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cardápio underground

O artista trabalha para conhecer uma verdade que já intui. Essa operação cognitiva
produz a obra. (GUY BRETT)

A edição do cardápio underground de 2017 contou com a residência dos


artistas expositores por cinco dias em conjunto com a curadoria. O estado de
metamorfose do processo criativo foi acompanhado no decorrer do assentamento
do olhar dos artistas sobre o novo, representado pelo espaço a ser ocupado, a
garagem e pelas subjetividades diversas das pessoas da convivência.
A residência manifesta o espaço do tempo. Neste meio emergem relações de
conhecimento e reconhecimento, aprendizagem e principalmente a imersão na
criação. O pensamento está incessantemente no projeto da criação e neste
momento de simultaneidade de processos, o contágio acontece. Imposto de
maneira mais pungente pela limitação do espaço e mais tênue pelo intercâmbio
inevitável provocado pela coexistência. Este dois elementos cristalizaram alguns
traços de semelhança entre os obras apresentadas.
À primeira vista, o espaço parece povoado por imagens de naturezas
extremamente distintas. A semelhança é informe, reside no princípio que norteia a
concepção destes trabalhos e parece apontar para um horizonte comum. As
imagens apresentadas provêm da transgressão da forma, não como negação, mas
como consolidação que renova. Os animais de Matias Picón em Texto, híbridos
desconhecidos pela natureza são representativos desta ideia do mesmo modo que
Distraídos perderemos de Kauê Garcia, com o jogo desigual familiar do ping pong.
As fotografias de Ivi Maiga também envolvem esta reflexão ao contar com
procedimentos de deslocamento visual para dar origem a um novo desenho
constituído de recortes de paisagem, de justaposições de fotografias. Ao lado, o
trabalho de Tre Laracampos igualmente busca a gênese de uma composição que
tem como substrato a materialidade do acaso e da especificidade do local
encarnadas na coleta de elementos e de mesma importância, a estrutura vertical
provinda estatuária reatualizada, interseccionada por camadas horizontais e não
figurativa, protagonizando os canos enferrujados e troncos e galhos de árvores da
vizinhança. Por final vemos o trabalho de Guilherme Pinkalsky que traz a tensão
entre a forma e sua transgressão com o apagamento das imagens comerciais das
revistas e insurgência de novas formas, que não negam de todo sua origem, por
vezes revelando a procedência do material.
O projeto gráfico de Daniel Lima na entrada do espaço expositivo procura
introduzir o observador através do diálogo com a fotografia de Ivi Maiga. Através do
redesenho das formas fotografadas, do mesmo modo é análogo aos procedimentos
aqui observados nas obras.
O diálogo entre a forma e a transgressão tal como visto nos trabalhos dos
artistas parece um meio de concretizar as verdades por eles intuídas ou mesmo
representa uma verdade de certa maneira por todos intuída, trazida à vida através
da obra.

ÉRICA BURINI
Curadoria
A proposta de idealizar um fio condutor para a pequenina constelação de
trabalhos produzidos durante a residência é o exercício da busca da semelhança.
Em princípio a diferença grita. O processo revelou alguns dos indícios para a
construção da interlocução entre os trabalhos. Semelhança informe de Georges
Didi-Huberman, assim como outras de suas ideias apareceram para clarear o
caminho a ser trilhado e então se fez evidente a relação existente entre os modos
de conceber os trabalhos, pela busca de causas motoras a serem transgredidas.

GUILHERME PINKALSKY
Sem título
Em uma parede é criado um esquema de flutuação de formas que descende
da subversão de imagens de revistas encontradas na cidade. O processo de criação
passa pelo uso da própria tinta do material gráfico, diluída em tíner. Um conjunto
destas composições é posto na parede originando uma nova composição coletiva.
Há o convite à intervenção com as canetas que se dependuram e representam um
elemento importante da estrutura tal como as linhas da madeira que se revela nos
espaços entre as folhas. Neste sistema, o artista compartilha a autoria com os
transeuntes. No decorrer do tempo é entendido que haverá o apagamento da
composição construída tal como a imagem fundamental retirada de revistas
subvertida na pintura com tíner.

IVI MAIGA
Sem título
Os lugares nos quais se encontra o trabalho da artista variam entre pontos de
maior visibilidade e um caráter de semi-invisibilidade, remetendo ao aspecto de
anonimato percebido nas fotografias extraídas da região central da cidade.
A visão inicialmente se atrai pelas colunas de padrões construídas, e então,
um olhar mais cauteloso se dá conta que se trata de uma transfiguração de uma
paisagem local, que pela inversão e repetição, cria um espaço distinto, produzido
pelo ponto de vista interessado daquele que olha o mundo pela primeira vez,
renovando sempre o arrebatamento da descoberta. As imagens criadas contém esta
tensão entre o desconhecido e o reconhecível, o que se mostra e o que não quer
ser visto, o visível e o sensível.

KAUÊ GARCIA
Distraídos perderemos
Uma mesa de ping pong que desafia quem a vê, seja por sua forma insólita,
ou pela referência mordaz a Leminski que dá nome ao trabalho. Quando uma dupla
se forma para enfrentar o triângulo azul, a mesa escancara uma competição
desigual. Partindo de um desequilíbrio, alude à diferença capital posta na
sociedade, remetendo à própria pirâmide social. A situação lúdica tensiona o Homo
Ludens de Huizinga ao levar para o jogo características angustiantes da realidade
social, mas que igualmente proporciona a experiência de imersão e catarse. O
divertimento neste caso é assaltado por um desconforto amargo.

Reajuste
Próximo a se incorporar na paisagem da garagem expositiva, Reajuste causa
o efeito de estranhamento pela adulteração da métrica do tempo que relativiza a
percepção temporal, que é absolutamente imprecisa no corpo humano, e
forçosamente categórica na sociedade ocidental, que tem outros de seus valores
representados pela imagem cristã e as garrafas.

MATIAS PICÓN
Texto
A obra é resultado de uma espécie de Zona Autônoma Temporária (T.A.Z.),
orientada pelos notórios escritos de Hakim Bey, instalada em cada lugar vivenciado
pelo artista. Texto se coloca sobre a parede como fragmentos do processo de
investigação do local, no caso, a cidade de Bragança Paulista. Durante o período de
residência o artista realizou colagens, que tiveram sua matéria-prima visual retirada
de revistas de sebos e bazares, em especial o Bazar do Salomão, importante
referência do centro da cidade. A partir desta pesquisa de sobreposições de
texturas, criação de híbridos animais e humanos, intercalando signos da tipografia,
são feitos recortes, que são ampliados e tomam a parede despertando fascínio e
instalando mistério com texturas nas quais se encontram e se perdem os animais
híbridos.

TRE LARACAMPOS
Sem título

Um corpo de canos enferrujados, correntes e delicados troncos atravessa


três planos de vermelho. O trabalho também surge da seleção de materiais
sugeridos pela cidade, e da indagação sobre o local. A materialidade do que é
coletado confere uma literalidade ao conceito que ainda assim permite a divagação
criativa do olhar. Com o elemento central pode ser feito um paralelo com o próprio
corpo social ou subjetivo que têm em si integrado o rural e o urbano em expansão,
dicotomia lancinante da concretude do trabalho que parece se resolver no
atravessamento das camadas de significado. A penetração do espaço também tem
a sua conotação no tempo, tendo os canos guardado na ferrugem a memória de
integrar o primeiro banco da cidade e os galhos jovens há pouco despencaram e
foram coletados.
Agradecimentos

A residência teve sua potência ampliada pelas mãos daqueles que não mediram
esforços para que ocorresse esta exposição da melhor maneira possível, em um
espaço de tempo de tal forma reduzido. Agradecimento especial à Daniela Verde
pelas inúmeras soluções encontradas, a Binho Miranda pelo registro atencioso e
pela generosidade de abrir as portas de sua casa.

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