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a tempestade
Liana de camargo Leão
Sou professora
Ilustrado porde literatura inglesa na Universidade Federal do Paraná (UFPR) e
já ministrei
Márcia vários cursos sobre Shakespeare, dentro e fora da universidade. Tenho
Széliga
artigos publicados sobre as peças e sobre Shakespeare no cinema. Organizei
também, junto com a professora doutora Marlene Soares dos Santos, o livro
Shakespeare, sua época e sua obra (2008), onde vários especialistas brasileiros
falam sobre a obra de Shakespeare. Há quatro anos organizo, em Curitiba, para
alunos da UFPR e também para o público leigo, um evento em homenagem ao
nascimento do dramaturgo: o “Abril de Shakespeare”.
Márcia Széliga
Aquarela poderia ter sido o material utilizado nas ilustrações deste livro. Afinal,
combina com água, mares, garoa, chuva, tempestade. Mas a escolha mesmo
acabou sendo o lápis de cor, cores suaves podendo se tornar fortes, vivas... Como
uma chuva pode se transformar numa tempestade.
Para dar mais alimento à minha inspiração, usei como ponto de partida o filme
Prospero’s book, de Peter Greenaway, onde as cenas percorrem páginas de um livro
vivo.
Sim, os livros são vivos! Ilustrar também é mexer com algo muito vivo.
A tempestade, de Shakespeare, coloca qualquer um nessa dimensão de tocar o
sentido mágico das coisas e os sentimentos da vida.
Trazer essa vida para as ilustrações é um jeito de fazer com que as imagens e as
palavras entrem pelas janelas da alma, que possam tocar fundo, através dos olhos
leitores, a porção mais viva de cada um.
Liana de Camargo Leão
A tempestade
Ilustrado por Márcia Széliga
1
A temp
estade
Liana de camargo leão
Ilustrado por Márcia Széliga
08-11807 CDD-028.5
Índices para catálogo sistemático:
1. Teatro : Literatura infantil 028.5
2. Teatro : Literatura infanto-juvenil 028.5
EDITORA SALESIANA
Rua Dom Bosco, 441 - Mooca
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Fones: (11) 3274-4906 / 3274-4953
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Shakespeare se despede
do teatro:
A tempestade, sua última peça
De Milão:
TRÍNCULO, um bufão
ESTÉFANO, um mordomo
CAPITÃO
PILOTO Da ilha:
ARIEL, um espírito do ar
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1a cena – no navio
Trovões e relâmpagos. O navio enfrenta uma tempestade. Marinheiros correm de
um lado para o outro. Muitos gritos e confusão. O capitão dá ordens para o piloto
manobrar a embarcação e tentar salvá-la do naufrágio. A situação é de perigo 7
CAPITÃO – Piloto!
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ANTÔNIO – Covarde! Tenho menos medo de morrer do que você!
Com muita raiva
PILOTO – Falar é fácil. Venha trabalhar.
Muito nervoso
GONZALO – Confio no piloto, ele não tem cara de quem vai morrer
Aparte afogado. Tem mais cara de quem vai morrer enforcado. Tomara que
a forca, e não o fundo do mar, seja o seu destino. Senão estamos
todos perdidos!
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2a Cena – na ilha
Da praia, a jovem Miranda e seu pai, Próspero, veem o navio afundar. Ela pede ao pai
que ajude os náufragos. Próspero conta a Miranda sobre o passado 11
MIRANDA – Pai querido, o que fez?
Vi o navio afundar,
Sofri com os que vi sofrer.
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Próspero faz um gesto de magia sobre a cabeça de Miranda. Ouve-se
uma música suave, e ela adormece. Entra Ariel, um espírito bom, que
serve a Próspero
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PRÓSPERO – Muito bem, fiel servidor!
Agora, mais tarefas para você.
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MIRANDA – Pai, não quero ir.
Ele é um vilão
Que eu não consigo
Nem olhar.
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CALIBAN – Está na hora do meu jantar.
Não quero trabalhar.
Esta ilha é minha,
Herdada de minha mãe, Sicorax.
Quando você aqui chegou,
Gostava de mim,
E me ensinou o nome
Da luz grande que queima no céu de dia,
E da luz pequena que queima no céu à noite.
E eu mostrei para você toda a ilha:
Onde encontrar água fresca e terra boa.
Que todos os feitiços de Sicorax –
Besouros, sapos, morcegos –
Caiam sobre você!
Eu sou seu único súdito,
Eu, que antes era meu próprio rei.
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CALIBAN – Não, por favor.
Com medo Vou obedecer.
Sai Caliban. Ariel volta, ele está invisível para todos, menos para
Próspero. Ele toca e canta, e o príncipe Fernando, apenas ouvindo a
música, o segue
Miranda vê Fernando
Fernando vê Miranda
FERNANDO – Ó maravilha!
Será humana ou divina?
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FERNANDO – Ela fala a minha língua!
Para si mesmo
PRÓSPERO – Mentira!
Você veio aqui me roubar!
Agora será meu escravo!
Para mim vai trabalhar!
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PRÓSPERO – Silêncio, filha!
Siga-me, traidor,
Agora é meu prisioneiro.
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3a Cena – Em outra parte da ilha
Entram Alonso, Sebastião, Antônio e Gonzalo. Conversam sobre o naufrágio e sobre como sobreviveram 21
GONZALO – Senhor, alegre-se.
Nós nos salvamos.
É um milagre!
Gonzalo adormece
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ANTÔNIO – Durma, senhor.
Eu e Sebastião
Vamos proteger o seu sono.
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SEBASTIÃO – Começo a entender...
Lembro que você roubou
O poder de Próspero, seu irmão,
Aliando-se a Alonso, com traição.
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Antônio e Sebastião levantam as espadas sob a cabeça de Gonzalo
e Alonso
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GONZALO – Apenas um sussurro esquisito,
Uma música no meu ouvido.
Então, acordei assustado,
E vi Antônio e Sebastião
Com as espadas puxadas.
É melhor irmos embora,
Vamos, rápido, agora!
Saem todos
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4a Cena – Em outra parte da ilha
Entra Caliban, carregando lenha. Ouve-se um ruído de trovão
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CALIBAN – Que todas as pestes caiam sobre Próspero!
Que ele fique coberto de feridas!
Os espíritos que ele comanda
Podem me escutar,
Mas eu sinto tanta raiva
Que preciso praguejar!
Próspero manda seus espíritos
Me assustarem à noite,
E, por todo lado,
Me seguirem como assombrações.
Às vezes, feito porco-espinho,
Os espíritos me espetam,
E, como cobras, se enroscam no meu pé.
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TRÍNCULO – Mas o que é isso? É um homem? Ou é um peixe?
Cheirando Caliban
Está vivo ou morto? É peixe!
Tocando Caliban
Pelo cheiro é peixe. É um bacalhau muito velho, meio podre.
Cheirando Caliban de novo
Mas é um peixe muito esquisito! Se eu estivesse agora na Inglaterra,
Examinando melhor eu levava este monstro para a feira de domingo. Ia ficar rico: todo
mundo ia querer ver esse bicho fedorento. Lá ninguém dá nem uma
moedinha pra ajudar um mendigo, mas dão um monte de moedas
pra ver um índio empalhado. Vou examinar bem este peixe: as pernas
parecem de gente; as barbatanas parecem braços... E esta coisa está
quente! Acho que não é peixe. Deve ser um habitante da ilha que um
raio acabou de atingir!
Que música horrível! Não serve nem pra cantar num enterro.
Falando para si mesmo
Ah, aqui está meu consolo.
Olha para a garrafa
Bebe
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CALIBAN – Não me torture, espírito!
Pensando que Estéfano é um
espírito enviado por Próspero
Caliban bebe
TRÍNCULO – Acho que conheço essa voz. Não, não pode ser. Ele
Com a cabeça ainda coberta morreu afogado. Deve ser um espírito! Socorro! Socorro!
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CALIBAN – Juro por esta garrafa
Para Estéfano Que serei seu súdito fiel.
Esta bebida deve ser do céu!
Caliban bebe
TRÍNCULO – Que monstro idiota! Acreditar no homem da lua!
Para Estéfano Esse monstro gosta de beber!
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Caliban bebe da garrafa e beija os pés de Estéfano
CALIBAN – Bã, bã, bã, Caliban tem outro rei! Liberdade! Liberdade!
Canta, bêbado
ESTÉFANO – Monstro-criado, beba à saúde de seu novo rei. Nunca
Falando para Caliban mais vamos beber água até o vinho acabar.
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TRÍNCULO – Monstro mentiroso, monstro idiota! Já viu algum
covarde beber tanto quanto eu?
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ESTÉFANO – Trínculo, não interrompa mais o monstro.
ESTÉFANO – Quieto.
Para Trínculo
Continue.
Para Caliban
CALIBAN – Como eu já disse,
O mago Próspero
Roubou a ilha de mim.
Se o senhor o matar,
Fica com a ilha
E eu viro seu escravo.
ESTÉFANO – Uma boa ideia! Mas como vou fazer isso? Onde está
o inimigo?
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TRÍNCULO – Mas o que eu fiz? Não fiz nada. Não abri a boca,
nem para beber. Vou mudar de lugar.
ARIEL – É mentira!
Fingindo que é Trínculo
ESTÉFANO – O quê? Atrapalhando o monstro de novo? Tome
Para Trínculo isso!
TRÍNCULO – Excelente.
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CALIBAN – Não tenha medo.
A ilha é cheia de sons,
Música e mil ruídos,
Que não fazem mal
E encantam os ouvidos.
Às vezes, mil instrumentos e vozes suaves
Cantam para eu dormir.
E em meus sonhos, os céus se abrem
E despejam tesouros sobre mim.
E, quando acordo,
Choro para dormir de novo
E sonhar outra vez.
ESTÉFANO – Que lugar ótimo! Vamos ter música sem ter que pagar.
Saem todos
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5a Cena – diante da caverna de Próspero
Entra Fernando, carregando lenha 39
FERNANDO – O trabalho é pesado,
Mas, quando vejo o seu rosto,
Tudo fica leve.
MIRANDA – Miranda.
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FERNANDO – Miranda, eu sou um príncipe,
Ou talvez já seja até rei.
Mas aguento este serviço escravo
Só para vê-la.
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PRÓSPERO – Para o noivado comemorar,
Seres misteriosos vão dançar.
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Da matéria dos sonhos
E a nossa vida
Está envolta em um sono.
Miranda e Fernando entram na caverna. Próspero fica sozinho no palco
Próspero sai
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6a Cena – em outra parte da ilha
Entram Alonso, Sebastião, Antônio e Gonzalo
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GONZALO – Como estou cansado!
Com voz cansada Não consigo dar nem mais um passo.
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SEBASTIÃO – Mas deixaram a comida.
Estou com uma fome...
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ANTÔNIO – Eu vou junto.
Também com a espada em punho
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7a Cena – Diante da caverna de Próspero
Próspero, com a ajuda de Ariel, planeja uma armadilha contra Caliban, Estéfano e Trínculo 49
PRÓSPERO – Ariel, apareça!
Entra Ariel
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ESTÉFANO – Monstro, foi uma perda terrível! Preciso voltar ao
pântano e procurar minha garrafa.
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TRÍNCULO – Vamos pegar essas roupas. Venha, monstro, carregue
isso aqui.
52
PRÓSPERO – Onde estão o rei e seus companheiros?
Ariel sai. Próspero faz um círculo no chão. Ouve-se uma música. Ariel
volta com Alonso e os outros, que ainda estão enfeitiçados. Todos
entram no círculo feito por Próspero
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Desperte.
Sebastião, que quis roubar a coroa do próprio irmão,
Acorde.
E Antônio, meu sangue e minha carne,
Que cedeu à ambição,
E roubou o meu ducado,
Olhe nos meus olhos.
Todos têm o meu perdão.
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PRÓSPERO – Sinto muito, senhor.
SEBASTIÃO – Um milagre!
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MIRANDA – Oh! Maravilha!
Vendo os nobres Quantos humanos vejo aqui!
Como é bela a natureza humana!
Ó, admirável mundo novo
Que tem tão nobres habitantes!
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Pai e filho se reencontram.
O duque Próspero tem de volta o seu ducado.
Nesta ilha perdida, nós perdemos a razão
E encontramos o arrependimento e o perdão.
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REI ALONSO – Esta ilha é mágica,
E toda essa história
Desafia a nossa razão.
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CALIBAN – Ai, ai, vou ser beliscado até a morte.
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Prometo, para nossa viagem,
Mares calmos e velas velozes.
Entrem, senhores.
Saem todos
Epílogo
Pedindo aplausos
Fim
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William Shakespeare
No céu havia uma estrela, e sob ela eu nasci.
(William Shakespeare)
Havia muita música nas peças daquele tempo, e os músicos ficavam à vista
de todos, em um balcão sobre o palco.
Márcia Széliga
Aquarela poderia ter sido o material utilizado nas ilustrações deste livro. Afinal,
combina com água, mares, garoa, chuva, tempestade. Mas a escolha mesmo
acabou sendo o lápis de cor, cores suaves podendo se tornar fortes, vivas... Como
uma chuva pode se transformar numa tempestade.
Para dar mais alimento à minha inspiração, usei como ponto de partida o filme
Prospero’s book, de Peter Greenaway, onde as cenas percorrem páginas de um livro
vivo.
Sim, os livros são vivos! Ilustrar também é mexer com algo muito vivo.
A tempestade, de Shakespeare, coloca qualquer um nessa dimensão de tocar o
sentido mágico das coisas e os sentimentos da vida.
Trazer essa vida para as ilustrações é um jeito de fazer com que as imagens e as
palavras entrem pelas janelas da alma, que possam tocar fundo, através dos olhos
leitores, a porção mais viva de cada um.