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Simpatia, Micro-hierarquia e Micropolítica*

Candace Clark

É preciso pouco esforço para sentir pena dos fracassos de outro homem.
(George Eliot, Middlemarch, I872)

O que era mais irritante na conduta dela era o modo como ela demonstrava simpatia
ante minha situação. Então, ela dizia coisas como “Oh, deve ser difícil ser solteira
no subúrbio”. Suponho que se ela tivesse oferecido isto no contexto correto, teria sido
bom (...) Mas ela despejava isso a qualquer momento. Aparentemente, ela estava
oferecendo apoio, mas esse era um modo pelo qual ela reestabelecia sua posição
como Aquela Que Tinha Um “Namorado”. (...) Eu me sentia, de algum modo,
atacada, colocada na defensiva. Oferecer sua simpatia, quando eu não precisava
dela, fazia com que eu sentisse, “nossa, isto é um problema. Talvez eu esteja
realmente chateada com isso”. Então eu me afastava, transtornada, sentindo raiva
dela. E eu sentia culpa por não estar aceitando a gentileza dela. (Entrevista e “escrita
livre”, com uma jovem e bem sucedida profissional judia)

Relembro, vividamente, uma cena que ocorreu há trinta e cinco anos atrás. Pouco
antes do Dia de Ação de Graças, minha escola de ensino médio do subúrbio organizou
um movimento para coleta de enlatados, alimentos de cesta básica e dinheiro, para
comprar perus para as famílias pobres. Fui, de algum modo, selecionada para ser parte do
grupo que entregaria a comida à família Grant. Em uma manhã de sábado, quatro de nós
se espremeram entre caixas e sacolas de comida dentro de meu Volkswagen. Dirigimos
para o endereço especificado, numa rua não-asfaltada em uma vizinhança pouco familiar
para nós, do outro lado da cidade. Carregando caixas e sacolas três degraus acima de uma
pequena escada, batemos à porta da minúscula casa de madeira, que um dia já fora pintada
de branco. Olhamos em volta, de olhos bem abertos, e esperamos. Algumas crianças
vestindo roupas gastas, três ou quatro anos mais jovens do que nós, brincavam
silenciosamente no quintal lamacento e fingiam nos ignorar.
A Sra. Grant abriu a porta, e nos convidou a entrar. Levamos nossa oferenda à
estreita sala de estar, amontoada pela mobília gasta e de baixo custo. Folhas de jornal, tão
desbotadas quanto o vestido da Sra Grant, haviam outrora sido coladas como “papel de
parede”. Hoje, tinham descascado. Então, isso era a pobreza. Tínhamos lido David
Copperfield e Vinhas da Ira na escola, mas aquilo ali era real, e estávamos embaraçados
por nossa intrusão naquele ambiente. A Sra Grant fingiu não notar os olhares de surpresa
em nossos rostos. Meus colegas estavam silenciosos, e eu tentei agir como porta-voz, da
maneira mais respeitosa e profissional que pude. Sim, estávamos fazendo uma entrega, e
esperávamos que estivesse satisfatória para ela. Ela nos agradeceu como se tivéssemos de
fato feito algo significativo, como se tivéssemos feito algum tipo de sacrifício. O marido
dela estaria presente ali também se pudesse, ela disse, mas ele se encontrava fora,
respondendo a um anúncio de oferta de emprego. Eu estava chocada pelo fato da Sra

*
CLARK, Candace (2018 [1997]). Simpatia, Micro-hierarquia e Micropolítica. Belo Horizonte, FAFICH/
UFMG. Tradução para uso didático por Leandro de Oliveira. [do original em língua inglesa, "Simpathy,
Microhierarchy and Micropolitics" in Misery and company: sympathy in everyday life. Chicago;
London: The University of Chicago Press, 1997].
Grant se mostrar tão deferente e tão grata a nós, adolescentes. Não sei se ela estava sendo
sincera, mas ela estava certamente atenta a seus modos, e demonstrou sua apreciação de
forma muito afável.
Senti muita culpa e muito desprezo por mim mesma; senti embaraço por causar
embaraço. E senti um rompante de simpatia/ empatia pela Sra Grant1. Como pudera eu –
uma jovem de 17 anos dirigindo seu próprio carro, vestindo a última moda adolescente e
o penteado estiloso da época, levando açúcar, latas de milho e abóboras que familiares do
outro lado da cidade tinham doado apenas porque de fato não as queriam – ter a ousadia
de pisar ali? Por outro lado, como eu era capaz de ser tão presunçosa ao ponto de assumir,
automaticamente, que minha vida era tão melhor que a dela? Talvez eu devesse sentir
culpa por estar sentindo pena. O que meus companheiros estavam sentindo, eles
guardaram para si. Emoções rodopiando, fizemos uma veloz retirada. Mas esta cena não
se apagou de minha mente.
O ato de caridade começara como uma boa ação ‘em abstrato’, e como uma chance
de estar junto com meus amigos em uma manhã de sábado – éramos muito menos nobres
que a Dorotéia de George Eliot. Nossa simpatia preliminar e distanciada pelos pobres se
transformou em simpatia, plena e totalmente ativa, pela Sra. Grant. E ambas a rebaixavam
e humilhavam. Será que para a Sra Grant, ou para as crianças no quintal lamacento, o
peru e as duas ou três caixas de comida compensavam pela degradação de ter adolescentes
secundaristas invadindo seu mundo daquele modo? Eu jamais saberei. Mas naquela
manhã de novembro, em 1962, eu compreendi um fragmento da micropolítica da
simpatia.
A micropolítica é um lado da simpatia que muitas pessoas preferem ignorar. Ainda
assim, como espero ter deixado claro, expressar simpatia pela condição ou situação ruim
vivida por um outro pode rebaixar essa pessoa. No capítulo 05, vimos que as pessoas alvo
de simpatia/compaixão se tornam devedoras pelas dádivas que receberam; no capítulo 06,
vimos que elas, pelo simples fato de parecerem precisar de simpatia/compaixão, podem
ser consideradas portadoras de problemas ou inabilidades pelos quais elas podem ser
culpabilizadas. As pessoas que expressam simpatia, por outro lado, estão em melhor
situação. Elas estão na posição de credor, tendo situações de vida menos problemáticas,
e ao oferecerem sua compaixão a outros, elas elevam seu status moral e social. Mesmo
quando elas não têm esta intenção consciente, oferecer sua simpatia pode ter
consequências micropolíticas. Ironicamente, uma transação de simpatia, na economia
socioemocional, pode tornar as pessoas mais próximas e ao mesmo tempo alargar o
abismo que as separa. Isto pode explicar um paradoxo sociológico fundamental: todos os
grupos humanos são simultaneamente coesos e estratificados. A simpatia, ao lado de

1
A noção norte-americana de sympathy possui sentidos e modos de uso distintos de seu correlato em
português brasileiro. A noção de sympathy é frequentemente empregada para assinalar a expressão de
empatia por uma condição ou situação ruim que outra pessoa esteja atravessando – um ato de expressão
que pode ou não ser “sincero”. O termo “simpatia”, em língua portuguesa, é usado para nomear a expressão
e impressão de afinidade por (e/ou reconhecimento da gentileza de) outra pessoa em situações interpessoais
muito plurais, comportando usualmente apenas conotações positivas, como quando dizemos que “fulano é
uma pessoa muito simpática”. Esta distinção deve ficar mais clara ao longo do texto, a partir dos exemplos
de situações em que a noção de sympathy é empregada que são oferecidos pela autora (Nota do Tradutor).
outras dádivas emocionais, pode contribuir simultaneamente para a coesão e a
estratificação.
Corro certo risco, ao focar as implicações micropolíticas da simpatia. O leitor
poderia inferir que acredito que todas as pessoas que oferecem sua simpatia estão –
consciente e cinicamente – usando a expressão de simpatia para promover seu próprio
interesse pessoal. Não estou, de modo algum, afirmando isto. Sofrimentos genuínos
podem gerar simpatia genuína, constituída por profunda empatia e profunda
intersubjetividade. Neste tipo de situação, quando as partes são iguais entre si, ambas se
percebem elevadas e gratificadas.
Contudo, as relações sociais raramente são tão simples. Em primeiro lugar, a
igualdade é rara, enquanto a desigualdade está em toda parte a nossa volta. Nem mesmo
amigos, amantes e cônjuges ocupam posições sociais totalmente idênticas. Em um dado
momento, uma pessoa está one-up,2 para usar a expressão feliz de Stephen Potter (1952).
Uma troca de simpatias pode sublinhar, intensificar ou reverter o grau de desigualdade.
Prestar atenção aos aspectos micropolíticos das trocas emocionais nos alerta para o fato
de que a economia socioemocional está atrelada a intricados arranjos micro-hierárquicos.
Explorar estes arranjos podem ajudar a elucidar os laços entre processos
macrossociais e microssociais. Randall Collins (1981), Anthony Giddens (1984, 1991),
Pierre Bourdieu (1990), Thomas Scheff (1990), George Ritzer (1990) e inúmeros outros
na nova geração de teóricos sociais ofereceram versões de teoria sociológica que reavalia
processos em um nível macro como estratificação, modernização e patriarcado à luz dos
achados de pesquisas microssociológicas sobre interação simbólica, análise de
conversação e etnometodologia. Aparentemente, o trabalho de Erving Goffman
convenceu esta nova geração (dentro da qual me incluo) de que o microcosmo é, de pleno
direito, um importante objeto de estudo e uma chave para a compreensão do macrocosmo.

“Lugar” e micro-hierarquia

Os atores sociais, via de regra, sabem onde estão pisando, e onde querem pisar,
com relação a outros atores em seus encontros cotidianos. Se eles não agem de forma
apropriada a seu “lugar”, serão lembrados disto por terceiros. Quer se trate de uma estrela
ou um figurante, um superior ou um inferior, alguém íntimo ou um estrangeiro, as pessoas
“sabem o seu lugar” ou são “colocadas no seu devido lugar” caso violem a ordem das
coisas. Aquilo que estou chamando de “lugar” é o equivalente, em um nível micro, do
status social no sistema de estratificação de uma sociedade. Enquanto o status social é
uma posição em um nível macro sobre a qual existe consenso coletivo (Merton, 1957, p.
368; p. 381-384), um lugar é uma posição muito menos definida, situada em nível micro.
É claro que o status social de um ator influencia o lugar dele ou dela em uma micro-
hierarquia, mas nas sociedades modernas, pelo menos, a correspondência entre status e
lugar não é perfeita.

2
A expressão comporta o sentido geral de ‘estar por cima’, acima de outra(s) pessoa(s), sinalizando sucesso,
vantagem ou superioridade relativas, em um dado contexto ou situação (N. do T.).
As pessoas nas sociedades modernas se movem entre muitos lugares no decorrer
de um dia, ocupando pelo menos um para cada uma de suas relações ou encontros. O
senso subjetivo de lugar de uma pessoa é um colaborador efêmero da concepção de si ou
“identidade”. O senso de lugar emerge em um contexto interacional particular (ou em um
contexto imaginado). É a consciência momentânea de “quem eu sou e como devo agir
neste momento neste encontro”, parte do self situado.
Acima disto, lugares sociais são arranjados hierarquicamente, encompassando
diferenças naquilo que os sociólogos chamam de “poder” (Henley, 1977. Kemper, 1978,
1991), “status face-a-face” (Ridgeway, Berger e Smith, 1985), e “distância social”, o
oposto da intimidade (Bogardus, 1953). Micro-hierarquias são mais precárias que
sistemas de estratificação social, e raramente equilibradas. Relações de lugar estão em
um constante estão de fluxo, ajuste e alinhamento. Em questão de instantes, o vão entre
as partes pode se ampliar ou se estreitar. O superior se torna o inferior. No tocante a isto,
o lugar de uma pessoa em um encontro é menos estável que o status que ela ou ele ocupa.
Os atores sociais podem não estar cientes de suas tentativas de se situar em relação
a outros ou das tentativas dos outros em relação a eles, mas estas ainda assim ocorrem
(Goffman, 1951). Em cada encontro e relacionamento, cada participante questiona
(dentre outras coisas) quem tem um lugar social mais alto e, pelo menos em um dado
momento, cada um responde a essa questão a sua própria maneira. Os seres humanos
possuem mecanismos comparativos inatos que constantemente pesam objeto contra
objeto, ideia contra ideia, grupo contra grupo e indivíduo contra indivíduo (Sherif e
Hovland, 1961; Wolf, 1990, p. 229-230). Assim, comparação e contraste não são
necessariamente atos que expressam vontade pessoal, mas parte do funcionamento
normal de nosso equipamento intelectual. A comparação evoca emoções, e as emoções
fornecem informação sobre onde estamos pisando.
Paralelamente, a preservação de uma auto-imagem aceitável depende em parte da
habilidade dessa pessoa em reivindicar lugares aceitáveis na variedade de situações,
encontros e relações que constituem um “espaço de vida”. Como Scheff e Retzinger
notaram, os seres humanos são extremamente sensíveis a possível rejeição, não somente
por aquilo que a rejeição diz sobre o eu de alguém, mas também por aquilo que ela diz
sobre o laço entre o eu e o outro (1992, 64-65). Monitorar o posicionamento em lugares
envolve monitorar laços. Em suma, prestar atenção às menores diferenças de lugar social
é uma necessidade perceptiva, social e de autoproteção.
Estar sintonizado a arranjos micro-hierárquicos de lugares sociais também
possibilita a um ator social saber que linhas de ação tomar ante outros na economia
socioemocional. Uma miríade de regras não-escritas de interação se torna objeto de
ajustes, de modo a dar conta até mesmo das menores diferenças em poder e lugar. O porte
adequado ante alguém que é muito superior é diferente do porte adequado alguém que é
razoavelmente superior, ou um pouco superior, ou em algum grau inferior (ver, por
exemplo, Whyte, 1943; Goffman, 1967; Schwartz, 1967, 1973). Por exemplo, Schwartz
(1973) mostrou que monopolizar o tempo de outros fazendo com que eles esperem reflete
e reforça diferenças de poder. Ele também descreve as mensagens de poder inerentes na
doação de dádivas (1967, p. 2-4), por exemplo, “meu presente caríssimo mostra que tenho
mais riqueza que você” ou “eu sei que tipo de presente é bom para você”. Ou seja, os
atores não podem adotar junto a uma pessoa em lugar superior a mesma linha que elas
adotariam com uma pessoa em lugar inferior. Elas não adotam a mesma linha com uma
pessoa que tem valor moral ou social mais baixo e com aquelas cujo valor social ou moral
é mais alto. Pessoas ocupando lugares mais altos frequentemente têm mais capital cultural
e social, e assim, mais estima e privilégio. Elas têm um numero maior e distinto de direitos
na interação. Por exemplo, elas podem avaliar outras, fazer perguntas pessoais, dar
conselhos, sinalizar nossas falhas, ter suas opiniões levadas em consideração, chegar
atrasados, ouvir segredos, “ter algo mais importante pra fazer”, ignorar o outro, e assim
por diante. E seus lugares sociais as protegem dos abusos e intrusões alheios (Hochschild,
1983).
Evidentemente, as pessoas por vezes se engajam em comportamentos
inapropriados a seu lugar, como quando um subordinado faz perguntas pessoais a seu
chefe, ou quando o chefe tenta em excesso agir como “um de nós”. Além disto, nem todos
leem os arranjos micro-hierarquicos de forma correta. Uma pessoa pode acreditar que ela
própria, ou outra, está posicionada mais alto ou mais baixo do que é de fato o caso. Nós
chamamos pessoas que repetidamente ambos os tipos de erro de socialmente ineptas, sem
tato, ou mesmo chatas e “sem-noção”.
Contudo, mesmo as pessoas socialmente aptas podem interpretar erroneamente as
configurações de lugar, porque os lugares específicos que as pessoas podem ocupar em
uma situação particular são frequentemente misturados ou elusivos. Isto, por sua vez, se
deve em parte ao fato de que as distâncias entre lugares não são uniformes. Mas há mais:
os lugares se sobrepõem uns aos outros, e eles mudam. Eles são propriedades
naturalizadas, multiplamente definidas e situacionalmente negociadas.
Uma das razões pelas quais os atores podem ter dificuldade em discernir
configurações de lugar é que a extensão do vão que separa os lugares de duas pessoas é
variável. Um vão pode ir desde a distância imensa (como entre o executivo da corporação
e a datilógrafa, o dono de terras branco e o trabalhador rural afroamericano no Sul dos
EUA) à distância imperceptível (entre amigos). Mesmo se os atores são claramente pares
ou íntimos, como os “tenentes” entre os rapazes da esquina de William Foote-Whyte
(1943), uma pessoa em um dado momento está situada mais alto que as outras. Em suma,
a pessoa A pode estar um passo acima, três passos acima, ou meramente um décimo acima
com relação à pessoa B. Em geral, distâncias maiores entre lugares são mais fáceis de
detectar (e, talvez, de manter).
Além disto, quando muitos atores estão presentes, cada um deles ocupa
simultaneamente vários lugares sociais. Em uma família ou grupo de colegas de trabalho,
por exemplo, cada membro é em algum grau superior ou inferior a cada um dos outros
membros (num dado momento). Aferir múltiplas distâncias simultaneamente pode ser
difícil, especialmente naqueles pontos quando a configuração interconectada inteira
estiver em fluxo. Certas vezes, como quando um chefe e um trabalhador são amigos, uma
pessoa pode ocupar simultaneamente dois ou mais lugares de relacionamento na conexão
a apenas uma outra pessoa.
Além disto, desde que as pessoas concordem sobre certa distância entre elas, elas
podem com frequência interagir livremente, e até mesmo com “intimidade”, dentro de
uma configuração de lugar hierárquica. Grupos dispostos em hierarquias paternalistas
(Van den Berghe, 1978), tal como brancos e negros no sul dos EUA, na África do Sul de
início dos anos 1990, ou entre pais e filhos em uma família, substituem a distância
geográfica pela distância social visando perpetuar seus lugares desiguais. Observadores
externos podem não perceber a total extensão do vão, e as partes envolvidas podem
naturalizá-lo e deste modo não acreditar que ele existe.
A leitura de lugares sociais é complexificada, também, pelas múltiplas
perspectivas acerca do lugar de uma mesma pessoa. Ao mesmo tempo em que situamos
a nós mesmos e aos outros, os outros estão tentando nos posicionar. Existem, portanto,
visões “subjetivas” (autoconstruídas) e “objetivas” (construídas pelo outro) sobre o lugar
de cada pessoa. Lugares objetivos não são aqueles que as pessoas gostariam de ocupar ou
pensam que ocupam, mas aqueles a que os outros nos alocam pela concessão de atenção,
estima, deferência e honra – ou pela falta destas. O lugar objetivo que outros constroem
pode colorir o senso subjetivo que uma pessoa tem de “onde estou situado nesta relação”,
mas não o determina totalmente. Algumas pessoas resistem ao lugar que os outros
definem para elas, enquanto outras aceitam esse lugar.
Não é surpreendente, portanto, que a leitura das configurações de lugar possa ser
desnorteante. Se ela fosse apenas uma tarefa cognitiva de prestar atenção a “lembretes de
status” (Goffman, 1951) ou expectativas (ver, por exemplo, Ridgeway, Berger e Smith,
1985), ela seria ainda mais difícil. Acredito que, com frequência, é uma deixa emocional
– um rompante de pretensiosidade, uma leve ansiedade, uma sensação de mágoa ou
mesmo uma pontada de culpa – que informa ao ator social qual é o lugar dele ou dela, ou
como esse lugar mudou, por vezes antes que tome ciência de outras pistas. As pessoas
constantemente experimentam e provocam emoções na interação (Kemper, 1978;
Wentworth e Ryan, 1992): parece razoável supor que estas emoções façam algo
significativo. Ou seja, tanto as emoções orientadas para si (como o orgulho e a vergonha)
e as emoções orientadas para os outros (como a reverência e o desdém) costumam servir
para marcar o lugar da própria pessoa. Com frequência, emoções positivas sobre si (como
a satisfação ou o orgulho) e emoções negativas sobre os outros (como o desprezo e o
nojo) assinalam um senso subjetivo de superioridade ou poder. Emoções negativas sobre
si (embaraço, por exemplo) marcam um senso de inferioridade. A despeito disto, uma
emoção negativa sobre si (por exemplo, a culpa) pode indicar um senso de poder sobre o
destino de outra pessoa ao mesmo tempo em que assinala um fracasso pessoal. Deste
modo, de maneiras complexas, algumas emoções marcam lugares, registrando a posição
relativa de uma pessoa em sua psique e soma.
O caso da entrega de comida no dia de ação de graças, que descrevi no início deste
capítulo, oferece uma ilustração. A gratidão da Sra. Grant (mesmo que insincera)
assinalava seu próprio lugar inferior, e minha simpatia marcava um lugar superior. Ao
mesmo tempo, eu estava desconfortável por ser alocada a um lugar superior, e sentia culpa
por simpatizar com a situação dela. Até mesmo minha culpa registrava minha posição
superior. Outro doador, uma Lady Bountiful3, poderia ter assinalado sua posição superior
com simpatia ou pena somente, sem culpa.

3
A expressão “Lady Bountiful”, em língua inglesa, é usada para se referir a uma mulher generosa que
ostenta sua caridade mais preocupada com o juízo que fazem dela que com a situação dos donatários.
Micropolíticas

Se a desigualdade é onipresente, a micropolítica também o é. “Micropolítica” é a


conduta orientada para obter, manter e eventualmente conceder poder interpessoal através
de atividades como reivindicar lugares, negociar e disputar posições. A precariedade das
micro-hierarquias em nossas vidas cotidianas gera grande necessidade de negociação.
Nas sociedades modernas que tenham pelo menos uma retórica de igualdade e
oportunidade, a tarefa de estabelecer o lugar relativo de uma pessoa é, via regra, mais
difícil que nas sociedades tradicionais, em que os lugares estão conectados com mais
segurança a status sociais como os de camponês e proprietário de terras, patriarca e
escravo. Paralelamente, a ascensão do individualismo elevou a aposta que temos em
concepções de si mesmo, elevando a motivação para que negociemos nossos lugares.
Em instituições modernas como o mundo dos negócios, o namoro, a família e o
governo, a micropolítica frequentemente se desenrola na arena da economia
socioemocional. Hoje, mais do que nunca, as emoções são instrumentos políticos chave.
Dado que a estima e suporte que concedemos a negociantes, cônjuges em potencial, pais,
filhos e líderes políticos é baseada em grande medida no modo como nos sentimos quanto
a eles, as pessoas podem tentar influenciar nossos sentimentos. Um ator social pode dirigir
emoções a outros como reinvindicações de lugar. De forma flagrante ou sutil, consciente
ou não-consciente, uma pessoa pode utilizar emoções como nojo, desprezo, raiva (ou
gratidão, paciência e simpatia) para inferiorizar outros, elevar a si mesma, ou ambos.
Aqueles que desde início dispõem de mais capital social e cultural podem se arriscar mais
e com mais facilidade fazendo reivindicações emocionais de lugar (por exemplo,
mistificação, fazer as pessoas esperar, ou apelar à lei e à tradição).
Poder-se-ia dizer que uma pessoa deflagrou com sucesso uma reação em cadeia
emocional para obter a posição privilegiada quando suas reivindicações emocionais de
lugar conclamam sobre outrem os marcadores recíprocos da inferioridade. As pessoas
frequentemente sentem dificuldade em reconhecer o uso das emoções por terceiros –
especialmente emoções positivas como a simpatia – para reivindicar um lugar de
superioridade. Contudo, suas próprias reações emocionais podem sinalizar uma mudança
nos arranjos de lugar. Por exemplo, a exibição de desprazer de uma pessoa pode evocar
um súbito sentimento de vergonha, embaraço, mágoa ou inadequação em outra. Cada ator
sente que o vão entre eles se alargou. Ainda que as partes envolvidas nem sempre fiquem
igualmente satisfeitas com o resultado, uma negociação ocorreu. As emoções marcam seu
reconhecimento comum da configuração de lugar resultante.
Reivindicações emocionais de lugar podem operar de diversas maneiras e envolver
muitas emoções, dependendo, em parte, dos lugares iniciais das pessoas envolvidas. As
cinco estratégias de negociação de lugar que esboço abaixo podem ocorrer separadamente
ou em combinações. Notem que as pessoas nem sempre utilizam estas estratégias de
forma calculada. Elas, frequentemente, não estão cientes de que as estão empregando.
Contudo, mesmo que não seja conscientemente motivada, uma linha de ação emocional
pode ainda assim influenciar os lugares relativos dos atores. Três destas estratégias
iniciam direcionando emoções sobre outros:

1. Obviamente, um ator social pode exibir emoções negativas e assim fazer outro
ator se sentir inferior ou rebaixado. Por exemplo, a raiva ou o escárnio de um
professor ou de um chefe pode produzir humilhação em estudantes ou
trabalhadores. Esta estratégia é usualmente empregada por superiores junto a
inferiores ou subordinados, dado que ela poderia ter resultados desastrosos caso
alguém tentasse utilizá-la na direção inversa.
2. Um ator social pode conceder uma dádiva emocional, tal como a paciência, a
gratidão ou a simpatia, de uma maneira que sublinha a fraqueza, os problemas ou
a posição inferior do destinatário, fazendo com que ele ou ela se sinta
autoconsciente e inadequado.
3. Um ator pode reduzir o vão em um arranjo de lugares direcionando emoções
positivas para outra pessoa lisonjeando, bajulando e “caindo nas graças” dessa
pessoa.
Duas estratégias adicionais se impõem na evocação de emoções sobre terceiros:
4. Uma pessoa pode ressaltar seu lugar relembrando a outra uma obrigação ou dever,
ou criando um sentimento de obrigação, se este não existia anteriormente. Se bem
sucedida, esta estratégia provoca no outro sentimentos de culpa por não ter
cumprido tal obrigação, e induz uma sensação de urgência a agir em favor da
primeira pessoa. Por exemplo, um pai ou mãe pode sinalizar para um filho que o
baixo rendimento em avaliações é uma retribuição inadequada por tudo que os
pais fizeram pelo filho. Um marido pode chegar em casa, se sentar em uma mesa
de jantar vazia e direcionar um olhar queixoso à esposa, notificando-a sobre o fato
óbvio de que o jantar não está pronto. Uma esposa pode emitir um profundo
suspiro enquanto ela tenta pagar as contas, relembrando ao marido que ele não
tem cumprido a contento o papel de provedor. Em todos estes casos, se a deixa
emocional funciona, o alvo é inferiorizado.
5. Uma pessoa pode sair na vantagem mantendo um monopólio sobre o autocontrole
enquanto evoca emoções em terceiros. Adolescentes norte-americanos utilizam
deliberadamente esta estratégia quando tentam obter de seus pais um aumento na
mesada, ou de um professor a elevação na nota de uma avaliação. Utilizada por
um superior, tal estratégia rebaixa ainda mais o subordinado. Utilizada por um
subordinado, ela diminui (ao menos temporariamente) a distância que os separa.

O resultado, em rede, de micropolíticas emocionais, é (frequentemente) a


reprodução de arranjos de lugar previamente existentes em nível micro, e
consequentemente, arranjos de poder existentes no nível macro. Quanto mais
correspondência houver entre o status no nível macro e os lugares no nível micro (e
quanto mais estas posições de status servirem como canal de acesso a estratégias
micropolíticas eficazes), maior será a tendência a que as coisas permaneçam do jeito
como estão. Pessoas em lugares superiores estão, muito possivelmente, melhor
familiarizadas com tais estratégias emocionais que as pessoas em lugares inferiores.
Aqueles em lugares inferiores, muito sabiamente, tendem a refrear o direcionamento de
sua fúria, de seu desprezo ou mesmo de sua piedade para com os superiores, blindando o
status destes últimos contra possíveis ataques. No fim das contas, o superior não precisa
recorrer à força ou à ameaça para manter seu privilégio, porque a pessoa subordinada
sente seu lugar inferior, e estas sensações desarmam toda e qualquer insubordinação.
Deste modo, sentimentos de inferioridade podem aprisionar as pessoas em relações
desiguais. Scheff constrói um argumento similar em sua discussão sobre o papel que a
vergonha desempenha na preservação de sistemas estratificados (1990, p. 71-95).
Contudo, micropolíticas emocionais também são capazes de perturbar arranjos de lugar
e, em última instância, desestabilizar arranjos de poder. Os atores sociais podem,
ativamente, tentar evitar posicionamentos que os inferiorizem, e evitar os sentimentos que
marcam estes lugares como inferiores. As pessoas em posição inferior dispõem de um
número de estratégias emocionais que podem empregar para elevar seu lugar, ou para
fazer com seus superiores se sintam rebaixados (talvez mesmo com consequências de
médio e longo alcance).

Simpatia e micropolíticas da emoção

As cinco estratégias micropolíticas que descrevi acima podem ocorrer


isoladamente ou em conjunto, em uma dada transação que envolva simpatia. Os atores
sociais podem conceder simpatia de formas que nitidamente debochem de qualidades
negativas de terceiros (estratégia 01), perdoá-las com condescendência por seus
problemas e/ou ditar uma definição potencialmente questionável da situação do outro
(estratégia 02), agir de modo a cair nas graças do outro (estratégia 03), gerar sentimentos
de obrigação (estratégia 04) ou provocar um desequilíbrio emocional (estratégia 05). Por
sob as palavras e gestos que constituem uma exibição de simpatia pela situação precária
de alguém, repousam julgamentos, compreensões e sentimentos – processos interiores e
constructos que o observador precisa inferir. Como assinalei anteriormente, interpretar a
simpatia requer que nos engajemos na “abdução”, velozmente vasculhando as mensagens
implícitas e explícitas do outro, o que envolve um exame exterior e interior (Scheff,
1990). No exame exterior, efetuamos uma leitura dos tons de voz, expressões faciais,
gestos e palavras do outro. No exame interior, efetuamos uma leitura de nossos próprios
pensamentos e sensações e imaginamos o grau em que o outro sente, é capaz de sentir ou
poderia ter sentido empatia. Imaginamos os sentimentos de simpatia/empatia que os
outros de fato sentem ou poderiam ter sentido. Comparamos o sujeito que expressa a
simpatia e sua biografia a outros, relembrando ocasiões passadas em que recebemos
simpatia (deste sujeito ou de outros), nas quais este sujeito teria retido e recusado a
concessão de simpatia, e muito, muito mais. Nós imaginamos futuros possíveis e como
estes serão afetados pela presente transação de simpatia. Ao longo de todo esse processo,
reagimos com nossas próprias emoções, e as comparamos a sentimentos passados, a
sentimentos futuras e a sentimentos que poderiam ter ocorrido.
Para compreender como a simpatia opera micropoliticamente, os sociólogos
devem olhar além das mensagens explícitas de modo a explorar as implicações das
transações envolvendo a simpatia: as mensagens implícitas que uma pessoa envia e as
mensagens que a outra recebe ou lê, interpretando deixas presentes na cena, ou imputando
sentido a tais deixas. Evidentemente, obter informação sobre os processos de exame e
interpretação das pessoas é algo problemático, e os métodos sociológicos convencionais
não são adequadamente equipados para este tipo de tarefa. Até mesmo a análise de
conversação empregando registros em áudio e vídeo da interação fornecem pouca
informação acerca dos processos de exame interior.
Minha análise dos aspectos micropolíticos da simpatia se amparam em alguns
métodos distintos. Primeiro, empreguei entrevistas em profundidade, em especial reações
às questões: “alguém já demonstrou simpatia por sua situação, ou sentiu pena de você,
quando você não queria? Você pode descrever como você se sentiu? Como você reagiu?”.
Outra técnica que pode oferecer um lampejo do implícito é a “escrita livre” (freewriting),
um método que peguei emprestado de professores de redação (Elbow, 1973) e adaptei ao
estudo da experiência emocional (Clarck e Kravanja, 1990). Grande parte dos dados
apresentados aqui provém da escrita livre dos sujeitos sobre suas experiências de receber
a simpatia alheia. Eu e meus assistentes de pesquisa treinamos alguns grupos de sujeitos
na técnica de escrever de forma ininterrupta sem se preocupar com ortografia, pontuação
ou gramática, permitindo que a caneta se tornasse uma estenógrafa da mente. Como
comento no apêndice metodológico deste livro, fornecemos a eles questões diretas, e.g.:
“como você se sente quando alguém diz pra você que lamenta por você estar passando
por uma situação ruim, e isto fere teus sentimentos?”. A escrita livre não é um método
ideal para o estudo de sentidos implícitos, dado que ela demanda que as pessoas
relembrem eventos aos quais elas podem não ter prestado muita atenção de início.
Contudo, apesar de suas limitações, ela aprofundou algumas intuições obtidas a partir de
entrevistas.
Alguns respondentes diziam que não conseguiam se lembrar de ter recebido
simpatia indesejada. Suas situações estavam, sob certos aspectos, protegidas. Por
exemplo, uma mulher branca de meia-idade, dona-de-casa e secretária em meio
expediente, explicou sua falta de experiência com a simpatia indesejada da seguinte
maneira:
“meus amigos são próximos, atenciosos e se preocupam comigo. Eles jamais cogitariam
dizer algo como ‘lamento pelo que você está passando’. Acho que, dado que estou em
casa com minhas crianças a maior parte do tempo, não tenho contato com muitas pessoas.
Agora que estou trabalhando, talvez eu esbarre em pessoas que poderiam falar esse tipo
de coisa para mim”

Homens relatavam com frequência que eles recebiam de terceiros pouca simpatia
de qualquer espécie – muito menos uma simpatia indesejável e depreciativa. Por exemplo,
um jovem homem branco, contador, escreveu: “não consigo me imaginar em uma
situação como essa”. Contudo, alguns respondentes pareciam expressar uma ideologia
cultural (ou um wishful thinking) ao invés de relatar situações de interação, como uma
mulher branca de 22 anos, secretária, que escreveu: “as pessoas não fazem esse tipo de
coisa. Elas não oferecem simpatia às outras, a não ser que de fato estejam sentindo isso”.
De fato, com muita frequência, as pessoas não estão cientes dos aspectos
micropolíticos de uma demonstração de simpatia, e fracassam na tentativa de decodificá-
los. Ainda assim, na escrita livre, algumas pessoas forneciam pistas sobre como elas se
engajavam no exame interior, evidenciando que a dádiva da simpatia requer
interpretação. Por exemplo, um gerente de meia idade, branco, casado, na casa dos 50
anos, escreveu: “Você tem que descobrir porque o outro está com pena de você. Porque
esta pessoa está fazendo um comentário desse tipo, e quais são os motivos por trás disto?”.
Eles sinalizaram alguns problemas: o quão sincera é a simpatia ofertada? Quais são os
motivos da pessoa que a oferta? O que a pessoa que oferta a simpatia está sugerindo
acerca das habilidades daquela que é alvo de sua simpatia? A oferta de simpatia pode ter
a intenção de confortar ou de depreciar a pessoa que a recebe. O sujeito que oferece sua
simpatia pode também estar tentando elevar a si mesmo, sendo bom e gentil. Ele pode
gerar obrigações a serem cobradas mais tarde.
O caso da jovem profissional citado no início deste capítulo evidencia algumas
das dificuldades envolvidas na interpretação. A simpatia da colega de trabalho dela
sublinhava seus problemas, era uma espécie de lisonja, e ao mesmo tempo a deixou
transtornada. Em adição a isto, a colega de trabalho aumentou seu próprio capital social.
Ainda assim, foram necessários diversos encontros com a gentil colega de trabalho antes
que a mulher aprendesse a confiar no que ela chamou de seu “barômetro emocional
interno” e percebesse que ela tinha se sentido diminuída. Suas reações confirmam que
receber a simpatia alheia pode estimular emoções que marcam um lugar inferior.
Sentimentos de inadequação assinalavam o lugar inferior dela, e os sentimentos de mágoa
e raiva sinalizavam que algo no relacionamento não estava corretamente equilibrado.
Além disto, as reações dela mostram que as pessoas estão condicionadas a encarar a
simpatia como uma dádiva ou benefício, e não como um ataque ou forma de depreciação.
Assim, as pessoas podem se descobrir confundidas pelo micropolítico simpático, e sentir
culpa em rejeitar a dádiva, quaisquer que sejam os termos implicados na oferta. Outra
mulher, uma assistente administrativa hispânica de 22 anos, escreveu: “aquilo que os
outros pensam não é muito importante. Mas é importante para mim como os outros
fizeram com que eu me sentisse... Acho que eu me magoo facilmente. Talvez eu seja
excessivamente sensível”. Prestar atenção aos próprios sentimentos durante uma
interação pode fornecer dados úteis para decifrar as intenções da pessoa que oferece sua
simpatia.

Estratégia 01: zombar através da simpatia

Uma variedade de oferta micropolítica de simpatia que não é difícil de reconhecer


é a zombaria através da simpatia que é servida com sarcasmo em um tom de voz que
comunica falsidade. Este tipo de simpatia abertamente comunica desdém. O policial de
boa índole, nos filmes, pode lançar ao criminoso: “você não presta, tenho pena de você!”,
mas exemplos deste tipo de reinvindicação emocional de lugar dificilmente acontecem na
vida cotidiana. Alguns estudantes de ensino médio, em uma aula de língua inglesa,
escreveram em um exercício de escrita livre sobre outros estudantes que utilizaram da
zombaria através de simpatia para embaraçar inimigos pessoais e para insultar alunos sem
popularidade. Testemunhei exibições deste tipo em tribunais, observando juízes
sentenciando usuários de drogas, assassinos e assaltantes, especialmente os reincidentes.
Por exemplo, um juiz em uma corte de Nova Jersey repreendeu um ladrão de carros e
traficante de drogas condenado: “sinto muito por você, Sr. Delgado. Você não parece ser
capaz de aprender. Você é escória, e você vai continuar sendo escória”. Este juiz também
empregou a mesma abordagem com um advogado de defesa que estava emperrando os
trabalhos “Oh, vamos, Sr. Valente. Sou muito sensível ao extremo fardo que este trabalho
está sendo para o senhor, mas será que nós poderíamos por fa-vor [demorando em cada
sílaba] prosseguir com o caso?” (notas de campo).
Ser o destinatário de uma exibição sarcástica de simpatia pode ser perturbador.
Uma mulher branca de meia idade que lecionava para o 2º ano disse: “Se percebo que
uma pessoa está sendo sarcástica (...) eu fico furiosa”. Nesta mesma vertente, talvez
expressando aquilo que muitos outros polidamente evitavam dizer, uma menina hispânica
de 09 anos de idade escreveu “Me sinto zangada. Zangada. Zangada. Zangada. Dá
vontade de dar um soco na cara da pessoa”.

Estratégia 2: elevar a si mesmo apontando os problemas dos outros

O caso da pessoa que oferta simpatia sem zombar, mas ainda assim deprecia, é
um pouco mais confuso. Este tipo de pessoa simpática pode estar fingindo simpatia, como
no caso abaixo descrito por uma mulher casada, WASP,4 profissional da área de redação
técnica:

Lembro que uma vez eu usei de simpatia com a intenção de colocar uma pessoa no seu
devido lugar. Eu tinha um chefe que estava sempre, de maneira semi-gentil, dizendo e
fazendo coisas que me rebaixavam. Me cansei daquilo, e dei o troco. Eu estava na sala
dele, e disse: “Oh, Sr. Wall, veja todos esses relatórios pendentes que o senhor ainda
precisa fazer. Sinto muito pelo senhor. Eu não gostaria, por nada neste muito, de ter o teu
emprego”. Ele mudou de cor, e pude ver que ele estava com raiva. Ele apenas disse “Oh,
eu consigo fazer isso em um minuto. Não é nada demais”, e me enxotou da sala dele.
Normalmente teríamos batido um pouco de papo. Então, eu dei uma bela alfinetada nele.
(notas de campo)

Aqui, vemos uma oferta de simpatia que intencionalmente questiona a habilidade


que outra pessoa teria para desempenhar adequadamente seu trabalho. Se o chefe tivesse
publicamente reconhecido sua vulnerabilidade, ele teria seu lugar rebaixado.
Independente de qual pudesse ser a reação dele, a funcionária se sentiria menos
inferiorizada.

4
A sigla WASP (White, Anglo-Saxon and Protestant) possui usualmente uma conotação pejorativa nos
EUA, sendo usada para rotular pessoas que são simultaneamente brancas, anglo-saxãs, protestantes,
conservadoras, com elevado poder aquisitivo e/ou patrimônio.
Os respondentes relataram que quando eles estavam cientes de receber simpatia
calculada e insincera que sublinhava seus problemas, experimentavam ressentimento. Por
exemplo, a assistente administrativa de 22 anos anteriormente citada explicou: “algumas
pessoas dizem que ‘sentem muito por você’ intencionalmente, pra te derrubar, de modo
que você não consiga alcançar todo seu potencial. Elas te sabotam, fazendo com que você
se sinta incapaz”. Outra jovem mulher branca advertiu que deveria se perguntar “é ‘sentir
muito’ por pena, e eles estão te depreciando pessoalmente?”. E uma mulher branca mais
jovem escreveu: “talvez eles estejam dizendo que ‘sentem muito’ para me levar a criar
caso”. Se os respondentes sentiam que a pessoa que oferece simpatia estava
deliberadamente depreciando, eles frequentemente reportavam um sentimento de raiva.
A raiva pode conduzir uma pessoa a responder com alegações voltadas a proteger um
lugar ameaçado.
É comum que as pessoas utilizem esta estratégia de maneira menos egoísta. Em
sua imaginação, as pessoas se engajam profundamente na demonstração de simpatia por
outros poderosos ou ameaçadores. Alguns respondentes relataram que eles lidavam com
chefes desagradáveis, clientes ou cônjuges substituindo sua raiva ou irritação por
simpatia. Ao fazer isto, eles diminuíam, em suas mentes, o lugar dos outros. Esta
estratégia é também ilustrada por atendentes de vôo no estudo de Hochschild (1983, p.55),
que mantinham controle sobre seu humor encontrando razões para sentir pena por seus
passageiros encrenqueiros.
Ainda assim, mesmo quando a pessoa que concede simpatia não está
intencionalmente tentando depreciar, ela pode irritar – especialmente se houver uma
comparação implícita entre as respectivas situações da pessoa que oferece e a da que é
alvo de simpatia. Como uma mulher branca casada, designer gráfica no campo editorial,
escreveu: “Uma pessoa deve se achar muito superior para lamentar pela situação de
outra”. O empreiteiro Frank DeLucca explicou que, justamente por este motivo, ele se
mantinha calado sobre seus problemas pessoais:
Nos primeiros anos de escola em que trabalhei, o dinheiro não dava pra muita coisa. Acho
que inúmeras vezes, em casa com meus pais ou irmãos, eu poderia ter tocado nesse
assunto e dito que eu não tinha dinheiro pro gás e coisas do tipo. Eu podia ter dito: “Eu
realmente não tenho dinheiro algum. Gostaria muito de ter, mas não tenho”. Naquelas
circunstâncias, sem sombra de dúvida, é provável que eles tivessem respondido “Bem,
aqui, tome – pegue aqui algum dinheiro”. Mas eu sentia (talvez fosse uma coisa de ego),
“Vou conseguir por conta própria. Eu não vou morrer. Tem carne suficiente nos meus
ossos. Vou sobreviver. Amanhã eu consigo. Se eu preciso do dinheiro, vou trabalhar em
algum outro lugar, vou tentar e vou conseguir”.

Aceitar a simpatia e ajuda dos pais teria ferido seu “ego”, e reduzido seu senso de
lugar dentro da família.
Ao mesmo tempo, de forma consciente ou não-consciente, as pessoas que
concedem simpatia podem estar tentando sublinhar ou elevar seu próprio lugar superior
se exibindo como pessoas morais e boas. A narrativa de um homem de negócios, casado,
WASP e de meia idade, ilustra este tipo de situação:
Tendo sofrido uma lesão no tendão de Aquiles, e andando em muletas por três semanas e
meia, fui alvo de um bocado de simpatia (...). É isso que as pessoas deficientes enfrentam
todo dia (...) aquelas que tentam te ajudar você, quando você sente que poderia fazer algo
por conta própria, isso era muito irritante (...) Mas eu guardava isso dentro de mim, e
deixava que elas fizessem o bem. (Entrevista)

Ethel Carrington, a estudante de ensino fundamental de meia-idade citada em


capítulos anteriores, descreveu um caso pouco usual, no qual uma pessoa desconhecida
redigiu para ela uma carta de seis páginas expressando simpatia:

Consultei um novo médico porque eu tenho Lupus, e também tenho câncer. Até esse dia,
eu nunca tinha encontrado essa mocinha [que trabalhava no consultório do médico], e ela
me escreveu uma carta de seis páginas sobre como ela sentia pena por mim. Eu estava
totalmente chocado, porque trabalhando na área de saúde por tanto tempo quanto eu
trabalhei, eu jamais teria feito uma coisa daquelas. Colocar uma coisa dessas no papel é
colocar seu emprego em risco. Meu arquivo era confidencial, e ela o abriu e pegou meu
endereço. Primeiro, isto me assustou porque eu não sabia o que pensar – o que é isso, essa
mulher é louca? Eu entendi que ela era Testemunha de Jeová, e suponho que ela sentiu
que estava fazendo a coisa certa, mas eu jamais teria feito algo assim.

A pessoa que ofertou sua simpatia ultrapassou fronteiras éticas da privacidade e


fronteiras sociais da intimidade de modo a “fazer o bem”. Sua oferta inadequada conduziu
Ethel a questionar a sanidade da mulher. Embora Ethel não tivesse de modo algum
apreciado o gesto, ela escreveu à jovem um bilhete de agradecimento. Nem todas as
pessoas que receberam este tipo de simpatia são gentis o bastante para permitir que os
outros conquistem esse tipo de lugar. A jovem escriturária Robin Adams, por exemplo,
disse que quando se sentiu “forte o bastante”, ela resistiu a “lixo desse tipo”.
Alguns respondentes comentaram que, quando a simpatia fere, é provável que ela
seja insincera. Simpatia insincera significa rebaixamento. Novamente, o depoimento de
Robin Adams é ilustrativo. Descrevendo a simpatia indesejada que ela recebeu por ela
não conseguir ter filhos, ela disse: “Há pessoas que não são tão sinceras quanto você
gostaria que elas fossem, que dizem coisas sem estar falando muito seriamente, porque
no fundo elas realmente não se importam”. Uma mulher branca, esposa e dona de casa,
disse: “Quando a simpatia é genuína, ela não machuca, mas quando ela não é genuína,
ela é como uma faca” (escrita livre). Como um respondente afirmou explicitamente, uma
pessoa cuja expressão de simpatia é sincera saberia como proteger os sentimentos daquela
que é alvo de sua simpatia: “Se ela realmente lamentasse pela minha situação, ela não
teria dito coisa alguma” (mulher jovem e branca, escrita livre). Outra jovem branca disse:
“Uma pessoa que sente simpatia de fato não machucaria você. Ela pensaria um modo de
evitar isso” (escrita livre). A pessoa verdadeiramente simpática teria minimizado o
problema, evitando qualquer exibição de sentimento que colocasse a fragilidade alheia
sob um holofote. A julgar pelas descrições dos respondentes, eu não diria que todas
pessoas que concedem simpatia sejam insinceras. Mas as pessoas que eram alvo da
simpatia tiveram essa impressão, e se ressentiram por isto.
As pessoas também se ressentem por ter outros decidindo quando elas precisam
ou não de simpatia por sua situação. Como uma mulher branca de 22 anos, tecnóloga da
área médica, colocou: “se eu própria não tenho lamento pela minha situação, não lamente
pela minha situação” (escrita livre). A pessoa que concede simpatia pode despojar o
destinatário do direito de definir sua própria vida e circunstâncias. Um zelador hispânico
semi-aposentado, ex-boxeador, ilustrou este ponto quando disse:

Muitas vezes as pessoas falam para mim, “Oh, pobre Raul!”. Bem, eu posso ser pobre,
mais estou me virando muito bem. Riqueza material, não tenho, mas fora isso... Tenho
muitos amigos, meus filhos estão indo bem, e tenho um punhado de netos. Então, de
outras formas, sou um homem muito rico. E embora eu more sozinho, na verdade nunca
estou solitário. Eu não sinto pena de mim mesmo (Entrevista).

Paralelamente, a expressão de simpatia pode magoar ou insultar se aquele que a


concede não aparentar a empatia adequada (lembremos dos comentários de Frank
DeLucca sobre sua mãe, discutidos no capítulo II). Frank se ressentia pelas expressões
imediatas e automáticas de simpatia de sua mãe, que indicavam (para ele) pouca empatia
da parte dela. Ele sugeriu implicitamente que sua mãe era o tipo de pessoa que não
despendia o tempo necessário para compreender a situação do outro. Não gastar tempo
pode significar que a pessoa que é alvo da simpatia não está sendo levada a sério, ou não
vale bastante para esse incômodo. Goldie Blum ilustrou este ponto em uma descrição das
reações excessivas de membros da família a seus problemas dentários: “Eu meio que
apaguei isso. Eu disse a eles, “Eu ficarei bem. Tenho uma consulta marcada”. Você sabe,
“Não há problema, já passei por isto várias vezes”. Alguém demonstrando simpatia em
excesso pela tua situação pode ser quase irritante”. Ela também escreveu uma amiga que
parecia projetar seu próprio anseio por simpatia sobre outros: “A pessoa da qual estou
falando era exagerada para ambos os lados, ofertando simpatia demais e esperando
simpatia da parte dos outros. Era simpatia demais, e reclamação demais. Ela era
insuportável. Eu não queria contar pra ela nem se eu estava com dor de cabeça, porque
eu não queria a simpatia dela por essa situação”.
Os respondentes também ofereceram evidência de que o impacto de uma linha de
ação emocional depende da configuração inicial de lugar. Usualmente, pessoas iguais ou
superiores podem oferecer conforto. Contudo, quando pessoas subordinadas oferecem
conforto, elas podem estar depreciando o destinatário ou elevando indevidamente a si
próprias. George Eliot ilustrou este ponto com maestria, em sua narrativa sobre os
encontros de Harriet Bulstrode com uma amiga, depois que a má conduta passada de seu
marido veio a público:

Selina [a Sra Plymdale] recebeu [Harriet Bulstrode] com uma afetividade patética (...)
Antes, a sra. Bulstrode pensara que questionaria a sra. Plymdale antes de qualquer outra
pessoa, mas ela descobriu, para sua surpresa, que uma velha amiga nem sempre é a pessoa
em quem é mais fácil confiar: havia a barreira imposta pela lembrança da comunicação
sob outras circunstâncias. Havia a sensação desagradável de ser alvo de pena, recebendo
a má notícia por alguém que, desde longa data, costumava permitir sua superioridade.
(Eliot [1872] 1981, 726)
Para o desprazer de Harriet Bulstrode, a Sra Plymdale fora capaz de equilibrar
uma relação entre “pares” que, desde longa data, sempre fora desigual. Para algumas
pessoas, toda simpatia pode ser odiosa. Por exemplo, o programador Juan Carvajal disse:
Não gosto de oferecer simpatia a outras pessoas, e não gosto quando outras pessoas me
oferecem a simpatia delas. Gosto de lidar pessoalmente com meus problemas, se eu tiver
algum. E é por isto, acho, que eu nunca lamento pelos problemas dos outros – porque se
eu posso resolver meus próprios problemas, eles também podem resolver os deles. É isto
que eu gosto de fazer: solucionar meus próprios problemas.

Uma mulher, branca, casada, no início da casa dos 30, escreveu: “pode chamar de
orgulho ou teimosia, mas eu sinto raiva. Não faço questão de ter gente sentindo esse tipo
de coisa por mim (...) Não sou a coitadinha de ninguém, e não faço a menor questão de
ser afagada dessa maneira” (escrita livre). Uma mulher branca, casada, de meia idade,
assistente administrativa, expressou inquietação semelhante: “simpatia por minhas
imperfeições mentais ou físicas (...) Eu sentiria ressentimento porque ninguém deveria
olhar para uma pessoa que não é perfeita com tristeza ou pena”. Outra mulher branca de
meia-idade afirmou “Guarde sua tristeza e sua simpatia para aquelas pessoas
desaventuradas que realmente precisam dela, e as ajude”. Uma jovem mulher branca
começou a questionar as implicações micropolíticas de sua própria simpatia, ao longo de
sua escrita livre: “Eu disse que para minha amiga Wendy que sentia muito pela situação
dela, e agora me pergunto se isto a magoou. Ela está infeliz com sua situação, e eu estou
feliz com a minha. Eu só digo “sinto muito” porque sei que ela poderia estar melhor. Mas
isto é apenas meu ponto de vista pessoal. O ponto de vista dela, eu não sei”. As palavras
dela me lembraram de minhas próprias reações, tantos anos atrás, a simpatia que senti
pela Sra Grant.

Estratégia 03: agir de modo a cair nas graças de outrem

Esta estratégia usualmente envolve tentativas de redução da distância entre lugares


através da criação de uma maior intimidade. Se a pessoa que oferta a simpatia é um
superior ou um igual, a pessoa que é alvo de simpatia tem a tendência a não levantar
objeção, como sugerem os comentários de Frank DeLucca:
A simpatia de certo modo te coloca no mesmo nível que o outro, onde ele pode
falar contigo e você pode dizer “É, me sinto mal”. Mas essas palavras são sinal de algo.
Elas criam uma sintonia que mostra que vocês estão, ambos, no mesmo nível. É um
dispositivo, sabe, um dispositivo psicológico. E ele está lá porque ele funciona.
Contudo, trazer alguém abaixo até o nosso nível não gera o mesmo tipo de reação
que trazer alguém acima até o nosso nível. Quando a pessoa que expressa simpatia é um
subordinado, ele ou ela pode estar tentando cair nas graças da pessoa que é alvo de sua
simpatia. Por exemplo, um subordinado pode expressar simpatia pelos problemas de
saúde vividos por seu superior, na tentativa de criar proximidade. A pessoa que expressa
simpatia pode genuinamente lamentar, e desejar maior intimidade devido à admiração ou
afeição pelo superior. Este padrão pode se aplicar àqueles que simpatizam com situações
vividas por estrelas de cinema, figuras do mundo do esporte e outras celebridades.
Comparecer a um funeral, por exemplo, pode fazer com que a pessoa que expressa
simpatia se sinta mais próxima, em termos de intimidade e status, a uma pessoa célebre.
Por outro lado, aquele que expressa simpatia pode não sentir muita coisa de fato, e estar
meramente efetuando uma manobra por reconhecimento de modo assumir a dianteira
junto a outros subordinados.
Quaisquer sejam as motivações da pessoa que expressa a simpatia, se o
destinatário reconhece a dádiva, ambos se tornam temporariamente mais próximos. Se a
pessoa que é alvo de simpatia aceita também a obrigação de retribuir no futuro, a relação
pode se deslocar em direção a um novo nível de intimidade.
Muitas vezes, contudo, a pessoa que é alvo de simpatia rejeita a dádiva, e tenta
salvaguardar seu lugar. Uma mulher branca solteira, espécie de estrela em seu escritório,
comentou sobre uma nova colega de trabalho: “Ela tenta encontrar um pretexto – qualquer
pretexto – para expressar simpatia, de modo que ela pudesse se tornar minha amiga. Então
ela sugeriu que nos aproximássemos. Eu não conseguia suportar aquilo” (notas de
campo). De modo similar, o pediatra na casa dos 50 (citado no capítulo 02) mencionou
reações de terceiros à morte de sua primeira esposa. Ele sentiu “muito apreço e afeto”
pela simpatia que a maioria das pessoas demonstrou. Contudo, se sentiu “frio” e
indiferente quando as pessoas perguntavam por “coisas específicas que não eram da conta
delas”: “era um balde de água fria, e ponto. É algo que eu não faria. Se você pretende
oferecer sua simpatia, você o faz, e isso é tudo (entrevista). Consideremos também a
descrição dada por uma jovem professora universitário sobre um encontro um encontro
com um aluno falando sobre a morte. Após expressar simpatia pela perda recente vivida
pelo jovem, a professora se descobriu objeto de simpatia oferecida por ele:

Ele queria que eu começasse a contar todos os meus problemas para ele. Pensei comigo
mesma, “Não quero ter qualquer proximidade a mais com você. Não quero te contar nada
a mais sobre mim. E o que te faz pensar que você poderia me ajudar? (...) Sei
perfeitamente o que eu estava fazendo: estava tentando preservar meu lugar de
professora” (Notas de campo, mulher WASP solteira)

O jovem talvez não tivesse a intenção de rebaixar a professora a seu próprio nível,
ou de se elevar ao dela, mas ela estava ciente e alerta ante essa possibilidade. De modo
similar, uma colaboradora da pesquisa disse, através de escrita livre, que ela deveria ter
se aberto quando colegas de trabalho tentaram se aproximar dela oferecendo simpatia,
mas ela simplesmente não conseguiu, e “se fechou como uma ostra”. Uma recepcionista
branca de 23 anos de idade, que se descobriu em situação parecida, disse: “Eu os tranquei
do lado de fora, totalmente. Eu hibernei, me afastei totalmente de todos” (escrita livre).
Estes casos, novamente, ilustram o argumento de que os lugares originais das
partes na hierarquia impactam o sentido que elas atribuem a uma demonstração de
emoção. Pessoas em lugar de subordinação, inferioridade ou ausência de intimidade que
não permanecem em seu devido lugar podem sofrer retaliações. Ofertas semelhantes,
quando feitas por pessoas em lugar igual ou superior, ou com as quais exista intimidade,
podem não ser rejeitadas com tanta facilidade. Mas há mais. Embora a simpatia simbolize
tanto a proximidade quanto a igualdade, este ideal confunde as coisas porque algumas das
pessoas que expressam simpatia podem ter motivos ulteriores.

Estratégia 04: Gerando dívidas socioemocionais

Dado que a expressão de simpatia é um ato de gentileza que confere valor moral
ao doador, uma pessoa que expressa simpatia pode fazê-lo visando, de modo consciente
ou não-consciente, deixar o destinatário – ou a comunidade – em dívida. Alguns
contribuintes do Neediest Cases Appeal (“Ajuda aos Mais Necessitados”) explicitaram
esta estratégia. Ao longo dos anos, cartas publicadas por alguns doadores indicaram que
eles tinham a expectativa de contar com a retribuição da caridade de terceiros, caso
encarassem má sorte no futuro (Atwater & Robboy, 1972). O público e os sujeitos alvos
de simpatia deviam a seus benfeitores deferência, gratidão e simpatia futuras.
O recebimento de simpatia alheia pode colocar a pessoa agraciada não somente
um, mas dois degraus abaixo: primeiro, por ter seus problemas sublinhados; segundo, por
contrair uma dívida. O ator que se encontra dois degraus abaixo pode ter bastante
dificuldade em recuperar seu lugar. Jim Mulcahy descreveu a estratégia usada por sua
mãe para induzir culpa: ela, de vez em quando, oferecia simpatia a ele para sublinhar sua
incapacidade de atender a solicitações dela. Quando ele sentia culpa, ele tentava reverter
a estratégia dela:

Minha mãe dizia “Faz tempo que não tenho notícia tua. Está tudo bem? (...) Então ela
dizia, “estou com uma gripe horrível”, ou algo assim (...) Você se sentia muito mal. Você
se sentia péssimo. Você sentia tipo “Porque eu não telefonei para ela ontem à noite, ao
invés de esperar até hoje?”. Eu tentava passar por cima disso rápido, e falar de outra coisa:
“Você foi ao cabelereiro hoje? O que mais você está fazendo?”. Eu gostava de fazer com
que ela parasse de lamentar por si mesma, para que eu não tivesse que me sentir tão mal
por não ter telefonado, ou por não expressar simpatia pelo que ela estava sentindo. Talvez
eu estivesse devolvendo o fardo de volta pra ela.

Jim também se sentia em dívida por dádivas anteriores de sua mãe. Nas palavras
dele: “mães são, provavelmente, um bom exemplo [de pessoas às quais alguém deve
simpatia], particularmente a medida que elas ficam mais velhas. É provável que na
juventude elas nunca pedissem isso. Tudo era doação. Então, quando ela foi ficando mais
velha, ela gostava de receber essas gentilezas, coisa que é natural”
Ainda assim, pessoas que recebem simpatia alheia frequentemente consideram a
dívida questionável. A profissional cujos comentários abriram este capítulo ofereceu
nítida evidência deste tipo de reação. Ela sentia que devia gratidão pela confusa e dolorosa
exibição de simpatia de sua colega de trabalho. A sensação de estar devendo a outra
pessoa, e os futuros envolvimentos que isto implicava, talvez seja parte da razão pela qual
se rejeita a simpatia oferecida por pessoas das quais não se é íntimo.
Uma mulher irlando-americana de 22 anos, solteira, estudante de graduação
trabalhando em empregos de meio-expediente, relatou um exemplo incomumente público
de geração de dívida pela oferta de simpatia. Seu pai, um músico de jazz divorciado de
quase 50 anos, desenvolvera um tumor maligno no cérebro. Ele não tinha meios para
sustentar a si mesmo, e não tinha seguro médico para cobrir as crescentes despesas com
cirurgias e cuidado médico de rotinha:

Certa noite, recebi um telefonema de Fred, outro músico que costumava tocar com meu
pai anos atrás. Fred, até então, não sabia que meu pai estava doente, e quando soube,
decidiu pegar um vôo saindo da Califórnia e realizar um concerto surpresa beneficente
por meu pai. Estávamos muito contentes – meu tio, minha avó e eu. Cerca de trezentos
músicos de todo o país, músicos famosos que todo mundo conhece, estavam vindo, por
respeito a meu pai. O modo como a coisa aconteceu, contudo, foi frustrante. Meu pai
estava muito fraco, mas meu tio o levou ao salão, e ele ficou sentado a noite inteira em
uma mesa longe da banda, de modo que o som não o deixasse com dor de cabeça. Quando
as pessoas chegavam, elas se aproximavam e entregavam cheques em mãos a ele ou a
uma pessoa da família, e depois não sabiam o que dizer. Elas tentavam não olhar para
meu pai, para não demonstrar o quão chocadas elas estavam pelo fato de ele estar em um
estado tão ruim. A pior parte era que a única coisa sobre a qual eles falavam era como
Fred era maravilhoso. Ele estava sendo tão generoso, em dedicar tempo à realização do
concerto! Ele era um anjo! Aquela acabou se tornando a noite de Fred, ao invés de meu
pai. A família inteira simplesmente sentou à mesa, e ficávamos dizendo uns para os
outros, “Como poderemos um dia retribuir por tudo isto?”. Antes mesmo da metade da
noite, meu tio disse: “Temos que começar imediatamente a planejar algo para retribuir a
todos”. Tentei agradecer a Fred tanto quanto pude, e a todos os outros também, mas de
fato, a família jamais vai superar a sensação, o fardo, de fato, de dever tanto a ele. O peso
disso seguramente toma muito de nós (Notas de campo).

O magnânimo Fred conseguiu fortalecer seu próprio lugar (estratégia 02) e reduzir
o lugar do homem sendo ostensivamente honrado.
Outros casos de expressar simpatia para gerar dívida envolviam colegas de
negócio, conhecidos, e até mesmo membros da família que oferecem simpatia a pessoas
que recentemente se tornaram viúvas, na expectativa de lucrar materialmente com isto.
Estas ofertas de simpatia tentam gerar uma dívida que poderia ser apagada através de
retribuição com bens materiais, dinheiro vivo ou outros favores. Por exemplo, alguns
respondentes contaram histórias sobre parentes pagando mais do que pretendiam por
caixões ou serviços funerários porque achavam que eles deviam algo a agentes funerários
solícitos e que expressavam simpatia. Uma gerente de pessoal aposentada, WASP, na
casa dos 50, falou sobre como a simpatia pela morte recente de seu marido a deixava
desconfiada e desconfortável:
De início, eu estava em negação, e todas essas pessoas continuavam mandando cartões e
telefonando. Eu ficava dizendo para mim mesma, “Ei, eu estou viva. Eu tenho dinheiro o
suficiente. Nós, de qualquer maneira, não tínhamos um bom casamento. Porque você está
lamentando pelo que aconteceu comigo? Eu consigo dar conta disto”. Algumas destas
pessoas eram sinceras, acho, mas outras estavam indo ao funeral para comer e participar
de uma festa. E alguns queriam que eu ficasse em dívida com eles. Por exemplo, o
vereador da cidade. Ele era, de certo modo (suponho), um colega de Bill. Mas sejamos
francos. Tudo que ele queria de fato era meu voto. Suponho que ele pensou que eu acharia
especial o fato de ele ter prestado atenção em mim, e que ele poderia contar comigo na
próxima eleição.
Então, algumas pessoas me ofereciam falsa simpatia, de modo a me vitimizar. Por
exemplo, o suposto melhor amigo de Bill. Ele me chamou e disse: “oh, eu o amava como
a um irmão. Se houver qualquer coisa que eu possa fazer por você (qualquer coisa no
mundo), eu farei. Deixe que eu compre o carro de Bill de você”. Então eu disse: “quanto
você me daria por ele?”. Ele respondeu: “Querida, o melhor que posso fazer por você são
treze mil dólares. É o melhor que posso fazer”. Bem, aquele carro tinha rodado apenas 28
milhas. Respondi que eu não precisava tanto assim daqueles treze mil dólares.

Sinto uma ponta de culpa por te contar sobre este outro incidente, mas enfim. Quando
retornei a minha casa após o funeral, eu estava igual um zumbi. Então, Charlie e Janice
vieram do outro lado da rua, dizendo, “Meu Deus! É tão terrível! Deixa a gente te ajudar”.
Charlie queria me ajudar a tirar as coisas de dentro do carro. Ninguém, em todos os anos
anteriores, jamais me ajudara a trazer as compras pra dentro de casa. Porque estavam me
ajudando agora? Veja, para início de conversa, nós não tínhamos essa proximidade toda.
O corpo de meu marido nem tinha esfriado, e Charlie aparece querendo uns livros da
coleção de livros raros de Bill. Ele veio depois e falou: “Deixe nós, homens daqui de
perto, te ajudar”. O que ele queria de fato dizer era: “você tem que ter um homem aqui
para te ajudar”. Com uma insinuação sexual. Bill costumava andar com Charlie, e me
contara que ele flertava muito com as mulheres da vizinhança. Então, isso me assustou, e
me deixou bastante desconfortável (Notas de Campo).

Esta recém-viúva teve o cuidado de assinalar que a expressão de simpatia de


muitas pessoas era sincera. Ainda assim, até mesmo a simpatia sincera a fazia se sentir
constrangida ou inadequada. Ela disse, “bem, eu não queria encarar pessoas desse jeito,
então me hospedei em um hotel”.

Estratégia 05: Criando um desequilíbrio emocional

Outra estratégia que pode melhorar o lugar de alguém (ou diminuir o lugar do
outro) é a criação de um desequilíbrio emocional. Os atores podem exibir simpatia que
evoca mais emoção nos outros do que aquela que eles próprios sentem. Este tema possui
algumas variações. A oferta simpatia ante, digamos, a perda de um ente querido, uma
cirurgia iminente, uma deficiência ou algo que desfigure a pessoa, impele estes problemas
ao primeiro plano na interação. Como resultado, a pessoa com o problema pode começar
a sentir novamente a tristeza, preocupação ou humilhação que ele ou ela cuidadosamente
comprimiu sob a superfície de modo a seguir com a vida cotidiana. Ideias e sensações
sobre o problema podem povoar nossos pensamentos sobre eventos mais próximos.
Exibições emocionais como lágrimas, agitação ou rubor podem ocorrer, colocando a
pessoa em desvantagem na interação, no momento presente e no futuro. Ela pode se sentir
insegura e duvidar de si mesma. Como disse Jim Mulcahy, “Fico desconfortável quando
as pessoas chegam e expressam simpatia. Me desligo disso rapidamente e vou fazer outra
coisa. Estou em paz com a morte de minha mãe. Isto foi duas semanas atrás. Não quero
remoer os aspectos sofridos disto. Não quero sentar e falar sobre tristeza”.
Mesmo que a pessoa que é alvo de simpatia não reviva emocionalmente seu
problema, ela pode se sentir perturbada ou surpresa e se tornar mais emocional que a
pessoa que oferece simpatia. Deste modo, é possível destruir a compostura da pessoa que
recebe simpatia. Como Stephen Potter (1948, 1950, 1952) assinalou, tempos atrás – em
seus bem humorados porém reveladores livros sobre alcançar a vitória usando artimanhas
questionáveis porém não ilícitas (gamesmanship), sobre obter sucesso na vida
aparentando sucesso (lifemanship), e sobre como conquistar prestígio inferiorizando o
próximo (one-upmanship) – provocar o descontrole em outra pessoa pode inferiorizá-la
no plano da interação. Uma mulher branca de 44 anos descreveu esta estratégia em termos
gerais: “A simpatia é o grande put-down.5 Quando alguém diz que lamenta por mim, e eu
sei que ela quer me por para baixo, fico com raiva mas frequentemente machuca. Certas
vezes, me sinto inadequada e ‘defensiva-ofensiva’ (...) Eu ataco de volta, e depois sinto
raiva por ter sentido tanta raiva” (escrita livre). Jim Mulcahy nos oferece um exemplo
disto:
Já vi situações em que não eram de simpatia transbordando, mas de uma pessoa tentando
jogar um jogo de poder com você. Um cara chega e diz “nossa, você está bem?”, e de
súbito você diz pra si mesmo “Eu pareço não estar bem?”, ou algo parecido. Tinha um
cara que entrava todo dia de manhã dizendo “nossa, você tá se sentindo bem?”. Eu
respondia, “estou bem sim”. E eu pensava, porque preciso me justificar para este FDP a
essa hora da manhã?6 Ele não estava chateado por mim. Talvez ele não estivesse jogando
comigo, mas eu não me sentia convencido.

A simpatia pode produzir embaraço, e o embaraço pode “atordoar quase até o


ponto da paralisia” (Scheff e Retzinger, 1992, p.135).

Rejeitar a simpatia alheia para proteger seu próprio lugar

Dado que a simpatia pode rebaixar de diversas maneiras, a oferta de simpatia pode
criar ou perpetuar hierarquias. Como a profissional citada no início deste capítulo, a
pessoa que é alvo da simpatia pode se sentir diminuída e aceitar essa leitura das
configurações de lugar. Por exemplo, quando se acredita que o outro não está agindo de
forma proposital, os destinatários da simpatia frequentemente relatam que se sentiam
magoados ou feridos. A mágoa é uma emoção demarcadora de lugar, que sinaliza maior
inferioridade ou distância do que o esperado. Outros sujeitos mencionaram sentir
embaraçadas, incompetentes, inferiores e atordoadas: emoções que assinalam ou
instituem um lugar inferior.
A oferta de simpatia também pode ter consequências ruins para uma relação. Por
exemplo, uma jovem mulher branca que trabalhava como contadora descreveu uma
amizade que desmoronou:

Uma das últimas vezes em que uma pessoa disse que lamentava pelo que eu estava
passando acabou se tornando um conflito entre a pessoa e eu. Fiquei imediatamente

5
“Put-down” é um comentário ou ato de menosprezo, considerado frequentemente intencional, que visa
rebaixar a pessoa à qual esse se dirige.
6
No texto original “Why do I have to justify myself to this SOB first thing in the morning?”, SOB é um
acrônimo para a expressão “son of a bitch”.
furiosa e defensiva, e comecei a questionar porque essa pessoa se sentia dessa maneira.
Eu não queria que essa pessoa sentisse qualquer simpatia por mim (...). Fiquei com tanta
raiva de que alguém pudesse se sentir daquele modo e falar aquilo sem considerar como
eu estava me sentindo (...). Por vezes, “dizer algo” é diferente de “dizer algo acreditando
no que se está falando” (...). Isso feriu meu orgulho. (Escrita livre).

Como a descrição oferecida por ela sugere, o recebimento de simpatia que


inferioriza pode resultar em uma sequência ou mistura de emoções que começa com uma
sensação de inferioridade e passa para um anseio por replicar com contra-alegações de
lugar. Como um jovem homem branco que trabalhava como estoquista colocou,
resumidamente: “primeiro me sinto ferido, em seguida me sinto com raiva” (escrita livre).
O gerente na casa dos 50 anteriormente citado, que disse que era necessário descobrir os
motivos sob a simpatia alheia, escreveu, com uma linguagem incomum, uma advertência
contra a aceitação da perda de lugar:
Muitas pessoas, ao receber simpatia indesejada, simplesmente tomam uma atitude
defensiva e assumem o papel de estar condenado, ao invés do papel assertivo de “você
precisa justificar seu comentário!”. Se a cabeça fria prevalecer, então a discussão toma a
forma de perguntas e respostas que definam a situação e validem quaisquer comentários
que estejam por trás da simpatia inicial. Se o acusador persistir no ataque, a vítima precisa
contra-atacar com força e coragem (Escrita livre).

Uma dona de casa branca na casa dos 30 ofereceu também um exemplo de um


encontro que deflagrou uma cadeia de emoções e ações:

Ano passado, tivemos um problema com a professora de Jennifer, e o levamos ao diretor


da escola, que era extremamente condescendente em sua expressão de simpatia (...). Então
levamos o assunto ao superintendente (...) Quando algo assim acontece, sempre descubro
um jeito de lidar com isso de modo a me sentir melhor, que eu não deixei aquilo que
chatear por tanto tempo e que eu fiz o melhor possível para achar uma solução (escrita
livre).

A solução a que ela se refere, neste caso, foi levar o assunto ao superintendente
escolar, reafirmando seu lugar e rebaixando o diretor condescendente.

* * *

Neste texto, inspecionamos a subestrutura microhieráquica da economia


socioemocional. Vimos algumas variedades de oferta de simpatia que comportam
desagradáveis mensagens micropolíticas. As pessoas podem se sentir magoadas, traídas
ou com raiva ante os gestos de simpatia de terceiros, porque receber a simpatia alheia
pode deslocar uma pessoa um ou mesmo dois degraus abaixo. Uma pessoa que aceita a
simpatia está, em essência, admitindo estar em uma situação ruim (ou seja, pior do que a
situação da pessoa que oferta a simpatia), e contraindo uma dívida pela dádiva emocional.
Não é surpreendente, portanto, que muitos respondentes tenham considerado o
recebimento de simpatia algo estranhamente humilhante ou enfurecedor. Quer a pessoa
que oferta simpatia esteja ciente ou não, agindo de forma deliberada ou inadvertida, a
dádiva da simpatia pode evocar emoções no destinatário que rebaixam sua imagem de si
e sua sensação do lugar que ocupa. Consciente ou inconscientemente, as pessoas podem
oferecer sua simpatia de maneira estratégica. Elas podem gerar obrigações nos outros,
cair nas graças de uma pessoa, ressaltar os problemas dos outros, ressaltar sua própria
magnanimidade e seu valor moral superior, ou perturbar, desequilibrar e tirar a outra
pessoa do eixo. Na medida que o capital social e cultural de um ator ajuda a estabelecer
seu lugar, a estrutura social mais ampla é reproduzida na micropolítica das trocas de
simpatia. Os atores sociais usualmente querem preservar ou elevar seu poder interpessoal,
seu lugar social e sua imagem de si; vimos aqui que as posturas que eles assumem quanto
a dar e receber emoções, tais como a simpatia, podem ajudá-los nisto.
Poderiam outras emoções positivas ser utilizadas micropoliticamente? A gratidão
pode operar da mesma maneira, se o doador implica que o destinatário simplesmente
desempenhou o papel menor de um auxiliar. O mesmo vale, creio, para a “paciência”,
para o “gostar” (liking), para o amor e outras emoções que consideramos que assinalam
proximidade ou igualdade. A paciência, por exemplo, pode significar a compreensão e
preocupação de “A”. Ela também comunica a mensagem de que “B” é uma pessoa
deficitária ou lenta, e que “A” está resistindo ao uso da estratégia 1, sendo gentil o bastante
para não apontar estas falhas de maneira mais dolorosa. Contudo, acredito que a simpatia
é uma emoção ajustada de um modo totalmente único às micropolíticas emocionais. A
simpatia tem como premissa os problemas das pessoas, e pessoas com problemas são
especialmente vulneráveis aos avanços micropolíticos de terceiros. Ainda que a simpatia
possa operar cimentando vínculos sociais, é também verdade que ela opera como
nenhuma outra emoção na ampliação de distâncias microhierárquicas entre pessoas.

Tradução, para uso didático, por Leandro de Oliveira.

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