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Quem nega o atentado contra


Bolsonaro assume viver uma
alucinação coletiva
9-12 minutos

Foto: FABIO MOTTA/ESTADÃO

por Rodrigo da Silva

Segundo a Fundação Getúlio Vargas, numa análise de 1.702.949


retuítes coletados entre as 18h30 de quinta-feira, dia 6, e as 9h de
sexta, um dia após o atentado sofrido por Jair Bolsonaro, 40,5% das
pessoas que escreveram sobre o incidente na rede social

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questionaram a veracidade do ataque. Foi o maior grupo


comentando sobre o assunto no Twitter nesse intervalo de tempo.

Esse é um nítido experimento sobre o funcionamento do viés de


confirmação nas discussões políticas – e de como ele pode criar
uma ilusão coletiva.

Há dezenas de vídeos do atentado sofrido por Bolsonaro, há uma


confissão de culpa do agressor, relatos médicos, boletins oficiais de
instituições públicas, relatos policiais e testemunhas – mas nenhum
desses elementos é satisfatório para uma parcela de eleitores que
não comungam de seus valores ideológicos. Para esse grupo, toda
cena não passou de uma grande conspiração para eleger Bolsonaro.
E acredite: essas pessoas realmente entendem que representam o
lado mais racional dessa discussão.

Como diz o americano Scott Adams:

“A maioria das pessoas sabe o que é viés de confirmação, senão


pelo nome, certamente por experiência pessoal. Todos sabemos
quanto é difícil mudar a opinião de alguém sobre algo importante,
mesmo quando todos os fatos estão do nosso lado. O que os não
persuasores usualmente não percebem é quão prevalente é o viés
de confirmação. Ele não é um bug ocasional no sistema operacional
humano. Ele é o sistema operacional humano. Somos programados
pela evolução para fazer com que novas informações apoiem
opiniões existentes, desde que isso não nos impeça de procriar. A
evolução não liga se você compreende ou não a realidade. Ela só
quer que você se reproduza. Também quer que você conserve
energia para coisas importantes, como sobreviver. A pior coisa que
seu cérebro pode fazer é reinterpretar a realidade em um filme
totalmente novo a cada nova peça de informação. Isso seria

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exaustivo e não traria nenhum benefício. Em vez disso, o seu


cérebro escolhe o caminho de menor resistência e instantaneamente
interpreta suas observações para se adequar a sua visão de mundo.
É bem mais fácil.”

Para Adams, é mais provável buscarmos a razão como uma


justificativa para as nossas emoções do que o contrário. E não é
difícil entender o motivo.

Nós nos identificamos como liberais, conservadores ou


progressistas em parte porque tentamos construir uma imagem
social, em nossa busca desenfreada por uma identidade de grupo,
seja para repelir a estética de determinados candidatos ou partidos,
seja para sinalizar virtudes. No fundo, no apagar dos votos, pesa
mais a fórmula do discurso do que os programas de governo.

Alguns indivíduos, é verdade, são honestos o bastante para se


inteirar sobre os assuntos políticos e econômicos e eventualmente
mudar de posição. Mas isso carrega um custo social enorme, a
julgar que os seres humanos têm uma imensa dificuldade em admitir
seus erros.

É exatamente nesse ponto que assumimos lutas em nome de um


grupo ou ideal. Terceirizar nossas opiniões políticas, delegando-as a
uma mente coletiva, é a forma mais fácil de abrirmos mão do
trabalho de estudar, compreender e formular uma posição
independente – algo que toma tempo e exige o abandono de
atividades (e vícios) que não estamos dispostos a deixar de lado.

Como afirma a Teoria da Ignorância Racional, formulada ainda na


década de cinquenta pelo economista americano Anthony Downs, as
pessoas frequentemente escolhem permanecer ignorantes sobre
determinados assuntos porque os custos de coletar as informações

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necessárias para obter conhecimento sobre eles são maiores que


as recompensas dadas pela compreensão adquirida.

Pare e pense. A política inegavelmente exerce uma influência direta


na vida das pessoas. Se tivéssemos a chance, certamente
escolheríamos que todos os nossos conhecidos nutrissem
consciência disso. Mas tempo é um bem escasso. Acompanhar os
processos políticos de um Estado com tantas atribuições, seguindo
as propostas e o trabalho de novos candidatos, vereadores,
deputados estaduais, deputados federais, senadores, governadores,
prefeitos e presidentes da República, construindo uma base sólida
de conhecimentos ligados a diferentes áreas – da ciência política à
econômica– para embasar críticas ou elogios, e escolher as
melhores opções para o país, pode ser algo perfeitamente plausível
para você, que está lendo este texto e que se importa (e tem tempo
para gastar) com o noticiário político, mas é uma tarefa inviável à
imensa maioria dos eleitores, que entendem intuitivamente que cada
voto tem um peso irrisório numa eleição e que, justamente por isso,
sobram razões para gastar as suas horas em outras atividades.
Para esses eleitores há incentivos maiores em permanecer
ignorante em matéria de política do que abrir mão de exercícios com
grandes recompensas diárias, como descansar com a família,
trabalhar ou navegar sem propósito na internet.

Na prática, nós alimentamos a imagem pública de que nos


importamos com um assunto tão relevante à sociedade, como a
política, mas não queremos o custo que isso gera, nem assumir
sozinhos o risco de estarmos errados. Por isso esperamos a
posição de uma tribo ideológica minimamente solidária com nossa
estética intelectual para nos darmos ao luxo de apenas replicar
opiniões.

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É aí que impera o viés de confirmação. O que acontece no mundo


real passa a ser mero capricho – e o que poderia ser apenas um
problema de discurso, atua diretamente como um agregador de
pobreza: quase metade da riqueza nacional, entregue às decisões
políticas através do pagamento de impostos, tem seu destino selado
à irracionalidade das guerras de narrativas travadas pelas tribos
ideológicas de quatro em quatro anos. Nosso viés de confirmação
torna o país refém das alucinações.

Acredite, é pior do que você imagina.

No início de 2017, o Washington Post entrevistou 1.388 americanos e


perguntou em qual das duas fotos abaixo havia mais pessoas: a da
posse de Obama (acima) ou a de Trump (logo abaixo).

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Confrontados com essas imagens, 15% dos eleitores de Trump


afirmaram que, mesmo após analisa-las, havia mais pessoas na
posse republicana do que na democrata. Eis o que chamamos de
dissonância cognitiva.

Como afirma Adams:

Quando você experimenta dissonância cognitiva, espontaneamente


gera uma alucinação que se torna sua nova realidade. Para
observadores externos, a alucinação pode parecer ridícula. Mas,
para aquele que a experimenta, ela faz todo sentido. Assim, a
primeira coisa que você precisa saber sobre dissonância cognitiva é
que é possível reconhecê-la com frequência nos outros, mas é raro
reconhecê-la em si mesmo.

Esse é um fenômeno sem preconceitos partidários, mas que se


acentua no populismo e em períodos de crise econômica e grande
polarização. Ancorados em cherry picking, nós não nos
satisfazemos apenas em ignorar elementos que condenam a
moralidade da nossa tribo – também criamos teorias conspiratórias
para imputar imoralidades imperdoáveis a nossos adversários
políticos, em acessos de esquizofrenia retórica. E fazemos tudo isso
genuinamente crentes de que estamos lidando com o mundo real.

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Como escreveu o economista austríaco Friedrich Hayek, vencedor


do Nobel, em sua magnum opus O Caminho da Servidão:

Quase por uma lei da natureza humana, parece ser mais fácil aos
homens concordarem sobre um programa negativo – o ódio a um
inimigo ou a inveja aos que estão em melhor situação – do que sobre
qualquer plano positivo. A antítese ‘nós’ e ‘eles’, a luta comum contra
os que se acham fora do grupo, parece um ingrediente essencial a
qualquer ideologia capaz de unir solidamente um grupo visando à
ação comum. Por essa razão, é sempre utilizada por aqueles que
procuram não só o apoio a um programa político mas também a
fidelidade irrestrita de grandes massas.

Na dissonância cognitiva ideológica, o stress ocorre quando


personagens políticos não correspondem às expectativas de nossos
estereótipos. Se Jair Bolsonaro está catalogado como um
instrumento de violência no conjunto de valores que listamos em
nossa tribo, a alucinação atua para nos impedir de interpretá-lo como
uma vítima sempre que ele for abatido pela violência – especialmente
por membros assumidos de nosso grupo. No ponto cego ideológico,
a maneira mais confortável de julgar um atentado à moralidade de
nossa tribo é assumir a negação da realidade.

Fenômenos dessa natureza são expostos a cada momento nas


redes sociais, mas raramente de modo tão claro e explícito como o
apresentado neste final de semana. Ao fim do dia, quem nega o
atentado contra Bolsonaro assume viver uma alucinação coletiva. E
o pior: provavelmente jamais saberá disso.

Rodrigo da Silva é jornalista e edita o Spotniks. É autor do “Guia


Politicamente Incorreto da Política Brasileira” (LeYa, 2018).

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