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ָ‫ייום ייהָווה‬

APOSTILA DE ESCATOLOGIA
O DIA DO SENHOR
Pr. A. Carlos G. Bentes
DOUTOR EM TEOLOGIA
ÍNDICE

INTRODUÇÃO 3

O PLANO DA REDENÇÃO É O ÂMAGO DA ESCATOLOGIA 4

O CENTRO DA MENSAGEM ESCATOLÓGICA É A COLOCAÇÃO APROPRIADA DE: 5

AMILENISMO 6

A História do Amilenismo 7

PÓS MILENISMO 12

PANORAMA DO PÓS MILENISMO 13


A História do Pós milenismo 14

UMA CONSIDERAÇÃO DE ARGUMENTOS EM FAVOR DO PÓS MILENISMO 16

PRÉ MILENISMO 22

UMA CONSIDERAÇÃO DOS ARGUMENTOS EM FAVOR DO PRÉ MILENISMO 31

O PRÉ MILENISMO HISTÓRICO 36

PRÉ MILENISMO DISPENSACIONAL 37

OS TRÊS ESTÁGIOS DO DISPENSACIONALISMO 38

DISPENSACIONALISMO 46

QUADRO DAS DISPENSAÇÕES 55

CONCEPÇÕES ACERCA DAS ÚLTIMAS COISAS 56

DOUTRINAS TRIBULACIONISTAS 58

CONCLUSÃO 76

BIBLIOGRAFIA 77

2
INTRODUÇÃO

A Teologia Sistemática vem desenvolvendo-se desde os primórdios e em cada época se prende a


um tópico das doutrinas bíblicas. No século II, a Igreja lidava especialmente com a Apologética e as
ideias fundamentais do cristianismo; nos séculos III e IV, com a doutrina de Deus; no século V, logo no
início, lidava com a Antropologia e a Hamartiologia; do século V até o VII, com a Cristologia, nos
séculos XI até XVI, com a expiação, no século XVI, com a aplicação da Redenção. Agora, o interesse
especial da Era Moderna é a Escatologia, o único tópico da teologia que ainda sobrava para ser
desenvolvido. Há cem anos atrás, James Orr (1844-1913) predisse que o século XX seria a era da
escatologia. Estamos no século XXI e o interesse só aumenta.
Escatologia é o estudo dos eventos que estão para acontecer segundo as Escrituras. O termo
escatologia deriva do grego, eskhatos (ἔσχατος), que significa “último”, e logia (λογία), que significa
“tratado” ou “estudo” de um conjunto de ideias.
O estudo da Escatologia é imprescindível, quer seja abordado no terreno da ciência, da filosofia ou
da religião. O homem vive perenemente a procurar a verdade concernente ao seu destino do Universo no
qual habita. Como ser racional, ele indaga: “Morrendo o homem, porventura tornará a viver?” (Jó 14.14).
E nos apressamos em acrescentar: “Como podemos estar certos acerca de uma vida futura, relacionada
com a existência presente?”.
Três doutrinas principais destacam-se universalmente como afirmadas por todos os cristãos –
exceto os que com relutância precisam ser considerados hereges – ao longo de dois milênios. A primeira
é que Jesus Cristo retornará à terra. Isso às vezes é conhecido como fé na parousia, que significa
“aparecimento” ou “vinda”. Cristãos de todas as tradições, tribos e denominações aguardam a segunda
vinda de Jesus Cristo. A segunda convicção de todos os cristãos acerca do futuro coletivo é que, quando
Cristo retornar, ele há de estabelecer ou manifestar completamente a ordem e a soberania de Deus – o
reino de Deus – que já está operando na história. A terceira fé cristã unificadora sobre a escatologia
universal é que, no fim, Deus criará um novo céu e uma nova terra que durarão para sempre. A maioria
dos cristãos considera o novo céu e a nova terra uma continuação da criação original – sua redenção pela
renovação. Alguns poucos consideram essa realidade futura uma criação completamente nova depois da
destruição deste mundo. Todos concordam que humanos ressuscitados e redimidos habitarão com Deus, e
Deus habitará com eles em uma utopia que jamais acabará.1
A Escatologia cristã, centralizada na Bíblia, é uma apresentação positiva das promessas baseadas
nas palavras irrevogáveis de um Deus Eterno e imutável. Não existe vida, presente ou futura, à parte de
Deus, a qual se torna possível por intermédio de seu Filho Jesus Cristo. Foi Ele quem disse: “Eu vim para
que tenham vida, e a tenham em abundância”. (Jo 10.10; 11.25,26; 14.1-3).
“Se o cristianismo não for uma escatologia radical, ele não terá relação com Cristo” (Karl Barth).
A segunda vinda de Jesus Cristo à Terra e os acontecimentos pertinentes à mesma criam um
alicerce de esperança, consolo e bendita antecipação, que para sempre mitiga a sede do povo de Deus,
cansado do pecado, do sofrimento e da tristeza associada à peregrinação terrena. Deus tem um plano
eterno e um propósito, revelado nas Escrituras através de muitas passagens (Ef 3.10,11; Is 46.10; 2Rs
19.25; Ap 1.6). Em Escatologia Bíblica estudamos parte deste propósito.

1
OLSON, Roger E. História das Controvérsias na Teologia. 1ª ed. São Paulo: Editora Vida, 2004, p. 480,481.
3
DE UM MODO GERAL, HÁ QUATRO MANEIRAS DE INTERPRETAR A ESCATOLOGIA
BÍBLICA:
1. A preterista - vindica a revelação do passado, interpretando a Escatologia em relação aos judeus e
cristãos como em relação ao império Romano e à História.
2. A espiritualista - trata tudo como símbolos, e nada é literal, tudo é figurado.
3. A histórica - tudo vem-se cumprindo através da História.
4. A futurista progressiva - crê que tudo está por acontecer no seu devido tempo e lugar. Crê no
cumprimento profético da Revelação no passado, presente e futuro. Embora muitos escritos
proféticos tenham sido revelados através de simbolismo, todavia terão cumprimento literal.

No estudo da Teologia Sistemática há um fio de prata. Ele liga todos os módulos da Sistemática:
Bibliologia, Teontologia, Cristologia, Antropologia, Angelologia, Hamartiologia, Soteriologia,
Eclesiologia, Pneumatologia e Escatologia. O fio de prata da Teologia Sistemática é a doutrina da
Redenção, doutrina esta balizada na Pessoa Teantrópica do Redentor – Goel - ‫ גאל‬- O Parente Remidor.
Rompendo-se o fio de prata da Teologia da Sistemática esta morre. O fio de prata da teologia é o
plano da Redenção alicerçado na Doutrina do Parente Remidor – O Goel - Jesus Cristo, o Resgatador dos
Judeus, dos Gentios, da Igreja e do Cosmos.
O tema central da Bíblia é a Redenção.2
O tema divide-se assim:
1. O Antigo Testamento: a preparação do Redentor.
2. Os Evangelhos: a manifestação do Redentor.
3. Os Atos: a proclamação da mensagem do Redentor.
4. As Epístolas: a explicação da obra do Redentor.
5. O Apocalipse: a consumação da obra do Redentor.
“A redenção obtida por Jesus Cristo é cósmica no sentido em que restaura toda a criação”.
“Essa confissão fundamental tem duas partes distintas. A primeira é: a redenção significa
restauração – ou seja, o retorno à bondade de uma criação originalmente incólume, e não meramente a
adição de algo supracriacional. A segunda é: essa restauração afeta toda a vida criacional, e não
meramente alguma área limitada dela”.3
“A cosmovisão reformada se distingue das demais em alguns pontos fundamentais. Primeiro, ela
estabelece a autoridade suprema das Escrituras, entendida como a revelação da mente de Deus ao homem
como único ponto de partida para a construção de uma cosmovisão essencialmente cristã. Em segundo
lugar, ela oferece um escopo integral não dualista para a formação de uma cosmovisão a partir da união
dos três aspectos fundamentais da revelação bíblica, a tríade criação-queda-redenção. E por último
salientamos a visão reformada plena da soberania de Deus sobre a criação e o escopo integral da queda e
a redenção total de Deus, em Cristo Jesus”.4
O PLANO DA REDENÇÃO É O ÂMAGO DA ESCATOLOGIA
A Doutrina da Redenção abrange:
1) A Doutrina do Parente Remidor - GO’EL (Rute, Lv 25.25-34; Dt 25.5-10 ).
2) A Doutrina da Redenção da Terra - (Rm 8.18-23; Lv 25; Zc 14.4,5,8,10; Is 35.1,2,13; 11.5-9; Jl
2.22-27; Is 65.20 etc.).
3) A Redenção das Nações (Gn 9.12-17; Ap 10; Zc 14.16-19; Ap 21.24; 22.2; Is 60.3).
4) A Redenção de Israel (Am 9.15; J1 3.20,21; Is 60.4-12).
5) A Redenção do Homem (Ef 1.13,14; Rm 8.23,24; l Jo 3.1,2; Fp 3.21; Ap 1.5,6).

2
PAUL, Hoff. O PENTATEUCO. 6ª impressão. Belo Horizonte: Editora Betânia, 1995, p. 4.
3
WOLTERS. Albert. M. Criação Restaurada. 1ª ed. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2006, p. 79.
4
CARVALHO, V. R. G. COSMOVISÃO CRISTÃ E TRANSFORMAÇÃO. Viçosa, MG: Editora Ultimato, 2006, p. 53.
4
O CENTRO DA MENSAGEM ESCATOLÓGICA É A COLOCAÇÃO APROPRIADA DE:
O trono de Davi, na profecia (2 Sm 7.12-16; S1 89.34-37; Is 9.6,7; Zc 14.9,16-19 ).
A pessoa que se assentará nesse trono (Lc 1.31-33; Ap 20.6; Jr 23.5; 2 Sm 7.14-17; Mt
19.28;25.31).
A menos que essas verdades sejam claramente definidas, recebendo alicerce bíblico, a profecia
perderá a sua significação e vitalidade, surgindo assim certa incoerência, que tende a confundir e não a
esclarecer.
Deus trata com três povos:
1. Israel;
2. Igreja;
3. As Nações (Gentios)
“Portai-vos de modo que não deis escândalo nem aos judeus, nem aos gregos (Gentios), nem à
igreja de Deus” 1Co 10.32).

5
EXISTEM TRÊS LINHAS ESCATOLÓGICAS:
1. Amilenismo; 2. Pós-Milenismo; 3. Pré milenismo.

AMILENISMO

Amilenismo - Embora seja o mais claro e simples dos sistemas, o amilenismo apresenta
dificuldades especiais. Este ponto de vista pode ser declarado de modo breve: não haverá um reino
terrestre de Cristo de mil anos de duração.
O amilenismo não crê em duas ressurreições físicas (Ap 20.4-6). A primeira ressurreição, dizem os
amilenistas, é espiritual, a segunda é física. Vários autores advogam este sistema, entre os quais Floyd, E .
Hamilton e Ray Summers.
A outra doutrina importante do amilenismo é a sua interpretação dos mil anos em Ap 20.2. Neste
texto, fala-se de Satanás sendo preso por mil anos, e em Ap 20.4, daqueles que foram decapitados por
causa de seu testemunho de Jesus, reinando com Ele por mil anos. Para os amilenistas, estes mil anos não
são uma expressão literal, para eles estes mil anos constituem o período da Ressurreição do Senhor até a
Parusia. Acham que Cristo está reinando, de modo espiritual, nos corações dos salvos. Acham que a Igreja
é a Novo Israel de Deus.

Panorama do Amilenismo5

Ao examinarmos os aspectos gerais do amilenismo, talvez nosso procedimento melhor seja notar
aquelas doutrinas que tem em comum com o Pós-milenismo. A primeira é que a segunda vinda de Cristo
inaugurará a era final e o estado final tanto para crentes como para incrédulos. Isto quer dizer que a
segunda vinda será seguida imediatamente pela ressurreição geral, o julgamento de todos os homens, e a
consignação de todos para seus para seus estados futuros e finais. Não haverá período de transição,
nenhum reino terrestre e pessoal de Cristo, nenhum milênio. Estes eventos se seguirão em sequência
rápida, sem qualquer período de tempo interveniente que se possa notar.
O segundo aspecto (compartilhado com a maioria dos pós milenistas) é que os mil anos em
Apocalipse 20 são simbólicos mais do que literais. Outro modo de dizer isto é declarar que a referência
aos mil anos é atemporal. O pós-milenista acredita num reino terrestre de Cristo, mas com Cristo ausente
ao invés de presente. Esta crença, no entanto, não se baseia em Apocalipse 20; na realidade, esta
passagem é considerada irrelevante à questão.
5
ERICKSON, M.J. Um estudo do Milênio. Opções contemporâneas na Escatologia. 2ª ed. São Paulo: Edições Vida Nova,
1986.
6
Além disto, as duas ressurreições em Apocalipse 20 não exigem, como argumenta o pré milenista,
um milênio interveniente. Os amilenistas estão de acordo que as duas ressurreições não são físicas.
Alguns amilenistas, no entanto, consideram a primeira ressurreição como sendo espiritual e a segunda
como sendo física; outros consideram as duas ressurreições como sendo espirituais.
Finalmente, as profecias são menos literais do que a maioria dos pré milenistas as consideram.
Estas profecias não serão cumpridas num período terrestre de mil anos; tendem, pelo contrário, a serem
cumpridas dentro da história da igreja, ou, nalguns casos, na “nova terra”.
Há, além disto, alguns pontos de congruência entre o amilenismo e o Pré milenismo. O primeiro é
o ponto de vista pessimista. O amilenista não antevê um crescimento da justiça em escala mundial, que se
estenderá a todas as áreas da sociedade. Os amilenistas variam quanto às suas estimativas de quão bem-
sucedida será a pregação do evangelho. Alguns concedem a possibilidade de conversão em escala
mundial e, neste caso, todos confessarão Cristo como Senhor, e poderemos dizer que o reino de Cristo
está presente, que chegou o Seu domínio. Muitos amilenistas, porém, duvidam que a evangelização será
tão bem-sucedida assim. O número dos que creem e são salvos será, portanto, apenas um pequeno
segmento ou remanescente da população do mundo. Embora os amilenistas não tenham prazer nesta
perspectiva, acreditam que seja consistente com o ensino da Escritura e com o curso recente dos eventos
do mundo. Logo, o amilenista pode ter tanta certeza quanto o pré milenista típico de que a fé de muitos se
esfriará.
Além disto, o amilenista acredita na iminência da segunda vinda de Cristo. Embora este termo tenha
vários matizes diferentes de significado, quer dizer, de modo geral, que o Senhor poderia voltar a
virtualmente qualquer tempo. Para o pós-milenista, o Senhor não voltará até que o evangelho tenha sido
propagado até aos confins da terra e o mundo tenha desfrutado de um período de paz. O amilenista e o pré
milenista, no entanto, não acreditam que estes fenômenos precederão a vinda do Senhor. Logo, sem
eventos importantes de longa duração ainda a serem cumpridos, o Senhor poderia vir a qualquer
momento. Deve ser notado, no entanto, que embora esta doutrina seja compartilhada pelos amilenistas e
pelos pré milenistas, não produz a mesma atitude ou tom no amilenista típico que produz no pré
milenista. Logo, o amilenista raras vezes lastima a deterioração das condições do mundo nem condena a
cultura presente. Tem preocupação marcantemente menor com os detalhes e a sequência das últimas
coisas e menos curiosidade acerca dos “sinais dos tempos”.Na realidade, o assunto inteiro da escatologia
parece receber menos atenção dos amilenistas dos que dós teólogos pré milenistas, especialmente
daqueles que são dispensacionalistas. O amilenismo genuíno tem um gênio todo seu.

A História do Amilenismo 6

Alguns têm achado elementos amilenistas bem cedo na história da igreja. Dietrich H. Kromminga,
um pré milenista, discerniu na Epístola de Barnabé “um tipo muito primitivo de escatologia amilenista” e
a Epístola de Barnabé é um dos escritos cristãos mais antigos fora da própria Bíblia. O argumento de
Kromminga, no entanto, é disputado por outros estudiosos da história da igreja. Mesmo assim, o
amilenismo tem estado presente, numa forma nem sempre diferenciada do pós-milenismo, durante longos
períodos da história da igreja.
Ainda que não tenha havido nenhum amilenismo radical nos primeiros séculos da igreja,
elementos amilenistas, no mínimo, provavelmente estavam presentes. Foi Agostinho, porém, aquele que
sistematizou e desenvolveu a abordagem. Porque ele estava na vanguarda em certo número de áreas de
pensamento, achamos nos seus escritos ênfases “confusas” que teólogos posteriores claramente
distinguiam. Logo, tanto os amilenistas quanto os pós milenistas podem, com alguma justificativa,
reivindicá-lo para a posição deles. O argumento mais significante (para os nossos propósitos) que

6
ERICKSON, M.J. Um estudo do Milênio. Opções contemporâneas na Escatologia. 2ª ed. São Paulo: Edições Vida Nova,
1986.
7
Agostinho fez é que o milênio não é primariamente temporal nem cronológico. Seu significado, pelo
contrário, se acha naquilo que simboliza. Esta tradição continuou na Igreja nas suas variedades católica e
protestante. É provável que aquilo que agora chamamos de amilenismo e pós milenismo se achassem
juntos até o século dezenove, quando o pós milenismo foi desenvolvido pela primeira vez de modo total e
abrangente.
Com o declínio do pós milenismo durante o século vinte, números consideráveis de pós milenistas
anteriores acharam necessário ajustar sua escatologia. Porque o Pré milenismo representava uma
alteração por demais radical, a maioria optou pelo amilenismo. O surto recente do amilenismo, portanto,
pode ser relacionado com os eventos que precipitaram a crise para o pós-milenismo. Para alguns, era
claramente uma mudança de doutrina. Para outros, era simplesmente adotar uma posição sobre um ponto
de vista a respeito do qual não tinham tomado posição antes. De qualquer maneira, as alternativas se
estreitaram um pouco, de modo que, na prática, a escolha está entre o amilenismo e o Pré milenismo. Os
conservadores nos grupos reformados históricos - denominações tais como a Igreja Reformada da
América, e a Igreja Reformada Cristã, bem como muitos bispos presbiterianos - são, primariamente,
amilenistas.

Amilenismo 7

A palavra amilenismo significa literalmente “nenhum milênio”. Estritamente falando, não é o caso
do amilenismo não ensinar nenhum milênio de forma alguma. A verdade é que o amilenismo não crê num
milênio literal e futuro.

O amilenismo ensina que o milênio de Apocalipse 20 é toda a era do Novo Testamento, desde a
primeira vinda de Cristo até o fim do mundo. Portanto, os mil anos de Apocalipse 20 devem ser
entendidos simbolicamente, e não literalmente.

Este ensino é baseado, primeiro, no fato que os números na Escritura, incluindo o número mil, são
frequentemente simbólicos ao invés de literais. Um bom exemplo é o Salmo 50.10, onde a Escritura
certamente não quer dizer literalmente e somente “mil montanhas”, mas todas as montanhas.

Visto que a prisão de Satanás é uma das principais características deste período de mil anos
(Apocalipse 20:1-3), o amilenismo ensina que Satanás está preso por toda a era do Novo Testamento. Ele
não está completamente preso, mas preso somente “para que mais não engane as nações” (Apocalipse
20:3, ARC). Ele está preso, em outras palavras, para que não possa impedir o evangelho de ser pregado e
resultar na conversão das nações gentílicas.

Que Satanás estava preso no tempo da primeira vinda de Cristo é claro a partir de Mateus 12.29.
Ali, numa referência óbvia à Satanás, Jesus usa a mesma palavra grega para amarrar que aparece em
Apocalipse 20:2. Ele diz aos fariseus que “o homem valente [Satanás]” deve ser amarrado. No contexto
desta declaração, Jesus está falando da vinda do reino através da reunião dos gentios, mediante a pregação
do evangelho (Mateus 12.14-21,28-30). Mateus 12.29 interpreta Apocalipse 20.2 e mostra que o resultado
da prisão de Satanás é o sucesso do evangelho entre as nações no Novo Testamento.

O amilenismo, portanto, não espera um milênio ainda porvir, mas crê que estamos no meio do
milênio agora, e que, quando o milênio terminar, o fim do mundo terá chegado. Esta era do Novo
Testamento é a última era do mundo.

7
Fonte (original): Doctrine according to Godliness, Ronald Hanko, Reformed Free Publishing Association, p. 305-306.
8
Os amilenistas não esperam um rapto mil anos antes do fim, nem uma vinda de Cristo mil anos
antes do fim, nem esperam que a grande tribulação ocorra mil anos antes do fim do mundo. Antes, eles
ensinam que todos estes eventos ocorrerão no fim e serão seguidos pelo estado eterno.

Por isso, o amilenismo ensina que a “trombeta” de 1Coríntios 15.51,52 é a última, e que seguindo
o rapto (1Tessalonicenses 4:16,17), os eleitos estarão para sempre com o Senhor na glória celestial. Da
mesma forma, no ensino amilenista a grande tribulação de Mateus 24.29 é imediatamente seguida pela
trombeta que anuncia a vinda de Cristo na aparição real de Cristo sobre as nuvens e a assembléia dos seus
eleitos.

O amilenismo não ensina um período de paz e prosperidade sem precedentes para a igreja antes do
fim, mas toma seriamente a verdade bíblica de que a grande tribulação da igreja precederá o final de todas
as coisas – que naqueles últimos dias “sobrevirão tempos difíceis” (2Timóteo 3.1), tempos nos quais “os
homens perversos e impostores irão de mal a pior” (v. 13).

Por causa disto, alguns acusam o amilenismo de pessimismo. Contudo, ele não é pessimista. Os
amilenistas creem que Cristo reina, e que com poder soberano faz com que todas as coisas, mesmo as
tristes, cooperem juntamente para o bem dos seus amados.

Avaliação do Amilenismo8

No sistema amilenista temos muitas coisas dignas de louvor e válidas, bem como pontos fracos e
até mesmo inconsistências.

Aspectos Positivos

Do lado positivo, o amilenismo reconhece que a profecia e escatologia bíblicas fazem uso de
grande quantidade de simbolismo, e as maneja de acordo. Alguns milenistas têm tratado das expressões
figuradas nas passagens escatológicas de modo por demais literal, embora poucos expositores tenham
levado a efeito este princípio de modo consistente. Algumas passagens representam bem obviamente
alguma coisa além do seu significado imediato e literal. O amilenista, de modo geral, tem procurado levar
a sério a natureza da literatura bíblica e tem perguntado o que estava sendo transmitido dentro daquele
meio ambiente cultural, reconhecendo que o simbolismo pode estar presente e operante ainda quando não
é óbvio. No seu aspecto melhor, o amilenismo também tem procurado determinar o devido significado
dos símbolos ao estudar a cultura ao invés de atribuir um significado de modo arbitrário.
Em segundo lugar, o amilenismo tem procurado fazer exegese séria da passagem bíblica relevante,
Apocalipse 20. Foi, em parte, uma resposta à pergunta dos pré milenistas: O que significa a passagem se
não ensinar um milênio terrestre? Do ponto de vista dalguém que acredita que a Bíblia é a autoridade
suprema da fé e da prática cristãs, este escrutínio da Escritura é altamente louvável. A investigação levada
a efeito por Hughes é uma tentativa eficiente de chegar ao significado. Os pormenores e o espírito aberto
a uma variedade de possibilidades estão na melhor tradição da erudição bíblica.
Parece, também, que o amilenismo tem uma filosofia realista da história. Seu conceito daquilo que
há de vir e qual a direção que a história está tomando encaixa-se bem com os desenvolvimentos recentes e
as tendências que se pode discernir. O ponto de vista amilenista leva em conta ou uma deteriorização ou
uma melhoria das condições, nem ensinando que o mundo inteiro será convertido antes da volta de Cristo,
nem que as condições do mundo inevitavelmente piorarão.

8
ERICKSON, M.J. Um estudo do Milênio. Opções contemporâneas na Escatologia. 2ª ed. São Paulo: Edições Vida Nova,
1986.
9
Aspectos Negativos

Quando consideramos as doutrinas especificas do amilenismo, bem como os argumentos em prol


dele, porém, achamos algumas dificuldades. Um grupo importante destas diz respeito à exegese de
Apocalipse 20.
A interpretação convencional amilenista é que há dois tipos diferentes de ressurreição, uma
ressurreição espiritual e uma física, respectivamente. Mediante um exame pormenorizado, no entanto,
pergunta-se se isto cria uma distinção onde não existe nenhuma. Até mesmo Hughes reconhece e admite
esta dificuldade, e oferece uma interpretação diferente para esta passagem. O mesmo verbo, ezesan, é
empregado para as duas ressurreições, e não há base contextual aparente para distinguir entre as duas.
V. 5 oferece um problema especial para esta interpretação.
Depois de afirmar que os mártires vivem e reinam com Cristo por mil anos, a passagem diz: “Os
restantes (hoi loipoi - oi( loipoi\) dos mortos não reviveram até que se completassem os mil anos”.
Embora a passagem certamente possa ser interpretada doutra forma, parece dar a entender que aqueles
participam da primeira ressurreição não participam da segunda, pois o contraste é entre os que foram
ressuscitados no começo do milênio e os que foram ressuscitados no fim. O “reviver” também se
descreve de modo semelhante. Presumivelmente os que estão com vida no começo estão com vida no fim.
Se este for o caso, e se estas devem ser tratadas como dois tipos diferentes de ressurreição, parece seguir-
se a conclusão de que os que “estão espiritualmente ressurretos, ou renascidos, não são fisicamente
ressurretos. Mas isto dificilmente se encaixaria na doutrina do amilenismo! Alguns argumentariam que
isto é atribuir um significado que não está presente. O propósito gramatical de hoi loipoi, no entanto,
parece ser fazer distinção entre os dois grupos. Deve ser notado que a segunda ressurreição não é
especificamente identificada nem nomeada, e que certamente não há sugestão alguma de que os mártires
participariam dela da mesma forma segundo a qual reviveram e reinaram como resultado da primeira
ressurreição. Certamente, o argumento do silêncio não é forte. O silêncio, no entanto é achado justamente
onde deveríamos achar alguma evidência positiva
A posição argumentada por Hughes é, conforme notamos, bem diferente daquele de Summers.
Levando em conta a força das objeções tais como aquelas notadas supra, é, de muitos modos, um
tratamento novo e original de dados familiares. Mesmo assim, quando se examina os vários elos
detalhados do argumento, revelam-se dificuldades.
Conforme notamos, Hughes reconheceu que as duas ressurreições devem ser da mesma classe,
fazendo com que ambas as ressurreições sejam espirituais. A evidência que aduziu para a asseveração
crucial merece escrutínio especial.
Argumentou que se o primeiro verbo, ezesan (“viveram”), em v. 4 é aoristo ingressivo, então o
segundo verbo, ebasileusan (“reinaram”) também o deve ser. Logo, se traduzirmos o primeiro “vieram a
viver”, devemos traduzir o segundo, “começaram a reinar”. Visto que esta ação abrange mil anos, o
resultado é claramente lúdicro. A alternativa, que pareceria preferível, é não traduzir nenhum dos verbos
como aoristo ingressivo “viveram e reinaram com Cristo durante mil anos”. A pergunta, porém, é porque
os dois verbos devem ser tratados da mesma maneira. A. T. Robertson, cuja Grammar of the Greek New
Testament in the Light of Historical Research tem sido considerada, já há muito tempo, uma autoridade
padronizada, escreveu: “Um exemplo bom é ezēsan kai ebasileusan meta tou christou chilia etē (Ap
20.4). Aqui, ezēsan é provavelmente ingressivo, embora zēsōman seja constativo em 1Ts 5.10, mas
ebasileusan é claramente constativo. Hughes tinha consciência desta referência, e até mesmo a citou
numa nota de rodapé. Mesmo assim , rejeitou-a, meramente com a explicação: “Mas isto rompe a
conexão entre ezēsan e ebasileusan, e remove ezēsan de qualquer conexão com a frase chilia etē.
“Porque, porém, ezēsan deve ser ligado com a frase chilia etē? Parece que Hughes pressupôs a posição
que estava querendo apoiar mediante o argumento - um caso clássico de petição de princípio! Hughes
deveria oferecer evidência mais substancial do que esta, especialmente diante de uma autoridade da
10
estatura de Robertson. Hughes afirmou que os conceitos de julgar e de reinar parecem ser unidos pela
expressão “as almas dos decapitados por causa do testemunho”. Estendeu esta expressão para dizer que
estas almas tanto viveram quanto reinaram por mil anos, mas deixou de apoiar esta ideia. É nesta altura
que introduziu a nota de rodapé citando Robertson.
Hughes também argumentou com base no uso contemporâneo. Disse que somente em dois lugares
no Novo Testamento é que o aoristo indicativo de zaō pode ser apropriadamente interpretado como sendo
ingressivo. À parte das fraquezas inerentes dos argumentos baseados no uso comparativo, Hughes deixou
de explicar que o aoristo indicativo de zaō aparece no Novo Testamento apenas oito vezes, ao total.
Reconhece que em duas destas ocasiões é ingressivo; os argumentos a favor dele, portanto, dificilmente
impressionam.
Outro passo crucial no seu argumento é que o termo “ressurreição” no Novo Testamento pode
significar outra coisa além da ressurreição física. Mas nos exemplos que citou, não estabeleceu
inequivocamente que a respectiva “ressurreição” é espiritual mais do que física. Por exemplo, sua
alegação de que em Lucas 20.35 Jesus fez “alcançar a era vindoura” o equivalente de “a ressurreição
dentre os mortos” é muito disputável. Hughes sugere que nada no contexto indica que Jesus estava
falando de uma ressurreição corpórea. Na realidade, porém, foi exatamente este assunto que fora
levantado pelos saduceus (que negavam uma ressurreição do corpo), e a resposta que Jesus lhes deu
evidentemente visava refutar a heresia específica deles. É provável que fosse assim que os ouvintes de
Jesus entenderam Suas palavras. Outro problema para Hughes é a falta de quaisquer critérios claros para
determinar quando uma referência à ressurreição é física e quando é espiritual. Na ausência de tais
critérios, é muito possível que todas as referências à ressurreição na Bíblia sejam espirituais. Se este for o
caso, Hughes talvez tenha tirado a base da doutrina da futura ressurreição do corpo, coisa esta que
presumivelmente não quer fazer.
Mais uma dificuldade é a sugestão de Hughes de que “os restantes dos mortos”, que não viveram
até ao fim dos mil anos, não vivem então, tampouco. Acredita que a declaração: “Os restantes dos mortos
não reviveram até que se completassem os mil anos,” é o equivalente de dizer: “a segunda morte teve
poder sobre os restantes dos mortos durantes os mil anos,” ao qual acrescentou: “e aqueles sobre os quais
a segunda morte tem poder nunca são livres do seu poder.” Esta última declaração é, naturalmente,
verdadeira se a segunda morte se refere à morte espiritual. O que seria necessário estabelecer, porém, é
que “não viveram” (v. 5) se refere à segunda morte, e não à primeira. É verdade que se diz que a segunda
morte não tinha poder sobre os que participam da primeira ressurreição, mas é possível que a primeira
morte não tivesse semelhante poder, tampouco. Se não o tiver, então poderemos entender que a
declaração: “Os restantes dos mortos não reviveram até que se completassem os mil anos”, tem o
significado mais natural de “os restantes dos mortos reviveram depois dos mil anos”.

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Pós Milenismo
Esta interpretação escatológica facilmente se confunde com o amilenismo. Afirmam seus adeptos
que o Reino de Cristo é espiritual, não geográfico, de modo que onde há indivíduos que recebem Cristo e
reconhecem Sua soberania sobre suas vidas, ai está o Reino de Deus. Há também a esperança da
conversão de todas as nações do mundo, não na totalidade, mas a grande maioria da população de todos
os povos da Terra. Assim, será inaugurado um longo período de paz entre os homens no mundo, que se
identifica com o Reino milenar. Os pós milenistas não interpretam os mil anos literalmente (Ap 20).
Afirmam que haverá um curto lampejo de maldade antes da vinda do Senhor, seguido da ressurreição de
todos, o julgamento e a consignação dos homens ao estado permanente do céu e do inferno.
As raízes do pós milenismo são reconhecíveis nas ideias de Ticônio e Agostinho. Jonathan
Edwards, primeiro presidente da Universidade de Princeton no século XVIII, e os Hodges e B.B.
Warfield, os famosos teólogos do seminário de Princeton, representavam este ponto de vista. Hoje, o Pós
milenismo tem poucos adeptos em consequência dos acontecimentos históricos, nada animadores, mais
do que pelas demonstrações de provas bíblicas.
Embora o esquema escatológico conhecido como pós milenismo não seja sustentado em grande
escala hoje em dia, teve influência bastante significante dentro da igreja durante longos períodos da sua
história, e, no decurso destes últimos cem anos tem sido, às vezes, a posição dominante.

TEMAS BÁSICOS DO PÓS MILENISMO


1. O reino de Deus é primariamente uma realidade presente; está aqui de modo terrestre. O reino não
é um império ou domínio sobre o qual o Senhor reina. É mais corretamente, o governo de Cristo
nos corações dos homens. Onde quer que os homens acreditem em Jesus Cristo, dediquem-se a Ele,
e O obedeçam, o reino está presente. Não é algo para ser introduzido de modo cataclísmico nalgum
tempo futuro.
2. O pós-milenista espera uma conversão de todas as nações antes da volta de Cristo. A pregação do
evangelho será eficaz.
3. A expectativa de um longo período de paz na terra, chamado o milênio. À medida que cada vez
mais pessoas se submetem ao plano do Senhor e começam a praticar os ensinos e modo de vida que
Ele estabeleceu, a paz será o resultado natural.
12
4. O crescimento paulatino do reino. O Reino é a contínua propagação do evangelho introduzindo
mais e mais o reino.
5. No fim do milênio haverá um período de apostasia e uma explosão de iniquidade que ocorrerá em
conexão com a vinda do Anticristo.
6. O milênio terminará com a volta pessoal e física de Cristo.
7. A volta do Senhor será imediatamente seguida pela ressurreição de todos - justos e injustos — e
pelo julgamento de todos, e sua atribuição a um dos dois estados finais e permanentes.
8. No pensamento dalguns dos pós milenistas, mas não em todos, é que a nação judaica será
convertida. Esta não é a ideia ensinada por alguns pré milenistas de que a aliança de Deus é
basicamente com os judeus, e que, depois de um interlúdio de tratar com a igreja, Deus restaurará
Israel à sua posição especial e favorecida. Pelo contrário, é uma crença que certas profecias que
ainda não foram cumpridas prometem que grandes números de judeus sério convertidos e entrarão
na igreja do mesmo modo que quaisquer crentes hoje.

Panorama do Pós milenismo

Um vislumbre rápido de vários temas básicos nos dão entendimento deste modo de ver as últimas
coisas.
O primeiro tema é que o reino de Deus é primariamente uma realidade presente; está aqui de
modo terrestre. O reino não é um império ou domínio sobre o qual o Senhor reina. É mais corretamente, o
governo de Cristo nos corações dos homens. Onde quer que os homens acreditem em Jesus Cristo,
dediquem-se a Ele, e O obedeçam, o reino está presente. Não é algo para ser introduzido de modo
cataclísmico nalgum tempo futuro.
Em segundo lugar, o pós-milenista espera uma conversão de todas as nações antes da volta de
Cristo. A pregação do evangelho será eficaz. Esta não será uma realização humana, realizada por meio de
grande perícia ou metodologia finamente afiada, mas, sim, uma realização divina, levada a efeito pela
obra do Espírito em convencer e regenerar os homens. Nem necessariamente cem por cento da população
será convertida; substancialmente todas as pessoas em todas as áreas e nações do mundo virão, porém, a
crer. Haverá um reavivamento em escala mundial, seja rápida ou paulatinamente. Esta cristianização do
mundo é geralmente concebida num arcabouço evangélico. A conversão de cristãos individuais, que
acreditam num evangelho da salvação pela graça, mediante a fé, levará a efeito esta transformação do
mundo. A decisão pessoal e a crença individual constituem o fulcro sobre o qual acontece o novo
nascimento.
Uma terceira doutrina do pós milenismo é a expectativa de um longo período de paz na terra,
chamado o milênio. À medida que cada vez mais pessoas se submetem ao plano do Senhor e começam a
praticar os ensinos e modo de vida que Ele estabeleceu, a paz será o resultado natural. Este é o caso,
primeiramente, dos relacionamentos entre as nações. Aqui temos um conceito verdadeiramente
revolucionário, porque dentro da história registrada, a paz em escala mundial tem prevalecido, em média,
somente cerca de uma vez cada quinze anos! Um momento de reflexão sobre os desenvolvimentos do
século XX revelará que a paz genuína, prevalecendo pelo mundo inteiro, é realmente rara. Não somente
cessarão conflitos entre as nações, como também cessarão a fricção entre as classes sociais e entre as
raças. Presume-se que cessarão as disputas trabalhistas. Cessará o conflito racial, que se dissolveria em
harmonia entre brancos, negros, índios, latinos, e outros. Até mesmo o turbilhão religioso e a competição
inter-denominacional ficarão sendo coisas do passado. Aqui temos o cumprimento da predição de que o
lobo e o cordeiro se deitarão juntos (Is 11:6). Aquele que disse: “Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou”
(João 14:27), cumprirá essa promessa em grande escala. Aquele que é chamado o Príncipe da Paz (Is 9:6)
comprovará que merece tal designação.
Deve ser notado que o pós-milenista não é literalista no que diz respeito à duração do milênio: o
milênio é um período longo de tempo, não necessariamente mil anos medidos pelo calendário. Sua
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duração seria difícil de calcular, de qualquer modo, porque o milênio não tem qualquer ponto inicial
claro. Não haverá, certo dia, uma condição de paz que estava completamente ausente no dia anterior; o
reino chegará paulatinamente.

Este, pois, é o quarto tema distintivo: o crescimento paulatino do reino. Um milenismo anterior,
como o Pré milenismo do nosso dia, sustentava que o reino milenar começaria de modo repentino e
dramático, através da volta visível e física do Senhor. O conceito pós-milenista, do outro lado, é que a
continua propagação do evangelho introduziria mais e mais o reino.
Deve ser notado também que a diferença entre a era milenar e as demais eras da vida da igreja não
é qualitativa mas, sim, quantitativa. Alguns pós milenistas dizem que o milênio abrange a totalidade do
período da igreja. Aqueles que não pensam assim, no entanto, entendem que a era presente simplesmente
irá se misturando com a era milenar, O casamento, a família e o nascimento humanos ainda estão
presentes. Ainda haverá problemas econômicos, sociais e educacionais, mas seus aspectos mais
desagradáveis serão grandemente modificados e até mesmo eliminados.
Logo, a distinção entre o Pré milenismo e o pós milenismo é mais do que aquela entre “antes” e
“depois”. Para o pré milenista, o milênio é uma qualidade de existência muito diferente das demais eras,
até mesmo um tipo diferente de mundo. Para o pós-milenista, é apenas diferente da era presente quanto ao
grau.
Em quinto lugar, no fim do milênio haverá um período de apostasia e uma explosão de iniquidade
que ocorrerá em conexão com a vinda do Anticristo. Loraine Boettner sugeriu que Deus talvez permita
esta manifestação limitada da iniquidade para demonstrar de novo e de modo mais claro que coisa terrível
é o pecado e quanto merece o castigo. É compreensível que aqueles que passaram virtualmente sua vida
inteira num ambiente de justiça dificilmente poderiam crer que o pecado, o diabo e seus seguidores são
tão ruins quanto se diz deles, ou que merecem um castigo final tal como a entrega ao inferno.
Um sexto argumento do pós milenismo é que o milênio terminará com a volta pessoal e física de
Cristo. O conceito pós-milenista da segunda vinda não é diferente daquele doutros conceitos milenistas a
não ser no seu relacionamento cronológico com o milênio.
Uma sétima crença, um corolário de certas outras, é que a volta do Senhor será imediatamente
seguida pela ressurreição de todos - justos e injustos — e pelo julgamento de todos, e sua atribuição a um
dos dois estados finais e permanentes.
Mais um elemento, que se acha no pensamento dalguns dos pós milenistas, mas não em todos, é
que a nação judaica será convertida. Esta não é a ideia ensinada por alguns pré milenistas de que a aliança
de Deus é basicamente com os judeus, e que, depois de um interlúdio de tratar com a igreja, Deus
restaurará Israel à sua posição especial e favorecida. Pelo contrário, é uma crença que certas profecias que
ainda não foram cumpridas prometem que grandes números de judeus sério convertidos e entrarão na
igreja do mesmo modo que quaisquer crentes hoje.

A História do Pós milenismo 9

Durante os dois ou três primeiros séculos da sua existência, a igreja foi, em grande medida,
milenista, e considerava os mil anos do Apocalipse de modo escatológico e futurista. A igreja acreditava
que Jesus reinaria na terra no futuro. Este reino seria introduzido por um evento específico,
provavelmente a segunda vinda do Senhor. Às vezes, este milênio era retratado de modo bastante vívido,
o que deu origem a algo chamado quiliasmo, um entendimento altamente imaginativo do período terrestre
de mil anos. Às vezes o quiliasmo era muito físico e literal no seu modo de entender a felicidade terrestre
dos crentes.! o Este conceito foi especialmente popular durante o período da perseguição da igreja,
9
ERICKSON, M.J. Um estudo do Milênio. Opções contemporâneas na Escatologia. 2ª ed. São Paulo: Edições Vida Nova,
1986.
14
quando parecia improvável que a igreja fosse bem-sucedida no seu esforço de ganhar o mundo para
Cristo mediante a pregação do evangelho. Se a igreja deveria ser vitoriosa, teria que ocorrer alguma
reviravolta dramática, cataclísmica e sobrenatural do curso dos eventos.
Um dos primeiros a questionar este ponto de vista foi Ticônio (m 3907), um donatista africano.
Introduziu uma interpretação de Apocalipse 20 que, em várias formas (especialmente conforme a
modificação feita por Agostinho) dominou a exegese daquela passagem durante aproximada· mente os
treze séculos seguintes.
Ticônio rejeitou o ponto de vista estritamente escatológico de Apocalipse 20, de acordo com o qual
descreve um reino puramente futuro de Cristo. Fê-lo, porém, de tal maneira que a esperança escatológica
não fosse completamente perdida. Esperava que o fim viesse, e isto no ano 380. Por causa de não
sabermos a data exata da morte dele, não sabemos se Ticônio sobreviveu ao ano 380, ou o que aconteceu
ao ponto de vista dele quando Cristo não voltou durante aquele ano.
O milênio se refere à era presente. Se Cristo fosse vir em 380, então o milênio viria antes. É um
período durante o qual, com a ajuda divina, os santos não somente não são vencidos pelo pecado, mas são
triunfantes. Segundo o modo de Ticônio entender, a primeira ressurreição em Apocalipse 20, que introduz
o milênio, é da morte do pecado para uma vida da justiça. Aqueles que participam da primeira
ressurreição são aqueles que nasceram de novo, e este novo nascimento é levado a efeito através do
batismo. A primeira ressurreição, portanto, é uma ressurreição espiritual: é o novo nascimento. O reino
milenar da Igreja, segundo Ticônio, duraria até o fim dos tempos, ou seja, 380. Cristo já estava reinando.
O trono da glória de Cristo é a encarnação. É no Seu corpo encarnado que Se assenta à destra do poder e
reina. Seu domínio está dentro da igreja, e é presente, não futuro. O reino de Cristo não começará com
Sua vinda; já começou. As almas dos justos em Apocalipse 20 são aqueles que morrem com Cristo na
presente aflição. Morreram antes da ressurreição física, pois somente as suas almas são mencionadas. Se
participassem do reino físico, decerto teriam corpos. O reino milenar se estende da paixão de Cristo para
Sua parusia, e os mortos bem como os vivos participam dele. Os bem-aventurados são aqueles que
mantêm seu batismo, porque, assim como a primeira morte é devida ao pecado, a primeira ressurreição é
devida ã sua remissão.
Ticônio não interpretava literalmente a palavra millennium, e via o reino de Cristo apenas como
um período prolongado de tempo. Alguns eram mais literalistas, e acreditavam que se tratava realmente
de mil anos, e ficavam muito emocionados nas suas expectativas à medida em que o ano 1.000 se
aproximava.
Agostinho (354·430) popularizou e promulgou o ponto de vista de Ticônio, a despeito dos fatos de
que Ticônio era um donatista e que Agostinho fosse o oponente principal dos donatistas. Agostinho
também tinha anteriormente entendido o milênio como sendo um sábado universal repleto de gozos
espirituais, mas já abandonara essa interpretação futurista, sendo que sua razão principal foi os exageros
desenfreados e as ideias grosserias nas descrições do milênio dadas pelos quiliastas.
Agostinho, como Ticônio, considerava que a Igreja já estava no milênio. Os mil anos ou datam dos
tempos de João até ao fim, ou abrangem a totalidade da presente era. Agostinho citava passagens tais
como Mc 3.27: “Ninguém pode entrar na casa do valente para roubar-lhe os bens, sem primeiro amarrá-
lo; e só então lhe saqueará a casa.” O valente, disse Agostinho, é Satanás. Seus bens representam os
cristãos, que anteriormente tinha sob seu domínio. Está amarrado, trancado no abismo, de modo que fique
longe dos cristãos. Satanás, portanto, está amarrado durante o período inteiro entre a primeira vinda de
Cristo e a segunda, e, destarte, é incapaz de enganar as nações das quais se constitui a igreja. No fim desta
era, será solto para testar a igreja e depois será final e completamente subjugado.
Não é difícil entender porque este retrato do milênio era atraente a Agostinho, nos tempos em que
vivia. Era, sem dúvida, afetado pelo “estabelecimento” da Igreja católica. Uma série de eventos que
culminaram na conversão do imperador Constantino em 312 e na tolerância que ele concedeu ao
cristianismo paulatinamente tornaram o cristianismo virtualmente a religião oficial do império. Parecia
que, sem qualquer interposição milagrosa de Deus, a Igreja chegara a uma posição de supremacia. À
15
medida em que o antigo Império Romano, que tinha sido o inimigo da Igreja, estava cambaleando para
sua queda, parecia que a Igreja estava para entrar na sua herança. Estava assumindo as funções políticas
do império. Este fato levou Agostinho a idealizar o lado político da Igreja católica. Foi o primeiro teólogo
a identificar a Igreja católica, na sua forma visível e empírica, com o reino de Deus.
Embora a forma exata deste ponto de vista fosse um pouco alterada (às vezes era difícil distingui-
Ia daquilo que chamamos de amilenismo) prevaleceu por muito tempo. À medida que a Idade Média se
desenvolvia, parecia sempre mais que somente grupos periféricos e excêntricos viam o milênio como
evento futuro. Aquilo que conhecemos hoje como Pré milenismo era mais e mais sujeito à suspeita da
heresia. Mui· tas denominações maiores finalmente incorporaram o pós milenismo nos seus credos. As
Confissões de Augsburg e Westminster são basicamente pós· milenistas. Os grupos luteranos,
presbiterianos e reformados tenderam a seguir esta posição. A famosa faculdade de teologia de Princeton,
nos séculos XIX e XX, representada pelos Hodge e por Benjamin B. Warfield, apresentava
incondicionalmente este sistema.
Na sua maioria, os pós milenistas clássicos acreditavam que o reino de Cristo passaria a ter
alcance mundial através da pregação do evangelho da conversão pessoal. Alguns pós milenistas, no
entanto, acreditam num rei· no menos espiritual e, portanto, num evangelho menos espiritual. O reino é
um reino literal. Estas pessoas praticavam aquilo que às vezes é chamado o Evangelho Social, segundo o
qual o mundo será transformado de fora para dentro, ao invés de vice-versa. À medida em que as
estruturas da sociedade são alteradas e a distribuição econômica disposta de outra forma, o
comportamento e o caráter das pessoas mudarão também. Alguns, que eram de persuasão mais liberal,
ressaltavam o lugar do esforço humano neste processo mais do que o lugar do Espírito de Deus.
Consideravam que o reino seria introduzido em grande medida através de agências e movimentos daquilo
que é definido a rigor como sendo a Igreja. Alguns cristãos na Alemanha até mesmo viam a política
guerreira do Imperador Wilhelm como sendo um dos meios da graça de Deus, e, na década de 1930,
alguns apoiavam o nazismo como sendo a obra de Deus. Karl Barth argumentou que semelhante conceito
deixava de distinguir o mal do bem, o demoníaco do divino. Na realidade, o fim teológico do século XIX
poderia ser datado em agosto de 1914, quando Barth viu numa lista de intelectuais que estavam
endossando as políticas do Imperador os nomes de vários dos seus professores de teologia. Devemos
notar, no entanto, que tais pessoas representavam o elemento periférico do pós-milenismo. A maioria dos
pós milenistas considerava que o caráter do estabelecimento do reino terrestre de Cristo era sobrenatural.
O pós milenismo tem sofrido um forte declínio na sua popularidade no decurso dos últimos
cinquenta a sessenta anos. Em grande medida, isto tem resultado mais das considerações históricas do que
das exegéticas. Certos desenvolvimentos pareciam fornecer evidência empírica de que o milênio não
estava chegando. Conforme notaremos mais tarde, a conexão entre estes desenvolvimentos e o abandono
do pós milenismo era mais psicológica do que lógica. Mesmo assim, o efeito estava ali. Hoje, os pós
milenistas são, senão uma espécie extinta, pelo menos uma espécie que corre perigo. Conforme observou
Boettner, no entanto, outros pontos de vista milenistas têm tido seus altos e baixos também. Este fato é
especialmente aplicável ao Pré milenismo, que estava em “baixo” durante os longos séculos da Idade
Média. É bem possível que o pós milenismo volte novamente à popularidade.

UMA CONSIDERAÇÃO DE ARGUMENTOS EM FAVOR DO PÓS MILENISMO10

Os argumentos em favor do pós milenismo são os seguintes:


1. A Grande Comissão leva-nos a esperar que o evangelho se propague com poder e acabe por
fim resultando num mundo em boa parte cristão. Jesus disse explicitamente:
“Toda a autoridade me foi dada no céu e na terra. Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações,
batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; ensinando-os a guardar todas as coisas que
10
GRUDEM, Wayne. Teologia Sistemática. 1ª ed. São Paulo: Editora Vida Nova, 1999, p. 958-962.
16
vos tenho ordenado. E eis que estou convosco todos os dias até à consumação do século” (Mt 2 8.18-20).
Uma vez que Cristo tem toda autoridade no céu e na terra e já que ele promete estar conosco no
cumprimento dessa comissão, podemos esperar que isso transcorra sem impedimentos e, por fim, triunfe
em todo o mundo.
2. Parábolas sobre o crescimento gradual do reino indicam que, por fim, sua influência cobrirá a
terra. Aqui, os pós milenistas destacam o seguinte:

Outra parábola lhes propôs, dizendo: O reino dos céus é semelhante a um grão de mostarda, que
um homem tomou e plantou no seu campo; o qual é, na verdade, a menor de todas as sementes e,
crescida, é maior do que as hortaliças, e se faz árvore, de modo que as aves do céu vêm aninhar-se nos
seus ramos (Mt 13.31-32).

Podemos também observar o seguinte versículo: “Disse-lhes outra parábola: O reino dos céus é
semelhante ao fermento que uma mulher tomou e escondeu em três medidas de farinha, até ficar tudo
levedado” (Mt 13.33). De acordo com os pós milenistas, ambas as parábolas indicam que o reino terá
influência crescente até permear e, em alguma medida, transformar o mundo inteiro.
3. Os pós milenistas também diriam que o mundo está se tornando mais cristão. A igreja está
crescendo e se disseminando por todo o mundo, e mesmo quando perseguida e oprimida, cresce de modo
notável pelo poder de Deus.
Aqui, porém, precisamos fazer uma distinção significativa. O “milênio” imaginado pelos pós
milenistas é muito diferente do “milênio” de que os pré milenistas falam. Enquanto os pré milenistas
falam de um mundo renovado, com Jesus Cristo fisicamente presente e governando como Rei junto com
os crentes glorificados em corpos ressurretos, os pós milenistas estão simplesmente falando de uma terra
com muitos, muitos cristãos influenciando a sociedade. Eles não imaginam um milênio que compreenda
uma terra renovada, ou santos glorificados, ou Cristo presente de forma corpórea para reinar (pois eles
pensam que essas coisas só ocorrerão depois que Cristo retornar para inaugurar o estado eterno). Assim,
toda a discussão do milênio é mais que uma simples discussão da sequência de eventos que giram em
torno dele. Ela também inclui uma diferença significativa quanto à própria natureza desse período.
De fato, ainda que não conheça ninguém que pense desse modo, não seria impossível alguém ser pós-
milenista e pré milenista ao mesmo tempo, com duas concepções do termo milênio. E concebível que
alguém seja pós-milenista e pense que o evangelho crescerá em influência até o mundo ser em grande
parte cristão e que então Cristo voltará, estabelecendo um reino terreno literal, levantando da morte os
crentes para que reinem com ele em corpos glorificados. Ou, por outro lado, seria razoável um pré
milenista bem otimista adotar muitos dos ensinos pós milenistas acerca da natureza cada vez mais cristã
desta presente era.

Em resposta aos argumentos pós milenistas, é possível levantar os seguintes pontos:


1. A Grande Comissão de fato fala da autoridade colocada nas mãos dos cristãos, mas isso não
implica necessariamente que Cristo usará essa autoridade para provocar a conversão da maioria da
população do mundo. Dizer que a autoridade de Cristo é grande é simplesmente outro modo de dizer que
o poder de Deus é infinito, que ninguém o negará. Mas a questão é esta: quanto desse poder Cristo usará
para conseguir o crescimento numérico da igreja? Podemos pressupor que ele a empregará de maneira
plena, obtendo a cristianização mundial, mas tal pressuposto é só isso: um pressuposto. Não é baseado em
nenhuma evidência específica contida na Grande Comissão ou em outros textos que falam da autoridade e
do poder de Cristo nesta era.
2. As parábolas da semente de mostarda e do fermento de fato nos falam que o reino de Deus crescerá
gradualmente de algo bem pequeno para algo muito grande, mas não falam da dimensão do crescimento
do reino. Por exemplo, a parábola da semente de mostarda não nos diz que a árvore cresceu até cobrir
toda a terra. E a parábola do fermento simplesmente fala do crescimento gradual que permeia a sociedade
17
(como a igreja já tem feito), mas nada diz de sua amplitude ou do efeito de sua influência (não nos diz,
por exemplo, se no final 5% da massa ficou levedada e 95% não, ou se 20% levedou-se e 80% não, ou se
600/o levedou-se e 40% não, e assim por diante). Simplesmente levamos longe demais a parábola quando
tentamos fazê-la dizer mais que isto: que o reino crescerá gradualmente e por fim exercerá influência em
todas as sociedades em que for plantado.
3. Em resposta ao argumento de que o mundo está-se tornando mais cristão, deve-se dizer que o
mundo também está piorando. Nenhum estudioso de história ou da sociedade moderna afirmará que a
humanidade progrediu muito ao longo dos séculos na luta contra a perversidade profunda e contra a vasta
imoralidade que permanece no coração das pessoas. Aliás, a modernização nas sociedades ocidentais no
século XX muitas vezes é acompanhada não de progresso moral, mas de índices sem precedentes de uso
de drogas, infidelidade conjugal, pornografia, homossexualidade, rebelião contra as autoridades,
superstição (na astrologia e no movimento da Nova Era), materialismo, cobiça, roubo e falsidade no falar.
Mesmo entre cristãos professos há indícios recorrentes de imperfeições desalentadoras na vida cristã,
especialmente nos âmbitos da moralidade pessoal e do grau de intimidade com Deus. Em lugares em que
os cristãos fiéis à Bíblia compreendem vastos segmentos da população, ainda não ocorre nada parecido
com um reino milenar terreno.2’ E verdade que o crescimento da igreja como porcentagem da população
mundial tem sido nítido em décadas recentes,22 e isso nos deve servir de grande incentivo. É possível que
algum dia vejamos uma influência muito maior do cristianismo genuíno sobre muitas sociedades e, se
isso ocorresse, faria a posição pós-milenista parecer muito mais plausível. Mas tais eventos também
poderiam ser entendidos dentro de uma estrutura pré milenista ou amilenista, de modo que a decisão final
a respeito dessas posições divergentes ainda precisa ser tomada pela interpretação dos textos bíblicos
pertinentes.
4. Por fim, devemos observar que algumas passagens do Novo Testamento parecem negar
explicitamente a posição pós-milenista. Jesus disse: “Entrai pela porta estreita (larga é aporta, e espaçoso,
o caminho que conduz para a perdição, e são muitos os que entram por ela), porque estreita é a porta, e
apertado, o caminho que conduz para a vida, e são poucos os que acertam com ela” (Mt 7.13-14). Em
vez de ensinar que a maior parte do mundo tornar-se-á cristã, Jesus aqui parece estar dizendo que os
salvos serão “poucos” em contraste com os “muitos” que rumam para a destruição eterna. De modo
semelhante, Jesus pergunta: “... quando vier o Filho do Homem, achará, porventura, fé na terra?” (Lc
18.8), pergunta que dá a entender que a terra não estará cheia daqueles que creem; antes, será dominada
pelos que não têm fé.
Contrário à ideia de que o mundo melhorará cada vez mais com o aumento da influência da igreja.
Paulo prediz que antes da volta de Cristo, virá a "apostasia" e será revelado o “homem da iniquidade" “o
filho da perdição” que se assenta “no santuário de Deus, ostentando-se como se fosse o próprio Deus”
(2Ts 2.3,4).
Ao escrever para Timóteo sobre os últimos dias, Paulo diz:

Sabe, porém, isto: nos últimos dias, sobrevirão tempos difíceis, pois os homens serão egoístas,
avarentos, jactanciosos, arrogantes, blasfemadores, desobedientes aos pais, ingratos, irreverentes,
desafeiçoados, implacáveis, caluniadores, sem domínio de si, cruéis, inimigos do bem, traidores,
atrevidos, enfatuados, mais amigos dos prazeres que amigos de Deus, tendo forma de piedade, negando-
lhe, entretanto, o poder (2Tm 3.1-5).
E diz adiante:

Ora, todos quantos querem viver piedosamente em Cristo Jesus serão perseguidos. Mas os
homens perversos e impostores irão de mal a pior, enganando e sendo enganados [...] Pois haverá tempo
em que não suportarão a sã doutrina; pelo contrário, cercar-se-ão de mestres segundo as suas próprias
cobiças, como que sentindo coceira nos ouvidos; e se recusarão a dar ouvidos à verdade, entregando-se às
fábulas (2Tm 3.12-13; 4.3-4).
18
Por fim, e talvez de maneira mais conclusiva, Mateus 24.15-3 1 fala de uma grande tribulação que
precederá a época da volta de Cristo:

Porque nesse tempo haverá grande tribulação, como desde o princípio do mundo até agora
não tem havido e nem haverá jamais. Não tivessem aqueles dias sido abreviados, ninguém
seria salvo; mas, por causa dos escolhidos, tais dias serão abreviados [...] Logo em seguida à
tribulação daqueles dias, o sol escurecerá, a lua não dará a sua claridade, as estrelas cairão
do firmamento, e os poderes dos céus serão abalados. Então, aparecerá no céu o sinal do Filho
do Homem; todos os povos da terra se lamentarão e verão o Filho do Homem vindo sobre as
nuvens do céu, com poder e muita glória (Mt 24.21-30).

Essa passagem retrata não um mundo cristianizado, mas um mundo de grande sofrimento e mal,
uma grande tribulação que excede todos os períodos anteriores de sofrimento sobre a terra. Ela não diz
que a grande maioria do mundo dará boas-vindas a Cristo quando ele vier, mas, antes, que quando o sinal
do Filho do homem aparecer no céu, “todos os povos da terra se lamentarão” (Mt 24.30).
Uma vez que Mateus 24 é muito difícil para a perspectiva pós-milenista, houve várias tentativas de
explicá-lo não como uma predição de eventos que ocorrerão logo antes da segunda vida, mas como algo
cumprido principalmente na destruição de Jerusalém em 70d.C.
Para apoiar essa interpretação, os pós milenistas consideram simbólica a maioria dos elementos de
Mateus 24.29-31: o escurecimento do sol e da lua, a queda das estrelas do céu e o abalo dos poderes dos
céus não devem ser compreendidos como eventos literais, mas como figuras da vinda de Deus para
julgamento. Dizem que figuras semelhantes de julgamentos encontram-se em Ezequiel 32.7; Joel 2.10 e
Amós 8.9 - mas essas passagens simplesmente falam de julgamentos de trevas e, assim, não mencionam a
queda das estrelas do céu ou os poderes dos céus sendo abalados. R. T France também menciona Isaías
13.10 e 34.4 que falam do escurecimento do sol e da lua e da queda da hoste celeste, mas não há nenhuma
certeza de que France esteja correto ao afirmar que essas passagens são apenas simbólicas — elas são
colocadas em contextos em que seriam facilmente interpretadas como predições literais de mudanças
cósmicas que precederão o julgamento final. Assim, não é nem um pouco óbvio que essas passagens
sejam meras figuras apocalípticas do julgamento contra Jerusalém.
Além disso, a interpretação que os vê como meras declarações simbólicas tornam-se mais difíceis
na sequência das declarações de Jesus, pois ele não só fala dos sinais no sol, na lua e nas estrelas, como
diz imediatamente depois: “Então, aparecerá no céu o sinal do Filho do Homem [...] e verão o Filho do
Homem vindo sobre as nuvens do céu, com poder e muita glória” (Mt 24.30). Coerente com a
interpretação simbólica anterior dessa passagem, France diz que “todos os povos da terra” refere-se
apenas aos judeus, ou seja, “todas as tribos [famílias] da terra”, a terra de Israel. E diz que a referência ao
Filho do homem vindo nas nuvens do céu com poder e grande glória não se refere à volta de Cristo, mas à
sua ida ao Pai no céu “para receber vindicação e autoridade”. France cita com aprovação a declaração de
G. B. Caird, que diz que a “vinda do Filho do homem nas nuvens do céu nunca foi entendida como uma
forma primitiva de viagem espacial, mas como símbolo de uma reversão poderosa da sorte na história e
em nível Então, o envio dos anjos de Cristo com o toque de trombeta para juntar seus eleitos de todos os
cantos da terra é compreendido como referência a mensageiros que pregam o evangelho em todo o
mundo. Assim, a reunião dos eleitos é a reunião deles na igreja, por meio da pregação do evangelho.
Entretanto, nessa interpretação, France não consegue explicar de maneira satisfatória o fato de
Jesus dizer que todos os povos da terra "verão o Filho do Homem vindo sobre as nuvens do céu, com
poder e muita glória” (Mt 24.30). Isso não é uma operação celestial invisível em que Cristo recebe
autoridade de Deus Pai; antes, aqui se prediz sua volta com poder e grande glória. Os que pregam o
evangelho em nenhuma outra parte são chamados anjos que tocam trombetas, e a pregação do evangelho
em parte alguma é chamada reunião dos “seus escolhidos, dos quatro ventos, de uma a outra extremidade
19
dos céus” (Mt 24.31). Além disso, quando em outras ocasiões Jesus fala de sua vinda nas nuvens, não fala
de uma ida ao Deus Pai no céu, mas de uma vinda ao povo na terra: “Eis que vem com as nuvens, e todo
olho o verá, até quantos o traspassaram. E todas as tribos da terra se lamentarão sobre ele” (Ap 1.7). E
quando Cristo voltar, Paulo diz: “... nós, os vivos, os que ficarmos, seremos arrebatados juntamente com
eles, entre nuvens, para o encontro do Senhor nos ares” (l Ts 4.17). Quando Cristo vier nas nuvens de
glória com grande poder e autoridade, virá para reinar sobre a terra, e esse é o sentido de Mateus 24.30,3l.
(France não comenta o fato de Jesus dizer que os povos da terra que se lamentarão “verão o Filho do
Homem vindo sobre as nuvens do céu” [v. 30]. O fato de essas tribos verem a vinda de Jesus faz com que
seja difícil compreender aqui alguma interpretação simbólica ou celestial invisível.) Ademais, a
conjunção de fatores que conhecemos de outros textos relacionados à volta de Cristo (sinais cósmicos, a
vinda de Cristo com poder, o soar da trombeta, os anjos reunindo os eleitos) fornece uma defesa
cumulativa para a certeza de que aqui se vê a segunda vinda de Cristo, não uma simples representação do
momento em que ele recebe autoridade. E se Mateus 24 trata da segunda vinda de Cristo, então trata de
sua vinda logo após um período de grande tribulação, não após um milênio de paz e justiça estabelecido
sobre a terra.
Por fim, todas as passagens que indicam que Cristo poderia voltar logo e que devemos estar prontos
para sua volta a qualquer momento também precisam ser consideradas um argumento significativo contra
o pós-milenismo. Pois se Cristo pode voltar a qualquer momento e precisamos estar prontos para sua
volta, então o longo período necessário para o estabelecimento do milênio sobre a terra antes da volta de
Cristo simplesmente não pode ser considerado uma teoria convincente.

Avaliação do Pós milenismo11

Tendo visto algo da história do pós milenismo e das suas doutrinas principais, devemos passar a
avaliá-lo. Quais são as suas fortalezas, e quais as suas fraquezas?

Aspectos Positivos

Começando com o lado positivo, notamos que o pós milenismo corretamente deu atenção a um
tema genuinamente bíblico - a dimensão presente do reino de Deus. Jesus disse que o reino estava
próximo, que estava entre os homens, e falava acerca de homens que entravam no reino. Em tudo isto,
certamente parece que dizia que este reino não era uma realidade puramente futura. O Rei está ausente em
certo sentido, mas noutro sentido está certamente presente (Mt 28.19-20). Sabendo que nosso Senhor e
Rei está presente e que Seus recursos estão disponíveis a nós agora, nosso estilo de vida deve ser
caracterizado por confiança, otimismo, e agressividade.
O pós milenismo também tem encorajado, com toda a razão, um ativismo da parte dos crentes. Se
o reino estiver presente, podemos fazer alguma coisa para estendê-lo. Desta maneira, a doutrina do
cristianismo pode sustentar sua ética. As parábolas de Jesus, em especial, mostram que o reino cresce
gradualmente, ao invés de meramente surgir na sua forma completa num eschaton distante. Entender que
o reino pode crescer pouco a pouco, e que realmente faz assim, ajuda-nos a perceber nossa participação
em levar este reino a efeito através de levar o evangelho a outras pessoas e de promover modos cristãos
de viver. É assim que ordena a Escritura, e a descrição pós-milenista do reino apóia este mandamento.
O pós milenismo também é bíblico ao promover um espírito de otimismo e ao combater o tipo de
pessimismo que alguns cristãos têm permitido que faça deles suas vítimas. Jesus realmente prometeu
poder a todos aqueles que levassem o evangelho (At 1.8). Falava do reino permeando o mundo inteiro. As
descrições bíblicas da apostasia e da iniquidade que caracterizariam os tempos do fim têm tornado

11
ERICKSON, M.J. Um estudo do Milênio. Opções contemporâneas na Escatologia. 2ª ed. São Paulo: Edições Vida Nova,
1986.
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fatalistas alguns dos cristãos. As condições serão sempre piores, dizem eles, e nada podemos fazer para
alterá-las. Este tipo de pensamento torna a Igreja menos eficaz do que seria doutra forma, e o mal mais
pervasivo. Por serem a confiança e a expectativa tão importantes para o sucesso, o pós milenismo
contribui ao cumprimento daquilo que é predito.
Além disto, o pós milenismo reconhece que o reino de Deus tem escopo mais amplo do que a
Igreja. Sempre onde se faz a vontade de Deus, ali está o reino de Deus, ainda que seja apenas de modo
parcial ou fragmentário. Este pode ser o caso mesmo quando a pessoa que cumpre o ato não tem
consciência de realizar a vontade de Deus. Talvez não seja conscientemente dedicado a Deus. Isto
significa que Deus pode realizar Sua vontade, pelo menos em parte, através de pessoas, agências, nações
e ideologias não-cristãos. Se empregou a Babilônia e a Assíria nos tempos bíblicos, pode fazer algo
semelhante em nossos dias. Quer dizer que o cristão pode e deve cooperar de modo construtivo com
qualquer pessoa ou agente que está agindo com alguma parte no aspecto do reino de Deus. Além disto,
quer dizer que o reino é, em grande medida, um reino ético.

Aspectos Negativos

Do outro lado, o pós milenismo tem certas falhas. Uma delas é o seu otimismo a respeito da
conversão do mundo, que não parece muito realista à luz dos acontecimentos mundiais recentes. A
porcentagem de cristãos no mundo não está aumentando. Na realidade, até em termos de cristãos
nominais, há uma porcentagem mais baixa da população do mundo do que ocorria há dez, trinta ou
cinquenta anos. Até mesmo as oportunidades para a propagação do evangelho parecem desvanecer-se.
Faz um quarto de um século que o continente chinês está fechado aos missionários - embora os
desenvolvimentos políticos recentes ofereçam alguma esperança de uma mudança - e certas seções da
Índia estão igualmente fechadas. As perspectivas para a conversão em escala mundial parecem poucas. O
mesmo se pode dizer das estruturas das sociedades. A esperança de que a Primeira Guerra Mundial
pusesse fim às guerras revelou-se falsa. A Liga das Nações fracassou, e as Nações Unidas somente têm
tido sucesso parcial. Embora o progresso tecnológico seja inegável, não tem havido progresso ético e
social comparável.
Reconhece-se que esta crítica talvez tenha que ser qualificada nalgum tempo futuro. Talvez,
nalgum tempo além do futuro previsível, as tendências atuais serão invertidas. Para a esperança pós-
milenista concretizar-se, no entanto, seria necessária uma inversão bem radical das tendências atuais.
Talvez mais danificante para o pós milenismo é seu aparente descuido das passagens bíblicas (e. g.
Mt 24.9-14) que retratam uma piora das condições espirituais e morais nos tempos do fim. Parece que o
pós milenismo tem baseado sua doutrina em passagens bíblicas muito cuidadosamente selecionadas.
Mesmo nas passagens que os pós milenistas discutem, alguma seletividade parece estar em
operação. Por exemplo, na parábola do joio e do trigo, não há indicação alguma que o joio venha a ser
transmutado em trigo bom; no fim, tem de ser desarraigado e destruído. Porque não se encaixa na posição
deles, os pós milenistas passam desapercebida, de modo geral, esta dimensão do relato.
Há, também, alguma artificialidade no modo de os pós milenistas tratarem as duas ressurreições e
o milênio em Apocalipse 20. Este fato será demonstrado mais claramente quando avaliamos o
amilenismo; bastará por enquanto notar que os pós milenistas põem de lado o fato de que as descrições
das duas ressurreições são muito semelhantes.
Finalmente, os pós milenistas têm tido certa dificuldade em manter um sobrenaturalismo genuíno.
À medida que seu conceito do reino ficou sendo mais difuso, alguns deixaram de discriminar entre o bem
e o mal. Por exemplo, alguns viam o reino sendo cumprido até mesmo através do nazismo. A antítese
bíblica entre o reino bom e santo de Deus, que será completamente presente somente quando Cristo voltar
pessoalmente, e o reino do mal, com o qual o reino de Deus sempre está em conflito nesta vida, foi
diminuída.

21
22
Pré milenismo 12

No Pré milenismo temos um ponto de vista bastante popular, especialmente nos círculos
evangélicos ou conservadores. Em certas maneiras, este conceito é claro, definido, simples e pouco
complexo. A silhueta dos seus aspectos principais facilmente se discerne. Mesmo assim, por causa de
haver duas variedades distintas de Pré milenismo, é difícil, às vezes, determinar qual é o Pré milenismo
genérico e quais são os aspectos específicos dos seus dois subtipos. Nos capítulos posteriores, estas duas
variedades serão expostas com detalhes. A esta altura, porém, bastará notar os aspectos gerais do Pré
milenismo e depois notar resumidamente os pontos de divergência.

Panorama do Pré milenismo

O primeiro aspecto importante do sistema pré milenista é um reino terrestre de Cristo que é
estabelecido pela Sua segunda vinda. Em comum com o pós-milenismo, o Pré milenismo assevera que
haverá um período em que a vontade de Deus é feita na terra, período este em que o reino de Cristo é uma
realidade entre os homens. Este reino significa que haverá perfeita paz, retidão e justiça entre os homens.
Alguns pré milenistas consideram que o período é literalmente de mil anos. Outros seriam menos literais,
considerando-o apenas como um período extenso de tempo. O fato essencial, no entanto, é que este reino
será na terra e que Jesus Cristo estará fisicamente presente. Segundo o pós-milenismo, o reino de Deus
será na terra, mas Cristo não terá voltado fisicamente.
Além disto, este milênio terrestre não chegará a ser uma realidade através de um processo
paulatino de crescimento ou desenvolvimento progressivos. Pelo contrário, será inaugurado pela segunda
vinda, de modo dramático ou cataclísmico. Ao passo que o milênio esperado pelos pós milenistas pode
começar tão paulatinamente que seu início será virtualmente imperceptível, não haverá dúvidas quanto ao
começo do milênio, conforme os pré milenistas o veem. A volta de Cristo será semelhante à Sua partida -
dramática e externa, facilmente observável por qualquer pessoa, e, como consequência, inconfundível.
O milênio não será meramente uma extensão e aperfeiçoamento de tendências já presentes na
terra. Não será levado a efeito pela engenhosidade humana nem pela melhoria social. Na realidade, será
precedido por uma deteriorização, e não uma melhoria, das condições espirituais, senão sociais. Os pré
milenistas aplicam a declaração de Cristo em Mateus 24.12 acerca do esfriamento da fé dos homens ao
período de tempo imediatamente antes da segunda vinda. As condições serão transformadas de modo
sobrenatural, e Deus usará Seu próprio poder ao invés dos meios humanos para realizar Seus propósitos.
Os pré milenistas acreditam que uma “Grande tribulação” imediatamente precederá o milênio e
que esta chegará a ressaltar os efeitos do milênio. Este será um período de intensa angústia,
verdadeiramente diferente de qualquer coisa que já ocorreu na terra. Provavelmente incluirá fenômenos
cósmicos, perseguição, e grande sofrimento. Os pré milenistas diferem entre si quanto à presença da
Igreja de Jesus Cristo na terra durante a tribulação, ou se Deus a removerá da terra imediatamente antes
da grande tribulação. Estas duas posições, conhecidas respectivamente como Pós tribulacionismo e Pré
tribulacionismo, receberão mais atenção adiante.
A segunda vinda de Cristo trará Satanás e seus ajudadores sob controle, prendendo-os por mil
anos. Sem isto, naturalmente, as condições que se acham no milênio seriam impossíveis. Perto do fim do
milênio, no entanto, Satanás será solto por um breve tempo e se empreenderá numa luta final
desesperada. Depois, ele e seus demônios serão completamente vencidos, e lançados no lago de fogo
preparado para eles.
As duas ressurreições em Ap 20.4-6 devem ser distinguidas com base em seus participantes, e não,
como no amilenismo e no pós-milenismo, com base em sua natureza. Ambas as ressurreições, e não

12
ERICKSON, M.J. Um estudo do Milênio. Opções contemporâneas na Escatologia. 2ª ed. São Paulo: Edições Vida Nova,
1986.
23
apenas a segunda (conforme creem os amilenistas), são físicas ou corpóreas. Somente os crentes estão
envolvidos na primeira ressurreição, no entanto, ao passo que o restante da raça humana, os não-cristãos,
não são ressurretos até ao fim do milênio. Uma razão para dividir a ressurreição é que todos os crentes
reinarão juntamente com Cristo durante o milênio, aqueles que estiverem com vida quando Cristo voltar e
aqueles que morreram na fé. A ressurreição dos descrentes serve apenas para levá-los ao julgamento.
Embora os dois grupos de pré milenistas concordem quanto aos aspectos enumerados supra,
discordam em certo número de aspectos. O aspecto mais importante é o relacionamento entre a Igreja e a
tribulação. O pré tribulacionista acredita que a igreja será “arrebatada,” ou removida tio mundo, antes da
grande tribulação. O pós-tribulacionista acredita que a igreja permanecerá no mundo durante a tribulação,
embora talvez seja protegida dalguns dos aspectos mais severos da tribulação. Um aspecto estreitamente
relacionado é a natureza da segunda vinda. O Pós tribulacionismo a vê como uma vinda única e unitária
ao fim da tribulação. O Pré tribulacionismo a vê como sendo feita de duas etapas ou fases - uma “vinda
para” a Igreja no começo da tribulação, removendo-a do mundo, e uma “vinda com” os santos no fim da
tribulação.
Outras diferenças são mais sutis. Uma é questão de atitude. O pré tribulacionista geralmente está
mais interessado na segunda vinda e sua cronologia do que o pós-tribulacionista. Neste aspecto, o pós-
tribulacionista é mais semelhante ao amilenista do que ao pré milenista pré tribulacionista. Há, também,
um pouco de diferença de gênio entre os dois. Os pré tribulacionistas, que geralmente são
dispensacionalistas, frequentemente têm um tom mais judaico no seu milênio, na sua escatologia, e na sua
teologia inteira, do que os pós tribulacionistas.

A BASE HISTÓRICA PARA O PRÉ MILENARISMO 13

O princípio do pré-milenarismo era forte na igreja primitiva — ele se manteve como um padrão
para os Pais ate o primeiro Agostinho 14. Agostinho, cuja poderosa influencia se estendeu aos mil
anos que o sucederam, mais tarde descartou erroneamente essa teoria.

Os Primeiros Pais
Clemente de Roma (c. século I d. C.)
O Senhor disse a Abraão: “Sai-te da tua terra, e da tua parentela, e da casa de teu pai, para a terra
que eu te mostrarei” [...] E, novamente, quando Abraão se afastou de Ló, Deus lhe disse: “Levanta, agora,
os teus olhos e olha desde o lugar onde estas, para a banda do norte, e do sul, e do oriente, e do ocidente;
porque toda esta terra que vês te hei de dar a ti e a tua semente, para sempre” (FECC, 10).
Rápida e repentinamente Sua vontade será cumprida, como também esta testemunhado pela
Escritura, que diz: “O que ha de vir vira e não tardara”; e: “De repente, vira ao seu templo o Senhor, a
quem vos buscais” (ibid., 23).
Pois Ele nos preveniu: “Eis que cedo venho, e o meu galardão esta comigo para dar a cada um
segundo a sua obra”. Portanto, Ele nos exorta a atentar para isso a fim de não ficarmos ociosos ou
indolentes em qualquer trabalho. Esforcemo-nos, pois, para sermos encontrados entre aqueles que
esperam por Ele para podermos participar das Suas dádivas prometidas (ibid. 34-35).

Inácio de Antioquia (falecido c. 110)


Esteja atento, e tenha um espírito avivado [...] Seja sempre mais zeloso do que és agora.
Analise as épocas cuidadosamente. Olhe para Aquele que esta acima de todo o tempo, que e eterno
e invisível, e que, no entanto, se tornou visível para o nosso bem (EP, 1, 3).
13
GEISLER, Norman. Teologia Sistemática Vol. 3. 3ª Impressão. Rio de Janeiro: Editora CPAD, 2016, p. 956-961.
14
Sobre o Agostinho “primeiro” e “posterior”, veja a nota de rodapé sob “A Base Histórica para o Livre arbítrio de Adão”, no
Volume 5, capítulo 3; veja também suas citações sob “A Base Histórica para uma Expiação Ilimitada”, no capitulo 12 do
mesmo volume.
24
A Epistola de Pseudo Barnabé (c. 70-130)
Chegará o dia em que todas as coisas irão perecer com o diabo. O Senhor está próximo com a Sua
recompensa. Portanto, nos convém muito indagar a respeito dos acontecimentos atuais a fim de
procurarmos diligentemente aquelas coisas que podem nos salvar (21).

O Didaquê (c. 120-150)


Que a graça venha, e este mundo passe. Hosana ao Deus (Filho) de Davi! Se alguém é santo, que
venha, se alguém não é santo, que se arrependa. Maranata. Amém (10.6).

Justino Mártir (c. 100-c. 165)


A mim e a outros que somos cristãos honrados em todos os sentidos, nos foi dada a garantia de
que haverá a ressurreição dos mortos, e mil anos em Jerusalém, que então será reconstruída, enfeitada e
aumentada, [como] declaram os profetas Ezequiel, Isaías e outros (DJ, 80).

Irineu (c. 125-c. 202)


Convém aos justos primeiro receber a promessa da herança que Deus fez aos pais, e depois reinar
nela, quando ressuscitarem para ver Deus novamente nessa criação que foi renovada; e o juízo terá lugar
em seguida [...] Portanto, é apropriado que a própria criação, estando restaurada à sua primeira condição,
deva, sem qualquer limitação, permanecer sob o domínio dos justos.
Assim, então, a promessa que Deus fez a Abraão permanecerá firme [...] Deus prometeu a terra a
Abraão e à sua semente. No entanto, nem Abraão nem a sua semente, isto é, aqueles que são justificados
pela fé, recebem qualquer herança neste momento; mas a receberão na ressurreição dos justos. Pois Deus
é verdadeiro e fiel; e a promessa que Ele fez é: “Bem-aventurados os mansos, porque eles herdarão a
terra” (AH, 5.32).
[Jesus disse:] “Digo-vos que, desde agora, não beberei deste fruto da vide até àquele Dia em que o
beba de novo convosco no Reino de meu Pai”. Assim, portanto, Ele mesmo irá renovar a herança da terra
e reorganizar o mistério da glória dos [Seus] filhos; como disse Davi: Ele “renova a face da terra”. Ele
prometeu beber do fruto da vide com os Seus discípulos, indicando, assim, os seguintes pontos: a herança
da terra da qual se bebe o fruto da vide e a ressurreição dos Seus discípulos em carne e osso. Pois a nova
carne que ressuscita é a mesma que também recebeu o novo cálice. E de maneira nenhuma podemos
entender que Ele estará bebendo o fruto da vide quando se colocar com os Seus [discípulos] em um
palácio celestial, nem aqueles que bebem estarão sem a carne, pois beber daquilo que flui da vide
pertence à carne, e não ao espírito.
Portanto, a bênção prevista pertence inquestionavelmente aos tempos do reino, quando os justos
irão reinar sobre aqueles que ressuscitam dos mortos, quando também a criação, tendo sido renovada e
libertada, irá frutificar com abundância e com todos os tipos de alimento a partir do orvalho do céu e da
fertilidade da terra. E, como todos os animais estarão se alimentando [apenas] da produção da terra, eles
[nesses dias] se tornarão pacíficos e harmoniosos uns com os outros e perfeitamente sujeitos ao homem
(ibid., 5.33).

Lactâncio (c. 240-c. 320)


“Os mortos ressuscitarão, não quando se completarem mil anos depois da sua morte, mas para
que, quando forem novamente restaurados à vida, possam reinar com Deus durante mil anos” (Dl, 7.22).
Quando Ele tiver destruído os pecadores e executado Seu grande juízo, e tiver chamado à vida os
justos que viveram desde o inicio, ficará comprometido com os homens durante mil anos, e reinará sobre
eles com o mais justo comando [...] Então, aqueles que estiverem vivos nos seus corpos não morrerão, e
durante esses mil anos produzirão uma infinita multidão, e seus descendentes serão santos e amados por
Deus. Mas aqueles que ressuscitarem dos mortos presidirão sobre os vivos como juízes [...]
25
Durante esse mesmo tempo, também o príncipe dos demônios, que é o inventor de todos os males,
estará preso em cadeias e ficará aprisionado durante os mil anos do governo celestial, no qual os justos
irão reinar no mundo, de modo que não poderá mais inventar nenhum mal contra o povo de Deus [...]
Durante esses tempos, os animais não irão se alimentar com sangue, nem os pássaros com as presas, e
todas as coisas serão pacíficas e tranquilas (ibid., 7.24).
Quando os mil anos tiverem se completado, o mundo será renovado por Deus, os céus serão
cingidos, e a terra será mudada; eles serão brancos como a neve. E eles estarão sempre em plena atividade
na gloriosa presença do Todo-Poderoso, e farão ofertas ao Seu Senhor, e o servirão para sempre. Ao
mesmo tempo, terá lugar a segunda ressurreição publica, na qual os injustos serão ressuscitados para que
recebam a punição eterna (ibid., 7.26).

Os Testamentos dos Doze Patriarcas (c. século I d. C.)


Os santos irão repousar no Éden, e os justos irão se regozijar na Nova Jerusalém, que estará sob a
glória de Deus para todo o sempre. E Jerusalém não precisará mais suportar a desolação, nem Israel será
levado ao cativeiro; pois o Senhor estará no meio dela, residindo entre os homens; o próprio Santo de
Israel irá reinar sobre eles em humildade e em simplicidade, e aquele que nEle creu verdadeiramente
reinará nos céus (7.5).

Comodiano (entre os séculos III e V)


Nas chamas do fogo, o Senhor irá julgar os ímpios. Mas o fogo não irá tocar os justos, apenas
estará junto a eles. Quanto a alguns, parece haver uma demora, mas uma parte foi varrida para o
julgamento. O calor será tão grande, que até as pedras se derreterão. Os ventos se acumularão e causarão
relâmpagos, a ira celestial irá causar devastação; e os ímpios serão alcançados pelo fogo, a despeito dos
lugares para onde possam fugir [...] Chamas cairão sobre as nações, e os medos e os partos queimarão
durante mil anos [...] então, depois de mil anos, eles serão levados ao Geena; e aqueles que foram os seus
líderes serão queimados junto com eles (ICAGH, 43).

Aqueles que se dedicaram ao Senhor ressuscitarão para Ele, serão incorruptíveis, e viverão livres
da morte. E não haverá qualquer lamento, nem qualquer gemido naquela cidade.

Também virão aqueles que venceram um cruel martírio sob o Anticristo, e viverão por toda a
eternidade, e receberão bênçãos porque sofreram coisas más; e eles se casarão e procriarão durante mil
anos [...] A terra será completamente renovada e produzirá abundantemente (ibid., 44).

Efraim da Sina (c. 306-373)


Grant Jeffrey (nascido 1948) descobriu um manuscrito, ainda sem tradução, escrito por um poeta
cristão sírio que, além de ser pré-milenar, era também pré tribulacional15. Essa foi uma descoberta
fenomenal, particularmente à luz dos pronunciamentos pós tribulacionistas da igreja primitiva dizendo
que “não podemos encontrar nenhum traço de Pré tribulacionismo na igreja primitiva” (Ladd, BH, 31). O
argumento que vem de um silêncio perceptível é frequentemente perigoso.

Por que, então, não rejeitar todo cuidado terreno e nos preparar para encontrar o Senhor Jesus
Cristo? [..,] Todos os santos e o Eleito do Senhor são reunidos antes da tribulação que está prestes a
chegar e são levados para o Senhor, para que não vejam, a qualquer tempo, a confusão que subjugará o
mundo por causa dos nossos pecados (citado em Ice, WTS, 110-11).

15
Veja Capítulo 16. 83 Veja Capítulo 4.
26
Os Pais Medievais

Durante a Idade Média, e tendo perdurado até a Reforma, a visão amilenar passou a ser a doutrina
dominante, devido à influência do “Monólito Medieval”, Agostinho de Hipona (354-430). Infelizmente,
no que concerne à profecia, Agostinho veio a rejeitar a hermenêutica literal 16 para aceitar uma abordagem
mais alegórica. Dessa maneira, associado à união feita pela Igreja Católica Romana dos reinos espiritual e
terreno17, e à preocupação dos reformadores posteriores sobre outras questões críticas, o amilenarismo
alegórico ganhou proeminência nos tempos modernos. Através de um progresso exegético e da
reaplicação de uma hermenêutica literal, o pré-milenarismo tem experimentado um certo renascimento.

Agostinho
O primeiro Agostinho era pré-milenar, mas mudou a sua opinião quando reagiu fortemente contra
a seita do quiliasmo18 e adotou uma abordagem alegórica, um erro crucial que os amilenaristas e pós-
milenaristas vêm perpetuando desde essa época.
Aqueles que, sob o poder dessa passagem [Ap 20.1-6], desconfiaram que a primeira ressurreição
seria futura e física têm sido influenciados, entre outras coisas, especialmente pelo número de mil anos.
Eles entendem que seria conveniente que, durante esse período, os santos desfrutassem de um tempo
agradável, como se fosse um descanso Sabático [...] E essa opinião não estaria sujeita a qualquer objeção,
se alguém pudesse acreditar que as alegrias dos santos nesse Sábado seriam espirituais e se devessem à
maravilhosa presença de Deus; pois eu pessoalmente, também, uma vez aceitei essa teoria (CG, 259).
Por que Agostinho abandonou o pré-milenarismo?
Eles afirmam que aqueles que ressuscitarem gozarão o lazer de imoderados banquetes carnais
abastecidos com uma grande quantidade de carnes e bebidas, destinado não só a chocar os sentimentos
dos temperados, mas até a ultrapassar a medida da própria credulidade. Tais assertivas só podem ser
aceitas pelos carnais (ibid.).
O que Agostinho usou para substituir uma interpretação literal? Uma interpretação alegórica:
“Essa ressurreição [em Jo 5] não diz respeito ao corpo, mas à alma. Pois as almas também têm uma morte
das suas próprias iniquidades e dos seus pecados [...]19 Quanto a Apocalipse 20.1-6, Agostinho também
oferece a sua interpretação:
Existem duas ressurreições — a primeira é a ressurreição espiritual, que acontece nessa vida, e
evita que o homem sofra a segunda morte; a outra, a segunda, que não ocorre agora, mas no fim do
mundo, é a ressurreição do corpo, não da alma, quando o juízo final irá enviar alguns à segunda morte, e
outros àquela vida que não tem morte (CG, 20.6).

Omiti muitas passagens porque, embora pareçam estar se referindo ao juízo final, numa análise
mais cuidadosa elas se tornam ambíguas, ou parecem fazer alusão a algum outro evento — talvez àquela
vinda do Salvador que continuamente acontece na Sua igreja, isto é, nos Seus membros, nos quais ela
acontece pouco a pouco, e pedaço a pedaço, considerando que a Sua igreja representa o Seu corpo, ou se
referindo à destruição da Jerusalém terrena. Pois, até quando fala sobre isso, muitas vezes Ele usa uma
linguagem que pode ser aplicada ao fim do mundo e àquele último e grande dia do Juízo, de modo que
esses dois eventos não podem ser separados, a não ser que todas as passagens correspondentes sobre o
assunto nos três evangelistas, Mateus, Marcos e Lucas, sejam comparadas umas às outras. Pois algumas

16
82 Veja Capítulo 12.
17
83 Veja Capítulo 4
18
Os donatistas, que afetaram profundamente a Soteriologia de Agostinho (Veja Volume 3).
19
Mais uma vez, essa é uma interpretação extremamente improvável: Jesus falou aqui a respeito de corpos saindo dos túmulos
(v. 28); veja capítulo 7.
27
coisas são colocadas de maneira mais obscura por um evangelista e mais claramente por outro, de modo
que fica aparente que certas coisas têm a finalidade de estar se referindo a um único evento (ibid., 20.5).
Deste modo, o abandono medieval do pré-milenarismo do Novo Testamento e dos primeiros Pais
se baseou na adoção de uma hermenêutica alegórica.

Os Pais Reformadores

Os principais reformadores, como Lutero e Calvino, eram amilenaristas. Como estavam


intensamente preocupados com assuntos relacionados com a soteriologia 20, deixaram que sua escatologia
agostiniana ficasse latente à espera de uma consistente aplicação futura da hermenêutica literal (como eles
mesmos haviam feito em relação aos assuntos da salvação, o que possibilitou a Reforma).

Os Mestres da Pós Reforma

Entre os muitos que redescobriram o pré-milenarismo do Novo Testamento e dos primeiros Pais,
havia aqueles que pertenciam às tradições luterana, reformada e puritana.

Jonathan Edwards (1703-1758)


Ate agora, na sua maior parte, os santos haviam se mantido reprimidos, pois eram governados por
homens ímpios. Mas agora eles irão se tornar predominantes, o reino será entregue nas mãos dos “santos
do Altíssimo” (Dn 7.27). E “eles reinarão sobre a terra” (Ap 5.10). Eles viverão e reinarão “com Cristo
durante mil anos” (20.4) (.HWR, 3.8.3).
Então, o anticristo será confinado no inferno e não terá mais lugar aqui na terra. Muito mais tarde,
da mesma forma, pode-se observar a ocasião em que o diabo será solto no início do reinado de mil anos
de Cristo sobre a terra, para finalmente ser lançado no abismo [Ap 20] (EWCR, introd.).

John Gui (1697-1771)


O resto dos mortos (não os santos mortos, pois todos eles serão ressuscitados juntos), isto é, os
ímpios que morreram, não de morte espiritual ou moral, mas física, esses não viverão novamente até que
os mil anos tenham terminado, de modo que haverá um período exato de anos entre a ressurreição dos
santos e a ressurreição dos ímpios. Nem haverá nenhum desses ímpios vivendo sobre a terra, ou em
corpos durante esse tempo, pois os ímpios mortos não serão ressuscitados junto com os santos quando
Cristo retornar, e os ímpios que estiverem vivos serão destruídos na conflagração do mundo, e nenhum
deles viverá novamente até o fim desses anos (EWB, sobre Ap 20.5).

Charles Spurgeon (1834-1892)


Quantos navios carregados até a superfície se aproximam de nós vindos do milênio! Que visões
nós temos dos dias do céu sobre a terra! Através do nosso glorioso Senhor, mantemos um relacionamento
com os anjos; uma comunhão com espíritos brilhantes lavados no sangue, que cantam perante o trono;
melhor ainda, temos uma comunhão com Aquele que é Infinito (ME, Nov. 24).

Existe também um exército de pré-milenaristas nos séculos XIX e XX, inclusive John Nelson
Darby, C. I. Scofield (1843-1921), George Peters (1825-1909), Erich Sauer, Lewis Sperry Chafer, John
Walvoord, Charles Ryrie (nascido 1925), e muitos outros. Como seus ensinamentos foram amplamente
disseminados será desnecessário encher essas páginas com suas citações a favor do pré-milenarismo.

20
Veja Volume 3.
28
As Doutrinas do Pré milenismo

As Duas Ressurreições

O pré milenista insiste em que as duas ressurreições mencionadas em Apocalipse 20.4-6 são físicas
na sua natureza. Por causa de este aspecto formar a chave da posição pré milenista, merece escrutínio
cuidadoso.
Uma palavra de explicação a respeito da hermenêutica está apropriada aqui como pano de fundo
para o entendimento desta passagem especifica, bem como, na realidade, do Livro do Apocalipse inteiro.
O pré milenista adota uma hermenêutica relativamente literalista na interpretação da Escritura, e
especialmente do Apocalipse. Segue-se que as palavras são tomadas literalmente quando isto não leva ao
absurdo. Além disto, os pré milenistas exibem uma forte tendência para uma interpretação futurista do
Apocalipse, ao invés das interpretações preterista, histórica ou idealista. A interpretação preterista
considera que os eventos do livro tinham ocorrido quando o livro foi escrito, a interpretação histórica
considera que estes eventos foram futuros quando o livro foi escrito, mas que ocorriam no decurso da
história da igreja; a interpretação idealista ou simbólica tira a historicidade destes eventos, fazendo com
que sejam puramente símbolos de verdades que são atemporais no seu caráter; a interpretação futurista
considera que estes eventos ocorrem primariamente no tempo do fim. O Pré milenismo dispensacionalista
segue quase exclusivamente o método futurista de interpretação. O Pré milenismo histórico, no entanto,
representado por escritores tais como George E. ladd e G. R. Beasley-Murray, combina os conceitos
futurista e preterista, sustentando que o livro necessariamente tinha uma mensagem para a própria era de
João, e que representa a consumação da história da redenção. Defensores das duas posições acreditam
que, pelo menos parcialmente, compreender a mensagem do Apocalipse é entender os eventos ainda no
porvir.
No seu livro Crucial Ouestions About the Kingdom of God, bem como em vários artigos, ladd deu
o que é talvez a defesa mais eficiente e enfática do ponto de vista de que há duas ressurreições corpóreas.
Empregou várias linhas de argumento, a primeira, a principal, sendo exegética. Considera que a
interpretação de Apocalipse 20 pode ser reduzida a, ou depende de, uma única pergunta: As duas
ressurreições nos vv. 4 e 5 são ressurreições corpóreas? A primeira ressurreição é literal, uma ressurreição
do corpo, ou espiritual, uma ressurreição da alma? A resposta depende da devida interpretação do termo
ezesan no v. 4.
A primeira ressurreição abrange dois grupos: os apóstolos e santos aos quais foi prometido poder
para julgar e reinar (ver Mt 19.28 e 1Co 6.3), e os mártires. Há várias razões porque esta primeira
ressurreição não possa ser outra coisa senão uma ressurreição literal, corpórea.
1. A interpretação que faz estas palavras referirem-se à condição dos mártires depois da morte é
totalmente supérflua. Nenhum cristão precisava da renovada certeza de que o martírio destrói o corpo e
não a alma. Jesus deixara muito claro em Mateus 10.28 que somente Deus pode danificar a alma.
2. É verdade que os termos “morte” e “vida” se empregam tanto da existência espiritual quanto
da física. Logo, é possível em princípio que a ressurreição seja espiritual. Quando se empregam da morte
e da vida espirituais, porém, sempre há algum indício no contexto para indicar este fato. Nada no contexto
sugere esta interpretação.
Porque tanto a primeira ressurreição quanto a segunda são descritas com terminologia idêntica,
ezesan, e porque nenhum adjetivo ou advérbio qualificador, nem qualquer outra coisa, indica que as duas
ressurreições são diferentes quanto ao tipo, a tentativa de fazer com que sejam diferentes é puramente
arbitrária. Conforme a expressão de Henry Alford:

29
Se, numa passagem em que se mencionam duas ressurreições, onde certas almas viveram na
primeira, e os restantes dos mortos reviveram somente no fim de um período específico depois
daquela primeira, - se, em semelhante passagem, a primeira ressurreição possa ser entendida como
um levantar-se espiritual com Cristo, ao passo que a segunda significa um levantar-se literal da
sepultura; - então acaba-se toda a relevância de linguagem, e a Escritura são canceladas como
testemunha definitiva de coisa alguma.

Beasley-Murray argumentava não menos vigorosamente que interpretar “viveram” (v. 4) como
sendo um tipo inteiramente diferente de ressurreição é atribuir confusão e “pensamento caótico” ao autor,
que supostamente tinha em mente dois tipos diferentes de ressurreição, mas que não deu indicação
alguma de uma mudança de referência.
A descrição das duas ressurreições, notou Ladd, é completamente paralela. O verbo ezēsan
significa, noutros trechos, “ressurreição corpórea” (Ap 2.8; 13.14; Ez 37.10). Se significa ressurreição
corpórea no v. 5, deve significar o mesmo em 4b ou “perdemos o controle da exegese.
Visto que o contexto não oferece base alguma para a distinção entre as duas, não devemos fazer
esta distinção a não ser que possamos achar ensinos no restante da Escritura que exijam semelhante
distinção. Não há tais ensinos, no entanto. A ausência de referências de um modo ou doutro é
essencialmente um argumento negativo. Se não há evidência bíblica adicional sobre este assunto, então
devemos interpretar de modo semelhante as duas ocorrências de ezēsan.
Além disto, devemos notar que aqueles que participam da segunda ressurreição aparentemente não
estavam envolvidos na primeira. Estes são “os restantes” (hoi loipoi), aqueles que sobram ou que não
participam da primeira ressurreição. Embora haja certa ambiguidade a respeito da expressão, não parece
excluir o último grupo do primeiro.
Além desta passagem, segundo Ladd alegou, há outras passagens que parecem dar indícios de
mais de uma ressurreição. Filipenses 3.11 fala da exanastasin te ek nekrōn, literalmente: “a ressurreição
para fora, dentre os mortos,” significado este que é geralmente perdido nas traduções, que dizem alguma
coisa como: “a ressurreição dentre os mortos.” Parece que Paulo, neste texto, estava aspirando uma
ressurreição que, em efeito, resultaria numa separação dentre outras pessoas mortas. Lucas 14.14 se refere
a uma ressurreição dos justos, o que, segundo parece, subentende uma distinção da ressurreição em geral.
Lucas 20.35 fala de uma ressurreição dentre os mortos, com significado semelhante a Filipenses 3.11,
excetuando-se que esta não é uma “ressurreição-para-fora”. Ladd disse que 1Coríntios 15.23 e 1
Tessalonicenses 4.16 também dão indícios de uma ressurreição parcial, e Daniel 12.2 e João 5.29 sugerem
uma ressurreição em duas etapas.
Ladd também argumentou em prol do milênio em bases teológicas.
Embora alguns críticos do Pré milenismo tenham objetado que um milênio é supérfluo, Ladd
argumentou que desempenha um papel específico e integral no plano de Deus. É mais uma etapa no
propósito redentor de Deus em Cristo. Durante Sua vida na terra, Cristo experimentou o estado de
humilhação em etapas progressivas. Depois da Sua ressurreição e ascensão, reassumiu o poder e a glória
que tinham sido dEle, reinando à destra do Pai. Seu reino de triunfo ainda não é aparente, porém. Se é
para ser plenamente exercido e demonstrado, precisa tornar-se público em poder e glória. Ladd acredita
que é necessário esta manifestação da glória e da soberania de Cristo ocorrer na terra. Este é o propósito
para o qual serve o milênio. Ladd discerniu três etapas no triunfo de Cristo sobre a morte, conforme a
descrição em 1Coríntios 15.23-26: a ressurreição, a segunda vinda a parusia) e o fim (o telos). O intervalo
entre a ressurreição e a parusia é a era da igreja; o intervalo entre a parusia e o telos - sem o qual os dois
poderiam ser encaixados num só evento - é o milênio. A primeira destas eras é a do reino oculto do Filho;
a segunda, a era do Seu reino manifesto.
Para o pré milenista dispensacionalista, há ainda outro argumento em prol do milênio: o grande
número de profecias, especialmente no Antigo Testamento, ainda não cumpridas. O dispensacionalista
acredita que nenhuma profecia do Antigo Testamento é cumprida dentro da era da igreja, e que algumas
30
destas profecias são de tal natureza que devem ocorrer na terra. Deve haver, portanto, algum período ou
interlúdio na terra quando estas profecias possam ser cumpridas, a saber: um milênio terrestre. A partir
destas profecias, tiram-se muitos pormenores do reino milenar de Cristo.
A Natureza do Milênio

Embora haja variações, há, em todos os pontos de vista pré milenistas do milênio certos elementos
em comum. O primeiro é obviamente que, durante este período, Jesus Cristo possuirá controle absoluto.
As forças principais que se opunham a Ele e ao Seu domínio durante o período entre Sua ascensão e Sua
segunda vinda terão sido eliminadas para todos os fins práticos. Satanás terá sido preso. O Anticristo (a
besta) e o falso profeta terão sido destruídos por Cristo na Sua segunda vinda. Como resultado, todos
quantos estiverem com vida durante este período se submeterão ao domínio do Messias. Cada joelho se
dobrará, conforme a expressão de Paulo em Filipenses 2.10-11.
Este será um período de domínio em justiça. O padrão de vida previsto no Sermão da Montanha
tornar-se-á uma realidade. A preocupação não será meramente com aquilo que uma pessoa faz - suas
ações externas mas com aquilo que é - seus pensamentos e intenções. Cristo reinará com justiça sobre
Seus súditos.
Este reino de Cristo terá uma dimensão política, a paz em escala mundial. Este fato, por si mesmo,
demarcará o milênio como sendo claramente distinto do restante da história. Dentro do alcance da história
humana registrada, a paz em escala mundial tem prevalecido cerca de um ano em quinze. Algumas
guerras têm sido grandes conflitos globais; outras têm sido muito mais limitadas no seu escopo. Raras
vezes, no entanto, tem havido paz universal genuína. Quando o Príncipe da Paz vier, no entanto, a paz
prevalecerá. Em linguagem profética, “converterão as suas espadas em relhas de arados, e suas lanças em
podadeiras: uma nação não levantará a espada contra outra nação, nem aprenderão mais a guerra” (Is 2.4;
Mq 4.3). Não se tratará de relaxamento, ou mera ausência de hostilidades externas, mas, sim, a genuína
harmonia.

Haverá, também, harmonia dentro da criação. A maldição que foi pronunciada sobre o homem por
causa da queda também afetou o restante da criação. A natureza é retratada “gemendo e suportando
angústias”, esperando sua redenção e sua libertação (Is 11.8-9; 65.25). O homem não precisará temer
qualquer criatura. As forças destrutivas da natureza, tais como as tempestades, os terremotos e os vulcões
serão aquietadas. O quadro de Jesus acalmando o mar ao repreender a tempestade (Mt 8.26) é uma:
antecipação daquilo que ocorrerá mais plenamente na ocasião do milênio.

Além disto, os santos reinarão juntamente com Cristo. Em Apocalipse 20, os que são ressuscitados
na primeira ressurreição reinam com Cristo durante o milênio. A natureza exata do seu domínio não é
declarada (i. é, os súditos, o grau de controle, e os aspectos da vida e do comportamento envolvidos).
Parece, no entanto, que uma recompensa pela fidelidade dos santos será compartilhar ou participar
daquilo que Jesus Cristo faz.

Israel no Milênio

Finalmente, os pré milenistas veem uma condição especial para Israel durante o milênio, embora
discordem entre si quanto à natureza exata desta posição.
De um lado, os pré milenistas dispensacionalistas sustentam que haveria uma virtual restauração
da economia do Antigo Testamento. Segundo este ponto de vista, Deus apenas voltou-Se temporariamente
dos Seus tratos primários com o Israel nacional para a Igreja, ou o Israel espiritual. Deus voltou-se contra
ele porque Israel rejeitou a oferta do reino que Cristo lhe fez. Depois de Deus ter levado a efeito Seu
propósito em conexão com a Igreja, no entanto, reassumirá Seus relacionamentos com Israel. No milênio,
Israel será restaurado à terra da Palestina. Jesus Se assentará sobre o trono literal de Davi, e reinará sobre
31
o mundo a partir de Jerusalém. Serão restaurados o culto no templo e a ordem sacerdotal do Antigo
Testamento, inclusive o sistema sacrificial. Coloca-se no milênio o cumprimento de virtualmente a
totalidade das profecias não cumpridas até ao tempo de Cristo, ou do Pentecoste, no máximo.
Do outro lado, um pré milenista histórico como Ladd coloca consideravelmente menos ênfase
sobre o Israel nacional do que os dispensacionalistas. Crê que a Igreja veio a ser o Israel espiritual e que
muitas das profecias e promessas que dizem respeito a Israel agora são cumpridas na Igreja. O sistema
sacrificial do Antigo Testamento passou para sempre, porque Cristo, a realidade, já veio. Mesmo assim,
acredita que o Israel literal ou nacional ainda será salvo. Baseia este conceito primariamente em Romanos
11.15-16. No futuro, Israel se voltará a Cristo e será salvo. Não que todo israelita individual será
convertido, mas a nação como um todo o será. Por intermédio de Israel, Deus abençoará o mundo inteiro
e, presumivelmente, isto ocorrerá durante o milênio.

UMA CONSIDERAÇÃO DOS ARGUMENTOS EM FAVOR DO PRÉ MILENISMO21

Os argumentos contra a posição pré milenista foram apresentados em sua essência nos argumentos
em favor do amilenismo e do pós-milenismo, e assim não serão repetidos numa divisão separada, mas se
considerarão as objeções incidentais ao longo da discussão.

1. Algumas passagens do Antigo Testamento não parecem caber nem na presente era nem no estado
eterno. Essas passagens indicam algum estágio futuro na história da redenção, muito mais grandioso que
a presente era da igreja, mas que ainda não parece remover de sobre a terra todo o pecado, rebelião e
morte.

Falando de Jerusalém em algum período no futuro, Isaías diz:

Não haverá mais nela criança de poucos dias, nem velho que não cumpra os seus dias; porque o
jovem morrerá de cem anos, mas o pecador de cem anos será amaldiçoado (Is 65.20 ARC).

Aqui lemos que já não haverá crianças morrendo na infância e já não haverá velhos morrendo
prematuramente, algo bem diferente desta era presente. Mas a morte e o pecado ainda estarão presentes,
pois a criança de cem anos morrerá e o pecador de cem anos “será amaldiçoado”. O contexto mais amplo
dessa passagem pode mesclar elementos do milênio e do estado eterno (cf. v. 17, 25), mas faz parte da
natureza da profecia do Antigo Testamento não fazer distinção entre eventos futuros, assim como essas
profecias não fazem distinção entre a primeira e a segunda vinda de Cristo. Assim, no contexto mais
amplo, pode haver elementos misturados, mas permanece o fato de que esse único elemento (as crianças e
os velhos viverem muito, a criança morrendo aos cem anos e o pecador sendo amaldiçoado) indica um
tempo especifico no futuro muito diferente da era atual.

Isaías parece predizer em outro trecho um reino milenar quando diz:

O lobo habitará com o cordeiro, e o leopardo se deitará junto ao cabrito; o bezerro, o leão novo
e o animal cevado andarão juntos, e um pequenino os guiará. A vaca e a ursa pastarão juntas, e as
suas crias juntas se deitarão; o leão comerá palha como o boi. A criança de peito brincará sobre a toca
da áspide, e o já desmamado meterá a mão na cova do basilisco. Não se fará mal nem dano algum em
todo o meu santo monte, porque a terra se encherá do conhecimento do SENHOR, como as águas
cobrem o mar (Is 11.6-9).

21
GRUDEM, Wayne. Teologia Sistemática. 1ª ed. São Paulo: Editora Vida Nova, 1999.
32
Essa passagem fala claramente de uma renovação significativa da natureza que nos leva muito
além desta era presente, uma época em que “a terra se encherá do conhecimento do SENHOR, como as
águas cobrem o mar” (v. 9). Mas logo no versículo seguinte Isaías diz:

Naquele dia, recorrerão as nações à raiz de Jessé que está posta por estandarte dos povos; a
glória lhe será a morada. Naquele dia, o Senhor tornará a estender a mão para resgatar o
restante do seu povo, que for deixado, da Assíria, do Egito, de Patros, da Etiópia (Is 11.10-
11).

Aqui alguns ainda buscam o Messias e, ao que parece, chegam à salvação; aqui também o Senhor
ainda reúne o remanescente de seu povo dentre as várias nações da terra. Não parece, portanto, que o
estado eterno tenha começado, mas a reversão da natureza excede em muito tudo o que ocorrerá nesta
presente era. Isso não indicaria um reino milenar futuro?
O Salmo 72 parece ir além de uma descrição do reinado de Salomão, predizendo as glórias do
reinado do Messias:

Dominará de mar a mar, e desde o rio até às extremidades da terra. Aqueles que habitam no
deserto se inclinarão ante ele, e os seus inimigos lamberão o pó. Os reis de Társis e das ilhas
trarão presentes; os reis de Sabá e de Sebá oferecerão dons. E todos os reis se prostrarão
perante ele; todas as nações o servirão. Porque ele livrará ao necessitado quando clamar,
como também ao aflito e ao que não tem quem o ajude. Compadecer-se-á do pobre e do
aflito e salvará a alma dos necessitados.
Libertará a sua alma do engano e da violência, e precioso será o seu sangue aos olhos dele (Sl
72.8-14 ARC).

Essa passagem com certeza fala de um governo messiânico muito mais amplo que os vividos por
Davi ou Salomão, porque esse reino do Messias estende-se “até às extremidades da terra” e “todas as
nações o servirão” (v. 8, 11 ARC; observe que o salmo também afirma: “Temer-te-ão enquanto durar o sol
e a lua, de geração em geração” no v. 5, ARO). Esse será um reino em retidão e justiça — mas com
certeza não será o estado eterno. Ainda haverá “o necessitado” clamando e “o aflito” e “o que não tem
quem o ajude”; ainda haverá pessoas que necessitam serem resgatadas “do engano e da violência” (v. 12-
14). Ainda haverá inimigos que “lamberão o pó” sob o reinado desse Rei justo (v. 9). Tudo isso fala de
um período muito diferente da era atual, mas inferior ao estado eterno em que já não haverá pecado nem
sofrimento.
Zacarias também profetiza um tempo futuro de grande transformação na terra, em que o Senhor é
Rei sobre toda a terra e em que ainda há rebelião e pecado, sofrimento e morte:

Virá o SENHOR, meu Deus, e todos os santos, com ele. Acontecerá, naquele dia, que não
haverá luz, mas frio e gelo. Mas será um dia singular conhecido do SENHOR; não será nem dia
nem noite, mas haverá luz à tarde.
Naquele dia, também sucederá que correrão de Jerusalém águas vivas, metade delas para o mar
oriental, e a outra metade, até ao mar ocidental; no verão e no inverno, sucederá isto.
O SENHOR será Rei sobre toda a terra; naquele dia, um só será o SENHOR, e um só será o
seu nome [...]
Esta será a praga com que o SENHOR ferirá a todos os povos que guerrearem contra
Jerusalém: a sua carne se apodrecerá, estando eles de pé, apodrecer-se-lhes-ão os olhos nas suas
órbitas, e lhes apodrecerá a língua na boca. Naquele dia, também haverá da parte do SENHOR
grande confusão entre eles; cada um agarrará a mão do seu próximo, cada um levantará a mão

33
contra o seu próximo. Também Judá pelejará em Jerusalém; e se ajuntarão as riquezas de todas as
nações circunvizinhas, ouro, prata e vestes em grande abundância [...]
Todos os que restarem de todas as nações que vieram contra Jerusalém subirão de ano em ano
para adorar o Rei, o SENHOR dos Exércitos, e para celebrar a Festa dos Tabernáculos. Se alguma
das famílias da terra não subir a Jerusalém, para adorar o Rei, o SENHOR dos Exércitos, não virá
sobre ela a chuva (Zc 14.5-17).

Aqui, novamente, a descrição não cabe na era presente, pois o Senhor é Rei sobre toda a terra
nessa situação. Mas também não cabe no estado eterno, por causa da desobediência e rebelião contra o
Senhor presente de maneira manifesta. Pode-se objetar que se trata de uma profecia típica do Antigo
Testamento em que eventos futuros distintos são misturados, não se distinguindo na visão do profeta,
ainda que possam estar separados por longo período quando de fato ocorrem. Entretanto, é difícil fazer tal
distinção nessa passagem porque trata especificamente de uma rebelião contra o Senhor que é Rei sobre
toda a terra que será punida por essas pragas e por ausência de chuva.
2. Também há passagens do Novo Testamento além de Apocalipse 20 que indicam um futuro milênio.
Quando o Senhor Jesus ressurreto fala à igreja de Tiatira, diz: “Ao vencedor, que guardar até ao fim as
minhas obras, eu lhe darei autoridade sobre as nações, e com cetro de ferro as regerá e as reduzirá a
pedaços como se fossem objetos de barro; assim como também eu recebi de meu Pai” (Ap 2.26-27). As
figuras empregadas (regência com cetro de ferro; despedaçamento de potes de barro) implicam um
governo de força sobre o povo rebelde. Mas quando os crentes que venceram o mal participarão desse
governo? A ideia cabe bem num reino milenar futuro, quando os santos glorificados governarão com
Cristo sobre a terra, mas não cabe em nenhum período da era presente ou no estado eterno. (A ideia de
reger as nações “com cetro de ferro” também se encontra em Ap 12.5-6 e 19.15.)
Quando Paulo fala da ressurreição, diz que cada um receberá um corpo ressuscitado, segundo a própria
ordem dele: “Cristo, as primícias; depois [epeita], os que são de Cristo, na sua vinda. E, então feita], virá
o fim, quando ele entregar o reino ao Deus e Pai, quando houver destruído todo principado, bem como
toda potestade e poder. Porque convém que ele reine até que haja posto todos os inimigos debaixo dos
pés” (l Co 15.23-25). As duas palavras grifadas nessa passagem (epeita e cita) significam “após”, não “ao
mesmo tempo”. Portanto, a passagem dá alguma base para a ideia de que, assim como há um intervalo
entre a ressurreição de Cristo e sua segunda vinda, quando receberemos um corpo ressurreto (v. 23),
também há um intervalo entre a segunda vinda de Cristo e “o fim” (v. 24), quando Cristo entregará o
reino a Deus depois de reinar por um tempo e colocar todos os inimigos sob os seus pés (Ap 20.6,7,14).
3. Convém reexaminar Apocalipse 20 tendo por base algumas outras passagens que insinuam ou
indicam claramente um período futuro muito mais grandioso que a era presente, mas inferior ao estado
eterno. Algumas declarações aqui são mais bem entendidas como referências a um reinado terreno futuro
de Cristo anterior ao julgamento por vir.
a. O fato de Satanás ser preso e lançado no abismo (v. 2-3) implica uma restrição de sua atividade
muito maior que tudo que conhecemos nesta era presente (veja a discussão acima sobre o amilenismo).
b. É melhor entender a declaração de que os que foram fiéis “viveram” (v. 4) como referência a uma
ressurreição corpórea, pois o versículo seguinte diz: “Esta é a primeira ressurreição”. O verbo ezesan,
“viveu”, é exatamente o mesmo empregado em Ap 2.8, onde Jesus identifica-se como aquele “que esteve
morto e tornou a viver" aqui obviamente em referência à sua ressurreição.
c. Numa interpretação pré milenista, o reinado com Cristo (em Ap 20.4) é ainda futuro, não algo que
esteja ocorrendo no presente (como alegam os amilenistas). Isso é coerente com o restante do Novo
Testamento, onde lemos com frequência que os crentes reinarão com Cristo e dele receberão autoridade
para reinar sobre a terra (veja Lc 19.17; 19; 1Co 6.3; Ap 2.26-27; 3.21). Mas as Escrituras não dizem em
parte alguma que os crentes, em seu estado intermediário (entre a morte deles e a volta de Cristo), estarão
reinando com Cristo ou dividindo o governo com ele. De fato, Apocalipse retrata santos no céu, antes da
volta de Cristo, esperando sob o altar e clamando ao Senhor que comece a julgar os malfeitores sobre a
34
terra (Ap 6.9-10). Em parte alguma se diz que os cristãos já estariam reinando com Cristo.

Entre os que vivem e reinam com Cristo em Apocalipse 20 estão “tantos quantos não adoraram a
besta, nem tampouco a sua imagem, e não receberam a marca na fronte e na mão” (Ap 20.4). Trata-se de
uma referência aos que não cederam sob a perseguição promovida pela besta e mencionada em
Apocalipse 13.1-18. Mas se a severidade da perseguição descrita em Apocalipse 13 leva-nos a concluir
que a besta ainda não entrou no cenário mundial, estando ainda no futuro, então a perseguição promovida
por essa besta também está no futuro. E se essa perseguição está ainda no futuro, então a cena em
Apocalipse 20, os que “não adoraram a besta [...] e não receberam a marca na fronte e na mão” (Ap 20.4),
também ainda estão no futuro. Isso significa que Apocalipse 20.1-6 não descreve a presente era da igreja,
sendo melhor compreendê-lo como referência a um reinado milenar futuro de Cristo.

Essas considerações combinam-se para defender a causa do Pré milenismo. Se estivermos


convencidos dessa posição, na realidade é secundário se o período de mil anos é entendido como mil anos
literais ou simplesmente um longo período de duração indeterminada. E ainda que nem todos os detalhes
quanto à natureza do milênio estejam muito claros, podemos ter razoável certeza de que haverá um reino
futuro de Cristo na terra que será nitidamente distinto desta era presente.

Avaliação do Pré milenismo22

Em nossa avaliação do Pré milenismo, passaremos ao largo das críticas que se aplicam apenas a
uma ou outra variedade Pré milenismo, e nos confinaremos àqueles aspectos que são comuns ao Pré
milenismo em geral.

Aspectos Positivos

No lado positivo, os pré milenistas têm revelado mais seriedade escatológica do que muitos
representantes de sistemas competitivos. Sem dúvida, às vezes os pré milenistas têm levado isto a pontos
extremos, demonstrando um interesse excessivo nas coisas futuras e dando-se a especulações indevidas
acerca de pormenores que nunca poderemos resolver com os dados atualmente disponíveis. Mesmo
assim, a Bíblia realmente coloca grande ênfase na era do porvir, e os pré milenistas certamente não
negligenciaram esta ênfase.

Além disto, os pré milenistas têm levado a sério a exegese. Talvez o escrutínio mais minucioso dos
textos bíblicos relevantes, e especialmente do Livro do Apocalipse, tem sido feito por pré milenistas. Isto
talvez seja atribuível à sua abordagem mais literal à interpretação dos escritos proféticos, abordagem esta
que tende a tornar a pessoa mais otimista quanto à possibilidade de determinar o significado destes
escritos. Se acreditamos que as Escrituras são autoritativas, devemos considerar esta exegese intensiva
(seja qual for a razão dela) um valor muito positivo.

Finalmente, parece que a interpretação pré milenista dos versículos cruciais em apocalipse 20 é
mais adequada e levanta menos dificuldades do que as interpretações alternativas.

Aspectos Negativos

Do outro lado, há problemas vinculados com o esquema pré milenista, e estes devem ser
examinados com cuidado, também.
22
ERICKSON, M.J. Um estudo do Milênio. Opções contemporâneas na Escatologia. 2ª ed. São Paulo: Edições Vida Nova,
1986
35
Uma das objeções é a raridade das referências bíblicas ao milênio. É explicitamente referido
somente em Apocalipse 20. Certamente, se esta doutrina fosse tão importante quanto alegam os pré
milenistas, deveria ser mencionada mais do que uma só vez na totalidade da Escritura. Os pré milenistas
respondem que numerosas outras passagens, muitas delas sendo profecias, se referem ao milênio. Mesmo
assim, estas por si só não são suficientemente claras ou sem ambiguidade para nos levar a crer num
milênio.
Jesus tinha muita coisa para dizer acerca das últimas coisas: muitas das Suas parábolas se
relacionavam com este assunto, e um discurso inteiro, Mateus 24-25, foi dedicado aos tempos do fim.
Mas certamente nunca predisse um reino terrestre de mil anos, nem sequer predisse quaisquer eventos que
precisassem de semelhante período para serem cumpridos, De modo semelhante, quando Paulo tratou da
segunda vinda, não mencionou qualquer reino terrestre. Alguns, portanto, acham melhor entender a
referência isolada ao milênio dalguma forma que não seja um período literal e terrestre de mil anos.

Outra objeção é o modo relativamente literal de os pré milenistas interpretarem as profecias do


Antigo Testamento. Os dispensacionalistas, é certo, aplicam esta hermenêutica de modo mais rigoroso e
radical do que os pré milenistas históricos. Logo, os dispensacionalistas insistem em que as profecias a
respeito de Israel devam ser cumpridas pelo Israel literal e nacional, ao passo que os pré milenistas
históricos veem que algumas, pelo menos, destas profecias, são cumpridas pela Igreja, ou o Israel
espiritual.

O pré milenista tende a argumentar que, visto que as profecias já compridas foram cumpridas de
modo algo literal, as profecias ainda não compridas o serão da mesma maneira, Rejeita as tentativas de
alegorizar a profecia.

Algumas profecias cumpridas, no entanto, não, foram, cumpridas muito literalmente, conforme indicou
Louis Berkhof. A predição de que Elias precederia a vinda do Messias foi cumprida por João Batista, não
pela personagem literal e real do Antigo Testamento. Pedro argumentou que a promessa feita a Davi, de
que o Cristo ressurreto Se sentaria no trono daquele, foi cumprida quando Jesus foi ressurreto dentre os
mortos e exaltado à destra de Deus (Atos 2:29-36). A Igreja que estava em oração viu na prisão de Pedra e
João um cumprimento de Salmo 2, que retrata os reis e soberanos em oposição ao Rei que Deus colocara
no Seu santo monte de Sião (Atos 4.21-28). No grande concílio de Jerusalém, Tiago declarou que Amós,
ao falar da restauração do tabernáculo caído de Davi, se referira ao estabelecimento espiritual do reino e à
inclusão dos gentios (Atos 15. 13-18). Outras passagens que parecem tratar o cumprimento profético de
modo semelhante incluem Mateus 2.16-18; Atos 2.14-21; e Gálatas 4:27. Os pré milenistas às vezes
dizem que profecias tais quais estas podem ter um cumprimento literal e espiritual também. Dessa forma,
por exemplo, Atos 15 está dizendo que Deus primeiramente reunirá os gentios e depois estabelecerá o
reino davídico. Tais interpretações, porém, indicam uma fraqueza na abordagem pré milenista às
Escrituras.

Outro problema é que um milênio terrestre é teologicamente supérfluo, questão esta levantada
especialmente pelos amilenistas. Por que deve haver um reino terrestre de Cristo? Por que não devemos
avançar diretamente da segunda vinda de Cristo para o julgamento, e depois para os estados finais do
destino dos justos bem como dos injustos? Até mesmo o argumento de Ladd no sentido de que deva haver
um reino terrestre para demonstrar a supremacia de Cristo não persuade, porque a supremacia de Cristo
não poderia também ser demonstrada pelo estabelecimento de um reino espiritual eterno? Especialmente
tendo em vista a carência de referências textuais, o milênio parece dispensável.

Além disto, o modo segundo o qual o reino será estabelecido parece entrar em conflito, de certas
maneiras, com outros conceitos bíblicos. Segundo o ensino pré milenista, o reino será inaugurado por
36
uma demonstração dramática e poderosa do poder do Senhor, executando julgamento sobre o mundo e
estabelecendo Seu reino pela vara de ferro. Isto, no entanto, parece ser uma contradição do modo segundo
o qual Deus agora age, através da operação quieta, interna e invisível do Espírito Santo, transformando de
dentro os corações dos homens. Jesus, na realidade, disse que Seu reino não é deste mundo, e que, se
fosse, Seus servos lutariam (Jo 18.36). Mesmo assim, o Pré milenismo vê Cristo reinando com uma vara
de ferro. Não somente a cronologia, mas também o próprio meio de estabelecer o reino, no conceito pré
milenista, parece diferente do conceito que Jesus dá em João 18.

Finalmente, a tendência do Pré milenismo (especialmente do dispensacionalismo) de dar ao


milênio um sabor judaico tem sido criticada há séculos, sendo que dois críticos antigos foram Caio de
Roma (ca. de 200) e Orígenes. O pré milenista deve tomar cuidado para evitar que o Israel literal retenha
um lugar de tanta relevância no plano e programa de Deus que virtualmente substitua a Igreja como
objeto primário da operação de Deus. Deve também acautelar-se de interpretar o Novo Testamento pelo
Antigo, anulando, assim, a revelação progressiva.

O Pré milenismo subdivide-se em duas correntes: Histórico e Dispensacional.


1. O Pré milenismo Histórico (Não Dispensacional)

O Pré Milenismo Histórico

O Pré Milenismo Histórico sustenta que o retorno de Cristo será precedido de certos sinais,
depois seguidos de um período de paz e justiça no qual Cristo irá reinar em pessoa como Rei. Os
Premilenistas históricos entendem a volta de Cristo e o arrebatamento como um só e o mesmo evento.
Eles veem unidade. Portanto, eles são distintos dos pré milenistas dispensacionais, que os consideram
como dois eventos separados pela Grande Tribulação de sete anos. O Pré milenismo foi a interpretação
escatológica predominante nos três primeiros séculos da igreja cristã. Os antigos pais Papias, Irineu,
Justino Mártir, Tertuliano e outros sustentaram essa concepção.

A principal diferença entre o Pré milenismo histórico e o dispensacionalista é a distinção que os


dispensacionalistas fazem entre Igreja e Israel. O Pré milenismo histórico considera a Igreja como o
verdadeiro Israel espiritual de Deus. O Reino de Deus se concretiza presentemente na Igreja, embora os
37
judeus ainda venham a ter um tempo de participação especial na história da salvação, convertendo-se e
fazendo parte da Igreja.

Pré Milenismo Dispensacional

Pré Milenismo Dispensacional – A passagem básica do Pré milenismo é Ap 20.4-6. Os Pré


milenistas observam que aqui estão as provas de um período de mil anos e duas ressurreições, uma no
início e outra no fim. O Pré milenismo insiste numa interpretação literal e coerente dessa passagem. Uma
vez que o mesmo verbo – ezēsan (ἔζησαν viveramé empregado em referência a ambas as
ressurreições, logo devem ser do mesmo tipo. Ambas as ressurreições são físicas, porém não são iguais. A
primeira é chamada de A Primeira Ressurreição, e é destinada somente aos salvos. Estes receberão corpos
glorificados, espirituais; A Segunda apesar de ser física não será gloriosa, pois os que dela participarem
provarão o dano da Segunda Morte.

natureza, que “geme e suporta angústias”, aguardando sua redenção, será libertada da maldição
da Queda (Rm 8.19-23). Até os animais viverão em harmonia uns com os outros (Is 11.6,7; 65.25), e as
forças destrutivas da natureza serão acalmadas. Os santos governarão junto com Cristo nesse Milênio.

Os Pré milenistas creem que Jesus voltará antes dos mil anos (Ap 20.2-6) e que reinará sobre o
mundo, o qual sobreviverá à destruição e ao julgamento e que os homens serão visitados por Deus sobre a
terra na Grande Tribulação. Muitos pais da Igreja Primitiva eram milenistas (khiliastas: do grego khilia -
χίλια). Com a posição adotada por Agostinho (século V), o Pré milenismo caiu no desprezo geral até a
revitalização ocorrida no século passado. Muitos creem que o Pré milenismo é sinônimo do
“dispensacionalismo” criado e popularizado por John Nelson Darby, destacado líder dos Irmãos Livres de
Plymouth, Inglaterra. Com sua esquematização escatológica, ele obteve grande aceitação entre os
evangélicos (principalmente no norte dos Estados Unidos), no movimento evangelístico que gerou muitos
institutos bíblicos, “missões de fé” e a famosa Bíblia de Scofield. Aqui no Brasil, os batistas regulares, o
38
Instituto Bíblico Palavra da Vida, a Chamada da Meia-Noite , as Assembleias de Deus e outras missões
estrangeiras e escolas iniciadas por missionários da outra América divulgam esta posição teológica.

39
OS TRÊS ESTÁGIOS DO DISPENSACIONALISMO

40
Segundo Norman Geisler existem três tipos de dispensacionalismos:23

O Dispensacionalismo Tradicional

O dispensacionalismo tradicional (clássico) é encontrado nos escritos de John Nelson Darby


(1800-1822). C. I. Scofield (1843-1921), e Lewis Sperry Chafer (1871-1952). Ele defende que as alianças
do Antigo Testamento conhecidas como abraâmica, davídica e nova aliança foram feitas estritamente com
a nação de Israel e com os seus descendentes literais, e serão literalmente cumpridas neles. Isto envolve a
crença de que havia duas novas alianças, uma para Israel (ainda a ser cumprida) e uma para a igreja
(sendo cumprida atualmente). Alem disso, Israel e a igreja formam dois povos de Deus separados, um
terreno e outro celestial. Por isso, eles terão dois destinos, um no céu, para a igreja, e um na terra, para
Israel.

O Dispensacionalismo Revisado

O dispensacionalismo revisado e representado por John Walvoord (1910-2002) e Charles Ryrie


(nascido 1925). Assim como o seu precursor, este dispensacionalismo afirma que ha ainda um
cumprimento nacional literal da aliança abraâmica a Israel. No entanto, ele defende que há apenas uma
nova aliança, que, embora tendo um cumprimento literal posterior no Israel nacional, possui uma
aplicação atual para a igreja. A maioria dos dispensacionalistas revisados defende que, embora haja
diferenças nítidas entre Israel e a igreja e os seus respectivos destinos, tudo faz parte de um único povo
geral de Deus que compartilha a redenção espiritual realizada por Cristo.
Segundo Ladd o profeta Jeremias antevê um dia quando Deus fará uma nova aliança com o Israel
rebelde (Jr 31.33,34). Para Ladd o livro de Hebreus aplicou esta profecia à nova aliança feita no sangue
de Cristo (Hb 8.8-12). No Novo Testamento, a eleição constitui uma continuidade da eleição de Israel
(Não esquecer que na visão de Ladd há um só povo - A Oliveira, e nela estão inseridos os ramos naturais
e os zambujeiros). A ênfase recai na iniciativa divina no processo de salvação e não na antítese entre
eleição e reprovação. O Novo Testamento geralmente ignora as dificuldades teológicas que derivam do
conceito de eleição; entretanto em Rm 9.14-33, Paulo resolve as dificuldades, afirmando a liberdade de
Deus para ter misericórdia de quem Ele quiser. No uso da misericórdia, Deus não depende de ninguém. A
ira de Deus em relação aos objetos de sua cólera tem seus motivos (Rm 9.22), e Israel não obteve a justiça
porque não o procurou por meio da fé (Rm 9.32).

O Dispensacionalismo Progressivo

O dispensacionalismo progressivo, abraçado por Robert Saucy (nascido 1937), Craig Balaising
(nascido 1949), e Darrell Bock (nascido 1952), é uma outra revisão do dispensacionalismo na direção da
teologia da aliança. Embora afirmando que haverá um cumprimento literal das alianças abraâmica,
davídica, e da nova aliança, no Israel étnico, eles insistem que há um cumprimento inaugural atual na
igreja.
Assim, eles mantém a opinião de que o cumprimento da aliança davídica começou na ascensão de
Cristo a mão direita de Deus, e que se cumprirá posteriormente na Sua vinda a terra, na Segunda Vinda.
Como teólogos da aliança, ambos enfatizam a opinião de que há um único povo de Deus, e abraçam uma
hermenêutica em que leem estas promessas do Antigo Testamento a Israel a luz do seu suposto
cumprimento em Cristo e em Sua igreja.

23
GEISLER, Norman. Teologia Sistemática Vol. 3. 3ª Impressão. Rio de Janeiro: Editora CPAD, 2016, p. 899,900.
41
Bruce Anstey defende três principais dispensações no modo de Deus agir (cf. “Concise Bible
Dictionary” — pag. 216-217). Alguns podem enxergar mais de três dispensações, mas todos os
dispensacionalistas concordam que as três que iremos considerar são as principais, e são aquelas sobre as
quais recai a controvérsia a respeito do ensino dispensacional. Portanto é de vital importância entender as
diferentes maneiras de Deus agir em conexão com elas.

A Dispensação da Lei

A primeira destas dispensações é a Dispensação da Lei. A casa de Deus na terra não foi realmente
estabelecida até que Ele tivesse criado um relacionamento com Israel sobre o terreno da redenção, dando
àquele povo a Lei e o culto a Deus no tabernáculo — Êxodo 20. Antes disso os homens caminhavam com
Deus como indivíduos, mas não existia um sistema publicamente organizado por Deus para tratar com os
homens no que diz respeito à Sua casa. Portanto, dificilmente poderíamos afirmar que existissem
dispensações antes disso (cf. Concise Bible Dictionary).

A Dispensação da Lei foi um modo organizado de Deus tratar com os homens (a nação de Israel)
no qual as obrigações legais e exigências da Lei deviam ser cumpridas pelo povo que estava sob ela, a fim
de poder caminhar em comunhão com Deus. Essa administração do povo de Deus naqueles tempos
passou por três fases:
42
• Aproximadamente 400 anos sob os Juízes (da entrada de Israel na terra de Canaã ao final do
tempo dos Juízes — Atos 13:19-20).

• Aproximadamente 500 anos de reinado (desde o rei Saul ao cativeiro babilônico).

• Aproximadamente 600 anos de testemunho profético durante os Tempos dos Gentios (do
cativeiro babilônico a João Batista — Lucas 16:16)

A Dispensação do Mistério

A segunda grande dispensação é a Dispensação do Mistério. Ela também tem sido chamada de
Dispensação da Graça de Deus. Trata-se de uma administração para o governo de um povo celestial, salvo
por graça e selado com o Espírito Santo — a Igreja de Deus. J. N. Darby a chamou de “a presente
dispensação” e “dispensação da Igreja” (Collected Writings, vol. 1, p. 289).

O apóstolo Paulo foi comissionado para “demonstrar a todos qual seja a dispensação do
mistério”. Portanto a Paulo caberia ensinar as coisas relacionadas ao Mistério “que desde os séculos
esteve oculto em Deus”, que compõem a verdade de Cristo e da Igreja (Ef 5:32). O ministério da graça
realmente começou com o ministério de nosso Senhor Jesus Cristo (João 1:17; Lucas 4:16-30), mas
quando o Seu povo (os judeus) O rejeitaram, Deus deixou aquele povo de lado por um tempo como nação
e iniciou a atual Dispensação da Graça com o chamamento celestial da Igreja por meio da vinda do
Espírito Santo no dia de Pentecostes (At 2:1-4; 1:15). Os crentes hoje estão sendo chamados para fora de
entre judeus e gentios para fazerem parte desse novo grupo celestial que Deus está formando — a Igreja
de Deus, corpo e esposa de Cristo (At 15:14; 26:17). A responsabilidade do ministério cristão é a de
promover a “dispensação [oikonomia] de Deus” ajudando os crentes a entenderem sua vocação celestial
em Cristo, e a conduzirem suas vidas em conformidade com a atual administração de Sua casa (1 Tm
1:4). A Igreja não é uma dispensação, mas é governada por uma dispensação ou normas de conduta de
Deus em relação à verdade especial revelada no Mistério.

A Dispensação da Plenitude dos Tempos

A terceira grande dispensação ainda é futura; trata-se da “Dispensação da Plenitude dos


Tempos” (Ef 1:10). Esta será uma designação especial de Deus para com os homens durante o reino
público de Cristo no Milênio — o reino de mil anos de Cristo. Naquele dia o remanescente de Israel
restaurado e muitas nações gentias desfrutarão de uma porção terrenal de bênção sob Cristo e a Igreja. A
administração de toda aquela esfera estará nos céus, encabeçada por Cristo e pela Igreja por sobre a terra.
Isto está indicado em Efésios 1:10 na expressão “no Cristo”. Geralmente, quando nos escritos de Paulo o
artigo “o” é colocado antes de “Cristo” (como em “no Cristo”) isto indica a união mística entre Cristo, a
Cabeça, e os membros de Seu corpo (1 Co 12:12-13). [N. do T.: A passagem de Efésios 1:10 na versão
Almeida traz “em Cristo”, mas o correto seria “no Cristo”, como aparece na versão de J. N. Darby e na
tradução literal de J. N. Young].

Há uma outra maneira de colocar o tridispensacionalismo que é o chamado Dispensacionalismo


Progressista.
Diversos teólogos dispensacionalistas de hoje, como Robert Saucy, Charles Ryrie, Craig e Darrell
Bock, chamam-se “dispensacionalistas progressistas” e têm conquistado muitos seguidores. Eles não
veem a Igreja como um parêntese no plano de Deus. Do ponto de vista do dispensacionalismo
progressista, Deus não tem dois propósitos separados para Israel e para a Igreja, mas sim um único
propósito – o estabelecimento do Reino de Deus – no qual tanto Israel como a Igreja terão parte. O
43
dispensacionalismo progressista não vê nenhuma distinção entre Israel e a Igreja no estado eterno futuro,
pois todos serão parte de um só povo de Deus. Além disso, eles defendem que a Igreja reinará com Cristo
em corpo glorificado na terra durante o milênio.

O dispensacionalismo progressivo passa por três dispensações bíblicas:


1ª) Passada. Da Eternidade passada até ao primeiro advento;
1ª) Presente. Do primeiro ao segundo advento;
2ª) Futura. Do segundo advento até à Eternidade futura.

Estas três dispensações sustentadas pelo dispensacionalismo progressivo estão centralizadas em


Cristo. Isto é, elas são cristocêntricas.

O Dr. Aldery Nelson da Rocha também vê três dispensações:


A Dispensação do Mistério A Dispensação da Graça A Dispensação da Graça
Da eternidade passada até a Da Encarnação até a Segunda Da Segunda Vinda até eternidade
Encarnação do Logos Vinda futura
Ef 3.9: E demonstrar a todos qual Ef 3.2: Se é que tendes ouvido a Ef 1.10: De tornar a congregar
seja a dispensação do mistério, dispensação da graça de Deus, em Cristo todas as coisas, na
que desde os séculos esteve que para convosco me foi dada. dispensação da plenitude dos
oculto em Deus, que tudo criou. tempos, tanto as que estão nos
céus como as que estão na terra;
44
No entanto, há ainda uma diferença entre os dispensacionalistas progressistas e o restante do
evangelicalismo em um aspecto: eles afirmam que as promessas do Antigo Testamento referentes a Israel
ainda serão cumpridas no milênio pelo povo judeu, que crerá em Cristo e viverá na terra de Israel como
“nação-modelo” para que todas as nações o vejam e dele aprendam. Portanto, eles não diriam que a Igreja
é o “novo Israel” nem que todas as profecias serão cumpridas no Israel étnico.
O termo “progressivo”, para este novo entendimento do dispensacionalismo, vem de um dos
distintivos desta nova corrente: A relação progressiva entre as dispensações. Uma dispensação avança no
plano divino sobre a anterior.
A dispensação anterior antecipa e logo presencia o Messias. Depois de Sua ascensão, Cristo
inaugura a presente dispensação. A futura dispensação é a dispensação do seu regresso e da consumação
do seu Reino. As dispensações Presente e Futura são vistas no Novo Testamento como o cumprimento do
Pacto Davídico.
O dispensacionalismo progressivo passa por três dispensações bíblicas:
1ª) Passada. Da Eternidade passada até ao primeiro advento;
45
2ª) Presente. Do primeiro ao segundo advento;
3ª) Futura. Do segundo advento até à Eternidade futura.
Estas três dispensações sustentadas pelo dispensacionalismo progressivo estão centralizadas em
Cristo. Isto é, elas são cristocêntricas.

O Dr. Aldery Nelson da Rocha também vê três dispensações:


1ª) A Dispensação do Mistério. Da eternidade passada até a Encarnação do Logos (Ef 3.9);
2ª) A Dispensação da Graça. Da Encarnação até a Segunda Vinda (Ef 3.2);
3ª) A Dispensação da Plenitude. Da Segunda Vinda até eternidade futura (Ef 1.10).

Até Agostinho dividia a história em três períodos:


1. Antes da lei
2. Sob a lei
3. Depois da lei.24

Charles Hodge cria que existiam quatro dispensações: 25


1. De Adão até Abraão;
2. De Abraão até Moisés;
3. De Moisés até Cristo;
4. De Cristo até o fim.

O ESQUEMA DISPENSACIONAL DE SCOFIELD:

1. Dispensação da Inocência - Da Criação à Queda.


2. Dispensação da Consciência - Da Queda ao Dilúvio.
3. Dispensação do Governo Humano - Do Dilúvio à chamada de Abraão.
4. Dispensação da Promessa ou Patriarcal - Da chamada de Abraão à saída do Egito.
5. Dispensação da Lei ou Israelita - Do Monte Sinai ao Monte Calvário.
6. Dispensação da Graça ou da Igreja - Do Calvário ao Arrebatamento.
7. Dispensação do Milênio ou Governo Divino - Da Parusia ao Grande Trono Branco.

Cremos que Deus tem um único propósito - estabelecimento do Reino de Deus - no qual tanto
Israel como a Igreja e os Gentios - as nações justas (o trigo) terão parte no Estado Eterno. E todos serão
chamados Povos de Deus: “Agora o tabernáculo de Deus está com os homens, com os quais ele viverá.
Eles serão os seus povos (no grego está no plural, λαοί -laoí); o próprio Deus estará com eles e será o seu
Deus” (Ap 21.3).
De acordo com o sistema apresentado pelos dispensacionalistas tradicionais, há sete épocas da
história da Salvação: Inocência, Consciência, Governo Humano, Patriarcal, a Lei, a Graça e o

24
TILLICH, Paul. História do Pensamento Cristão. 3ª Edição. São Paulo: Editora ASTE, 2004, p. 134.
25
RYRIE, Charles C. DISPENSACIONALISMO, Ajuda ou Heresia? 1ª ed. Mogi das Cruzes, São Paulo: ABECAR, 2004
46
Milênio, que será o governo divino. A chave imprescindível para a compreensão do futuro é Daniel 9.24-
27. As 70 semanas se referem a 490 anos (70 x 7) e não a dias. As primeiras 69 semanas de anos
terminaram com a crucificação de Jesus, encerrando a época na qual Deus tratava principalmente com
Israel. Com a rejeição do Messias que Deus ofereceu a Israel no ministério e na pessoa de Jesus, Deus fez
o relógio escatológico parar. No intervalo entre 69ª e 70ª semana, Deus estabeleceu a Igreja, a realidade
não prevista pelos profetas do Antigo Testamento.
A Igreja, portanto, é o ministério revelado a Paulo e aos escritores do Novo Testamento (Ef.3; Cl
1; Rm 16.25-27). Terminado este período da Graça, no qual os gentios e judeus são convidados a formar a
“Noiva” de Cristo, ocorrerá o Arrebatamento (lTs 4.13-18). Este maravilhoso evento se realizará sem
aviso prévio. O relógio profético então será reativado, com a atenção de Deus voltada para Israel. A 70ª
semana de Daniel 9 marcará os sete anos da Grande Tribulação. Dentro da última semana de Daniel
haverá o desenvolvimento do seguinte quadro:
1. Israel, a nação judaica, estará no centro do plano divino de Deus para com a humanidade. Restaurada,
Israel reconstruirá o Templo e restabelecerá os sacrifícios exigidos pela lei mosaica.
2. O poder político internacional será exercido pelo Anticristo, a Besta ou o Homem de Iniquidade (l Jo
4.3; Ap 13; 2Ts 2.3).
3. O cristianismo apóstata, unindo o Catolicismo, a Igreja Ortodoxa e o Modernismo protestante,
chamado a Meretriz, se aliará com o Anticristo (Ap 17) e prosperará através da união adúltera durante
um tempo.
4. O pecado aumentará entre os homens e chegará a uma profundidade e intensidade jamais vistas a não
ser na época do Dilúvio.
5. A ira de Deus será derramada sobre a Terra numa série de julgamentos e cataclismos.
6. Quando a Besta (o Anticristo) romper (Dn 9.27) com a nação Israelita, provocará uma crise
internacional que atingirá seu auge na guerra de Armagedom. Tudo culminará no fim dos sete anos
da Grande Tribulação com a vinda de Jesus Cristo com os seus santos. Após a Parusia, o reino do
Anticristo será destruído e Cristo passará a reinar sobre a terra (Zc 14.9,16-19; Mt 25.31-46; 19.28).
Assim se cumprirão literalmente as profecias do Antigo Testamento que preveem um reino
messiânico na Terra. Passados os mil anos previstos em Ap 20, Satanás será solto da sua prisão,
encabeçará uma revolta breve dos habitantes não regenerados, nações-bodes (Mt 25.31-46), mas que
será esmagada . Sucederá então o último julgamento, do Trono Branco (Ap 20.11-15). Os mortos não
convertidos serão julgados segundo as suas obras. A Igreja depois do Milênio gozará a Nova
Jerusalém, e os judeus e as nações justas (ovelhas) gozarão a Vida Perfeita na Nova Terra,
eternamente (Mt 25.31-46; Ez 37.21-28).

47
Dispensacionalismo 26

Antes de examinarmos os vários pontos de vista tribulacionistas, precisamos notar o sistema


teológico e hermenêutico conhecido como dispensacionalismo. Alguns o consideram o equivalente ao Pré
tribulacionismo, mas esta identificação precisa ser qualificada em dois aspectos: Primeiro,
dispensacionalismo é mais do que um ponto de vista acerca do relacionamento entre a vinda de Cristo e a
tribulação. É um sistema inteiro de teologia, do qual a escatologia é uma parte. Além disto, é um método
de interpretar a Bíblia e, portanto, afeta o modo de a pessoa entender até mesmo as porções não-
doutrinárias da Escritura. E, em segundo lugar, embora todos os dispensacionalistas sejam pré
tribulacionistas, nem todos os pré tribulacionistas são dispensacionalistas.
Mesmo assim, é importante examinar este sistema e esquema inteiro antes de proceder aos pontos
de vista tribulacionistas. O dispensacionalismo tem uma posição de grande influência dentro do
fundamentalismo americano, e uma vez que alguém aceita o dispensacionalismo, a questão da tribulação
está efetivamente fechada.
Por causa da ascensão do dispensacionalismo ter sido aproximadamente paralela àquela do
movimento fundamentalista, ficou sendo virtualmente a teologia oficial do fundamentalismo. Alguns
comentaristas praticamente identificaram os dois. Alguns proponentes do dispensacionalismo consideram
que não é uma interpretação da Bíblia, mas simplesmente uma reafirmação daquilo que a Bíblia diz.
Alguns fizeram dele um teste de ortodoxia, considerando que uma pessoa que não sustenta todos os seus
aspectos é alguém que nega a própria Escritura. Em muitos casos, trata-se de uma atitude mental total ou
coletânea de atitudes.
Nesta conexão, devemos notar que os vários elementos são partes essenciais de um todo orgânico.
Alguns consideram a questão de um arrebatamento pré ou pós-tribulacionista como assunto relativamente
independente. Para o dispensacionalista, porém, a verdade do sistema dispensacional subentende a
verdade do Pré tribulacionismo, e a falsidade do Pré tribulacionismo subentende a falsidade do
dispensacionalismo. Para tal pessoa, portanto, um ataque contra o Pré tribulacionismo parece ser um
26
ERICKSON, M.J. Um estudo do Milênio. Opções contemporâneas na Escatologia. 2ª ed. São Paulo: Edições Vida Nova,
1986.

48
ataque contra o sistema inteiro de crença cristão. Sua experiência cristã inteira tem sido associada com
este modo de crer, e até condicionada a certos termos e expressões. Embora este seja o caso dos aderentes
de todos os sistemas de crença e vida, é especialmente o caso dos dispensacionalistas, entre os quais há
geralmente instrução doutrinária bem extensa e específica, que se aproxima (nalguns casos) do
doutrinamento (ou ideologização). Devemos, portanto, ter em mente que seu senso de segurança religiosa
está vinculado com aquilo que lhes parece ser os essenciais do cristianismo.

Panorama do Dispensacionalismo

Devemos olhar o padrão generalizado do dispensacionalismo e defini-lo antes de fazer um


escrutínio mais de perto. Até certo ponto, procuraremos também remover alguns falsos conceitos e até
mesmo caricaturas do dispensacionalismo que às vezes têm sido sustentados.
Primeiramente, há a crença de que há várias “dispensações”, palavra esta que Charles C. Ryrie
definiu como sendo uma economia distinguível da realização do propósito de Deus. É uma mordomia da
luz de Deus, um passo na revelação da verdade de Deus. Quem poderia negar que, na ocasião da chamada
de Abraão ou da chamada de Moisés (o incidente da sarça ardente) houve um derramamento
genuinamente novo de revelação? O mesmo é o caso da vinda de Cristo e do Pentecoste. Estes eventos
lançaram nova luz, e o relacionamento entre Deus e Seu povo mudou-se de acordo.
Importante, também, é o conceito dispensacionalista da salvação.
A salvação é mediante a fé. Sempre foi assim, e sempre será assim, pois não há nenhum outro
meio de salvação. Alguns críticos do dispensacionalismo têm imputado aos seus apoiadores uma crença
em novos meios ou canais de salvação. Mais corretamente, no entanto, os dispensacionalistas dizem que,
embora nova luz tenha sido lançada sobre o relacionamento entre Deus e o homem, nunca foi instituído
nenhum meio novo de entrar naquele relacionamento. Sem dúvida, alguns ultra dispensacionalistas talvez
tenham crido e ensinado doutra forma, mas os dispensacionalistas da corrente principal insistem nesta
união da salvação - o novo nascimento é comum a todos os períodos do tratamento de Deus com toda a
humanidade. Ninguém a qualquer tempo entra na comunhão com Deus sem a fé e o novo nascimento.

Além disto, a lei moral de Deus, diferentemente da lei cerimonial, é aplicável a todas as
dispensações, embora, naturalmente, possa ser aplicada de modos diferentes em tempos diferentes. A
proibição do assassinato, por exemplo, não é restrita a qualquer dispensação individual; o assassinato
doutros seres humanos sempre tem sido errado, e sempre o será. Às vezes, os dispensacionalistas insistem
em que uma passagem deve ser aplicada somente à dispensação à qual foi dirigida. Logo, os ensinos
acerca da vida sob a lei cerimonial ou da vida no milênio não devem ser aplicados agora. A lei moral, no
entanto, sempre está em vigor, porém, embora talvez varie seu conteúdo exato. Resumindo: os santos em
várias épocas têm mais aspectos em comum do que diferentes.

A História do Dispensacionalismo

O movimento dispensacionalista é de origem mais ou menos recente.


Nenhum sinal desta teologia pode ser achado na história primitiva da igreja. Por várias razões, no
entanto, isto em si mesmo não deve ter influência demasiada sobre a questão da veracidade do
dispensacionalismo.
Em primeiro lugar, muitas doutrinas não foram articuladas pela igreja por muitos séculos. Este é o
caso da Pessoa e obra de Cristo, a Trindade, e virtualmente todas as demais doutrinas também. Na sua
maior parte, as crenças eram sustentadas implicitamente, e somente se tornaram explícitas quando surgiu
uma forma extraviada de ensino ou quando irrompia uma controvérsia na igreja. A escatologia, em
especial, não tem sido elaborada com detalhes até mais ou menos recentemente.

49
Além disto, outros métodos do estudo da Bíblia e da sua interpretação, inclusive alguns que são
empregados por oponentes do dispensacionalismo, também são de origem relativamente recente. Um
exemplo é a crítica literária e histórica da Bíblia.
Em terceiro lugar, se estivermos fazendo qualquer progresso no estudo da Bíblia, devemos esperar
que algumas coisas sejam descobertas que não eram conhecidas previamente. Pode tratar-se de
interpretações de passagens específicas, mas é também muito possível que leve a um novo sistema inteiro
de teologia. Negar este fato tira toda a base de qualquer possibilidade de progresso real no entendimento
bíblico e teológico.
Rejeitar o dispensacionalismo por causa da sua novidade aparente é, portanto, um argumento
fraco. Podemos, no entanto, examinar a história do movimento a fim de responder àqueles que debatem a
veracidade dele com base em sua Antiguidade.
Os defensores do dispensacionalismo geralmente reconhecem que não era um sistema
completamente desenvolvido até o século XX, mas, argumentam que havia precursores relevantes deste
sistema. Sem dúvida, é possível que o Pré milenismo dos primeiros séculos da igreja tenha incluído a
crença no arrebatamento pré-tribulacional da igreja. Além disto, alguns deste pré milenistas primitivos
falavam de dispensações. Não queriam dizer por “dispensação”, porém, exatamente o que os
dispensacionalistas de hoje querem dizer com esta palavra. Até mesmo João Calvino se referiu a
dispensações, mas não era dispensacionalista.
Alguns escritores certamente dividiram a história bíblica em períodos ou eras. Alguns destes
esquemas eram bem simples e continham relativamente poucos de tais períodos. William Cave (1633-
1713), por exemplo, falava dos períodos patriarcal, mosaico e evangélico. Pierre Poiret (1646-1719), no
entanto, alistou seis períodos ou “economias” – a criação, o pecado, a restauração antes da encarnação de
Cristo, a restauração depois da encarnação, a cooperação com a operação de Deus, e a providência
universal. Embora estas divisões servissem para distinguir períodos de tempo, não distinguiam as
maneiras da operação de Deus.
Aquele que realmente desenvolveu a hermenêutica e a teologia dispensacionais foi John Nelson
Darby (1800-1882). Darby nasceu de pais irlandeses em Londres, em novembro de 1800. Seus primeiros
anos foram passados na Irlanda, onde obteve sua educação básica. Darby formou-se em direito e começou
a exercê-lo em 1822, com aparente capacidade de ser excelente nesta profissão. Pouco depois, porém, foi
convertido, e deixou a profissão após apenas um ano de exercício. Seu interesse na teologia e na Igreja foi
crescendo, e em 1825 foi ordenado um diácono da Igreja da Inglaterra. Trabalhou muito como pároco
auxiliar de uma paróquia em Ennisbury, e seus esforços foram premiados com muitas conversões de
católicos romanos.
Enquanto estava em Dublin para ser ordenado ao ministério, ficou sabendo que o bispo ali emitira,
e os clérigos endossaram, um decreto que denunciava os católicos romanos e que reivindicava favores e
proteção especiais para a Igreja da Inglaterra. O decreto também exigia um preito de lealdade ao rei,
baseado no argumento de que os católicos devem sua primeira lealdade ao rei, e não ao papa. Darby ficou
grandemente perturbado e colocado num dilema: de um lado, não desobedeceria a regra da diocese; do
outro lado, a lealdade ao rei pareceu-lhe pouco melhor do que a devoção ao papa. No meio desta tentativa
de tornar a Igreja da Inglaterra a religião estabelecida, ficou envolvido com o movimento chamados dos
Irmãos.
Dois princípios básicos distinguiram este movimento: em primeiro lugar, todo. Dia Do Senhor é
consagrado ao “partir do pão”; em segundo lugar, a pessoa serve no ministério mediante a chamada de
Cristo, não pela ordenação dos homens. É significante que Darby ficou exposto a este último conceito
quando se preparava pela ordenação na Igreja da Inglaterra, e enquanto estava tendo questões de
consciência quanto à obediência ao decreto do bispo. Continuou a ministrar na Igreja da Inglaterra por
algum tempo, mas finalmente deixou aquela denominação.
Darby se tornou ativo no movimento dos Irmãos bem rapidamente. Embora ele não tivesse sido
seu fundador, suas grandes capacidades organizacionais dentro em breve o tornaram seu líder e
50
organizador, formando grupos em vários lugares. O grupo de Plymouth foi o primeiro que teve o nome de
“irmãos”, e vieram a ser conhecidos como “os irmãos em Plymouth,” ou simplesmente, “Irmãos de
Plymouth.” Aquele termo veio a ser aplicados aos outros grupos também. Embora seja um tipo de
acidente da história, estas pessoas que meramente queriam ser conhecidas como “irmãos em Cristo”
vieram a ser conhecidas por Irmãos de Plymouth, um título com implicações um pouco denominacionais.
Darby, um escritor prolífico, desenvolveu o pensamento dos Irmãos em sistema. Outros seguiram a
linha de interpretação dada por Darby: por exemplo, C. H. Mackintosh, cujos livros frequentemente
tinham apenas os iniciais C. H. M. na folha de rosto; G. Campbell Morgan, embora mais tarde
abandonasse a abordagem dispensacional; Harry Ironside; A. C. Gaebelein; e C. I. Scofield. Todos estes
homens efetivamente popularizaram a abordagem dispensacional, sendo que seus escritos extensivos
eram lidos em grande escala nos círculos fundamentalistas.
Provavelmente, a popularização mais eficaz do dispensacionalismo foi a Bíblia de Referências de
Scofield. No começo do século XX havia poucas Bíblias disponíveis com “ajudas”. Procure imaginar a
prédica do leigo típico. Conhece algumas histórias bíblicas, mas tem dúvida acerca da sua ordem
cronológica ou ambiente geográfico, ou, ainda mais provavelmente, tem dúvidas quanto ao significado de
muitas passagens doutrinárias. Quando, pois, obtém uma Bíblia com um esboço juntamente com o texto e
com notas explanatórias ao rodapé de cada página, fica muito alegre. Naturalmente, tem forte atração para
qualquer pessoa que não tem comentários ou que acha inconveniente carregar um comentário consigo.
Scofield (1843-1921) tinha convenientemente combinado o texto e o comentário num só volume. Não
surpreende que algumas pessoas achassem conveniente lembrar-se se leram alguma coisa no rodapé (nas
notas) ou no meio da página (no texto). A interpretação de Scofield veio a ser amplamente adotada nos
círculos fundamentalistas. Nalgumas igrejas, até se pode ouvir o farfalhar de muitas páginas sendo
viradas simultaneamente porque tantas pessoas levam a Bíblia de Scofield. Não é totalmente
desconhecida a situação em que um pastor, para citar a localização de uma passagem, dá o número da
página ao invés de citar o livro, capitulo e versículo!
O outro meio eficaz da propagação deste sistema foram os institutos bíblicos. Muitas congregações
fundamentalistas tinham sido, a certo tempo, parte de denominações grandes, e recebiam seus ministros,
direta ou indiretamente, dos seminários daquelas denominações. Quando apareceram indicações de
desvios doutrinários nestes seminários, no entanto, as igrejas começaram a receber seus ministros, não
dos seminários, mas dos institutos bíblicos. Quase sem exceção, estas instituições e seus corpos docentes
eram saturados de dispensacionalismo. Destarte, este ponto de vista espalhou-se ainda mais amplamente.
Nalguns casos, os institutos bíblicos evolveram em faculdades bíblicas e depois em faculdades cristãs de
filosofia e letras: por exemplo, b Instituto Bíblico de Providence veio a ser a Faculdade Bíblica de
Providence-Barrington, e depois a Universidade de Barringtono. Alguns também desenvolveram um
seminário teológico: O Instituto Bíblico de Los Angeles veio a ser a Faculdade Biola, mas também deu
origem ao Seminário Teológico Talbot. O Seminário Teológico de Dallas teve um padrão de
desenvolvimento basicamente semelhante embora fosse algo diferente. Logo, os estudantes para o
ministério não tinham de escolher entre uma educação de seminário e uma educação teológica totalmente
evangélica. Alguns estudantes obtinham sua educação pré-graduada num instituto bíblico e depois iam
para um seminário dispensacionalista, tal como Dallas, Talbot, Grace, ou Batista Conservador do Oeste.

Doutrinas do Dispensacionalismo

A Interpretação da Escritura

A primeira doutrina do dispensacionalismo é que a Bíblia deve ser interpretada literalmente. Para
avaliar corretamente este fato, é necessário reconhecer que o dispensacionalismo surgiu quando alta
crítica estava em desenvolvimento. Este último método de chegar ao significado da Bíblia dependia,
nalguns casos, de pressuposições racionalistas. Uma das pressuposições racionalistas era que nenhum
51
evento sobrenatural pode ocorrer. Por exemplo, quando se diz que Jesus andava sobre a água (Mt 14.22-
33), isto ocorreu num dia de neblina. Jesus, na realidade, estava em pé na praia, mas ninguém podia
discerni-lo na neblina. Logo, parecia que Jesus estava em pé na própria água. Semelhante abordagem dá à
Bíblia um significado bem em contraste com seu significado mais óbvio ou aparente. Para muitos,
portanto, “não-literal” veio a ser identificado com “liberal”.

Neste contexto, é compreensível que os dispensacionalistas procurassem tomar a Escritura tão


literalmente quanto possível. Sem dúvida, não entendiam literalmente certas expressões obviamente
figuradas, tais como as árvores batendo palmas (Is 55.12). Mesmo assim, a Escritura deve ser entendida
literalmente sempre que não resulta daí uma situação ridícula. Um lema que a maioria dos
dispensacionalistas adotaria e endossaria de bom grado é: Quando o sentido óbvio faz bom sentido, não
procure outro sentido.

Esta é especialmente a situação quando se interpreta referências bíblicas a Israel. O termo “Israel”
sempre deve referir-se à própria nação de Israel, o Israel étnico, o Israel cuja descendência física remonta
a Jacó (ou, como Deus veio a chamá-lo, Israel). Nunca se refere ao “Israel espiritual”.
Toda a Escritura profética deve ser tratada de modo semelhante. Toda a profecia será cumprida
literalmente e conforme todos os detalhes. Se a Bíblia diz que Cristo, depois de descer, ficará em pé sobre
o Monte das Oliveiras e que o monte se rachará, então Cristo literalmente ficará em pé sobre o monte
literal, e o monte se rachará.
Concomitante com esta interpretação literal da profecia há uma interpretação tipológica das
passagens históricas ou narrativas, que às vezes se assemelha fortemente ao antigo método alegórico. Os
tipos acham-se em tanta profusão e recebem significados tão esotéricos que o dispensacionalista vai
muito além do significado literal dos eventos narrados. Um exemplo disto é a interpretação do Livro de
Ester proposta por Walter Scott, a quem Scofield chamava “o eminente ensinador da Bíblia”:

Quanto ao significado tipológico do livro, Assuero representaria o poderio gentio supremo, e


Vasti, “beleza”, a Igreja professa, que deixa de revelar sua beleza. Ela então é substituída pela
noiva judaica, Ester, “estrela”, ao passo que o maligno Hamã, planejando a destruição de
Israel, foi cortado dramaticamente no meio dos seus propósitos assassinos, com igual certeza
representaria a conspiração dos inimigos do Israel restaurado nos últimos tempos. Mordecai
seria o tipo do nosso Senhor, cabeça do Seu povo exaltado no futuro milenar.

Isso é, supostamente, o que ensina a narrativa histórica. A tipologia achada ali vai muito além do
significado literal da passagem. De modo semelhante, Cantares de Salomão frequentemente é entendido
como retrato do relacionamento entre Cristo e a Igreja. A descrição do tabernáculo é vista como sendo
mais do que apenas a receita do tamanho, cor, e forma dos vários elementos naquela estrutura. É
entendida como sendo uma apresentação de verdades espirituais. Quando este autor era jovem um jovem
pastor em Chicago, participou de um culto reunido da Sexta-Feira Santa. O preletor escolheu seu texto
para um sermão expositivo para a Sexta-Feira Santa em Êxodo 39, e achou na descrição do peitoral do
sumo sacerdote o plano inteiro da salvação. Cada item do peitoral possuía um significado especial,
simbólico que não estava de modo algum aparente na leitura superficial da passagem.

Não se sugere com isto que a tipologia é exclusiva à hermenêutica dispensacionalista. Muitos
outros exegetas bíblicos também acharam tipos dentro da Bíblia. Geralmente o fazem, no entanto,
somente quando o contexto indica que se trata de um tipo, especialmente quando um escritor do Novo
Testamento identifica um tipo dentro do antigo Testamento (conforme o escritor de Hebreus faz com
Melquisedeque). O dispensacionalista, porém, frequentemente vai além disto, designando como tipo
aquilo que não é assim definido no seu contexto.
52
Israel e a Igreja

Uma segunda doutrina principal do dispensacionalismo é uma distinção nítida e específica entre
Israel e a Igreja. Esta distinção é considerada básica para qualquer compreensão correta da Escritura.
“Realmente, a eclesiologia, ou a doutrina da Igreja,” disse Ryrie, “é a pedra de toque do
dispensacionalismo. Segundo este conceito, Deus fez uma aliança especial com Israel (originalmente com
Abraão) que é incondicional. Se fosse condicional, seu cumprimento dependeria da obediência de Israel
aos mandamentos de Deus. Se Israel fosse desobediente, as promessas seriam perdidas e o
relacionamento especial cessaria. Sendo incondicionais, porém, as promessas de Deus hão de se cumprir.
Independentemente da resposta de Israel, esta nação permanece sendo o povo especial de Deus e,
finalmente, receberá Sua bênção.
Várias linhas de evidência são aduzidas no argumento em prol desta qualidade distintiva de Israel.
A primeira é que o Israel nacional e os gentios são contrastados no Novo Testamento. Israel foi tratado
como nação em contraste com os gentios depois de a Igreja ter sido estabelecida no Pentecoste (Atos
3.12; 10; 5.21,31, 35; 21.28). Em Romanos 10.1; Paulo orou por Israel, o que é uma referência clara a
Israel como povo natural distinto da Igreja e fora dela.
Além disto, o Israel natural e a Igreja também são contrastados no Novo Testamento. Paulo
escreveu: “Não vos torneis causa de tropeço nem para judeus, nem para gentios, nem tão pouco para a
Igreja de Deus” (1Co 10.32). Se a esta altura o povo judaico fosse meramente igual aos gentios ou à
Igreja, qual é a razão de ser de semelhante distinção? Em Romanos 9.3-4, Paulo atribuiu a aliança e as
promessas aos seus “compatriotas segundo a carne,” referindo-se obviamente ao Israel natural. Estas
palavras foram escritas após o início da Igreja, provando-se que a Igreja não tomou para si simplesmente
as promessas e bênçãos feitas a Israel Além disto, judeus crentes e gentios crentes, que juntamente
formam a Igreja nesta era, continuam a ser distinguidos no Novo Testamento. Este fato comprova que o
termo Israel ainda significa os descendentes físicos de Abraão. Paulo disse em Romanos 9.6: “Porque
nem todos os de Israel são de fato israelitas, nem por serem descendentes de Abraão são todos seus
filhos”. O termo Israel não se refere aqui à Igreja. Simplesmente distingue a nação como um todo do
elemento crente dentro da nação.
Ryrie tem consciência do argumento, dos não dispensacionalistas baseado em Gálatas 6.15-16:
“Pois em Cristo Jesus nem a circuncisão é coisa alguma, nem a incircuncisão, mas o ser nova criatura. E a
todos quantos andarem de conformidade com esta regra, paz e misericórdia sejam sobre eles e (kai) sobre
o Israel de Deus” (KJV). A pergunta é: Quem é “o Israel de Deus”? O amilenista (assim Ryrie
identificava todos quantos diferem com ele sobre este detalhe de interpretação) insiste que é a Igreja
inteira. O pré milenista, do outro lado, assevera que Paulo estava simplesmente destacando os judeus
cristãos para reconhecimento especial, e não fazendo com que “Israel” fosse equivalente à Igreja. A
questão inteira, conforme Ryrie, depende do significado da conjunção kai (“e”). Pode ser entendido no
sentido ascensivo, “até,” que faria com que a igreja fosse “o Israel de Deus,” Pode ser tomado no sentido
enfático, “e especialmente” (cf. Marcos 16.7; Atos 1.14), que faria de “Israel” (os cristãos judaicos) uma
parte muito importante da totalidade (a Igreja). E pode ser tomado como simples conectivo, “e”, que
também faria com que “Israel” se referisse aos cristãos judeus mais do que à igreja inteira. Ryrie notou
que somente a primeira interpretação, a ascensiva (“até”) identifica a Igreja e Israel. Segundo o
julgamento de Ryrie a questão deve ser decidida, não pela gramática somente, mas, sim, pelo argumento
do livro como um todo, e este favorece o significado conectivo ou enfático de kaí. Se os escritores do
Novo Testamento quisessem fazer com que Israel e a Igreja fossem iguais, poderiam facilmente ter feito
assim em numerosos outros lugares. Ryrie concluiu: “O uso das palavras Israel e Igreja mostra claramente
que, no Novo Testamento, o Israel nacional continua com suas próprias promessas e a Igreja nunca é
considerada igual a um assim chamado “novo Israel”, mas é cuidadosa e continuamente distinguida como
obra separada de Deus nesta era.
53
A implicação é que o termo Israel sempre deve ser entendido do modo mais literal possível - a
saber, como o Israel étnico, nacional, e político “- e nunca num sentido espiritualizado - a saber, a Igreja.
Isto significa que todas as promessas a Abraão e sua descendência devem ser literalmente cumpridas no
próprio povo de Israel, a nação. Visto que algumas destas promessas ainda não foram plenamente
cumpridas, o serão nalgum tempo futuro. Destarte, Deus decerto ainda terá um período de tratamento
especial com Sua nação da aliança, Israel”.
A igreja, segundo o dispensacionalismo, é totalmente imprevista no Antigo Testamento. Acontece
assim, parcialmente porque é uma entidade distintiva a esta era presente, e parcialmente por causa da sua
base ou maneira de origem. Ryrie ofereceu três provas do aspecto distintivo da igreja.
1. A qualidade misteriosa da igreja. Paulo descreveu um mistério “que estivera oculto dos
séculos e das gerações; agora, todavia, se manifestou aos seus santos” (Ef 3.8-11; Cl 1.26). O corpo de
Cristo é mencionado três vezes no contexto (vv 18, 22, 24). Se a igreja foi um mistério desconhecido nos
tempos do Antigo Testamento, decerto não era constituída naquele período. De fato, Paulo disse que esta
entidade é um “novo homem” (Ef 2.15) cuja existência foi possibilitada somente pela morte de Cristo.
2. As observações de Paulo acerca do início da Igreja. Paulo ensinava enfaticamente que há
um relacionamento necessário entre a Igreja e a ressurreição e ascensão de Cristo. A Igreja é edificada
sobre Sua ressurreição, porque o Senhor foi feito Cabeça da Igreja depois que Deus “ressuscitou-o dentre
os mortos, e fê-lo sentar à sua direita nos lugares celestiais” (Ef 1.20; cf. vv. 22-231. Além disto, o devido
funcionamento do corpo depende de dar dons ao corpo, que por sua vez depende da ascensão de Cristo
(Ef 4.7-12). Se, dalguma forma, o corpo de Cristo existisse antes da Sua ascensão, deve ter sido um corpo
não-operativo. A Igreja, edificada sobre a ressurreição e a ascensão, deve necessariamente ser distintiva
desta era. Com a frase “mortos em Cristo” (1Ts 4.16), Paulo claramente distinguia entre os que morreram
depois do primeiro advento de Cristo e os que morreram antes dele, demarcando ainda mais, destarte, a
Igreja como sendo distintiva desta era e oculta dos crentes do Antigo Testamento.
3. A obra batizadora do Espírito Santo. A igreja somente começou no Pentecostes. O Senhor,
na Sua ascensão, falou do batismo no Espírito Santo sendo ainda futuro e diferente de qualquer coisa que
Seus discípulos tivessem experimentado antes (Atos 1.5). Atos 2 não especifica que o batismo no Espírito
ocorreu no dia de Pentecoste, mas Atos 11.15-16 o diz, declarando que cumpriu a promessa do Senhor.
Paulo explicou que este batismo coloca as pessoas no corpo de Cristo (1Co 12.13). A primeira ocorrência
deste batismo foi no dia de Pentecoste. Visto que a Igreja é o corpo de Cristo lCo 1.18), não poderia ter
começado antes do Pentecoste, e forçosamente começou naquele dia.
Ryrie tomou o cuidado de indicar que o aspecto distintivo da Igreja nesta era não significa: (1) que
não havia pessoas com o relacionamento correto com Deus nos tempos do Antigo Testamento, ou (2) que
Cristo não fundou a Igreja. Tudo quanto os dispensacionalistas estão afirmando é que o povo de Deus que
foi batizado no corpo de Cristo e que assim forma a Igreja é distinto dos santos de dias anteriores e dos
santos de um tempo futuro.
Segue-se que a Igreja não é mencionada em lugar algum do Antigo Testamento, não é profetizada
em lugar algum. É um “parêntese”, que se encaixa, especificamente, entre a sexagésima nona semana e a
septuagésima semana de Daniel. Nenhuma profecia foi cumprida desde o tempo de Cristo. O relógio
profético não deu nenhum tique-taque desde Pentecostes.
O reino, portanto, foi adiado. Tanto João Batista quanto Jesus pregavam que o reino estava
próximo. Este reino terrestre foi oferecido aos judeus, o povo escolhido segundo a aliança, e eles o
rejeitaram. Os dispensacionalistas não identificam o lugar e tempo exatos da rejeição. Scofield sugeriu
que o rei fosse moralmente rejeitado em Mateus 11.20-21, quando Jesus começou a pregar uma nova
mensagem, uma de descanso e serviço, a quaisquer pessoas na nação que sentissem consciência da sua
necessidade. Mesmo assim, disse Scofield, a rejeição definitiva foi mais tarde (Mt 27.31-37). Alguns a
colocam em Atos 28.20.
Depois de Israel ter rejeitado o reino, Deus o ofereceu à Igreja. A Igreja era, por assim dizer, o
substituto de Israel que Deus providenciou, “enxertando-a”. Para Israel, no entanto, o reino foi
54
simplesmente adiado. Será oferecido de novo ao povo de Deus, Israel, depois de ser completado o' tempo
dos gentios. Deus não Se esqueceu do Seu povo Israel, nem o deslocou por meio da Igreja.

Os Dois Reinos

O dispensacionalismo distingue entre o Reino de Deus e o Reino dos Céus e baseia esta distinção
principalmente no fato de que a maioria das parábolas do reino (dos céus) em Mateus 13 não se acham
em Marcos e Lucas. O reino dos céus, segundo Scofield, é judaico, messiânico, e davídico. Fora
prometido a Davi, e esta promessa entrou no período do Novo Testamento “totalmente sem mudança”.
Estava “próximo” desde o início do ministério de João Batista até “a virtual rejeição do Rei”, e depois foi
adiado. Será realizado no milênio.

O reino de Deus, do outro lado, é universal. Inclui “todas as inteligências morais que livremente se
sujeitam à vontade de Deus, sejam anjos, a Igreja, ou os santos das dispensações passadas ou futuras”.
Todas as dispensações da história humana podem ser apropriadamente chamadas dispensações do reino
de Deus. É o mais inclusivo dos dois termos.

O Propósito do Milênio

Finalmente, no dispensacionalismo o milênio é mais do que meramente um reino de Cristo sobre


a terra durante mil anos. Tem um lugar claro e específico no plano de Deus: a restauração do Israel
nacional ao seu lugar favorecido no programa de Deus, e o cumprimento das promessas de Deus a Israel.
O milênio, portanto, tem um tom muito judaico. É o tempo quando Israel recebe sua posição ideal. Ao
passo que nalgumas outras formas de Pré milenismo não fica muito claro o propósito do milênio, no
dispensacionalismo é uma parte integrante da teologia bíblica e do modo de entender a Bíblia. Grandes
porções de profecia ainda não foram cumpridas, e o milênio providencia um tempo próprio para seu
cumprimento.

Avaliação do dispensacionalismo

Aspectos Positivos

O primeiro ponto forte e benefício do sistema dispensacionalista é que realmente é um sistema. A


palavra sistema evoca uma reação negativa em muitos círculos hoje, principalmente por causa da
influência do existencialismo que é hostil à estrutura e à ordem na realidade, e à intelectualização ou
racionalização da verdade. Desde o tempo do ataque de Sören Kierkegaard contra o sistema de Georg
Hegel, em que tudo se encaixava com perfeição no seu próprio lugar, o existencialismo tem tido suspeita
de qualquer tratamento da realidade que coloca os vários elementos numa totalidade coerente. Como
consequência, os estudos bíblicos nos anos recentes tem sido um pouco fragmentários na sua natureza,
enfatizando a teologia bíblica, e minimizando a teologia sistemática. Os dispensacionalistas, no entanto,
têm procurado sintetizar ou integrar o testemunho bíblico inteiro numa totalidade global unificada.
Procuraram evitar a confusão sentida pelo leigo quando é informado que uma das porções da Escritura
significa uma coisa, e que outra porção significa o exato oposto. O fato de que o significado é melhor
apreendido e a compreensão melhor facilitada dentro de uma estrutura, ou Gestalt,27 talvez explique pelo
menos em parte a grande popularidade do dispensacionalismo entre os leigos.
Em segundo lugar, o dispensacionalismo tem procurado levar a sério a ideia da revelação
progressiva, e desenvolveu uma teologia baseada sobre ela. A estrutura dispensacionalista às vezes é
27
Gestalt. Al., 'forma', 'figura', 'configuração'. Substantivo feminino. Posicionamento que parte da teoria do gestaltismo.

55
retratada vividamente como uma escada, sendo que cada uma das dispensações é outro degrau para cima.
Decerto, Deus revelou mais verdades à medida em que o tempo tem passado, e o dispensacionalismo
reconhece este fato de modo formal.
Em terceiro lugar, o dispensacionalismo tem procurado ser genuína e totalmente bíblico. O
dispensacionalismo pergunta, em qualquer questão de doutrina: “O que diz a Bíblia?” Quando discute as
questões, fala em termos de Escrituras específicas e demonstra um conhecimento eficiente do conteúdo
da Bíblia. As escolas dispensacionalistas ressaltam a importância de saber o que a Bíblia diz e onde o diz.
Se a Bíblia é a autoridade suprema em questões da fé e da prática, então este biblicismo deve ser
considerado uma real virtude.

Aspectos Negativos

O dispensacionalismo tem seus problemas, também. O primeiro é que, a despeito da sua tentativa
de levar a sério a revelação progressiva, fracassa neste ponto. A “era de ouro” da história redentora de
Deus foi o tempo dos Seus tratos especiais com Israel. Depois dalgumas dispensações intervenientes, o
plano de Deus exige uma inversão dos Seus tratos com Israel. O que agora está acontecendo é um tipo de
desvio do plano, um arranjo interino. Como consequência, o Antigo Testamento, em certo sentido, não foi
realmente ultrapassado.
Em segundo lugar, a distinção entre Israel e a Igreja, tão básica e crucial para o
dispensacionalismo, é difícil de manter de modo consistente. Os dispensacionalistas têm selecionado com
cuidado passagens que favorecem (ou que pelo menos podem acomodar) a interpretação deles. Outras
passagens, no entanto, não são tão fáceis de colocar fora do caminho. Em Romanos 9 e Gálatas 3, por
exemplo, é difícil de escapar da conclusão de que Paulo considerava a Igreja, com judeus e gentios
igualmente, como sendo a legítima herdeira das promessas originalmente feitas ao Israel nacional. Parece
mesmo que haverá um período de favor especial para com os judeus, e que se voltarão a Deus em grandes
números. Parece provável, no entanto, que isto será levado a efeito através de serem convertidos e
integrados na Igreja, ao invés de por meio de Deus continuar o relacionamento que tinha com eles no
Antigo Testamento, como nação escolhida segundo a aliança.
Em terceiro lugar, a distinção entre o reino de Deus e o reino dos céus, da qual depende tanta
coisa, é difícil de sustentar. As passagens em Marcos e Lucas que são paralelas a Mateus 13 empregam a
expressão “Reino de Deus” ao invés de “Reino dos Céus”. Somente Mateus emprega esta última
expressão. É difícil acreditar que estas duas expressões designam duas entidades diferentes em passagens
doutra forma paralelas. Parece que os autores descrevem uma só entidade com duas frases. Mateus estava
escrevendo primariamente aos judeus, que consideravam o nome de Iavé (Iahweh) tão sagrado que nem
sequer deveria ser pronunciado. Um substituto comum para este nome era “céu” ou “os céus”. Nesta base,
“reino dos céus” era simplesmente um substituto reverente para “reino de Deus” para as pessoas que
tinham convicções contra o uso desta última palavra. Esta explicação das duas frases parece melhor do
que aquela dos dispensacionalistas. Edificar o conceito total da natureza do reino e daqueles que o
recebem, sobre esta distinção da terminologia, é edificar sobre um alicerce inseguro.
Finalmente, o dispensacionalismo é inconsistente quando abandona sua interpretação
extremamente literal da profecia em troca de uma interpretação virtualmente alegórica da narrativa
histórica, especialmente onde não há justificativa para isto, ou no contexto imediato de uma passagem
especifica, ou noutro trecho da Escritura. O dispensacionalismo parece ter perdido o controle da exegese.

56
QUADRO DAS DISPENSAÇÕES

J. N. Darby J. H. Brookes James M. C. I. Scofield Charles C. Aldery N. da


1800-1882 1830-1897 Gray 1843-1921 Ryrie Rocha
1851-1935 1963-1985 1985
Estado paradisíaco Éden Edênico Inocência
(até o dilúvio) P M
Antediluviano Antediluviano Consciência
A I
Noé Governo S S
Patriarcal Patriarcal Humano S T
Abraão Promessa A É
D R
Israel A I
Sob a lei Mosaico Mosaico Lei O
Sob o sacerdócio
Sob os reis
Gentios Messiânico Igreja Graça PRESENTE GRAÇA
Espírito Espírito Santo
Milênio Milenar Milenar Reino/Milênio
Plenitude do PLENITUDE
Tempo FUTURA DOS
TEMPOS
Eternidade

57
Concepções Acerca das Últimas Coisas
CATEGORIAS AMILENISMO PÓS-MILENISMO PRÉ MILENISMO PRÉ MILENISMO
HISTÓRICO DISPENSACIONAL
SEGUNDA Um único evento; Um único evento; Arrebatamento e Arrebatamento da
VINDA nenhuma distinção nenhuma distinção segunda vinda Igreja sete anos antes
entre arrebatamento e entre arrebatamento e simultâneos; Cristo da Grande Tribulação.
segunda vinda; segunda vinda; Cristo volta para reinar na Segunda vinda após a
introduz o estado retorna após o milênio. terra. G. Tribulação.
eterno.
RESSURREIÇÃO Ressurreição geral dos Ressurreição geral dos Ressurreição dos 1ª Ressurreição:
crentes e incrédulos na crentes e incrédulos na crentes no início do Os santos antes da
segunda vinda. segunda vinda. Milênio. Ressurreição Grande Tribulação. Os
dos incrédulos no final mártires no fim da G.
do Milênio T.
2ª Ressurreição:
Incrédulos no final do
Milênio.
JULGAMENTOS Julgamento geral de Julgamento geral de Julgamento na 2ª Bema: o Tribunal de
todas as pessoas. todas as pessoas. Vinda. Cristo p/ galardões dos
Julgamento no final do crentes.
Milênio Armagedom: judeus e
gentios no fim da G.
Tribulação.
Trono Branco:
Incrédulos no fim do
Milênio
TRIBULAÇÃO A tribulação é A tribulação é Conceito Conceito
experimentada nesta experimentada nesta Pós-tribulacional: Pré-tribulacional:
era presente. era presente. A Igreja passará pela a Igreja é arrebatada
Tribulação que não é a antes da G. Tribulação.
G. Tribulação.
MILÊNIO Nenhum Milênio A era presente O Milênio é tanto Na segunda vinda
literal na terra após a transforma-se no presente quanto Cristo inaugura um
segunda vinda. O milênio por causa do futuro. Cristo está Milênio literal de mil
Reino está presente na evangelho. reinando no céu. O anos na terra.
era da igreja. Milênio não tem
necessariamente mil
anos
ISRAEL E A Igreja é o novo A Igreja é o novo Alguma distinção Completa distinção
IGREJA Israel. Não há Israel. Não há entre Israel e a Igreja. entre Israel e a Igreja.
distinção entre Israel e distinção entre Israel e Há um futuro para Programa distinto para
a igreja. a igreja. Israel, mas a Igreja é o cada um.
Israel espiritual.
REINO A igreja é o reino A Igreja introduz o O reino introduz a O Reino é Eterno.
reino (o milênio). igreja. Nele serão inseridos a
Igreja, o
Remanescente judaico
e os Gentios salvos
(trigo, ovelhas, peixes
bons).
DEFENSORES L. Berkhof; Charles Hodge; G. E. Ladd; L. S. Chafer;
O. T. Allis; B. B. Warfield; A. Reese; J. D. Pentecost;
G. C. Berkhouwer W. G. T. Shedd; M. J. Erickson. Charles C. Ryrie;
A. H. Strong J. F. Wallvoord

58
59
DOUTRINAS TRIBULACIONISTAS 28

Pré tribulacionismo

Chegamos agora à discussão do relacionamento entre o evento (ou série de eventos) conhecido
como a Grande Tribulação e a vinda de Cristo. Ele voltará para remover Sua Igreja do mundo antes da
tribulação, ou a Igreja passará pela sequência inteira? Ou será que experimentará parte da tribulação e
então será libertada do mundo antes de ocorrer a parte principal (e mais severa) dela?
Teoricamente, os pontos de vista tribulacionistas poderiam ser ligados a quaisquer das posições
milenistas. Na prática, porém, estas perguntas têm sido levantadas e tratadas primariamente por pré
milenistas - talvez porque os pré milenistas frequentemente têm dado mais atenção aos pormenores da
escatologia do que os defensores dos outros dois conceitos milenistas. Para os propósitos desta discussão,
os pontos de vista tribulacionistas serão tratados como subdivisões do Pré milenismo.
O primeiro ponto de vista tribulacionista que discutiremos é o pré-tri-bulacionismo. É importante
observar primeiramente o relacionamento entre esta posição escatológica e o sistema teológico geral
conhecido como dispensacionalismo. Na prática, são quase invariavelmente unidos entre si; logicamente,
porém, são um pouco independentes. Todos os dispensacionalistas são pré tribulacionistas - porque o Pré
tribulacionismo faz parte do sistema integral do dispensacionalismo - mas nem todos os pré
tribulacionistas são dispensacionalistas. O arrebatamento pré-tribulacional pode ser baseado em
fundamentos exegéticos independentes, ao invés de ser inferido de premissas dispensacionalistas.

Panorama do Pré tribulacionismo

O ponto de partida para o exame do Pré tribulacionismo é seu modo de ver a natureza da grande
tribulação. Os pré tribulacionistas insistem em que esta realmente é a grande tribulação, uma tribulação
completamente sem igual na totalidade da história. Embora alguns escatólogos ressaltem que a igreja
sempre tem experimentado a perseguição e, portanto, a tribulação, o Pré tribulacionismo vê esta grande
tribulação como sendo tão intensa que não será facilmente confundida com a tribulação em geral. Sem
dúvida, numerosas passagens bíblicas falam da tribulação e da guerra que é característica da experiência
dos santos em todas as eras dos tratos redentores de Deus para com Seus filhos. Em contraste agudo com
isto, no entanto, há o ensino bíblico que um período futuro de tribulação sem precedentes eclipsará todos
os tempos anteriores de aflição. Envolve três classes de pessoas: (1) a nação de Israel, (2) o mundo gentio
pagão, e (3) os santos ou eleitos que viverão naquele tempo de tribulação.
Esta grande tribulação tem um propósito definido e duplo: (1) terminar “os tempos dos gentios”
(Lucas 21.24), e (2) preparar para a restauração e reunião de Israel no reino milenar de Cristo após o
segundo advento. A tribulação, portanto, serve assim de período de transição no plano de Deus. Os pré
tribulacionistas insistem muito enfaticamente que o propósito primário da tribulação não é purificar a
igreja ou disciplinar os crentes.
Um segundo aspecto do Pré tribulacionismo, de extrema importância, é a ideia de que Jesus virá
buscar Sua igreja antes da grande tribulação para “arrebatá-la” fora do mundo. A palavra arrebatamento
deriva de rapere, a tradução latina de “arrebatar” em 1 Tessalonicenses 4.17. A palavra grega geralmente
relacionada com o arrebatamento é parusia (que é transliterada parusia). Esta vinda de Cristo para a
Igreja significará que os crentes serão arrebatados da terra para se encontrar com Ele no ar. Cristo não
descerá totalmente para a terra, conforme fará na segunda vinda (a vinda com a igreja) quando descerá ao

28
ERICKSON, M.J. Um estudo do Milênio. Opções contemporâneas na Escatologia. 2ª ed. São Paulo: Edições Vida Nova,
1986.

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Monte das Oliveiras. Logo, Sua vinda não será observada pelo mundo descrente, embora seus efeitos (i.
é, a ausência de um número substancial de pessoas) serão facilmente discerníveis.
O efeito do arrebatamento é remover a igreja da cena da história do mundo durante a tribulação,
que durará sete anos. O dispensacionalismo, com sua distinção nítida entre Israel e a Igreja, considera que
a tribulação fará a transição entre o trato (temporário) da Igreja da parte de Deus, e o recomeço do Seu
trato primário com o Israel nacional. A “bendita esperança” do crente, portanto, é a libertação da grande
tribulação.
No arrebatamento, duas coisas acontecerão: (1) os santos que estiverem com vida serão
“trasladados”, ou seja, serão transformados para a natureza e a condição que serão deles por toda a
eternidade; e (2) os crentes que morreram em Cristo serão ressuscitados para acompanhar os crentes vivos
no céu (o “antigo” céu). É assim que os pré tribulacionistas interpretam 1 Tessalonicenses 4.
Nesta ocasião, todos os cristãos serão julgados (2Co 5.10). Aparecerão diante do tribunal de Cristo
e serão julgados segundo as suas obras. Es te julgamento não será extensivo a todas as pessoas que já
viveram, nem sequer a todas as pessoas que finalmente serão salvas. Diz respeito somente a “'todos nós”,
ou seja, os crentes em Cristo durante a presente era (i. é., a Igreja). Este julgamento não separará os salvos
dos não-salvos; será para dar galardões para as boas obras das pessoas que estão sendo julgadas.
No fim deste período de sete anos, durante o qual a Igreja, tendo recebido seu galardão, estará com
Cristo no céu enquanto os não-cristãos estarão passando por grandes tribulações na terra, Jesus voltará
com a Igreja em triunfo. Este grande evento será visível a todos. Será acompanhado por uma segunda
ressurreição: uma ressurreição dos crentes que morreram durante a tribulação. Estes passam a
compartilhar do reino milenar com Cristo e os demais crentes.
A segunda vinda, portanto, tem duas etapas ou fases. Na primeira fase, Cristo vem para a igreja,
para removê-la do mundo. Na segunda fase, chega com a igreja, para começar o reino terrestre,
estabelecer Seu governo, e iniciar o milênio. Segundo o ponto de vista pós-tribulacionista, conforme
veremos mais tarde, estes são dois aspectos de um único evento ou ocorrência. O Pós tribulacionismo
discerne apenas duas ressurreições, ao passo que o Pré tribulacionismo vê três (a ressurreição dos justos
mortos, no arrebatamento pouco antes da tribulação, a ressurreição, imediatamente após a tribulação, dos
santos que morreram durante a tribulação, e a ressurreição dos descrentes no fim do milênio). Porque o
Pós tribulacionismo não divide a vinda de Cristo em duas etapas, não distingue entre as duas primeiras
destas ressurreições.
Uma doutrina crucial do Pré tribulacionismo é a doutrina da iminência, segundo a qual a volta de
Cristo (o arrebatamento ou a parusia) pode ocorrer a qualquer tempo. Nenhum evento adicional precisa
ocorrer, nenhuma profecia adicional precisa ser cumprida, antes do arrebatamento. Isto, naturalmente,
está estreitamente vinculado ao conceito do Pré tribulacionismo. Se a segunda vinda fosse um evento
unitário ou unificado, não poderia ocorrer a qualquer momento; a grande tribulação teria que ocorrer
primeiro. Na realidade, porém, Cristo pode vir a qualquer tempo, até mesmo antes de completar-se esta
frase. Os pré tribulacionistas veem esta crença na iminência como sendo um grande incentivo para a
urgência no serviço cristão. Porque não sabemos quando acabará nossa oportunidade para o serviço,
ficamos mais resolutos quanto ao empregar bem o tempo presente.

A História do Pré tribulacionismo

No capítulo sobre o Pré milenismo, notamos que o quiliasmo era uma força dominante nos
primeiros séculos da era cristã. Quando, porém, examinamos de perto este quiliasmo, dificilmente
achamos que é a forma pré tribulacionista que estamos examinando neste capítulo. Ao invés de antecipar
uma libertação da tribulação vindoura, os cristãos primitivos evidentemente aguardaram aquela grande
aflição como experiência pessoal.
O Didaquê, escrito na primeira quarta parte do século II, aparentemente tinha, em parte, a intenção
de preparar os cristãos para a aflição vindoura. O último capítulo é como segue:
61
1. Vigiai por vossa vida: as vossas lâmpadas não estejam apagadas, e nem desprevenidos os vossos lombos,
mas estai preparados, porque não sabeis a hora em que nosso Senhor há de vir. 2. Mas reuni-vos
frequentemente, buscando as coisas proveitosas às vossas almas, porque não vos aproveitará todo o tempo
de vossa fé, a não ser que estejais perfeitos no último tempo. 3. Porque nos últimos dias (se multiplicarão)
os falsos profetas e os corruptores, e as ovelhas se converterão em lobos, e o amor se tornará em ódio. 4.
Porque com o incremento da iniquidade, odiar-se-ão uns aos outros, e perseguir-se-ão e trair- se-ão, e então
aparecerá o enganador do mundo como filho de Deus, e fará sinais e prodígios, e a terra será entregue em
suas mãos e cometerá iniquidades como jamais praticaram desde os séculos. 5. Então virá a criação dos
homens para o fogo da prova, e muitos se escandalizarão e perecerão, mas os que permanecerem em sua fé,
se salvarão pela mesma maldição. 6. E então aparecerão os sinais da verdade: primeiro, o sinal da abertura
no céu; depois o sinal da voz da trombeta, e, em terceiro lugar, a ressurreição dos mortos, 7. mas não de
todos, porém como foi dito: “O Senhor virá e todos os santos com Ele.” 8. Então o mundo verá o Senhor
vindo sobre as nuvens do céu.

V. 5 sugere que os crentes estarão presentes nesta tribulação e que, mediante sua perseverança,
demonstrarão a realidade da sua fé. Diz, também, que todos os homens criados serão provados pelo fogo,
e que muitos se escandalizarão e perecerão. Somente v. 7 admite a possibilidade de um entendimento pré
tribulacionista - a referência a todos os santos vindo com o Senhor relembra, de leve, a “vinda com” a
igreja conforme os pré tribulacionistas, ao invés da “vinda para” a igreja.
Outros escritos antigos são, de modo semelhante, pré milenistas sem serem pré tribulacionistas.
Dois exemplos são o Pastor de Hermas e a Epistola de Barnabé. O primeiro destes contém uma massagem
que às vezes: é citada como exemplo da crença num arrebatamento pré tribulacionista, mas o exame mais
pormenorizado dela revela que não o é.
Talvez o primeiro dos pais da Igreja a oferecer um tratamento pormenorizado da tribulação foi
Irineu (130?-200?). Seus escritos revelam que era um pré milenista rematado, mas que não acreditava
num arrebatamento entes da tribulação. Pelo contrário, via Cristo chegando ao fim da tribulação para
destruir o Anticristo e livrar Sua igreja.

Mas depois deste Anticristo ter devastado todas as coisas neste mundo, reinará por três anos e seis
meses, e se assentará no templo em Jerusalém; e depois o Senhor virá do céu nas nuvens, na glória
do Pai, e enviará este homem [o Anticristo] e aqueles que o seguem para o lago de fogo; mas
inaugurará para os justos [a Igreja] os tempos do reino.
Pois todas estas palavras, bem como outras, foram faladas, sem dúvida alguma, com referência à
ressurreição dos justos, que ocorre depois da vinda do Anticristo, e à destruição de todas as nações
dominadas por ele; nos [tempos de] tal [ressurreição] os justos reinarão na terra, tornando.se
sempre mais fortes ao verem o Senhor; e, através dEle, ficarão acostumados a participar da glória
de Deus Pai, e desfrutarão no reino de convívio e comunhão com os santos anjos, e da união com
seres espirituais; e o mesmo [diz respeito aos] que o Senhor achará vivos na carne, aguardando
Sua vinda do céu, que sofreram a tribulação, bem como escaparam das mãos do Maligno.

Os pré tribulacionistas geralmente reconhecem que não há nenhuma declaração completa do Pré
tribulacionismo nos escritos dos pais antigos. Mas, como disse John Walvoord, não há, tampouco, nos
escritos deles uma exposição detalhada e estabelecida de qualquer outro aspecto do Pré milenismo. Na
realidade, conforme ele notou, a maioria das doutrinas mais importantes foram desenvolvidas no decurso
de um período de vários séculos. A doutrina da Trindade não recebeu uma declaração definitiva e
geralmente aceita até o século IV e depois, a partir do Concílio de Nicéia em 325. A doutrina da
depravação humana não era uma doutrina estabelecida da igreja até ao século V e depois. E a doutrina do
sacerdócio do crente não ficou estabelecida até a Reforma Protestante. Se estas doutrinas, por básicas e
centrais que fossem, não eram formuladas de modo definitivo de noite para o dia, é de se estranhar que os
pormenores da escatologia, que são especialmente difíceis, fossem lentos em desdobrar-se?
62
Mesmo assim, é verdade que estes escritos cristãos antigos contêm uma crença na iminência, que,
segundo sustenta Walvoord, é o aspecto central do Pré tribulacionismo. A Igreja primitiva não enfrentou
todos os problemas levantados pela doutrina da iminência, tais como seu relacionamento com a
tribulação. Se a expectativa era de uma vinda a qualquer momento, como ocorre entre os pré
tribulacionistas modernos, é debatível. A Igreja primitiva parece, pelo contrário, ter esperado que uma
série inteira de eventos logo ocorresse, inclusive a tribulação.
Embora haja, nos escritos dos pais primitivos, sementes das quais a doutrina do arrebatamento pré
tribulacionista pudesse ser desenvolvida, é difícil achar neles uma declaração inequívoca do tipo de
iminência usualmente aceito como artigo de fé pelos pré tribulacionistas. Além disto, há nestes escritos
algumas expressões claramente pós tribulacionistas, conforme até mesmo Walvoord reconheceu:

A expectativa da vinda do Senhor era nublada, porém, pela crença de que os eventos da tribulação eram
pendentes, e que a vinda de Cristo para estabelecer Seu reino era pós·tribulacionista. Embora nem todos os
pais revelem clareza na questão, alguns deles eram pós tribulacionistas. Os pré tribulacionistas usualmente
reconhecem que nenhum deles ensinava a exata interpretação de Darby.

Durante a Idade Média, conforme já vimos, a interpretação escatológica que foi paulatinamente
adotada era o assim-chamado ponto de vista histórico, que coloca os eventos escatológicos dentro da
história da Igreja. Na Reforma, os protestantes tendiam a identificar o Anticristo com a Roma papal. A
tribulação já estava ocorrendo, ou ocorreria durante o decurso normal da história. Neste arcabouço,
certamente não havia expectativa de uma vinda iminente. Até mesmo os protestantes que eram pré
milenistas tendiam a seguir o modo histórico de interpretação.
No começo do século XIX, o Pré tribulacionismo nítido ocorreu nos pontos de vista de John
Nelson Darby (1800-1882), um membro do movimento dos Irmãos de Plymouth. Este movimento
começou em Dublin em 1825, como grupo de homens preocupados com a condição espiritual da Igreja
protestante na Irlanda. Grupos semelhantes de oração e comunhão surgiram noutros lugares. Darby, que
entrou na comunidade em 1827, bem como outros líderes do movimento, envolveram-se nas conferências
proféticas levadas a efeito em Powerscourt House. O ponto de vista ali exposto era muito semelhante
àquele que se achava na Igreja primitiva: um ponto de vista futurista quanto à vinda do Anticristo, que
infligirá severa perseguição sobre a Igreja durante a grande tribulação. Conforme este ponto de vista,
Cristo voltará no fim da tribulação para libertar Sua igreja. Darby introduziu uma modificação deste
conceito: Cristo virá arrebatar Sua igreja antes da tribulação e antes de Ele vir em glória para estabelecer
o reino milenar.
O conceito de Darby resultou em uma divisão do movimento dos Irmãos. Samuel P. Tregelles, um
membro dos Irmãos nos primeiros dias do movimento, alegou que a ideia de uma vinda secreta de Cristo
para arrebatar a Igreja originou-se numa profecia na Igreja de Edward Irving, um pregador na conferência
profética da qual se derivou as reuniões em Powerscourt House. Darby a aceitou como sendo a voz do
Espírito e a aceitou como doutrina, mas Tregelles, Benjamim W. Newton, e outros que sustentavam uma
perspectiva pós-tribulacionista, rejeitaram-na. O resultado foi o início de contendas dentro do movimento
dos Irmãos.
Darby visitou os Estados Unidos nada menos que seis vetes entre 1859 e 1874, e fez exposição dos
seus modos de ver a escatologia. Para muitos americanos, o darbyismo se constituía na recuperação da
doutrina bíblica da gloriosa segunda vinda de Cristo.
O interesse no ensino e na pregação proféticos era um fator principal na ascensão do movimento
das Conferências Bíblicas, em que os ministros e leigos que aceitavam um grupo de crenças comumente
aceitas reuniam-se para a mútua comunhão. A conferência mais famosa foi a Conferência de Niágara.
Depois de ela deixar de existir, uma nova conferência foi estabelecida em Seacliff, Long Island, em 1901.
Foi em Seacliff que C. I. Scofield (1843-1921) teve a ideia de uma Bíblia de referência. Embora muitos
dos primeiros líderes destas conferências fossem pós tribulacionistas, a maioria era pré tribulacionista, e
63
foram eles que fizeram o impacto maior sobre o movimento. A Bíblia de Referências de Scofield foi
especialmente eficaz em espalhar o Pré tribulacionismo. Largamente distribuída nos círculos
conservadores, era o único auxílio ao estudo bíblico possuído por muitos leigos. O movimento dos
institutos bíblicos também foi eficaz em promover o Pré tribulacionismo. À medida em que sempre mais
seminários das denominações principais se voltavam para uma teologia liberal, as Igrejas conservadoras
dependiam mais e mais dos institutos bíblicos para receberem seus pastores, e estes institutos eram quase
exclusivamente pré tribulacionistas. Como resultado, este ponto de vista foi adotado pela maioria das
igrejas independentes conservadoras e batistas, bem como por muitas “igrejas livres”.

Doutrinas do Pré tribulacionismo

Chegamos agora a um exame mais pormenorizado das doutrinas principais do Pré tribulacionismo
e dos argumentos aduzidos para apoiá-las. Examinaremos as questões do Pré tribulacionismo em si
mesmo, ao invés do sistema mais amplo da interpretação dispensacionalista dentro do qual
frequentemente é achado. Há três considerações aqui: a Igreja parece estar ausente durante a tribulação; a
Igreja é removida antes da tribulação; e a vinda do Senhor é iminente. Examinaremos estas
considerações, uma por uma.

A Ausência da Igreja Durante a Tribulação

A primeira consideração envolve um conceito específico da natureza da igreja. É aqui que a


estreita conexão entre o Pré tribulacionismo e o dispensacionalismo se torna aparente pela primeira vez. É
verdade, diz o pré tribulacionista, que haverá crentes, ou santos, ou eleitos presentes durante a. tribulação.
De fato, Mateus diz que, por amor aos eleitos, aqueles dias serão encurtados. O pós-tribulacionista
comete um erro sério ao supor que estes santos são a Igreja. Este engano, por sua vez, baseia-se num erro
maior ainda: equiparar ou identificar a Igreja com todos os crentes durante todos os períodos dos tratos de
Deus com a raça humana.
O Pós tribulacionismo tem alegado que o arrebatamento da Igreja no fim da tribulação é afirmado
em Mateus 24.31: “E ele enviará os seus anjos, com grande clangor de trombeta, os quais reunirão os seus
escolhidos, dos quatro ventos, de uma a outra extremidade dos céus.” Esta passagem e outras como ela,
no entanto, não empregam em lugar algum as· expressões distintivas Igreja ou corpo de Cristo ou
qualquer outro termo que claramente e de modo especial se refere à Igreja. Sempre emprega o termo mais
geral, escolhidos. Se a Igreja fosse envolvida, tal fato não seria tornado explícito e claro? Walvoord
sugeriu que o contexto de Mateus 24 limita a palavra eleitos a um de dois significados: os santos vivos na
terra na ocasião do segundo advento (cf. Mt 24.22) ou Israel como nação eleita. De modo semelhante, as
palavras Igreja ou igrejas não aparecem no Apocalipse depois do capítulo 3 (a não ser em 22.16, onde o
Cristo ascendido declara que está enviando uma mensagem às igrejas que estão na terra quando o
Apocalipse está sendo descrito).
Mas mesmo se o significado mais amplo de eleitos se aplica em Mateus 24.31, ainda é bem
possível harmonizar a passagem com o Pré tribulacionismo. Mateus fala dos eleitos sendo reunidos “dos
quatro ventos, de uma a outra extremidade dos céus”; Marcos fala de serem reunidos “da extremidade da
terra até à extremidade do céu” (Marcos 13.27). Não há dúvida que, no segundo advento, a Igreja,
arrebatada antes da tribulação, será reunida no céu; os santos do Antigo Testamento serão ressurretos, e os
eleitos na terra serão reunidos. Walvoord tirou a conclusão de que, embora esta passagem não comprove o
Pré tribulacionismo, “não oferece qualquer evidência contra ele.

Mas o que se diz dos eleitos que estiverem presentes durante esta grande tribulação? Se não são a
Igreja, quem são? Certamente um remanescente de crentes piedosos estará presente quando Cristo voltar
para estabelecer Seu reino. Apocalipse 7.4 fala de 144.000 de todas as tribos de Israel. Não são a Igreja,
64
pois os membros da Igreja não são chamados “os filhos de Israel”. Embora membros da Igreja sejam
referidos como filhos de Abraão, “o pai de nós todos” (Rm 4.16), é bem diferente da designação “filhos
de Israel”. Estes 144.000 servos selados de Deus são judeus. Além disto, Apocalipse 7.9 fala de uma
grande multidão que inclui grande número de gentios que se tornam crentes durante a tribulação,
mediante o fiel testemunho dos judeus. Estes dois grupos retêm suas características nacionais como
gentios salvos e judeus salvos. Nenhuma das promessas especiais e peculiares dadas à Igreja na era
presente é dada a estes santos da tribulação.

A Igreja é Removida do Mundo

Gordon Lewis levou o argumento um passo à frente e defendeu a ideia de que as passagens que
acabamos de considerar realmente apóiam um arrebatamento da igreja antes da tribulação; referem-se,
indicou ele, somente aos judeus. Notemos o contexto de Mateus 24. Os discípulos tinham pedido ao
Senhor um sinal da Sua vinda e do fim da era. Esta pergunta, como aquela em Atos 1.6 (“Senhor, será este
o tempo em que restaures o reino a Israel?”) foi feita dentro do arcabouço das preocupações judaicas, e a
resposta de Cristo estava em termos do futuro dos judeus. São os judeus que são retratados como estando
presentes durante a tribulação. Tirar a passagem fora do seu contexto e aplicá-la a todos os crentes é
forçar a Escritura. Quando a passagem é vista nesta luz, sua interpretação se torna mais fácil. Depois dos
sinais iniciais, os judeus verão no templo o sacrilégio desolador falado por Daniel o profeta. O tempo da
aflição de Jacó será abreviado por amor aos eleitos (os israelitas). Depois da tribulação, o Filho do
homem, de quem falou Daniel, virá nas nuvens do céu e reunirá os Seus eleitos. A declaração de Jesus de
que esta geração não desapareceria até que todos os sinais fossem cumpridos era uma promessa de que a
raça judaica não desapareceria até que ocorressem todos estes eventos pertencentes à sua restauração.
Alguns responderiam, porém, que esta ênfase judaica é meramente “roupagem” para Mateus, que
estava escrevendo para leitores judaicos. Marcos e Lucas, porém, mantêm estes aspectos judaicos, e este
último até acrescenta alguns: Jerusalém seria cercada por exércitos (21.20) e seria “pisada pelos gentios”
até se cumprirem os tempos dos gentios (21.24). Logo, a ênfase judaica no discurso no Monte das
Oliveiras não é incidental, mas, sim, intrínseca, pois os eleitos na tribulação são judeus eleitos.
O argumento precedente é basicamente negativo, um argumento pelo silêncio. Além disto, no
entanto, o pré tribulacionista acha promessas especificas de que a Igreja não estará no mundo durante a
grande tribulação. Várias destas promessas se acham nas duas cartas de Paulo aos tessalonicenses.
Paulo descreveu aos tessalonicenses a grande ira do porvir, e prometeu que não passarão por estas
aflições severas: “Porque Deus não nos destinou para a ira, mas para alcançar a salvação mediante nosso
Senhor Jesus Cristo” (1Ts 5.9); e Jesus “nos livra da ira vindoura” (1Ts 1.9-10). Lucas 21.36 certamente
parece referir-se também a um escape do dia vindouro da prova: “Vigiai, pois, a todo tempo, orando, para
que possais escapar de todas estas coisas que têm de suceder, e estar em pé na presença do Filho do
homem”.
O padrão de eventos que acompanham a tribulação, conforme Paulo em 1 Tessalonicenses, é o
seguinte: os mortos crentes serão ressuscitados e os vivos serão arrebatados na vinda do Senhor (415-17);
o arrebatamento virá repentinamente, como o nascimento de uma criança (5.3) ou como ladrão vindo de
noite, removendo a Igreja da esfera onde ocorre a tribulação. Muitos serão embalados até sentir uma falsa
segurança. Os crentes, porém, não estarão num estupor sonolento ou bêbado, mas, sim, estarão alertas e
sóbrios (5.8). Se estiverem alertas, a ira não virá sobre eles.
Os pós tribulacionistas sustentam que a promessa é para proteção da ira de Deus, não para
remoção do cenário. Os pré tribulacionistas rejeitam este conceito como sendo inadequado. Lewis disse:
“Se um pós-tribulacionista quiser importar para este contexto uma teoria da preservação da ira divina,
deve produzir alguma evidência do contexto para apoiar sua teoria.” Outras passagens das Escrituras, os
pré tribulacionistas argumentam, afirmam que os crentes são guardados ou livrados da ira de Deus, e não,
conservados dentro dela.3 o Apocalipse 3:10 diz: “Eu te guardarei da hora da provação que há de vir
65
sobre o mundo inteiro, para experimentar os que habitam sobre a terra”. Romanos 5.9 diz: “Logo, muito
mais agora, sendo justificados pelo seu sangue, seremos por ele salvos da ira [de Deus]”. A ilustração em
2 Pedro 2.6-9, o livramento de Ló de Sodoma, sugere o livramento para fora de ou longe de a ira de Deus.
O mesmo acontece com Noé e sua família, libertado do dilúvio pela arca, bem como Raabe em Jericó.
Estes exemplos, embora não sejam provas conclusivas, confirmam a ideia de que Deus
caracteristicamente livra os crentes da ira que visa julgar os descrentes. Sugerem que o livramento que
Deus dará ao Seu povo, do meio da tribulação, estará em harmonia com este princípio geral.
2 Tessalonicenses também oferece um comentário interessante sobre a tribulação e o
arrebatamento. Alguns cristãos de Tessalônica receavam que o dia de Cristo já “tinha chegado” (2:2).
(“Presente” é uma interpretação mais exata do que “perto”, e não entra em conflito com o ensino anterior
de Paulo de que o dia realmente estava “perto”). Estes cristãos estavam preocupados com a volta de
Cristo em chama de fogo, tomando vingança contra os ímpios (1.7-9). Paulo procurou aliviar as mentes
deles ao indicar que, antes de vir este dia da vingança do Senhor, certos outros eventos devem ocorrer: a
“partida” (apostasia) e a revelação do homem da iniquidade (2.8). Lewis insistia em que a “partida” (2.3)
e a remoção daquele que detém (2.7) são o mesmo evento.
Usualmente, o substantivo grego apostasia é interpretado por sua transliteração “apostasia” e se
fosse interpretado assim aqui, significaria “um abandono moral, espiritual ou doutrinário da fé.” E.
Schuyler English, no entanto, propôs o que Walvoord chamou uma interpretação “algo novo” de 2
Tessalonicenses 2.3, e Lewis a adotou e defendeu; apostasia em 2.3 deve ser traduzida “partida” ao invés
de “apostasia,” e se refere ao arrebatamento da Igreja para fora do mundo antes da tribulação.
É verdade, estes homens notaram, que os significados mais comuns e primários de apostasia são
“apostasia”, “revolta,” ou “rebelião” contra Deus. Há também, no entanto, conotações secundárias, tais
como “desaparecimento” ou “partida”. Para averiguar o significado de uma palavra, é preciso determinar
seu uso costumário no Novo Testamento. Numa única outra ocorrência (em Atos 21.21, onde o conceito é
“abandonar a Moisés”) apostasia se refere com certeza à rebelião contra Deus. A palavra ocorre também
seis vezes na Septuaginta. Embora sempre conte uma separação de Deus, em cada caso é ou uma frase
descritiva ou o contexto que requer que este seja o significado. Embora o substantivo seja raro no Novo
Testamento, o verbo de onde é derivado (aphistēmi - a)fi/sthmi) se emprega quinze vezes. Em apenas
três ocorrências é que se refere a um desvio da religião, e em cada caso este significado é indicado ou por
uma frase descritiva (“da fé” - 1 Tm 4.1; cf. Hb 3.12) ou pelo contexto (Lucas 8.13). Nos demais casos,
aphistēmi quer dizer “partir”, seja de uma pessoa (Atos 12.10; Lucas 4.13) da iniquidade” (2 Tm 219), do
templo (Lc 2.37). ou do corpo (2 Co 12.8). English e Lewis concluíram que “partida” é uma tradução
legitima de apostasia no Novo Testamento e que é a interpretação correta da palavra em 2 Tessalonicenses
2.3. Logo, Paulo estava afirmando e asseverando um arrebatamento antes da tribulação.

A Iminente Volta de Cristo

A terceira doutrina principal é a da iminência. Uma vez que a Igreja será arrebatada ou trasladada
antes da tribulação, nem a tribulação nem quaisquer outros eventos preditos na Escritura precisam ser
cumpridos antes da vinda de Cristo. Cristo pode vir buscar a Igreja literalmente a qualquer momento. Esta
crença usualmente é apoiada por várias linhas de argumento.

A primeira é relativa às passagens que conclamam os crentes a serem vigilantes porque não
conhecem o tempo da vinda de Cristo. Estas passagens se acham tanto nos Evangelhos quanto nas
Epístolas.

Em Mateus 24 e 25, mesmo depois de alistar muitos sinais prévios da Sua volta, Cristo insistia em
que Seus discípulos sempre estivessem prontos para a Sua vinda. O dia e a hora da Sua volta eram
sabidos somente ao Pai. Porque a volta de Cristo será tão inesperada quanto foi o dilúvio nos tempos de
66
Noé, os servos do Senhor devem ocupar-se, empregando e investindo os talentos que o Senhor lhes dera.
Jesus até mesmo declarou explicitamente que não somente não sabia os tempos e as épocas, mas também
que nem era para eles saberem, dando a entender que não deviam inquirir quanto a isto.

Estes ensinos sugerem que a vinda de Cristo poderia ocorrer a qualquer momento. Se eventos tais
como a tribulação devem acontecer primeiro, é difícil perceber a razão de dizer “Não sabeis a hora”.

O ensinamento dos Evangelhos, especialmente do grande discurso escatológico de Jesus, também


é a mensagem das Epístolas. Tendo em vista o fato de que o tempo da vinda do Senhor é desconhecido e
que decerto está próxima a Sua vinda, numerosas passagens recomendam com insistência a vigilância.
Devemos esperar com ardente expectativa a redenção do corpo (Rm 8.19-25) e a revelação do Senhor
Jesus (1Co 1.7). Aguardamos nosso Salvador do céu (Fp 4.5). Renunciamos o mundanismo e vivemos
vidas preciosas, aguardando a bendita esperança da manifestação de Cristo (Tito 2.13). Devemos ser
pacientes, pois a vinda do Senhor está próxima (Tiago 5.8). Não devemos queixar-nos contra os irmãos,
porque “o Juiz está às portas” (Tiago 5.9). Devemos guardar-nos no amor de Deus, esperando “a
misericórdia de nosso Senhor Jesus Cristo, para a vida eterna” (Judas 21).

Todos estes textos argumentam que a vinda do Senhor pode ser a qualquer momento. Um
argumento final para a iminência é que só pode haver uma bendita esperança se olhamos para o Senhor.
Se o próximo evento no plano de Deus for a vinda do Maligno (Anticristo) e da tribulação, dificilmente
teríamos uma base para a esperança. O medo e a apreensão seriam mais apropriados. A exortação de
Paulo no sentido de nos consolarmos uns aos outros com a esperança da vinda de Cristo (1Ts 4.18)
certamente dá a entender que a perspectiva para a Igreja é algo diferente da perseguição, sofrimento,
provável martírio e destruição. A razão de ser da passagem em Tessalonicenses depende da vinda do
Senhor ser iminente e pré-tribulacional.

Avaliação do Pré tribulacionismo

Aspectos Positivos

O Pré tribulacionismo, com seu conceito da iminência a qualquer momento, dá um senso de


expectativa à fé cristã. A Igreja primitiva aguardava ansiosamente a vinda do Senhor como uma realidade
pela qual podia governar sua vida. Esta veio a ser uma esperança purificadora. O Pré tribulacionismo
conseguiu recaptar algo deste gênio do século I. Além disto, deu à tarefa da Igreja uma dimensão de
urgência. Se o tempo que temos disponível para fazer a obra de Cristo for limitado, e se o fim deste
período de oportunidade puder vir a qualquer momento, é imperativo fazer a obra de Cristo tão
rapidamente quanto possível. Uma abordagem agressiva à missão da igreja é a consequência lógica.

Os pré tribulacionistas têm conservado viva a discussão da escatologia em épocas que outros não
têm feito assim. Nos anos recentes, temos visto um reavivamento tremendo do interesse na escatologia.
Podemos até chamar nossos tempos de “panescatológicos”. Os pré tribulacionistas têm antecipado este
reavivamento do interesse dentro da paisagem teológica mais ampla.

Finalmente, têm sido alertas às dimensões escatológicas da totalidade da Escritura. Embora talvez
seja verdade que ocasionalmente os pré tribulacionistas têm achado mais escatologia na Bíblia do que
realmente está ali, chamaram a atenção doutras pessoas ao significado escatológico de passagens que,
doutra forma, não teriam sido vistas assim. Em especial, algumas ênfases e aplicações secundárias têm
sido olvidadas por aqueles que consideraram somente o sentido primário ou mais óbvio.

67
Aspectos Negativos

O primeiro defeito no Pré tribulacionismo acha-se na fraqueza da sua evidência em prol do


conceito da iminência a qualquer momento. Algumas das Escrituras às quais apelam os pré
tribulacionistas não parecem apoiar esta ideia.
O argumento básico em prol da iminência é o grande número de injunções na Escritura no sentido
de vigiar, aguardando a vinda de Cristo, e as advertências de que Sua vinda ocorrerá num tempo
improvável e sem antecedentes reconhecíveis. Estas injunções são justificadas, argumenta o pré
tribulacionista, somente se o arrebatamento pode ocorrer em qualquer tempo. Se existirem eventos ainda
não cumpridos, que devem realizar-se antes do arrebatamento, não há razão de ser para esta vigilância.
Mas porque esta é uma conclusão lógica? Por que a conclamação para vigiar pela vinda de Cristo e
a advertência de que o tempo da Sua vinda é desconhecido requerem a conclusão que poderia vir a
qualquer momento? Não se trata simplesmente de dizer que o número, natureza e duração dos eventos
intervenientes são desconhecidos? Noutras palavras, não pode ser que haja necessariamente um intervalo
de tempo, mas que não sabemos sua extensão?
Além disto, parece que quando as passagens de “vigiai” e “não sabeis o tempo” foram escritas, não
poderiam ter qualquer possibilidade de se tratar da iminência a qualquer momento. Entre outras coisas,
Jesus indicou aos primeiros discípulos que Sua vinda seria adiada por certo tempo. Este parece ser o
ensino de pelo menos três das Suas parábolas: o nobre que foi para um país distante (Lucas 19.11-27), as
virgens prudentes e néscias (ver Mt 25.5), e os talentos (Mt 25.19).
A parábola dos servos pressupõe um período de atraso durante o qual pode ser estabelecida a
qualidade genuína dos servos (Lucas 12.41-48; Mt 24.45-51). Quando o mestre adiou a sua volta, o servo
falso tornou-se descuidadoso, e o servo fiel continuou a esperar e vigiar com fidelidade. Walvoord,
reconhecendo este aspecto das parábolas, sugeriu que o longo período de atraso seria satisfeito por “uns
poucos anos”. Mas semelhante atraso é tudo quanto o Pós tribulacionismo requer.
Na ocasião em que Jesus falou estas palavras, havia também certos eventos que, segundo parece,
teriam de acontecer antes da Sua segunda vinda: por exemplo, Pedro teria que envelhecer e tornar-se senil
(João 21.12 ss.); o evangelho teria que ser pregado a todas as nações (até mesmo antes de Cristo vir
“para” a igreja); e, possivelmente, Jerusalém' teria de cair antes da segunda vinda de Cristo.
Os pré tribulacionistas às vezes respondem que, quando as declarações foram feitas, não poderiam
querer dizer que a vinda era iminente, porque estes eventos intervenientes ainda tinham de ocorrer. Agora,
porém, depois de terem sido cumpridos, a vinda é iminente. O problema, no entanto, é mais profundo do
que isso. Se, na ocasião em que as palavras foram faladas e ouvidas pela primeira vez, não exigiam o
conceito da iminência, então as palavras não requerem iminência no tempo presente, tampouco. O
decurso de alguns anos não investe a linguagem com significado que não' tinha previamente, nem sequer
pode. O pré tribulacionista pode argumentar que as palavras devem ser entendidas com o significado, por
exemplo, de: “O Senhor pode vir a qualquer tempo, a não ser que Pedro ainda não tenha envelhecido”. É
justamente este o ponto principal, porém. Não há razão alguma porque exceções adicionais não sejam
acrescentadas à lista, como, por exemplo: “O Senhor pode vir a qualquer tempo, a não ser que a grande
tribulação ainda não tenha ocorrido”.
O outro problema principal para o Pré tribulacionismo diz respeito às passagens bíblicas em que
veem descrições do arrebatamento (a vinda para a igreja). Uma delas é 1 Tessalonicenses 4.16-17.
Embora o arrebatamento (em que o Senhor não vem totalmente até a terra) alegadamente seja
relativamente inconspícuo, não visto pelos descrentes, sua descrição (“dada a sua palavra de ordem,
ouvida a voz do arcanjo, e ressoada a trombeta de Deus”) faz com que soe como alguma coisa
inconfundível. A sugestão dos pós tribulacionistas que esta é uma referência, não a uma “vinda para” a
igreja, mas a uma só segunda vinda de Cristo parece encaixar-se melhor na descrição.

68
Uma dificuldade adicional ocorre em conexão com a referência em 2 Tessalonicenses 2.3 a
apostasia. Embora seja verdade que “partida” é uma tradução possível, será que é a melhor tradução? No
contexto, nada parece sugerir uma partida (ou “arrebatamento”) dos crentes. Uma regra segura de
interpretação é adotar o sentido mais comum ou provável de um termo a não ser que haja alguma boa
razão no contexto para adotar outro. Visto que o contexto fala do homem do pecado, e da iniquidade e
injustiça que acompanharão sua vinda, parece mais razoável traduzir apostasia no sentido usual de
“apostasia” ou “desvio da fé”.

Pós tribulacionismo

O Pós tribulacionismo, como o Pré tribulacionismo, é primariamente uma subdivisão do


pré”milenismo. Tecnicamente, todos os não pré milenistas são pós tribulacionistas. Poucos não pré
milenistas, no entanto, se preocupam com a ideia de uma tribulação. Destarte, podemos limitar, com
segurança, nosso tratamento do Pós tribulacionismo para o Pós tribulacionismo da variedade pré
milenista.

Panorama do Pós tribulacionismo

O primeiro aspecto principal do Pós tribulacionismo é, naturalmente, que a Igreja não será
removida do mundo antes da tribulação; pelo contrário, passará por ela, suportando-a pela graça e força
de Deus. Somente depois desse grande e terrível período é que Cristo virá. Os pós tribulacionistas não
acreditam que o arrebatamento seguirá a tribulação, pois não empregam os termos arrebatamento e
transladação (nenhum dos quais é termo bíblico). Não é que o pós-tribulacionista deseja suportar a
tribulação - nada poderia estar mais longe dos seus desejos - mas é que não acha evidência na Bíblia para
este tipo de livramento da grande aflição vindoura.
Frequentemente o pré tribulacionista argumenta que a Igreja decerto não ficará exposta à ira de
Deus. O pós-tribulacionista prontamente concorda com isto: de fato, insiste neste aspecto. O pós-
tribulacionista frequentemente distingue entre a grande tribulação e a ira de Deus. A tribulação, que é
parcialmente infligida pelos não-cristãos e o diabo, ser; experimentada por todos quantos estiverem com
vida e sobre a terra n; ocasião. A ira de Deus coincidirá em parte com a tribulação, mas visa so mente os
ímpios; os santos de Deus serão poupados dela.
No fim da tribulação, Cristo virá pela segunda vez. Esta é a esperança do cristão. Implícito nesta
crença há o conceito de que a volta do Senhor será um evento unitário. Não terá duas etapas ou duas fases
- uma vinda para a igreja e uma vinda com ela. Todas as passagens que se referem a uma vinda do Senhor
se referem a este evento único. Esta vinda terminará o período da grande tribulação do milênio. Embora o
termo arrebatamento raras vezes, ou nunca, seja usado pelos pós tribulacionistas, aquilo que o termo
designa realmente acontecerá no fim da tribulação. Quando Cristo vier, os santos que já morreram serão
ressuscitados. Eles, juntamente com os santos que ainda estiverem com vida, serão levados a encontrar-se
com o Senhor, e depois voltarão à terra para reinar com Ele.
Para o pós-tribulacionista, pois, há apenas duas ressurreições: uma, de todos os mortos justos, no
começo do milênio, e de todos os restantes (os ímpios) no fim do milênio. Por causa de não haver
qualquer interlúdio entre a vinda para a igreja e a vinda com a igreja, nenhum santo morre durante o
interlúdio e, portanto, não há necessidade de outra ressurreição dos justos.
O pós-tribulacionista é geralmente menos literal na sua abordagem às últimas coisas do que o pré
tribulacionista. Este fato revela-se de várias maneiras. O pós-tribulacionista não tem certeza que a
tribulação durará precisamente sete anos civis. A referência em Daniel diz respeito a setenta períodos de
“sete”, que têm sido entendidos por muitos como semanas, e semanas de anos, ao invés de dias.
Passagens que descrevem a tribulação propriamente dita não especificam sua duração do milênio. O que o

69
pós-tribulacionista tem certeza é que, por um período extenso de tempo, o Senhor pessoalmente regerá
sobre a terra.
Além disto, o pós-tribulacionista não acha na Escritura o quadro bem detalhado do milênio que o
pré tribulacionista acha. Este último vê no milênio o cumprimento de muitas passagens proféticas do
Antigo Testamento; o pós-tribulacionista não vê o milênio como sendo um grande repositório do
cumprimento profético.

O gênio do Pós tribulacionismo, portanto, é bem diferente daquele do Pré tribulacionismo, sendo,
de muitas maneiras, semelhante ao do amilenista. Se um pré tribulacionista resolvesse que há insuficiente
evidência bíblica em prol de um milênio, exigiria dele uma alteração muito importante da totalidade do
seu sistema escatológico. Requereria um ajustamento consideravelmente menos radical para a maioria
dos pós tribulacionistas, no entanto. Noutras palavras, O milênio desempenha um papel bem menos
crucial na teologia deles.

No esquema pós-tribulacionista, há sinais ou indicações da proximidade da vinda do Senhor - em


especial, a grande tribulação. Poderíamos esperar, portanto, que os pós tribulacionistas fossem fixadores
de datas, mas são exatamente o oposto. Visto que não é certa a duração da tribulação, nenhum
cronograma ou tabela de horários é possível.

A ideia da iminência é afetada por este conceito, também. Muitos pós tribulacionistas empregam o
adjetivo iminente para a segunda vinda, mas a vasta preponderância dos pós tribulacionistas querem dizer
por isto, não que a vinda de Cristo pode ocorrer em qualquer momento, mas, sim, que está pendente: a
sequência de eventos que inclui a vinda do Senhor muito possivelmente está próxima. É este complexo de
eventos que está iminente, e não um só evento especifico.
O pós-tribulacionista tem uma esperança, mas não é do livramento da tribulação vindoura. Alguns
pré tribulacionistas asseveram que a vinda elo homem do pecado não é base alguma para a esperança. O
pós-tribulacionista afirma, no entanto, que sua esperança é que, ocorra o que ocorrer, o Senhor virá e trará
tudo isto ao fim. Sua esperança está na segunda vinda do Senhor.
A referência aos eleitos que estiverem presentes no meio da tribulação é, segundo acredita o pós-
tribulacionista, à Igreja, e não aos judeus eleitos. Este fato ressalta outro aspecto da teologia da maioria
dos pós tribulacionistas: não há uma distinção aguda entre Israel e a Igreja. Embora Israel provavelmente
tenha um lugar especial nos últimos tempos, não será porque Deus volta a tratar de Israel como nos
tempos mais antigos, mas, sim, porque incluirá um número grande, mas raro, de judeus na Igreja. Paulo
declarou em Gálatas 3 que aqueles que têm a fé de Abraão, ao invés, do sangue de Abraão, são os filhos
verdadeiros de Abraão. Ao invés de ser totalmente imprevista nas profecias do Antigo Testamento,
conforme alegam alguns pré tribulacionistas, a Igreja cumpre muitas daquelas profecias e promessas.
Alguns pós-tribulacionista entendem que a Igreja inclui todos os crentes em todos os tempos e lugares.
Restringir “os eleitos” na tribulação a certos judeus literais ou nacionais é, portanto, inconcebível.
O Pós tribulacionismo combina elementos de dois outros pontos de vista no seu entendimento do
reino de Deus. Como o pós-milenismo, vê o reino como estando presente na terra ou dentro dos corações
dos homens, e como estando dentro do tempo. Como o Pré milenismo pré tribulacionista, vê o reino como
sendo do outro mundo, e futuro. O reino não está crescendo e se espalhando paulatinamente; virá
dramaticamente quando o Senhor voltar.
Para o pós-tribulacionista, o reino é tanto presente quanto futuro. Basiléia significa basicamente “o
reino de Deus,” não “um domínio” sobre o qual Ele é soberano. Como consequência, já está presente;
reina nos corações de todos quantos nEle creem e a Ele obedecem. Jesus disse: “... está próximo o reino
dos céus” (Mt 4.17). Mesmo assim, será plenamente realizado primariamente no futuro. Somente quando
Cristo voltar é que cada joelho se dobrará diante dEle e cada língua O confessará como Senhor. Conforme

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o modo do pós-tribulacionista julgar, é importante não negligenciarmos nenhum dos aspectos do reino a
favor do outro.

A História do Pós tribulacionismo

No capítulo anterior notamos que embora houvesse uma forte linha pré milenista (ou quiliasta) na
teologia cristã primitiva, não havia a esperança de um arrebatamento antes da tribulação. Pelo contrário, a
expectativa da vinda de Cristo inclua os eventos que precediam e acompanhavam Sua vinda. Havia,
certamente, uma antecipação de que este complexo de eventos logo ocorresse, mas a expectativa foi para
o grupo inteiro de acontecimentos - a vinda do Anticristo, a grande tribulação, e a volta de Cristo.
Elaboremos um pouco mais este ponto de vista da Igreja primitiva, bem como a história posterior do Pós
tribulacionismo.
O autor da Epístola de Barnabé não poderia ter esperado que Cristo voltasse a qualquer momento,
porque esperava antes um grande período final de aflição. Advertia os crentes a fugirem das obras do mal,
a odiarem o presente século, e a procurarem com seriedade aquilo que pode salvá-los. A Igreja passaria
pela tribulação, e Cristo viria destruir o Anticristo somente no término dela. Em especial, o autor da
Epistola de Barnabé acreditava que o fim não viria até que o Império Romano tivesse sido dividido em
dez reinos. Tal coisa obviamente não poderia ocorrer de um momento para outro, porque naquele tempo o
poderio de Roma estava no seu ponto alto.
Justino Mártir (100?-165?) um dos pais mais antigos, que era claramente pré milenista, previa os
crentes sofrendo grande perseguição e tormentos antes da vinda do Senhor. Sua referência ao Anticristo,
embora breve, basta para indicar que Justino acreditava que aqueles sobre os quais este maligno exerceria
sua crueldade incluiria a Igreja. Justino acreditava que os sofrimentos que o Anticristo infligiria sobre os
crentes não seriam muito mais severos do que aqueles que os cristãos já estavam sofrendo pela sua fé. Em
certo sentido, no entanto, a grande tribulação seria apenas uma extensão e intensificação daquilo que já
estava presente. O próprio Justino veio a ser um mártir por sua dedicação a Cristo.
Tertuliano (160?-230?) era um pré milenista declarado, e claramente antecipava o estabelecimento
de um reino de Cristo sobre a terra. Numa passagem, dá a impressão de acreditar numa vinda de Cristo a
qualquer momento: “Mas que espetáculo é esse advento do nosso Senhor, que rapidamente se aproxima;
agora é reconhecido por todos, agora é altamente exaltado, agora é o Triunfante!” Não pode ser
considerado um pré tribulacionista, no entanto. Não acreditava que o fim pudesse vir a qualquer tempo;
seria precedido e anunciado por sinais de advertência. Recomendava aos seus leitores, com insistência,
que orassem para serem libertos das coisas vindouras. A esperança e as orações de Tertuliano não eram no
sentido de o Senhor vir removê-lo da tribulação, mas para ele ficar em pé diante do Filho do homem
depois de uma série de sinais cósmicos terem aparecido e “todas estas coisas terem acontecido.
Lactâncio (250?-320?) discutiu em pormenores os tempos do fim. Numa passagem, disse que os
profetas tinham “previsto sinais mediante os quais a consumação dos séculos deve ser esperada da nossa
parte, dia após dia, e ser temida”. Esta declaração talvez soe como uma crença numa vinda a qualquer
momento. Mediante um exame mais de perto, no entanto, fica evidente que aquilo que constantemente se
esperava não era a vinda de Cristo, mas, sim, a ocorrência de uma série de sinais que precedessem a Sua
vinda. Lactâncio seguia a interpretação histórica, e via a história humana como sendo um período de seis
mil anos, seguido por outros mil anos, o milênio. Acreditava que, dos seis mil anos, todos já decorreram
menos duzentos e cinquenta anos. Durante os anos restantes, algumas mudanças de grande monta teriam
de ocorrer. O Império Romano deveria cair e o governo voltar à Ásia, porque o Oriente teria de governar
o mundo inteiro mais uma vez.
Lactâncio descreveu vividamente as condições horríveis que prevaleceriam nos últimos tempos. A
tribulação seria tão severa que destruiria nove décimos da raça humana. A Igreja, bem como o mundo,
sofreria estes males dos tempos do fim. O Anticristo viria perseguir os justos durante os últimos 3 1/2
anos. Um sinal especial anunciaria a vinda de Cristo: “Cairá repentinamente do céu uma espada, a fim de
71
que os justos saibam que o líder da guerra santa está para descer”. Todas estas considerações indicam que
Lactâncio era um pós-tribulacionista.
Hipólito (m. 236?), bispo de Roma na primeira parte do século III, escreveu um tratado sobre o
Anticristo. Interpretou Apocalipse 12 como sendo um ensinamento de que o adversário perseguiria a
Igreja. Certamente identificou os “santos” em Apocalipse 12 como sendo a Igreja. Jesus Cristo viria do
céu somente depois da abominação da desolação ter sido estabelecida, e depois de ocorrerem todos os
eventos acompanhantes.

George E. Ladd resumiu o período patrístico com aparente exatidão:

Cada pai da Igreja que trata do assunto prevê que a Igreja sofrerá às mãos do Anticristo. Deus
purificaria a Igreja através do sofrimento, e Cristo a salvaria mediante a Sua volta no fim da
Tribulação quando, então, destruiria o Anticristo, livraria Sua Igreja, e traria o mundo ao fim e
inauguraria Seu reino milenar. O ponto de vista que prevalece é o Pré milenismo pós-tribulacional.

Conforme foi observado antes, a posição escatológica de Agostinho tornou-se sempre mais
dominante durante a Idade Média, e o Pré milenismo entrou em virtual eclipse. Alguns segmentos da
Reforma foram pré milenistas na sua orientação, e todos eram da variedade pós-tribulacionista. Algumas
destas seitas passaram por verdadeira oposição e até perseguição - boa parte dela religiosa na sua origem
e natureza - de modo que não é surpreendente que estas seitas previssem que a Igreja permaneceria na
terra durante a grande tribulação. Somente quando o pietismo se desenvolveu dentro da Igreja luterana é
que o Pré milenismo entrou naquela denominação. Nos séculos XVIII e XIX, um grande número de
estudiosos bíblicos importantes na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos era pré milenista, entre eles Isaac
Newton, Charles Wesley, Augustus Topladay, Richard C. Trench, Edward Bickersteth, Horatius Bonar, H.
G. Ginness, C. J. Ellicott, Henry Alford, Joseph A. Seiss e H. J. Raven. Com a exceção dos Irmãos de
Plymouth, que eram dispensacionalistas, quase todos eram pós tribulacionistas. Mesmo entre os Irmãos
havia diversidade, sendo que Tregelles e Benjamin W. Newton defendiam uma forma de Pós
tribulacionismo.
Com a influência do dispensacionalismo que se espalhou em círculos conservadores e
fundamentalistas, ocorreu uma virtual polarização após a Primeira Guerra Mundial: a pessoa tinha de ser
ou amilenista ou pré tribulacionista. Para ser um pré milenista - um verdadeiro pré milenista - era
necessário ser pré tribulacionista também, na ideia de muitos dispensacionalistas. Imediatamente após a
Segunda Guerra Mundial, no entanto, surgiu um movimento popularmente conhecido como o novo
evangelicalismo, que desafiava muitos dos aspectos da aliança dispensacionalista fundamentalista.
Embora não fosse este o enfoque da sua crítica, os novos evangélicos discordaram da doutrina de um
arrebatamento pré tribulacionista. Homens tais quais Edward J. Carnell e Ladd desenvolveram e fizeram
exposição de um Pré milenismo pós-tribulacionista.

Doutrinas do Pós tribulacionismo

A Presença da Igreja na Tribulação

O argumento principal de Pós tribulacionismo - dentro do contexto deste estudo - é que a Igreja
estará presente na tribulação. A Igreja será poupada da ira de Deus, mas não da tribulação. A palavra
grega thymos (θυµός), que significa “um irrompimento violento de ira”, emprega-se para a ira de Deus
em nove das dezoito vezes que aparece no Novo Testamento. Todas estas nove estão no Livro do
Apocalipse, onde a ira divina é retratada ferindo somente os ímpios (em Ap 14.8 vem sobre Babilônia; em
14.19 e 19.15, sobre os exércitos em Armagedon; em 15.1,7, e 16.1,19, sobre os habitantes da terra). A

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palavra grega orgē (ὀργή), que significa “um estado firme de ira,” emprega-se a respeito da ira de Deus
cerca de vinte e sete vezes no Novo Testamento. A orgē de Deus, segundo o argumento dos pós
tribulacionistas, cai somente sobre os ímpios, nunca sobre os justos. A evidência que apóia este
argumento é tanto positiva quanto negativa. Negativamente, somente os Ímpios são descritos como sendo
vítimas desta ira (João 3.36; Rm 1.18; 2Ts 1.8; Ap 6.16-17; 14.10; 16.19; 19.15). Positivamente, é
declarado que os crentes são: “por ele [Cristo] salvos da ira (Rm 5.9), “livres da ira vindoura” (1Ts 1.10),
“não destinados para a ira” (1Ts 5.9).
Em contraste com isto, no entanto, há o conceito da tribulação, denotado pelo substantivo thlipsis
(θλϊψις) e o verbo thlibō (θλίβω). Das cinquenta e cinco ocorrências destas palavras no Novo Testamento,
quarenta e sete têm conexão com a tribulação que será suportada pelos santos. Somente duas vezes, a
palavra se refere à ira de Deus contra os pecadores (Rm 2.9; 2Ts 1.6), e em nenhum destes dois casos se
refere à ira de Deus contra os pecadores durante a septuagésima semana de Daniel. No contexto da
septuagésima semana, tribulação se refere à perseguição dos santos (Mt 24.9,21,29; Mc 13.19-24; Ap
7.14). A tribulação, portanto, não é a ira de Deus contra os pecadores, mas, sim, a ira de Satanás, do
Anticristo, e dos ímpios contra os santos.
A experiência normal e típica dos santos é, conforme numerosas passagens, aquela da tribulação.
Jesus disse: “No mundo passais por aflições; mas tende bom ânimo, eu venci o mundo” (João 16.33).
Paulo e Barnabé pregavam que devemos entrar no reino de Deus através de muitas tribulações (At 14.22).
Paulo até mesmo disse: “Mas também nos gloriemos nas próprias tribulações” (Rm 5.3). João se
identificou para seus leitores como sendo “irmãos vosso e companheiro na tribulação... em Jesus” (Ap
1.9). A Igreja, destinada a tribulações em geral (1Ts 3.3), tem sido resistida e perseguida por muitos
anticristos no decurso de toda esta era (1Jo 2.18,22; 4.3).
Os pós tribulacionistas não negam uma distinção entre a tribulação em geral e a grande tribulação.
Notam, no entanto, que a palavra empregada para denotar a tribulação geral da Igreja é a mesma que se
emprega em Mateus 24.21 para a grande tribulação. A diferença entre a última e a primeira é de
intensidade somente, não de tipo. Cria, portanto, uma suposição de que a Igreja, não tendo sido poupada
da perseguição e da aflição durante qualquer outro período de tempo, não será poupada daquela dos
últimos tempos.
Estas distinções talvez pareçam insignificantes, mas se constituem em resposta a um dos
argumentos dos pré tribulacionistas, a saber, a Igreja forçosamente deve ser arrebatada do mundo. John F.
Walvoord coloca o argumento assim: “Por que um filho da graça de Deus - que é salvo pela graça, que é
conservado pela graça, que tem todas as promessas maravilhosas de Deus - deve ser forçado a passar por
um período que, segundo a Escritura, é expressamente designado como tempo de julgamento sobre um
mundo que rejeita a Cristo?” O pós-tribulacionista concorda com o pré tribulacionista que os santos não
podem passar sob a ira de Deus, e não passarão mesmo. Argumenta, no entanto, citando os dados
linguísticos supra, que a Igreja não precisa ser arrebatada antes da grande tribulação.
Mesmo assim, a Escritura realmente fala de uma libertação, ou remoção, ou um escape dos santos
- presumivelmente a Igreja - da aflição que os aguarda. Não se inclui aqui a ideia de um arrebatamento?
Um exemplo primordial é a exortação de Jesus: “Vigiai, pois, a todo tempo, orando, para que possais
escapar de todas estas coisas que têm de suceder, e estar em pé na presença do Filho do homem” (Lucas
21.36). Os pós tribulacionistas tais como Robert H. Gundry, no entanto, têm um modo de tratar deste tipo
de passagem de uma maneira consistente com seu arcabouço escatológico básico.
O contexto imediatamente antes de Lucas 21.36, Gundry notou, indica que os ouvintes de Jesus
viveriam no tempo do Anticristo e da tribulação. Os pré tribulacionistas frequentemente interpretam este
fato no sentido de que os discípulos, sendo judeus, representam o Israel literal, e, portanto, que os eleitos
que estiverem presentes durante a tribulação serão judeus eleitos. Fazer com que isto fosse evidência no
sentido de que a Igreja será arrebatada da tribulação parece uma interpretação um pouco forçada. Além
disto, a palavra traduzida “escapar” é ekpheugō, “escapar do meio de”. Entender esta palavra no seu

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sentido mais óbvio claramente contradiz a doutrina pré tribulacionista de que a Igreja nunca se achará na
tribulação.
Uma passagem que tem sido objeto de muito escrutínio e controvérsia é Apocalipse 3.10: “Porque
guardaste a palavra da minha perseverança, também eu te guardarei (tēréō) da (ek) hora da provação que
há de vir sobre o mundo inteiro, para experimentar os que habitam sobre a terra.” A interpretação deste
versículo depende do significado da preposição ek. Os pós tribulacionistas argumentam basicamente que
o sentido primário de ek, “sair de dentro”, refuta a interpretação pré tribulacionista do versículo. Para a
Igreja emergir de dentro da hora do teste, deve ter estado presente durante aquele teste.
É verdade que ek e apo (“fora de”) frequentemente denotam o mesmo relacionamento. Nesses
casos, no entanto, não é porque ek perdeu a ideia de “dentro para fora” mas porque apo acrescentou ao
seu significado central um significado adicional.
João emprega ek aproximadamente 336 vezes, muito mais do que qualquer outro escritor no Novo
Testamento. Em todos os casos, a ideia de emergir ou de origem é o significado mais apropriado ao
contexto. O uso da palavra em João, portanto, parece ser bem estabelecido.
Os pré tribulacionistas às vezes objetam que, se for correto o ponto de vista pós-tribulacionista,
então, no lugar de ek haveria dia (“através de”) ou en (“em”). Gundry respondeu que é questão de ênfase.
En teria colocado toda a ênfase na presença dentro de. Dia teria enfatizado a entrada, a presença dentro
de, e a saída. Mas ek coloca toda a ênfase sobre a saída, ressaltando, assim, o resultado finai e vitorioso
do preservar e guardar. A mesma ênfase aparece em Apocalipse 7.14, onde os santos saem “fora da (ek)
grande tribulação”. A pergunta importante, disse Gundry, é por que João não empregou apo em
Apocalipse 3.10, que pelo menos permitiria uma interpretação pré tribulacionista, ou por que não usou
uma preposição que requereria esta interpretação - ektos, exōthen, aneu, ou chōris.
A última questão importante em Apocalipse 3.10 é o significado do verbo tēreō. Quando está em
vista uma situação de perigo, tēreō significa “guardar”. O perigo está implícito na ideia de guardar. Se a
Igreja está no céu nesta ocasião, porém, conforme ensina o Pré tribulacionismo, então qual poderia ser o
perigo que necessita a mão protetora de Deus sobre ela? Por todas as partes da Septuaginta e do Novo
Testamento, tereō sempre denota a proteção dentro da esfera do perigo.
Em um só outro trecho do Novo Testamento tēreō ocorre com ek: “Não peço que os tires (airō) do
(ek) mundo; e, sim, que os guardes (tēréō - τηρέω) do (ek) mal” (João 17.15). Airō ek, que significa
“levantar, erguer, ou remover:' parece descrever perfeitamente o que o arrebatamento será um levantar ou
remoção. Está, porém, em contraste e oposição a precisamente esta ideia que Jesus emprega tereō ek na
segunda cláusula. Pareceria estranho se em Apocalipse 3.10 tēreō ek pudesse ter o próprio significado que
parece contradizer em João 17.15. Nem é possível eliminar o paralelo entre os dois versículos ao
distinguir um âmbito moral em João 17.15 e um âmbito físico em Apocalipse 3.10, pois é a presença
física dos discípulos que os coloca na esfera moral do maligno.

O Encontro “nos Ares”

Outra doutrina principal do Pré tribulacionismo é seu conceito dos crentes que se encontram com o
Senhor “nos ares”. Quando Cristo vem para os santos antes da tribulação, O encontrarão nos ares e Ele os
levará com Ele para o céu por sete anos. Ali, aguardarão Sua volta triunfante para estabelecer o Seu reino
na terra. No arcabouço de referência pós-tribulacionista, no entanto, os crentes serão arrebatados para um
encontro com o Senhor no fim da tribulação, e imediatamente O acompanharão na Sua descida triunfante
para a terra.
Qual destes conceitos é apoiado pelo significado de apántēsis (ἀπάντησιν), a palavra que é
traduzida “encontro” em 1 Tessalonicenses 4.17 Esta é uma pergunta crucial. O pós-tribulacionista
argumenta que o significado de apántēsis se adapta melhor ao conceito dele do que ao do pré
tribulacionista.

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Esta palavra aparece em apenas dois outros lugares no Novo Testamento (a ocorrência em Mateus
27.32 é textualmente duvidosa). Uma referência explicitamente escatológica ocorre na parábola das
virgens prudentes e néscias (Mt 25.6). Aqui o grito de aviso quando o noivo vem era: “Eis o noivo! saí ao
seu encontro (apántēsis)”. Como corresponderam as virgens prudentes? Saíram como grupo de boas-
vindas, e se encontraram com ele nalgum ponto fora do lugar onde a festa do casamento haveria de ser
celebrada. Depois, voltaram e o acompanharam ou escoltaram para o lugar das bodas. Presume-se que
não interromperam o avanço do noivo nem inverteram sua direção; nem elas nem ele partiram para algum
outro lugar para um interlúdio, depois do qual voltaram juntos.
A palavra ocorre, também, numa passagem de narrativa que não é escatológica, Atos 28.15-16.
Aqui, Paulo e seus acompanhantes estavam se aproximando de Roma. Um grupo dos irmãos em Roma,
quando souberam da aproximação daqueles que iam chegar, foram até a Praça de Ápio e às Três Tabernas
para o “encontro” (apántēsis) deles. Este encontro animou bastante a Paulo, e ele, juntamente com o
grupo das boas-vindas, continuou até Roma. Aqui também, o termo é empregado para um grupo de boas-
vindas que sai encontrar-se com um hóspede e depois volta com ele para seu destino.
Se é este o significado básico de apántēsis, como, pois, poderemos interpretar 1 Tessalonicenses
4.17? Cristo voltará, e os mortos justos serão ressuscitados para encontrar-se com Ele, seguidos pelos
crentes que ainda estiverem com vida sobre a terra. Estes dois grupos ficarão sendo uma só grande
comitiva de boas-vindas, e quando se encontrarem com o Senhor, Ele não virará para ir embora com eles.
Pelo contrário, eles é que farão uma reviravolta para acompanhá-lo para a terra. A palavra apántēsis tem
exatamente o mesmo significado aqui que tem nas outras duas referências no Novo Testamento,
especialmente em Mateus 25.6. Nada no estudo comparativo da palavra sugere a remoção dos crentes
para algum outro lugar, conforme o ponto de vista pré tribulacionista parece requerer.

A Remoção daqueles que Detém

Mais uma passagem significante é 2 Tessalonicenses 2.6-7: “E, agora, sabeis o que o detém, para
que ele seja revelado somente em ocasião própria. Com efeito o mistério da iniquidade já opera e aguarda
somente que seja afastado aquele que agora o detém.” A interpretação padronizada pré tribulacionista
daquele que detém identifica-o com o Espírito Santo. Visto que o Espírito Santo agora reside dentro da
Igreja, removê-lo do caminho necessariamente requer o arrebatamento ou remoção da Igreja para fora do
mundo.
Os pós tribulacionistas interpretam esta passagem em uma de duas maneiras básicas: (1) aquele
que detém é o Espírito Santo, mas Sua retirada não acarreta a remoção da Igreja; ou (2) aquele que detém
não é o Espírito Santo. As duas interpretações concordam, no entanto, que a remoção daquele que detém
não é o arrebatamento da Igreja.
Ladd representa aqueles que não identificam o detentor com o Espírito Santo. Acha que a
expressão “que seja afastado” (literalmente, “que saia do meio”) talvez não se refira de modo algum
àquele que detém, mas, sim, ao Anticristo. O poder que detém seria, então, o poder do próprio Deus, e a
passagem seria parafraseada: “Pois o mistério da iniquidade já opera; só que tem quem agora detém, a
saber, Deus, até que ele, o Anticristo, saia do meio”. Ladd asseverou que esta interpretação melhor se
encaixa na organização dos vv 6 e 7. Estes dois versículos dizem precisamente a mesma coisa, e há um
equilíbrio semelhante nas duas partes de cada versículo.

6a E agora vós sabeis o que o detém (o poder de Deus).


6b para que a seu próprio tempo seja revelado (o Anticristo).
7a Pois o mistério da iniquidade já opera;
7b somente há um que agora o detém (o poder de Deus) até que seja posto fora;

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Ladd prontamente reconheceu que esta não é uma interpretação autoritativa, mas alegou que, pelo
menos, é tão possível como aquela que faz com que aquele que detém seja o Espírito Santo, e que se
“adapta ao movimento da passagem de modo mais natural”. De qualquer maneira, disse que qualquer
alegação no sentido de achar-se nesta passagem apoio para um arrebatamento pré tribulacionista não
passa de uma suposição.
Gundry enunciou a outra interpretação pós tribulacionista daquele que detém, a saber, que é o
Espírito Santo. Sua primeira razão é que este ponto de vista era sustentado por alguns na Igreja primitiva.
Em segundo lugar, parece que para deter uma pessoa, é necessário outra pessoa. Em terceiro lugar, esta
interpretação melhor explica a mudança do neutro (“o que detém,” to katechon) para o gênero masculino
(“aquele que detém,” ho katechôn): Paulo primeiramente se referiu ao que detém como sendo neutro
porque a palavra Pneuma (“Espírito”) é neutra, e depois se referiu àquele que detém como sendo
masculino, porque o Espírito tem personalidade.
A interpretação pré tribulacionista do que detém, dizem os pós tribulacionistas, tem algumas
dificuldades sérias. Entre outras coisas, Jesus deu claramente a entender que o Espírito Santo estará
presente durante a tribulação. Disse àqueles que seriam Suas testemunhas durante aquele período: “...
porque não sois vós os que falais, mas o Espírito Santo” (Mc 13.11). Durante a tribulação parece que o
Espírito Santo dará poder aos crentes para a evangelização, e regenerará numa escala ainda maior do que
faz agora. A despeito do aumento da atividade satânica, os resultados da operação do Espírito Santo serão
mais evidentes então do que agora. Isto deve requerer um aumento da obra do Espírito, e não uma
diminuição dela. Além disto, não é correto pensar que o Espírito nunca opera à parte da Igreja. É bem
possível que o Espírito possa reter o maligno sem fazer uso da Igreja, e que possa então retirar aquele
poder detentor sem remover a Igreja ou mesmo sem cessar Sua obra em geral.

Avaliação do Pós tribulacionismo

Aspectos Positivos

Uma das maiores forças do Pós tribulacionismo é sua versatilidade em tratar com a Escritura. Este
esquema de interpretação parece levar em conta o mais largo alcance da Escritura. Oferece interpretações
apropriadas e plausíveis de todos os tipos de matéria bíblica relevante - os escritos apocalípticos, os livros
proféticos, os ensinos escatológicos de Jesus, e muito mais. Noutras palavras, não se baseia nalguns
poucos textos de prova cuidadosamente selecionados.
Não somente tira suas conclusões de uma ampla faixa da Escritura, como também, segundo
parece, manuseia essas Escrituras de modo mais natural do que o Pré tribulacionismo. De modo geral, as
interpretações pós tribulacionistas das passagens-chaves dão a impressão de se encaixar bem no sentido
natural daquelas passagens. Noutras palavras, o Pós tribulacionismo não depende de escavar significados
secretos. Por exemplo, quando a Escritura fala dos santos da tribulação, dos eleitos, e similares, o Pós
tribulacionismo não lhes dá um significado que é radicalmente diferente do seu significado noutras partes
da Bíblia. São simplesmente o mesmo tipo de crentes que são referidos a partir dos tempos de Cristo. De
modo semelhante, a remoção da Igreja não é, dalguma maneira, “contrabandeada” para dentro de textos
(tais como 2Ts 2.3) que, na superfície, se referem à apostasia. Embora o termo apostasia certamente possa
significar uma partida num sentido diferente do sentido mais comum ou frequente, o significado mais
comum ou natural deve ser suposto a não ser que o contexto requeira um significado especializado. Na
ausência de tais indicações contextuais, o sentido normal deve permanecer em vigor. Neste aspecto,
parece que o Pós tribulacionismo manuseia a Escritura de modo mais regular e adequado do que o Pré
tribulacionismo.
Outra maneira de expressar este fato é dizer que o Pós tribulacionismo revela menos tendência do
que seu concorrente de colocar ideias preconcebidas na sua leitura de um texto. Quase nunca acha num
texto ideias especiais que alguém somente acharia se chegasse ao texto com um sistema preconcebido. Do
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outro lado, suas interpretações de passagens, embora sejam naturais, não entram em conflito com
conceitos pós tribulacionistas.
O Pós tribulacionismo também se opõe eficientemente àquilo que tem sido coloquialmente
referido como a mentalidade de “tirar o corpo fora”. Depois de 1918, o fundamentalismo americano
revelou fortes tendências tão presas ao outro mundo que levaram muitos aderentes a negligenciar
responsabilidades atuais enquanto meditavam na esperança de um lar celestial. Na escatologia, este
conceito acha sua expressão no desejo de que a Igreja seja “arrebatada” para fora do mundo para não
precisar enfrentar a grande tribulação. O Pós tribulacionismo não oferece escape algum das adversidades.
Pinta um quadro muito realístico das exigências e custos e dores da vida cristã, enquanto também
relembra aos crentes quais são os recursos de poder aos quais podem recorrer quando viverem em meio à
adversidade.
Finalmente, o Pré tribulacionismo oferece uma base para a antecipação cristã. Não alega ter
calculado todos os pormenores das últimas coisas ou ter explicado cabalmente todos os símbolos
envolvidos na escatologia bíblica, e geralmente tem exercido real controle próprio e cuidado em fixar
datas. Ao assim fazer, tem conseguido conservar algo do senso genuíno de mistério a respeito da
revelação bíblica. Há não somente uma confiança nos fatos principais da escatologia como também uma
crença de que, quando o Senhor vier, os fatos remanescentes serão revelados e o recebimento desta
revelação se constituirá em parte da alegria na consumação do plano de Deus.

Aspectos Negativos

Há, no entanto, certos aspectos negativos no Pós tribulacionismo conforme é geralmente


formulado. Um é a relativa falta de clareza de grande parte dele. Ao passo que os pré tribulacionistas
falam do milênio como sendo precisamente mil anos, e da tribulação como sendo exatamente sete anos, o
pós tribulacionista frequentemente não tem certeza quanto à duração de cada. Simplesmente sabe que
haverá tais períodos. Destarte, o milênio fica um pouco despojado de cor. A relativa falta de pormenores
concretos acerca do milênio resulta em relativamente pouco fundamento lógico para um milênio. De
modo semelhante, a relativa ausência de significados inequívocos para os símbolos escatológicos na
Escritura dá ao Pós tribulacionismo menos persuasividade retórica do que o Pré tribulacionismo
usualmente possui. Nalguns aspectos, e nalgumas questões, o Pós tribulacionismo é virtualmente
impossível de se distinguir do amilenismo.
Há, também, frequentemente uma falta de informações positivas da parte do Pós tribulacionismo.
Parcialmente, isto se deve ao fato de ter sido muito enunciado em anos recentes em reação contra o Pré
tribulacionismo e em contraste com ele, sendo, portanto, identificado como sendo o ponto de vista de que
a Igreja não será arrebatada antes da grande tribulação. Parcialmente, é o resultado do fato de que sua
doutrina principal é desagradável, ou seja: os crentes terão de passar por severa tribulação.
Além disto, porém, muitos pós tribulacionistas simplesmente não têm sido animados para enunciar
sua posição. Naqueles ambientes em que o Pré tribulacionismo tem sido virtualmente equivalente à
ortodoxia, alguns pastores pós tribulacionistas têm recusado a ser dogmáticos quanto à sua posição, e,
portanto, têm dado a impressão de não ter convicção ou, mesmo, compreensão.
Visto que o Pós tribulacionismo considera matizes finos de significado e definições precisas na
escatologia serem menos importantes do que o Pré tribulacionismo os considera, não tem ressaltado o
estudo intensivo da escatologia como tem feito o Pré tribulacionismo. No desejo de evitar minúcias em
excesso, às vezes tem exagerado a reação contra, e logo deixou de enfatizar suficientemente os grandes
fatos centrais escatológicos, tais como a segunda vinda gloriosa e corpórea do Senhor. Num período de
interesse ressurgente e generalizado na escatologia, este fato deve certamente ser considerado um
demérito.

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CONCLUSÃO

Cremos que o Dispensacionalismo é um sistema de teologia que se desenvolveu a partir da Bíblia.


O Dispensacionalismo é crucial para que se entenda corretamente a Bíblia, em especial a Profecia
Bíblica.
O Pré milenismo era a doutrina da Igreja primitiva e do período patrístico. A Bíblia se explica
melhor através deste sistema teológico.
O Pré milenismo dispensacionalista se ajusta perfeitamente ao incremento da pregação expositiva
da Bíblia versículo por versículo.
O Pré milenismo harmoniza a Bíblia inteira.
O Pré milenismo é a única posição que propõe uma conclusão satisfatória para a história.
A teologia dispensacionalista proporciona uma explicação plausível para a questão da soberania de
Deus sobre um mundo cuja maldade parece aumentar a cada dia.
O Dispensacionalismo responde aos ataques do liberalismo que está eivado dentro das igrejas.
O nosso Dispensacionalismo talvez seja o chamado Dispensacionalismo Revisado. Cremos na
Eleição Divina, tanto de judeus como de gentios; cremos numa eleição específica dos eleitos, a Igreja,
que governarão com Cristo no Milênio e Eternidade. Cremos numa única economia divina, na qual
Judeus, Gentios e Igreja adentrarão no Estado Eterno.
Podemos até não chegar a um consenso sobre qual corrente é a mais digna de aceitação, contudo
podemos ver que todas são unânimes em afirmar o que talvez seja o mais importante, a volta gloriosa do
Senhor Jesus.
Todo cristão tem direito a suas convicções sobre a verdade da Bíblia, mas enquanto estivermos no
corpo terreno, nenhum de nós pode ser infalível. Ninguém, em época alguma, é dono de toda verdade –
não na era apostólica nem os reformadores ou dispensacionalistas ou não dispensacionalistas. Contudo
devemos manter com convicção a verdade conforme cremos que Deus nos deu o entendimento.
“Nos essenciais, a unidade, nos assuntos de dúvida, a liberdade, em todas as coisas, o amor”
(Rupertur Meldenius).

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Biografia do autor
O pastor Antônio Carlos Gonçalves Bentes é capitão do Comando da Aeronáutica,
Doutor em Teologia pela American Pontifical Catholic University (EUA), Pós-graduado
em Ciências da Religião pela Pan Americana, Pós-graduado em Psicologia Pastoral pela
Pós-graduado em Ciências da Religião pela Pan Americana, Pós-graduado em Psicologia
Pastoral pela FATEH - Faculdade de Teologia Hokemãh, conferencista, filiado à
ORMIBAN – Ordem dos Ministros Batistas Nacionais, professor dos seminários batistas:
STEB, SEBEMGE e Koinonia e também das instituições: Seminário Teológico Hosana,
UNITHEO, Seminário Teológico Goel e Escola Bíblica Central do Brasil, atuando nas
áreas de Teologia Sistemática, Teologia Contemporânea, Apologética, Escatologia,
Pneumatologia, Teologia Bíblica do Velho e Novo Testamento, Hermenêutica, e
Homilética. Reside atualmente em Lagoa Santa, Minas Gerais. É pastor presidente da
Igreja Batista Nacional Goel em Lagoa Santa - Minas Gerais. É casado com a pastora Rute
Guimarães de Andrade Bentes, tem três filhos: Joelma, Telma e Charles Reuel, e duas
netas: Eliza Bentes Zier e Anna Clara Bentes Rodrigues.

Pedidos ao Pr. A. Carlos G. Bentes


E-mail: pastorbentesgoel@gmail.com

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