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O BRASIL E A PROTECAO DO CONSUMIDOR: EVOLUGAO HISTORICA, PRINCIPIOS INFORMADORES E EXEMPLOS NO DIREITO COMPARADO Barbara da Costa Pinto Oliveira* 1. Introdugao. 2. Contexto histérico e evolugao do direito docon- sumidorno Brasil. 2.1. Contexto histérico e social. 2.2. O direito doconsumidor no Brasil —Instrumentos utilizados até acriagiio do COdigo de ProtegZo e Defesa do Consumidor em 1990, 2.3. ‘momento imediatamente anterior &criago do Cédigo de Protegio € Defesa do Consumidor. 3. 0 Cédigo de Protecio e Defesa do ‘Consumidor (Lei n. 8.078/90). 3.1. O espitito da Lei n. 8.078/90 & da politica nacional das relag6es de consumo. 3.2. Prinefpios no ireito do consumidor. 4. Aspectos da proteeiio do consumidor no direito comparado.4.1. Unido Buropéia, 4.2. Estados Unidos. 4.3. Canadé. 4.4. Mercosul. 5. Conclusio, 6. Referéncias bibliogeati- cas. Doutoranda em Direito Eeondinico pela Faculdade de Direito da UFMG e pesquisadora pelo NPY 59. BARBARA DA COSTA PINTO OLIVEIRA. 1 INTRODUGAO ‘Com este trabalho pretende-se tracar a evolugo histérica do direito do consumidor no Brasil e, com isso, identificar os principios gerais da disciplina, Sera feita, ainda, uma breve ilustragiio da protegiio do consumidor no dieito ‘comparado. 6 bem verdade que © consumidor nunca esteve completamente desprotegido no direito brasileiro, como também é verdade que as relagdes de consumo se modificaram bastante nas duas tiltimas décadas do século XX, 0 que levou juristas patrios a avaliarem a necessidade da eriagao de um instituto jurfdico que viesse amparar esse novo consumidor, inseriddo em um mercado cada vez mais global, no qual os atores principais siio empresas cada vez, maio- res, mais distantes.e mais poderosas, A mudanga nos conceitos sociais de comprador/vendedor para consumi- dor/fomecedor levou a uma série de alteragSes no panorama juridico.e social que culminaram na criagao do Cédigo de Protegaioe Defesa do Consumidor, em 1990. Ocorre que, em nivel macro, o aparecimento do diteito do consut dor foi reflexo de uma mudanga ainda maior: a transformagao de toda a teoria dos contratos privados, o que alguns autores chantam da Nova Teoria dos Con- tralos, ¢ que reforgou a progressiva clerrubacdla da hist6rica barreira entre o pt blico e o privado. Foi no estabelecimento de uma dindmica dialética que as relagdes de mercado causaram a evolugiio do ordenamento jurfdico e que este transformou, ¢ continua a transformar, aquele mesmo mercado. 2 CONTEXTO HISTORICO E A EVOLUGAO DO DIREITO DO CONSUMIDOR NO BRASIL 2.1 Contexto histérico e social A segunda metade do século XX assistiu a uma infinidade de transforma- des estruturais das sociedades em um ritmo extraordinariamente acelerado. AS 60. REVISTA BO CAP, leis tém se tornado ineficientes rapidamente obsoletas na solugiio dos proble- mas que vieram como conseqiiéncia juridica dos fendmenos hist6ricos da Revo- lugao Industrial. Esse marco hist6rico, que transformou completamente 0 modo de vidados seres humanos, ocidentais ¢ orientais, resultou em umacrescente conceniragao de riquezas, na enorme complexidade das relagdes (le produgio e consumo em massa, na internacionalizagiio das meios de produgiio e consu- mo, bem como no avango aceleraclo do desenvolvimento tecnolégico. Verifica-se queaté osSculo XX, especialmente apdsa Segunda Guerra Mun- dial, quando se instaurou definitivamente o consumo em massa, as relagGes entre consumilor e produtoreram regis pelo principio pacta sunt servanda, ipicode Ditreito Civil, enquanto tipica elacao contratual civilista A legislago de entio con derava que o produtor eo consumidérestivessem em uma relagao de igualdadee, portant, este iltimoniio merecesse proiegiio especial da ei. Ocontratoera lei entre as partese, como diz o Prof. Joao Bosco Leopoldino da Fonseca, “os industriais e os comereiantes, no intuitode assegurar aes ial ceram-se ao trabalho de inserircldusulas de gar quais pudessem transferir e exonerar-se de qualquer responsibilidlacle de~ corrente de suas atividadles de producd0 e distribuigao, Essa atituce decor ria justamente do maior poder econdmico de que dispunham e que lhes pemmitia impor ao contratante mais fraco sua posigiio dominante.” abilidadeem- pormeiodas Acconomia global, que abriga economias nacionais coexistindo com os conglomerados transnacionais, passou a exigir uma legislagiio que asseguirasse 0 controle de qualidade dos produtos e servigos, e, por intermédio dela, a segu- ranga individual e social de cada consumidor. E inegavel que a coniig&o global cdo mercado e das produtos pode causar prejufzos ao consumiclor, uma vez que Ihe falta um direito prético internacional para exigir reparagJo. Buscou-se, So- bremaneira,estabelecer umarelagio deequilibrio, de igualdade material entreo consumidor eo fornecedor. O consumeitismo é esse esforgo para situarocon- sumidor no mesmo nivel do vendedor, que recebeu grande impulso pela Carta da ONU de 1985 (Resolugio n, 39/248). 61 2.2 O direito do consumidor no Brasil — Instrumentos utilizados até a criagao do Codigo de Protegio ¢ Defesa da Consumidor em 1990 As primeira manifestagGes de protegaio do consumidor, no Ambito do to brasileiro (primeira metade do século XX), uilizaram a expresstio rela Ses de consumo, mas intimamente relacionada com a protegaio contra o abuso do poder econ6mico, ou seja, como diteito da concorréncia. Assim é que tam- ‘bém se inclufa o tema na lei de crimes contra a economia popularde 1938, No dimbito piiblico, os estudos sobre diteito do consumidoriniciaram-se na década de 60 do século passado, com a mudanga do mereado bri ‘asileiro, queiria definitivamente se transformar durante a década do milagre econémico, 08 anos 70, Muito embora niio houvesse na década de 60 uma legislagao consumeirista, havia j4 a movimentagao na paulatina criagao instrumentos de ‘ordem legal destinados a protecao do consumo da populacao. Em 1962, a Lei Delegadan. 4, de 26 dle sctembro de 1962, criavaa Superintendéncia Nacional de Abastecimento (SUNAB), o primeiro organismo de protegiio ao consumoe Aalimentagao do povo, ou condigdes de fornecimento alimentar, Nesse mesmo momento, segundo a tendéncia da lei de protegiio aeco- nomia popular de 1938, promulgou-se a Lei n. 4.137, de 10 de setembro de 1962, que previu a criagdo do Consclhode Administragiioe Detesa Econdmica (CADE), primeito organismo com 0 escopo de repressio ao abuso do poder econdmico. Esse drgiio manifestou-se essencialmente como um instrumento de Proteciioda economia popuki nacional Na hist6ria do Brasil protegiio do consumidor~e do consumo popular *ompanhat intimamente pela repressdo ao abuso do poder econdmica edefesa da concorrénci E inegavel que nesse momento a fungao principal das politicas concortenciais no Brasil era proteger o mercado intemo contra a agaio predal ‘ia do capital internacional, Essa tendéncia tomou-se um tanto perniciosa quan- doo Estado, a partir da década de 70, passou a atuardiretamente na economia. Daf até a reabertura comercial e politica na década de 90, 0 consumidor ficou 62 dlreito do consumidor foi o fator respor volvesse uma legislagdio consumeirist a REVISTA DO CAAP extremamente prejudicado, pois, sendo 0 Estado (ditatorial) o maior prestador de servigos nas diversas éreas, quase indcuo era o poder de reclame exigir melhor prestagio de servigos piiblicos. Ainda necess tendéncia de cartelizagio durante os anos 70, por causa dos conglomerados indust iio mencionar a grande isestatais, Essa estreita relagio entre repressio ao abuso do poder econdmico e vel para que o Brasil criasse e desen- muito mais vollada para garantias cole vase difusas que para garantias individuais. Em virtude da pouca abertura do mercado até 1990, é como se o Brasil tivesse saltado a etapa de direitos do consumidor exelusivamente individuais ena Europa. etapa que ocorreu nos Estaclos Unidos Portanto, conforme analisou o Prof, Aurélio Wander Bastos, durante es- sas trés décadas, a agdo interventiva do Estado permeava todas as atividades econdmicas relevantes: e a protegto do consumidor dependlia da efetiva inter- vengiio do Estado, ¢ a defesa da concorréncia, das politicas estatais de desen- volvimento de setores especificos do mereado, por meio de ages dirigidas cle fomento industrial ede controle estatal. Esse controle se dava, enti, pelo tabe- lamento de pregos, 0 crescimento dos monopolios estatais ¢ as reservas de ‘mercado, Essa especial forma ce atuagdo estatal levou ao desenvolvimentode ‘uma cultura interventiva apoiada em critérios protecionistas, na qual os direitos do consumidor foram ficanddo cada vex mais prejudicados indiretamente, fosse pelos pregos eartelizados, fosse pela inexisténcia ce concoménciaefetiva, Havia uma evidente violagio ao direito do consumidor ao menor prego e 4 melhor qualidade do produto ou servigo, pilares de um mereado fundado na livre con- conéncia, Nesse ambiente, emeuja sede discutia iou-se a Comissdo Interministerial de Presos (CIP), © a fixagiio dos progos de instumos e produtos das dife- rentes entidacles empresariais do mesmo ramo ou de fornecimento de servigo. Os pregos que nfo estavam sujeitos a tabelamento cram, muitas vezes, fixadlos de acordo com parfimettos nada comprometidos com as priticas concorrenciais, 63 BARBARA DA COSTA PINTO OLIVE RA Sua atuagio teve como consequéncia prejudicar a atuagao da SUNAB ea proteedo ja ineipiente do consumidor No que conceme is relagdes privaclas individuais, a protegdio do consu- midor dava-se fundamentalmente contra o patticular, no ambito de atwagao do Cédigo Civil de 1916, que tinha como pilarabsoluto 0 principio da autonomia da vontade ¢, portanto, a presungtio de equilfbrio entre as partes contratante Oconceito de consumo aincia nao era absorvide pelo Cédigo Civil bras leiro, havendo referéncias esparsas, porexemplo, quanto a classificagaio dos bens, pois que da natureza do direito civil,e quanto aos diteitos do usuftutustio. Nao havia, nesse momento, constimidores, mas compradores ou adquirentes de bens, mutuzitios e usuiirios de servigos. © Cédigo Civil estava muito afeito & nogdo de propriedade ¢ sua proteciio, mas ainda ndo se concentrava na circula- ‘io de bens promovida por atores em desigual condigo, pois que esse era um fendmenoestranho a ia forma No campo penal, houve preocupagzio com a punigdo da fraude a0 co- io de génetos alimenticios ¢ farmacéuticos. Preocupou-se, na década de 6070, com a regulamentagdo das embalagens, quanto a0 peso e volume liqui- dos, deixando outros setores da satide ¢ alimentaco sem major eontrole, 0 que gerou diversos episddlios tnigicos na histéria industrial brasileira, tal qual 0 caso datalidomida, Como se veré adiante, ainda em 1972, os Estados Unidos ja se preocupavam com aseguranga do consumidor, tanto que eriaram a Consumer Product Safety Comission, responsdvel por editar normas, aprovare fiscalizar ‘05 produtos de consumo popula A protego do consumidor, como um desdobramento do Cédigo Civil, ouiseja, como matéria de ordem privacda, dava-se, pela existéncia e aplicagaio dos seguintes institutos prineipais: a) tradicional garantia contra vicios edibit6rios ‘nos contratos comutativos, que, cle acordo com a interpretagao jurisprudencial doar. 1.103 do Cédigo Civil, era traduzido pela presungao absoluta de conhe- cimento dos defeitos ocultos pelo vendedor, sendo ele responsavel por perdase anos, além da restituigao do prego ou, alternativamente, pelo abatimento do prego pago, tratando-se de relagdo entre comereiante € comprador’ b) 0 com- prador no tinha, em hipotése alguma, uma agaio direta contra o fabricante, mas 64. REVISTA DO CAMP té0-somente contra o comerciante vendedor, ¢ este, contra o que Ihe vendeu,e assim sucessivamente. Oespitito do Cédigo Civil, inspirado na codificago napolednica do sé- culo XIX, era fundado no liberalismo, Finalmente, livre dos monareas,o homem «era capaz-de expressar sua vontadde eter seu valor como individuo, conceitos que foram materializados pelo instrumento do contrato, Esse instrumento previa, sustentado pela idéia do racionalismo.e de igualdade formal, que todos os ho- mens eram iguais porque dotados de razaio e que nenhum homem poderia impor sua vontade a outro, dato acordo de vontades, materializaclo no contrat, Esse modelo liberal prega.a separagiio absoluta entie 0 diteito pablicoeo direito privado, com o predominio da vontade privada na esfera das relagdes econdmicas, nao cabendo ao Estado outra tarefa que niio a atuagio negativa, isto ¢, a ndio-interferéneia, de modo que essa vontade pucesse se manifestar plenamente. corre que a concepeo tradicional do contrato, desenvolvida no século XIX girando em tomo apenas do principio da autonomia da vontade, ou auio- noma privada (ou seja, na liberdade conttatual, vinculatividade, consensulisto), nao era mais suficiente para tutelar as novas ocorréncias no direito dos contra- tos, como os contratos de adesio ¢ suas cldusulas abusivas — ¢ as “novas” relagdes contratuais ~ como a relagio de consumo, A busca da construgo de um direito de protegdo ao consumidor foi to- mando forma material com o Projeto Nina Rodrigues (1971), tendo sido objeto de trabathos doutrinérios ¢ legislativos, sendo parte até mesmo do Projeto de Cédligo Civil (634-B de 1975),em varias disposigdes posteriormente alteradas pelo revisor da comissao, o Prof. Miguel Reale. Ainsuficiéncia do modelo liberal fez com que. dade de protegao total & tcoria contratualista, e nao sé no que concerne telagdes de consumo. Ghestin, civilista francés citado pelo Prof. Jodo Bosco Leopoldino da Fonseca, em 1980, classilivou a atuagao estatal na esfera contratual alerializavel em quatro tipos de contratos, de acordo com seu contetido: con- tratos proibidos (previstos em lei e nulos de pleno direito por desrespeitarem princfpios da ordem juridica); contiatos regulamentados (regulando quer o pre- vislumbrassea necessi- 65 BARBARA Da CONTA 0 OLIVEIRA {0 quer 0 contetido do contrato); contratos controlados (sujeitos a controle preventivo, por meio de exigéncia de autorizagao prévia, possibilidade de

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