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TEORIA MUSEOLÓGICA APLICADA À CONSTITUIÇÃO

E MANUSEIO DE ACERVOS FAMILIARES:


ESTUDO DE CASO DA RELEÇÃO ENTRE FAMÍLIAS E OS OBJETOS QUE
PERTENCERAM A FILHOS MORTOS.
Grupo de Trabalho (11)

Grupo de Trabalho (7)

Resumo: Partindo de um lugar de intersecção entre Antropologia e Museologia - lugar respaldado por
serem memória e patrimônio categorias caras aos dois campos de conhecimento – o projeto de
pesquisa se tratou a analisar o caso das famílias da cidade de Belém-PA, que sofreram com o evento
crítico denominado de Chacina de Belém, relacionam morte, memória e objetos. Pretende, portanto,
apreender e analisar narrativas, lembranças e histórias de vida para pensar questões antropo-
museológicas concernentes à constituição de patrimônios afetivos e acervos familiares.
Foram feitas 4 entrevistas com famílias da Chacina junto ao Núcleo de Experimentação
Cinematográfica do curso em Bacharelado em Cinema da UFPA, resultando no Documentário “É o
Que Eu Guardo Dele” sobre a Chacina e a relação dos familiares com os objetos deixados pelas
vítimas.
Devido a museologia interessasse pelo que está dentro e fora dos museus, o projeto impele a
aplicação/reflexão dos conteúdos da teoria museológica para analisar a construção de acervos
familiares constituídos de objetos que pertenceram a filhos mortos de famílias vítimas da violência
urbana. Logo, trata-se de uma pesquisa de campo para a produção de dados qualitativos com vistas à
análises pautadas no repertório de conhecimento e de discussão da museologia como aquisição de
acervo, salvaguarda, exposição, documentação museológica e teoria dos objetos, para além dos muros
dos museus.

Palavras-chave: Museologia; Antropologia.


Abstract: Starting from a place of intersection between Anthropology and Museology - a place
backed by memory and heritage categories that are dear to both fields of knowledge - the research
project was to analyze the case of the families of the city of Belém-PA, who suffered with the event
Critic called the Chacina de Belém, relate death, memory and objects. It intends, therefore, to
apprehend and to analyze narratives, memories and life histories to think antropo-museological
questions concerning the constitution of affective patrimonies and family collections.
Four interviews were conducted with Chacina families at the Cinematic Experimentation
Center of the UFPA Bachelor of Film course, resulting in the documentary "É o que guardo dele”(It's
What I Keep From It) about the Chacina and the relationship of relatives with the objects left by the
victims.
Due to museology interested in what is inside and outside the museums, the project impels
the application / reflection of the contents of the museological theory to analyze the construction of
family collections constituted of objects that belonged to children dead of families victims of urban
violence. Therefore, it is a field research for the production of qualitative data with a view to the
analysis based on the repertoire of knowledge and discussion of museology as acquisition of
collection, safeguard, exhibition, museological documentation and object theory, beyond the walls Of
museums.

Key-words1: Anthropology; Museology.

1
INTRODUÇÃO

No dia 4 de novembro de 2014, o Policial Militar afastado Antônio Marco da Silva


Figueiredo, conhecido por Cabo PET pelos companheiros, foi abordado por volta das 19 horas
por três homens perto de sua casa no bairro do Guamá, que o alvejaram com 30 tiros. Logo
após o acontecido, que resultou na morte do cabo, mensagens em redes sociais começaram a
circular convocando outros policiais a dar resposta a morte e ordenando toque de recolher nas
ruas. As ações decorrentes de tal fato ficou conhecido como Chacina de Belém. A violência
estendeu entre até a manhã do dia 5, onde Pessoas encapuzadas em motos e em um carro
atiravam indiscriminadamente, matando 10 pessoas.
Durante a manifestação de 1 ano da Chacina, a qual estive presente, uma mãe estava
com a farda de trabalho do filho em mãos, quando uma repórter local a chamou para fazer
uma entrevista; a mãe balança a farda do filho e chorava ao mesmo tempo, falando que ela era
inocente e trabalhador. Naquele momento aquela farda estava exposta, e representava para a
mãe a prova de tudo o que dizia. A partir de exemplos como esse, o projeto visou investigar a
relação dos familiares com os objetos que pertenciam a esses entes queridos.

REFLEXÕES

Notamos nas entrevistas feitas com os familiares de 4 vítimas escolhidas que a seleção
dos objetos se baseia em 3 grandes narrativas: uma particular, a narrativa familiar; uma mais
pontual, a narrativa da Chacina de Belém; e uma mais geral, a narrativa da realidade que está
inserido. São selecionados, principalmente os objetos que representem suas qualidades e os
afastam da criminalidade. Outros objetos selecionados são o que remetem a narrativa da
Chacina, já que as famílias fazem o esforço de colocar sua versão da história para informar
que as vítimas não se tratam de bandidos como falaram representantes do estado e da mídia
local. Por isso, são guardados ou produzidos objetos que comprovam a inocência das vítimas.
A Chacina está ligada diretamente a um grande problema de Belém: a violência
urbana. Esses objetos, portanto, representam nãos só as vítimas, mas também os jovens da
comunidade que são vítimas em potencial. Aos moradores da periferia, os que mais sofrem
com o problema, os que vivem chacinas diariamente, são atribuídos estereótipos de bandidos
e perigosos em potencial, os objetos dessas famílias servem, em última instância para
desconstruir esses rótulos.
Objetos que foram produzidos para a militância, logo que não pertenceram à vítima,
são incorporados aos acervos familiares como baneres, faixas, cartazes, documentos de
jornais.

CONCLUSÃO

Como visto, os objetos deixados pelas vítimas são carregados de memórias. Memória
familiar, memória sobre o evento, memória sobre a periferia, etc. O historiador francês Pierre
Nora em seu texto “Entre memória e história- a problemática dos lugares” define a memória
como algo vivo, e quando uma lembrança não está em nossa memória, é necessário criar
suportes para rememora-la, o que ele denomina de Lugares de memória. Ou seja, criamos
suportes para que aquilo ainda esteja em evidencia, pois, a memória se enraíza no concreto,
no espaço, no gesto, na imagem, no objeto (NORA, 1993. p, 9). Usando Pierre Nora, percebo
que, com a morte violenta, os objetos deixados se tornam esses suportes de lembranças,
representando narrativas sobre o familiar morto sobre a Chacina e a periferia. E, quando
necessitou de um aspecto que não se viu representado em um desses objetos, criou-se outros
póstumos, como os objetos de militância que vão nas manifestações, as fotos de jornais do
evento da Chacina, as postagens de perfis em redes sociais e outros, que, apesar de não terem
sidos usados pela vítima pertencem a ela.

Partindo desse ponto, os acervos dessas famílias seriam o que Nora pontua como
lugares de memória, ou, adequando ao caso, objetos de memória. Patrimônios ”que operam na
relação simbólica entre algo que se vê, e algo que se deseja ver, mas que está ausente.”
(SOARES, 2012. p. 63)
Eles representam uma memória esfacelada pela Chacina. São restos: “A forma
extrema onde subsiste uma consciência comemorativa numa história que a chama, porque ela
a ignora"(Nora), que remetem ao filho, a Chacina, e a periferia. Representam a visão dos
familiares das vítimas sobre esses casos. Apresentam outra perspectiva, diferindo da visão
errônea que a mídia e a população tem sobre os casos, como as próprias famílias pontuam.
Logo, vemos um potencial evocativo dos objetos. Eles têm um valor documental
especifico: a musealidade (SCHREINER, 1980 p. 39) e estão em um processo vívido de
preservação e de informação: a musealização (LOUREIRO 2011, p. 2-3).
Definida como “valor documentário específico dos objetos concretos e perceptíveis da
natureza e sociedade, o valor de evidência autêntica da realidade” (SCHREINER, 1980 p. 39),
a musealidade é a motivação da preservação de tais objetos. E essa ação consciente de
preservação tem caráter seletivo (CURY, 1999. P, 52). Como visto nas entrevistas, a seleção
seguiu a logica das 3 narrativas pontuadas por mim. Se um determinado objeto não
representasse um valor documental para nenhuma delas, ou não ter um forte poder evocativo,
ele é descartado da composição daquele acervo. Entretanto, ainda se tem memória naquele
objeto, apesar de não servir para as narrativas dos familiares, eles contem memórias da vítima
que servem para outras pessoas(amigos e conhecidos), e para outros acervos. Ou seja, o
descarte nesse caso se trata de uma doação, já que o objeto ainda tem valor simbólico.
As pessoas que se prontificaram a guardar, selecionar e expor tais objetos, são as
“pessoas-memórias” que Nora aponta como agentes que trazem a memória à tona, já que a
memória se presentifica em ritos e gestos (NORA, 1993. P, 9); processos que nada mais são
que a preservação, a seleção e criação de narrativas. Portanto, os familiares têm grande
responsabilidade na musealização desses objetos, pois são eles que tiveram o olhar
museológico sobre o acervo, cuidando desde a aquisição até a comunicação (CURY, 1999).
São os familiares que selecionam e decidem como e o que vai ser exposto, tendo o controle
sobre o processo info-comunicacional (LOUREIRO, 2011). E, por serem esses objetos de
memória, que estão em um processo vivido, em permanente evolução e suscetível a todas as
manipulações (NORA, 1993); garante sua salvaguarda, já que a preservação é a manutenção
dinâmica do que é vivido (SOARES, 2012. P, 65).
Contudo, a partir da ideia de que o patrimônio é algo herdado que assegura a
continuidade (SOARES, 2012. P. 65), pode-se dizer que os objetos das vítimas são agora
pertencentes aos familiares, portanto, os usos que se tem deles de representar as realidades
das famílias, a realidade da periferia. Logo, eles ainda estão salvaguardados em seus
contextos, as narrativas dos familiares sobre o individuo, a chacina e a periferia. A
musealização nesse caso não separa o objeto de seu contexto de origem para ingressar no
campo museológico como pontuado por Desvallées; Mairesse, 2011, e nem separa para
ingressá-lo em uma nova realidade, o museu como diz Van Mensch(1992). Os objetos
salvaguardado em seus contextos, em suas realidades, potencializam as narrativas que
despertam ou que produzem.
No contexto de uma instituição, sem as narrativas dos familiares, os objetos não
remetem as vítimas, não remetem a Chacina e nem remetem a periferia para tratar sobre
violência urbana. Stallybras (2000) diz em seu livro “Casaco de Marx” que: “Penhorar um
objeto é desnudá-lo da memória”(2000, p. 65), ou seja, quando um objeto não é usado como
suporte para memória, consequentemente, não tem valor documental, e por conseguinte, não
tem necessidade de preservação.
Os objetos quando entram no museu também não perdem seu uso original, natural.
Martin R. Schärer diz que “As coisas têm uma faceta estrutural e cultural”. O primeiro refere-
se a uma coisa Materialidade, o último ao contexto de sua aplicação e uso”(2009, p. 85), e que
por isso, ao longo de suas “vidas”, os objetos ganham e perdem funções, sendo essas funções
submetidas a mudanças constantes dependendo dos valores atribuídos. O manequim que vai
para a exposição feita pelo grupo Tela Firme sobre a Chacina intitulada de “Choram os
Cravos do Novembro” também demonstra isso. Ele é um objeto que foi concebido para ser
utilizado como um simulacro de um ser humano, e cumpre essa função ao representar as
vítimas mortas na Chacina e as mortes na periferia, com uma camisa com tinta vermelha que
representa sangue, e furos que representam buracos de balas. Mas quando estava na casa de
uma das mães, ele lembra o seu net, por isso ela se abraça a ele.
Esses objetos ainda têm seus usos de origem, porém, ganharam mais um: o uso
simbólico, que representa memórias e realidades da vítima. Assim como Daniel Miller (2013)
exemplifica em seu livro “Treco, troços e coisas” que a vestimenta tem muitas mais funções
que apenas vestir, mas também ser a essência do sujeito representado em bens materiais.
A preservação dos objetos é ao mesmo o tempo a manutenção/sobrevivência das
narrativas (SOARES, 2012. p. 63), já que a memória é um processo vivo são as narrativas que
são, de fato, preservadas. Portanto, a importância está nas narrativas dos familiares. Sendo
assim, a musealização no caso dos acervos dos familiares da Chacina é um processo especial.
A camisa de uma das vítimas pode ser apenas um objeto que traz recordação para os
familiares, pois, naquele momento, a memória potencializada é uma memória familiar.
Contudo, aquela mesma camisa pode despertar outra narrativa, que fale sobre a violência
urbana, a realidade da periferia, fala especialmente sobre as diversas Chacinas que
aconteceram e acontecem em grandes cidades como Belém do Pará.
Por fim, reitero que, quando os Museus não cumprem seu papel social de discutir
sobre os problemas da sociedade Belenense(SANTIAGO, 1972), e não se mantem como
espaço de reflexão (HUYSSEN, 1996, p. 226) para falar de violência urbana, quando não
discutem os silenciamentos, as discriminações que certo grupos sofreram e sofrem na cidade,
eles não cumprem seu papel social postulado pela museologia social e registrada
especialmente na Carta de Santiago do Chile. Logo, os museus de Belém precisam se abrir
para as questões sociais, urgentemente.

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