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ANAIS do III Encontro Estadual de História: Poder, Cultura e Diversidade – ST 08: Dobrando esquinas:
(outros) trabalhadores e a cidade. 1
soube ver a “Paris dos livros literários” e a “Paris das ruas”. Seus métodos,
mais do que devaneios, tornaram-se uma forma de análise que possibilitava
uma maior apropriação dos terrenos e das condições sociais. Em uma leitura
das cidades é possível observar espaços belos e feios, e estes podem nos
apontar o lugar das classes em uma cidade, mas há mais entre os bairros
belos e feios do que possa crer nossa vã urbana geografia.
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Situacionista, é exatamente o contrário do que se chama agora em português
um ‘situacionista’, isto é, um partidário da situação existente” (IS, 1964). A idéia
era sair da passividade, não se submeter às situações vigentes e sim construir
situações mais do que necessárias, satisfatórias.
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considera a cidade uma construção humana, uma representação dos fazeres
individuais e coletivos de pessoas simples que buscaram na vida em sociedade
uma melhor forma de vida (RONILK, 1994).
Discutindo em “Outra cidade para outra Vida”, Constant nos diz que “um
estudo profundo dos meios de criação de ambiências e da influência
psicológica dessas ambiências é uma de nossas tarefas atuais” (CONSTANT,
1959). Essa influência a qual Constant se refere são as zonas
psicogeográficas, ou seja, zonas em que fatores psicológicos estão dispostos
na geografia urbana. A psicogeografia é o “estudo dos efeitos exatos do meio
geográfico, conscientemente planejado ou não, que agem diretamente sobre o
comportamento afetivo dos indivíduos” (IS, 1958). O funcionalismo ignora
totalmente a psicogeografia, sobretudo, por não reconhecer o valor da vivência
prática dos eternos transeuntes, os moradores e os marginais das ruas. A
marginalidade sabe deslocar cada lugar de sua história e colocá-los a serviço
de sua sobrevivência. Assim os espaços nunca obedecerão a sua finalidade
original, pois agora pertencem ao jogo de seduções da própria luta de classes.
O que se discute aqui não é apenas a construção de cidades, mas seu uso.
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rumar sem direção, este modelo experimental é base para apreender cada
signo inscrito nas plásticas de uma cidade. E como estamos discutindo o meio
urbano, a deriva também passa a ser uma forma de estudar e usar este
(aproxima-se muito da idéia de Febvre sobre o direito à cidade[6]).
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A deriva consegue observar os indivíduos em suas relações cotidianas e em
suas relações com seu meio, assegurava não só o lócus urbano, mas os
signos desse na vida dos indivíduos. Essa preocupação aproxima-se muito do
pensamento de Lepetit em seu artigo “A História Leva os Atores a Sério?”,
onde se questiona a concepção da macroeconomia e das mentalidades com
respeito à formulação da História, pois na opinião do autor, ambas não
privilegiam os atores em suas relações conscientes no cotidiano (LEPETIT,
2001). Voltaremos a isto adiante.
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assistem passivos à construção de suas moradias, na sociedade em geral os
indivíduos aceitam a construção de toda sua vida. O espetáculo se refere à
passividade no qual o espectador se relaciona com uma realização que não é
própria de si.
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capitalista; 2) o movimento de Maio de 68 ligado diretamente ao libelo “A
Miséria do Meio Estudantil”, moveu toda periferia parisiense que já se
envolvera em estudos psicogeográficos como o de Les Halles; 3) a adoção da
deriva experimental por outros movimentos pelo mundo como os tropicalistas
no Brasil (Jacques 2003). O estudo urbano situacionista nunca objetivou virar
livro acadêmico, mas contribuir com a transformação contra-cultural das
ambiências.
Neste caso essa via de mão dupla é o ponto comum que Lepetit em seu
artigo A Cidade Moderna na França. Ensaio de História Imediata: “a relação
indissociável entre grupos sociais e configuração material da cidade”
(LEPETIT, 2001). Perfeita preocupação na construção de uma história urbana
que precisa de novos elementos para ser pensada enquanto categoria
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pluridisciplinar. Pois não é suficiente apenas dispormos de uma história que
organize elementos para construir seus métodos, mas que crie novos métodos
para suas novas demandas. Porém é preciso que fique claro o valor do criar:
“criar não é arrumar objetos e formas, mas é inventar novas leis a respeito
desse arranjo” (DEBORD, 1957). Assim os relatórios psicogeográficos de
derivas se dispõem como uma nova fonte para a elaboração de uma Nova
História Urbana do Tempo Presente, na qual não se rejeita a
pluridisciplinaridade que abraça os horizontes da psicogeografia e que utiliza
elementos de um desvio não apenas para escrever, principalmente porque a
cidade não é só para estudar, e sim para modificar. O Urbanismo Unitário
oferece a História não apenas novos elementos para um estudo, mas novas
motivações para que a História seja também uma vivenciadora – construtora de
situações – e uma idéia contra o espetáculo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Conrad Editora do Brasil, 2002.
NOTAS:
[1] Discente do curso de licenciatura em História da UESC.
[2] Mestre em História Social pela PUC/SP e professor do Departamento de
Filosofia e Ciências Humanas da UESC.
[3] O livro Apologia da deriva organizado por Paola Jacques contém vários
artigos de números da revista Internacional Situacionista sobre cidade, muitas
das citações deste ensaio estão encontram-se neste livro. Para orientar sobre a
autoria do texto citado a referência às citações das décadas de 1950 e 1960
obedece ao autor e ano de publicação nas revistas contidas neste livro.
[4] LeFebvre chegou a pesquisar com a IS, e contribuído com sua teoria dos
momentos na construção das idéias sobre situações, mas logo virou alvo da
crítica da IS, por fazer uma “ficção científica da revolução”. Já Michel de
Certeau escrevia em jornal em pleno Maior de 68, onde circularam textos e
membros da IS de forma corriqueira, em seu livro A Invenção do Cotidiano I ele
chega a fazer referência ao livro A Sociedade do Espetáculo de Debord, que
juntamente com outros materiais situacionistas certamente contribuíram para
compreensão de território e da relação sujeito/cidade.
[5] Le Corbusier foi um dos importantes influenciadores da arquitetura
moderna, participante dos CIAM’s (Congresso Internacional de Arquitetura
Moderna) até se tornar parte da crítica de um grupo de arquiteto antes do CIAM
X que discutiu uma arquitetura crítica e voltada ao social.
[6] A idéia do direito à cidade foi sistematicamente discutida pelos
situacionistas ainda antes de 1968 quando LeFebvre lança o livro O Direito à
Cidade, no Brasil publicado pela editora Documentos um ano após a sua
publicação original.
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