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2-Nº2/Jul-Dez 2015
Resumo: O artigo apresenta argumentos críticos contra qualquer tipo de projeto jurídico ou
demagógico que chancele a aplicação da pena de morte, não importa sob qual motivação,
considerando-a ilegítima axiologicamente e moralmente.
Abstract: The article represents critical arguments against any kind of juridical or demagogic
project which seals the application of death penalty, it doesn’t matter under which motivation,
considering it axially and morally illegitimate
INTRODUÇÃO
A defesa da legitimidade da pena de morte constantemente desponta na agenda social
da massa populacional, acuada pela percepção sensacional da violência endêmica que
perpassa a estrutura política da ordem pública atual do Estado Plutocrático, incapaz de
resolver seus crônicos problemas de exclusão social. A reflexão filosófica não pode descurar
da urgente tarefa de analisar essa ideia insana que permanece em estado latente nas
consciências de inúmeras pessoas, pacíficas até segunda ordem. Ao desmistificar algumas das
contradições axiológicas contido no projeto de aplicação da pena de morte, o ofício filosófico,
comprometido com a justiça social e com a dignidade da vida humana para além das alienadas
e reificadas demandas mercadológicas da sociedade capitalista, positivamente é capaz de
contribuir para a análise crítica dessa demanda. Para a realização de tal empreendimento
crítico, pautado na reflexão ética sobre a dignidade da vida humana para além do senso
vingativo presente no projeto de aplicação da abjeta pena de morte, as citações e as
referências bibliográficas não são metodologicamente necessárias, pois a consciência
emancipada de toda disposição necrófila é intrinsecamente soberana para denunciar o projeto
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Os crimes praticados pelos plutocratas são muito mais deletérios para a ordem pública
do que os delitos violentos perpetrados pelos sujeitos que defendem seus próprios interesses
egoístas. Afinal, ao realizarem falcatruas que desfalcam o erário público, os plutocratas
impedem que verbas estatais sejam aplicadas na tentativa de saneamento dos problemas
sociais, fazendo assim com que inúmeros cidadãos caiam nas raias da miserabilidade. Nessas
condições, muitos desses sujeitos reduzidos ao estado de escória social reificada não
encontram alternativa, no seu desespero existencial, a lutarem pela sobrevivência senão
mediante inserção no crime, aumentando ainda mais sua marginalidade social. A mentalidade
obtusa da opinião pública reacionária não consegue perceber que grande parte da
criminalidade social decorre da má gestão da coisa pública pelos poderes estabelecidos, que
não governam em nome do bem comum, mas da satisfação dos interesses escusos de
empresas, corporações e grupos mafiosos.
A pena de morte nada mais é do que o assassinato legalizado pelo Estado, cumprindo
não apenas o propósito de punir exemplarmente o criminoso para que outrem não venha a
cometer ações similares, mantendo-se assim o tecido social sob um rígido controle moral, mas
também atuando como uma vingança judiciária do poder estabelecido contra a pessoa
delituosa. Ora, um Estado forte não necessita excluir a existência de um ser humano em
desajuste com as leis, mas pode convenientemente lutar por sua reabilitação moral, tornando-a
uma pessoa melhor e também consciente de seu papel criativo na transformação social.
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Quantos homicídios travestidos como execuções legais praticadas pelo Estado detentor
do monopólio legítimo da violência (e da morte) não ocorreram contra pessoas inocentes, sem
que houvesse em tempo hábil revisão de pena, de modo a se evitar a efetivação dessa barbárie
legalizada contra a vida do condenado? A prepotência jurídica é tamanha que mesmo em
inúmeros casos nos quais se reconhecia a inocência do réu se mantinha incólume o
ordenamento de condenação capital, como forma de representar a solidez e a precisão dos
juízos judiciários, tal como ações divinas no plano concreto.
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Na pior das hipóteses, somente uma nação que possuísse uma constituição impecável,
e cuja casta política apresentasse plena probidade administrativa na gestão pública, poderia
talvez conquistar legitimidade moral se porventura aplicasse a pena capital aos seus
condenados. Um país que calcou sua história moderna através de corruptos governos tirânicos
e que exerceu políticas imperialistas sobre seus vizinhos geográficos não possui qualquer
legitimidade moral para aplicar a pena capital sob quaisquer circunstâncias. Entre 1975 a
1999, durante o controverso regime de Suharto, a Indonésia espoliou o Timor-Leste,
massacrando milhares de cidadãos em um regime de terror, destruição da qual até hoje essa
nação não se recuperou, sem receber qualquer indenização. Quando ocorreu o tsunami de
2004 que arrasou o território indonésio, seus governantes não hesitaram em solicitar e aceitar
ajuda humanitária internacional. As leis trabalhistas indonésias se submetem piamente ao
crivo neoliberal e permitem que seus trabalhadores sejam explorados até a última gota de
sangue por multinacionais consagradas pelo mercado consumidor. No modus operandi
jurídico indonésio, estupros são crimes que recebem mais condescendência legal do que o
narcotráfico, circunstância que evidencia os preconceitos patriarcalistas do país e suas
incoerências jurídicas que atentam contra a dignidade humana e contra a consciência
intelectual esclarecida.
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Um Estado realmente forte não necessita apelar para a pena de morte em determinados
crimes, e se porventura recorre a tal expediente é porque ele não encontra capacidade
suficiente de assistência social racionalizada para estabelecer os preceitos civilizacionais em
sua jurisdição territorial protegendo seus cidadãos das intempéries da vida, evidenciando
assim sua decadência política, pois seu poder se consolida mediante os corpos profanados dos
mortos assassinados por suas mãos frias. Sociedades que eliminam as ações corruptas nos
quadros públicos apresentam taxas mais baixas de criminalidade, pois investimentos
fundamentais para a formação plena do cidadão não são desviados para satisfazer a sanha
privada dos plutocratas. Há ainda casos controversos de que alguns países que apresentam
elevado índice de execuções anuais fazem tráfico internacional de órgãos, um negócio
altamente lucrativo para esses governos corruptos, movimentando uma sórdida rede
empresarial que prospera mediante a anulação existência de uma massa de miseráveis que não
devem mais viver em prol da salvação das vidas de uma elite capaz de pagar altas taxas pela
aquisição de um coração, de um fígado, de um rim.
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Por coerência axiológica, a massa reacionária deveria clamar acima de tudo pela
eliminação física dos plutocratas corruptos, pois é essa corja que atenta de maneira mais
terrível contra a ordem pública. Contudo, a melhor maneira de se resolver as injustiças sociais
é exigir dos mandatários governamentais e das elites plutocráticas, que violam o patrimônio
estatal, que trabalhem compulsoriamente para que saldem suas dívidas para com a coisa
pública. Além disso, caberia a desapropriação absoluta das suas posses e quantias financeiras
depositadas em bancos para que assim se tornasse razoavelmente possível sanar os prejuízos
materiais ocasionados por essa rapinagem elitista.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em tempos de insurgência do espírito fascista, é crucial que a consciência crítica
permaneça alerta para destruir essa força nefasta que ameaça as frágeis bases de nosso
combalido tecido social. O discurso necrófilo que assombra a dignidade humana e que exige o
derramamento de sangue para saciar sua sanha ressentida contra a vida apresenta
cotidianamente sua horrenda virulência, cada vez mais onipresente, e nesses quadros
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encontramos a figura dos hipócritas “homens de bem”, que nada fazem de efetivo para a
transformação radical das bases sociais em prol de uma vida comum mais justa, mais
solidária, mais feliz. Em nome da laicidade do Estado e de sua independência jurídica perante
a moral do ressentimento, cabe aos sujeitos imbuídos do senso revolucionário de luta pela
supressão da ordem plutocrática vigente em prol da instauração de uma organização
rigorosamente democrática a tomada constante de posição contra os discursos obscurantistas
dos assassinos travestidos de defensores da dita moral e dos bons costumes.
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