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Azul ou vermelho? Vermelho ou azul? Para mim a única diferença entre essas
duas cores está na grafia. Daltonismo de acordo com o “mini Aurélio” é “um
distúrbio visual que consiste na incapacidade de distinguir diferentes frequências
do espectro luminoso”. Na prática eu não conheço as cores azuis ou vermelhas,
no meu cérebro elas se transformam em roxo.
Parar no sinal roxo, comprar uma camisa roxa do cruzeiro, comer uma suculenta
maçã roxa. Como vocês podem ver o daltonismo nunca atrapalhou o meu dia a
dia, eu estava acostumado com meu modo de enxergar o mundo, mas na vida
tudo tem uma primeira vez.
Faltava uma semana para as novas eleições, a praça da igreja estava lotada de
espectadores, o último debate estava prestes a acontecer. Eu acabava de voltar
de férias e caia de cabeça, meio perdido, naquele turbilhão político sendo o
responsável por cobrir o debate.
Eu não conhecia os novos candidatos, sabia apenas que eram parentes, primos
de segundo grau, alguma coisa assim… Chamavam-se Cláudio e Carlos.
Tinham quase a mesma idade, eram advogados. Cláudio se candidatava pelo
PCP, partido comunista pontiguacensse, e Carlos era o candidato do PDP,
partido democrata pontiguacensse. Era um embate direto entre a esquerda e a
direta local.
Na internet eu havia visto algumas fotos dos candidatos. Carlos tinha um rosto
oval, olheiras escuras e um nariz fino. Seu primo Cláudio tinha os olhos claros,
um queixo quadrado e o mesmo nariz fino. Os dois candidatos surgiram sob as
vaias e aplausos do público, eu distante do palanque forçava as vistas em vão
ao tentar distingui-los. Inocentemente perguntei a um colega ao meu lado:
“Nosso país está imerso numa crise econômica global, por isso temos que nos
unir e fazer os sacrifícios necessários para que o Brasil volte a crescer.
Precisamos cortar gastos com a administração pública!”
A praça encheu-se de vaias e aplausos. Estava claro para mim que os discursos
eram proferidos por Carlos do PDP e Cláudio do PCP. Mas aproveitei a confusão
para me certificar.
“Caros eleitores, o candidato diz o que vocês querem ouvir, ele foge da verdade
amarga. Precisamos do dólar alto para tornar nossas empresas competitivas.
Temos que dificultar o acesso ao crédito. Antes de voltar a crescer é preciso
parar de produzir e consumir em demasia”.
Seria o Carlos do PDP que falava? “Meu Deus eu devo estar ficando louco”, suas
vozes eram indistinguíveis. Um mal estar tomou conta de mim. Comecei a suar
frio e a tremer.