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Capítulo

18
ABSCESSOS PULMONARES
Leandro Publio da Silva Leite
Raimundo Nonato de Sousa Andrade
Breno Machado Costa

INTRODUÇÃO As bactérias anaeróbicas são patógenos freqüen-


tes nas infecções do trato respiratório inferior. Elas
Abscesso pulmonar é definido como uma infec- provavelmente são os agentes causais em 10% das
ção subaguda na qual a radiografia do tórax mostra pneumonias adquiridas na comunidade e em 35%
uma cavidade dentro do parênquima pulmonar 13 . A das pneumonias nosocomiais 18 .
fase inicial do desenvolvimento de um abscesso pul-
O primeiro estudo que reconheceu bactérias ana-
monar é a pneumonia de aspiração, que a radiografia
eróbicas como patógeno pulmonar foi publicado em
do tórax mostra como um infiltrado, representando
1904 por Guillemot, Halle e Rist16. Em 1920, David Smi-
uma pneumonia focai ou consolidação que evolui com th observou que organismos encontrados em exames
necrose do parênquima. A formação do abscesso é uma histológicos de paredes de abscessos pulmonares eram
complicação relativamente comum da pneumonia de os mesmos encontrados nas fendas gengivais e pos-
aspiração, envolvendo anaeróbios. Isso se torna apa- tulou a aspiração como a causa dos abscessos pulmo-
rente na radiografia do tórax, quando uma área de nares. Ele confirmou essa hipótese reproduzindo
necrose do parênquima comunica-se com um brôn- abscessos pulmonares em animais de experimentação,
quio e drena, determinando o típico nível hidroaéreo 1 . que foram inoculados com piorréia dos pacientes 27 .
É durante essa fase da infecção que aproximadamen-
te 60% dos pacientes com abscessos anaeróbios têm o O médico também deve estar atento ao diagnósti-
característico escarro fétido4. co diferencial com as causas não infecciosas de cavi-
dades pulmonares, tais como: carcinoma brônquico
, O abscesso pulmonar é arbitrariamente classi- necrosado, infarto pulmonar, granulomatose de We-
ficado como agudo ou crônico, com uma linha di- gener, nódulos reumatóides e anomalias do desenvol-
visória de seis semanas de duração dos sintomas. vimento como bolhas, cistos e seqüestro pulmonar 30 .
Por esse critério, cerca de 60% dos abscessos pul-
monares são crônicos 3 . Apesar das infecções por
bactérias anaeróbicas serem a causa mais freqüen- FlSIOPATOLOGIA
te, outras etiologias infecciosas devem fazer parte Para o entendimento da fisiopatologia da doença,
do diagnóstico diferencial, i n c l u i n d o bactérias é necessário o conhecimento da fonte do inóculo e o
Gram-negativas aeróbicas (Klebsiella e Pseudomo- método pelo qual ele penetra até as vias aéreas inferio-
nas), bactérias Gram-positivas aeróbicas (Staphylo- res. A cavidade oral contém cerca de 200 espécies de
icoccus aureus), Legionella, c o c c i d i o i d o m i c o s e , bactérias. A área que contém a mais alta concentração
criptococose, histoplasmose, blastomicose, asper- de bactérias anaeróbicas é a fenda gengival. Esse é o
gilose, actinomicose e tuberculose 30 . local das espécies de anaeróbios, que são mais freqüen-

CAPITULO 18 243
temente isolados em casos de pneumonias de aspira- Os principais anaeróbios isolados nas infecções
ção e abscessos pulmonares 27 . Isso explicaria a associ- pulmonares são Peptostreptococcus, Bacterioides melani-
ação clínica entre abscessos pulmonares e doença da nogenicus e Fusobacterium nucleatum. Bacterioides fragi-
fenda gengival na forma de piorréia ou gengivite. As lis, o qual é de específico interesse devido à resistência
secreções orofaringeanas contêm concentrações de IO8 à penicilina, foi encontrado em 20% dos casos2. Esse
a 109/mL de bactérias, com a relação de anaeróbios para resultado tem sido encontrado por muitos autores, in-
aeróbios de aproximadamente 3:1 a 5:119. Infecções cluindo uma taxa de 14% a 21% para Bacteróides fragi-
anaeróbicas pulmonares ocorrem ocasionalmente em lis 7<8-26. Os m e s m o s organismos têm sido
pessoas desdentadas e naqueles com boa higiene documentados nas pneumonias necrotizantes em pa-
oral14. Em 10% dos casos de abscessos pulmonares, cientes imunocompetentes 4 . Nos pacientes imuno-
nenhum fator de risco é identificado 13 . comprometidos, as infecções oportunísticas por Cândida
albicans, Legionella micdadei, Legionella pneumophila e
Anaeróbios da cavidade bucal penetram nas vias Pneumocisti carinii são mais prevalentes 25 .
aéreas inferiores devido à perda da consciência e a con-
seqüente supressão do reflexo da tosse. O alcoolismo
é um fator predisponente, comum em pacientes com Q U A D R O CLÍNICO
abscessos pulmonares. Outras causas de perda de
consciência que predispõem à aspiração incluem con- O quadro clínico de pacientes com infecções ana-
vulsões, anestesia geral, sedação e coma. eróbicas do pulmão varia de uma infecção aguda, que
Disfagia devido à doença neurológica ou esofági- simula uma pneumonia devido à outra bactéria, a uma
ca, alteração no mecanismo de fechamento da glote infecção crônica indolente, que é confundida com tu-
por traqueostomia ou entubação orotraqueal podem berculose ou neoplasia brônquica. A fase inicial da in-
também predispor à aspiração. Mesmo indivíduos nor- fecção é a pneumonite, que pode ser aguda, subaguda
mais aspiram, especialmente, durante o sono. A dife- ou crônica. Os pacientes com pneumonite aguda apre-
rença entre as pessoas n o r m a i s e aquelas que sentam sinais clínicos que sugerem pneumonia pneu-
subseqüentemente sofrem pneumonia ou abscesso mocócica. Seguindo o episódio agudo, o curso pode
pulmonar é a composição do inóculo, a freqüência e o ser caracterizado por febre, leucocitose, produção de
volume da aspiração e a propensão de reter o inóculo escarro purulento e alterações radiológicas de pneu-
devido à redução nos mecanismos de defesa, como o monite ou supuração pulmonar. Muitas vezes o epi-
reflexo da tosse14-30. sódio precipitante não é reconhecido e a doença
Outros mecanismos menos comuns podem deter- pulmonar pode ser insidiosa. Em tais casos, o médico
minar infecções anaeróbicas pulmonares como: expan- deve suspeitar de pneumonia de aspiração, baseado
são transdiafragmática de uma coleção subfrênica e na susceptibilidade do paciente e nos achados radio-
disseminação hematogênica de tromboflebite séptica17. lógicos de envolvimento dos segmentos superiores dos
lobos inferiores e dos segmentos posteriores dos lo-
Infecções anaeróbicas pulmonares são infreqüen- bos superiores. O pulmão direito é evolvido duas ve-
tes em crianças, mas ocasionalmente podem ocorrer zes mais que o esquerdo, em virtude da posição mais
após amigdalectomias, presumivelmente porque as
vertical do brônquio direito1-3,4'30 (Fig. 18.1).
criptas amigdalianas são colonizadas por bactérias
anaeróbicas 20 . Se a pneumonia de aspiração não é tratada, ocor-
re progressiva necrose tecidual, resultando em forma-
ção de abscesso ou p n e u m o n i a necrotizante.
BACTERIOLOGÍA
Ocasionalmente ocorre fístula broncopleural, resultan- I
Bactérias anaeróbicas são encontradas em 60% a do em empiema.
85% dos casos, quando técnicas diagnosticas apropria- O abscesso pulmonar é distinguido da pneumo-
das são utilizadas. Aproximadamente 50% dos pacien- nia necrotizante arbitrariamente, em bases de obser-
tes contêm somente bactérias anaeróbicas, enquanto os vações radiológicas. O abscesso pulmonar é definido
outros 50% têm uma combinação de bactérias anaeró- como uma cavidade dominante e solitária que mede
bicas e aeróbicas. Achados similares são encontrados ao menos 2 cm em diâmetro, e usualmente é confiB
em pacientes pediátricos com infecções pulmonares nada a um único lobo. Em contraste, pneumoniane- j
anaeróbicas10'". crotizante é caracterizada por múltiplas pequenas ]
Nas pneumonias por aspiração adquirida no am- cavidades que medem menos de 2 cm em diâmetro
biente hospitalar são mais prováveis as infecções dentro de um ou mais segmentos ou lobos pulmona- I
mistas, nas quais predomina o componente aeróbi- res5. E clinicamente útil separar essas duas entidades I
co. Isso decorre da progressiva colonização da via porque existe mau prognóstico associado com pneu- I
aérea superior com bacilos Gram-negativos duran- monia necrotizante. Observações clínicas conduzidas I
te a hospitalização 5 . por Bartlett e Finegold estimam que são requeridas

244 CAPÍTULO 181


Fig. 18.1 -Aspecto radiólogico típico do ãbscesso pulmonar, comprometendo o segmento posterior do lobo superior direito.

uma a duas semanas da aspiração inicial para o apare- Levison, em um estudo randomizado, comparou
cimento de ãbscesso pulmonar 4 . A média de duração a eficácia clínica da clindamicina com a da penicilina
dos sintomas respiratórios é de duas semanas prece- no tratamento de ãbscesso pulmonar adquirido na co-
dendo a hospitalização. O escarro fétido é notado em munidade. Após iniciar a terapia, os pacientes trata-
menos de 5% dos pacientes que têm pneumonite ana- dos com clindamicina tinham menor período de febre
eróbica e ocorre em 50% a 60% dos pacientes que têm e menos dias de escarro fétido que os pacientes trata-
um ãbscesso pulmonar anaeróbico 4 . dos com penicilina. Somente oito dos 15 pacientes tra-
Aproximadamente um terço dos pacientes que têm tados com penicilina seguidos até o final do estudo
pneumonite anaeróbica ou ãbscesso pulmonar, e me- foram curados, enquanto todos os 13 pacientes trata-
tade daqueles que têm pneumonite necrotizante de- dos com clindamicina foram curados 21 .
senvolvem empiema 4 . Outro estudo tem confirmado esses achados. Gu-
diol, estudando 37 pacientes com infecção pulmonar
TRATAMENTO anaeróbica, observou falência do tratamento em oito
de 18 pacientes no grupo tratado com penicilina, e so-
A penicilina tem sido largamente utilizada para o mente um em 19 pacientes no grupo tratado com clin-
tratamento da pneumonia de aspiração e ãbscesso damicina não respondeu ao tratamento 1 5 . Esses
pulmonar por, aproximadamente, 50 anos. Durante a estudos mostram que a clindamicina parece ser supe-
maior parte deste período, a droga foi utilizada sem o rior à penicilina no tratamento das infecções anaeró-
conhecimento da flora bacteriana envolvida. A peni- bicas pulmonares.
cilina foi indicada empiricamente, baseada nos dados
clínicos que estabeleceram a sua eficácia. Os testes de Monoterapia com metronidazol não é efetiva no
sensibilidade mostram que a maioria das bactérias ana- tratamento das infecções pulmonares anaeróbicas. In-
eróbicas nas vias aérea superiores é sensível à penici- fecção concomitante com bactéria aeróbica e Microae-
lina (Figs. 18.3 E 18.4). rophilic streptococci pode resultar na falência do
tratamento. Quando o metronidazol for usado para
i Ao comparar penicilina à clindamicina, Bartlett não tratar infecções anaeróbicas pulmonares, a penicilina
observou nenhuma diferença entre estes dois agentes. deve ser associada para cobrir esses organismos 23 .
Sete pacientes com infecção, incluindo Bacteroides fragi-
lís, foram tratados com penicilina e todos evoluíram Outros antimicrobianos que apresentam ativida-
bemb. O fato de a penicilina ser efetiva, mesmo nos ca- de contra bacteroides produtores de beta-lactamase,
sos em que a bactéria resistente foi isolada, sugere que como ticarcilina e clavulanato, ampicilina e sulbactam,
todo o componente de uma infecção polimicrobiana não amoxicilina e ácido clavulânico, imipenem e piperaci-
necessita ser tratada para se obter a cura1'3-18. lina podem ser úteis no tratamento de pneumonia de

CAPÍTULO 18 245
Fig. 18.2 -Aspecto radiológico após três semanas de tratamento com penicilina.

aspiração nosocomial, quando Gram-negativos aeró- torácicas guiado por imagem uma alternativa segura
bicos estão presentes9,12. ao tratamento cirúrgico tradicional.
Independentemente do esquema antimicrobiano Abscessos pulmonares foram drenados por meio
escolhido, o tratamento deve continuar até haver me- de cateteres guiados por tomografia computadoriza-
lhora radiológica, isto é, redução acentuada da cavi- da em 19 pacientes que apresentavam sepse, apesar
dade e formação de uma lesão cicatricial estável. A da antibioticoterapia adequada. Os abscessos foram
antibioticoterapia deve estender-se por dois a qua- curados em todos os pacientes. Três pacientes foram
tro meses8'11,24. submetidos à cirurgia para remoção de tecido organi-
zado ou decorticação28. Drenagem de abscesso pulmo-
A drenagem postural é um importante componen- nar guiado pela tomografia computadorizada é um
te do tratamento. A broncoscopia não é indicada roti- método efetivo para tratar abscessos que são retratad-
neiramente, contudo é útil para a retirada de corpo os ao tratamento convencional.
estranho e diagnosticar neoplasia.
Até 1940, a pneumotomia e a drenagem eram o
tratamento aceito para abscesso pulmonar. Subseqüen- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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CAPITULO 18 247
Capítulo

19
BRONQUIECTASIA
Antero Gomes Neto

HISTÓRICO ca, após o desenvolvimento da anestesia21 e introdu-


ção de novas técnicas de ressecção pulmonar, como
0 termo bronquiectasia é derivado do grego bron- dissecção e ligadura individual das estruturas do hilo
chos, de brônquio, e ektasis, de dilatação. Portanto, li- pulmonar descritas por Churchill (1939)14 e Overholt
teralmente, a palavra bronquiectasia refere-se a uma e Langer (1947)41, houve uma redução da mortalida-
dilatação do brônquio, termo que Laennec, em 181927, de cirúrgica para cifras próximas de zero. O aprimo-
introduziu na literatura médica para designar uma ramento destas técnicas, ocorrido logo depois da II
alteração anatômica caracterizada pela dilatação de Guerra Mundial, deu entusiástico impulso à terapia
um ou vários segmentos brônquicos. Posteriormen- cirúrgica da bronquiectasia, tornando-a, naquela épo-
te, introduziu-se o conceito de bronquiectasia irre- ca, o tratamento de escolha para esta doença.
versível40 para diferenciar da b r o n q u i e c t a s i a
Ochsner et ai, (1949)40 mostraram uma redução sig-
reversível, ou pseudobronquiectasia, que ocorre por
nificativa da incidência de complicações cirúrgicas e
relaxamento do tecido muscular e elástico da parede
uma melhora dos sintomas em 79% dos pacientes, com
brônquica na vigência de processos infecciosos bron-
44,9% destes ficando curados da doença, após o aban-
copulmonares agudos 9 .
dono da técnica de ligadura em torniquete do hilo
No passado esta doença teve uma prevalência alta pulmonar.
em todo o mundo e sua história natural freqüentemen-
A introdução dos antibióticos (sulfonamida em
te exibia complicações como hemoptise, empiema, in-
1938 e penicilina em 1941) tuberculostáticos (estrepto-
suficiência respiratória e abscesso cerebral, que muitas
micina em 1947) e dos programas de vacinação, prin-
vezes culminavam com a morte.
cipalmente anti-sarampo e anticoqueluche, concorreu
0 tratamento de pacientes com bronquiectasia até para uma significativa diminuição da incidência de
as primeiras três décadas do século XX era praticamen- bronquiectasia de etiologia infecciosa, especialmente
te inexistente. Coube aos cirurgiões 11,13,22,»,4?> as primei- nos países de primeiro mundo 7 1 6 , restando somente
ras tentativas de tratar esta doença mediante cirurgias aquelas de natureza congênita, que são atualmente as
em vários tempos com ligadura em massa das estru- mais prevalentes nesses países50. Nos países em de-
turas do hilo pulmonar, apresentando altos índices de senvolvimento como índia 32 , Nigéria 1 e Brasil10'54, a
morbimortalidade. E foram estes mesmos cirurgiões, bronquiectasia ainda é uma doença bastante preva-
operando bronquiectasia, que lançaram a primeira lente. Nesses países a bronquiectasia é na maioria das
pedra na edificação de uma nova especialidade, dan- vezes secundária a infecções pulmonares virais e bac-
do início assim, à história da cirurgia torácica. A partir terianas ou tuberculose, e muitos doentes ainda evo-
do final da década de 1930, ainda na era pré-antibióti- luem com complicações como abscesso cerebral, que

CAPITULO 19 249
nos países do chamado Primeiro Mundo só foram vis- A obstrução brônquica por aspiração de corpo es-
tas antes da primeira metade do século XX. tranho (Fig. 19.1a e b), neoplasia endobrônquica, com-
pressão extrínseca por a u m e n t o dos linfonodos
peribrônquicos ou por qualquer outro fator pode tam-
ETIOLOGIA
bém ser causa de bronquiectasia.
As causas de bronquiectasia são diversas, e em cer-
ca de 1/3 a 2/3 dos pacientes não se consegue identifi-
car a etiologia247. A doença pode se desenvolver por
fatores adquiridos ou congênitos (Tabela 19.1).

Entretanto, a maioria dos casos de bronquiecta-


sia está relacionada a fatores adquiridos, merecendo
destaque os processos infecciosos e a obstrução brôn-
Fig. 19.1 - Bronquiectasia localizada no segmento basal posterior direito
quica. No passado, as pneumonias virais e bacteria- em um paciente de 29 anos. A) A seta indica a presença do corpo
nas da infância e adolescência, tais como sarampo, estranho dentro do brônquio dilatado. B) Segmento ressecado com o
coqueluche, influenza e tuberculose eram as condi- corpo estranho (ponta de caneta).
ções que p r e d i s p u n h a m ao desenvolvimento de
bronquiectasia. Essas infecções, apesar de serem atu-
almente incomuns nos países de Primeiro Mundo, Os fatores congênitos e familiares são causas in-
continuam muito prevalentes nos países pobres e em freqüentes de bronquiectasia. Destacam-se entre eles
desenvolvimento. Nessas regiões, a maioria dos pa- as discinesias ciliares, incluindo a síndrome de Karta-
cientes com bronquiectasia é formada pela popula- gener, a fibrose cística e as deficiências imunológicas,
ção economicamente menos favorecida, com pouco principalmente, de IgA e IgG, e a deficiência de aH
acesso aos serviços de saúde e à aquisição de medi- antitripsina, como os fatores congênitos mais comuns.
camentos. Acrescido a isto, a alta incidência de tu- Outras alterações de natureza congênita menos íre-
berculose, provavelmente, é um dos principais fatores qüentes incluem a síndrome de Williams-Campbell55,
responsáveis pela incidência elevada de bronquiec- a Síndrome de Young23 e a síndrome de Mounier-
tasia nos países em desenvolvimento e do terceiro Kuhn8. A primeira caracteriza-se pela ausência ou de-
mundo nos dias atuais. ficiência de cartilagem a partir dos brônquios
segmentares; a segunda, pelas infecções sinusopulmo-
No Brasil, a incidência de tuberculose, em 1997, nares recorrentes e infertilidade por azoospermia; e a
foi de 51,7/100.000 habitantes, ocupando o 10s lugar última, por anormalidade do tecido conjuntivo da via
entre os 22 países que são responsáveis por 80% dos aérea e dilatação secundária da traquéia e brônquios
casos estimados de tuberculose no mundo 44 . principais (traqueobroncomegalia).

250 CAPÍTULO 19
PATOLOGIA (Fig. 19.3) há um aumento progressivo da dilatação
brônquica em direção à periferia do pulmão, onde o
As formas de classificação anatômica das bronqui- brônquio termina em fundo de saco.
ectasias são diversas; entretanto, a proposta por Reid
Nesta forma de bronquiectasia há geralmente
(1950)42 que as classificou em cilíndricas, císticas ou
perda do arcabouço conjuntivo-cartilaginoso de su-
saculares e varicosas ou mistas é a mais utilizada atu-
porte brônquico, levando a uma maior destruição do
almente. Essa classificação foi baseada no estudo
parênquima pulmonar do que na forma cilíndrica.
broncográfico, macroscópico e microscópico (peça Na bronquiectasia varicosa ou mista observa-se, al-
cirúrgica) de 45 casos de lobectomias por bronqui- ternadamente, áreas de dilatações intercaladas com
ectasia. Ele mostrou que havia uma boa correlação áreas de constricções, formando um contorno brôn-
patológico-radiológica em todos os tipos de bronqui- quico irregular, similar a uma "veia varicosa".
ectasia, e que havia também uma redução no número
de subdivisões brônquicas (ramos laterais), nas formas Em uma publicação recente, Ashour 4 propôs uma
císticas e varicosas. Na forma cilíndrica, os ramos late- classificação funcional para as bronquiectasias. Este
rais que não apareciam na broncografia, obstruídos autor demonstrou que nas bronquiectasias cilíndricas
por ímpactação de muco e secreção, eram vistos no havia um fluxo normal de sangue pela artéria pulmo-
nar, enquanto nas bronquiectasias císticas o fluxo de
exame patológico e histológico da peça cirúrgica. A
sangue pela artéria pulmonar era praticamente nulo.
bronquiectasia cilíndrica (Fig. 19.2a e b) caracteriza-
O primeiro tipo de bronquiectasia foi denominado
se, anátomo-radiologicamente, por apresentar um
bronquiectasia perfundida, e o segundo bronquiectasia não-
brônquio uniformemente dilatado, terminando de for- perfundida, denotando uma maior severidade da do-
ma abrupta. ença na forma não-perfundida. Com base nessa
Este tipo de bronquiectasia ocorre em 2/3 dos classificação, nos pacientes com doença bilateral o lado
casos após infecção aguda na infância, como coque- a ser primeiramente ressecado ou unicamente resse-
luche, sarampo ou outros vírus, e predomina nos lo- cado e o lado a ser preservado podem ser mais preci-
bos inferiores. Na bronquiectasia cística ou sacular samente definidos.

Kg. 19.2 -A broncografia em PA (a) e perfil (b) mostra bronquiectasia cilíndrica na língula (seta) em uma paciente de 38 anos.

CAPITULO 1< 251


Fig. 19.4 - Bronquiectasia localizada com distribuição da doença distai
ao brônquio do lobo médio.

Fig. 19.3 - Broncografia mostra bronquiectasia cística no lobo inferior e


língula e cilíndrica na divisão superior do lobo superior esquerdo em
uma paciente de 40 anos.

Quanto à distribuição das bronquiectasias, Sealy


et al.i7 e Deslauriers et oi}5 as dividiu em dois grandes
grupos (localizadas e difusas ou multissegmentares),
com características anatômicas, perfil etiológico e im-
plicações terapêuticas distintas. Na bronquiectasia lo-
calizada (Fig. 19.4), a distribuição da doença fica
confinada à porção distai de um brônquio fonte, lobar
ou segmentar, e na bronquiectasia multissegmentar
(Fig. 19.5) a doença se distribui em mais de um lobo,
ou em segmentos de lobos diferentes, podendo ser uni
ou bilateral.
As bronquiectasias causadas por pneumonias bac-
terianas e virais da infância são geralmente localizadas
e situam-se freqüentemente nos lobos inferiores (seg-
mentos basais), lobo médio ou língula. A tuberculose
também pode dar origem a bronquiectasias localizadas
que, diferentemente das pneumonias bacterianas, aco- Fig. 19.5 - Bronquiectasia multissegmentar com distribuição da doença
distai aos brônquios da pirâmide basal do lobo inferior e do lobo médio.
metem mais os lobos superiores e, ocasionalmente, o
segmento superior do lobo inferior10.
Outras causas menos comuns de bronquiectasias fonodos peribrônquicos resultante de processos infec-
localizadas são a aspiração de corpo estranho e a sín- ciosos57, principalmente pelo Micobacterium tuberculo-
drome do lobo médio. A última decorre da obstrução sis e por processos obstrutivos com impactação
do brônquio do lobo médio por hipertrofia dos lin- mucóide vistos nas doenças de vias aéreas hiper-rea-

252 CAPITULO 19
tivas. As bronquiectasias multissegmentares estão mais imunodeficiências são também predispostos a infec-
relacionadas àquelas de causas genéticas ou de natu- ções do trato respiratório que, comumente, culminam
reza desconhecida15'19-47, que na maioria das vezes dis- com bronquiectasia.
tribuem-se bilateralmente, acometendo os lobos
inferiores e, concomitantemente, a língula ou o lobo
QUADRO CLÍNICO
médio.
O desenvolvimento da bronquiectasia está asso- A apresentação clínica do paciente com bronqui-
ciado a uma série de fatores. Pneumonias graves ou ectasia é variável, sendo a tosse produtiva com ou sem
infecções pulmonares de repetição de menor intensi- pneumonia de repetição e hemoptise os sintomas mais
dade podem causar destruição dos cílios, da mucosa, freqüentes2'3'5'30-34. Entretanto, o paciente pode ser as-
do tecido musculoelástico e, ocasionalmente, da carti- sintomático quando tiver bronquiectasias mínimas e
lagem brônquica. A cicatrização desse processo com localizadas principalmente nos lobos superiores, ou
substituição por tecido fibroso leva à perda da elasti- ter sintomas respiratórios graves que o incapacitem
cidade da parede brônquica, associada à contração do para o labor diário nas bronquiectasias difusas. Em
tecido peribrônquico e à tração na estrutura brônqui- qualquer faixa etária, a tríade clássica de sintomas ca-
ca resultam na dilatação brônquica. racteriza-se por tosse produtiva crônica com escarro
purulento, infecção respiratória de repetição e hemop-
A dilatação brônquica inicial e a alteração do clea- tise de pequena ou grande monta19-30'47. A tosse, algu-
rance mucociliar levam à retenção de secreção, predis- mas vezes paroxística, está invariavelmente presente
pondo a infecções secundárias de repetição, e pode ser o único sintoma durante anos. Inicialmente
responsáveis pela manutenção da dilatação e pelo dano a tosse acompanha-se de expectoração mucóide, que
irreversível da parede brônquica. Outros processos pa- depois se torna purulenta. O uso de antibiótico nos
tológicos que incluem a metaplasia escamosa, a pneu- surtos de infecção muitas vezes mantém o paciente as-
monite com microabscessos, a linfadenopatia sintomático e sem produção de catarro por algum perí-
peribrônquica e a hiperplasia das artérias brônquicas odo. Entretanto, à medida que a doença progride, a
contribuem para a manifestação dos sintomas de tos- expectoração torna-se contínua e a produção de escar-
se e hemoptise nos pacientes com bronquiectasia. Me- ro aumenta, podendo atingir cifras de até 600 mL/dia.
rece destaque a bronquiectasia transitória ou
pseudobronquiectasia, que ocorre por relaxamento do Na era pré-antibiótica, observava-se a halitose e
tecido muscular e elástico da parede brônquica na vi- expectoração fétida em cerca de 25% dos pacientes,
gência de processos infecciosos broncopulmonares mas esses sintomas, felizmente, são infreqüentes nos
dias de hoje. A combinação de fisioterapia e drena-
agudos9. Essas bronquiectasias são geralmente cilín-
gem postural aliada ao uso precoce de antibiótico re-
dricas, completamente reversíveis por um período de
duz o volume e a purulência do escarro, além de
até quatro meses50 e devem ser diferenciadas das ver-
impedir a infecção secundária por germes anaeróbi-
dadeiras bronquiectasias por serem de tratamento
cos. Isto concorreu para um melhor controle das in-
eminentemente clínico.
fecções virais ou b a c t e r i a n a s r e c o r r e n t e s ,
A obstrução brônquica por aspiração de corpo es- responsáveis pelo agravamento da bronquiectasia e
tranho ou neoplasia endobrônquica podem ocasionar aumento do dano pulmonar. Geralmente, nos surtos
retenção de secreção que predispõe ao surgimento de de infecção respiratória, ocorre maior produção de ca-
infecção secundária e, finalmente, bronquiectasia, por tarro e pode surgir hemoptise. Outros sintomas me-
mecanismos semelhantes aos acima descritos. Similar- nos comuns são febre, dor pleurítica e graus variados
mente, a obstrução brônquica por compressão extrín- de dispnéia que também costumam aparecem duran-
seca que ocorre por hiperplasia reativa, inflamatória ou te os episódios de infecção34-38. Esses sintomas eram
neoplásica dos linfonodos peribrônquicos nas infecções mais comuns na era pré-antibiótica. Atualmente, a he-
crônicas (exemplo, tuberculose, histoplasmose etc.) e moptise é o sintoma mais comum nos pacientes com
neoplasias também pode evoluir para bronquiectasia. bronquiectasia de etiologia tuberculosa, chamadas
bronquiectasias "secas", enquanto a tosse produtiva e
As discinesias ciliares resultam em déficit na fun- a pneumonia de repetição são mais encontradas na
ção ciliar e, com isto, da limpeza das secreções da ár- etiologia não tuberculosa, ditas bronquiectasias "úmi-
vore respiratória, predispondo os pacientes à infecção das" 1019. As primeiras localizam-se predominantemen-
secundária e ao desenvolvimento de bronquiectasia. te nos lobos superiores e as últimas, nos lobos
A síndrome de Kartagener, que se caracteriza pela tría- inferiores. Episódios de hemoptise maciça devido à
de clássica de SÍÍWS inversus totalis, pansinusite e bron- ruptura de uma artéria brônquica ocorrem ocasional-
quiectasia é o protótipo do grupo das discinesias. Os mente e podem ser uma ameaça à vida.
pacientes com fibrose cística com alterações das pro-
priedades viscoelásticas do muco e os doentes com Complicações infecciosas como empiema, absces-

CAPITULO 19 253
so pulmonar, abscesso cerebral e amiloidose secundá- gráfico e/ou tomográfico dos pulmões. Até a década
ria são raramente vistas atualmente, mesmo nos paci- de 1980, a broncografia era um exame indispensável
entes com muito tempo de doença. aos cirurgiões18-34'47'56 para o diagnóstico e mapeamen-
No que tange à função pulmonar, Bogossian et ai10, to (localização e extensão anatômica) acurado da doen-
estudando 314 casos de bronquiectasia tuberculosa e ça.
não-tuberculosa, mostraram a presença de distúrbio Na última década a broncografia tem sido substi-
ventilatório obstrutivo (VEF1/CVF<70%) nos dois gru- tuída pela tomografia computadorizada de alta reso-
pos, enquanto foi encontrada uma redução da CVF ape- lução (TCAR) ou tomografia com cortes finos2'25'26'3852
nas nos pacientes com antecedentes de tuberculose. Em na quase totalidade dos casos. Alguns estudos têm
outro estudo de pacientes fumantes e não-fumantes demonstrado uma boa correlação da TCAR com a
com bronquiectasia38 foi também demonstrado um dis- broncografia35 e com a anatomopatologia 25 . Além dis-
túrbio ventilatório obstrutivo nos dois grupos, embora so, por ser a TCAR um método não-invasivo, feito sem
sendo mais acentuado no grupo de fumantes.
a necessidade do uso de contraste e facilmente exe-
qüível, tornou-se atualmente o exame de escolha no
PROPEDÊUTICA
diagnóstico de bronquiectasia. A TCAR tem uma boa
acurácia na detecção da presença de bronquiectasia,
A maioria dos pacientes com bronquiectasia tem mas uma menor precisão na definição do tipo e da
alguma alteração no exame físico, sendo as crepitações extensão da doença.
úmidas nas áreas afetadas os achados mais importan- Os achados tomográficos que confirmam o diag-
tes. Outros sinais comuns são os roncos difusos expi- nóstico de bronquiectasia incluem a dilatação brôn-
ratórios e sibilos, que podem ser vistos em 29% a 47% quica com o sinal de "anel de sinete", a ausência do
dos pacientes 3454 . A diminuição do MV e, por vezes, a estreitamento ou afunilamento brônquico progressivo,
macicez, podem ser detectados sobre os lobos afeta-
o espessamento da parede brônquica e a visualização
dos. O baqueteamento digital é um sinal raro que Mer-
de brônquio a menos de 1 cm da pleura25. O brônquio j
cúrio Neto e Nicotra encontraram em somente cerca
normal só é visto na porção central do parênquima ou
de 3% dos seus pacientes.
adjacente ao hilo pulmonar. O brônquio dilatado, quan-
do o diâmetro interno se torna maior que o da artéria
DIAGNÓSTICO correspondente, tem a aparência de "trilhos de bonde"
no corte longitudinal e assume a forma circular ou oval
A suspeita diagnostica de bronquiectasia deve ser no corte transversal, conhecida como "anel de sinete".
feita em todo e qualquer paciente que se apresente A manutenção da mesmo diâmetro brônquico em dois
com história clínica prolongada de tosse com expec- ou mais cortes tomográficos consecutivos, à medida
toração purulenta, pneumonia de repetição e hemop- que se aproxima da periferia, confirma a perda do es-
tise recorrente. No exame físico, a presença de treitamento brônquico progressivo.
crepitações, sibilos ou roncos associadas a algumas
alterações no RX simples de tórax, tipo aumento da Na série de Kang et ai25, comparando os achados
trama broncovascular ou dilatações brônquicas, re- pré-operatórios de TCAR com os patológicos de peças
forçam a suspeita diagnostica de bronquiectasia. Gu- cirúrgicas, o critério diagnóstico de bronquiectasia mais
dbjerg20 descreveu os critérios para o diagnóstico de sensível foi a ausência de estreitamento brônquico, que
bronquiectasias no RX simples de tórax que incluí- esteve presente em 37 (79%) de 47 lobos ou segmentos
am: aumento da trama broncovascular, atelectasia ressecados de 22 pacientes com bronquiectasia.
com empilhamento brônquico e presença de estru- Conforme os critérios tomográficos de Naidich et I
turas tipo "favo de mel" ou espaços císticos com ní- ai.37 para a definição do tipo de bronquiectasia, as for-
veis hidroaéreos. Conforme esses critérios, somente mas cilíndricas aparecem na TCAR com contornos re- I
7,1% dos seus pacientes com diagnóstico broncográ- gulares, enquanto as formas varicosas assumem a
fico de bronquiectasias tiveram RX de tórax normal. aparência de "colar de pérola". As formas císticas ei-
Mais recentemente, outros autores 38,52 , usando os cri- põem-se em grupos ou aglomerados com ou sem aí- I
térios de Gudbjerg detectaram anormalidades no RX vel hidroaéreo que as tornam facilmente reconhecidas. I
de tórax em cerca de 90% dos pacientes com suspei- A diferença entre as bronquiectasias cilíndricas e vari- I
ta clínica de bronquiectasia. Entretanto, em outras sé- cosas é difícil de ser feita, principalmente nos brômB
ries35-48 os percentuais de dados anormais no RX quios que se distribuem nas posições verticais, tais I
simples têm variado de 37% a 64% dos casos, além como os segmentos basais dos lobos inferiores e osfl
de alguns deles serem totalmente inespecíficos para apicais dos lobos superiores35,50. Do ponto de vista d-1
bronquiectasia. Portanto, o diagnóstico de certeza, rúrgico, a classificação das bronquiectasias é menos I
na maioria das vezes, só é feito pelo estudo bronco- importante do que a determinação da localização e I

254 CAPÍTULO 19
extensão da doença. A cirurgia é o tratamento prefe- fibrose cística. Radiografias dos seios da face devem
rencial na doença localizada, mas é raramente indica- também ser feitas, visto que muitos pacientes com
da quando a doença acomete vários lobos, qualquer bronquiectasias têm sinusites associadas. Quando isto
que seja o tipo de bronquiectasia. acontece, além do tratamento antimicrobiano, irriga-
Quanto à extensão e à localização da bronquiecta- ção e drenagem cirúrgica podem ser necessária.
sia por segmento brônquico, a TCAR tem uma especi-
ficidade menor que a broncografia, principalmente nos TRATAMENTO CLÍNICO
casos em que há distorção do parênquima pulmonar
por fibrose ou consolidação que impeça a visualiza- O tratamento clínico da bronquiectasia sintomáti-
ção dos brônquios dilatados35. ca que tem por objetivo o controle dos sintomas e a
prevenção da progressão da doença se baseia, tradicio-
A indicação atual da broncografia limita-se àque-
nalmente, no tripé antibiótico, medicação broncodila-
les casos de dúvidas quanto à extensão da doença
tadora e fisioterapia respiratória com drenagem
quando a cirurgia é contemplada 36 . Nessas situações, postural. Preconiza-se também a imunização contra
a broncografia deve ser feita com bário adequadamen- as principais bactérias responsáveis pelos episódios de
te diluído, como preconiza Moreira et ai.36, evitando infecção na bronquiectasia com vacina antiinfluenza
realizá-la nos pacientes com pouca reserva pulmonar e antipneumocócica 50 .
ou que tenham alergia ao produto do contraste.
Na vigência de um surto de infecção da bronquiec-
Finalmente, nos últimos cinco anos, a tomografia tasia, caracterizada por aumento da purulência no es-
helicoidal tem mostrado ser uma alternativa à TCAR carro ou pelo surgimento de febre e dor torácica, está
e à broncografia, principalmente em crianças, por evi- indicado o uso de antibiótico, de forma empírica, ou
tar os falsos-negativos que, algumas vezes, ocorrem orientado pelo Gram e cultura do escarro. Sabe-se que
na TCAR. A sensibilidade e especificidade da tomo- os organismos cultivados com mais freqüência no
grafia helicoidal para o diagnóstico de bronquiecta- escarro de pacientes com bronquiectasia infectada,
sia, quando comparada com a TCAR por Lucidarme na ausência de fibrose cística, são o H. influenzae e o
ia!.31, foram de 91% e 96%, respectivamente, em 50 S. pneumoniae36'*19. Assim sendo, os antibióticos de es-
pacientes. Em outra série53 de 30 pacientes, a sensibili- colha inicialmente são a ampicilina, ou amoxicilina, ou
dade e a especificidade diagnostica foram de 91% e sulfametoxazol-trimetoprim, ou ainda cefuroxima,
99%, respectivamente. As bronquiectasias podem não usualmente eficazes contra estas duas bactérias. Nas
ser vistas na TCAR nas seguintes situações31'53: a) esta- exacerbações agudas da bronquiectasia, o antibiótico
rem localizadas em áreas dos intervalos de cortes to- normalmente deve ser feito por duas semanas24-49,
mográficos; b) assumirem uma posição perpendicular embora nos pacientes com sepse brônquica crônica seja
ou oblíqua ao plano axial, impedindo a detecção da necessário um período maior de tratamento para evi-
dilataçáo brônquica pela ausência do estreitamento tar a reinfecção e o retorno da purulência no escarro.
progressivo; c) na presença de impactação dos brôn- Em um estudo randomízado duplo-cego contro-
quios por secreção ou muco simulando nódulo, mas- lado, Chan et ai12 demonstraram um melhor resulta-
sa ou consolidação pulmonar; d) artefatos resultantes do com o uso da ciprofloxacina (500 mg 2xdia) do que
dos movimentos respiratórios ou batimentos cardíacos com a amoxicilina (1 g 3xdia), no tratamento das bron-
que deformam as imagens brônquicas, particularmen- quiectasias infectadas. No entanto, nessa série, a Pseu-
te, nas áreas paracardíacas. Alguns desses problemas domonas aeruginosa foi a bactéria mais comum na
podem ser evitados com o uso da tomografia helicoi- cultura do escarro, seguida do Haemophilus influenzae,
dal, que se tornou atualmente uma alternativa ao uso em 34% e 19% dos casos, respectivamente.
I da TCAR e à broncografia em situações de dúvidas
Nos pacientes com fibrose cística ou em outros ca-
quanto à extensão da bronquiectasia nos casos de in-
sos em que a P aeruginosa esteja presente, o uso de
dicação do tratamento cirúrgico.
uma quinolona por via oral ou de uma cefalosporina
Abroncoscopia deve ser feita de rotina 5 para afas- de terceira geração, tipo ceftazidima, em combinação
tar lesões endobrônquicas como causa da bronquiec- com um aminoglicosídeo por via parenteral pode ser
I tasia, ou para definir o local do sangramento em suficiente para debelar tais infecções50.
pacientes com hemoptise recorrente, mas não tem va- Lin et ai.29 demonstraram em um estudo randomí-
lor no diagnóstico da bronquiectasia. Outros exames zado duplo-cego de 28 pacientes com bronquiectasia,
que devem ser feitos em criança ou adulto jovem sem que o uso de aerossol com gentamicina (40 mg 2xdia)
antecedentes de pneumonia, lesão obstrutiva ou ou- diminuiu significativamente a produção de catarro e
I tros fatores predisponentes de bronquiectasia são a a inflamação da via aérea em relação aos pacientes que
dosagem sérica de imunoglobulinas e o teste de sódio usaram apenas aerossol com solução salina a 0,45%.
I e cloro no suor para afastar deficiências de IgGs e Foi mostrado, também por estes autores, que houve

I CAPÍTULO 19 255
uma diminuição significativa nos níveis de mielope- provavelmente, persiste a conduta ortodoxa de tra-
roxidase no escarro, uma das enzimas responsáveis tamento clínico inicial para os pacientes com bronqui-
pelo estímulo da secreção de muco e pela injúria da ectasias. A maioria dos cirurgiões2'5'19'34'45 ainda segue
via aérea. rigorosamente essa conduta, ou seja, somente indicam
Por fim, a fisioterapia respiratória e a limpeza brôn- a cirurgia para os pacientes que persistem com graves
quica através da drenagem postural, precedida de ae- sintomas não responsivos ao tratamento clínico.
rossol com drogas broncodilatadoras, associadas a uma Com base nos bons resultados do tratamento ci-
hidratação judiciosa, concorrem para o controle clíni- rúrgico ao longo dos anos, acreditamos que a cirurgia
co e a melhora na qualidade de vida da maioria dos deva retomar o seu espaço, situando-se como modali-
pacientes com bronquiectasia. Todavia, por se tratar dade terapêutica inicial nos pacientes que se apresen-
de uma doença de natureza irreversível, a única mo- tem com sintomas de tosse crônica e infecção
dalidade terapêutica com real possibilidade de cura pulmonar recorrente ou hemoptise, mesmo antes que
ainda é a cirurgia, principalmente nos pacientes com ocorra falência do tratamento clínico, principalmente
doença localizada. na doença localizada. Neste mister, Sanderson et ai*6,
em 1974, já achavam que havia um viés não justifica-
TRATAMENTO CIRÚRGICO
do em favor do tratamento conservador das bronqui-
ectasias: "It is our opinion that current bias towards
Alguns autores 3350 acham que com o uso do anti- conservative management is unjustified."
biótico apropriado e no tempo oportuno, a cirurgia A classificação da bronquiectasia em localizada e
raramente se faz necessária. Para esses autores, a ci- difusa ou multissegmentar, proposta por Sealy et al.i7,
rurgia seria indicada somente para os pacientes jovens
estratifica de princípio dois grupos de pacientes com
com sintomas respiratórios incapacitantes (tosse com
perspectivas terapêuticas distintas. Os pacientes com
expectoração purulenta profusa e pneumonia recor-
bronquiectasia localizada, denominados grupo I19, que
rente) que persistissem e interferissem com a vida nor-
mal do paciente, a despeito do t r a t a m e n t o são sintomáticos, têm na cirurgia a modalidade tera-
conservador. Entretanto, ao longo das últimas déca- pêutica de eleição quando a função pulmonar for com-
das, outros estudos3'46,56 têm mostrado que são pou- patível com a ressecção proposta. Os pacientes com
cos os que se curam ou se tornam definitivamente bronquiectasia multissegmentar uni ou bilateral, de-
assintomáticos com o tratamento conservador. A re- nominados grupo IP9, geralmente portadores de sin-
gra quase sempre nesses casos é a recidiva dos sinto- tomas graves, são de preferência tratados clinicamente,
mas e a necessidade de internações hospitalares pelo receio da excessiva perda de função pulmonar
freqüentes, apesar do uso rotineiro de antibióticos. que possa ocorrer nas ressecções extensas ou bilate-
rais. Os doentes do grupo I com doença mínima e oli-
Estudos feitos comparando resultados do trata- gossintomáticos com boa resposta ao tratamento
mento conservador com o tratamento cirúrgico3'30'46'56 conservador devem seguir adiante com esse tratamen- I
mostraram resultados melhores nos pacientes trata- to, pois não existe amparo na literatura para indica- I
dos cirurgicamente, com um número significativamen- ção cirúrgica nesses casos. Nos doentes do grupo II, I
te menor de pacientes que persistiram sintomáticos, por outro lado, a doença difusa e bilateral, por si só, I
enquanto os sintomas permaneceram inalterados ou não constitui uma contra-indicação absoluta para ei-
tornaram-se progressivamente piores nos pacientes ru rgia. Os doentes desse grupo que se apresentem com I
tratados conservadoramente. sintomas graves e incapacitantes para o labor diário e I
Annest et ai.3, com o objetivo de avaliar a contri- de difícil controle clínico podem eventualmente ser I
buição da cirurgia no tratamento da bronquiectasia, operados 28 . Contudo, nesses casos deve ser esclareci-
compararam retrospectivamente dois grupos de paci- do ao paciente que a cirurgia de ressecção, além der I
entes com características similares submetidos a trata- ter um maior risco cirúrgico, tem uma conotação pali- I
mento cirúrgico (n=24) e conservador (n=16). Os ativa, adjuvante ao tratamento clínico. Nos pacientes I
autores mostraram que tanto o número de pacientes com doença multissegmentar bilateral com si dornas i
que persistiu com sintomas foi significativamente me- refratários ao tratamento clínico, alguns estudos1*28!
nor, como o número de pacientes que se tornou assin- têm mostrado que, apesar do percentual de cura ser
tomático foi significativamente maior nos pacientes baixo, mesmo quando se fazem ressecções completas
tratados cirurgicamente. Entretanto, pelo fato de os por operações bilaterais, a redução dos sintomas e a
estudos comparativos entre tratamento cirúrgico e con- melhora da qualidade de vida têm sido maior do que
servador terem sido retrospectivos, são passíveis de fa- naqueles que são apenas tratados clinicamente. A ci-
lhas ou distorções na interpretação dos seus resultados. rurgia nesses casos deve geralmente ser feita em dois
Por falta de estudos prospectivos e randomizados estágios. Opera-se primeiro o lado mais extensamen-
comparando as duas modalidades terapêuticas é que, te envolvido, preservando-se o segmento superior do

256 CAPÍTULO 1? I
lobo inferior quando sadio, e resseca-se a língula, mes- A analgesia pode ser feita preferencialmente com
mo quando tenha lesões mínimas que possam ser sí- morfina epidural (3 mg a 4 mg) por cateter após indu-
tio futuro de recidiva da doença18-28'47-56. ção da anestesia geral, repetida em doses menores (2
mg a 3 mg) nos dois dias subseqüentes. A partir de
Em resumo, os pacientes de eleição para o trata-
então, o controle da dor pode ser feito com antiinfla-
mento cirúrgico devem preencher os seguintes critéri-
matório não-hormonal e/ou opióide por via oral.
os de operabilidade: 1) ter sintomas respiratórios não
controlados com tratamento conservador em grau su- Para os pacientes com bronquíectasias que não têm
ficiente para causar desconforto; 2) ter bronquiectasia reserva pulmonar para serem submetidos à cirurgia e
irreversível diagnosticada por broncografia, TCAR ou complicam com hemoptise maciça, resta como única
tomografias helicoidais do pulmão; 3) ter reserva respi- opção terapêutica, de sucesso temporário, a emboli-
zação da artéria brônquica 51 . Finalmente, os pacientes
ratória compatível com a cirurgia de ressecção pulmo-
com bronquiectasia difusa que evoluem com sintomas
nar programada, ou que o VEFj pós-operatório previsto
graves, tipo insuficiência respiratória e outros, e não
seja maior que 0,8 L a 1,0 L17, ou que no mínimo dois melhoram com as formas atuais de tratamento dispo-
lobos ou seis segmentos pulmonares sejam poupados 15 . níveis podem eventualmente se beneficiar com o trans-
No pré-operatórío, os pacientes devem ser avalia- plante pulmonar bilateral6.
dos quanto à presença de doenças associadas, além
de se submeterem a exames laboratoriais de rotina, ele-
RESULTADOS
trocardiograma, provas de função pulmonar (gasome-
tria arterial e espirometria) e broncoscopia para afastar A ressecção pulmonar na bronquiectasia, para ob-
lesão endobrônquica, e coletar material para pesquisa ter êxito, deve incluir todos os segmentos afetados pela
de BAAR e estudo bacteriológico. Os pacientes devem doença e, obviamente, poupar todos os segmentos sa-
ser submetidos à antibioticoterapia e à fisioterapia res- dios. Na cirurgia da bronquiectasia o cirurgião tem que
piratória com drenagem postural para um melhor con- estar habilitado para fazer ressecções segmentares, ten-
trole clínico da doença antes da cirurgia. do em vista que muitas vezes a doença acomete me-
nos de um lobo ou segmentos de lobos pulmonares
Na cirurgia, os pacientes adultos devem ser ope-
diferentes. Isto se tornou possível com a introdução
rados na posição de decúbito lateral e intubados sele-
das técnicas de ressecção segmentar pulmonar14-41 nas
tivamente com tubo de duplo lume, tipo Carlens ou décadas de 1930 e 1940. O aprimoramento das técni-
similar; e a maioria das crianças intubadas com tubo cas cirúrgicas e anestésicas, bem como o melhor ma-
simples e operadas em decúbito ventral 19 , ou com blo- nuseio dos pacientes no pré e pós-operatório, foi fator
queador brônquico para isolar a via aérea a ser opera- importantes na diminuição das complicações e na re-
da e evitar a contaminação do pulmão contralateral 2 . dução da mortalidade cirúrgica para cifras próximas
As toracotomias devem ser póstero-laterais ou laterais de zero.
com preservação muscular de acordo com a preferên-
cia e experiência do cirurgião. As complicações de todos os tipos de ressecções
na bronquiectasia variam de 11,0% a 31,7% (Tabela
No pós-operatório, uma analgesia eficaz, além de 19.2), sendo empiema, atelectasia, pneumonia, escape
antibioticoterapia e fisioterapia respiratória são essen- de ar prolongado e espaços pleurais residuais as mais
I ciais para evitar ou minimizar complicações. comuns.

CAPITULO 19 257
Gomes Neto et ai}9 mostraram uma incidência Bom (melhorado) - diminuição dos sintomas pré-
de complicações significativamente menor nos pa- operatórios; Ruim - n e n h u m a melhora ou piora dos
cientes com bronquiectasia localizada. Em um estu- sintomas pré-operatórios.
do de 67 casos, os autores tiveram somente 13% (6/
Os melhores resultados da cirurgia na bronquiec-
46) de complicações em pacientes com doença loca-
tasia têm sido obtidos nos pacientes com doença loca-
lizada, enquanto, 9 de 21 (42,9%) pacientes com do-
lizada unilateral (Figs. 19.6a e b; 19.7a e b).
ença multissegmentar evoluíram com complicações
no pós-operatório. Nestes casos, a maioria dos doentes se beneficia com
a cirurgia, que proporciona a cura em um percentual
Para que se obtenha sucesso com o tratamento
que varia de 72,5 a 84,8, e o restante deles evolui com
cirúrgico, os critérios de operabilidade devem ser
diminuição dos sintomas da doença (Tabela 19.3).
rigorosamente seguidos. É de fundamental impor-
tância que se determine claramente no pré-opera- Na presença de doença multissegmentar e/ou bi-
tório a extensão da ressecção a ser feita, porque é lateral, um percentual menor de doentes alcança a cura
difícil fazer tal avaliação durante a cirurgia. No se- com a cirurgia, mesmo quando a ressecção cirúrgica
guimento pós-operatório a longo prazo, a fim de
permitir uma melhor avaliação do tratamento ci-
rúrgico, os resultados podem ser classificados em 19 :
Excelente (cura) - completa ausência de sintomas;

Fig. 19.6 - A) A tomografíâ demonstra bronquiectasias cilíndricas do Fig. 19.7 - A) A tomografíâ demonstra bronquiectasias císticas do lobo
lobo inferior esquerdo em uma paciente de sete anos. B) A peça cirúrgica inferior direito em um paciente de 38 anos. B) A peça cirúrgica do mesmo
do mesmo caso confirmando os acbados da tomografíâ. caso mostrando bronquiectasias císticas (setas retas) e cilíndrica (seta curM

258 CAPÍTULO 19
inclui todos os segmentos do pulmão acometidos pela RESUMO
doença. Entretanto, nesss casos, ocorre melhora clíni-
A bronquiectasia caracteriza-se pela dilatação ir-
ca em um percentual significativo de pacientes, po-
reversível de um ou vários segmentos brônquicos e
dendo até 77% deles alcançarem bons resultados com
pode ser causada por fatores adquiridos ou congê-
a cirurgia (Tabela 19.4).
nitos. Destacam-se entre os fatores adquiridos mais
Todavia, como nestes casos a ressecção completa comuns as pneumonias bacterianas, virais, e a tuber-
da doença nem sempre é possível e os percentuais de culose, principalmente nos países em desenvolvimen-
cura são baixos, a cirurgia tem uma conotação paliati- to e do terceiro mundo. Dentre os fatores congênitos,
va, devendo somente ser indicada em doentes bem a fibrose cística e as discinesias ciliares são atualmen-
selecionados. te as causas mais comuns de bronquiectasia nos paí-
ses do Primeiro Mundo.
Na literatura, são poucos os estudos que permi-
tem a comparação e confrontação dos resultados do A bronquiectasia pode ser classificada quanto à apre-
tratamento cirúrgico na bronquiectasia4'5'18'19'47'56. A sentação patológico-radiológica em cilíndrica, cística ou
maioria dos trabalhos inclui grupos heterogêneos de sacular e varicosa; e quanto à distribuição, em localizada
pacientes, tornando difícil a análise dos resultados e a e difusa ou multissegmentar, podendo a última ser uni
retirada de conclusões. Para que isto não ocorra e os ou bilateral. As bronquiectasias localizadas têm na maio-
resultados se tornem comparáveis, se faz necessária a ria das vezes etiologia adquirida, como infecção pulmo-
estratificação dos pacientes pelo grau de extensão da nar na primeira infância ou obstrução brônquica por
bronquiectasia, ou seja, em localizada ou multisseg- neoplasia ou corpo estranho. As bronquiectasias multis-
mentar uni ou bilateral, e pelo tipo de ressecção reali- segmentares ou difusas estão mais relacionadas a fato-
zada. Evidentemente, os resultados clínicos deverão res congênitos. Em cerca de um terço dos casos não se
ser sempre melhores quando a cirurgia for feita em consegue determinar uma etiologia.
pacientes com doença localizada ou quando a ressec- O diagnóstico da bronquiectasia deve ser suspei-
ção for completa. tado pela história clínica. Tosse produtiva crônica,

259
infecções respiratórias de repetição e hemoptise de pe- 5. Ashour M, Al-Kattan KM, Jain SK, Al-Majed S, Al-Kassimi F,
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servador são os candidatos ideais para o tratamento Chemotherapy 1996; 42(2):150-6
cirúrgico, desde que tenham reserva pulmonar fun- 13. Churchill ED. Lobectomy and pneumonectomy in bronchiec-
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do, melhorar sua qualidade de vida. No entanto, nes- 16. Field CE. Bronchiectasis. Third report on a follow-up study of
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em que se consegue ressecar toda a porção pulmonar 19. Gomes Neto A, Medeiros ML, Gifoni JMM. Bronquiectasia lo- I
afetada pela doença. Por isso, os melhores resultados calizada e multissegmentar: perfil clínico-epidemiológico e re-
da cirurgia na bronquiectasia têm sido obtidos nesses sultado do tratamento cirúrgico em 67 casos. J Pneumol I
pacientes, onde cerca de 84% podem ser curados com 2000;27:1-6.
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260 CAPÍTULO Irj


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CAPITULO 19 261
Capítulo

EMPIEMA PLEURAL
Darcy Ribeiro Pinto Filho
José Antônio de Figueiredo Pinto

INTRODUÇÃO mente para estabelecer a correta relação entre a fase


evolutiva da infecção e o método apropriado de dre-
Dentre as patologias cirúrgicas relacionadas à ati- nagem, alcançando, desta forma, satisfatoriamente os
vidade do cirurgião torácico, o empiema pleural fi- objetivos estabelecidos para o seu manuseio.
gura entre as mais prevalentes. Doença definida pela
presença de pus no espaço pleural, com três fases
evolutivas definidas e características peculiares, o em- HISTÓRICO
piema tem na drenagem cirúrgica seu método tera-
Hipócrates (460-370 a. C.) já identificava na dre-
pêutico de escolha.
nagem das secreções pleurais o único caminho para a
Salvar a vida, remover o empiema, reexpandir cura do empiema. Sua descrição do diagnóstico e tra-
o pulmão encarcerado, obliterar o espaço pleural, tamento do empiema é de uma lucidez impressionante
restabelecer a mobilidade diafragmática e da pare- se forem considerados os recursos diagnósticos e te-
de torácica e reduzir o período de permanência hos- rapêuticos da época. Dizia ele:
pitalar são os objetivos primordiais no manuseio do "Pacientes com plêuris, os quais desde o início têm
empiema1. escarro de diferentes cores ou consistência, morrem
Ao atendermos pacientes portadores de empie- no 3 e ou 5 e dia. Se eles sobreviverem, poderão morrer
ma pleural deparamo-nos com dilemas pertinentes no 7 e ou 9 e dia, ou tornarem-se supurativos pelo l l e
à própria característica da doença. Qual a fase do dia. Quando a cavidade pleural é aberta e o pus flui
empiema? Qual o melhor método terapêutico a ser branco, o paciente sobrevive, mas se estiver mistura-
empregado? Quais recursos diagnósticos estão dis- do com sangue, turvo e mal cheiroso, ele morrerá.
poníveis? O fator desencadeante da infecção está Quando o 15 s dia após a ruptura surgir, prepare um
controlado? banho morno, coloque-o (o doente) sobre um assento
que não deve oscilar, alguém deverá segurar suas
A busca destas respostas estabelece uma intrigan- mãos. Então sacuda-o pelos ombros e escute para ver
te e desafiadora postura frente a estes doentes, exi- qual o lado em que o murmúrio é ouvido. A direita
gindo conhecimentos que irão se assentar sobre deste lugar, preferentemente à esquerda, faça uma in-
dados históricos, fisiopatogenia, manifestações clíni- cisão. Isto levará à morte mais raramente". 2
cas, bacteriologia, métodos diagnósticos e alternati-
Das descrições de Hipócrates até meados do sécu-
vas terapêuticas.
lo XIX, o tratamento do empiema persistiu praticamen-
Entender o amplo espectro do empiema pleural é te inalterado. Nessa época surgiram os trabalhos de
substrato imprescindível ao cirurgião, fundamental- Bowditch e Trousseau 3 ,que popularizaram a toraco-

CAPITULO 42 681
centese e demonstraram que a drenagem aberta não procedimento, tão largamente utilizado nos dias de
era necessária em todos os casos. hoje, é, essencialmente, uma variação do procedimen-
Hewitt, em 1876, descreveu a drenagem fechada to proposto por Hipócrates há mais de 2000 anos. Til-
através da inserção de um tubo de borracha na cavi- lett e Sherry, em 19498, propõem a utilização de
dade pleural e colocação destes tubos imersos em água. enzimas fibrinolíticas (uroquinase e estreptoquinase)
Para os casos de cronicidade e persistência de cavida- instiladas dentro da cavidade pleural para lise de lo-
de residual, a toracoplastia surge no final do século culações e facilitação da drenagem pleural. Os anos
XIX. O método foi largamente utilizado nos casos de 1980 e 1990 viram surgir novos recursos técnicos que
empiema secundário à tuberculose. foram incorporados ao manuseio do empiema. O
exemplo mais eloqüente é a retomada da pleurosco-
A decorticação pulmonar para tratamento do em- pia como método terapêutico e, mais recentemente, a
piema pleural surge no início do século XX (Eggers, pleuroscopia videoassistida 9 .
1923)3 com índices de cura extremamente estimulan-
tes. Mesmo com as alternativas anteriormente men- Curiosamente, a história do diagnóstico e manejo
cioanadas, na era pré-antibiótico o tratamento para terapêutico do empiema, pouco se afastou dos precei-
infecções do espaço pleural baseava-se quase que ex- tos de Hipócrates.
clusivamente na abordagem cirúrgica precoce e "We ought not reject the ancient Art because it did not
agressiva, via de regra através de toracotomia e res- attain accuracy in ali things, but rather to receive it and
secção costal. Nessa época, o pneumotórax aberto e admire its discoveries madefrom a state ofgreat ignorance."
o pouco entendimento da fisiologia do espaço pleu-
Bela Schick (Modem Medicai Literature)10.
ral foram responsáveis por um grande número de
mortes por empiema 4 índices de mortalidade entre
30% e 70% para os combatentes portadores de empi- ETIOLOGIA
ema pleural durante a Primeira Grande Guerra Mun-
dial determinaram, por parte do exército dos Estados Uma grande revisão de aproximadamentes 1.300
Unidos, em 1918, a criação da Army Empyema Com- casos de empiema mostrou que 60% dos casos se ori-
mission5/6, coordenada pelos cirurgiões Graham e Bell. ginam de infecções pulmonares preexistentes2.
Os estudos desta comissão representaram um marco Admite-se que a contaminação do espaço pleu-
referencial na história terapêutica do empiema pleu- ral possa ocorrer pela passagem direta de bactérias
ral. Definiram-se, então, os conceitos referentes à ação através da pleura visceral, ou seja, decorrente da rup-
da pressão atmosférica sobre o espaço pleural. A dre- tura de abscessos pulmonares periféricos para a ca-
nagem aberta, método de eleição para o tratamento
vidade pleural. A possibilidade de contaminação
do empiema pleural àquele tempo, representava o
direta do espaço pleural via linfática ou hematogêni-
caminho para a morte dos pacientes, visto que, nas
ca sem a existência de abscessos pulmonares perifé-
fases iniciais do empiema, a exposição do espaço pleu-
ricos não apresenta sustentação teórica. Menos
ral à ação da pressão atmosférica determinava pneu-
freqüentemente, o empiema pode resultar da conta-
motórax aberto, redução do retorno venoso, queda
minação do espaço pleural por infecções de outros
do débito cardíaco, colapso cardiocirculatório e mor-
órgãos que estejam contíguos à pleura: ruptura de
te. As diretrizes estabelecidas pela Empyema Commis-
sion foram as seguintes: o líquido pleural deve ser esôfago, parede torácica, linfonodos mediastinais.
drenado, porém na fase pneumônica aguda deve-se As infecções do espaço pleural secundárias a pro-
evitar um pneumotórax aberto; deve-se ter cuidado cedimentos cirúrgicos torácicos são responsáveis por
para evitar um empiema crônico, fazendo-se uma rá- aproximadamente 20% de todos os casos de empiema
pida esterilização e obliteração da cavidade infecta- pleural e estão diretamente relacionadas à abertura da
da; deve ser prestada uma cuidadosa atenção à luz de órgãos potencialmente contaminados como
nutrição do paciente. brônquios e esôfago, o que pode ocorrer durante o
procedimento ou no período pós-operatório, através
Tais recomendações reduziram os índices de mor-
de fístulas e/ou deiscência de sutura. Pneumonecto-
talidade para algo em torno de 5% e mantêm-se abso-
mia é o procedimento responsável pelo maior núme-
lutamente atualizadas.
ro de empiemas pós-cirúrgicos (2% a 12% )3.
Outras técnicas inovadoras no tratamento do em-
piema foram surgindo. No ano de 1935, Eloesser7 subs- Empiema relacionado a procedimentos diagnós-
creve o procedimento que levaria seu nome para o ticos (toracocentese, biópsia pleural) ou pequenas in-
manejo do empiema tuberculoso. O método popula- tervenções cirúrgicas como drenagem pleural ou
rizou-se como drenagem pleural aberta e substituía pleuroscopia são menos freqüentes.
os drenos pleurais de longa permanência indicados Traumatismo torácico representa a 3- causa mais
para estes pacientes. Interessante observar que este comum de empiema pleural (10%) e está virtualmen-

682 CAPITULO 42
te associado ao trauma penetrante ou à presença de sos secundários a infecções por micobactérias e fun-
hemotórax. Ruptura esofágica traumática ou hérnia gos são raros.
diafragmática associada à ruptura de vísceras ocas E m p i e m a s p o r g e r m e s anaeróbicos estão freqüen-
abdominais têm menor incidência como causa de em- t e m e n t e associados à gengivite, alcoolismo, D P O C ,
piema secundário ao traumatismo torácico. O hemo-
carcinoma b r ô n q u i c o e diabete. Condições que deter-
tórax constitui-se em um excelente meio de cultura e
m i n e m alterações de consciência (uso de drogas, anes-
pode tornar-se infectado pela presença de três fato-
tesia geral), disfagia orgânica ou funcional,
res muito comuns na vigência do trauma de tórax:
instrumentação orofaríngea e refluxo gastroesofági-
dreno torácico, infecção pulmonar e pneumotórax.
co aumentam significativamente o risco de infecções
A possibilidade de desenvolvimento de um empie-
por anaeróbio, mas as tornam infreqüentes em crian-
ma secundário a um hemopneumotórax é duas ve-
zes maior do que a um hemotórax simples. Neste ças com menos de seis anos de idade.
sentido, o fator mais importante na prevenção de um Uso prévio de antibióticos e culturas inadequadas
empiema pós-traumático é a completa drenagem do podem ser responsáveis por índices de 20% a 30% de
eventual hemotórax concomitante 11 . Causas menos empiemas estéreis. De acordo com Bartlett14, a baixa
freqüentes de empiema incluem abscesso subfrênico incidência de germes anaeróbios isolados em muitas
com contaminação pleural transdiafragmátíca, per- séries de empiema pleural decorrem dos métodos ina-
furação espontânea do esôfago, complicações de eso- dequados de preservação do material (oxigênio-sen-
fagoscopia, aspiração ou retenção de corpo estranho. sível) durante a transferência para o laboratório, além
da inexistência de meios de culturas específicos para
estes germes em muitos destes laboratórios.
EPIDEMIOLOGIA Frente aos microrganismos mais freqüentes em pa-
Embora possa afetar pacientes de todas as idades e cientes portadores de empiema é possível estabelecer
dasses sociais, o empiema ocorre mais freqüentemente uma correlação entre características clínico-radiológi-
em crianças e idosos, pobres e debilitados12. Neoplasi- cas e o germe mais provável.
as, doenças pulmonares crônicas, doenças cardíacas, O germe mais freqüente em adultos jovens e cri-
diabete, alcoolismo, uso de drogas, neuropatias centrais anças acima de dois anos portadores de empiema
e imunossupressão são situações debilitanres associa- parapneumônico é o pneumococo. Nas crianças com
das freqüentemente ao empiema pleural. menos de dois anos que apresentem rápida evolu-
índices de mortalidade do empiema variam de 1% ção dos sintomas clínicos, velamento total do hemi-
a 19%, podendo ser superiores a 40% em pacientes tórax, d e v e ser c o n s i d e r a d a a p r e s e n ç a de
imunocomprometidos (ex.: AIDS)13. estafilococos. Nos pacientes debilitados (alcoolismo,
diabetes melitus, imunossuprimidos) os germes ae-
O grupo de maior letalidade é o caracterizado por
róbios Gram-negativos e anaeróbios apresentam
paciente com mais de 50 anos e naqueles portadores
uma incidência aumentada. Empiemas pós-opera-
de arritmias cardíacas, insuficiência cardíaca conges-
tórios, na subtotalidade dos casos, são decorrentes
tiva, doenças renais ou doença pulmonar obstrutiva
de infecção por germes Gram-negativos.
em estágio final.
Pior prognóstico é reservado a pacientes portado-
res de empiema secundário a infecções adquiridas em A TRÍADE DIAGNOSTICA:
ambiente hospitalar, especialmente quando isolados CLÍNICO-RADIOLÓCICA-TORACOCENTESE
germes Gram-negativos.
O Quadro Clínico

BACTERIOLOGIA As manifestações clínicas do empiema estão rela-


cionadas com o seu fator causai (pneumonias em 60%
0 espectro microbiológico do empiema vem alte- dos casos), estágio evolutivo da doença, quantidade
rando-se com o passar dos anos, muito provavelmen- de pus no espaço pleural, competência imunológica
te em decorrência da chamada "era dos antibióticos". do paciente e poder de virulência do microrganismo
Seu uso disseminado no tratamento das pneumonias infectante. Febre, dor torácica e dispnéia estão presen-
determinou redução nas taxas de incidência e morta- tes na maioria dos casos, sendo febre o sintoma mais
lidade do empiema. Embora o pneumococo e o estafi- freqüente. Prostração, diminuição do murmúrio vesi-
lococo permaneçam como os principais patógenos em cular, maciçez à percussão do hemitórax afetado e es-
muitas séries, as bactérias aeróbicas Gram-negativas coliose, em alguns casos, compõem o restante do
(Escheríchia coli, Klebsíella e Pseudomonas) e os g e r m e s quadro clínico2. Nas fases iniciais do empiema os sin-
anaeróbios vêm e m e r g i n d o como i m p o r t a n t e s micror- tomas são mais exacerbados e o paciente apresenta-se
ganismos envolvidos na etiologia dos e m p i e m a s . Ca- toxêmico. Na medida em que o empiema evolui para

CAPÍTULO 42 683
a cronicidade, os sintomas tornam-se mais brandos,
sobressaindo-se o quadro de febrícula, anorexia, adi-
namia e dor torácica de menor intensidade.
No hemograma, o número de leucócitos costuma
elevar-se a 15.000 mm 3 ou 20.000 mm 3 , com desvio para
a esquerda na contagem diferencial.

Os Métodos de Imagem
O radiograma simples de tórax constitui o primei-
ro sinal consistente da presença do derrame pleural.
A distinção entre líquido pleural, consolidação ou
mesmo abscessos pulmonares, nem sempre é simples.
Neste sentido, a realização de incidências radio! ógi-
cas em decúbito lateral com raios horizontais deverá
fazer parte da avaliação destes pacientes.
Schachter, em 197615, descreveu três característi-
cas radiográficas do empiema que podem ser utiliza-
das para diferenciá-lo do abscesso pulmonar: a
interface do nível hidroaéreo estende-se completa-
mente até a parede torácica; os limites da coleção hi-
droaérea d i m i n u e m q u a n d o em contato com o
mediastino; o nível hidroaéreo freqüentemente ultra-
passa os limites das cissuras.
Para os casos de dúvida poderemos utilizar os re-
cursos da ecografia torácica ou tomografia computa- Fig. 4 2 . 2 - Ecografia torácica. Traves de fibrina (setas) evidenciando a
dorizada 16 . Além da definição entre doença pleural segunda fase evolutiva do empiema parapneumônico.
(derrame) e parenquimatosa (abscesso, consolidação),
tais recursos possibilitam a identificação de eventu-
ais septações do derrame pleural, caracterizando, par- características da segunda fase do empiema, também
ticularmente, a fase fibrinopurulenta do empiema faz parte das informações possíveis de serem retira-
pleural (Figs. 42.1 e 42.2). das do método. No entanto, a interpretação da eco-
grafia é altamente d e p e n d e n t e do examinador e
Não existe nenhum sinal patognomônico de em-
deverá estar associada ao conjunto de informações
piema ao exame de ecografia torácica, e sua princi-
clínicas e de outros métodos de imagem para que
pal utilidade é distinguir coleções líquidas de massas
se possa estabelecer condutas baseadas nos acha-
sólidas, o que em aproximadamente 5% dos casos não
dos observados durante sua realização.
será possível. A identificação de septações pleurais,
Contrariamente à ultra-sonografia, a tomografia
computadorizada de tórax apresenta achados maisre-
produzíveis e muito menos dependentes da experi-
ência do radiologista para sua interpretação. Aj
distinção anatômica entre pulmão, espaço pleural e
parede torácica é virtualmente mais efetiva ao exame
tomográfico computadorizado, o que pode ser incre-
mentado pela reconstrução das imagens ao computa-
dor, permitindo adequada distinção entre abscsos
pulmonares, derrame pleural, ascite e empiema.
Informação útil fornecida pela tomografia com-
putadorizada é a distinção das densidades dos teci-
dos e coleções identificadas na cavidade pleural,
através das Unidades Hounsfield (H). Coeficientes
de atenuação de -100 H são característicos de tran-
sudato, enquanto densidades maiores, como -20 H,
F i g . 4 2 . 1 - Tomografia computadorizada de tórax. Empiema indicam a presença de um exudato e auxiliam no di- 1
multisseptado, à direita (seta). agnóstico das infecções pleurais.

684 CAPITULO 42
O acesso às informações fornecidas pela tomogra- nova punção em 12 a 24 horas. A elevação do pH
fia computadorizada de tórax sustenta uma crescente será indicativa de que o derrame parapneumônico
incorporação do método para o manejo diagnóstico e está em fase de resolução e a drenagem pleural con-
terapêutico do empiema. temporizada; uma queda nestes índices é critério
Ressonância nuclear magnética não tem se mos- para indicação de tratamento cirúrgico.
trado um método eficaz para manuseio diagnóstico Os parâmetros bioquímicos, por si só, não repre-
das coleções pleurais. A reconstrução tridimensional sentam critérios absolutos para drenagem do espaço
obtida pelo exame não estabelece acréscimo aos da- pleural e devem estar associados às manifestações clí-
dos obtidos através da radiologia simples, ecografia nicas e radiológicas de cada caso17.
torácica ou tomografia computadorizada de tórax16.
Ressalte-se que os critérios bioquímicos de Light se
aplicam tão somente aos derrames parapneumônicos.
A Toracocentese Nesta linha de raciocínio, todo o esforço deverá
ser feito para não perdermos a oportunidade de tra-
Definida a presença de coleção líquida no espaço tar precocemente o empiema pleural.
pleural, estará indicada a toracocentese para compro-
vação de sua etiologia infecciosa. O procedimento é
realizado sob anestesia local na subtotalidade dos EMPIEMA PARAPNEUMÔNICO
casos, obedecendo o cuidado técnico de puncionar-
mos o paciente sentado e tendo como referência ana- O surgimento de coleções pleurais associadas a con-
tômica a linha axilar posterior, logo abaixo da ponta solidações pneumônicas (derrames parapneumônicos)
do omoplata. Nos casos de derrame multisseptado representa um desafio diagnóstico e terapêutico dos
poderemos contar com o auxílio da ultra-sonogra- mais intrigantes a quem por ventura esteja envolvido
fia, ou mesmo da tomografia computadorizada, com com o seu manejo. De uma simples coleção líquida es-
vistas à orientação do local mais adequado para a téril, sem alterações bioquímicas (derrame parapneu-
punção pleural. mônico não-complicado), passando por um segundo
estágio, onde se observa a presença de alterações bio-
O aspecto purulento do líquido pleural, por si só, químicas secundárias ao metabolismo bacteriano e fa-
define o diagnóstico de empiema 3 .Constitui rotina, no gocitose dos leucócitos (derrame prapneumônico
entanto, o encaminhamento deste material para aná- complicado) até a evidência de coleções francamente
lise bacterioscópica e bacteriológica, cultura para ger- purulentas (empiema parapneumônico), cabe ao mé-
mes aeróbios e anaeróbicos e antibiograma. O aspecto dico decidir sobre o momento evolutivo da doença, a
amarelo citrino, algumas vezes evidenciado à toraco- necessidade de intervenção e o método adequado para
centese, por outro lado, estabelece uma questão pecu- cada situação. Errar nestas decisões acarretará cronici-
liar ao diagnóstico do empiema pleural: a ausência do dade do processo, maior tempo de hospitalização, cus-
aspecto turvo ou purulento afasta o diagnóstico de to elevados e aumento da morbimortalidade.
empiema à toracocentese? Lights cunhou o termo der-
rame parapneumônico complicado ao estudar uma
série de pacientes portadores de derrame parapneu- Fases Evolutivas
mônico, com aspecto amarelo citrino, sem a presença
de germes, mas que evoluíam, na sua subtotalidade, No início da década de 1960, a American Thoracic
para as fases mais avançadas da doença com pus e Society publicou a classificação do empiema em três
necessidade de drenagem pleural. fases distintas: aguda, fibrinopurulenta e crônica18.
A grande contribuição do trabalho do autor foi Tal publicação permitiu a identificação das fases
estabelecer critérios bioquímicos que antecipassem, evolutivas e suas características, servindo de base in-
de maneira precoce, a indicação de drenagem dos dispensável para o planejamento terapêutico desta
casos de derrame parapneumônico. pH < 7,00; gli- patologia.
cose < 60 mg/dl; desidrogenase láctica(DHL) > 1.000 Fase aguda (exsudativa) caracterizada por um rá-
UI/L são as características bioquímicas que definem pido acúmulo de líquido, que poderá ser estéril,
os derrames parapneumônicos complicados. O pa- como resposta à reação inflamatória pleural, com
râmetro bioquímico mais sensível nesta situação é o níveis de glicose, desidrogenase láctica (DHL) e pH
pH, que costuma apresentar uma queda mais pre- ainda dentro dos limites da normalidade, a mobili-
coce que a glicose. Níveis de pH entre 7,00 e 7,20, dade pulmonar e da pleura visceral estão preserva-
com glicose e DHL normais, são considerados limí- das. As características da fase exudativa do empiema
trofes para indicação de drenagem pleural, deven- algumas vezes se superpõem ao cssonceito de derra-
do-se avaliar cada caso individualmente. Na opção me pleural parapneumônico não-complicado ou com-
por uma atitude conservadora é recomendada uma plicado da classificação de Lights.

CAPITULO 42 685
Na verdade, é necessário que se enfatizem mar- A fixação do mediastino ou aderência pulmonar
cos conceituais distintos entre o que estabeleceu a Ame- permite a exposição da cavidade pleural à pressão at-
rican Thoracic Society e a classificação de Lights para os mosférica sem que se observe colapso pulmonar à re-
derrames parapneumônicos. O derrame parapneumô- alização de e v e n t u a l d r e n a g e m pleural aberta
nico não-complicado representa uma resposta infla- mediante o insucesso da drenagem fechada.
matória do espaço pleural à presença do processo Não se adotando nenhuma atitude terapêutica,
infeccioso pneumônico e o tratamento com antibióti- em três a quatro semanas evidenciaremos a última fase
cos suficiente para sua resolução. Os derrames para- evolutiva: fase crônica (organização). Líquido pleural
pneumônicos complicados apresentam alterações espesso e francamente purulento. A fibrina é progres-
bioquímicas e líquido amarelo citrino que, agregados sivamente substituída por fibroblastos, o que deter-
a características clínicas e radiológicas, sustentam a in- minará imobilização do pulmão ou "encarceramento
dicação da drenagem pleural. Diferentemente, o pulmonar". O organismo finalmente limita a infecção
empiema (presença de pus no espaço pleural) para- e protege-se da sua disseminação hematogênica.
pneumônico na fase aguda deverá ser tratado com dre-
nagem da cavidade pleural, independentemente de Os sintomas clínicos estarão atenuados, com mí-
achados bioquímicos ou mesmo de bacteriologia. nima repercussão sistêmica e os estudos radiológicos
mostrarão uma cavidade empiemática com limites
O ponto de convergência conceituai entre os pa- definidos por paredes espessas e organizadas, geral-
cientes portadores de derrame parapneumônico com- mente em posição póstero-inferior.
plicado e empiema franco fase aguda reside na
ausência de aderência pulmonar e na indicação tera-
pêutica da drenagem pleural fechada. Relação entre as Fases Evolutivas e Opções
Terapêuticas
Febre alta, prostração e dor torácica de forte inten-
sidade, tipo ventilatório-dependente, são os sintomas Fundamentados nos conhecimentos da fisiologia
clínicos mais freqüentes da fase exsudativa. Radiologi- do espaço pleural e na definição das fases evolutivas
camente, observaremos derrame pleural livre, mais evi- do empiema, estabelece-se uma relação entre as op-
dente no radiograma em decúbito lateral com incidência ções terapêuticas e a fase da doença. Os métodos tera-
horizontal dos raios X, com mínimo espessamento pleu- pêuticos cirúrgicos disponíveis, como toracocentese,
ral. Nos derrames volumosos poderemos observar des- drenagem intercostal, pleuroscopia, drenagem aber-
vio contralateral das estruturas do mediastino. Nesta ta, decorticação, esterilização e toracoplastia, deverão
fase o pulmão expandirá prontamente, uma vez remo- ser indicados para cada fase específica da evolução da
vido o derrame, sendo imediatamente colapsável na doença. A correlação adequada entre os métodos dis-
vigência de pneumotórax aberto ou fechado. poníveis e a fase evolutiva representa o sucesso tera-
pêutico do empiema.
Num período indefinido de tempo, que estará na
dependência da relação entre as forças de defesa do
organismo e a virulência do microrganismo causador
Fase Exsudativa
da infecção, o processo evoluirá para a fase de transição
(fibrinopurulenta), na qual observaremos um líquido Para os empiemas em fase inicial (exsudativa) a
pleural mais turvo, um aumento progressivo dos valo- drenagem fechada é a opção mais adequada, com o
res da DHL e do número de leucócitos, contrapondo- dreno introduzido às cegas no espaço pleural, na
se a uma redução dos níveis de glicose e pH, como maioria das vezes sob anestesia local. A anestesia
resultado do metabolismo bacteriano e fagocitose dos geral tem sido utilizada para crianças portadoras de
leucócitos. Nesta fase é possível a identificação de ger- empiema e para aqueles pacientes adultos com ris-
mes e, caracteristicamente, inicia-se a deposição de uma cos anestésicos aceitáveis, no intuito de agregarmos
rede de fibrina por sobre a pleura visceral e parietal. Há inspeção direta do espaço pleural através de pleu-
a formação de septações ou loculações pleurais e con- roscopia, lavagem da cavidade e drenagem tubular
seqüente imobilização parcial do pulmão. O organis- orientada. A referência anatômica para drena yen
mo está buscando limitar o processo inflamatório, pleural é o 4Q ou 5Q espaço intercostal junto à linM
desencadeado no espaço pleural, a este compartimen- axilar média. O termo drenagem fechada ou drena-
to. Nesta fase, em virtude da deposição de camadas gem simples faz referência à existência de uma co-
sucessivas de fibrina por sobre as superfícies pleurais, luna líquida interposta entre o espaço pleural e o
as mesmas se aderem e se espessam, atingindo, por fim, meio ambiente. Em condições usuais a extremidade
tal consistência que irá impedir a transmissão de varia- do dreno ou a haste do frasco de drenagem não deve
ções de pressão ao mediastino e, conseqüentemente, mergulhar mais do que 2 cm ou 3 cm no líquido,
ao hemitórax oposto. A esta seqüência de eventos de- sob pena de criar uma resistência indevida e inde-
nominamos "fixação do mediastino". sejável ao fluxo das coleções pleurais pelo dreno.

686 CAPITULO 42
Para os casos de derrame pleural parapneumônico não- dárias à tuberculose ou pneumonias necrotizantes
complicado poderemos evacuar o derrame pleural (estafilococos, Gram-negativos) pode comprometer
através da própria toracocentese diagnostica. Este a efetividade do método 19 .
método, no entanto, não deve ser utilizado para os A indicação da drenagem pleural aberta ou pleurosto-
casos de derrame parapneumônico complicado ou mia no empiema pleural na fase de transição é preco-
empiema parapneumônico. nizada desde que os critérios de aderência pulmonar
- "fixação do mediastino"- sejam identificados2". O
método é baseado na drenagem pleural aberta com
Fase Fibrinopurulenta ou de Transição
retalho cutâneo, como proposto por Eloesser, 1935,
A evolução do processo infeccioso, com o surgi- para tratamento do empiema tuberculoso. A ressec-
mento de fibrina e septações pleurais, caracterizará a ção de um ou dois segmentos de costela, no ponto de
segunda fase. A fase fibrinopurulenta, ou de transi- mais declive da cavidade empiemática, com a sutura
ção, é a que abriga o maior número de opções tera- do retalho cutâneo previamente liberado, à pleura pa-
pêuticas. A drenagem fechada com dreno tubular (Fig. rietal, possibilita a drenagem das secreções, lavagem
42.3), utilizada como método isolado, mediante as ca- da cavidade e gradativa reexpansão pulmonar. A pos-
racterísticas deste período evolutivo, tem uma possi- sibilidade de alta hospitalar precoce foi identificada
bilidade razoável de insucesso. Exceção aos casos de como vantagem do método.
urgência (paciente séptico) e indisponibilidade de No final da década de 1940 surgem os primeiros
outros recursos cirúrgicos. trabalhos 8 , mostrando a utilização de substâncias fibri-
nolíticas no tratamento do empiema em fase fibrino-
purulenta. Através do dreno tubular, a substância
(estreptoquinase e uroquinase) é injetada no espaço
pleural. O dreno é mantido clampeado por aproxima-
damente quatro horas e posteriormente aberto para
drenagem das secreções. O procedimento é repetido
diariamente por, em média, dez dias. Chin 21 publicou
um estudo comparando os resultados da drenagem
pleural fechada com a utilização de substâncias fibri-
nolíticas associadas ao método. Observou que não
houve diferença significativa entre os dois grupos de
tratamento no que se referia à melhora do processo
infeccioso, período de hospitalização, necessidade de
outro método cirúrgico e mortalidade. O autor con-
clui que a terapia trombolítica aumenta o volume de
drenagem do empiema, mas não reduz morbidade e
Fig. 42.3 - Drenagem pleural às cegas de empiema multisseptado.
mortalidade.
Seta indicando posição do dreno pleural e persistência das coleções
pleurais (pontilhado).
Pleuroscopia/Videotoracoscopia

Na tentativa de impedir a cronificação do pro- A utilização terapêutica da pleuroscopia encontra


cesso infeccioso e curar o empiema, outras técnicas na fase de transição do empiema uma grande área de
foram propostas para a fase de transição. A decorti- aplicação. O método interpõe-se entre a drenagem pleu-
cação pulmonar precoce, assim chamada para diferen- ral fechada, realizada às cegas, e procedimentos mais
ciá-la da decorticação tradicional, com pleurectomia extensos como a toracotomia e decorticação pulmonar.
parietal, foi introduzida como alternativa para os Está indicada nas fases iniciais do empiema, mais pre-
casos de empiema em fases iniciais que não se re- cisamente na fase de transição ou fibrinopurulenta. O
solvessem com drenagem fechada. Através de tora- método permite adequado controle do processo infec-
cotomia convencional a cavidade pleural é aberta e cioso e reexpansão através da remoção dos coágulos
removido o conteúdo purulento, coágulos de fibri- de fibrina, lise das locuções pleurais, lavagem da cavi-
na e a "casca" que envolve o pulmão, liberando-o e dade e posicionamento dos drenos pleurais sob visão
promovendo a ocupação do espaço pleural. O mé- direta. A realização de duas incisões de aproximada-
todo mostrou-se efetivo no controle do empiema. A mente 1,5 cm, no 4o ou 5o espaço intercostal, permite a
identificação pré-operatória de eventuais lesões pa- introdução do pleuroscópio e de instrumental para
renquimatosas que possam impedir a reexpansão manipulação da cavidade empiemática. Essas mesmas
pulmonar, tais como supurações pulmonares secun- incisões servem de passagem para os drenos pleurais.

CAPITULO 42 687
A vídeotoracoscopia, um dos principais avanços de empiemática pós-pneumonectomia, como propos-
da técnica operatória nos últimos anos, insere-se na to por Clagett, 1963, compõem o restante das alter-
terapêutica do empiema pleural com os mesmos pro- nativas terapêuticas para a fase crônica.
pósitos da pleuroscopia convencional, permitindo, A drenagem aberta representa a alternativa tera-
através de seus recursos de imagem, uma melhor vi-
pêutica inicial, visto ser um procedimento de mínima
sualização do campo operatório. Um estudo compa-
morbidade e mortalidade, e apresentar reduzido pe-
rativo entre videotoracoscopia e toracotomia para
ríodo de hospitalização destes pacientes. Também, por
tratamento do empiema multiloculado em adultos
não mostrou vantagens àa erraigia Viàeoassistiàa em estas características, é indicada para pacientes em con-
termos de resolução do processo infeccioso. No en- dições clínicas que contra-indiquem a toracotomia con-
tanto, no que se referiu a tempo de hospitalização, vencional com decorticação pulmonar.
conforto do paciente e retorno às atividades laborais, A associação de fisioterapia respiratória intensiva
mostrou-se um método mais eficiente 22 . As séries acelera o processo de recuperação da expansibilidade
publicadas apontam para a possibilidade do método pulmonar.
ser utilizado como primeira opção para o tratamento
do empiema, visto ser de fácil execução, relativamente Para os casos de insucesso da pleurostomia, avali-
atraumático, não excluir a possibilidade de outros ados os riscos operatórios e assegurada a existência
métodos cirúrgicos e possível de ser utilizado em pa- de parênquima pulmonar potencialmente expansível
cientes gravemente enfermos que não tolerariam pro- que permita a total ocupação do espaço pleural, indi-
cedimentos de maior porte. Ferguson 23 , no primeiro ca-se a decorticação pulmonar.
Simpósio Internacional de Toracoscopia, expressa sua A indicação de toracoplastias, omentoplastias ou
opinião de que o empiema, na fase fibrinopurulenta,
mioplastias com o intuito de obliteração da cavidade
é mais bem manejado pela lise das loculações e com-
fica restrita aos casos de persistência de espaço pleu-
pleta drenagem do espaço infectado, o que é perfei-
ral residual sem perspectiva de expansão pulmonar.
tamente possível através da pleuroscopia. O método,
segundo este autor, também permite uma adequada (Tabela 42.1)
inspeção do espaço pleural, no sentido de determi-
nar a necessidade ou não de um procedimento adi-
EMPIEMA NA INFÂNCIA
cional. Não está indicado para os casos de empiema
livre (fase exsudativa) e empiemas organizados (fase A incidência de empiema na infância tem decres-
crônica). Do ponto de vista conceituai, o método rea- cido desde a década de 1950, acompanhada de índi-
liza Use das septações ou desbridamento pleural, e não ces muito baixos de mortalidade, 1% a 2% nos últimos
decorticação pulmonar propriamente dita. 30 anos. O surgimento da terapia antimicrobiana, as-
sesso à radiologia torácica competente e o aprimora-
O estudo de 50 pacientes portadores de empiema
mento do conhecimento médico no manuseio das
na fase de transição submetidos à pleuroscopia mos-
doenças contribuíram decisivamente para estes bai-
trou índices de resolução de 90% dos casos. Através
xos índices. Tal decréscimo levou alguns autores a con-
de análise bivariada, foram identificados três fatores
siderarem o empiema na infância como uma rara
prognósticos desfavoráveis ao desfecho — resolução
entidade médica25. No entanto, as doenças que deter-
do empiema fase fibrinopurulenta: presença de ger-
minam imunossupressão, como a síndrome de imu-
mes anaeróbios no líquido pleural, mau estado geral
nodeficência adquirida (AIDS) transmitida pela mãe e
dos pacientes e expansibilidade pulmonar parcial no
as más condições de higiene e nutrição das crianças
pós-operatório imediato(p < 0,001)24.
nos países subdesenvolvidos são elementos que nos
apontam para caminhos diversos desta constatação:
Fase Crônica os desafios preventivos, diagnósticos e terapêuticos do
empiema pleural na infância permanecem absoluta-
A evolução para a fase crônica é resultado de duas mente inseridos em nossa prática diária.
circunstâncias: falha no diagnóstico precoce da do-
ença ou falência dos métodos terapêuticos emprega- O tratamento adequado das pneumonias na in-
dos nas fases iniciais. Felizmente, a incidência de fância - fator preventivo -, as quais constituem o prin-
empiemas parapneumônícos nos estágios mais avan- cipal fator responsável pela inf ecção do espaço pleural,
çados tem decaído substancialmente, o que demons- seguido pela busca diligente das eventuais complica-
tra o avanço na qualificação do trabalho médico. As ções decorrentes destas pneumonias - diagnóstico pre-
opções para o tratamento da fase crônica estarão res- coce do empiema - e escolha do método cirúrgico de
tritas, basicamente, à drenagem aberta, decorticação pul- drenagem pleural adequado às fases evolutivas do
monar e toracoplastia. Alternativas como mioplastias, empiema alicerçam o correto manuseio das coleções
omentoplastias e também a esterilização da cavida- pleurais infecciosas na infância.

688 CAPITULO 42
Bacteriologia racocentese - alicerça o diagnóstico do empiema na
infância. Também nessa faixa etária poderemos ne-
A maioria dos empiemas na infância está relacio- cessitar do auxílio da tomografia computadorizada
nada com processos infecciosos pulmonares. Os ca- ou mesmo da ultra-sonografia para elucidação de
sos de empiema decorrentes de traumatismo torácico, imagens suspeitas, definição da fase evolutiva e ori-
cirurgia mediastino-pulmonar ou disseminação hema- entação sobre o melhor local para toracocentese ou
togênica são raros nesta faixa etária. drenagem pleural.
No período pré-antibiótico, a incidência de empie- A ecografia torácica em crianças poderá ser feita
ma em crianças hospitalizadas era de aproximadamen- sem o auxílio do anestesista, o que imputa ao méto-
te 10%, sendo o pneumococo e o estreptococo os do utilização mais freqüente. A tomografia compu-
principais germes causadores das infecções pleurais. Na tadorizada nesta população de pequenos pacientes
atualidade algumas séries apontam o surgimento do é feita com anestesia geral pela necessidade da imo-
Haemophilus influenzae tipo b como um germe freqüen- bilidade e apnéia inspiratória. Tais recursos são de-
temente identificado. As observações de Hoff, 198926'27, pendentes da experiência do médico radiologista em
resumem o verificado na literatura quanto à incidência retirar das imagens as respostas aos questionamen-
de germes responsáveis pelo empiema parapneumô- tos sobre a presença de septações, grau de encarce-
nico na infância: Streptococcus pneumoniae como o prin- r a m e n t o p u l m o n a r e diferenciação entre lesões
cipal agente causador, seguido por Staphylococcus aureus, parenquimatosas ou pleurais, e utilizados conforme
Streptococcus piogenes, anaeróbios e Haemophilus influen- a disponibilidade de cada serviço.
zae tipo b. Nas crianças com menos de 2 anos é necessá-
rio que se considere o envolvimento do estafilococo Tratando-se de derrame parapneumônico, três si-
como o principal germe responsável. O tratamento an- tuações podem ser evidenciadas à toracocentese: lí-
timicrobiano das pneumonias em crianças, face à difi- quido amarelo citrino, líquido purulento e líquido
culdade para coleta de material das vias aéreas, é muitas levemente turvo ou opalescente. Exceção à evidência
vezes desacompanhado de exames culturais ou bacteri- de pus franco, os demais serão submetidos à análise
oscópicos que possam inferir sobre o germe responsável bioquímica na busca da distinção entre derrames pa-
pela infecção respiratória. Em conseqüência ao uso pré- rapneumônicos complicados ou não, com base nos cri-
vio de antibióticos, poderemos observar altos índices térios de Light, 19813.
0% a 85%) de culturas negativas do líquido pleural. Glicose < 40 mg/dL; pH < 7,2 e DHL > 1000UI/L
caracterizam os derrames parapneumônicos compli-
cados e indicam drenagem precoce das coleções.
Diagnóstico
Algumas características evolutivas dos empie-
Semelhante ao empiema do adulto, a tríade diag- mas podem permitir a correlação entre os achados
nostica - suspeita clínica-método de imagem e to- de imagem ou da toracocentese e o germe respon-

CAPIJULO 42 689
sável pela infecção. Empiema por germes anaeróbi- nagem pleural fechada e antibioticoterapia, como ati-
os costuma apresentar fetidez, espessamento pleu- tude inicial. O comprometimento severo implicará em
ral exuberante e loculações precoces. As infecções atitude terapêutica mais agressiva: minitoracotomia,
por estafilococos costumam ser livres, sem septações pleuroscopia ou decorticação pulmonar.
e algumas vezes associadas a pneumatoceles 28 . Os Crianças portadoras de empiema pleural, ao rea-
derrames parapneumônicos secundários à pneumo- lizarem drenagem das coleções, o fazem, na subto-
nia pneumocócica, quando não purulentos e sem talidade dos casos, sob efeito da anestesia geral. A
critérios bioquímicos indicativos de drenagem de- possibilidade de agregarmos à drenagem simples ou-
corrente do alto teor protéico e também da grande tros métodos, tais como minitoracotomia com desbri-
quantidade de fibrina, podem apresentar-se na for- damento pleural ou mais efetivamente a toracoscopia
ma gel. A tentativa de remoção destas coleções pleu- que permita a visualização de toda a cavidade pleu-
rais é frustrada pela impossibilidade de escoamento ral, mesmo que isto represente aumento do tempo
das mesmas através do dreno pleural. A inapropria- anestésico, deve ser fortemente considerada. Abrir
da permanência destes drenos, freqüentemente, mão desta estratégia pode representar demora na re-
leva à contaminação secundária do espaço pleural 19 . solução do empiema, aumento nos dias de internação
e custos, necessidade de nova intervenção e cronifica-
ção do empiema 24 (Fig. 42.5).
Estratégia Terapêutica
A estratégia terapêutica para o empiema na infân-
cia, assim como no adulto, estará orientada por qua-
tro variáveis: estágio da doença, tipo de bactéria que Parâmetros
ocasionou o processo infeccioso, resposta à terapêuti- 1. pH < 7,2
ca inicial e grau de encarceramento pulmonar 29 2. Glicose < 40 mg/dl
3. Escoliose
As opções de tratamento do empiema variam des-
4. Encarceramento pulmonar
de o uso adequado de antibióticos e toracocentese, con- 5. Infecção por anaeróbio ou aeróbios Gram-negativos
siderados métodos conservadores, até técnicas
operatórias mais agressivas como a pleuroscopia ou
toracotomia com decorticação pulmonar. A decisão Antibioticoterapia
sobre qual o melhor método terapêutico a ser adota- Leve: nenhum parâmetro adequada e
vigilância clínica
do passará, necessariamente, pela análise criteriosa das
variáveis mencionadas. O escore de severidade do
empiema (ESE) proposto por Hoff, 1989 (Fig. 42.4), Moderado: pelo menos um Drenagem fechada/
mostrou-se um parâmetro útil e aplicável na prática parâmetro antibióticos
diária para a decisão entre uma atitude conservadora
ou agressiva no manuseio das infecções pleurais na Pleuroscopia/
infância. Analisando critérios bioquímicos e bacterio- Severo: dois ou mais parâmetros
toracotomia mínima/
lógicos do líquido pleural e também achados radioló- decorticação pulmonar
gicos, este autor estabeleceu três graus de intensidade
do comprometimento pleural: leve, moderado e severo.
Fig. 4 2 . 4 - Escore de severidade do derrame parapneumônico na
Critérios bioquímicos: pH < 7,2; glicose < 40 mg/ infância (Hoff, 1989).
dL; bacteriológicos: identificação de bactérias Gram-ne-
gativas e anaeróbios; radiológicos: escoliose moderada
ou severa; sinais de encarceramento pulmonar. Empiema Pós-operatório
O acometimento pleural será considerado leve Vários fatores estão relacionados com a infec-
quando nenhum destes parâmetros for identificado; ção do espaço pleural após cirurgias torácicas (ex.:
moderado quando identificarmos pelo menos um dos ressecções pulmonares, esofágicas, mediastinais).
parâmetros; e severo quando dois ou mais destes parâ- Dentre estes, a presença de fístula broncopleural,
metros estiverem presentes. Os pacientes com leve com- corpo estranho no espaço pleural, espaço residual
prometimento pleural serão tratados com antibióticos e pós-ressecção, ou mesmo retirada precoce e inade-
mantidos sob vigilância clínica. Piora do quadro clíni- quada dos drenos pleurais. Responsáveis por apro-
co, caracterizada por retorno do estado febril após me- ximadamente 20% de todos os casos de empiema,
lhora inicial, prostração, leucocitose persistente e as infecções do espaço pós-operatórias são mais fre-
aumento do derrame ao radiograma de tórax, é sinal qüentes em pacientes submetidos a pneumonecto-
indicativo de atitude intervencionista: drenagem pleu- mia (2% a 12%) e ocorrem em 1% a 3% daqueles
ral. Moderado comprometimento será tratado com dre- que se submetem à lobectomia 30 .

690 CAPITULO 42
Fig. 42.5 — Algoritmo, manuseio diagnóstico e terapêutico do empiema pleural parapneumônico.

O diagnóstico geralmente é estabelecido no pós- estará assentado na tríade clínico-radiológico-toraco-


operatório recente, primeiros 30 dias, ou apresenta-se centese. A observação de líquido purulento pelos dre-
muitos meses ou anos após a ressecção. Nos casos de nos pleurais no pós-operatório por si só indica o
empiema secundário à lobectomia, o principal fator diagnóstico. Nos pacientes submetidos a pneumonec-
responsável é a não-ocupação do espaço pleural pelo tomia, os sinais de expectoração piossanguinolenta, di-
pulmão remanescente, propiciando cenário ideal minuição do nível hidroaéreo ao radiograma de tórax
para o desenvolvimento do processo infeccioso. Nos pós-operatório e/ou surgimento de outros níveis de-
casos de pneumonectomia, a cavidade residual ine- terminam atitudes diagnosticas e terapêuticas diligen-
rente ao tipo de ressecção e a existência de fístula do tes, face ao risco potencial de empiema associado à
coto brônquico se somam para determinar a elevada fístula do coto brônquico.
incidência de empiema nestes pacientes. Estabelecido o diagnóstico através da toracocen-
Negar a presença de infecção pleural no pós-ope- tese, como em todos os casos de empiema, é necessá-
ratório estabelece o primeiro passo para a inadequa- rio que se efetue a drenagem das coleções.
da resolução do empiema e possivelmente representa
um importante fator a contribuir para maiores índices Empiema Pós-pneumonectomia
de morbidade e mortalidade nesta população de pa-
cientes. Todo e qualquer sintoma de infecção neste pe- A ocorrência de empiema pós-pneumonectomia está
ríodo deverá ser considerado como fator de alerta para associado a índices de mortalidade que variam de 28% a
eventual contaminação da cavidade pleural. Febrícu- 50%31. Fatores predisponentes incluem radioterapia pré-
la, dor torácica, inapetência e hemograma infeccioso operatória, ressecção de doença inflamatória, coto brôn-
determinam a busca incessante do diagnóstico, que quico longo, contaminação transoperatória do espaço

CAPITULO 42 691
pleural, desvascularização excessiva do coto brônquico verá ser encaminhado imediatamente ao bloco cirúr-
durante a linfadenectomia mediastinal e presença de gico para reintervenção. A ressutura do coto brônquico
bacilo álcool-ácido - resistente no exame de escarro. deverá ser precedida de desbridamento e revitalização
Não há dúvida de que a prevenção é fator determi- das margens brônquicas, reamputação nos casos de coto
nante da evolução destes pacientes para a contamina- longo residual e fechamento com fios inabsorvíveis. A
ção do espaço pleural. Durante a pneumonectomia todo cobertura do coto ressuturado com tecido vasculariza-
o cuidado deve ser empregado no manuseio do coto do, preferentemente através da transposição de mús-
brônquico. Dissecção cuidadosa dos tecidos peribrôn- culos da parede torácica, como o grande dorsal e o
quicos para evitar desvascularização e a amputação jun- serrátil anterior, completará o procedimento.
to à carina traqueal são detalhes técnicos absolutamente
Felizmente esta situação de emergência quanto à
imprescindíveis nesta situação. Não há nenhuma evi-
fístula broncopleural é pouco freqüente. Na maioria
dência de que as broncorrafias realizadas manualmen-
das vezes teremos empiemas diagnosticados após a
te ou através de grampeadores apresentem maior ou
menor incidência de fístulas 32 . No entanto, é recomen- 1- semana de pós-operatório, com fístulas de menor
dável, em ambas as opções de fechamento do brônquio, calibre ou mesmo sem evidência de trajeto fistuloso,
a cobertura do coto com tecido vascularizado (ex.: gor- que poderão ser tratados com planejamento adequa-
dura pericárdica, músculo intercostal), principalmente do e razoável índice de sucesso. A completa drena-
nos casos em que identificamos os fatores predisponen- gem das coleções purulentas num primeiro momento
tes à deiscência e fístula broncopleural já citados. e a ocupação do espaço pleural, numa segunda fase,
são objetivos terapêuticos inerentes a esta situação.
Eventual contaminação da cavidade pleural du-
rante a ressecção aumenta sobremaneira o risco de A conduta frente ao empiema pós-pneumonecto-
empiema no pós-operatório. Nestes casos, a exaus- mia, no entanto, terá propostas diferentes mediante a
tiva lavagem da cavidade e instituição de irrigação presença ou não de fístula broncopleural.
pleural contínua no pós-operatório, através da in- Na fase aguda da evolução do processo infeccioso
serção de intracath ou mesmo abocath junto ao 3- es- — até a 1- semana de pós-operatório — e na ausência
paço, linha axilar média, acoplado a frasco com
de fístula broncopleural, a drenagem pleural fechada de-
solução salina isotônica correndo a uma taxa de 100
verá ser instituída e mantida até que ocorra a estabili-
mL/h, representam atitudes preventivas efetivas 33 .
dade do mediastino, ao final de duas semanas,
A drenagem pleural balanceada com frasco coletar
é indicada para estes pacientes 34 . Confirmado o di- aproximadamente. Nesta fase, conseqüentemente está
agnóstico de empiema, duas atitudes são impres- contra-indicada a drenagem pleural aberta (pleuros-
cindíveis: d r e n a g e m da coleção p u r u l e n t a e tomia). A coleta de amostras para cultura e antibio-
verificação da integridade do coto brônquico atra- grama é imprescindível e orientará o uso de
vés da broncoscopia. antibióticos sistêmicos e locais. O paciente deverá ser
mantido com irrigação contínua, utilizando solução
O diagnóstico de empiema pós-pneumonectomia salina isotônica na forma anteriormente mencionada.
associado à fístula broncopleural é observado em 40% A possibilidade de irrigação com Povidine® diluído ou
dos casos, e somente 20% destas fístulas irão fechar mesmo solução de Dakin pode ser considerada com a
espontaneamente 31
intenção de promover maior espessamento pleural.
Situação caracterizada por emergência médica e
que está associada a potencial contaminação do espa- Controlada a sepse pleural, transforma-se a dre-
ço pleural é a identificação, no pós-operatório recen- nagem fechada em drenagem aberta, seguida de la-
te, 1- semana, de fístulas brônquicas de maior extensão v a g e m diária da c a v i d a d e com solução salina
ou mesmo deiscência total do coto brônquico, freqüen- isotônica. A associação de lavagem da cavidade com
temente associadas a falhas na técnica operatória. O solução de Dakin pode promover, além da esteriliza-
manejo desta situação deve-se iniciar pelo posiciona- ção do processo infeccioso, um exuberante espessa-
mento do paciente em decúbito lateral, sobre o lado mento pleural, diminuindo o volume da cavidade e
da pneumonectomia, até que se realize adequada dre- facilitando a obliteração do espaço quando do iecha-
nagem do espaço pleural. Esta medida evitará a catas- mento através do método de Clagett 35 (preenchimen-
trófica aspiração do conteúdo pleural para o pulmão to do espaço pleural com solução de antibiótico). 0
remanescente contralateral e possível morte por asfi- fechamento definitivo da cavidade deve ser precedi-
xia. Nas grandes fístulas, que invariavelmente indicam do de rigorosa inspeção direta através de pleurosco-
a necessidade de ventilação mecânica, está indicada a pia ou m e s m o fibrobroncoscopia na busca de
intubação seletiva, através de tubo simples orientado eventuais loculações ou mesmo tecidos desvitaliza-
para o pulmão remanescente pela fibrobroncoscopia dos residuais. Amostras bacterioscópicas devem ser
ou através do tubo de Carlens. Após estas medidas obtidas para que se ateste a esterilidade da cavidade.
iniciais e obtida a estabilidade clínica, o paciente de- A evidência de um tecido de granulação que se es-

692 CAPITULO 42
tende por toda a cavidade e uma nova inspeção do tido com drenagem aberta até que se observe a cica-
coto brônquico confirmando a ausência de fístula trização do coto brônquico e esterilização da cavida-
antecipam o sucesso do método com índices de até de, o que deve ocorrer após seis semanas ou até 90
80%36. Miller Jr.30 propõe a modificação do clássico dias de lavagens diárias. Obtidos estes resultados, in-
método de Clagett e Geraci através da manutenção dica-se a obliteração através do método de Clagett.
do dreno pleural e irrigação contínua da cavidade A possibilidade de tratamento da fístula bronco-
com 500 mL de solução de glicose a 5% e 2 g de cefa- pleural pós-pneumonectomia em apenas um estágio,
losporina, correndo a uma taxa de 50 mL/h. Após através da transposição de músculos da parede toráci-
duas semanas de irrigação contínua, durante três dias ca com fechamento da fístula e obliteração do espaço,
consecutivos são coletadas amostras bacterioscópicas com o próprio tecido muscular, poderá ser obtida nos
do líquido de drenagem. A ausência de germes no casos em que as dimensões da cavidade possam ser to-
material examinado sustenta a retirada do dreno talmente ocupadas pelo músculo transposto.
pleural. Esta proposta, na experiência do autor, al-
Bastante utilizada durante a cirurgia para trata-
cançou índices de sucesso em 50% dos casos.
mento da tuberculose, a toracoplastia com fratura da
Na presença de fístula broncopleural de pequeno parede torácica e sutura das partes moles ao mediasti-
calibre (< 5 mm), na fase aguda, sem que o paciente no, no sentido de promover obliteração do espaço re-
apresente insuficiência respiratória, o tratamento ini- sidual infectado pós-pneumonectomia, é raramente
cial também recai sobre a drenagem pleural fechada. utilizada nos dias atuais.
O dreno deverá ser mantido em associação à irriga-
ção contínua, como mencionado anteriormente, até
que se obtenha a estabilidade do mediastino. A di- Empiema Pós-lobectomia
minuição da pressão intrapleural pós-drenagem A ocorrência de empiema pós-lobectomia ou seg-
previne a aspiração de conteúdo para o pulmão con- mentectomia relaciona-se, principalmente, ao espaço
tralateral e aumenta a chance de fechamento espon- residual que possa permanecer após retirada parcial
tâneo das pequenas fístulas (< 2 mm). Passado um do pulmão, acrescido de eventual persistência de fuga
período aproximado de duas semanas, a drenagem aérea pelos drenos, o que na maioria dos casos indica
fechada é convertida em drenagem aberta e o ritual trajeto fistuloso broncopleural. A fístula broncopleu-
de lavagem da cavidade instituído, obedecendo o cui- ral pode variar de pequenos escapes de ar pela super-
dado de realizar este procedimento com o paciente fície cruenta do pulmão remanescente, as quais, na
sentado. O fechamento espontâneo de pequenas fís- maioria dos casos, cessam espontaneamente, até fís-
tulas poderá ser identificado através de broncoscopia tula do coto brônquico amputado, o que poderá exi-
ou pleuroscopia com injeção de líquido na cavidade e gir atitude intervencionista para seu fechamento.
observação de eventuais bolhas de ar junto ao coto Diferentemente do que se observa nos casos de
brônquico. empiema pós-pneumonectomia, o objetivo terapêuti-
Estabelecidos os critérios de ausência de fístula co da infecção do espaço pleural secundária a ressec-
broncopleural e esterilização da cavidade, indica-se o ções parciais é obliterar o espaço pleural através do
fechamento da cavidade residual através do método pulmão remanescente. Desta forma, os métodos tera-
pêuticos empregados estarão diretamente relaciona-
de Glagett.
dos ao momento do diagnóstico e às condições do
Na persistência de fístula broncopleural, o manu- pulmão remanescente em ocupar a cavidade residual.
seio passa por dois estágios consecutivos. Num pri-
Tomografia computadorizada de tórax ou mesmo
meiro momento é buscado o fechamento da fístula
a ecografia torácica são exames de grande auxílio na
através de nova toracotomia, identificação do coto
definição da melhor estratégia terapêutica. As infor-
brônquico, desbridamento das margens brônquicas,
mações acerca das condições estruturais do pulmão
o qual deve ser extremamente cuidadoso pelo risco
para ocupar a cavidade e identificação de múltiplas
de lesão do coto da artéria pulmonar e também do
loculações obtidas através destes métodos de imagem,
esôfago. A orientação técnica nesta situação é manter
orientam sobre o melhor método a ser empregado.
a dissecção mediastinal especificamente ao coto brôn-
quico. Após o desbridamento o coto é ressuturado e Na fase aguda, caracterizada pelas primeiras duas
recoberto por tecido vascularizado (músculos da pa- semanas pós-ressecção, quando o pulmão remanes-
rede torácica ou o grande epíploo). cente ainda não aderiu à parede torácica, o que de-
terminará estabilidade do mediastino, o método de
A abordagem transesternal e transpericárdica para drenagem preferido é a drenagem fechada. A possi-
coto brônquico longo residual representa uma alter- bilidade de acrescentarmos um procedimento que
nativa para o insucesso do manejo inicial através da possibilite desbridamento dos coágulos de fibrina,
toracotomia convencional 37 . O espaço pleural é man- desfazendo as septações pleurais sob visão direta,

CAPITULO 42 693
lavagem da cavidade e drenagem tubular orientada, presença de pus à toracocentese contra-indica a reali-
sustenta a indicação de pleuroscopia (videoassistida zação de biópsia pleural 38 .
ou direta) para esta situação. Ainda nesta fase a rein- A drenagem fechada deverá ser instituída de ime-
tervenção com decorticação pulmonar precoce pode diato com o intuito de evacuar as coleções purulentas e
ser considerada. restabelecer a pressão negativa do espaço pleural. Num
A drenagem pleural aberta está indicada para os segundo momento é necessário que se responda a al-
casos de empiema diagnosticados após a segunda se- gumas questões para que se alcance sucesso terapêuti-
mana de evolução pós-operatória. co39. O pulmão expandiu após a drenagem inicial? 0
paciente já foi submetido à ressecção pulmonar previa-
Assim com nos casos de empiema pós-pneumo-
mente? O pulmão apresenta lesões residuais como re-
nectomia, o diagnóstico de fístula brônquica deverá
trações fibróticas, cavidades, bronquiectasias que
ser excluído através de exame broncoscópico. poderiam comprometer sua expansão no caso de indi-
A fístula brônquica pós-lobectomia será manusea- carmos decorticação pulmonar? O paciente apresenta
da da mesma forma indicada nos casos de empiema tuberculose multirresistente? Há concomitância de he-
pós-pneumonectomia. Fístulas precoces estão rela- moptise com risco de vida?
cionadas a erros técnicos e devem ser reoperadas de
imediato; as pequenas fístulas poderão fechar esponta- Para os casos de expansão pulmonar total pós-dre-
neamente com a adequada drenagem da cavidade, e nagem, este costuma ser o tratamento definitivo em
para os casos de fístulas persistente estará indicado seu associação ao uso de tuberculostáticos. Pacientes sem
desbridamento, ressutura e cobertura do coto com teci- evidência de lesão parenquimatosa e que não expan-
diram o pulmão após drenagem inicial serão subme-
do vascularizado, preferentemente os músculos da pa-
tidos à decorticação pulmonar. A toracoplastia
rede torácica. Espaço pleurais residuais de menor
representa uma alternativa utilizada com relativa fre-
dimensão são observados nos empiemas pós-lobecto-
qüência para os casos em que observamos lesões
mias, favorecendo a obliteração destes espaços pela
pulmonares que antecipem a não expansibilidade
transposição de músculos (mioplastia) ou omento
do pulmão. A verificação da não-expansibilidade
(omentoplastia). A indicação de toracoplastia é rara. pulmonar poderá ser obtida em dois momentos: no
pré-operatório, usualmente através da tomografia
computadorizada de tórax, ou durante a decorticação
EMPIEMA TUBERCULOSO
pulmonar, ao depararmo-nos com um pulmão não-
O aumento na incidência de casos da síndrome expansível às manobras de pressão positiva na via aé-
da imunodeficiência adquirida e o descaso das autori- rea impostas pelo médico anestesista. Para esta
situação, as alternativas estarão relacionadas à drena-
dades com a saúde pública determinaram uma trági-
gem aberta ou à toracoplastia.
ca elevação nos casos de tuberculose em nosso país.
Neste sentido, o entendimento da fisiopatogenia Nos pacientes em mau estado geral deveremos
e da terapêutica do empiema pleural tuberculoso faz- considerar a realização de drenagem pleural aberta
se necessário. A contaminação da pleura ocorre atra- como método de escolha.
vés da ruptura de uma lesão tuberculosa ricamente A ressecção pulmonar de pacientes portadores de
habitada por bacilos, geralmente uma caverna tuber- tuberculose multirresistente é objeto de outro capítu-
culosa, para o espaço pleural. lo deste livro.
Embora alguns casos de empiema tuberculoso pos-
sam ser assintomáticos e manifestarem-se através de
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