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Isto é, não pode mais ser. No ambiente cultural relativo ao recorte histórico que
se convencionou nomear de contemporâneo - sem pretender adentrar nas questões que
envolveriam a substância deste termo, e diante da atual proliferação de imagens
oriundas de uma gama ainda mais diversificada de meios expressivos intercambiados -
tornou-se muito difícil discernir, no âmbito de toda produção visual que ocorre sob a
égide da atividade artística, o que seria arte. Tal fato se constata frente à perda de
alcance dos paradigmas modernos nos dias de hoje. Abordar as principais circunstâncias
que nos levaram a esta condição, trata-se da objetivação que poderemos observar no
andamento das argumentações que tentam sustentar a afirmação inicial deste texto,
agora lido como: “isto é arte, hoje não pode mais ser”.
x + y – z + h – q = 0
2x - y + 3z – h + 2q = 0
Matriz de 4 linhas por 6 colunas com 5 incógnitas
-x + 2y + z + 2h - 2q = 0
-2x - 4y - 2z - 2h + q = 0
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“Cogito, Ergo Sum” era a palavra de ordem de Descartes: “ Penso, logo existo”, (ênfase
minha). Desde então, esta concepção do sujeito racional, pensante e consciente, situado no
centro do conhecimento, tem sido conhecido como o “sujeito cartesiano”. HALL, Stuart. A
identidade Cultural na Pós-modernidade. Rio de Janeiro, DP&A Editora. 1998. Pg. 27
Este fundamento matemático, lógico e exato, indicava uma possibilidade
imaginativa mas não um fato disponível ao desdobramento cotidiano, posto que tais
cálculos, entre o final do século XIX e o início do século XX, só eram possíveis pela
aplicação das então conhecidas réguas de cálculo, de uso sabidamente moroso. Neste
sentido, Carl Marx viu suficiência nesta iminente “possibilidade” para conjecturar uma
proposição econômica, social e cultural, que vislumbrava, em tese, reduzir as aflições
humanas pelo uso exclusivo da razão como parâmetro regulador e criador da sua
ideologia.
O fato que se constatou a seguir foi que as infinitas variáveis que o universo
natural e humano pode suscitar escapam do alcance reducionista que esta equação, até
então “simplista”, oferece. Neste sentido, o marxismo como ideologia de referência das
nações socialistas e, até certo ponto, paradigma modernista, ruiu junto com o muro de
Berlim em 9 de novembro de 1989, em decorrência da sua incapacidade em prever, e
corresponder, toda diversidade de fatos e variáveis que as relações sócio-econômicas
podem produzir.
2
O nascimento do “indivíduo soberano”, entre o humanismo renascentista do século XVI e o iluminismo
do século XVIII. HALL, Stuart. A identidade Cultural na Pós-modernidade. Rio de Janeiro, DP&A
Editora. 1998. Pg. 25
Reflexos do reducionismo marxista rumo à internalidade da arte.
Um dos principais teóricos da arte moderna, Clement Greenberg, não nos deixa
escapar uma possibilidade de relação analógica, quando consideramos que sua noção de
arte orienta-se para uma “internalização” reducionista3 que encerra por refletir
diretamente sua ligação com a ideologia marxista. Ao reduzir sua noção de pintura às
suas realidades de materiais, de cor e de suporte, assim como também às tensões entre
os campos de cor, Greenberg estabelece uma compreensão de arte que tem seu
fundamento lançado falando-se de pintura, mas que alcança outros meios expressivos
com a mesma profundidade. A pintura, assim como toda a dita arte moderna, em termos
gerais, se volta para sua internalidade, ou seja, cada meio expressivo se concentra no
esforço de reconhecimento e delimitação das suas questões fundamentais. Campos
gramaticais construídos terminam por estabelecer as demarcações territoriais de cada
linguagem específica. Neste contexto, a pintura, a escultura, o desenho e outros meios,
rompem com a função representacional da imagem artística inaugurada entre a
antiguidade e o renascimento. A partir desta compreensão - vista aqui como uma
ruptura com a representação, seguida de um compromisso progressivamente maior com
a apresentação das realidades interiores de cada linguagem - tal posicionamento acaba
se impondo, mais tarde, como o principal paradigma moderno. Os meios expressivos,
reduzidos à essência de seus campos de conhecimento, desligam-se paulatinamente do
mundo até então visto como pulsão inicial e indicial das imagens artísticas.
Ao romper o seu laço com a realidade, com o mundo e com todas as suas
possíveis contaminações literárias - a simbologia, a narrativa – e, consequentemente,
com o caráter alegórico das imagens artísticas, os meios expressivos da arte moderna
são reduzidos às suas ossaturas irredutíveis. Para a arte moderna, em sua relação
verticalizadora, centrada em seus paradigmas, nada resta senão um comportamento
voltado exclusivamente para si. Deste modo, por esta compreensão, podemos definir o
termo que nomeamos de internalidade.
3
A arte moderna se caracteriza por uma atitude reflexiva e autocrítica que tende a afastar do
seu âmbito tudo aquilo que não lhe diga respeito exclusivamente. _ Greenberg, Clement. Arte e
Cultura - Ensaios Críticos. São Paulo. Editora Ática, 1996. Pg. 10
Considerando a verticalidade da ideologia marxista - no que diz respeito às
relações entre as bases (o povo) e sua cúpula decisória (os teóricos da revolução) -
podemos afirmar que, no que tange à arte moderna e seus paradigmas, a recíproca é
verdadeira pois seus fundamentos teóricos delimitam, clara e verticalmente, o que é e o
que não seria arte. Deste modo fica possível dizer precisamente o que é arte, desde que a
imagem submetida ao juízo dos especialistas atenda à redução de um modelo ideológico
previamente estabelecido.
4
Entrar nos sistemas deste trabalhos (minimalistas) é precisamente entrar num mundo sem
centro, um mundo sem substituições em parte alguma legitimado pelas revelações de um tema
transcendental. Esta é a força desses trabalhos, sua seriedade e sua afirmação de
modernidade. _ Batchelor, David. Movimentos da arte moderna - Minimalismo. S‹o Paulo.
Cosac & Naify Edi•›es. 1999. pg.70
Serializar, para os minimalistas, trata-se de um procedimento advindo
diretamente do construtivismo que, neste momento, pretende indicar uma ênfase, onde a
expressão da unidade modular, à medida que este gesto vai se repetindo, cede parte de
sua expressão para um sistema visual que também vai se impondo na mesma proporção.
A conhecida “ênfase minimalista” equivale, então, a realizar uma serialização de
unidades modulares, a organizar um jogo onde a expressão da unidade se reduz a
medida que um sistema visual mais abrangente surge. Serializar significaria reduzir uma
configuração visual ao seu grau expressivo mínimo. Esta ênfase, um sussurro,
objetivaria uma leitura da imagem orientada para a visibilidade dos seus fundamentos
irredutíveis.
O nonsite, além de permitir uma relação com o sistema de arte, faz uso declarado
de mídias “representacionais” tais como fotografia e cartas gráficas. O retorno do uso de
um meio expressivo que prima pela exatidão representacional contradiz e escapa a uma
questão que define, em termos, a arte moderna e sua conhecida internalidade. O uso da
fotografia por Smithson, além de contrariar um dos paradigmas de Greenberg no que diz
respeito à representação, com sua relação indicial, implícita na gramática da linguagem
fotográfica, reconstrói a ponte rompida entre a arte moderna e a realidade do mundo
com todas as suas vicissitudes.
5
Seu conceito dialético entre o site (a fonte do material ou o lugar de uma alteração física da
terra) e o nonsite (seu paralelo, ou representação na galeria). T/A_ Shapiro, Gary. Earthwards -
Robert Smithson and Art After Babel. University of California Press, 1995. pg. 02
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As velhas identidades, que por tanto tempo estabilizaram o mundo social, estão em declínio,
fazendo surgir novas identidades e fragmentando o individuo moderno, até aqui visto como um
sujeito unificado. - HALL, Stuart. A identidade Cultural na Pós-modernidade. Rio de Janeiro,
DP&A Editora. 1998. Pg. 07
Sobre o descentramento quântico.
Lembremos o modelo
atômico de Rutherford Bohr.
Os elétrons ocupam posições
definidas nas respectivas
eletrosferas e no centro se
posicionam, pontualmente, os
prótons e nêutrons no núcleo.
Este modelo atômico, relativo à
concepção da física moderna,
faz uso de afirmações pontuais:
aqui está o elétron, ali está o
núcleo. Este modelo exprime,
graficamente, uma redução que repercute, em si, uma também redução conceitual sobre
a constituição da matéria. Esta forma de abordagem e conceituação simplificada
dominou a ciência moderna e se fundamenta em afirmações e reduções tais como: isto
é, aqui está. Rutherford, do mesmo modo que Greenberg, faz uso de proposições
afirmativas e modelos conceituais reduzidos para definir o que é a matéria e a arte.
Por analogia, poderíamos dizer que “a arte deixa de ser isto”, à medida que os
paradigmas modernizantes perdem o seu alcance com a realidade da produção artística
da atualidade, passando à noção de que poderia, em tese, lidar com diversas e
simultâneas possibilidades de arte. Estas diversificações das possibilidades da arte têm
seu ponto de partida desde a superação dos conceitos de arte moderna nos anos sessenta.
O descentramento do sujeito pós-moderno tem sua correspondência imediata com a
aposta da mecânica quântica na diversificação das possibilidades. Do mesmo modo que
a ciência, a arte contemporânea, na sua relação análoga7, deixou de fazer uso de
afirmações pontuais e paradigmáticas ao definir o que seria arte para, em seu lugar,
indagar sobre as diversas possibilidades da experiência artística. Neste sentido,
poderíamos dizer que, no contexto contemporâneo, a arte e a ciência se comunicam pelo
viés do descentramento da física de do sujeito moderno.
7
Estes artistas (cinéticos), não menos que os cientistas, fazem modelos do universo. Seus
modelos são propostos intuitivamente, mas não deixam de serem menos válidos que uma
forma de conhecimento. Um fio de especulação cósmica pode ser seguido nos trabalhos de
muitos artistas entre os anos 20 e 80. T/A _ Brett, Guy. Force Fields: Phases of the Kinetic.
Barcelona, MAC.BA. 2000. pg.10
A matemática contemporânea e a dialética.
Figura 2
Advertência.
Para afirmarmos hoje “isto é arte”, só seria possível se pudéssemos nos aproximar
o suficiente da imagem a ser analisada, a tal ponto de detalhamento que, nesta
aproximação, adquiríssemos acuidade suficiente para reconhecer estas minúcias que as
imagens geradas no contexto do contemporâneo exigem.
“Isto é arte” não pode mais ser, se a nossa compreensão sobre a imagem procurar ainda
se sustentar em reduções obtusas, sem a profundidade dos ínfimos detalhes. “Isto é arte”
ainda pode ser, desde que a imagem, sujeita ao discernimento estético, seja vista tão de
perto que tal proximidade nos permita enxergar seus aspectos particulares e contextuais.