ALCIDES SCAGLIA Já destaquei em textos anteriores o conceito de currículo e de competência. Nesta crônica pedagógica (e nas próximas) quero caminhar para a materialização do currículo para a iniciação ao futebol. Apontarei a matriz curricular, ou seja, quais especificamente seriam os conteúdos (competências, ou mesmo saberes) que os iniciantes devem aprender numa escola de futebol, comprometida com suas funções educativas e seus princípios pedagógicos. É importante retomar o fato de que a materialização do currículo é dirigida a partir das seguintes competências essenciais: estruturação de espaço, comunicação na ação e relação com a bola. E sua organização ao longo do processo de formação prevê que os iniciantes devam aprender estes saberes, em sua maioria, na perspectiva das competências gerais. Ou seja, o direcionamento dos planos de aulas (unidades de ensino) devem se pautar pelo conceito de competências gerais. As competências gerais surgem nos meus trabalhos da reflexão sobre os estudos de autores como Claude Bayer, Júlio Garganta, Amandio Graça, João Batista Freire, Pablo Juan Greco, Roberto Paes (entre outros). Pensar as competências essenciais na perspectiva geral é entender a família dos jogos. É olhar esta família, inicialmente, pelas suas semelhanças, possibilitando aproximações profícuas para o processo de formação cada vez mais amplo e diversificado. Por exemplo, por este prisma é possível compreender quão semelhantes sãos os jogos pertencentes à grande família dos jogos de bola com os pés. O quanto jogar rebatida é o mesmo que jogar certo jogo de futebol, ou então, brincar de controle, bobinho, três dentro três fora, linha, centro avante etc… permitem o desenvolvimento de competências e habilidades que podem ser transferidas para o futebol (e ao mesmo tempo redistribuída para toda a família dos jogos de bola com os pés, como descrevi em minha tese de doutorado, disponível na biblioteca virtual da UNICAMP). Além dos jogos de bola com os pés, há muitas semelhantes exigências que podem ser transferidas quando se analisa nossa rica cultura lúdica (conceito de Gilles Brougère). Para o processo de iniciação, a partir da lógica interacionista e o conceito de competências gerais, brincar de pega-pega é o mesmo que driblar sem bola. Ou, colocar a bola nos pés variando jogos de pega-pega possibilita a criação de ambientes de aprendizagem para várias habilidades requeridas pelo jogo de futebol (como descrevi em crônica intitulada pedagogia do futebol). Contudo, vamos à materialização da matriz curricular para os iniciantes de 6, 7 anos em uma escolinha de futebol. No que diz respeito às competências essenciais relativas à comunicação na ação, os iniciantes devem: – Compreender o que é regra; – Respeitar as regras, os companheiros e os adversários; – Aprender a jogar com os outros (cooperação). Quando destaco compreender o que é regra, estou me referindo às regras dos diferentes jogos, e não às regras do jogo de futebol. Os iniciantes de 6, 7 anos estão saindo da fase pré-operatória (em que o egocentrismo é uma característica marcante), e adentrando na fase operatória concreta, a qual se caracteriza especialmente pele início do processo de socialização. Surge a necessidade de se adaptar de forma mais inteligível ao coletivo. E para isto precisa aprender a seguir regras, respeitar estas regras acordadas, as quais possibilitarão a convivência em grupo. E como a vida social, o jogo de futebol, por ser um jogo coletivo, exige muito isto. Já a relação com a bola, de forma geral deve possibilitar aos iniciantes: – Reconhecer as habilidades específicas básicas (drible, chute, passe, condução e controle de bola); – Ampliar seu acervo de jogos/brincadeiras (tanto com bola quanto sem); – Aprender a brincar de bola com os pés. Em seu livro “Pedagogia do futebol”, o professor João Batista Freire, propõe um meio interessante para se organizar a distribuição das aulas sobre as habilidades específicas do jogo de futebol. Esta organização advém de seu corente respeito às teorias que sustentam sua obra, pois ele sugere que para os inciantes de 6, 7 anos o professor deva destinar mais tempo aos pequenos jogos que permitam desenvolver o que ele denomina habilidades específicas individuais, que seriam a condução e o controle de bola. Ele prioriza estas habilidades pelo fato delas poderem ser estimuladas por meio de jogos menores, ou mesmo jogos solitários, como, por exemplo, o jogo solitário de embaixadas (pensando o controle de bola) e o adaptado pequeno jogo de siga o mestre com a bola nos pés (desenvolvendo a condução, enquanto competência geral). Por fim, a competência essêncial estruturação do espaço se preocuparia com a organização de jogos que permitam ao longo do tempo destinado a esta categoria: – Dominar o espaço de ¼ do campo de futebol; – O espaço da trave 3 X 2 metros (trave de futsal). Para o desenvolvimento desta competência essêncial, começa-se a transitar das competências gerais para as específicas, pois aqui se inicia o processo de construção da lógica tática específica do jogo de futebol. Até então, a preocupação não pairava sobre a lógica específica do jogo de futebol, mas sim a lógica tática de pequenos, médios e grandes jogos para o desenvolvimento, por exemplo, de habilidades (fundamentos técnicos) exigidas pelo futebol e também todos os outros diferentes e semelhantes jogos pertecentes a grande família dos jogos de bola com os pés. Portanto, voltando ao final da explicação da crônica pedagógica “As competências do jogo de futebol”, quando esta explicava a distribuição das porcentagem de estímulos para as competências gerais, específicas e contextuais, quantificando a periodização, ou melhor, o planejamento para a iniciação. Trabalhar a competência essêncial estruturação de espaço, neste particular, responsabilizaria-se pelos 15% do desenvolvimento das competências essenciais na forma de competência específica (a lógica de um pequeno jogo formal de futebol).