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Quando entre 1207 e 1209 encontramos o jovem Francisco de Assis perfileirado ao grupo dos
“penitentes”, e depois, desejoso de viver uma experiência de fé junto ao “sacerdote da igrejinha
de São Damião”, evidencia-se, por meio das biografias, que o santo usava o hábito de ermitão,
cingido com uma correia e andando com bastão e cajado (cf. 1 Celano, 21), característicos de
um grupo, constituído por sua maioria de cristãos leigos, denominado “Ordem dos Penitentes”.
Os textos biográficos são claros ao afirmar que o poverello associou-se aos grupos penitentes;
grupos que espalhavam-se por toda a cristandade, e que nos tempos do santo contavam
inúmeros homens e mulheres, ora ligados entre si por movimentos espirituais – alguns até
hereges, como os cátaros e albingenses –, ora por grupos mais submissos à Igreja de Roma – os
beguinatos – ou mesmo indivíduos penitentes individuais, que perambulavam entre as grandes
basílicas e centros de peregrinação do medievo cristão. Dentre as diversas biografias do santo
de Assis, uma que trata de forma explícita esta condição é a Legenda dos Três Companheiros,
escrita por volta de 1246-1247: “Francisco, tendo concluído a restauração da igreja de São
Damião, vestia um hábito eremítico, levava na mão um cajado, calçados aos pés, cinturão” (LTC
25).
A questão que precisa ser levantada aqui é: Quem eram estes penitentes? Qual sua função na
Igreja? Como viviam? E qual sua relação com os Terceiros Franciscanos, posteriormente
chamados de Ordem Franciscana Secular?
A grosso modo podemos dizer que era a possibilidade de se alcançar o perdão dos pecados com
a condição de que se fizesse algum tipo de penitência externa, fosse em grupos maiores, ou
mesmo individualmente. A distinção acontecia da seguinte forma: os donatos ou oblatos,
homens que se consagravam a serviço de uma igreja local, mosteiro ou bispado; mulheres
reclusas ou encarceradas, consagradas a Deus sem nenhuma ligação institucional eclesial; os
eremitas solitários, nas grutas e cavernas; os peregrinos; os cônjuges que optavam por manter-
se junto às famílias, vivendo, no entanto, de abstinências e mortificações.
De inspiração bíblica, estes grupos vaziam valer seu direito de viver radicalmente o Evangelho.
Vejamos como se inspiravam e os meios que utilizavam para expressar sua religiosidade.
A penitência na Bíblia
Por diversas vezes a dor e o sofrimento do povo eram associados à prática pecadora cometida
pelo mesmo até então, algo que somente seria modificado quando a comunidade se
emendasse. Bom exemplo disso encontramos no livro do profeta Daniel, que insistia na ideia de
conversão enquanto necessidade de o indivíduo voltar-se para Deus (cf. Dn 9, 3). Seja em relação
à renúncia do mal (Am 5,14), ou evitar o pecado (Pr 17, 20), ou mesmo uma busca de amizade
com Deus (Os 3), a obrigação de purificação é uma constante entre os Profetas (cf. Is 1,16-17; Jr
7,3). Por vezes relacionada a uma purificação interior (cf Jr 3,10; 4,34), outras associada à
necessidade de conversão do coração (cf Ez 33,14-15; Ml 3,7-8), vemos que tal prática, ensinada
“pedagogicamente” por Deus, se expressa pelas obras exteriores e sinais do culto judeu (cf 1Rs
21,27-29; Gn 3,5-9).
Já nas passagens do Segundo Testamento percebemos que Jesus sempre priorizou o amor filial
mais do que o temor. Para Ele, o serviço ao próximo e a entrega pessoal a Deus vão muito além
de um simples modo de agir só porque a Lei nos pede, algo que ultrapassa a pura ética – ethos
–, exigindo transformação nos sentimentos em relação ao outro, e a si mesmo. Assim, a
“conversio” cristã torna-se algo a ser vivenciado e posto em prática unicamente porque o amor
vindo de Deus, e elevado à Deus, nos impiulsiona a tal postura. Jesus sempre apontou para esta
necessidade ao afirmar “Convertei-vos, porque o Reino de Deus está próximo” (Mt 4, 17). Uma
necessidade da “mudança do modo de avalia as coisas (‘metanóia’) da qual, se fomos sinceros,
vão brotar também os novos comportamentos (bons frutos)” (PAZZELLI, 2009, p. 14).
O penitente age assim externa e interiormente porque seu coração o leva a isto, e sua busca
pelo Senhor o conduz à revisão de vida. Jesus nos leva à mudança de vida, de conduta e de
convivência fraterna (Mc 16,16; Mt 15,17; Mt 7,17-20). Interioriza-se a conversão que acontece
na pratica cotidiana, ou seja, o homem muda em seu interior e traz para fora de si este mesmo
ardor de conversão.
Não perca, nos próximos artigos, as implicações destes elementos no cristianismo antigo e no
franciscanismo.
Referências
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