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A romanização afectou muitas áreas da vida, incluindo a língua. O latim, língua oficial
do Império Romano, passou a ser usado na administração. A sua versão coloquial, o latim
vulgar falado em todo o império,[16] foi difundido por soldados, colonos e mercadores
vindos de várias províncias e colónias romanas. Estes estabeleceram-se em cidades perto
de povoações nativas, mantendo frequentemente os mesmos nomes.
Falar latim era mais um privilégio do que um dever, e começou pelas camadas mais altas
da sociedade, que tinham de lidar com a administração romana.[17] A evolução do latim
no território correspondente a Portugal ocorreu a dois ritmos:[18] no centro e sul, na
Lusitânia, foi adaptado cedo, acompanhando a rápida romanização e maior
cosmopolitismo. A norte, na região da Galécia, a tardia romanização, o carácter rural e o
isolamento resultaram numa menor assimilação cultural e linguística, que levou ao
desenvolvimento de uma variedade de latim com influências da língua galaica.[19][20] A
adesão ao cristianismo, introduzido nas cidades da Hispânia a partir do século I e tornado
religião oficial do império em 380 pelo imperador hispano Teodósio I, contribuiu para
popularizar o latim.
O uso das línguas paleo-ibéricas foi decrescendo, primeiro através do bilinguismo nos
centros de ocupação romana, depois limitando-se às regiões isoladas. As línguas pré-
romanas nativas acabaram por desaparecer,[21] mas supõe-se que o seu contacto com o
latim contribuiu para o desenvolvimento de diversos dialetos nas diferentes regiões da
Hispânia. Mesmo a elite educada de hispano-romanos parece ter tido um sotaque peculiar:
entre outros, o imperador Adriano, de origem bética, foi alvo de riso ao discursar no
senado romano pelo "pronuntians agrestius", um sotaque rústico que o levou a
aperfeiçoar o latim.[22][23]
Para alguns autores o fato de a Lusitânia e Galécia estarem incluídas na Hispânia Ulterior
(a "Hispânia afastada" na primeira divisão da Península), sob influência da Bética, uma
província antiga colonizada pela aristocracia senatorial, explica o latim conservador, que
preservou formas arcaicas (como "pássaro"/"pájaro" (passer) e "comer" (comedere) em
vez de formas latinas mais recentes ave (avicellus) manger/mangiare (manducare), e que
pode explicar parte das diferenças entre o castelhano e o português.[24] Um dos fenómenos
mais antigos nesta diferenciação é a "troca dos b pelos v", ou betacismo,[25]
provavelmente sob a influência das línguas pré-romanas, com o /v/ muito mais usado no
português. No latim clássico
ão existia o actual som [v]: "via" pronunciava-se "uia" (semelhante ao W inglês). A partir
do século I o latim vulgar transformou o /w/ em /β/, que se manteve no espanhol, e que
evoluiu para /v/ no português. Exemplos antigos de betacismo incluem a grafia de
Nabia/Navia, deusa da mitologia galaica e lusitana.[26]