveau Moyen Ave Id d b
,. . es o ra 1937, com vários excertos de figuras de destaque do catolicismo brasileiro,
o pano~ama de an~stIas, VaI?asc~r uma nova Humanidade».32 A qUarta
0';1

exaltando o integralismo e, consequentemente, Plínio Salgado, que cons-


humamdade nascena do medIevalIsmo - o mesmo medievaIismo d fi
tantemente discursava mensagens de exaltação à doutrina: «Maria San-
I o pe Ios con fi-ad es Iusitanos
did . (lL) 33 - e, com essa composição e en-
1uçao- .. al d al ' a revo- tíssima é a grande salvadora das nações. O seu culto é o ponto inicial da
espmtu e teração da sociedade como um todo ocorreria de ressurreição dos pOVOS»,37 afirmou em carácter salvacionista em Maria:
uma forma natural, tendo o aspeto doutrinador do integralismo co
fconte d e transição . - mo Salvação do Mundo!
para a nova concepção social.
O discurso feito pelos integralistas em relação ao catolicismo não era
Essa revolução tin.h~ ~omo ~érito a organização de uma sociedade uma via de mão dupla. Tais questões não passaram despercebidas pelo
c?rporattvIsta, autontana e radical com base nos preceitos do cristia-
Vaticano, que desenvolveu uma série de investigações sobre Plínio Sal-
rusmo. !ustamente essa conceção cristã e um discurso de força religiosa
gado e a AIB. No Archivio Segreto Vaticano, documentos 38q~e mostr~
~~ movimento trans~ormaram o integralismo em uma organização po-
o Vaticano, através do papa Pio XI, ressaltando atenção ao discurso reli-
htt~~ que recebeu apOIOnão só da Igreja Católica, como de outros grupos
34 gioso de Plínio Salgado. O primeiro documento foi escrito por D. Gastão
rehgIosos. Ressalta-se a importância que os movimentos católicos con-
Liberal Pinto, bispo de São Carlos, São Paulo e foi enviado ao núncio
apostólico no Brasil, D. Benedetto, para ser avaliado e publicado, mas a
30 lbid., 34.
31 lbid., 37.
32 lbid., 35.
Sob~e a f0rt?ação e pe~samento ideológico do Integralismo Lusitano, cf. José Ma-
33
pretende revolucionar um continente não pode basear-se no que este ou aquele acham
~~~~)?-wntas, Filhos de Ramzres: As Origens do lntegralismo Lusitano (Lisboa: Nova Ática, que deveria ser e, sim, no que efetivamente pode ser (Acervo Documental AlB/PRP- D EL-
FOS-PUCRS - Ação Integralista Brasileira/Partido de Representação Popular - Espaço
34 Havia d.iverso~ ~egrnentos religiosos no apoio e .defesa do integralismo, principal-
de Documentação e Memória Cultural da Pontificia Universid~de Cató~ica do Rio
~ent~ a IgreJ~ ~atolIca, que poss.tua diversos grupos mtelectuais que exaltavam a orga- Grande do Sul. Fundo PRP-Brasil. Série 1, Emílio Otto. 15). Inclusive o movimento kar-
n1Z~~ao de P~lmo Salgado, mas diferentemente do IL, o brasileiro, não era unicamente decista esteve presente no movimento integralista brasileiro. Em 1937, Alberto Silvares,
catolIco~ havia u~ ecumenismo no movimento, exemplo ocorreu na cidade de Juiz de ex-intendente municipal, secretário de propaganda do Andaraí (AlB) e membro da C~-
Fo~a?Minas Ge~aIs, em que a AlB teve sua semente plantada dentro de uma instituição mara dos Quatrocentos lançou o livro O Communismo e.se~ Contr~-':en~~. O autor dedi-
religiosa metodism, um grande centro educacional secular denominado Instituto Cran- cou o livro a Deus, Plínio Salgado e «ao grande mestre e mSlgne mlsslo~ano Alan Kardec,
bery. Através d~ força ~os líder~s e do~trinado.res metodistas, nasceu o integralismo juiz- codificador da mais sublime das doutrinas, o Espiritismo,» Alberto Silvares, O Commu-
forano, com a mtegraçao do discurso mtegralista conservador ao discurso metodista do ntsmo e seu Contra-Veneno (Rio de Janeiro: Minerva, 1937).
c~mtexto reli~oso da déc.ada de ~930. Cf. Leandro Pereira Gonçalves, «Tradição e cristia- 35 Gustavo Barroso, lntegralismo e Catolicismo, 2. a ed. (Rio de Janeiro: ABC~ 1937):
msmo: o nascI~ento do integralismo em Juiz de Fora», in Estudos do lntegralismo no Brasil, 36 Tristão Athayde et al., Os Catholicose o lntegralismo (Rio de Janeiro: Secretana Nacional
org. GI~e!da Bnto SIlva (Recife: Editora da UFRPE, 2007); Leandro Pereira Gonçalves, de Propaganda, 1937). . ,. .
e Maurício de Castro Correa, «Ação Integralista Brasileira: seus reflexos emJuiz de Fora, 37 Plínio Salgado, Maria: Salvação do Mundo! (APHRC/FPS - Arquivo Público e HIS-
um resgate historiogrãfico», in Entre TiposeRecortes, vol. 1, orgs. Leandro Pereira Gonçalves tórico de Rio Claro/Fundo Plínio Salgado-011.001.002).
e Renata ~uarte Sunões. No entanto, a temática gerou inúmeras divergências no movi- 38 Breves Observações sobre a Ortodoxia da Doutrina lntegralista Perante a Igreja Católica
ment?, pOISconstantemen.te os protestantes questionavam a supremacia católica no in- (Sacra Congregazione degli affari ecclesistici straordinari anno 1938 - Poso ?29-531 -:
tegralisrno, conforme publicação: «Oficializar ou tomar oficiosa determinada religião vai FASe. 50) e Ortodoxia delta Dottrina integralista nel Brasilei (Sacra Congregazione degli
um grande passo que o mtegralismo não procurou encetar, porque um movimento que affari ecclesistici straordinari anno 1938 - Poso 529-531 - FASC. 50)

264
265
A Vttga Corporativa
o integralismo de Plínio Salgado e a busca de uma proposta corporativista para o Brasil

publicação não ocor:eu.39 O segundo, de um especialista que o núncio relato, afirma-se certa injustiça em um possível conhecimento público
pediu para ler. Os dOIStextos foram enviados pelo Núncio Benedett do documento: «Além de ser inoportuna, parece-me também que a pu-
S ,. d E d oao
ecretano e sta o do papa, Eugenio Pacelli, futuro Pio XII e n blicação poderia produzir a impressão de ser unilateral e injusta»:" A in-
.. ifi
materiais ven ca-se que a AIB não era tão bem-vista, oposto ao dis
' estes
'· S 1 d curso ·ustiça vista pelo documento do Vaticano está no facto de um~ possível
PI
que Imo a ga o e seus correligionários faziam, colocando o rn .
. alo 1· OVI-
~ondenação e crítica feita em Breves Observações sobre a Ortodoxia da Dou-
mento mtegr ista e o cato icismo como elementos de congregação. trina Integralista perante a Igreja Católica. Foi afirmado no documento es-
A ~ropo!ta do integralisrno pli~iano te~ como fundamento central a rito pelo Bispo de São Carlos que o discurso integralista apresentava
apro~m.a~ao do discurso integralista d? .dIscurso católico em direção à c 1 .
erros, por abusar da religião na organização po ítica:
constttuiçâo de um cOIporatIvIsmo espiritual de matiz católica, promo-
vendo de forma paulatina um afastamento do discurso cOIporativista f _ Evidentemente este modo é um erro. É abusar da religião,dizia LeãoXIII,
cista ~e matiz ??lítico e de ~onto:n0.s laicos ..A inspiração em aspetos ~: arrastar a Igreja para um partido e empenhar-se para que ela dê a força de
doutnna e pratica do fascismo italiano fOI moderada pela existênc. seu braço para vencer os adversáriospolíticos (Sapientiaa christianae); porque
da doutrin~ do catolicismo social, sendo que o corporativismn represe~~ sempre da identificação da religiãocom um partido, os adversáriosde~te'par-
tou uma evidente convergência entre a política integralista, notadamente tido tomam-se adversários da Igreja e os políticos acabam por substituir os
a pliniana, .e a Igr~ja C~tólica. A~esar de algumas divergências, o que pre- ideais da religião. Como também nenhum partido, por mais respeitávelque
valeceu fOI a recIproCIdade, pOIS havia outros interesses além de uma seja, não tem o monopólio da defesa dos interesses religiosos. Leão XIII
questão religiosa, e foi criado um núcleo de ideias e de organização po- assim lembrava aos cardeais franceses (8-5-1892): os homens que tudo su-
bordinassem ao prévio triunfo de seu partido, mesmo sob o pretexto de ser
lítica em tomo da defesa do cOIporativismo, anticomunismo, antilibe-
ele o mais apto para a defesa religiosa,estariam com as ideias transtornadas,
ralismo e demais interesses convergentes entre a Igreja Católica e a AlE.
anteporiam a política que divide à religião que une."
No documento Breves Observaçõessobrea Ortodoxia da Doutrina Integralista
perante a Igreja Católica, verifica-se que havia certo temor por parte do clero
em relação ao discurso religioso contido no movimento integralista, prin-
° documento, que não foi indicado para publicação, chegou ao co-
nhecimento de Plínio Salgado através do Arcebispo de Belo Horizonte,
cipalmente pelo crescimento da AIB e do discurso religioso nele contido:
D. Antônio dos Santos Cabral, que solicitou ao chefe integralista uma
impressão em relação aos dizeres de D. Gastão ~ibera~ Pinto. 0, do-
Nas condições presentes da sociedade brasileira,urge adquirir a exatasig-
cumento, com 46 páginas dactilografadas, nunca fOIpublicado e esta de-
nificação da doutrina integralistae, uma vez esclarecidasemelhante filosofia,
toma-se mister julgar da sua ortodoxia em relação ao ensino da IgrejaCató- positado no Fundo Plínio Salgado no Arquivo Público e Histórico de
lica. Uma doutrina que no dizer de seus adeptos vai empolgando a menta- Rio Claro (FPS/APHRC), sendo nele visível a ira do autor, apontando
lidade das multidões não deve ficar desconhecida, principalmente daqueles inclusive erros de dactilografia ou ortografia: «Onde havia uma vírgula,
que por missão devem ser os mentores da sociedade cristã. Acresce que o pôs-se o ponto final,. 43 Plínio Salgado em relação ao documento disse:
integralismo prega ser sua doutrina a única salvaçãoda sociedade e da Igreja
no momento presente, antepõe seus métodos às medidas apregoadas pelos Não tenho coragem de publicar este estudo crítico, a respeito de um tra-
Papas, aconselhando de preferência seus processos à Ação Católica." balho de um dos Exmos. e Revmos Srs. Bispos brasileiros. Tenho, porém,
coragem de o remeter aS. Ex.', para evitarque aquilo, que faço ocultamente,
Em Ortodoxia deUa Dottrina integralista nel Brasilei a publicação do pri-
meiro documento foi desaconselhada, ficando à disposição do clero. No
41 Ortodoxia della Dottrina integralista nel Brasile? (Ttradução minha.) «Oltre ad essere

inopportuna, mi pare anche, che Ia pubblicazione potrebbe produrre I'impressione d'es-


39 Posteriormente pub.licada in Castão ~iberal Pinto, «Carta de Dom Gastão Liberal
sere untlaterale ed ingiusta.» .
Pinto .aos.Bispos ?o Brasil sobre o mtegr~l~mO; breves observações sobre a ortodoxia da 42 Breves Observaçõessobrea Ortodoxia ...
doutnna integralista per~te a Igreja Cato!Jca», Boletim do Centro de Pesquisas e Estudos da
História dalgreja no Brasil, a. 6, vol. 3, n.? 22 (1984); 3-9. 43 Plínio Salgado, Apreciação das ~Impressõessôbrea Ort~dox~ada Do.utrina Integralista Pe-
40 Breves Observaçõessobrea Ortodoxia ... rante a Igreja Catôlia», de S. Exaa Revdma. D. Gastao Liberal Pinto (APHRC/FPS-
-103.007.003).

266 267
A Vága Corporativa
o integralismo de Plínio Salgado e a busca de uma proposta corporativista para o Brasil

nhum sistema filosófico anterior. [...] Terminando pode-se afirmar, a) a filo-


~os~a ser al.ardeado, ?a imprensa, por um outro, que, mais ardoso na defi
sofia do integralismo, ao contrário do que apregoa, não é uma filosofia nova,
o integralisrno, oblitere o respeito a um ilustre prelado." eSa
é uma mescla de todas as filosofias antigas e modernas, pretende fundir todas
as verdades e erros que brotaram até hoje da inteligência: b) Maldizentes às
Nele, o líder integralista iniciou
- a análise ' justificando na-o concord
vezes a política ou a economia do século passado, o integralismo não rompe
com as p al avras de D. Gastao, e afirmou estar disposto a pOSSl'· ar
- El bi . velS Con com que este século passado teve de pior as suas filosofias. Condenando os
d e,:açoes. e sa Ia que ISSOnão ocorreria, até porque o docum -
_ foi . ento COlll erros do século XIX, o integralismo se apega a um dos mais graves erros: o
as lfipressoes
_. 01 escnto em 1938, após o aconselhamento
. . d "\T •
o vatican ecletismo.48
em nao agir contra o integralismo, e tal posição chegou ao conhe . o
d Iíder i alo . Clffiento
o 1 . er mtegr
. ,. ista, pOISo próprio deixou claro ,ono document 1ogo Esta crítica foi recebida duramente por ele, que demonstrou uma in-
na pflffierra pagma, ao escrever: «este trabalho não vai ser publicad 4
Otrche o «na~ _. Vaiser pu bli cado» foi riscado pelo autor na versão origin~ 0»5 coerência ao dizer:
querendo, assim,
. transparecer na versão oficial do documento que est ava'
A •
[...] os livros e artigos não têm valor doutrinário oficial. Ainda mesmo os
sen d o corajoso e autentico, por defender seus ideais· quando na v d d subscritos por autoridades do movimento. Podem exprimir a doutrina de
., heci ' ,er a e
e1e Ja con ecra o resultado da Igreja, mais uma exemplificação d ' alguns integralistas fundamentados, naturalmente na doutrina integralista.
tumsmo. p 1..
iruano dee se se aprovei
aproveitar de todos os momentos e situações o opor-
ara Mas não são a doutrina do integralismo. Serão opiniões pessoais, comentá-
engrandecer-se: p rios nesta doutrina.49

Lamentando embora ter de discordar de S. Excia. Reva. não me esq . Comprovando que criava discursos de acordo com o momento e com
, b di A • ,UIVO
n.em_a o e iencia, nem à franqueza sincera, com que costumo expor con- a necessidade que a ocasião exigia, dois anos antes, em 1936, Plínio Sal-
vicçoes, Como este trabalho [não vai ser publicado] tem um cunho ex I . gado, em 5 de julho, escreveu um artigo intitulado «Em face do dilúvio»
d . . id d .. C USIVO
e intmu a e, t~meI.a liberdade de ser, às vezes, rudemente franco. Declaro, para o jornal A Offensiva, em que afirmou, ao analisar o integralismo
entret~nto, que jamais me vem à mente a ideia de faltar ao respeito devido frente o comunismo, justamente o contrário, valorizando sobremaneira
a um Ilu~tre prelado brasileiro, a quem pessoalmente acato. E estou inteira- as suas obras literárias e produção cultural e intelectual. As mesmas que
me~te disposto a ~ceitar quaisquer observações ou mesmo, se for o caso,
foram usadas como base para a crítica do Bispo de São Carlos e agora
castigos que me sejam dados."
atacadas por ele:
,? documento escrito por D. Gastão Liberal Pinto faz uma análise de Contra a mística do bolchevismo, só a mística do integralismo. Essa mís-
vanos trechos e documentos das suas obras e de outros integralistas, tica já existe e levei dez anos para tomá-Ia uma realidade. Tenho sentido essa
como Gustavo Barroso." Nas reflexões, o Bispo de São Carlos tentou realidade, falando ao rádio. Toda a carta geográfica da Pátria me escuta e aos
«desmascarar» o integralismo e a originalidade nele pregada: telegramas que em seguida recebo passam diante de meus olhos como urna
parada de almas despertas, uma a urna, iluminadas, nesta obra firme de res-
?línio S~gado na Quarta Humanidade faz um longo histórico da evo- surreição nacional. Como se criou isso? Realizei milhares de conferências;
luçao das diversas correntes filosóficas que o mundo tem conhecido em publiquei 18 livros, escrevi milhares de artigos; atravessei centenas de noites
todas as épocas e lug~es. Referindo-se ao integralismo que no seu dizer será em claro, doutrinando os moços, ou trabalhando; viajei a minha Pátria, de
a filosofia da humanidade futura, afirma que o integralismo não repudia ne- trem de ferro, de navio, de automóvel, de canoa, a cavalo, de avião; estive
em comícios tumultuosos, perdi companheiros em conflitos, realizei dezenas
44 Ibid. de congressos; lancei no país centenas de oradores, de escritores; ternos quase
45 Ibid. 100 jornais semanários, 8 diários, urna revista ilustrada e uma de alta cultura;
46lbid.
47 Sobre a crítica proferida por Dom Gastão Liberal Pinto a Gust B nfierir
· d 1989 1 hi . d avo arroso, co
o estud o rea1iza o em,. d pe o istona
ali or Antônio Rago FiIho que an al·ISOU o do-
cumento Breves Observaçõessobrea Ortodoxia ...
An com oRa propOSltO
Filh e213215
contextu izar a oposição católiica ao pensamento b arr0- 48
. A •
Plínio Salgado,Apreciação das...
Slano. torno go o..., - .. 49

268 269
A ~ga Corporativa
o integralismo de Plínio Salgado e a busca de uma proposta corporativista para o Brasil

es~turei uma vasta org~ação de assistênciasocial e fundei mais de 300 Mas, como foi ressaltado, em Ortodoxia della Dottrina integralista nel
nucle~s.onde se fa: do~tnna e se executa um ritual uniforme, que identifi.c~ Erasile?, a crítica ao integralismo foi duramente desaconselhada por mem-
os espíntos; c~çoes, hinos são c~t~dos d~sde o Acre ao Rio Grande do
Sul, todas palpitando na mesma rnísnca, mais de 1000 escolaspnm·ári . bros do Vaticano, pois mesmo havendo uma sobreposição da política
ali ale b . , as tn- sobre a religião e sendo o discurso de Plínio Salgado apontado como
tegr st~s Ia. e~am e .educam;.a ~ultura fisica desp~rt~a mocidade Para
um sentido otirrnstade VIda;multIplIcam-seas nossas bIblIotecas·no . não católico, e consequentemente não cristão, «A concepção de Deus
, s naVIOs contida no lema integralismo comporta até o panteísmo; Donde a con-
mercantes, em mares longínquos, nas capitais dos países da Europ d
Améri
enca, h'a N'uc1eos Integraloistas onde brasileiros saudosos da P'tn.a e a clusão de que o integralismo não pode ser considerado autenticamente
a a co-
mungam, a mesmas horas, com o sertanejo de todos os sertões do Br .1 cristão».55A doutrina integralista e as palavras de Plínio Salgado foram
idéi . d aSI a
mesma I ela, segum o o mesmo ritual. Tudo isso está feito. Em 8 milho' vistas como úteis para o período em que o mundo estava vivendo, en-
de qUIometros
·1' qua ra os, e am a nos mares e nas terras estrangeiras.50 oes
d d . d
xergando a AIB como o fascismo brasileiro e, assim, auxiliando no com-
bate aos inimigos do cristianismo, o comunismo. Dizia no documento
yalo.rizava a sua produçã~, até porque essa possuía elementos de cate- que: «Sobre esteaspeto o partido ~rasileiro do inte~~isI?o se e~contra nas
quizaçao. Em 1937, ao publicar Geografia Sentimental, disse: «{Iuero q mesmas condições, como o fascismo de Mussolini, o integralisrno de Sa-
· . lid I ~
este Irvro seja 1 o pe os moços para que amem o Brasil e compreendam
ue
lazar, o nacionalismo de Franco, que por tal motivo, nunca sofreram qual-
~ grandeza deste vasto império-j" pensamento corroborado pelo integra- quer censura das autoridades eclesiásticas.e "
lisrno, a grandeza da Pátria. Com o objetivo de encontrar erros no pensa- A relação entre política e religião era, sem dúvida, um elemento de
mento de D. Gastão, Plínio Salgado buscou aspetos que apresentavam grande debate no Vaticano; mas, mesmo existindo contradições ou ~té
falhas no relato do bispo e afirmou que: «Ninguém tem o direito de atacar mesmo ambiguidades no movimento integralista, sob o olhar da Igreja,
ou defender o integralismo sem o conhecer bem e completamente.»52 ele era visto como uma verdadeira profissão de fé, não sendo aconselhável
Não aceitava o facto de o bispo não ter como base central de análise a condenação, pois, ao contrário do que aconteceu com a Action Française,
os documentos oficiais da AIB, logo, não atingindo a ideia central do a AIB possuía um católico fervoroso na liderança, diferentemente de Char-
pensa~ento integralista. No entanto, verifica-se que Plínio Salgado, em les Maurras,? que foi acusado de colocar a política acima da religião, ainda
Aprec~ação tt:':
«Impressões sôbre a Ortodoxia da Doutrina Integralista perante que o movimento possuísse uma forte base católica no seu programa: «Es-
a Igrqa Caiôlica», escreveu 46 páginas tendo como referência máxima a banjando-se na glória de suas credenciais católicas, a Action Française estava
análise do documento de suas próprias obras, dessa forma, com um dis- totalmente despreparada para a avalanche que a oprimiu menos de um
curso ambíguo mostrou-se presente. O autor ainda criticou que «este não ano depois de ela ter atingido o auge de seu prestígio eclesiástico.v" Dessa
po~~ nem deve ser atacado, nem defendido, com argumentos de ordem forma, em reflexão ao documento de críticas, apontou-se:
religiosa, mas somente de ordem política»." Essa afirmação foi baseada
n~ ~elatório co~ que o Bispo de São Carlos demonstrou a incapacidade E porque esquecer a magnífica profissão de fé pública, feita pelo chefe in-
ongmal do movimento integralista, ressaltando não haver um discurso tegralista nas sessões solenes das cortes do Sigma, quando se proclamou a
novo e apontando para a mescla promovida por Plínio Salgado como
um grande perigo ao catolicismo, uma vez que: «A filosofia integralista 55 Ibid.
é claramente, essencialmente eclética, portanto anticatólica. Só poderão 56 Ortodoxia della Dottrina integralista nel Brasile? (Tradução minha.) «Sotto questo aspetto
negá-lo os que não leram do integralisrno.. 54 iI partito Brasiliano dell'Inte~a1ismo tr,?vasi ~elle I?edesirne condizioni, come il ~asci.smo
di Mussolini, I'integralismo di Salazar, iI ~~lOnalrs.m~ de Franco, che per tal motnio gtam-
mai soffii.rono alcuna censura dalle autonta ecclesiastiche,»
57 Para um amplo entendimen.to do pensame~to maurrasiano, cf Olivier Dard, Charles
50 Plínio Salgado, «Em face do dilúvio», in Páginas de Combate (Rio de Janeiro: Antunes, Maurras. Le maitre et l'aaion (pans: Annand Colin, 2013).
1937),37-39.
58 Oscar L. Arnal, Ambivalent AUiance: the Catholic Church and the Action Française 1899-
51 Plíni~ ~a1gado Geografia ~entimental, 2. a ed. (Rio de Janeiro: José Olympio, 1937),8. -1939 (pittsburgh: University ofPi~sburgh Pres~, 1985), 123 (tradução minha). «Basking
52 Id. Plínio Salgado, ApreCIação das...
53 Ibid. in the glory of its Catholic credennals, the Action Française was totally unprepared for
the deluge that overwhelmead it less than a year after it had reached the zenith of its
54 Breves Observaçõessobre a Ortodoxia ...
ecclesiastical prestige,»

270 271
O integralismo de PUnio Salgado e a busca de uma proposta corporativista para o Brasil
A Vága Corporativa

Esse foi o mesmo argumento utilizado por Plínio Salgado que, no ~~-
sua candidatura a sucessão presidencial: este é o Estado Integral, como e
compreendo no retrocesso da minha consciência, nas horas de silêncio U
umento de resposta a D. Gastão, disse: «Muitas autoridades em rnatena
~uais me dirijo a Deus, suplicando-o, que faça feliz ao meu povo, para .isto ~e1igiosa, tanto leigos, co~o sace,r~otes e bispo~, afirm.~ não haver opo-
e que quero vos fazer neste momento a profissão pública da minha fé.59 o, sição entre a doutrina social catohca e a doutnna do Sl~a, pelo menos
as partes essenciais da estrutura doutrinária do integrahsmo.,,61 .
A Doutrina Social da Igreja apresentava um elemento de extrema irnp n Verifica-se que o discurso anticomunista e a defesa de dogrnas .v~nd?s
A' fund or-
tancia para a amentação do pensamento pliniano e isso era visto co da palavra cristã sobrepuseram-se a qualquer tipo de críticas OpOslcloms-
bons olhos pelo Vaticano, apesar de todos os receios contidos no relató ~ tas ao pensamento de Plínio Salgado. Vê-se tal documento com grande
do Bispo de São Carlos, principalmente por querer iniciar um processo ~o relevância, pois ele foi elaborado em 1937, mo~ento turb~lento da po-
críticas e condenação a um movimento que possuía um sólido discurs e lítica brasileira, que teve como consequência a lmplant~çao d~ Estado
. _ . .. o
cnstao e anncomumsta, Justamente o que Leão XIII sugeriu em 1891: Novo getulista e a consequente ilegalidade da ~B. Asslm~ a atitude de
não autorizar a publicação do documento do BISpo de Sao Carlo~ d~-
A fim de julgar o integralismo com equidade, interpretar a sua atitude em monstra que Plínio Salgado constituiu, nesse momento, uma c~nunUl-
face da Igreja e dar a uma ou outra expressão menos correta de seus escritos
dade da defesa de um pensamento cristão e conservador, que f01 funda-
o significado justo, convém também não esquecer: a) que no programa de
mentado com eloquência no exílio em Portugal, período ~e extr~ma
reforma social seguiu muito de perto toda a orientação doutrinária católica.
relevância para o entendimento do discurso religioso .do líder mtegrallsta.
A Carta Nacional do Trabalho, publicada recentemente, é um resumo das en-
cí~licas ~rum Novar:en: de Leão XIII e Q]tadragesimoAnno de Pio XI; b) que A documentação do especialista do Vaticano concluiu, portanto, ser um
o mtegralismo constitui atualmente uma das organizações na defesa de Deus, erro a condenação da AIB:
da Pátria e da Família contra o comunismo ateu, que na frase de Pio XI,
Assim, como me parece, as razões doutrinárias se ur~em _aos motivos de
constitui «a mais grave ameaça" à civilização cristã; c) que uma das suas as-
oportunidade e de prudência para ~esaconsel~ar a pubhcaçao de.Breves Ob-
pirações, rica de consequências práticas, é: «fundar toda a moral brasileira
servações sobre a Ortodoxia da Doutrina Integralzsta. Me p~.ece mais seguro e
nos sentimentos religiosos, base da honestidade e da disciplina social" (plínio
vantajoso para a Igreja, na situação atual dos grupos políticos e nas suas po-
Salgado, O que éIntegralismo, 4." ed., 133); d) que o integralismo nestes últi-
mos tempos combateu com grande furor o comunismo, a maçonaria e todas
sições doutrinárias até agora tomadas, nos conservar realmente ror~
e acima
dos partidos: trabalhando, de modo que os bons germes que Ia existem, se
as forças anticristãs de dissolução social. Essas posturas dizem muito e não
desenvolvam com vigor e nos esforçando a fi~ de amortecer. os cho~ue: ~as
podem ser esquecidas."
discórdias partidárias com a irradiação conqUistadora da candade cnsta.

59 Ortodoxi~ della Dott~na inte,grtÚistanel Brasile? (fradução minha.) «Eperché dimenti-


Vê-se que as matrizes culturais de Plínio Salgado, na .déc:da de, ~O,
care Ia magnifica p~ofessl?nedi fede pubblica, fatta peI Capo Integralista nella sessione
soIenne delle Com del Sigma, quando si proclarnó Ia sua candidatura alla successione não eram suficientes no momento para uma nova orgamzaçao política
pres~denziale:«Qyes.toé 10stato Integrale, come io 10comprendo nel recesso della mia
~osc!enza,nelle ore silenziose,nelle quali rni dirigo aDio, supplicandolo, che facciafelice
il mIOPopolo. Per ciõ é, che io voglio farvi in questo momento Ia professione pubblica
della mia fede,» 4.' ed. 133);d) Che I'lntegralismoin questi ultimi tempi ~ ~o~ba~t~ con ~de fu~ore
60 o,nodoxia deDap0tt:ina integrrm:taneIBrasi~? (traduçãominha). AIfine di giudicareI'In-
dal Comunismo, dalla massoneria e da tutte le forze antlo:st1an~dl.dlssolUZlOnesociale.
tegralismocon equita, interpretareil suo atteggiamentoin facciadella Chiesa e dare ad una Questi atteggiamentidicono molto e non possono essered11llentlcatl.
o altra.espre~sionemeno corretta dei suoi .sc~ttiIa significazionegiusta, conviene anche 61 Plínio Salgado, Apreciação das:" . _. . .
62 Ortodoxia ddla Dottrina integrallsta nel Brasile! (Tradução ml?ha.) «COSI,
come m~p~re,
~o~ d11ll~ntlcare:a~ch~ neI pr?gramma di nforrne sociali ha seguito molto vicino tu~
I on~ntazlOnedottnn<J?~cattohca.La carta Naz:lOnaledI Lavoro pubblicata recentemente e Ie ragioni dottrinarie si uniscono ai motivi di opportumtà e di prudenza.per sconsl~hare
un nassunto delleEnciclicheRerum Novarum di Leone XIII eQuadragésimo anno di PioXI. Ia pubblicazione delle «Breviosservazioni.sopra I'ort?dos~ia della dottn~a Inte!?fahs.t~»:
b) ~he l'lntegralis~c:>costituis~eattualm~nteuna delleorgani.zzatenella difesadi Dio, della Mi pare piú sicuro e vantaggioso per Ia Chiesa, nella sltuazl~ne attuale dei ~ppl politici
patna e della famigliacontro il Comurusmo ateo, che nella frase de Pio XI costituisce'Ia e nelle sue posizioni dottrinarie finora assunt~, c?nservar~1r.ealm~ntefuon. e sopra dei
piú graveminacci~' all~c~vilizzazionecristiana.c) Che una delle sue aspirazioni,ricchedi artiti: lavorando, affinché i buoni gen:li che ': esistono, s~svilupp;n0 c~:m.Vlgore,e sf~r-
conseguenze pratiche e: fondare tutta Ia moralità brasiliana nei sentimenti religiosi che ~andoci infine di ammortizzare gli um delle discordie faziose colllITadlazlOneconquis-
sono Ia base di onestà e della disciplina sociale' (Salgado, Plínio, Cià che é I'IntegraÉsmo, tatrice della carità Cristiana».

273
272
ti . tapara o Brasil
. .sr: de T>7' . S· _1 _.1_ e a busca de uma proposta corpora VIS
A Vága Corporativa O mtegnulsmo runto aigaa»

tr tanto em um contexto cultural e espiritualista, esse caminho


br~sileira. A~ropriações foram incorporadas e a busc.a ~o co?hecimento taS.dEn e iado 'longo uma vez que haveria a necessidade de mexer co~
f01 estabelecida. Os movimentos conservadores radicais, alem da Igre' a ernas , .,' r o por mais
- de uma nova etapa dra er turas culturais e intelectuaIs do paIS, e o mtegra IS~ /
C ato'1'ica, roram
r , 1os para a construçao
sustentacu as estrU . d . - pOssUla torça capaz
. - tivesse em determma os meIOS, nao l' .
pensamento cultural do líder integralista; no entanto, independente dO acel~a?a? qp:erisso a saída encontrada foi a alteração do discurso paI ~t1:0.
apoio ou não da Igreja, a revolução cultural e espiritual de Plínio Salgad e de vitona, ." - da AIB nas e elçoes
caminhava de forma lenta, como ele próprio afirmava. Portanto, era pr~ Ern urn primeiro momento, autonz~u a partl~~;J~o Em dezembro desse
ciso alterações das rotas políticas do movimento, principalmente em um de 19fi34~:;:~:n~:~:~~~oa~~r~:c7:~n~~n;os mili~antes e dos votos ob-
contexto em que a conjuntura mundial era favorável aos ideais conser_ ano, c
vadores. Com isso a viabilidade de uma eleição presidencial, interrom_ tidos nas eleições:
pida pelo golpe do Estado Novo de 1937, e o consequente exílio do autor • r fi rma nacional. Basta dizer que só no Estado
em Portugal. O integrahsmo e hoie u:n~ o bro organizaram-se 152 municípios,
de S. Paulo, durante ?, ~es e nove:nto; de estudos, etc. Há em S. Paulo,
O líder integralista, desde o início das reflexões políticas na década de
com sede, quartel, ml~l?l~,d~parta~ d com um efetivo de 40 000 rapa-
1920, era defensor de um pensamento antipartidário. Em 1932, ano de
atualmente, 203 mUn1~l~lOS mte~~::::s~ossa província deram-nos perto
fundação da AIB, afirmou: «Sendo os partidos políticos do Brasil cons- zes combatentes. As ultlmas delelç .' trada no pleito 23 dias antes,
tituídos por essa massa ignara, evidentemente não podem sistematizar do que etermmel a en .
de 10 00 O votos, sen. - ueria desvirtuar o movi-
campanhas de ideias, nem traçar quaisquer programas» 63 Estabeleceu
combates contra a existência dos partidos políticos no Brasil, como na i
sem ter feito qualificação ele1to: ~~r~~i~~ ~~~t;co. O mesmo se deu em
mente, transf~m:ando-o num . g fi~ ele er deputados no Amazonas, no
obra O que é Integralismo quando afirmou: «o integralismo moverá [...] todas as provmClas.Mesmo, ~sslmS' g S Paulo e em Santa Catarina,
guerra de morte a todos os partidos, sejam eles quais forem»." Buscou r Ai s no Espmto anto, em . .
Ceara, em ag~a, decidir da escola do presidente do Estado, pOlS_os
em valores ufanistas a defesa de tais práticas, ao rememorar Duque de sendo que esta, l.remos ecr Em todas as outras províncias, as votaçoes
Caxias: «O Duque sempre dizia, quando os brasileiros brigavam e se se- dfioiS
gr~de~pa~pde~::;::::iso da nossa intervenção.Levamosem todo
paravam por causa dos partidos políticos: Minha espada não tem partidos, oram e eva as, 67
o país, perto de 80 000 votos.
por que ela serve a nação.,,65 Nessa conceção contra os partidos políticos es-
tava a base fascista do discurso que, através da defesa corporativista, im- do.vi preciso entrar na <<vulgari-
Com certo sucesso alcança o, V1U que. era traietória ara o
pedia qualquer ação associada ao modelo liberal:
dade partidária», indo contra '" ~eus ens~~::ee~~0;~~óp~lis,68 e~ 7 de
Os partidos só podem se extinguir,organizando-se a verdadeira democra- oder fez com que fosse reahza o, na ~l .' 69 ndo ocorreu
p d 1935 2 o Congresso Integrahsta Brasileiro. qua
cia cristã, que é o Estado Corporativo. Não haverá descontentes nem perse- março e , o . _ . 'd' d movimento, transformado em par-
guidos, porque todos os homens que pertencem agora aos partidos são bra- oficialmente a alteraçao jun lCa? lt r o discurso feito até então.
sileirose pertencem a uma profissão.Elespoderão, pois, entrando para a sua tido político. Para tanto, era prec~o a era rtigo no mesmo ano do
classe,ser elevados por ela, porque na classe as vontades são muito mais li- Dessa forma, o líder in~egra:ista armou, : :s partidos políticos, mas
vres, pois estão a salvo de dependências humilhadoras.é congresso, que a questao nao era ser con

No modelo político em que a AIB estava inserida, existiam duas op-


ções para alcançar o poder: a via insurrecional ou a eleitoral. A primeira dê . d Plínio Salgado a Ribeiro Couto, 12 dez. 1934 - (FCRB - Fun-
67 Correspon el!Cla e B-Po . 28177). . A

foi o caminho teórico escolhido por ele ao organizar os ideais integralis- dação Casa de RUi B~bosalAPT ~~xandre Luís Oliveira e Priseila MusqUlm.Alcan-
68 Cf. Leandro Per~lfa Gon.1a.ves, ovimento operário na cidade de Petrópolts (R]»>,
tara, «A Ação Inte~allsta Brasl ~~a.e1~1~ , . .
63 Plínio Salgado, «O paiz que não lê», in Despertemos a Naçãal...., 176. Revista Ars Histonca, vol~ 3 (20 ~~so Integralista Brasileiro na cidade de Viton~, capital
gr 1934 em que a AIB adquiriu carácter verdadeIramente
64 Plínio Salgado, O que éIntegralismo, 4.' ed. (Rio de Janeiro: Schmidt, 1937), 133. 69 Antes, ocorreu o 1. Con
,· S to em março d e, .,
65 Plínio Salgado, Nosso Brasil, 4.' ed. (São Paulo: Voz do Oeste, 1981),71. d o E~pmto ~n d' b I imento como sociedade CIvil.
66 Plínio Salgado, «O problema da ordem», in A doutrina do Sigma ..., 49. político atraves o esta e ec

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274
A l-'llga Corporativa
o integralismo de Plínio Salgado e a busca de uma proposta corporativista para o Brasil

sim c<?ntra ~s partidos políticos estaduais, que eram a base da velha oI" Com um discurso salvacionista dos integralistas, que não teriam opção
garquia brasileira: 1-
nas eleições de 1938, dizia ter alterado as bases intelectuais do movi-
mento pelo bem integral:
Em artigo que publiquei há tempos, há bem tempos, condenei as dit d
ras em termos veementes. Só os povos selvagens as toleram. Nós q a u- Hoje, no Brasil, só existe um partido nacional. É o integralismo, conforme
. uerelllos
um governo que esteja a salvo de agitações dos partidos que atentam . há dias tomou patente o general Góes Monteiro. E esse partido não é na-
di . peno-
icamente contra a segurança nacional. [...] A conclusão é a fatal· os cional pelo simples facto de se haver registrado como tal perante a Justiça
. di . que
atentam peno icarnente contra a segurança nacional são ospartidos e ted. . competente; é nacional porque todo o seu pensamento político, seu senti-
os políticos regionais. 70 s uazs,
mento, sua mística, fundamentam-se naquelas aspirações gerais comuns a
todos os brasileiros."
Uma expressiva mudança. Um ano antes da aceitação partidária
bati d . , COlll-
to os os partidos políticos, sem exceção. Na Cartilha do Pliniano
ana Tentava impedir qualquer tipo de supremacia partidária oligárquica
afirm ou:
estadual, ou até mesmo entre opositores esquerdistas - os comunistas do
Partido Comunista do Brasil (PCB), os aliancistas da Aliança Nacional
. - Porq~~ o integralismo combate:: os partidos ~olíticos? - Porque os par- Libertadora (ANL), criada no mesmo período de oficialização partidária
tidos p~lI.uc?s enfraquecem o Brasil em benefício próprio e dividiram em da AIB e colocada na ilegalidade, em julho de 1935; ou até mesmo da
grupos ~ll1mlg?So povo b~asileiro. - Então os partidos políticos fazem mal Frente Única Antifascista (FUA), existente desde 1933. Sobre o Partido
ao Brasil? - SIm. Os partidos políticos fazem um grande mal ao Brasil e
Integralista, Plínio Salgado afirmava que:
~~em f?r u~ b~m brasileiro não deve pertencer a essas agremiações. Os po-
Iíticos liberais so querem o governo para proteger os amigos contra os inte- Somos o único partido nacional registrado no Superior Tribunal Eleitoral.
r~sses ?o pov~. - O integralismo é um partido político? - Não. O integra- Como tal, temos comparecido às eleições. Realizamos pela doutrina, pela
lisrno e o Brasil que VaImarchando aos hinos dos camisas verdes." propaganda, pelo voto, pela cultura, pela disciplina moral que os integralistas
aprendem na escola de civismo das nossas milícias desarmadas: a revolução
~~m a alteração polí?ca do movimento, preparava-se para uma ação legaJ.74
política ousada: a candidatura à Presidência da República, em 1938, e
afirmou: O momento era favorável à criação de organizações políticas, pois o
período «democrático» discursado por Getúlio Vargas beneficiava o cres-
Registrei o integralismo como partido político, de âmbito nacional não cimento de grupos como a AIB e a ANL:
só para ir verificando, em cada eleição, o crescimento da consciência nova
que estou criando, como para isolar os camisas-verdes das lutas de carácter O restabelecimento de uma ordem legal estimulou a participação política
local ou regional, o que é obra eminentemente educativa, no sentido da Uni- e fortaleceu o movimento social. Várias greves eclodiram no período e o
~ad~ da Pátria. Além disso, faço os integralistas se submeterem dessa forma, processo político radicalizou-se. À direita e à esquerda surgiram duas orga-
as 1~ISdo país~ d~monstrando que nos utilizamos dos meios facultados pelo nizações políticas não-partidárias que tiveram abrangência nacional e se tor-
r~gtn:e, na obJeu:ação de reformas que reputamos indispensáveis à raciona- naram bastante expressivas. Totalmente divergentes entre si, a Ação Integra-
lização e fortalecimento da democracia. Basta ler os meus livros e os meus lista Brasileira (AlB) e a Aliança Nacional Libertadora (ANL) eram bem
d?cumentos políticos, para se verificar que sempre falei isso aos adeptos da defendidas programaticamente e conseguiram produzir grande mobilização
Sigma e ao povo brasileiro." no país."

73 Plínio Salgado, «Mínimo múltiplo commum, in Páginas de Combate ..., 167.


70 P~io Salgado, «O integralismo não é extremismo», in A doutrina do Sigma ..., 193-
-194 (gnfo nosso). 74 Plínio Salgado, «A lei de segurança nacional», in Enciclopédia do Integralismo, vol. 6,
O Integralismo e aJustiça Brasileira (Rio de Janeiro: Clássica brasileira, 1959), 19-40.
71 Plínio Salgado, Cartilha do Pliniano (Rio Claro: Edição do núcleo municipal de Rio
75 Dulce Pandolfi, Os anos 1930: as incertezas do regime», in O Brasil Republicano: o
Claro, 1934).4-6.
tempo do naaonal-estatismo, Jorge Ferreirae Lucíliade Almeida Neves Delgado, vol. 2 (Rio
72 Plínio Salgado, «Vejo-vose estou alerta!»,in Páginas de Combate..., 102-103.
deJaneiro: Civilização Brasileira,2003), 31.

276 277
A Vága Corporativa
o integralismo de Plinio Salgado e a busca de uma proposta corporativista para o Brasil
A ANL foi um movim . .
como obi ti ento inspirado na luta contra o fascismo e tinh apelido de «galinhas verdes» 81aos camisas verdes." O escritor Rubem
vo
tassem coJetr agrupar todos os sectores e instituições que se manI.fc a Braga buscou desacreditá-lo publicamente, chamando-o de desonesto,
n a a extrema-d· .t es,
1930 tomou com Getúl· ~;I
a e contra os ~mos que o movimento d
10 vargas «A organ Z - e
charlatão, descontrolado, orador de tolices, fora da realidade objetiva,
tas, socialistas e liberais desiludid . I açao con~egava cOmunis_ um aleijado mental, além de ridicularizar seu bigode e sua magreza."
. ,. . . . os com o rumo assumido pelo
revo 1ucionano iniciado em 1930 . h . processo Rubem Braga perguntava e respondia o que seria o Brasil com Plínio Sal-
, e tm a como presidem- de h gado: «Nas mãos r:nagrelas deste homem, o Brasil seria o reino da estu-
ex-tenente e agora líder comunista Luís Carlos Prest 76 onra o
AANL bé es,» pidez, da nebulosidade, da opressão, da exploração. [...] Não tenho a
, tam em uma frente de luta contra o inte ali
ter suas ações de expansão na década de 1930 gr rsrno, passou a menor dúvida de que Plínio é um odioso charlatão. Sua fraqueza moral,
. d - com auge em 1935 sua doutrina cheia de besteiras, seus fins mesquinhos são evidentes,. 84
te~ta_ova e um levante contra o governo de Getúlio Var as A ~ na
criacão da ~L, a motivação anticomunista passou a se:a.· P~r d.a Os conflitos não ficaram restritos aos ataques verbais. O ano de 1934
SIVel,pnnC1.J?al~ente após o episódio de novembro de 19351U::n~aIs VI- foi marcado por confrontos armados entre forças antifascistas e integra-
~.J?0 de allanClStas, liderados por Luís Carlos Prestes e 01
qa Be o,~tn
listas, demarcando assim o perigo comunista visto por Plínio Salgado. No
mês de outubro, em comemoração à fundação da AlB, ocorreram con-
1UICIOU um levante contra o governo sendo deb 1 d 1 g nano,
. 77O . , e a o pe as tropas v frontos na cidade de Bauru, resultando na morte do integralista Nicola
guistas. r?"alllzações antifascistas criadas, principalment ar-
bater o crescimenro do integralismo já eram d h' e, para ~om- Rosica." Quatro dias depois, em 7 de outubro, um desfile de dez mil ca-
desde 1933, quando em 25 de J'ulho' di e con eC1m~~tonacIOnal misas verdes foi programado, em direção à Praça da Sé, na capital de São
. ' , rversos grupos políticos .. 78 Paulo, onde os integralistas fariam comício e prestariam juramento ao
~ ~~:~o S~ci~~tha Bdrasileiro,(PSB) o Gr~mio Universitário Sosc~~;::a Chefe, em comemoração aos dois anos da AlB. No entanto, o confronto
. os ra a ores Gráficos, a LegIão Cívica 5 de Julh .'
com a FUA, que também ocupava o espaço, foi inevitável e ocorreu a Ba-
iomullls~a, a secção paulista do Partido Socialista Italiano ~' adL~ga
?S DeZOIto, o Grupo Socialista «Giacomo Matteotti» G
a an eI~a talha da Praça da Sé, com um saldo de vários mortos e feridos."
LIb~ra», a revista O Socialismo e os jornais O Homem ~ ' o A:o 7;<ItalIa
ganlzar~-se para a fundação da FUA.80 rore e a - or-
81 Anita Leocádia Prestes, ao analisar as consequências da Batalha da Praça da Sé, em
tá A.paErtlrdessa ramificação política nacional, os embates foram inevi depoimento, afirmou: «A partir dali, o integralismo perdeu muito a sua repercussão sua
avelS. m pouco t . ali - influência. Até porque correram. Segundo dizem as crônicas, correram de forma assim,
rarn a idi 1 .zados os 1U.tegr rstas, e notadamente seu líder, passa- muito covarde. Então isso levou a um desgaste muito grande. Tanto que eles foram ba-
. ser n IC~anza os publIcamente pela oposição, fonnada or _ tizados na época pelas forças da Aliança Nacionallibertadora como galinhas verdes. Por-
pos 1Utelectuals, como o humorista Aparicio Fernando d B·~ ~ff que galinha é considerada um animal covarde que corre do inimigo. E eu me lembro,
Torelly, também conhecido por A 11 1 e n er o eu era pequena na época, eles realizaram um congresso, uma convenção, em pleno Teatro
de B - dI' , . p.J?0re y e pe o falso título de nobreza Municipal, aqui no Rio de Janeiro. Então os militantes comunistas espalharam milho
arao e tararé, Nas paginas do Jornal carioca A Manhã, concedeu o nas escadarias e, na hora da chegada deles, soltaram as galinhas pintadas de verde.» Anita
Leocádia Prestes, «Depoimento», in Soldado de Deus. Direção: Sérgio Sanz. Argumento e
roteiro: Sérgio Sanz e Luiz Alberto Sanz. Produção: Júlia Moraes. Rio de Janeiro: Video-
76 Ibid. 31-32. filmes Produções Artísticas, 2004 (87 min.).
n Cf. Marly Vianna, Revolucionários de 35· S, h Re . 82 Mário Magalhães, «Sangue na Praça da Sé», Folha de Sâo Patdo, São Paulo, 1 nov.2009.
das Letras), 1992. . on o e midade (São Paulo: Companhia 83 Folha do Povo, 6 ago. 1935; apud, Jacira Cristina Santos Primo, Tempos Vermelhos:

78 A única força política importante de esquerda ue _ . . . A Aliança Nacional Libertadora e a Política Brasileira, 1934-1937, dissertação de mestrado
o PCB. Essa ausência justifica-se pela posição olí q d nao P~CIP~U .da fundação fOI em História (Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2006), 62.
recusava a participar de qualquer organi - ~ oca a secçao brasileira da IC que se 84 Ibid.
políticas da esquerda. Ricardo Figueired~~ça~ enos~ e despr~zava as outras correntes 85 Cf. Lídia Maria Vianna Possas, O TrágicoTrêsDe Outubro: Estudo Histórico de um Evento
e 0 antifascismo no Brasil (I933-1934}»,
79
70;01; ~.~~' (;o%l).n;eUnica Antifascista (PUA) (Bauru: Universidade do Sagrado Coração, 1993).
Em tomo desse núcleo, gravitavam os anar uista : 6~-361. 86 Cf. Eduardo Maffei, A Batalha da Praça da Sé (Rio de Janeiro: Philobiblion, 1984).
tros grupos de esquerda como a Frente Ne a sq . ts, anofasclstas mdependentes e ou- Após a Batalha da Praça da Sé, os confrontos continuaram pelo Brasil, ocorrendo con-
dicas do PCB. Ricardo Figueiredo de Castr~ ~6C1Iallsta,
além das participações esperá- frontos em diversas cidades, como em São Sebastião do Caí (RS), Petrópolis (RJ), Campos
80 Ibid., 360. ..., . dos Goytacazes (RJ), entre outras cidades. Em cada morte, vinda através de confronto, o
integralista era transformado em «Mártir Integralista». Segundo o Monitor Integralista,

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279
A ~ga Corporativa
o integralismo de Plínio Salgado e a busca de uma proposta corporativista para o Brasil

Com a divulgação do embuste conspiratório conhecido como Plano


A partir desse momento . . lini
visível e a int 'fi _ ' o anticomurusrno p ano passou a ser rn . Cohen e o consequente Estado Novo getuliano, ocorria um questiona-
resultado d ensi caçao
d pelo pod er passou por uma trans formação polín ais mento entre os integralistas: «seria o momento do poder?» Com a pre-
aversão ao e uma I?u anfc~a. pela ~ual o Brasil vivia na década de 1930 ~ sença de alguns deles na organização ditatorial de 1937, o objetivo de
comurusmo 01mtensificada c ANL d ' .' <li
certo poder passava a ser vislumbrado por Plínio. As relações entre ele e
novos projetos, pois a chamada «revoluç~~:piritu~» :ã~ ~:~:sIdade de
Getúlio Vargas nunca foram as melhores, basta lembrar da Lei de Segu-
alcançar um poder de facto em um Brasil insurr . al 1( em capaz de
as raízes da busca pela legalização partidá eClO~ -' d nesse contexto rança Nacional, que o obrigou a alterar determinados componentes do
N . I
ana e a e eiçao e 1938 movimento, como a extinção das milícias integralistas, e apontava Ge-
~ entanto, seu projeto eleitoral sofreu mudan Ças atra ' d .
políticas promovidas por Getúlio Vargas que em 1937. ;es e alterações túlio Vargas como o verdadeiro culpado pelas mudanças da organização
do Estado Novo, consolidando a ditad~ra Dessa fc ' ecredtouo golpe daAlB:
dos e . - l' . . orma, to os os parti
t r agremIaçoes po l' .íticas. foram extintos . O int egra nisrno connnuo .- Sob o pretexto de premunir o país contra o comunismo, os políticos ro-
e uma presença' po. ítica discreta:. «Até 1938 , a açao - d os mtegralista
. ua tineiros, avessosa tudo o que signifique algo novo, começaram a confabular
touPcomid a to 1erancia governamental ' na-o somente como contraof s con- . desde fins de 1934. E no ano de 1935 surgiu o projeto da Lei de Segurança
ao artr o Comunista como também para a demolição d b ensrva Nacional. Aparentemente, inspirava-senas precauções recomendadas pelos
beral -bu, ~gues
ês oue era oretendi
que er~ preten Ido pelos construtores do Estado o arca Novo»
ouço li-'Kl integralistascontra as manobras dos adeptos de Moscou. Na realidade,visava
Getuh~ Vargas unhz.ou preceitos centralizadores, e muitos «his : o próprio movimento integraiisra."
dores
fi assmalaram
Plí ter SIdo o Estado-Novo G et u liiano uma Jogada . tona-
par
a astar mIO Salgado do caminho do poder» 88 A 1 _ .a O contacto com Getúlio Vargas ocorria através de relações de proxi-
sempre foi de instabilidade: . re açao entre os d01S midades em tomo dos inimigos em comum, mas a busca pelo poder su-
premo era um elemento gerador de divergências e, através da ânsia pelo
91
ap~~elaçã? entre a AlB e G.etúlioVargas foi marcada por momentos de poder, Vargas conseguiu manipulá-Io habilidosamente. De qualquer
ras A maço~s e a~are~te caminhos em comum e outros de profundas rutu- forma, com as alterações políticas ocorridas através do golpe do Estado
vid ~p~o~açao existente entre ambos era amplamente dinamizada de-
Novo em 1937 e a proposta de um projeto corporativo em tomo da or-
. o a m~nl1gosem comum, expresso pelo discurso antiliberal e antic -
rusta, ass~ como. algumas reivindicações e plataformas próximas re °l~:s ganização da sociedade brasileira através do autoritarismo de Getúlio
~etu: fceV1dente dIsc~rso nacionalista, com a defesa da implantação umde Vargas, os integralistas passaram a enxergar uma possibilidade de avanço
s a o orte
os tr balh d e centralizador
E e
_ o grand lo 1
e ape o as c assespopulares, em especial
â dos seus ideais, inclusive com articulações no governo.
ad anfiores. sta relaçao,eao qu tud o m . diica, parece não ter sido vista Ao referenciar os acontecimentos de 10 de novembro de 1937, Anor
com. es~ anç~e ressalvaspela elite integralista.De fato, o golpe de Estado Bluter Maciel, jurista e catedrático de História Econômica da América,
que mst ou a ditadura do Estado-Novo contou com o apoio em alguns da Faculdade de Ciências Políticas e Econômicas de Porto Alegre e mem-
momentos, de membros da AlB.89 ' bro fundador do núcleo AIB no Rio Grande do Sul, afirma que apesar
de ocorrida uma mudança radical nos rumos políticos do Brasil, nenhum
havia 20 mártires integralistas: Nicola Rosica Jaim B b '- abalo ocorreu nas estruturas nacionais, principalmente porque ideias pre-
José Luis Schroeder, Alberto Sechin Juven'al Fale _ ar os~ Guunaraes, Caetano Spinelli,
drade, Ricardo Strelown Ge ' J
_ ca?, ose Gertrudes, Femando de An- sentes na legislação do Estado Novo representavam anseios doutrinados
Amadeu Faustino, Vice~te :-:a~d~:~d!~~~;:lXas ~ri~o, ~anuel Duarte da Silva,
Gruenwaldt, Amaro Miranda, José Antenor de Pa~l~o~e Firmino dos Santos, Ric~r~o
Be~ardes. Monitorf~tegralista (Rio de Janeiro, 7 out. 19~eto, Amaro Tavares, AntonIO
Manoel MaurícioAlbuquerque Pequena Hist" da . - .
de Janeiro: Graal, 1986), 591.' ona Formaçdo Social Brasileira (Rio 90Plínio Salgado, «A lei da segurança nacional» ..., 16.
91Leandro Pereira Gonçalves, «o Estado Novo: fim da Ação Integralista Brasileira e
88 Gilberto Felisberto Vasconcellos «Apresenta ã . s prisão de Plínio Salgado», in Presos I!olíticos e Perseguidos Estrangeiros na Era Várgas, orgs.
Leandro Pereira Gonçalves e RenataDuarte S' ~ o», m Entre TIposeRecortes, voI. 1, org .
89 Odilon Caldei Neto, Integralismo,
I on Caldeira .
mestrado em História (Universidade Estadual r
Neointeimoes.
ali .. . .
Mlsm~ef}ntlssemltlsmo: 5, dissertação de
e annga, Manngá, 2011), 36.
Marly de Almeida Gomes Vianna, Erica Sarmiento Silva e Leandro Pereira Gonçalves
(Rio de Janeiro: Mauad X, 2014), 129-158.

281
280
._1' de rnr. . S' _7 _1 e a busca de uma proposta corporativista para o Brasil
A Vága Corporatiua O integratlsmo rumo aJgaaO
,. té
, . _ d seu discurso e pensamento poht1co e a
de urna necessana
p~la AlB desde 1932, como a supressão dos partidos políticos e a orga~ alteraçao o . . . m ambiente
fi - d m novo discurso corporanvlsta em u
nização do trabalho nacional." trlesrno ~ .ormÓ~~íli~ uocorreu no período da II Guerra Mundial, mo-
Ao analis~,a C?onstituição de 1937,os integralis~~ identificam-se cOlll dernocrat1c~~e foi preciso reordenar determinadas ideias p~ra ~ c~ns:u-
o
elementos VISIveISda proposta e prática corporativrsta de seu arcabou
teórico. Ao estabelecer uma análise jurídica da legislação, Anor Bluter JO ~eon~~~: novo projeto que fosse compactuado com a realida e o ra-
ça
. d
,
undo no pos-guerra. .'
ciel destaca a função nitidamente econômica do sindicato como órgãa~ sil e ~ m dual a prática corporativista faSCIstaperdia .espaço para
do Estado e delegado de funções do poder público. Não há críticas à pr~ a
~e ,?rm ~~ co~ceito corporativo cristão de democracIa em tomo
posta, mas a menção que a AIB possuía um programa mais amplo na or- a cnaçao d~ d P rtugal que teve anteriormente um papel
biente conserva oro o ,
ganização do Estado Corporativo, que atribuía aos sindicatos outros ele- de urn am fi rmação política e intelectual, voltou a ter um
ntal para a sua o .
mentos além do aparato econômico, como a atribuição de mais três fun d ame _. . 1 te adaptação perante a nova Sl-
formaçao e pnncrpa men ,
pape_1d e. ans
n:
r •
funções: função política, função cultural e função moral, estabelecendo xíli~ e com a criação de uma composição política.
o sindicato preconizado na AIB que é do trabalhador integral." tuaçao vivida com o e seu foco de inspiração, no entanto, sua
Mesmo com a negação posterior, devido a frustração e derrota política, Para isso Salazar pas~ou ~ ser o O momento auge tanto de Plínio
no momento de implantação do Estado Novo, a constituição, que re- fi lítica não f01 mais a mesma. " d
SO~Çg:d~lquanto do integralismo brasileiro, o~~rre~ durant~ o pe~~as~
presenta o corporativismo em sua ação política na proposta varguista, , . d d AIB contexto de fasClt1ZaçaOque vrveu o
foi comemorada pelos integralistas, que identificavam certa influência e relativo à legalida e a a ~~ eríodo entre guerras, Plínio Salgado C01~-
porque não, uma vitória do movimento em uma conceção ideológica, nos anos 1930. Sem a forç P d tucumâ» conti-
. 1 - 96 d strando que o «caroço e
uma vez que foi rememorado em 1937, palavras de Plínio Salgado no tinuou arncu açoes, _ em°r-ticas com uma composição cristã eram ne-
momento de inauguração da AIB em 1932 com o Manifesto de Outu- nuava aberto e ~ue. açoes po 11 d . dade entretanto, nota-se que,
, . eliminar os ma es a SOCle , .
bro: «Um governo que saia da livre vontade das classes é representativo ~essa~as para t s políticas do líder integralista representa pesqmsar
da Pátria»," pois para atender às necessidades nacionais, a AIB propõe a
:ves~ga~:~~o:~:s:ória de projetos fracassados no â~bito do m~d:lo
adoção do Estado corporativo." e ce a. . . d de brasileira, mas que, obVlamente, nao m-
Essa relação que teve, como consequência, o afastamento e remode- corporatlVlsta ~ara a SOClea _ d doutrina pliniana, pois tais re-
lações. Miguel Reale, por sua vez, supostamente não teria participado no
~:~~:sap~~~i~i~~~:ea ~:~~~~r~~:~:~e~tos centrais presentes na política
processo que culminou com a tentativa de golpe contra o Estado Novo.
Ainda assim, por ter visualizado a perspetiva de perseguição política, exi- conservadora brasileira do século xx.
lou-se durante um ano, na Itália. Ao retomar ao Brasil, Miguel Reale se
afastou de militância integralista, seus demais líderes, e dedica-se às ati-
vidades acadêmicas e intelectuais. Gustavo Barroso, por outro lado, não
exerceria atividade política em nível institucional após o seu desliga-
mento com o integralismo. Além disso, o fim de sua trajetória integralista
marca também o cessar de sua intensa atividade antissemita.
Após a legalidade, Plínio Salgado é marcado pelo exílio (1938-1946),
algo de fundamental importância para o entendimento e compreensão

92 Anor Butler Maciel, Subsídiospara o Estudo da Estrutura Políticado Estado Novo (porto id 'blica em 1974 e faleceu no ano seguinte. En-
96 Plínio Salgado aposentou-se da VI a pu. alo t d cunho autoritário permaneceu,
Alegre: Edição da Livraria do Globo, 1937),3. - d ponentes nacion IS as e
93 Ibid. 8-9 tretanto,.a manute~lÇao os C?~nto dos denominados neointegralistas, que vem provar
94 Ibid. 360. influenCIando, aSSIm, o surgt~d' onservadoras idealizadas nos anos 30 em tomo da
id dã d ' I XXI que I elas c ,
95 Anor Butler Maciel, O Estado Corporativo (Porto Alegre: Edição da Livraria do Globo, ao CI a ao o s:c~ o . d estão presentes no nosso meio.
1936),32. prática corporauVlsta, am a

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