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\.

Compêndio
de
História da Igreja
POR
fREI DAOOBERTO ROMAO, Q. F. M.
j.
Lente geral de Hielória Ecle(rlástka

·.'1 t~
i \ I VOLUME
\ \.
A ANTIGUIDADE CRISTÃ

, I
\1
I'

1- ~
~~< PREFACIO DA L" EDiÇÃO

Se com este volume começo a dar aos estudantes de


teologia um manual, que possa servir de base ao estudo da
história da Igreja, tenho a convicção de cumprir os votos
e desejos de muitos, não só estudantes de teologia, senão
também outros filhos e admiradores da santa Madre Igreja.
O pouco que existe em nossa literatura sobre o assunto, é
I M P R I M A T U R
já bastante antigo e não pode satisfazer aos desejos de tan-
POR COMISSÃO ESPECIAL DO EXMO. tos espíritos que por ele se interessam.
E REVMO. SR. DOM MANUEL PEDRO De outro lado, porém, devo confessar que é uma em-
DA CUNHA CINTRA, BISPO DE PE-
TROPOLIS, FR. LAURO OSTERMANN, presa das mais dificeis escrever a história da Igreja num
O. F. M, PETROPOLIS, 3-1-1949. ambiente em que faltam os subsídios mais indispensáveis.
Não pretendo, por isso, realizar todas as esperanças dos
jovens estudantes, e menos ainda dos peritos teólogos. O
manual não quer ser uma obra de todo original e perfeita.
I
Servi-me para a sua composição, antes de mais nada,

/
/ I
das prelcções dos meus inolvidáveis lentes da história ecle-
siástica, no Ateneu de Santo Antônio de Roma. Consultei
também numerosos manuais e monografias que se escreve-
o ram nos diversos países do velho mundo, conferindo, quan-
I do possível, conscienciosamente as fontes primitivas. Não
indiquei, porém, todas as fontes e a literatura completa, o
que inutilmente aumentaria as páginas dum simples manual;

, fiz somente as indicações mais necessárias.


Como a arte cristã, nos últimos decênios, cada vez mais,
~e tornou disciplina à parte, que deve ser tratada em par-
ticular, separei-a completamente do manual. De outro lado,
sendo geralmente o lente de história eclesiástica também
o de patrologia, resolvi unir esta com a história antiga,
tratando-a mais extensamente, para assim evitar inúteis re-
petições.
Espero, pois, que poderei oferecer, se não um traba-
lho perfeito, ao menos um compêndio útil aos estudantes
\1 ""

10 Prefácio

de teologia. Queira Deus abençoar estas humildes páginas


de história na sua missão que pretendem iniciar para maior
honra e glória de Deus e de sua santa Igreja.

Curitiba. Festa do Doutor Serãfico S. Boaventura. 14 de Julho ,


de 1939.

PREFÁCIO DA 2.' EDIÇÃO


'\
. INTRODUÇÃO

Desde mais de um ano, está esgotada a L' edição des- li 1. Conceito e fim, importância e método da história
te compêndio de história eclesiástica. Doenças prolongadas eclesiástica
e outros trabalhos não me permitiram atender às reclama-
ções e aos pedidos que, várias vezes, me foram feitos da I. A Igreja é o corpo místico de Jesus Cristo e, por-
parte da Editora. Mas, finalmente, aqui está a 2.' edição tanto, é divina, essencialmente imutável. Imortal e divino é
do lo volume, e, em breve, seguirá, se Deus quiser, também tudo que lhe vem de Cristo, seu fundador, e do Espírito
a do segundo. Santo, que a dirige continuamente. Enquanto divina, a Igreja
Procurei melhorar, quanto passivei o manual, reduzir não tem história, porque história é desenvolvimento, mudan-
a um mínimo as expressões gregas, cortar alguns pontos ça. Mas, instituída pelo divino Salvador para salvação do
de pouco interesse, explicar outros mais claramente, corri- gênero humano, ela é formada também de um elemento hu-
gir algumas opiniões erradas e dar ao todo um aspecto mais mano, os membros da hierarquia e os fiéis, considerados
claro para a memória e mais agradável à vista, tomando no seu conjunto: a comunidade dos fiéis, a ê""À'YJaía do
em conta as benévolas observações que com muita caridade Novo Testamento. Ela é uma sociedade visível em seus
me fizeram alguns Reverendos Padres. Deus lhes pague. membros. Inimigos anticristãos vêem nela unicamente uma
Seja em tudo adorado e louvado Cristo, Rei dos séculos e sociedade visível. Tendências erradas dentro do cristianis-
da eternidade. mo, espirituaIí:;,ticas, vêem nela unicamente uma sociedade
invisivel. Mas a apologética e a história nos ensinam o du-
Petrópolis, na festa da Páscoa de 1948. plo elemento, divino e humano, visível e invisivel.
Por isso, a Igreja tem necessàriamente a sua história,
o seu desenvolvimento. Como o grão de mostarda é a mais
pequena das sementes, mas, crescendo, se torna a maior das
plantas e se faz uma árvore (Mt 13, 31-32), assim a Igre-
ja havia de crescer até chegar a estender os seus ramos
sobre toda a terra. A exposição científica deste seu desen-
volvimento objetivo é o que chamamos história da Igreja,
no sentido técnico da palavra.
2. O objeto da história no sentido mais restrito é o
homem. Como indivíduo, ele é objeto da biograiia. Como
membro da sociedade é objeto da história universal. Se-
gundo o seu duplo fim, a felicidade temporal e eterna, é
objeto da história profana ou religiosa. A religião ocupa o
i'
12 Introdução § I. Conceito e fim, importância e método da história eclesiástica 13

lugar mais nobre na história da humanidade. Ela consiste Mas, sendo a Igreja verdadeira depositária da revela-
no conhecimento teórico de Deus e no culto prático, tal qual ção divina, a sua história é também um meio para conhe-
se tem formado, no decurso dos séculos, entre os vários cer as riquezas da verdadeira fé. E' e será sempre uma
povos. Na realidade, são muitas as formas de religião. Mas apologia eficaz da religião católica e da Igreja, é e será
a razão nos ensina que só uma pode ser verdadeira, e a sempre uma prova inconcussa de que a Igreja, apesar de
apologética nos diz que esta é a que tem por fundador a todas as mudanças que sofreu no tempo e no espaço, é e
Jesus Cristo e que nós chamamos Igreja católica, apostó-
lica, romana.
.. será sempre essencialmente tal qual foi nos primeiros anos
da 'sua existência.
Jesus Cristo fundou a sua Igreja para todos os tempos Enfim, o católico e, em particular, o teólogo reconhe-
c para todos os povos. Segundo tempos e povos, ela desen- cerá, estudando a história da Igreja, que o florescimento
volveu-se externa e internamente. O seu desenvolvimento do reino de Deus na terra depende, depoís da graça divina,
externo, a sua difusão, as relações com os Estados, as per- sobretudo da piedade, da sabedoria e do zelo de seus mem-
seguições que se lhe fizeram com as armas do poder poli- bros e, principalmente, de seus pastores. E conhecendo a
tico e do espirita, é o que chamamos história externa da Igreja pelo estudo da sua história, amá-Ia-á, e Com ela há
Igreja. O seu desenvolvimento interno, a evolução da sua de viver e sentir. O desconhecimento da história eclesiástica,
constituição, que por vezes precisava de ser ampliada e re- pelo contrário, afeta também as outras ciências teológicas
formada segundo as exigências do ambiente local e tempo- e, por conseguinte, todo o sentimento eclesiástico e religioso.
ral, a fundação de institutos, a formulação determinada do
5. No entanto, para alcançar o seu fim, e para cor-
culto e da doutrina em si imutável, o desenvolvimento das
responder perfeitamente à sua importância, a história ecle-
ciências e da disciplina, enfim todo este evoluir progressi-
siástica deve nortear-se por certas regras. Em primeiro lu-
vo e orgânico que, segundo os desígnios de Jesus Cristo,
gar, ela tem de ser objetiva, i. é, deve deixar de lado todo
devia operar ·se no decurso dos séculos, é a história inter-
o partidarismo, embora aquela objetividade absoluta, da
na da Igreja. Considerando todo este processo, podemos
qual fabularam certos espiritos liberais, seja uma quimera.
definir a história eclesiástica como exposição científica do
A história deve, em 2' lugar, deduzir-se das fontes primi-
desenvolvimento externo e interno da sociedade visível, fun-
tivas} que, por sua vez, devem ser minuciosamente exami-
dada por Jesus Cristo para a salvação da humanidade.
nadas, segundo as regras da crítica externa e interna, de-
3. Nesta definição da história da Igreja exprime-se, ao irem ser explicadas pelas diversas disciplinas da propedêu-
mesmo tempo, o seu fim: pesquisar e expor, clara e cien- tica histórica.
tificamente, todas as manifestações da sua vida, todo o seu A história deve, em 3' lugar, seguir o método pragmá-
desenvolvimento, realizado no tempo e no espaço. tico-genético que, em toda parte, procura os motivos, as
4. Desta definição se deduz outrossim a grande im- causas, os conexos dos vários fatos históricos. Errada é a
portância da história eclesiástica. A história é, antes de tu- consideração moderna da história de Macchiavelli, de Mon-
do, um meio para conhecer a Igreja, sociedade visível de tesquieu e dos filosofistas: Todo acontecimento histórico de-
todos os cristãos. Não há outro meio, pelo qual se possa senvolve-se necessàriamente de sua pressuposição e tem ne-
conhecer melhor a Igreja, do que a sua própria atividade, cessàriamente este ou aquele efeito. Todavia, há certas leis
seu desenvolvimento externo e interno, a sua história. E co- morais; tudo tem certa finalidade. Tal método nada tem
mo a história da humanidade desperta o interesse dos ho- que Ver com o pragmatismo utilitarista que na história re-
mens, porque nela se conhecem a si mesmos, assim a his- conhece apenas um rnt:io ue susttmtar e melhorar a vida.
tória eclesiástica desperta o interesse dos cristãos, porque O verdadeiro pragmatismo teológico reconhece na história
é a história daquela grande família a que pertencem, e que os desígnios da Providência divina. E esta consideração nos
tem por chefe o próprio Filho de Deus. leva a um 4' ponto: Sendo a Igreja uma instituição com-
Introdução § 2. Divisão da história eclesiástica 15
14

. posta não só de elementos hum anos, mas também de ele- em determinado ambiente de tempo e espaço, exerceram um
mentos divinos, a história deve nortear-se pelos ditames da influxo decisivo sobre toda uma idade. Outros, menos im-
religião. Esta nem impede nem dificulta o método cientí- .! portantes, determinaram uma época ou um período.
Dois fatos há, que nos autorizam a dividir a história
fico da história; pois a fé e a ciência não se contradizem.
Ambas procuram a verdade, que é uma só. da Igreja em três grandes idades, antiguidade, idade-média
e idade moderna. O primeiro é a transmigração dos povos
De Smedt, Principes de la critique historique, Paris 1883. - germânicos e a conversão deles ao cristianismo; o segundo
Bernheim, Lehrbuch der hist. Methode, ed. 5-6, Leipzig 1908. -
F eder. Lehrbuch der his\. Methodik, ed. 2, Regensburg 1921..--:- é o aparecimento do espirito moderno.
Fonck, Wissenschaftl. Arbeiten, ed. 2, Insbruck 1916. - SawlCtl, 9. Cada uma destas idades tem o seu caráter especial. .
Geschichtsphilosophie, 1921; trad. ital, por Pagnini, Firenze 1925. -
Albers, Manuale di propedeutica storica, Roma 1909. - Iso/di, Pre- A antiguidade cristã apresenta-nos o cristianismo nascente,
leções de introdução à história e crltica histórica, São Paulo 1932. - colocado em frente duma cultura a ntiga e florescente, que
Schuetz, Gatt in der Geschichte, Salzburg 1930.
l se formara sem o cristianismo e antes dele. E' a cultura dos
§ 2. Divisão da história ecIesiâstica , ( gregos e romanos. Esta cultura, porém, havia de transfor-
mar-se, pela influência abençoada do Evangelho, de pagã
6. A Igreja apresenta-se-nos como um organismo muic que era em cristã. Esta idade grego-romana termina, no oci-
to complexo de fatos e, ao mesmo tempo, como um orga- dente, com a migração dos povos e, no oriente, de certo
ni smo que tem uma existência quase duas vezes milenária . modo, com o sinodo trulano de 692. Naturalmente, os pon-
Para se iormar uma id éia exata dos diversos acontecimen- tos divisórios não aparecem sempre bem claros; não podem
tos em particular, como de toda a vida da Igreja em geral, ser tomados matemàticamente. Por isto, nem todos os his-
divide-se a sua história segundo a natureza dos objetos e, toriadores fazem a mesma divisão.
principalmente, segundo os períodos do tempo. Distingui- Por sua vez, a antiguidade cristã é dividida, pela con-
mos, pois, uma divisão real e uma divisão cronológica. versão de Constantino Magno ou pelo Edito de Milão, em
7. A divisão real tem a sua razão de ser nas várias duas épocas:
formas e diversos modos, pelos quais a Igreja procura cum- 1') a época da fundação e propagação do cristianis-
prir a sua missão. Esta atividade da Igreja diz respeito ou mo, assim como da sua defesa contra o judaísmo e, sobre-
a pessoas e sociedades, que lhe são alheias, ou a si mesma .' tudo, contra o pagan ismo, - tempo das perseguições e dos
e seus membros. Segundo estas diversas formas de ativida- apologetas (1-313);
de distinguimos uma história externa e outra interna, como 2') a época das controvérsias dogmáticas, dos concí-
já foi explicado. lios, da constituição e dos Padres da Igreja, no império cris-
Mais importante é a divisão cronológica, embora de tão (313-692).
per si o seu valor seja apenas relativo. Pois só uma com- 10. A migração dos povos germânicos já então come-
preensão clara e nítida do processo genético-cronológico po- çara a destruir o império ocidental e a ampliar o ambien.
derá ser guia seguro e ensinar-nos a ver e compreender os te da história antiga. A educação destes povos pela Igreja
fatos particulares à luz dos grandes acontecimentos, e a ver e a sua intima cooperação com a mesma preenchem a his-
e compreender o sentido da história. tória da idade-média, idade germânico-românica. A sua nota
8. Mas será possível uma tal divisão? Sem dúvida. caracteristica consiste em que primeiro existe a Igreja sem
Pois, como na vida do indivíduo há diversas fases, e como cultura oposta. E' ela que cria uma nova cultura, a cultu-
o mesmo acontece na vida dum povo inteiro, assim também ra cristã, e a leva à mais alta perfeição. Baseada no sólido
na vida da Igreja, que abrange todos os povos c todos os fundamento da sua vida interna, manifestada pelo monaca-
tempos. Na realidade há, no decurso da história eClesiás- to, liturgia, teologia e direito, desenvolve também grande
'
.. tica, fatos e pessoas que, colocados pela Provid~ncia divina atividade no campo político-eclesiástico. Por conseguinte,
16 Introdução § 3. Fontes da história eclesiástica 17

acentuam-se, mais e mais, os problemas da relação entre o se, portanto, os monumentos, escritos ou não escritos, que
Estado e a Igreja. Toda esta evolução desenrola-se em três nos dão notícia do passado da Igreja.
épocas: 13. As muitas e variadíssimas fontes da história ecle-
19 ) a época da conversão e organização dos povos siástica podem dividir-se:
germânicos e românicos, do predomínio imperial e da cultu- to) segundo a sua origem, em fontes divinas, que são
ra carolíngio-otônica, ou seja a idade média primitiva, os livros da Sagrada Escritura, e fontes humanas. Estas são
até 1073; imediatas ou mediatas. As fontes imediatas ou originaís pro-
2') a época do predomínio dos papas, ou a alta idade- vêm de testemunhas oculares ou auriculares, como documen-
média, desde Gregório VII até Bonifácio VIl/ (1073-1303); tos, relações, memórias e outros monumentos contemporâ-
3 9 ) a época da dissolução da cultura medieval e da neos. As fontes mediatas ou derivadas são relações poste-
luta contra o predomínio eclesiástico, a baixa idade-média riores, fundadas em fontes anteriores;
(1303-1517). 2') segundo a posição do autor em fontes públicas e
privadas. As fontes públicas ou oficiais, que são redigidas
11. A mudança essencial da cultura européia, o apare- ou reconhecidas por uma autoridade eclesiástica ou civil,
cimento do espírito moderno, teve por consequência um rom- têm por sua natureza uma' importâncía particular. Tais são,
pimento cada vez mais sensível entre os povos da Europa p. ex., decretos, bulas, breves dos pontífices romanos, atas
e a Igreja que, até então, lhes fora guia e mestra. Esta dos concílios, disposições e cartas pastorais dos bispos, leis
separação achou uma expressão particularmente triste na da Igreja e leis civis referentes à Igreja, concordatas, re-
perniciosa revolução de Lutero contra a Igreja, a pseudo- gras de ordens religiosas, liturgias, símbolos. As fontes pri-
reforma protestante. Originou-se uma cultura autónoma, que vadas ou particulares são relações feitas sem autoridade
sucessivamente se manifestou anti-eclesiástica, anti-cristã e oficial, que, no entanto, servem para esclarecimento sobre
irreligiosa. E' a idade moderna que, segundo o dito desen- pessoas e fatos notáveis, p. ex., atas e biografias dos már-
volvimento, se divide em duas épocas, separadas entre si
pelo chamado esclarecimento: I, tires e santos, os escritos dos Santos Padres, dos escrítores

19 ) a época da revolução eclesiástica e da cultura anti- l eclesiásticos e obras dos adversários da Igreja;
3Q ) segundo a forma, em fontes escritas, monumentos
eclesiástica, que ainda conserva a fé na revelação !\ prôpriamente ditos, como edifícios cultuais, pinturas, moe-
(1517-1700); das, etc., e fontes orais, como lendas e tradições populares.
2 a época do Estado ateístico e do espírito anti-cris-
9
)
14. Para facilitar o uso das fontes da história eclesiás-
tão e irreligioso, que nega por completo a revelação, época tica, fizeram-se grandes coleções. Só as mais importantes
esta que, por sua vez, é dividida pela revolução francesa em sejam aqui mencionadas:
dois períodos.
1.0) Atas pontifícias.' Pontificum Romanorum a S. Clemente. I
Cellarius, Historiae antiquae, mediae, novae nucleus, Jenae usque ad Leonem Magnum epistolae genuinae, ed. Coustant, ,ParIs
1675-76. - Goeller, Die Periodisierung der Kirchengeschichte und 1721; ed. Schoenernann, Gocttingae 1796. - Pont. Rom. eplst. a
die epochale Stellung des Mittelalters, Freiburg 1919. ~ Lorfz, S. Hilario usque ad S. Hormisdam, ed. Thiel, Brunsbergae 1868.
Die Oeschichte der Kirche in ideengeschichtlicher Betrachtung, Loewenfeld, Epistolae Rom. Pont. ineditae (494-1198), Lipsiae 1885.
Muenster 1933.
- As bulas pontifícias estão contidas nos chamados bulários. O pri-
meiro bulá rio de grande volume é obra de L. Cherubini (Roma
§ 3. Fontes da história eclesiástica 1586). Uma edição mais recente é a de Luxemburgo (19 vol., .1727
55). O melhor bulário, hoje em dia, é a edição taurinense (24 vol.:
12. Fontes da história são os produtos da atividade 1857 ss) continuada em Nápoles (1867 ss); mas vai apenas ate
humana, ou destinados ou, ao menos, aptos, por sua exis- Bento XÍV (1758). O bulário de Bento XIV pode ser considerado
tência, origem e outras circunstâncias, a serem testemunhos como continuação da edição luxemburgense. Outra continuação, fei-
ta em Roma (1835 5S), vai desde Clemente XIII até Gregório XVI.
dos fatos históricos. Fontes da história eclesiástica chamam-
Compêndio I - 2
18 Introdução § 4. Ciências auxiliares da história eclesiástica 19

j affé, Regesta Pont. Rom. a condita ecclesia ad a, 1198; ed. culos foram publicados pela Kirchenvaeter-Kommission da Real Aca-
Kaltenbrunner. Ewald, Loewenfeld , l-II , Lipsiae 1885-88. - Potthas~, demia das Ciências da Prússia, Upsia 1897 sS. - A edi ção devia
Heg. Pont. Rom. iode ab anno 11 98 a d a nnum 1304, l-II , Beroll- abranger 54 volumes. - Bibliothek der Kirchenvaeter, ed. Reithma)'r
ni 1874-75. - Os registos pontifícios dos séculos XIII e X IV foram e Thalhofer, 80 vol., Kempten 1869-86 ; nova ed ição por Bar-
publicados pela tcote Française de Rome, Pari s 1883 55. - Mui- denhewer, 63 vo1., Kempten-Mt1enchen 1911 5S. - Uma nova série
tas outras coleções foram feitas para os diversos países e Institu- em 17 volumes, ed. Bardenhe\\~er, ZelJinger e A'l a rt;n, 1932 sS. _
tos Religiosos. Hurter, SS. Patrum opus cll la selecta, ser. I, 48 vol., ser. II, 6 vaI.,
29 ) Atas dos concílios: Depois da publicação de várias cole- Oeniponte 1868-92. - Rauschen, Florilegium patrist., 12 fase., Bon-
ções, nos sécu los XVI e XVII, a pareceu uma de maior importân- nae 1904-19; nova series ed. Albers 1920 5S; Oeyer et Zellinger
cia ch amada Collectio regia (37 vol., Paris 1644 5$). Pouco de- 1926 ss. - Rouet de journe l, Enchiridion patrist., ed. 8 e- 9, frib.
poi's, Labbé e Cossart publicaram a sua coleção de J5 monumentais i. B. 1932.
volumes (Paris 1671 55). Entre as coleções que se seguiram po- 6.°) Inscrições e monumentos: J. B. de Rossi, Inscriptiones
demos mencionar: Ha rd ui nus, Act a conciliorum et ep ist. decretales chri st ian ae urbis Roma e sep ti mo saecul0 antiquiores, 2 vaL, Romne
at: cOJlslituliunes SUIll. P Oli !., 12 voL, Paris 171 5; e Mansi, Sacro r. 186 1-88. - A. Silvagni, Insc riptiones christianae urbis Romae septi-
Coneil. nova et amplissim a collectio, 31 vol., Florentiae et Venet. mo saeculo antiquiores, nova serjes, Romae 1922 sS. - Muitas ou-
1759-98; nova ed. COIU uma co ntinuação em 53 volumes, Paris tras coleções dizem respeit o a regiões particul a r es, das mais a maior
1901-27. A Collectio Lacensis (7 vol., Friburgii i. B. 1870 55) ofe- parte está contida no Corpus inscriptionum latinarum, cd. pela ac<:;-
rece-n os um complemento dos concí lios mais recentes. - Nos úl.,. demia de Berlim, e no Corplls inscriptionum graecarum, ed. Boeçkh,
timos decê nios, fizeram-se também diversas edições do Corpus juris Berlim 1829-77. - Merecem mencionados aind a : Bosio, Roma sot-
canonici; a última é o Codex juro cano Pii X jussu digestus, Be- terranea , Roma 1632 ; De Rossi, La Roma satterr~lnea cristiana , 3
nedicti XV auctoritate promulga tus, Romae 191 7. - Ao lado do voI., Homa 1864-77 ; Wilpert, Die Malereie n der Kata komben Roms,
ejC apa rec eram as Condicis juris ca noniei font es cura Pelri Cardo 2 vol., Preiburg t903 ; Id., Die roe misc hcl1 Mosaike n und Malereien
Gasparri ed iti (Romae 1923-32). - Aqui devem se r mencionados der a ltkirchl. Bauten vom 4. bis 12. jahrhundert, 4 vol. , Freiburg,
também os Acta S. Sedis, publicados desde 1865, e os Acta Aposto- 2 ed. 1917 ; Id., I sarcofagi cristian i antichi, 2 vol., Roma 1929-32;
licae Sedis, desde 1909. Maru cchi, Eléments d'An:héoJ. chrét., 3 vo1., 2 ed. Rome 1906;
3.°) Biografias dos papas : Liber Pontificalis, ed. Duchesne I-II, Leclcrcq, Manuel d'Arch éo l. chrét., 2 vol., Paris 1907; Kaufrnann,
Paris 1886.-92; ed. Mommsen (Mon. Germ. Hist.) 1, Be rolini 1898. Handbuch der christl. Arch~ologie, 2 cd. Paderborn 1913.
_ \Vatterich, Vitae P ont. Rom. ad ex. saec. IX usque ad finem
saee. XIII, 2 voL, Lipsiae 1862. - Pl atina , Liber de vita Chrisli
:\c oe vit is Sumo Pont. Rom., Venet. 1478 ; contin. por Panvinio e § 4_ Ciências auxiliares da história eclesiástica
Ciearelli até Clemente VIII. - Ciaeonius-Ol do inus, Vitae et res
gestae P ont. Rom. et S. R. E. Cardo ab initio nascentis ecclesiae 15. As fontes da história eclesiástica fornecem-nos o
usque ad Clementem IX , Romae 4 vol. ín-f.-Mi rbt, Quellen zur material histórico. Para usá-lo convenientemente precisamos
Gesehichte des Papsttums , ed. 4. Tuehingen 1924; ed. 5, 1934. das ciências auxiliares, que nos põem em condições de exa-
4. O) Atas e biografias dos mdrfires e santos: Martyrologium minar, compreender e julgar as fontes quanto à sua forma
Hieronymianum, edd. De Rossi et Duehesne (AASS Nov. II)', Paris e ao seu conteúdo.
1894; nova ed. Quentin, BruxeI. 1931. - Quentin, Les martyrologes
histo riques du moyen-âge, Paris 1908; nova impr. 1923. - Ruinart, 1Q) O conteúdo das fontes diz respeito a toda a vida
Acta primorum martyrum sincera et selecta, Paris 1689; Ratisbonae da Igreja. Por isso, precisamos, em primeiro lugar, das ou-
1859. - Surius, De proba tis vitis Sanctorum, l-VI , Coloniae 1570-75. 1ras ciências teológicas: dogmática, moral, liturgia e direi-
- Bolland us et soe., Acta Sanctorum, quotqllot toto orbe coluntur, to canónico. A vida e a atividade da Igreja são grande-
Antuerpiae 1643 ss; nova impr. Paris 1854 sS. - Um complemen-
to desta obra monumental são os Analecta Bollandiana, Paris e
mente influenciadas pelas circunstâncias políticas, SOCiaIS,
Bruxel as 1882 sS. culturais e comerciais. Portanto, também a história profana
5.°) Coleções dos Padres e escritores eclesidsticos: A maior e é de grande importância para o estudo da história eclesiás-
mais completa é a de Migne, Patrologiae eursus completus: Patrolo- tica. A vida da Igreja desenvolve-se no tempo e no espaço.
gia latin a ab aevo apostolico usque ad Innoeentium III (1216), 221
vol. t Paris 1844-64; Patrologia graeca llsque ad saeculum XV, 161
Por conseguinte, requerem-se, para °
seu conhecimento, a
vol. , Paris 1857-66. - Corpus scriptorum ecclesiasticorum latinorum, cronologia e a geografia. Por sua importância, estas duas
., Vindobonae 1866 sS. ~ Os escritores gregos dos três primeiros sé- ciências já foram apelidadas "fachos da história". A geogra-
2'
20 Introdu ção .
§ 5. O desenvolvimento da historiografia eclesiástica 21
fia nos fa z conhecer o ambiente loca l dos acontecimentos.
A cronologia instrui-nos sobre as datas que se encontram livros escritos em diversas línguas e a conhecer a linguagem
nas fontes e sobre os diversos modos de computar o tempo. das fontes históricas. Dicion ários ou glossários explicam e
interpretam os termos usados nos respectivos tempos. As
16 . .A:Lçronoloj;ias mais conhecidas são as seguintes:
fontes mais antigas exigem, além di sso, o conhecimento da
a) a cronologia romana qu e começa com a fundação de Roma,
i. é, em 753 a. c.;
paleografia, que nos ensina a ler os escritos antigos e deter-
b) a cronologia ou era mundial, desde a criação do mundo, minar a época da sua origem. A diplomática nos ensina a
usad a em diversas formas: a forma bizantina (5509 a. C.), que se exa minar os documentos e formar um juízo sobre os mes-
empregava na Rússia ate ao reinado de Pedro o Or., na Grécia, mos. A epigrafia trata das inscrições e das siglas. A ar-
Sé rvia e România até ao século XIX, a forma alexandrina (5492 queologia e a arte cristãs têm por objeto os monumentos
a. C.) e a forma judaica (3761 a. C.);
c) as olimpíadas, ciclo de qllatro anos , com eçan do em 776 a.
que se fize ram sob o inlluxo do cristianismo. A numismá-
c.. que ficaram em uso, mes mo entre os cristãos, até ao sé- ti ca tra ta elas moedas e medalhas e da sua significação para
cul o XVI; a história . A esfragistica, das bulas e dos selos; a heráldi-
d) as indi cções, ciclo de quinze anos, desde Dioclecia no (297) ca, das armas dos principes e nobres das idades-média e
até ao século XVI; moderna .
e) a cro nologia dos maometanos, chamada héjira, que começa
com a fuga do profeta de Meca para Medina (15 de Julho de 622) Grolefend, Zeitrechnul1g des deutschen MiHelalters und der
e segue o ano lunar de 354 di as; Neuzeit, 3 vaI., 3. ed. Hannover 19 10. - Cal'oignac, Chronologie,
Paris 1925. - Cappelli, Cronologia, cronografia e calendário per-
r-n a era cristã, introduzida pelo monge Dionísio Exíguo (c. 525), p~tuo, MiJano, 2. ed. 1930. - Droysen, Allgem. hi st. Handatlas
.\ cujo cálculo, porém, não é exato; pois coloca o nascimento de Je- 1886. - Slreil, K.thol. Missions.tlas, Steyl 1907. - Id. , Atlas hie-
.~ sus Cristo no ano de 753 ~ de modo que o ano de 754 é o rarchicus, 2. ed. 1929. - Mas-Lat rie, Trésor de chronologie, d'histoi-
primeiro ano da era cristã, qu ando é certo que Jesus Cristo nasceu t e e géographie pour I'étude et I'emploi des documents du moyen-
antes de 750 u. c. âge, Paris 1889. - Mais rica lit era tura sobre as ciências auxiliares
'_ ... Também o início do ano era diferente, co meça ndo uns em 25 enco ntra-se nas maiores obras da hist óri a ec lesiástica.
de Dezembro, mais tarde em 1.0 de Janeiro (ano da Encarnação),
outros em 25 de Março (an o da Anun ciação). Estes últimos se- § 5. O desenvolvimento da historiografia eclesiástica
guiam ou o cálculo pisano que precede o dia 1. 0 de Janeiro, ou
(I cálculo florentino que o segue. Outros ainda faziam começar o
18. O tempo das perseguições dificultou sobremaneira
an o com o dia da Páscoa (ano da Reden ção), ou com o 1. 0 de
Março ou 1." de Setembro. E' só desde o século XVI, que o 1.0 de
o cu ltivo da historiografia eclesiástica. Como primeira ten-
Janei ro fo i adotado universa lmente co mo primeiro dia do ano. tativa duma história da Igreja podem ser considerados, de-
Q uan to à duração do ano, segu ia-se, até ao sécu lo XVI, o ca- pois dos Evangelhos e dos Atos dos Apóstolos de S. Lucas,
lendá rio juliano, introd uz ido por Jú liO César, 110 ano 45 a. C. Como, os cinco livros das Reminiscências de Hegesipo, escritas na
po rém, o ano civil deste ca lendá rio excedia, por II ' c 14" , o ve rda-
deiro a no solar, diferença que desde muito Se tinh a notado e que
segunda metade do século II. A obra pereceu; só alguns
em 1582 fazia dez di as inte iros, O papa Gregó ri o XIII reformou fragmentos chegaram até nós . Igual sorte tiveram as crôni-
o antigo calendário, suprimindo os dez dias de 5 a 14 de Outubro cas de Júlio Africano e de Hipólito .
de 1582 e ordenando que em 400 anos se eliminassem três dias
bissextis. .
19. O pai da história eclesiástica é Eusébio, metropo-
Este calendário gregori ano foi aceito pelos protestantes só no lita de Cesaréia na Palestina (t 340?). Ele compôs primei-
século XVIII. Os russos o aceitaram em 1918, os g regos ortodoxos, ro uma Crônica universal, que, em duas partes, abrange to-
em 1923, os turcos, em 1926. A nOva reforma do calendário, que da a história desde o principio do mundo até princípios do
visa principalmente a fixação da Páscoa e j á foi objeto dos traba-
lhos da Sociedade das ""Nações, parece não ter andamento. século IV da nossa era. O seu escopo é demonstrar a har-
monia entre as histórias profana e sagrada, bíblica e ecle-
17. 2 0 ) A forma das fontes exige um outro grupo de
siástica. Baseando-se nesta obra, Eusébio escreveu, em se-
ciências auxiliares. Para interpretar as fo ntes escritas é in-
dispensável a filologia, que nos ensina a compreender os guida, uma História Eclesiástica que, em dez livros, vai até
ao ano de 324. E' uma obra de incalculável valor, devido
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. ..

~
22 IntÍ"odução § 5. o desenvolvimento da historiografia eclesiástica 23

as muitas citações de fontes aliás perdidas e à compreensão Anastácio Bibliotecário (t 879) , a História eclesiástica de
unive rsalist~ da história da Igreja" Um século depois, três Odorico Vitalis (t 1142), de Bartolomeu de Luca (t 1327)
doutos escn!o~es continuaram, quase ao mesmo tempo, a e de Vicente de Beauvais (t 1264). Todos eles trataram o
obr~ de EuseblO: Sócrates, o mais hábil e crítico (305-439), assunto até ao seu século respectivo. A obra mais volumo-
Sozomeno (324-425) e Teodoreto, bispo de Ciro (320- sa e mais importante da idade-média é, no entanto, a Sum-
428). Teodoro de Constantinopla fez um resumo dos três ma historiaUs de S. Antonino, arcebispo de Florença (t
anteriores e continuou a obra até a morte de Justino I (527), 1459). Infelizmente peca por falta de crítica.
enquanto que Evágrio continuou a mesma obra desde 431 22. Na idade moderna, deu extraordinário impulso à
até 594. historiografia o humanismo com seu método crítico que, du-
. 20. O ocidente não ligou igual interesse à historiogra- rante a idade-média, ficara esquecido quase de todo. Influi-
fIa, contentando-se com traduções de obras gregas. S. lerô- ram também eficazmente a invenção da imprensa e o mo-
mmo tradUZIU a Crônica de Eusébio, continuando-a até 378. vimento religioso do século XVI. Ataques e defesas de pro-
Outros continuadores da mesma Crônica foram Próspero tes tantes e católicos obrigaram os contendores a estudar a
de Aquitânia, Isidoro de Sevilha e Beda o Venerável. Rufi- história da Igreja.
no de Aquil éia verteu para o latim a História de Eusébio e A primeira obra monumental dos protestantes é a gran-
continuou-a até 395. Sulpício Severo escreveu, em estilo de EccIesiastica Historia (Basi!. 1559-74) dos centuriado-
clássico e com apreciação crítica, uma História ou Crônica res de Magdeburgo. Em oito volumes trata dos primeiros
sacra que, começando com o princípio do mundo, vai até treze séculos da era cristã. Foi redigida em Magdeburgo
400 d. C. A Crônica ou Hisloriarum libri VII adversus por uma associação de eruditos, a cuja testa se achava Fl á-
paganos, de Orósio, começa igualmente com o principio do cio Ilírico. Os autores visavam descobrir os principios, pro-
mundo e termina com o ano de 416. A obra, de tendência gressos e crimes do anti-cristo, i. é, do papado. Desta for-
apologética, foi composta a pedido de S. Agostinho. Agos- ma, a obra veio a ser necessàriamente uma caricatura da
tlllho, por sua vez, escreveu a grandiosa De Civilale Dei, história, causando grande sensação em toda parte.
pela qual influenciou a historiografia de toda a idade-média. Contra os centuriadores surgiu logo o mais vigoroso
Cass iodoro (t 575), na sua His/oria triparti/a, muito esti- defensor da verdade histórica, o oratorian o Cesáriu Barônio
mada na idade-média, oferece-nos um resumo de Sócrates (t 1607) , desde 1596 cardeal e pouco depois bibliotecário
Sozômeno e Teodoreto e uma continuação dos mesmos au~ do Vaticano. Nos doze volumes dos grandiosos Annales
tores até 518. Rufin o e Cassiodoro são, no essencial, os eeelesiastie; trata outros tantos séculos da história da Igre-
mestres de toda a idade-média, quanto à história da anti- ja, terminando com o ano de 1198. A primeira edição foi
guidade cristã. feita em Roma (1588-93). Ainda em vida de Barônio se
S. jcrônimo nos deu a primeira história da literatura fez uma edição em Mogúncia (1601-05), e uma terceira saiu
cristã, De viris illustribus, continuada por Genádio, Isidoro à luz em Antuérpia (1589-1612) .
,
de Sevilha e Ildefonso de Toledo. 23. A Eeclesiastica Historia e os Annales Eeclesiastici
i ficaram, por longos decênios, as únicas fontes para os es-
21. Na idade-média, história eclesiástica e história pro-
fana quase que não se distinguiam. A maior parte das obras
,
f
tudos e controvérsias dos partidos opostos. E' só na épo-
r
trata de assuntos particulares. Assim Gregório de Tours ca de Luis XIV que a historiografia recebe nOVOs impul-
\ . sos; e é a França que então marcha à frente. Grande nú-
(t 594) escreveu a história dos francos, Isidoro de Sevi- ),
lha (t 636), a dos visigodos, vândalos e suevos. Beda o mero de religiosos, maurinos. oratorianos, dominicanos, fran-
Venerável (t 735) é O pai da história inglesa, e o histo- ciscanos e jesuítas, dedicaram-se com. ólimos resultados ao
riador dos longobardos é Paulo Diácono (t 799). cultivo dos diversos ramos da história eclesiástica, estabe-
Importância geral têm a Historia tripartita do douto lecendo as regras do método crítico-histórico, publicando as
24 Introdução § 5. O desenvolvimento da historiografia eclesié.stica 25

obras dos Santos Padres e redigindo histórias particulares Hegel. A Igreja antiga é considerada como produto de fa-
e universais. Maior renome tiveram Alexandre Natalis, O. P., tores naturais. Nega-se a ação da Providência divina. Os
Cláudio Fleury e Tillemont; mas as suas obras ressentem- representantes principais desta escola são Baur (t 1860),
se infelizmente do espírito galicano. Os franciscanos Antô- Ofroerer (t 1861) que por estudos intensos conseguiu ven-
nio e Francisco Pagi fizeram uma crítica à obra de Barô- cer os erros do racionalismo e se converteu ao catolicismo
nio, corrigindo-a e completando-a. (1853), Hilgenfeld e, mais do que todos, A. Harnack
24. Na Itália granjearam grande renome: o cardeal cis- (t 1930).
terciense Oiov. Bona, o cardeal jesuíta Pictro Sforza Pal- Entre os católicos, o novo florescimento foi iniciado
lavieini, os irmãos Pietro e Oiro lama Ballerini, Luís Antô- pelo conde Frederico Leopoldo de Stolberg (t 1819). A
nio Muratari, o cardeal dominicano José Agostinho Orsi, o sua História da Religião de Jesus Cristo que, em quinze vo-
arcebispo João Domingos Mansi e, principalmente, o ora- 1umes, trata os quatro primeiros séculos até 430, "respira
toriano Odorico Rainaldo, continuador de Barônio. uma unção verdadeiramente religiosa e tem a inspiração
Na Espanha e em Portugal fizeram-se, sobretudo, co- de uma alma profundamente convertida". A obra foi con-
leções de fontes históricas. Mas não faltam também exposi- tinuada por Kerz (30 vol.) e Brischar (8 vol.) até 1245.
ções de história eclesiástica. Uma obra monumental de 51 Em seguida, distinguiram-se Katerkamp (t 1834), Moehler
volumes é a Espana Sagrada, começada por Henrique Fló- (t 1838) e Doellinger (t 1890). Hefele (t 1893) escre-
rez, eremita de S. Agostinho, e continuada por diversos his- veu uma àtima história universal dos concílios (I-VII,
toriadores. 1855-74), continuada por Hergenroether (VIII-IX, 1887-
25. Na Alemanha, internamente dilacerada pela revo- 90). O mesmo Hergenroether (t 1890), cardeal desde 1879,
lução religiosa do protestantismo e pela guerra dos trinta deu-nos um manual que revela admirável erudição. A obra
anos, o cultivo das ciências estava quase completamente pa- foi melhorada e, depois da sexta edição, transformada e
ralisado. Só no século XVIII é que despertou de novo al- novamente editada por J. P. Kirsch. Bons compêndios fi-
gum interesse científico. Infelizmente, entre os católicos não zeram Ritter (t 1857), Alzog (t 1878), Kraus (t 1901),
foi possível uma historiografia profícua, devido ao espírito Brueck (t 1903), Funk (t 1907), cuja obra foi melhora-
galicano-josefinista, enquanto que entre os protestantes do- da e publicada recentemente por BilJlmeyer, Knoepfler (t
minava o espírito flaciano. Além disso, o racionalismo do ~ 1921), Marx (t 1924) e outros.
, I I 26. Na França, Itália e Inglaterra saíram à luz, duran-
esclarecimento fazia-se sentir, cada vez mais. Alguma ce-
lebridade tiveram os protestantes Mosheim, Semler e te o século XVIII e princípio do século XIX, algumas obras
Schroeckh. de importância parcial. Quanto à história universal, poucos
Com a época dos românticos, 110 princípio do século esludos de valor ali se fizeram. Só no fim do século XIX
XIX, começou, porém, um novo florescimento dos estudos e mais ainda nestes últimos decênios, também nestes paí-
históricos, promovidos particularmente pelo claro conheci- ses se tem cultivado com grande sucesso a historiografia,
mento do método histórico e por edições importantes de fon- sobretudo na França, onde se distinguiu Rohrbacher, cuja
tes. Até os protestantes começaram a tratar a história da Hisloire universelle de I'Église catllOlique (29 vaI.) é supe-
Igreja com maior equidade e imparcialidade. Sejam men- rada ainda pela, infelizmente pouco crítica, Histoire général
cionados só os nomes de Planck (t 1832) e de seu discí- de l' Église de Darras, continuada por Bareille e Fàvre
pulo Neander (t 1850), Kurlz (t 1890), Hase (t 1890) e I (44 vo1.).
lIerzog (t 1882), cujos manuais foram muito apreciados. Um dos maiores historiadores dos nossos dias foi Du-
No entanto, domina nas escolas protestantes até hoje chesne (t 1922). Mas a Histoire ancienne de l'Église, pu-
a historiografia racionalista, iniciada por Mosheim, desen- blicada com o seu nome, foi posta no Índice. Duchesne
volvida por Sem ler e influenciada pela filosofia panteista de submeteu-se humildemente (AAS 1912, 56; 103). Também
------.- -------- ''':1-------------..,.-------,..----.. .
26 Introdução

Batiffol, discípulo de Duchesne, goza de boa rep utação.


Cabro l é considerado como o historiógrafo mais insigne da
França moderna . Especial menção mereCe aqui a Bibliolhe-
que de l' enseignemenl de l' histoire ecclésiastique.
Na Bélgica, os neo-bolandistas têm a sua sede. Cau-
chie (t 1922) e Ladeuze fundaram o colégio da história
eclesiástica na universidade de Louvai na, com a Revue
d' hisloire ecclésiasliqu e, publicada desde 1900.
Os manuais mais usados em lingua francesa são os de
Rivaux, Marion e Lacombe, Poul et e jacquin. Obras mais
A ANTIGUIDADE CRISTÃ
volumosas criaram Mourret 1 Dufourcq, Poulet e outros mais.
Fl iche e Martin começaram a edição duma Histoire de I'Égli-
se que abrangerá 24 vo lumes. PR IMEIRA ÉPOCA
27. Na In glaterra começou Hughes a edição duma vo-
lumosa Hislory of lh e Church, cujo primeiro volume apa- DESDE A FUNDAÇÃO DA IGREJA ATÉ AO
receu em 1934. Na Hola nda, finalmente, saiu o manual do EDITO DE MILÃO (1-31 3)
jesuita Albers, que em 1926 teve a sua 5.' edição e foi tra-
du zido para o latim, ita liano e francês. No mesmo a no apa-
rece u a I.' edição do manual de De jong, atualmenle a r- CAP iTULO I
cebispo de Ut recht e cardeal. Em 1938, saiu a 3.' edição
e m quatro volumes. FUNDAÇÃO, PROPAGAÇÃO E PERSEGUiÇÃO
Considerando toda esta imensa literatura da história DA IGREJA
eclesiástica, ad miramos o muito que já se fez. Mas é mis-
ter confessar que muitas questões particulares ainda não § 6. Preparação do mundo para o cristianismo
foram suficientemente elucidadas. Seria muito para dese-
jar que os teólogos se dedicassem com maior carinho ao 28. Jesus Cristo é o centro da história. Sentem-no e
estudo dos múltiplos problemas da história da Igreja, por- dizem-no os homens pelo simples fato de dividi rem as gran-
que, como diz o cardeal Hergenroether, sem a história da des épocas da história num tempo antes de Cristo e nu m
Igreja não há conhecimento perfeito do cristianismo. tempo depois de Cristo. Como Verbo do eterno Pai criou
o mundo e os homens. Fez-se homem Ele próprio para, co-
mo Homem-Deus, fazer- nos par ticipantes da sua vida di-
vina. Esta santificação do gênero humano pelo Cristo his-
tó rico e a continuação da sua obra salvadora pelo Cristo

I
místico, a Ig reja, é a última e a mais profunda razão de
toda a his tória.
No entanto, Cristo, histórico c místico, não veio ao mun-
do sem preparação. Apa receu, segundo as palavras de
S. Pau lo, na "plenitude dos tempos" (Gál 4, 4; Ef I, 10),
i. é, quando a humanidade estava preparada para o rece-
ber. Tal preparação realizou-se essencialm ente na história
do povo hebreu, como também na história do paganismo.
§ 6. Preparação do mundo para o cristianismo 29
28 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão
ros. Mais odioso ainda tornou-se Antioco IV Epifanes
A) Preparação do povo judeu (175-54), que lançou mão de todos os meios para heleni-
29. A verdadeira religião, a fé no Messias prometido, zar a Palestina. O heróico sumo sacerdote anias foi depos-
é o mais precioso dom que Deus fez aos homens. Para con- to. Em toda parte levantaram-se altares dos deuses. No pró-
servá-la intacta, Deus não se fiou totalmente na reminis- prio templo de Jerusalém foi dedicado um altar a Júpiter.
cência dos patriarcas e na sua retidão; mas Ele mesmo a culto judaico e a observância da lei mosaica, em parti-
veio, repetidas vezes, ensinar a sua lei e castigar os trans- cular a circuncisão, foram proibidos sob pena de mOrte. Um
gressores. Depois do dilúvio" quando, de novo, "toda a car- ginásio foi erguido com a finalidade de implantar o espi-
ne havia corrompido os seus caminhos" (Gên 6, 12), cha- rita pagão. Epifanes conseguiu, de fato, que muitos judeus
mou a Abraão, separou-o dos outros homens e o fez pai apostatassem. Mas, de outro lado, não faltaram mártires
de seu povo escolhido, destinado a guardar fielmente a fé que deram provas magnificas da sua fé e do seu heroismo.
dos patriarcas. 32. E ai não parou a resistência. A perseguição des-
Ele mesmo quis ser chefe deste povo. Moisés, Josué e pertou o zelo e o heroismo dos macabeus. a sacerdote Ma-
os juízes não foram, senão chefes subalternos dum gover- tatias e seus cinco filhos restabeleceram a independência da
no puramente teocrático. Em seguida, o povo pediu-lhe um nação. Simão obteve plena liberdade. a sumo sacerdócio
rei, como tinham os outros povos. Deus lho concedeu. Po- e o principado foram declarados hereditários na sua fami-
rém, mesmo assim não deixou de governar o seu povo, deu- lia (2 Mac 14, 27 ss). Começou com isto a dinastia dos
lhe um tribunal próprio para conservar o depósito sagrado Asmoneus (142 a. C.). Sucederam-lhe seu filho João Hir-
e enviou os seus profetas para, por meio deles, manifestar cano I (135-05), Aristobulo I (105-04), Jônatas Alexandre
as suas ordens, esclarecer, mais e mais, o plano da salva- (104-78), o primeiro a tomar o título de rei, e Alexandra
ção e indicar a vinda do Messias prometido. (78-59), viúva de Jônatas.
30. Entrementes, o reino de Israel, não escutando a Entre os filhos de Alexandra, Hircano II e Aristobulo
voz dos profetas, entregou-se aos excessos da idolatria. Por II, rebentou a guerra civil. Ambos invocaram o auxílio dos
isto, Deus permitiu que Salmanasar IV levasse as dez tri- romanos que, chefiados por Pompeu, invadiram o pais (63).
bos do norte ao cativeiro da Assíria (722). Desde então César confirmou Hircano como sumo sacerdote (48) e,
desapareceram da história. Também o resto do povo eleito, obrigando-o a reconhecer a dominação romana, nomeou-o
Judá e Benjamim, desobedecendo ao Scnhor, foi levado por etnarca. Em seu lugar governou o idumeu Antípater, cujo
Nabucodonosor ao cativeiro da 8abilônia (601). Mas este filho Herodes foi, enfim, nomeado pelos romanos rei da Pa-
povo resistiu a todas as crises da sua história. Ciro, rei da lestina (40). a cetro de Judá passara a um estrangeiro.
Pérsia, deu-lhe a liberdade. Grande parte, porém, preferiu 33. A nação ainda se manteve por um século inteiro.
permanecer na Babilônia, e desta forma houve uma divisão Herodes, em tudo dependente da graça de Augusto, mas
em judeus da Palestina e judeus da Diáspora. déspota e cruel para com seu povo, morreu no ano 4 antes
31. A Palestina fícou sendo dominio de Alexandre da nossa era. Seu reino foi dividido. Arquelau, digno filho
Magno que fez em pedaços o reino dos persas. Depois da do tirano, foi instituido etnarca da Judéia; mas, acusado
morte de Alexandre (t 323), o país obedeceu aos Ptolo- perante Augusto por suas crueldades, foi desterrado para
meus do Egito. Mais tarde, Antíoco III, rei da Síria, ex- Viena nas Gálias (6 d. C.). A Judéia ficou unida à pro-
pulsou os egipcios (198 a. C.). Como Alexandre e os Pto- víncia da Síria e governada por procuradores romanos. Fi-
lomeus, assim também Antíoco tratou os judeus com bene- lipe (t 30 d. C.),mais henigno e pacifico, recebeu a Ba-
volência. Não assim os seus sucessores. Seleuco IV (187- tanéia, a Ituréia e a Traconitide na qualidade de tetrarca.
75) ordenou ao seu primeiro ministro, Heliodoro, que fos- Herodes Antipas, assassino de S. João Batista (FI. Jos.,
se confiscar o tesouro do templo de Jerusalém, ofendendo Antiqu. 18, 5, 2), tetrarca da Galiléia e Peréia, uniu, de-o
profundamente os sentimentos religiosos dos judeus since-
30 J época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 6. Preparação do mundo para o cristianismo 31

pois da morte de Filipe, os domínio&- dele com a sua he- Procurando sacudir novamente o jugo dos romanos, se-
rança primitiva. Mas acusado por Agripa I, seu sobrinho, guiam duas tendências. Uns esperavam a libertação unica-
foi deposto pelo imperador Calí gola e desterrado para Lião mente da Providência divina; outros, os zelotas, conside-
nas Gálias (40 d. C.). ravam o jugo estrangeiro como essencialmente contrário aos
Agripa I, educado em Roma e companheiro de Calí- privilégios do povo escolhido e estavam, por isto, sempre
gola em todas as suas devassidões, foi por este instituído prontos a levantar revoluções.
rei de toda a Palestina. Mostrou-se servidor fiel de Roma e, Quanto à doutrina, acentuavam demasiadamente a tra-
para granjear também as simpatias dos judeus, moveu uma dição oral e pregavam um sem-número de preceitos mosai-
perseguição sangrenta contra os apóstolos. Mas pouco de- cos e tradicionais, pelo que a sua vida religiosa veio a ser
pois, sofreu terrível morte (t 44). Com prazer aceitara a um mesquinho formalismo, que nutria o orgulho, a hipocri-
ímpia bajulação do povo: "Dei voces, non hominis" (At 12, sia e o amor-próprio. Eram eles os verdadeiros chefes
22). Cinco dias depois, expirou entre horríveis convulsões do povo.
(FI. Jos., Antiqu. 19, 8, 2). Toda a Palestina foi submetida 36. Osesseus (segundo Filo) ou essênios (segundo Jo-
então ao governo dos procuradores romanos que, por seu sefa, An!. 18, 1, 5) eram uma espécie de ordem religiosa.
despotismo sobremaneira cruel, provocaram a guerra judai- Como os saduceus e fariseus reduzem a sua origem ao tem-
'ca (66-70), e esta, finalmente, pôs termo à nação. po dos macabeus e seleucidas. Durante as guerras de Ma-
34. Enquanto, politicamente, o povo escolhido ia per- tatias e seus filhos, muitos refugiaram-se no deserto de En-
dendo, mais e mais, o seu poder e a sua independência até gadi, onde levavam uma vida ascética e observavam, na
extinguir-se a nação, dividiu-se, no campo religioso, em vá- maioria, o celibato. Obedeciam à lei mosaica. Mas não to-
rios partidos. Os saduceus, os liberais daquele tempo, men- mavam parte no eulto do templo. Cristo não teve contacto
cionados pela primeira vez pelo ano de 150 a. C., observa- com eles. Na Sagrada Escritura não são mencionados.
vam a lei mosaica, mas muito arbitràriamente a explicavam. Seita semelhante eram os terapeutas do Egito. Filo des-
Não aceitavam a tradição, nem acreditavam na imortali- creve-a em De vila contemplativa. Levavam uma vida mis-
dade da alma, nem na ressurreição dos corpos. Negavam tico-ascética; mas não têm nada de comum com os primei-
também a Providência divina. Eram deístas. Pela maior par- ros monges cristãos, como opinava Eusébio (HE 2, 16-17).
te pertenciam à sociedade aristocrática da nação e procura- 37. Os samaritanos, finalmente, eram judeus que, du-
vam manter boas relações com as respectivas autoridades rante o cativeiro de Israel, tinham ficado na Palestina, mis-
do país, não tendo, por isto, grande influência entre o povo. turando-se com os gentios imigrantes. Não eram considera-
35. Os fariseus entram na história igualmente no tem- dos como verdadeiros israelitas. Excluídos da construção do
po dos macabeus e têm a sua origem provàvelmente no par- templo de Zorobabel, edificaram outro templo ao sul de Ga-
tido dos hassideus, "que eram dos mais valentes de Israel rizim. Entre os livros da Sagrada Escritura aceitaram so-
e todos zelosos pela lei" (1 Mac 2, 42). Não devem, po- mente o pentateuco. Professavam o monoteísmo. Conserva-
rém, identificar-se com estes. Segundo Josefa (An!. 13, 10, vam também a esperança do Salvador, e mostraram-se, des-
5-6) o partido formou-se durante o reinado de João Hirca- de o princípio, favoráveis ao cristianismo.
no. Por motivos religiosos, bastante egoístas, opuseram-se 38. Desde os cativeiros assírico e babilônico, muitos ju-
à política deste príncipe, e foram, em seguida, uma das deus encontraram-se fora da Palestina. Muitos também fo-
causas da guerra fratricida entre Hircano " e Aristobulo, ram deportados para o Egito. Outros deixaram a sua pá-
que levou à perda da autonomia nacional. Abandonando a tria, movidos pelos horrores das guerras que se seguiram
dinastia indígena, julgavam conseguir mais fàcilmente os à morte de Alexandre Magno. Outros ainda, fascinados pe-
seus interesses debaixo dum domínio estrangeiro. Mas isto los lucros do comércio, foram estabelecer-se nos grandes
causou a sua decadência. centros do império. No tempo dos apóstolos, achavam-se'
-32 I épo ca : Desde a fu ndaç ão da Igreja ao Edito de Milão
§ 6. Preparação do mundo para o cristianismo 33
judeus espalhados quase em todo o mundo (elr. AI 2, 9-11) .
Eslrabão escreve que no mundo inteiro não era fácil acha r giosos e temen tes a Deus" do Novo Testamento (At 10,
lugar que não lhes tivesse aberto as suas portas (FI. Jos., 2; 13, 50; 16, 14) , nos quais o cristianismo encontrou um
An!. 14, 11 5). São os judeus da Diáspora. A eles se diri- terreno bem preparado. O Evangelho oferecia-lhes o que o
gia S. Paulo, nas suas viagens. Particula rmente numerosos coração pedia, suprimindo as cerimônias que eles aborre-
era m na Siria e no Egito, onde se encon travam já nos tem- ciam. Desta maneira, o judaismo tornou-se testemunha da
pos de Jerem ias (J er 44, 1). Alexandre Magno concedeu- Igreja católica no momento em que esta estava para tomar
lhes estabelecerem-se na nova capital, Alexandria, onde, no o lugar da sinagoga.
tempo de Filo, o seu número orçava por dois quin tos da
FI. / os., Opera, ed. Niese, Be roli ni ] 885-95. - Philonis opera,
população. Também em Roma formou-se, desde os dias de ed. Cohn, Wend la nd, Reite r. 8 vo l. 1898- 1930. - Doe/linger, Hei-
Pompeu , uma numerosa colônia juda ica. dentum und judentum , Vorh alle zu r Geschichte des Christentums,
Hegensburg 1857. - Felten, Neutestam. Zeitgeschichte, 2 vol., Re~
39. Estes judeus da Diáspora , chamados helenistas , re- gensburg 1910; trad . ital. Storia dei tempi dei Novo Testamento,
conhecia m o sinédrio como a utorida de religiosa e ficavam 4 v..ol., T orino 19 13-14. - SChuerer, Geschichte des ju edischen Vai.
em união com os judeus da Pa lest ina por meio de peregri- kes, 4. ed . Leipzi g 1901-09. - Lagrange, Le Ju daisme avant Jesus-
Cheist, P aris 193 1. - Moore, jud aism in the first cent !.lri es of the
nações e do tributo que pagava m ao templ o. Aceitaram, po- christian era , 3 vo l., Cambridge 1927-30. - Trotti, Fílone Alessan-
rém, no decorrer dos tempos, Iingua e costumes dos gen- drino, Homa 1932. - Hc epers, Der neue Bund bei den Proph eten,
tIOS . E corno já não mais compreendessem a língua da Sa- Fre iburg 1933. - Ceppi, História do povo de Israel, Petrópolis 1946.
grada Escritura, foi necessário traduzi-Ia para o grego . A
empresa fo i iniciada no reinado de Ptolomeu II Filadelfo B) Preparação do paganismo
(285-47 ) e executada, segu ndo antiga tradição, po r 72 dou- 41. O mundo pagão foi preparado para a vinda do
tos. Dai o nome de "Septuaginta" . Foi uma obra verdadei- Salvador não só pelo contacto com os judeus, como tam-
ram ente providencial que, por ~ ua vez, exerceu um influxo bém por outros fatores. Esta preparação se fez, antes de
benéfico entre os gentios, ensinando-lhes, em particular, o tudo, nega tivamente, no ca mpo religioso, moral e fil osófico.
monoteismo da religião revelada, a idéia de Deus que nem A religião pagã, noS últimos tempos da re pública romana,
a filosofia, nem o gênio relig ioso podia conceber. estava desacreditada em la rgas camadas da sociedade. Ora ,
Outro ponto de contacto entre judeus e pagãos veio a onde não há religião, não pode ha ve r moralidade. T ambém
ser a filosofia helênico-judaica, cujo represe ntante mais emi- a filosofia , qu e só para as classes superiores podia substi-
nente foi o célebre Filo (t 39 ). Por meio da exposição tuir, até certo ponto, a religião, havia caido em completa
alegórica que ele fez do Antigo T esta mento, conseguiu har- dissolução . E precisamente esta bancarrota da religião, da
monizar as idéias religiosas do judaismo Com elementos da moralidade e da fil osofia preparo u o caminho para o cris-
fil osofia platónica, es tóica e neo-pitagórica. tianism o.
.. 40. Influenciados a ssi m pelo ambiente pagão em que 42. Pela revelação di vina e pela luz natural da razão,
VIVIam, os Judeus mfluenciavam, por sua vez, os gentios os homens tinham chegado ao conh ecimento de Deus. "Mas
atraindo-os à sua lei. O desprezo com que estes os olha~ conhecendo a Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe
vam fa zia, é verda de, com que pOlICOS se decidi ssem a pa s- dera m graças... Mudaram a glória de Deus incorruptível
sar ~o juda~sm o e entrassem em sua comunhão por meio em semelhança de imagem de homem corruptível e de aves
da CIrCUnClsao. Eram chamados prosélitos. Mas o conceito e de animais de quatro pés e de reptis" (Rom 1, 21-23).
ma is nítido de Deus, a solenidadê- do culto, a moralidade O politeísmo, ao declinar da era antiga, dominava toda a
mai s elevada tiveram por consequência que um número con- vida pública e privada. Nas Indias Orientais, depois da re-
siderável de gentios se dispusesse a aceitar o monote ísmo ligião antiqui ssima dos Vedas, Brama, um deus impessoal,
e a tomar parte no culto da sinagoga. São estes os "reli- era reconhecido como deus sup re mo, criad or do mund o, dos
deu ses e de todos os seres. Brama, por seu turno, cedeu o
Compêndio I - 3
34 J épo ca: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 6. Prep aração do nll1ndo para o cri stianismo 35
lugar ao budismo, religião do nirvana, sem Deus e sem vi- queza era virtude, pobreza era ignominia . Pior ainda era a
da futura. Na Pérsia adorava-se Mitras; no Egito, isis e sorte dos escravos, cujo número era realmente espantoso.
Os iris-Se rápis. Na Frigia venerava-se a Magna Mater Cibi- Não eram considerados como homens, mas como coisa bru-
le e Atis. Na Siria faziam-se sacrificios aos diversos Baalim. ta. El1tregues ao arbítrio dos do nos, a sua vida não era,
Éfeso ado rava a grande Diana, e Delfos, o seu Apolo. Ro- muita s v ~ zes, senão um prolongado martírio.
ma, enfim, na idade áurea da sua literatu ra e das artes 45. a. Faltava a moralidade, porque faltava a religião.
erigill a todos os deuses o famoso Panteão. Mas estes deu~ As camadas inferiores da sociedade procuravam substituí-Ia
ses não elevavam a a lma; muitos eram personificações pelos mistérios do oriente e por toda sorte de superstições,
do vício.
astrologia, magia, teurgia, necromância (Tac., Hist. I, 22) .
E não bastava a inda. Criava m-se novas divindades. Ao As classes cuitas recorriam à filosofia. Mas também a fi-
lado do Estado diviniza do, o próprio imperador tornou-se losofia havia chegado a um estado de comp leta es tagnação.
alvo de honras divinas, sobretudo nas províncias orientais. Tinham-se sucedido as muitas escolas da Grécia, todas en-
Em toda parte ofereciam-se sacrifícios. Um cuito pompo- tre si diferentes: a escola jônica de Tales (c. 600) que pro-
so se exercia por um número considerável de sacerdotes. fessara uma filosofia naturalista ; a escola ascética de Pitá-
43. Mas tudo isto qua se não passava de puro forma- gora s (t 525), qu e ensinava: o fim último e a felicidade
lismo. Dúvidas e erros, os mais grosseiros, re inavam acerca suprema do sábio é a semelhança com a divindade e o meio
das verdades que ma is importam ao coração humano e Cons- necessário para ating i-Ia é a prática da virtude; a escola
tituem o fundamento da vida moral e in telectual. Bem acer- eleática de Xenófanes (t 480), que ensinara a unidade de
tadas são, portanto, as palavras de S. Paulo, que nos es- Deus, mas confundira Deus com o universo; a escola ato-
boça um quadro tão tétrico da moralidade de seu tempo mística de Demócrito (t 370) que chegara à conclusão de
(Rom I, 24-32). E, todavia, é ele o mais comedido entre que um Deus verdadeiro e imortal não existe.
todos quantos escreveram, na antiguidade, sobre este pon- b. Todas estas escolas tão diferentes entre si aplana-
to. Não se lê, de fato, sem horror o que nos dizem Salús- ram O cam inho à escola dos sofistas de Atenas, homens ve-
tio ( Bell. Cat. 12-13) e Sêneca (De ira 2, 8), Tácito e Ju- nais e sem convicções, que ensinavam aos jovens estudio-
venal, Suetônio e outros escritores sobre a degeneração mo- sos a arte de defender o pró e contra de todas as ques-
rai, a que descera o mundo pagão. A human idade estava tões. O interesse própr io lhes era norma suprema de ação.
dominada por um orgulho sem limites, uma cobiça desen- Contra eles surgiu a reação de Sócrates (t 399) com a es-
freada e um sensuali smo fe rino que sacrificava tudo, sem cola ética, Platão (t 348) com a academia, e Aristóteles
remorsos, aos seus desejos. (t 322), fundador da escola peripatética. Mas nem estes
44. E as condições da família, da mulh er e da crian- gênios da filosofia mundial deram resposta suficiente aos
ça? A fam ilia não era protegida pelo vínculo indi ssolúvel problemas que mais interessavam o coração humano: Deus,
do matrimônio.· O pai era senhor absoluto da família . O o mundo e o próprio "eu",
divór~ i o, dissolução do matrimônio patrício, era frequente ; c. Muito menos a podiam dar os discípulos de Epicuro
e malS frequente amda era o repúdio, dissolução do matri- (t 270), segundo o qual o supremo bem consiste no pra-
mônio plebeu. Sêneca afirma Que muitas mulheres _ e ele zer, e de Zenão (t 260), fundador da Estoa, que entrega-
fala das "illustres et nobiles féminae", - não co~tavam os va O mundo ao cego e invariável poder do fado. Outros
seus anos pelo número dos cônsules, senão pelo número dos ainda seguiam o ecletismo como Cícero e Sêneca. Outros
maridos (De benel., 3, 16). Tertuliano diz que as mulhe- pagavam tributo ao cepticismo, renuncian do por completo
res se casavam, para se divorciar (Apol. 6). Daí resultou ao conhecimento da verdade. A pergunta de Pilatos: "Que
o desprezo e a condição indigna da mulher e da criança. coisa é a verdade?" (Jo 18, 38) é um exemplo.
Também os pobres não tinham direito, nem consolação. Ri- d. A descrença dos eruditos e a superstição dos incuitos
3'
§ 7. Jesus Crislo 37
36 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão
da de Balaão : a estrela de Jacob acabara de despontar
são os resultados a que havia chegado, depois de tantos sé- (Num 24, 17).
culos, a pobre humanidade, entregue a si mesma, por se ter 4R. ne 11m modo muito prático, finalmente, o paganis-
esquecIdo de Deus. O coração do homem não se conten- mo foi preparado para o cristianismo pelas tendências de
tava, p~rque a felicidade não está no erTO e no vício. ja- unidade cm todos os campos da cultura. A cultura grega,
maIs deIxará de ser verdadeíro o dito de S. Agostinho: "Fi- fundalllento de toda a cultura ocidental, nascera na Jônia.
zestes-nos para vós, Senhor, e inquieto é o nosso coração ",,"x;Imlre Magno abrira-lhe o caminho para a Asia Menor,
até que repouse em vós" (Conf. I, I). E por isto, quanto " Slria e o Egito. Os romanos encontraram-na em toda par-
menos a cultura pagã satisfazia o coração humano, tanto k c, ajuntando o seu espírito prático, criaram a cultura
mais este se abria à verdade do Evangelho. grego-romana, que atingiu o seu apogeu no tempo do im-
46. No entanto, a filosofia, as religiões e mistérios do perador Augusto.
paganismo prepararam a humanidade para Cristo não so- A mistura dos povos e das suas opiniões filosóficas,
~ el1te nu~ sen tido negativo, senão também dum modo po- especialmente nOS grandes centros culturais, Roma e Ale-
SltIV? POIS, por mUItos que fossem os erros e abe rrações, xandria, teve por consequência uma certa uniformidade tam-
conhnham todavia alguns grãozinhos de verdade. A doutri- bém no culto. Acresce ainda a unidade politica e comercial
na de Sócrates, Platão e Aristóteles deixava entrever o mo- d o império com uma lín gua e uma administração e com os
noteísmo; e a moral de alguns sequazes da Estoa, Epicte- caminhos que ligavam o oriente e o ocidente. E esta unida-
to, Sêneca e Marco Aurélio, tinham pontos de contacto com de de cultura, culto e Estado reclamavam, por assim dizer,
a doutrina moral do Evangelho. A estes se refere, sem dú- a unidade da verdadeira religião.
vida, Clemente de Alexandria, quando eSCreve: "Assim co- E' este o sentido de todas as batalhas ganhas pelas
mo aos judeus fora dada a lei, a filosofia fora dada aos águias romanas: a paz de Augusto preparou o caminho para
gentios para guiá-los a Cristo" (Strom. 1, 5, 28). Cristo. Roma era aquela mulher do Apocalipse, cheia de abo-
minação, a grande Babilônia (Apoe 17,4-5). Ela havia de
47. Além disto, todo esse caos relig ioso-moral-filosó_ transformar-se em trono de Cristo, Rei dos séculos. A ca-
fico não con seguiu sepultar no esquecimento a antiquíssi- pital do mundo pagão seria capital do reino de Deus na
ma tradição do Sa lvador, prometido no paraí so ; mas fez terra.
com qu e todos anelassem e esperassem a vinda de um ser
Eus., Praeparatio evangelica , Mi g ne PG 21. - Aug., D~ civitate
divino que os livrasse. Já os oráculos indicavam um tempo Dei, Migne PL 41. - Doellinger ; F~lIen; Wendland, Dl e heJle-
de ouro, em que víria o Salvador. E as esperanças do povo nistisch-roemische Kultur in ihren Bezlehungen zum Judentum und
escolhido encontravam um eco também na literatura dos ro- Christenturn J 2. ed. Tuebingen 1912. - Nock, Conver~ion, th~ oId
and new in religion from Alexander the Oreat to Augustme af H1PPO,
manos. Virgílio canta: "Já chegou esta última idade pro- Oxford 1933. - Allevi, Ellenismo e Cristianesimo, Milano 1934. -:-
fetízada pela síbila cuméia. A grande ordem dos séculos já Liefzmann Geschichte der alten Kirche, I. Die Anfaenge, Berbn
1932. - ' Dawson, The making of Europa j tcad, alemã por I.
renasceu inteiramente. Apareceu a virgem e com ela o rei- Mu ehlenkamp, Leipzig 1935.
no de Saturno . .. Sob as suas leis, os últimos vestígios
dos nossos crimes ... serão para sempre apagados. " Esse § 7. Jesus Cristo
menino viverá a vida dos deuses ... , governará o universo
49. "Mas, quando chegou a plenitude do tempo, Deus
pacificado pelas virtudes de seu pai. .. " (Écloga 4, 4 ss).
enviou seu Filho, feito da mulher, feito sob a lei, a fim de
Tácito (Hist. 5, 13) e Suetônio (Vita Vesp. 4, 5) referem
remir aqueles que estavam sob a lei, para qu e recebêsse-
que, segundo antiga e constante opinião, este menino viria mos a adopção de filhos " (Gál 4, 4-5). Com es tas poucas
da terra dos judeus. Assim pensava-se e falava-se em Ro- palavras, o apóstolo indica a vinda, a origem e a missão
ma, quando no oriente apareceu aos reis ma "Os a estrela do Redentor. A sua vida e a sua obra são o fundamento
miraculosa que os conduziu a Belém. Cumpri~-se a profe-
38 I época: Desde a fund ação da Igreja ao Edito de Milão § 7. Jes us Cristo 39

da I g~eja: Tudo, pois, que sabemos de Jesus Cristo, p er- Jc"" nasccl1 an tes de 750 u. c. , talvez em 748-49 ou mes-
tence a histórIa da Ig reja. II10 enln' 747-4b.
. 5? a .. Em vão procurou uma critica radical negar a :)2 . Maior incerteza ain da há acerca do ano da morte,
vida . hlstó n ca de Cristo. Os livros do Novo Testa mento fon- punllIl' IIIIS aceita m uma ativid a de de três anos, basea ndo-
tes mconcussas, não admitem dúvida. Além disso e~ is te m 'I' no I'.v,, " gelho de S. João . Outros, a poiados nos s inópti-
argumentos irrefutáveis ta mbém na literatura pro'fana ju- cus, ft 'dllzern-na a um ano apenas. O precursor, S. João
daica e pagã. Flávio Josefo escreveu, pelo ano de 93 as lIali 81", começou a sua pregação no 15' ano de Tibério, e
suas "Antiquita tes ", cha mando a Jesus Cristo um h OI~ e m t]1I:IIId o logo em seguida ta mbém Jesus iniciou a sua vida
sabIO, taum a turg o, dou tor dos homens (An t. 18, 3, 3 ) . Se pilhlica, ti nha 30 a nos de idade ( Lc 3, 1. 23) . Mas qua l é
é ve rdade que Nlese nega a a utenticidade desta passa gem " te rmo, com q ue devemos começa r a contar os 15 a nos de
e out~os a rej eitam, ao menos e m parte, como interpola- Ti béri o? Tal vez o a no de 76 5 u. c., qua ndo fo i chamado
da, nao é menos verdade que vá rios au to res de b om reno- a ser co- im perado r ? 011 talvez o a no de 767, quando Au-
me, .como Kneller, defe ndem a Sua g enuinidade (SML 53, gusto fal eceu'! Neste caso, o 15' a no de Tibéri o teria sido
I ss, ~ 61 S8) . Fala ndo sobre a mor te de S. Tiago, o mes- o a no que correu desde Ag osto de 28 a té Agosto de 29.
mo Fla vIo Josefa chama -o irmão de Jesus, apelidado Cristo Al gun s SS. P adres d izem que Cristo morreu no 16' ano de
(Ant. 20, 9, I) . T ibério, ou seja no a no 29- 30 (Cfr. RE B 3, 95 ss).
b. Na li terat ura pagã encon tramos uma carta do s írio 53. De pois de uma vida oculta d e trin ta a nos , Jesus
Mara a seu filh o Se rapião, escrita entre 73 e 160. O auto r começou a sua pregação . Apresentou-se ao mu ndo como o
c o nfro~ta. Jesus Cristo Com Sócrates e Pitágo ras e o chama Homem- D eus e provou a sua div indad e por sua consciência
um rei sabIO, que depois da sua morte ain da vive na sua mess iâ nica, pelo cumprimento das p rofecias, pelos milag res,
lei. Plínio o Moço escreveu, p elo ano de 112 a sua célebre es pecia lme nte pela própri a gl oriosa ressurreição, pela san-
ca rta a Traj~no ( Ep. lO, 96), na qua l fala' de Jesus e de tidade de vi da e pela sabedor ia e ve rdade infa livel da sua
su a obra. O mesmo fa zem Tácito (c. 120), na sua narração doutrina .
sobre a perseguição neronia na (A nna l. 15, 44), e Suetônio, 54. A pregação do di vino Salvador visava um dupl o
amigo de Plínio (Cla ud . 25 ; Ne ro 16 ). fi m. E le vp.io, an tes de tud o, para ensinar ao s homen s a ver-
c. Apócrila é, no entanto, a preten sa corres pondência dadei ra religião. Primeiro ma nda mento desta religião é o
e~ t re Jesus Cristo e o toparca Abgar de Edessa, que Eu- a mor de Deus e do próximo. Fonte do a mor é a vo ntad e.
seb~ o enw ntrou no arquivo desta cida de ( HE I , 13) e que A relig ião de Cri sto exig e, portan to, a intenção interna, re-
~sta contida também na Doutrina de Adeu . Apócrifos são jeita o forma lismo de fa ri seus e pa g ãos e não adm ite polí-
Ig ualmente os ch a mados Acta Pi/ati e uma ca rta de Lêntul o tica c mesquinho naciona lismo. E' ve rdade que Jesus pre-
ao senado de Roma. gou sóme nte aos jude us, mas a sua doutrin a era destinad a
51. O nascimento de Jesus Cristo é um fa to único na pa ra todos os homens e pa ra toclos os tempos.
hi s tória. DeliS nasce como homem no mundo. Todavia en- 55. Jesus veio, em seg undo luga r, pa ra fundar a socie-
q~ a nto que co nhecemos tão bem as da tas de outros hO~l e n s dade relig iosa de seus discípulos. " Veio pa ra o que e ra seu;
celebres, do Homem -Deus não con hecemos nem o a no do mas os seus não o recebera m" (]o I, I I). Os fari seu s hi-
naScime nto, nem a duração da sua vida p ública, nem o ano pócritas sentira m-se humilhados e ind ignados por suas
da s.ua morte; e tal ~ez nun.ca te remos cla reza neste ponto. admoestações e repreensões . Os saduceus indife renles e ma-
? computo de DlOfllSlO EXJguo é certamente errôneo. Pois terialistas despreza vam um re ino que não era deste mun-
e certo que Herodes, assàssino dos Inocentes (Mt 2, 15) , do. E esta indig nação e este indiferentismo acabaram por
morreu em 750 u. c. (Jos., Ant. 17, 8, 2; Bell . Jud . I, 33) ; inflamar um ódio mortal que chegou, finalmente, a realiza r
portanto, quat ro anos antes da nossa era. Por conseguinte, os desíg nios da Providência divina na cruz do Ca lvá rio.· Com
§ 8. A Igreja de Jerusalém 4\
40 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão
_ WilJam, Das Leben Jesu im Lande und Volke Israel, Freiburg
a morte de Je~~s termina a antiga aliança; a nova entra 1933; trad. port., Pelrópolis 1939. - Lepin, L. Christ Jésus, son
em seu lugar. A todos, porém, que o receberam deu po- existence historique e 5a divinité, Paris 1929, - Prat. Jêsus-Christ,
der de s~, tornarem fílhos de Deus, àqueles que ~rêem em 2 vol., Paris 1933. _ Holzmeister, Chronologia vitae Christi, Ro-
seu nome (Jo I, 12). Estes são separados do povo judeu ma. 1933.
e com eles todos .os homens devem formar uma só família: § 8. A Igreja de Jerusalém
da qual Jes~s Cnsto n,tesmo é chefe e Pai. E' este o ele- 58. Depois dos sublimes momentos que se seguiram à
mento matenal da IgreJa, a sociedade visivel. ressurreição de Jesus, os apóstolos dirigiram-se para a Ga-
56. ~m seguida, o divino fundador deu à sua Igreja a liléia, onde, segundo as palavras do Mestre divino, Ele se
org~mzaçao, escolhendo os setenta e dois discípulos e es- lhes manifestaria em corpo e espírito (Jo 21, lss). Real-
pecialmente os doze apóstolos. Instituiu-os como sacerdotes mente assim aconteceu. As aparições repetiram-se, e duran-
do Novo Testamento, doutores e juizes dos povos, dizendo te as mesmas Jesus instruiu os futuros pregadores do seu
a ,eles e 80S seus sucessores: "Fazei isto em memória d Evangelho a respeito da sua santa missão. Finalmente, suhiu
mim" (Lc 22, 19); "Ide por todo o mundo e pregai o Evan~ com eles ao monte das Oliveiras, abençoou-os e remontou
gelho a toda criatura" (Me 16, 15); "Tudo o que ligardes ao céu.
sobre a terra, será ligado também no céu, e tudo o que Os apóstolos voltaram ao cenáculo de Jerusalém, onde,
deslIgardes sobre a terra, será desligado também no céu" com Maria Santissima, algumas piedosas mulheres e outros
.~Mt 18, 18). Sancionou. também a sua instituição, dizendo: discípulos, perseveraram unânimemente na oração. Ao todo
? que vos ouve, a mim ouve, e o que vos despreza a eram cento e vinte pessoas. Na Galiléia viviam ainda outros
~lm despreza". (Lc 10, 16). Desta forma, a Igreja é ess~n­ quinhentos irmãos. No cenáculo prepararam-se os apóstolos
clalmente dividida em docentes e discentes com os outros fiéis, pelo espaço de dez dias, para a vinda
Finalm.ente, Jesus instituiu S. Pedro ~omo fundamento do Espírito Santo (At 1, 13).
e chefe ~,~,vel da sua Igreja: "Tu és Pedro, e sobre esta Um dia, S. Pedro disse: "E' preciso que o apostola-
pedra edlflcare~ a minha Igreja" (Mt 16, 18); "Apascenta do de Judas passe a um outro" (At 1, 15 ss). Sob a sua
os meus ~ordelTos, apascenta as minhas ovelhas" (]o 21, presidência, os apóstolos elegeram Matias, completando o
15-17). So neste. fundamento e supremo chefe visivel COI1'- número dos doze. S. Pedro começa, portanto, já no cená-
servar-se-Ia a umdade da Igreja; só assim seria perfeita a culo, a exercer a supremacia que Jesus Cristo lhe conferira.
sociedade religiosa. Os apóstolos e todos os fiéis reconhecem-no como chefe.
57. Esta Igreja é a continuação da vida de Jesus Cris- 59. a. Cinquenta dias tinham decorrido depois da res-
to e da obra da salvação. A vida de Jesus teve por fim surreição de Jesus Cristo. Em Jerusalém celebrava-se a fes-
um fracasso aparente, a morte na cruz. A Igreja participa ta de Pentecostes, que atraía uma multidão imensa de po-
da sua cruz. Ao lado de grandes triunfos haverá sempre vo. De repente, desencadeou-se uma tempestade. Os após-
sofnmentos e perseguições; ao lado de santidade e de vir- tolos oravam. Chamas apareceram no ar e, em forma de
tudeT haverá sempre abuso e relaxação. Em toda a h'ISt6 na, . línguas de fogo, pararam sobre a cabeça de cada um. To-
ve~1 lca-se a .luta entre a luz e as trevas, entre o reino de dos ficaram cheios do Espírito Santo. Com a sua luz e com
CflStO. e o reino de Satanás. Mas o triunfo final pertencerA a sua graça seriam capazes de realizar a sua missão.
à _Igreja, porqu_e Jesus Cristo o disse: "As portas do inferno b. Logo em seguida, S. Pedro começou a pregar aos
MO prevalecerao contra ela" (Mt 16, 18). ,judeus, vindos de todos os paises, falando-lhes do Messias
Lorlz, 2. ed. 20 ss. - Grimm, 7 vaI., Regensburg 1876-99' crucificado e ressuscitado. As suas palavras foram ouvidas
3. e~ .. po~ Zahn, 1906-20. - Fi!lio~n, 3 vol., Paris, 2. ed. 1925. .-:. com verdadeira emoção. Naquele mesmo día, perto de três
~~Ptn:, FITenze 1922; ed. port., Sao Paulo 1929. - Fe/der Jesus
1g~~S US, ~derborn, 5. ed. 1923. - Reatz, Jesus Christus F~eiburg mil pessoas converteram-se e toram batizadas (At 2, 1-41) .
. - . eyenberg, Leben-Jesu-Werk, 3 vot, 1922-32 ~ Adam E' com o dia de Pentecostes que começa a história da Igre-
Jesus Chflstus, 5. ed., Augsburg 1938; trad. port., Petr6polis 1938:
42 I época : Desde a fund,a ção da Igreja ao Edito de Milão § 8. A Igreja de Jerusalém 43
ja no sentido próprio da palavra. A idéia dum reino na- da Igreja primitiva. Os helenistas, menos conhecidos e~ Je-
ciona l, que os apóstolos pouco a ntes ainda tinham exter- rusa lém, e, r or isto, fàcilmente pretendos na dlstnbUlçao de
nado (At I, 6), desapareceu. Entrou em seu lugar a idéia viveres, ' I"cixavam-se desta preterição. Como os apóstolos
do reino un ive rsal do Messias com seus valores sobrenatu- não pudessem mais atender a todas ás exi gê~cias. do s~u .
rais : penitência, batismo, remissão dos pecados, graça do mini st0rio, divieliram os trabalhos, para qu e nao so o pao
Espirito Santo. O Espírito Santo ia governar, desde então, do mrro, mas também o pão do espirito fosse distribuido.
a Igreja de Jesus Cristo.
Foram eleitos, por isso, sete varões, mais tarde cha-
60. Enquanto os peregrinos se espalhavam pelo mun- mados di áconos. Os após tolos, depois de orarem, impu se-
do e falavam aos seus da nova dou trina, o prestígio dos ram-lhes as mãos e instituí ra m-nos como seus auxilia res.
apóstolos ia crescendo, de dia para dia. Deus confi rma va a E les tin ham o enca rgo de servir aos pobres e de ajudar aos
s ua doutrina com muitos milagres. Entre eles tem maior im- .a póstolos ta mbém na pregação. Deste modo: os doze podiam
portância a cura do coxo de nascimento (At 3, 1-8). O po- con sagrar-se mais in tensivamente à pregaçao do Evangel~o.
vo que presenciou o milagre aglomerou-se em volta de S. O número elos discípulos multíplicou-se, de dIa para dIa.
Pedro e de seu companh eiro, S. João. O prín cipe dos após- Também muitos sacerdotes ab raçaram a nova doutrina (At
tolos aproveitou-se da ocasião para falar novamente ; e es- 6, 1 ss) .
te segunelo se rmão foi tão bem sucedido, que o número dos 63. No entanto, a popu la rida de de que gozavam os
cri stãos sub iu a cinco mil homens (At 4, 4).
apóstolos, e, de modo particu la r, o diácono S. Estêvão:
61. Esta primeira comunidade judeu-cristã não vivia se- não pod ia deixar de inquietar os homens da sin agoga. Ja
para da da sinagoga, nem interna , nem externamente. Os por ocasião da cura do coxo de nascimento, S. Pedro e S.
seus membros consideravam-se como cumprimento elo ju- João tinham sielo encarcerados . Em outra ocasiã o, todos os
daísmo, coroação do Antigo Testamento. Por isto, tomavam apóstolos tinham sido aprisionados. Mas um anJo vIera
parte no culto do templo e observavam a lei mosaica. Mas, ab rir a porta da prisão, e eles continuaram a prega r. Quan-
além disso, tinham as s uas próprias reuniões, que realiza- do, p ela segunda vez, todos foram metidos no cárcere e o
vam em casas particulares, perseveravam unânimes na dou- principe dos sacerdotes lhes proibiu a pregação, S. Pedro
trina dos apóstolos, na oração e na participação da "fração respondeu : "Cumpre obedecer antes a Deus que aos ho-
do pão", i. é, na celebração da Euca ristia e dos ága pes, ex- mens" (At 5, 29).
pressão da ma is perfeita fraternidade. A franqueza do apóstolo exasperou os juízes a ponto
Todos "tinham um só coração e uma só a lma. Nin- ele pedirem a morte dos doze. Só no meio do conselho, um
guém considerava como de sua propriedade os bens que único homem conservou-se tranquilo, Gama li el, cuja opinião
possuía; tudo entre eles era comum", A sua vida social era era acatada por toelos. Foi ele quem desta vez salvou a
um verdadeiro comunismo, um comunismo cristão. A histó- vida dos apóstolos (At 2, 34-39) . A lenda cristã faz Ga-
ria de JOSé ou Barnabé (At 4, 36-37) e de Ana nias e Sa- maliel converter-se ao cristian ismo (Clem. , Recogn. I, 65).
fira (At 5, 1 ss) exclui terminantemente o comunismo mo- 64. E ntrementes, a pregação de S. Estêvão levou o ódio
derno e ateu. Reconhecia-se a propriedade pa rticular, e nem dos sinedristas ao úl timo extremo. Não podendo resistir á
toda propriedad e se admini strava em comum , nem a repar-
sabedoria com que falava , arrastaram -no fora da cidade
tição era igual para todos. Cada um recebia conforme a sua para o a pedrejar. A autoridade judaica não tinha direito
necess idade (At 2, 42 ss; 4, 32 ss).
de dar sentença ele morte. S. Estêvão não fo i condenado;
62. Mas, de outro lado, foi precisamente neste campo fo i o furor do povo que o vitimou sob con ivência dos sine-
de a ss istência social-caritativa, que, pela primeira vez, se dristas. A sua morte foi O princípio de uma perseguição vio-
abriu aquele conflito entre judeus-cristãos da Palestina e lenta. Muitos cristãos loram la nçados ao cárcere e martiri-
helenistas, que ha via de afligir tão dolorosamente a vida "lados; muitos outros fugiram da cidade, d ispersa ndo-se pe-
44 J época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão

las terras da Judéia e Samaria. Só os apóstolos permane- § 9. Cristianismo helénico: S. Paulo. - A Igreja de Antioquia 45
ceram em Jerusalém (At 6, 8; 8, 1).
admissão incondicional dos gentios na Igreja. S. Paulo foi
65. A perseguição teve ótimos resultados a favor do destinado por Deus a libertar o cristianismo do jugo da lei
cristianismo. A aflição puriiicou a Igrej a, uniu mais estrei- mosaica, para abrir livre entrada a todos os homens
tamente os seu s membros e demonstrou-lhes bem claramen- (Lortz 23-24).
te a distinção entre a comunidade cristã e o judafsmo. Além
disto, como os primeiros ouvintes de S. Pedro, no dia de 67. a. Saulo, chamado mais tarde Paulo, nasceu em
Pentecostes, assim os cristãos, dispersos pelas cidades e Tarso, capital helênica da Cilícia, que nos tempos apostóli-
províncias, tornaram-se pregadores da f é cristã. S. Filipe cos se distinguia pelo comércio, pelas riquezas e pelas ciên-
pregou na Samaria, onde muitos aceitaram a palavra de elas. Seus pais, judeus que possuíam as regalias de cida-
Deus e foram batizados, pelo que S. Pedro e S. João fo- dãos romanos (Rom II , I) , levaram-no a Jerusa lém, onde,
ram enviados, a fim de administrar aos neófitos o sacra- sob a direção de Oamaliel, se to rnou escriba fa riseu, since-
mento da confirmação (At 8, 5 ss) . Foi ainda S. Filipe, ro, apaixonado pela lei de seus pais. Depois da morte de S.
quem batizou o ministro da rainha da Etiópia (At 8, 26 ss), Estêvão, "respirando ameaças e morte contra os disc ípulos
"o primeiro dentre os gentios" (Eus., HE 2, I), enquanto do Senhor, apresentou-se ao príncipe dos sacerdotes e pe-
S. Pedro recebeu Cornélia, centurião da coorte itálica, com diu-lhe cartas para as sinagogas de Damasco", a fim de
toda a sua casa no seio da Igreja (At 10, I ss). Desta trazer presos também os cristãos daquela cidade (At 9, 1-2).
forma , tornava-se cada vez mai s visível a separação entre Mas no caminho de Damasco tocou-o a graça do Senhor.
a Ig reja e a s inagoga. Foi pelo a no 36; pois neste ano fora deposto Pôncio Pi-
A perseguição teve ainda outro efeito, muito mais im- latos, não tendo ch egado ai nda o seu sucessor. Só a ssim
portante. Deus, nos seus conselhos imperscrutáveis, aprovei- fora possível a perseguição, movida pela s inagoga.
tou-se da mesma para levar a o seio da Ig rej a aquele ho- b. Desde o dia de Damasco, o nome de Jesus ficou
mem, que havia de ser o maior dos apóstolos, S. Paulo. gravado com letras de fogo no coração de Sauh O p,;rse-
guidor tornou-se instrumento princlpal do. unIVersalismo
Monografias e comentários catôlicos aos Atos dos Apóstolos;
Fplt en, 1892; Knnbpnbal1er, 1899; Be/ser, 1905; j acqu;er, 1926; cristão. Pois, judeu legitimo, romano e helenosta por nascI-
Steillmann, 1934. - Doellinger, Christentum und J(irche in der Zeit men to, educação e vida, representante rias três grandes
der Grundlegung, Regensbllrg 1863. - Batitfol, L'Église naissante culturas em que nasceu o cristianismo, vei o a ser o primei-
et le catholicisme, 2 vOI. , 6. ed. Paris I927<?9. - Ehrhard, Urchristen-
tum und Katnolizismus, Luzem 1926. ro teólogo cristão, capaz de Iransplantar o cristianis mo do
ambiente judaico para o campo da cultura grego-romana e
§ 9. Cristianismo helênico: S. Paulo. - A Igreja ·de preparar-lhe, em toda parte, o caminho dá vitória. A
de Antioquia grande mudança, pela qual passou o cristianismo desde o
ano 36 até 67, é essencialmente a obra de S. Paulo
66. Não obstante a longa educação dos apóstolos pelo (Lortz 24).
Mes tre divino, e apesar de serem eles instituídos sacerdotes 68. Balizado por Ananias, logo começou a pregar a
do Novo Testamento e enviados a todos os povos, não se doutrina de Cristo. Não podendo, porém, ficar em Damas-
apagara entre eles, po r completo, a idéia dum reino de Deus co, por causa da s ciladas que Os judeus lhe armavam, re-
judeu-nacional, senão com a vinda do Espírito Santo (clr. tirou-se para o deserto da Arábia, onde fo i instruído pelo
§ 8). E embora S. Ped ro decidisse, de fato, a questão pelo próprio divino Mestre. Em seguida, voltou a Damasco. Mas
hatismo de Cornélio e sua família e convencesse também a os sacerdotes da sinagoga, irritados à vista das muitas con-
comunidade de Jerusalém, relatando a visão que tivera dos versões, resolveram matá-lo. Ele, porém , livre "mais uma vez
animais puros e impuros (At 11 , I ss), continuaram ainda, do perigo, tomou o caminho de Jerusalém, a fim de encon-
em certos círculos judeus-cristãos, os preconceitos contra a trar-se com Pedro, chefe da Ig reja (Gál I, 17-18; 2 Cor
II, 32; At 9, 23-25). Embora chamado a o ministério apos-
46 J época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 9. Cristianismo helênico: S. Paulo. - A Igreja de Antioquia 47

tólico diretamente por Deus, estava, todavia, persuadido de ram-Ihes as mãos e despediram-nos". S. Paulo inaugurou
que não devia exercer a sua missão, senão em perfeita união então as suas grandes viagens de missão.
com o centro da Igreja e seu supremo chefe.
71. A primeira viagem levou o apóstolo, acompanha-
Mas também em Jerusalém os judeus procuraram ma- do de Barnabé e João Marcos, de Antioquia a Seleucia,
tá-lo. Por isto, depois de quinze dias, os discipulos acom- onde embarcou para Chipre, pátria de Barnabé. Em Palas
panharam-no até Cesaréia, donde se retirou para Tarso converteu-se o procôllsu! romano, Sérgio Paulo, vendo o
(At 9, 26-30). E foi nesta cidade que S. Barnabé, pelo castigo do mago Bar-Jesus (At 13, 10-12). Em seguida, os
ano de 42, foi buscá-lo para lhe ser companheiro na mis- três missionários dirigiram-se a Pcrga, florescente cidade
são de Antioquia, capital da Siria.
da Panfília, onde Marcos se separou dos dois zelosos após-
69. Antioquia, terceiro centro do império romano, ao tolos. Estes atravessaram o rochoso Tauro, cheio de peri-
lado de Roma e Alexandria, pode dizer-se primeira estação gos, e pregaram em Antioquia da Pisídia, Icônio e Listra,
do cristianismo no seu caminho que, saindo do judaísmo, cidades da província romana da Galácia. Em Listra, S. Pau-
tomou para o mundo em fora. Os primeiros pregadores do lo restituiu a saúde a um paralítico de nascimento. O po-
Evangelho foram cristãos de Jerusalém que, depois da mor- vo, em vista do milagre, quis dar honras divinas aos após-
te de S. Estêvão, se tinham dirigido à Síria (At 11, 19). tolos, o que eles só a custo conseguiram evitar (At
A maior parte dos neo-convertidos vinha do paganismo; e 14, 7 ss).
de tal maneira destacavam-se eles no meio da população, Os judeus, porém, concitavam, em toda parte, os ant-
que precisamente em Antioquia os adeptos de Jesus Cristo, mos contra os apóstolos, principalmente em Listra, onde
pela primeira vez, foram apelidados de "cristãos" (AI Paulo foi apedrejado. No dia seguinte, partiram em dire-
11, 26). ção a Derba. Voltaram então pelo mesmo caminho, confor-
A numerosa conversão dos gentios foi motivo de gran- tando os fiéis e ordenando sacerdotes para cada Igreja (At
des preocupações dos judeus-cristãos de Jerusalém. Envia- 14, 22). Embarcaram, finalmente, em Atália, e tornaram
ram, por isto, Barnabé a Antioquia. Mas ele, cheio do Es- assim, depois de uma viagem de quatro anos, a Antioquia
pírito Santo, alegrou-se com o que viu. Longe de pôr fim da Síria.
ao movimento, pregou também ele aos gentios. Vendo, po- 72. Uma séria controvérsia sobre a lei mosaica levan-
rém, que era necessário aí um pregador douto e zeloso Como tou-se então entre os fiéis de Antioquia. Pois, embora os
Saulo, foi buscá-lo em Tarso. gentios fossem imediatamente admitidos a entrar na Igre-
70. Depois de um ano de pregação, ouviram que a fo- ja, sem passar pela sinagoga, ficava, todavia, de pé a ques-
me assolava a Igreja de Jerusalém. Vemos então os dois tão da lei cerimonial. Estavam os neo-convertidos obriga-
amigos partirem, em nome dos antioquenos, com recursos dos ou não a observá-Ia? Efetivamente, formara-se em Je-
para a Igreja-mãe. Tendo concluído a sua missão, volta- rusalém, sob a influência dos fariseus, um partido, que pre-
ram, levando consigo João Marcos, parente de Barnabé (At tendia obrigar os gentios a tornarem-se judeus, antes de se-
11,29-30; 12,25). rem admitidos na Igreja. Representantes deste partido, não
enviados pela Igreja, vieram a Antioquia, dizendo: "Se não
Em Antioquia pregavam, a este tempo, diversos pro-
receberdes a circuncisão, não vos podereis salvar" (At 15,
fetas e doutores, Barnabé, Simão o Negro, Lúcio de Cirene,
1). Paulo e Barnabé protestaram contra tal heresia; e a
Manaém e, em último lugar, S. Paulo. Mas precisamente questão produziu uma viva exaltação dos â~imos. Final-
ele foi escolhido por Deus para ser o maior de todos. Disse mente, resolveram submetê-Ia, por intermédio de Paulo e
então o Espírito Santo aos chefes da Igreja antioquena: Barnabé, à Igreja-mãe de Jerusalém.
"Separai-me Saulo e Barnabé para a obra a que os desti-
73. No concílio dos apóstolos (50), Pedro, João e
nei" (At 13, 2). "E, depois de jejuarem e orarem, impuse- Tiago Menor concordàram com Paulo e Barnabé e, de acor-
J

48 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 9. Cristianismo helênico: S. Paulo. - A Igreja de Antioquia 49

?o com toda a assembléia dos anciãos, definiram que a fé logo florescentes comunidades cristãs em Filipos, Tessalo-
e que .~alv_a, não a lei (At IS, II). Mas, para facilitar a nica e Beréia. Mas, perseguido pelos judeus, de cidade em
reconclloaçao entre os cristãos, vindos do judaísmo, e os de cidade, o apóstolo embarcou para Atenas. Ali o vemos pas-
ongem pagã, S. Tiago fez a proposta de que a estes se sear pelas ruas da cidade universitária, pregar na si nagoga
recOl;,endasse a observância de alguns preceitos morais e e nas praças públicas, e subir, finalm en te, ao areópago para
ntual~. E neste senti.do, os apóstol os e presbiteros de Je- falar aos a tenienses cultos do "Deus desconhecido" (At
rusalem, escreveram a Igreja de Antioquia: "Pareceu bem 17, 16 ss).
ao Esplnto Santo, ~ a nós não vos impor mais encargos 76. Paulo no areópago de Atenas. - " Esta narração,
do que os necessanos, sendo os seguintes: que vos abste- diz Curtius, é urna das ma is importantes páginas da histó-
nhals do que tiver sido sacrificado aos ídolos e do sangue ria humana". E' a primeira vez que a jovem Igreja se en-
e das ca rn es sufocadas, assim como da fornicação" (At contra com a filosofia pagã. E S. Paulo corresponde perfei-
IS, 28-29),
tamente à importância universal deste momento. E' verda-
., . 74. Pela decisão. dos supremos chefes da Igreja, os de que a Atenas de S. Paulo, havia muito, perdera a he-
fIeIS, vll1dos do gentilIsmo, foram declarados, definitivamen- gemonia política. Mas brilhava ainda pelos seus templos e
te, livres da lei mosaica. Os judeus-cristãos não podiam dei- outros edifícios de arte e de luxo, era ainda o centro da
xar, por conseguinte, de desligar-se dela igualmente. Na vida e dos trabalhos esp irituais, para onde acorriam não
Pale~tina , as circunstâncias não perm itiam um rompimento s6 numerosos estudantes da Grécia, mas também da Ásia
IInedlato, mas sIm em Antioquia. O próprio príncipe dos Menor, do Egito e até da Itália.
apóstol ~s: S, Pedro, deu o exemplo, quando, pouco depois No meio destes epicureus materialis tas e dos sérios es-
do concilIO de Jerusalém, se dirigiu à capital da Siria sen- tóicos, o apóstolo pronunciou aquele discurso admirável, que
tando-se à mesa com os gentios-cris tãos. E' verd ad~, que S. Lucas em substância nos conservou (At 17, 22 ss),
ele se ret Iro u novamente, quando alguns judeus da Judéia exemplo para sempre de uma fé viva e coraj osa na Pro-
se mostrava m escandalizados com o seu proceder. Is to cau- vidência divina que dirige sàbiamente os destinos do gê-
sou grave irritação e desordem . S. Paulo viu ameaçada a nero humano (Schuite). O resuitado do discurso, é verda-
sua obra, e a idéia da Igreja unive rsalista traída pela es- de, foi aparentemente um fiasco quase completo. Poucos
treIteza de espirita da velha sinagoga. Por isto, resistiu a aceitaram a nova doutrina, entre os quais Dionísio, o Areo-
Pedro "em rosto" (Gál 2, . 11); e a sua atitude fez com pagita, primeiro bispo de Atenas (Eus., HE 3, 4) e uma
que também o supremo chefe da Igreja se declarasse em mulher, chamada Oâmaris.
favor da liberdade cristã.
77. Todav ia., S. Paulo não desanimou. Com otimismo
Desta maneira, a separação entre a Igreja e a sinago- católico no coração, contin uou a sua missão, traba lhando
ga estava firmada. Faltava só que também os judeus-cris- pelo espaço de um an o c meio em Corinto (At 18, I ss),
tãos da. Palestina fos sem libertados da antiga lei, o que se então cidade comercial mais populosa do Peloponeso. Ha-
deu, praticamente, pela destruição de Jerusalém . bitando na Casa de Áquilas e Priscila, cristãos que, havia
75. Depois da controvérsia de Antioquia, S. Paulo em- pouco, tinh am sido expulsos de Roma em virtude dum de-
preendeu a sua segunda viagem de missão (50-53). Acom- creto de Cláudio (Suet., Claud . 25), formou ali uma flo-
p~nharam-n o, desta vez, Si las, o jovem Timóteo, alma cân- rescente comunidade cristã, à qual se alistou o próprio Cris-
dIda e modesta, que o apóstolo amava extremamente, e Lu- po, prefeito da sinagoga. Os judeus, não obstante, perse-
cas, evangelista e historiador. Visitando novamente as co- guiram o apóstolo com seus ódios e levaram-no ao tribu-
munidades da Pisidia e atravessando, em seguida , a Fri- nal de Gálio, irmão de Sêneca e procurador da Acaia. Mas
gia, a GaláCia e a Misia, chegou a Tróade, onde numa Gálio ' nem sequer os admitiu ii sua presença, nem fez caso
visão, foi chamado à Macedônia (At 16, 9). Form~ram-se deles, quando os gregos espancaram a Sóstenes, novo chefe
Compêndio I - 4
50 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão !i 9. Cristianismo helênico: S. Paulo. - A Igreja de Antioquia 51
da sinagoga, diante do tribunal (At 18, 12 ss). S. Paulo, pirassem contra a vida do apóstolo (At 23, 12 ss), Lísias
finalmente, embarcou, com Áquilas e Priscila, para Éfeso e, t) fez conduzir ao procurador António Félix que, no dizer
passando por Cesaréia, voltou a Jerusalém e Antioquia. de Tácito (Hist. 5, 9), governava em Cesaréia com o po-
78. Ainda no mesmo ano, o zeloso apóstolo começou der de um rei e com a alma de um escravo. O procurador
a sua terceira viagem de missão (53-58). Com seus com- reconheceu a inocência do apóstolo; mas, não querendo
panheiros, Lucas, Timóteo, Tito e outros, seguiu quase o ofender os judeus e esperando um bom resgate (At 24, 26),
mesmo caminho da segunda viagem. Da Pisídia dirigiu-se não lhe restituiu a liberdade. Ao cabo de dois anos, o in-
a Éfeso, onde admitiu na Igreja alguns discípulos instruí- justo e indigno procurador foi deposto. Seu sucessor, Pór-
dos por Apoios, judeu de Alexandria e discípulo mediato cio Festo (60-62), quis enviar o apóstolo para Jerusalém.
de S. João Batista. Paulo ficou em Éfeso dois anos e três Mas Paulo apelou para o imperador, ao que Festo respon-
meses, pregando com extraordinário sucesso. Foi aí que es- deu: "Para César apelaste, a César irás" (At 25, 12).
creveu também uma epístola aos gálatas e duas aos corín- 80. Entregue ao centurião Júlio, que o tratou com hu-
tios, entre os quais havia cisões. Deus confirmou a sua pre- manidade, S. Paulo embarcou com Lucas, Aristarco e ou-
gação com numerosos milagres, sarando doentes e afugen- tros companheiros. Depois duma terrivel tempestade e do
tando espíritos maus (At 19, 8 ss). naufrágio, ocorrido perto de Malta, chegou a Roma, na pri-
Entretanto, chefiados por um certo Demétrio, os ouri- mavera de 61. Dois anos durou a sua prisão, durante a qual
ves de Éfeso, cidade da grande Diana, amotinaram o povo lhe foi concedido receber a quantos o vinh am visitar,
contra Paulo, que então partiu para a Macedónia, chegan- judeus e pagãos. Os judeus de Roma eram os de sempre;
do provàvelmente até Dirrhachium na llíria (Rom 15, 19). obstinavam-se em não aceitar o Evangelho (At 28, 26 ss).
Em caminho escreveu mais l1ma epístola aos coríntios, e Mas entre os pagãos houve abundante messe. Até pretoria-
visitando-os pela segunda vez, ficou entre eles três meses. nas e gente da casa imperial abraçaram o cristianismo
Foi então que escreveu a epistola aos romanos, documen- (Filip 1, 13; 4, 22). Durante esta prisão, S. Paulo escre-
to principal da teologia paulina. veu as epístolas a Filêmon, aos colossenses, efésios e fi-
79. Deixando Corinto, visitou as comunidades de Fili- lipenses.
pos, Tróade e Mileto, onde se despediu dos presbíteros da' 81. Com estas notícias terminam os Atos dos Apósto-
Asia Menor, recomendando-lhes, pela última vez, o reba- los; e também aquelas epístolas nada nos dizem de posi-
nho, "sobre o qual o Espírito Santo os constituíra pasto- tivo sobre o fim do cativeiro do apóstolo. A tradição, bem
res", e prevenindo-os de futuras heresias (At 20, 17 ss). provada pela conclusão dos Atas (28, 30-31), atesta que,
Passando depois por Cesaréia, seguiu para Jerusalém, em- ao cabo de dois anos, lhe foi restituída a liberdade. Efeti-
bora conhecesse a sorte que lá o esperava. vamente, se a prisão tivesse acabado com a morte de Pau-
S. Tiago Menor e os irmãos receberam-no carinhosa- lo, Lucas certamente o teria relatado. Em favor da liberta-
mente. Temendo, porém, o ódio dos fariseus, aconselharam- ção falam também as declarações de Festo e de Agripa (At
lhe cumprir um voto no templo, para que todos soubessem 25, 25; 26, 32). Os próprios judeus não acharam motivos
que observava a lei. Mas, vendo-o entrar no templo, alguns suficientes para acusá-lo perante o tribunal do imperador.
judeus da Ásia Menor, apoiados pelos zelotas de Jerusa- S. Paulo, por seu lado, estava convencido da sua libertação
lém, amotinaram o povo contra ele e arrastaram-no para (Filip 1, 25-26; 2, 24).
fora do templo a fim de o apedrejar. Só a intervenção de Além disso, prova-se uma segunda prisão do apósto-
Lísias, tribuno romano, salvou-lhe a vida. Da flagelação, lo por 2 Tim 4, 13 ss. O lugar desta prisão foi também
decretada por Lísias, libertou-se Paulo, apelando para o Roma. As pessoas de que Paulo manda saudações a Timó-
privilégio de cidadão romano. teo eram membros da comunidade romana. Esta vez, o
Como então mais de quarenta judeus fanáticos cons- apóstolo tem o pressentimento da próxima condenação. Afi-
4'
52 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 10. A Igreja em Roma - S. Pedro 53

nal, as cartas pastorais a Timóteo e Tito não podem ser Atos dos Apóstolos (18, 2). Mas, se é incerto quem fosse
escritas durante a primeira prisão, ou antes dela; pois fa- o primeiro pregador do Evangelho em Roma, é certo que o
lam-nos de viagens, que o apóstolo não pode ter feito an- próprio principe dos apóstolos ali pregou, estabeleceu a sua
tes da sua primeira prisão. sede episcopal e sofreu o martirio.
82. Entre a primeira e a segunda viagem a Roma, S. 84. Infelizmente, as notícias que temos de S. Pedro são
Paulo esteve na Espanha, realizando assim um antigo de- muito escassas. Os Atos dos Apóstolos, nos primeiros onze
sejo (Rom 15, 24-28). A sua presença na península ibéri- capítulos, só referem a sua pregação em jerusalém e ou-
ca deduz-se, antes de tudo, das palavras de S. Clemente tras partes da Palestina, até ao batismo de Cornélio. A sua
Romano que, pelo ano de 96, escreveu aos cristãos de Co- atividade durante os anos seguintes nos é quase comple-
rinto: "Depois de ter ensinado a justiça a todo o mundo tamente desconhecida.
chegou até ao extremo ocidente" (Cor 5, 7). o mesmo ates~ Pilatos havia sido deposto por Vitélio, governador da
ta o célebre Fragmento Muratoriano, escrito pelo ano 200 Síria, que o enviara a Roma (Jos., An!. 18,4, 2). Marcelo,
(Kirch, Enchiridion Fontium, 158); e Teodoreto de Ciro es- seu substituto, não chegara ainda, quando Anás e Caifás,
creve: "Postea igitl\lr in Italiam venit, et in Hispaniam per- arrogando-se direitos que não lhes pertenciam, condenaram
venit, et insulis ... utilitatem attulit" (ln Ps. 116). Estêvão e perseguiram os cristãos. O novo procurador de-
. Fouard, Saint Paul, 12. ed., Paris 1925. - Holzner, Paulus,
pôs de seu cargo o sumo sacerdote. A Tibério sucedeu Ca-
Frelburg 1937. - Bartmann, Paulus, die Grundzuege seiner Lehre Iígola (37-41), que para si mesmo exigia um culto divi-
Pad,erborn 1914. - Prat, La théologie de Saint Paul, 2 voI., 26. ed.; no (Sue!., Calig. 22). Os judeus, como súditos que eram
Pans 19~8. ,- Tondelli, Il pensiero di San Paoto, Milano 1928. _
Marucchl, Pletro e Paolo a Roma, 4. ed., Torino 1934. - Rarnes deste monstro coroado, viam-se constrangidos também a
The martyrdom af St. Peter and St. Paul Oxford 1933. - Savio' adorá-lo. A resistência que opunham valeu-lhes as mais fu-
Clviltà cat., 1914, 1, 424 55; 560 55. - DI;bowy Clemens von Ro~ nestas consequências. Perseguidos eles mesmos, não podiam
ueber die Reise Pauli nach Spanien (BibL Stu(Üen 19, 3). - Der
kath. Gedanke VIII 5 ss. ser perseguidores. Por conseguinte, a Igreja gozava então
de paz em toda a Palestina.
§ 10. A Igreja em Roma - S. Pedro S. Pedro aproveitou-se da ocasião para visitar as Igre-
jas já fundadas. Em Lida deu saúde a Enéias; em jope
83. Quando S. Paulo chegou a Roma, já ali existia ressuscitou Tabita (At 9, 33 ss). Achava-se ainda em jope,
uma florescente comunidade cristã. Ele mesmo escrevera em quando teve a visão dos animais mundos e imundos. Esta
58, quando da sua estada em Corinto: "Graças dou ao meu levou-o ao batismo de Cornélio e de toda a sua família
Deus. .. porque a vossa fé é celebrada em todo o mundo" (At 10, 1 ss).
(Rom 1, 8). Não sabemos quem tenha sido o primeiro pre- 85. a. Entrementes, Calí gola caiu morto pelo punhal
gador do Evangelho na capital. Provàvelm~nte foram aque- dos conjuradores. Cláudio (41-24) subiu ao trono. Os reis
les judeus que de Roma haviam ido à festa de Pentecos- aliados e tributários felicitaram-no pela elevação; e entre
tes e tinham assistido ao primeiro sermão de S. Pedro (At estes, quem mais se distinguiu, foi Herodes Agripa. Lem-
2, 10). Pode ser também que tenham sido soldados da Coor- brando-se da sua antiga amizade, Cláudio, depois da mor-
te itálica, que tinha a sua sede em Cesaréia. O centurião te de Marcelo, confirmou-o rei de toda a Palestina (Jos.,
Cornélio, batizado por S. Pedro, era desta coorte. A pri- An!. 19, 4, 1-2; 5, 1), o que encheu de alegria os judeus;
meira noticia certa do cristianismo de Roma data dos úl- mas para os cristãos significava o inicio de novas perse-
timos anos do imperador Cláudio (Sue!., Claud. 25, 4). Ha- guições.
vendo sérias perturbações da ordem política por causa do b. A primeira vítima foi S. Tiago, a quem Herodes
nome de Cristo, Cláudio mandou expulsar toda a colônia mandou matar a espada (At 12, 1-2). Vendo que esta or-
dos hebreus. Esta noticia de Suetônio é confirmada pelos dem agradava aos judeus, ordenou também a prisão de S.
54 I época: Desde a fu nd ação da Igreja ao Edito de Milã o § 10. A Igreja em Rom a - S. Pedro 55
P ed ro, para que fosse morto depois da Páscoa. Mas um Babilón ia do Egito era a penas um peque no castelo roma-
anjo veio restituir-lhe a liberdade; e Pedro p artiu então para no. Depois de ter também S. João Evangelista cha mado
outro luga r (At 12, 17). Para onde? Antioquia? Roma? Roma a grande Babilónia (Apoc 16, 19; 17, 5; 18, 2 ss),
Não o sabemos. Orígenes e outros escritores eclesiásticos toda a antigui dade cristã a conhecia com este nome, como
atribuem-lhe a funda ção da sede episcopal de Antioquia. P ápias atesta , e ma is claram ente Cl emente de Alexandria
S egundo antiga tradição, o apóstolo dirigiu esta Ig reja pelo (Eus., HE 2, 15).
espaço de sete anos. Mas não temos uma prova em apoio
87 . P elo a no de 96, três decênios depoi s da morle de
da tradição. E nada proíbe a dmitir que de Jerusalém se
S. Ped ro, Clemente Romano escreveu aos corintios : !IA es-
tenha diri gido a Roma. E' isto o que nos di z outra a nti ga
tes santos varões (Pedro e Paulo), que ensinava m a san-
tradição, transmitida por Eusébio ( HE 2, 14 ) e outros es-
c ri tores. Pelo decreto de Cl áudio provàvelmente teve de tidade, se associou grande multidão de eleitos que, supli-
ciados e atormentados pelo ód io, fo ra m entre nós de ótimo
deixar nova mente a capita l. Certo é que, depois da morte
exemplo" (Co r 6, 1) . D o mesmo modo, S. Inácio de An-
d e Agripa , voltou â Igreja-mãe, presidiu ao concílio dos
tioquia, nos primeiros anos do século !I, supõe a exis tên-
apóstolos. e en controu-se com S. Paulo em An tioquia . De-
cia dos príncipes dos apóstolos em Roma, qua nd o escreve:
pOIS de dIversas vIagens p elo oriente e p ela Grécia, estabe-
" Eu não vos ordcno como Pedro e Paulo" ( Rom 4, 3) .
leceu-se definitivam ente em Roma e dirigiu os destinos des-
ta comunida de até à sua morte. Eusébio conservou-nos o tes temunho de Clemente de Ale-
xandria (c. 150-215) e de Pápias, bispo de Hierápolis e
86. ·a. S. Pedro esteve em Roma. - O prim eiro a le- discípulo de S. João, segund o os quais S. Pedro pregou
vantar uma dtlvida contra esta tese católica foi Marsílio de em Roma e ali aprovou o Eva ngelho de S. Marcos, escrito
Pádua, sectário de Luí s IV da Baviera na luta contra o a instâ ncia s da comunidade romana. Pápia s acrescen ta que
papa João XXII ( 13 16-34 ) . Negaram-na, em seguida, tam- S. Pedro escreveu em Roma a sua primeira epistola ( Eus. ,
bém Calvino e, no século XIX, ainda Bam, Lipsius e ou- HE 2, 15; 6, 14). Dionisio de Corinto escreveu ao papa
tros protesta ntes. Sobremaneira lortes torn aram-se as nega- Sotero (1 65-74): " ( Pedro e Paulo) assim como vieram à
ções p ro tes tantes por ocasião do concilio vaticano. E ainda cidade de Corinto, plantando a nossa Igreja com os seus
que a maioria dos protestantes com o próprio Harnack, ho- en sinamentos, assim ig ualmente se foram à Itã lia, onde vo s
je em dia, reconheçam o lato, há a inda qu em ouse negá-l o, doutrina ram e sofreram o martirio no mesmo tempo" ( Eus.,
cego pelos preconceitos duma his to riografia tendenciosa. HE 2, 25).
b. Não Jerusa lém, a cidade deicida, mas Roma tinha 88. Dez anos depois, S. Ircneu fal a da funda ção da
sido escolh ida pela Providência divina para ser a capital Igreja romana pelos a póstolos P edro e P aulo (Adv. hae r.
do reino de Deus na te rra. Para Roma é que ela dirigiu 3, 3, 2) , e o seu testemu nho é de tão alto valor que, por
os passos do primeiro papa. Realmente, há ta ntas provas s i só, bastaria para confundir todos os adversários. Disc í-
da estada de S. P edro em Roma, e prova s tão convincen- pul o de S. P olicarpo e cl érigo e bispo de Lião, conhecia a
tes, que só um homem de má fé pode ainda duvidar dela. tradição do oriente e do ocidente ; e não conte nte ainda, foi
Já as pa lavras dos Atos dos Apóstolos (12, 17) designam, a Roma, a fim de estudar as ori gens e a doutrina da Igre-
com muita probabilidade, a cida de de Roma. Se, em segui- ja da capital.
da, o mesmo a pósto lo, na sua primeira epistola, chama "Ba- Contemporâneo de S. Ireneu foi Tertuliano, que, pelo
bilónia" o luga r da sua residência ( I Ped 5, 13), esta Ba-
fim do século !I, passou longos a nos em Roma. Ele ates-
bilônia não pode ser senão Roma. Aqu ela das margens do
ta a pregação e a morte de S. Ped ro em Roma (De praesc r.
Eufrates, ainda que existisse, estava deserta, como nos di-
32. 36). Pelo mesmo tempo, o presbitero romano Caio po-
zem E strabão e Plínio O Velh o ; e conforme a na rração de dia objetar, numa disputa, a Prado, chefe da seita cata-
Josefa (Ant. 18, 9), judeus quase não havia mais nela. A frig ia: "Eu posso mostrar os t roféus (sepulcros) dos após-
56 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edit o de Milão § 11. S. João e os ou tros apóstolos 57

tolos. Quer vás ao Vaticano quer à Via Ostiense encon- § 11. S. João e os~ outros apóstolos
trarás os troféus daqueles que fundaram esta Igreja'" (Eus.,
HE 2, 25). 91. Se são poucas as not icias que temos da vida de
S. Pedro, menos ainda sabemos sobre os outros apóstolos.
. 89. Com isto já nas achamos no campo da arqueolo-
Os Atas de S. Lucas mencionam de alguns apenas o nome.
gia. Tanto em c ima da terra, Como nas galerias subterrâneas
Só de S. João Evan gelista e de S. Tiago Menor um pouco
encontramos inúmeras vezes os nomes de Ped ro e Paulo.
mais nos dizem a s fontes.
Em medalhões, copos e paredes os achamos, às vezes acom-
panhados de suas imagens. A cadeira de S. Pedro no ce- S. João, irm ão de S. Tiago Ma ior, aparece diversas
mitério de Priscila, as inscrições nas catacumbas de S. Se- vezes com papel saliente ao lado de S. Ped ro. Esteve pre-
bastião e os baixos relevos de muitos sarcófagos atestam sente no concilio dos a póstolos, sendo chamado, como Pe-
bem a ltamente a esta da de S. Pedro em Roma. Ali ás ne- dro e Tiago Menor, "coluna" da Igreja apostólica (Gál 2,
nhuma outra cidade jamais reclamou para si a honra de 9). Até à morte de Maria Santíssi ma, deve ter ficado em
possuir os sepulcros dos principes dos apóstolos. Foi, pois, Jerusalém. Em seguida, foi pa ra Éfeso e regeu, depois da
em Roma que S. Pedro doutrinou e batizou. Foi em Roma morte de S. Paulo, a Igreja da Ásia Menor. Teve ali di-
também que governou a Igreja, 'primeiro bispo da cidade versos discípulos, entre os quais se dist inguem S. Policar-
eterna . po, bispo de Esmirna, e Pápia s, bispü de Hierápoli s.
' . 90. Efetivamente, para esta afirmação podemos adu- Segun do a notícia lendária de Tertuliano (De praescr.
Zlf nu mero mterminável de testemunhos históricos. Basta di-
36) , o apósto lo Joi, durante o reinado de Domicia no (8 1-
zer que os autores de toda a antiguidade cristã estão de 96) , levado a Roma e metido numa cal deira de óleo fer-
acordo em atestar o episcopado romano de Pedro, e que vente. O próprio eva ngelista atesta que foi desterrado para
com o nome de Pedro todos os catál ogos dos pontifices ro- a ilha de Pat mos "por causa da palavra de Deus e do tes-
manos abrem a lista da sucessão epi scopal de Roma . Assim tem un ho de Jesus" (Apoc I, 9).
o c~tálogo de S. Ireneu, o mais antigo e de irrefutável au- 92. Foi no sil êncio do desterro que escre veu o Apo-
tenltcldade (Adv. haer. 3, 3, 3) ; assim Euséb io na sua Crô- calipse, aquelas marav ilhosas visões, em que lhe foi mostra-
nica e na sua História da Igreja; assim o catálogo liberia- do O poder do Cordeiro divino, a tribulação dos cristãos,
no de 354; assim também o index, i. é, um g rupo de catá- o juizo dos perseguidores e o triunfo fi na l da Igreja. Depois
logos dos sécul os V-VII; assim finalm ente o Liber Ponti- da morte de Domiciano, o a póstolo voltou para Éfeso, on-
ficali s. de escreveu as epístolas e o quarto Evangelho com o fim
Segundo a ntiga tradição que remonta ao século IV ou de demonstrar a missão messiânica e a divinda de de Je-
talvez ao século III , S. Pedro fo i bi spo de Roma pelo es- sus Cristo. Explicando a idéia do Logos num sentido cris-
paço de vinte e cinco anos. S. Jerôn imo escreve que, no se- tão, visava co mbater o perigo das especulações helenistas,
gundo ano do Imperador Cláudio, "Simon Petrus... Ro- as falsas concepções de Cerinto, dos gnósticos-docetas, ni-
mam pergit ibique viginti quinque an nis cathedram sacer- cola itas e biliamitas. S. João morreu, segundo S. [reneu, no
dotalem tenuit" (D e vir. iiI. I; clr. Chron. 2). Colocando- principio do reinado de Trajano (Adv. haer. 3, 3, 4), e Po-
se a morte do apóstolo no :no de 67, teria chegado a Roma Hcrates, bispo de Éfeso no fim do século II , atesta que o
em 42 , preCisamente depOIS da sua prisão em Jerusa lém. apóstolo mOrreu nesta cidade.
93 . S. Tiago Menor, filho de Alfeu e de Maria, " irmã"
,F ouard, ~e~ o~i gin es de l'Église. Sain t Pierre et les premi eres
~nnes ~u chn~~l a",sme. 8. ed., Pa ri s 1905. - Ro bertson. E poches da Virgem Santíssima, e por isso chamado "irmão" do Se-
II:' th~ I~fe of ,Simon Peter, New York 1933. - Pro/umo, La merncr. nhor (Mt lO, 3 ; Gál I, 19), foi, depois da partida de S.
na, di S,;n P~etro nella reg ione salaria-nomentana, Roma 1G16. _ Pedro, a primeira autoridade entre os cri stãos da Pales-
Gnsar, Ges~hl chte Rams und der Paepste im Mittelalter I, Freiburg
1~ 1. - Ltetzman n, Petrus und Paulus in Ram 1915. _ Cas r tina . Sua piedade valeu-lh e o sobrenome de "Justo" . Segun-
DJe aelteste roemische Bischofsliste, Serlin 1 926~ . pa, do Hegesipo foi o primeiro bispo de Jerusalém (Eus., HE
58 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 12. A propagaçã o do cristianismo nos primeiros três s~culos 59

2, I), donde nunca se retirou. Pouco antes do seu martí- § 12. A propagação do cristianismo nos primeiros
rio, escreveu uma epistola aos judeus-cristãos na diáspora, três séculos
mostrando-lhes a necessidade das boas obras, que os simo-
nianos e outros sectários diziam desnecessárias para a sal- 95. Os a póstolos obedeceram a voz do divino Mestre:
vação. Por sua extrema austeridade e admirável piedade, "Ide, ensínai todas as gentes" (Mt 28, 19). Os seus discí-
S. Tiago converteu muitos à fé cristã. Isto moveu aó sumo p ulos imitaram-lhes o exemp lo. Grande foi ta mbém o zelo
sacerdote, Anano o Moço, a condená-lo à morte (62). Pre- apostó lico nas gerações seg uintes. Não só clérigos, como
cipitado do pináculo do templo, mOrreu a pedrejado (Jos ., tam bém mui tos outros cristãos dedicaram-se à pregação do
An!. 20, 9; Hegesipo, ap. Eus., HE 2, 23). Evangelho, de modo que, já nos do is primeiros séculos da
nossa era, o crist ianis mo se espalh ou sobre todas as pro-
94. A sorte dos outros apóstolos nos é quase comple-
víncias do impéri o rom an o, passando bem cedo para as ou-
tamente desconhecida. Os atos apócrifos que se lhes atri-
tras na'rões. Dos miss ionarios deste tempo, porém, pouco
buem são, em parte, de origem gnóstica, e o conteúdo ba- ou nada nos diz a hi stó ria.
seia-se mais em invenções do que na trad ição eclesiástica.
96. A comunidade mais numerosa e mais importante
Segundo Euséb io (HE 3, 1), S. André teria pregado nas
foi a de Roma. Roma tornou-se centro de toda a cristan-
regiões da Cítia, ou seja, Capadócia, Galácia e Bitínia; e
dade. Tácito nOs conta (An. IS, 44) q ue, no rei nado de
a tradição diz ter s ido ele crucificado na Acaia. S. Tomé
Nero, morreu grande multidão de cristãos. O papa Cornt-
pregou entre os partas, e segundo a lend a foi morto a fl e-
lio (t 253) fala igualmente du ma numerosa cristanelade ro-
cha na India. Para a Ind ia foi també m S. Bartolomeu (Eus.,
mana, dirigida por quarenta e se is sace rdotes e cerca de
HE 5, la ). Mas esta Ill dia é pro và velmente a Arábia me-
ridional, onde, no século II , Panteno encontrou °
Eva nge-
cem clérigos inferiores. No resto da Itália existi a m comu-
nidades tão num erosas, q ue o mesmo papa pôde reunir ses-
lho de S. Mateus. Este apóstolo pregara primeiro aos ju-
se nta bispos ital ianos num conc ílio de Rom a, qua ndo al i
deus, e para eles escrevera o seu Eva ngelho. Mais tarde, se
se declarara o cisma dos novacía nos (Eu s., HE 6, 43). En-
dirigira a outros povos ( Eus., HE 3, 24).
tre as prim eiras Igrejas da ItMia con tam Ostia, Pu téo li, Ná-
Sobre a atividade dos outros apóstolos nada mais diz poles, Rave na. Milão, Verona e Aquiléia.
o pai da história eclesiástica. T ambém a memória dos dis-
97. Nas Gálias, os princípios do cristianis mo eSCO n-
cípulos dos apóstolos envolve-se nas trevas da lenda e do
dem-se nas somb ras da len da. A tradição fa la de Láz aro,
esquecimento. S. Marcos, certamente idêntico com João Mar-
Maria Madalena e Mar ta, de Dionisio o Areopagita e de
cos, sobrinho de S. Barna bé, mai s tarde intérprete de
um certo Amador, criado da Sagrada Família. Há quem
S. P edro, é considerado como funda dor da Igreja alexan- opine q ue S. Pau lo enviou para as Gálias () seu d iscípulo
drin a ( Eus., HE 2, 16). S. Lucas, médico de fa ma (Cal
Crescente, e esta opinião baseia-se na segunda epístol a a
4, 14), acompan hou O apóstolo das gen tes nas s uas últimas Timóteo (4, 10) . Mas es ta passagem não oferece fund a-
viagens. Mais tarde, teria pregado na Acaia e aí sofrido mento algum para tal asserção; pois leia-se "Gallia" ou
o martíri o.
"Galatia ", qualqu er destes nomes pode designar ambas as
Baunard, O apó stolo S. João, Rio de Janeiro 1924. - Fouard, regiões. T am pouco se baseia em fontes hi stó ricas a notí-
Sain t Jean et la iio de I'âge apostolique, Paris 1904. _ Chapman, cia de Gregório de T ours (Hist. Franc. I, 28), segu nd o a
John the Pr'esbyter and the fourth Gospel, Oxfo rd 1911. _ Lipsius,
Die apokryphen Apostelgeschichten und Apostellegenden, 2 val., q ual, pelos meados do século II, sete bispos mission~rios
Braunschweig 1883-90. fo ram enviados a fim de pregar aos gauleses. Certo e, no
entan to, que entãu havia fl orescentes Igrejas em Lião e Vie-
na (Eus., HE 5, 1-4) . Entre as vítimas da perseguição de
Marco Aurélio (177) encontra-se o própri o bispo Fotino
de Lião, a quem sucedeu na sede episcopal S. Ireneu. Num
60 J época : Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão
§ 12. A propagação do cristianismo nos pri meiros três séculos 61
sinodo de Arles ( 314 ) esti ve ram presentes tr inta e três bis-
101. Ass im, pois, já nos prime iros três séculos da nos-
pos e entre eles dezesseis eram das Gá lias.
sa era havia com unidades cristãs em to da a Europa ci-
98. O prime iro apó stol o da Espanha foi S. Paulo. vi lizad~. Ma ior fo i, po ré m, a este tem po, a extensão elo
Uma tra dição do século VII , segundo a qu a l S. Ti ago Ma ior cristi anis mo na Áfri ca e no o riente. As font es qu e nos re-
teria pregado o Evangelho na p eninsu la ibérica, carece de latam a sua difusão nest as regiões são muito mais ricas e
fundamento histórico. Os primeiros testemunh os escritos que mais numerosas.
possuimos so bre o cris tianis mo da Es panha são as no tícias Para a África proconsular passou o cristianis mo, nos
de S. Ire neu (Adv. hae r. I, lO, 2) e Tertuli ano (Adv. Jud. fins do século 1. No século II, T er tuliano p odia lançar em
7). No tícias ma is exa tas nos deu, pe los meados do século rosto aos magi strad os romanos : " Somos de o ntem, e já
III, S. Ci priano, qu e então escreveu uma carta à s Igre jas e nch emos a s vossas cida de s, a s vossas ilhas e até os cam -
de León-As torga e Mé rida ( Ep. 67) , mencio nando també m pos e o palácio e o se nado e o foro; e s6 vos deixamos
a Igreja de Saragoça. No concilio de Elvi ra (c. 300) es- os vossos templos " ( Apol. 37). Em outro lugar, O mes mo
tiveram presentes deze nove bispos e vin te e quatro pres bi- au tor afirma q ue a população das cid a des se compunha,
teros. Provàvelmente, porém, não es tava m represen tadas to- na ma ioria, de cris tãos (Adv. Scap. 2). S. Cipriano nos laia
das as Igrej as da Espanha.
de um herege qu e foi cond enado por noventa bispos da
99. Segundo o tes temunho de S. Irene u (Adv. haer. África ( Ep . 59, 10) .
I , l O, 2 ), o cri stianism o teve, a este tempo, adeptos ta m- 102. A Igreja do Egito con sid era a S. Marcos como
bém nas du as Germânias, inferior e superior, à margem es- seu fundad or. A fl orescente comunidad e de Alexa ndria , a
querda do Ren o. Centros do cris tia nis mo tornaram-se já
pri meira qu e ap a rece na his tó ria do Egito, ilustrou-se bem
e ntão Colô nia, Treves e Mogún cia. Em Bonn foi desco-
cedo pela Célebre escola cateq uética, cujo prim eiro d ire-
berta a ba s ílic a dos mártires Cássio e Fl orê ncio, sol dad os
to r conhecido foi Panle no (Eus. , HE 5, !O). De Alexan dfla
da legião te baica, e em Xanten ( Ad Sanctos ) encontra ra m- irradiou a luz do E va ngelh o até à T éba ida c à Lí b ia . No
se os sep ulcros de má rtir es do sé cu lo IV. O utros bispados princ ipio do século IV, ha via cerc a de cem bispados es-
existira m à marge m dire ita do Danúb io, como Ratisbona,
palhados e m todo o Egito. Todos eles ficaram, nos sécul os
Lorch, anele foi martirizado o bi spo S. Flori a no, e Augsbur-
se bo-uintes , em continuo contacto Co m a Ig reja-m ã e de Ale-
g o, o nde, no tempo de Diocleci ano, S. Afra s ofre u o martí-
rio. Na Estiria morreu pela lê o bispo Vitorino de P etau, xa ndria.
na Croá cia, o bi s po Q uirin o de Siscia. Na P a nOni a s ofrera m 103. N a Palestina, o cristiani smo teve de lutar conti-
O ma rtírio, ao mesmo tempo, os cha mados Quatro Coroa- nuame nte co m o ód io dos judeus. Os trabalhos apos tó licos
dos (A ASS Nov. 3, 748 ss). Na Dalm á cia es palhou a pri- limitavam-se, por isto, quase exclus ivamente às c idades he-
meira semente eva ngéli ca Tito, discípul o de S. Paul o (2 len istas. Mas os grandes acon tec im entos do ano 70 puse-
Tim 4, lO ). ram lermo à s ingló r ias agitações dos judeus. Antes da des-
100. No século II, o cristianis mo entro u também na trui ção de Jerusalém, os cristãos emigraram para Pela. A
Britânia, C< jnacessível aos ro manos, submetendo-se, porém, comunidade pri mitiva, judeu-cristã, de ixou de exis tir. De-
a Cris to" ( Tert. , Ad v. Ju d. 7). E, embo ra a na rração do pois da guerra , volta ra m alg uns emigra ntes. Hegesipo fala
Livro Pon tifical e de Beela o Venerável sobre a co nversão de S. Sim eão, sucesSOr de S. Ti ago Menor, como bis po de
do rei Lú cio, no tempo do papa El eutéri o (174-89; PL Jerusalém, e de a lgun s da vidi da s, acusados perante Do mi-
127, 1249; 95, 30) , não possa ser provad a, ê certo, to- ciano. Quando o imperador Ad ri ano des truiu completamen-
davia, qu e, no século III, existiram na Britâni a diversas Ig re- te a antiga cidad e, edificando em seu lugar a fE lia Capi-
jas fl o rescentes. No sínodo de Arf es (3 14) tomar am pa r- tolina, form ou-se um a comunidade ge ntio-c ris tã. Mas a me-
te os bispos de York, Lon dres e Lincoln. trópole da Igreja siríaco-pa lestinense era Ces aréia.
§ 12. A propagação do cristianismo noS primeiros três séculos 63
62 I epoca: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão

104. Quanto à Arábia, depois da estada de S. Paulo tírio de muitos fiéis na perseguição de Diocleciano (HE 8,
(Gál I, 17), faltam-nos noticias até ao fim do século II 12). A Crônica de Arbela, recentemente (1907) descoberta,
quando Panteno a visitou. Segundo Eusébio (HE 5, 10): não admitida por todos como autêntica, baseada, porém,
Panteno pregou no oriente, chegando até à India; mas con- em fontes e tradições anteriores, narra que o "apóstolo"
forme a interpretação dos historiadores, esta India é a Ará- Adai pregou com fruto na Assiria e que, pelo ano de 225,
bia meridional. Pelo ano de 240, a Igreja da Arábia apa- existiam na Mesopotâmia e na Assíria dezessete bispos.
rece perfeitamente organizad a; pois Orígenes, chamado 108. Na Pérsia penetrou O cristianismo durante o sé-
por um governador da Arábia, esteve presente num gran- culo II!. Centros da vida cristã tornaram-se Nisibis, Seleu-
de sínodo. Assistiu também a outro sinodo, celebrado em cia-Ctesifonte e Susa. Inimigos dos romanos, os persas con-
Bostra (244), onde, por ele convencido, o bispo Berilo re- sideravam os cristãos como amigos, enquanto estes eram
tratou os seus erros acerca da Sa ntí ssima Trindade. perseguidos no império. Depois da paz constantiniana, po-
105. Antioquia foi o centro da Igreja da Síria. De lá rém, começaram na Pérsia violentas perseguições.
s~ .irradiou o cristianismo em todo O país e na s re giões Finalmente, o cristianismo parece ter chegado até às
VIZinhas, chegando, nos meados do século II , a té Edessa índias Orientais. Os atas apócrifos de S. Tomé, escritos
(Urfa, capital da Osrhoena. Pelo fim do mesmo século o no sécu lo III , relatam a pregação deste apóstolo no reino
rei Abgar VIII (179-216) apresenta-se-nos como cristão. parto-indiano de Gundafor ou Gandhara. Confirmam-no
Uma lenda, conservada por Eusébio (HE I, 13), faz datar Orígenes, Efrem, Ambrósio e Jerõnimo. Os "cristãos de S.
da época apostólica a conversão deste pais. Mas a pre- Tomé" na costa 1I1alabárica atribuem também a este após-
tensa correspondência entre Jesus Cristo e o rei Abgar V, tolo a sua conversão. A antiga tradição foi sustentada re-
como também outros docum entos que Eusébio encontrou centemente por Dahlmann, Vaeth e outros . Todavia, noticias
na biblioteca de Edessa não têm fundamento na história. historicamente certas existem só do século VI.
. . 106. Em nenhuma outra parte do mundo antigo o cris- 109. Desta maneira, ao despontar do século IV, o cris-
tIanIsmo se nos depara tão florescente, como na Ásia Me- tianismo estava espalhado em todo o mundo então conheci-
nor. Plín io o Moço, assustado pelo número elevado dos cris- do e não só entre as classes inferiores da sociedade, mas
tãos da Bitínia, para cujo governador O escolhera o im- tal~bém entre os eruditos e as autoridades. S. Paulo trans-
perador Trajano, no ano de 112, escreveu a seu amigo im- mitiu aos filipenses a s saudações dos santos de Roma e,
perial: "A contagiosa praga da su perstição cristã já se não particularmente, dos da casa ele César (Filip 4, 22). To-
limita às cidades; invadiu tambem as a ldeias e os cam- davia, o Evangelho é, sobretudo, uma boa nova da mise-
pos, e se estendeu pelas gentes de todas as idades e con- ricórdia. Jesus Cristo convidou a todos a entrarem no rei-
dições e sexos. Os nossos templos estão quase totalmente no dos céus. Mas achou ouvidos mais dóceis entre os fra-
aba ndonados, como também as práticas religiosas" (Ep. 10, cos e os que sofrem. Daí se explica que, como relata o·
97). Semelhantemente espalh ou-se O cristianismo no Pon- apóstolo das gentes, s6 poucos ricos e intelectuais perten-
to, na provincia Ásia com Éfeso, sua cap ital , e na Frigia. ciam às comunidades por ele lundadas. E não causa ma-
ravilha; pois mui difícil era ganhar para a doutrina da cruz
107. Da difusão da Igreja na província Armênia dá- a sociedade elevada, os filósofos e magistrados, porque en-
nos testemunho a carta de Dionísio Alexandrino aos fiéis
tre eles a imoralidade e o orgulho eram os maiores adver-
daq uele pais (Eus., HE 6, 46). Verdadeiro apóstolo do rei-
no da Armênia é Gregório Iluminador que, pelo ano de sários da verdade revelada.
302, converteu u rei Tiridates 1IJ (t 322), com o qual gran- Lanzoni, Le diocesi d'ltalia dalle or igin i all'anno 604, 2. ed.,
faenza 1927. ~ Mackinnon, The Rome of the early Church, London
de parte do povo recebeu o batismo. 1933. _ Duchesne, Fastes épiscopaux de j'ancienne Gaulle, 3 vO~'J
Também na Mesopotâmia havia cristãos, pelos mea- Paris 1894-1915. - jullian , Histoire de la Gaulle, 8 vo1. t PariS'
dos do sécu lo III (Eus., HE 7, 5); e Eusébio atesta o mar- 1908-26. _ García Villada, Historia ec les iástica de Espana, 2 val.,
·64 I época: Desde a fun dação da Igreja ao . Edito de Milão § 13. Ca usas da rápida propagação do cristi anismo 65

.Madrid 1929-33. - Zeiller, Les origines ch réti ennes dan s les pro- eruditos e ignorantes, todos, enfim, tornaram-se apóstolos
vinces Danubiennes de "empi re Romain, Paris 1918. - Williams,
Ch ristianity in early Britain, Oxfo rd 1912. - Wall, The first do Evangelho. A sua própria vida era uma continua pre-
Chrístian s of Britain, London 1927. - Harnack, D ie Mission und gação . Sua conduta exemplar e seu mútuo amor, num mun-
Ausb rei tung des Christentum s in den ersten drei Jahrhunderten, 2 do cheio de ódios e de crimes, tudo is to despertava a aten-
vaI., 4. ed., Leipzig 1924. ção dos homens. Já S. Lucas escreve que os primeiros cris-
tãos "eram um só coração e uma SÓ alma" (At 4, 32). Os
§ 13. Causas da rápida propagação do cristianismo Sa ntos Padres tecem elogios verdadeira mente eloquentes. S.
e a reação dos adversários Justin o afirma que muitas conversões eram motivadas pela
110. Se investiga rmos a s causas da rápida propaga- vida virtuosa dos cristãos (Apol. I, 16), enqua nto que ou-
ção do cri stianismo, a prime ira que se nos depara é, sem tros, embo ra cheios de ód io e desprezo, exclamavam: "Olhai
dúvida, a g raça divina. Sem ela, sem a preparação provi- como eles se amam mutuamente e como estão prontos a dar
de ncia i do mundo para Cristo e a sa lvação, ela se ria inex- a vida uns pelos outros" (Tert., Apol. 39).
plicável. Outras são as ca usas imed iatas; e a principal den- b. Efetivamente, o que mais inexplicável e divino pa-
tre elas é a força in trinseca da verdade revela da , confir- recia aos pagãos, era o herois mo e a constância dos már-
mada pela ressurreição de seu divino fundador. tires. Ju stino confessa que precisamente esta constância dos
A nova religião a presentava-se como rel igião da ca- cristãos, no meio dos mais a trozes suplícios, destruiu com-
ridade e, por isto, convertiam- se, em prime iro lugar, aos pletamente os seus antigos preco nceitos e o moveu a abra-
milhares, a s classes op rimidas, mu lheres ·e escravos, que no çar o cri stianismo (Apol. 2, 12). E Tertulia no pôde dizer
crist ia nismo achavam co nsolação nas s uas afli ções . Mas a aos magistrados: "Crucifi cai-nos, marti rizai-nos, condenal-
do utrina do Evangelho impunha-se também aos eruditos e nos . .. Quanto mais vidas nos ce ifa is, ta nto mais nos mul-
às autoridades. Na próp ria casa im per ia l achou adeptos. tiplicamos; semente é o sangue dos cris tãos" (ApDl. 50).
Depois de tantas dúvidas e dum tactea r tão prolongado, 113. a. No entanto, muitas dific ul dades opuseram-se à
raiou fin almente a luz da verdade que solucionava, do mo- nova doutrina que "era pa ra os judeus escândalo e lou-
do mais plausível, todas as questões qu e preocupavam o Cura pa ra os gentios" (I Cor I , 23) . Jesus Cri sto mesmo
espírito hu mano : D eus, o mundo e o próprio "eu", a imo r- tinha predito aos discí pulos que se riam perseguidos por ju-
talidade da alma e a justiça eterna. Esta lu z atraía os sá- deus e gentios (Mt 10, 17- 18) . Os ju de us od iava m os cris-
bios e os filósofos que, como Justino e Dionísio Alexandri- tãos, porque os cons ideravam como apósta tas e tra idores da
no, em vão tinha m esperado encontra r a verdade nos vários lei mosaica' e este ódio pa rece ter s ido, ao menos em par-
sistemas fil osóficos (J ust., Dia l. 2-8). te, a causa' da perseguição neroniana. Ma is tarde, T ertulia -
III . Ta mbém os carismas e os milag res numerosos no diz, generalizando, que a sinagoga fo i a fonte das per-
eram testemunhos seguros da nova doutrina . Os Atos dos seguições (Scorp. 10).
Apóstolos e os escritos dos Sa ntos Padres no-lo atestam b . Mas a causa principal das perseguições fo i, por sua
inúmeras vezes . S. Justino se refere a estes mi lag res para natureza, a oposição radical e intrínseca entre o monoteis-
convencer os pagãos (Apol. 2, 5 [6 J). Origenes (Contra mo cri stão e o politeísmo pagão. Embo ra o mundo estives-
Cels. I, 46) e Tertuliano (Apol. 23) convidam os seus se preparado para receber a sa lvação, paganismo e cristia-
adversários a presenciarem os fa tos prodigiosos operados nismo eram e continuavam a ser dois mundos diametral-
pelos cristãos, a fim de acaba r, de vez , com os preconcei- mente opostos. Por conseguinte, a luta era inevitável. E' a
tos. E muitos, judeus e pagãos, realmente, se converteram lu ta entre a cidade de Deus e a cidade de Lúcifer, de que
à vista dos fatos sobrenaturais. fala S. Agostinho. Seria erro ide ntificar s implesmente o rei-
11 2. a. De um modo muito eficaz in fluiu o zelo dos no de Lú cifer com o Estado. T odavia, as forças do inferno
primeiros cristãos. Homens e mulheres, livres e escravos, era m a s do Estado pa gão, o poder brutal. Por isso, a opo-
Compê ndio I - 5
66 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 13. Causas da rápida propagação do cristianismo 67

sição devia necessàriamente vir a ser perseguição violenta. contra as heterias (Plin., Ep. 10, 97). Dai também as mui-
Seria erro também identificar simplesmente o reino de Deus tas acusações de crimes imorais. A Eucaristia era conside-
com a Igreja católica. Mas a Igreja possui o poder da cida- rada qual ceia tiestéica, os ágapes, como orgias libidino-
de de Deus, poder sobrenatural. Por isto, pertencia-lhe ne- sas (Just., Apol. 1, 26; Tert., Apol. 7-9; Min. Fel., Oc!. 9).
cessàriamente a vitória, o triunfo final. Estas e muitas outras suspeitas, como superstição, magia}
culto do asno, deram motivo àqueles ódios desmesurados,
114. Seria, porém, injusto apresentar-nos o Estado ro-
mano unicamente como tirano arbitrário e cruel persegui-
de que fala Tácito nos seus Anais (15, 44).
dor. Proibe-o a simples consideração de que as persegui- 117. Todavia, os magistrados não podiam deixar de
ções mais violentas não foram movidas por tiranos como reconhecer que os cristãos eram bons súditos do império.
Nero e Domiciano, mas por imperadores de caráter nobre Obedeciam às autoridades, porque sabiam que não há poder
e insignes administradores. O Estado romano mostrava-se que não venha de Deus (Rom 13, 1); pagavam pontual-
por via de regra, muito tolerante para com as religiões d~ mente os impostos segundo a norma dada por Jesus Cris-
outros povos, contanto que Júpiter conservasse o seu lugar to: "Dai a César o que é de César" (Mt 22, 21); reza-
de honra. Até o monoteismo dos judeus era uma "religião vam também pelo imperador e pelo Estado (Clem. Rom.,
certamente lícita" (Tert., Apol. 21). Cor 61) e eram exemplo de virtude para todos. Portanto,
115. Quais foram, pois, as razões que transformaram a sua relação com o Estado era inteiramente nova, e com-
o Estado tão tolerante em perseguidor do cristianismo? Foi, preende-se que as autoridades não podiam achar logo uma
antes de tudo, a união essencial entre este Estado e a re- solução decisiva. Dai se explica a atitude dupla e vacilan-
ligião politeista, que compenetrava toda a vida pública. To- te dos imperadores até à perseguição de Décio.
dos os atas de Estado eram atas religiosos. Um ataque con- 118. De fato, muitas perseguições têm por autores não
tra a religião politeista devia, por conseguinte, parecer um os magistrados e o Estado, mas o povo encolerizado, prin-
atentado contra o próprio Estado. Ora, o cristianismo não cipalmente no século II. Os magistrados e imperadores só
era uma religião nacional, como o judaismo. Era destinado raras vezes procediam contra os cristãos, movidos então
a todos os povos e para todos os tempos. Era uma reli- por denúncias ou pelo furor da populaça, de vez em quan-
gião universal. Não pretendia apenas erguer um altar a seu do também por própria iniciativa. Durante o século II, nor-
Deus entre os altares de outros deuses, mas derrubar todos teavam-se, por via de regra, pelo rescrito de Trajano, que
os demais. Não reconhecendo, pois, os deuses do Estado, dizia respeito só a pessoas isoladas, não ao cristianismo co-
nem o culto do imperador, os cristãos eram considerados mo tal. Só pelos meados do século 111 é que o Estado come-
como Ímpios e ateus (Just., Apol. 1, 6. 13; Mart. S. çou a decretar a supressão do cristianismo. Até então, o
Polyc. 9). fundamento jurídico das perseguições ficou muito incerto.
Este ateismo parecia ser a causa da ira dos deuses 119. a. Mas, se, nem antes, nem depois, todos os im-
e, por isso, das calamidades públicas. "Si Tiberis ascendit peradores seguiam a mesma norma, quais foram então as
ad moenia, - diz Tertuliano, - si Nilus non ascendit in normas que observavam? Procediam segundo princípios da
arva, si crelum stetit, si terra movit, si fames, si lues, statim: legislação universal? Ou decretavam leis especiais? Os his-
Christianos ad leonem acclamatur" (Apol. 40). Por conse- toriadores não estão de acordo. Uns admitem uma lei es-
guinte, os cristãos passavam por inimigos do Estado pecial, referindo-se à chamada lei neroniana: "Non licet esse
(Ib. 35). vos" (Tert., Apol. 4). No entanto, se tal lei excepcional
116. Além disso, não podendo eles participar da vida existisse, como explicar então a atitude vacilante dos im-
pública, das liturgias, dos espetáculos, etc., despertavam a peradores seguintes? Como explicar principalmente as dú-
suspeita de formarem uma associação secreta, proibida já vidas de Plínio o Moço? Verdade é, porém, que já desde
pela lei das doze tábuas e, mais tarde, pela lei de Trajano a perseguição neroniana os cristãos só pelo nome eram per-
68 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 14. Princípios das perseguições no império romano 69
seguidos e ·condenados (lb. 2. 44; Ad Scap. 4; Just., negli Acta martyrurn, Torino 1927. - Ler;lercq, Les Martyrs I, 4. ed.,
Apol. 1, 4). Tours 1921. - Allard, Histoire des persécutions, trad. ital. por E.
Lari, 5 vol., 2. ed., Firenze 1923-28.
b. Segundo outros, o fundamento da perseguição eram
as leis universais do código penal, que podiam fàcilmente
§ 14, Principias das perseguições no império romano
ser aplicadas aos cristãos. Entre elas, tem o primeiro lu-
gar a lex luZia maies/atis, em virtude da qual os cristãos 121. O primeiro perseguidor do cristianismo no trono
podiam ser acusados e condenados como inimigos do Esta- imperial foi Nero (54-68). Assim escreve Tertuliano expll-
do e como associação ilícita;· pois reuniam-se à noite ou às citamente (Apol. 5). Este imperador marcou com o seu no-
escondidas. A participação em tais reuniões era tida como me uma das mais horrendas tragédias da história, o incên-
crime de lesa-majestade (Ulpian. ap. Kirch 1012). Contra dio ne Roma. Cláudio tinha sido envenenado (Sue!., Claud.
a mesma lei pecavam os cristãos, negando o culto imperial 44), provàvelmente por sua própria esposa Agripina, que
(Ter!., Apol. 28). A lex de sacrilegio era violada pelos cris- procurava assegurar o trono para seu filho Nero (Tac., Ann.
tãos, quando negavam os sacrifícios, desprezavam os deu- 12, 64), moço então de 17 anos de idade.
ses e destruiam os templos. Tais sacrilégios eram punidos Depois de alguns anos felizes de governo, manifesta-
com grande rigor (Kirch 1014). Podiam igualmente ser ram-se nele todas as más inclinações humanas. Assassino
acusados de magia, quando operavam milagres ou expul- de Britânico, filho legítimo de Cláudio, assassino também
savam demônios; ou de superstição externa, quando confes- de sua mãe Agripina, de seu professor Sêneca, de sua es-
savam uma religião que não era aprovada pelo senado. posa Octávia, casou-se, doze dias depois, com Popéia Sa-
c. Outros, finalmente, afirmam com Mommsen que os bina e matou-a com um pontapé, quando ela se achava grá-
cristãos não eram tratados por processos criminais confor- vida. Ao prefeito do pretório enviou, em vez de um remé-
me leis ou decretos imperiais, mas quase exclusivamente dio que prometera, veneno. Assim Nero dava ao mundo o
por procedimentos coercitivos, que davam aos magistrados espetáculo continuo de uma orgia sanguinária e repelente.
o direito de obrigar o cidadão romano a cumprir os seus Chegou até a proclamar que a virtude era mentira e que
deveres religiosos. No entanto, nem este procedimento coer- eram dignos de perdão os que confessavam francamente as
citivo, nem aqueles processos criminais parecem ter sido suas imoralidades (Suet., Nero 39). Tal foi o primeiro per-
aplicados exclusivamente. O certo é que a condição dos cris- seguidor do cristianismo.
tãos perante a legislação romana era excepcional. Não eram 122. O incêndio de Roma, no ano 64, foi ocasião, não
tratados como os demais criminosos. causa da perseguição. Segundo Suetônio (Nero 16), o pró-
120. Com a subida de Décio (249-51) ao trono impe- prio imperador mandara incendiar a cidade antiga. Tácito,
rial mudou essencialmente a sua condição. Este imperador, mais reservado, diz que corria o boato de ter Nero incen-
como também os seus sucessores, procuraram restabelecer, diado a cidade e que parecia procurar a glória de edificar
na base da antiga religião, a unidade do império, já então uma nova cidade e dar-lhe o seu nome. Dos catorze bairros
de Roma só quatro ficaram em pé. Depois de ter descrito
ameaçado pelos bárbaros. Daí se explicam os decretos que
os horrores do incêndio, Tácito continua, falando com pro-
proibiam o "ser cristão". Portanto, as perseguições deste pe-
funda tristeza das riquezas, adquiridas por tantas vitórias,
ríodo têm por fundamento jurídico decretos imperiais e, por-
das obras-primas da Grécia e de uma multidão de manus-
tanto, um caráter mais geral e mais violento. E' este o
critos autênticos, antigos monumentos do gênio que os an-
tempo da luta decisiva entre o cristianismo e o paganismo. ciãos se lembravam de ter visto, e cuja perda toda a magni-
Weis, Christenverfolgungen, Geschichte ihrer Ursachen im ficência da nova Roma não era capaz de fazer olvidar (Ann.
Roemerreiche, Muenchen 1899. - Leclercq, Accusation CQntre les 15,38-41).
chrétiens, Dict. d'areh. ehr. et lit., I 265-307. - Huentemann; Theol.
Quartalschr. 1932, 72-93. - L. de Regibas, Sloria e dirilto romano 123. Depois do incêndio foram celebrados sacrifícios
70 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 14. Princípios das perseguições no impériO romano 71

expiatórios por ordem do imperador, foram consultados os ção, ambos sofreram o martirio no dia 29 de Junho de 67 ,
livros sibilinos, e Nero mandou fazer preces públicas. Mas, o que, porém, historicamente não se pode provar.
no meio de tudo isso, todos tinham o secreto sentimento 125. Entretanto, nem os martírios dos cristãos, nem as
de que Nero era o autor do crime . Conhecendo o perigo promessas, nem os soco rros e a prodigalidade do impera-
que o ameaçava e acon selhado, segundo Comodiano, pelos dor, nem as expiações religiosas conseguiram abafar os mur-
Judeus, o I~perador, para pôr fim aos murmúrios do povo, múrios que atribuíam o incêndio de Roma às ordens de
declarou reus os cristãos e os afligiu com penas crudelís- Nero. E os murmúrios, aos poucos, transformaram-se em
simas (Tac., Ann. 15, 44). ódio que acabo u por des tronar o tirano. Os gauleses de-
Foram presas alg uma s pessoas, gente comp !'ada, que ram o sinal da revolta . Na Espanha e em outras provin-
o imperador precisava para denu nciar os cris tãos. À denlm- cias os exércitos rebelaram-se igualmente. Vendo-se aban-
cia deles foi presa uma multidão ingente. Os cárceres en- donado por sua própria gua rda militar, Nero fugiu para fora
che!'am-se de heróis da fé, e os carrascos submeteram-nos da cidad e. Mas foi in útil. Reconhecido e perseguido, suici-
à tortura , querendo obri gá-los a confessar um crime que dou-se, tendo apenas 32 anos de idade. Roma rejubilava
não tinham cometido. Não sendo possível convencê-los do naquele dia; - assim termina Suelônio a biografia do ti-
crime que lhes era imputado, foram condenados por causa rano (cap. 49).
do "ódio do gênero humano". Ja não por causa do incên- 126. Depois da morte de Nero, sucedera m-se, no es-
dio, mas pelo nome cristão sofreram o martírio. paço de um ano, três imperadores, Galba, Otão e Vitélio,
Muitos foram destinados aos combates de feras, outros que caíram todos vítimas de rebeliões. Finalmente, foi pro-
foram crucificados, outros ainda, ao cair da noite, vestidos clamado imperador o general Vespasiano (69-79), depois
de túnicas embebidas em óleo, pez e resina, foram atados de Augusto, o mais distinto entre os imperadores do século
a postes de madeira, que os algozes incendiaram atrozmen- I e, como seu filho Tito (79-81), chamado de "delícia do
te, para iluminar a noite. Outros, finalmente, morreram na gênero humano", digno dos elogios de S. Agostinho, que
rep!'esentação de cenas mitológicas, de Dirce e das Danai- os chama a ambos príncipes ótimos e dignos de serem ama-
des (Clem. Rom. , Cor. 6; Tac., Ann. 15, 44). dos ( De Civ. Dei 5, 21 ).
124. a. A perseguição, que durou até à morte do ti- t27. Mas, no reinado de Domiciano ( 81-96) , apare-
rano (Te!'!., Ad nato I, 7), estendeu-se, ao que parece, so- ceu nova mente a oposição radical que existia entre a reli-
bre todo o impé!'io. In sinua-o Suetânio (Nero 16). Dizem- gião do verdadeiro Deus e a religião do Esta do, cujo re-
no, em seguida, expressamen te Osório (Hisl. 7, 7, 10) e presen tante se dizia "senhor e Deus" (SueI., Dom. 13).
Sulpi cio Severo (Chron . 2, 29, 3). E nas palavras de S. Desconfiado e ambicioso, Domiciano tornou -se, pelo fim do
Pedro aos cdstãos do oriente (I Ped 4, 12) é fácil reco- seu gove rno, tirano tão cruel, que Juvenal (Sal. 4, 38) lhe
nhecer uma exortação a seus irmãos da Ásia, já atingidos dá o apelido de Nero Calvo, enquanto que T ertuliano o
pela perseguição (Allard I , 62) . chama apenas "pa rtia Neronis de crudelitate" (Apol. 5).
Em todas as fontes cristãs, ele nos aparece como segun-
b . O número dos mártires não é conhecido. Clemente
do perseguidor do cristianismo. De fato , muitos cristãos, ne-
Romano, provàvelmente testemunha ocular, diz só mente que
gando ao imperador as honras divinas e o tributo ao tem-
foi uma "magna electorum multitudo" (Cor. 6), e Tácito
plo de Júpiter, eram acusados de ateísmo e de costumes
fala igualmente de uma "multitudo ingens" (Ann. 15, 44).
judaicos e, em consequência disto, executados ou expulsos
Os únicos mártires de que sabemos seguramente os nomes
(SueI., Dom. 12; Dia, Hist. 67, 14).
são os apóstolos S. Pedro e S. Paulo. S. Pedro foi cru-
cificado, como diz Orígenes, a seu próprio pedido, com a 128. Entre as vítimas achava-se o próprio primo do
cabeça para baixo (Eus., HE 3, I). S. Paulo morreu de- imperad(>r, Tito Flávio Clemente, cõnsul no ano 95. Sofreu
capitado (Terl., De praesc. haer. 36, 3). Segundo a tradi- o martírio pelas mesmas acusações de ateísmo e costumes
72 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 15. Perseguições parciais no século II

judaicos. Sua esposa Flávia Domitila foi desterrada para a administração do império, que os romanos diziam aos seus
ilha Pandatária, perto de Oaeta. Eusébio, baseando-se em sucessores: "Seja mais feliz do que Augusto e melhor do
Brútio, escritor pagão, fala de outra Flávia Domitila, so- que Trajano". Menos feliz foi a sua atitude para com o
brinha de Clemente, desterrada para a ilha Pôncia. Não é, cristianismo, que sofreu violenta perseguição. Motivo desta
porém, possível, constatar se se trata de uma ou de duas perseguição foi um decreto contra as heterias; mas as vio-
Domitilas. Histôricamente certo é ainda o martírio de Ací- lências foram mais obra do povo, do que do imperador
Iio Olábrio, cônsul em 91. (Eus., HE 3, 33).
S. João Evangelista, quase centenário, foi desterrado 131. a. As noticias mais exatas sobre esta persegui-
para Patmos; e os mártires, mencionados no Apocalipse, so- ção encontram-se na carta de Plinio o Moço, governador
freram igualmente nesta perseguição (Apoc 1, 9; Ter!., De da Bitínia, ao imperador e no rescrito de Trajano. Pouco
praescr. haer. 36). Eusébio nos conservou ainda uma no- depois de ter tomado posse do governo, Plinio publicou a
tícia de Hegesipo, segundo a qual Domiciano, receoso da ordem de Trajano que proibia as heterias, associações não
segurança de seu trono, fez vir a Roma alguns parentes do reconhecidas pelo Estado. Em consequência disto, muitos
Senhor, descendentes de David, que os judeus vilmente ha- cristãos deixaram de assistir às reuniões do culto. Outros,
viam acusado (Eus., HE 3, 20). Mas, reconhecendo, pela porém, continuavam a reunir-se, e, por causa de denúncias,
inocência dos acusados, a inutilidade da perseguição, repri- Plínio teve de ocupar-se da questão. Mas não conseguiu
miu-a, de certo modo, não abolindo, porém, os seus verificar os crimes de que os cristãos eram acusados. E
decretos. assustado pelo número elevado dos fiéis e convencido da
129. No entanto, a cobiça e crueldade de Domiciano sua inocência, ainda que os achasse "excessivamente su-
reclamavam outras vítimas. Ele precisava de dinheiro. Por persticiosos", consultou o imperador e pediu uma norma de
isto, condenava varões ricos e membros da nobreza para conduta (Ep. 10, 96).
confiscar-lhes os bens. A consequência foi uma conjuração b. Trajano respondeu-lhe pelo célebre rescrito, dizen-
que acabou pelo assassínio do tirano (Sue!., Dom. 16 ss; do que não era possível estabelecer norma fixa e geral.
Dio, Hist. 67, 15 ss). Nerva, que lhe sucedeu, proibiu, jun- "Persegui-los não devemos. Se tos trouxerem e forem réus
tamente com as acusações de lesa-majestade, as que se fun- convictos, punam-se; mas, se negarem ser cristãos e de-
davam no modo de viver judaico, i. é, cristão, e as do ateís- monstrarem não o ser, orando aos deuses, sejam manda-
mo (Dia, Hist. 68, 2). Infelizmente, o seu governo foi de dos em paz ... Libelos anônimos, por caso nenhum os admi-
pouca duração. tas, seja qual for a acusação" (Ep. 10, 97). Este rescri-
Literatura para estas e as seguintes perseguições: Ailard, His- to, tão ilógico e tão pouco fundado na legislação romana,
toire des persécutions. - Id:, Le christianisme et l'empire romain deu a Tertuliano motivo a uma acerba crítica (Apol. 2).
de Néron à Théodose, 9. ed" Paris 1925. ~ Fracassini, L'impero ed Todavia, ficou sendo norma de proceder por um século
ii cristianesimo da Nerone a Constantino, Perugia 1913. - Ehrhard,
Die Kirche der Maertyrer, Muenchen 1932. - Profumo, Le fonti inteiro.
ed i tem pi dello incendio neroniano, Roma 1905. - Semeria, II 132. Muito pouco sabemos sobre os mártires que so-
primo sangue cristiano, 3. ed., Roma 1907.
freram no reinado de Trajano. Eusébio refere que, em vir-
tude do rescrito imperial, a perseguição foi um tanto re-
§ 15. Perseguições parciais no século II primida. Mas em consequência das agitações das massas
130. O maior serviço que Nerva prestou ao impeno do povo e das autoridades provinciais, muitos cristãos foram
foi a adopção de Trajano (98-117), que lhe sucedeu no vitimados. Os mártires mais distintos deste tempo, e os úni-
trono. Principe nobre e justo, começou o seu governo com cos, cujos nomes nos foram transmitidos por Eusébio, fo-
a punição dos delatores, que tanto mal tinham feito duran- ram S. Simeão, bispo de Jerusalém, que, na idade de 120
te o reinado de Domiciano. E tão bem sucedído ficou na anos, foi crucificado (Eus., HE 3, 32), e S. Inácio de An-
74 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão
§ 15. Perseguições parci ais no século II 75
tioquia, que foi levado a Roma, onde morreu vitima dos d e Esmirna à comunidade de Filomelium na Frígia Magna.
leões no anfiteatro (t 107?). O precioso documento, escrito em 156, fala também de doze
133. a. Os dois imperadores seguintes, embora não mu- c ompanheiros de Policarpo que o precederam na morte.
dassem a condição jurídica dos cri stãos , mostraram ânimo 135. a. Marco Aurélio (161-80) não s eguiu a política
mai s favorável para com el es. Adriano (117-38), feliz no tolerante de seu pai adotivo Antonin o. O filósofo estóico no
s eu governo, grande amante das artes, amava também a jus- trono imperial tivera por professor Fronto de Cirta, um dos
tiça e a paz. Pelo rescrito que dirigiu a Fundano, procôn- mais encarniçados inimigos do cristianismo. Ao mesmo tem-
sul da província Ásia (c. 125), e que S. Justino nos con- po, o filósofo Celso escreveu contra o cristianismo os seus
servou) vê-se claramente que tomava os cristãos sob sua livros cheios de ódio e de mentiras. · Acresce ainda que as
proteção, e ameaçava até de cast igos se veros qualquer in- g ra ndes calamidades, fome e peste, que a ssolavam o im-
justa denúncia (Just., Apol. I, 68) . pério, e os inimigos poderosos, que a meaçavam as frontei-
b. Não pôde, no enta nlo, impedir que, durante o seu ras, em muitas partes des pertava m a cólera do povo, que
reinado, os cristãos da Palestina so fressem violenta perse- cons idera va os cris tãos "ateus" como causadores de tan-
g uiçã o por parte dos judeus. Estes, chefiados por Bar- tos males .
kochba, s ublevaram-se conlra Roma (1 32-35), por causa b. Da grande aflição da Ig re ja nos dão uma idéia a s
dos editos de Domiciano e Adriano que p ro ibiam a circun- a pologia s de Atenágoras, Melito, Me lda des e Apolinaris, di-
ci são, e p or causa da ordem de Adria no de reconstruir Je- rig idas neste tempo a o imp era ? or, como também as relações
rusalém como cidade pu ramen te pagã, com o nome de Élia e os atos dos mártires d e~peri oçlo . E' · verdade que não
Capitolina (SueI., Dom. 7; Dio, Hi st. 67 ). Os cristãos, ne- foi lançado prúpriamente u·m ed ilo ··. d e perseguição; mas
gando-se a tomar parte na sublevação, tiveram que sofrer um rescrito de 176, que proibia a introdução de novas re-
a vingança de Barkochba (Just., Apol. I, 31), que, só de- lig iões, dirigia-se, ao meno S indireta mente, contra os cris-
pois de longas lutas, foi derrotado pelos exércitos roma- tãos (Eus., HE 4, 26). A um a consulta do procônsul das
nos (Dio, Hist. 69). G á lias respondeu o imperador que ma nda sse executar os
134. a. Mais favorável ainda do que Adriano mostrou- c ristãos, que não quisessem abando na r a sua religião. Em
se aos cristãos seu sucessor Antonino Pio (138-61). Eusé- o ut ras províncias, a s autoridades toma ra m semelhantes me-
bio nos transmitiu um edito, que este imperador teria diri- d idas mes mo sem rescr ito imperia l, co rrespondendo ao ódio
gido às cidades da Ásia proco nsular (HE 4, 13) , tecendo das massas populares.
gra ndes elogios aos cristãos e castigando os seus delatores . c. É, pois, pouco provável que Marco Aurélio, depois
Se este edito de tolerância, hoje em dia, ge ralmente é con- da vitória sobre os quados, tenha proibido a perseguição,
siderado como apócrifo, ao menos na s ua forma atual, cer- C0 1110 nos relatam fonte s cristãs (Tert., Apol. 5 ; Eus. , HE
tamente autêntico é outro edito do mesmo imperador, di- 5, 5) . Aliás, também as M editações do imperador não nos
ri gido aos habitantes de Larissa, T essaloni ca, Atenas e ou- permit em acreditar em tal med ida. Ele próprio atribuiu a
tras cidades da Grécia. Aqui Antonino Pio não proibe os vitória à s armas roman as e a Júpiter Plüvio, e não às ora-
p rocessos contra os cristãos como ta is, mas sámente os ex- ções dos cristãos.
cessos (Eus., HE 4, 26).
136. Primeira vítima desta p ersegUl çao foi S. Justino,
b. Realmente, nem no reinado de Antonino Pio falta- martirizado em Roma, no ano de 165. Com ele sofreram seis
ram martírios. Em Roma morreu S. T olomeu com dois ou- companheiros. Em Roma morreu ta mbém o papa Aniceto
tros cristãos, cujo martírio deu motivo a Justino a escre- (154-65). O longo pontificado de seu sucessor Sotero
ver a sua 2.' apologia. A vítima mais insigne deste tempo (166-74) prova, porém , que na ca pita l houve relativa tran-
foi o grande bispo, S. Policarpo de Esmirna, cujo martí- quilidade. A perseguição não obedeCia a um edito univer-
rio nos foi relatado minuciosamente numa carta da Igreja sal, nem ao cego ódio do fil ósofo no tro no. Mas houve nu-
76 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 16. A perseguição de Setímio Severo 77

merosos mártires nas províncias. Certamente histórico é o do século II, muitos cristãos, martirizados pelos magistra-
martírio de Carpo, Pápilo e Agatonice de Pérgamo. dos. Contra eles escreveu Tertuliano os seus livros Apolo-
Com especial crueldade foram perseguidas as Igrejas geticam e Ad Na/iones (197).
de Viena e de Lião nas Gálias, onde uns cinquenta már- 139. No entanto, as perseguições entraram, em breve,
tires selaram com o sangue a sua fé. O próprio bispo, Po- numa segunda fase. E nada mais natural. Como a Igreja, a
tino, quase centenário (t 177), deu-lhes o exemplo. Os fiéis este tempo, já se apresentasse perfeitamente organizada e
daquela Igreja descreveram-nos os horrores da perseguição parecesse aos pagãos como um Estado universalista dentro
e o heroísmo de seus irmãos numa carta às comunidades do Estado romano, o próprio imperador mudou de conduta,
da Asia proconsular e da Frígia. A carta não chegou até começando a proceder mais sistemàticamente contra os cris-
nós; mas Eusébio nos conservou boa parte (HE 5, 1-2). tãos. Pode ser que, além das considerações politicas, in-
Os mesmos cristãos enviaram ao papa Eleutério (174-89) o fluíssem também revoltas dos judeus e exagerações dos
presbítero lreneu com a relação dos seus sofrimentos. lre- montanistas.
neu seria, em seguida, bispo de Lião. Ü golpe dirigiu-se principalmente contra os catecúme-
137. A Marco Aurélio sucedeu Cômodo (180-92), ho- nos. Um decreto de 202 proibiu, sob penas graves, a con-
mem perverso e imperador indigno. Todavia, os cristãos go- versão ao cristianismo, como um decreto do ano anterior
zaram de paz, durante todo o seu reinado. Isto se deve à proibira passar ao judaismo (Spart., Sever. 17, 1). A per-
influência de Márcia, sua çsposa morganática (Hipol., seguição particular e tumultuosa do século II, começou a
Philos. 9, 12), que, se não era cristã ou catecúmena, ao ser perseguição da Igreja como tal; e tão espantosa foi a
menos era amiga dos cristãos. Não obstante, ficou em pé tempestade, que muitos julgavam ter chegado o tempo do
o rescrito de Trajano, em virtude do qual sofreram o mar- anticristo (Eus., HE 6, 7).
tirio alguns fiéis. Em Cartago foram condenados os seis 140. Na capital houve relativa tranquilidade. O papa
mártires cilitanos (180), cujos atos nos são conservados. Vítor I (189-98) pôde celebrar um sínodo para solucionar
Em Roma sofreu S. Apolônio (t 184), que pertencia à aris- O problema da celebração da Páscoa. Zefirino (198-217)
tocracia da cidade (Eus., HE 5, 24), e S. Jerônimo dá-lhe sobreviveu ao imperador. Tanto mais cruel foi a perseguição
o título de senador. Os atos do seu martírio são autênticos 'la Africa proconsular, onde Scápula continuou a perseguir
(Rauschen, Flor. Patr. m, 3. cd. 85 sS). O discurso que os fiéis, ainda depois da morte de Setímio. Em Cartago
o ilustre mártir pronunciou em sua defesa perante o tribu- ocorreu o glorioso martírio de S. Perpétua e S. Felicidade
nal do prefeito pretoriano Perenis pode ser contado entre e companheiros. S. Perpétua mesma narra o seu martírio;
as apologias do século II. e a sua Passio, redigida talvez por Tertuliano, é, entre os
documentos deste gênero, o mais belo de todo o período
das perseguições.
§ 16. A perseguição de Setímio Severo e o primeiro período
Em Alexandria sofreram S. Leônidas e muitos discípu-
de paz
los de seu filho Orígenes. A escola catequética teve de fe-
138. Cômodo não conhecia limites nos seus excessos. char as suas portas. Clemente, diretor da escola, deixou a
Foi um tirano tão cruel, que pareciam ter voltado os tem- cidade, e Orígenes, seu jovem sucessor. sofreu violentas ve-
pos de Calígola e de Nero. Acabou por cair vítima de um xações. Eusébio fala de numerosos outros mártires do Egi-
atentado. Depois de uma longa luta pela coroa imperial, to e da Tebaida (HE 6, 5). Clemente de Alexandria diz,
Setímio Severo (193-211) foi universalmente reconhecido. no 2 9 livro dos Strôrnuta, que ele viu diàriamente correr cu-
Ele continuou, a principio, a política tolerante de seu an- pioso sangue cristão.
tecessor, razão por que Tertuliano lhe dedicou palavras de 141. Setímio Severo faleceu numa expedição à Britâ-
grande elogio (Ad Scap. 4). Todavia, morreram, pelo fim nia (211), deixando o império a Caracala e Geta. Com sua
..
78 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 16. A perseguição de Setímio Severo 79

morte começou um longo período de paz que durou, in- em Roma, decidiu em favor dos primeiros para exercerem
terrompido só pelo breve reinado de Maximino Trácio, até ali o culto divino (I. c. 49).
à perseguição de Décio (250). Caracala, aliás um tirano b. Apesar de tudo, perante a lei a condição dos cris-
perversíssimo e assassino d~ seu irmão, quanto aos cris- tãos permaneceu a mesma. Por isto, não é impossível, que
tãos observou uma tolerância que, em parte ao menos, se tenha havido martírios, durante o reinado do excelente mo-
explica pelas impressões que do cristianismo tivera na sua narca. As atas falam dos papas Calisto I (217-22) e Ur-
juventude (Tert., Ad Scap. 4), em parte, porque, sendo de bano I (222-30); e com o nome de Urbano liga-se também
família síria, não tinha relação intrínseca com a religião do o de S. Cecília. Mas todas as atas, atribuídas ao reinado
Estado. Macrino (217-18), elevado ao trono depois do as- de Alexandre, são muito lendárias para poderem servir de
sassinio de Caracala, professou a mesma tolerância. Uma fontes históricas.
nova rebelião acabou por dar a coroa imperial a Eliogábalo 144. Uma real'ão profunda contra os favores de Ale-
(218-22), então sacerdote do Sol na Síria, apesar de ter
xandre fez-se sentir, quando o jovem imperador foi assas-
apenas 13 anos de idade.
sinado em Mogúncia, numa expedição contra os germâni-
142. Já na corte de seu tio Setímio Severo, iniciara- cos. O assassino Maximino Trácio (235-38) cingiu a coroa
se certo movimento religioso sincretista, promovido especial- imperial e perseguiu cruelmente os cristãos como partidá-
mente por Júlia Domna, filha de Bassiano, sumo sacerdo- rios de seu antecessor. Os seus decretos dirigiram-se, so-
te do Sol, e esposa de Setímio. Tal movimento veio a ser bretudo, contra os chefes da Igreja (Eus., J-1E 6, 27). De
sumamente perigoso para o cristianismo, quando Eliogába- fato, o Catálogo Liberiano de 354 nos traz a notícia de que
lo formou o plano de refundir todos os cultos, mesmo o o papa Ponciano (230-35) foi condenado, junto com Hipó-
cristão, com o culto do Sol Invicto Mitras, que ele profes- lito, a trabalhos forçados nas minas da Sardenha (Kirch
sava. Não pôde, porém, realizar os seus projetas; pois, por 547), onde ambos morreram. Também Antero, sucessor de
causa dos crimes que praticava no exercício do seu culto, Ponciano, morreu ao cabo de um ano, não sendo, porém,
os pretorianas o assassinaram (Lampr., Heliog. 3. 17). possível verificar se morreu como mártir.
143. a. Alexandre Severo (222-35), seu primo, que lhe Entretanto, Maximino não foi universalmente reconhe-
seguiu no trono, foi de caráter diametralmente oposto. Jo- cido e, portanto, os seus decretos não foram executados em
vem ideal, justo e puro no meio da devassidão da corte e, toda parte. Só nas províncias da Capadócia e do Ponto,
por isto, odiado por Eliogábalo, professava também °sin- onde, por causa de terremotos, o fanatismo do povo se acen-
dia mais ardentemente contra os cristãos, correu copiosa-
cretismo religioso. Mas, influenciado por sua mãe Júlia Ma-
mente o sangue dos mártires (Cypr., Ep. 75, 10).
méia, que procurava conhecer a religião cristã e, por isto,
entretinha relações com Orígenes e Hipólito, "permitiu exis- 145. Contra Maximino surgiram, em breve, revoluções
tirem os cristãos", como diz Lampridio (Alex. Sever. 22). em diversas partes do império. Os imperadores, proclama-
Segundo o mesmo escritor (c. 51), fez até escrever no seu dos por meio destas revoltas, Oordiano I, Oordiano II, Pu-
pieno e Balbo, caíram vítimas de Maximino ou dos preto-
palácio o preceito do Evangelho: "O que não queres que
rianos. Finalmente, o tirano foi assassinado nas vizinhan-
a ti façam os homens, igualmente não o faças tu a eles"
ças de Aquiléia, quando, declarado inimigo da pátria, inva-
(Lc 6, 31). Da mesma forma mandou, se é verdade o que
diu a Itália. Oordiano III (238-44), menino de treze anos
relata Lamprídio, colocar no seu oratório pagão a imagem de idade, foi elevado ao trono. Mas Filipe o Árabe (244-49)
de Cristo, juntamente com as de Apolónio de Tiana, Abraão o assassinou, numa expedição contra os persas, para cingir
e Orfeu. E teria edificado um templo a Jesus Cristo, se os a coroa. E ele simpatizou tão abertamente com o cristianis-
sacerdotes pagãos não o tivessem impedido (I. c. 29. 43-51). mo, que parecia ter abraçado a nova religião (Eus., HE
Numa contenda entre cristãos e taberneiros sobre um local 6, 34). De fato, porém, não é provável ter professado a
...
80 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 17. A perseguição sistemática e o segundo período de paz 81

doutrina do Evangelho um imperador que, pelo assassínio, (Cypr., De lapso 7-9; Eus., HE 6, 39-41). Não menos de
subiu ao trono e que, quando em 247 se celebrava o mile- 41 destes libelos foram encontrados, desde 1893, no Egito,
nário da fundação de Roma, apareceu trajado de pontífice não sendo, porém, possível verificar a origem cristã de ne-
máximo (Eutr., Fel. 9, 3). nhum deles.
Neste longo período de paz que vai desde Setímio Se- 148. Mas o heroísmo cristão não se apagara de todo.
vero até Filipe o Árabe, o cristianismo cresceu considerà- Muitos fiéis preferiram renunciar antes à vida, do que à
velmente. Ao desenvolvimento externo, porém, não corres- sua fé. Em Roma sofreu o martírio o papa Fabiano (235-
pondeu, infelizmente, a vida interna. Muitos cristãos deixa- 50). Em Esmirna, o sacerdote Piônio foi preso, quando ce-
vam dominar-se pela tibieza; já não conheciam o heroís- lebrava a memória de S. Policarpo. Como o grande bispo,
mo dos mártires, capaz de resistir, quando uma nova per- assim também o piedoso presbítero morreu nas chamas da
seguição veio afligir a Igreja. fogueira. Em Tiro foi cruelmente maltratado o grande Orí-
genes, que, pouco depois. veio a falecer. Em Alexandria, o
§ 17. A perseguição sistemática e o segundo período de paz jovem Dióscoro, que tinha apenas quinze anos de idade,
sofreu com tão admirável heroísmo, que o governador lhe
146. Pelos meados do século m, o império marchava a restituiu a liberdade. Aos mártires deste tempo pertencem,
passos rápidos para a ruína moral e política. Nas frontei- entre outros muitos, também S. Águeda de Catânia e S. Fé-
ras ameaçavam contínuas rebeliões e incursões dos povos lix de Nola.
finítimos. Em Roma estavam esquecidas a religião e as an-
149. A perseguição causou grande perturbação na
tigas tradições.
Igreja. Mas teve para ela também um efeito salutar. Pu-
Décio (249-51), que, numa expedição para a Panõnia,
rificou-a de seus maus elementos; e das ruínas ressurgiu
fora proclamado imperador, resolveu restituir ao império o
a Igreja rejuvenescida. Muitos renegados voltaram ao seio
antigo esplendor. Julgando dever, antes de tudo, restabele-
cer a unidade interna e religiosa, projetou submeter os nu- da Igreja. Outros, não sentindo bastante força para enfren-
tar o martírio, retiraram-se aos desertos, dando início à vi-
merosos cristãos à religião do Estado, custasse o que custas-
se. Portanto, o fundamento jurídico das perseguições foram, da eremitica. O edito deciano foi um fracasso.
daí em diante, editos universais, que visavam a extinção Convencendo-se de que não conseguiria o desejado
completa do cristianismo, não pela morte dos fiéis, mas pela efeito, Décio desistiu, em principias de 251, de seu edito.
apostasia. Pouco depois, caiu morto na guerra contra os godos. Fora
uma figura grande e nobre entre os imperadores romanos,
147. Pelo fim de 249 ou em principias de 250, apa-
receu o edito de Décio, que ordenava a todos os súditos mas uma figura trágica. Não conhecera os sinais do tem-
oferecessem um sacrificio aos deuses do Estado. O golpe po, as forças intrínsecas do cristianismo. Fascinado pelas
veio muito de improviso, e muitos, de fato, leigos e clérigos, festas brilhantes do milenário, que revestiram a antiga re-
apostatararn, ou em consequência de simples ameaças ou ligião do Estado dum esplendor aparente, exaltara-lhe de-
de terriveis tormentos. O bispo Dionisio de Alexandria des- masiadamente as forças e a vitalidade.
creve o grande temor dos cristãos do Egito ao publicar-se 150. Sucedeu-lhe no trono o imperador Galo (251-53)
o edito. S. Cipriano, bispo de Cartago, relata os aconteci- que admitiu ao governo seu filho Volusiano. Em consequên-
mentos em sua Igreja. cia duma peste, Galo ordenou que se oferecessem sacrifí-
Ele distingue três categorias de lapsos. Uns ofereciam cios expiatórios a Apolo. Como os cristãos se negassem a
sacrifícios (sacrificati); outros só queimavam incenso dian- cumprir a ordem, tiveram que sofrer nova perseguição (Eus.,
te das imagens (thurificati); outros ainda procuravam obter HE 7, 1). Desta vez, porém, estavam melhor preparados
um libelo (libellatici) ou a inscrição nos registras imperiais e mostraram maior constância nos suplícios, do que no
(acta facientes) em testemunho de obediência ao edito tempo de Décio. O papa Cornélio morreu no desterro (253).
Compêndio I - 6
82 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 17. A perseguição sistemática e o segu ndo período de paz 83

Lúcio, seu sucessor, também foi expulso. Alguns cristãos scu próprio seio houve dolorosas agitações. Contra o papa
que, meses atrás, haviam renegado a fé , expiaram a culpa Corn('lio, uma pequena minoria elevou ao sólio papal o or-
pelo martirio. ~ulh()so presbítero Novaciano (251-58?). Aos motivos pes-
151. a. Galo, porém, caiu vitima duma rebelião, e Va- soais dcsta eleição acresceram motivos disciplinares que di-
leriano (253-60) restabeleceu a paz. O papa Lúcio pôde ziom respeito à penitência e produziram um perigoso cisma,
voltar do desterro (Cypr., Ep. 58). Segundo o testemunho o "isma novaciano (cfr. § 37).
de Dionísio Alexandrino, muitos cristãos se achavam até no 153. a. A perseguição de Valeria no terminou, quando
palácio do imperador. o imperador, traido, como diz Dionísio Alexandrino, por
Mas o mesmo Dionisio nos informa que Valeriano, pelo Macriano, caiu vergonhosamente nas mãos do rei Sapor I
fim do seu reinado, mudou de conduta, provàvelmente a da Pérsia. Galieno (260-68), seu filho, não se preocupando
instâncias de seu favorito , Macriano) general e mago egípcio com a sorte de seu pai, restabeleceu logo a paz religiosa e
(Eus., HE 7, 10-12). O escopo que visava era o de Décio; restituiu aos cristãos os cemitérios e as igrejas (Eus., HE
mas o modo foi mais violento. Um edito de 257 mandou, 7, 13) . Estes favores devem-se, provãvelmente, ao influxo
sob pena de desterro, que os bispos, presbiteros e diáco- de Salonina, esposa do novo imperador, que simpatizava
nos sacrificassem aos deuses. Sob pena de morte foram proi- com o cristianismo. E com isto começou um período de paz,
bidas as visitas aos cemitérios e às reuniões cultuais. que durou mais de quarenta anos.
b. Vendo que este primeiro edito não surtia o desejado b. O papa Dionísio pôde, pois, reorganizar a Igreja
efeito, o imperador fez seguir outro, em 258, muito mais romana, tão provada nos anos anteriores. E soube tam-
rigoroso. Ordenou l' que os clérigos superiores fossem lo- bém fazer valer a sua autoridade de bispo universal. Apa-
go executados, se perseverassem na fé; 2' que os fiéis lei- rece como árbitro que vela pela pureza da fé, sobretudo na
gos de alta condição perdessem seus bens e dignidades e, questão do monarquianismo sabeliano. Para ele apela o
se ainda perseverassem, fossem também supliciados; 3' que mundo em questões de fé.
as mulheres nobres fossem despojadas de seus bens e des- c. Mas, embora o cristianismo pràticamente fosse reco-
terradas; 4° que os oficiais dos domínios imperiais fossem nhecido como religião lícita, a condição juridica ficou a mes-
condenados a trabalhos forçados. ma como dantes. Permaneceu também a aversão das mas-
152. a. Os mártires mais celebrados desta perseguição sas do povo e das autoridades provinCIaIS. O sucessor de
foram, em Roma, o papa Xisto II (257-58) e seus sete diá- Galieno, Cláudio 11 (268-70), parece até ter perseguido
conos, entre eles o glorioso S. Lourenço. A forma de seu os fiéis.
martírio tão conhecida, na grelha, é descrita, no entanto, 154. a. Aureliano (270-75) manteve o ·edito de Galie-
só em atas lendárias. Quase um ano passou, sem que fússe no. Confirma-o o benévolo acolhimento das petições que lhe
possivel dar a Xisto II um sucessor. Foi eleito então Dio- fizeram os fiéis de Antioquia contra as pretensões de Pau-
nisio (259-67). Que também os jovens Tarcisio e Pancrá- lo de Samósata (Eus., HE 7, 30). Este heresiarca monar-
cio tenham sido martirizados nesta perseguição, não é pos- quianista não quis ceder, apesar de ser deposto por um sí-
sivel provar. Em Cartago sofreu o martírio o grande bispo nodo. O imperador pagão pronunciou-se a favor do partido
S. Cipriano. Possuímos ainda duas relações sobre o seu que estivesse em união com a Igreja de Roma.
processo e sobre a sua heróica morte (Ruinart 252 ss). Em b. No entanto, como Aureliano fosse muito zeloso pelo
útica, na África, um grupo numeroso de mártires, conhe- culto dos deuses, não causa maravilha que cedesse às ins-
cidos pelo nome de massa cândida, e, na Espanha, S. Fru- pirações dos idólatras e publicasse um edito de persegui-
tuoso, bispo de Tarragona, morreram igualmente pela fé. ção. Mas o edito não teve importância, porque Aureliano
b. A Igreja achava-se, pois, nos meados do século IH, foi assassinado, no mesmo ano, e seus sucessores tiveram
numa situação extremamente difícil, tanto mais, porque no de concentrar as suas atenções em outros problemas. Nada
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84 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 18. Último combate e vitória final do cristianismo 85

se sabe de perseguições durante os reinados de Tácito l"tâncio (De mar!. pers. 16) designa como autor das maqui-
(275-76), Probo (276-82), Caro (282-83) e seus filhos Nu- nações o neoplatônico Hiérocles, governador da Bitínia, que
meriano e Carino (283-85). Mais perigosa foi uma reação também com a arma literária combatia o cristianismo.
espiritual anticristã, que durante o reinado de Aureliano te- 157. G. Esta última e mais sangrenta de todas as per-
ve a sua expressão nos 15 livros do neo-platónico Porfírio seguições da antiguidade começou por um expurgo no exér-
(clr. § 20). cito. Só depois de longas deliberações consentiu Dioclecia-
Durante este longo período de paz, a Igreja pôde de- 110 na perseguição da Igreja. Não foi tirano. Tiranos foram
senvolver-se tranquilamente e recolher forças para resistir (jalério e, em seguida, o césar Maximino Daja.
à última tempestade, a mais cruel e sangrenta de todas, a b. Apareceram, com breve intervalo, quatro editas. O
perseguição de Diocleciano. primeiro mandava destruir as igrejas e queimar os livros
sagrados. Quem os entregava era chamado Htraditor". O
§ 18. último combate e vitória final do cristianismo edito privava, além disso, os cristãos dos direitos civis, ti-
rava aos que tinham algum cargo honorífico os seus pos-
155. Diocleciano (284-305), filho dum escravo de Dio- tos e dignidades e condenava a trabalhos forçados os em-
c1éia na Dalmácia, mas imperador prudente e capaz, seguiu pregados imperiais (Eus., HE 8, 2; Lac!., De mar!.
igualmente, pelo espaço de vinte anos, a politica de tole- pers. 13).
rância. Todos os seus cuidados concentravam-se na boa c. Mas este primeiro edito parecia a Galé rio muito mo-
administração do império. Logo depois da sua elevação ao derado. Um incêndio no palácio imperial de Nicomédia e
trono, dividiu-o em duas partes, reservando para si, com o rebeliões na Síria e Capadócia, atribuídas aos cristãos, mo-
titulo de Augusto Jóvio, a parte oriental com residência em tivaram um segundo edito, que ordenava a prisão dos clé-
Nicomédia, e confiando o ocidente a Maximiano, com o tí- rigos. Um terceiro oferecia a liberdade aos apóstatas, en-
tulo de Augusto Hercúleo, com residência em Milão. Para quanto que os renitentes deviam ser martirizados até à mor-
cada uma das partes do império nomeou, em 293, um césar te (Eus., HE 8, 6). Um quarto edito estendeu finalmente
com direito de sucessão: Galé rio para o oriente, com resi- esta coação a todos os cristãos.
dência em Sírmio, e Constâncio Cloro para o ocidente, com 158. G. Desde então correu em torrentes o sangue dos
residência em Treves. Desta forma todo o império estava mártires. Só nas Gálias, Espanha e Britânia havia paz.
dividido em quatro prefeituras, doze dioceses e noventa e Constâncio Cloro só permitiu executar o primeiro edito. Os
seis províncias, organização esta que, mais tarde, seria mo- mártires mais conhecidos deste período são S. Inês, S. Lú-
delo da organização da Igreja. cia, S. Justina de Pádua, S. Januário, bispo de Benevento
156. G. A paz duradoura favoreceu extraordinàriament;; e, desde o século V, padroeiro de Nápoles, e o mais cele-
a propagação externa da fé cristã. Nas cidades populosas brado de todos, S. Sebastião. S. Brás talvez tenha sofrido
ostentavam-se já formosas igrejas. Em muitas partes do mais tarde o martírio. Muito lendários são os martírios de
oriente e da África, o número dos cristãos era igualou até S. Maurício e da legião tebaica, como também de S. Úrsula
superior ao dos pagãos. A própria esposa de Diocleciano, e das suas "onze mil" companheiras.
Prisca, e sua filha Valéria ado taram o cristianismo ou, ao b. Naqueles dias tremendos, a Igreja era chefiada pelo
menos, simpatizavam com ele. papa Marcelino (296-304). Ele foi acusado pelos dona tis-
b. Mas as forças adversas compreendiam que era che- tas de ter renegado temporàriamente a fé e de ter sacrifi-
gado o momento da luta decisiva. Um partido pagão, che- cado incenso aos deuses. E' pura invenção. Já S. Agosti-
fiado por sectários do neoplatonismo, que se formava em nho negou tal opinião.
redor de Galério, logrou convencer o supersticioso Diocle- 159. Diocleciano, cansado e desanimado pelo insuces-
ciano da necessidade de mudar a sua política religiosa. La- so, abdicou em 305; e com ele teve de renunciar também
..
86 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 18. último combate e vitória final do cristianismo 87

Maximiano. Os dois césares sucederam-lhes como augus- derrotado numa guerra com os armênios. Constantino
tos. Galério nomeou para césares Maximino Daja para o Magno, em breve, havia de conduzir o cristianismo à vitória
oriente e Severo para o ocidente (Itália e África). Depois completa.
da morte de Constâncio Cloro (t 306), Severo recebeu a 162. Ofendido por Maxêncio, Constantino marchou con-
dignidade de augusto. Mas na sua expedição contra Maxên- Ir> Roma, em Outubro de 312, venceu o seu adversário jun-
cio (306-12), filho de Maximiano, que usurpara o poder til .1 Ponte Mílvia e entrou triunfalmente na cidade. A sua
na Itália, perdeu trono e vida (307). Galério, não reconhe- vitória foi o triunfo do cristianismo. Já no ano seguinte,
cendo o usurpador, nomeou augusto para a Itália a Licínio. Constantino e Licínio publicaram, de comum acordo, o
Esta nomeação descontentou sériamente a Maximino e Cons- Edito de Milão (Lact., De mort. pers. 48; Eus., HE !O, 5),
tantino que sucedera a seu pai Constâncio e já fora pro- que assegurava a todos o livre exercício do culto, restituía
clamado augusto pelo exército. A fim de tranquilizar os âni- a<>s crístãos todas as ígrejas e todos os bens que se lhes
mos, Galério concedeu o título de augusto a todos os che- haviam tirado durante a perseguição e concedia às auto-
fes legítimos das prefeituras. ridades e comunidades cristãs o direito de personalidades
160. a. Nos ,domínios de Galério, Maximino e Licínio jurídicas. Com este edito começa uma nova época na histó-
continuou a perseguição (Lact., De mort. pers. 21 ss; Eus., ria do cristianismo.
De mar!. pal.). Morreram, a este tempo, os doutos presbí- 163. O novo estado das coisas não foi, porém, reco-
teros Pânfilo de Cesaréia e Lucíano de Antioquia, como nhecido por Maximino Daja. Ele excedia em crueldade o
também os bispos Pedro de Alexandria e Metódio de Olim- próprio Galério. Por isso, Licínio declarou-lhe a guerra e
po. Nas províncias do Danúbio sofreram S. Vítorino de <> venceu na batalha de Adrianopla. Desesperado, este mais
Petau, S. Quirino de Síscia e os "Quatro Coroados". Se- cruel de todos os perseguidores suicidou-se em Tarso, tG-
gundo cálculos de Eusébio, o número dos mártires foí imen- mando veneno (t 313). Infelizmente, também Licínio, ambi-
so; e maior aínda foi o número dos confessores, lançados cionando o domínio de todo o império, aproximou-se nova-
nos cárceres, submetidos a tormentos, enviados às minas, mente do partido pagão, começando a perseguir os cristãos.
depois de mutilados. Só nos domínios de Constantino e Ma- Pessoalmente não pronunciou nenhuma sentença de morte
xêncio os cristãos gozavam de quase completa paz. por motivo de religião; mas permitiu que o fizessem os go-
b. Não obstante, a Igreja romana achava-se em condI- vernadores das províncias. As vítimas mais conhecidas são
ções dificílimas. Depois da morte do papa Marcelino, não os chamados Quarenta Mártires, soldados de Sebaste na Ar-
foi possível dar-lhe logo um sucessor, devido às persegui- mênia, e S. Brás, bispo da mesma cidade.
ções externas e perturbações internas. Só ao cabo de qua- 164. Em tais condições, religiosas e políticas, não se-
tro anos sucedeu-lhe Marcelo I (308-09). Durante a lon- ria possível evitar-se uma guerra entre os dois rivais. Cons-
ga sedisvacância, a organização eclesiástica ficou quase in- tantino venceu em duas batalhas o seu adversário (323),
teiramente dissolvida. e, senhor de todo o império, introduziu em toda parte o
161. Mas, em breve, despontaria o dia da paz, também Edito de Milão. Rejubilava a cristandade, e Eusébio expri-
me esta alegria, quando no princípio do último livro da sua
no oriente. Galério adoeceu gravemente, em 310. Talvez ain-
história eclesiástica canta com o salmista: "Cantai ao Se-
da no fim do mesmo ano, redigiu, de acordo com Licínio
e Constantino, um edito de tolerância, publicado em 311 nhor um cãntico novo, porque Ele operou maravilhas. A sua
destra e o seu santo braço fizeram-no triunfar. O Senhor
(Lact., De mort. pers. 34; Eus., HE 8, 17). Confessando
manifestou o seu salvador; revelou a sua justiça aos olhos
que se enganara em perseguir os cristãos, concedeu-lhes
das nações" (SI 97, 1-2).
restaurar as suas igrejas e exercer livremente a sua religião.
165. A visão de Constantino. - A conversão de Constantino
Só Maximino soube, por algum tempo, ignorar em seus do- foi de tão grande importância para o império romano e para a
mínios o edito. Pouco depois faleceu Galério. Maximino foi história universalf que fàcilmente se compreende a origem das len-
88 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 19. Importância apologética das perseguiçGes 89
das que se ligam a este acontecimento. Eusébio refere, na sua his- não a morte. Todavia, ainda no século III, ambas as pala-
tória eclesiástica, simplesmente, que Constantino, antes da guerra vras eram empregadas indistintamente.
contra Maxêncio, invocou o auxílio de Deus, e que, depois da vi-
tória, ordenou, se colocasse na sua estátua triunfal, que os romanos 167. O testemunho dos mártires é de grande impor-
lhe erigiram, o sinal da redeNção e se escrevessem no pedestal pa- tância para demonstrar a divindade da religião católica. Para
lavras alusivas ao fato (HE 9, 9). compreender toda a força deste argumento convém ter-se
Mais tarde, na sua Vila Constantini (1, 28-31), escrita em 337, presente a grande multidão dos que pela fé sofreram a mor-
relata Eusébio a visão lendária da cruz, apoiando-se no que lhe
dissera o próprio imperador. Segundo esta narração, no princípio te. Tem-se afirmado que o número foi muito exagerado; e
da guerra, provàvelmente ainda nas Gálias, numa tarde, o impera- é verdade. Mas não é menos verdade que uma historiogra-
dor estava olhando para o céu, quando, de repente, viu, em cima fia tendenciosa e de má fé o tem diminuido demasiadamen-
do sol, uma cruz flamejante com esta inscrição: TO{JT,ú) vExa. Na te. Se consultarmos as fontes autênticas, Tácito, Clemente
noite seguinte, apareceu-lhe Jesus Cristo com o mesmo ~inal e orde- Romano, Plínio o Moço, lreneu, Cipriano, Eusébio, Lactân-
nou-lhe que mandasse fazer um estandarte com ° monograma de cio, etc., não podemos negar, que foi realmente muito ele-
Cristo, o Lábaro.
Esta relação de Eusébio não carece de dificuldades; pois a apa- vado. Certo escritor moderno (Rosenberg), paganizante, ce-
rição da cruz, como aqui se refere, não é mencionada em nenhuma go pela paixão e por preconceitos, indica, para a persegui-
das primeiras relaçôes. Todavia, é fora de dúvida que não se ba- ção de Diocleciano, nada mais de "nove bispos rebeldes exe-
seia numa mera invenção. Também Nazário, num panegírico a Cons- cutados" e, "para a província da mais veemente resistência,
tantino, feito em 321, alude ao acontecimento. Lactâncio, igualmen-
te contemporâneo, nota, já pelo ano de 314, que Constantino, du-
a Palestina, nada mais de oitenta sentenças executadas".
rante um sono, recebeu uma ordem divina de afixar nos escudos E, todavia, já Cipriano, meio século antes de Diocleciano,
o sinal de Deus e entrar assim no combate (De mort. pers. 44). fala de um "martyrum innumerabilis populus" (De morta-
Quando, alguns anos depois da vitória, foi levantado, em honra de' litate 26). Eusébio, metropolita de Cesaréia, não pretendia
Constantino, o arco triunfal, nele foi gravada a inscrição: "Imp. escrever a história dos mártires, senão da Palestina, e, no
Caes. FI. Constantino Maximo P (io) F (e1ici) AugustoS. P. Q. R.
quod instinctu divinitatis ... rempublicam ultus est armis". entanto, fala de centenas de mártires do Egito.
Allard, IV - V. - Bacei Venuti, Dalla grande persecuzione alIa 168. Houve numerosos mártires de todos os sexos, de
vittoria de Cristianesimo, Milano 1913. - Batiffol, La paix Constan- todas as idades e de todas as condições. Os suplícios eram
tinienne et le catholicisme, 4. ed., Paris 1929. - La scuola cat- tantos e tão diversos, que fazem estremecer a quem lê as
tolica, periodo mensile, ano XLI.o, serie V, vaI. II: II XVI Cente-
nario della libertà deJla Chiesa, Milano 1913. atas e as relações. Tácito os chama esqllisitissimos (An 15,
44). Quanto aos gêneros de tormentos, uns eram prescritos
pela lei, outros, muitas vezes, mais horríveis, eram inventa-
§ 19. Importância apologética das perseguições
dos pela crueldade dos carrascos. A constância, com que os
166. "Mártires" chamavam-se os heróis cristãos, que so- mártires os suportavam, era tão heróica e tão serena, que
freram por causa da sua fé. A palavra "mártir" significa, inspirava admiração aos próprios gentios.
segundo a sua origem grega, "testemunha". Empregava-se, Acrescem ainda milagres extraordinários, que se faziam
nos tempos apostólicos, para significar as testemunhas auri- por ocasião dos suplícios. Muitos perseguidores, cegos, ne-
culares e oculares da vida e ressurreição do Senhor, i. é, les não viam, senão produtos da magia. Muitos outros, po-
os apóstolos (At I, 8. 22). Ora, haverá testemunho maior rém, reconheciam neles a intervenção dum Deus todo-po-
em prol de uma verdade do que derramar por ela o próprio deroso.
sangue? De fato, a palavra passou, em seguida, a designar 169. A consequência de tudo isso foi a multiplicação
aqueles que, com o seu sangue, deram testemunho da rea- prodigiosa dos cristãos, de sorte que Tertuliano podia lan-
lidade dos fatos evangélicos e da doutrina dos apóstolos, en- çar em rosto aos magistrados: "Quanto mais vidas nos cei-
quanto que os demais defensores da fé eram chamados de fais, tanto mais nos multiplicaremos; semente é o sangue
"confessores", embora sofressem também perseguições, mas dos cristãos" (Apol. 50).
§ 20. Polêmicas contra o cristianismo 91
90 I época: Desde a lundação da Igreja ao Edito de Milão

Desta forma, o martirio é uma prova convincente da Origenes escreveu Contra Celsum (248). Celso divide a sua
divindade do cristianismo. Realmente, era impossivel que obra em quatro partes. Na primeira, o judaismo combate
tantos mártires de todas as idades e condições, em todos a idéia messiânica dos cristãos; na segunda, ele mesmo com-
os pontos do mundo, se sujeitassem, com paciência herói- bate a idéia messiânica em geral, também contra os judeus,
ca, a uma morte dolorosa, prolongada e associada às mais pretendendo destruir assim o fund.amento ?O cristianis"-,o;
requintadas torturas, se Deus os não amparasse e socorresse na terceira impugna algumas doutnnas particulares. da. f: e
para não renegarem a sua fé. Uma religião assim protegida da moral cristãs; na quarta, finalmente, procura Justificar
por Deus, tem que ser forçosamente divina. o paganismo, fornecendo com as suas afirmações as arm.as
de combate não só aos seus contemporâneos, mas tambem
Delahaye, Sanctus, Bruxelas 1927. - Allard, Dix leçons sue le
martyre, Paris, 3. ed., 1907. - Rosenberg, Mythus des 20. aos inimigos posteriores da Igreja católica até aos nos-
jahrhunderts, Muenchen 1934. - Devivier, Curso de apologética sas dias.
cristã, São Paulo 1925. c. Ao mesmo tempo viveu Franto de Cirta (t dep. 175),
mestre de Marco Aurélio. Segundo Minúcia Félix, pronun-
§ 20. PoIêmicas contra o cristianismo ciou ele um discurso contra o cristianismo, repetindo todas
170. O cristianismo teve que sustentar não só as per- as acusações tantas vezes propaladas, nunca, porém, pro-
seguições da força bruta, senão também das armas da pa- vadas (Ocl. 9, 6).
lavra, falada e escrita. Apareceu uma série de libelos, nos 172. a. Mais perigoso tornou-se, em seguida, o neopla-
quais a Igreja era atacada quer direta, quer indiretamente. tonismo fundado em Alexandria por Amônio Sacas (t 242)
Os seus autores, vendo que O paganismo, na sua for- e desen~olvido em Roma por Platino e por Porfirio, Jâm-
,I
ma antiga, não podia rivalizar com o cristianismo, procura- blico e Proclo em Atenas. Plotino foi um caráter sincero,
vam regenerá-lo e dar-lhe um caráter mais espiritual, insis- dedicado a uma vida ascética. Quis uma regeneração do pa-
I: tindo particularmente no sentido alegórico dos mitos. Com- ganismo, sem hostilizar o cristianismo. Não assim Porfirio,
preendendo, outrossim, que a vida e os milag.res de Jesus Hiéroeles, Jâmblico e Proelo.
Cristo eram para' os cristãos os mais poderosos atrativos, b. Porfírio (t 304) escreveu Quinze livros contra os
opuseram-lhe a figura mistificada de Pitágoras e as mara- cristãos (c. 270). Como de fosse, sem dúvida, o mais im-
vilhas que atribuiam a Apolônio de Tiana, contemporâneo portante filósofo de seu tempo, excitou com s~us livros se-
dos apóstolos. Nasceu assim o neopitagorismo, doutrina pi- riamente os ânimos. Estudou as Sagradas ESCrituras do An-
tagórico-platônica, misturada com a ascética dos essênios. tigo e Novo Testamento, e procurou desacred~tá-las, ~e­
Apolónio de Tiana é contado entre os sectários deste monslrando contradições aparentes entre os hag1ografos, in-
sistema. Faleceu pelo ano de 96, altamente venerado pelos sistindo dum modo particular na discussão de S. Pedro e
pagãos. Parece, no entanto, que antes foi um charlatão, do S. Paulo. Jesus Cristo lhe era um sábio e teurgo, a sua dou-
que verdadeiro lílósofo. trina idêntica . à de Platão. Negava os milagres operados
171. a. O primeiro escritor anticristão de algum valor por Cristo. Negava também os dogmas da ressurreição e
foi Luciano de Samósata, autor da sátira De morte Peregri- da eternidade do inferno.
ni (c. 167). Tomou por objeto de suas zombarias, ao me- c. Pouco mais tarde, Hiéroc\es, governador da Bitínia
nos indiretamente, os cristãos, representadas por um cer- e um dos autores da perseguição diocleciana, escreveu os
to Peregrino Proteus, sacerdote criminoso, feito depois as- dois livros 26yo' 9),2aJ.~,'}e,ç (303), Discursos amigos da
ceta do Egito, filósofo cínico e, finalmente, suicida. verdade, comparando Jesus Cristo com Apolônio de Tian~.
b. Celso, lilósofo platônico e amigo de Luciano, escre- A obra se inspira na novela biográfica, que Filóstrato, VI-
veu }.óyoç à}.'1!'i-~ç (c. 180), obra bastante perigosa, per- sando igual escopo, escrevera , a pedido de Júlia Domna,
dida hoje, mas pela maior parte conservada na resposta que esposa inteligente de Setímio Severo. Fil6strato fizera uma

92 J época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 21. A jerarqui a eclesiástica 93
comparação entre Cristo e !\ alô . .
dência anticristã Hiérocles' p nlO,. provavelmente sem ten- chamados "apóstolos" ou "evangelistas" (At 21, 8; Eph. 4,
. resplfa adio. 11; Did. II, 3-6).
Todos estes escritos quer fos e . Particular menção merecem entre eles os "profetas" e
de de um edito imperial' de 448 s m queImados em vir tu-
que "doutores" (At 13, I). Aqueles eram homens dotados de
livros de Porlírio e talvez d 't mandava queimar os
esquecidos na época seguint e oudros autores, quer fossem especial carisma para exortar os fi éis e possuíam , às vezes,
e o dom de profecia; estes tinham o carisma de ensinar a
dos só alguns fragmentos na , p;r eram-se, sendo conserva-
que vitoriosamente os refutaS o ras dos apologetas cristãos, doutrina de Jes us Cristo. Competia, pois, aos profetas e dou-
ramo tores a edificação e ulterior ins trução dos fiéis, enquanto
173 Mas nã o s' t t d
<luções da arte do p~nc:f a os literários, senão também pro- que os doze se ocupavam na fundação e direção das Igre-
rizar o cristianismo Ma ' sedrvlram para combater e ridicula_ jas, A missão dos profetas e douto res tem caráter carismá-
. JS e uma vez os . t- tico, transitório. O ministé rio dos apóstolos própriametlte
presentados como adOradores d ,CTlS aos eram re-
na (Apol 16) . . e asnos, Provam-no Tertulia- ditos não era um carisma transitório, mas instituição per-
. e um crucIfixo, encontrado no Pala!" manente (dr. Clem. Rom., Cor. 42, 1-2; 4).
K /I H mo.
e ~er, ellenismus und Chri t ' - 176. As fontes primitivas dizem-no s, outrossim, que os
La reachon paienne Etude s I S ent~m). Koeln 1864. - LabrioUe
a,u VJe siecle, Pari~ 1934 ~r Ma thOlonuque antichrétienne du le; apóstolos, nas diversas Igrejas, instituíam lugar-tenentes
Celsus gegen das Chrjste~tum u.
1 er Kampf des Philosophen (At 14,22 ; 20, 17. 28), bispos, presbíteros e diáconos, aos
~lrU~ifix vom Palafin Freiburg' l~~nz l~99;h'- Kraus, Das Spot- quais conferiam a sua própria autoridade. Portanto, desde
otrn, Paris 1928. ' ,- re ler, La philosophie de .
os primeiros tempos da Igreja, os poderes que Jesus Cris-
to tinha dado aos apóstolos passaram a seus sucessores.
CAPITULO II Os caris mas desapareceram, mais e ma is, depoi s dos tem-
pos apostólicos, enquanto que os outros cargos, conferidos
,,".
A CONSTITUlÇÁO DA IGREJA pela imposição das mãos c pela oração, permaneciam (At
6, 6 ; 13, 3). Eles são um elemento essencial da Igreja,
§ 21. A jerarquia eclesiástica formando a jerarquia do Novo Testamento.
177. Nos tempos do primeiro zelo, quando todos "ti-
174. Apesar de todas as . -
Pedro ficou inabalável o persegUlçoes, a Rocha de S. nham um só coração e uma só alma", não era necessário
Igreja crescia, de dia pa~a rJ~ae Jesus Cnsto o prometera. A que a autoridade eclesiãstica se manifestasse muito. Não era
por conseguinte, para ela uma' e~terna e mternamente. Era, necessário que fossem determinadas jurídica e exatamente
mas cada vez mais perfeitas t I~'é de vItalidade aceitar for- as atribuições dos superíores. Crescendo, porém, o núme ro
tituição. aIO lO no tocante à sua cons-' das comunidades e de seus membros e com eles também
o númerO dos indiferentes e he réticos, já de per si a a uto-
E oual foi a constituiç- d I ' ridade e a organização da Igreja deviam acentuar-se mais
de mocritica com I ao a greJa primitiva? Não foi
• I o gera mente dizem o t claramente.
s'mplesmente carismáfc . s pro estantes, nem
, . ,a, sem autondade J·uríd·· . Já S. Paul o escreve que havia nas Igrejas uma distin-
monarqUlca, essencialmente tal I' . .ca , e sIm
175 N qua amda hOje é. ção entre os fiéis. Uns eram os que regiam e ensinavam,
. os seus princípios d' - outros os que eram governados e que escutavam (filip 1,
te só nas mãos dos apóstolo; a Ifeçao estava nMuralmen-
D 1). Aqueles se chamavam clé rigos e estes, leigos (At I, 17;
a ordem de ensinar as gente; b °tdlvldno Mest re receberam
das as Coisas que Ele h ' ' a /Zan o-as a observar to- 20, 28; Clem, Rom., Cor. 40).
as doze tinham a seu la;;,a mandado (Mt 28, 19-20). Mas 178. Os clérigos eram designados com o nome de bis-
como todos os pr'm' os companheiros e auxiliares que pos, presbíteros e di áconos. Os dois primeiros nomes, a prin-
, elTOs pregadores do Evangelho, era~ cípio eram equivalentes , S. Paulo mandou de Mileto cha-
r 94 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão
§ 21. A jerarquia eclesiástica

salém e a Sagrada Escritura o confirma (At 15, 13; Gál


95

~ar os presbíteros da Igreja de Éfeso (At 20 17) lh 1, 19; 2, 9). S. Ireneu e Hegesipo compuseram até catá-
dIsse'. '. "Aten d' . e a todo o rebanho, sobre
el a vos ' o qual
e eso
logos dos bispos das Igrejas mais importantes, particular.
Espl.nto Santo vos constituiu bispos para governardes a mente de Roma, que remontam até aos apóstolos (Iren.,
Igreja de Deus" (At 20, 28). Adv. haer. 3, 3, 3; Eus., HE 4, 22). Isto não era possível,
1.'~d?s os presbíteros de uma comunidade formavam o se o episcopado não fosse de origem apostólica.
presbJteno (1 ~Im 4, 14), instituição esta que se formou 182. O diaconato, segundo S. Inácio de Antioquia
a ..exemplo das s~n.a?og~s, dirigidas por um conselho de an- (Smirn.8) e S. Clemente Romano (Cor. 42), instituição di-
CJaos. Tal presblterlO tmha um presidente, e, à medida que vina, tem a sua origem na eleição dos sete de Jerusalém (At
este ~oncentrava em suas mãos a direção da comunidade 6, 1). Os diáconos eram, por via de regra, os auxiliares do
crescIam. as suas atribuições, e reservava-se só a ele o no~ bispo nos seus ofícios muito variados. Tinham de ajudá-lo
me de bISpo. r, na assistência aos pobres e no culto divino, principalmente
179. Esta di~~inção entre diversos graus da jerarquia, na administração da Eucaristia. Batizavam também e pre-
que encontramos ja nas cartas dos primeiros Padres apostó- gavam por ordem do bispo. O seu encargo era, de fato,
licos, S. Clemente
.. Romano (Cor . 40'" 42' 44) eJ mais
. cIara- mais importante do que o dos sacerdotes, embora estes
mente, S. Ina~JO (Et 6, 1; TraI. 3, I), demonstra que se ocupassem um grau superior na jerarquia. A Didascalia
a~entuava, maIs e maIS, o caráter monárquico da Igreja. O apostólica (2, 44) os chama "ouvido e boca, coração e al-
bISpo era, como sucessor dos apóstolos, o chefe da comuni-
ma" do bispo.
dade. Ele era o pastor ordinário; ele administrava os sacra- Desde meados do século II, aparece também o c!lrgo
mentos; ele celebrava os divinos mistérios. Os presbíteros de arcediago, pessoa mais importante depois do bispo, e
eram os seus auxiliares, simples sacerdotes. muitas vezes sucessor dele. Só mais tarde, quando 10ram
. 180. Daí não se segue que o episcopado seja poste- criadas as paróquias, é que os presbíteros obtiveram maior
nor ao presbJterato ou uma evolução do mesmo, como pre- autoridade.
tende":. ?S protestantes e como, nos tempos antigos, dizia 183. Quando, com o crescimento das comunidades, se
S. Jerommo
t . (Com. in Ti!. 1. 4'
, PL 26 597) O mesmo
J • multiplicavam os negócios e não se julgava conveniente au-
s~n o ensm~! em outro lugar, a distinção entre bispos pres- mentar o número primitivo dos sete diáconos (Sin. de
blteros e dlaconos, "por instituição divina" (Adv L"f 2- Neoces. c. 15), foram criadas novas ordens para seu auxílio
PL 23, 164) .. E.~ vão pretendem, país, os protesiant~~1 pro~ nas atribuições de menor importância. Algumas destas ar·
va; . como pnmlÍlva a constituição presbiterana. Pelo con- dens parecem remontar até aos últimos tempos apostólicos,
trano, :> presbiterato é uma derivação do episcopado. De a saber dos leitores e dos exorcistas. Nos meados do século.
fato, na~ se compreende na, como o episcopado podia ser IlI, acresce a ordem dos subdiáconos. Em seguida, ajunta-
re:on~ecldo, desde logo, e tão universalmente, se existisse ram-se ainda as ordens dos acólitos e dos ostiários. Assim
pnmelro o presbiterato, tanto menos que a suprema autori- se acha constituída a jerarquia no tempo do papa Cornélio
~a?e, o papa, não tinha ainda, nesses tempos, influxo su- (251-53), como consta de uma carta que ele escreveu ao
fiCIente ?ar~ i~t:oduzir, uniformemente e em toda parte mu- bispo Fabiano de Antioquia (Eus., HE 6, 43) .
dança tao mCISlva. ' 184. Para o serviço dos enfermos e para instrução de
. • 181. Além. disso, não nos faltam vestígios da consti- mulheres que não podiam ser instruidas convenientemente
tUlçao monárqu!ca da Igreja nos tempos mais remotos. Ti- pelos homens e para outros cuidados houve a instituição
~óteo e TIto tem, nas epistolas de S. Paulo, o caráter de das diaconisas, de que nos fala já S. Paulo na sua epís-
?ISPOS e d~ mesmo modo também os "Anjos" das sete Igre- tola aos romanoS (16, I ss). A superiora das diaconisas,
jas da ASla Menor (Apoc 1, 20 ss). S. Tiago Menor é era a nf.!wfivuç. Ao lado das diaconisas aparecem as viú-
chamado por Hegesipo (Eus., HE 2, I. 23) bispo de Jeru-
96 I época: Desde a fundação da fgreja ao Edito de Milão § 23. O primado do bispo romano 97

vas (1 Tim 5, 3 ss), cuja missão principal era a oração. IS7. A semelhança das. ditOclesoe~ i~~~~~~~s f:~~~~~;
Mas es tes dois cargos não se diferençavam rigorosamente na Igreja oTlen a , ., d
entre si, tanto assim que, ao menos no princípio, o cargo de formaram-se, . . ' ii xo ultrapassava os IIITIltes a
eclesiásticos, Igrejas, cUJo 10 u Antioquia para a diocese
diaconisa era desempenhado regularmente por viúvas. provincia. Eram parhcularmed nte ra o E'gito e as provin-
.. d . te e Alexan TIa, pa .
poh!1ca o onen , . d m chamados palnarcados,
§ 22. Organização das dioceses e provincias eclesiásticas
i.
cias limítrofes. MaiS t~r e : r: com o nome de exarca-
m
enquanto Éfeso e c~sa~~~ia I~a; divisão . Roma era o. único
185. a. Para o ulterior desenvolvimento da organização
dos. No oCidente nao . ' . . to foi de grande Impor-
·.eclesi ás tica influiu sensivelmente a do império. Este se cons- . d da Igreja latma, e IS .
tituia de cidades, provincias e dioceses politicas. As primei- patnarca ° 'd de eclesiástica; pois as mUJ-
lância para se conservar a UnI ao 'ente o ocidente não as
.ras comunidades cristãs era m fundadas nas cidades, onde tas contendas que houve no ti ,
os bispos estabeleciam a sua sede. Elas formavam com seus conheceu.
arredores as paróquias, chamadas, desde o sécu lo V, dio- ,., at Louva in 1900. - Semeria,
lHichels, L' origine de I ePI!sc oghi~sa primitiva, Rom a 1902. _
ceses. Já antes, as comunidades de cidades mai ores eram Dogma ge rarchia e culto ne I~. 'he von den ersten jahrzehnten
divididas em comunidades menores que Se agr upavam em Brflder.~, Di~ Verias.sung de! m: 175 n. Chr., Mainz ]904.
volta de igrejas, chamadas " tituli" . A sua administração era t
der apostolisch~ n \Vlr!{samtkelt n lebiScatholi cisme, P aris 1909. _
BatiffoI, L'Eg:ltse nfalssan e de~ Urkirche, Berlin 1923.
confiada a um presbítero, ajudado por outros clérigos. Pelo V ieckmann, D1C Ver assung
ano 300, havia perto de vinte "tituli" na cidade de Roma.
b. A medida que o cristianismo pen etrava tamb ém no § 23. O primado do bispo romano
campo ("má XWl!ct,) form avam-se a li Igrejas independen_ · a IgreJ' a na forma
188 A tendência de cen t ra I Izar " , 111
I 0.-
tes com próprios bispos, chamados "corepiscopos", que, po- . . - de dioceses e prOVJllClaS, l:ll ffi l-
rém, no século V, foram substituídos por simples sacerdo- nárquica, pela organrzaç;od da 19r~ja universal. Esta uni-
tes, dependentes do bispo da cidade. Dividia-se desta for- na no papado, 'pela UnI a e. ia da sua origem e essência
ma a diocese em paróquias no novo sentido da palavra. dade não é scnao a consequenc DeliS e todos os cristãos
de
186. Como diversas paróquias formavam a diocese, as-
divinas. Jesus pregara o remo mbr~s deste reino único,
tinham a consciência de serem me .",'. era confirmada
sim várias dioceses formavam as provin cias eclesiásticas, .. 1 C isto Esta conSClenCla
cujos limites coincidiam, por via de regra, com os limites Corpo Ml stlco c e r d" O Mestre dado um pastor ca-
das províncias política s. Os apóstol os tinham pregado, de peIo lato de lhes ter o h IVIO chefe que não só havia de
p referência, nas metrópoles das províncias romanas, porque mum para todo ? rebane~ilOur;:mbém ' efetuá-I a.
representar a ullIdade, s . . . do problema do primado
nelas se achavam geralmente judeus em maior nlimero. Par-
tindo da metrópole, fundavam-se comunidades também nas 189. Aqu.i te~os o pnn~~~ fa re a romana teve, desde
outras cidades. Daí se explica certa llnião orgânica entre a
do papa. A hl stona ates!a q rim~zia sobre as demais
os inícios da s ua eXlstencla a ~terno d e unida-de, centro
Igreja da metrópole e as comunidades das cidades vizinhas, t
IJ.:H'jas. 5. Pedm ,,-ra ~) ~; :~me o apostólico. A sua prer-
certa autoridade do bispo da metrópole, o metropolita, e e
dependência dos bispos das demais cidades, os sufragâneos. '1" devia eXls!!r nao S • • d'ÇPãO prometido e conferido
rngativa, seu primado de jUs"S II 2i 15 17) e confirmado
O metropolita, ou arcebispo, como mais tarde se chamava, C isto (Mt 16 1 ; o ,- . d
convocava os sínodos provinciais e lhes presidia. Os primei- por Jesus r ' 5a rada Escritura, haVIa e
ros vestígios dest<l constituição remontam, pois, a o tempo
por muitos fatos relatados n~ ,,;:va-o com certeza absolu-
dos apóstolos. Ma s foi principalmente no concílio de Nicéia passar a os seus su~essor~~~nte Pda Igreja. Os Santos Padres
ta também a tradlçao COIl der a 5 Pedro o primado
(325), que os direitos do metropolita foram sancionados I"dos estão de acordo em conce . .
(cãn. 6).
de jurisdição.
98 I época: Desde a I d -
un açao da Igreja ao Edito de Milão
~ 24. Educação, eleiçáo, sustento e qualidades do clero 99
190. S. Inácio de Antioquia eh . ..
carta aos romanos, a ueJa I T' a.ma, no. pn~ClplO da sua
H
11'11'1" ohediência como a quem escreve no Espírito Santo
também preside na' reqg ia-o d gela dIlela e Ilummada, a qual (dr. Ti xcronl 1, 141-42).
·
ça d a candade" i é dI . ' . . e preSI'd e a. ahan-
os 'romanos .
M"is tarde, Dionísio de Alexandria foi acusado peran-
lerminologia de 's . l~áca grela Universal; pois, segundo a
h- " l'''l'a Dionísio (259-68) de ter chamado o Filho de
d ar ou Iro sentido . a estala ex
e segundo o c
_ onexo, será difícil I h',,;; IIIlIa criatura · do Pai. O bispo de Alexandria justifi-
13, I). pressao (cfr. Rom 9, 3; TraI.
,'"" ",. perante o bispo de Roma, sem contradição alguma.
Abércio, bispo de Hier' r 1'12. E' digno de notar-se também que os hereges e
de 193, conservado no museo:~~~, no seu céle.bre epitáfio ('h,III ;'dicos procuravam, antes de mais nada, a comunhão corri
mana o titulo de Rainha ves/'d ~ranense, dá a Igreja ro- flol";I, convencidos de que esta comunhão equivalia à co-
S. lreneu reconhece' na / a e ouro (Klfch /55). 1IIIIIIh ão com a Igreja uni versa l. A primazia da Igreja de
principal i/as", por ser flJntlad:reJe~o~ama?a uma "pa/enfiar I~ nllla aparece, portanto, como um fato consumado; já nos
S. Paulo, e exige que pu t· P apostolas S. Pedro e p' il11eiros séculos da história.
I . , r mo IVO desta diO" 'd d
greJas com ela estejam un 'd (Ad "nl a e, todas as NouschcJl, Textus anteni caeni ad primatum Romanum spec tantes
Tambem . . I as v. /Jaer. 3, 3, 2)
S CIpriano f I ' . (I ,'!or, patr ist, 9) , Bonnae 1914, - OeiselmanIl. Der petrinische Pri-
. a a mUItas veze d . 11I;,t (Bibl, Zeitfr. XII , 7), Muenstef 1927, - Tixeronl I, 131 S5,
ron:ano; e o seu testemunho é ' t nt . s". o prllnado
maIs enVOlvido se achou em sé . a o maIs precIOSO, quanto
la Igreja. E' verdade que o r:;s controverSIas com aque- li 24. Educação, eleição, sustento e qualidades do clero
aos outros apóstolos a m gh nde bISpo de Cartago dá 193. Os primeiros pregadores do Evangelho não pos-
, esma onTa e o
mo a S. Pedro e ensina ue . mesmo poder co- "liam, geralmente, g rande erudição. Os próprios apóstolos
sómente a Deu~ da adn' q t o~ bISpos devem dar contas
i .
VIa, em suas cartas chama
llnlS raçao das sua I
d
.
s grejas. Toda-
finllam sido simples pescadores. Os carismas substituiam-
lhes esta falta (I Cor 12, 28). Mas, com o correr do tem-
tri", e "Ecclesia rinci . a se e de Roma "cathedra Pe-
est" (Ep. 55 8' ~g If)ahp
po, sentia-se, mais e mals, a necessidade duma devida edu-
s, onde unltas SaCerdo talis exorta
f ' , , . ortanto embora S C" . <"lição dos ministros do altar. Como Jesus Cristo reunira em
asse um advogado da posi ã '. . . 'pnano não redor de s i os apóstolos a fim de prepará-los para a sua
ma, não pode ser Chamad~ o monarqUlca do bispo de Ro- :llta missão, assim o faz iam também estes, instruindo os
diversos autores modernos. eplscopaJista, como o fi zeram scus discípulos por um tratamento pessoal. Mais tarde, fi_
I 9 I. O testemunho dos Santos P , zeram-no, da mesma forma, os seus sucessores, Foi esta a
fatos históricos A 19 e' adres é conflTJnado por educação ordiná ria dos clérigos na antiguidade.
. r Ja romana desde '.
po,s, tem exercido esta primazia I os pnmelros tem- Uma preparação eficaz para as ordens superiores da
prImado não alcançasse lo 'o a ' e embOra o exercício do jera rquia eram também as ordens inferiores; pois ninguém
e . o bispo de Roma ainda ~ãO . sua Importância medieval podia ser promovido, se não havia mostrado a sua capaci-
todavia, sempre reclamava para !~vesse um título distintivo, dede na o rdem imediatamente inferior. Desde fins do sé-
lros bispos lho reconheciam E aquele pnmado, e os Ou- C1111l II, aparecem, a lém disso, as escolas catequéticas em
Q uando, pelo fim do p'. as provas? Alexandria, Antioquia, Cesaréia e outras cidades, cujo fim
.
d as na Igreja de Cor'ni "melTo século . primário era a instrução dos ealecúmenos e dos fiéis. Mas
b' ' Surglfam cOnten_
não o apóstolo S. JOã~ qO, o . Ids po r~maJ1o, S. Clemente (e estas escolas serviam também para educação do clero.
ad moestou os cristãos ' ue aIO a VJVJa e resl'd'la em Éfeso) 194. A eleição dos clérigos estava, 110 principio, nas
.~ , e o seu tom aut 'fá' , mãos dos apóstolos e dos seus prim ei ros sucessores, toman-
consclencia de possuir a su . Of! no revela a sua
do-se em conta tambem os desejos da comunidade. Assim
Ele pede, suplica aos CUlpa~~emacla (Cor I, 57. 59. 63).
s, mas também manda e Te- nus diz S. Lucas, quando fala da eleição de S. Matias e
d"s sete diáconos de Jerusalém. S. Paulo instituiu presbi-
7'
100 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão
§ 25. Batismo, simbolo hatismal e oposição herética 101
teros e escreveu a Tito que fizesse o mesmo em Creta (Tit
Depo~s
I, 5). S. Clemente Romano atesta o mesmo costume entravam casados no estado eclesiástico, po-
(Cor. 44). ticos. Os que a viver com suas mulheres. da
diam nele continuar d . ao se
Mais tarde, a eleição do bispo fazia-se pela comuni- o rdenação, porém, os bispos, presbíteros e iaconos n
dade e pelos bispos da província. Segundo Cipriano (Ep. podiam mais casar. x ressões claras da
55, 8; 59, 5; 67, 3-5) competia à comunidade o direito da Todavia, como o celibato, segundo e ~t 19 12) como
Sagrada Escritura, ta~to 7de2~e~~),C~::tom~iS pe:feito' e dis-
eleição, aos bispos da província, o consentimento e a sa-
gração. Esta se fazia, a exemplo dos apóstolos e conforme
de S. Paulo (J Cor , : d Deus muitos cristãos abstl-
punha melhor para o se rv~ço e ment~ e de entre eles eram
os cânones de Arles (314) e Nicéia (325), pela imposição
das mãos, precedida pelo jejum e acompanhada por Ora- nham-se voluntàriame~te o cas~ éri o~ Deste modo, o ce-
ções. A ordenação dos sacerdotes e diáconos obedecia às escolhidos, de preferencla, os lo . ~~o estado mais apro-
mesmas normas. A sagração do bispo devi a Ser feita por libato foi consldetado, desde . Iog 'da jerarquia eclesiástica,
três bispos (Arles c. 20).
príado às tr!s lor~~n's:ufo~r~~~~ando obrigatório. Pela pri-
s
195. O sustento dos clérigos obedecia, desde os prin- e, desde o s cu o , b i a ão no cân. 33 do con-
cipios do cristianismo, às palavras de Jesus Cristo: "O ope_ meira vez foi decretada esta o ~ ~s~ em seguida, universal
rário é digno do seu alimento" (Mt 10, 10), e de S. Pau- cilio de Elvira (c. 300) , lornan o ,

, i r
lo: "Não sabeis que os que trabalham no santuário comem para ° ocidente. . d' Ce
do que é do santuário, e que os que servem ao altar têm . d oncílio de Nicéia de mtro UZtr o -
:i.l . parte no altar?" (I Cor 9, 13). Por isto, os cristãos ofe- Uma tentaftva o c . te foi frustrado pela opo-
libato obrigatório também no oflen (S HE 1 11). Con-
. i' . r eciam donativos por ocasião do culto divino. A Doutrina h· Pafnucio do Eglto ocr. , ,
Ai dos apóstolos (c. 13) pede as primícias para a Igreja. Ter- slçao
tudo, do ISpO
o celibato rI.,
tornou-se o b . 'atório também no oriente
Juliano fala de contribuições que se faziam mensalmente para os bispos. P
(Apol. 39).
bFunk}18K971rct;:;rgg~S~r~elher~KirSCh
. h Abllandlungen llud Untersuchungen I, a-
Ma s, como S. Paulo (Al 20, 34), assim, nos tempos der orn , I 240-41.
seguintes, os clérigos Se sustentavam, não raras vezes, pelo
trabalho de s uas próprias mãos, ou até pelo comércio, o
que certamente não Se fazia sem grande perigo. S. Cipria_ CAPITULO 1Il
no Se queixa amargamente de l11uitos clérigos avarentos (De
laps. 6), e o sinodo de Elvira (c. 39) viu-se obrigado a pro- CULTO, DISCIPLINA E VIDA RELIGIOSO-MORAL
ceder contra os excessos de ta l comércio, que, não obstan_ DA IGREJA
te, só no século V, deixa de Ser fonte de sustento para o
clero, provàvelmente em virtude de um decreto de Valellti- § 25. Batismo, símbolo batismal e oposição herética
niano III (452). .
198 a ·Um dos fatores principais, qu~ lev~ram ~/~IS~
. . . . .. f ' a admirável harmonIa en re a
t 96. As qualidades morais e intelectuais, exigidas para
a admissão dos clérigos, foram enumeradas, pela primeira tianismo a vltofla, 01 I das perseguições, °
exemplo.
vida dos cristãos .. No empo á tires eram não ra ras vezes,
dos fiéis e o herOIsmo dos _m r O martíri~ substituia, nestes
'vez, por S. Paulo (1 Tim 3, 2 ss; Tit 1, 5 sS). Eram ex-
cluidos da ordenação os bigamos, os neófitos, os penitentes, causa de repentinas convebrstoes. (Terl De bapt. 16). Fora
.os clínicos e os que se castraram a si mesmos. Para os eparação e o a lsmo ') . d'
bispos exigia-se uma idade de cinquenta anos, pata os pres- casos, a pr . batismo era, desde o primeIro la
.bíteros, uma idade de trinta anos (Didasc. 2, I). destes casos) ~o:em, O . ' ara entrar no reino de Deus:
da Igreja, condlçao necessafla P C ' t (Mt 28, 19;
197. O celibato não era obrigatório para os eclesiás_ em virtude das palavras de Jesus flS o .
Jo 3, 5) .
r- 102 I epoca;
' Desde a fund açao
- d a 19reía ao Edito de Milão § 25. Batismo, símbolo batis mal e oposição herétic,a 103

I b. Nos tempos apostólicos o ba .


do logo depois da profissão d~ fé ttsmo e ra administra-
atestam, diversas vezes os At d em Jesus Cris to, como
porém, fa zia-se preced~r u ~s os Apóstolos. Mais tarde
o ca teeum enato, O sín odo :;: ~~go p erí odo de preparação:
pois do batismo, ° bispo impunha ao neófito a mão, un-
gindo-o com crisma. Ela um noVO sacramento (DB 2044).
A solenidade acabava com a santa comunhão e prolonga-
va- se pelo espaço de oito dias , durante os quais o neófito
vestia a túnica branca. Como a solenidade terminava no
se dois a nos, e quando necesSári~r\~S;a.beleceu que duras- domingo da Pascoela, dava-se-Ihe, no ocidente, o 110me de
199, O nome de "e t . a e res ( cc. 4. 42) . "D ominica in albi s" (deposítis) .
. . a ecumenos" f .
pn,:,elfa_ vez, por Tertuliano Mas ., 0 1 empregado, pela 202. a. A profissão de fé, que se recitava antes do ba-
mslttulçao (Ara I. 1 6 I ) " J3 S. J ustmo conhece a t ismo, baseava-se na fórm ula prescrita por Jesus Cristo (Mt
em R " e, r elo ano ele 220
orna um ca tecumenato e f . ' encontramos 28, 19) e continha os pontos principais da tra dição a postó-
Trad. apost, 40-45). p r eltamente organizado ( Hip., lica . Era, por isso, o funda men to da in strução dos catecú me-
Dura nte o ca tecumena to Os nos. "Regra da fe" ou "da verdade" chamam-na S. lreneu
entrar !la Igreja podiam a : t' ~ue se preparavam para e T e rtuliano. Mais tarde, tornou- se ma is u sado o nome de
da s t M' SSIS Ir som en te à p' .
a!l a Issa chamada "M' rIm elra parte " slm bolo" .
guiam-se, no el;lanto desde Iss,a ddoS catecúmenos". Distin- b. Na s ua forma atual data dos meados do século V.
três classes de ca te;ún e o sIno o de Neocesaréia (c 5) No s séculos IV e V, oS apóstolos eram tidos universalmen-
pr - I nos : os audiente . ,
. egaçao; Os gcnu flccte ntes qu d . s, que assistia m à 'e corno seus autores. D e iato, encontramos, no ocidente e,
sls bam ainda à oração e à 'bên e epol~ da pregação, as-
ã
tes, que já estavam para recebe ç o dbo bISp o ; os compe ten_
mais detcrminad amente, em Roma, um simbolo batismal,
exatamente delineado, já pela volta do sécu lo II. O texto
r, e m reve o b t '
D e t II d o isto se ded ' a Ismo. mais antig o que se usava em Roma noS foi tra nsmitido em
a regra. Mas também ° ~Zat~ue °dbatismo dos adu ltos era latim e grego . E dele não disco rda va essencialmente o sím-
( _lren ., Ad v. haer. 2, 22. 4) "In OrO' as criança s se pra ticava bolo batisma l usado no oriente. A sua origem é, portanto ,
\ ç ao apostólica (Ep. ad R . "'genes cha ma-o uma tradi - a nterior. Alguns o consideram como resul tado de uma luta
costume geral S C' .' om .::>, 9) . D esde o século 1lJ ' contra Ma rc ião ; outros o fazem apa recer nOS princípios do
" d' d . . . Ipllano quer que ' b .
? attsmo não seja ' e

I a la o ma is de oito dias de . d
200, Fora d
.
pOIS o nascImento da criança.
e casos de necessid d
d o b a tlsmo tinhalllga r na .' 'I' a e, a adm inistração
século ll . outros até noS fins do século \.
203 , a. Quando se multiplicavam as heresias e cismas,
acontecia que convertidos, batiza dos p or heréticos, pediam
costes. F '
aZia-se s Vlg.l las' da P ,oa
primeiro no oise e (Ie Pente-
'
admissão no seio da Igreja. Surg iu então o problema da
q ualquer lugar onde hOl s no:, tanques e mares, ou cm eficácia de tal balismo. T e rtuliano negava a sua validade ;
I, 61; Tcrt. , De ba pt 4)vesse agua (Did . 7; Just., ApDl e o seu tratado De baptismo (c. 15) foi seguramente a
prios pOr uma tríplice' 511 ': nlJ1al~ tarde, em batisférios p ró~ causa de que no mesmo sentido se pronunciassem três si-
j
ui ersao Aos f
e e~ casos que nã o p ermitiam a 'b . <:n ermos ( clínicos), nodos de Cartago e da Ásia Menor (Eus., H E 7, 7 ) . A
gaçao ou aspersão. s u mersao tazl<1 -se por irri- teoria, c m muitas reg iões, foi posta em prática.
Administrava m_no os bis b. Em dois s inodos de Cartago, presididos por S. Ci-
pres bíteros e d iáco nos E . pos ou, por seu mandato os priano (255 e 256), foi pronunciada , mais uma vez, a mes-
o I . . m ca so de nec ' d '
5 elgas podiam batizar (Te t . O esSl a de, também ma doutrina. D aí resultou uma contenda acalora da entre aS
20 1. Já antes ele 200 ~ ., e. bap!. 17) . Igreja s de Cartago e Roma. O papa Estêvão I (254-57),
de a ig umas cerimônias qu ' o, escn. tores ecles" t'
• Ias ICOS fa lam
o tenrio conhecimento da resolução dos sínodos africanos, de-
ato d o b atlsmo:
. ' preced
() sina ) da cruz Iam ou ac ompanhavam a fe ndeu a validade do ha lismo dos hereges. porque era o
a renúncia a Satanás o CI _ . 1 o sal, a un ção com óleo batismo de Jesus Cristo, e pro ib iu , sob pena de excomu-
' ' S eX01ClS[110S a p I' - '
u
t I lano menciona também o .. , 1'0 Issao de fé. Ter- nhão, a sua repetição corn o " coisa nova" na Igreja (Cypr.,
s padnnhos ( D e bapt. 18) . De-
104 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão
§ 26. Eucarist ia, ágape e disciplina do arcano 105
Ep. 74, 1; DB 46). Realmente, não admitiu os legados dum
terceiro sinodo de Ca rtago na comunhão da Igreja romana, brar-se de manhã, talvez já pelo fim do tempo apostóli-
o que equivalia a um a nátema ao primaz da África. Ci- co, ou talvez no principio do século II , em virtude da lei
priano resistiu. O cisma parecia inevitável. Estêvão não COn- de Trajano contra as heterias (Plin., Ep. 10, 97).
seguiu extirpar o erro. 206. a. As partes principais da liturg ia euca ristica são·
204. a. A perseguição valeriana tranquilizou, por algum mencionadas nos Atos dos Apóstolos (2, 42; 20, 7-11), na
tempo, os ânimos, e os dois adversários morreram duran-
Doutrin a dos Apóstolos (c. 9), na primeira apologia de S.
te a mesma perseguição, Est êvão em 257, Cipriano em 258. Justino (cc. 65-67) e na Tradição Apostólica de S. Hipó-
O papa Xisto II (257-58) restabeleceu a comunhão da Igre- lito. As Constituições apostólicas, escritas pelo ano de 400,
ja de Cartago; mas não conhecemos claramente a conduta descrevem-nos a Missa dos fiéi s segundo a liturgia clemen-
tina (Kirch 679 ss).
deste papa. Também ele morreu antes de Cipriano. Como
o bispo de Roma, assim também Dionisio de Alexandria de- b. A Mi ssa começava com sa lmos e hinos e com uma
fendeu a validade do batismo dos hereges, salvando o ca- leitura biblica, costume que da Sinagoga passou pa ra a
ráter sacramental do batismo contra as conside rações subje- Igreja. À leitura seguia a homilia do bispo, a oração co-
tivistas de Cartago. mum e a bênção do bispo. Aqui terminava a Missa dos
catecúmenos.
b. Mais tarde, os donatistas negaram novamente a va-
lida de do batismo dos hereges. O sinodo de Arles (314) c. Em seguida, os fiéi s davam-se mútuamente o ósculo
.! da paz e ofereciam ao bispo o pão e o vinho misturado
i,I
I:!
teve de trata r da questão. Condenou O erro, fazendo, porém,
uma distinção entre diversas categorias de hereges, o que Com água, e o bispo consag rava pão e vinho, pronuncian-
. 1" aliás fi zera, por certo, Estêvão I e o que igualmente fize- do uma longa oração eucaristica. Os diáconos repartiam o
,II ram, mais tarde, os concilias de Nicéia e o Quinissexto. pão e o vinho consagrados entre os que assis tiam. O pão
era levado tam bém aos ausentes, doe ntes e prisioneiros . Por
, penz.inger-BalllllVart, Enchiridion syrnbo lorum. - SOden, De r via de regra, a comunhão era administrada em cada sole-
Strel t zWIsc hen Rorn und Karthago ueber die Ketzertaufe, Rom J908.
- Coch, Die Taufe im N euen Testament (Bi bl. Zeitfr. III, 10), nidade eucarística, debaixo das duas espécies. O pão con-
Muenster 1910. - Duchesne, Ori gines du culte chrétien, 5 vol., Pa- sagrado, que se punh a na mão dos comungantes, podia ser
ris 1 92~. - Badcack, Th e History of Creeds, London 1930.
levado para casa e servir assim para comunhão diária . O
costume de receber a comunhão em jejum é mencionado por
§ 26. Eucaristia, ágape. e disciplina do arcano Tertuliano (Ad uxorem 2, 5), e é realmente tão antigo como
205. a. Ao batismo seguiam logo a con firmação, admi- o de celebrar a Eucaristia de man hã.
nistrada exclusivamente pelo bispo, e a com unhão (Ju st., 207 . Logo no princípio do cristianismo, o domingo era
Apol. 61. 65; Ter!. , De ba pt. 8). Centro do culto fo i, des- o dia da solenidade eucarística (At 20, 7; Did. 14; Jus!.,
de o principio do cristianismo, a Eucaristia. Os apóstolos Apol. I, 67 ). Tertuliano, porém, menciona também a cele-
e a primeira comunidade de Jerusalém, depois do primeiro bração nos dias da s estações (De ora!. 19), i. é, 4."
Pentecostes, tomavam ainda parte no culto do templo. Mas e 6." feiras. S. Cipriano fala até do sacrifício diário ( Ep.
tinham tam bém as suas próprias reu niões, em casas parti- 57, 3). A cel ebração competia ao bispo, que era assistido
culares, onde diàriamente partiam o pão e tomavam as re- pelos sacerdotes e por todo O clero. Quando um sacerdote
feições com alegria e simplicidade de coração (At 2, 46). o substitu ia, fazia-o com prévia autorização do bispo.
b. Aqui temos dois elementos destas reuniões, a Eu- 208. Os ágapes que, a exemplo da última Ceia, prece-
caristia e os ágapes que, como a Última Ce ia, se realiza- tliam à Eucaristia, continuavam a realizar- se à ta rde, quan-
vam à tarde. Mas, em atenção aos abusos, mencionados por do esta já passara a celebrar-se de manhã. Eram convites
S. Pa ulo (I Cor II, 20-21 ), a Eucaristia passou a cele- de caridade, feitos com os donativos dos fiéi s. A Didasca-
lia e as Constituições Apostólicas chamam-nos "eulógia",
106 I época: D esde a fu ndação da Igreja ao Edito de Milão § 27. A penitência 107

Eram acompanhados de orações e salmos, como também de b. Foi este o primeiro exemplo de excomunhão ecle-
pregações oportunas, T inham o fim de socorrer os pobres s iástica. Distinguia-se, em seguida, uma excomunhão maior
e de cultivar a caridade entre os irmãos. No enta nto, o cos- e outra menor. Esta só excluia da com unhão eucaristica.
tume degenerou ràpidamente; e a degeneração levou, desde A excomunhão maior ou perpétua era aplicada, desde o sé-
o século IV, à sua supressão, decretada definitiva mente pelo culo 11, por via de reg ra, aos chamados pecados capitais
cân. 74 do sínodo trulano, no ano de 692. ou mortais ou canônicos. Tais eram, segundo T ertuliano, a
209, Obedecendo à ordem de Jesus: " Não deis aos cães a postasia ou idolatria , o homicidio e o adultério, Em outro
o que é sa nto, nem lanceis aos porcos as vossas pérolas" luga r, o mesmo Tertuliano enumera ainda outros.
(Mt 7, 6), os fiéis guardavam segredo acerca dos misté- 2 11 . No entanto, é princípio constante da Igreja que
rios da sua fé. Dai formo u-se uma linguagem simbólica in- todos os pecadores podem ser reconciliados com Deus por
compree nsível aos alheios, a disciplina do arcano, como a meio da penitência. S. Paulo que excluiu, em 1 Cor 5, 5,
chama, pela prim eira vez, o teólogo reform ado Dalleus (t o incestuoso, em 2 Cor 2, 5 ss, readmitiu-o à comunidade.
1670), Ela dizia respeito principalmente aos sacramentos do O autor da Dou/rina dos Após/c/os ( 10, fi; 14, 1), S. Iná-
batismo e da Euca ristia , mas ta mhém ao mistério da SS. cio de Antioquia ( Filad . 8, 1) e o chama do Pastor de Her-
Trindade, ao símbolo da fé, ao Padre-nosso e outros pon- mas (Mand. 4, cap. 3) afirmam igualmente que "a todos
tos da doutrina, A sua existência nos tempos apostólicos é os que se ar rependem perdoa o Senhor, se eles se conver-
prova da pelos apologetas do sécu lo II. Numerosos símbolos
, ! cristãos, Como o peixe, a âncora, a barca, a pomba, o cor-
terem à união com Deus e com o bispo" . O Pa stor de Her-
.11 ; mas acrescenta que esta penitência, depois do batismo, se
deiro, etc., a inda hoje dão testemunho da instituição. conced ia uma só vez. Todavia, das suas próprias pa lavras
1;1
"
,I. Além do fim de ocultar os mistérios da fé aos pagãos, podemos concluir qu e eI1l Roma existia o costume de repe-
,!I a disciplina do arcano visava também um fim pedagógico tir a penitência.
de prepa rar os catecúmenos e de estimular o seu zelo. Só
Depois do Pastor de Hermas , fa lam da peui tência Jus-
assim se explica a sua existência a inda no sécul o V, quan-
t ino, Dionisio de Corinto, Ireneu e Clemente de Alexandria .
do já não havia mais perigo de profa nação.
Nenhum deles conhece o pretenso rigor ismo da Igreja pri-
Rauschen, Monumenta eucharistica et liturgica vetustissima mitiva. Só o pecado contra o Espí rito Santo não pode ser
(Flo ri!. patrist. 7), 2. ed., Bo nnae 19 14; ed. Quasten 1935. - Funk,
Kirch engesc h. Abhan dJungen und Untersuc hungen I 278-92; III 1-41 ; perdoado ( lren., Adv. llaer. 3, II , 9) . Tertuliano, no seu
42-57. - Cabr() [, Les origines liturgiques, P aris 1906. - Bati/foI , tratado sobre a penit ência (c, 7) , desenvolve as mesmas
Étud cs d'histoire et de théologie positive II: L' Eu charistie, Paris
1905; cd . 9. 1930. - Rauschen, E ucharistie lInd Busssak ram ent in idéias, como o Pastor de Hermas, Só mais tarde, depois da
den erslen sechs Jahrhunderten, 2. ed. Freiburg 19 10. - Ko ch, sua apostasia para o montanista, revela-se rigori sta.
D as Abendma hl ím Neuen Testament (Bibl. Zcitfr. IV, 10),
Mu enster 1911. 212 . A praxe da disciplina penitenciária não era uni-
§ 27. A penitência forme em todas as Igrejas . Podemos dizer que, no século
II, era opinião geral, que a reconciliação , - não se fal a
210. a, Não há talvez nenh um ponto da história anti ga aq ui da penitência privada , - só uma vez podia ser co n~
tão con trove rtido, como o problema da penitência. A Ig re- cedida, e adiava-se, não raras vezes, a té à morte. Em al-
ja é a comunhão dos santos. Segundo opin ião de mui tos gumas Igrejas, como, p, ex. , na Espa nha, mesmo na ho:a
teólogos, a Igreja primitiva considerava-se como comunida- da morte, certos pecadores não eram ad mitidos à comunhao
de de "santos" no sentido de isen tos de pecado. Por isto, eucarística.
jul gava não poder tolerar entre os seus membros os que ti - U ma mudança decisiva designa o "edito peremptório",
nham pecado gravemente, porque ta is pecados, depois do de que fa la Tertuliano no seu li belo sobre a pudicícia ( I,
batismo, não poderiam ser perdoados. Realmente, S. Pa ulo 6). Não sabe mos se T ertuliano o atri bui ao papa Calisto I
excluiu da comunidade dos fiéis um incestuoso ( I Cor 5, 5) . (217-2 2), como a maioria dos histo riadores dizia até há
108 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Mijão § 27. A penitência 109

pouco, ou ao bispo Agripino de Cartago, como hoje mui- anos ou até à morte, conforme a gravidade do crime, Prin-
tos dizem, ou ao episcopado católico em geral, como in- cipal importância tinha a confissão, o que se conclui do em-
clina a dizer Ehrhard, O edito concedia, feita a confissão e prego da palavra "exomológesis" (0= confissão) para signi-
a penitência, a reconciliação aos incontinentes, Em Roma ficar toda a instituição da penitência,
opôs-se a isto Hipólito, acusando o papa Calisto de laxis- Ela era ou secreta ou pública, A confissão secreta é
mo (Philos, 9, 12), Como Tertuliano montanista, assim tam- um uso da Igreja primitiva e instituição divina (DB 916),
bém Hipólito negou a possibilidade de tal reconciliação, embora não o possamos provar pela Sagrada Escritura, A
213, Mais uma vez, o mesmo problema deu origem a confissão pública fazia-se, por via de regra, só dos pecados
um conflito nas Igrejas de Cartago e de Roma, O motivo públicos, Mas as obras de penitência e a absolvição eram,
foi em ambas as Igrejas a questão dos laps'os, que aposta- até ao século IV, quase sempre públicas, Os pecados ve-
taram durante a perseguição de Décio, Sobre o conflito em niais eram perdoados fàeilmente, nem eram objeto propria-
Cartago nos informa S, Cipriano, O grande bispo teve de mente dito da confissão. Era sempre opinião da Igreja que
defender a autoridade eclesiástica contra um partido de podiam ser perdoados por outros meios, como obras de ca-
lapsos relaxados, chefiados pelo diácono Felicíssimo, Eles, ridade e jejuns,
julgavam que bastava um "libelo de paz", para serem re- 216, Os penitentes públicos eram divididos, no orien-
conciliados com a Igreja e que não precisavam de penitên- te, e mais determinadamente na Ásia Menor, desde meados
. cia, nem da admissão pelo bispo, Cipriano respondeu não do século 1II, em várias categorias (Greg, Thaum" Ep,
conhecer uma Igreja de lapsos; mas pronunciou-se franca- can,), Desde o sínodo de Ancira (314), enumeram-se qua-
mente a favor da readmissão com a condição da penitência tro classes: !lentes, audientes, genuflectentes e consistentes,
(De laps, 36), Os laxistas não se submeteram, Formaram Os tlentes ficavam no átrio da igreja e, chorando, pe-
até um cisma, elegendo um antibispo na pessoa do presbí- diam a intercessão dos fiéis, Os audientes tinham o seu lu-
tero Fortunato, Como, porém, o papa Cornélio confirmasse gar no pórtico da igreja e com os catecúmenos tinham que
a sentença de Cipriano, o cisma desapareceu paulatinamente, retirar-se depois da pregação do bispo, Os genut1ectentes
214, a, Em Roma, o problema dos lapsos provocou um deviam retirar-se com a bênção do bispo depois dos au-
conflito de proporções muito mais vastas, levando a uma dientes, Funk opina que podiam assistir a toda a liturgia,
verdadeira heresia, o chamado novacianismo. O que Calis- Os consistentes podiam assistir em pé a toda a liturgia, e
to I concedera aos incontinentes, cOllcedeu-o Cornélio aos sÓ ficavam excluídos da comunhão eucarística (cfr. Conc,
apóstatas arrependidos, O presbitero Novaciano, tomando Anc, cc, 4 ss),
ares de rigorista, se lhe opôs e fez eleger-se antipapa, Mas 217, a, A absolvição fazia-se, geralmente, depois de
foi excomungado por um sinodo de 60 bispos da Itália, cumpridas as obras da penitência, pela imposição das mãos,
b, Novaciano, como Hipólito e Tertuliano montanista e competia ao bispo; em caso de necessidade também ao
baseavam-se naqueles rigoristas de que fala o Pastor de sacerdote, Desde a perseguição de Décio nomeavam-se, em
Bermas, Mas as suas opiniões não eram as da Igreja pri-
muitas partes do oriente, penitenciários próprios para este
mitiva, A disciplina primitiva foi a de Cipriano e Cornélio ..
Desde o século IV ouvimos que também os homicidas po- fim (Socr., HE 5, 19),
diam ser admitidos à penitência, Só os relapsos não conse- b, O tempo da penitência podia ser abreviado pela in-
guiam mais a reconciliação com a Igreja, Ficavam entregues tercessão dos mártires e confessores que, às vezes, conce-
à misericórdia de Deus, diam aos pecadores um 'iHbclo de paz", no qual reconhe-
215, Quem desejava reconciliar-se com a Igreja, tinha cemos os principios das indulgências, Tal libelo precisava
de submeter-se à confissão de seus pecados e às obras de naturalmente da aprovação do bispo (Tert., Ad mart. I;
penitência rigorosa, obras que duravam, às vezes, longos Cypr., Ep, 15, 22, 23),
--
"

110 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 28. Os tempos santos e a discussão da Páscoa III

. Mori(lus, De disciplin a in administr ation e sacramenti poeniten- Antigo Testamento passaram ao Novo as festas de P áscoa
tJae, Pans 1651. - Funk, Ki rch engesch . Abhandlungen un d Untcr- e de Pentecostes, aquela para comemorar a ressurreição de
suchungen I 155-209. - Waikins, History af Penance 2 voI Lon~
dçn 1920. - Vel/ico, Antonianum 5, 1930, 25-26. - 'Ehrlza;'d, Die Jesus Cristo, ou, segundo Tertuliano (De ora!. 23) , a Pai-
Kl.rc~e de r Ma,ertyrer, Muenchen 1932. - Galtier, L'J::glise et la ré- xão e a mo rte do Senhor, esta, em memória da vinda do
mlSSlOn des pechés aux premiers s iecles, Paris J 932.
Espírito Santo. Estas duas festas era m, até ao tempo de
Orígenes, as únicas festas do ano litúrgico. .
§ 28. Os tempos santos e a discussão da Páscoa
b. No oriente, e primeiro entre os basilidianos do Egi-
21 8. No dizer de Clemente de Alexandria e outros es- to, foi introdu zida, em princi pias do século 1I/, a festa da
critores da Igreja, a vida dos cristãos devia ser uma festa Epifania ou Teofania (Clem. Al ex., Strom. I, 21 ). _Cel ~b~a­
continua, santifica da pela memória da vida e morte de Je- va-se no dia 6 de Janeiro, e reco rdava a revelaçao diVina
sus Cn sto. Mas, pa ra que os fiéis se lembrassem mais viva do Messias na ado ração dos Reis Ma gos, no batismo e no
e constantemente dos mistérios de Cristo, a Ig reja instituiu milagre das bodas de Caná, incl uindo-se, mais tarde, tam-
solenidades especiais, qu e lh es anunciassem os grandes fa- bém o mistério do nascimento. Motivo da sua introdução
tos da redenção. foi, ao que pa rece, a ten tativa de suprimir uma festa po-
Desde os tempos apostólicos, o primeiro dia da sema- pular, que os pagãos de Alexanclria celebravam nesse dia
na era celebrado como dia da redenção e era designado pelo para comemorar o na scimento do deus Aion de uma virgem
nome de, Dia do Senhor, Dics DOl11í nica : XV{jlO.%1] (~flifla). Coré (Epiph., Haer. 51, 22) . No enta nto, não concordam
Neste dia celebrava-se a Eucaristia; as orações faziam-se os historiadores.
'i,l' em pé, e não se devia jejuar nem trabalhar. Os antigos es- c. Além disso, cada Igreja celebrava o "dies natalis"
: '"I ~I critores cristãos, S . Lucas (At 20, 7) , o autor da Didaqué de seus mártires, pela solenida de do culto divino junto a
,Ii' (c .. 14), . S. Inácio (Magn. 9, I) , S. Justino (Apol. 1, 67) seu s sepulcros. Esta solenidade consist ia no sacrificio euca-
e TertulJano (De orat. 23), falam tão claramente, que pa- rístico e numa certa espécie de ágapes. Tai s festas são ates-
recem da r uma lição aos modernos sabatistas. Os dias da tadas já pela relação do martírio de S. Policarpo (c. 18) ,
semana eram chamados "feria e" 1 porque O cristão devia ce- testemunho ao mesmo tempo da veneração das relíquias e
lebrar (feriari ) , todos os dias, a memória do Senhor. do nome "dies natalis".
21 9. Como os judeus jejuavam duas vezes por semana, 221. A preparação da Páscoa se fazi a, desde os dias
na segunda e quinta feiras, assim o faziam os cristãos na apostólicos, po r um certo período de jejum, consagrado à
quarta e sexta feiras (Did. 8). Estes dias, dedicados pelos memória da morte de Jesus (dr. Mt 9, 15). Uns Jejuavam
pagãos a Mercúrio e a Vênus, eram consagrados pelos cris- só um dia , a sexta-feira santa. Outros prolongavam O je-
tãos à memória da Paixão de Jesus Cristo, pela oração co- jum até ao sábado santo. Outros ainda jejuavam quaren~a
mum e pelo jejum que durava a té à hora nona. Entre os horas ou toda a semana santa (Eus., HE 5, 24). InsenSI-
ocidentais, estes dias eram chamados "dies s tationis" ou velmente fo i-se prolongando este jejum a té chegar a ser
"dias de vigília". O sábado era, no oriente, um dia de ale- quadrages imal , imitando-se o exemplo de Jesus Cristo (Mt
gria, porque lembrava o fim da criação; no ocidente, veio 0\ 4, 2; cfr. § 62) . Jejuava-se o dia inteiro até ao pôr do sol.
a ser dia de jejum, porque Jesus, num sábado, se achava Só nos domin gos não se jejuava (Socr., HE 5, 22).
no sepu lcro. O sinodo de Elvira (c. 26) menciona este je- 222. a. Como era diversa a prepara ção para a Pás-
jum do sábado, e na Ig reja ro mana, este cos tume existia coa assim também a própria solenidade não era uniforme.
sem dúvida já no século III. Em' algumas pa rtes do oriente, particula rmente na província
220. a. Como no Antigo Testamento havia não sómen- proconsular da Ásia, cel ebravam o dia da morte de Jesus
te uma festa semanal , mas também festas anuais, assim os Cristo aos 14 de Nisan (n úaxa arav(},{"Jlf1.0v) e chama-
cristãos celebravam, além do domingo, outras festas. Do vam-se, por isto "quartodecimanos". Dois dias depois cele-
,,
§ 29, A vida retlgioso-moral 11 3
] 12 1 época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de MiJ ão

bravam a ressurreição (nríoxa àvaar;río'flov), ainda que não § 29. A vida religioso-moral
10sse domingo . No resto da cristandade festejavam a Pás- 224 Se excetuarmos a comunidade primitiva de je~u-
coa no domingo que seguia ao 14 de Nisan, e na sexta-feira .- em OS uase nada da vida nova das Igrejas
que lhe precedia, a morte de Jesus, ainda que não fosse o salém, t
nao
S~a~lguma; descricões gerais chegaram até nós .
dia 14 de Nisan. Es tes continuavam o jejum até ao sábado
santo inclusive, aqueles o terminavam às três horas da sex-
~a:c::ae:'ida social, os cristã~s não se disdtinguia~i~o'~NOÓ~-
da um seguia os costumes e seu p . ,
ta-feira santa. tros ho~ens;d~: Tertuliano, vivemoS convosco neste mundo,
os CrlS aos, d s banhos dos talheres, do co-
nã? a~? stados do 10~;s aOs suas m,iximas relig iosas e mo-
b. Além disso, depois da destruição de Jerusa lém, a l-
guns judeus celebravam a Páscoa, às vezes, antes mesmo merclÜ (Apol. 42). b' te "Os cristãos escreve o
do e.quinócio primaveril, enquanto que, no tempo de Jesus, , - ram as do seu am len . ,
'sempre a haviam celebrado depois do equinócio. Al guns rals nada e t a Diogneto (c. 5), vivem cada um na sua
autor a car a , . stranha . encon-
cristãos do oriente imitavam-lhes o exemplo, chamando-se pálria, mas C0l11 0 peregdrlnos e~ugt:~e: "porém 't~~;a pátria
"protopasquitas" . Lastimava-se esta discórdia na celebra- m pátna em to os os , ,
tram
I
u aé para eles um eXI'1'0
stre I . Casam como todos os I
ou-
ção da ma ior festa da cristandade ( Eus., Vita Cons!. 3, 5) ,
embora não se tratasse de uma questão dogmática . erre _ expõem seus filhos COIl1O e es ...
Iros hom ens ... , mas nao d . da carne Ha-
223 . a. S. P olicarpo de ESmirna procurou obter unifor- Vivem na carne, mas não segundo os esejos, éU;' As
' a verdadeira morada e o c .
midade neste ponto, tratando COm O papa Aniceto (154-66); bital11 a terra. ~as a s~( . orém somos cidadãos dos
l mas em vão. P olicarpo baseava -se na tradição de S. João pala vras do apos~olo: Nos , P o Salvador Nosso Senhor
'lil
, li .
Evangelista, Aniceto, na de S. Pedro e S. Paulo. Todavia ,
os dois nobres anciãos mantiveram a paz.
. u donde lambem esperamos
ce s, C . t " (Filip 3 20), lhes eram norma e leI.
jesus nS o ,
.
d ' d c(stã nos 10-
225 Algumas particularidades a VI a I . N-
,I!' b. Mais acre tornou-se a controvérsia no pontificado de
Vitor [ ( 189-98). Este papa ordenou que se reunissem sí- ram relatadas por c~~~~~\~;Od: ~~~:se:teg~:dta~~:e~~r::~m ~~
nodos para tratar da questão. De fato, realizaram-se síno- frequentavamTos I' chamava de "priva tum consistorium
dos nas Gálias, na Palestina, no Ponto, na Osrhoene, etc. t t os que er t u lano - d'
ea r , t 10 \7) Um ator nao po la ser
Todos eles pronunciara m-se contra os quartodecimanos. Só impudicitiae" (D e spec. í ã~ deixava de o ser (S in.
admitido na Igreja, enquan o n
o sínodo de Éfeso, presidido pelo metropolita Policrates,
manteve a s ua tradição. Vitor I ma ndou, por isso, sob pena
de excomunhão, que todos aceitassem a prática comum. S.
de E~~p~!:~d~~~~eo enfeitar e pintar o rosto; cond~~ava­
Ireneu repreendeu-o, dizen do não se r a questão de tão al- se o uso excessivo de anéis e brincos, pmt~r ;s I ~. ~s 2~
to a lcance para se proced er com tanto rigor (Eus. , HE 5, usar cabelos postiÇOS! (c\emN:~e~;'a~ae:~r~'~l:'p r~ibido S ' to-
24). Policrates manteve a sua praxe, sem que se chegasse II; Tert. , De cultUre~:;'e'ndava_se a té urna recreação con-
a um cisma. O concilio de Nicéia resolveu, finalmente, a dos . os enfeites,doe a palavra d ' to lo'. "Alegrai-vos sem-
o apos
questão, ordenando, que em toda a Igreja a Páscoa fosse ce- ventente, segu~, .. 4 4) Também Clemente Alexand ri-
lebrada no domingo que segue à lua cheia, depois do equi-
nóci o primaveril (Eus., Vi ta Consto 3, 18-20). '". pre no Sednh~r mo(~idl:de ' um ' exercício honesto de g inástica
no conce e a
Funk, Kirchen gesch. Abhand lungen un d Untersuchungen I (Paed 3, 10). . t- ea
24 1-78. - Dowden, Th e Church Year and Kalender, Cambridge 226 Uma nota característica dos primeiros cns aos r
19tO, - -- Kelln cr, He orto logie, 3, ed" Freiburg 1011. _ Boehmcr, . a m os seus bens em ob ras
Der christl. Sonntag nach Ursprun~ und Geschichte, 1931. _ Bo fle,
a prática da caridade. Empregav d' b e fi vida
Les origines de la Noel et de ".Eplphanie, Louvain 1932, _ Coiton,
de mi sericórdia . Sabemos o que S. Lucas IZ ,so r s
From Sabbath to Sunday, Bethlehem 1933. caritativa da comunidade primitiva de ]erusalem. ~o:t:~e;
ma forma descreve S. justmo a mudança dos
Compénd:lo I - 8
"

114 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão


§ 29. A vida religioso-moral 11 5
(Apol. I, 14.67) . Era proibido exigir juros. O g rande man-
damento da caridade tem o primeiro lugar na pregação de suas mulheres, como Cristo ama a sua Igreja (Ad Polyc. 5).
S. Paulo; I Cor 13 é um verdadeiro hino à caridade. A mes- Havia também matrimônios mistos, devido às circunstância~
ma glorificação da caridade encontramos na catequese da do tempo. Mas já Tertuliano os combate, m~strand~ as suas
Doutrina dos Apóstolos (Did. I, 2). As obras da caridade péssimas consequências para a parte cnsta .. ? smodo de
eram organizadas, e a elas se dedicava m, de preferência, Elvira os proibe (cc. 15-17). Aborto e mfan!1cldlO eram s~­
os diáconos e as diaconisas. A sua atividade estendia-se a veramente condenados, e os apologetas afirmam que tal Cfl-
pobres e doentes, viúvas e órfãos, inválidos de toda sorte, me não acontecia entre os verdadeiros cristãos (Did. 2. 5;
e também aos que tinham naufragado na fé. Tert., Apol. 9). As segundas núpcias não era m proibidas,
"Censurais-nos, - diz Tertuliano aos pagãos, mais ou mas não eram bem-vistas e eram um impedimento para a
menos com estas palavras, - porque nos amamos recipro- ordenação dos clérigos. A virgindade era alta ment~ aprecia-
camente, ao passo que vQs vos odiais; porque esta mos pron- da e muitos cristãos se lhe consagravam voluntanamente.
tos a morrer uns pelos outros, e vós estais prontos para vos O; apologetas invocam-na como prova da alta moralidade
da Igreja (Just., Apol. I , 15).
estrangulardes; porque a nossa fraternidade se estende até
à comunhão dos bens, ao passo que estes bens são exata- 229. Os conflitos motivados pelo problema da penitên-
mente aquilo que quebra todos os laços de fraternidade en- cia nos provam, que houve rigoristas. "Se a lguns membros
tre vós; porque temos todas as coisas em comum, exceto da Igreja, em certas circunstâncias, deram mostras ·de ~ma
s6 as mulh eres, e v6s só a elas tendes em comum" (Apol. severidade pouco escl arecida, de uma exagerada au~tenda­
39). Em uma palavra, tão elevada se apresentava a moral de . .. , poderemos, se não justificar, pelo menos explIca~ um
dos fiéis, que os próprios pagãos não podiam deixar de tal procedimento pela resistência desesperada do J~da~s?,o
admi rá-los. O médico Galeno (t 200) deu-lhes o mais bri- e do paganismo, pela necessidade de estabelecer prmClpiOs
lhante testemunho, exaltando o seu desprezo pela morte, a rígidos em oposição a máximas corruptas e imorais, de com-
pureza dos seus costumes e a sua abstinência (Cfr. bater o excesso do mal por uma espécie de excesso do
Theoph., Ad Autol. 3, 15; Arist., Apol. 15-16). bem. E esse mesmo procedimento, considerado na sua ve r-
227. Também as ocupações cotidianas dos cristãos eram dadeira aspiração ... , não demonstra, com que zelo, com
santificadas pelas práticas da piedade. Tertuliano escreve: que ardor, com que puro e santo entusiasmo tinham . os pri-
tiA todos Os passos, ao entrar e ao sai r, ao vestir os ves- meiros cristãos abraçado os preceitos e a Vida do
tidos e os sapatos, ao lavar e comer. .. , seja qual for a Evangelho ?"
ocupação que temos, sempre fazemos o sinal da cruz na nos- 230. "Não podemos, contudo, passar em silêncio as
sa fronte" (De carona 3). Apreciavam também a ltamente queixas de muitos doutores da Igreja, dirigidas contra os
a oração privada. Rezavam de manhã e à noite, à hora que abraçavam o cristianismo cam vistas mundanas. Cum-
terceira J sexta e nona, e em diversas outras ocasiões duran- pre não esquecer os que nas perseguições renegavam a Cns-
te o dia. A Doutrina dos Apóstolos ordena, que, três vezes to ... , lembrar os que tornaram necessário o código tão am-
por dia, se recite o Padre-nosso (c. 8). Belas e edificantes plo da penitência, pensa r finalmente nos que, para não c?r-
são diversos tratados que Tertuliano, Orígenes e Cipriano tarem suas relações com o mundo, ima gi~vam superslIclo-
escreveram sobre a oração.
samente poderem, de repente, gozar da contemplação e da
228. De um modo particular eram santificados o ma- união com Deus, recebendo o batismo na hora da morte,
trimônio e a família. Com palavras magníficas traça Ter- sem estarem para isto preparados com a prática não in-
tuliano o ideal do matrimônio cristão (Ad uxor. 2, 9). S.
terrompida da verdadeira virtude. Em todos os tempos Cres-
Inácio quer que o casamento se faça não segundo a carne,
ceram plantas parasitas entre as floridas espigas da gran-
mas Com a aprovação do bispo, e que os maridos amem as
de seara cristã" (Alzog I, 266-67).
8'
116 I época : Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 29a. Princípios do monacato 117

Lebreton~ ~a vie ~hrétienne au premier siécle de l'J::glise, Paris ao menos, realizavam reuniões particulares. No século III,
1927. - SC~llllng, Relchtum unct .Eigentum in der a ltkirchUchen Li- .existiam tais associações provávelmellte em toda s as ,l gre-
teratur! Frelb~rg 1~8. - Mqrtmez, L'ascetísme chrétien pendz.nt
)es trOls prenuers slecles, Parrs 191 3. ias. O sínodo de Elvira fala delas (cc. 13-14), e.o smodo
de Ancira igualmente as conhece (c. 19). Certo e, porém,
§ 29a. Principios do monacato que, a té ao século 1/1, não ~parece nenhum mslttuto regu-
larmente organizado e perfeItamente separado da comuni-
. , . 231. Neste prime~ro periodo da história da Igreja, teve dade dos fi éis.
mlCIO aquela mstttUlçao que, no século IV, veio a ser um 234. A primeira mudança neste sentido. realiz~u-se du-
d os fatores mais ill1po~tantes da vida cristã e que até hoj e rante a perseguição deciana. MU Itos cn sta~s retiraram-se
produzIU os maIs preCIOsos frutos espirituais: o monacato então ao deserto, para não se expor ao pengo da aposta-
As suas origens remontam até à idade apostólica . S. Luca;
sia. Outros, aborrecidos da hipercultura de. ~eu ,t~mp o, e
escreve que Os cristãos vendiam os seus bens, repar tiam en- detestando a vida relaxada de muitos co r rehgl~naT1os. vol-
tre SI os produtos segundo as necessidades de cada um, Ora- tavam as costas á sociedade dos homens. Retiravam-se .a
vam no templo em comum dià riamente e par tiam o pão lugares desertos para, como monges, dedicar tod~ a sua .VI-
pc.las casas, louvando a Deus e sendo bem vistos por todo da aos exercícios da piedade. Tal fOI o prll1ciplO. da VIda
O povo (AI 2, 45-47).
eremítica ou anacorética. O berço desta VIda m? n astl~a 10 1
Esta vida generosa dos primeiros cristãos atraiu em o Egito, onde o clima e o caráter da populaçao \Ddl gen a
todos os tempos, grande numero de almas, de h ome~s e

,'IiiII
favore ciam tal gênero de vida.
mulheres,. não fracos e cansados da vida, mas principalmen_
235. O primeiro anacoreta de que nOs fa la a história
te os esplfltos maIS fortes e os mais robustos caracteres a
loi S. Paulo de Tebas (230· 347 ?). De sua vicia nad a maIS
,IP abraçarem a vida ascética, e inspirou os fundadores das ~á­
podemos verificar com certeza histórica. A bl ograha qu e
rias ordens religiosas a reproduzir O ideal, se bem de di-
ferentes formas. S. j erõnimo lhe escre ve u é mais uma pl edosa lenda, cio que
verdadeira história (PL 23, 17 5S). Todavia, a sua eXlstê~­
.' 232. Os primeiros representantes desta vida de perfei. da, a sua pátria, a sua fuga para o dese r to e a SU~ condi -
çao foram os chamados ascetas, virgens e continentes de ção c.\t:. vida, ao menos , são fatos de que se nao pode
ambos Os sexos, que, sem serem deste mundo viviam no
duvidar.
mu~do, não separad~s. da sua família . O nome de "virgens" 236. Como patriarca dos monges é considerado S. An-
deSIgnava, de ordmano, só as mulheres, enquanto que os
tão do Egito (251-356). A sua vida nos foi descri ta por
homens continentes geralmente era m chamados "ascetas".
S. Atanásio (PL 26, 823 S5), que o conh eceu pessoalmen-
233. a. Pouco se sabe dos ascetas primitivos. No fim te. Herdeiro de grandes riqllezas, renunci ou a todos os bens
d? prim eiro século, o papa Clemente I fez uma ligeira alu- te rrest res e retirou·se para uma solidão. Tendo passado
sao a eles (Cor. 38, 2). A Dou/rina dos Apóstolos fali de aloun s decênios no deserto, viu·se rodeado de numerosos
ascetas que se dedicavam à pregação do Evangelho (cc. di~CípU10S, desejosos de imitar-lhe o exemplo. Erigiram ce-
11-12). Os apologetas, Justino e Atenágora s 110 oriente Mi- Ias em sua vizinhança e povoaram paulatll1amente aquele
núcio Féli x _e Tertuliano ~o .ocidente, falam-nos com gran- deserto. O primeiro destes núcl eos foi Pispir ,Pallad., Hlst.
de velleraçao da conllnencla voluntária destes heróis e Laus. 21). Em menos de dez anos, c~ntavam-:ie mtlha res de
heroinas.
sol itários. Faium tornou-se centro pnnclpal.
b. No seu tratado De habitll virgillllll1, S. Cipriano es- 237. Dest. forma, a vida solitá ria do anacoretismo veio
creve qu e, na Igreja de Cartago, havia virgens consagradas a ser comunidade anacorética. A comunidade não tinh a re-
a. Deus, que confirmavam a sua virgindade com uma espé- g ra fixa. A sua única regra era a autoridade do mestre.
cie de voto. Parece que elas formavam uma a ssociação ou, Toda a vida dos monges dividia-se em estudo da Sagrada
118 I época : Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão
§ 30. Desenvolvimento da literatura eclesiástica 119
Escritura, meditação e trabalho manual O 10 . d"d I'
IVI ua lsmo é
o • • vezes, dos "pad res" ou IIsantos padres" como testemunhas
a nota caracterlshca do monaquismo antoniano.
da tradição eclesiástica.
Esta. vida anacorética tinha naturalmente os seus peri- S. Agostinho deu este tftulo também a S. Jerónimo por
gos. Abria a porta a imprudências e abusos que, se não motivo da sua erudição e santidade, Desde então, chamam-
chegaram a des!ruIr a fl orescente instituição, levaram-na, to- se "Padres da Igreja" ou IISantos Padres" os escritores ecle-
davia, ao descredlto, devido à falta de autoridade constante siásticos que se distinguiram pela doutrina ortodoxa, vida
que a regulasse. Remediar este mal seria tarefa reservada santa, aprovação eclesiástica e antiguidade. A história dos
a S. PacômlO, fundador do cenobitismo (cfr. § 61). seus produtos literários é o que chamamos "palrologia" .
240. Os escritores teológicos da antiguidade cristã que
igualmente confessaram a fé da Igreja, mas não se distin-
CAPITULO IV guiram por todas aquelas notas, são chamados, desde S. Je-
rônimo (De viris iIIustribus), "escritores da Igreja". Mas
LITERATURA E CI€NCIAS ECLESIÁSTICAS. HERESIAS também os Padres da Igreja não gozam todos a mesma
E CISMAS autoridade, S. Agostinho, Ambrósio, Jerônimo e Gregório
Magno eram considerados os maiores do ocidente, e pare-
§ 30. Desenvolvimento da literatura eclesiástica nos três ce que, desde o século XI, se lhes deu o título de "Docto-
primeiros séculos res Ecclesiae". No oriente são considerados como "gran_
,,/1 238. As condições da Igreja primitiva dificultavam gran- des doutores" S. Atanásio, Basílio Magno, Gregório Nazian-
,I I deme.nte° cultivo da literatura eclesiástica. Poucos erudi- zeno e João Crisóstomo. Mais tarde, concedeu-se o título
tos tinham ~ntrado na Igreja; e os chefes das com unidades de "Doctor Ecclesiae" também a outros. Suas notas distin-
" ,! estavam mUito preocupados com a propagação do Evange- tivas são: Doutrina ortodoxa, santidade, erudição eminente,
lho e com. a administração das suas com uni dades, para expressa declaração da Igreja.
poderem cUidar de estudos cientificas. Além disso os fié' 241. Os primeiros escritores eclesiásticos pós-apostóli-
lombravam . d t- , IS cos foram os Padres apostólicos, assim chamados por te-
- . .-se aIO a ao vivamente dos fatos da sa lvação,
que nlnguem pen ~a.va em especulações científicas. E por que rem sido discípulos dos apóstolos ou tidos como tais, No
propaganda hterarla? Jesus não dissera aos apóstolos: Es- tocante ao ca ráter doutrinal e parenético de seus escritos
crevei! mas: Pregai! seguem, de perto, os autores do Novo Testamento, sobre-
I
i
\
, . Se, não obstante, já pelo fim do primeiro século e prin-
CipIO do. segundo, foram redigidos os primeiros monumen-
tos da htera_tura cr.istã, estes são, por sua natureza, escri-
tudo S. Paulo. Alguns deles eram tão altamente estimados,
que mereceram ser admiti dos nos manuscritos bíblicos e,
como as Sagradas Escrituras, eram lidos por ocas ião do
tos de ocaslao, devidos aos cuidados dos pastores e às ne- culto divino.
cessldade~ do tempo. Quase todos têm forma epistolar. Seus 242 . Pelo ano de 125, começou a desenvolver-se uma
autores sao chamados, desde o século XVII Pad nova categoria de literatura eclesiást ica, a apologia. Os seus
tólicos, ' res apos- autores, os apologetas, visavam a defesa do qistianismo
contra os ataq ues do paganismo e do judaísmo. '}\. este es-
. 239. uPadres" chamam -se, nos primeiros séculos, só os
copo primário juntou-se logo outro, a defesa da Igreja con-
biSpOS, como testemunhas da tradição eclesiástica (cfr. I
tra a heresia ' e o cisma. O resultado foi a literatura anti-
Cor _4, 14~15). No martírio de S. Policarpo lemos, como
herética ou polêmica.
pa!5aos e Judeus clamavam : "Este é o mestre da Ásia
P?I dos cristãos" (12, 2). Nas sessões dos concílios' d~
243. Pela volta do século II , teve inicio uma própria
ciência da fé cristã, cultivada principalmente nas escolas teo-
seculo IV e nas controvérsias teológicas fala-se, inúmeras
lógicas de Alexandria e Antioquia. Embora não tivesse ain-
120 I epoca: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 31. Os Padres apostólic os 121

da terminado a lu ta contra os inimigos externos e inter- bre O batismo, O jejum, a oração e, especialmente, a Euca-
nos, prevaleceu, contudo a literatura puramente teológica ristia , com três orações magníficas, as mais antigas orações
que já não tinha por fim imediato refutar erros e contra~ da santa Missa. A terceira parte (cc. 11-15) tem caráter
dições, mas cujo objeto principal era expor e desenvolver disciplinar e dá instruções sobre o modo de receber os após-
a doutrina cristã. tolos e profetas e, em geral, os peregrinos, sobre a santi-
Nos dois primeiros séculos, empregava-se só a língua ficação do domingo e sobre as qualidades e a eleição dos
g rega. E' pelo fim do século II, que apa rece também o la- bispos e diáconos. O último capitulo é um epílogo sobre a
tim na literatura eclesiástica. Mas ainda no século 11/ pre- segunda vinda do Senhor, que se julga iminente.
va lecia, até em Roma, o grego. '
246. No tocante ao tempo e ao lu gar da origem desta
Coleções. das obras patrísticas v. § 3. - Rauschen, Grundriss obra tem maior probabilidade a opini ão de Bardenhewer,
der Patrologle, ed. IO~-I ] IJ, por Altaner, Freiburg 1931. _ Bar-
dClZhewer, Geschichte de~ altk i~chli c hen LiteratuT, 5 vai., Freiburg
que ·julga ter sido escrita entre os anos 80 e 100. O estilo
1902-32. --:- I~ .• Patr~J ogle, Frelburg 19W. - Harnack, Geschichte antigo e simples acusa, de fato, um tem po anterior a Jus-
der altchn.stllchen Llteratu,r bis Eusebius, Leipzig 1893- 1904. _ tino e. Inácio e mesmo a Clemente Romano. O lugar deve
M.ar~, Abnss der PatroJogle,. Paderborn 1919. - Ceillier, Histoire
generaJe des auteurs sanés et ecclêsiastiques, 23 vaI., Paris 1729-63 ; procurar-se provàvelmcnte na Siria ou na Palestina.
nov~ ed., 16 vaI. 1858-69. - Tixeronl, Préc is de Patrologie 4 vol. A Doutrina era, na antiguidade, altamente apreciada.
Pans 1920. J J

O autor da carta a Barnabé, o Pastor de Hermas e Justino


§ 31. Os Padres apostólicos a conhecem. Clemente de Al exan dria conta-a entre os li-
vros da Sagrada Escritura (Strom. I , 20); mas Eusébio
244. Foi J. B. Cotelier o primeiro a publicar uma sé- (HE 3, 25) a enumera entre os apócrifos do Novo Tes-
rie de escritos intitulada Paires aevi apostolici sive Saneto- tamento. Num códice do século XI conservou-se uma tra-
rum Patrum, qui temporibus apostolieis f/oruerunt, Barnabae, dução latina dos primeiros sei s capitulos, exceto os versos
C/ementis Romani, Hermae, 19nalii, Po/ycarpi, opera edita I 3 - 2 1 traducão esta que foi feita talvez já no sé-
et inedita . .. , (Paris 1672). Mais tarde, tornou-se costume c~lo II. T~d;via, de~de a idad e-média, a ob ra ficou sendo
enumerar entre os Padres apostólicos também Pápias de esquecida.
Hierápolis e ü autor desconhecido de uma carta dirigida a 247. No mesmo manuscrito jeroso limitano e num códi-
Diogneto. finalmente, acrescenta-se ainda o autor da Dou- ce sina itico do século IV, descoberto por Tischendorf, no
trina dos Apóstolos, descoberta pelos fins do século XIX. mosteiro de S. Catarina (1859). COnservou-se outro monu-
245. O mais antigo de todos os monumentos conserva- mento literário dos tempos apostólicos, chamado geralmen-
dos da literatura cristã, depois da Sagrada Escritura, é a te Epistola de Barnabé e atribuido pela antiguidade a S.
chamada Doutrina dos Apóstolos ou Didaqué. O metropo- Barnabé, companheiro de S. Paulo. Orígenes (Contra Cel-
lita fll oteo Bryennios de Nicomédia encontrou-a, em 1875, sum I, 63) chama-o uma "epistola católica". Eusébio (HE
num códice de Constantinopla, escrito em 1056. Em 1883, 3, 25; 6, 13) e Jerõnimo (De vir. iiI. 6) enumeram-no, po-
Bryennios editou a Doutrina, e logo depois, o códice foi rém, entre os apócrifos.
transportado para a biblioteca patriarca l de Jerusalém. De fato, o modo de julgar o Antigo Testamento, dia-
A preciosa obra é dividida em três partes. A primeira

I
metralmente oposto ao dos outros apóstolos, a data poste-
(cc. 1-6) é um catecismo de moral e descreve os dois ca- rior à destruição do templo de Jerusalém (c. 16), que S.
minhos da vida e da morte. O caminho da vida consiste na Barnabé provàvelmente não veio a conhecer, e o pouco co:
observâ ncia dôs mandamentos, sobretudo do amor de Deus nhecimento do culto judaico, tudo isto excl UI S. Barnabe
e do próximo, e na abstinência da magia e idolatria. O ca- í como autor da carta. A profecia de Daniel sobre os dez
minho da morte é o pecado. A segunda parte (cc. 7-10) reis, relatada no quarto capitulo, indica como tempo da ori-
é uma espécie de ritual e contém prescrições litúrgicas so- gem talvez o reinado de Nerva (96-98) ; enquanto que a
II

122 I época: Desde a fun dação da . Igreja ao Edito de Milão


§ 31. Os Padres apostólicos 123
rica alegoria dá quase por certo que a obra foi escrita em mo dizem as chamadas Clementinas. Também as notícias do
Alexa ndria.
Martyrium S. Clementis sobre a sua ori gem fl ávio, o seu
248. O autor, depois da introdução (c. 1), quer de- d esterro ao Quersoneso e a morte no Ma r-Negro são len-
monstrar, ~a primeira parte (cc. 2-17), didático-dogmática, das que não merecem f é alguma.
que o Ant/go Testamento não só é abolido, mas que ele, 25 1. Esta fa lta de noticias sobre a vida do terceiro su-
com sua lei e com suas cerimônias, nem sequer foi uma cessor de S. Pedro é recompensada pela preciosa ca rta aos
instituiç ão divina e que as suas doutriRas não tinham se- corintios, em que a Igreja romana se ma nifes ta como cen-
não um sentido espiritual e alegórico. Deus não quer sacri- tro de unidade ecles iás tica . A carta deve ter s ido escrita em
fícios de animais, mas a contrição; não qu er a circuncisão 96 ou 97; pois o autor conhece, além da perseguição nero-
e ab stinência de carne de certos animais, mas a abstinên- niana, outra qu e "recentemente" assolara a Igreja, i. é, a
cia do pecado. Portan to, °Antigo Testa mento não é senão
perseg uição de Domicia no. Ma is terminante ainda é o tes-
uma mi steriosa anunciação do Novo Testamento.
temunho de Hegesipo ( Eus., HE 3, 16) , segundo o qual
Um exemplo clássico é o capítulo IX, onde o a utor contendas, ocorridas na comunídade de Corinto, durante o
fala dos 31 8 criados de Abraão e da sua circuncisão (Oên reinado de Domiciano, motivaram a ca rta .
14, 14; 17, 27) , pela qua l devia se r revelado ao pa triarca
O nome de Clemente não é mencio nado, mas a ca rta
a morte do Salvador na cru z (c'-BOO, "7'-18). quer ser um escrito da comunidade de Roma dirigido à de
A segunda parte (cc. 18-20) é parenética e tem como Corinto. Hegesipo, porém, dá por autor Clemente Roma no.
fonte provávelmente a Doutrina dos Apóstolos. O autor des- Dionís io de Corinto escreve ao papa Sotero (170) . que a
creve os dois caminhos da luz e das trevas. No último ca- ca rta de Clemente se lia aos domingos na igreja (Eus ., HE
pitulo admoesta os destinatários a andar no caminho dos 4, 23 ) . Eusébio e j erônimo atestam que Clemente escreveu
mandamentos de Deus. Quem o faz, será glorificado; q uem e/11 nome da Igreja de Ro ma .
tri lha r a senda das trevas, perecerá com suas obras. O dia
da recompensa está perto. 252. No prólogo, Clemente indica como ocas ião da sua
carta o cisma da Ig reja corintia . P or instigações de a lgumas
249. Sob o nome de Clemente chegara m até nós duas pessoas a trevidas, os coríntios tinham deposto vários pres-
cartas aos corintios, das quais a segunda, porém, não é au- bíteros, apesa r da vida exemplar dos mesmos. Dai resulta -
têntica, nem é uma carta, mas sim uma homília, a- mais an- ram desordens nesta Ig reja que, a ntes do conflito, gozara
tiga que possuímos, pro nuncia da provàvelmente em Corin- dum renome tão glorioso. Na primeira parte (cc. 4-36) cen-
to, pelos meados do século II. As duas cartas conservaram- sura a inveja como cau sa da discó rdia, e enumera as vir-
se-nos em dois ma nuscri tos gregos, incompletas no códice iudes ma is necessárias pa ra resta belecer-se a pa z e para vol-
alexandrino do século V, e completas no ja mencionado ta rem os fi éis a uma vida verdadeiramente cristã, ilustra-
códice jerosolimitano. Existem também diversas traduções. da pelos exemplos de Jesus Cristo e dos santos do Antigo
250. O a utor da primeira ca rta, Clemente Romano, se- e Novo T estamento. A segunda parte (cc. 37-61) trata mais
gundo Origenes (Jo 6, 36) e Eusébio (HE 3, 15) , é idên- de perto do conflito; Deus mesmo é o auto r de toda a or-
tico Com o companheiro de S. Paulo ( Filip 4, 3 ) . Ireneu o dem. E' preciso respeitar a ordem estabeleCida por j esus
faz seg uir, na cátedra de S. Pedro, em "terceiro lugar de- Cristo e os apóstolos. Cesse, pois, a discórdia ; os culpados
pois dos apóstolos" , e Jerónimo conlirma esta opinião ( De deixem voluntàriamente a cidade e fa çam penitência . Os
vir. iII. 15). Eusébio acrescenta que Clemente governou a presbíteros depostos devem ser reinteg rados; pois a ordem
Igreja pelo espaço de nove anos, começando no 12' ano de eclesiástica foi instituída po r Deus. P or isto, os presbíteros.
Domiciano (92-101). instituídos pelos apóstolos e seus sucessores, não podem
A vida de Clemente nos é completamente desconheci- ser depostos pela comunidade. "Vós, que causastes o Con-
da. Certamente não foi o cônsul Tito Flávio Clemente, co- mto, submetei-vos aos presbíteros! Ai! dos obstinados" .
124 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 31. Os Padres apost6licos 125

Esta parte termina com uma magnifica oração, tirada, carismas, do outro lado, são mencionadas, pela primeira vez,
ao que parece, da antiga liturgia romana. A conclusão (cc. por Epifânio e Jerônimo.
62-65) resume em poucas palavras o conteúdo e exprime a b. Foram atribuídas ainda errôneamente a S. Clemen-
esperança de que os portadores da carta, em breve, possam te as Pseudo-Clementillos, romance religioso, que compreen-
voltar como núncios da paz. de as Recognitiones, espécie de autobiografia, com idéias
253. a. Com grand e prudência soube Clemente desem- gnóstico-ebioníticas, e as Homili~s. Tudo isto deve. a. ~ua
penhar-se de seu papel de pacificad or. A energia e serie- origem a uma mão ariana do seculo IV. As Con stltu l~oes
dade, unidas à clemência, fazem do escrito um modelo de. apostólicas, o Apocalipse de Pedro por Cle"'.e~te, os Con~­
carta pastoral. Grande é também a sua importância dogmá- nes de C/emente, a Liturgia de C/emente e vanas cartas sao
tica. Ela consiste na doutrina sobre a divindade de Jesus igualmente de data posterior.
Cristo (c. 36) e, principalmente, na doutrina sobre o pri- 255. A figura mais nobre e mais simpática entre os Pa-
mado da Igreja romana (c. 59) e sobre a jerarquia ecle- dres apos tólicos é S. Inácio de Antioquia, espírito cheio de
siástica. fé viva como S. Paulo, ardente de um amor místico Como
b. Esta é uma ins tituição divina (cc. 42. 50): Jesus S. João. Segundo o testemunho de Origenes (Luc. 6), Eu-
Cristo é de Deus; os apóstolos são de Cristo. Os apóstolos sébio (HE 3, 22) e Jerônimo (De vir. iII. 16), foi ~ ter-
passaram, por sua vez, a outros o seu cargo. Os chefes da
Igreja não podem ser depostos pela comunidade, porque
í ceiro bispo de Antioquia, sucessor de S. Pedro e de EvodlO.
I Da sua vida anterior 110S faltam todas as notícias au-
dela não ob tiveram o seu poder. Uma vez, chamam-se bis- " tênticas. Ele mesmo chamava-se também TeMoro; e este
pos e diáconos, outra vez, presbiteros, palavra que designa
manifestamente os bispos e talvez também os diáconos. Co-
mo se vê, a ordem jerárquica não está ainda perfeitamente
determinada. Porém, desde a Dou/rins dos Apóstolos, nota-
I
i
nome deu motivo a uma lenda , que o identifica com o me-
nino, apresentado por Jesus Cristo aos apósto~o~ como ~1O­
dela de humildade (Mt 18, 1 ss). Mas o Marlmo de [naclO,
no qual esta lenda aparece pela primeira vez, .nã~ merece
se certo progresso; pois que há presidentes da comunidade, fé' foi escrito, pela volta do século IX, por S,mao Meta-
sucessores dos apóstolos, Com residência fixa e com poder
oficial.
c. O primado romano não é objeto de uma afirmação
doutrinal, mas resulta simplesmente do fato e do modo de
intervir a Igreja romana no cisma dos corintios. Não está
provado terem os corintios apelado para Roma. Mas a Igre-
I
:~

}
fr~stes, douto oficial da corte bizantina. S. Jerônomo (Chro_n.
ad ano 2116) diz, que S. Inácio foi discípulo de S. Joao
Apóstolo, e esta afirmação é confirmada pelo Martírio Co/-
bertino, fal sificação do século IV ou V. O que de ce r~o sa-
bemos sobre S. Inácio é só o seu episcopado, a sua vIagem
para Roma , as suas sete cartas e o seu martírio.
ja de Roma, consultada ou não, considera como seu di- 256. Segundo a Crônica de Eusébio, S. Inácio foi bis-
reito e dever dirigir aos coríntios uma repreensão e exor- 1 po de Antioquia desde o primeiro ano de Vespasiano até
tação, vi sando restabelecer a paz.
254. a. Além das duas cartas aos corintios, muitos ou-
tros libelos foram atribuidos a Clemente. Porém nada jus-
I
1
ao décim o de Trajano, ou seja desde 69 até 108. Preso e
condenado à morte , foi levado a Roma, acompanhado por
dez soldados, ~ leopardos os chama ele, por causa da
crueldade com que o tratavam. Em Seleucia embarcou para
tifica a sua autenticidade. Duas cartas Ad virgines não po_
Panfilia ou Cilicia, atravesso u então a Asia Menor, passan-
dem atribuir-se a ele, porque o modo de emprega r a Sa- do por Filadélfia e Éfeso, e demorou-se algum tempo na
grada Escritura, a linguagem, o conteúdo e, sobretudo, a residência de S. Policarpo, jovem bispo de Esmirna.
censura das chamadas "sub-introductas", aCusam muito cla- DeleO'ados de diversas comunidades cristãs vieram ren-
ramente uma data posterior, talvez o fim do século II ati ,I der-lhe a" sua veneração. A alguns deles entregou cartas
principio do século III. E se, de um lado, falam ainda dos para as respectivas comunidades, Éfeso, Magnésia e T.rales,

~l
126 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milâo § 31. Os Padres apostólicos 127

dirigindo-lhes palavras ch eias de unção sobre a unidade ecle- Smirn. 4), do primado romano e da organização monár-
siástica .e ~nimando-~s. a Conservar a unidade com O bispo quica da Igreja (ctr. §§ 21 e 23).
e a reSIstir aos herellcos doceta s judaizantes (Mag n. 6; 26 J. Esta doutrina clara sobre a organização monár-
TraI. 9). quica da Igreja deu motivo a certos protestantes de nega-
257. Em Esmirna escreveu também a belíssim a carta rem a autenticidade da s cartas de Inácio . Julgavam ser
aos romanos. Inácio dá a esta Igreja os epítetos mais hono- inadmissivél o que Inácio ens ina sobre este ponto, como di_o
rificos. A carta excede todos os apla usos humanos e. ziam ser inadmiss ivel o que o s<l nto escreve sobre as here-
Moehl er diz que ela é talvez o mais amável de tudo qu;nto sias contemporâneas. Como, porém, não podem resistir à
produzIU a li teratu ra cristã. Toda ela se ressen te de uma força das razões extrínsecas da tradição, particularmente da
saudade ardente de ganhar a palma do ma rtirio. Inácio roga carta de S. Policarpo aos filipenses (c. 13, 2), recorrem a
a?s romanos, ~o.m palavras comoventes} não queiram impe- um último refúgio, negando a autenticidade da carta de Po-
dIT o seu ma rtlflO ; quer tornar-se trigo de Deus, moido pe- lica rpo ou, ao menos, da passagem em questão. Mas hoj e
los. dentes das feras, para assim ser verdadeiro pão de também os protestantes de maior renome não duvidam mais.
C"sto (c. 4) . da autenticidade das cartas de S. In ácio.
258. Seguiu depois a Tróade, onde escreveu mais três. 252. E' verd ade que elas chegaram até nós em cole-
cartas aos cristãos de Filadélfia e Esmirna e ao bispo Po- ções diferentes. Logo depois da morte de S. Inácio, S. P o-
hca~po. Nas duas primeiras: agradece a caridade que os lica rpo enviou uma coleção das mesmas aos fiéis de Fili-
ITmaos lh e. t111ham feIto e da-lhes paternas exortações, se- pos. Não sabemos quantas ca rtas con ti nha esta coleção, que
melhantes as que dera aos cristãos de Efeso, Magnésia e já não exis te. Eusébio (HE 3, 36) conheceu outra, igual-
Trales. No mesmo sentido quis escrever a outras comunida- mente perdida, que continha as sele cartas, ordenadas se-
des da Ásia Menor. Como, porém, inesperadamente tinha de gundo lugar e tempo da sua composição. Coleções poste-
partir, pediu a Policarpo escrevesse em seu nome, dando- riores, porém, conservaram-nos, com escritos espúrios, tam-
lhe, além disso, áureas regras para o bom exercício do mi- bém as sete cartas autênticas. A sua descoberta sucessiva
nistério pastoral. deu motivo a discussões acaloradas. Hoje nin guém poderá
259. De Tróade passou a Nápoles na Trácia, atraves- mais levantar uma dúvida séria na Hquestão inaciana".
sou a Macedônia e a llíria, emba rcou provàvelmente em Dir- 263. A vida de S. Policarpo é mais conhecida, do que
ráquio ou Apolônia e, desembarcando em Bríndisi, seguiu a de S. In ácio. A Vila el conversatio S. Po/ycarpi, escrita
a pé para Roma: onde sofreu o martírio. Já S. Policarpo por um certo Piônio, no fim do século IV, é lendária . Mas
110s drz que Inacro morreu como mártir ( Fil. 9). S. Ireneu Eusébio ( HE 5, 20) nos conservou uma carta de S. lreneu
(Adv. haer. 5, 28, 4) , Origenes e o Martírio Colbertino a F lorino, apóstata, pela qual o b ispo de Lião procura con-
afi rmam que Inácio foi sacrificado às feras do anfiteatro verter o seu antigo condiscipulo, lembrando-lhe a memória
c o próprio Inácio pressupõe esta forma de martírio na su~ de Policarpo, seu mestre comum. Outras notícias completam
ca rta aos roma nos (4, 2; 5, 2) . ainda um pouco os seus conhecimentos, particula rmente o
. 260. As cartas de S. Inácio p ertencem aos mais pre- Marfyrium Polycarpi, uma carta dos cristãos de Esmirna à
crosos monum entos da litera tura cri stã. São o produto dum comunida de de Fílomelium na Frigia, a mais antiga Passio
espi rito que amava apaixonadamente a Deus e a Ig reja. autêntica, que nos foi conservada.
Dai explica-se também O estilo original, vivo e abrupto. To- 254. O santo foi discípulo dos apóstolos e conversou
d~s , c~as têm, ~I~m .disso, uma singular importância para a com muitos que tinh am conhecido, em vida, a Jesus Cristo.
hrstona do crrshalllsmo e do dogma católico. Em parti- Foram também os a póstolos que o escolhera m para bispo
cular, são uma das mais an tigas e mais indiscutiveis prova s de EsmiT/la (Iren., Adv. haer. 3, 3, 4). Ao que parece, foi
da cristologia católica (Mag n. 8; Rom. 3. 6; Ef. I, 18; sagrado por S. João, pouco antes do exílio do apóstolo
128 J época: Desde a fundação da Ig reja ao Edito de Milão § 31. Os Padres apostólicos 129

( Tert., De praescr. haer. 32). T em-se por certo que os elo- só vez, a palavra "bispo", enquanto que se inculca a obe-
g ios, feito s pelo vidente de Patmos ao Anjo de Esmirna diência aos presbíteros e diáconos?
(Apoc 2, 9-10) se dirigem a Policarpo. 266. a. Outro discípul o de S. João, apóstolo, foi Pápias,
O grande bispo já contava mais de oitenta a nos de bispo de Hierápolis, amigo de Policarpo ([ren., Adv. haer.
idade, quando foi a Roma consultar o papa Aniceto sobre 5, 33, 4). Também Jerõnimo e Euséb io, na sua Crônica, cha-
diversos p ontos da di sciplina, especialmente no tocan te à ce- mam-no discípulo de S. João Evangelista, enquanto que
lebração da Páscoa (dr. § 28). Em Roma desenvolveu uma Eusébio, na sua História (3, 39) o diz discípulo de certo
,a ti vidade benfazeja contra os va lentinianos e marcionitas. presbítero João de Éfeso. Eusébio se enganou. O presbitero
Quando, um dia , Marcião se encontrou com ele e perguntou e o discípulo do Senhor, de que fala Pápias, são uma e a
se o conhecia, Policarpo respondeu: "Sim , bem sei que és mesma pessoa.
o fi lho primogênito de Satanás" (lren., Adv. haer. 3, 3, 4 ). b. Pápias escreveú, prOvàvelmente no tempo de Anto-
Depois da sua volta para Es mirna, foi condenado pelo pro- nino Pio, uma Explicação das palavras do Senhor, não só
cônsul Estácio Quadrato a morrer na fogu eira. Mas as cha- das que estão contidas nas Sagradas Escrituras, mas tam-
ma s, cercando-o brandame nte, nenhum dano lhe fi zeram. O bém das que foram transnnitidas pela tradição oral. Aqui
"con fec!or" feriu-o então com a espada (Ruinart 74 ss) . Foi está o grande valor da obra. As notícias sobre a origem
pelo ano de 156. Polica rpo tinha então 86 anos de idade. dos Evangelhos de S. Mateus e de S. Marcos aumentam-
ü glorioso martírio foi relatado pela comun idade de Esmir- lhe ainda a importância. Mas Eusébio não estimava muito
na, na mencionada carta encíclica, aos irm ãos de Filome- o autor ; censurou particularmente O seu quiliasmo. Da obra
lium e a todas as Igrejas. volumosa restam apenaS alguns fragmentos.
265. S. Polica rpo escreveu diversas ca rtas. Uma delas 267. Entre os Padres apostólicos conta-se geralmente
é dirigida aos filipen ses. S. Ireneu a chama "perfectissima" também o autor de um libelo que tem o título de Pastor
quanto à fé e pregação da verdade. Os fi lipenses pediram- Hermae. Até principios da idade moderna, a obra atribuía-
lhe que quisesse passa r uma carta deles à Igreja antioque-. se ao Hermas mencionado por S. Paulo (Rom 16, 14) . O
na e enviar-lhes as cartas de Inácio. Policarpo, responden- próp rio autor apresenta-se-nos (Vis. 2, 4, 3) como con-
do, exprime o seu contentamento pela vida, carida de e fé temporâneo de Clemente Romano . S. Ireneu e Tertuliano
dos filipenses, exorta-os, principalmente as viúvas e as vir- chamam o libelo de "Scriptura". Origenes muito se incli-
.gcns, os diáconos e presbíteros, previne-os do perigo dos nava a contá-lo entre os livros canônicos. No entanto, muito
docetas e deplora a conduta de certo sacerdote Valente, que antes de Orígenes, o autor do fragmento muratoriano de-
se tornara indigno do ministério por sua avareza.
signa como autor o irmão do papa Pio I (l40-154?); e
razões internas e externas dão a esta opinião maior proba-
A carta foi muito a preciada. e S. Jerônimo relata que, bilidade. Foi provàvelmente durante o pontificado deste pa-
.a seu tempo, ainda se lia nas reu niões litú rgicas (De vir. pa que se fez a compilação, e o lugar da sua origem é se-
iiI. 17). A sua importância está principa lmente nas muitas guramente Roma . Patrólogo s modernos colocam a obra en-
citações dos livros canôn icos do Novo T estamento. A au- tre os apócrifos ou entre a literatura interna da Igreja.
tenticidade e integridade não ad mitem dú vida a lguma. Só 268. Revestida de forma apocaliptica, a obra divide-se
um a critica tendenciosa duvidava delas para negar as cartas em cinco visões, doze preceitos e dez semelhanças. Nas 4
de S. Ináci o. Hilgenfeld opinou qu e fosse um prefácio para primeir.as visões aparece urna matrona, simbolizando a Igre-
.as ca rtas de fnácio, feito para co nfirmar a instituição do ja pecadora, penitente, santificada e justa. Na 5.' visão, o
episcopado. Outros dizem que a carta foi interpolada para anj o da penitência aparece a Hermas em forma de pastor,
.conseguir o mesmo fi m. Mas como é poss ível provar o epis- dandO-lhe exortações e revelações. Dai o título. Na 3.' vi-
.copado por um escrito, em que não sé encontra, nem uma são e na 9.' semelhança é-lhe mostrada uma torre, sí mbo-
Compêndio I - 9
130 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão
§ 32. Literatura apOlo gética do século II 131
lo da Igreja, edificada sobre as águas (do batismo)., cons-
tura. A idéia central destas apologias é provar que as pro-
truida por pedras bem formadas (os bons cristãos). Outras
fecias messiânicas Se cumpriram. .
pedras, espalhadas em redor da torre, significam os maus
cristãos, que têm de fazer penitência para poderem ser uni- 271. O primeiro dos apologetas foi Quadrato,. discípulo
dos à Igreja. dos apóstolos (Eus., Chron. 2140). Quando o Imperador
Adriano se achava na Ásia Menor (123-24 ou 129) , entre-
269. O valor dogmático da obra não é grande. A sua
gou-lhe Quadrato uma apologia, da qual EusébIO nos con-
importância principal está no campo moral-prático da pe-
SerVOu um só fragmento (HE 4, 3), para provar a sua an-
nitência, ensinando a possibilidade de uma penitência de-
tiguidade; pois o autor afirma nele que em seu tempo. VI-
pois do batismo, que efetua a justilicação interna. Ensi-
viam ainda homens sarados e ressuscitados por Jesus Cnsto.
na também claramente o valor das boas obras. Até ao sé-
culo IV, o libelo gozava de grande autoridade, pelo que foi 272. Aristides de Atenas, chamado por Eus~bio "f~~)"
admitido, em parte, no códice sinaitico. Mas, devido a cer- e "filósofo" (Chron. 2140; HE 4, 3) e por Jeronlmo fi-
tas doutrinas obscuras perdeu, desde o século V, a anti- lósofo eloquentissimo" (De vir. iiI. 20!, endereçou Igual~
ga estima. mente a Adriano uma apologia, que se Julgava perdIda, ate
Finalmente, éra enumerado entre os Padres apostólicos ao século XIX. Em 1878, os monges mequitaristas de San
o autor de lima carta a Diogneto. Mas, devido ao seu ca- Lazzaro encontraram um fragmento armênio, e Rendei Har-
ráter apologético, deve ser tratado como pertencente à li- ris encontrou, em 1889, no mosteiro de S. Catarina do mon-
teratura apologética da antiguidade. te Sinai uma tradução siriaca. A mão destes precIOsos acha-
dos, Rdbinsoll provou que a apologia não se perdera, m~s
Lightloot, Tile ApostoHc Fathers, 5 vaI., London 1886-!lO. _
Funk-Diekamp, Patres apostolici, I,2. ed" Tubinga 1901; II, 3. ed. que era idêntica ao texto grego inserido pelo monge Joao
1913. - Rau$chen, Patrologie 56 55. - Bardenhewer, Geschichte de Jerusalém (c. 630) na Vila Barlaa~J et foasaph ...
I 90 55. - Marx, Abriss 10 58. - Funk, Abhandlungen und Unter- Aristides, depois de ter estabelecIdo. o ~er.dadelro cO,n-
suchungen III, 261-75.
ceita de Deus, demonstra que o culto IdolatTlco dos. bar-
baras e dos gregos não é compativel com tal conceIto e
§ 32. Literatura apologética do século II corrompe os costumes. Em seguida, declara que nem o culto
270. No terceiro deCênio do século II, a literatura cris- judaico é perfeito. Verdade e moralidade só se encontram
tã se reveste de formas científico-apologéticas. Varões eru- no cristianismo. Por conseguinte, todos os homens devem
ditos entraram em maior número na Igreja, e, pelo simples abraçar o cristianismo.
fato de terem conhecido a verdade, sentiam-se obrigados a 273. a. O mais insigne entre os apologetas do século "
defendê-la contra os ataques dos pagãos e dos judeus. foi S, Justino, filósofo e mártir, natural de Flávia Nápolis,
As apologias que se dirigem contra os pagãos têm ge- antiga Siquém na Samaria. Moço, esforçou-se por achar a
ralmente forma de discursos retóricos. Os destinatários são verdade (Apol. I, I; Dial. 2-8). Passou. de . ~ma escola fI-
quase sempre as autoridades, imperadores e magistrados; losófica a outra, da Estoa à escola penpatetrca, desta aos
algumas vezes, amigos pagãos dos autores. Todas elas vi- pitagoreus. finalmente, julgava ver reali~ados os seus de-
savam o mesmo fim: refutar as acusações de ateísmo pela sejos na escola platônica. Eis que, um dIa, qu~ndo passea-
exposição da fé monoteista, as acusações de imoralidade va à beira-mar, meditando sobre problemas. fil osófICOS, se
pela exposição da alta moralidade e santidade dos cristãos, lhe apresentou um venerável ancião; e, segull1do os conse-
as aCllsações de lesa-majestade, provando que os cristãos lhOS deste, estudou os profetas, "órgãos do Espíri~o Sa?to e
cumpriam todos os deveres que o Estado podia exigir. intérpretes da verdade". Este estudo levou-o ao cnstlaOlsm~,
Contra os judeus escrevia-se, por via de regra, em for- provàvelmente antes da guerra de Barcochba .. ~utro moti-
ma de diálogo, servindo de base comum a Sagrada Escri- vo da sua conversão foi o exemplo dos eflstaos (Apol.
1, 12).
132 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 32. Literatura apo\ogétita do sétu\o II 133

b. Todo o resto da sua vida, dedicou-a ele à defesa rece com o célebre rabi Tarfon de Éfeso (Eus., HE 4,
da verdade. Vestido do pálio filosófico, empreendeu diver- 18): contemporâneo de Justino. Na .introdução, ~ a~tor des-
sas viagens, pregando o cristianismo com a palavra viva e creve a sua própria evolução espmtual. Na pnmelTa p~rte
escrita, convicto de que quem conhece a verdade e não a (cc. 9-47) declara que a lei mosaica é abalo da e a .leI de
prega, um dia será julgado por Deus. Finalmente, estabe- Cristo permanece. A segunda parte (cc. 4~-1O.8) é c~l~toló­
leceu-se em Roma, onde fundou uma escola. Teve aí uma gica, e ensina que a adoTação de Cnsto nao e contr~n.a ao
disputa com o filósofo cinico Crescente, convenceu-o de monoteísmo dos patriarcas. Os profetas provam a ?Ivmda-
1 ;
ignorante e devasso e foi, por isso, perseguido (Eus., HE de de Jesus como Filho de Deus humanado. A t:rcelTa par-
4, 16). Sofreu o martirio com seus companheiros pelo ano te (cc. 109-42) demonstra que os judeus e pag~os, conver-
&I~. . ,
tidos à doutrina de Jesus Cristo , são o verdadeIro povo de
274. Dos muitos escritos de Justino chegaram até nós IsraeL A Igreja de Cristo é destinada para todos os homens
duas apologias contra os pagãos, uma mais volumosa, di- de todos os séculos.
rigida a Antonino Pio, ao senado e a todo o povo romano, 277. Um discípulo de S. justino foi Taciano da Assiria.
e outra, posterior e mais breve, dirigida provàvelmente ao Ambos encontraram a verdade só depois de longas ab.. rr~­
mes?JO imperador. Além disso, possuímos uma apologia de ções. Todavia, há uma grande ?iferença entro: oS dOIS fi-
justIno contra os judeus, o Diálogo com Trifon. lósofos. Justino apreciava, tambem como cnstao, ~lta~ente
Na primeira apologia pede Justino aos leitores que es- a filosofia, Taciano a desprezava. Justino ficou hei a sua
tudem e examinem despreocupadamente a causa dos cris- nOva fê, Taciano voltou, depois d~ morte do mestre, ao
.•, ,. tãos. Para facilitar-lhes o trabalho, expõe-lhes a vida e a oriente, onde apostatou para o gnostiCIsmo, tornando-se che-
.'
, , doutrina do cristianismo, em duas partes. Na primeira par-
te (cc. 1-12), apologética, declara que os cristãos não po-
fe dos encratitas ou aguários .
Pouco depois da sua conversão ao cristianismo escre-
dem ser condenados, senão por causa de crimes. Ora, eles veu um libelo Oro/ia ad Graecos, paTa jushhcar a sua con-
não os cometem. As acusações que se lhes fazem não pas- versão. Ele ~olemi za tudo quanto é p~g~o, e, para provar
sam de calúnias. A segunda parte (cc. 13-67), expositi- a verdade do cristianismo, aduz a sub10mldade da sua dou-
va, trata dos costumes, do culto, particularmente da divin- trina e a idade venerável das Sagradas ESCrituras. .
dade de Jesus Cristo, e dos sacramentos. Os últimos capítu- Maior importância obteve outra obra de Taclano,. o
los têm uma importância especial, porque encerram a pri- Dia/essaron ou Concordância dos Evangelhos que, 1I1le1oz-
meira descrição completa da liturgia. Na conclusão (c. 68), mente, não chegou até nós na forma original. ~~s pode
Justino exige, não pede, que se proceda com justiça, amea- ser reconstruído, no essencial , por meio do comentano de S.
çando com a justiça do juiz supremo. Efrém e de outros citados da literatura antrga.
.275. Na segunda apologia, complemento da primeira e 278. Espirita muito semelhante a Justino foi Atenágoras
motivada pelo martírio de três cristãos de Roma, Justino de Atenas. Filósofo como ele, admirava como ele a itloso-
responde, sem disposição exata, a algumas perguntas cíni- fia platônica. Mas lhe é superior quanto à beleza de es!tlo
cas dos pagãos. Os cristãos não devem procurar espontâ- e clareza de disposição. Pelo ano de 177, escreveu u~a
neamente a morte, porque a vida é um dom de Deus. Mas, petição a favor dos cristãos aos imperadores ~a rco Aure-
acusados, devem dizer a verdade. As perseguições são obra lio e seu filho Cômodo. A finalidad e do !tbelo e r~f~tar as
dos demónios. Mas os demônios não teriam poder sobre os três principais acusações que se fazi~m a?s cnstaos: o
cristãos, se Deus não permitisse as a!lições dos perseguidos ateísmo convites tiestéicos e ações edlpodêlcas. Descreve,
para santificá-los e levá-los a maior glória. como A~istides e o autor da carta a Diogneto, com palavras
276 .. O Diálogo com Trifon teve origem numa disputa, eloquentes, a vida edificante dos cristãos. . . .
real ou flcticia, entre Justino e Trifon, idêntico, ao que pa- Atenágoras nos deu ainda um magmhco 1obelo Sobre
134 1 época: Desde a fundação da tgreja ao Edito de Milão 135
§ 32. Literatura apologética do século II
(1 ressurreição dos mortos. É , sem dúvida, a melhor obra amigo da insânia do cu~to idolátrico e opõe à mitologia
que se escreveu, na antiguidade, sobre este assunto. O autor pueril do paganismo a sa doutrma dos profetas. Sob~etu­
prova, nos dez primeiros capitulos, a possibilidade da res- do, trata da criação do mundo e do homem,. tal qual e re-
surreição pela onipotência de Deus. Nos capitulas seguin- latada no primeiro livro de MO is~s. No. te!CelTO hvr.o prova
tes, procura demonstrar a necessidade da ressurreição pela Teófilo a antiguidade da verdade"a rehglao pelos livros da
natureza do h o me~, sintese de corpo e alma, pela justiça Sagrada Escritura , muito mais antigos, do que os mItos dos
de Deus e pelo fIm sobrenatural do mesmo homem, i. é,
a sua eterna felicidad e. pagãos .
Te61i1o emprega, pela primeira vez, a palavra "triás"
279. Uma pérola da literatura cristã é a Carta a para designar a Santíssima Trindade, e dá às três pessoas
Diogneto. Depois das cartas de S. Iná ci o e talvez do rliá- divinas constantemente os nomes de Padre, Logos e Sa-
logo de Minúcia Félix, nenhum outro documento da litera- bedoria. Pela primeira vez, pronuncia também claramente
tu ra antiga teve acolhimento tão simpático como ela. Um a inspiração divina do Novo,", Testamen.to, assim como Ate-
pagão da a~ ta sociedade, chamado Diogneto, pedira a um nãgoras já o fizera em relaçao ao Antigo Testamento. Ou-
amIgo. Crlstao, que lhe desse resposta a três questões : I) tras obras de Tcólilo desapareceram.
I Qual e o culto dos cristãos e por que não aceitam o dos 282. O fil6so10 cristão Hérmias, conhecido só pelo no-
~ :1 pagãos nem o dos judeus? 2) Qual é a caridade dos cris- me escreveu [rrisio philosoplzorum gentilium. Em es!llo sar-
,
".
I!i
tãos ? 3) Por que apareceu tão tarde o cristianismo? O
autor responde, criticando o paganismo e o judaísmo, des-
crevendo com pala vras cheias de unção a vida edificante dos
cá;tico ridiculariza as contradições da psicologia e da me-
tafisica dos filósofos pagãos. O libelo coloca-se . geralmen-
te entre as apologias do século 11. Alguns esentores mo-

1
..•1.
cristãos (cc. 5-6), demons trando a divindade do cristianis- dernos datam a sua origem numa época postenor. Mas, de
mo (cc. 7-8), e explicando a vinda tardia do mesmo certo, não passa aquém do século 1\ 1.
(cc. 9-10).
I' ,
,,, 283. Melciades deve ter sido contemporâneo de Ta-
ij 280. O precioso libelo ficou conservado num só códice ciano e, talvez, discípulo de Justino. Tertuliano menciona-o
'J de Estrasburgo do século XIJI ou XIV. destruído em 1870. como adversário do gnóstico Valentino (Adv. VaI. 5). Pro-
FIgurava entre os eSCritos de S. Justino. No entanto "o es- vávelmente foi da Ásia Menor. Filósofo como J" 5tIllO, es-
tilo tão magnifico e tão eloquente desta carta e leva~se mui- creveu diversas obras contra gregos, judeus e heréticos.
to. acima do de S. Justino" (Tillemont). A maioria dos pa- Mas todas se perderam. Combateu, sobretudo, os gnós!leos,
trologos hodlernos estão de acordo que a carla foi escrita e foi também acre adversário dos montal1lstas, pelo que
pela volta do século II. Alguns querem ver o seu autor na Tertuliano lhe deu o epíteto de "sofist a".
pessoa de Aristides de Atenas. Nos últimos capítulos (cc.
284. O bispo Apolinário de Hierápolis escreveu, no tem-
11:12), o auto~ designa-se a si mesmo como discípulo dos
po do imperador Marco Aurélio, uma série de tratados
a postolas. Por Isto, alguns patrólogos o enumeram entre os
apologéticos e polênücos. Mas nenhum escapou ao dente
Pad.r~s apo:tól~cos. Mas os ditos capitulas são seguramente
espunos. Nao e posslvel identificar o autor; e do destinatá- roedor do tempo.
rio conhecemos sàmente o nome. Figura nobre e venerável do século II foi, finalmente
o bispo Melito de Sardes. Polícrates o chama, na sua car-
281. Muita semelhança com a carta a Diogneto têm ta ao papa Vítor, "grande luz da Igreja da Ásia Menor".
três livros qu e Teófilo de Antioquia escreveu, pelo ano de Eusébio conservo u-n os algumas notícias sobre a pessoa e
180, a Autohcos. No primeiro livro, Teófilo oferece a seu sobre os escritos e a longa lista de tratados nos dá,. ao
amigo pagão uma acertada exposição da fé dos cristãos no menos, uma idéia da vasta atividade deste zeloso bISpo
Deus invisivel, combate o politeísmo dos pagãos e detende (Eus., HE 4, 26).
o nome de cristão. No segundo, procura convencer o seu 285 . Todos estes apologetas defenderam o cristianis-
136 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 33. Heresias em geral. - Os judaizantes 13T

mo contra os pagãos. Alguns, como Justino e M-elcíades, PO 6. _ Oito, Corpus apologetarum christ. saee. II, 9 vo1., Jena
1847-72; l-V, 3. ed. 1876-81. - Pueeh,. Les ap.ologistes grecs du
escreveram também contra os judeus. Mas o primeiro e lIe siecle Paris 1912. - Lagrange, Samt Justm, Paris 1914. -
principal apologeta antijudaico foi Ariston de Pela. Do au- Giordani,' La prima polem.ica cr istiana , Torino 1930. - L{ttle, Thc"
lar não sabemos mais do que o nome. A sua apologia, AI- l:hristology 01 lhe Apologlsts, London 1934. - Marx, Abnss 23-35..
Rauschen, Patrologie 67 S5.
lercafio Jasonis ei Papisci, pereceu. Mas escritores posterio-
res aproveitaram-se dela como fonte. Celso ridiculariza-a;
§ 33. Heresias em geral. - Os judaizantes
,
; Origenes a defende. Ariston prova que o Antigo Testamen-
"~c! to foi cumprido em Jesus Cristo. 288. · As apologias do século II, além de visarem a de-
286. A importância politica dos apologetas foi quase fesa do cristianismo, provando e fundamentando a fé pelos.
nula. Grande foi, porém, a sua importância para o desen- argumentos da filosofia, loram, por isto mesmo, uma tenta-
volvimento da doutrina cristã. Apresentam-nos a primeira tiva de resolver o problema teológico da relação entre a fé
tentativa de criar uma filosofia cristã. Verdade é que não e a razão, problema sempre renovado, quando as verdades
, '.0
falavam, ex-professo, de questões fil osóficas. Mas recorriam reveladas se apresentam a um espirita culto, e acompanha-
à filosofia todas as vezes que esta lhes podia ministrar do sempre de dois grandes perigos, o racionalismo e o fi-
esclarecimento ou confirmação da doutrina cristã. Defenso- deismo. Este acentua demasiadamente a tradição, pouco se
res da fé, buscavam no arsenal da razão as mesmas armas preocupando em fundamentar cientificamente a fé. Aquele
de que se serviam os pagãos para impugnar o depósito das dá a preferência à razão, negligencian do a tradição. A Igre-
verdades reveladas. Dai se explica o caráter fragmentário ja não podia aprovar nem uma nem outra destas soluções
da filosofia patrística. extremistas. Fiel ao universalismo, afirma tanto a tradição
287. Mas os apologetas fizeram, ao menos, uma ten- revelada como a razão.
tativa; e esta foi decisiva. Filósofos cristãos posteriores com- 289. Este problema teológico havia de agravar-se à me-
pletaram a sua obra. Os apologetas, por sua vez, comple- dida que se espalhava o cristianismo no mundo helênico.
tam, felizm ente, os Padres apostólicos e os livros da Sa- No século II , teve não só a solução verdadeira, objetivista,
grada Escritura. De modo particular, dão resposta mais católica, mas também uma solução subj etivista, herética. O
perfeita ao que S. Paulo deixara de dizer. O apóstolo das que Jesus Cristo profetizara pela parábola do jOiO entre'
gentes eSCreveu não só para os pagãos, e, sim, também para o trigo (Mt 13, 24 ss) e do que S. Paulo previne os pres-
os judeus monoteistas. Por isto, apresenta o cristianismo, bíteros da Asia Menor (At 20, 29-30) , aconteceu de fato.
sobretudo, como religião da salvação eterna, operada pela Nem todos os que ouviam o Evangelho aceitavam-no inte-
morte de Jesus Cristo. Os apologetas dirigiram-se mais di- gralmente, mas tomava m dele o que lhes agradava e mis-
retamente aos pagãos politeistas. Por isto, deixaram de turavam-lhe outros elementos, formando assim diversas he-
lado, quase por completo, a pessoa de Jesus Cristo e a efi- resias. Estas deram, embora negativamente, grande impul-
cácia da graça. Tiraram da filos ofia grande parte dos seus so às ciências teológicas, "... non verum docendo quod
argumentos, sem fazerem, todavia , da sua fé uma pura fi- nesciunt, sed verum quaerendum carnales et ad verum ape-
losofia. Ensinaram a cognoscibilidade natural das verda- riendum spirituales catholicos excitando" (Aug., De vera
d,:s fundamentais do cristianismo, mas, ao mesmo tempo, relig. 8, 15).
nao se esqueceram de acentuar o fato da revelação divina. 290. Estas heresias são ou de origem judaica ou de
A razão e a fé se lhes unem numa perfeita harmonia; e à origem pagã. Os judeus e muitos cristãos vindos do judais-
sua doutrina corresponde a moral de verdadeira santidade. mo não se conformavam com a idéia de que o Antigo Tes-
Em uma palavra, os apologetas continuaram felizmente tamento fosse substituído pelo Novo. Consideravam a lei
aquele universalismo de espírito que chamamos "síntese ca- mosaica como obrigatória, e, por consequência lógica, ne-
tólica", jamais desmentido na evolução da teologia católica. gavam ao fundador da nova lei a dignidade que lhe com-
138 I época: Desde a funda ção da Igreja ao Edito de Mil ão § 33. Heresias em geral. - Os judai zantes 139

'pelia, negando em parte ou de todo a Sua divindade. Os tismo. Mas a sua conversão não foi sincera . Vendo que os
gentios não compreendiam a doutrina cristã sobre a cria- apóstolos davam o Espírito Santo pela imposição das mãos,
ção do mundo ~ origem d.o pecado e do mal. Opunham, por- ofereceu-lhes dinheiro, para que lhe vendessem o mesmo
tanto, ao mOnismo cnstao uma teona dualista ensinando poder. Com indignação censurou-o S. Pedro. Segundo os
a eternidade de Deus e da matéria. Em conse~uência des- apócrifos de S. Pedro, "Acta Petri", escritos provàvelmen-
~a dupla origem distinguimos duas espécies de heréticos, te no fim do século II, Sim ão ter-se-ia encontrado com o
Judalzante~ uns, e gnósticos outlOS. Ma s nem sempre a he- apóstolo, mais tarde, em Roma, onde teria morrido desgra-
resIa manIfesta-se tão clara e distinta. Às vezes, aparece çadamente (elr. Sulp. Sev., Chron . 1. 2, 28, 5).
a? mesmo tempo,. influenciada pelo judaismo e pelo paga ~ 294. A doutrina simonia na, chamada "gnosis samari-
nlsm o ; é o gnosÍlclsmo JudaIzante. tana" , é uma mistura de mitologia siriaco-fenícia e sincre-
. 291. Os judaizante~ dividiam-se, desde o princípi o, em tismo oriental. Não é pa ssivei ter clareza sobre o seu sis-
dOIs. partrdos. Un s se lImItavam a observar por si mesmos tema, porque as fontes principais, Ireneu (Adv. haec. I,
a leI mosalca ; outros pretendiam impô-Ia também aos cris- 23, I ss) e Hipólito (Philos. 6, 7 ss) ,' o descrevem muito
tãos . vindos do paganismo. Os rigoristas, censurados já no cUferentemente. Segundo Justino e Iren eu é o seguinte: Si-
concdlo de Jerusalem, depois da morte de S. Tiago Me- mão designa-se a s i mesmo como Deus ou grande poder
nor. ( t 62) , ~epararam-se da Igreja, opondo ao bispo Si- de Deus. Dele emanou a Énnoia , a cogitação. Esta criou
meao um antrblspo, T ebutis (Heges. ap. Eus., HE 4, 22) , os outros espíritos, demiurgos, que, por sua vez, criaram
abnndo assIm o primeiro cisma na Igreja. Consideravam o mundo material. Não querendo sujeita r-se a Énnoia, apri-
Cristo como simples homem. Aceitavam somente o Evan- sionaram-na num corpo material. E' ela a ovelha desgar-
gelho de S. Mateus, e este mu tilado, mudando até o texto rada do Evangelho (Mt 18, 12), que, passando por muitas
sagrado para negar a divindade de Jesus. S. Iren eu os cha- transformações, veio finalme nte entrar no corpo duma pros-
ma de ebionitas (pobres ). tituta, Helena de Tiro, que Simão tomou por companheira.
292. Os moderados, que Epit'ânio chama de nazareus Para libertá-Ia definitiva mente, e para salva r o gênero
admitiam qu~ .Jesus Cris to era filho de Maria, nascido po; humano, ele baixou do céu , apa recendo aos judeus como
obra do Esplrlto Santo. Mas também eles só aceitavam o Filho, aos samaritanos <.: u1110 Pai, e aos demais povos como
"Evangelho de S. Mateus", que é provà velmente o " Evan- Espirita 5a:1to. Para se salvar, o homem não precisa senão
gelho dos hebreus", de que fala S. Ireneu (Adv. haer. 1, crer em Simão e em sua esposa. Não existe uma diferença
26, 2) , e que S. Epifânio chama " Evangelho dos naza reus" essencial entre o bem e o mal, pura inven ção dos demago-
livro apócrifo. I gos para reduzir os homens à escravidão. Quais fos sem as
Qua ndo, ao começa r a guerra judaica, a comunidade consequências morais de tal doutrina, fácil é imaginar.
cristã de Jeru salém abandonava a cid ade e se esta beleci a 295. Patrício e su cessor de Simão foi Menandro (Iren.,
em. Pela, associ aram-se-Ihes essênios e outros sectários ju- Adv. haer. I , 23, 5), que ensinava uma doutrina semelhan-
daICOS, e, em con sequ ência disso, também os mod erados te, fazen do-se passar, senão pelo próprio Deus, como seu
não c o ~seguir a m m a nt~ r a unidade com a Igreja. S. Jeró- mestre, ao menos, por Salvador do gênero humano. A seita
nrm o nao dIstingu e maI s a dupla heresia, qu e se mantivera dos sim onianos manteve-se até ao século IV.
,na Pe réia e na Síria, até ao sé culo V ou, talvez, até à in- 296. Cerinto, contra o qual S. João escreveu o seu
vasão dos árabes (637). Evangelho, misturava com o cristiani smo, além de elemen-
293. O patriarca dos hereges foi Simão Mago, natural tos de ebiol\itismo e quiliasmo , doutrinas gnósticas. Ensi-
·de Olton na Samana, terra clássica do sincretismo (At 8, nava que o criador era um demiurgo e que Jesus era um
9 ss ; Just., Apol. I, 26. 56; Dial. 120; Iren., Adv. haer. simples homem, filho de José e Maria. Com ele unira-se,
I, 23, 1-4) . Movido pela pregação de Filipe, recebeu o ba- no batismo, o éon Cristo, que antes da Paixão, de novo,
140 I época : Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 34. O gnosticismo. - Vista geral 141

O abandonara (docelismo). Depois da ressurreição univer- de muitos anos, quando a heresia já se achava no caminho
sal haverá na terra um reino cheio de deleites sensuais (Iren., da decadência.
Adv. haer. I, 26, J; 3, II, I; Hipol., Philos. 7, 33). O ponto de partida dessa confusão de doutrinas foi a
297. U~,a mi stura exótica de judaismo, cristianismo e questão : Donde provém o mal? Esta questão vinha acom-
, pa~an.,smo e também a seita dos elquesaítas (Eus., HE 6, panhada por outra: Se Deus não é e não pode ser o au~or
'I
I 38, Hlpol., Ph"os. 9, 13 ss; Epiph., Pan o 53). Epifânio cha- do mal, como então explicar a origem do mundo matenal,
i ma-os de "sampseus". Na Armênia mantiveram-se COm o em Que o mal reside ? A esta se ligava, finalm ente, uma ter-
) no.me de "mandeus", até aos nossos dias. Reduzem a sua ceira- questão : Como será possível a salvação do espirito,
on gem a um certo Elquesai, contemporâneo do imperador destinado a voltar para Deus ?
T:aJano e a~tor do IIv~o sagrado da seita, que ele preten- 300. Estes probl emas não eram alheios ao mundo an-
dia t~r rece~ldo das maos dum anjo. Mas Hipólito diz que tigo. Havia então, nO oriente, certas associações e escolas,
tudo ISSO nao passa de mentira. cuj os autores e propagadores pretendiam transmitir aos seus
. . ? s elquesaitas observavam a lei mosaica, exceto os sa- adeptos o verdadeiro conhecimento (gnosis) de Deus, do
CI"I:'C'OS sangrentos, e unia~, ao seu culto a astrologia cal- mal e da salvação. S. Paulo previne os cristãos do perigo
da~ca, a. magIa, uma especle de batismo e abluções rituais. (Coi 2, 4. 8). Na solução dos ditos problemas baseavam-
~Iem dISSO,. ens i~avam a doutrina dos dois principios . O se, de um lado, no sincretismo dos cultos orientais, de ou-
Salvador Cnsto e aquele anjo que trouxe do céu o livro tro lado, numa especulação filosófica unilateral.

I';
sagrado, éon de gigantescas proporções. Jesus foi um pseu- A resposta que o cris tianismo dava àquelas questões
do-messia s e imposto r. não sa tisfazia a todos os eruditos, que da filosofia antiga
298. Ao judaísmo herético pertence, finalment e, o sis- se haviam convertido à doutrina cristã. Procuravam comple-
tema das Pseudo-Clementinas, vinte homílias, que preten- tá-la, em parte, pela filosofia grega, o neoplatonismo, com
dem conter ~s pregações de S. Pedro (PG 2; clr. n. 254b). a sua doutrina sobre os seres intermediários entre Deus
A sua doutnna é ~ma mlstu.ra de teísmo judaico e panteís- e o mundo, em parte, pelas reli giões orientais, particular-
mo ~S tÓ ICO, de Ideias eblOnItas ou elquesaítas e cristãs. O mente ° parsismo. Pretendiam obter, desta forma, em opo-
cns!Iamsmo lhe é idêntico ao verdadeiro judaísmo purifi- sição à fé católica c prescindindo da ciência que se baseava
ca do pelo verdadeiro profeta, que apareceu em Adã o, Moi- na fé eclesiástica, a "verdadeira " gnos is cristã, uma ciência
s.és .e Jesus. Este, maior do que Moisés, não é, todavia, mais elevada. Mas S. Paulo dera-lhe o nome de "falsa gno-
Salvad or, nem verdadeiro homem, nem verdadeiro Deus. sis" (1 Tim 6, 20) . Mais tarde, chamava-se geralmente
Irc,! .,. Adv. hae r~ses. ~ Hippol ., Philosophumena. _ T er!., De gnosticismo.
pra.escnptlOne haere hcorum. - Epiph., Panarium. - Aug. De hae- 301. Embora haja diversos sistemas do gnosticismo,
re~lbus. - ~ch~ane> Dogmengeschichte, Freiburg, I, 2. ed: J892. _
Tlxeront, . Hlsto lre d~s. ~ ogm.es, P aris, 11. ed. 1930. _ Tondelli, todos têm por fundamento alguns principios comuns. O pri-
11 .Ma ndels mo e .'e. onglnl c~rrst iane. Roma 1928. _ Loisy. Le Man- meiro e mais caracteristico é o dualismo, ou seja a oposi-
d e~sme .et _ le~ OTJgln~s c~rétlennes, Paris 1934. - CUllmann, Le pro- ção entre Deus e o mundo material. Esta oposição é diver-
bJeme httera lre ct hJstonQue du rom an pseudo-clémcntin, Paris J93O.
samente determinada, concebendo uns a matéria, segundo o
neoplatonismo, como o mal absoluto, sem forma e sem essên-
§ 34. O gnosticismo. - Vista geral. - A gnosis. alexandrina cia (llfJ õ,,) tomando-a outros no sentido parsista, ani-
e slriaca
mada pelo principio do mal.
299. Mais perigosa do que o judaismo herético foi para 302. Na filosofia neoplatônica, Deus é todo transcen-
a !greJa a heresia do gnosticismo. Ele apresentou-se com o dental, tão puro e sublime, que não pode haver contacto
bnlho ~~ erudição; e tão poderoso foi o seu atrativo, que entre ele e a matéria , nem por meio da criação. Supõe-se,
um esplTIto como Agostinho se deIXOU fascinar pelo espaço portanto, uma série intérmina de éons ou espiritos, ema-
142 I epoca: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 34. O gnostic ismo. - Vista geral 143

na5ões do ser supremo, que se tornam tanto mais imper- 305. Os princípios destas aberrações encontram-se na
feItos, quanto maIs se dIstancIam da divina fonte de sua doutrina de Simão Mago, de Cerinto e dos elquesaitas. Mas
essência. Alguns contam até 365 emanações. o período clássico do gnosticismo são os cinco decênios an-
T odos os éons (= eternos) juntos constituem o reino tes e depois de 150. No entanto, devido ao seu caráter
da luz (n;J,'í(}WfW), no qual tudo é bom. O último dos sincretista, não é uma doutrina uniforme, nem tem um fun-
éons inferiores, que já se misturaram com o reino das tre- dador determinado. A histó ria conhece cerca d e trinta di-
vas e do mal ("él'Wfw ), criou o mundo material. Este versos partidos e fundadores de d iversas escolas gnósticas,
cnador é. idêntico com o legislador do Antigo Testamen- que, para propagar as suas idéias, criaram uma rica lite-
to, o demlurgo Javé. A criação se realizou contra a vonta- ratura. Os seus principais representantes são Bas ílides, Va-
de de Deus, porque nela se estabeleceu a dominação da lentim e Marcião. As sua s sedes principais eram Al exan-
matéria . dria, Antioquia e, por algum tempo, também Roma.
. ~03. a. A salvação consiste na libertação das almas 306. Os primeiros gnósticos, mencionados por S. Ire-
apnslOnadas na matéria. Para realizá-Ia, veio o éon supre- neu (Adv. haer. I , 24) , são os dois discípulos de Menan-
mo, o Logos Cristo, anunciar aos homens o verdadeiro dro: Saturnino e Basilides. Basílides, primeiro representan-
Deus e ensinar-lhes a vencer a matéria. Mas, sendo a ma- te da gnosis egipcia, dout rinava no tempo de Adriano em
t~ri a o mal absoluto, os gnósticos neoplatônicos admitem Alexandria. A sua doutrina obscura e confusa não permite
somente uma encarnação aparente. um conhecimento exato. S. Ireneu a propõe como emana-
. b; Este docetismo divide-se em duas tendências. Os sí- ção em sentido descendente, Hipólito (Philos. 7, 14 ss) ,
TIOS dIzem que o éon Cristo assumiu um corpo etérico, apa- como evolução em sentido ascendente, sendo, porém, o fun-
rente, ou passando p ela Virgem Maria (Bardesanes), ou damento o mesmo em ambas as relações, dualista e não-
aparecendo sem nascImento na sua forma viril (Marcião). panteista. A moral de Basílides e de seu filho Isidoro é bas-
Os alexandrinos ensinam que Jesus nasceu como qualquer tante rigorosa. O matrimônio lhes é santo; superior, porém,
homem, descendo sobre ele, no batismo, o éon Cristo, para é a virgind ade. A salvação existe só para a a lma; o corpo
morar nele até ao tempo da Paixão. se decompõe inteiramente. A seita manteve-se até ao século
c; Nem todos os homens participam da redenção. Sen- IV. Mas a escola tomou, mais e mais, formas libertini stas e
do. cflados como hilicos, psíquicos e pneumáticos só estes antinomistas.
ú!hmos, os _gnósticos, serão os escolhidos. Os psíquicos, ca- 307. a. O mais profundo dos g nósticos alexandrinos foi
tollcos, s~rao recolhIdos num lugar intermediário, enquanto Valentim, que veio estabelecer-se em Ro ma, onde se demo-
que os hlhcos, materiais, a grande massa da humanidade rou pelo espaço de vinte anos. Levado por ambição, alme-
e~tão irremediàvelmente destinados a perecer Com a maté ~ java o ponlificado, quando mOrreu o papa Hig ino (t 140).
na. FIm e ter~o de tudo será a apocatástase, ou regresso Preterido na eleição, fez- se chefe duma seita e teve nume-
de todas a s cOIsas ao lugar respectivo da sua natureza. rosos sectários, chamados valentinianos. Tertuliano escreve-
304. Conforme a estas doutrinas, acristãs e naturalis- (De praesc. hae r. 30) que foi excluído, mais de uma vez,
tas, que destróem completamente a unidade de Deus e a do seio da Ig rej a.
união h!postática d.e Jesus Cristo, a ética dos gnósticos tem b. O seu sistema já não pode ser reconstruido nos por--
um carater naturalista, e consiste em g randes austeridades menores. Os seus discípulos dividiram-se em duas escolas,_
em parte contrárias à natureza . E como os extremos sem~ uma ocidental , na Itália e no sul das Gálias, representada
pre se tocam, converteu-se num desenfreado antinomismo por Secundo, Tolomeu e Heracleon, e outra oriental, no Eg i- -
e libertin~sm o, favoreci.do pela identificação do demiurgo to e na Síria, representada por T eódoto e Marcos. A dife-
c?m o legIslador do Antigo Testamento, cujo decálogo é con- rença das duas escolas consiste principalmente na diversa
SIderado como contrário à vontade de Deus. concepção do Salvador que, segundo uns, assumiu um COr---
144 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 34. O gnosticismo. - Vista geral t45

po psiquico, segundo outros um corpo pneumático. Como éons, tem, no entanto, com eles muitos pontos de contacto..
todos eles se acomodassem largamente à terminol ogia cató- o o dualismo o desprezo ao Anti go Testamento e a
;. Jica, tornaram-se muito perigosos para a Igreja ( Ter!., Adv. com , .
m atéria ass im como a ética . rigOrista.
M't b ·trànamento
UI o ar 1 . ...
Valen!.; Iren., Adv. haer. I, II ss). chama Harnack a este heresia rca " primeiro reformador cns-
308. A gnosis alexandrina pertencem também os ofitas, tão e inovador do paulinismo". .
que veneravam a serpen te como medianeira da gnos is; os Filho dum bispo de Sinope no Ponto, fOI excomunga-
naassenos, que adoravam a serpente; os cainitas, que ti- do por seu pai , por motivo de sua vida escandalosa: Esta-
'nham como livro sagrado um "Evangelho de Judas"; os se- beleceu-se então em Roma, onde foi condenado tambem pelo
titas, que veneravam a Sei como pai dos pneumáticos; Abel Pio I S Policarpo de Esmirna, encontrando-o na s ruas
e Caim eram considerados como pais dos ps íquicos e hi- papa . , . d S ... (I en Adv
da cidade , chamou-o "primogêmto e ata n.~s. r., .'
d
, licos; os adamitas, que professavam o comunismo de mU- haer. 3, 3, 4), e os demais escritores ec1esla;;ttcos da crantt -
lheres e praticavam as mais horriveis devassidões ; os car- O'uidade viram nele o ma is perigoso adversa no da l"rcJ a.
b .
pocracianos, os antítatos, os nicolaitas, os prod icianos e 312. a. Marcião negava toda a Sagrada Escr!tura, ex-
outros mais, que, pela maior parte, se perderam nas aber-
ce to o Evangelho mutilado de S. Lucas e dez eplstolas de
rações do antinomismo. S. Ireneu fala de fórmulas de en-
S. Paulo. Para justificar o seu modo de ver e para ex pll~ar
·cantamentos que empregavam. Epífanes, filho de Carpócra- esta sua Sagrada Escritura, escreveu as chamadas Anllte-
tes, ensinava abertamente o comunismo de bens e de mu-
ses. Ponto de partida da sua teoria é a d?utri~a .de S. Paulo
'Iheres; mas Com apenas dezessete anos de idade morreu em
sobre a graça. Na sua opinião, Paulo e o untco. apóstolo
consequência da sua vida licenciosa (Clem. Alex., Strom . que realmente compreendeu o Senhor. A sua doutnna e ex-
3, 2; Iren., Adv. haer. I, 25. 31-33).
c1usivamen te revelação do Novo T estamento . O, Evangelho,
309. A gnosis siríaca não é hostil ao Antigo Testamen- como ele o entende, opõe-se à lei; a graça, a Justtça .. O
ia. As suas doutrinas principais são o docetísmo e uma mo- cristianismo em geral não tem nada de ~omum com o JU-
rai rigorista. Representantes desta escola são Saturnino, dis- daismo. Dai veio a concluir, nas sua s Antileses, qu~ O Deus
cipulo de Menandro, e Bardesanes de Edessa (t 222), o do Antigo T estamento e o do Novo estão em pe r~et~ a opo-
mais distinto entre os gnósticos de Antioquia. sição. O Deus dos judeus ê o Deus da justiça, Idcnhco C?111
Ensinava o docetismo dos valentinianos orien tais. O O demiurgo criador do mundo mau, um deus CIOSO e Vlll-
Salvador, dotado dum corpo etérico, não é l" lYJa!jíaç, e gativo. O Deus do Novo Testamento é o Deus da graça e
.s im ó,à M af![aç. Ajudado por seu filho Hann ôn io, for- da caridade. .
mulou a doutrina em belos hinos, atraindo desta maneira b. Este Deus su premo manifestou-se em CTlsto, que no
g rande número de adeptos. Ainda no século IV, S. Efrém 15' ano de Tibério baixou do céu , assumiu um corpo h~­
de Edessa teve de lutar contra a seita, opondo aos hinos mano apa rente, pregou e operou milagres, mas fO I cn~clh­
heréticos os seus belos versas católicos (Epiph., Panar. 55). cada aparentemente COmO adversário da lei pelos sectaTlos
310. Aos gnósticos da Siria pertence também a seita do demiurgo . Ressuscitado, revelou. a S. Paulo o verdadeI-
dos encratitas de Taciano, que se distinguiu por seu rigo- ro Evangelho da justificação pela fe, sem as boas ob ras ~a
rismo, condenando o uso de carn e e vi nho e O matrimônio. lei. O verdadeiro cri stão é sem medo, porque Deus n2.0
Por seu costume de usar sàmente água, mesmo na santa 'ulO'a a ninguém. O cristão obedece, porque ama, sem pen-
J b
Missa, os sectários ch amavam-se também de aguários (Iren., sar em prêmio, nem cas t'Igo. f d"
Adv. haer. I, 28). 313. Tais são flS doutrinas do Hprimei~o re o rm,a ar .
311. Marcião foi um dos ma is perigosos heres iarcas. Repudiava as Sagradas Escrituras, de que nao ;;e podIa ser-
Embora não possa ser enumerado entre os gnósticos pró- vir. O que aceitava, interpretava-o conforme as su ~s .dou-
,priamente di tos, porque rejeitava a doutrina ridícula dos trinas preconcebidas. Começava o livre exame da blblta. O
Compêndio I - 10

'1
146 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 35. O maniqueísmo ou gn osticismo párseo 147

cristianismo individual, subjetivista, separava-se do cristia- cificado por ordem do rei Bahrão I (c. 276). Há, no entan-
nismo universal e objetivista. O fundador de uma seita cha- to, variações sobre a sua pregação e sobre a sua morte.
mava a sua obra a "verdadeira e melhor Igreja" . Também os seus sequa zes sofrera m violentas persegui-
Realmente, Marcião fundou uma Igreja à parte, com ções tanto na Pérsia, como no império romano. Seus escri-
bispos, presbíteros e diáconos, modificando, porém, a dis- tos foram metidos no fogo. Apesar disto, a seita teve uma
tinção entre clérigos e leigos. As fun ções cultuais eram se- larga difu são, no oriente até à China, e, no ocidente, até
melhantes às católicas. Reconhecia a Euca ristia e o batismo. à Africa setent rional, onde S. Agostinho, por longos anos,
Substituia, porém, o vinho pela água, e as palavras: " Este foi seu adepto. Espalhou-se também na Itália e na Espa-
é o meu corpo", por estas outras: "Esta é a fi gura de meu nha, e manteve-se, nas suas diversas formas, até à idade-
corpo". média.
Deste modo, o sistema marcionista foi de todos os sis- 315. O sistema do maniqueísmo é um dualismo radi-
temas gnósticos °
ma is cristão. Mas por isso mesmo e por cal. Existem, desde o princípio, dois seres primitivos essen-
sua grande difusão o mais perigoso pa ra a Igreja. Mante- cialmente dis tintos, Ormu zd com o reino da lu z e Ahriman
ve-se, em diversos países, até ao século V. Alguns historia- com o reino das trevas. Os dois reinos se originaram pela
dores querem ver um conexo entre os marcionistas e os pau- emanação dos dois principias. Entre os éons têm um lugar
licianos da idade-média. saliente o homem primitivo, éon da luz, e o demãnio primi-
Moehfer, Versuch ueber den Ursprung des Gnostizismus, em tivo Satan ás éon das trevas. Este inva diu as regiões da
Gesammelte SChriften, I, Regensburg 1839. - BOllssel, Hauptpro- luz 'e, por sl:a vitória sobre o homem primitivo, confundi-
bleme der Gnosis, Goettingen 1907. - Buonaiuti, Lo Gnosticismo, ram-se partículas da luz com as trevas. Desta matéria he-
Homa 1907. - Funk, Abhandlungen un d Untersuchun gen, I, 358-75.
- Leipolt, Johannesevangeli um und Gn osis, em Neutestament l. Stu- terogênea formou-se o mundo visível.
,I dien, Leipzig 19l4, 140-46. - Ehrhard! Die Kirche der Maertyrer As particulas da luz, aprisionadas na matéria, são o
122-227. - !Vilson, Mare ion, London 1933.
"Jesus patíbilis", como as chamavam os maniqueus ociden-
tais. As outras partes da lu z são o "Jesus impatibilis" . Es-
§ 35. O maniqueismo ou gnosticismo párseo te deve liherlar aquele. Libertar as partículas da luz apri-
314. Muita sem el hança com os sistemas mencionados sionadas dos elementos tenebrosos é o fim da criação. Mas
tem a gnosis pársea, ou maniqueísmo, cujo fundamento é Ahriman criou, por sua vez, os homens, Adão e Eva, frus-
o dualismo extremo de l oroastro, misturado com elementos trando assim a salvação. As almas dos homens são partí-
da antiga religião babilônico-caldaica e da moral e ascética culas da luz. Ahriman quis difundir a luz pela geração, para
párseas, budistas e judaicas. manter assim o seu dominio. Mais tarde, o Jesus impati-
bilis baixou aparentemente . à terra, ' a fim de instruir os ho-
Fun dado r do maniqueísmo foi Mani, cham ado pelos
mens sobre a sua origem e o seu destino. Mas a sua dou-
gregos Manes e pelos roma nos Man ichaeus. Nos últimos
trina foi mal compreendida e falseada pelos apóstolos e
decênios, fo i objeto de mu itos estudos, ocasionados por con- cristãos posteriores. Por isto, veio, finalmente, o próprio
sideráveis fragmentos de obras dele e de seus sectá rios, en- Mani, o Paráclito prometido por Jesus, para libertar as par-
contrados no Turquestão chinês e no Egito. O próprio Mani tículas da luz.
confessa ter haurido a sua doutrina dos Padres da justiça,
316. A salvação consiste principalmente no ensinamento
Jesus, l oroastro e Buda , pretendendo, porém, vencê-los a de três preceitos: I) o signaculum ori s ou a proibição da
todos por seu novo Evange lh o. Pregou primeiro nas fndias. blasfêmia, de carne e de vinho; 2) o signaculum manus ou
Em seguida , começou a pregar também na Pérsia, onde go- a proibição do trabalho manual; 3) o signaculum sinus ou
zava dos fa vores do rei Sapor I (241-72). Mas, devido às a proibição do matrimônio.
maquinações dos magos e sacerdotes de loroastro, foi cru- Mas estes signacula eram destinados exclusivamente
10'
§ 36. Controversias trinitárias 149
148 (, época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão
tes subordinacianos deixaram, porém, íntacta a unidade de
'I para os escolhidos, chamados "cátaros ", enquanto que os Deus e a divindade de Jesus Cristo.
j catecúmenos ou ouvintes só eram obrigados à observân cia
319. No enta nto, pelo fim do século li , a questão tor-
1 dos dez mandamentos. Podiam, no resto, fazer tudo quanto
nou-se objeto de acres controvérsias. Ensinando a unidade
era necessário para sustentar os esco lhidos, que em troca
absoluta de Deus e negando a pluralidade das pessoas di-
lhes perdoavam os pecados. Os perfeitos, livres da matéria,
vinas, algun s chegaram a concluir que Cristo não era Deus
entram primeiro na luz e no sol, depois num rei no etérico
e nele ex iste apenas uma força divina. E' a doutrina dos
e, finalmente, na luz puríss ima. Os outros devem passar de
antitrinitá rios ebionitas, cha mados também subordinacianos
corpo em corpo, e até em animais e plantas. Tendo-se rea-
ou dinâmicos ou adopcianos. Outros, pelo contrário, diziam :
lizado a rede nção, o mundo visível será destru ído por um
Cristo e o Pai são uma e a mesma pessoa, que, por d iversos
incêndio, e os dois rei nos ficarão para sempre separados.
modos, se têm manifestado. São os antitrinitários modalis-
317. O culto divino revestia-se dum misticismo impe- tas, apelidados tamb ém de patripassia nos. Segundo o seu
netrável, e fazia -se com as orgias mais detestáveis. Para lema , "Mona rchiam habemus" (Te rt., Adv. Prax. 3), todos
f, presidir ao culto e governar a seita, Mani estabeleceu uma eles chamavam-se monarquianos .
I jerarquia, cujo chefe é o sucessor de Mani. Consiste de doze 320. Co ntra os dois extremos, a Ig reja teve de defen-
mestres, setenta e dois bispos, presb íteros e diáconos. Des- de r, de um lado, a un idade de Deus, de outro lado, a di-
ta forma opôs o heresiarca à Igreja católica outra Ig reja vi- vindade de Cristo. Na solução do problema é quase impos-
sível (Aug., Haer. 46). sível não ve r a obra da Providência div ina , que fez com que
'I! "I. Ii,l Alfarie, Les écritu res ma nichéen nes, 2 vol., Pa ris 1918-19. - primeiro surgissem os e rros acerca da pessoa de Cristo: o
Ballr, Das manichaeische Religions-s)'stem, nova impr. 1928. - Ton- judaísmo ebion ita, que negava a divindade de Cristo, e o
delli, Mani, Milano 1932. - Jackson, Resea rches in Manichaeism,
New York 1932. docetismo g nóstico, que negava a sua humanidade. Contra
II
.$ , ambas as heresias era relativamente fáci l estabelecer a ver- :;"c f_
.§. ,36.. Controvérsias trinitárias dad e: .illitlp.. é verdadeiro Deus e verdadeiro home% S ol- / ,7,- (' ,/
vida esta questão cristológica e entrando agora no campo h .'> .:- .. 0:
3 18. Ao judaísmo e ao gnosticismo prende-se intima- IrillitáriOl fo i, a lém di sso, de grande utilidade nos de f enso- . --(:: /:"'/J '7
mente a chamada questão trinitária. A pregação apostólica res da fé ortodoxa a opos ição ent re os próprios antitrini-
acentuara a unidade de Deus contra o politeismo pagão. tários, fornecendo uns as armas contra os outros .
Mais tarde, os apologeta s e os escritores antignósticos pre- 32 1. a. Os monarquianos ebionitas reduzem a sua ori-
ga ram a mesma unidade divina. Ao lado deste dogma prin- gem ao curtidor Teódato de Bizâncio (Eus., HE 5, 28).
cipal do cristianismo apa rece, desde logo, também o da di- Durante a perseguição, renegara a Cristo com a desculpa
vindade de Jesus Cri sto . Surgiu então, por lógica conse- de não ter renegado senão um homem. Pelo ano de 190,
quência, o problema da relação entre os dois dogmas. p regou a sua doutrina em Roma, onde foi excomun gado pelo
Os Padres apostólicos não deram uma resposta clara e papa Vítor I ( 189-98). Acreditava na messianidade de Cri s-
precisa. Os apologetas te ntaram solucionar o problema, se- to, no seu nascime nto da Virgem Maria e na vinda do Es-
g uindo a teosofia de Filo. Distinguiam em Deus um Logos pírito Santo sobre ele no batismo. Negava, porém, a sua di-
interior e um Logos exterior, que, eterno segundo a sua vindade, apelando para as palavras de S. Paulo ( I Tim 2,
5) e de S. João (Jo 8, 40).
essência, só pela cri ação começou a ser uma pessoa distin-
ta (Ju st., Apol. 2, 5; Theoph. , Ad Au!. 2, 10) . Por tal dou- b. Um dos seus disc ípulos, T eódato o Moço, mistura-
va a sua doutrina com elementos gnósticos, admitindo um
trina ficava o Filho subord inado ao Pai. Pois negava -se-
eon Melquisedec, superior a Cristo e medianeiro entre os
lhe a subsistência eterna, a geração não se considerava co-
anjos. Os seus sectários chamavam-se melgu isedequianos
mo um ato necessário e eterno, e, sim, livre e temporal. Es-
150 1 cpoca : Desde a fund ação da Igreja ao Edito de Milão § 36. Controvérsias trinitárias 151

(Hipol., Philos. 7, 35-36) . Uma tentativa de fundar uma como Pai; na encarnação e na obra da salvação, como Fi-
Igreja à parte fraca ssou, porque o confessor Natalis, a quem lho; na santificação, como Espírito Santo. Desde então, o
elegeram para bispo, primeiro antipapa (217 ; Eus., HE 5, monarquianismo adotou, mais e mais, o nome de sabe-
28) , voltou logo, arrependido, ao seio da Ig reja . lianismo.
322. Ainda na primei ra metade do sécul o III, um certo 325. A heresia provocou contendas acérrimas na co-
Ártemas pregou a mesma doutrina. Seu discipulo Paulo de munidade de Roma. Infeli zmente, o maior adversário de
I
I Sam6sata, bispo de Antioquia , homem ambicioso e avaro Sabélio, Hipólito, não ficou isento de heresia, professando
l (Eus., HE 7, 27-30), veio a ser, no sécul o m, o principal uma espécie de subordinacianismo ou diteísmo. O papa Ze-
,
•.\ representa nte da doutrina ebion ita . Ensinava que Jesus era
um simples homem, nascido de Maria Virgem, no qual ha-
firino, teólogo menos experimentado, contentou-se com con-
firmar a doutrina tradiciona l: a unidade de D eus, a di vin-
bitara o Logos impessoa l ou a Sabedoria de Deus, como dade de Jes us Cris to, e a morte do Filho, não do Pai.
num templo. O Logos não é distinto do Pai, é ófloovr;wç Não é, pois, verdade o que I-Iarnack e ou tros protes-
ui> lr:ar(!í, sendo ovma igual a vTtor;watç. Um sí- tantes pretendem: ter o modalismo sido dout rina reconhe-
nodo de Antioquia (268) , onde o presbitero Malquião o con- cida em Roma desde Vítor I até Calisto I. Mas também não
venceu de heresia, excomungou-o e lhe deu o bispo Domno é verdade que Zefirino confirmou a doutrina de Hipólito.
como sucesso r. Daí a grande aversão do douto presbitero contra o papa
Mas, como Paulo era ministro da rainha Zenóbia de e conira Calisto, que, da condição de escravo, subira a con-
Palmira, soube manter-se, até à conquista de Antioquia pelo selheiro do papa.
imperador Aureliano (272; clr. n. 154). E mesmo assim, a 326. A oposição de Hipólito levou, finalm ente, a um cis-
semente que havia espalhado não desapareceu de todo (Eus., ma, quando Calisto I (217-22) foi elevado à sede pontifí-
HE 7, 30). Sobreviveu, particularmente, no presbítero Lu- cia. Pois o novo papa, depois de ter excomungado Sabélio,
ciano, fundador da escola exegética de Antioquia, por meio acusou Hipólito da heresia contrária, do diteísmo. Hipólito,
do qual as idéias passaram a seu discípulo Ari o. por sua vez, indignado e excitado pela elevação de Calisto,
323. Os monarquianos patripassianos consideram a como ta mbém peia atitude indulgente do papa na questão
Noelo de Esmirna como seu primeiro representante ( Hip., penitenciária, fez eleger-se antipapa por uma minuria, que
Adv. Noe!.; Philos. 9, 7- 10). Ele ensinava que em Deus exis- possuía g rande in!luxo em Roma. O cisma perdurou nos
te rea lm ente só a natu reza; a personalidade não é senão a dois pontificados seguintes de Urbano I (222-30) e de Pon-
manifestação ad extra. Por conseguinte, a mesma pessoa é dano (230-35).
Pai e Filho, gerada e não gerada, visível e não visível, con- 327. Sabélio retirou-se, no entanto, para o Egito, onde
form e a diversidade da manifestação. muitos adotaram a sua doutrina e onde a seita se manteve
Quase ao mesmo tempo, Prâxeas tran splanto u a doutri- até ao sécul o IV , apesa r de ser fortemente combatida por
na para Roma. Mas, por ser adve rsário do montanismo , foi Dionís io de Alexandria. Este, para combater a heres ia, em-
acremente combatido por Tertuliano (Adv. Prax.). pregava uma terminologia menos feliz, chamando o Filho
324. No pontificado de Zefirino ( 198-217), Epígono, criatura do Pai. Mas, acusado perante o papa Dionísio (260-
discípulo de Noeto, abriu uma escola em Roma, cujos che- 68) , logo revogou o seu erro. Também o bispo Berilo de
fes, mais tarde, foram Cleômenes e Sabélio. Este último, Bostra na Arábia simpatizo u com o sabelianismo. Mas re-
oriundo da Líbia, tornou-se defenso r principal do modalis- nunciou ao erro, quando Orígenes o convenceu da heresia,
mo e estendeu a questão também ao Espírito Santo (Hip., num sínodo de 244. Nem Calisto, nem Hipólito, nem Orí-
Philos. 9, 11-12). Ele ensina: Deus Padre, Filho e Espíri- genes, nem Dionísio acha ra m a verdadeira solução do pro-
to Santo são uma e a mesma coisa; mas há três manifes- blema trinitário. Ela ficou reservada aos concílios de Ni-
tações de Deus. Na criação e na legislação manifestou-se céia e de Constantinopla, no século IV .
152 I época : Desde a fundação da Igreja ao Edito de Alilão § 37. Montanismo, quiliasmo e cisma de Novacia no 153

Schwane, Dogmen~eschichte J. - ! ixeronf, Histoire des dogmes pela gnosis ebioni!a de Cerinto, assumiu a forma de um
I. - Bardy, Paul de Samosate, lou vam, 2. ed. 1929. ~ MacchiorQ
L'eresia Noetiana, Napoli 1921. ' g rosseiro sensualismo, mas também en tre os demais cristãos.
Estas idéias baseavam-se, de modo especíal, nos cc.
20 e 21 do Apocalipse de S. João. Satanás seria acorren-
§ 37. Montanismo, quiliasmo e cisma de Novaciano
tado pelo espaço de mil anos. Os santos ressurgiriam e rei-
328. Além das questões dogm á ticas, outras controvér- nariam com Cristo na nova Jerusalém. Depois conceder-se-ia
sias, de caráter religioso-moral, perturbara m, nos séculos II a liberdade a Satanás, que, por breve tempo, desenvolveria
e III, a paz da Igreja. A cristandade primitiva tinha o sen- assustadora atividade. Mas seria definitivamente vencido, e
timento de ser uma comunidade de santos. Alguns rigoris- haveria então o fim do mundo atua l, o último ju ízo e um
tas chegaram até a dizer que quem, depois do batismo, se novo céu e uma nova terra.
separava da Igreja por um pecado mortal, estava dela se- 331. Os primeiros representantes deste quiliasmo entre
parado para sempre. Ora, já S Paulo se vira obrigado a os escritores eclesiásticos são o aulor da carta de Barnabé
repreender os cristãos de Corinto por causa dos seus pe- e Pápias. Também nos escritos de Justino, Ireneu, Lactâ n-
cados. Quanto mais não devia m ter motivo de se que ixarem cio e outros encontramos idéias semelhantes, principalmen-
os chefes da Ig reja, e m tempos poste riores. Daí s urg iram te, porém, entre os montanistas. Eles ensinava m que ao rei-
duas questões: I) Será preciso mitigar a disciplina eclesiás- no milená rio deve preceder uma vida de g rande austerida-
tica para não excluir ta ntos pecadores? 2 ) Ficará em pé a de. Por isto, proibiam primeiro qualquer matrimônio; em
sa ntidade objetiva da Igreja, não obstante se encontrarem seguida , ao menos, as segundas Il l1pcias; exig ia m um jejum
I nela membros indignos? Solução err ónea deram, no século rigo roso, declaravam ilícíto fugir da persegu.ição e aconse-
I II, os montanistas, e, no sécul o m, os novacianos. lhavam até procurar ° martíri o (Tert., De fu ga 9). As mu-

.- il 329. Montano, frígio, antigo sa cerdote de Cíbile ou de


Apolo, passou ao cristianismo, no terceiro quartel do século
lh eres deviam renunciar a qual quer enfe ite. Os que, depois
do batismo, tivessem caído em pecado mortal , deviam ser
II. Mas logo sentiu-se chamado a reformar a Igreja, tornan- excluidos para sempre da Igreja.
cio-se Iundador duma seita, que primitivamente se chama- 332. Como os montanistas se restrin g issem a questões
va "heresia dos frígi os" ou "cata frigias" . Montano p reten- él isciplinares, não são heréticos no sentido próprio da pa-
dia ser um instrumento de Deus, o paráclito prometido por lavra. Mas pela idéia do profeti smo in dividual opuseram-se
Jes us C risto. Logo lhe ade rira m não poucos sectá rios, entre à auto ridade eclesiástica. E como anu nciasse m a vi nda ime-
os quais fi gurara m, sobretudo, dua s mulhe res visionárias, diata do fim do mundo, negavam também a missão un iver-
Maximila e Priscila. Seus va ticínios se referiram particular- sal que Cristo dera à sua Igreja. Po r isto, opu seram-se-Ihes
os bispos em di ve rsos s inodos e os excomungaram. Em Ro-
me nte à vinda de Cristo e à prox imidade do re ino milená-
ma, onde seu chefe era um certo Prodo, combateu-os o
rio. E como estes vaticínios vinham aco mpa nha dos por uma
presbítero Gaio. Fê-lo , porém, de um modo imprudente.
mo ral severa, a seita propagou -se ràpidamente na Ásia Me-
Para tirar aos montanistas o fl!ndamento 1 negou a autenti-
nor e em outras regiões.
cidade joan éica tanto do quarto Evangelho, como do Apo-
330. O erro principal do montanismo é °
quiliasmo, calipse, atribuindo ambos os livros a Cerinto.
profecias visionárias da nova Jeru salém. Já os judeus do 333. No entanto, todas as medidas não conseguiram
Antigo Testamento, oprimidos pelo jugo dos estrangeiros, deter o movimento. Passou para o seu lado o próprio Ter-
es peravam a vinda dum reino messiânico de mil anos. Os tuliano, que se tornou seu principa l defensor. Originou-se,
próprios apóstolos nutriam tais esperanças (At 1, 6). Ain- em seguida, uma acre contenda entre ele, talvez o maior
da depois de Pentecostes, mantiveram-se estas idéias não só douto de seu tempo, e o papa Calisto I. T ertuliano nutriu,
ent re os cristãos judaizantes, entre os quais o quiliasmo, por algum tempo, a esperança de poder introduzir a sua
154 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 38. Literatura anti-herética 155

doutrina na com,unidade de Cartago, Desiludido, separou- praxe (etr. § 25). Opôs-se, porém, a Novaciano na questão
se ,da Igreja catohca .. ~hegou a substituir o conceito obje- do cisma e do rigorismo.
llvlsta duma Igreja vlslvel pelo conceito subjetivista duma b, No entanto, este grande bispo teve de lutar, desde
Igreja espiritualista, a sua elevação à sede episcopal, em primeira linha, contra
Mas o sucessor de S. Pedro compreendeu mais serena uma oposição de elementos relaxados, oposição esta que se
e. claramente o espirito de Jesus Cristo. Não aprovando o agravou ainda, quando Cipriano começou a proceder contra
f1gonsm~ dos ~nontanistas, concedeu a reconciliação aos pe- o abuso dos "libelIi pacis". Muitos "lapsi" e até confesso-
cadores tnCont111entes, contanto que se arrependessem e fi- res passaram para a oposição. Esta foi eficazmente apoia-
zessem penitência. da por Felicíssimo que, sem a permissão de seu bispo, ha-
A seita manteve-se por longos séculos. Ainda o sínodo via sido chamado à dignidade de diácono pelo presbítero
trulano de 692 teve de tratar dela. Mas, com o correr dos Novato. Cipriano lançou-lhe o anátema, e Felicíssimo pas-
telllpo~, . dissolveu-se cm diversos partidos. Muitos de seus sou então para a oposição. Os cismáticos elegeram, em se-
parlldanos professaram também verdadeiras heresias. Ou- guida, um antibispo na pessoa de Fortunato. Mas Cipriano
tros associaram-se aos novacianos. manteve a sua sentença, fê-Ia confirmar num sínodo de 251
334, Efetivamente, renovou-se a contenda quando, du- e enviou-a ao papa.
rante a pers,eguição de Décio, numerosos cristãos renega- c. Assim, pois, encontramos o singular fenômeno de dois
I .• '
cismas em sentido contrário; em Cartago, os relaxados con-
!~ i ram a sua fe. O papa FabIano (235-50) sofreu o martírio.
tra o bispo Cipriano; em Roma, os rigoristas contra o papa
I DepoIs de uma sedisvacância de catorze meses, foi eleito
., I o papa ~ornélio (251-53), que prometeu aos "Iapsi" a rc- Cornélia. E, todavia, uniram-se os dois extremismos con-
conclhaçao, se fizessem penitência. Mas a ele se opôs o am- tra as autoridades legítimas da Igreja. Mas o cisma de Fe-
blcJOso presbítero Novaciano, eleito antipapa por uma pe- licissimo, em breve, se dissolveu (Cipr., Ep. 44. 45. 47 etc.;
quena mmona . Eus., HE 6, 43),
.,'
'l'
. I
337. Como o papa Cornélia e Cipriano, assim também
Novaciano desaconselhava primeiro a reconciliação co-
mo inconveniente. Em breve, porém, chegou a negar à Igre- Dionísio de Alexandria opôs-se ao rigorismo, franqueando
Ja_ o direito de readmitir os apóstatas e de dar-lhes o per-
aos arrependidos e penitentes o retorno à Igreja. Desta for-
ma, a Igreja, também desta vez, manteve o seu caráter uni-
dao, mesmo na hora da morte. Tal severidade aplicava-se
versalista de mãe de todos os fiéis. Pelo procedimento do
logo a todos os que houvessem cometido um pecado capital. papa foi decidida, definitivamente, a questão: a Igreja é
335, Os novacianos pretendiam formar uma Igreja de santa, ainda que o não sejam todos os seus membros.
puros e santos, pelo que se chamavam de "cátaros". Como Escritos montanistas de Tertuliano: De monogamia, De fuga in
~, 19~eja católica não se conformava com o seu rigorismo, persecutione, De jejunio, De pudicitia. - Aizberger, Geschichte der
Ja nao a consideravam como esposa de Cristo, e adminis- christl. Eschatalagie innerhalb der vornicenischen Zeit, Freiburg
1896. - Gry, Le Millénarisme, Paris 1904. - LabriolIe, Les saurces
tra~am aos que a eles passavam do catolicismo um segundo de l'histoire du Montanisme, Paris 1913. - Faggiotto, L'eresia dei
ballsmo. O papa Cornélio, porém, excomungou-os num sÍ- Frigi, H:oma 1924. - A. d'Ales, Novatien, Paris 1925. - Ehrhard,
Die Kirche der Maertyrer 227-65. - Acaniz, Ecclesia patristica et
nodo de Roma (251), A seita difundiu-se principalmente no Millenarismus, Uranada 1933.
onente, onde muitos montanistas se lhes associaram e onde
se encontram algumas comunidades, ainda no século VII. § 38. Literatura anti-herética. - Antignósticos isolados
33~ . .a. O cisma abriu, pela primeira vez, o problema 338. a~ As diversas seitas gnósticas bem sabiam que só
da eflcacla dos sacramentos. Devido à grande autoridade aquelas verdades podiam passar por cristãs, que tivessem
de que gozava Tertuliano, formou-se a praxe de rebatizar por fundamento a doutrina apostólica, Não podendo, pois,
,os hereges convertidos; e Cipriano de Cartago defendeu esta negar a dissonância que existia entre os seus sistemas e os
156 (época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão
§ 38. Li teratma anti~hcr;':tica 157
livros da Sagrada Escritura, apelaram para uma pretensa
tradição apostólica secreta, rejeitaram alguns livros da Sa- bitero da Igreja de Lião e: pelo ano d e 177 , foi eleito SlJ-
grada Escritura, mutilaram outros e criaram lima rica lite- do bispo Potino marhe.
ratura apócri!a, como evangelhos, atos dos apóstolos e ou-
tros escritos mais.
cessor
S Ireneu Or
f . defensor estr~nuo da doutrina católica
t f ' m con
b. Como os sectários, além disso, pelo desprezo gue contra' a h~re~ia. t.;~~~:fO;: C~~~~'~i~;~;~e;v;:;Usol/~aereses~
votavam à história e pelas tendências docéticas, dissolviam serva<l:sO';~amU~Sté( nós' numa antiga tradução latina, e a
a vida histórica de Jesus Cristo, a tarefa dos escritores Ó~~~n:;;'atio praedicalionis apostolicae, conservada numa
eclesiásticos antignósticos estava perfeitamente delineada: tradução armênica. 'I
fixar o cânon da Sagrada Escritura, formular uma regra de
341 a Adverslls haereses (PO 7), escri!,: no, penu -
fé, que contivesse a essência da doutrina cristã, a unidade
r d',·~ do século I I é a primeira refutaçao vlgo:o,:a
de DeliS, a divindade e humanidade de Jesus Cristo, e esta- Imo ecen., o me~mo tempo, uma clara exposrçao
belecer o fato e a necessidade de que todas as Igreias de- do gnoshclsmo, e, a - _ . af'rma decididamen-
vem esta r em união COI11 a doutrina e a Igreja dos após- da doutrin.a çri~taã'a~t~i~idI~~~e~ ~:o trSaOdiçdo eclesiástica, en-


tolos, p or meio duma sucessão ininterrompida de seus his- te o pnnclplO d d 'mado ro
sinando a il1stit i ;o ~~vi~a S~b~r~sC::Oast~;icO~ ~~s cxpliC;

pos, particularmente dos bispos de Roma. Foram estes Os
): I:iif i' i princípios que, finalmente, triunfaram da gnosis herética . E ~::é~ ~e~~~:a dOa qu~ os apologeta s a doutrina cristoló-
esta vitória da Igreja foi lima prova da sua origem divina
i ,;

I
I r'a
,: J
, não menos gloriosa, do que a sua vitória sobre o judaís-
mo e o paganismo.
crica e trinitária.
b No rimeiro livro explana () sistema dos va en, m1 _
b. d P lon "a série de outros gnósticos antenores,
. 'l.!! '
'." ~
'I '
i ;I
,
339. C0l110 os escritos gnósticos, assim também os es-
critos antignósticos desapareceram em grande parte, por-
nOs e e uma b . . ,
A expo<icão destes sistemas, dIZ ele, Ja por S d r
i mesma é um
t · f ~sóbre o erro Todavia, prom ete, no fIm o Ivro, r -
e
nua o " . . , t E' o que ele faz no
futar a he,resia t:l~b,éa~ã~o:ttl~~~~~ê:' seguintes, pela t:adi-
que as gerações posteriores não tinham mais nenhum in-

s:guOdoel~V~~'gfada Testal~eotos.
teresse por aquelas questões, que outrora haviam agitado
tão acremente a Igreja, Desapareceu assim um libelo de Jus- Escritu:a de ambos os
tino contra Marcião, tratados antignósticos de Melciades, ,ao e p A obra valeu a seu alltor grande. veneraçao. Tertu-
. c, h "omniurn doctrinarum cunOS1SSImus expJora-
Teófilo e Gaio, presbitero de Roma, e os cinco livros das
ha~? o c ama varão de eminente santidade e impor-
memorabilias de Hegesipo, das quais só algumas notícias
são conservadas ( PG 5, 1307-28; Eus ., HE 4, 22). !~r c'a\A~~'se~~~' ;~~igna-o como testemunha fidedigl1lS~tndlO
an I . . d d fé católica. Na verdade) am a
Mas chegaram até nós obra s de S. Ireneu, de Hipó- e intrép,do propugna ~r a Ol1to de partida para
lito e Tertuliano; e foram eles precisamente que mais se h' s cinco livros sao um seguro P
ole't °d da mais antiga história das heresias. Os protes-
fazer de Ireneu o primeiro testemunha ~o
distinguiram na lura contra a heresia no ocidente. No orien-
o es u o
te, as escolas de Alexandria e Antioquia tornaram-se cen- tant~s queremca t{}'I'co
Crlstlamsmo 1 . Mas o próprio Ireneu não quer senao
tros da ciência e doutrina católicas. Mas o mérito principal
defender a fé dos apóstolos. . ,
da vitória cabe sempre a Roma, herdeira e guarda fiel da
tradição apostólica, centro vital da unidade eclesiástica. 342 Q S Hipólito presbitero de Roma, talvez d'r"
, . • f' 11~ escritor muito ativo e advers no
.140. O mais insigne adversário da gnosis heré tica do
século II foi S, Ireneu (t c. 202) , bispo de lião. Nasce1l
pUélO de ~~~e~~6S~;COS e dos modalistas. Os seus escritos,
ac rrtmo mouco lidos no OCIdente .
redigidos todos em grego, edr. ra~de estima Ficaram enu-
b
na Asia Menor e foi discípulo de S. Policarpo de Esmima N 'ente porém gozavam e g .
(Eus., HE 5, 20): Mais tarde, o encontramos como pres- o on, ' t que seus partidários lhe erigiram e
mera dos no monumel1 o .té ' Roma
que, em 155 1, foi reencontrado no seu cernI TIO em .
158 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 39. A escola catequética de Alexandria 159

b. Relativamente poucos tratados chegaram até nós. Um zar a cultura grega com a religião revelada, de cristianizar
deles é a Refutatio omnium haeresillm (PG 16), chamada o helenismo. Grupos inteiros da sociedade culta pediam ins-
geralmente Philosophumena. A obra se compunha de dez trução religiosa que correspondesse às exigências de uma
livros; fa ltam, porém, hoje o segundo e o terceiro. O autor cultura e erudição esmeradas. E' assim que em Alexandria
visav~ provar que a heresia tem por origem a filosofia pagã, se originou a primeira escola superior de religião, primeira
doutrmas ocultas e narrações fantásticas de astrólogos . faculdade teológica, a escola catequ ética.
Outra obra de Hipólito, Sintagma contra Iodas as he- 345. As origens desta escola escondem -se nas trevas
resias, pode ser essencia lmente reconstruída por meio de do esquecim ento. O prim ei ro diretor conhecido loi Panteno
autores posteriores, que a empregaram como fonte. Da pena de Sicilia, estóico convertido (Eus., HE 5, 10). Ele ensi-
do douto presbítero sairam ainda um tratado dogmático so- nou, com geral admiração do seu auditór io, pelo ano de 180,
bre o anticristo, um libelo contra Nocto, outros contra Mar- até à morte, pela volta do século II. Os mestres, porém,
J
i~
cião e contra os montanistas, uma crõnica mundial Ou Liber que fizeram da escola um verdadeiro cen tro da ciência teo-
,~ generationis mllndi, e muitas outras obras exegéticas e ho- lóg ica pa ra todo o oriente cristão, foram Clemente de Ale-
t miléticas. Historiadores modernos atribuem-lhe também a xandria e,' sobretudo, o grande Orígenes.
":i II'
Tradilio apostolica, fonte muito rica para a liturgia roma- 346. Tito Flávio Clemente, filh o de uma familia pagã,
na. - De TertulIano v. § 40.
nasceu provàvelmente em Atenas, pelo ano de 150. Conver-
I II." "
I.!. II
Doellinger, Hippolytus und Kallistus, Regensburg 1853. _ Funk,
Abhandl. und Untersuch. II 161-97. - Bardenhewer, Geschichte der
alt k. Literatur. !' .2. ed.,. 399 .5S; 550 ss. -
tido ao cristianismo, empreendeu longas viagens pela Gré-
cia Magna, Siria, Palestina e pelo Egito, onde, finalmente,
' 1'"
'1 .
106 55. -
Rausclzen, Patrologie
Domm, Ippohto di Roma, Roma 1925. _ Hipp. Rom. encontrou a ciência que buscava, ju nto a Panteno. Depois

:~;,
ope ra, ed. de Lagarde, Leipzig 1858.
da morte do venerando mestre, Clemente assumiu a dire-
ção da escola (Eus., HE 6, 6). Mas, pouco depois, a per-
§ 39. A escola catequétlca de Alexandria e outros escritores seguição de Setim io Severo obrigou-o a fugir. Retirou-se
gregos para a Ásia Menor, e nunca mais voltou ao Egito. Faleceu
antes de 215.
343. Os escritores anti-heréticos não só g ranjearam
347. Clemente percebeu claramente que, se a Igreja
grandes merecimentos pela defesa da fé, mas também im-
quisesse cumprir a sua missão de Mestra da humanidade,
portância geral pelo desenvolvimento da doutrina cristã. No
deveria porfiar com o paganismo no campo das ciências e
en tanto, maior é, sob este ponto de vista, a importância da
da literatura . S. Paulo chamara a lei mosaica "pedagogo
escola catequética de Alexandria e, ma is tarde, das escolas
para nos conduzir a Cristo" (Gál 3, 24). Clemente atribuiu
exegéticas de Cesaréia e Antioquia. Foi nestas escolas que
à filosofia dos gregos um papel semelhante. Por isto, fez
se formou uma ciência teológica no sentido próprio da
palavra. da pena um instrumento de sua missão.
Profundo conhecedor da Sagrada Escritura, cOmo das
344. O Egito tinha a sua cultura elevada já no tempo literaturas clássica, herética e cristã, escreveu uma série de'
das dinastias locais. Tendo Alexandre Magno, depois da in-
obras, que Eusébio enumera (HE 6, 13). A principa l é uma
vasão dos persas, estabelecido ali a sua dominação, come- trilogia, que apresenta uma tentativa de criar uma verda-
çou a florescer o helenismo, cujo centro se tornou Alexan- deira ciência da fé, um sistema teológico. A primeira par-
dria Com o Museion de Tolomeu I (323-285). Nesta cida- te, Protrepticus ou Coho rtalio ad gentes, apresenta-se como
de de Filo, que já procurara harmonizar o judaísmo com a trânsito da apologética à teologia especulativa. Seu es'copo
filosofia pagã, neste centro que era, ao mesmo tempo, do é mover o leitor a não escutar as canções da mitologia pagã,
comércio, das nacionalidades e das línguas, mais do que em mas os cânticos de Cristo que, qual novo Arion, quer atrair '
qualquer outra parte, sentia-se a necessidade de harmoni- a si todos os homens. A segunda parte, Paedagoglls, é um
160 I época: Desde a fundação da Igrej a ao Edit o de Mil ão § 39. A escola catequética de Alexandria 161

tratado de mo ral, pelo qual Clemente procura levar um jo- a tradíção da Igreja é um fundamento da doutrina cristã,
vem convertido a uma vida virtuosa, O pedagogo é .Jesus empreendeu uma viagem a Roma, "para ver a mai« antig~
Cristo. Ensina o caminho da virtude, não da ciência. Assim das Igrejas" (Eus., HE 6, 14). Para se poder dedicar me-
preparado, o cristão é capaz de compreender a verdadeira lhor aos mais adiantados dos seus discípulos e ganhar mai ~
gnosis , o conhecimento científico das verdades religiosas. tempo para os seus estudos, escolheu a Héraclas como mes-
Dela trata a terceira parte, S/romata (tapetes), exposições tre dos principiantes, e, na sua ausência, corno seu substi~
,científicas da verdadeira filosofia, tuto na direção da escola. Héraclas foi , mais tarde, sucesso,:
Chegou até nós também uma belíssima homilia de Cle- de Demétrio na sede episcopa l de Alexandria.
mente, Quis dives salve/lIr?, na qual, comentando a parábo-
350. Devido às crueldades, cometidas por Cara cala eni
la do jovem rico (Mc 10, 17, 3 1), o autor demonstra os
Alexandria, Orígenes teve de interromper os seus trabalhos
perigos e a ulilidade das riquezas, e estabelece os deveres
e foi a Cesaréia na Palestina, onde os bispos Teoetisto de,
dos ricos para se sal varem, A homilia é uma ve rdadeira so-
Cesaréia e Alexandre de Jerusa lém o trataram com grande
lução do problema social.
respeito. Ao chamamento de Demétrio, porém, voltou a Ale-
A teologia de Clemente ainda ostenta não poucos de- xandria, onde desenvolve u, nos anos seguintes, uma ex-
feito s, Querendo harmonizar a doutrina cristã com a filo- traordin ária atividade literária, espalhando-se ,a sua faina
I~
I " sofia antiga , acentuava demasiadamente a última, negligen- em todo o mundo.
r !: ciando um ta nto a Sagrada Escritura e a Tradição da
Igreja . 351. Quando, em 230, a lgumas heresias pertu rbaram
I ' a Igreja de Acaia, Orígenes foi chamado a combatê-Ias. Pas-
'I::~ 348. Orígenes, discípul o e sucessor de Clemente, em
breve, ofuscou a fama de seu mestre. Nasceu de familia
sando e ntão pela Palest ina, foi ordenado sacerdote pelos
bispos de Cesaréia e Jerusalém, apesar do impedimento q'ue
cristã, provàvelmente em Alexandria (c. 186). Desde a sua tinha. Demétrio, porém, não deu o seu consentimento, de-
~I
infân cia, mostrou-se cará ter forte, amante da piedade e das gradou-o e desped iu-o do cargo de diretor da escola. Orige-,
ciências. Seu pai, S. Leônidas, mestre-escola, deu-lhe a pri- nes retirou-se então para Cesaréia, onde abriu uma nOva
meira educação, dirigindo as suas atenções especiais à for- escola. Pelo espaço de 20 anos dirigiu-a e lh e deu um bri~
mação religiosa de seu talentoso filh o. Desde cedo, ouviu lho que, em breve, superou o da escola alexandrina, Um'
também as preleções de Pan teno e de Clemente. S. Leô- dos seus discipulos, Gregório Taumaturgo, num discurso de'
nidas morreu mártir na perseguição de Setimio Severo despedida, enalteceu as qualidades do mestre corno homem,
(203). Pela morte do pai, os bens da família foram con- cristão e pedagogo. Orígenes fico u na escola de , Cesaréia"
fiscados, e Origencs teve de cuida r de sua mãe e de seus com algumas interrupções, até à sua morte. Na perseguição
irmãos mais novos, o que ele fez lecionando. de Décio, sofreu heróica mente a trozes sofrimentos , em con-,
349. a. Quando tinha apenas dezessete anos dc idade, sequência dos quais veio a falecer, pelo ano de ;l54 (Eus.,.
o bispo Demétrio nomcou-o diretor da escola catequética, HE 6, 39).
cargo este que exerceu até 230, despertando extraordiná- A escola, decaída depois da morte do mestre, foi res-
ria admiração, tanto por sua ciência, como por sua vida suscitada, mais tarde, e enriquecida por Pânfilo de urna va-
ascética (Eus., HE 6, 8). Por motivos a scéticos tomou no liosa biblioteca, em que S. Jerônimo encontrou o material
sentido literal as palavras de Mt 19, 12 e as aplicou a para os seus estudos. ,
si mesmO.
352. A atividade literária de Orígenes não conhece igual
b. Como, de mais a mais, também os pagãos viessem na antiguidade, antes do Niceno, e, depois deste concilio,
,ouvir as suas preleções, procurou aperfeiçoar os seus conhe- só é excedida pela de S. Agost inho. Orígenes ,é o teólogo.
cimentos na escola filosófica de Amónio Saca (Eus., HE mais douto da Igreja grega até aos nossos dias, ímportan~:
,6 , 19), fundador do neoplatonismo; e, convencido de que te em quase todos os ramos da ciência eclesiástica ., Em con-
Compêndio I - 11
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162 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milâo § 39. A escola catequética de Alexandria 163

sideração à sua energia incomparável chamavam-no de "ada- culpa, os anj os a um corpo etérico, os homens a um corpo
mântinos": Epifânio refere que, como diziam, Origenes es- animal, e os demónios a corpos invis iveis de indizível feal-
creveu seIS Iml lIvros. Mas ]erônimo menciona um catá- dade. Mas todos os espíritos serão purificados pela transe
logo, feito por Eusébio, que não continha dois mil. migração. A reabilitação de todos os seres racionais é o
353. O grande teólogo ocupou-se, de preferência, com fim do mundo visível.
trabalhos exegéticos, comentários, notas e hom ilias. De su- C. No entanto, há quem queira absolver a Orígenes de

ma importância foi a sua Hexapla que, em cinquenta li- toda a heresia. Pois a terminologia não estava ainda fixa-
vros, vIsava rlustrar a relação entre o texto dos Septua- da e a sua doutrina loi ocasionada pela oposição sistemá-
ginta e ° original do Antigo Testamento, confrontando, em tica ao gnosticismo. De outro lado, o piedoso teólogo ele
seis colunas, outros tantos textos e traduções. Da obra mo- próprio confessa: " IIIa sola credenda es! veritas, quae in
numental que mereceu ao autor o titulo de pai das ciên- nullo ab ecelesiastica et apostolica discordat traditione" (De
cias biblicas, conservaram-se numerosos fragmentos. princ. praef. 2). Honra, pois, ao grande douto, em que nada
De grande valor são igualmente os dois tratados ascé- se acha do orgulho e da ambição dos hereges!
ticos De oralione, uma pérola da literatura cristã, e a Cohor- 355. Na qualidade de diretor da escola de Alexandria
fatia ad martyrium, como também os tratados apologéticos sucedeu a Origenes seu discípulo Héraclas e, quando este
e dogmáticos, especialmente os oito livros Contra Celsum subiu à sede episcopal, outro discipulo, Dionísio, a quem
apologia mais completa de seu tempo, e a obra De prin~ Eusébio chama de "Grande" (HE 7, proem .). Ele sucedeu,
cipUs, na qual Origenes realiza o que já Clemente visara: em 248, a Héraclas igualmente na sede episcopal de Ale-
o primeiro sistema de uma dogmática cristã. xandria.
.. O autor trata em quatro livros: I) de Deus e do mun-
do dos espíritos; 2) da criação do mundo visível, dos ho-
Dionísio, figura venerável, nobre, eminente, foi coluna
inabal ável da Igreja nO meio das ondas dum tempo agitado.
mens e da salvação; 3) do li vre arbítrio e da sua rela- Filho de pais pagãos, rico, era, a ntes da sua conversão, pos-
ção com a graça; 4) da Sagrada Escritura e do seu trí- suidor de altos cargos honorificas. Sérios estudos leva ram-
plice sentido, histórico, moral e místico, ou seja somático 110 a abraçar a doutrina cristã. Desde a sua elevação à digni-
psíquico e pneumático. A obra, conservada s6 pela traduçã~ dade episcopal, a sua vida foi uma cadeia continua de afli-
defeItuosa de Rufino, infelizmente, não é isenta de erros. ções e sofrimentos. Na perseguição de Décio teve de fu-
354. a. O erro principal que se atribui a Orígcnes diz gir. Em seguida, trabalhou por combater heresias e cismas.
respeito à doutrina trinitária. Ensina um certo subordina- Na perseguição de Valeriano foi exilado. Em 262 voltou,
cianismo. Deus lhe é, por essência, simples, imutável e bom. mas não teve descanso até à morte (264/65).
Por ser bom, manifesta-se ad extra; por ser imutável, ma- 356. Dos seus numerosos escritos só poucos são con-
nifesta-se ab aeterno; por ser simples, a geração do Filho servados. Em quase todas as lutas teológicas de então en-
é eterna. Portanto, o Verbo é consubstancial e coeterno com contramo-lo como moderado, mas enérgico defensor da Igre-
o Pai., !odavia, não é "0 Deus", e sim, Houtro Deus", e ja. Combateu, porém, em particular o quiliasmo e o sabe-
o Esplnto Santo é inferior ao Filho (De princ. I, 3, 5; Iianismo.
C. Celso 5, 39). Chama o sabelianismo uma doutrina cheia de blasfê-
b. Outros erros dizem respeito à explicação da Sagra- mias contra Deus onipotente, Pai de Nosso Senhor Jesus
da Escritura, ad mitindo em mu itas passagens s6mente um Cristo, cheia de descrença em relação ao Logos humanado,
se ~tido ~oral ou mistico. Além disso, ensinava Orígenes ' a Primogénito de todas as criaturas, Unigênito de Deus Pa-
pre-exl stencla da alma. Todos os espíritos, criados antes do dre, cheia de insânia em relação ao Espirita Santo. Toda-
mundo visível, eram igualmente perfeitos. Mas, abusando via, durante esta luta sabeliana, Dionísio foi acusado em
do seu livre arbítrio, foram degradados à medida da sua Roma, junto ao papa Dionisio (259-68), de ter negado a
11'
164 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão § 40. Escritores lalinos dos séculos II e III 165

paternidade eterna do Pai , de ter chamado o .pilho uma Paulo de Samósata, trilhou caminhos errados. Por ele a
criatura do Pai, de ter negado a consubstancialidade do Fi- doutrina de Paulo passou a seu discípulo Ario. Dos seus
lho. O papa censurou o sabelianismo, como também a dou- escritos nenhum chegou até nós (Eus., HE 8, 13; 9, 6).
trina do bispo. Mas, Dionísio justificou-se a pleno conten- 360. Aos escritores gregos da Palestina pertence ain-
to do. papa. E, ~e,' mais tarde, os arianos apelaram para a da o teólogo leigo Júlio Africano (t d. 240) de Élia Ca-
autondade do bIspo alexandrino, Atanásio o podia chamar pitolina, oficial do exército romano e amigo do rei Abgar
"mestre da Igreja católica". IX de Edessa. E' ele o autor da primeira crônica mundial
357. Discípulo de Orígenes foi igualmente S. Gregório cristã, que vai até 221. Escreveu, além, disso, duas cartas
Taumaturgo. filho de familia nobre pagã, dedicou-se aos exegéticas, das quais uma, sobre a história de Susana, nos
estudos retóricos e jurídicos, e estava para terminar os seus foi conservada.
estudos em Berito, quando a convite de sua irmã foi visitar 361. Finalmente, deve se r menci onado ainda Metódio,
a: cidade de Cesaréia na Palestina. Aí veio a conhecer Orí- bispo de Olimpo na Licia ou de Filipos na Macedônia. Pre-
genes que o fa scinou Com suas preleções. Consagrou-se en- so, como Pânfilo, na perseguição de Maximino Daja, mas
tão à filosofia, à teologia e ao cristianismo. adversário de Origenes, mOrreu mártir em 31 1. De seus es-
Voltando para a sua cidade natal, Neocesaréia no Pon- critos chegou até nós o Simpósion das dez virgens, no qual
to, foi elevado à sede episcopal. As numerosas lendas de declara que a virgindade é o estado ma is perfeito da vi-
milagres, que já em vida do santo se espalharam, demons- da cristã.
tram que ele deve ter sido uma figura imponente, pastor Metódio escreveu também UI1l tratado Sobre a Ressur-
zeloso de seu rebanho. Gregório faleceu pelo ano de 270. reição, no qual defende contra Orígenes a identidade do
Entre outras obras chegaram até nós uma Confessio corpo ressuscitado e combate as opiniões de Orígenes so-
fidei, uma Epistola cano nica com preceitos disciplinares, um bre a pré-existência das almas, sobre o pecado pré-mundial
tratado sobre a passibilidade e impassibilidade de Deus, e e sobre a finalidade do mundo. Muitos outros tratados saí-
um panegírico de seu mestre Origenes. ram da pena de Metódio, parte desaparecidos, parte conser-
. 358. Um terceiro partidário e admirador de Orígenes vados em fragmentos. Viu a sua missão na atividade lite-
fala douto e distinto presbitero Pânlilo de Cesaréia na Pa- rária. foi realmente fino estili ~ta e excelente teólogo.
lestina (t 310). M~rec eu os mai s altos louvores pelo au- Obras de Clemente Alex. PO 8-9 ; ed. Staehlin, 3 vol., Leipzig
. menta da biblioteca de Orígenes c pelos esforços que fez 1905-18. - Obras de Orígenes PO 11-17. - Dion. Alex. PO 10 ;
ed. Feitoe, Cambridge 1904. - Greg. Taum. PO 10. - Brigg,
p or estabelecer um bom texto da bíblia. Preso na perse- The Christian Platonists of Alexilndria, Oxford, 2. ed. 1913. -
guição de Maximino Daja, eSCreveu lima apologia de Orí- Bardy, Ch':ment d'Alexandrie, Paris 1926. - Id ., Origene, Paris
genes em seis livros, dos quais, porém, um só ficou Con- 1931. - Cadiou, La jeunesse d'Origene. Histoire de I'école d'Alexan-
drie au début du 3e siecle, Paris 1936. - Bardenhewer II, 40 5S;
5ervado, e este num a tradu ção bastante defe ituosa de 96 ss; 203 ss; 315; 263. - Rauschen, Palrologie 116 ss. - lnsllel"s,
Rufino. Curso de Patrologia, Braga 1944.
359. a. Pelo fim deste período, foi fundada também a
escola de Antioquia, que, em seguida, teve grande impor- § 40. Escritores latinos dos séculos II e III
tância para o desenvolvimento das ciências eclesiásticas, em-
bora não tanta como a escola alexandrina. Em oposição a 362. a. Toda a literatura cristã dos primeiros dois sé-
esta, cultivou, de preferência, o método histórico-gramático, culos foi redigida em grego. Só no último quartel do século
11, teve início a literatura latina, principalmente na África
na explicação da Sagrada Escritura.
ocidental. Compete o lugar de honra à Igreja de Cartago,
b. O fundador desta escola e seu primeiro diretor foi
onde os corifeus da ciência africana, Tertuliano e Cipriano,
o presbítero e mártir Luciano de Samósata (t 312), que
criaram uma verdadeira língua teológica , enquanto que em
na sua doutrina cristológica, infelizmente influenciado por
§ 40. Escritores latinos dos séculos II e III 167
166 I época: Desde a fundaç ão da Igrej a ao Edito de Milão
do império. Pouco a ntes de 197, converteu-se ao cristia-
Roma, ainda no principio do século m, tanto na liturgia
nismo, tendo até então bebido até às fezes o cálice do pe-
conlo na teologia, se empregava o grego.
cado. O motivo da sua conversão talvez se possa deduzir
b. Desde os inicias da literatura latina, nota-se urna
da sua própria palavra: "Sel,:ente é o sangue dos cristãos"
diferença essencial entre os latinos e os gregos, resultado
. das neceSSIdades do tempo e do caráter nacional. Os orien- (Apol. 50) .
Acostumado a se r in te iramen te o que era, abraçou o
tais tratavam, de preferência, questões especulativas cris-
cristianismo com o arelo r dum Paulo, e começou logo a de-
tológicas e trinitárias. Os ocidentais, pelo contrário, ~cupa­
vam-se de problemas práticos. senvolver uma atividade admirável em defesa da nova fé
contra pa gãos, judeus e he reges . Não é poss íve l ver ificar
353. O primeiro dos escritores cristãos do ocidente a
se era presbitero, como afirma Jerônimo (De vir. iiI. 53) ,
escrever em lati m, foi provàvelmen te Minúcio Félix, advo-
ou não. Mas, pelo a no de 205, o seu rigori smo exage rado
gado romano, mas oriundo da África. Só na idade madura
lcvou -Q à seita dos montani sfas. e. como chefe de um par-
conseguiu "sair de trevas profundas para a luz da sa hedo~
tido da seita , morreu depoi s de 220.
fia e da ~er?ad.c" (Oe!. !, 4). O seu único tratado que
chegou ate nos e uma apologia, chamada Dctavius. A obra 365. Até ao tempo de S. Agostinho, Tertuliano foi O
é redigida. el~ for~l~ de diálogo entre os dois amigos do mais original de todos os escritores cristãos do ocidente.
autor, o cnstao OtavIO c o pagão Cecil ia. Pela arte de dis- Ao ardor púnico aliava o sentimento prático dos romanos, e
pos ição e beleza de linguagem, excede todas as apologias domina va, ao mesmo tempo, como nenhum contempo râneo,
dos três primeiros séculos . a língua latina. Mas, de vido ao estilo apa ixonado e abrupto,
Os três amigos fazem um passeio a ó stia. No caminho obscurece-se, muitas vezes, o sentido, e por isso, como tam -
en~ontram uma imagem de Serápis, O que dá ocasião ao bém por causa da sua apostasia , os seus numerosos escritos
dIal ogo (cc. 1-4). Cecílio, representa nte do cepticismo re- pouco se liam Oll não se mencionavam. Ass im aconteceu que
< muitos desaparecera m de tod o, outros foram conse rvados
t IrgIOSO, pretende demonstrar que não é passivei conhecer
os deuses e o além-mundo. Os próprios cori fe us da ciência frag mentàriamente. Trinta chegaram até nós, mas s6 o Apo-
antiga devem confessa r com Sócrates: "Q uod supra nos, nihil toge/icum ficou conservado em diversos man uscritos.
ad nos" (13 , 1) . Por isso, é melhor COnserVélr o culto dos 356. a. Tertuliano foi, antes de tudo, apologeta . Escre-
antigos d eu ~e sé q u ~ eng randeceram Roma, enq ua nto que o veu Adversl/s ll/da eos, demon strando, na prim eira parte, que
Deus dos cnstaos e um fantasma, no qual só acreditam ho- o Antigo T estamento teve de ceder ao Novo Testamento, e
mens incultos e crimin osos (cc. 3-1 3). Otávio responde-lhe diri gindo-se, na segunda parte, contra o docetismo dos gnós-
q~e o homem nasceu para conhecer a verdade. Os deuses ticos. Num tratado Ad S capll /am lembra ao procônsul da
nao passam de homens divinizados. Roma cresceu, não pelo África a sorte dos perseguidores. No De lesUmonio al/imae
culto dos deuses, mas pelo roubo e pela violência. As acusa- desenvolve a sentença: "Anima naturaliter christiana".
ções que se faze~ aos cristãos não passam de calúnias (cc. b. No ano de 197, saíra m duas apologias da pena de
14-38). Ceclho, fmalm ente, declara-se vencido. Os três ami-' Tertuliano, Ad na/iones e o ApotogeliCllm. As duas obras
gos voltam do seu passeio, alegres e contentes, "Cecílio, têm muitos ponto s de contacto . Ma s a form a e o valor são
P?r ter achado a fé, Otávio, por ter vencido, Mi núcia, pela muito diferentes. No Apologeticum , o tom é mais modera-
te de Uni e pela vitória do outro" (40, 4). do ; a lin guagem, mais nobre ; o conteúdo dos argumentos,
, 364: O mais, importante dos escritores latinos des te pe- mais lógico . Enquanto qu e Ad na/iones visa quase exclusi-
nodo fO I, sem duvl(i ~} Tertuliano. Nasceu em Cartago. pelo vam ente a refuta ção das in justiça s pagã s, o Ap%geticum
ano de. 150. Seu paI era c~nturião no serviço do procônsul se ocupa ma is em expor a fé e a vi da cristãs. Esta diferen-
d~ ~fnca. Segundo EusébIO (HE 2, 2), estudou jurispru- ça baseia-se na diferença cios destinatários. Ad nationes
<lencla e granj eou, em breve, grande renome, até na capital di rige-se ao grande público, o Ap%getiwm, aos magistra-
lú8 I época: Desde a fundação da Igrej a ao Edito de Milão § 40. Escritores latinos dos s éc ulos II e III 169
dos das provincias. O autor defende principalmente os cris- siásticas nas controvérsias internas das Igrejas de Cartago·
tãos contra as acusações politicas de ateísmo e lesa-majes- e de Roma. S. Agostinho (De bap!. 3, 3, 5) chama-o "bis-
tade, criticando a justiça pagã, que condenava só o nome po católico" e "mártir católico", e isto apesar da sua opo-
cristão, e terminando por afirmar: "Semente é o sangue dos sição à Sé apostólica na controvérsia sobre a eficácia do
cristãos".
batismo dos hereges (elr. § 25). Vítima da perseguição va-
367. Além das ob ras apologéticas, escreveu Tertuliano leriana, selou a sua obra com um glorioso martírio (t 258).
obras dogmáticas e polêmicas contra os hereges, especial- 370. As obras literá rias de Cipriano, redigidas em es-
mente contra os gnósticos. Entre elas tem o primeiro lugar tilo florido e agradável, ressentem-se todas do espírito evan-
De praescriptione haereticorum, talvez o mais importante de gélico de prudência e mansidão. Tratam quase exclusiva- .
todos os tratados do douto escritor. São três as objeções mente de assuntos práticos e religiosos. A vida prática, não
que o autor faz aos heréticos: I) Só as Igreja s dos após- a teoria, a fé, não a especulação guiavam o grande pastor
tolos podem se r testemun has da verdade, pois só os após- de a lmas. A clareza e a simplicidade dão a todos os seus
tolos receberam de Cristo a verdade; os hereges não po- tratados um encanto pouco comum e lhe valeram o aplau-
dem invocar nenhuma des tas Ig rejas. 2) A doutrina cató- so de contemporâneos e posteriores. A idéia central da s ua
lica é a do utrina ensin ada por Cristo; qualquer outra dou- teologia é a unidade ecl esiástica: "Fora da Igrej a não há
trina l' uma inovação, e não pode ser a verdade. 3) Os salvação" (Ep. 73, 21).
heréticos nem podem invocar a bíblia, pois ela foi confia-
da só à Igrej a católica. 371. As duas obras principais são De ca/hoUcae Ecc/e-
siae unitale e De lapsis, amba s escritas em 251 . A primeira
Outros tratados anti-heréticos de Tertuliano são Adver-
, j e mais célebre dirige-se contra os cismas de Felicíssimo e
sus Marcionem, Adversus Valen/inianos, De anima, De
de Novaciano. Não pode haver senão uma só Igreja. Cristo
baptismo, Scorpiacae, e Adversus Praxean. Este último é a
1 04 '" fundou-a num só fundam ento, S. Pedro. "Não pode ter a
mais clara e mais importante explicação da doutrina trini-
I Deus por Pai, quem nã o tem a Igrej a por Mãe" (c. 6).
tária que se eSCreveu antes do concílio de Nicéia.
De lapsis é uma carta pastoral. Cipriano lamenta a aposta-
368. Uma terceira categoria de escri tos tratam de as- sia de tantos cristãos durante a persegui ção deciana. Mui-
suntos prático-ascéticos. A eles pertencem De poenilentia, loS, longe de se mostrarem arrependidos, pretendiam ser re-
De ora/ione, Ad mar/yres, De spectaculis, libelo não menos admitidos no seio da Igreja sem as obras da penitência. O
atual em nossos dias do que nos dias de Tertuliano, De cultu santo esforça-se por convencer os culpados da gravidade
feminarum, De "adiei/ia e muitos outros. de seu pecado e da necessidade de fazer penitência. Cada
369. Po ucos decênios depois de Tertuliano, ilustrou a página respira o grande amor, o zelo ardente, a paternal
Igreja de Cartago o segundo mestre ela escola african a, S. compaixão do bispo.
Cecílio Cipriano. Filho dum a família pagã, ri ca e nobre, con- 372. a. Outros libelos de Cipriano nos falam dos mais
seguiu renome como reitor na escola de Sua cidade natal. variados assuntos da vida cristã. Ad Dana/um é um mo-
Convertido pelo presbitero Cecilio, no ano de 246, foi, pou- nólogo, em qu e o autor revela a felicidade que encontroLl
co depois, ordenado sacerdote e sagrado bispo de Cartago na fé cristã. De Ilabilu virginuln é uma a locução, em que
(249). Aperfeiçoou os seus conhecimentos de teol ogia cristã o bispo, depoi s de algumas palavras a toda a comunidade,
à mão dos escritos de Tertuliano, mas sem aceitar os exa- homens e mulheres, grandes e pequenos, se dirige parti-
geros do "mestre" (Hier., De vir. iiI. 53). cularmente ao estado da virgindade. Louva as virgens, estas
Caráter nobre e distinto e, ao mesmo tempo, ascético "flores do jardim da Igreja", mas repreende as aberrações.
e piedoso, mostrou-se verdadeiro pastor do seu rebanho du- As virgens devem brilhar por simplicidade no vestir e no
rante as perseguições de Décio e Valeriano. Foi igualmente pensar; devem vive r no mundo como 'se estivessem no céu .
defensor estrênuo da unidade, ortodoxia e disciplina ecle- De dominica oralione é uma explicação alegorizante do Pa-
170 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão
§ 40. Escritores latinos dos séculos II e III 171
dre-Nosso. De morfalitafe é ainda uma pastoral. O bispo
verteu-se ao cristianismo e, para provar a sua sinceridade,
ensina aos seus fiéis que a morte é apenas um trânsito para
escreveu sete livros AdversLls nationes. A obra não é de
uma vida melhor.
grande valor, nem inteiramente ortodoxa.
b. De grande importância são, finalmente, as numero-
sas cartas de Cipriano, fonte principal para a história de 377. Maior fama conseguiu Lactâncio (t c. 330), se-
seu tempo. As coleções modernas compreendem 81 cartas gundo jerônimo discípulo de Arnóbio (De vir. iiI. 80). Nas-
65 escritas por Cipriano, 13 dirigidas a ele, e 3 nem po; cido de família pagã, provàvelmente na África proconsular,
ele escritas, nem a ele dirigidas. converteu-se ao cristianismo antes da perseguição dioclecia-
c. Muitos outros escritos chegaram até nós sob o no- na. Diocleciano chamou-o como Jctor para Nicomédia, no-
me de Cipriano; muitos lhe foram atribuídos errôneamen- va capital do império. Com a perseguição teve de deixar
te; muitos outros que saíram da sua pena desapareceram. a cadeira de professor. Mais tarde, o encontramos, já ve-
Fora das atas do seu martírio, possuímos ainda a Vida de nerável ancião, em Trcves como educador do príncipe Cris-
C.iprian:J, escrita por um diácono Pôncio. E' a mais antiga po, filho de Constantino.
blOgrafla, que nos apresenta o ideal de Um bispo. Distinguiu-se por uma educação esmerada e pela ele-
gância de estilo. A sua eloquência lhe valeu o apelido de
373. Con tempnrâneo de Cipriano foi o ambicioso filó-
"Cícero cristão". Os humanistas dedicaram-lhe um interes-
sofo estóico Novaciano de Roma (eypr., Epp. 44-45; Eus.,
I ~I I se tão vivo, como a nenhum outro Padre da antiguidade.
HE 6, 43). Gravemente enfermo, recebeu o batismo e foi,
.. não obstante, mais tarde, ordenado sacerdote, e isto sem
ter recebido antes as ordens menores. Durante a persegui-
378. a. Entre as suas obras a mais importante é lnsfi-
tutiones divina e, obía volumosa de sete livros. E' uma apo-
ção de Décio, fugiu por temor. M2.s, passado o perigo, vol- logia, na qual o autor combate os autores da perseguição
, 'i! tou a Roma, levantou-se contra o papa Cornélia e fez-se e, em geral, todos os inimigos do cristianismo. E não quer
· .. !
sagrar bispo de Roma. Chamava-se a si mesmo e a seus somente combater o erro, quer também explicar a verdade.
I ,I
adeptos de "evangélicos". Lactâncio é o primeiro escritor latino a tentar um sistema
Desenvolveu uma vasta atividade literária, como ates- da doutrina cristã.
~am os muitos escritos, mencionados por ]erônimo (De vir. b. Outra obra de Lactâncio é a célebre De l1lorfibus
dI. 70). Mas poucos restos se conservaram. Certa impor- persecLlforum, fonte importante para a história das perse-
tância tem uma monografia dogmática De frinitale, escrita guições. Ele quer demonstrar como o Deus dos cristãos re-
antes do cisma, contra os patripassianos. vela o seu poder, aniquilando os inimigos do seu nome. O
374. Os patrólogos enumeram entre os escritores lati- livro "respira chamas e fogo" (Bardenhewer). Pinta com
"OS deste período também o poeta cristão Comodiano. Nada cores muito vivas as cenas mais horríveis; mas relata com
sabemos sohre a sua vida. Bardenhe\ver opina que viveu fidelidade; não falsifica.
110 século III. Outros querem fixar a época da sua vida no c. Nestas e em outras obras de Lactâncio ouvimos já
século V. Muito difícil é dar resposta definitiva. um eco do júbilo dos cristãos, depois de longos séculos de
375. Vitorino de Petau (t 304) foi o primeiro 2xege- perseguições. Este júbilo aparece especialmente numa poe-
ta entre os Padres latinos. Jerônimo dedica-lhe um interes- sia do mesmo escritor, De ave Phoenice, cuja felicidade é
:..,e particular. Bispo de Pc tau na Estíria, foi martirizado n2. a morte, pela qual consegue a vida eterna.
perseguição de Diocleciano. De suas obras possuímos so- Min. Fel., Oct. cd. R3tlSchen, Flor. patr. 8, Bonnae 1913; ed.
mente poucos fragmen tos (dr. ]cr., D e vir. ill. 74 ) . Martin 1930. - üp. Tert., PL 1-2; CSEL 2 vaI. 1890-1906; Apal.,
cd. l\lartin, Flor. palr. G, 19:33; De pracscr. haer. ed. Martill, Flor.
376. Terminemos esta época com os nomes de dois patr. 4, 1930; Hacntcmafll1, Quaracchi 1924; De bapt., cd. Rauschen
apologetas, ambos leigos da Africa, Arnóbio Sênior e ~ior. patr. 2, 1916; De poen. ct De pudic., ed. Rauschcn, Flor. patr:
Lactâncio. Arnóbio Sênior, retor de Sic.:! na Numídia, COI1- 10, 1915. - Op. Cypr., PL 4; CSEL 3; De lapsis, ed. Martin, Flor.
patr. 21, 1930. - Op. Nova. PI 3. - Op. Arnob., PL 5; ed. Mar-
172 I época: Desde a fundação da Igreja ao Edito de Milão

chesi, Torino 1934. - Bardenhewer, II, 377 58. - LabrioUe, Histoi-


re de Ia littérature latine chrétienne, 2. ed., PariS 1924. - Buonai-
uti, II cristianesimo nell'Africa Romana, Bari 1928. - Amatarei
Storia úella letteratura latina cristiana, Bari 1929. - Bardy Lit~
tératur~ Iatine. chrétienne, Paris 1929. - A. d' AJes, Théolog'ie de
Tertulhen, Pans 1905. - Id., La Théologie de S. Cyprien, Paris
1922. - Bertou, Tertullien le schismatique, Paris 1928. - Insuelas,
Curso de Patrologia. - Muita literatura indicada por Bardenhewer
e Bihlmeyer.

SEGUNDA ÉPOCA

DESENVOLVIMENTO DA IGREJA
NO IMPÉRIO CRISTÃO
TEMPO DAS CONTROVÉRSIAS DOGMÁTICAS
(313-692)

VISTA GERAL
379. Trezentos anos de violentas persegUlçoes não
conseguiram destruir a obra de Cristo. A Igreja cresceu, de
dia para dia, apesar de todas as dificuldades. Gloriosa foi
a sua vitória sobre o paganismo, e não menos gloriosa, a
sua vitória sobre os inimigos internos, heréticos e cismá-
ticos. A última tentativa de Diocleciano e de seus auxilia-
res demonstraram claramente que o futuro pertenceria ao
cristianismo.
380. Depois da vitória de Constantino Magno, as con-
dições da Igreja perante o Estado mudaram completamen-
te. Ao lado do paganismo, o cristianismo é oficialmente re-
conhecido e, de fato, preferido. Teodósio Magno o declara
até religião do Estado. Abriram-se-Ihe, por conseguinte, pos-
sibilidades e tarefas inteiramente novas. Começa a difundir-
se tranquilamente, levando a doutrina do Evangelho até às
últimas extremidades do império e para além das fronteiras.
Desde os povos germânicos e celtas até à Ásia central ecoa
a palavra de Cristo. Cheio de santa alegria canta, por isso,
pelo ano de 410, o bispo Nicetas de Remesiana, autor de
Te Deum: "Te per orbem terra rum sancta contitetur Eccle-
sia ... ln Te, Domine, speravij non confundar in aeternum".
381. Infelizmente, o Estado não se contentou com fa-
zer aliança com a Igreja, mas quis dominá-la. "No espirito
de Diocleciano e dos antigos imperadores, mas com outra
religião, Constantino pôs as coisas sacras ao serviço do Es-
174 II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão § 41. A Igreja no império romano 175

tado". Considerava a Igreja como instituição imperial. Jul- sias teológicas, 3) das ciências e da literatura da Igreja,
gava que todos os poderes se reúnem num só representante 4) do clero e monacato, do culto e da disciplina.
de Deus. Por isto, não hesitou de imiscuir-se nos negócios 385. a. Todo este movimento progressivo vem acompa-
internos da comunidade cristã. Veio a ser fundador do ce- nhado por outro regressivo: a decadência do paganismo e
saropapismo. O primeiro grande problema desta época é, o desaparecimento da cultura antiga. O império mais pode-
por conseguinte, a relação entre o Estado e a Igreja. roso da antiguidade dissolve-se cada vez mais. Separam-
382. Da vitória de Constantino resultou outro proble- se completamente oriente e ocidente. O império ocidental
ma, problema da fé. Com a conversão das massas, um es- não consegue resistir à onda devastadora da migração dos
pirita mundano entrou na Igreja, produzindo perniciosos fru- povos, que ameaça destruir também a Igreja.
tos. Terminadas as lutas externas, a Igreja podia concen- b. Mas a Igreja permanece de pé no meio das ruínas
trar todas as suas energias no desenvolvimento da sua vida do império para consolar os vencidos e para educar os ven-
interna, particularmente da sua doutrina. Mas, devido a con- cedores. Inabalável é o rochedo de S. Pedro, o papado, que,
cessões que imprudentemente se faziam a este espírito mun- particularmente nas duas "colunas da tradição eclesiástica",
dano, logo este desenvolvimento foi perturbado por acér- Leão I e Gregório I, conserva, ao mesmo tempo, a unidade
rimas controvérsias teológicas, que abalavam ameaçadora- da Igreja e a cultura ocidental.
mente os fundamentos da doutrina católica. Tratava-se dos c. O império bizantino e a Igreja oriental são abala-
problemas trinitárias e cristológicos, da eficácia dos sacra- dos assustadoramente pelo islamismo, que lhes arranca pre-
mentos e da graça divina. cisamente aquelas províncias, que, por séculos inteiros, fo-
Estas lutas tornaram-se tanto mais veementes e pro- ram centros principais da vida cristã.
longadas, quanto mais as heresias encontravam apoio no 386. Mas toda esta evolução não tem termo fixo. Entre
poder do Estado. O espírito mundano e o relaxamento da a antiguidade e a idade-média há um período de trânsito,
vida cristã, em união com a heresia, poderiam ter causado durante o qual o ambiente histórico se transloca e trans-
a morte do cristianismo precisamente na hora da sua li- forma. Dissolve-se, por um longo processo, o imperIo ro-
bertação, se não fosse divino. mano e a sua cultura, e formam-se, pouco a pouco, os ele-
383. No entanto, as controvérsias não serviram senão mentos da idade-média.
para tornar mais brilhante a vitória da verdade. Os gran-
des concilias ecumênicos, celebrados neste período, fixaram
o resultado das controvérsias e lançaram os fundamentos CAPíTULO 1
inabaláveis e invariáveis da teologia católica. E' verdade, os
erros e as heresias fizeram com que muitas partes do orien- A IGREJA E O ESTADO
te se separassem novamente da Igreja universal. Mas todos
sentiam o que dissera S. Cipriano: "Fora da Igreja não há § 41. A Igreja no império romano
salvação" (Ep. 73, 21). A Igreja celebra os seus grandes 387. Constantino Magno, primeiro imperador cristão
triunfos. O segundo período da sua história é o tempo dos (Eus., HE 10; Vita Constantini), filho de Constâncio Cloro
grandes concílios e dos grandes doutores da Igreja. e de S. Helena, atribuiu a sua vitória sobre Maxêncio ao
384. Se ainda considerarmos que, além disso, se de- auxílio do Deus dos cristãos. A vitória fez com que ele
termina mais claramente a constituição eclesiástica, que o mesmo se convertesse ao cristianismo. Desde 312, foi con-
monacato se torna verdadeiro jardim das mais belas flores siderado catecúmeno no sentido largo da palavra.
da vída espiritual, e que o culto divino dá expressão ex- Entretanto, na sua conversão influíram também consi-
terna à piedade cristã, podemos tratar, nesta segunda par- derações políticas. Durante a sua longa estada na Ásia Me-
te, 1) das relações entre Igreja e Estado, 2) das controvér- nor, veio a conhecer perfeitamente a vitalidade invencível
§ 41. A Igreja no império romano 177
176 II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão
S. BrilS, bispo da mesma cida de, sofreu debaixo do mesmo
,do cristianismo e concluiu que só ele ser ia capaz de resis-
govc ma dor (AASS Febr. I 336 ss; Anal. BolI . I 614).
tir aos elementos dissolventes, que já atacavam a medula
As discórd ias entre os do is imperadore s, motiVadas pela
do império. Compreendeu cla ramente que o paganismo re-
questão religiosa e agravadas por ciúmes p e~soa is, levaram,
trógrado ia irremediàvelmente ao encon tro da morte; c, do
finalmente, a uma guerra aberta, em que Llctnlo perdeu tro-
mesmo modo, o Estado, que nele' se baseasse. Constantino
no (323) e vida (324).
passou, pois, para o lado de quem possuía o futuro.
39 1. Desde então, Constantino deu à sua atitude uma
388. O Edito de Milão foi o primeiro passo. Dissolveu
exp ressão ainda mais defini da. Os altos ca rgos foram con-
para sempre a união essencial que existira entre o Estado
cedidos, de preferência, aos cristãos. Igrejas magníficas se
,e a religião politeista. E' o prim eiro documento imperial a
levantaram em Roma, Jerusalém e outras cidades, e foram
estabelecer o principio de que na vida humana existem duas
doladas de rendas riquissimas. Os templos dos ídolos foram
esferas independenles, a relig ião ~ o Estado, princípio en-
abando nados, e destruidos aqueles que hav iam se rvido para
sinado por Jesus Cristo, quando disse: "Dai a César o que cultos imorais. Outros foram trans formados em igrejas cris,-
é de Césa r e a Deus o que é de Deus" (Mt 22, 21). Tal
tãs. Proibiram-se ta mbém os auspícios privados. E, num ma-
principio não destrói a união entre os dois poderes; pelo
nifesto, dirigido ao oriente, Constantino exprimiu ?_ seu de-
.contrário, enobrece-a e aperfeiçoa -a .
sejo de que todos professassem a verdadeira religlao. PrOI-
389. Constantino, porém, não se limitou à tolerância. biu, porém, que os pagãos fossem molestados por caUsa da5
Concedeu à Igreja também muitos privilégios e subvenções s uas convicções religiosas (Eus., Vita 2, 48-60).
que a religião antiga possuira : imunidade do clero, direito 392. a. Para se libertar, finalmente, da antiga nobreza
hereditário das igrejas, jurisdição civil dos bispos, santifi-
romana, pela maior parte a inda pagã, e para poder mais
cação do domingo e outros mais. Toda a legislação foi mo-
fàcilmente proteger as fronteiras, Constantino escolheu. para
dificada, conforme o espirita do Evangelho. Foi abolido o
capital do império Bizàncio-Constanti nopla (330), CIdade
suplício da cruz (Socr., HE I, 8) e proibido ferretear os
essencialmente cristã. Daí res ultou, ao mesmo tempo, a pre-
celerados. A Lex Júlia Poppaea fo i res tringida a favor da
servação do bispo de Roma do perigo do cesaropapisn;o ..
virgindade cristã, e proihida a venda da s crianças, assim co-
b. Mas, de outro lado, a IIledida leve uma conscquencIa
mo foi proibido o infanticídio. triste. A sede episcopal de Consta ntinopla tornou-se, aos
Mas, como a maior parte da popnlação do império ain- poucos, s imples instrumento da corte. Não poucos al',"eja-
da professasse o paganismo, o imperador procedeu com mui- va m as honrás de bispo da capital. Um centro ecleslastJco
ta prudência , acomodando-se às circuns tâncias e conservan- no oriente nas mãos du m episcopado ambicioso e cortesão
do o título de "Ponfifex Maximus" e outros costumes mais.
devia torna r-se necessàriamente rival de Roma Antiga . O
390. Enquanto assim Consta ntino, senhor do ocidente, nacionalismo veio a ser meio para reali za r ambições pes-
se declarasse tão se rena mente a favor do cristianismo, Li- soais. E esta evol ução não podia deixar de leva r, em última
cínio, imperador do oriente, tom ou uma atitude contrária, análise, ao ci sma a d entaI.
cada vez mais acentuada. Não revogo u, é verdade, o Edito 393. a. Constantino pode, pois, se r chamado, com ra-
de Milão, mas fez sentir, de todos os modos, aos cristãos zão o "Grande". Mas santo não foi. A lenda do batismo
.a sua hostilidade. Uns Íoram expul sos do exército ou reti- pel~ papa Silvestre I não tem nenhum fundam ento na _his-
rados da corte imperial. Outros foram privados de bens e tória) mas, liga-se ao batis tério cons tantiniano do Latrao e
liberdade. Proibiram-se também as reuniões sinodais, difi-
cultava-se o culto e, em algnma s partes, os governadores
data provàvelmente da segunda parte do século V. A n,o-
natio Co nslantini, que a relata, é uma falsificação postenor
chega ram a perseguir san grentam ente a Igreja. E' conheci- (cfr. § 70). O fato de ter Constantino diferido o seu ba-
do o martírio dos quarenta soldados de Sebaste, cuja mor- tismo até à morte (337) pode ser justificado pelo costume
te se atribui ao governador Agricolau; e diz-se que também
COmpêndio r - 12
179
§ 41. A Igreja no imp6rio romano
178 II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão
,II' \Ilode (Cad. Theod. 16, 10, 2). Depois de ter unido. o
do tempo. Mas as suas crueldades, até mesmo para com
seus próprios parentes, não tem nada comum com sentimen- ill'I'L'rio renovOU aquela lei, mostrando que abraçara o cns-
, . - u pai Mas compreendeu-
tos cristãos. Outra prova de que não compreendeu muito ti:ulistllo por convlcçao, como se .
o espírito cristão foi o seu cesaropapismo que o moveu a II". " espírito ainda menoS do que este.
chamar-se de "bispo dos negócios externos da Igreja" (Eus., Foi estrênuo fautor do arianismo e representante. decla-
tam
Vita 4, 24). Eusébio tece disto um elogio ao imperador; ""lo do igrejismo estatal. Sua própria vontade era lel'C -
mas esquece-se do perigo que ai se esconde para a liber- 11L"u nas coisas da religião. Este cesaropaplsmo de ons-
dade da Igreja. A idéia do cesaropapismo é pagã. Ainda 1;\ní..'Ío e de muitos de seus sucessores ~orn?u-se para a I?re-
menos podemos desculpar a cooperação de Constantino com i;, UI1I perigo maior do que o fora a tJrama dos p~r~egU1do-
.' - 5 m ele não se compreendem as pernrclOsas lu-
o arianismo e o seu sincretismo. Se Constantino não tives- '" pagaos. e . IV V ' VI perturbaram
se dispensado as suas simpatias aos bispos arianos, a he- I:\s dogmáticas, que) nOs seculos , e ,
resia não podia tomar tão assustadoras proporções. " paz da 19reja. .
b. Todavia, não podemos negar que o primeiro impe- 396. Q. A precipitação e o pro~edimento tão. pouco cns-
rador cristão foi um instrumento insigne nas mãos da Pro- (;"0 de Constâncio e seus irmãos nao podl~m d:"xar de pro-

vidência divina. Claro conhecimento do tempo, coragem para vocar uma reação dos gentios. E a r~açao nao t~rdou. O
tomar a iniciativa e energia de executá-la caracterizam os laganismo, embora decrépito, ainda v.,vla. Tr.adlçoes anh-
grandes homens da história. Constantino as possuía. A Pro- ~as, costumes seculares da vida políhca, soc',"l e cultur~1
vidência divina delas se serviu, não só para a propagação ,
11.10 se
extl'nguem da noite para o d,a. TendenClas
. I espm-
. t .
do cristianismo, mas ainda para a constituição da Igrcja. tuais) opiniões e crenças, que dominaram po~ secu os ln el-
Além disso, o monarca procurou corrigir, no leito da morte, ros, não se apagam, sem antes reunirem, mals. uma ve.z, to-
as faltas que cometera na vida, demonstrando, assim, que das as suas forças para travar uma luta de vlda e de n.l?r-
se convertera sinceramente. le com o novo espirito, Especialmente as ant~gas f.am,]l.as
da nobreza ficaram fiéis à religião de seus pals. Alem dlS-
394. Os filhos de Constantino dividiram entre si o im-
50, grupos inteiros da sociedade, sacerdotes, profes,sores de
pério. Constantino II recebeu as Gálias com a Espanha e a
Bretanha; Constante, o Ilírico com a Itália e a África; Cons- escolas superiores e artisias lutavam por sua eX1Stencla.
b. E os cristãos, em vez de se unirem contra o lnllTIl-
tâncio, o adente.
go, enfraqueciam-se internamente por heresias e Cismas, per-
Infelizmente, cometeram, para assegurar-se do trono,
dendo externamente o seu influxo SOCIal e o seu renome.
inauditas crueldades contra os membros mais chegados da
Acresce ainda que, precisamente no século IV, o neopl~to­
família. Só dois sobrinhos de Constantino Magno escapa-
nismo, filosofia religioso-idealista, ~lti~nO fruto do. espmto
ram da carnificina, Galo e Juliano. Com tal procedimento
helênico deu ao paganismo a aparencla de nova vltahdade
atraíram sobre si a ira de Deus. Desunidos também entre
e de no~o esplendor. Partiria e ]âmblico foran~ os seus re-
si, guerrearam-se mútuamente. Constantino II caiu numa ba-
presentantes no princípio do século .. E o maIOr represen-
talha contra Constante, perto de Aquiléia (340). Constan-
te perdeu trono e vida numa rebelião de Magnêncio (350). tante desta religião filosófica scria ]ulrano Apost~ta._
Constâncio, derrotando o usurpador, reuniu todo o império 397 Juliano Apóstata (361-63), filho dum ,rmao con-
nas suas mãos (351). sanguin~o de Constantino Magno, foi, depois do assassímo
395. Quanto ao cristianismo, os três irmãos continua- de Galo o único membro masculino que se salvara do mor-
ram a obra de seu pai, não com a mesma prudência e cir-
ticínio da família' imperial. Caráter nobre por natureza, teve
cunspecção, mas com violência e precipitação. Constâncio as pressuposições para ser um ótimo imperador. Mas .a .edu-
~roibiu todos os sacrifícios pagãos (341) e, pouco depois,
cação insuficiente sob a direção do bispo ~flan~ EuseblO de
Juntamente com Constante, sancionou a proibição com a pena Nicomédia o fez hipócrita e inimigo do cnshamsmo. Apesar

1'2"'
§ 41. A (greja no imp ério rom an o 181
180 H época: Desenvolvimento da IcrreJ'
o a no I'm peno
. . <:nstao
,-

de ser destinado à vida cl erical d' . Ílllpério. Os mártires ma is conhecidos fo ram os dois irmãos
leitor (Socr., H E 3 I) d' ,e ~ ]a exercer o cargo de .1";'0c Paulo em Roma.
. ~ " o Java o Cri stianism o q -
n heCla senao pela forma do arian' .' ue nao co- 400. Positivam ente, o imperador procurou restabelecer
cruel Constâncio Além d' Ismo, replesentado pelo
. ISS O, a conduta dos b's á r .. rdormar a religião idóla tra, dando-lhe no neoplato nismo
c as discórdias dos cris tãos fizeram-lhe é . 1 pos U lCOS 11111 novO fundam ento e imitando várias instituições que vi e-
. A causa principal de seus ódios P, sSIl11a. Impressão. la a conh ecer no cristianismo. Fundou hospita is e asilos para
cla de seus mestres pagãos p ' 1p . ' porem, fOI a IIl fluên- ,,:; pobres, cuidou da instrução religiosa do povo. Procurou
M,;ximo, O retor Libânio e o· eu"nC almen:e. O neoplatôni co "'evar a moral dos sacerdotes e in troduziu uma espécie de
lado da mãe, souberam inSPirar_~~~ou~a!~~",o, par?nte pelo jCíarquia e di sciplina penitenciária.
tra Constâncio e o cristianismo. o 10 Ilnplacavel con-
40 1. Mas todas estas tentativa s de reforma, - tes\e-
. 398. Em 356, Constâncio, nomea ndo Cê lIJtlnh os manife stns aliás em favor do cristianismo, - não
a~ Gálias, onde se distinguiu COI11 tanto t~~ilh sar, envio~-o Sllrtiram efeito. S. Atanásio as comparava com "uma nu-
CitO o proclam ou Augus to (360) L o, que o exer- vem pequena, que depressa pa ssará" (dr. Theod., HE 3,
Constâncio; mas es te faleceu 't ogo se levantou contra !.l). Os p r6prios pagãos zombavam do zelo religioso do im-
~xércitos. Juliano que, partindoa~:: g \se encontrarem .os perado r (Am . Marc. 25, 4). E a morte de Juliano pôs fim
a santa Missa bem de . a las, aIOda asslstJra ii S\l a obra a penas começada. Não loi ele, de certo, um
. ' pressa mal1lfestou as
h Ipõcritamente veladas até e t- sua s crel1ças, Nero. Na pacificação das Gálias mostrara-se hábil gover-
paganismo. n ao, e começou a restaurar o
nador e o seu governo imperial merece toda a admiração.
" 399. a. Jul gou poder realizar o Tanto mais nitida resplandece a di vinda de da Igreja, na im-
e positivamente. Começou por tirar: teus planos negativa potência do imperador de reprimir o cristianismo. Bem ca-
Jégios, concedidos por Con stal1till greJa t odos os privi- racterística é a lenda, que fa z Juliano, mortalmente ferido
dos altos cárgos os "galileus" o e seu s filhos. Expulsou na guerra contra os persas, exclamar: "Galileu, tu ven CeS-
mandou fechar-lhes as escola' como ch~ mava os cris tãos, te" (Theod., HE 25).
antigos clássicos, condenando-~s O~I i p~OI?,r-Ihes explicar os 402. Desde a morte de Juliano Apóstata , o cristianis-
tar as escolas dos T . g OranCla ou a frequen- mo pen etrou, mais e mais, em todas as cJasscs da s oci eda~
bios entre os cristã~:n t;~s. ProCl~rou também causar dis túr- de. Os imperadores apoiaram-no de todos os modos, em
-arianos Aos' d I vorecenc o ora os católicos, ora os
' . ' . JU eus, que despreza va ma parte por sentimento religioso, em parte por razões polfti-
Ill lmigos dos cristãos, permitiu ree'dific:rq~e ~::; el~ erjO! caso joviano (363-64), jovem comandante da guarda impe-

:~:a~;;~t:a:'
br d
~n~ove;~:dl;ar:~:, d~=sme~tirfa sent~nç~ d: J:=
, , ,o, nao Icará ai oedra
rial , católico sincero, despojado de suas di gnidades por cau-
sa da sua crença, foi proclamado imperador pelo exército
e pe ra que não seia derrubada" (Mt 24 . sa- (Am. Marc. 25, 5 ss). Restituiu ii Igreja tudo quanto Ju- '
fai fru st rada por chamas u . ' 2). A empresa liano lhe tirara, seguindo, no resto, uma política tolerante.
como relata Amiano Marceqll'neOIf(rRomperam dos fun da mentos, 403 . Esta política foi continuad a por Valentiniano I
. er. gest. 23, I 3)
bat b. JulIano
' . .valeu-se também da pena Como meio ' de. com (364-75), que, no reinado de Juliano, fora confessor
er o cnstIamsmo, escrevendo entre t· - (Th eod ., HE 3, 16) , porque se negara a obedecer à ordem
~;~~i2:t~~i::p~~~~e~~n;~sares contra o~;::ta~~~:~ :~~lll:=
.~ r os aI1 tlOquenos .
de sacrilicar aoS deuses. Considerando a extensão im ensa
do impt rio, dividiu-o em duas partes. Reservou para si o
PersegUição sang renta não a . . ocident e, estabelecendo a sua residência em Milão. Ao seu
ódio de certos funcionários pÚblicos e qu;s J:~hano. Mas
C.
° irmão Valente ( 364-78) cedeu o oriente. Val ente loi, infe-
pagão chegaram a derramar sangue , e~ a~gnuamlSmo dO! espovo
as par do lizmente, encarni çado ari ano, C, enqu anto concedia liberda-
182 11 época: De se nvo IvJmento
. da Ig reja no império cristã o § 41. A 19reja nO' império romano 183

ele aos pagãos e aos . d ,1I\i5 imperadores, proibiu, sob penas gravíssimas, o culto
católicos. JU eus, perseguiu atrozmente os
idolatrico.
404. a. Valentiniano r faleceu d b. A resposta dos pagãos foi o assassínio de Valenti-
os quados. Seu filho Graciano urante ne~ociações com niano II pelo franco Arbogasto, que elevou ao trono a Eu-
so, e aconselhado por S A b .( 375-83), catorlco lervoro- gênio, retor cristão) mas simples instrumento nas mãos de
tamente contra o paga: m rRosIO, procedeu mais resolu- Arbogasto. Ambos foram derrotados por Teodósio, às mar-
fllSl110 enunciou t't I
d e Pontífice Máximo SII . : ~o I u o e traje gens do Isonzo perto de Aquiléia (394). Teodósio, numa
ainda se faziam par~ o p~~~~u ~~s s~{~~ençoes públic~s, que alocução ao senado romano, declarou o cristianismo religião
senado romano o altar da deu a . ° OS, e f~". retIrar do
do Estado.
os privilégios dos sacerdote sd VII6na: SUpfIIllIU também c. Ele mesmo foi, se abstrairmos de algumas explosões
s e as vesta IS.
_ IJ. T odas estas disposições rov . de có lera, um caráter nobre e generoso, exímio estrategista
taçao entre os gentios Um p. ~cara11l grande mquie- e legisl ador, e, sobretudo, um verdadeiro cristão, que, no di-
feito Símaco foi ter coo ma . cOIllIssao, chefiada pelo pre- zer de S. Agostinho, "mais se gloriav~. de ser membro da
, o Imperado f'
que retirasse as suas ordens M . r,. a 1m de pedir-lhe Igreja, do que de reina r sobre a terra" (De civ. Dei
cebeu em audiência a depu! _as ,?Iaclano n em s:,quer re-
ser pontífice máximo _ t açao ·. Se Olaclano nao quiser 5,26, 1).
- M' , ena d Ito um dos depu! d 407. Depois da morte de Teodósio, o império foi divi-
en tao aximo será I)ontífice R I . a os, - dido para sempre. Honório (395-423) , imperador do oci-
do I' f 01' .
assassinado em Vã . eaI mente
' o Jovem .
Impera-
_ I o pc o usurpador Máximo dente, tirou aos templos as últimas rendas qu e ainda lhes
40;). Este, porém, não foi re h .d . ('aviam ficado. O general vândalo Estílico, sogro e prim eiro
lias, na Espanha e na Brl't" con eel o, senão nas Oá- ministro de Honório, ordenou se queimassem os antiquís-
. a ma. O resto do' .. .
t a I fiCOU fiel ao irmão de O ' .. Impcno oCldon- simos li vros das sibilas, procurando, porém, conservar, co-
O p artido pagão renovou ~a~~~no~~~lenht!Jano II (383-92). mo monumentos de arte, os templos e as estátuas dos
ql\e era ainda menino de t pIO ao novo lmperadoi,
deuses .
aconselhado por Ambrósio ~:ze anos .. Mas Valentiniano, 408. Entretanto, o imp~rio ocidental ia, sem cessar, ao
Máximo então procurou ti' a _1~elIu-o Igualmente. Quando encontro cla dissolução. Durante o reinado de Honório e
veio em auxilio de sell .:v; e trono e Vida, Teodósio sens sucessores, João Tirano (423-25), VaIentiniano 11\
pador (388). J m amigo, vencendo o Usur- (425-55) e os oito imperadores que se seguiram no espa-
406. a. Teodósio I (378-95) . ço de vinte anos, muitas calamidades afligiram o império.
trono do oriente prese . ' que deVia a Graciano o O último, Rómulo Augústulo (475-76), foi destronado por
nicena, tornando:se a .reveu a t~dos os se us súditos a fé Odoacro.
periai. No seu zelo e~~I~uV~~~~~elro fundador da Igreja im- 409. Como Honório, assim Arcádio (395-408), impera-
rar os templos dos ídolos Pd o paganismo ordenou cer- dor elo oriente, tirou aOS sacerdo tes pagãos o resto das suas
truídos, vítimas do , 0Jo: oSdquals alguns foram até des- r endas e privilégios. Teodósio II (408-50), aconselhado por
", Impru ente do pov . t- sua piedosa irmã, S. Pulquéri a, excluiu os gentios dos car-
monges. A destrllicão de cêl b . o CtI S ao e dos
foi ordenada pelo patriarca ;e~~loSerapelOnde Alexandria gos públicos e ordenou que fossem queimados os escritos
volta dos pagãos (39 I) O t ' mas devIdo a uma re- anticristãos de Pa rfirio. Mas não consegu iu extirpar com -
ao cutto cristão O velll' u ros templos foram destinados pletamente o paganismo, embora, já em 423, dissesse não
. o retar Lih â ' d'" haVf r mais gentios no seu império (Cad. Theod. 16, 10,
rador cm defesa dos tem 1M ' 1110 IrIgI~ -se ao impe-
não teve nenhum resulta! o~ãO ahs a sua OmIto pro lemplis 22). Ainda Justiniano I (527-65) vill-se obrigado a proce-
o der contra a idolatria, que na escola tilosófica de Atenas
ganismo. Em 391 uma le: d't d uve meIO de salvar o pa-
, I, I a a de comum acordo pelos possuia até então um baluarte forte. Justiniano fec hou as
--- 185
184 II época : Desenvolvimento da Igreja no império cristão § 42. A Igreja for a do império

suas portas (529). Os professores emigraram para a § 42, A Igreja fora do império
Pérsia. . I re'a tinha ultrapassado a s
412. G. Desde muüo ,p~ .g ln'ml'ga de morte dos r o-
410. Q. Mas a supressão do paganismo não foi imica- . ." Na ersla I I
mente a obra dos imperadores. Contribuiu também a cor- Ironte"as do ImperlO. I'b d d'e e proteção enquanto du-
deu-se-Ihes I er a ,
rupção interna da antiga religião e a supers tição. E não manos, conce . . _ Muito numerosos foram os'
devemos esquecer que, à s vezes, os cris tãos se deixaram ra va no impéno ~ perseg~ça~. , do reino. A sua met rópo-
cris tãos nas provmclas OCl en ais
arrastar a atas de violência . Foi a ssim que caiu vítima a
filósofa alexandrin a Hipália (t 41 5 ) , de que nos fala o ]e era Seleucia-Ctesifontc. I a pa z con stanliniana,
historia dOr Sócrates (HE 7, 14-15) . b. Mal, porém, se proc amaraSa p or II (309-81) , um
· . comoçou com
b . No entanto, ma is do que todos os fatores externos, q uando na P ersla - . _' O . ' sti ga do pelos judeus
'd de p e"segulcao. re I, ln b'
fo ra m a s for ça s intrínsecas do cri st ia nism o, a s suas ener- lungo pe rro o . . , 'Idal'ca CQ m o ta m em
, ~ra de ongem Jl , .
gias religiosas, mora is c espi ritua is , e a atividade dos seus e pela ra mha que ~ e movido ainda por s us peitas p ol!-
chefes, bispos, do utores e monges, que tra nsfo rmaram a so- pelos sacerd otes do Sol, 11 Constâ ncio publtCOll, em
. . d as oela gue rra COI , d
ciedade. Atanásio de Alexandria, Basilio Magno, Gregó rio to cas, a glava '. C . te não surtisse logo o ese-
Nazian zeno, Cirilo de Alexandria, João Crisós lomo e alg uns 342, o primeiro edIto.. orn o ~~3 um seg undo edito , mais
." : representantes d a vida monástica, verd adeiros heróis do es- lado efeito, fez segulr ~ el~ t dos os crístãos. Com a dmi-
"'upl decretan do a mOI te e o
ii ' píri to, contribuíra m muito mai s para a vitória do cris tianis- l..- . ..... • • ,:. t m estes os S llp I'l l:' I'OS, Aos milha-
,
mo, do que o poder dos impe radores . r ável h e rOl ~;rI10 cnlren ara S zômeno fa la de clezessels
res derra maram o seu sangue , o
411. Os res tos do paganis mo, que a inda se mantinha m,
\" mais aferrada mellte no ocidente do que no oriente, viviam mil ( HE 2, 9- 14) . eri odo de paz, Jedzdejerd o
4- 13. DepOIS dum breve p se mos trara s ingularmente
Iii
, geralmente retirados no campo, fora da s cidades. Daí o no-
(397-420), que por lllUlto te~P? u uma nOva pe rse guição.
me de "pagani " . S. Gregó rio Mag no ainda fez esforços por . . 't'anismo Ifll CJO
s up rimi-los na Ita lia , par ticul armente nas ilhas de Córsega
favo ravel ao crlS I ' ct b' o Abda s de Susa, que
1 im pl"u dente o ISp
f .
e Sardenha. Motivo 0 1 o z e .o tem lo (418). A tempestade durou ,
mandara destrUIr um P d 450 e fo i partlcular-
E em bora, finalmente, o pag anismo externamente fosse . t ões ate ao ano e •
com breves m errupç, B - o V ou Varanes (420-38).
extirpa do, as condições da Igreja não eram lumiilOsas, por-
men te violenta no remado de arai das crueldades infligi-
que com O culio id olãt rico não desapareceram igua lmente
os vícios pagãos e Com a difusão do cristia nismo o seu es-
S. Jaco b Dissecato é um exemt o 'a da
Pérsia foi' des truí-
das aos cristãos. Quase toda a e~~~~ianismo estabeleceu em
pírito não p enetr ou bastante na vida politica. Os impera -
d a ao mesmo tempo, qu e °d n . c'pal No ano de 641 ,
Seleucia-Ctesifonte a sua sen:l!:~~e I a P é rsia.
dores e ram ba tiza dos, mas o império continuava pa gão, de-
dicado a o despoti smo, ao q ual corres pondia, de outro lado,
u m servilis mo vil e ba ixo dos cortesãos . os maome tanos ocu~a~am,.;1 ristiani ; acta por Gregór io lIu-
414. a. A ATmen1a~ l.u ~ eroical11ente a Maximino Daja,
Mirbl , QueJlen zur Geschichfe des Paps ttums) 5. ed. Tuebingen mina dor (clr. § 12), reslstr . Tiridates JII a fechar ao
1934 . - Lot, La fín du monde an tíque et !e ctébut du moyen âge,
Paris 1928. - Gaspar, Geschichte des PapsHurns von den Anfaen gen quando este qUIs obngar o reI. (Eus HE 9 8 ). Em
bis 1.Ur Hoehe der \VeHherrsc haft , I~II, Tu ebing en 1930-33. _ Sílva- . ' . odas do seu reIno ., , S
cns!tamsmo as .p :,. ln alto florescimento. Quando , .
seguida, a reltg lao ~tmg1U u
Tarouca, Ecclesia in imperio Roman o-Byzantíno, Roma 1933. _
Funk, J{onstantin der Grosse lJnd das Christentum, Abhandl. und !tabelo armênio, a Sagrada
Unters. 11, 1_23. - Batiffol, La paix Constantienne et Je Cath oli- Mesrópio (t 441) lI1ventou o I~ngua nacional, e desde então
cisme, Paris 19'4, - Doe/ger, Konstan tin der Grosse und seine Zeit, Escritura foi tradUZIda p~r~ a 1 a ros erar.
Freiburg 191 3, - Salvatorelli, Constantino il Grande, Roma 1928.
também a literatura armenl~ ~01l1e;~Uem ~od~r da Pérsia, ~
- Baker, Constantin the Great and the Ch ristian Revofution, London
1930. - Allard, Juli~n I'Apostat, 3 vol., 2. ed., Paris 1903. _ Pa-
lanqu e, S, Ambr oise et I' Empire romain, P aris J933.
b . infeli zmente, a Armema ca
a ig reja teve de sofre r atroz persegUlça .
. -o Mas °
he róico
187
§ 43. O islamismo
[86 II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão
c grande influxo junto à corte real de Axuma e valcram-
povo ficou. firme na sua fé, e conseguiu também rejeitar se da sua posição para propagar o cristianismo. Edésio
o nestonamsmo. COn;?, porém, seus bispos não pudessem voltou à sua pátria. Frumêncio, porém, chegou a ser admi-
tomar. parte no conelho de Calcedônia onde foi julgado o nistrador do reino, fez-se sagrar bispo por S. Atanásio
monofIsltIsmo, e como os sectários desta heresia espalhas- (328), e estabeleceu a sua sede episcopal na capital. O jo-
sem !alsas informações, separou-se, no fim do século V e vem rei Aizana, e com ele grande parte de seu povo, recebeu
prIncIpIo do século VI, completamente da Igreja universal.
o batismo.
. 415 .. Na Ibéria ou Geórgia, situada ao 1I0rte da Armê- O imperador Constâncio tentou arrastar o rei, o bispo
ma, o cnstlamsmo foi introduzido, como Rufino relata (HE e o povo ao arianismo j mas em vão. O arianismo não con-
1~, 10), a partu' de 325, quando uma escrava, chamada seguiu penetrar na Abissínia. Em consequência das relações
Numa, por suas orações, restituiu a saúde à rainha do pafs. com a metrópole Alexandria, entrou, pelos fins do século
Pouco depoIs, converteu-se o rei e chamou missionários. V, o monofisitismo no país, que a ele ficou entregue até
Autores modernos querem ver na narração de Rufino uma aos nossoS dias. A heresia misturaram-se ainda elementos
lend.a, e colocar o início da conversão da Ibéria no reinado judaizantes, como circuncisão, santificação do sábado, disci-
do Hllperador Constâncio. plina matrimonial bastante relaxada e até poligamia, etc.
. Partindo da Ibéria, o cristianismo propagou-se tam- Harnack, Die Mission und Ausbreitung des Christentums, 4. ed.,
,Y
bem entre os ~utros povos do Cáucaso, albaneses, lácios Leipzig 1924. _ Labourf, Le Christtanisme dan~ l'empir~ perse .sous
e abascos. pevldo às relações com a Armênia, todos estes la dynastie Sassanide, Paris 1904. - Weber, Dle kathobsche Klrche
li' in Armenien. lhre Begruendung und Entwicklung vof der Tr~nnung,
povos passaram, mais tarde, para o monofisitismo. Freiburg 1903. _ Morgan, Histoire du peuple arménien, Pafls 1919 .
416. Para o Turquestão, a índia e a China foi levado _ Moute, Christian in China before 1550, London 1930. - Confl
o. CrIstianIsmo pelos nestorianos da Pérsia. Centenas de lá- Rossini, Storia d'Etiopia I, Milar10 1928.
pides sepulcrais, encontradas no Turquestão dão testemu-
nho. ,da. sua existência, até ao ano de 1345. Em Si-ngan-íu, § 43, O islamismo
os jeSultas acharam, em 1625, uma inscrição de 781 que 4! 9. 11. Enquanto assim, no oriente, os povos, uns após
atesta a atividade de um monge e a construção de um 'mos- outros, se convertiam ao cristianismo, conquistou a Igreja
two; entre 635 e 638, sob a proteção do imperador também os povos transmigrantes do ocidente, que começa-
chmes. ram, neste período, a lançar os fundamentos da idade-média.
417. Entre os homeritas ou sabeus da Arábia pregou Mas, no fim do período, surgiu, nO oriente, um poderoso
o. bispo ariano Teófilo, enviado pelo imperador Constân- adversário do Evangelho, o islamismo.
CIO. Nao se encontram, todavia, na Igreja da Arábia ele-
b. Maomé (570-632), lundador da nova religião, nas-
mentos "trlano~. ~lorcs~eu a vida monástica, especialmen- ceu em Meca, da casta sacerdotal dos cureichitas. Seu tio
te .!l0 monte Sinal. S. HIlarião, Simão Estilita e Eutimio são e pai nutrício era prefeito da Caabá, santuário dos árabes,
g_lonas desta Igreja. Nos princípios do século VI os cris- dedicado primitivamente a um ser supremo, maIS tard~,. a
t~os ela Arábi~ ~nfrentaram vitoriosamente uma p~rseguição uma multidão de divindades. Pelo casamento com CadldJa,
v~olcnta do ,reI judeu Dh~I-Nuwãs. No século seguinte, po- viúva rica, chegou a ser senhor de grandes riquezas. ComO
rem, sucumbll am a l~va_sao dos persas e, mais tarde, à dos negociante fez, em seguida, longas viagens e veio deste 1110-
maometanos. Os cnstaos restantes aceitaram o nesto- do a conhecer o judaísmo, o parsismo e o cristianismo nes-
rianismo.
toriano; e são estes os elementos com os quais formou uma
418. ': ~bissínia ou Etiópia axumítica foi cristianiza-
religião sincretisla.
da por ~OIS jovens de Tiro, Frumêncio e Edésio, que, vol- c. Em consequência da sua constituição nervosa teve,
t~ndo ,d_ uma v~gem a lndla, foram aprisionados e redu- a partir do ano de 6 \ \, visões pretensas do arcanjo Oa-
ZIdos a escravldao. Ganharam, porém, em breve, simpatias
188 11 época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão 189
§ 43. O islamismo
briel, que, mais tarde, se repetiam, quantas vezes ele o de- céu, lugar de prazeres sensuais. A doutrina da predestina-
sejava. O que via em tal estado anormal, tinha-o, ao me- .cão é um puro determinismo ou fatalismo. Nas obras mís-
nos no princípio, como revelação de Deus. Considerava-se ticas do islamismo posterior aparece um certo emanismo.
então como o maior profeta, chamado a restaurar a verda- Segundo uns, a última realidade é a Vontade (monoteís-
d.eira fé. Desprezado, de início, encontrou, aos poucos, ou- mo), segundo outros, a Beleza ou a Luz eterna, que se rc-
vIdos entre Os seus parentes. Expulso, porém, de Meca, fll- flete no universo (panteísmo). A alma é uma particula de
gm para Medina (622); e esta fuga, chamada "héjira", de-
Deus.
sIgna o InIClO da cronologia dos árabes. Em Medina reuniu
423. A moral do islamismo só ex:ge obras externas:
um exército, expugnou Meca (630), purificou a Caabá dos
orações a fazer-se cinco vezes por dia em direção de Meca;
ídolos pagãos e a tornou, com a "pedra negra", centro do
novo culto. jejuns, que se fazem no mês de Ramadan, desde o despon-
tar até ao pôr do sol; divers<1s 3hluções, esmola, circunci-
420. Depois da morte de Maomé (t 632), rompeu um são a fazer-se aos 14 anos de idade, peregrinação a Meca
confl:to por motivo da sucessão. Quem havia de ser cali- ao menos uma vez durante a vida, e guerra contra os "in-
fa, lugar-tenente do profeta? Abu Beler, sogro do fundador fiéis". Quem morre no combate contra eles, entra infalivel-
foi o primeiro. Seguiram-no Omar, Otman, Ali e MoaVija: mente no céu. Proíbem-se o vinho e a veneração das ima-
com o qual começa a dinastia dos omíadas de Damasco gens, o assassínio, a usura e 3. dlscórdia entre correligio-
(661-750).
nários. Mas prescreve-se o ódio aos inimigos, i. é, aos que
421. Maomé não deixou a sua doutrina escrita. Foi con- não obedecem ao profeta. Característica é a condição indigna
s:rvada no Corão, livro sagrado dos maometanos, redigido da mulher e a poligamia. Quatro mulheres são permitidas
80 no tempo dos primeiros califas. Consiste em notícias dou- ao homem pela lei, e concubinas em número ilimitado. Para
trinais particulares e pi'etensas revelações do profeta. Divi- o califa não existe nenhuma lei neste particular.
de-se em 114 capítulos ou SUías. Hevela poucos conheci- 424. Politicamente, o maometanismo é o mais extremo
mentos em matéria de religião, sobretudo no tocante ao despotismo. Numa só mão reúnem-se os dois poderes, es-
cristianismo.
piritual e temporal. Não há sacerdócio. No correr do tem-
Na explicação do Corão cl;videm-se os maometanos, po, tornou-se necessária a instituição de pregadores, chama-
cevido às muitas contradições e incoerências do mesmo, em dos "chaiques". Corno esta religiã.o, no princípio nacional,
sunitas e ciitas. Estes negam, aqueles aceitam, fora do Co- viesse, pouco a pouco, a assumir caráter universalista, tor-
rzo, uma tradição oral, chamada "Suna". As duas seitas nou-se um perigo mundial.
subdividiram-se em numerosas denominações. Existem hoje 425. Já Maomé havia acentuado, nos últimos anos da
cerca de 250 milhões de maometanos, sendo cerca de 15 mi- sua vida, mais e mais, a idéia política da sua obra. O visio~
ihões ditas.
nário virara em déspota guerreiro e político, arrastado por
422. O princípio fundamental do maometanismo é lima fanática crueldade e cego por inaudita devassidão. Tendo
completa entrega a Deus. Daí o nome "Islão". Poucos são ensinado a guerra contra todos os "infiéis", começara por
os seus dogmas. Existe um só Deus de unidade absoluta conquistar a Arábia. Nlorte prematura cortou-lhe repentina-
pessoal e invisíve1. Nega-se, portanto, a Trindade cristã, co~ mente os planos. Mas os seus sucessores continuaram as
mo também o politeismo pagão. O trono de Deus é rodea- conquistas.
do de anjos bons, formados de luz purissima. Opõem-se- 426. Fácil foi a sua obra. O império grego caira em
1hes os anJos maus. A revelação se transmitiu pelos pro- desoladora estagnação. Os árabes apresentavam aos orien-
fetas, Abraão, A1oisés, Cristo, e o maior de todos, Mao- tais uma Hvisão do mundo" que lisonjeava às paixões e pro-
mé. Não há uma verdadeira redenção. Há, porém, uma res- pagavam-na à força de armas. Além disso, os gregos, desuni-
surreição e um último JUÍzo, ao qual segue o inferno ou o dos e orgulhosos, perderam-se em infinitas controvérsias re-
190
II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão
§ 43. O islamismo 191

ligio.sas e seitas .• Na corte bizantina via-se, a princípio, no da Espanha. Quando, em 750, foi destronada a dinastia dos
movlm~nto dos arabes, um feliz acontecimento, que enfra- omíadas de Damasco, Abderram ão, único rebento da famí-
que.cer!a o ~ewo dos persas; e não se percebia que a nova lia que esca pou da carnificina, fugiu para a Espanha e fun-
potencIa sena um perigo muito ma ior, cio que jamais o fora dou ali o ca lifado de Córdova, com o qu e, consolidando-se
o reInO dos persas.
Q poder dos sarracenos na peninsuJa, se iniciou um perí odo
427. Abu Bekr (632-34) venceu os exércitos de He- de grande florescimento das ciências e das artes. No orien-
rádio I e ocupou Damasco. Omar (634-44) conquistou a te, os abássidas, nova dinastia (750- I 258), erigiram o ca-
Palestll1a . No lugar do templo de Salomão surgiu a mesqui- lifado de Bagdá, sede dum vasto império mundial.
ta de Omar. Também Antioq uia caiu nas mãos do califa 430. Os conquistadores concederam aos ha bitantes dos
e logo depois, o território do Tauro. O Egito foi conquis~ territórios ocupados liberdade religiosa. Só da Arábia foram
t~do por Amru, general de Omar. Os patriarcados de An- expul sos tanto os cristãos como os judeus. Muitos, porém,
lIoqu!a, Jerusalém e Alexandria passaram, pois, ao dominio a posta taram, movidos pelas vantagens materiais da nova re-
d~s arabes. Durante o reinado de Otman (644-56), todo o ligião. Os que fic aram fi éis ao cristianismo tiveram que so-
remo da PérSIa teve de render-se. O mesmo cali fa invadiu frer muitos vexames. Assim aconteceu que províncias intei-
a A fTlca setentrional até Cartago e conquistou ainda a A _ ras reca íram nas trevas da descrença e da superstição . A
mênia e o Chipre. r
Igrej a ele Cartago desapareceu ela história, nos meados do
428. Depois de uma guerra intestina, que teve por re- século XI!.
sultado a queda de Ali (656-61), Moavija (661-80), fun- 43 J. No século IX, os sarracenos apoderaram-se tam-
dador da dl~astra dos omíadas, fez de Damasco a capital bém da Sicília, e dali empreenderam muitas piratarias na
do seu Impeno. Contllluaram as conquistas, pelo fim do sé- Itália e conseguiram fixar o seu pé, por algum tempo, na
cu.lo _VIl . No. on ente, as controvérsias dogmáticas entre os Itália inferior e nas costas da Provença .
cnstaos ~aclhtaram ainda a sua marcha. A Providência di-
Orimme . Moh am med, 2 vol., Mainz 1892-1 904 . - Andrae, Der
vl~a ,servla: se dO~ árabes para vingar o igrejismo bizantino. Ursprun g des Islam und das Christentum, U ppsai a 1926. - Fausti,
Ate as lnd las orientais e ao Tu rquestão levou O Crescent e Islam nelIa luce del pensier o cattolico, Roma 1934. - Id., La pre-
as suas armas. dicazi one religiosa di Maometto, Palermo 1935.
. 429. a . No ocidente, caiu Ca rtago (698) e, pouco de-
pOIS, os fIlhos traIdores de Vitiza e os judeus chamaram os
CAP ITULO II
mouros para a Espanha contra o rei Rodrigo, que caiu na
batalha de Xeres de la Frontera (7 I I). Em breve toda a
CONTROVÉRSIAS TEOLóGICAS
Espanha estava /Ias mãos dos mou ros, exceto as m~ntanhas
do e~tremo norte. Os árabes passaram até os Pireneus,
conqUIstaram Narbo/la, Carcassona e Nim es. Ma s a vitória Vista geral
de C~rlos Martelo, perto de POitiers (732) , pôs lima bar- 432. Depois de algumas tentativas do primeiro teólogo
reira a Inva são. Aos poucos, foram arrojados de novo para cristão, S. Paulo, e dos apologetas, os grandes alexandri-
aquém dos Pireneus. " nos, Clemente e Origenes, tinham procurado criar um sis-
. b. Pelágio, visigodo, organizou desde 718 nas Astú- tema científico da fé. No entanto, só uma Ig reja livre de
nas, a resi~tência; e seu genro, Afonso I (739-57), estabe- perseguições extern as podia reso lver perfeitamente tal pro-
l: ceu deflnlhvamente o reino das Astúrias, enquanto que blema. Só então, os gênios do espírito podiam concentrar
Carlos Magno conquistou o noroeste, fundando a Marca da devidamente as suas aten ções a todos os pontos da doutri-
Espanha .
na cristã. E como O gênio humano tem sempre as suas di-
c. Mas, ainda não tinha chegado o tempo da liberdade ferenças, a solução dos vários problemas não se fez só por-
192 II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão
§ 44. O arianismo 193
meio de pacíficos tratados , mas sobre tudo por meio de vee-
deiro Deus e verdadeiro homem, em uma só pessoa. Mas
mentes controvérsias en t re a s diversas tend ências de subje-
COmo explicar a uniã o das duas naturezas? 2) Nestório,
tivismo e objetivismo, individua lismo c uni ve rsalismo.
a centuando demasiadamente a dualidade das naturezas, che-
433. E stas controvérs ias dog máticas preenchem todo o g ou a dizer que duas eram também as pessoas. A sua dou-
período, e têm muito ma ior al cance do que a s d os sécuios trina foi condenada no concilio de Éfeso (431). 3) Os mo-
anteriores. No meio das lutas, a Igreja, sempre Mestra da nofisitas, pelo contrá rio, acentuan do demasiadamente a uni-
verdade, a ssistida pelo Espiri to Santo, revelou brilhante- dade da pessoa, vieram a negar a dualidad e das nature-
mente a sua missão div ina, dando res posta clara e precisa zas . Esta heres ia foi condenada pelo concilio de Ca lcedô-
às qu estões, que preocupavam todas as classes da socieda - nia (451).4) Os monoteletas, finalment e, aceitando as duas
de e que d iz iam respeito aos pontos mais importa ntes da naturezas, como também a unidade da pessoa, quere ndo ex-
fé cri stã.
plicar a impecabilidade do Hom em-Deus, ensinavam, .qu e
E estas lutas revestem-se de uma nota parti cula r, por- Cristo tinha uma só vontade. O 3.' concilio de Constanltno-
quanto as respecti vas questões não fo ram solucionadas em pia (680-81) lançou-lhes o anátema.
sinodos particulares, como no período anterior, nem pelo
437 . Ao mesmo tempo que no oriente se tratava destas
papa em pessoa, senão por concílios ecumênicos, COil voca- ·
questões teológ icas, mais próprias ao espirito es peculativo
dos pe lo imperado r, reconheci dos e confirmados naturalmen-
te pelo papa. dos ori entais, os ocidentais, mai s inclInados a problemas
,,,- práticos, procuraram dar resposta à questão antropológica
,- 434. As suas definições, os dogmas, ema nam certamen-
ou soteriológic a sobre o estado primitivo do homem, sobre
te do tesouro da revelação , depositado na Sagrada Escritu-
as consequênc ias do pecado original e sobre a relação e~­
ra e na Tra dição eclesiás tica , e são o res ul tado da a ssis-
tre a graça e o livre arbítrio. O ~ e:ros que aquI .. I g r~Ja
tência infalível do Espirito Santo. Mas a graça tem por base
teve d e comba ter foram O pelagIaRlsmo e o s.e mlpelagIa-
liIi a na tureza, quer d izer, a defini ção de um dogma b aseia-se
nismo, e já an tes o donatismo, qu e, de início a penas cisma,
nos tra balhos teológicos dos homens .
e m seguida, ve io a ser heresia.
435. Três ciclos de dogma s esperavam uma solução : No centro destas lutas surge a figura maj estosa de S.
o trinitário, cristológico e antropológ ico. Autes de tudo, os
Agos tinho, Doctor g ratiae. .
teól ogos visavam a solu ção cio problema trinitário, que na
época an terio r não teve resposta satisfatóri a. Com o naqu ele 438. Fora destas grandes controvérsias foram discuti-
tempo, ass im também neste período, trata va- se primeiro da das outras questões de menor importância, que, em. parte,
relação entre o P a i e o Filh o. O arianismo, últim a con se- têm relação com aquelas, em parte, têm origem própna; en-
quênci a da doutrina eb io nitica, en si nava q ue o Filho e ra tre elas contam o originismo e a controvérsia sobre os cha-
criad o pelo Pai. O maeedonianismo estendeu esta doutri na mados "Três Capítulos" .
ao Espirito Santo. Amb os for am conde nados pela Igreja; Em todas estas lutas, a Igreja apresenta-se como ver-
a qu ele, no co ncili cr de Nicéia ( 325) , este, no concilio de dadeira g uarda da revelação, defendendo o depósito da fé
Cons tantinopla ( 38 1). contra as soluções heréticas e conservando fielmente a he-
436. Definid a claramente a doutrina trini tá ria, os teólo- rança que Jesus Cristo e os apóstolos lhe legaram.
gos passa ra m a di rig ir as s uas atenções ao problema cr1s-
tológico, para definir as relações entre a divindade e a hu- § 44. O arianismo
manidade de Jesus Cristo. 439. u. Por slla importâ ncia e pela lógica da sua evo-
Esta controvérsia p ercorreu qnatro fas es : I) Ponto de lução doutrinal, o arianismo é a primeira das heresias desta
partida era a doutiina da Igrej a sobre a div indad e de J es us época. Ataca a doutrina central do cri s tianis~?, pedra de
Cristo, formulada contra o arianismo. Jesus Cris to é verd a- toque no decorrer dos tempos, mas professada Ja por S. Pe-
\,;ompênd lo I - 13
195
§ 44. O arianismo
194 Il época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão
descansou. Ainda antes de chegar a Nicomédia, escreveu uma
dro, quando disse: "Tu és o Cristo, o Filho de Deus vivo" carta ao bispo de Nicomédia, lançando calúnias contra AI~­
(Mt .16, 16). Palavra providencial, que atesta não sómente
xandre e adaptando fórmulas católicas à sua. pr6pna
a ~mdade da na~ureza divina e a filiação natural de jesus
doutrina errónea. Chegado a Nicomédia, fez segUIr a sua
Cnsto, mas tambem a pluralidade das pessoas divinas.
obra principal, T/wlia, em prosa e poesia, para propagar a
.. b. Os judaizantes, primeiros heréticos que negaram a
dIVIndade de jesu~ Cristo, foram vencidos fàcilmente pela sua doutrina.
441. Esta é um orgulhoso racionalismo. Despreza a
autondade dos apos:?los. Os monarquianos dinâmicos, que Tradição eclesiástica e nega o caráter sobrenatural da .dou-
lhes herdaram as Id':las, e os modalistas, que pecaram pelo trina cristã. As teses principais são as segumtes: Ha um
erro oposto, foram Igualmente excluídos da Igreja. Mas o só Deus de unidade absoluta. A ele é essencial o .não s:r
t~mor de recalf no mesmo erro do monarquianismo moda-
criado e o não ser gerado. Daí se segue que o Filho naO
lIsta fez com que não se apagassem todas as dúvidas con-
é Deus. Ele foi criado pela vontade do Pai (noí1JI'-(J.,
tra a doutrina da consubstancialidade e co-eternidade do Fi-
lho com o P~i. O subordinacianismo dos apoIogetas chegou "ríopa rov nat(!6ç, ê; OU" õ.".W)V êarív). Por isto,
a ser negaçao da dlvmdade de jesus Cristo em Paulo de . chama-se a doutrina também exuconclallls mo . Sendo
criado embora antes do tempo, o Filho não é co-etern,?
Sa~ósata, ~estre de Luciano de Antioquia. E o discípulo de
Lucla~o, AfiO, transplantou o subordinacianismo para Ale-
Houv~ um momento em que não existia. Pela mesma raz.ao
não é consubstancial ao' Pai. Todavia, o Filho é supeno.r
x~n~la, centro da erudição helênica e da especulação
a todas as outras criaturas, imediatamente criado pelo Pai;
cnsta.
e criador de todas as outras coisas. Pode ser chamado ate
440. a. Ario, oriundo da Líbia, estudou nas escolas de Deus mas num sentido impróprio. Não é Filho de Deus
Alexandria e. Antioquia. Ele mesmo chama-se discípulo de
:~ segu~do a natureza, mas de adopção. . .
LUCiano. O biSpo Pedro ordenou-o diácono, mas teve de ex- 442. Esta doutrina, embora absurda, espalhou-se rapi-
comungá-lo, em breve, devido à participação no cisma me-
damente, porque, de um lado, gozava dos favo.res da corte
" leclano, .causado pelo bispo Me!écio de Licópolis na Tebai-
da. AqUiles, sucessor de Pedro, reconciliou-o com a Igrei.
imperial e dos origenistas, inimigos do ~a~ehamsmo; de .?~­
tro lado, ressentia-se de elementos gnostrcos e neoplatom-
e ordenou-o sacerdote (312).
cos atraindo assim fàcilmente os que procuravam uma apro-
b. Mas a conversão de Ario não foi sincera. Em 318 xi~ação do cristianismo ao paganismo. O racionalismo da
contradisse, pela prim:ira vez, a seu bispo Alexandre, qu~ teoria ariana dava uma resposta fácil ao problema da re-
pregara sobre a geraçao eterna e a eonsubstancialidade do lação entre o Pai e o Filho; e uma hábil propaganda fez
Filho de Deus, acusando-o de sabelianismo, ou seja de mo- o resto para conquistar multidões de s.equazes. I?urante a
narqulamsmo modalista. Tal acusação projetou uma luz cla- guerra liciniana, Ario voltou a Alexandna, onde nao ~ó me-
ra sobre as verdadeiras idéias do heresiarea. Pois, comba- lecianos, separados do bispo Alexandre, mas. ta~bem c~­
t~ndo o sabelianismo, empregou as mesmas armas que an-
tólicos, clérigos e leigos lhe aderiram. O s.eu pfl~clpal seela-
tigamente tmham usado os monarquianos ebionitas. Acusa- rio, porém, continuou a ser Eusébio de Nlcoméd13, pelo que
do então de heresia e excomungado com seus sectários, con- os arianos, pouco a pouco, passaram a chamar-se de
t\l1UOU, apesar disto, a pregar os seus erros e exereer as fun-
ções sacerdotais, pelo que foi expulso de Alexandria. eusebianos.
443. A controvérsia ia agitando, mais e mais, a socie-
c Retirou-se para junto de seu amigo e condiscípulo dade, quando Constantino, apenas ~e~minada a guerra ~om
EusébIO, bISpo de Nicomédia. O bispo A[exandre escreveu Licínio, interveio para acalmar os ammos e envIou o bIS?O
para pr~ve.nir o seu rebanho e os demais bispos, uma epís: Hósio de Córdova para mediar entre Alexandre e Ano.
tola enclchca (Socr., HE \, 6), explicando os acontecimen- Hósio compreendeu perfeitamente a importância da contro-
tos e comunicando a sua sentença. Mas também Ario não
'3'
196 Il época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão § 44. O arianismo 197

v~~sia, e C.?~stantino, por ele informado, convocou o 1.• con- chamadas "subintroductas", à sagração dos bispos e sua
CIlio ecumemco a celebrar-se em Nicéia (325). O papa Sil- confirmação pelo metropolita, à reconciliação dos excomun-
vestre deu. o seu consentimento, enviando os seus legados, gados, aos direitos patriarcais de Alexandria, Roma e An-
dOIs presblteros romanos, para presidir ao concílio, junta- tioquia e a outros pontos da disciplina eclesiástica. Estes
mente com Hósio. cânones foram declarados, pelo imperador, leis civis e, por
. Estiveram presentes 318 (?) bispos e outros clérigos e isso, chamados "nomocânones" (Eus., Vita 3, 17-21).
leigos (Athan., Ep. ad Afros 2). O próprio Constantino 447. Todas as resoluções do concílio foram quase itnâ-
ab;1U a assembléia, exortando os conciliares a conservar a nimemente aceitas. Só Téonas e Segundo negaram-se a as-
uOldade, e ent;egou ~s negócios aos presidentes (Eus., Vita sinar e com o heresiarca , foram mandados para o dester-
3, 12-13) . Ano, apalado por dezessete bispos eusebianos, rO. !\ :nesma sentença foi aplicada, três meses depois, a
havia .exposto a sua doutrina nas sessões preparatórias. Mas Eusébio de Nicomédia e a Téognis de Nicéia, que tornaram
na pnmeira sessão solene já ningu ém mais ousou defender a defender a Ario e obstina ram-se a não romper as rela-
abertamente as suas opin iões, senão dois bispos da Líbia, ções com os excomun gados. Os escritos de Ario e de seus
Téonas e Segundo.
amigos foram lançados ao fogo.
,. 444. Todavia, seguiram-se longas e aca loradas discus-
sões, nas quais se distinguiram como defensores da orto-
448. A controvérsia estava, pois, resolvida; mas não
est:lVa terminada a luta. Pelo contrário, o zelo que Constan-
~ doxia .os bispos Ma rcelo de Ancira e Eustácio de Antioquia, tino mostrava em executar as disposições do concilio, em
:1' e, mais do que todos, o Jovem diácono Atanásio de Ale- breve arrefeceu, e os hereges conseguiram influenciá-lo,
xandria. Um símbolo, proposto por Eusébio de Nicomédia mais 'e mais. Os desterrados, por mediação de Constância,
I~ Iii e um outro,. redigido por Eusébio de Cesaréia, que por seu; irmã do imperador e viúva de Licínio, voltaram do exílio.
termos podia ser exphcado tanto em sentido ortodoxo co- Eusébio e Téognis foram até reabilitados nas suas sedes.
" ~ ~ em se?tido herético, foram rejeitados. Os padres con- Animados por tal sucesso, empreenderam logo a luta
clhares eXigIram termos claros e precisos. contra a fé nicena, embora só indiretamente, perseguindo
445. Finalmente , foi composto, provàvelm ente por Hósio os defensores da ortodoxia. Já em 330, foi deposto e exi-
e . Atanásio, o símbolo nlceno (OS 54) que definiu e lado Eustácio de Antioquia, med ida esta que acarretou um
fnsou bem claramente a doutrina católica: "Cremos... em longo cisma na Igreja antioquena. Mas o alvo principal dos
um só Senhor Jesus Cristo, Filho unigênito de Deus nas- ódios arianos foi o grande Atanásio, cuja causa , de ora em
cido do Pai, i. é: da substância do Pai, Deus de Deu~, Luz diante, pode ser identificada com a da ortodoxia.
de Luz, verdadeiro Deus de Deus verdad eiro, gerado, não 449. S. Atanásio, nascido em Alexandria, pelo ano de
feito, . consubstancial ( óflooVatoç) ao Pai". Acentua-se 295 estudou na célebre escola da sua cidade natal. Foi
pnnclpalmente esta palavra, negação ma is terminante da ord~nado diácono e logo escolhido para secretário do bispo
heres ia. Toda a Iórmula exprime, do modo mais perfeito, a Alexandre. Este levou-o consigo ao concílio de Nicéia, do
fé ortodoxa: umdade numérica da essência e pluralidade qual veio a ser a alma. Três anos depois, faleceu Alexan-
das pessoas divinas. No fim, foram condenadas as propo- dre e Atanásio foi eleito sucessor. Pelo espaço de quase
slçoes pnnclpals de Ano; e aí existe, infelizmente, meio século, dirigiu, com ânimo inflexivel, os destinos da
um defeito no emprego dos termos ovaía e vn6amatç Igreja do Egito, baluarte inabalável e defensor intrépido da
que se ~omam, como sinônirnos, no sentido de essência, ~ fé nicena.
que podia levar, e, de fa to, levou a desin tcligências. 450. Contra ele dirigiram-se os ataques mais veemen-
446 . O concílio tratou também da celebração da Pás- tes dos arianos. Eusébio não só moveu dúvidas contra a
coa e do cisma meleciano; e redigiu vinte cânones disci- validade da sua eleição e sagração, mas exigiu também que
plinares, que dizem respeito à admissão dos clérigos, às Ario fosse reabilitado na Igreja de Alexandria. Como o he-
198 II época: Desen volvimento da Igreja no império cristão § 44. O arianismo 199

resia~c~ simulasse uma fé ortodoxa, Constantino ordenou a reunidos num s ítlodo " in encaeniis" de Antioquia (341).
AtanasIO que o recebesse na sua comunhão. Atanásio, po- Estes não só negaram obediência ao papa, ma~, propo.ndo
rém, negou-se terminantemente. a um tempo três fórmulas de fé, aumentaram amda mais a
Euséb io, por seu lado, não descansou. Aliou-se Com os confusão.
meleclanos, que leva ntavam contra Atanás io fal sas acu sa - 454. A diversidade das fórmulas manifestou com evi-
ções. Ata~ásio. soube. justificar-se de tal modo, que O im- dência que a heresia começava a dissolver-se. Formava-se .o
perador nao pode deixar de reconhecer a sua inocência. semi-arianismo. Todas as três fórmula s aprOXImam-se, maIs
451. Mas seguiram-se outras calúnias. Acusa ram o bis- ou menos, da fé nicena. Pouco depois, faleceu E usébio, ,des-
po confessor de ter ordenado ao presbítero Macário que de 337 bispo de Constantinopla. A sua morte fOI provavel-
derrubasse o alta r e quebrasse o cálice do sacerdote mele- mente motivo de crescente moderação de uma parte dos seus
Cliln O l sqUlra s. Acusaram -no ainda de ter assassinado o bis- sectários. Numa quarta fórmula antioquena negaram a s pro-
po e~ ipcio Arsênio, igualmente meleciano, de ter cometido posições de Ario, condenadas pelo níceno, deixando, porém,
adulteflos e outros crimes. de lado a p alavra " homousios".
Para responder a estas acusações, o santo teve de com- 455. A confusão dogmática e a s discórd ia s, causadas
pMecer num sinodo de Tiro (335), onde, apesa r da sua pela morte de Eusébio, reclamavam um novo s íno~ o. A pe-
~ bnlhante defesa: foi pronunciada contra ele a deposição. O didos de Constante, imperador do OCIdente, ConstanclO,. s~­
li Imperador, ~ovldo amda por outras maquinações, desterrou nhor do oriente, convocou os bispos a reunir-se em Sar~l­
, I' o grande bISpo para Treve s; julgava talvez não poder, de
outro modo, restabelecer a paz religiosa.
ca (343 ) , a hodierna Sófia na Bulgária, pertencente entao
ao império oriental, mas ao patnarcado de Roma . , .
-. i'; i 452. a. Logo depois desta vitória, os eusebia nos cele- Este sinodo de Sárdica, na intenção do papa JulIO I,
b;aram outro sinodo, em Constantinopla, onde foi deposto ° devia ser ecumênico; mas, por circunstâncias infeliz:s, não
• bISpo Marcelo de Anclra, terceiro defensor do niceno. Acusa- veio a sê-lo . Reuniram-se cerca de 170 biSpos. HoslO fOI
ram-no, infelizmente não sem motivo, de sabelianismo. nomeado presidente. Compareceram também Atanásio e Mar~
b. Mas a s tentativas de Eusébio de reintegrar, finalmen- cela admitidos logo pelos defensores do nlceno. Mas fOI
le, seu amIgo Ano foram frustradas pela Providência divi- este' o motivo de se retirarem 76 bispos eusebianos, que
na. Quando o heres iarca já estava para entra r na ig reja de em filipópolis, como Sócrates escreve ( HE 2, ~O): ou, se-
C?"stantinopla, surpreendeu-o, de repente, uma morte trá- g undo opinião recente, num conciliábulo d~ .Sardlca, pro-
g ica (336; Alh., Ep. ad Ser. de morte Arii, 2-4). Parece nunciaram o anátema, não só contra AtanasIO e Marcelo,
que Conslanlmo, movido pelo fim trágico do herege, resol- mas a té cont ra o papa e os dema is bispos ortodoxos. Os
veu cha~ar do des terro o bispo-confessor. Depois da Sua P adres do concilio legítimo, por seu turno, excomunga ram
morte,. fIzeram-n o seus filhos, cumprindo a última vontade os chefes dos eusebianos, justificaram, mais uma ve~, Ata-
do paI.
nás io e Marcelo, e estabeleceram vinte cânones, a tnbulOdo
453. Mas nem assim descansa ram os eusebianos. No ao papa o direito de apelação e, por consegulllte, o pnmado
novo Imperador do oriente, Constâncio, enconlraram um dó- de jurisd ição (cc . 3-5 ), que os orientais começavam a negar
cd tnstrumento. Atanásio leve de fug ir, nova mente, e reti- (DB 57b-d).
rou-se para Roma, enquanto que o capadócia Gregório, 456. Deste modo, a discórdia se a gravou , ao invés da
aco mpanhado de forças armadas, en trou na cidade e na ca- união que se procurava . Todavia, por influência . de Cons-
tedral de Alexandria. O papa Júlio I (337-52) , porém, de- tante, Atanásio pôde voltar para a sua sede, depOIS da mo~­
clar~u !nJusta .a depo~ição de Atanásio e de Marcelo, cuja te do intru so Gregó rio (t 346). Mas, em 348, os adversa-
profJssao de fe . adnlltla, ao menos, uma interpretação orto- rios fizeram-lhe novas acusações. Escreveu então a sua Ap~­
doxa, e comunIcou a sua sentença aos bispos do o riente, logia contra arian os e, para dar armas também a seus aml-
- 200 II época : Desenvolvimento da Igreja no império cristão
§ 44. O arjanismo
gos, redig iu, dOis anos depois, De decretis Nicaeni synodi. 201
Infelizmente, o imperador católico perdeu, neste ano, trono
- de Libéflo.
. N-ao quis; no entanto, liher-
e vida, e COnstâncio, desde 351 senhor de todo o império, meteu a liberlaçao b ar a sua resistênCIa. do teve
parece ter prOjetado eleva r o arianismo a religião do
Estado. lá-lo, sem antes que r O papa no exílio, q~a~ ou-
Dois anos ji se aChavcaomo se exprime AtanasloH,.e C
457. Logo, 11 0 mesmo ano, reuniu o I.' sínOdo de Sír- mom~nto d~o:f~rmam~no
1 queza
~ist. \~~~;llen;e,
A . 41' I., .
esc.f1tore~ ~blema
um (Alh., e ol que
mio (hoje Mikrovícza) na Panônia, onde então residia. Uma iros I) Não sabemos, porem, s liberiano,
nova fórmula de fé condenava o arianismo puro, mas su- Consl.
h lmp. . d dar resposta ao p .
primia também o "homoúsios ". Atanásio não a recon heceu feito' e antes e tomava o arialllsmo. ,
ten a , o rum o que te Ate
c, par isto, renova ram_se Contra ele os ataques. O papa devemos conhecer!, . enos triunfavam aparentemt:n o . "ho-

~o~ento tinham-~~n~~t~~ ~ Est:rr~ut:


Libério (352-66), em vão, o defendeu. Os sinodos de A rles 4"9 a Os ao Imc d pelejar con r
(353) e Milão (355), constrang idos pOr Constâncio, assi- a est/ : abelianis,:, o.
naram a deposição do intrépido ConfeSsor. Os bispos que se "sios" pretex1ando c .- Como, porem, O d
negavam a reCOnhecer a sentença injusta, como PaUlino de
Treves, o quase centenário Hõsio, Eusébio de VereeI/i, Hi-
mou,
foi para ~11~~li~e,1produto. do SUbJ~t~vl:~~ns
)onlo de umao: .. d'vidiram-se, e-
1 ensinavam que
lário de Poitiers e Dionísio de Milão, foram desterrados. sempre m . ória em vanos par I o _ os anomeus, ex-
~
'i! Um a riano, AUXêncio, foi nomeado bispo de Milão, pois da em
F'lho sua na
vldt a é' semelh ante
. , ao Aécio
Pa i. SdaoA
e n tíoquia e pelos
~ Atanásio viu-se Obrigado a fugir ao deserto, para sal- o I. hefiados pelo dlacon? . Cesaréia. Outros en-
trem istas, c, . de Cizico e AcaclO de . São os homens.
Var a sua vida ; a sua sede foi acintosamente OCupada pelo
bispos EunomlOFilhO é semelhante ao PaI. m dois par-
capadócia Jorge. No exílio, o g rande bispo eSCreveu muitas si navam que o subdivldlTam,se e .
. i~t obras em defesa da verdade, SObretUdo Oratíones quotuor
contra Arianos e Historia Arianoruln. Foi a este tempo que
b Estes, por seu turno, Filho é semelhante ao Pai ~e­
,.. , . . s afirmavam que o . _o estes os homeusla-

~s
tado sob retambém
escreveu a Vida de S. Antônio do Egito e um tra-
a virgindade. 1idos. Un 'neia 011 segundo tudo, ': sa. os chefiados por
ndo a esse seml-anan , b'
gu u menos exalamente: d Constantinopla tam em

I 458. Entretanto, os eusebianos não se deram ainda pa r


contentes. Projetaram atrair à sua causa o próprio bispo de
Roma. Os seus eSforços tiveram por resultado o que cha_
mamos de Questão liberiana. O papa libério resistiu in-
nos o , e Ancira. MacedonlO e
BasIlio d
pertence a eles.
ça só de vontade . ou aç.
Todos
Filho uma semelhan-
ão Acácio de Cesare~
Outros atribuíam ao
estes pa rtidos combatiam-se
"a tornou-se
aCre-
chefe desta seIta . . a sua derrota. . .
flexi velmente às maquinações dos arianos e do imperador,
repreendeu severamente o seu legado, Vicente de Cápua, mente, começando assIm . io (357), os extrem Istas re:
460. No 2. sinodo deegS~~~a sirmíana, pela qual negp~r
0

que no sinodo de Arles assinara a condenação de Atanásio,


e negou aos arianos a comunhão eClesiástica . . . ·uma fórm ula, a s . o homeuslantsmo,
dIgITam t o homousialllsmo e S da Escritura, e
Mas, Certa noite, pelo fim de 355, apareceu em Roma vam igualmente rem estes term as na . aM gra J'à no ano se-
- se encon ra . d ao PaI as,
o eunuco Eusébio que o prendeu e o levou a Milão, onde
nao F'lho subordIna o . Ia fórmula num
residia então o imperador. Tamb ém na presença de Cons_ declararam o 1' 1'anos. condenaram10 aque.
. t Os sem l-ar 3 '1 smodo de Sírmío,
tâncio, Libério mostrou_se intrépido defensor da fé e da cau-
guIO e, . e substituíram-na, I . Filho semelhan-
sa de Atanásio. POr isto, teve de seguir o caminho do exí- sínodo
P de AnclTa sirmiana, declarando o ou-a. Esta
lio para Beréia. Em seu lugar foi sagrado bispo o arcedia_ ela terceira fÓrmula éncia . O imperador aprov das lór-
go Félix, que na série dos papas aparece errôneamente co- P , egundo a ess enão uma
mo Félix. 11. O povo, porém, não reconlloceu o intruso~
e
le ao aI s
fó rmula outra c d ~41
oisa não vem a ser .s m diversas re-
à qual se ajuntara b' 1 o decre-
quando Constâncio, (;111 35 7, visitou a cidade eterna, pro-
mula s anfíoque~~:s :s~embléias conté~ t~~n
soluções de ou .
e
de 268 contra au
d:n Samósata.
to do sínodo antJoqueno
-- /

202 II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristã o


§ 44. O arianismo 203
Deixando de lado o "homoÍls ios", é no resto anti-ariana e
ortodoxa . Igual sorte teve a assembléia de Seleucia. To~os os
conciliares foram obrigados a aceitar a fórmu la de NIce. Só
461. Foi esta a fórmula que O papa Libério teria assi- alguns poucos negaram-se constantemente a reconhecê-la,
nado, como afirma Sozômeno (HE 4, 15) , e com ele ou-
entre eles o papa Libério. S. Jerônimo pôde exclamar com
tros escritores. Outros, porém, o negam. Ma s, ainda que
toda a verdade: " Gemia o orbe todo e admirava-se de se
a ssim fosse, não seria isto um argumento contra a infalibili- ter tornado ariano" (Dia!. adI'. Lucif. 19).
dade do papa; pois Libério não negou o "homoús ios" e
além disso, não se tra ta de uma sentença "ex-ca thedra".' ' 464. Triunfaram, pois, mais uma vez, os antinicenos.
Mas foi também a sua última vitória. Em 361 morreu Cons-
_ . Pelos meados de 358, O papa voltou para Roma. Cons-
tâncio. Juliano Apóstata chamou do exilio todos os dester-
tanclo mand ou que governassem juntos Libéri o e Félix. Mas
o povo não. aceitou a sua ordem (Theod., HE 5, 18) . Félix rados. Ta mbém Atanásio voltou para Alexandria, onde lo-
teve de retirar-se. A lenda deu-lhe errôncamente a honra go celebrou um sínodo (362), condenando novamente o
de mártir. a rianismo. Por sua sáb ia moderação conseguiu também que
muitos heréticos voltassem ao seio da Igreja. No mesmo
462. Constâncio julgava certa a vitória de seu racio-

,,
sentido trabalha ram S. Ciril o de Jerusal ém, os três grandes
nalismo. Par~ .obter, finalmente, uma paz perfeita, quis con-
, 'i: , voca r o concil IO gera l. Como os a nomeus pressentissem uma
grandes bispos da Capadócia, Basilio. ~a gn o, Gregório Na-
zianz eno e Gregório de Nissa, S. Hllano de POlllers e os
provavel união dos semi-arianos com os ortodoxos, aCOn-
, ;f selharam ao. impe;ador, que dividisse o episcopado. Os oci-
papas Libério e Dâmaso I (366-84). A fé nicena ia ganhan-
do terreno em toda parte.
de ntaiS reunlr-SO-Iam em Rimini e os orientais em Seleucia
na Isáuria. ~ assim aconteceu. A fÓrmula a ser proposta aos 465. Entretanto, Atan ásio teve de fugir, mais uma vez,
~ :ilP para os monges do Egito, provàvelmente por motivo a as
ll conCIliares e a chamada quarta sirmiana, obra dos anomeus.
. 'i
Revela-nos toda a insinceridade dos sectários. Mudando as muitas conversões que fazia entre os pagãos. Assim refere
~ozôlI1cno(HE 5, 14). T eodoreto a crescenta que tão gran-
expressões, mantinham a sua doutrina, dizendo ser o Filho
em tudo semelhante ao Pai segundo as Escrituras. O impe- de foi O ódio do Apóstata, que deu ordem de ma tá-lo (HE
rador confirmou a fórmula e cuidou que fosse assinada por 3, 9). Quando, depois da morte de Juliano e do breve rei-
todos os conciliares . nado de jo viano, o imperador Valente, ariano extremista, su-
biu ao trono do oriente, os ortodoxos sofreram a última per-
463. O duplo sinodo rea lizou-se no ano de 359. Em seguição por parle dos sectários de Ario, e com eles também
Rími,:! reuni.ram-se ce rca de 400 bispos, que, com poucas os semi-arianos. Estes inclinaram-se, em gran de parte, a
exceçoes, rejeItaram aquela fórmula, renovaram a decisão aceitar o "hom oúsios" e uniram-se realmente com Libério
nicena e pronuncia ram o anátema contra Os anomeus. Mas (366). Ata násiO, exilado pela quinta vez, fo i em breve cha-
uma pequena minoria se opôs, e quando os legados orto- mado do desterro, porque o decreto de Valente provocara
doxos quiseram apresentar-se ao imperador, nem sequ er fo- no Eo-ito uma ao-itacão ameaçadora. Desde então, aquela
ram admitidos em audiência. Levados à pequena cidade de alma "admirável de Pai da Ig reja egipcia teve paz até à
Nice e atemorizados, a ceitara m uma fórmula de fé que con- morte (t 373) .
diZia melhor com os sentimentos dos extremistas. Esta fór-
muja 'foi cham ada ilnicena
H
, para, corno diz S. Atan ásio en- 466. Va lente morreu trágicamente dura nte a guerra com
ganar os inca utos (clr. Theod., HE 2, 21; Socr., HE 2, os godos; e com ele o arianismo perdeu o último protetor
37). Enganados e atemorizados por embustes violências e no trono imperial. Gracia no, imperador do ocidente, era pro-
ameaças, quase todos os bispos reunidos em Rímini assina- funuamente católico, e, desde logo a seu lado o grande Am-
ram esta fórmula pseudonicena. Só poucos ajuntaram uma brósio trabalhou incans àvelmente para restabelecer a unida-
clâusula condenatória contra o arianismo. de da fé. No oriente, surgira m, depois da morte de Ata-
násio , os o-randes
b neonicenos, Bas ílio Magno, Gregório Na-
204 Jl época : Desenvolvimenfo da Jg reja no imperio cristão
§ 45. O macedonianismo e controvérsias contemporâneas 205
;ianzeno e Gregório de Nissa, que, definindo mais claramen_
e a termmologla (pia oVal t -, , , t o i, ao que parece, o primeiro a pro ferir abertamente esta
contribuíram para a restauraÇãa~ d a12tu; V3w.ataart;j, muito heresia. Depois da sua morte, o bispo Maratônio de Nico-
paz re lIglOsa.
467. Quando, finalmente Teodósio M . média tornou-se seu principal defensor. De ambos a seita
trono imperial do oriente, era' selada a sorteagd': as~bl~ ao dos "pn eumatômacos" herdou os nomes.
Pro.cedeu com figo.' contra a heresia. Em 379, cha~~~"~~:~ O maior adversário da nova heresia foi aquele que já

~~r~~S~~~I~~~;n~ :é S~~t~~~!:co~~d~e
l1a luta ariana tinha sido o mais estrênuo defensor da orto-
Con.stantinopla, a lim doxia, S. Atanásio. Em quatro cartas a Serapião de Tmuis
achavam-se, nesse momento ~inda s as l~reJas da capital (358) defendeu a divindade do Espírito Santo e a sua con-
~~~~~~~~ obrigou os here~es a ;::re;:-~=s d~~d~~,a:~s~ substancialidade com o Filho e com O Pai. O sínodo de
Alexandria de 362 pro nunciou-se no mesmo sentido. Depois
Finalmente, convocou O T de Atanásio, declararam-se contra os macedonianos os gran-
(381 ) h 'd eonel 10 de Constantinopla des bispos da Capadócia, S. Basílio Magno, Gregório Na-
, recon .ecI 0, mais tarde, como 2' ecumênico. Ali f .
zianzeno e Gregório de Nissa, Ambrósio de Milão e outros
aprovad? ~ Olceno e condenado, mais uma vez solenem ~J

,,• •
• ,,,
te, o anamsl11 o, e Com ele também o

cllio l o'
O e
. t i '
t'
tudas as heresias semelhantes O frut pneuma omaqUlsmo e
. e-
o permanente do con-
I o SlnJ 10 o niceno-constantinopolitano
- f .
Padres, como também diversos sinodos, principalmente o
1." concilio de Constantinopla (381) .
470. Este concílio, de inicio, foi apenas um sínodo ge-
raI do oriente. Mais tarde, foi reconhecido como concílio
t I rro n~o ICOU, contudo, inteiramente extirpado An-
es pe o contran o, foi precisam ente nesse tempo qu e ~ollle­ ecumênico, embora não estivesse presente nenhum bispo oci-
çou a a poderar-se dos povos germânicos u " . . . dental, nem o papa Dâmaso enviasse seus representantes.
as suas invasões no lmp' é'
fiO romano.
' q e )a iniCIaram Estiveram presentes 150 bispos o rtodoxos e 36 pn eumatô-
,ii "
macos. Presidiu-o, no princípio, O bispo Melécio de Antio-
Eus., Vita Constarttini. _ Obras d S .
Hetele, Konziliengeschichte J 2 ed e . AtanásIO, PO 25-28. _ quia e, depois da morte dele, S. Gregório Nazianzeno e, fi-
g~sCh.ichte der patristischen ieiÍ ,2 '
~52F S5; - Schwane, Dogmen- nalmente, Netário de Constantinopla .
HIStolre des dogmes JJ. _ Lauche~1 e  h reJ b~rg J895, ~- Tixeront,
191I. - Ehrhord Die kath Kir fi '. \~naslus der Urosse, Koeln 471. a. Os Pa dres conciliares aceitaram, com al gumas
Voeike r, I, 2! í: Die g~ieCh'~h nn d an d,el der .Z~iten und der modificações, o símbolo batismal de S. Epifânío (Ancor.
Bonn 1937. ! e un dle latemtsche Kirche,
119-20) , que reprodu z quase verbalmente o simbolo niceno,
acrescentando no 3' artigo contra os pneumalômacos estas
§ 45. O macedonianismo e controvérsias contemporâneas palavras: "Cremos. " ta mbém no Espirita Santo, que é Se-
468 O maced . . nhor e dá vida, e procede do Pai e do Filho, e com o Pai
gica cO~seqUênCia o:,an~m~ ou mar~tonianislllo foi uma ló- e o filho deve ser adorado e glorificado, e que falou pelos
Ih .. o anal1lsmo. Ano declarara que o F' san los profetas". Acresceram ainda os artigos que dizem
o era cnado do nada, feito pela vontade do P . 1-
respeito à una, sanla Igreja católica, ao batismo para re-
por seu. turno, era o autor de todas as outras cria~~a: ~':' missão dos pecados, à ressurreição dos mortos e à vida
consegulllte, o Espírito Santo devia e . . r
etema .
c:i~tur~ do Filho, inferior a ele. De fa:o' a~~~slderado como b. Deste modo, o s ímbolo " niceno-constantinopolitano"
~'PIO llao se t:llha discutido esta ques tii~, por~u~u:o~~ ~r;n= é a coroaç ão do niceno. Veio a ser reconhecido na Igreja
eresse dos teoJogo s se concentrava n n universal logo que o concílio alcançou foros de sínodo uni-
entre o Pai e o Filho o problema da relação
, começou, pelos meados do século IV versal. Tal aconteceu no oriente no concílio de Calcedõnia
também esta controvérsia a agita r os espIn "t
os . ' (451), e no ocidente um século depois.
469. Macedónio, bispo homeusiano de Constantinopla, c. No entanto, a questão não estava ainda perfeitamen-
te resolvida. Os heréticos tinham ensinado, que só o Pai é
206 II época: Desenv olvimento da Igreja no império cristão
§ 45. O macedonianismo e controvérsias contemporâne as 207
Deus no sentido próprio da palavra, e que o Filho é cria-
tura do Pai, o Espirito Santo,' criatura do Filho. Por isto 475. Em 362, Paulino foi sagrado bispo pelo legado
pontifício Lucifero de Cágliari e, como seu sucessor Evágrio
os Padres de Nícéia acentuaram a consubstancialidade d;
FIlho Com O ~ai, os Padres de Constantinopla, o procedi-
(388-93) , reconhecido no ocidente, enquanto que Melécio e
mento do Esplflto Santo da essência do Pai . Faltava a inda seus sucessores foram reCon hecidos no oriente. E' verdade
que os dois partidos fi zeram um compromisso de se uni-
a resp?sta ao pl~oblema da relação entre o Espírito Santo
rem depois da morte de um dos bispos. Mas o compro-
e ? Filho, questao esta que, mais tarde, daria motivo de
misso não foi observado. O papa Dâma so I, movido por
acerrlmas controvérsias entre as Igrejas oriental e ocidental.
Basílio Magno, começou, desde 375, a inclinar-se para o la-
~72. !'lo concil~o de Constantinopla foram redigidos ain- do dos melecianos. Não obstante, prolongou-se a cisão até
da tres ca nones, nao reconhecidos, porém, pela Igreja oci- ao ano de 415. Os últimos eustacianos unira m-se pelo anO
dental. Um deles. tratava do patriarca de Cons tantinopla, de 482.
ao qual se atribUla. uma primazia de honra logo depois do
476. O cisma romano o u feliciano. - Quan do o papa
bISpo de Roma; maIS um passo para o futuro cisma oriental.
Libério, no ano de 355, foi desterrado para Beréia, o clero
A luta arian a teve por

,
473. O cisma antíoqueno. - romano jurou-lhe fidelidade. T odavia, quando à propos ta
consequênCIa dIversas controvérsias e cismas particularmen_ de Constâncio foi sagrado bispo Félix !l, a maioria do
• te os dois cismas antioqueno e romano. Qu~ndo em 330 o clero reconheceu o in truso. O povo, porém, ficou fiel a li-
bi~po . Eustácio de Antioquia foi depos to e dest~rrado, u;"a bério e, quando este, depois de três anos, voltou do seu des-
mlnona da comunidade antioqu ena lhe ficou fiel, não reco- terro, Félix teve de deixar o seu posto. Depois de uma ten-
n.hecendo os . bispos arianos que lhe sucederam. Estes eusta- tativa frus tra da de reconquistar a sé apostólica , morreu no
clanos, ChefIados pelo presbítero Paulino, mantiveram-se esqu ecimento (355). .
também depois da m~rte do bispo exilado. A maioria seguiu, Es tes fatos históricos foram, em seguida, obscureCIdos
por~m, aos bISpos ananos, embora muitos não professassem pela lenda que fez de Libério um herege e de Félix um papa
a te anana.
legítimo e santo.
474. Em 350, arianos e ortodoxos nã o-eustacianos ele- 477. Libério acolheu com clemência a quantos felicia-
geram, d e comum acordo, a Melécio, até então bispo de Se-
nos a ele se reuniram arrependidos. Es te seu proceder in-
baste, Julgando cada um dos partidos ser Melécio parti dá-
dulgente deu motivo a um novo conflito. Logo depoi~ da
no do seu credo. No entanto, já no discurso inaugural, o sua morte, foi eleito pela maioria do clero o papa D a~a-
novo bISpo manifestou-se, no essencial, partidário da fé ni- 50 I (366-84) . Mas, um partido rigorista opôs-lhe o anhpa-
cena. P~r isto, foi deposto pelo imperador Cons tâncio. Mui- pa Ursino . Este foi desterrado, no ano seguinte, para Co-
t?S, por~m, conservaram-lhe fidelidade, e, no reinado de Ju-
lIano, pode voltar à sua sede. lônia. Contudo, passaram ainda quinze anos, sem que ces-
sassem de todo os distúrbios .
. Os melecianos procuraram então unir-se cam os eus-
taClanos. Mas , como Melécio fosse eleito por arianos, os 478. Cisma (uciferiano. - O bispo Lucifero de Cágliari
eustaClanos negaram-lhe o reconhecimento. A isto os levou na Sardenha defensor apaixonado do níceno, foi desterra--
também o emprego diferente da terminologia teológica . Pau- do por Constâncio. No ex ílio dirigiu diversos escrit~s. polê-
Imo, tomando a palavra "hypóstasis" no sentido de essên- micos ao imperador (PL 13). Em 362, sagrou preCIpitada-
CIa, como os nicenos primitivos, ensinava uma hipóstase em mente o presbí tero Paulino para bispo dos eustacianos e não
Deus, enquanto que Melécio, tomando a palavra no sentido aprovou a indulgência que S. Atanásio mostrava aos h~­
de pessoa, como os neonicenos, ensinava três hipóstases. meusianos no sínodo do mesmo ano, que, por sua vez, nao
~sslm a conteceu ~ue, ao lado do arianismo, havia, em An- aprovava ~ sagração de Paulino. Lucifero sep~r?u-se então
1J0qula, dOIS partidos ortodoxos (cisma meleciano). dos outros bispos católicos. O cisma teve sectanos n~ S~r­
denha e na Espanha. No século V, desapareceu da hlst6na.
208 11 época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão § 46. O a polin arismo e a co ntrovérsia nestoriana 209
479. Marcelo de Ancira distinguira-se igualmente na lu- (' xcomun "'ou a seita . O usurpador Máximo fez executar a
ta contra os arianos. Mas a sua doutrina trinitária ressente-
I'riscilia;o e alauns sectários (385 ) ; e é este o primeiro
se de sabelianismo. A divindade lhe é uma mônade; Só pela
exempl o da pcn: capital aplicada a um herege. Alguns bis-
economia da salvação é que vem a ser uma trindade. Pela
pos ap rova ram-na . Mas S. Martinho de Tours protestou.
criação, o Logos, impessoal , emanou do Pai e tornou-se pes-
S. Ambrósio e o pa pa S irício condenaram a sentença .
soa pela encarnação. O Espírito Santo procedeu do P a i e
A seita, no entan to, multiplicou-se, e a invasão dos po-
do Filho no momento em que desceu sobre os apóstolos.
vos germânicos favoreceu a sua difusão . Só desde o s ínodo
No fim do mundo, o Filho e o Espírito Santo torna rão a
ser com o Pai uma e a mesma pessoa. de B'ra ga de 561, começou a desaparece r da his tória. Restos
do priscilia nismo conserva ram-se aínda por longos .séculos.
Condenado já p elos arianos, Marcelo viu-se, em segui-
da, aba ndonado ta mbém pelos o rtodoxos, sobre tudo, quando Adopcia nismo e ca tarismo ressentem-se de sua s Idéias .
Fotino de Sírmío, discípulo de Marcelo, transformou a sua Hefele Konziliengeschichte li 1 55. - Tix cront, Histoire des
doutrina em monarquianismo ebionitico. dogmes II ,' 67 55; 231 S5. - Cavdlera, Le schisme d'Anti oche, Paris
1905. - Fllnk, Abhandlungen und Untersuch. I 39 1 ss. - Th o e~n e l/,
480. Os messalianos ou ora ntes ou euquitas, espécie de Studia Luciferiana, Uppsa la 1934. - Babut, Pnscllilen et le Prlscll~

,
• ." ,
quietistas, influenciados provà velmente pelos maniqueus,
viam na oração contínua o único meio da salvação . P elos
meados do século IV, espalharam-se na Mesopotâmia e, mais
tarde, na Asia Meno r. O concílio de Éfeso lançou contra
Jiani s me, Paris 1909.

§ 46. O apolinarismo e a controvérsia nestoriana


484. a. O arianismo não SÓ negara a divindade do Lo-
eles o anátema . T odavia, ma ntiveram-se, ao que. parece, até
à idade-média. gos, ma s também a alma huma na em Jesus Cristo. Deste
modo, a ntolhou-se, já aos teólogos nicenos , o problema d.a
481. Os antidicomarianitas neg avam a virgindade de relação entre a na tureza divina e humana em Cristo. Mai S
Maria Santíssima e afirmavam que ela tinha mais de um conc reta mente a presentou-se o probl ema aos teólogos pos te-
filh o, fruto da união com S. José. Os cOloridianos, pelo Co n- riores. Da sua solução depende outro, O problema da
trário, adoravam Maria Santíssima como deusa, dedicando- salvaç ão .
lhe uma liturgia própria, com sacrifícios de bolos (xo}) .OQí-
lo, Apolinário de Laod icé ia (t 392 ) , a liás um dos pri n-
Oe". A seita teve origem na Arábia, e compunha-se quase
exclusivamente de mulheres, que se diziam sacerdotisas de
cipais defensores da fé nicena, julgav~ não p ode r salvar a
Maria. perfeita divind a de de Jesus Cristo, senao sacnflcan do a per-
feita human idade. Concordava, nes te ponto, ao menos em
482. Os sectá rios de Aério, diácono de Se bas te, nega- par te, com os a ria nos. Ens inando a tricotomia platônica ,
vam a distinção entre bispos, sacerdotes e diáconos, como concedia a Cristo só a a lma sen sitiva, negando-lh e a alma
também a utilidade da oração e das boas obras pelos racional , substituída, como dizia, pelo Logos , Parecia~lhe
defuntos.
necessá ria tal modificação da na tureza humana de Cnsto,
483. Prisciliano, leigo rico, asceta, erudito da Espanha, para comp ree nder tanto a impeca bilidade, como també~n
fund ou, no último qua rtel do século IV, uma seita seme- a unidade da sua pessoa. P ois onde há um homem perfei-
lhante ao montanismo, misturada com elementos maniqueus. to, dizia, há tam bém pecado ; e como o p ecado tem a sua
Negava a criação do mundo por Deus, a unidade do Deus ori gem na von tade, ou seja na a lma humana, esta deve ser
do Novo e do Antigo Testamento, a ressurreição da carne negada em Jesus Cristo. Além disso, Apolinário identifica-
e o matrim ónio. A sua doutrina trinitária é sabeliana, a sua va a na tu re za e a pessoa, c di zia que dOIS Se res perfeItos,
'cristolog ia, docética.
Deus c homem, não podem fundir-se num só; e m Cris to há,
Sagrado bispo de Avila, espalhou a sua doutrina na
porta nto, uma pessoa e ta mbém uma só natureza. . ..
Espanha e na Aquitânia. Mas o sínodo de Saragoça (380)
c. Aqui já encontramo s a doutrina do monoltslltsmo.
Comp ê nd Io I - H
210 II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão
§ 46. O apolinarismo e a controvérsia nestoriana 211
Considerando-a, o concilio de Constantinopla de 38 I, mais
pies bispo quem falava; mas foi aquele que se considerava
uma vez, definiu: Jesus Cristo é verdadeiro Deus e verda-
como primeiro bispo depois do de Roma.
deiro homem; e no seu I' cânon lançou o anátema contra os
apolinaristas. Mas, logo, povo e clero levantaram-se em defesa da
Mãe de Deus. Também bispos vizinhos, como Proclo de
485. Surgia agora a questão sobre o modo de se uni- Cizico e Eusébio, mais tarde bispo de Dorileu, pregavam
rem as duas naturezas para formar o Homem-Deus. Duas
contra o heresiarca. Mais do que todos, porém, censurava
respostas errôneas foram dadas, uma pela escola antioque-
S. Cirilo de Alexandria (412-44) a heresia, primeiro numa
na, outra pela escola alexandrina. Ambas visavam, em opo-
carta pascoal aos bispos do Egito e numa encíclica aos mon-
sição a Apolinário, salvaguardar a perfeita humanidade e,
ges egípcios. Em seguida, dirigíu também duas c~rtas a
em oposição ao arianismo, a perfeita divindade. Na solução
Nestório, procurando convencê-lo do erro. Mas, em vao. Am-
do problema, as duas escolas seguiram rumos opostos. A
bos dirigiram-se então ao papa.
escola alexandrina , acentuando demasiadamente a unidade
da pessoa, chegou a afirmar a unidade da natureza, o mo- 489. a. Celestino I (422-32) convocou um sinodo para
nofisitismo. A escola antioquena, acentuando demasiadamen- Roma (430), que se pronunciou contra Nestóri?,. ame~çan­
te a dualidade da natureza, acabou por ensinar a dualidade do-o da excomunhão, se não se retratasse. Cmlo fOI en-
de pessoa, o nestorianismo. carregado de executar a sentença; e lixou a Nestório um
prazo de dez dias para se retratar. Num símbolo. e em
486. A escola antioquena é representada pelos mais
acres adversários de Apolinário, Diodoro de Tarso e seu doze anatematismos expôs, ao mesmo tempo, a doutnna ca-
discípulo Teodoro de Mopsvéstia (t 428). Teodoro ensi- tólica e enviou-os a Nestório, para que os assinasse.
nava : as duas naturezas perfeitas de Jesus Cristo não se b. Mas Nestório tinha a seu lado o imperador Teodó-
confundem, mas são unidas só externamente. Ora, segundo sio II, e a escola antioquena Com o patriarca João de An-
o princípio aristotélico, a natureza não é perfeita sem ser, tioquia e O douto Teodoreto, bispo de .Ciro, e est~va, por
ao mesmo tempo, pessoa. Logo, existem em Cristo duas isso, bem longe de aceitar os anatemallsrnos de Cmlo. Os
pessoas, uma divina, outra humana . antioquenos opuseram-lhes, pelo contrário: doze contra-~n~­
Sendo assim, não pode haver verdadeira redenção, por- tematismos, acusando Cirilo de apolll1ansmo ou de diSSI-
que não há verdadeira encarnação do Logos, senão uma sim- mulado monofisitismo, porqu e ensinava uma união natural
em Cristo. Tal expressão podia despertar a indignação dos
ples bOÍl"latÇ. O Logos está no homem Cristo como a
antioquenos, qu e a tomavam no sentido d.e união e".' uma
estátua no templo. Daí segue-se que Maria não pode ser
só natureza. Mas Cirilo a tomava no senlldo de ulllao das
chamada verdadeira Mãe de Deus, .JwT6"oç mas sim- naturezas. E João de Anti oquia parece não ter duvidado se-
plesmente mãe do homem Cristo.
riamente da ortodoxia de Cirilo. Aconselhou até a Nestório
487. Esta heresia, a princípio só doutrina dos teólo- que aceitasse com a maioria dos Padres o "theotókos".
gos da escola antioquena, começou a inquietar os arlimos,
490. a. No entanto, o patriarca de Constantinopla e seus
quando Nestório, discípulo de Teodoro e monge de Antio-
s ectários já tinham conseguido de Teodósio " a convoca-
quia, foi elevado à sede patriarcal de Constantinopla (428).
ção do concílio de Éfeso (431), que veio a ser um ve.r?a-
Ocasião da controvérsia foi um sermão do presbítero Anas-
deiro triunfo da Mãe de Deus. Estavam presentes S. Cmlo,
tácio, que negava a Maria o titulo de Iheotókos, causando
com cinquenta bispos do Egito, Agamem non de Efeso com
uma grave agitação entre o povo. Nestório defendeu o pre-
quarenta sufragâneos e doze bispos da Pantília, e muitos
gador, dizendo que de Maria nasceu só o homem Cristo, e
outros. João de Antioquia retardou, de propÓSitO, a sua che-
negando a "communicatio ideomatum".
o-ada por não querer assistir à condenação de seu amigo
488. A atitude de Nestório foi extremamente perigosa. Nestório. Nem os legados pontifícios chegaram a tempo,
Já n.'io era um simples sacerdote como Ario, nem um sim- retidos por violenta borrasca. Por isto, Cirilo, sentindo-se
14'
212 II época: Desenvolvimento da Igreja no· império cristão § 46. O apol inarismo e a controv érsia nes10rian a 21 3

como represen tan te do papa, declarou, finalmente, aberto o depois, a Cirilo uma fórmula de fé ortodoxa, o chamado
C?ncílio, apesar dos protestos do comissá rio imperial, Candi- simbolo efesino, restabelecendo-se assim, ao menos em ge-
dlano, e de numerosos bispos. rai, a paz reli giosa .
b. O concílio teve lugar na basílica mariana de Éfeso. Mas com a reconciliação de Ciril o e João não termi-
Nestórío, que viera a Éfeso com dezesseís suf ragâneos foi nou ainda completamente o conflito. Muitos a ntioquenos se-
por três vezes, convidad o a comparecer; mas em vã;. O~ pararam-se de JO&O, pelo que este, apoiado pelo imperador,
198 conciliares começaram, por is to, os seus tra balhos. Con- procede:1 COl1tía eles com rigor. Nefl assim submeteram-se
s ultaram os Santos Padres e as atas dos concílios anterio- todos. C OI710 os livros de Nestório ti ve~ise m sido quei mados ,
res, verificara m o erro de Nestório e frisa ram bem 'c1ara a propa ga ram os escritos de Diodoro de Tarso e de Teodo-
dout rina católica: Jesus Cr isto é verdadeiro Deus e verda- rO d ~ I.~ opsvés tia. Edessa ficou sendo o centro da agitação_
deiro homem. De Maria não nasceu a divindade, mas tam - Rabulas, bispo desta ci dade , OS combateu, e o imperador
pouco a s imples humanidade. O que dela nasce u é a se- Zenão (474-9 1) fechou a sua escola (489). Supri midos no
gund a pessoa da Sa ntí ssima T rindad e, verdadeiro Deus. Fi- impé rio, os nestorianos emigraram para a Pérsia, onde o
nalmen te, o heresiarca foi deposto e excomungado. O povo bispo Ba rsu mas de Nisibi s (450-95 ) foi seu primeiro chefe.

,
,
cristão jubilava (Cyr., Ep. ad Alexandr.; L III, 533; 574 ).
49 1. a. Mas o júbilo dos católicos transfo rmou-se, bem
depressa, em tris teza e aflição. Pois, chegado, enfim, João
O metropolita Babeus de Seleucia Ctesifonte (497-503) se-
pa rou-se form almente da Igreja do império, formando uma
Igreja nacional-persa e chamando-se a si mesmo de (patriar-
ca) "católico" .
l' de Antioquia, este celebrou com os seus quarenta e três bis-
pos um conciliábul o, condenando o concílio feito e decla- 493 . A heresia difundiu-se, em seguida, na Arábia e
rando depostos Ci rilo e Agamem non. Candidiano, com issá- 110 sul e leste da Ásia , chegando até às índias e à China.
rio imperial, passou para O seu lado e escreveu a Teodósio Só no século XIV, começou a dissolver-se rápida e constan-
, ,#\ II a favor dos antioquenos. temente, devido às crueldades dos mongóis e às persegui-
b. Ciril o, porém, abriu a segunda sessão, na qual to- ções do islão. Muitos também voltaram ao seio da Igreja.
maram parte também os legados pontifícios que, depois de Uns cem mil nestorianos mantiveram-se no Kurdistão até aos
terem recebIdo as atas, aprovaram o concílio, anularam a nossos dia s. O patriarca era , até 1919, ao mesmo fempo,
s~nte n ça de_ João e° excomungaram. Ambos os partidos en- seu chefe politico. Mas durante a pri meira guerra mundial
vI~ ra m entao relações ao imperador, que, depois de longas sofreram basta nte e, em 1933, foram dizima dos cruelmente
dUVidas e heSitações, movido especialmente por sua irmã pelos maometanos do Irak.
Pulqu éria, confirmou, fin a lmente, as decisões do con cílio le- Fora deles existem outros tanto s "cristãos caldaicos",
gítimo. Nestó rio foi condenado a retirar-se pa ra o seu mos- unidos com Roma. Também os cristãos de S. Tomé, que ou-
teiro. Mais tarde, fo i desterrado para O Egito (1- 45 1), e trora se tinham un ido aos nestoriano" voltara m quase todos
seus escntos, lançados ao fogo. (c. 530.000 ) à uni ão com Roma .
. c. O infeliz patriarca foi uma figura trágica. Sem dú- H efele, Konziliengeschich te II, J41 55. - Tix eronl, Histoi re des
vida, podemos conceder-lhe uma boa intenção. Pouco antes dogmes II, 94 55; III , 11 55. - Vo;sin, L'Apollinarisme, Paris 100 1.
da sua morte, acusando, mais uma vez, O con cílio de Éfeso, _ Lielzmann, Apollin aris von Laodi cea und se ine SChule, Tuebingen
1904. - Norwood, The Heresy 01 Anlioch, New York 1929. - lo/y,
atestou a sua fé ortodoxa, empregando no fim palavras co- Theotokos apres le Concile d'Éph ese, Paris 1932. - A. d'Ale s, Le
moventes de reconci liação e de carida de para com os seus dogme d'Éphese, Pari s 1931. - Hayes, L'école d' Édesse, Paris 1930.
adversá rios. _ Dencl/e, Scholastik 1933, 64 ss; 203 55. - Pesch. Zur neueren
Literatur ueber Nestorius (115. Erg.-heft zu StML), Freiburg 19 14.
492. Os antioquenos, por seu lado, protestaram contra - Ehrhard, Die kath. Kirche im ' Va ndel der Zeiten un d Voelker,
a depos ição de Nestório. Vendo-se, porém, abandonado por I, 2, 1).
quase todas as Igrejas, João de Antioquia enviou, dois anos
214 II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão § 47. O monofisitismo 215

§ 47. O monQfisitismo monges que consigo trouxera, f ez se nt"r


I bruscamente a Fla-
494. Na luta contra Nestório foi estabelecida a unlao viana a sua vingança. .
das duas naturezas de Jesus Cristo em uma só pessoa teân- b. As cartas do papa nem sequ,:r foram hdas. C?nçe-
drica, ou seja o dogma da união hipostática. Mas alguns deu-se a pa lavra a êutiques, mas nao a seus adversanos.
anti-nestorianos, chefiados por Êutiques, arquimandrita de 8 11tiques foi, como era de prever-se, decl~rado ortodoxo,
Constantinopla, caíram no extremo oposto. Acentuando de- porque afirmava admitir as definições do nlceno e do efe-
masiadamente a unidade da pessoa e a natureza divina de s ino. Flaviano e Eusébio foram depostos. A ~esma sorte
Cristo, Eutiques ensinava: só antes da união da divindade coube a oulros bispos que se tinham pronu nCiado contra
com a humanidade podem admitir-se duas naturezas de e utiques, ou passavam por nestorianos: co~o Teodor:t~ de
Cristo. Depois da união não há senão uma só natureza. As C o Ibas de Edessa e Domno de AnllOqula. Dos 130 con-
duas naturezas confundem-se em uma só, ou transforma- se Cj~~a~es que se achavam presentes, muitos assinaram a seu-
a natureza humana na divina. t t s toram maltralados outros se esconderam. Fla-
cnçal ou ro ' A . da violên
Esta doutrina outra coisa não veni a ser, senão a cris- via no, em breve, veio a falecer e~ ,C?llsequencla s -
tologia extremista de Alexandria. Ela acentua o que em Cris- cias "ue sofreu. Os legados ponllflclOs levantaram em pro-

,
ii' ,,-." .

,
'
i~ '
to é divino; e daí se explica a sua vasta aceitação. Veio
a ser a heresia mais popular do oriente.
495. Contra eutiques surgiram logo os bispos Eusébio
de Dorileu e Teodoreto de Ciro. Mas o maior defensor da
testo:' sua voz; ~as em vão. Só pela fuga esc~param dos
tormentos. Teodósio II confirmou as atas .do s~,nodo. ~a,~
o papa condenou a assembléia, chamando~a de \atr oc!n~~_
(Ep. 95, 2). Dióscoro, por sua vez, exc\ullI o papa da
fé católica contra o monofisitismo foi S. Flaviano, patriarca munhão eclesiástica.
de Constantinopla. Convocou os bispos, que no mom ento se 497. Mas não durou muito o triunfo dos hereges. O
achavam na capital, para um sínodo (448). pelo qual o he- papa apenas recebida notícia daquelas cenas horrendas, ce-
resiarca foi deposto e excomungado. lebro~ um sínodo, anulou Iodas as atas de Éfeso, e eSCre-
eu tiques, porém, protestou contra a sentença e escre- veu cartas cheias de autoridade ao Imperador, e negou-se
veu cartas ao papa, a Dióscoro, patriarca de Alexandria, su- a aprovar Anatólio, que linha sido nomeado sucessor de Fla-
CeSSor indigno de Cirilo, e especialmente à corte imperial, yiano (Epp. 43 ss).
onde Flaviano tinha não poucos inimigos. O próprio impe- Quase ao mesmo tempo, houve uma grande mudança
rador, influenciado pe lo partido eutiquiano, escreveu uma na corte imperial. S. Pulquéria foi proclamada Augusta.
carta ao papa a favor do arqu imandrita. Leão I (440-61) , Morreu, pouco depois, Teodós io lI , e MarCiano (45~-57),
entretanto, ordenou que Se lhe enviassem as atas do síno- general valente e cristão ortodoxo, obteve com a mao de
do e, depois de as ter estudado, escreve" a sua Célebre Pulquéria a coroa imperial. Logo os desterrados. voltaram
Epístola dogmalica ad Flavíanum (PL 54, 755 A ss), ex- a sua s , e muitos renegados
sedes . tornaram a. unir-se
I d com,_
plicação cla ra e nítida da doutrina católica sobre as duas Roma. Também Anatólia pronunCiOu-se pela Eplsto a . ogm,.
naturezas de Jesus Cristo e a sua relação recíp roca. tica de Leão I e foi reconhecido pelo papa como bISpo de
Constantinopla.
496. a. No entanto, a pedido de futiques e seus sectá-
498. a. Leão I reclamara, em cartas a T eodósio ~I. e
rios, Teodósio 11 convocou Um si nodo para Éfeso (449),
Pulquéria, a reunião de um concílio a rea~lzar-se. na [ta"a.
confiando a presidência a Di6scoro, desde muito sectári o do
Satisfeito pela mudança, julgou desnece~~ano e moportuno
monofisitismo e rival de Flaviano. Leão 1, só de mau gra-
tal concílio Porém, o nOvo imperador, la antes de rec~~~r
do, enviou os seus legados para presidirem ao sínodo. Diós-
a carta do 'papa, convocara os bis pos, primeiro para N,eela
Coro, não querendo entregar-lhes a presidência , desde o prin-
e depois para Calcedônia. , . .
cípio violou todas as formalidades e, apoiado por seus 200
b. Este concilio de Calcedônia, o 4' ecumenIco, fOI com
216 II época : Desenvolvimento da Igreja no império cristão § 47. O rn ono fisitis mo 2t7

seus 630 conciliares o mais concorrido da antiguidade. Tam- sa, quando Pedro Mongo ocupou a sede patriarcal de Ale-
bém o papa enviou , embora de mau grado, os seus legados xandria (481).
na qualidade de presidentes. Marciano e Pulquêria tomaram 501. Juntamente com Acácio de Constantinopla, o novO
Igualmen te parte nas sessões, ou em pessoa ou por seus patriarca alexandrino redigiu uma fórmula de união, cha-
oficiais. Na 6' sessão, a própria imperatriz teve a presidên- mada "henólicon" (482) , pela qual julga va poder restabe-
cia de honra . lecer a lmião dos monofisitas. Condenava Nestório e Êuti-·
499. a. Foram lidas duas cartas de Cirilo de Alexan- ques, mas indiretamente também o concilio de Calcedônia.
dria e, principalmente, a Epístola dogmática de Leão I, que Proibia que se fala sse de uma Ou de duas naturezas e não
se escutou COm verdadeira emoção, acla mada pelos conci- permitia senão o simbolo niceno-cons tan tinopolitano. O im-
1:2res: E' esta a fé elos Padres, a fé dos após tolos, assim
I< perador Zenão (474-91) publicou o " henóticon" como lei,
cremos todos nós . Pedro falou pela boca de Leão" . Em se - vi sa ndo restabelecer assim a união religiosa.
g uida, foram reconhecidos como ecumênicos os concílios de Mas, na realidade, a fó rmu la de uni ão não serviu se-
Nicéia , Con stantin opla e Éfeso, aprovad os os dois s imbo- não pa ra aumentar a confusão e a s discórdias. Não só os
los de Nicéia e Constantinopla, an uladas as sessões cio la- catóJicos, mas também os monofi sitas rigorosos repeliram-
trocinio, e foi deposto o patriarca Dióscoro. na e sepa raram-se do seu bispo Man go, pelo qu e se chama-
, ..' b. Na base da Epistola dogmalica foi redigida uma vam "acéfalos" . O chefe dos catóiícos, Talaja , fu giu para
nova profissã o de fé que definiu claramente a doutrina ca- junto do pa?a Félix II (483-92) ; e este excomun gou am-
tólica: " Um e o mesmo Filho unigênito, Jesus Cristo, Se- bos os patriarcas , o que teve po r co nsequên cia um rompi-
nhor nosso, cm duas naturezas, consubs tancial ao Pai se- mento entre o o riente e o ocidente.
gundo a divindade e consubstancial aos homens segundo a 502. O cisma acaciano, iniciad o em 484, prolongou-se
humanidade, sem confusão (contra €utiques), nem transfor- por todo o reinado do impera do r Anastácio (49 1-5 18). As
mação (contra Dióscoro) , sem divisão nem separação (con- tentativas de reun ião que se fizeram não surtiram efeito,
tra Nestório; DB 148). No fim ajuntaram-se 28 cânones, porque o impe rador s impat iza va com os mo nofi s itas. Depois
renovando e aumentando, no câl1. 28, os direitos, que O de 35 anos, Justino I (518-27) restabel eceu, finalm ente, a
concilio de Constantinopla concedera ao patriarca da capi- união Com Roma (519). O papa f1 0rmisdas (5 14-23 ) man-
tal. Mas os legados pontificios protestara m, e o papa só dou-lh e, Como fórmula de união, o Ubetlus tidei, que todos
aprovou as definições dog máticas do concilio. os bispos tiveram que assinar. Nesta fórmula acentuavam-
se o primado e a infalihilidade da Sé apostólica e prome-
500. Ma rciano, por seu lado, condenou Dióscoro e IÔu-
tia-se obediência às suas decisões (DB 171 ).
tiques ao des terro e publicou severos decretos contra os
sectários. Todavia, o monofisitismo perdurou, e os seus par- 503. Infelizmente, Teodora, filha de Acácio e esposa do
imperador Justiniano J (527-65), era sectária do ll1onofi-
tidários chegaram até a apoderar-se, por algum tempo, de
sitismo, e por suas intrigas consegu iu a elevação de Ânti-
todos os patriarcados do orien te.
mo, monofi sita di sfarçado, à sede patriarcal de Constanti-
E' verdade que, como Marciano, assim também seu su- nopla (535). E quando, no ano segllinte, Ântimo foi depos-
cessor Leão J (457-74) apoiou a ortodoxia. Po r isto, os to pela influência do papa Agapito I (535-36) , a impera-
três pa triarcas monofisitas, Teodósio de Jerusa lém , Pedro triz, irritada, fo rmou o plano de implantar a heresia na pró-
Eluro de Al exandria, e Pedro Fulo de Antioquia, não con- pria residên cia do papa.
seguiram manter-se na sua sede. Mas, depois da morte de 504. a. Agapito fora enviado pelo rei ostrogodo Teo-
Leão I, o usurpador monofisita Basilisco (475-76) reinte- dahado à corte bizantina para estipular a paz com Justi-
grou Eluro e Fulo e anatematizou a Epístola dogmálíca do niano. Ali morreu repentina mente. Teodahado deu-lhe um
papa Leão J; e ainda maior perigo ameaçou a paz religio- sucessor na pessoa de Silvério (536-37), devidamente eleito·
'218 II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão § 48. O mono tele tis mo 2t9

e universa lmente reconhecido. Foi en tão que o general Be- ca se conseguiu completamente a sua conversão. Quando,
lisário se apoderou de Roma. no século Vii , os maometanos conquistaram as províncias da
b. Na corte bizantina achava-se o ambicioso diácono Palestina, da Siria e do Egito, formaram-se nelas Igrejas
Vigílio, na qualidade de apocrisiário. Aceitou a proposta que n~cion ais.
Teodora lhe fez de a poíar as suas tendências monofisitas e Na Síria conseguiu Jacob Barádai, bispo de Edessa
de conquis tar em troca a cátedra de S. Pedro. Belisário re- (541-78), dar aos seus sectários uma organização, e dele
cebeu ordens neste sentido. O papa Silvério foi acusado de herdaram o no me de Jaco bitas. Antioquia veio a ser centro
conspi rar com os godos, preso e exilado para a ilha Palmé- desta Igreja. No Egito receberam o nome de "coptas", i. é,
ria, onde em breve ve io a fale cer de fome e esgotamento. antigos cris tãos egípcios.
Entretanto, Vigília (537-55), uma vez reconhecido Como pa- Entre os jacobitas ho uve, durante os últimos decênios,
pa legítim o, mostrou-se desde logo perfeitamente ortodoxo, muitas conversões. No Egito existem atualmente cerca de um
e não cumpriu as promessas, feita s à impera triz. Nas suas milhão de coptas cismáticos. Uns 35 mil uniram-se com Ro-
cartas ao imperador e ao patriarca Menas pronun ciou-se ma . Os monofisitas ar mênios têm a sua sede patríarcal em
claramente contra o monofi sitismo. Mais tard e, expiaria a Etschm iadz in, no Cáucaso. Ta mbém na Abiss ínia formoLl-

.
,,,,',
sua ambição com dolorosos sofrimentos.
505. a. Todavia, a heresia manteve-se, sobretudo na Ar-
mênia, na Síria, no Egito e na Abi ssinia. Mas os seus adeptos
se uma Ig reja monofisita à parte .
Hefele , Konziliengeschicnte II, -313 55. - Tixeron/, Histoire des
dogmes III , 80 58. - Regnier, San Leone Magno, tr ad. do francês,
divid iram-se em várias seitas. As seitas principais foram a s Homa 1912.
dos severianos e dos julianistas, criações dos bispos Seve- § 48. O monotele!ismo
ro de Antioquia e Juliano de Halicarnasso, que, expul sos por
Justino I, se refugiaram , em Alexandria, onde se combatiam 507. Depois da conde nação do nestorianismo e do mo-
entre. si. Os severianos declararam CO riuptível o corpo de nofisitismo, uma questão cristológica apenas ainda pedia res-
Jesus Cristo, antes da ressurreição, sendo por isto chamados posta : sendo' Jesus Cri sto verda deiro homem, como se ex-
ftartólatras . Os julianistas nega ram a corrup tibilidade do plica a sua impecabilidade? Resposta errônea foi dada, no
-corpo de Cri sto e, por is to, eram chamados, pelos adversá- sécuto VII , pelo monoteletis mo. Condenando-o, a Ig reja re-
rios, de afta rtodocetas ou fantasi stas. solveu o prob lema no 3' concílio de Constantinopla e 6'
b. Ambas as seitas subdividiram-se em diversas deno- ecumênico (680-81).
minações. Ent re os julianistas, os ctistólatras ensinavam que 508. Durante o rein ado do imperador Heráclio (610-4/),
o corpo incorruptí vel de Cristo era criado, enqua nto que os a s condições políticas reclamavam urgentemente a reconci-
act istetas o negavam. Ent re os sever ianos, os temistianos Oll liação dos monofisitas. Os persas ocu param a Sí ria e a Pa-
agnoetas afirmavam que Cristo não conhecia todas as coi- lestina, conquistaram o Egito (619) e chegaram até às por-
sas. O diácono Temístio de Alexandria foi seu chefe. tas de Con stantinopla. O heróico imperador conseguiu ven-
c. En tre os monofisitas do Egito foi renovada, no sé- cê-los nu ma guerra de nove anos e arrancar-lh es também a
culo VI , também a controvérsia trinitária . Uns atribuíam a sagrada Cruz (629). Mas, pelo fim do seu reinado, os ára-
cada uma das pessoas divinas uma própria natureza ou hi- bes assolaram o império, e conquistaram as mais ricas pro-
póstase; são os triteístas. Outros confessavam até uma espé- víncias do oriente. Receando uma a liança dos monofisitas
cie de tetrateísmo. Os niobitas, sec tários de certo filósofo com o inim igo , I-lerácli o procurou restabelecer a paz religio-
Níobes, fin almente, d iziam que não havia distin ção entre a sa, custasse o que custasse.
humanidade e a divindade de Jesus Cristo. 509. a. O patri arca Sérgio de Constantinopla (610-38)
506. Apesar de muitos e repetidos esforços que se fi- julgou ter achado um meio de união, ensinando uma só von-
.leram para reunir os monofisitas com a Igreja romana, nun- tade {H.kl),ua e uma só energia teândrica de Cristo, em
220 " época: Desen volvi mento da Igreja no imp éri o cristão
§ 48. O mo notelelismo 2"·
"'
manifesta oposição à Epislola dogmática de Leão I e à dou-
sinando-se, porém, claramente uma só vontade em · Jesus
trina do calcedon ense. T eodoro de Faran na Arábia e Ciro
Cristo.
de Fasis, mais tarde patriarca de Alexandria, logo lhe ade-
rira m. Sérgio con seguiu convencer também ao imperador, 512. a. Os bispos orientais aceitaram o decreto; pois,
que, na s sua s exped ições con tra os persas, trabalhou pela S. Sofo rônio (t 638 ) teve um sucessor monoteleta, e para
união na Sír ia e na A rmê nia. An tioquia lo i sag rado po r Sérgio também um bispo mono-
b. Quando Heráclio reco nquistou o Egito (628) , o no- teleta. Mas os sucessores de Honório, os papas Seve rIn o
vo palria rca Ciro logrou , por meio do Lib elo de união, re- (640), João IV (640-42) e Teodo ro I (642-49), e, com eles,
duzir à união com a I greja uma parte dos monofisitas, os os bispos ociden tais, o rejeitaram.
severianos-teodosianos (633) , que, satisfeitos de tal união, b. O novo im perador Constante II (641-68) prometeu
diziam que não eles se iam converter ao caIcedo nen ~e , mas então ao papa Teodoro retirar a éctesis , ma s, em lugar dela
que os calcedonenses vinham un ir- se co n~:;j go. Concluíam publicuu outro decreto não menos infeliz, o chamado "t ipo"
logicam ente de uma só vontade c energia a uma só natu- (648) , que proibia tanto o dioteletismo como o monotele-
reza em Cristo. tismo. O orien te, sempre pronto a aceita r as ordens Impe-
riais su bmeteu-se tamb ém esta vez. Só S. Máximo, abade
51 0. A'1a s logo surgiu contra a nova heresia o monge
de Scútari, e seus dois discípulos de nome Anas tácio resi s-
pa lestin ense Soforônio, co ndenando-a qual renovação do mo-
tiram heroicamente.
I" nofis iti smo. Sabendo qu e a dou trin a tinh a por autor o pa-
5 13. No tro no pontifício sen tou-se entã o o grande papa
I' tr ia rca de Constan tinopla, dirighf- se a ele e m-os tr ou-Jh e o
Martinho I (649-55). Logo no primei ro ano do s eu po ntifi-
perigo do erro. Sérgi o fez- lh e a proposta de não falar mais
cado, reuniu Cm Rom a um sinodo, ond e explicou e defin!u
nem de um a nem de c!U â :.J von tad es de Cristo, e escreveu
a doutrina católica: Segundo os San tos Padres a operaçao
nes te sentido também ao papa Honório [ (625-38 ). O pap a,
e a vont ade têm a sua origem na naturez a e não l1a hi-
enganado pela informação unilateral, respondeu, aprovando
póstase. Ora, em Cristo há duas naturezas. Logo, há nele
a express ão de uma vontade de Cristo, baseando-se na dou- també m duas vontades e duas ene rgias ou op eraçõ es . De-
trina de que "a divindade a ssumi u a humanidade, mas não po is co ndenou tanto a "éctesis" como o "tipo", e excom.u n-
a culpa" (Ep. l" ad Serg.). Honório, pois, n ega sómen te gou Ciro de Alexandria c Sé rgio e seus sucesso res, P;rro
a '.'on tade peca dora em Jesus Cristo, não a vontade huma- e Paulo, como também diversos outros bISpo s monol e!elas.
na como tal. E a unidade da vo ntade não lhe é senão uma 514. a. Constante II , irritado pela linguagem enérgica
un idade mOia!.
do papa, que até Ousara lazer-se sagrar sem a confirma-
51!. S. SOÍorôn io foi, em breve, elevado à sede patriar- ção imperial, planej ou vingar-se da afronta e encarregou o
cal de Jerusal ém (634). Celebrou então um sínodo para de- exarca Olímpio de Ravena de pu nir o papa. Mas o ofICIai
finir a doutrina das duas vontades e energias em Cristo e do exarca, enviado para executa r o crime, perdeu a vis,ta I~ O
para condenar o monotel etism o, e dirigiu a carta sinodal ao momento em que estava para assassinar o papa. OlImplo
papa (M II , 461 S5) . Mas Honório não aceitou a carta de mo rreu pouco depois. O seu s ucessor, Calíopas, apa receu
Soforônio; escreveu , pel o contrário, no mesmo ano ain da, a então à frente de um exército, em Roma e levou o papa
Sérgio, Ciro e Soforônio que se evitassem as novas expres- ao d:sterro para a ilha de Naxos, e em seguida para Cons-
sões (M 11 , 537. 579) . Animado pelo consentimento apa- tantinopla, onde Ma rtinho sofreu inauditos tratos. Fmalmen-
rente do papa, Sérg io redigiu uma fórmu la de fé mono te- te o heróico defensor da fé foi levado ao Quersoneso da
leia, chamada 1!,,,gemç níarewç ( M 10, 92 9), que He- C;iméia, onde em consequência dos sofri mentus veio a
ráclio publicou como decreto imperial (638). Nesta fó rmu- fal ecer.
la proibia-se falar tanto de uma com o de duas energias, en- b. Sorte semelhante ti veram outros defensores da fé dio-
teleta . Ao venerável abade Máximo, mais insigne teólogo
222 II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão § 48. O monolclelismo

oriental naquele tempo, e aos dois companheiros Anastácios, finição dogmática, mas simplesmente um consentimento à
depois da cruel flagelação, foram cortadas a língua e a mão proposta de Sérgio. Nem ensinou o papa uma doutrina errô-
direita e, em seguida, os desterraram para a Lácia, onde nea; pois já o confessor Máximo, mais estrênuo adversário
morreram mártires da fé ortodoxa. do monoteletismo, defendeu a ortodoxia de Honório na con-
515. a. Entretanto, Constante II foi assassinado em Si- trovérsia com Pirro.
racusa, e seu filho e sucessor Constantino IV Pogonato As únicas palavras que podem ser aduzidas contra Ho-
(668-85) reconciliou-se com Roma. Desejava a paz entre o nório: "Unde et unam voluntatem fatemur Domini nostri Jesu
oriente e o ocidente, a fim de enfrentar o perigo dos ava- Christi", explicou-as o abade João, que redigiu a carta do
ros e dos árabes, que continuamente ameaçavam o império, papa, dizendo que o pontífice não queria negar senão a
e para tranquilizar a .Itália, já desde muito cansada da admi- vontade dos membros, a concupiscência, tomando a palavra
nistração bizantina e pronta sempre a separar-se completa- ev IHJ.'7fla no sentido moral, não no sentido fisico. O que
mente do império oriental. o secretário de Honório afirma, confirmou-o o papa João IV
b. Por isso, tendo em 678 concluido a paz externa, re- numa carta a Constantino III (641; DB 253; ctr. Kirch,
solveu celebrar um novo concilio universal, e pediu ao papa nn. 1075-76). O próprio Honório, numa segunda carta a Sér-

·"'
que enviasse os seus legados. Agatão (678-81) reuniu pri-
meiro um sínodo em Roma para preparar o concílio e esco-
lher os seus legados. Entregou a estes uma epistola dogmá-
gio (M II, 579 ss), reproduzindo a fórmula de Leão I, con-
fessa duas operações em Cristo.
518. E' verdade que Honório não pode ser de todo es-
tica, que continha claramente a doutrina católica e en- cusado; pois, enganado por Sérgio, não compreendeu o ver-
viou-os a Constantinopla, onde então se reuniu o 6~ conci- dadeiro alcance da questão e empregou termos que não cor-
lio ecumênico (680-81). Como as sessões se celebrassem respondiam perfeitamente à doutrina católica, proibindo as
,.. na capela do palácio imperial, chamado Trullum, a assem-
bléia recebeu o nome de sínodo trulano.
expressões uma" ou "duas energias"; e em vez de definir
Il

e resolver a questão, impôs silêncio.


516. Os conciliares estudaram as atas dos concilias an- Mas não é menos verdade que a condenação pronun-
teriores, aceitaram as cartas de Agatão com as decisões do ciada pelo concílio foi injusta e ilegítima, e só se explica
sínodo romano e rejeitaram as cartas de Sérgio, Ciro e Ho- pelo abuso que os monoteletas faziam das cartas do papa,
nório. Em seguida, lançaram o anátema contra Sérgio Pirro pela antipatia dos orientais contra Roma e pela circunstância
Paulo e Pedro, patriarcas de Constantinopla, assi~ com~ de terem sido obrigados a condenar os seus próprios patriar-
contra Ciro de Alexandria, Teodoro de Faran e Honório cas. Não foi a sentença dum concilio ecumênico, porque foi
bispo da antiga Roma. No símbolo, redigido no concílio: pronunciada contra a vontade de Agatão. Os legados pon-
foram aceitas quase verbalmente as definições de Agatão: tificios que a assinaram transgrediram as suas faculdades.
"Confessamos, conforme à doutrina dos Santos Padres duas Falta-lhe também o consentimento posterior da Sé apostó-
vontades naturais e duas operações naturais em um e ~. mes- lica; pois Leão II (682-83), confirmando as decisões do con-
mo Cristo, sem divisão, nem transformação, nem separação; cílio, acrescenta à condenação de Honório a cláusula: (( ...
duas vontades naturais, mas não opostas entre si ... , a von- Honorium, qui hanc apostolicam Ecclesiam non doctrina
tade humana que obedece ... à divina e onipotente" (DB apostolicae traditionis lustravit, sed profana proditione im-
289 ss). maculatam fidem subvertere conatus est" (gr. 7W(!'XW(!,!OE
517. Aqui surge a tão discutida questão do papa Ho- = permisit; Mil, 753). Dum modo semelhante escreveu
nório. O que dizer primeiro das suas cartas? Elas não são Leão II ao rei e aos bispos da Espanha. Por conseguinte,
uma definição "ex-cathedra"; pois faltam as fórmulas com embora Honório possa ser repreendido por sua fraqueza, o
as quais, naquele tempo, se costumava fazer tal defi~içãO. concilio de Constantinopla neste ponto não é ecumênico, e
Também o escopo que o papa visava não era dar uma de- a sentença não é contrária à infalibilidade do papa.
224 II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão § 49. O donatismo 225

51 9. Como Constantino IV, assim também Justiniano II agitar os es píritos, o cisma de Donato ou o donati smo amea-
manteve a s decisões do concilio trulano. Quando foi a ssas- çou gravemente a unidade da Igreja africana. Este cisma,
s mado, o usurp~dor Filipico Sardanes (711-13 ) procurou que, em breve, também veio a ser heresia, coincide com a
restabd ecer, maIS uma vez, o lllonoteletismo. Num s inodo perseguição de Diocleciano e com o problema da recepção
~e .. 712.r: ~ez anular as atas cio concíljo ecumênico. Mas Fi- dos lapsos. Mas as ca usas remotas são muito anteriores e
IrpICO iOI de rrotado, ao cabo de dois a nos, e Anastácio II ligam-se a os nomes de Cipriano e Novaciano. Cipriano tinha
(713-15) restabelecou o trulano. ensinado com Tertuliano que o batis mo, administrado por
520. ü monoteletismo sobrev iveu ai nda entre os ma ro- hereges, era inválido e devia ser re novado. Novaciano dis-
nitas do Li bano e de Chipre, que consideravam a S. Maron sera qu e os apósta tas não podiam ser reconciliados com a
(t C. 410) como seu pai espiritual. Muitos maronitas vol- Igre ja. No dona tis mo reapareceram ambas as tendências ri-
taram ao seio da Igreja, em 1J81; outro s reu nira m-se em goris tas.
1445, e conservaram até hoje heróica mente a sua fé cató lica. 524. a. Ocasião da luta foi a morte de Mensúrio, bispo
521. Ne m no quinto concílio ecumênico nem no sexto de Cartago (t 311), para cujo s ucessor foi eleito, pelo cle-
foram publicados decretos disciplinares. P or' is to, Justi nian~ ro e pelo povo de Cartago, e sagrado pelo bispo Félix de

.- II re umu, em 692, o 2' trulano, como complemento dos dois


antenores, e c ham ado por is to Quinissexto, Os 102 cânones
Aptunga, o arcediago Cecilia no. Es te, porém, tinha contra
s i uma forte minoria, cuj o centro espiritual era a rica e dis-
deste _sinodo, que já desig nam um g rande progresso da sc- tinta viúva Lucila, a quem Ceciliano hav ia rep ree ndido por
paraçao entre Ü orrente e o ocidente, em questões discipli- causa de uma exagerada venera ção das reliquias, e que, por
nares, nun c~ o btrve ra m o reconheci mento dos papas, nem isso, se mostrava gravemente ofendida e indignada com a
'1 s~quer de Sergio I (687-701), oriu ndo do oriente. O sinodo eleição.
, -, \ I'
nao pode ser, portanto, co nsiderado corno ecumêni co, embo- b. Além disso, dois anciãos leigos, aos quais Mensúrio
ra os g regos o tenham como tal. tinha confiado, para o g uarda rem, o tesouro da Igreja de
He fel.e , I<onzi liengesc hich te fll, 121 S5. - Tixeron t, Histoire eles Cartago, sentiram-se ofendid os, quando Ceci liano exigiu que
dogmes UI, 160.55. H.elele, Causa Honorji, Neapo li 1870. _ lho entregassem. Talvez tenham mesmo cobiçado a posse
Chapman, The Çondernn atlOn of Pope Honorius London 1907 _ do tesouro. Finalmente, não tinham sido convidados para a
Duchesne, l}~gltse au Vle siec1e, Paris 1925. • .
e leição dois presbíteros, Botro e Celestino, que nutriam es-
perança de ser el eitos para a sede episcopal; nem os seten-
§ 49, O dona!ismo ta bispos da Numidia haviam chegado ainda para tomar par-
522 . E nqua nto na Igreja orien ta l se tratavam de pre- te na eleição.
fe r.ência, as questões especulati vas, trin itária e cri~toJógicaJ c. Qua~do estes chegaram a Cartago, reuniram-se na
o mteresse dos teólogos ocidentais concent rava- se mormen- casa de Lucila, onde declararam deposto Ceciliano e sagra-
te no problema mais prático da salvação, questão soterio- ram b ispo o le itor Maiorino (312) , e, morto es te, a Donato
lógIca Ou antropológica. E só alguns pontos des te problema Magno, que de u o seu nome ao partido (Aug., De haer. 69) .
fo ra m t ~at~dos, pontos estes que vieram a ser objeto de du as Como a sede epi scopal de Cartago fo sse a ma is importante
controvcrslas : o donatismo no século IV o pelacrianismo no da África, o cisma alastrou, em breve, por toda a África
século V. ' b
latina.
O ambiente ma is determinado em que se desenvol veram 525. Ambos os partidos dirigiram-se a Constantino
estas lutas, foi a Africa setentrional, terra clássica da teolo- Ma gno, que se declarou por Ceciliano, tirando aos donatis-
gia moral da a ntiguidade cristã. Ma s também ii Itália, a . tas os privilégios, concedidos recentemente aos cristãos. Con-
França e até o oriente tomaram parte ativa nestas lutas. tra tal medída protestara m oS sectários de Dona to e exi-
523. Antes de começar a controvérsia soteriológica a giram que a sua causa fosse t ra tada num sinodo a reunir-
Compên dio I - 15
226 II época; Desenvolvimento da Igreja no império cristão § 49. O donatismo 227

se nas Gálias. Motivaram esta particularidade, porque nas ciou contra os sectários. Estes nem a ssim obedeceram. Cons-
Gálias os bispos não renegaram a sua fé durante a per- tantino, cansado por tal obstinação, tomou providências mais
seguição. enérgicas. Tirou-lhes as igrejas, confiscou-lhes os bens e de-
526. a. Desta forma, o cisma veio a ser heresia. Os do- cretou contra eles o desterro.
natistas diziam que um bispo lapso não podia sagrar nem 529. a. A execução destes decretos aumentou ainda mais
lícita, nem vàlidamente, e declaravam inválida a sagração o fanatismo dos hereges, que então negavam ao imperador
de Cecilia no por ser feita por Félix de Aptunga, que con- o direito de intrometer-se nas coisas da Igreja. Bandos fa-
sideravam como traidor. Pecavam, pois, por um falso con- náticos vagavam de cabana em cabana dos lavradores, co-
ceito da eficácia dos sacramentos, que, segundo eles, não s6 metendo horrendos crimes e crueldades, pelo que foram cha-
depende da fé, mas também da santidade do ministro, como mados "circurncelliones". Eles mesmos davam-se o nome
ensinara Tertuliano montanista. Os sacramentos administra- de "Milites Christi" ou "agonistici", i. é, combatentes, ou
dos por um pecador são inválidos. A renovação do balismo "filhos dos santos". A seita chegou a ser um perigo as-
é, portanto, a nota distintiva da seita. Quando se lhes obje- sustador.
tava que, neste caso, não havia mais certeza alg uma sobre b. Em 336, puderam celebrar um sinodo de 270 bis-
... , "
o valor dos sacramentos, respondiam, distinguindo entre pe-
cadores públicos e ocultos .
pos. O imperador Constante viu-se obrigado, depois d:
a~­
gumas tentativas de pacificá-los pela brandura, a sub]uga-
I" b. O erro principal dos dona/istas é, no entanto, a fal- los pela força. Proibiu, de novo, o seu cult?, e decretou o
li' sa compreensão da santidade da Igreja. Com Tertuliano desterro dos seus chefes . Não obstante, a seita crescia cOn-
montanista e Novaciano ensinavam que s6 é verdadeira a tinuamente. Quando Juliano Apóstata lhes permitiu volta rem
Igreja, na qual não há pecadores. Onde não há santidade do desterro, contavam já 400 bispos. Ma s foi esta ta mbém
dos membros, não está a verdadeira Igreja. Não negavam a sua maior difusão. Em breve, dividiram-se em diversas
o direito da Igreja de readmitir os pecadores arrependidos; denominações, e desde então tornou-se mais fácil a sua
não queriam, todavia, conceder a reconciliação por motivos
pedagógicos. supressão.
530. Cllefe do partido era, a esse tempo, o antibispo de
527. Con stantino Magno entregou a causa ao papa Mel-
Cartago Parmeniano, sucessor de Donato (t 355). Procurou
dades (311-14), que num sinodo de Roma confirmou Ceci-
liano. Mas os donalistas não se deram por conte ntes e re- difundir a heresia também por meios literários. Opôs-se-Ihe
petiram as suas recl amações . Para nã o exasperar mais ain- primeiro O bispo Opta to de Mileve, que escreve~ sete livros
da os espíritos, foi convocado o sínodo de Arles (314). A De schismafe Donatistarum, elucidando a sua origem e o seu
fim de elucidar, antes de mais nada, a causa de Félix de desenvolvimento e refutando os seus erros. Mas o maior
Aptunga, fez-se um inquérito, que verificou a inocência do adversári o da seita foi S. Agostinho que, desde 393, escre-
bispo caluniado, e, de outro lado, a existência de traid ores veu uma série de tratados contra O donatismo. Em 411 , te-
entre os próprios donatistas. Foi confirmada então a sen- ve além disso, uma g rand e disputa com os ch eles da he-
tença do sinodo de Roma e declarada a eficácia objetiva do re~ ia. Estiveram ali presentes 286 bispos católicos e 279
batismo e da sagração, embora feita por um traidor. donatistas.
528. Uma parte dos donatistas se submeteu. Outros, S. Agostinho explicou claramente a doutrina católica,
porém, tanto mais obstinadamente resistiram, ape/ando da estabelecendo estas três proposições:
decisão do papa para o imperador. Constantino mostrou-se 1) A verdadeira Igreja é aql.l ~ la que se acha espalhada _so~re
bastante irritado; aceitou, porém, a apelação, para poder todo o mundo; não aquel a que existe num pequeno ~ anto da~ A fflca .
Quem se separa da Igreja universal , separa-se ue Cnsto, e nao pode
mais fácilmente suprimir o movimento. Convocou, pois, um
salvar-se.
novo sinodo para Milão (316), que igualmente se pronun- 2) No tocante à questão de como pode haver pecadores na
lO·
§ 50. O pelagianismo 229
228 II ~poc a: Desenvolvimento da Igreja no império cristão
n80 tivessem pecado. Pelágio, e com ele Celéstio, antigo
Igreja, é preciso disting uir um estado "viae" e um estado "I . "
uma i ' mi'1'Itante e .uma Igreja triunfante.
greJ8 g Dnae ' advogado e de pois igua lmente monge leigo, dai concluíram
3) QU3.fl tO à ~f !các ia dos sacramentos não pode haver d ' "d não haver pecado original. Atribuíram, por conseguinte, ao
alguma ; ~OIS. o m~",stro primário é o próprio Jesus Cr isto. ~v~a~ homem , mesmo depois da sua queda, uma disposição per-
cerdote nao e senao o seu luga r-te nente. fe ita para praticar o bem. S6 a graça externa é necessária.
531. A maior .parte dos donatistas subm eteu-se, final- A graça interna não serve, senão para facilitar o bem.
mente. MUitos, porem, ainda res istiram. Os últimos restos só c. Desta forma, caiu Pelágio num erro oposto ao ma-
desapareceram no s.é~ ul o VII, quando os maometanos ocupa- niqueísmo, que no prin cípio do século V ainda era forte, a
ram ~. Aloca. A vItOria de S. Agos tinho foi a vitória do ponto de produzir a nOVa seita do priscilianismo. E foi pre-
obje tlvl smo sobre o subjeti vismo religioso. cisamente com o fim de combater mais eficazmente esta sei-
Schwane, Dogmengeschichte. - Tixeronf Histoire des do ta, que Pclágio acentuava unilateralmente a liberdade hu-
II, 222 55. - Funk, Abhandl. und Unte rsuch (352 55 M gme!; ma na, a tribuindo a par te principal da salvação à atividade
Histoire littéraire de l'Afrique chrétienne, IV-VI!, Pa ;i;-191~~~~~UX' subjetiva do homem . .A sua doutrina estava em aberta opo-
s ição à pregação eclesiàstica sobre a necessidade da graça
§ 50. O pelagianismo inte!'ior, à p raxe do batismo das crianças e a muitas passa-
".. ~. 532. Precisamente no mesm o ano, em que S. Agostinho
gens das ep istolas de S. Paulo. Por isto, provocou logo uma
fo rte reaç ão.
I" venceu de hmltvam ente o donatismo, entrou em Cartago ou-
534. Movidos provàvelmente também pela invasão dos
l~ tro heres iarca, cujas doutrinas e ram tanto mais pe rigosas,
quanto o seu autor, o monge leIgo Pelágio, se apresentava vodos na Itália , os dois monges passaram a Cartago. Pe-
como um homem auste ro e gozava de fama de g rande san - lágio, em breve, seguiu para Jerusalém, onde fo i bem aco-
ítdade (Aug., De gest. Pel. 25) . lhido pelo bispo João. Celéstio, porém, ficou em Cartago,
... , 1: pretendendo receber a ordenação sacerdotal. Logo começou
Pelágio, oriundo provàvelmente da Irlanda viera no
a pregar a sua doutrina . Mas foi acusado então pelu diá-
principio do século V, a Roma, onde se demordu cerc~ de
cono Paulino de Mil ão, biógrafo de S. Ambrósio, que de-
dez anos. ~scandalizava-se com a vida tão pouco cristã de
pois da morte de seu bispo entrara nos serviços de S.
mUItos catoilcos e com a facilidade com que se desculpava
o relaxamento. Pretendia opor-lhe uma barreira, ensinando Agostinho.
que uma vontade s incera pode fàc ilmente observar todos os 535. Como Cei és tio não quisesse retratar-se, foi exco-
ma.n?amen tos. Com l sto começou a desenvolver o problema lll ungado num sínodo de Cartago (41 I) , por causa destas
d~ft c lhm o das relaçoes entre os dois fatores da vida reli- sete proposições:
gIosa: g raça e livre arbítrio. Nas suas opiniões erradas Con- I) Adão fo i criado mort al e teria morrido, ain da que não ti-
vesse pec ado.
ftrm ~ ra m-no estudos superficiais da Sagrada Escritura, em 2) O peca do de Ad ão só prejudicou a ele mesm o, nâo à sua
parltcular, das epís tolas de S. Pau lo, e a doutrina de Teo- descendênci a.
doro de Mopsvéstia, que durante os ditos estudos provàvel- 3) As cr ianças nascem no mesmo estado em que Ad ão se acha-
mente V~10 a conhecer, e que um certo Rufino tinha espalha- va antes do pecado.
do na cIdade eterna. 4) Não é pelo pecado de Adão que todo o gênero humano tem
de morrer, como nã o é pela ressurrei ção de Jesus Cristo que todos
533. a. Teodoro era então o maior representante da os hom ens ressu scitam; as crianças entram !la rein o do céu, ainda
escola antioquena (cfr. § 46). O seu racionalismo levara que não sej am batizadas.
5) O homem pode fica r ser:1 pecado e Cl;m prir ' filcil mcnte O~
ao nes to.rtamsmo. O racionalismo é também o d istintivo do
mandamen tos de Deus.
pelagIanIsmo. Aquele trata do redentor ; este, da redenção. fi) A Lei conduz. ao reino de Deus da mes ma fo rma como o
. b. _Teodo~o en s~n ara que os homens, no estado primi- Evangelho.
ttvo, nao podIam nao morrer. Teriam morrido, ainda que 7) Tmnbérn antes de j esL:s Cristo houve homens sem pecado.
230 II época: Dese nvol vimento da Igreja no império cristão § 50. O pelagianismo 23 1

. Celéstio apel ou da sentença do sínodo para a Sé apos- ( Di6spolis; 415 ) . Mas, simula nd o uma fé orto doxa, foi de-
t6hca. Mas, sem esp erar respos ta, seguiu imedia tamente para clarado inocente. Ent re tanlo, os a frican os, reunindo-se, no
tteso, onde soube alcança r a d ignidade sace rdo ta l. ano seguin te, primeiro em Car ta go e depois em Mileve, re-
536. S . Agos tinho, que aca ba va de derrota r O dona tis- jeitara m o s ínodo de Diós polis, que Jerónimo cha mara de
mo, foi chamad.a pela Providên cia como nenhum o utro pa ra "sínod o miserável" (E p . 143, 2) , e conde na ra m, ma is uma
comba te r ta mbem o pelagian ismo . Na s ua mocida de expe- vez, a heres ia . O pa pa Inocê ncio I ( 40 1-17) confir mou a
rimenta ra não menos o poder do p ecado e a fra queza da sentença e excomungou os heresiarcas. Qua ndo S. Agosti-
vonta de huma na, do que a força vito ri osa da g raça divi na. nho sou be da sentença do pa pa, excla mou : " Causa finita
Po r Is to, o "D ou tor da g ra ça", logo que soube da heresia, es t; utinam al iquan do f inia tur errar" (Se rm . 13 1, 10) . Mas
escreveu contra e la De peeeataTUm meritis et remissione ef o desejo do g râ nde bispo a ind a não se realizou .
de baptismo parva/oram, a o qua l fez seguir mui tos outros 539. a. Para se justificar, Celêstio fo i pessoalmente te r
trata dos, nos q uais es tabelece a doutrina ca tólica: com o p ap a Zósimo ( 417-18 ) , a quem tam bém Pelágio es-
l) Adã~ foi cri~dO à imagem e semel hanç a de Deus, possuindo creveu uma car ta, simulando uma fé ort odoxa . Zósimo viu-
d~n s nat uraIS pe rfc !tos e dons sobrena t urais. Podi a não morre r e
nao pec~ r. Est e est ad o devia p <,~sa r a não pode r pe car e morre r. se assi m dia nte de duas questões, uma dogmá tica e outra
Ma s Adao pecou; c, por isto, foi ferido nos Se us dOllS na tura is pessoal. Á questão dogmática : são hereges os que nega m
...,i , "
e os dons sob renatu rws f oram-lhe t irad os.
2) O pecado de Adão passou a todos os seus destendent~s, COi!]
' a necessidade da g ra ça, o ba tis mo das cri a nças e o pecado
origi nal ? -. j á Inocêncio I de ra a resposta, e neste pon to
tod ~s as suas cOl1sequ êl1 cia~ não só por imitação, mas po r propa- não havia d úv ida para Zósimo. Qua nto à questão pessoa l:
g açao. Pe lo pecado de Adao, o gên ero hum a no veio a ser uma
" ma ssa perdit ion;s". Por ~on.segui nte, o homem é inca p_a z ele salvél r- P eJ[lg io e Celéstio, são eles he reges? - o papa , fun da ndo-
Se ~r su a~ fo rças natur aIS, In ca pa z at é de pôr o prime iro ato de f~ . se em explicações ma is ou me nos ge ra is de Celéstio, des-
I 3) DaI segue-~e a necessidade da g ra ça, não só da graça cul po u os do is hereges e repreen deu os africanos, sem da r,
exte:n a, mas t.ambem da graç a in ter na, tanto excitante como CQj!- porém, uma decisão de finitiva .
• "';1 I'
comlta nte, e ainda da graça da perseverança.
4) .Es~a g raça nào é concedida por me recimento, lTlaS por me ra b. Os a fri can os, por sua vez, re unira m-se num sínodo
benevolencla de Deu5. plená ri o de ma is de 200 bisp os em Ca rtago (4 I 8) , on de
537. E s tes pontos são, de um lado, os princípios sóli- explica ra m, m a is a fund o, os pontos da controvérsia, e fo r-
dos da dou trina eclesiás tica . Mas, de outro lado, S. Agos- mula ram em oito cânones as sente nças do pelag ia ni smo ( DB
t mh o aflrma q lle a g raça de D eus é e ficacissima e irresis- 10 1 ss). S . Agos tinho mostrou, a lém disso, no seu livro De
tível: sempre invicta. A vonta de sa lvifica de Deus é, portanto, grafia Ch ris fi el de peccato originali, de modo convi ncen te,
p artIcular. Da ':massa da mna tion is " alg uns foram predes- a in sufi ciê ncia do conceito pela gia no da g raça. P ois, embora
t m~do s para a vIda etern a ; os outros fi ca m entregues à p er- P e1ág io fal asse da necessidade da g raça, entend ia como tal
d lçao mereCIda, sem se r~ m p redestinados ao peca do. Ao por só a Le i ou seja a doutrina e o exemplo de Jesus Cristo, i. é,
q~ e d" tal predestmaçao ou não-predestinação, Agos tinho a graça extern a .
11 30 da ~esp?~ta ; e é esta uma fra que za do augusti nis mo, 540. O pa pa , recebendo a sentença dos bispos af ri ca-
re conheCIda ]a pelos contemporâneos (K noepfier 194) . E sta nos, e reco nhecendo já por pró pria experiência a hipocrisia
fr<lq ueza da ria luga r a muita s cont rovérsias, no deco rrer dos d e Ce!éstio, q ue fug ira de Roma, condenou igua lmente o
séculos. pelagia nismo e, na chamada E pislo/a lraclaforia (PL 20,
. 538. ,Logo. no princípio da contrové rsi a, S. Agostin ho 693 ss), ordenou a todo o episcopado qu e aceitasse a dou-
e ~ vlo u, a lem ,"sso, o p resbi lero espanhol O rósio a S. Jerô- trina dos a fricanos. A carta foi bem a colhi da em toda parte.
01111 0, q ue se a cha va na Pa lestina. O eremi ta , por s ua vez, Só dezoito bispos italian os neg a ram-se a assin á-Ia e fo ram,
escreveu o seu Dza/aglis conlra Pelagianos. P el ágio teve de por is so, expulsos pelo im pera do r Honório.
comparecer p era nte um sinodo de Jerusal ém e outro de Lida 541. Mas a controvérs ia não te rmin ou ainda com ple-
232 II epoca: Desenvolvimento da Igreja no império cristão § 51. Predestinacianismo e semipclagianismo 233'

tamente . O bispo racionalista Juliano de Eclanum desde en- e a descrença e a reprovação de Qutros têm a sua razão,
tão chefe do partido, acusou Agostinho de ter, ~r s ua teo- últi ma na vontade divina. Se a vontade salvifica de Deu s
ria, profanado o matrimônio e prejudicado a moralidade. fosse universal, todos os homens seriam salvos, já que a
Agostinho defendeu-se nu m tratado De nupliis el con- vontade de Deus é onipo!en te e irresistivel. Os escolhidos
cupiscenlia. Partidários de juliano refugiaram-se no orien- alcançam infa li velmente a vida eterna pela graça invencí-
te, onde foram amigàvelmente acolhidos por Teodoro de vel; os réprobos são irrevogàvelm ente perdidos, devido à fal-
Mopsvéstia e por Nestório, confirmando-se assim também ta da graça suficiente. .
externamente as relações que existiam entre o nestorianis- 544. E' verdade que S. Agostinho não empre ga a pa-
mo e o pelagianismo. Nestôrio, porém, pronunciou-se, em lavra "irresistível", mas exp rim e-a com outros termo s , cha-·
seguida , contra Juliano e Celéstio. ma ndo a graça " indecJinabilis et insuperabilis" (De corrept.
542. Combatidos principalmente por Mário Mercator. et gratia 12, 38). Quando se lhe objetava a pal avra de
amigo de S. Agostinho, os che fes da he resia foram ex pul- S. Paulo : "Deus quer que todos os homens se salvem" (t
sos de Constantinopla pelo imperador Teodósio II e conde- Tim 2, 4), respondia que tod os aqueles que se salvam , o
nados, mais uma vez, no concilio de Éfeso (cc. I e 4 ) . Em conseguem, porque Deus o quer; ou que Deus quer que se
breve, extinguiu-se a heres ia na s ua forma extremista. Mas salvem homens de todas as condições, reis e sú ditos, doutos
reapareceu logo numa forma mode rada, co mo reação con- e ignorantes (Enchirid. 103 ; Ep. 217, 6, 19). Agosti nho ter-
tra a doutrina de S. Agostinho sobre a eficácia infali vel da mina, dizendo que a últim a razão desta predestinação ou
graça e a predestinação: o semipelagianismo. não-predestina ção é mistério.
545. Contra esta teoria do !Iaugustinismo" levantaram-
Obras de S. Agostinho CSEL (vári os volum es de vários edito-
res); melhor Migne, PL 32-47. - Bruckner Quellen zur Gesch ichte se logo adve rsários não só entre os pelagianos, mas tam-
des pelagianischen Streites, Tu ebingen 100'6. - Hefele Konzilien- bém entre os muitos antipelagianos. S. Agost inho lhes pa-
ge~chichte II, 104 ss. - Tixeront,. Histoire des dogmes Ii 436 ss. _
Plznv.al, Recherche~ sur I'oeuvre littéraire de P élage, Paris 1934. _ recia pôr em perigo a liberdade humana e, por con seguin-
Mer~tn, St. Augusttn et les d«,>gmes du péché originei et de la grâce, te, toda a ascé tica cr istã. As primeiras reclamações fizeram-
Pafls 1931. - Guzzo, Agostmo contro Pelagio, Torino, 2. ed. 1934. se ouvir no mosteiro de Adrumeto na Africa, onde a dou-
tri na de Agostinho provocou grande confusã o, entregan do-se
§ 51. Predes!inacianismo e semipeJagianismo muitos monges a uma es pécie de fatalismo. A ped ido do
a bade Valentim, o santo endereçou então dois livros aos
543. O mérito principal da vitória sobre o pelagianis-
monges, De grafia el libero arbilrio e De correplione el gra-
mo coube, sem dúvida, a S. Agostinho. Mas a doutrina do
lia (427). Declara que não se nega a liberdade humana,
grande bispo de Hipona sofreu, em certos pontos, uma mu-
quando se acentua a necessida de da g raça.
dança considerável, principalmente no tocante à predestina-
546. Com isto contentaram-se os monges de Adrume-·
ção. Antes de 396, atribuía a Deus uma vo ntade universal
to. Mas o último dos dois tratados provocou lima forte opo-
de salvar os homens. A razão última da fé de un s e da des-
s ição entre os monges de S. Vítor de Marselha e arredo-
crença de outros era, na sua opinião, a vontade do homem .
res, com o abade João Cassiano à frente. A doutrina de
Mas, acentuando, em seguida, mais e mais, a onipotência da
Agostinho lhes parecia ser contrária à Sagrada Escritura e
divina vontade, julgou dever modificar a s ua opinião. Pelo
alimentar uma espécie de fatalismo. Consideravam-na, por-
pecado de Adão, dizia, todo o gênero humano transformou-
tanto, como um gra nde perigo para a moralidade cristã.
se numa "massa perditionis" (ctr. § 50). Mas Deu s, por sua
P retend iam achar um meio-termo entre Agostinho e o pe-
mise ricórdia, compadeceu-se, desde a eternidade de uma
lagianismo, e opunham ao " Doutor da graça" as seguintes'
parte determinada da humanidade, escolhendo-a p~ra a sal-
proposições:
vação. O resto fica entregue à perdição. A vontade salvifica 1) A predestinação ot! a vontade salvífica de Deus é universal"
de Deus é particular. A crença e a bem-aventurança de uns não absoluta, maS condicional. A sua razão ultima e a presciência'
234 II épo ca: Desen volvi mento da (greja no império cristão § 52. O origenismo e os "Três Capítulos" 235
de .Oeu~, que escol he pa ra 3 vid a ete rn a os qu e, co nform e prevê, Fulgêncio de Rusp e (523) e aos esforços · do zeloso bispo
ser ao dI gnos da sua escolha (pr ae~ sis m~ riti s).
S. Ces ário de Arles . No sínodo d e Orange, 2' arausicano I I
2) O início da fé é obr a do homem. Mas o progresso na fé
e a prática do bt!m não se rea lizam sem o <lux íli o da graça. Depo is (529), pres idido por Cesário e confirmado pelo papa Boni-
De obtid a a justi ficação não é necessária a g ra ça da persever~nça. fácio II (530-32), foi condenado tanto o pelagianismo, co-
547. Esta doutrina dos ma rs ilienses, apresentada parti- mo também o sem ipelagia ni smo, declarando-se os sinoda is
cularmente nas Colfalion es de Cassiano (CSEL 13; P L 49, p or uma doutrina mod if icada de S. Agostinho.
477 ss), fo i cha mada de semipelagianismo, quando nos fin s O s ínodo ensina o pecado ori ginal, a incapacida de do
do século XVI a cont rovérsia molinista fez ressuscitar o pro- homem natural para operar o bem sobrenatural, a necessi-
blema da g raça. Quando S. Prósp ero de Aquitânia e S. Hi- dade absoluta da graça, também para o início da fé, e a
lário informaram a S. Agos tinho da agitação que o proble- graça da p erseverança . Nega, porém, a vo ntade pa rticula r
ma causa ra no sul das Gálias, escreveu em defesa da s suas de Deus de salvar os homens e a predestinação absolu ta
opiniões De praedestínat ione sanctoram e De dOilo perseve- e condena a predestinação ao ma I ( O B 174 ss).
rantiae. Ensina aqui, rnai::; uma vez, que não só a perseve- Com isto termina, no essencial , a controvérsia dos se-
ra nça, Illas também o inicio da fé é dom de D eLIS . mipelagianos, qu e não podem ser consi dera dos como here-
548. Pouco depois, morreu o grande bispo de Hipona ges formais. E com isto ta mbém chega ram, provisoria mente,
(t 430). Próspero e Hil á rio continuara m a luta contra os a seu ponto final as qu estões dogmática s que agitaram os
marsilienses, mas ded uzind o a predestinação não da vontade espí ritos, durante a segunda época da antiguidade e, is tã.
onipotente de Deus, como S. Agostinho, senão da sua pres- Hefele Konziliengeschichte II, 597 S5. - Tixeront , Histoire des
ciência, como os marsilienses; e daí resulta também a sua dogmes IIi, 274 55. - Ca,samassa, II pensiero. di. Sa n Agostino uel
~196-f}7, Roma 1919. - Vln c. Lerin., C OmmOI1JtOrIUm, ed. Rauschen
doutrina da vontade salvífica unive rsal. O autor desco nheci- (Flor. patr. 5) , Bonna. 1905; PL 50, 637 ss. - Modoz, EI con-
do de De voeatione omnium gentium, admirador a liás de S. cepto de la tradición en S. V icente de Lenns, Roma 1933. - Kocil,
Agostinho, en sina a mesma uni ve rsalidad e da vontade sa lví- der hl. Faustus, Bischo! von Rej i, Stuttgart 1895.
fica de Deus. A pedidos de Prósp ero e Hilá rio, o papa Ce-
1estino I declarou-se igu almente a favor de Agostinho, sem . § 52. O origenismo e os "Três Capítulos"
decidi r de"finitiva menfe a questão da eficácia da g raça e da 55 1. u. Fora destas controvérsias fundamentais, trinitá-
predestinação. ria, cri stológica e soterioIógíca e o donatisrno, outras duas
549. Todavía, O semipelag ia nis mo man teve-se nas Gá- questões, que se ligam ao nome de Origenes, inquietaram
lias ainda por um século inteiro. Depois da morte de João os espiritos: a controvérsia origenista e a dos "Três Ca-
Cassiano (i- 432 ou 435), defendeu-o particularmente Vicen- pítulos" .
te de Lerins no seu Co mrnon itorium adversas haereses, céle- b. Durante a controvérsia trinitária) invocava-se, não ra-
bre pela expos ição clara cio principio da trad icão católica ras vezes, o nome de Orígenes. Os arianos pretendiam fa-
(elr. § 56) . . ze r do o"ranele mestre a lexandrino um abonador.
da sua d Oll-
Depois da morte de P róspero, um certo pres bítero Lú- trina; c o subordinacianismo de Orí gencs podia, de certo mo-
cido acen tuou ai nda a dout ri na predestinacia na de Agosti- d o, justificá-los. Os ortodoxos, pelo contrario, e m parte, Iltes
nho; negou até o livre arbítrio e afirmou a predestinação disputavam a razão d e tal procedimento . Embora não des-
dos não-escolhidos para a morte ete rna. Contra este exces- conhecessem os errOs de Orígcnes, contin uavam, todaVia, a
so su rgiram G enádio e, mais d o que todos, Fausto de Reji, tributar estima e ve ne ração ao célebre ale xandrino. Pân filo
na Provença, represen tantes do semipelagia nismo, sem, no e Eusébio de Cesa réia escreveram uma apologia em defesa
entanto, aceitar todo ,~ os erros de João Cassian o . do mestre (clr. § 39 ); e em seu favor declara ra m-se igua l-
550. Pouco a pouco} porém, desapa recera m as idéias se- me nte os três grandes bispos da Capadócia, Basílio Ma gno,
mipelagianas devido principalmente ii Epístola sinódiea de G regório Nazianzeno e Gregório de !'Ussa.
236 II época: Desenvolvimento da Igreja nO império cristão
§ 52. O origenismo e os "Três Capítulos" 237
552. No entanto, nem todos eram do mes mo parecer.
Alguns repudiava m Or ígenes COmo verdadeiro herege por te im perial, sem no e ntan to admiti-los na comunh ão eclesiás-
ca usa das suas doutrinas sllbordinacianas, da pre-existência tica. O imperador Arcádio citou T eófilo pa ra dar contas de
dos espiritos, da eternidade do mundo material e da "apo- seu procedimento ao bispo de Constantinopla. T eófilo, po-
catástase" de todas a s coisas. Pela doutrina do s ubordina- rém, enviou Epifân io a Constantinopla , a fim de combater
cianismo consideravam-no, de fato, como pai do ariani smo. Crisóstomo como partidário dos or igenistas, diferindo a s ua
Entre estes . adv~ r sári os de Origenes dis tinguiram-se S. Epi- própria viagem até 403. Quando, finalm ente, se ap resentou
fil mo de Saiam IS <-r 403), T eófilo de Alexandria (t 412) em Constantinopla , não foi para da r contas ao bispo da ca-
e, mais ta rde, o imperado r Just iniano I, a cuj os nomes se pital, e sim para julgá-lo.
ligam três fases d iversa s da lu ta. 556 . Crisóstomo tinha provocado o ódio da vaidosa im-
" 55 3~ S .. Epifâ nio, seg.uindo a Metódio de Olimpo (t pe ratr iz Eudóxia , estigmatiza ndo num sermão os excessos
" II), nao so colocou Ongenes no catálogo dos hereges da moda na corte. Por intrigas da imperatr iz reuniu-se um
( Pan. 64), mas prego u também contra ele em Jerusalém sínodo em Calced ónia, chamado "a d quercum", que, presi-
(392). D,ai resulto u uma discussão acalorada entre Epifâ- dido po r T eófilo, pronunc io u a deposição do santo patriar-
1110 e Jeronlmo, de um la do, e O bispo João de Jerusalém e ca. S. Crisóstomo teve, po r duas vezes, q ue seguir o ca-
Hulin!) de Aquiléia, defensores de Oríge nes, de outro lado. minho do desterro c morreu, dep ois de inauditos vexames
Jerõnimo e Rufin o reconciliaram-se por mediação de T eófi- (407) em Comana no Ponto, lou vando a Deus e pe rdoand o
lo de Al exandria . Porém, como Rufin o, no seu prefác io à a os seUS perseguidores. Seus pa rt idários ficaram-lhe f iéis,
edição do De principiis de Ori genes, chamasse a Jerôn imo negando-se a reconhecer os seus sucessores Arsácio e Atico .
um admirador do mestre alexandrino, - e, de fato, o hav ia Só quando Teodósio II fez trans portar solenemente os res-
s ido antes de 392, - a luta se rea cendeu entre os dois a mi- tos mortais do sa nto pa ra Cons tan tinopla, terminou o ci sma
gos. Ain da depois da morte de Rufino (t 410) , manifes ta- dos joanitas (438).
se, nos libelos de Jerónimo, a s ua acerbidade. 557. a. Por um sécul o intei ro parou en tão a luta, pro-
554. Enquanto durava esta co ntrovérsia, surgiu outra no paga ndo-se o orígenismo paclfi camente, so bretudo na Pa-
tgito, mais violenta ainda. Entre os monges do dese rto squê- lestina. E fo i aqui que, no principio do século VI, se reen-
tlCO haVia m-se espa lhado idéias a ntropomórficas, atribuindo ce toll a contrové rsia. O abade S . Sabas (t 532) procurou
a Deus um corpo humano. T eó filo de Alexandria, home m em vão suprimir o movime nto. Dois orige nistas fo ram até
ambicioso e sem firmez a de caráter, cond eno u o a ntropomor- elevados à dignidade de bis pos, Domiciano de Anch'a e T eo-
fIs mo, numa carta pa s toral de 399. Ma s os monges ig no- doro Asquidas de Cesaréia na Ca padócia.
rantes levantaram-se contra a sentença e com ameaças de b. Mas Gelás io, sucessor de S. Sabas, expulsou qua-
morte .exigiram a sua retratação, bem como a condenação renta orige nistas da soa la ura. Como tam bém os patriarcas
de Ongenes, venerad o pelos monges eruditos do deserto E frém de An tioquia e Pedro de Je ru salém se pronunciassem
nitrico. O bispo cedeu às reclamações e ameaças tanto maís contra o origenis mo, Jus tiniano I publicou , em 543, um de-
fàcílmente, quanto mais odiosos lhe eram não poucos orige- creto de dez anatematismos contra outras tanta s proposi-
mstas, es peCIalmente os chamados "Quatro Irmãos Gran- ções e contra a pessoa de Orígenes (M 9, 487 ss). T odos
des", varões ilustres por sua er udição e piedade. Trezentos os bis pos e abades ti veram de a ss iná-lo. Também Monas de
monges do deserto nítrico, perseguidos e expulsos, dirigiram- Constantinopla e o papa Vigílio reconheceram o decreto.
se para a Pales tina . Orígenes, maior teólogo da Igreja ori ental, foi condenado
555. Cinquenta dentre eles, com os "Quatro Irmãos como herege, trezentos anos depois da s ua morte.
G randes " , foram a Con stantinopl a, onde S. João Crisóstomo 558. No entanto, para pôr termo à pe rseguição dos or i-
os acolheu benignamente e inte rcedeu por eles junto à COr- genistas, O bispo T eodoro Asquidas soube hàbilmente des-
viar a atenção de Jus tiniano I para outro a ssunto, que ha via
238 li época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão § 52, O origenismo e os "Três Capítulos" 239 ~

de afligir muito sensivelmente toda a Igrej a e, de um modo tão sem a presença de Vigílio. Nestas condições, o resultado·
particular, a Sé apostólica. Dizia ele que os monofisitas fá- era de prever-se. Foi pronunciado o anátema contra os "Três'
cilmente tornariam a unir-se á Igreja, se fossem condenados Capitulas" e riscado até o nome de Vigília, "salva commu-·
Três Capitulos, a saber: Teodo ro de Mopsvéstia e seus es- nione cllm Sancta Sede" .
critos, os escritos que Teodoreto de Ciro escrevera contra O papa, que proc urava a paz da Igreja, custasse o que
Cirilo de Alexandria e contra o concílio de Éfeso, e a carta custasse, redigiu o chamado "Constitutum", condenando 60 '
que lbas de Edessa endereçara ao bispo Máris de Hardaschir proposições de Teodoro, T eodoreto e Ibas. Porém Justinia-
na Pérsia em defesa de Teodoro. O imperado r acolheu de no não aceitou o " C onstítutum ", Vigílio, reduzido a uma
bom grado esta proposta e publicou, em 544, um edito a Ser con dição penosissima, privado de todos os seus conselheiros, . J i
assinado por todos os bispos. mudou , pela segunda vez , de opinião, reconhecendo o sin o-
559. A condenação dos "Três Capítulos" não foi, real- do de Constantinopla e motivando O seu procedimento num
mente, infundada, porque continham, de fat o, doutrinas nes- outro "Constitutum". Por isso, e pelas reclam ações dos ro-
torianas. No entanto, Teodoreto e Ibas haviam sido recon- manos foi-lhe restituida a liberdade. Em caminho para Ro-
ci lia dos com a Igreja, e Teodoro morrera na paz com ela. ma veio a falecer (t 555), expiando dolorosamente a am-
Um anátema contra os três bispos não som ente era incon- bição que o movera a aceitar a dignidade suprema de Vigá-
veniente, mas tinha também a aparência de injustiça. Acres- rio de Cristo. Seu sucessor, Pelágio I (556-6 I) , confirmou
cia que no ocidente se julgava, embora errôneamente, ter igualm ente o sinodo, que assi m ficou reconhecido como 5'
s ido a carta de Ibas aprovada pelo calcedonense. O edito concílio ecumênico, segundo Constantinopolitano (553).
foi , portanto, recebido com grande indignação. As tentati- 562. Pouco a pouco, cederam também os outros bispos
vas de impô-lo pela força levaram a novos e dolorosos do ocidente. Só na Itália setentrional chegaram a provocar
conflitos. I
um ci sma, favorecid os pela invasão dos longobardos (568).
560. Os bispos orientais, com Menas de Constantinopla I
Mas o bispo de Mil ão voltou à união em 571, os sufragâ-
à frente, cederam , pouco a pouco, à vontade do imperador. neas de Aquiléia, em 607. Os últimos cismáticos reconcilia-
Mas, o papa Vigília e os bispos ocidentais resistiram. Vigi- ram-se COI11 a Igreja romana pelo ano de 700, O cisma deu I
lia fo i, por isso, convidado para Constantinopla (548),ond e, origem aos patriarcados de Aquil éia e Grado.
depois de muitos vexames, redigiu o chamado "Judicatum",
Hefele, Konziliengeschichte II, 89 5S ; 784 S5. - Tixeront, Histo i ~
condenando os "Três Capitulas". O seu proced imento pro- re des dogrnes III, 130 ss. - Kn echt, Die Reli gionspolitik Kaiser
duziu uma forte ag itação entre os bispos ocidentais. Os af ri- Justinians 1., W uerzbu rg 1896, - Diehl, Hi stoire de l'Empire byzan-
canos chega ram até a tirar dos dípticos o nome de Vigí lia. tin, Paris, 10. ed . 1934. - Id., Justinien et la civili safjon byzantine
au Vle siêc le, Paris 1901. - Baker, Justinian, Lon don 1932. - Bion-
Para tranquilizar os ânimos, o papa retirou o "Judica- di, Giu stiniano I, principe e legislatore catto lico, Mil ano 1936,
tum" e combinou com o imperador a convocação de um con- Diekamp. Die origenistichen Streitigk eit en im 6. ]ahrh. und das 5,
cílio ecumênico, Mas, em vez de r eunir ° concílio, Justinia- allgemeine Konzil, Muen ste r 1899, - Scott, The eastern Church es
and the Papacy, L ondon 1933. - Baur, Johannes Chrysostomus und
no, movido pelas maq uinações de Asquidas, publicou um no- se ine Zeit, 2 vol., Muenchen 1929-30. - Puech, San Giovanni Cri.·
vo decreto contra os "Três Capítulos" (55 1). E quando o sostomo, Roma 1905. - Lazzati, Teofilo d'Alessa ndri a, Mila- ·
110 1934.
papa protestou, o imperador quis ap risioná-lo. Vigília fu giu
com perigo de morte, procurando asilo numa igreja, onde
pronunciou a deposição de Asquidas e a excomunhão de
Menas (t 552).
561. Iniciaram-se novas negociações para celebra r um
concílio geral sob a presidência do próprio papa. Mas não
foi possível haver harmonia de vistas. Justiniano abriu-o en-
240 II época: Desenvolvimento da Igreja no imp!!rio cristão Literatura e Ciências Eclesiásticas 241

CAPITULO 111 dências distintivas. A diferença das duas escolas se faz no-
tar tanto em filosofia como em teologia. Os alexa ndrinos
LITERATURA E CmNCIAS ECLESIASTICAS mais se aproximam de Platão, os antioquenos são aristo-
télicos. Os alexandrinos cultivam, de prefe rência, a exegese
Vista geral alegórica e mistica, seguindo a o g rand e Origenes. E' pre-
563. Com a vitória do cristianismo, que com Con stan- ciso, no entanto, distinguir entre os alexandrinos antigos
tino Mag no sub iu ao trono dos césares, começou tam bém e os neo-alexandrinos. Estes últimos empregavam o sentido
ú peri odo áureo da citncia e da li teratu ra patri s tica. A se- alegórico só para fins edificativos. Em tratados cientificas
gunda época da an tiguidade é o tempo do maior fl oresci- e polêmicos preferiam, como os antioquenos, a exegese gra-
mento da literatura cristã do orien te. As grandes contro- mático-histórica. Os a ntioquenos elevaram a exegese a uma
vérsias trinitária, cris tológica e sote riológica, des pe rtaram o ci~ncia própria . A sua escola atingiu, neste período, o maior
mais vivo inte resse dos teólogos. Varões ilust res e em inen- florescimento.
tes por santidade e erudição consa gra ram as Suas melhores Outra diferença das duas escolas consiste na diversa
força s àquelas questões que tão de perto tocava m a vida concepção da cristologia. Os a ntioqueno s, mais racionalis-
da Igreja . E' o período dos gra ndes Padres da Ig reja; para tas, acentuavam a separação das duas naturezas de Cristo,
.as ciências cristãs e pa ra a literatura eclesiástica um dos
e alguns teólogos da escola chegaram a pôr cm perigo a
períodos mais brilhantes de toda a história. O seu maior es-
unidade da pessoa d o Salvador. Os alexandrinos, pelo con-
plendor vai desde 325 até ao concílio de Cal cedônia. E' este
trário acentuava m mais a união das duas naturezas de Cris-
o per iodo ci áss ico da lite ra tu ra patrística. Desde meados do
to, e ~Iguns de seus representantes chegaram a negar a dua-
'Século V, notamos certa decadê ncia, Todavia, também nos
decênios seguintes não faltaram escritores de pulso. O zelo lidade das naturezas (cf r. §§ 46-47).
com que trataram as múltiplas questões da doutrina católica 566. No entanto, a atividade científica e literária não
e o heroismo de virtude com que se ap resenta vam ã socie- se limitou a estas duas escolas. Estendeu-se, mais ou me-
dade cristã, ainda hoje, despertam a admiração de todos nos, por toda a Igreja. Em várias partes do império e tam-
quantos es tudam a história da Igreja. bém fora do império encontra mos grandes doutores, astros
564. Como e ra necessá rio, antes de mais nada, defen- de primeira gra ndeza , principalmente na Palestina, Armênia
der a f é católica contra as inovações doutrinais, a literatu ra e Siria. As escolas de Cesaréia, Edessa e Nísibis granjea-
deste período tem caráter especificamente do gmático e polê- ra m grande renome. E como o oriente, assim lambé m a
mico. Não se neglige nciava, no entanto, um cu ltivo cuida- Ig reja ocidental teve, ao lado dos grandes Doutores da Igre-
doso dos dern2is ramos da teologia. A história eclesiástica ja, muitos outros teólogos e escritores que ilustraram as ciên-
é tratada ã parte por Eusébio e seus continuadores. A exe- cias e a lite ra tura cristãs.
g ese é cultivada particularmente por S. ]erônimo e as duas Podemos deste modo fala r, nos pa rág rafos seguintes,
escolas orientais. A catequ éti ca tem os seus representantes 1) do florescimento da teologia grega, considerando a) a
em Cirilo de Jerusa lém, Dídimo o Cego e S. Agostinho. Na escola alexandrina, b) a escola antioquena e os outros es-
luta contra Jul ia no Apóstata também a apologética produ- critores orientais; 2) do florescimento da literatura teoló-
ziu preciosos frutos. O seu maior representante pertence, po- gica nO ocid ente, considerando a) os escritores helenizantes,
rém, a uma geração mais rece nte: é S. Agostinh o, autor da b) S. Agostinho e a sua escola; 3) dos últimos escritores da
magní fica obra De civi/afe D ei. antig uidade cristã.
565. Os principais centros desta atividade lite rária fo-
ram, no oriente, as escolas de Alexandria e Antioquia, que,
neste período, desenvolveram consequentemente as suas ten-
COIU.Pêndio I - 18
242 II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão
§ 53. Florescimento da teologia grega 243
§ 53. Florescimento da teologia grega. _ A escola
alexandrina ca. Na primeira prova a superioridade do jud~ismo sobre. o
paganismo; na segunda demonstra a superiOridade do cn,:;-
567. O primeiro dos escritores gregos deste período é tianismo sobre o judaismo. Desta forma, as duas obras sao
o pai da história eclesiástica, Eusébio Pânlilo (265-340?), como duas partes de uma g randiosa apolog ia do cristianis-
bispo de Cesa réia na Palestina, célebre não só como histo- mo. Na dogmática, Eusébio não ficou, infelIzmente, Isento
riador, senão também como apologeta. Tenha ele aqui o pri- de opiniões erradas, combatendo os defensores da fé n!ce-
meiro lugar, apesar ele não pertencer própriamente à esco- na. Como seu mestre Pântilo, grande admIrador de Orrge-
la alexandrina . Discípul o do douto presbítero Pânlilo de Ce- nes ensinava um certo subordinacianismo, pelo que s impa-
saréia, participou, durante a perseguição de Maximino Da ja, tiz;va com os arianos. Assinou , porém, o niceno e nunca en-
por livre escolha, da prisão de seu mestre, colaborando com sinou o puro arianismo.
ele na cUlupusi,ão da Apologia de Origenes. Quando Pan- 570. Entre os alexandrinos própriamente ditos deste pe-
filo sofreu o martírio, Eusébio fu giu para Tiro e, em segui- ríodo o primeiro é Alexandre de Alexandria (t 328). Zelo-
da, para o Egito, onde foi de novo en carcerado. Em 3 14, so bispo da capital do Egito, enfrentou os heréticos mele-
foi elevado à sede metropolitana de Cesaréia, e te ve grande cianos e os arianos, e venceu-os ambos no concílio de Ni-
renome na corte de Cons tantino Magno, quando este veio céia. A estas lutas destinam-se alguns sermõ es e algumas
a ser senhor de todo o império c transfe riu a capital para cartas circulares.
Bizâncio.
571. Suc ess or de Al exandre na sede episcopal fo i S.
568. Singular importância têm a s obras históricas de . Atanásio (clr. § 44). Se Eusébio fo i dis farçado adversá rio
Eusébio. A primeira é a Crónica mundial, cuja parte princi- da fé nicena Atanásio foi seu mai s ilustre defensor. Já peios
pal consiste de tabelas cronológ icas. A sua idéia fundamen tal contemporâ~eos foi chamado <lo Grande", "M édico enviado
é uma apologi a do cristianismo. Começando as suas expos i-
por Deus para sarar as ferida s da Igreja" , "Coluna da Ig re-
ções com o princípio do mundo, Euséb io se propõe demons- ja" (Greg. Naz., Orat. 21 , 26 ) . De f~t o, é ele uma das fi-
trar que a trad ição juda ico-cris tã é muito mais antiga do g uras mais insignes de toda a hlstó na celeslásllca. A sua
que as memórias de qualquer outro povo. Em seguida eSCre- vida foi consa grada, particularmente, à defesa da fé contra
veu E usébio uma História eclesiástica de incalculável val or. os arianos (eh. § 44). A esta luta se destina também a
Quis dar apena s uma coleção de material histórico. Mas este maior parte dos seus escritos. Todavia, Atanásio não amava
material é tão rico e também a expos ição tão uni versalista, a luta. Em todos os seus tratados manifesta-se um carMer
que a obra merece todo o nosso aplauso. O texto hodierno a mável, cheio de bondade; e nunca invocou em sua defe sa o
compreende em dez livros a história desde o prin cipio da braço secular, como fa ziam os seus adversários.
Igrej a até a o ano de 324. Além disso, escreveu Eusébio a
572. a. Entre as obra s de Atanásio ocupam o primeiro
Vida de Constantino em quatro livros. Não é própriamente
lugar os tratados apologéticos. Já antes da controvérs ia aria-
uma biografia, e s im um pallegírico do imperador. Final-
na, escreveu uma apologia AdverslJs gentes libri duo . Os
mente, chego u a té nós o célebre . tratado Sobre os martires
dois livros formam uma unidade, tend o, porém, cada um o
da Palestina, conservado em duas edições. Uma, mais an-
seu titulo própri o. O primeiro, OraUo contra gente s, prova
tiga e mais breve, foi inserida ao 8' livro da história ecle-
siás tica. O libelo trata apenas da perseg uição de 303 até 311. a existência de um s6 Deus e, portanto, a sem-razão do pa-
ganismo. O segundo, Oratio de incarnatio,:e Verbi, prova a
569. Eusébio escreveu também numerosos tratados exe- conveniência e a necessidade da encarnaçao e a dlvmdade
g éticos, apologéticos e dogmáticos. Como exegeta segue a
de Jesus Cristo contra as objeções dos judeus e dos pagãos.
Orlgenes e pertence, portanto, ao menos indiretamente, à es-
b. Entre as obras dogmático-polêmicas, a mais volumo-
cola alexandrina. Maior importância têm as duas obras apo-
sa e a mais importante é a que tem o titulo Orationes qualuor
logéticas Preparação Evangélica e Demonstração Evangéli-
contra Arianos, das quais a última, porém, não é autêntica.
1ti.
§ 53, Florescimento da teologia grega 245
244 II época; Desenvolvimento da Igreja no império cristão
nais célebres da época, como Jerõnimo e Rufino, vinham
A obra foi escrita no deserto do Egito (356-62), e trata da :scutar a sua palavra, Também S, Antão deixou, mais de
origem eterna do Filho, da consubstancialidade com o Pai uma vez, o deserto para ouvi-lo.
e da distinção das pessoas divinas, No mesmo tempo, es- b, Didimo escreveu, por meio de am.anuenses,. uma sé-
creveu Atanásio as quatro cartas ao bispo Serapião de Tmuis, rie de obras dogmático-polémicas e exegellcas. Brilhou, ~o-
Muitas outras obras, pequenos tratados e cartas dogmáti- e silupllcidade de 110-
b re t u d o, P ela clareza de exposição
" . I I'b'
cas, completam a doutrina do grande bispo contra os aria- De Tnmla
nos e macedonianos, guagem, S ua ob ra principal e , e , I " Ires, comd a
qual combate o arianismo e o m acedo~laOlS mo, revelan 0-
c, Além disso, escreveu Atanásio uma série de tratados • uo defensor da fé nicena, Inume
se es t ren . J •ras . outras obras
históricos, exegéticos e ascéticos , O zeloso pastor soube fa- foram ditadas pelo grande mestre: S, e:ommo ;,ome~o~ .a
zer da hi stória uma arma poderosa para defender a Igreja numerá-Ias mas finalmente termmou, dIZen do: Et mflm-
e para re futar calúnias. Com este intuito escreveu Apulogia ~a alia qua~ digerere proprii indieis, cst" (D~ vir, iii, 1~).
contra Arianos, Apologia ad Constantium imperatorem e Grande admirador de Origenes, Dldlmo procurou explicar
Historia Arianorum ad Monachos, Também a Apologia de u n sentido ortodoxo a obra principal do venerado ante-
fuga sua pertence a esta categoria de escritos, Entre as obras ~e~sor na diretoria da escola, De principiis, Infelizment~ fez
ascéticas e práticas figuram um tratado Sobre a virgindade sua a doutrina da preex istência das almas ~ da apocatasta-
e a Vida de S. Anião. O venerável patriarca dos monges se; e, por isso, foi com Orígenes anatematlzado no 59 con-
morreu em 356; e provàvelmente no ano seguinte, Atanásio cílio ecumênico.
escreveu-lhe a vida como "espelho da ascética para os mon-
575, a, Outro grande egípcio foi Cirilo de Alexandria
ges", O livro teve um êxito magnifico. Levou as idéias do
(t 444), Pouco sabemos da. sua vida.anteri?r a 412, E~
monaquismo egípcio para o oriente e para o ocidente. Aos
403 acompanhou seu tio Teofllo ao, stllodo ad quercum
tratados práticos de Atanásio pertencem também numerosas
de Calcedônia, onde estava convencIdo da culpa do ~anto
cartas e pregações, cartas sinodais e encíclicas, O chamado
patriarca de Constantinopla, Em 412 sucedeu a seu 110 na
Simbolo A/anasiano, porém, não é dele. Parece datar do
sede patriarcal de Alexandria, Animado, no Principio do seu
século V e ter sido introduzido na liturgia ocidental no sé-
episcopado, de um zelo um tanto imprudente, tornou-se, em
culo IX, O oriente nunca o aceitou nos seus livros litúrgicos.
seguida, baluarte inabalável da ortodOXIa na luta contra o
573, Aqui devemos mencionar também uma série de nestorianismo (dr. § 46),
monges, amigos e contemporâneos de Atanásio, que nos dei- b, Arma principal de Cirilo nesta luta foi a palavra es-
xaram os frutos da sua atividade literária: S, Antão do Egi- 'ta O númerO e a importância dos seus tratados no-lo
to, S, Pacômio, Macário do Egito, Macário de Alexandria cn ,
apresentam como uma das maiores f Igura s, ~a h'1St,óna ' da
e Evágrio Põntico, o mais fértil e mais característico escri- antiga literatura cristã, Fora dos tratados Ja mencIOnados
tor espiritual do deserto egípcio. E também os bispos Se-
f § 44) , sairam da sua pena outrosé'muitos de bassunto
( cr.
rapião de Tmuis, Pedro li, sucessor de Atanásio na sede de a ologético, dogmático-polémico e exeg tICO, Uma o ra vo-
Alexandria, e Timóteo de Alexandria, irmão e sucessor de I:mosa de tendência apologética contra Juliano Apóstata
Pedro li, tenham aqui o seu lugar.
compreendia 30 livros; S?, dez , ~e conservaram, As obras
574. a. Contemporâneo de Atanásio e uma das figuras dogmático-polémicas de Ctrllo dtrlg~m~se em parte contra o
mais extraordinárias da patrologia foi o leigo Dídímo O Ce- arianismo, em parte contra o nestonamsmo, em parte contra
go (309-98), Apesar de ter perdido a vista, quando tinha outras heresias, Quase todas tratam da SS, Tnndade e da
apenas quatro anos de idade, adquiriu tão vastos conheci- Encarnação do Verbo, A mais importante é CiRCO livros con-
mentos e tão profunda erudição, que todos se curvavam dian- tra as blasfémias de Nes/ófÍo, A forma destes tratados lem-
te de seu espírito, Por mais de meio século ocupou o car- bra muito o método escolástico,
go de diretor da escola catequética de Alexandria. Os varões
246 II época: Desenvolvimento da Igreja no imp ério cristão § 53. flo.resci~ento da teolo gia grega 247

. c. Ainda mais numerosos são os tratados exegéticos. Ci- para o metropolita, "bom conselheiro, hábil auxiliar, i~tér­
nlo prova que não há contradição entre o Antigo e Novo prete das Escrituras Sagradas e dos. seus dev e~e~" baculo
~estxamento , e que o Antigo Testamento foi 7r:a,áay(j)yor; da sua velhice, apoio da sua fé, o famJi.ar ma.s f.el (Greg.
Btç "tO!61'. In felizmente, pereceram quase todos os seus Naz., Oral. 43, 33).
comentários. Além disso, escreveu Cirilo muitas cartas e ser- Em 370, morreu Euséb io, e Basilio fo i eleito seu _su-
mões. Entre estes figu~a .o mais célebre sermão da antigui- ces sor. Feito metropolita da Capadócia e "exarca" sobre c~n­
dade sobre MaTla Sanhsslma, pronunciado em 431 na igreja quenta bispos ela diocese politica do Ponto, trabalhou ln -
de Nossa Senhora de Éfeso (PG 77, 991 ss). . cansàvelmente por melhorar os costumes entre o povo e .o
576. À escola neo-alexandrina pertencem também os três clero refo rmar a liturgia, propagar a vida monástica e ali-
grandes capadócios,. S. Basílio Magno, seu irmão S. Oregó- viar 'a sorte dos oprimidos. A sua miss ão principal loi a
no de Nlssa e o am.go de ambos, S. Gregório de Nazianzo. luta contra a heresia dos aria nos, que o consideravam , de-
Como Atanásio, assim também eles vi ram na luta contra os pois da morte de Atanásio, seu . ma"is temido adver sã rio. Ro-
arian os c os pneumatômacos a missão principal da sua vi- , chedo no meio de um mar re voltoso, não cedeu nem mesmo
da. Un.do~ pelos laços de parentesco e amizade, e iguais . ao imperador Valente, que, apesa r do decreto de desterro
em unporta nc.a para a Igreja, são três es trelas de primei- iá pronunciado, não ousou removê-lo da sede epIscopal. Em
ra gra ndeza na Igreja oriental. Basilio é o caráter forte e 't , de Janeiro de 379, loi colher o prêmio de seus trabalhos.
i~qLlebrantável : Gregório de Nissa, o pensador profundo, 580. a. Como escritor distingue-se Ba sílio por uma dia-
Gregóno Naz.anzeno, o grande orador e distinto teólogo léti ca brilhante, eloquência, abundância de pensamentos, vi ...
(Marx, Patr. 90-91).
gor e beleza de linguagem. Entre os seus tratados polêmico-
577. S, Basílio Magno (330-79) nasceu em Cesaréia dogmáticos merecem ser mencionados, em pnmetro lugar,
na Capadócia de família abastada e nob re pelo sangue e os Cin co lil1ros contra Ellnômio, ariano extrem ista. Na sua
pela santidade. Fez os seus primeiros estudos sob a direção obra Sobre o Es pírito Santo apa rece, pela primeira vez, a
do paI BaslilO: celebrado rétor e advogado. Frequ entou, ell!
doxologia "Glória ao Padre com o Filho e o Espirita San-
segUIda, as celebres escolas de Cesaréia na Palestina de
to", substituindo a então comumente usada "Glória ao Pa-
Con stantinopla e de Atenas. Aqu i travou amizade indis;olú-
dre pelo Filho no Espírito Santo". Quando encontrou opo-
vel. cam Gregório Na~ianzeno. Aqui teve também Juliano
Apostata como cond.sc.pulo. Em redor dos dois amigos uni- sid o Basílio declarou que a sua doxologia se justifica pela
ram-se outros estudantes cris tãos, formando assim, de cer- S~gr~da Escritura c pela tradição da Igreja, que el~ eX-
to modo, a primeira associação ue acadêmicos católicos. prime melhor a pluralidade das pessoas cI.vmas e a umdade
da essência, e que, portanto, exclui tanto o sabcllamsmo
578. Porém Bas ílio não gostava lTluito do bulicio da
cidade mundial. Sentia-se chamado para o silêncio da soli- qua nto o arianismo. Basílio escreveu também uma obra
dão. Renunciando às honra s duma brilhante cá rreira de ré- Adversus Manichaeos, que pereceu.
tor, resolveu abraçar a vida mon ástica. Para se instruir na b. Entre as obras ascéticas de Basilio têm maior im-
vida e na doutrin~ . ascética, visitou os monges do Egito, portância as duas regra s monásticas, Regula e fusius trae/a-
da Palestma,_ da Slfla e da Mesopotâmia. Retirou-se depois ta e e Regulae brevius lractalae. Em forma de perguntas e
para a sohdao nas vlzlOhanças de Neo-Cesaréia no Ponto respostas,· são uma espécie de catecismo para os monges.
onde em breve se viu rodeado de uma grande multidão d~ T ornaram-se, pouco a pOllCO, normas para todos os cenO-
monges. bita, no oriente. Especial importância têm também as cartas
579. Pelo ano de 364, o metropolita Eusébio de Cesa- do grande bispo. São uma fonte preciosa para.a vida do
réia soube atrair o mon ge para junto de si e movê-lo a re- santo e para a história de seu tempo. Um bellss.mo tra-
ceber a ordenação sacerdotal. Desde então, Basílio foi tudo tado de Basílio dirige-se Aos jovens, pérola da literatura
248 II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão § 53. Florescimento da teologia grega 249

patrística, em que apresenta à juventude es tudiosa um ver- 584. Gregório de Nissa (t 395) considerava seu irmão
dadeiro programa do humanismo cristão. Basilio como mestre e pai. Já abraçara o estado clerical e
Sejam mencionadas ainda as nove célebres homilias so- era leítor, quando, como diz o Nazianzeno, se d ei~ou fasc!-
bre. o hexaêmeron com as magnificas passagens sobre a oni- nar pelos atrativos do mundo. Escolheu a proflssao de re-
potencIa de Deus e a beleza da criação. A teoria geocêntrica tor' e estimava ma ís ser chamado rétor do que cristão. Mo-
lhe é apenas urna hipótese. vid~, porém, por seus amigo s e parentes, retirou-~e_ nova-
581. Gregório Nazianzeno (326?-89) foi uma alma mente do mundo, procurou, po r alg um tempo a sohdao, de-
branda, que venerava ~eu grande amigo Basilio como guia di cando-se à ascét ica e aos estudos teológicos, e foi então
da VIda e mestre da fe. Educa do pela piedosa mãe Nona cha mado por Basilio à sede e piscopal de N issa (3 71). Du-
estudou, em seg uid a, nas escolas de Cesaréia na Palestina' ra nte a luta contra os arianos, foi deposto e exilado. Ma s,
Alexandria e Atena s. E studou Com entusiasmo as ci ência s an ~ d epoi s da morte de Valente, voltou e distinguiu-se comO
tiga.s; mas nun.ca se esqueceu da promessa que fizera a mãe, grande teólogo no concilio de Constantinopla.
dedIcando o filho ao Senhor já antes do nascimento dele. 585. Os escritos de Gregório tratam de quase todos os
No meio dos múltiplos negócios que, em seguida, o ocupa- ra mos da teologia e revelam profunda especulação. A su.a
vam, levava uma vida ascética nas proximidades de Na- obra mais célebre, Orafio calechetica mag na, é uma exph-
zianzo. cação e apologia dos principais dogmas da fé. Pretende con-
A desejo da comunidade cristã de Nazianzo, mas con- vencer em geral os judeus, pagãos e 11 eréticos da verdade
tra a sua. vontade foi ordenado sacerdote pelo velho pai, católica. Com o mesmo fím escreveu ainda vári os tratados,
que era bISpo. Sagrado .bispo de Sasima por Bas ílio (372), em particular contra os pneumatômacos, Contra EUllo~1ium,
fOI chamado P ? r T eodoslo Magno a Con stantin opla para mais erudita apologia que se tem escrito contra os ananos,
salva r O catohcl smo da capital. Gregório conseguiu brilhan- e Anlirrh elicus adversus Apollinarem, que os patrólogos con-
temente restaurar a fé ortodoxa por s uas pregações in fla- sideram como a mai s fo rte r efutação do apolinarism o. Par-
madoras. ticular in te resse teve e tem o Dialogas de anima el resur-
582. A esse tempo pertencem os seus célebres Cinco reefione, mag nifico di álogo entre o autor e sua irmã, Macri-
s,ermões teológicos sobre a di vindade do Filho e do Espírito na, que procurava consolar o irmão, desol ado pela morte
Santo, que lh e mereceram o título de "Teól ogo". Eleito bis- de Bas íli o. Além disso, escreveu Gregório uma série de tra-
po da capital, dirigiu algum tempo os negócios do concílio tados ascéticos, retóricos e epistolares. Seja mencionado, ao
de Cons tantinopla. Mas, encontrando resis tência e não con- me nos, o precioso livro De virginifale, em que o autor de-
seguindo pôr termo ao cis ma meleciano de Antioq uia , renun- senvolve com ve rdade iro encanto o pensa mento d e que a
CIOU a seu cargo, e voltou a Nazian zo, onde dirigiu, pelo virgindade faz da alma uma esposa de Crísto. Aos tratados
espaço de do is anos, os negócios da diocese, vacante desde a scéticos pe rtence tamb ém a Vila S. Macrinae, que escreveu
a morte do pai. Dedicou o resto da sua vida a exercícios pouco depois da morte de sua irmã, com o fim de conservar
ascét icos e a tra balhos literários.
O exemplo daque les, "que pela ve rdadeira sabedoria subi ram
583. Gregório Naz ianzeno foi, sem dúvida, O maior Ora- ao mais alto cume da virtude".
dor de seu tempo, o clássico entre os Pa dres gregos. Na sua Bardenhewer, Geschichte der altkirchl. Literatur III, 2. ed., Frei-
d outflna fOI pouco esp eculativo, mas extremamente fiel à burg 1923. - Marx, Pat rologie, 76 55. - Rauschen-Alt-a.ner, Patro-
Tradição eclesiástica. A maior parte das Suas 45 orações Jogie, 173 55; 193 55. - Insu elas, Curso d~ P~trol o gla: - Eus.
Caes Opera PG 19-24. - Sfevenson, Studl es ln EuseblUs, Cam-
conservadas tratam da SS. Trindade. As suas opiniões sobre bridge 1929. '- Alhan. A/ex., Opera, PO 25-28. - Bardy, Mg., Pa-
este ponto da doutrina católica e ram consideradas como as ris 19 14. - Didym., Opera, PO 39. - Funk, Abhandlllngen und
mais sólidas e precisas. Além disso, nos deixou 243 cartas Untersllch., 11 291 ss. - Cyrill. Alex., Opera, PO 68-77. - BaSlI.
e mais de 500 poesias. Magn., Opera, PO 29-32. - AI/ard. Mg., Pans,. 4 .. ed., 1903. -
Greg. Naz., Opera, PO 35-38. - Fleury, St. OregOlre de Naz. et
250 II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão § 54. A escola antioquena e outros escritores orientais 251

·son temps, Paris 1930. - Pellegrirlo, La poesia di San G regório arredores de Antioquia. Mas o estado da sua saúde deli-
Nazianzeno, Milano 1932, - Greg. Nys., Opera Pg 44-46. _ Gomes
de Castro, Die Trinitaetslehre des hL Oregor von Nyssa, Frei-
cada obrigou-o a voltar para Antioquia. Ordenado diácono
burg 1938. (381) e sacerdote (386) , pregou, pelo espaço de dez .a?os,
na catedral da cidade, com zelo ardente e com admlTavel
§ 54. A escola antioquena e outros escritores orientais sucesso. O nome do pregador ecoou também na capital do
império ; e quando morreu o patriarca Nectário de Const~n­
586. Entre os mais distintos representantes da escola tinopla (j' 397), o imperador Arcádia ordenou que Cnsos-
antioquena figuram os dois preCursores do nestorianismo, tomo fosse levado à capital para ser patnarca. Mau grado
Diodoro de Tarso (t 392) e seu discípulo Teodoro de seu aceitou a eleição, e foi sagrado pelo ambicioso Teófilo
Mopsvéstia (t 428). Ambos foram varões nobres, Diodoro de Alexandria.
amigo de S. Basílio, e Teodoro a migo de S. Crisóstomo, e b. Com ze lo apostólico e com energia inquebrantável
não quiseram senão prega r c defender a verdade. Infeliz- começou o nOvO patriarca a exercer o seu ministério. Antes
mente, as tel1dências da escola conduzi ra m-nos a fa lsas con- d e mais nada, empreendeu a reforma tão necessária dos che-
clusões. E precisamente por serem eles os primeiros defen- fes e dos membros da sua Igreja . An imado só pelo zelo das
sores daquela heresia, desaparece ram quase todos os seus almas e pela glória de Deus, e desconhecendo respeito hu-
escritos, embora em muitos tratados se tivessem mostrado mano não hesitou de estigmatizar os vicias do onirotente
baluartes da fé contra os arianos e contra os pagãos. Teo- ministro Eutrópio e da vaidosa e perversa imperatri z Eudó-
doro foi até anatematizado no 5' concílio ecumênico (cfr. xia . Esta não lhe perdoou a fra nqueza. Apoiada pelo ran-
§ 52). De seus escritos só restam os comentários aos pro- CorOSO Teófilo de Alexandria, começou a obra nefanda de
feta s menores e a dez epistolas de S. Paulo, como alguns intrigas contra o santo censor dos co stum es, e conseguiu
f ragmentos de outros tratados.
do fraco marido o decreto de desterro , onde °
santo mor-
587. Discipulo de Diodoro e amigo de Teodoro, sem reu, mártir do seu dever (dr. § 52).
partilhar dos erros de a mbos, foi S. João Crisóstomo, o 589. As obras de Crisóstomo, ql!e chegaram até nós,
mais celebrado dos antioquenos, o orador mais brilhante e são mais nUOle rosas do que as de qualquer outro escritor
um dos caracteres mais' nobres da Igreja oriental. Seu fiel oriental. Tratam principalmente de assuntos práticos e são,
amigo Paládio lhe escreveu a vida (PG 47, 1 ss). pela ma ior parte, com entários à Sagrada Escr itura ~ em .f~r­
Nascido de família rica de Antioquia (347?) , perdeu, " ma de homilias. As mais apreciadas são as suas hom Ilias
pouco depois, o pai , Secundo, comandante em eh ele das tro- sobre os salmos e sobre as epistolas de S. Paulo. Crisós-
pas da Siria. A piedosa mãe, Antusa, viúva de vinte anos tomo venerava altamente o grande apóstolo, e em sua honra
de idade, não quis mai s 'casar-se para se dedicar únicamen- pronunciou sete sermões, nos quais esboça uma magnifica
te à educação de seu filho. Este es tudou retórica na escola imagem da sua vida.
de Antioquia, para escolher, mais tarde, a prolissão de advo- São conservados também muitos outros sermões,
gado. Acon selhado, porém, por um seu amigo Basílio, dedi- do gmático-polêmicos, litúrgicos, panegíricos e ocasionais.
cou-se, na idade de vinte anos, à vida ascética. O então ar- Ent re estes têm principal importànc ia os 21 sermões De sla-
quimandrita Diodoro o iniCiou na doutrina cristã, na ciência luis ad populum Anlioc/oenum, e dois que dizem respeIto
das Escrituras c da ascética. O idea l de Crisóstomo era uma a o ministro derrotado Eut rópio sobre a caducidade da felI-
cela de eremita. Mas não pôde realizar o seu desej o, porque cidade terrestre.
a mãe não quis separar-se do filho. Só dllas obras apologéticas de Crisóstomo chegaram
588. a. Quando, em 373, loi convidado a receber a sa- até nós, Contra judeus e gentios, e Conlra Juliano e os gen-
gração episcopal, julgou ser indigno desta elevação e sub- tios. Mais numerosos são os tra tados mora is ; e a estes per-
,traiu-se pela fuga. Passou alguns aftos numa montanha dos tence a obra mais célebre de Crisóstomo, os seis livros Sobre
252 II época: Desenvolvimento da Igreja no impéri o cristão § 54. A esco la antioquen a e ou tros escritores orientais 253
o sacerdócio. E' um diálogo entre o autor e seu amigo Ba- Os tratados apologéticos, Graecarum aftectionum cura-
si lio sobre a dignidade e a responsabilidade do sacerdote. tio e Polymorphus, terminam dignamente a série das ~polo:
Nenhum de seus livros foi traduzido e impresso tantas ve- gias gregas. Nas suas obras dogmáticas T eodoreto nao 101
zes, como este precioso tratado. Finalmente, escreveu Cri- feliz. Dirigem-se quase todas contra Cirilo de .AI: xandTla.
sóstomo cerca de 238 cartas, redigidas quase todas durante Por isso fo ram condenadas no 5'1 concílio ecumeOlCO, como
o seu segundo desterro. Refl etem a grandeza da sua alma, nestoria~as. A maior parte delas pereceu. Finalmente, escre-
que não vivia senão para Deus. veu Teodoreto numerosos sermões e cartas. As 227 cartas
590. S. João Crisóstomo loi pastor de almas, não conservadas são uma fonte preciosa para o conhecimento do
dogmático especulativo. Todavia, loi contado entre os gran- nestorianismo e do monofisitismo , e revelam-nos a bela alma
des doutores da Igreja, sobretudo por sua doutrina sobre a de um bispo douto e humilde.
Sagrada Eucaristia. Sobre este ponto ele escreveu com tanta 593. Na Palestina brilharam dois luzeiros da ortodo-
c1a ieza como nenhum outro Padre da Igreja antiga. Com ra-
xia: Cirilo de Jerusalém e Epifânio de Sálar:'is. S. Cirilo de
zão foi chamado por contemporâneos e pósteros "Doutor da
Jerusalém (313-86) foi el evado à sede :plscopal em 34.8,
Eucaris·tia", "Coluna da Ig reja", "Luze iro da verdade",
quando a luta ariana agitava todo. o ,~nen.te. Embora. n~o
"Trombeta de Cristo".
simpatizasse com a palavra " h om ~ ustos e nao qutsesse, ImiS-
59 1. O último representante da escola antioquena foi cuir-se na luta , não pôde, todaVIa, abster-se de explIcar a
Teodoreto de Ciro (386-458). Seus pais entregaram-no a verdadeira doutrina católica . E o fez com energia. Como
UI11 mosteiro, onde viveu tranquilamente durante 30 anOS.

I
Atanásio, defende u corajosamente a fé nicena. Por isso, teve
Feito bispo de Ciro (423), dirigiu pelo espaço de 35 anOs de seguir, três vezes, o caminho do desterro.
esta Igreja. Desenvolveu admirável zelo de pastor de almas, Cirilo deve a sua fama, sobretudo, às 24 catequeses,
defendendo o rebanho contra hereges e pagãos e continuan- que dirigiu aos catecúmenos e neófitos (347-48) e qu~ são
do, todavia, a vida ascética. As tendências teológicas que de grande importância para a hlstóna da "t~rgla. Parllcular
caracterizam a escola anti oquena moveram-n o, infelizmente, interesse têm as últimas cinco, chamadas mlsta góglcas, que
a declarar-se contra Cirilo de Alexa ndria no toca nte à ques-
tratam das cerimônias do batismo, da crisma e da Euca-
tão nesto riana. Como, ao mesmo tempo, lutasse contra o
ristia, explicam claramente a presença real. de Jesus Cristo
monolisitismo, loi deposto pelo " latrocín io" de 449. Teo-
doreto apelou para o papa Leão Magno e assinou o aná- e descrevem a li turgia da missa de Jerusalem.
tema cont ra Nestório e loi, por isso, reabilitado como orto- 594. Contemporâneo de Cirilo foi o poli glota S. Epifâ-
doxo no concílio de Calcedônia. Desde então continuou a ttio de Sálamis (t 403). Muito cedo dedicou-se ao estudo
exercer o seu ministério episcopal com zelo apostólico até das Sagradas Escrituras. Depois de. uma viagem ao Egito,
à mort e. abraçou a vida monástica, quando tlllha 20 anos cie Ida?e.
592. Teodoreto foi um dos mais doutos escritores gre- Exerceu longamente o cargo de arquiman.drita do mo~telfo
gos, celeb rado, sobretudo, como exegeta. Seus comentários por ele fundado em Eleuterópolis na JudeIa .. Graças ~ su.a
vencem os de Crisóstomo pela exatidão científica; e há quem fama de douto e piedoso, foi eleito metropolita de Salanlls
o con sidere como maior exege ta entre os antigos. (367). Distinguiu-se por grande amor aos pobres, zelo e~
O douto bispo tem igualmente bom nome 11 0 campo propagar a vida monástica e em defender a pureza da fe,
da historiografia. A sua História da Igreja, continuação da e neste particular mostrou-se, às vezes, bastante tempestuo-
história de Eusébio, trata dos anos 323 até 428. A História so (dr. § 52).
religiosa tem por objeto a vida de 30 ascetas orienta is. O 595. Como a sua atividade de pastor, assim ta~bém
Compendillm fabulamm haereticamm resume a história dos os seus trabalhos literários visavam todos a propagaçao do
hereges desde Simão Mago até f:utiques. monaquismo e a extirpação das heresias. Revela não sómen-
254 II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão § 54. A escola antioq uena e outros esc ri tores orientais 255

te vastos conhecimentos teológicos, mas também maravilho- se para o império romano e estabeleceu-se em Edessa, onde
sos conhecimentos linguisticos. se tornou o mais celebrado mestre da escola.
Entre as suas obras te m o primeiro lugar o Ancora/us, 598. Entre as obras de Efrém compete o primeiro lu-
explicação da doutrina trinitária cont ra arianos e pneuma" ga r aos comentários que escreveu a quase toda a Sag rada
tômacos. O tratado termina com dois simbolos de fé. O pri- Escritura. Relativamente poucos chegaram até nÓs. Fora des-
meiro foi adotado, com insignificantes modifica ções, pelo l' tes comen tá ri os, redigidos em prosa, quase todos os trata-
concílio de Constantinopla (38 1) . Outra obra de Epifânio dos do douto diácono têm forma de poesia, e tratam de
tem o titulo Panárion ou N aereses. E' unta refutação de 80 ass untos moral-ascéticos e dogmático-polémicos. Efrém é
heresias, entre as quais se enumeram também os sis temas considerado o mais zeloso cantor da Virgem Santíss ima.
filosóficos dos pagãos e os partidos religiosos dos judeus. Canta a sua virgindade perpétua e a sua maternidade divi-
Epifânio escreveu, além disso, uma série ue tratadus na. Os seus contemporâneos já o cel eb ravam como "profeta
exegé_ticos, e. entre estes tem não pouca importância para dos sírios" e "citara do Espírito Santo". Bento XV decla"
as c!enClas blbhcas uma propedêutica biblica com o título rou-o Doutor da Igreja ( 1920) .
De mensuris el ponderibus (392). Não tra ta apenas das me- 599. Ibas de Edessa (t 457) , metropolita desta cidade,
didas c dos pesos, mas também do cânon e das traduções ·do trad uziu as obras de Diodoro e de T eodoro de Mopsvéstia,
Antigo Testamento e dos nomes geográficos da biblia. pelo que foi censurado de nestorianismo. O "latrocí nio" de
596. a. Finalmente, devemos tratar aqui de uma sene 449 o decl arou deposto; mas o calcedonense o reintegrou.
de escritores orient ais, que são cha mados sírios. HSírio" .é Rabulas de Edessa teve igualmente grande parte nas
O idioma fo rmado em Edessa, capital do reino de Osroene contrové rsias nestorianas. No concílio de Éfeso esteve ao la-
na Mesopotâmia. E' um ra mo da língua aramaica. O primei- do dos an tioquenos. Mas ainda no mesmo ano se separou
ro período da história eclesiástica não produziu senão pou- deles e defendeu, desde então, vigo rosamente a Cirilo de
cos monumentos literários desta lín gua. O mai s importante Alexandria. De seus escri tos só poucos chegaram até nós.
é a Doe/rina Addaei (dr. § 7). 600. Fundador da literatura armena foi S. Mesrópio
b. A literatura síria teve o seu fl orescimento no seculo (elr. § 42). T endo, por algum tempo, exercido o cargo de
IV. Centros da vida cientifica foram então a escola de Edes- secretário real, retirou-se à solidão, onde numerosos discí-
sa e, mais tarde, a de Nisibis. No tocante aos métodos asse- pulos se lh e associaram. Com eles deixou novamente o re-
melhavam-se à escola antioqucna. Da i se explica que ambas tiro, para pregar entre o povo, apoiado por seU bispo, Isaac
se tornaram , em seguida, centros do nestorianismo . Por isso,
() Orande, igualmen te escritor. Pregação e catequese foi a
a escola de Edessa foi s uprimida pelo imperador Zenão (dr. s ua principal ocupação.
§ 46). N isib is caiu nas mãos dos persas. 601. Ent re os muitos discípul os de Mesrópio podem ser
mencionados Córion, seu biógrafo, Moisés de Cora, escritor
c. Os primeiros escritorcs sirios deste período foram os
mais popular da Arm ênia (t 487), e o eremita Eliseu, que
bispos Jacob de Nísibi s (t c. 338) e Efraates (t 367), escreveu uma hi stória da guerra infeli z, que os arm ênios ti-
chamado o "Sábio da Pérsia". Uma série de 23 tratados veram de sustentar contra os persas. A obra tem também
que nos legou desenvolve uma vista geral da doutrina cristã. importância apologética. Ou tra s obras, particularmente exe-
597. O maior representante da literatura síria é o diá- géticas, sairam da pena de Eliseu. O seu tratado mais belo
cono S. Efrém' (306-73) . Nascido em Nísibis de pais cris- é uma Exortação aos eremitas.
tãos, abraçou a vida eremitica. Seu bispo, Jacob, o ordenou Obras de Teodoro de Mopsvéstia PO 66 ; - de Crisóstomo
diácono e o fez diretor da escola catequética da cidade na- PU 57-64 ; _ de Teodoreto de eiro PG 80-84; de Cirilo de Jeru-
salém PU 33; - de Epifânío PG 41-43. - Bardenhewer, Çleschichte
tal. Quando Nisibis foi anexada à Pérsia (363), os habi- der altkirchl. Li te ratur IV . - Rauschen-Altaner, Patrologle 245 58.
tantes cristãos tiveram qu e deixar a cidade. Efrém retirou- _ Marx, Patrologie 99 5S. - Insuelas, Curso de Patrologia. - Baur, .
256 II época: Desenvolvimento da Igrej a no império cristão § 55. Florescimento da literatura tecI. no ocidente 257
II
II
:
Johannes Chrysostomus und seine Zeit, 2 vol. , Muenchen 1929-30. dias, as orden s sacras. Logo distribuiu os seus bens aos po- !
_ Schutle, Theodoret von Cyrus, Wien 1904. ~ Pu ecll, S. Giovanni bres e dedicou-se com zelo admirável aos trabalhos
Crisostomo, H.oma 1905. - Du val, La littérature syriaque, 3. ed.,
Paris 1907. - Ricciotti, S. Efrem Siro, Torino 1925. -
S. Ephraem Syrí opera, Roma 1915 ss.
Mercati, episcopais.
b. Estudou, antes de tudo, as obras de Clemente de Ale- III
xandria, de Orígcnes, Didimo o Cego e Basílio Magno, a fim II :'
! I
§ 55. Florescimento da literatura teológica no ocidente. - de adquirir os necessários conhecimentos teológicos. Esfor-
I
Escritores helenizantes
602. O primeiro dos escritores ocidentai s deste periodo
çou-se depois eficazmente por reformar os costumes entre
leigos e clérigos, por propagar a vida monástica e melho- I I
é S. Hilário de Poitiers (t 367). o Atanásio do ocidente.
Filho duma família pagã, recebeu o batismo pelo ano de
rar a liturgia, cujas formas até hoje se conservam na Ig reja
de Milão.
c. T emido pelos heréticos c pagãos, amado como pai
I I
350, e foi el eito, pouco depois, bispo da sua cidade natal.
Acre adversário do a rianismo, foi desterrado por Constân- pelos dois jovens imperadores Graciano e Valentiniano II, I II
cio pa ra a Frigia (356-59). Ali teve ocasião de estudar os venerado por T eodósio Magno e admirado por contemporâ-
neos e pósteros, é Ambrósio um dos mais brilhantes luzei-
I
I
.h
Padres gregos, para servir-se, cm seguida, destes conheci-
ros da Igreja ocidental, um dos mais intrépidos defensores i
mentos, a fim de combater a heresia no ocidente.
da liberdade eclesiástica e da moral cristã, não cedendo ao I' I
" 'j' 603 . Foi no exílio, que Hilário escreveu a sua obra
principal, D e Trinilale libri Xli, obra mais excelente que
próprio imperador (Sozom., HE 7, 25; Ambr. , De obitu
Theod. 27, 34; Paul., Vita 24). O seu prestígio e a sua ati-
i I

I
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j .I
se tem escrito na luta contra os arianos. Seguiram-se vários i
.l
vidade ultrapassam muito os limites da sua diocese . Teo-
outros tra tados histórico-polémicos, três dos quais têm por
destinatário O imperador Co nstâncio. Foi ainda no desterro,
dósio o chamava " único digno do nome de bispo".
605. a. Apesar dos seus muitos trabalhos de bispo e
I
que Hilário escreveu uma série de hinos para o culto divino.
Reenviado para as Gálias, o zeloso pastor procurou , conselhei ro dos imperadores, Ambrósio desenvolveu uma ~}

com sábia moderação, restabelecer a fé nicena. Conseguiu-o, admirável atividade literária. Sendo romano e, primeiro que
de fato, num sínodo de Paris (361), onde quase todo o epis- tudo, pastor de almas, todas as suas obras têm por objeto
copado das Gálias se declarou pelo niceno. a ssuntos práticos. Não teve nem inclinação nem tempo para
Como Hilário é O primeiro dogmático entre os latinos, questões especulativas. As suas obras exegéticas são todas,
assim é também o primeiro exegeta importante do ociden- na sua origem , sermões, particularmente sobre O Antigo Tes-
te. Tanto na teologia especulativa como na exposição da tamento, seguindo na interpretação fi elmente as explicações
Sag rada Escri tura revela claramente a influência de Orige- de Filão e de Orígenes. Ao comentário às 13 epístolas de
nes, sem desconhecer, porém, o sentido gramático-histórico S. Paulo nega-se, desde Erasmo de Roterdão, geralmente,
dos livros sagrados. a autenticidade, senelo o au tor desconhecido chamado de
604. a. S. Ambrósio ( 333-97) foi o prim eiro dos quatro Ambrosias tro ou Pseudo-Ambrósio.
grandes doutores da Igreja ocidental. Nascido em Treves, b. Nas obras dogmáticas segue Ambrósio principalmen-
onde o pai residiu como prefeito das Gálias . Depois da mor- te a S. Basilio. Duas são dedicada s ao imperador G racia-
te prematura do pai, a mãe mudou-se com os filh os para no, De t ide ad Gracianum AlIguslum e De Spirilu Saneto .
Roma, onde Ambrósio fez os estudos de retórica e direi to. As principais obras moral-ascéticas são D e virginibus ad
Valentiniano I nomeou-o governador das províncias da Li- Marcel/iI/aro sararem e De ofticiis minislrorwn. Aquela é
gúria e Emília com sede em Milão. Pouco depo is, faleceu uma <.: oleção de sermões às virgens ; este, na sua origem,
o bispo Auxêncio, e Ambrósio foi elevado, pela voz do po- conferências aos clérigos, sistema completo da moral cristã.
vo, à sede episcopaL Depois de longa resistência cedeu às Além disso, nos foram conservadas d1versas orações e
reclamações do povo, recebeu o batismo e, dentro de oito cartas, que nos revelam a alta autoridade de que gozava
t:ompend. l0 I - 17
.
,..
"

258 II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão § 55. Florescimento da literatura teol. no oc~~e. nte 259

Ambrósio na Igreja e no Estado do seu tempo. Finalmente, rios o obrigaram a fugir. O mosteiro foi incendiado. Quatro
compôs o zeloso bispo uma série de hinos para serem can- anos depois faleceu ° santo em Belém.
tados durante o culto divino, que lhe mereceram o título de 607. a. Segundo Sulpício Severo, S. Jerônímo falava
"pai do canto eclesiástico". Houve quem lhe atribuísse tam-
bém o símbolo atanasiano. O Te Deum, porém, hoje, se
perfeitamente o latim, ° grego e o hebraico. O seu estilo
era tão puro, que Erasmo de Roterdão o fez exceder ao
atribui ao bispo Nicetas de Remisiana, amigo de Paulino próprio Cícero. As suas obras tratam de quase todos os
de Nola. assuntos da teologia, e excedem em número as obras de to-
606. a. O mais douto dos Padres da Igreja de seu tem- dos os Padres ocidentais, exeeto as de S. Agostinho .
po foi Sofrônio Eusébio Jerónimo (346?-420). Nascido em b. As suas obras bíblicas, influenciadas sensivelmente
Stridon na Dalmácia de família cristã, recebeu uma educa- por Orígenes, são traduções e comentários. A mais impor-
ção rigorosamente católica. Na idade de vinte anos foi a tante é a Vlllgala. fruto duma revisão da Ílala que teve de
Roma, onde estudou na escola de Donato, gramático celebra- fa zer por ordem do papa Dâmaso. Obras históricas são a
do ainda na idade média. Em seguida, fez longas viagens tradução e continuação da Crônica de Eusébio, De viris il-
pelas Gálias, Grécia e Asia Menor. Durante estas viagens, luslribus, primeira história da literatura cristã, e três biogra-
amadureceu a sua resolução de consagrar-se a Cristo. Reti- lias de S. Paulo, pai dos eremitas, de S. Malco. monge da
rou-se para o deserto de Cálcide ao leste de Antioquia, a Síria, e de S. Hilarião, pai dos monges palestinenses. São
"Tebaida Síria", onde, em lutas heróicas contra a sensua- três biografias que encantam o leitor pela elegância de es-
lidade, recuperou a paz da alma. Paulino de Antioquia deu- tilo e exposição. Podem ser contadas também entre as obras
lhe a ordenação sacerdotal (379). ascéticas de Jerônimo.
b. Jerônimo não desejava senão ocupar-se exclusivamen- Outra obra ascética é a belíssima carta a Eustóquio
te com as ciências teológicas. A fim de aprofundar os seus (Ep . 22) sobre a virgindade, ao mesmo tempo apologia da
conhecimentos exegé'.icos, foi a Constantinopla, onde então vida monástica. À mesma categoria de literatura pertence
pregava S. Gregório Nazianzeno. Lá se entusiasmou pelas um libelo Adversus Helvidillm, e outro Adversus fovinianum.
obras de Orígenes e de Eusébio de Cesaréia. Convidado en- As obras dogmáticas de Jerôn imo têm todas um caráter po-
tão pelo papa Dâmaso I, tomou parte num sínodo de Ro- lêmico. De grande interesse tanto teológico como histórico
ma (382); e em Roma ficou até à morte deste papa na são, finalmente, as cartas, verdadeiros modelos epistolares,
quanto ao estilo e ao conteúdo.
qualidade de secretário do mesmo.
c. Em breve, se tornou centro da vida ascética, rodeado 608. Amigo de S. Jerônimo foi Rufino de Aquiléia
de discípulos e discipulas da mais alta sociedade da capi- (345-410). Nascido de pais cristãos, fez os seus estudos em
Aquiléia e Roma. Em Roma conheceu a S. Jerônimo. Acom-
tal, como Marcela, Paula e EustÓquío. E este monge dou-
panhado da nobre Melân ia Sen., visitou os monges do Egi-
tissimo e austero, que falava e escrevia com a franqueza dum
to. Em Alexandria ouviu as preleções de Dídimo o Cego,
apóstolo, na opinião de muitos, teria sido o mais digno su- que o entusiasmou pelo grande Orígenes. Em seguida, vi-
cessor do velho papa. Mas a popularidade sobe e desce fà- veu longo tempo como eremita no monte das Oliveiras de
cilmente. Quando Dâmaso I faleceu, foi eleito Cirício . Jerô- Jerusalém (378-96), e recebeu do bispo João a ordenação
nimo voltou para o oriente. Depois de ter visitado a Dídimo sacerdotal. Na controvérsia origenista ficou fiel ao grande
o Cego e os monges do deserto nítrico, estabeleceu-se de- alexandrino. Daí resultou um conflito veemente com Jerô-
finitivamente em Belém, onde dirigiu, nos últimos três de- nimo. Reconciliado com ele, por mediação de Teófilo de
cênios da sua vida, uma grande comunidade de monges. Alexandria e de Melânia, reti rou-se para Roma, onde tradu-
A paz do seu mosteiro foi perturbada pela controvér- ziu a obra principal de Orígenes, De principiis, causa de
sia origenista e, mais tarde, pelo pelagianismo, cujos sectá- novas contendas entre os dois amigos.
17· .r
260 II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão § 56. Santo Agostinho e a sua escola 2&\

609. A maior parte das obras de Rufino são iraduções Mas, à medida que a criança se tornava moço, dimi-
de escritos de Origenes, Eusébio, Basilio e outros orientais. nuía a sua repugnância pelos estudos. Passou então para
Obras originais são a continuação da História da Igreja de Madaura, a lim de estudar eloquência e belas artes. Por fal-
Eusébio, a História dos monges do Egito, o Comentário ao ta de recursos, porém, teve de voltar para Tagasta, onde,
símbolo apostólico, uma Apologia contra Jerónimo e outra durante um ano nada fez, senão entregar-se a seus instin-
I Apologia ao papa Anastácio. Quando, no ano 410, os godos
invadiram a Itália, Rufino fugiu para a Siciliá, onde morreu
tos sen suais. Estes tão violentamente o dominavam que, dos
16 aos 32 anos, apenas teve sede de voluptuosidade e de '

,I
I,
no mesmo ano.
Obras de Hilário de Poitiers PL 9-10; - de Ambrós io PL 14-17;
- de Jerõnimo PL 22-30; a corresp. entre jer. e Agost. ed. SChmitt,
Flor. Patr. 22, Bonnae 1930; - de Rufino PL 21. - Bardenhewer,
luxúria.
Em 37 1, pôde começar os estudos de retórica na cida-
de de Cartago. O sensualismo o acompanhou. No ano se-
guinte, uma moça, sua companheira, deu-lhe um filho, Adeó-
Gesch.ichtt der altkirchl. Literatur III- IV. - Marx, Patrologie 11 6
1 ss. - Rallscllen-Altan er, Patrologie 284 S5. - lnsuelas, Curso. - dato. Foi a este tempo que lhe caiu n'as mãos o Hortensius
De Broglie, Sant'Ambrogio, Roma 1906. - Moriera, Torino 1928. de Cicero, diálogo infelizmente perdido em defesa da lilo-
- Ficarra, La p05izione di S. Girolamo nella storia del1a cultura,
2 vol., Palermo 1916-30. sof ia. A leitura deste livro inspirou-lhe melhores sentimen-
tos (Conf. 3, 4). Mas, antes de se converter completamen-
te, teve que esgotar até às fezes a experiência do mal.
l
I
§ 56, Santo Agostinho e a sua escola
610. Quando o império ocidental, a passos agiganta-
dos, marchava para o ocaso e a invasão dos povos germâ-
612. a. Cicero lhe dizia que a felicidade consiste no
conhecimento da verdade. Começando a procurá-la, julgou
encontrá-la no maniqueísmo, porque este parecia oferecer-
nicos parecia dest ruir 'a cultura antiga, Deus deu à sua Igreja
.J um homem, que unia em si toda a cultura grego-romana e
toda a ciência eclesiástica e, por sua personalidade e san-
lhe uma solução convincente do problema do mal que lhe
perturbava o espírito. O dualismo de Manes aplicava-se sin-
gularmente à dualidade que sentia no seu coração , a luta
tidade, de tal forma as centralizava e promovia, que as ri- entre o bem e o ma l. Mônica, sabendo das aberrações de
quezas desta cultura cristã se mostraram capazes de formar seu filho, chora va e rezava, dia e noite, por sua conversão.
o novo mundo da idade média. Este homem · foi S. Agos- E "era impossível que se perdesse o filho de tantas lá-
tinho (Lortz 73). Ele mesmo escreveu, nas Confissões, a sua grimas".
vida até 387; o seu amigo e discípulo Possidio continuou . b. Tendo terminado os estudOs, Agostinho abriu uma
a biografia até à morte ( PL 32, 33). escola de retórica em Tagasta e depois em Cartago. Pare-
611. Aurélio Agostinho (354-430) nasceu em T agasta, cia ser feliz. Mas sentia que lhe faltava alguma coisa. Para
cidade da Numídia. A sua origem. púnica explica-nos mui- procurar consolação, estudou as categorias de Aristóteles, a
tos aspectos da sua alma. "Ardente como o sol da terra, música e a astronomia; e estes estudos causaram-lhe dúvi-
sensual e apaixonado como sua raça, tendo o pensamento das. Fausto de Mileve, bispo maniqueu, maior celebridade
e a prosa ricos de vigor ígnea, é Agostinho o maior dos da seita, númida como Agostinho, não foi capaz de dar res-
africanos" . O pai Patrício legou-lhe os maus instintos da posta aos problemas a cujo respeito Agostinho O consulta-
natureza sensual , a ambição, o amor ao dinheiro. À mãe, va (Conf. 5, 3. 6).
S. Mônica, deveu o melhor de seu coração. A dupla here- c. Além disso, sentia-se Agostinho desgostoso dos es-
ditariedade explica-nos os contrastes de sua natureza. "Des- tudantes de Cartago. Procurava um campo melho r e mais
tinado a tornar-se logo um discípulo louvado e, mais tarde, vasto para a sua atividade. Resolveu mudar-se para a ca-
um professor insigne e, por l im, um mestre infatigável e pital do império. O único obstáculo era sua mãe. Um dia,
venerado, começou por detestar os livros e as escolas" (Pa- a companhou-o ela até ao porto. Agostinho fugiu então, ilu-
pini 18-25). Mais do que os estudos atraíam-no os jogos. dindo a mãe, deixando-a desconsolável à praia da Africa.
.•
§ 56 . Santo Agostinho e a sua escola 263
262 II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão

. 613. a. Agostinho chegou a Roma, em fins de 383. No ele mesmo pede que seja julgado segundo as obras mais
ano seguinte, Simaco, prefeito da capital, enviou-o a Milão, recentes. O estilo das suas obras é diferente, conforme a di-
onde pouco antes o grande Ambrósio triunfara da eloqliên- versidade dos destinatários, simples, às vezes misturado com
cia de Símaco. Agostinho sentiu logo a influência do bispo barbarismos nos escritos populares, claro e preciso nas obras
eminente, cujas pregações brilhavam não por resplendores filosóficas, manifestando todas as artes da eloquência nas
de empréstimo, mas pela convicção e pela caridade (Papini Confissões e na Cidade de Deus. Pelo número e extensão
81). E quando sua mãe chegou a Milão, estava, ao menos, de seus tratados, pela profundeza de pensamentos e pela
para tomar a resolução de abandonar os caminhos errados habilidade de dialética, S. Agostinho excede todos os outros
do maniqueísmo e romper os grilhões da sensualidade. escritores eclesiásticos.
b. O estudo de escritos neoplatônicos, o exemplo do 616. Um lugar especial entre as obras do grande dou-
rétor Mário Vitorino que o venerável sacerdote Simpliciano tor ocupam as Confissões e a Cidade de Deus. Os 13 li-
lhe mostrava, como também a vida de S. Antão, do qual vros das Confissões pertencem às obras mais excelentes da
lhe falava seu am igo Ponticiano, continuavam a obra da con- literatura mundial. Nos 10 primeiros livros, Agostinho canta
versão. Finalmente, à ordem misteriosa de uma criança: os louvores da Providência divina, manifestada na sua vida
"Tolle, lege !" e a leitura de Rom 13, 13-14: "Caminhemos até à morte de sua mãe. São uma confirmação do que es-
como de dia, honestamente; não em... desonestidades e creve no principio: "Fizestes-nos para vós, Senhor, e inquie- .. iI
T dissoluções ... , mas revesti-vos do Senhor Jesus Cristo", - to está o nOSSO coração até que repouse em vós" I, 1). Os
levaram-no ao caminho da santidade. três últimos livros são uma meditação sobre o hexzêmeron. :j
:1"
I c. No retiro de Cassiciacum preparou-se para O hatis- A mais importante de todas as obras de Agostinho são
.,
<
mo, que recebeu na Páscoa de 387 das mãos de S. Am- os 22 livros da Cidade de Deus (412-26), com os quais ele 'I
J brósio, juntamente com seu filho Adeódato e seu melhor
amigo Alipio. Voltou então com os seus para a pátria afri-
criou a filosofia da história, e são, ao mesmo tempo, a mais
brilhante apologia do cristianismo que já se tem escrito. "
;~

cana. Em Ostia faleceu Mônica. Chegado a Tagasta, Agos- A idéia central é o antagonismo entre as duas cidades de "
tinho viveu, por três anos, retirado na casa paterna, trans- Deus e de Satanás. A primeira parte compreende 10 livros
formada em mosteiro. Foram os grandes exercícios espiri- que são a mais completa refutação da mitologia pagã. A se-
tuais do santo, que se preparava para a sua missão heróica gunda consta de 12 livros, nos quais Agostinho estuda a
e para as lutas que o aguardavam. fundo a história das duas cidades adversas. Subdívide-se em
614. Em 391, foi ordenado sacerdote pelo bispo Valéria três partes de quatro livros cada uma. A primeira desc reve
de Hipona. Quatro a nos depois, Valéria o fez seu coadj utor.
Quando, no ano seguinte, morreu o velho bispo, Agostinho
a origem das duas cidades; a segunda apresenta a história 1
,
das mesmas através dos milênios; a terceira esboça o cum-
foi aclamado pelo povo seu sucessor. Desde então, a sua primento do seu destino. "Pela primeira vez, nessa obra, gra-
vida consome-se pelo trabalho, pela palavra falada e escri- ças à luz da revelação ... , uma razão humana atreve-se a
ta e pela oração. Tornou-se logo flagelo dos hereges. O tentar a síntese da história universal" (Gilson).
maniqueísmo, os donatistas, os pelagianos, todos tiveram
que inclinar-se ante a lógica de seus argumentos. Só com 617. Quase inúmeras são as obras dogmáticas e polê-
a morte, durante o assédio da cidade pelos vândalos (430), micas de Agostinho contra os maniqueus, donatistas, pela-
havia de terminar a sua missão. gianos e outros heréticos. Além dos escritos já mencionados
615. As obras de Agostinho tratam de todos' os assun- na história dos donatistas (clr. § 49) e pelagial10s (clr.
tos filosóficos e teológicos, lançando o fundamento de toda § 50), sejam lembrados aqui, a o menos, ainda De fide ei
symbolo, explicação do símbolo apostólico, De Trinifafe, em
a ciência medievaL Gênio igual a Orígenes, excedeu-o pela
púreza da doutrina. E, se, às vezes, muda as suas opiniões, quinze livros, Enchiridion ad Laureniium sive de fide, spe el
264 II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão § 56. Santo Agos1inho e a sua escola 265
earitate, e De haeresibus, resumo da história das heresias energia. Protegeu a Hália contra Átila (452) e a vida dos
desde Simão Mago até Pelágio. romanos contra Genserico (455). Mostrou-se temido flagelo
I Tratados exegéticos e morais, numerosos sermões e car- dos hereges e defensor intrépido do primado romano, cer-
I
tas completam ainda o quadro imponente da atividade li-
i' terária de Agostinho. Pelo fim da sua vida, escreveu as
cando-o de um esplendor como
cessores.
nenhum dos seus ante-
Retrae/aliol/es, obra incompleta em dois livros, na qual nos b. Poucos são os escritos de Leão, porque os seus mui-
dá uma crítica das suas obras anteriores.
tos negócios de chefe da Igreja não lhe permitiam ocupar-
618. Alguns pontos da doutrina de S. Agostinho mere- se de trabalhos científicos. Todavia, as suas 96 orações e
cem especial atenção. A existência de Deus, ele a conclui J 43 cartas revelam-nos um teólogo profundo e hábil diplo-
da evidência das verdades universais, que pressupõem uma mata. Singular importância tem a sua Epístofa dogmática
verdade imutável e eterna. A relação entre a fé e a razão, (cir. § 47 ). A ele como a Próspero de Aquitânia se tem atri-
entre teologia e filosofia é caracterizada pelas palavras: "In- buido o magnifico tratado De voca/ione omnium gen/ium,
tellige ut credas, crede ut intelligas" (Serm. 43, 7). Da SS. apologia excelente da doutrina augustiniana sobre a graça.
Trindade diz o santo: "Non perfecte tractatum est de Tri- Mas o verdadeiro autor é anônimo.
nitate". De fato, a sua própria obra De Trinita/e é o me- 621. a. Contra a doutrina de S. Agostinho sobre a gra-
lhor que a antiguidade tem produzido neste particular. Quan-

l to ii origem da alma inclina-se a ensinar o traducianismo


para explicar mais fàcilmente o pecado original. Não ousa,
porém, dar uma resposta definitiva. Mas em nenhum ponto
ça declárOll-se João Cassiano, pai do semi-pelagianismo.
Iniciado na vida monástica num mosteiro de Belém e entre
os monges do Egito, passou algum tempo em Constantino-

j deu tão vigoroso impulso às ciências teológicas, como na


questão da graça, razão pela qual foi chamado "Doctor
gratiae" (ctr. § 50).
p.la, onde foi diácono de S. João Crisóstomo. Desde 415, di-
rigiu o mosteiro de S. Vitor de Marselha, onde faleceu
em 435.
b. Os dois tratados De institutione coenobiorum e Cof-
619. Entre os amigos e discipulos de S. Agostinho po- la/iones XXIV valeram-lhe o nome de escritor clássico da
de ser contado, em primeiro lugar, o leigo Mário Mercator, vida monástica. Aquele nos relata as instituições e normas
residente desde 429 em Constantinopla, onde combateu com de vida nos mosteiros do Egito e da Palestina. As Col/alio-
êxito o pelagianismo e o nestorianismo. O presbitero Paulo nes são conferências feitas aos monges, contendo colóquios
Orósio, oriundo provàvelmente de Braga em Portugal, foi ter do autor e de seu amigo Germano com os monges e eremi-
com S. Agostinho para lhe pedir auxilio contra os prisci- tas do Egito. Cassiano escreveu também contra o nestoria-
lia nos e escreveu, a pedido de Agostinho, os Historiarum li- nismo e combateu, não menos energicamente, o pela-
bri VII, complemento da Cidade de Deus. Próspero de Aqui- gianismo.
tânia é considerado como melhor discipulo de Agostinho.
622. a. Amigo de Cassiano foi S. Euquério, de origem
Ao lado de seu mestre e depois da sua morte, combateu O
nobre, casado e pai de quatro filhos. Com dois de seus fi-
semi-pelagianismo. E' também O autor de uma Crônica mun-
lhos retirou-se ao mosteiro de Lerins, fundado e dirigido
dial, que resume a crônica de Eusébio e a continua desde 378
então por S. Honorato. Feito bispo de Lião, escreveu duas
. até 455. Alguns patrólogos atribuem-lhe ainda a bela obra
cartas, enaltecendo a vida monástica, e dois tratados exegé-
De voca/ione omnium genU"m.
ticos, dedicados aos dois filhos , igualmente elevados à digni-
620. a. Grande admirador de S. Agostinho foi, final- dade episcopal.
mente, o papa Leão I (440-61), "U1lI dos llIaiores papas da b. Outro discipulo de Honorato foi S. Hilário, desde 429
antiguidade. Já como arcediago dos seus antecessores era a a rcebispo de Arles. Escreveu vários tratados, dos quais fi-
personalidade mais importante da cúria rOmana. Feito papa, cou conservada a Vito S. Honorati. Á mesma comunidade
governou a Igreja com admirável sabedoria, prudência e religiosa pertence Vicente de Lerins que nos deu, no seu
266 II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão § 57. 05 últimos escritores da antiguidade cristã 267
célebre Commonitorium (434), um tratado brilhante sobre o 625. Salviano (t c. 480), presbitero de Marselha, cha-
princípio da tradição eclesiástica. "Magnopere credendum mado "Jeremias" de seu tempo, deu-nos uma preciosa e com-
est, ut id teneamus, quod ubique, quod semper, quod ab !'lleta descrição dos costumes do império decadente, espe-
omnibus creditum est" (ctr. § 51). Não consta ser ele o cialmente nos seus De gubernafione Dei libri VII!. O aus-
adversário de S. Agostinho e o autor das Oh jectiones vin- tero autor quer fortificar a fé do povo na Providência di-
centinae, combatido por Próspero de Aquitânia. vina, abalada pelos flagelos das invasões dos bárbaros.
Obras de S. Agostinho PL 32-47; Confessiones, ed. Skutella Igualmente presbítero de Marselha foi Genádio, cuja vi-
(Teubner) 1934; !)" Civ. Dei, ed. Hoffmann, CSEL 40, 2 vol. da nos é desconhecida. Faleceu no último decênio do sé-
1899-1900; S. Augustini textus eucharistici selecti ed. Lang (Flor.
patr. 35), Bonnae 1933; S. Augustini textus seleeti de poenit., ed. culo V. Suas obras polêmicas contra todas as heresias se
Schmaus (Flor. patr. 38), Eonnae 1934; Ss. Hieronymi et Augustini perderam. Conservada ficou a continuação da obra de S.
epistolae mutuae, ed. Schmid (Flor. patr. 22), Bonnae 1930. ~ Obras ]erônimo De viris illudr/bus.
de Mário Merc. PL 48; de ürósio PL 31; de Próspero PL 51; de
Leão I PL 54-56. - Possidius, Vita S. Augustini, em S. Possidii 626. O poeta leigo Comodiano parece pertencer à se-
opuscula ed. Vega, Escorial 1935. - Halz/eld, Sant'Agostino, Roma
1907. - Hertling, Augustinus, ,Mainz 1911. - Papini, A Vida de gunda metade do século V (clr. § 40). Avito de Viena (t
Santo Agostinho, trad. porto por o. Rangel, Rio de Janeiro 1932. 518?), bispo insigne e adversário forte do arianismo, nes-
----'-- Gilson, lntroduction à l'étude de S. Augustin, Paris 1929. - torianismo e monofisitismo, escreveu, entre outras obras, 100
Bougaud, Historia de S. Mônica, 2. ed. port., Guimarães 1888. -
Rica bibliografia em Funk-Bihlmeyer I, 371 sS. - Bardenhewer, cartas de alta importância para a história de seu tempo.
Geschichte der altkirchl. Literatur IV, 434 sS. - Rauschen-Altaner, Distinguiu-se também como poeta, sendo a sua obra princi-
Patrologie 319 55. - Marx, Patrologie 129 S5. - Insuelas, Curso. pal um poema que, em cinco livros, canta a criação, o pe-
cado dos primeiros pais, o seu castigo, o dilúvio e a passa-
§ 57. Os últimos escritores da antiguidade cristã gem pelo Mar Vermelho. Cesário de Arles (t 542), um dos
623. A transmigração dos povos com as suas conse- lI)ais insignes oradores da antiguidade, promotor e organi-
quências dificultaram não pouco o cultivo das ciências e da zador do mona cato, foi igualmente grande como pastor da
literatura. No ocidente temos, todavia, ainda uma série de sua Igreja e reformador da disciplina.
escritores de renome. A missão principal dos mesmos foi 627. Venâncio Fortunato de Poitiers (t 60 I) foi o úl-
a educação dos povos germânicos. Realizaram-na, transmi- timo poeta latino de importância. Os seus hinos Pange, lin-
tindo-lhes e adaptando-lhes os benefícios da cultura antiga, gua, Vexilla regis e Quem terra pontus aethera ainda hoje
profana e religiosa. Como aqueles povos, em grande parte, fazem parte da liturgia. Há quem lhe queira atribuir também
tinham aceito o arianismo, os escritores eClesiásticos desse o Ave, maris stella.
tempo tiveram de cumprir uma segunda tarefa, combater a Amigo de Venâncio foi Gregório de Tours ('r 594),
heresia. historiógrafo dos francos e autor dos Miraculorum libri VIII.
624. Um dos mais acres adversários desse arianismo Na História dos francos nos dá primeiro um resumo da his-
foi S. Fulgêncio de Ruspe (468-532). Desterrado pelo rei tória mundial até 397. Em seguida, relata a história dos
Trasimundo (507), voltou, durante o reinado de Hilderico francos desde Clóvis até Sigiberto e, finalmente a história
(523), e trabalhou com zelo ardente e verdadeiro heroísmo contemporânea, desde 575 até 591. Apesar de pouco criti-
em defesa da fé católica contra os arianos. Escreveu tam- ca, a obra tem grande valor para o conhecimento das con-
bém sobre a doutrina da graça, seguindo fielmente a S. dições politicas e religiosas do seu tempo.
Agostinho. Sua obra mais célebre é De tide sive de regula 628. Na· Itália floresceram, na primeira parte do século
fidei ad Petrum, breve, mais precioso resumo de toda a V, S. Pedro Crisólogo, bispo de Ravena (t c. 450) e Má-
dogmática. Fulgêncio foi o mais insigne teólogo do seu ximo, bispo de Turim (t c. 465), ambos eximias pregado-
tempo. res. Poucos escritos nos deixaram. Dois outros, pelo contrá-
268 II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão § 57. Os últimos escritores da antiguidade cristã 269

rio, influenciaram como poucos a teologia medieval, Boécio 632. Aqui deve ser mencionado também o Liber Ponti-
e Cassiodoro. ficalis, atribuído por Panvínio errôneamente a Anastácio Bi-
629. a. O filósofo Boécío (480-525), oriundo da fami- bliotecário. A obra é uma história dos papas em forma de
lia dos Anícios e, portanto, da mais antiga nobreza romana, biografias. A primeira parte, desde S. Pedro até o ano de
gozava do especial favor de Teodorico, rei dos ostrogodos. 530, foi redigida provàvelmente durante o pontificado de Bo-
Por suspeita de alta traição porém, foi cruelmente suplI- nifácio II (530-32). Outros autores desconhecidos continua-
ciado (525). ram a obra até ao pontificado de Estêvão V (VI; 885-91).
Com esta data term;lla o Liber Pontificalis nas suas edições
b. A sua obra principal, escrita na prisão, De consola- mais antigas (PL 117-119). Edições mais recentes contêm
tione philosophiae, foi muito apreciada durante a idade mé- várias outras continuações. Desde o pontificado de Anastá-
dia. Boécio prova que a verdadeira felicidade não consiste cio II, a ohra é uma fonte preciosÍssima para a história do
nos bens do mundo, mas na posse do bem supremo. Seus papado.
tratados teológicos procuram explicar filosO!icamente o mis-
tério da SS. Trindade e combatem o nestorianismo e o 010- 533. Ao século VII, finalmente, pertencem ainda alguns
noíisitismo. escritores de primeira ordem. S. Gregório Magno (590-604)
Boécio é, por assim dizer, o "último romano" e o "pri- é, depois de Ambrósio, Agostinho e jerônimo, o quarto dos
meiro escolástico". A sua importância está principalmente grandes doutores da Igreja ocidental. Oriundo de uma fa-
em que transmitiu à idade média o conhecimento da lógica milia rica patrícia, e por longos anos alto oficial e prefeito
aristotélica e lançou, por seus escritos, o fundamento formal de Roma, retirou-se depois para o mosteiro de S. André,
para o primeiro desenvolvimento da escolástica. que ele mesmo fundara. O papa Pelágío II enviou-o a Cons-
tantinopla na qualidade de apocrisiário pontifício e, tendo
630. Cassiodoro Senator (t c. 575) nasceu em Esqui- falecido Pelágio, foi eleito unânimemente seu sucessor. Não
lácio na Calábria de familia distinta. Tendo apenas a idade lhe valeu nem a fuga, nem a petição ao imperador, para
de 20 anos, foi nomeado secretário do rei Teodorico e veio que não confirmasse a eleição. Aceitou, finalmente, a digni-
a ser, em seguida, alma do governo de Teodorico e dos dade das mãos da Providência e desenvolveu uma maravi-
seus imediatos sucessores. Em 540, deixou a vida política lhosa atividade para propagar o cristianismo e a vida mo-
e retirou-se para as suas possessões no sul da Itália, onde nástica, para reformar o canto eclesiástico, combater o cis-
fundou e dirigiu o mosteiro de Vivário. Dedicou ali o resto ma milanês e suavizar a sorte da Itália. Com razão pode
da sua vida à ascética e à ciência, cujo cultivo impôs tam- ser considerado como fundador do Estado da Igreja.
bém aos seus monges.
634. Desta atividade são testemunhos as suas 848 car-
Cassiodoro escreveu, entre outras obras, De origine
actibllsque Oelamm, valiosa história dos godos, Hisloria
• tas conservadas e outros escritos, exegéticos, morais e litúr-
gicos. No que diz respeito às cartas, não há nenhum papa
ecclesiastica Iripartita, que ficou sendo, por assim dizer, ma- anterior, nem papa algum posterior até Gregório VII, que
nual de história eclesiástica na idade média, os doze livros nos tenha deixado tantos documentos. Todavia, dizem os
das Variae, seil. epistolae, coleção de decretos dos reis os- seus biógrafos, que só pequena parte da sua correspondên-
trogodos, fonte importante da história, e, principalmente, cia nos ficou conservada.
Institutiones divinarum el saeeularium lilleraram, enciclopé~ Digna de menção é, particularmente, a sua Regula
dia e metodologia das ciências. pastoralis, instrução sobre o modo de administrar os cargos
631. Amigo de Cassiodoro foi Dionísio Exíguo, oriundo eclesiásticos, que logo foi traduzida para o grego e, mais
da Citia, mais tarde monge em Roma, conhecido por suas tarde, para o inglês, e muito apreciada durante a idade-
traduções e coleções de cânones sinodais e decretos pontifí- média como compêndio da teologia pastoral. A Expositio in
cios e, sobretudo, pelo cômputo da era cristã. librum lob ou Moralillm libri XXXV, obra mais volumosa de
270 II época : Desenvolvimento da Igreja no império cristão § 57. Os últimos escritores da antiguidade cristã 271

Gregório, é um repertório de teologia moral. Os Dialogorum plica os diversos nomes de Deus na Sagrada Escritura, para
libri IV nos relatam a vida de diversos santos da Itália . A explicar a ssim a essência e as perfeições divinas. De mystica
biografia de S. Bento ocupa todo o livro II. Os livros li- /h eologia ensina em cinco capítulos a união mística da al-
túrgicos, Sacramen/ari1l1n Gregorianum, Liber anliphonarius ma com Deus, aquele estado em que a alma conhece a Deus
e Liber respo nsalis, provàvelmenie não podem ser atribuídos por um conhecimento inefável, extático . Em De caelesli hie-
a Gregório. rarchia encontramos, pela primeira vez, os espíritos cel estes
635. Na Espanha floresceram , nO mesmo tempo, S. divididos em três jera rquias de três coros cada uma . Em
Leandro de Sevilha (t 601), apóstolo do reino dos visigo- De ecclesiaslica hierarchia, o autor pretende demonstrar que
dos e am igo de Gregório Mag no, S. Ildefonso (t 669), bis- a jerarquia terrestre é uma imitação da jera rquia celeste.
po de Toledo, e, mais do que todos, S. Isidoro (t 636), s u- Ele é o primeiro escritor crístão a descrever os três cami-
cessor de seu irmã o Leandro na sede episcopal de Sevilha. nhos místicos que I~v a m a Deus, a via purgativa, iIum inati-·
foi ele, de certo modo, o último Padre da Igreja ocidental va e unitiva; e é chamado "pai da mística cristã".
e o mais célebre dos escritores desse tempo. 638. O teólogo maís erudito entre os gregos, no prin--
Escreveu Origines seu E/ymologiae, breve enciclopédia cipio do sécul o VI, fo i Leôncio de Bízâncio (t c. 543),
das ciências em vinte lívros, e De ecclesiaslicis otticiis, des- monge da laura nova de Jerusalém. Profundo conhecedor
crição das cerimônias do culto divino. Como historiador es- da lógica aristotélica, combateu as heresias de seu tempo,
creveu De viris illus/ribus, continuação da obra de Jerônimo nestonaOlsmo e monofisitismo. Sua obra principal é Adver-
e de Genádio, e a Historia de rebus Golhorum, Wandalorum SIlS Nes torianos el Eulychianos libri III. Na doutrina teo-

el Suev omm. Isidoro transmitiu as ciências antigas aos po- lógica segue, de preferência, S. Cirilo de Alexand ria.
vos germânicos, pelo que é chamado "Mestre da idade- 639. Pelos meados do mesmo século, brilhou o maior
média". poeta religioso da Ig reja grega, Romano, o Cantor ou Me-
636. Na literatura grega nota-se, desde meados do sé- lod ioso, oriundo da Siria e presbítero de Constantinopla.
culo V, uma decadência ma is sensível do que na literatura Dos seus mil (?) hinos só oitenta foram conservados. Dis-
latina. Depois das grandes controvérsias teológicas, mostra- ting uem-se pela profundeza de sentimen to religioso e pela
va-se pouco interesse pelos estudos científicos. sublimidade da linguagem.
Entre os poucos escritores que têm algum renome o pri- 640. Um escritor muito celebrado foí S. João Climaco,
meiro é o Pseudo-Díonísio Areopagita. Existe uma séri e de falecido segundo uns pelo ano de 600, segu ndo outros, pelo
tratados teológicos, que du rante muito tempo foram at ribuí- ano de 649. A sua grande erudição lhe valeu o apelido de
dos ao discipulo de S. Paulo, Dionísio de Atenas. O próprio "escolástico". Na idade de 16 anos entrou no mosteiro do
a uto r apresenta-se como tal. Durante a idade-média era con-
siderado com o primeiro bispo de Paris. Mas tudo isto é in-
• monte Sinaí, que ele, mais tarde, dirigiu como abade e onde
escreveu a Scala paradisi (K}Jjlaç), guia de vida espiri-
sustentável. Hoje, todos reconhecem que se trata de um au- tual. Sob a imagem duma escada que conduz ao céu descre-
tor que escreveu pelo fím do século V ou princípio do sé- ve o contínuo ape rfeíçoa mento dos ascetas. A última parte
culo VI, na Síria. Os tratados dependem de Clem ente de da obra, hoje considerada como opúsculo indepen den te, Ad
Alexandria e mais ainda do neoplató nico Prad o (t 485). O Pastorem, apresenta aos superiores dos monges o ideal dum
autor gozava de grande estima não só no oriente, como tam- bom pa stor.
bém no ocidente e influenciou não pouco a escolástica da 641. S. Solorónio de Damasco (t 638), monge e des-
idade-média. S. Antônío, S. Tomás de Aquíno e S. Boaven- de 634 patriarca de Jerusa lém, escreVeu uma Carta sinodal
tura citam-no frequ entemente. cont~a os monoteletas, alguns tratados biográficos, diversas
637 . O desconhecido autor deixou-nos quatro tratados oraçoes e poesIas. Na idade-média se lhe atríbuía também
e dez cartas. O primeiro tratado, De divinis nominiblls, ex- o Pralum spirituale, coleção de exemplos e milagres de mon-
· ··---·-----··. . - - - - - - - - - - - - - - - - - - - " r o
. ,
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272 II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão § 58. O clero secular. - Novos oHeios eclesiásticos 273

ges e ascetas. No entanto, esta obra interessante saiu da CAPiTULO IV


pena de João Moxo (i- 619), igualmente monge de Jerusa-
lém e amigo de Soforônio, a quem encarregou de publicá-Ia. CLERO E MONACATO. - CULTO E DISCIPLINA
642. Com o Prado espiritual tem muita semelhança a § 58. O clero secular. -- Novos oficias eclesiásticos
Historia Lallsiaca. Paládio, seu provável autor, pertence ao
século anterior. Nascido na Galácia, tornou-se monge, quan- 644. A rápida propaga,}o do cristianismo e a multi-
do jovem, visitou os mosteiros mais célebres de seu tempo, plicação das comunidades, como também a nova condi cão
foi discípulo de Evágrio Pôntico e chegou a ser bispo de da Igreja perante o Estado acarre tava m a necessidade' de
Helenópolis na Bitinia. Como tal defendeu generosamente a ce rtas mudanças na organização eclesiástica, já desde o sé-
S. João Crisóstomo e foi, por isso, exilado. Em 412, pôde culo IV.
voltar, sendo então nomeado bispo de Aspuna. Para centralizar a ajministração da Igreja, foi abolido,
Pelo ano de 420, escreveu a História Lausiqca ou Pa- pouco a pouco, o instituto dos corepiscopos. Um sinodo de
raiso Oll Vida dos Ss. Padres, ded icando-a ao estadista Lau- Laodicéia (c. 360) suprimiu-o de todo (cân. 51). Todavia ,
sus. Dai o nome. Muito lida, copiada, interpolada e aumen- na Africa encontraram":se muitos corepíscopos ainda no sé-
tada, é uma leitura edificante, <labrindo-nos um mundo que culo V; e no reino dos francos reaparecem, de novo, con-
não é deste mundo". servando-se até ao século ' XI. Em lugar do corepiscopado

l' 643. O mais insigne teólogo grego do século VII foi


S. Máximo, o Confessor (t 662). T endo sido primeiro se-
desenvolveu-se o sistema paroquial, que no cân. 6 do concí-
lio calcedonense já aparece como fato consumado (dr. §
22); o cân. 11 trata particularmente dos párocos .
cretário do imperador Heráclio, foi, mais tarde, monge e
abade do mosteiro de Crisópolis, hoje Scútari, perto de Cons- 645. Os primeiros de entre os presb íteros e diáconos
J tantinopla, e como tal, depois da morte de Soforônio, adver- receberam os títulos de "arcepresbitero " ou arcipreste" c
lI

sário principal do monoteletismo (cfr. § 48). Em uma cé- "arcediago". Aquele era o substituto do bispo nas funções
lebre disputa que, em 645, teve com O ex-patriarca Pirro, sacerdotais, este, seu auxiliar na administração e jurisdição.
convenceu o adversário do seu erro monotelético. No reina- O ofício do arcediago tornou-se particularmente importante,
do de Constâncio II, sofreu o martirio. pelo que, não raras vezes, o arcediago era eleito sucessor
A maior parte dos seus escritos numerosos combatem o do bispo.
monoteletismo. A sua Mystagogia é uma explicação simbó- 646. Também no tocante às ordens menores houve al-
lica da Igreja e do seu culto . guma mudança . No oriente desapareceram , nos séculos VII
Obras de Fulgêncio PL 65; de Avito PL 59; de Venâncio PL 88 ; e VIII , os exorcistas e ostiários; o acolitato ali nunca exis-
de Greg. lIe Tours PL 71; de Boécio PL 63-64; de Cassiodoro PI.. c'
tiu. O of icio das diaconisas foi perdendo o seu objetivo à
69-70; de Gregório Magno PL 75-79; de Isidoro PL 81-84; LP ed.
lJuchesne (até Martinho V), 2 vol., Paris 1886-92; Migne, PL medida que se ia to rnando geral o batismo das crianças.
117-11 9; Ps. - Dionísio PO 3-4; Leôncio PO 86; Máximo PG Todavia, manteve-se no oriente até fins do século VII. Nas
90-91. - Pllnzi, L'ltalia dei seco lo vr nelle Variae di Cassiodoro, Gálias desapareceu nos séculos V e VI; em outras partes
Aquila 1927. - Bardenhewer, Geschichte der altk. Literatur IV-V.
_ . Rausc!zen-Altaner, Patrologie 372 55. - Marx, Patrologie 160 55. do oc idente, no século seguinte. Mas reapareceu, na idade-
_ [/lsllelas, Curso de Patrologia. média, no instituto das canonisas.
647. Ao lado dos antigos ofícios foi criada uma sene
de outros nOvos. Desde o século IV, houve verdadeiras es-
colas de cantores. Seu diretor chamava-se simplesmente
"cantor" ou primicério e teve, em seguida, grande autori-
dgde. No oriente, o instituto dos cantores era distinguido
CoI11pêndio I - 18
274 II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão § 58. O clero secular. ~ Novos ofícios eclesiásticos 275
pela elevação à ordem. Parece, no entanto, que a qualidade Toledo (681). Os reis merovingios chegaram até a nomear
de cantor era unida à de leitor. os bispos, mesmo contra as reclamações da Igreja, e fa-
Outros ofícios eram administrados, em parte, por clé- ziam-no não sem simonia. Os reís ostrogodos da Itália, de-
rigos, em parte, por leigos. Podem ser enumerados os se- pois da morte do papa João I (526), reclamavam para si
guintes: Os hermeneutas ou intérpretes tinham de traduzir o direito da confirmação do papa. O mesmo fizeram os im-
as Sagradas Escrituras e as homílias aos que não entendiam peradores bizantinos desde o pontificado de Pelágío I
a lingua nacional. Os mansionários ou custodes tinham de (556-61). Contra o abuso de designarem os próprios bispos
guardar os edifícios cultuais e os sepulcros dos mártires. o seu sucessor, vários sínodos levantaram o seu protesto.
Os sincelos eram os familiares, conselheiros e até vigilantes 650. As condições da admissão ao estado clerical eram
do bispo. Os ecônomos administravam os bens eclesiásticos; as mesmas como no período anterior. Não eram admitidos
a sua instituição foi prescrita pelo calcedonense (cân. 26) escravos, penitentes, ne6fitos, clínicos, bígamos, atores, sol-
para todas as igrejas episcopais. No ocidente chamavam-se dados e os que tinham algum defeito corporal. Ninguém
também "vicedomini" e tinham grande influência. Os defen- podia ser eleito bispo, se não tivesse passado antes, com
sores presidiam aos processos eclesiásticos. Os notários e distinção, por todos os degraus da jerarquía. A volta ao
arquivistas redigiam, respectivamente guardavam as atas estado leigo ou a aceitação de cargos civis incompatíveis
eclesiásticas. Os apocrisiários ou núncios eram legados dos com o estado clerical era punida com a deposição ou até
patriarcas, principalmente dos papas, junto à corte de Cons- com a excomunhão. Bispos, sacerdotes e diáconos não po-
tantinopla, respectivamente de Ravena. diam, em virtude de diversos cânones disciplinares (Nic.
648. A educação do clero teve ainda, em parte, as an- 15; Calco 5), passar de uma Igreja a outra. Só em caso
tigas formas (cfr. § 24). Mas Eusébio de Vercelli e S. Agos- de grande utilidade fazia-se uma exceção.
tinho reuniram em suas casas os seus clérigos, confiando 651. Desde o século IV, tornou-se costume entre o cle-
a instrução dos jovens aos mais velhos e criando assim uma ro cortar os cabelos. No século V, a tonsura foi introduzida
espécie de seminário. Outros bispos imitaram este exem- como sinal distintivo. No oriente usava-se a chamada ton-
plo. Também alguns mosteiros tornaram-se viveiros para sura Pauli, no ocidente, a tonsura Petri. Esta chamava-se
o clero. Não poucos bispos excelentes receberam neles a sua também "carona Christi". Na Igreja iro-escocesa foi intro-
educação. duzida uma terceira forma, "tonsura S. ]oannis" ou "ton-
649. a. Também a eleição guardou essencialmente a sura S. Jacobi". Desde o século XVI, a tonsura dos clérigos
sua antiga forma. Porém, de mais a mais, restringiu-se o seculares foí reduzida a um pequeno CÍrculo.
influxo do povo. Justiniano I não admitia senão os clérigos 652. a. No tocante ao celibato, separaram-se igualmen-
e os nobres, que tinham de propor três candidatos (Nov.
123), sendo reservado ao metropolita o direito de nomear
• te, desde o século IV, o oriente e o ocidente. No ocidente,
proibiu-se, desde o sínodo de Elvira (cân. 33), o uso do
de entre estes o mais digno. Mais tarde, desapareceu todo matrimônio aos clérigos superiores. Leão I e Gregório 1 es-
o direito da comunidade, e só os bispos da provincia tinham tenderam esta proibição aos subdiáconos. No entanto, não
de propor os candidatos. foi possível introduzir o celibato logo em toda parte. l\as
b. Muitas vezes, o Estado fazia sentir demasiadamen- aldeias e nas cidades menores, ainda nos tempos de Am-
te o seu influxo nas eleições, particularmente no oriente. brósio, viviam muitos clérigos casados (De off. 1, 50). A
Para a sede de Constantinopla, desde os dias de Teodósio I, Igreja oriental manteve a antiga praxe (cfr. § 24), e san-
fazia-se a nomeação, por via de regra, pelo imperador. No cionou-a pelo sínodo trulano de 692 (cãn. 13).
ocidente, particularmente nos reinos dos francos e visigodos, b. A fim de evitar suspeitas contra clérigos não casa-
aparece, desde o século VI, ao lado da eleição, a confirma- dos, proibiu-lhes o concílio de Nicéia ter em sua casa mu-
ção real, como atestam os sínodos de Orange (529) e de 1heres "subintroductas", (Ia não ser mãe, irmã ou tia ou

"*
r
276 Ii época; Desenvolvimento da Igreja no império cristão § 59. Constituição patriarcal. - Sistema sinodal 277

outras pessoas que excluissem qualquer suspeita" (cân. 3). frer uma sensível mudança. O l' concílio de Constantinopla
Disposições semelhantes foram feitas em sínodos pos- concedeu ao bispo da Nova Roma a precedência logo de-
teriores. pois do da Antiga Roma, "propterea quod urbs ipsa sit
653. G. Constantino Magno concedera aos clérigos o iunior Roma" (cãn. 3). O calcedonense deu-lhe o direito de
privilégio da imunidade dos serviços municipais. Os filhos sagrar os metropolitas das dioceses politicas do Ponto, da
de Constantino isentaram-nos também dos impostos extraor- Asia e Trácia (cân. 28), pelo que a Igreja de Constantinopla
dinários. Ao privilégio da imunidade acresceu, em breve, o obteve a dignidade das de Roma, Alexandria e Antioquia. Os
privilegium iori. O sínodo de Cartago de 397 (cân. 9) or- legados pontifícios protestaram contra a disposição do con-
denou que os clérigos fizessem as suas queixas perante o cilio; mas cm vão. Os bispos de Constantinopla souberam
tribunal eclesiástico. O mesmo foi sancionado pelo concilio manter as novas atribuições, e não contentes ainda com o
de Calccdônia (cân. 9). Justiniano I mandou que também os título de patriarca, como se chamavam os bispos das quatro
leigos o fizessem, quando se tratasse de contendas entre lei- Igrejas desde o século V, e com o fim de dar maior brilho
gos e clérigos, pelo que se concedia à Igreja um verdadeiro à sua dignidade de bispos da capital, designaram-se, desde
poder judicial (Cod. J ust. 1, 4, 29). o cisma acaciano, com o título de "patriarca ecumênico H ,
b. No ocidente, respectivamente no reino dos francos, Justiniano I declarou (545) que os bispos de Constantinopla

l
fazia-se o processo perante o tribunal civil, mas com licen_ seguissem na dignidade imediatamente ao bispo de Roma e
ça do bispo, quando se tratava de clérigos, na presença do precedessem a todos os outros bispos (Nov. 131, 2). Gre-
superior eclesiástico, quando se tratava de processos entre gório I combateu o título de patriarca ecumênico como "ne-
I
leigos e clérigos. Os bispos eram julgados, desde o século fandum elationis vocabulum". Mas o título ficou.
VI, exclusivamente pelos sínodos provinciais. 656. Pelo mesmo concilio calcedonense, o titulo de pa-
J c. Segundo a norma de S. Paulo (1 Cor 6, 1 ss), Cons-
tantino Magno concedera que também litígios entre leigos
triarca foi concedido também ao bispo de Jerusalém, em-
bora com atribuições muito inferiores e por motivo exclu-
podiam ser tratados pelo bispo, quando uma das partes sivamente eclesiástico. Tendo sido sufragâneo do metropo-
assim o desejava, mesmo contra as reclamações do outro la- lita de Cesaréia, gozara sempre da precedência ante os ou-
do. Honório e Arcádia reduziram esta jurisdição episcopal ao tros bispos da província, privilégio que o niceno lhe con-
caso em que ambos os partidos se dirigissem ao tribunal firmara (cân. 7). Mas esta honra não bastava a alguns bis-
do bispo. pos menos dignos. O ambicioso Juvenal (421-58) obteve
Stutz, Geschichte des kirchlichen Benefizialwesens von seinen do calcedonense a jurisdição sobre os três bispos da Pa-
Anfaengen bis Alexander III, I, Berlin 1895. - Galtier, Ou rôle des lestina, depois de ter conseguido de Teodósio II a jurisdição
évêques dans le droit public et privé du bas empire, Paris 1893. -
1mbarf de la Toar, Les paroisses rurales dans l'ancienne France,
Paris 1900. - Funk-Bihlmeyer I, 281 ss.
• sobre a Arábia e a Fenicia. Teve, porém, de restituir estas
últimas ao patriarca de Antioquia, depois do novo aumento
da sua autoridade.
§ 59. Constituição patriarcal. - Sistema sinodal 657. No ocidente, o bispo de Roma era o único patriar-
ca. Mas, desde sempre acentuava-se mais o seu primado
654. O concilio de Nicéia (cãn. 6) ordenou que, assim
sobre a Igreja universal. Ao lado de Roma, existiam alguns
como os bispos de Roma, também os de Alexandria e An-
bispados que gozavam de certa autoridade sobre distrito
tioquia conservassem os seus antigos privilégios e a sua au-
mais vasto. Na Africa formara-se a constituição metropo-
toridade sobre os outros metropolitas, c que estes, por seu litana, e a primazia dos bispos de Cartago já durante o pe-
lado, ficassem com os seus direitos sobre os demais bispos. ríodo das perseguições. Obedeciam-lhes as três províncias
655. Quando Constantino Magno transferiu a sua resi- da Africa proconsular, Numídia e Mauritânia. Pelo fim do
dência para Constantinopla (330), esta disposição veio a so- século IV, formou-se a constituição metropolitana de Milão
278 II época: Desenvolvimento da igreja no império cristão § 59. Constituição patriarcal. - Sistema sinodal 279
e, um pouco mais tarde, a de Ravena. O motivo desta ele- pos do império, e porque era o imperador quem os convo-
vaçfu:J. foi o mesmo da de Constantinopla. Ambas as cidades cava. Os sinodais e o próprio papa reconheceram-lhe este
foram residências imperiais. direito. Era também o imperador quem mantinha a ordem
658. Nas Gálias não havia ainda constituição metropo- e, deixando aos bispos 'as deliberações e decisões, confir-
litana, quando os bispos se reuniram no sino do de Arles mava as decisões, elevava-as a leis do Estado e cuidava
(314). Só durante o século seguinte se formou. E corno en- da sua execução.
tão a Igreja de Arles tivesse maior importância, pretendia 662. Eram convidados os metropolitas, que tinham de
ter a dignidade de metrópole. Daí resultou um conflito en- vir acompanhados por uma parte dos seus sufragâneos. Era
tre os bispos de Arles e Viena. Hilário de Arles (429-50) considerada como necessária a presença dos patriarcas ou
reclamava até o direito de dar ordens em outras províncias dos seus substitutos. Geralmente poucos bispos do ocidente
e de sagrar todos os bispos das Gálias. O papa Leão I teve tomavam parte nas assembléias, porque a grande distância
de censurá-lo severamente. lhes dificultava demasiadamente a viagem. Mas era opinião
659. As províncias orientais do patriarcado romano fo- geral que um concílio ecumênico não podia ser celebrado
ram anexadas, depois da morte de Teod6sio Magno, ao im- sem a . participação do bispo de Roma, que enviava os seus
pério oriental. Para conservar os seus direitos, os papas no- legados. E estes tinham a presidência. O consentimento de-
mearam o bispo de Tessalonica para seu vigário. Não les era considerado como aprovação do próprio papa.
obstante, passou, pelo fim do século V, o Ilírico oriental ao 663. Além dos concílios ecumênicos, celebravam-se ou-
patriarcado de Constantinopla.
tros de menor importância, sínodos gerais para o oriente,
650. A unidade do patriarcado ocidental foi uma ver- respectivamente para o ocidente, sínodos patriarcais, nacio-
dadeira bênção. Pois esta unidade preservou o ocidente de nais, provinciais e diocesanos. Concílios plenários chama-
todos aqueles conflitos que agitaram o oriente. No entanto, vam-se os sínodos de todas as províncias da Áfcica oci-
a controvérsia dos "Três Capítulos" (clr. § 52) teve por dental. Sínodos provinciais deviam ser celebrados, segundo
consequência a criação de dois patriarcados titulares, de as disposições de Nicéia (cân. 5) e de Calcedônia (cãn. 19),
Aquiléia e de Grado. Quando, no princípio do século VII, duas vezes por ano; segundo o sínodo de Orleans (533; cãn.
os sufragâneos de Aqui/éia com o novo metropolita de Gra- 2), ao menos uma vez por ano. Outros reclamavam também
do voltaram à união com Roma, o metropolita de Aqui/éia
um sínodo diocesano a realizar-se uma vez por ano. Urna
arrogou-se o titulo de patriarca, como sinal da sua inde-
ínstituição singular é O sínodo endêmico de Constantinopla,
pendência. Roma concedeu então o mesmo título à sede de
Grado, transferido, em 1451, para Veneza. O patriarcado em que se reuniam, sob a presidência do patriarca, os bis-
pos que no momento se achavam na capital.
de Aquiléia foi abolido em 1751.
661. Como a constituição patriarcal, assim também o
• 664. O objeto das deliberações eram as diversas difi-
sistema sinodal teve, neste periodo, o seu maior floresci- culdades dogmáticas e disciplinares. As resoluções estão con-
mento, consequência das muitas controvérsias teológicas. tidas nas coleções de cânones, que logo se faziam para fa-
Seis concílios ecumênicos foram celebrados desde 325 até cilitar o seu estudo e seu emprego. As coieções mais im-
680; e também os de Sárdica (343) , de Éfeso (449) e o portantes são as de João Escolástico, presbitero de Antio-
2- trulano eram projetados como tais. Este último é consi- quia e, mais tarile, patriarca de Constantinopla, onde fale-
derado, de fato, como ecumênico no oriente, não sendo, po- ceu em 577; a coleção do sínodo de Cartago de 419, de
rém, reconhecido pelo oriente. Dionisio Exíguo, os Statuta ecelesiae antiqua e a coleção
Estes sínodos foram, de certo modo, sínodos imperiais, hispânica do século VII. Nas coleções de João Escolástico
porque neles se tratava também dos interesses do império, e de Dionísio Eixguo estão também contidos os chamados
porque os Padres conctliares eram quase exclusivamente bis- Cânones Apostólicos, que figuram no fim das Constituições
280 II época: Desenvolviment o da Igreja no império cristão § 60. O papado e o primado romano 281

Apostólicas, e constam de prescrições sobre a eleição, a orde- autoridade primacial. São eles que leva"ntam a voz contra
nação e os deveres clericais. erros e aberrações no ocidente e no oriente. São eles que
Bati//ol, Le Siége Apostolique 359-451, Paris 1924. - Chapman, decidem, invocados ou não, as questões dogmáticas. Dâmaso
Studies on the early Papacy, London 1928. - Cobhan, The Pa- I é o primeiro a dar à sede de Roma o título de Sé apos-
triarchs of Constantinople, Cambridge 1911. - Maspero, Histoire
des patri arch es d'Alexandrie 5t8-616, Paris 1923. - Calderini, Aqui- tólica. Oelásio I declarou que a Sé apostólica tem o direito
leia Romana, Milano 1930. - Funk, Die Berufung der oeku menischen de jul ga r todas as Igrej as, mas ela não pode ser julgada
Synoden des Altertums, Abh. und Unters. I, 39 ss; 498 ss; III, 143 por ninguém. E esta proposição "Prima Sedes a nemine iu-
ss. - Sejourne, Isidore de SeviJIe, son rôle dans I'histoire du droit
canonique, Paris 1929. - E. R. VOn Kientz, Die Gestalt der Kirche, dicatur" passou ao direito canón ico, no qual ainda hoje fi-
Frankfurt 1937. - Fllnk-Bihlmeyer, I<irchengeschichte I, 288 55, gura (CJC, d l1. 1556) . Hormisda escreveu aos bispos da
301 55. Espanha quc na Sé apostólica "citra maculam semper esl
§ 60. O papado e o primado romano catholica servata religio" (DB 171 ) . E de modo semelhante
escrevcu o papa Agatão ao 29 concílio de Constantinopla.
665. O primado do papa acentua-se mais, neste perío-
668 . O sínodo de Sárdica baseava o primado de Roma
do, do qu e no período anterior; e não sàmente é reconheci-
lia fundação da Igreja romana por S. Pedro. Também no
do, mas também explicitamente invocado em diversas oca-
oriente, imperadores e bi spos viam na funda ção apos tólica
siões. Não se baseia em ambições orgulhosas dos papas,
da Ig,·eja rOma"a a razão do primado papal. No entanto,
como uma histo riografia tendenciosa pretendia. Baseia-se
existia no oõiente, desde o sécu lo IV, uma forte tendência
ÍlnicaOlente no poder que Jesus Cristo deu a S. Pedro e a
sel1~ legítimos sucessores.
de derivar o) primado do papa da importância politica da
antiga capita l do impér io. Mas não há ninguém que não
666. a. Verdade é que os papas encontraram dificulda- veja que tal opinião era tendenciosa e visava justificar a
des, quando começaram a acen tuá-lo. Júlio I viu-se obriga- elevação da sede patriarca l de Constantinopla sobre os de-
do a defendê-lo contra os eusebianos. Mas estes esquece- mais patriarcados do ori ente.
ram-se que eles mesmos tinham enviado legados a Roma,
a fim de atrair o bisoo romano ao seu Jado. O I? concílió
669. Um título particular, não o tinha ainda, neste pe-
ríodo, o bispo de Roma. Os títulos de papa, apostólico, vi-
de Constantinopla (dn. 3) e o ca lcedonense (cãn. 28) re-
conhecem o primado do papa, fazendo o bispo de Roma pre- gário de Cristo, Sumo Sacerdote, Sumo Pontifice, etc., em-
ceder a todos os patriarca s, também ao de Constantinopla. pregavam-se também para outros bispos. Só no século VI
é que os historiadores começam a reservar ao bispo de Ro-
Também Justiniano I, embora fosse o mai s estrênuo re-
ma o .titu lo de papa. Gregório I se chamou, pela primeira
presen tante do cesaropapismo, chama o bispo de Roma "pri-
meiro de todos os sacerd otes " (Nov. 131, 2), "chefe dos vez, Servus servorunz Dei, resposta da humildade do santo à
saçerdotes de Deus" (Cad. Just. 1, 1, 7). arrogância do "patriarca ecumênico" de Constantinopla.
b. Os bispos do oriente reconhecera m igualmente a au- 670. De grande importância foi para o papado a trans-
toridade mag istral do papa, a ssi nando a fórmula de Hormis- ferê ncia da capital para Constantinopla. Os papas consegui-
da (519), que pôs termo ao cisma acaciano. Nas grandes ram assim maior liberdade de ação e não tinham mais de
controvérsias, a Sé apostólica teve papel decisivo. Os seus temer a degradação a simples bispos da corte, como os bis-
legados tinham a presidência nos concilios. O si nodo de Sár- pos de Constantinopla. Todavia, pesava, de vez em quan-
dica atribuiu ao papa o direito de apelação em toda a Igre- do, sensivelmente sobre eles o jugo dos ostrogodos e dos
ja (cc. 3-5). O imperador Graciano reconheceu ao papa Dâ- bizantinos, revezando-se assim tempos de grande brilho e
ma so I o poder judicial sobre todos os met ropolitas do de dolorosa impotência e humilhação.
ocidente. 671 . Dois papas levantaram de um modo extraordiná-
667. Os próprios papas tinham a consciência da sua jjo o prestigio da Sé apostólica , Leão I e Gregório I, am-
282 II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão § 60. O papado e o primado romano 283

bos distinguidos pelo apelido de "Grande". Mas também ou- e o jugo do domínio bizantino. A sua humilhação chegou
tros têm um nome glorioso na história. ao último extremo na pessoa de Vigília (537-55; cfr. § 52).
Os maiores papas do século IV foram Júlio I (337-52), 675. a. No fim do século,· momento critico da história
Libério (352-66) e Dâmaso I (366-84). A sua maior humana, profana e eclesiástica, quase no limiar da idade-
preocupação foi a luta ariana. Dâmaso esforçou-se por re- média, subiu ao trono pontifício Gregório I (590-604), ver-
formar a liturgia e restaurar as catacumbas de Roma, or- dadeiro papa-rei, último grande doutor da antiguidade (clr.
nando os sepulcros dos mártires com belas inscrições métri- § 57). Apesar da sua constituição delicada, desenvolveu, nes-
cas. Sirício (384-99), norteado inteiramente pelo espírito de te tempo de continuas lutas religiosas e políticas e de in-
seu antecessor, é o primeiro a usar o estilo de decreto; e términas calamidades, uma maravilhosa atividade. Igualmen-
nesta primeira decretaI manifesta do modo mais claro a sua te grande como pastor da Igreja e chefe social e político,
convicção de que o bispo de Roma, sucessor de S. Pedro, lançou nas ruínas da antiguidade os fundamentos de um no-
tem de velar por todas as Igrejas. vo tempo.
672. O século V começa com o brilhante pontificado de b. Pela administração exemplar dos bens edesiásticos
Inocêncio I (401-17). Mas o maior papa deste século foi deu inicio ao Estado pontificio e à futura potência política
Leão I (440-61; cfr. § 56). Personalidade digna, nobre e dos papas na Itália. De suma importância foi a sua ativida-
forte, teve papel saliente na história mundial, já pelo fato de missionária em favor dos povos germânicos. Reconhecia
do seu encontro com Átila e Genserico. Mas incomparàvel- perfeitamente a necessidade de conduzi-los ao seio da Igre-
mente maior é a sua importância para a história da Igreja. ja, porque lhes pertenceria o futuro. Conseguiu, de fato, que
Nenhum dos seus antecessores interpretou tão clara, firme e grande parte dos longobardos arianos se convertessem. Os
completamente o primado no sentido de pastor supremo e visigodos e francos ligaram-se mais estreitamente à Sé apos-
mestre da Igreja universal, como ele. Mais de uma vez, ex- tólica. Também a conversão dos anglo-saxões é, em última
primiu a sua convicção de que só em união com o papa os análise, obra de Gregório Magno.
outros bispos devem governar a Igreja (Ep. 14, I). c. Norma de toda a sua atividade no campo político-
E soube também, como nenhum papa anterior, fazer res- eclesiástico foi a idéia que formava dos dois poderes, Igreja
peitado este seu episcopado universal. No oriente decidiu a e Estado, papado e império. Foi inteiramente a mesma idéia
questão do monofisitismo pela Epístola dogmática e opõs- que deles formara Leão I. Com franqueza apostólica defen-
se à ambição do patriarca de Constantinopla. No ocidente deu os direitos da Igreja contra as injustiças do imperador
condenou os erros do priscilianismo, combateu os maniqueus Maurício (582-602), e conseguiu que este retirasse ou mo-
e expulsou-os de Roma. Sobretudo, velou zelosamente pela dificasse os seus decretos anti-eclesiásticos. Com igual ener-
disciplina eclesiástica. Obrigou o arcebispo Hilário de Arles
a renunciar a seus planos de elevar a sua sede a uma es- • gia escreveu ao imperador Focas (602-10), que, afinal, deu
solene testemunho do primado romano, chamando a Igreja
pécie de patriarcado. Do seu zelo apostólico nos dão teste- de Roma "sedes apostolica beati Petri, caput omnium eccle-
munho também as muitas pregações. siarum" (PL ed. Duch. I, 316). Todavia, nada havia no
673. Também Gelásio I (492-96) foi, apesar do seu grande papa de ambição, nada de vaidade. Todo ele era
breve pontificado, um papa eminente. Continuou felizmente justiça e caridade. "Servus servorum Dei" se chamava; e
a obra de Leão I. Durante o cisma acaciano, acentuou ener- foi esta também a norma da sua vida.
gicamente a superioridade da sua autoridade sobre a do im- 676. Seguiram-no no trono de S. Pedro varões dignos,
perador. A sua Ep. 12 tornou-se, na idade-média, norma mas menos capazes de dirigir a barca da Igreja através das
para as relações entre papado e império. ondas revoltosas do tempo. Os únicos papas do século VII
674. Durante quase todo o século VI, o papado teve que têm alguma importância, são Honório I (625-38) e
de sustentar o influxo lamentável dos soberanos ostrogodos Martinho I (649-55). Honório fora discípulo do grande Gre-
284 11 época : Desenvolvimento da Igreja nO impcrio cristão § 6 1. O monacato 285

gório e, como ele, empreendeu uma grandiosa atividade, ter- lima regra; e des ta fo rma teve o ri gem o p rimeiro mostei ro
minando o cisma acaciano no norte da Itália, cuidando das no sentido próprio da palavra. O s uperio r chamava-se aba-
coisas do Estado e Patrimô nio de S. Pedro, enriquecendo de, i. é, pai. Os monges lhe d evia m obedi ência absoluta.
a cidade eterna de magnificas ig rejas, velando pelos direi- T odos os monges eram leigos. P acô mio não admitia sacer-
tos primaciais no oriente e ocidente. O único ponto obscuro do tes. Para <) culto divino pedia padres que não pertenciam
do seu pontificado foi a qu estão dogmática do monote- à sua fundação.
lelismo. Dos Iatos h,ctáricos, bem d ocum entados, resulta que o
677. S. Martinho J teve de solucionar a questão, e o monaquismo cristão I:,J.da tem comum com in stituições mo-
fez como digno vigário de Cri sto, e, por is to, sofreu toda nás ti cas a nteri o res. Não se deriva dos a ntigos esseus ou te-
rap eutas, nem do neo-platonismo o u neo-pi ta go reism o, nem
I so rt e el e tormentos, morrend o como má rti r (dr. § 48). Os
do g nostici smo o u bl!d is mo, c omo a lgu ns hi storiadores têm
r
i
seus sucessores colheram os fru tos fe lizes, cuja semente
fa bula do te ndenciosamente. A o ri gem do mo naquis mo cató-
lançara.
lico é genuinamente cris tã .

I
Chapmnn, Studies, London 1928. - Caspar, Geschichte des
~apst~ums J~II.
- Regnier, S.a" Leone Mag no, Roma 1912. - Grisar, 681. Uma vez organi zada, a vida moná s ti ca propagou-
San üregoflO Magno, trad. Ital. por A. de Sa nti, nova impr. Roma se com admirável rapid ez. O mo n ast ~ ri o n de Tabenis i, já
1928. - Funk-Bihlmeyer, Kirchengesch ic hte I, 292 55 . '
em 328, ap resentou uma numerosa colô nia de mo nges . Pa-

I § 61. o monacato
678. O segundo periodo da his tó ria da Igreja é tam-
b ém o período clássico d? vida monás tica que, pelo fim do
cõmio teve de fundar vários o u tros mosteiros. Q uando veio
a falecer, em 346, a sua cong rega ção contava nove mostei-
ros co m milhares de monges e dois mosteiros de mulheres.
Centro principal era então o mosteiro de Pebou, com.uni-
século IV, exerceu imenso atrativo. Depois do ascetismo e dad e preferida de Pacômio, ond e ta mbém faleceu. Pelo fim
J do eremitismo dos primeiros sécul os, realizou-se, no século do século IV, a congregação conta va, segund o Cassiano (De
IV, uma feiiz transformaçã o. O cenobitismo, terceira forma in s t. coen. 4, 1), cinco mil mo nges. Pa ládi o (Hi st. Laus. 32)
da vid a monástica, significa o desenvolvim ento definitivo do l a ia de sete mil. Infelizmente, a s luta s monofisitas causa-
mo naq ui sP.1o antigo . Sobre a sua ori gem e primeira difusão ram uma ci são lamentável entre eles.
somos relativamente bem informa dos po r uma porçã o de bio- 682. a. Ao mes mo tempo, es pa lhava- se ainda o anaco-
grafias, a Historia Monachorum de Timóteo de Alexan- retismo de S. An tão do Eg ito. S. Amônio, a migo ínt im o do
dria ( ?), a História Lallsiaca de Pa ládio, os Apophthegmata gra nde p atriarca, dirigiu num erosos mo nges no deserto ní-
Putmm e várias no ticias dos his toria dores Sócrates e So- trico, qu e viviam se paradame nte, fo rmand o, po ré m, vária s
zêmeno.
• celas vizinh as um mos te iro. A,n ôn io mo rre u em 350. O n,,-
679. O iniciador do cenobitis mo ( koinós ' bios = vida m ero dos se us discípul os s ub iu , já no século IV, a cin-
comum ) foi o copta cris tão S. Pacômio. Nascido pelo ano co m il.
de 292, entrou na carreira militar. Mas, ab orrecido do mun- b . A obra de S. Antão l oi espa lha da, po r discípulos ex-
do, recebeu o batisl110 e ab raço u a vida erernítica, debaixo celentes, também no deser to s qu ético. Dist inguiu-se entre
da direção de S. Palemão. Pelo an o de 320, fundou o pri- e les S. Macário Magno (t 390/395 ) . Em 335, associou-se
meiro mosteiro para homen s, na a ldeia Tabenisi ao norte de a S. Antão; em 340, recebeu a o rd enação sacerdotal e apa-
T ebas. Pouco depois, fundou também o primeiro mosteiro rece, desde então, como abade. As 57 homilias que lhe são
para mulheres e deu-lhe como superiora sua irmã Maria. atribuídas são o reflexo duma personalid a de respeitável e
680. O mosteiro pacomia no cons is te de várias celas in- nobre, dum espírito original, a scético, mís tico. Mas, se ele
dependentes, cercadas de muralha s. Chamava-se monasté- não nos tivesse deixado, senão O úni co tratado, certamente
rion ou koinóbion. Pacômio deu aos s eus monges tambéÍn autêntico, Carla de Macário, já merece ria a s ho nras dum
·1

1 286 II época : Desenvolvimento da Igreja império crístão


11 0 § 61. O monacato 287
grande místíco. Alguns historiadores contam entre os mon- balhos manuais nos orfanatos e hospitais, que se levantavam
ges do deserto squélico também S. Macário Alexandrino, o ao lado dos seus mosteiros.
Moço ; segundo outros viveu no deserto nítrico. c. Com a prática de tão prudentes princípios, O mona-
c. Verdadeiro jardim de vida e virtudes monás ticas era quismo basiliano não tardou de propa gar-se por todo O
sempre, ainda no século V, a Teba ida. O grande abade S. oriente e foi adotado pela grande maioria dos mosteiros, que
Sin úcio dirigíu, pelo espaço de 85 anos, o chamado Mo steiro já exist iam em várias outras regiões. As duas regras que
Branco na Tebaida . Conforme escreveu seu discipulo e su- devem a sua origem a S. Basílio ( PG 3 1, 889 ss) ainda
cessor, obedeceram-lhe 2.200 monges e 1.800 monjas. Sin ú- hoje são observadas, no essencial, pelos monges orientais . .
cio morreu em 466, na idade de 11 8 anos. 685. Como os monges, assim também as virgens uni-
683. Do Egito passou o monaquismo primeiro para a ram-se paulatinamente em casas próprias para viver uma
península de Sinai. Desde o século IV, o monte santificado vida cotn.um. Os mais antigos mosteiros de mulheres encon-
pela legislação mosaica, foi ponto de atração para muitos tram-se no Egito. No tempo de S. Antão, uma virgem, Sin-
anacoretas e cenobitas. S. HiJarião de Gaza (t 371), discí- clética, te r-se-ia retirado para o dese rto e reunido em volta
pulo de S. Antão, transplantou a vida monáslica para a Pa- de si certo número de virgens e viúvas. Pouco depois, S.
lestina, onde em breve se levantaram numerosos mosteiros. Pacômio entregou à Sua irm ã Maria a direção de uma co-
Introduziu ali a vida eremítica, quando no Egito se ia es- munidade de monjas, perto de Tabenisi. Paládio fala de 400
pa lhando a vida cenobítica, menos rigorosa. Os seus mon- religiosas que ali viviam. A superiora destas comunidades
ges viviam em celas separadas, mas sob a direção de um chamava-se "ammas", mãe. Também S. Emília e Macrina,
abade. As suas fun dações chamavam-se de "Iauras", aldeias. mãe e irmã de S. Basílio Magno, eram superioras de nu-
Tornou-se célebre a laura magna ou antiga de S. Sabas merosas monjas. Quando S. Basilio red igiu as s uas regra s,
(t 532), perto de Jerusalém. lembrOU-se de dar normas também para os mosteiros femi-
Tamb~m na Síria s urgira m colônias de eremitas nas ninos. S. Paula (t 404) e sua filha Eus\óqui O fundaram o
mOtltatlhas de Antioquia e no deserto da Cálcide. S. João mosteiro de Belém, as duas Melãnias (Velha e Moça), o
Crisóstom o e S. j erôni mo vivera m, algum tempo, entre estes de Jerusa lém . Tão ràpidamente espalha ram-se estas funda-
monges. Palád io fala deles l1a sua História Lausiaca. ções, que no tim do sécu lo IV houve, no oriente, tantos
mosteiros femininos como masculinos.
684. a. Ao mesmo tempo, com eçou a florescer a vida
monástica na Ásia Menor. Sozômeno escreve que o bispo 686. Por motivos práticos, como culto divino, mútuo
Eustácio de Sebaste foi o iniciador do monaquÍSmo na Pa- a poio, etc., estes mosteiros de mulheres eram fundados, não
flagônia, no Ponto e na Armênia Menor. Eustácio entusias- raras vezes, junto aos mosteiros masculinos. Mas tal costu-
CI me acarretava graves inconveniências, pelo que a Igreja se
mou Basilio Magno por esta forma de vida; e este torno u~
se, em segL1ida, o maior cheie dos monges orientais. viu obrigada a proceder COtltra os abusos, já no fim da an-
tiguidade. Assim o fez o sínodo de Agde no ano de 506
1>. S. Basílio Magno, tendo vis itado os mosteiros do (cãn. 28).
Egito, da Palestina e da Síria, fundou, pelo ano de 360, o
687. Aconteci a também que crianças eram entregues aos
seu primeiro cen6bio perto de Neo-Cesaréia no Ponto. Ado-
mosteiros, a fim de serem educadas ou se consagrarem para
tou para os seus monges a fo rma cetlobítica de Pacômio.
sempre à vida religiosa. Tanto a regra de S. Basítio, como
Mas ajuntou-lhe alguns elementos novos, estabelecendo co- a de S. Bento conh ecem esta instituição. E' verdade que os
rn o uma das normas principais da - santificação monástica o "oblatos" , no princípio, não podia.m ser admitidos aos votos
exerc ício da caridade. Os basilianos reuniam-se seis Veze5 perpétu os, senão quando maiores de 16 anos. No entanto,
por dia para a oração. O reslo do dia era dedicado ao es- aos poucos formo u-se o princípío, estabelecido pelo sínodo
tudo da Sagrada Escritura, ao ensino nas escolas e aos tra- de Toledo de 633: "Monachum facil a ut paterna devotio·
------------ - --------- ------~----- .......
-- - - -- '~ -

2ô8 II época: Desenvolvimen to da Igreja no im pério cristão § 6ta. O monacato ocidental 289

aut pro p ria professio" (cãn_ 49). O 2' trulano exigiu .ao foi o primeiro a introduzir esta devoção perpétua-, pelo ano
menos lima idade de dez anos para a ent rada no mostelfo de 427. O mais célebre mos teiro que abrigava tais monges,
(cân. 40). embora a adoração perpétua não fosse da sua instituição,
688. a. O monacato orienta l não se limitava às três 101'- foi o de "Studion", em Constantinopla, fundado por Stú-
mas mencionadas. A história cita muitas outras espécies de dios, consular do império (463). Mais tarde, tornou-se cé-
monges, nem sempre ise ntos de abusos . Tais são os .sara- lebre este mosteiro pela luta cont ra O icolloclasmo.
baitas, chamados por S. Bento "mollélchorum ?:t~rnmum
gen us" (Reg. 1). Vi viam a dois ou três em eremltenos, sem § 61 a_ O monacato ocidental
superior nem ordem estável. Muitos abusos eram a conse-
592. A Vida de S. Anião, escrita por S. Atanásio, e
quência ( Hier., Ep. 22, 34).
traduzida para o latim, exerce u influxo benfa zejo, despertan-
b. Os giróvagos, "per omn ia deteriores sarabaitis" (5.
do também no ocidente a vida monástica , como atesta S.
Ben., Reg. I ), andavam de mosteiro em mosteiro, e não se
Agos tinho (Co nf. 8, 6). A presença de alguns monges
detinham senão três ou quatro dias como hóspedes. A estes
egipcios, que acompanharam O g rande bis po de Alexandria
c out ros abusos ooôs-se o concílio calcedonensc, subo rdi-
ao desterro de Treves, teve semelha nte efeito.
nando os monges à obediência dos bis pos e proibindo-lhes,
Foi particula rme nte em Roma que muitas pessoa s, até
sob pena dz excomunhão, o re torn o ao mundo e o matn-
da mais alta sociedade, abraçaram esta norma de vida. S.
môn io (cc. 4. 7. 16).

I
Jerõni:no veio a ser seu diretor esp iritual. Foi também ele
689. Outros monges mostravam, pelo contrário, extraor- que escreveu a Vila Pauli, Ma/chi, Hilarionis, como seu ami-
dinária austeridade. Os reclusos encerravam-se, por certo go Rufino escreveu a Hisloria monachorum in Aegypto. Eu-
tempo ou a vida toda, numa cela estreita. S. Salomão vi- sébio de Vercelli e Ambrósio de Milão propagaram a vida
veu 50 anos numa caverna perto de Antinous (PaI., Hist. monástica no norte da Itália. No su l da península lizeram-no
Laus. 96). Outro exemplo de ta l vida penitente loi Tais, Paulino de Nola (t 431) e Melânia Jun. (t 439).
pelo ano de 350.
693. S. Martinho de T ours (t 397) deu início ao mo-
690. Os estilitas pas savam a vida sobre uma coluna.
nacato nas Gálias. A sua cela às marge ns do Loire foí a ori-
Iniciador des te modo de vida fo i S. Simão, o Estilita (t
gem do céleb re mosteiro de Marmoutier (Maius Monaste-
460), oriundo da Cilícia. Santificou -se primeiro nu m mostei-
rium). Sulpício Severo escreveu, no fim do século IV, a vi-
rO do monte Telanissa, onde viveu pelo espa ço de 28 anos.
da do gra nde monge e bispo. G regório de T ours eSCreveu
O mosteiro to rnou-se cdebre pela santidade deste herói de
quatro livros De virlutiblls Sancti Martini. Admirador e bió-
pe nitência. De toda parte viuham pe regrinos pa ra ped ir-lhe
gra fo, imitou-lhe também o exemplo. João Cassiano (cfr.
conselhos. Simão não se ju lgava di g no de tão gra nde ve-
§ 56) foi g uia seguro para os monges de Marselha. S. Ho-
nera ção . Fez então erigir para si perto de An tioquia uma
norato (t 429) fund ou o célebre mostei ro de Lerins (410) .
coluna, que paulatinamente atingiu a altura de quarenta Cô-
S. Cesário de Arles (t 542) promoveu eficazmente a vida
vados, e nela passou cerca de 37 anos. Pregava, I11l11tas ve-
monástica no século VI e escreveu duas regras, uma para
zes às multidões que se apinhavam em redo r da sua coluna,
homens e outra para mulheres .
e era venerado como pacificado r e conselheiro de toda aque-
la região. U 111 dos seus admiradores lo i Teodoreto de Ciro, 594. Na Espanha, a vida monástica é mencionada, pelo
que lhe escreveu a vida (His!. relig. 26). O seu e~emplo fim do século IV, no Itinerário de Etéria. Mas as aberra-
fo i imitado por S. Daniel (t 493), Simão o Moço (-r 596) ções do priscilianismo fiz eram com que o mona quis mo não
e muitos outíos. se visse ali de bons olhos; e a tempestade das invasões des-
691. Os acoimetas eram monges que, lormando diver- truiu, além disto, muitos mostei ros nos seus inícios. No sé-
sos grupos, rezavam sem interrupção. S. Alexandre, abade, culo VI, S. Martinho de Braga (t 580) veio a ser o res-
(,;'ompêndio I - 19
290 II época: DesenVolvimento da Igreja ·no império cristão § 61a. O monacato ocidental 291
1
taurador do monaquismo. Em seguida, propagaram-no e fi- direção de seus abades. Acompanhado por alguns monges,
zeram-no prosperar S. Leandro, S. Isidoro e S. Frutuoso. estabeleceu-se no Monte Cassino, na Campanha, onde num
695. Das Gálias passou, finalmente, o monaquismo para bosque sagrado de Júpiter ou Apolo fundou aquele mosteiro
a Inglaterra, onde, em breve, a vida monástica veio a flo- que devia tornar-se a célebre abadia de Montecassino (529),
rescer brilhantemente. Um fenômeno singular foi o mona- berço da ordem beneditina. A pouca distância dali, S. Es-
quismo céltico ou irlandês ou escocês. Um dos seus ideais colástica, irmã de Bento, fundou um mosteiro para virgens.
loi peregrinar por amor de Deus. S. Columbano é seu mais 698. S. Bento deu a seus monges uma regra de 73
conhecido representante. Nos séculos VII e Vlll, estes mon- capitulas, cujo primeiro escopo é, "u! in omnibus glorili-
ges distinguiram-se por sua alta cultura. Mas ficaram sem- cetur Deus" (c. 57). Característico é o voto de estabilidade.
pre muito apegados a seus costumes nacionais. A tarefa principal da "Schola dominici servitii" é o "Opus
696. Desta forma, já no século V, existiam mosteiros Dei", o ofício divino. Os cc. 8-19, que regulam exatamen-
em todos os países do ocidente. Mas não havia uníformida- te o culto divino, são a primeira descrição completa das
de nem organização. S. Bento foi o homem predestinado horas canónicas.
a realizá-Ias. E' ele o patriarca dos monges ocidentais, co- A regra de S. Bento, recomendada por papas e prínci-
mo S. Basilío Magno o é dos orientais. pes, difundiu-se por todo o ocidente, chegando a predomi-
Nasceu, pelo ano de 480, em Núrsia, cidade da Úmbria, nar por toda a idade-média. E' que tão admiràvelmente se
I
de família distinta. Teve uma educação esmerada. Muito ce- adapta a todas as condições da vida e tanto se distingue

I
do, os pais piedosos enviaram-no a Roma, onde, não obstan- pela clareza e pela moderação, que deu formas determina-
te as devastações dos povos germânicos, floresciam ainda das à vida monástica e pôs termo à vida vagabunda que
os estudos superiores e as artes liberais. Infelizmente, o po- o santo patriarca censura tão severamente no primeiro ca-
vo romano tinha caído num estado lamentável de costumes. pítulo. A regra beneditina é, por assim dizer, a última gran-
O jovem Bento percebeu o perigo, e, tendo apenas 14 ou 17 de dádiva do espírito romano à idade-média.
anos de idade, fugiu de Roma, sem avisar nem sequer 699. Quando S. Bento fundou o mosteiro de Montecas-
os pais, sino e escreveu a sua regra, já a transmigração dos povos
697. a. Escolheu para morada uma gruta quase inaces- movimentara a Europa. Grande parte destes povos estabe-
sível, perto de Subiaco, onde licou por todos ignorado, me- lecera-se nas províncias do antigo império romano. Educá-
nos do monge Romano, a quem o jovem tinha manilestado los e cristianizá-los loi a missão da Igreja. A ordem bene-
o seu intento e que lhe cuidava do alimento. Certo dia, po- ditina, chamada por seu grande filho, Gregório I, a este
rém, alguns pastores descobriram o seu esconderijo, e, des- campo de atividade, tornou-se seu principal instrumento.
de então, a lama das suas virtudes espalhou-se na vizinhan-
ça. Os monges de Vicovaro lhe pediram que se dignasse ser • 700. S. Bento vivia ainda, quando Cassiodoro, depois
de abandonar os altos cargos que havia desempenhado no
reino dos ostrogodos, fundou o mosteiro de Vivário na Ca-
seu abade. Como se mostrassem ingratos e indignos, Bento
voltou para a solidão de Subiaco. lábria (clr. § 57). Em oposição a Bento prescreveu a seus
b. Muitos discípulos se lhe associaram e, em breve, le- monges o estudo dos clássicos e das ciências teológicas. Mui-
vantaram-se doze mosteiros, habitados por doze monges ca- tos beneditinos imitaram-lhe o exemplo. A ciência deve mui-
da um, com os seus respectivos abades, nomeados pelo pa- to a estes monges pela conservação de antigos manuscritos,
triarca. Até a nobreza romana entregou-lhe os filhos para copiados por eles.
serem por ele educados, e muitos abraçaram a vida monás- Ruf., Hist. munach. - Pall., Hist. Laus. - Theod., Hist. relig.
tica, como S. Amaro e S. Plácido, seus discípulos prediletos. - S. Pachomii regulae monasticae, ed. Albers (Flor. patr. 16), 80n-
nae 1923. - S. Caesarii regula sanctarum virginum, ed. Morin
c. Perseguido também em Subiaco pelos ciúmes de um (Flor. patr. 34), Bonnae 1913. - S. Benedicti regula, ed. Linder-
sacerdote, o santo retirou-se, deixando os mosteiros sob a baller (Flor. patr. 17), Bonnae 1928. - Heimbucher, Die Orden
19'
292 II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão 293
§ 62. Culto e disciplina
und Kongregationen der kath. Kirche, 3 vol., 3. ed., Paderborn
1932-34. - Workman, The evolution of the monastic ideal to 1200, gia antioquena apresenta-se em três formas, a de S,. Tiago,
London 1913. - Montalembert, Précis d'histoire monastique, nova usada em Jerusalém e Antioquia, e as de S. Basiho e de
ed., Paris 1934. - Id., Les moines d'occident, 7 vol., Paris 1860-77. S. João Crisóstomo, ambas usadas em Constantinopla .. A
- Str.alhenau, Geschichte der fmehchristlichen Aszese bis zur
Entstehung des Moenchtums, Leipzig 1914. - Hertling, Antonius der liturgia de S. Basilio, mais longa, empregava-se nos dIas
Einsiedler, 1929. - Morison, St. Basil~ and his r:ule, Londou 1913. de festa.
- Greg. Magn., Dialogi Migne, PL 66, 126 S5j ed. Moricc3, Roma
1924. - Mabillon, Annales Ordinis S. Benedicti, fi vol., 2. ed., Lucca 704 No ocidente foi introdu~ida, no fim do século IV,
1739-45. - D. A. Ramón Arrufai, A ordem beneditina, Rio de Ja- a liturgi~ ambrosiana, usada s6 no norte da Itália. Nas Gá-
neiro 1933. - Herwegen , Der hl. Benedikl. Duessoldorf 1917; 2. od. lias é conhecida, desde o século V, a liturgIa gahcana e na
1919. - Goyau, S. MelAnia, Roma 1909. - Antonelli, Antonianum
1927, 401 ss. - REB 1947, 404 ss. Espanha, a liturgia gótica, chamada, mais tarde, moça-
rábica. .
§ 62. Culto e disciplina Todas estas liturgias ocidentais foram ~xcellidas e.m 1m-
portAncia pela liturgia romana. ~o princípio não se dIferen-
701. Desde a subida de Constantino Magno ao trono çava ela das demais liturgias OCIdentaIS. Pelas ~eformas dos
imperial, o espirito cristão penetrou, mais e mais, em todas séculos IV e V revest iu-se de uma nota parllcular e, nos
as classes da sociedade. Os pensamentos religiosos e a pie- séculos VI e VII assumiu essencialmente a forma defini-
dade cristã manifestaram-se logo no culto divino. Os seus tiva. Uma nota c~racteristica consiste em dar maior co?si-
princípios fundamentais estavam lixados por Jesus Cristo. deração às festas do Senhor e dos santos, pelo que a mIssa
No periodo dos mártires não foi possível revesti-lo de gran- obteve ao lado do cânon uma parte variável. Esta inovação
de solenidade. As novas condições da Igreja deram-lhe oca- parece ter sido introduzida pel~ papa D~m~so I, que tanto
sião de enriquecer o seu culto com brilho e magnificência. interesse mostrava pela veneraçao dos marllres romanos.
702. Centro do culto cristão foi sempre a Eucaristia. 705. Os sacramentários leoniano (PL 55), gelas~ano
Pela Constituição apostólica sabemos que, pelo ano de 220, (PL 74) e g regoriano (PL 78), fontes principais da ht,,-,,-
a solenidade eucarística já tinha uma forma fixa. Sabemos "ia romana foram atribuídos errôneamente aos papas Leao
também que, ao menos em Roma, a Eucaristia se celebrava b ' • O
I Gelásio 1 e Gregório I. São de data posterior. sacra-
todos os dias; o mesmu se fa zia em outros lugares. Em mui- ~entário gregoriano, reforma do gelasiano e, P?r sua vez,
tas Igrejas, porém, a· solenidade eucarística era reservada fundamento do missal romano, foi usado por Adriano I. Ca~­
aos domingos e dias das estações (elr. § 26). los Magno introduziu-o no reino dos francos. As suas Ori-
A medida que ia desaparecendo a disciplina do arca- gens remontam, no entanto, ao tempo do papa Gregório I.
no, uniam-se mais estreitamente as duas partes da missa,
706. a. Os fiéis comungavam, nos primeiros séculos, to-
didática e eucaristica. A lín gua litúrgica veio a ser, no oci-
dente, o latim. Ao lado das denominações "liturgia", "sacri- • das as vezes que assistiam ao culto eucaristico. A conver-
são precipitada das massas populares teve como resultado
fício" e "oblação", que estavam em uso já no primeiro pe-
um grande relaxamento e, por conseguinte, desaparec~u ,
ríodo, aparece, desde o século IV, também o nome de "mis-
mais e mais, o costume da recepção frequente da Eucans-
sa" (= missio) que, pela primeira vez, se encontra na Ep.
tia. S. João Crisóstomo queixa-se amargamen~e do pouco
20, 4 de S. Ambrósio e na Peregrinatio ad loca saneia, que
data do mesmo tempo. fervor dos cristãos. O sínodo de Agde (506) vIu-se obriga-
do a prescrever que os fiéis comungassem, ao menos, três
703. Devido às mudanças que se iam introduzindo pau-
vezes por ano (cân. 18; Hefele, 2, 653).
!Iatinamente, formaram-se várias liturgias, tanto no oriente
como no ocidente. No oriente havia duas formas principais, b. Desde os inicias da Igreja, a leitura da Sagra.da, Es-
a liturgia antioquena e a liturgía alexandrina, correspon- critura teve um lugar de honra no culto divino. A prinCIpIO, I
dentes às duas antigas circunscrições eclesiásticas. A litur- liarn-se sucessivamente tooos os livros do Antigo e ~o. Novo
Testamento. À medida que se ia formando o ano hturglCo,

I
294 Jl époc<!: Desenvolvimento da Igreja no império cristão § 62. Cutto e disciplina 295

escolhiam-se . passag~n s. (pericopes ) apropriadas · que se Mais célebre é a schola cantorum fundada por Gregório I;
reu,nlam :m
.Ir~ros propnos, chamados "Iecionários", O pri- e foi muito provàvelmente nesta escola que se . formou o
meiro leclonano ou "comes" atribui-se a S. }erônimo. cantochão ou canto firme, gregoriano ou. romano. João Di á-
. 707. a. A leitura era seguida pela pregação, feita por cono escreve na sua Vila Gregorii (II, 6) que o mesmo
VIa de regra pelo bIspo. AutorIzados por ele, podiam tam- papa, "more sapientissimi Salomonis", compilou um an-.
bé!n pregar os presbíteros e diáconos, de vez em quando tifonário.
ate leIgos, nunca, porém, um a mulher (Cone. Carth. IV cân 709. No culto litú rgico · teve parte importante o ofício
98-99). ' . divino. Consistia primitivamente só de salm os e de leitura
b. A pr:gação era si mples homilia , que explicava a lei- da Sagrada Escritura. No segundo periodo acresceram hi-
tura. Mas "':0 faltam também exemp los de longos e bri- nos e odes, que ainda hoje apresentam grande parte da poe-
lhantes sermoes sobre temas de livre escolha verdadeiras sia eclesiástica.
obras-primas da retórica, especialmente no ~riente onde As horas canônicas eram, no tempo dos apóstolos, a te r-
eran~ acolhidos, às ~ezes, com entusiásticos aplausos. JoãoS. ça, sexta e noa (Did. 8, 3; Cypr., De dom. ar. 24). P ela
ensastamo teve de lIlterromper, mais de uma vez, o seu ser- influência do monaquismo acresceram, no segundo pe r iodo,
mão, ~ara repreender este costume: "Isto não e um teatro, as matinas e as vésperas. S. Atanás io fala da oração que
nem vIestes ouvir comediantes!" "Vós me aplaudis e eu ai se fa zia à meia-noite (De virgo 20). Das vésperas foi se -
de mim, eu bem quisera chorar" (Hom. 26 i~ Ep~ I

I
parado, em seg uida, o completório. Finalmente, foi inte rcala-
ad Cor.). da entre as laudes e a terça a prima. A recitação do ofício
c. O florescimento da pregação coincide eom o fl ores- obrigava sômellte os clérigos. Todavia, também o povo to-
clment? da Iitera tu.ra patristica. Os três grandes bispos da mava parte, como relata S. Etéria no seu Itinerário.
C,apadocl a, S. Basll!O, Gregório Nazianzeno e Gregó rio de 710. As vestes litúrgicas não se diferençavam, nos pri-
Nlssa~ e, ao lado deles, S. Cirilo de Jerusalém e Anfilóquio meiros séculos, das vestes profanas. No entanto, ninguém
de IC~nlo fo:am oradores sacros de pr!meira grandeza. Ma s devia assistir às funções sacra s, senão com traj es festivos.
o maIOr confeu da eloquência foi, no ori ente, S. João Cri- Destes é que se desenvolveu, pouco a pouco, o vestuário li-
sóstomo. No ocidente brilharam, sobretudo, S. AmbrÓSio e túrgico. As primeiras vestes litúrgicas de que nos falam as
S. Agostinho.
fo ntes são a túnica e a pênula, usadas, sobretudo em Ro-
708. T a mbém o canto eclesiástico contribuiu desde os ma, já no século IV. Da túnica desenvolve u-se paulatina-
t~mpos apostólicos, para a umenta r a solenidade d~ culto di- mente a alva; a pênula tomou a forma de casula ou plalleta.
VInO. S. Paulo fa la de salmos, hinos e cânticos espirituais
(Ef 5, 19). Plínio o Moço afirma igua lmente que os fiéi s
can!avam nas suas reuniões (Ep. 10, 97). Desde o edito de
• O sino do de Toledo de 633 (cãn. 28) fala de a mbas como
vestuário sacro do clero, e menciona, além disso, o orá rio,
conhecido ali ás desde o sinodo de Laodieéia de 380. Mais
Mrlao, as novas condições da Igreja pe rmitiam também maior
tarde, se chamava estola. O papa e os diáco nos usavam, des-
cultiv~ do canto ecl esiástico, particularmente no oriente, onde
de O século IV, alé m da túnica , a dalmática, desde O século
o InstItuto dos cantores foi elevado à categoria de ordem
IX, usada universalmente por bispos e diáconos. Estes últi-
(cfr. § 58). No ocidente, o canto eclesiástico foi promovido
espeCIalmente por S. Ambrósio de Mil ão . S. Agostinho cho- mos a tr~,javam como veste superior.
rava comOVIdo COm os hinos e cânticos, entoados pelas sua- A chamada capa era l11na veste comum a hom en s c mu-
ves vozes desta Igreja (Conf. 9 , 6). lheres. Usavam-na, de preferência, os monges. Dela se de-
Mas foi sobretudo em Roma que se cultivava o canto senvolveu o pluvial ou capa de asperges. Muito céleb re se
eclesiástico. Pelo ano de · 330, o papa Silvest re I instituiu tornou .a capa de S. Martinho de Tours (t 397). Dela se
.a primeira escola de cantores de que temos conhecimento. deduzem os nomes de capela e capelão. Derivações da capa
-------- ------------0:

296 JJ época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão § 62. Culto e disciplina 297

de asperges são a mozzetta dos cardeais e cônegos e a pe_ pública. O exemplo de Nectário foi imitado logo em outras
quena capa dos clérigos. Igrejas do oriente, deixando assim de existir as quatro clas-
711. O Liber Pontificolis menciona, na Víta Silvestri, ses dos penitentes.
um palliumlinostimum, do qual se desenvolveu o manípulo, 715. E' verdade que os crimes públicos ainda continua-
espécie de pequena estola. Outro era o pallium cOlltabula- vam sendo objeto da disciplina eclesiastica, que aplicava a
tum, considerado sempre Como distintivo de honra. Deu ori- excomunhão do culto divino ou, ao menos, da comunhão eu-
gem ao hodierno pálio, faixa de lã branca, semeada de cru- carística. Mas, no resto, cada um tinha liberdade de nor-
zes pretas. No oriente era, já pelo ano de 400, in sígnia dos tear-se por sua própria consciência. Sócrates (HE 5, 19)
bispos. No ocidente era reservado ao papa . Desde o século lamenta dolorosamente esta relaxação da disciplina ecle-
VI, o papa o concedia também a outros bispos, principal_ siástica.
mente aos metropolitas como sinal de honra e de união com 7/6. A administração da penitência entregava-se, desde
a Sé apostólica. O sinodo de Toledo de 633 tala, no, seu então, no oriente, mais e mais, aos monges. Até monges lei-
cãn. 28, também do anel e do báculo como insígnias do gos eram, em certas circunstâncias, admitidos Como confes-
bispo. sores e guias espirituais. Ficou, po rém, sempre firme a con-
7.12. A cor dos paramentos era, na antiguidade quase vicção de que só o sacerdote tinha o poder das chaves
exclUSIvamente branca. Não havia um cânon respectivo. Os (Chrys., De sacerd. 3, 5; Ambr., De poen. /, 2).
primeiros decretos relativos foram dados no tempo dos car- 717 . No ocidente, manteve-se ainda a anti ga praxe. O
lovingios. No século VIII/ IX acresceram as Cores vermelha, sinodo de T oledo de 589 inculcou o princípio de que para
verde e preta. No século XlII, foi concedida ainda a cor os pecados capitais não havia senão lima só penitência (cân.
violácea. II). Não raras vezes, a penitência era diferida até à morte.
713. Como o culto divino, assim tam bém a disciplina No entanto, o papa Sirício (t 399) concedera, também aos
penitenciária sofreu , no segundo per iodo da história eclesiás- relapsos, a readmissão ao culto divino, e na hora da morte
tica, uma sensível modificação. A penitência sacramental pri- também ii comunhão eucarística.
vada estava em uso, desde o princípio da Ig reja, e é atesta- Em virtude de uma disposição de Leão I (Ep. 168, 2),
da a sua exist~n cia pelo consenso dos mais anti gos Padres foi abolida a confissão pública ta mbém no ociden te, mas
(ctr. DB 96 1; Ench. Pat r. 1230). A penitência pública es- não a penitência pública. Esta se limitava, porém, aos cri-
tava sempre acompanhada da excomunhão e da reconciliação mes públicos de pa rticula r gravidade (Clr. Ku rtscheid, em
ou absolvição pública como partes essenciais. Sabemos qu e LfTK II , art. Beichte).
Calisto I tinha concedido a reconciliação aos inco ntinentes 718 . Alguns povos neoconvertidos, como os celtas da
arrependidos e que Estêvão I a concedera aos renegados. '
No segundo período, também os homicidas eram admitidos • Irlândia e os anglo-saxões da Inglaterra, segundo fontes dos
séculos V e VI, e segundo testemunho explícito do arcebis-
à reconciliação, embora uma só vez. O sinodo de Ancira de po Teodoro (t 690), nunca aceitaram a penitência pública.
3 /4 concedeu a comunhão no leito de morte (cân. 22). Ba- Em lugar dela tornou-se logo entre eles costume geral a
sílio Magno a concedia depois de uma penitência de 20 anos. confissão prívada, que era seguida geralmente pela absolvi-
Vê-se que não havia uniformidade, nem clareza na praxe. ção imediata e que se repetia sem restrições, A confissão
Cla ro era, todavia, que a Igreja possuia o poder de perdoar privada foi-se difundindo em toda parte.
todos os pecados.
'- '/ 719. Para"q"e a administração da penitência fosse uni-
714. O bispo Nectário de Constantinopla, movido por forme e digna, os bispos mais eminentes, como Basílio
um escândalo que se ' ligava a uma penitência pública (Socr.., Magno, Gregório de Nissa, Ambrósio, Agostinho, como tam-
HE 5, 1,9) ,~ llboliu, em 391, a instituição dos presbíteros bém os concílios, redigiram epistolas canônicas com nor-
peni.tenciários, com o que se abandonava também a confissão .; , mas para os confessores. Nes tas decisães ba searam-se os
298 II época: Desenvolvimen.to da Ig reja, no. império cristão § 62. Culto e disciplina 299
Padres da Igreja ainda no século VI, e são elas o funda-o se realizavam, nas calendas de Janei ro, em honra do
mej1to do.s chamados livros penitenciários que, de então em deus Jano.
diante, regularam toda a administração da penitência.
724. A preparação da Páscoa fo i, desde o niceno, a
720. Graças à vitória do cristiani smo, as festas ecle- Quaresma (clr. § 28), que consi st ia no ocidente de seis se-
siásticas obtiveram caráter públic o. Em 32 1, Con~tantino manas, no oriente de sete, sendo, porém, que o número dos
Magno ordenou que o domingo fosse sa ntifica do. Neste dia, dias de jejum era o mesmo em toda a Igreja , i. é, trinta e
tinham de cessar os processos e os trabalhos públicos. Teo- seis. Nos domingos não se jejuava e, no oriente, também
dósio Magno proibiu, além disso, que se fi zessem espetá- os sábados não eram dias de jejum. Em algumas partes co-
culos públicos, no dia do Senho r. Teodósio 11 e vários sí" meçaram, já no século V, a completar os quarenta dias de
nodos estenderam esta proibição às festas maiores e a todo jejum, iniciando-os na 4' feira antes do I' domingo da Qua-
o tempo desde a Páscoa até Pentecostes. resma e introdu zindo igualmente O costume de impor neste
72 1. Fo ram introduzidas, neste período, uma série de dia as cin zas.
novas festas anuais, completando-se desta forma os ciclos 725. Além disto, foram introduzidas, no ciclo pascal,
do ano eclesiástico. A festa da Epifania ou T eofania, cele- duas novas festas, o Domingo dos Ramos, para comemorar
brada no o riente já. no século III, foi introd uzida também a entrada solene de Jesus em Jeru salém (Cyr. Hier., Cath.
no ocidente ( Am. Marc., Rer. gest. 2 1, 2). O objeto des ta 18), e a Ascensão de Cristo, esta no principio, aquela no
fe sta era, no oriente, a manifestação de Cristo aos pagãos. fim do século IV.
João Cassíano nos diz que era consid erada também como Pelo fim do século V, o bispo Mamerto de Viena or-
dia do nascimento do Senhor, pelo· que não se celebrava ou- denou, por motivo de graves aflições, que na sua diocese,
tra festa particular (CoI. 10, 6). nos três dias que precedem a Ascensão, se fizessem procis-
722. No ocidente unia-se ao mistérío da manifestação sões (rogationes minores) que, aos poucos, se introduzi-
de Cristo aos pagãos os mi stérios do batismo e das bodas ra m também em outras dioceses . O sínodo de Orleans de
de Canã. Para celebrar o nascimento de Jesus foi instituí- 51 I (cã n. 27) prescreveu-as para toda a Gália. Em Roma,
da, por isso, primeiro 110 ocid ente, a festa do Natal. As o papa G regório Magno introduziu a litania maior a rea-
notícias mais antigas desta fe sta datam da primeira me- lizar-se no dia 25 de Abril (Reg. Greg. 2, 2), provàvelmen-
tade do sécu lo IV. A sua solenidade foi fixada para o dia te para suprimir uma procissão que os pagãos fazia m nesse
25 de Dezembro com o fim de suplantar ' a festa pagã do dia em honra d e Robigo e Robiga .
Sol Invicto, que neste dia se celebrava . Nos últimos decê- 726. Multiplicaram-se, neste período, também as festas
nios do mesmo século, a festa do Natal espalhou-se no dos má rtires, e espalharam-se as suas solenidades mais lar-
o riente. Em Constantinopla foi celebrada, pela primeira vez, gamente . Uma das primeiras é a festa do protomártir S. Es-
por S. üregório Nazianzeno, aos 25 de Dezembro de 379 têvão que, desde fins do sécu lo IV , se realiza no dia depois
ou 380 ( Hom. 38 in Theoph.) . JLl stino II (565-78 ) pres- do Natal. O seu culto é mais antigo, qu ase tão antigo como
Creveu-a para todo o império. a Igreja. Seguem as festa s de S. Lourenço, de S. João Ba-
723. Como a Páscoa se preparava por um período de tista, dos apóstolos Pedro e Paulo, dos santos Inocentes e de
j ejum, assim também o Natal teve o seu tempo de prepara- todos os apóstolos.
ção, o Advento. A princípio, consi sti a de se is semanas. Em No oriente celebrava-se, desde fins do século IV, na
segui da foi reduzido a quatro, sendo destinadas ao jejum oitava de Pentecostes, a festa de todos os mártires. No oci-
somente as 2' 4' e 6" feiras. No dia da oi tava do Natal dente encontra-se tal festa só nos princípios 00 século VII.
fi~pu-se, pelos' meados do século VI, a festa da Circuncisão. O papa Bonifácio IV (608-15) co nsagrou à Virgem Maria
Com esta nova festa visava-se s uprimir as solenidades, que e ..a todos , os. mártire.s o Panteão que o imperador Focas
§ 62. Culto e disciplina 301
300 II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão

lhe doara. (LP ed. Duch. I, 317) . Daí teve origem, mai~ guida, as relíquias foram transportadas para as igrejas. O
tarde, a festa de Todos os Santos . primeiro lugar tinha entre elas a sa nta Cruz, reencontrada
por S. Helena (Ambr., De ob. Theod. 43 ss ; Socr., HE
727. Já antes existiam algumas festas de Nossa Senho-
I, 17). Por ocasião da dedicação da basílica do Santo Se-
ra. A primeira é a festa de Nossa Senhora da. Luz ou .da
pulcro em 335 foi celebrada, pela primeira vez, a festa da i
Purificação, que se celebrava aos 15 de Fevereno, 40 dIas
Exaltação da Cruz, no dia 14 de Setembro. No século VII, I
depois da Epifania. No oriente era a festa da Apresenta-
esta festa foi int,oduzida também no ocidente, juntamente
ção de Jesus Cristo e chamava-se {mm'r1, encontro, lem- com a da Invenção da Cruz.
brando o encontro de Simeão com o Menino Jesus. Com a I.1'1
instituição do Natal, a festa da Purificação foi transferida 731. Também o culto das imagens existe já antes de
para o dia 2 de Fevereiro. Outras festas de Nossa Senhora Constantino Magno. Desenvolveu-se brilha ntemente no se- I!
I;'

deste per iodo são a Natividade, a Anunciação e a Assunção. gundo período, apesar da oposição de muitos Padres "

Orientais.
728. Desta multiplicação das festas deduz-se também
Finalmente, eram objeto de veneração os luga res santos, .,I
a crescente veneração dos heróis do cristianismo, não só
principalmente os lugares santificados pela vida e morte de
dos mártires, mas também dos outros santos. Os altares,
Jesus Cristo, como também o monte Si na i e os sepulcros
que se levantava m sobre os seus sepulcros, transformavam- 1
dos apóstolos Pedro e Paulo (Iimina apostolorum ). Desde '1:

se em igrejas. Nas igrejas maiores faziam-se os chamados


a vitória de Constantino, muitos cr istãos iam visitá-los em I
dipticos, que continham os nomes dos mártires e santos. De- ! "
peregrinações. Temos ainda interessantes descrições de pe-
les se desenvolveram, paulatinamente, volumosos martiroló-
gios. Em Roma foi redigida a D epositio episeoporum el mar-
regrinações no !linerarium Burdigalellse, escrito em 333, e
na Peregrinatio ad loca sanefa, que data de fins do século I
/yrum do cronógrafo de 354 (Kirch, 543 ss). Na Itália se-
tentrional teve origem, pelo ano de 450, o Marfyrologium
IV, e que? primeiro editor, Gamurrini, atribuiu a .S. Sílvia.
Outros consideram S. Etéria como autora; e esta e hOJe em
I
Hieronymianum, revisto e melhorado nas Gálias, pelo ano
dia opinião geral.
de 600. Este martirológio jeronimiano baseia-se no marti-
rológio sirio, compilado pelo ano de 400, e em vários ca- 732. O influxo do cristianismo sentia-se não só no cam-
lendários de Roma, Cartago, etc. po do culto e da di sciplina religiosa, mas também na vida
729. O lugar de honra tinha naturalmente Maria San- social. Ao lado das grandes igrejas levantavam-se hospitais

..
tíssima, cujos louvores se ca ntavam, já no primeiro perío-
e asilos de todas as categorias. A caridade cristã realizava
do, em palavra e imagens. A ela se dedicaram, no segundo obras dignas de toda a admiração, a ponto de Juliano Após-
periodo, magnificas basílicas. Seja mencionada s6mente a tata não conhecer melhor meio de reformar o paganismo
maior de todas as igrejas marianas, Maria Maggiore em Ro- do que a imitação das instituições da ca ridade cristã .
ma , ou basílica liberiana. Digno de menção é o g rande hospital de Cesa réia, fun-
Também os anjos tornaram-se objeto de veneração, que, dado por S. Basílio, verdadei ra cidade de obras de cari-
a liás, se baseava nos livros do Antigo e do Novo Testamen- dade, como diz Gregório Nazianzeno. S. Melânia Júnior dis-
to. Pa rticular veneração gozavam os Anjos Custódios dos tribuiu os seus milhões aos pobres, a igrejas e mosteiros
povos, províncias, cidades e pessoas. S. Miguel era venera- para passar o resto da sua vida nu m mosteiro por ela fun-
do como Anjo Custódio da Igreja, desde o século II (Past. dado em Jerusalém.
Herm ., Sim. 8, 3, 3). Desde sempre, a Igreja distinguia cla- A escravidão não podia ser logo abolida; mas ° tra-
ramente entre latria que só a Deus se deve e dulia. tamento dos escravos tornou-se mais humano. A sua eman-
cipação era favorecida pela Igreja e promovida pelo Es-
730. A veneração dos santos incluía também a vene-
tado. Toda a legislação, particularmente a legislação penal
ração das relíquias. Sobre os sepulcros · dos santos, já IlllS
tornou-se mais humana. A crucifixão, a conden'ação aos com-
tempos das perseguíções, celebrava-se a santa missa. Em se-
302 II época: Desenvolvimento da Igreja no império cristão

bates de gladiadores e outros suplícios foram abolidos. Em


404, o imperador aboliu totalmente os combates de gla c
diadores.
733. No entanto, a liberdade e a preferência, de que
gozava a Igreja, teve também consequências menos felizes.
Aos poucos, arrefeceu o antigo fervor e heroísmo de mui-
tos cristãos. Numerosos pagãos se convertiam sem convic-
ção, só para agradar às autoridades e por motivos de van- TABELAS CRONOLóGICAS
tagens materiais. Hipocrisia, indiferentismo, avareza, rivali-
dades, etc., eram as tristes consequências, que se faziam I. Os papas da antiguidade cristã l
sentir dolorosamente entre leigos e clérigos. A Igreja se tor-
nara, na expressão de S. ]erônimo) "potentia quidem et di- 1. S. Pedro, t 67 ou 64 36. Libério, 352-66
vitiis maior, sed virtutibus minor" (Vita Malchi I). O pres- 2. S. Lino, t 767 (Félix 11, 355-65)
3. S. Anacleto ou Cleto, t 88? 37. S. Dâmaso I, 366-84
bítero Salvian(\ "]eremias" de seu tempo, pinta-nos um qua- 4. S. Clemente, t 977 (Ursioo, 366-67)
dro bastante tétrico da sociedade cristã nas cidades do im- 5. S. Evaristo, t 105? 38. S. Sirício, 384-99
pério decaclente (De gub. Dei). 6. S. Alexandre I, +r 115? 39. S. Anastácio I, 399-401
7. S. Xisto I, t 1257 40. S. Inocêncio I, 401-17
734. Todavia, não devemos generalizar demais este re- 8. S. Telésforo, ·1· 136? 41. S. Zósimo, 417-18
laxamento. Varões ilustres, como Atanásio) Basílio, Crisós- 9. S. Higino, t 1407 42. S. Bonifácio I, 418-22
10. S. Pio I, t 1557 (Eulálio, 418-19)
tomo) Ambrósio) Agostinho e numerosos monges e santos II. S. Aniceto, 155-66 43. S. Celestino I, 422-32
demonstram uma altura moral nunca atingida no paganismo. 12. S. Sotero, 166-75 44. S. Xisto III, 432-40
E deles irradiava uma luz benéfica sobre toda a socieda- 13. S. Eleulério, 175-89 45. S. Leão I, 440-61
14. S. Vito r I, 189-99 46. S. Hilário, 461-68
de cristã. A Igreja foi sempre mestra de santidade. Seus 15. S. Zefirino, 199-217 47. S. Simplicio, 468-ft~
filhos nem sempre ficaram fiéis à Mãe. 16. S. Calisto I, 217-22 4H. S. Félix II (III), 483-92
E também não devemos esquecer que o segundo pe- (S. Hipólito, 217-35) 49. S. Uclásio I. 492-96
17. S. Urbano I, 222-30 50. Anastácio II, 496-98
ríudo da história eclesiástica se nos apresenta como tempo 18. S. Ponciano, 230-35 !iI. S. Símaco, 498-514
clássico do dogma; é o período dos grandes doutores da 19. S. Antero, 23.5-36 \Lourenço, 498, 501-05)
Igreja) dos grandes concílios; é o tempo clássico do mona- 20. S. Fabiano, 236-50 :52. S. lIormisdas, 514-23
21. S. Cornélio, 251-53 53. S. João I, 523-26
quismo e da constituição da Igreja. Toda a sua história (Novaciano, 251) 54. S. Félix III (IV), 526-30
nos demonstra, não menos do que a do primeiro período, 22. S. Lúcio I, 253-54 55. Bonifácio II, 530-32
23. S. Estêvão I, 254-57 (Dióscoro, 530)
a ação da Providência divina.
Funk, Ueber den Kanon der roem. Messe, Abh. und Unters. III,
85 ss. - Eisenhofer, Handbuch der kath. Liturgik, 2 vaI., Freiburg
• 24.
25.
26.
S. Xisto 11, 257-58
S. Dionísio, 259-68
S. Félix I, 269-74
56. João 11, 533-35
57. S. Agapito I, 535-36
58. S. Silvério, 536-37
1932-33. - Schaster, Liber Sacramentorum, Note storiche e liturgiche. 27. S. Eutiquiano, 275-83 59. Vigília, 537-55
sul Missale H:amano, 9 vol., Tarino 1919-28. - Wagner, Die Ele- 28. S. Caio, 283-96 60. Pelágio I, 556-61
mente des grego ri anis chen Gesanges, Regensburg 1909. - S. Au- 29. S. Marcelino, 296-304 61. João III, 561-74
gustini textus selecti de poenitentia, coll. Poschmann (Flor. patr. 30. S. Marcelo I, 308-09 62. Benedito I, 575-79
38), Bonnae 1934. - Poschmann, Die abendlaendische Kirchenbusse 31. S. Eusébio, 309 63. Pelágio 11, 579-90
im Ausgang des christlichen Altertums, Muenchen 1928. - Goeller, 32. S. Meldades, 311-14 64. S. Gregório I. 590-604
Papsttum und Bussgewalt in spaetroemischer und fruehmittelalter- 33. ~. Silvestre I, 314-35 65. Sabiniano, 604-06
licher Zeit, Freiburg 1933. - Kellner, Heortologie oder das Kir- 34. S. Marco, 336 66. Bonifácio III, 607
chenjahr und die Heiligenfeste in ihrer geschichtlichen Entwicklung, 38. S. Júlio I, 337-52 67. S. Bonifácio IV, 608-15
3. ed., Freiburg 1911. - Allmang, Pastor Bonus, 25, 129 5S. - Botte,
Les origines de la Noel et de l'Épiphanie, Louvain 1932. - Quentin, 1) Segundo o Anuário Pontifício para o ano de 1948. Cfr. tam-
Les martyrologes du moyen âge, Paris, 2. ed. 1923. - Numerosa bém LP. - Capelli, Cronologia, 2. ed., Milano 1930. - Seppeit-
literatura em Funk-Bihlmeyer, Kirchengeschichte I. Loeffler, Papstgeschichte.
-

304 Os Papas

68. S. Adeodato I, 615-18 78. Dono, 676-78


69. Bonifácio V, 619-25 79. S. Agatão, 678-81
70.
71.
72.
73.
74.
Honório I, 625-38
Severino, 640
João IV, 640-42
Teodoro I, 642-49
S. Martinho, 649-55
80.
81.
S. Leão II, 682-83
S. Benedito II, 684-85
82. João V, 685-86
83. Cónon, 686-87
84. S. Sérgio I, 687-701
,
I

I
75. S. Eugênio I, 654-57 ') (Teodoro, 687)
76. S. Vitaliano, 657-72 (Pascoal, 687)
77. Adeodato II, 672-76
lNDICE ALFABÉTICO
II. Concilios ecumênicos da antiguidade cristã Abássidas, 429 c Antidicomarianita5, 481
1. Nicéia I, 325 4. Calcedônia, 451 Abderramão, 429 c Antonino Pio, 134

f
Abércio, 190 AntÔnio Félix, 79
2. Constantinopla I, 381 5. Constantinopla II, 553
Abgar V, 50 t, 105 Antropomorfismo, 554
3. Éfeso, 431 6. Constantinopla III, 680-81
Abgar VIII, 105 Apocrisiário, 647
Abu Bekr 420, 427 Apolinário de Hierap., 284
Acácio de Const., 501 Apolinário de Laod., 484 b, 485,
Acilio Olábrio, 128 486
Ac~lmetas, 691 ApoIinarismo, 484
Acólitos, 183, 646 Apologetas, 242
Actistetas, 505 b Apolónio, S., 137
Adamitas, 308 Apolónio de Tiana, 143, 170,
Adriano, imp., 133 172 c
Adrumeto, 545, 546 ApoIos, 78
Advento, 723 Aquilas, 77
Aftartodocetas, 505 Arbogasto, 406 b
Agamemnon de Ef., 4IlO, 491 Arcádio, imp., 409, ,1555
Agapes, 61, 116, 205 b, 208 Arcediago, 182, 645
Agapito, pp., 503, 504 Arcipreste, 645
Agostinho, S., 437, 530 S8, 543 Arianismo, 435, 439 ss
S8, 610 S8, 648, 707 c, 708, 719 Ario, 439, 440 55, 468
Agatão, pp., 515 b, 516, 667 Aristides de Atenas, 272
Agripa I, 33 Ariston de Pela, 285
Agripa II, 81 Arnóbio Sen., 376
Agueda, S., 148 Arquelau, 33
Alexandre de Alex., 440, 443, Ascetas, 232, 233
449, 570 Atanásio, S., 444, 448, 449 ss,
Alexandre Severo, 143 469, 571, 572
Ali, 420, 428 Atenágoras de Atenas 278
Amaro, S., 697 b Augustinismo, 537, 542, 543 S8
Ambrósio, S., 404, 405, 466, 469, Aureliano, imp., 154, 322
483, 604, 605, 613, 692, 707 c, Avito de Viena, 626
708, 719 Bardesanes, 309
Amônio, S., 682 Barcochba, 133 b, 273
Amônio Sacas, 172, 349 Barnabé, S., 68 ss
Anacoretismo, 682 Barsurnas, 492
Ananias, 68 Bartolomeu, S., 94
Anás, 84 Basilides, 305, 306
Anastácio II, imp., 519 Basílio M., S., 464, 466, 469•.,~l
André, S., 94 b, 576 ss, 684, 685 707 c 713
Aniceto, pp., 136, 213, 264 719, 732 -- J - , ,

Anomeus, 459 5S
Batismo, 198 ss, 203 204 336
2) Foi eleito, quando Martinho se achava no exílio e, parece, Antão, S., 236, 682 526, 533 c J"
este nada objetou, Antero, pp., 144 Belisário , 504
Compêndio I - 20
Indice Alfabético 3Ó7
306 Indices
Disciplina -do arcano, 209 - de Reji, 549
Bento, S'J 696 55 - de Consl. III, 436, 507, 515 b DiSciplina da pen" 71 3 S5 Felicidade, S" 140
Bigamos, 196, 650 - de Eleso, 436, 490, 542 Dó'açãO constant.~ 393 felicíssimo, 213, 336
Boécio, 629 _ de Niceia, 194, 223 b, 435, Docetismo, 303, 309 Félix de No1a, S., 148
Bonifácio II, pp., 550 443, 652 b, 654, 664 Domiciano, imp., 91, 127 S5 - pp., 501
Brás, S., 163 Coliridianos, 481 Donatismo, 4;37, '522 ss - antip., 461, 476
Comodiano, 374 Donatistas, 158 b - de Aptung, 524, 526 5
Caabá, 419 Cómouo, imp., 137, 138 Donato M., 524 c, 525 Festas ecl., 720 ss
Cailás, 84 Confessores, 166 Doutores da Igreja, 240 Filipe, o Arabe; 145
Cainitas, 308 Confissão, 215 - diac., 65
Caio, presb., 88 Constâncio,. 394 55, 453 55 Ebionitas} 291, 319, 321 Filo, 36, 38 s, 344
Calígola, 32, 84, 85 . Constâncio ' Cloro, 155, 158 :s Ed ito de Milão, 162, 164, 388 Flávia Dom. 128
Calisto I, pp., 143 b, 325 s, 333, Constante, 394 5 Elrém, S., 597 s Flaviano, S.; 495 s
713 Constante II , 512 b, 514- 5 Eleição eel., 194, 649 f loriano, S., 99
Cânones apost., 664 Constantino M., 159 s5,380 so, ~liogábalo, imp., 141 Focas, 675 c
Ca nonisas, 646 387 58, 525 S5, 653 s, 720 Elquiesaitas, 297 Fortunato, 336 b
Cantores, 64-7, 708 Constantino II, 394 S Emitia, S., 685 FOlino, S., 97
Canto ecl., 708 Constantino IV, 515 Encratitas, 277, 310 Fragmento Murat., 82
Caracala, 141 Constituição apost., 254, 664 Epifania, 220 b, 721 Fronto de Cirta 135 171 c
Carismas, 175, 176 Captas, 506 Epifânio, S" 552 55, 594. s Frumêncio, S., 418 '
Carpocracianos, 308 Corão, 421 Epistola de Sam" 247 s Frutuoso, S., 152
Cassiodoro, 630, 700 Coreplscopos, 185 b, 644 Epistola tract., 540 Ftart61atras 505
Catafrígios, 88 Cores litúrgicas, 712 Escola alex., 343 ss, 485, 565, Fulgêncio d~ Ruspe, S., 550, 624
Catálogos, 90, 144, 181 Cornélia, cen!., 65 s, 83 s 567 S5
Catecumenato, t 98 55 Cornélia, Papa, 96, 150, 152 b; - antioqu., 343, 359, 485 ss, 565, Oaio, presb., 332
586 ss Oalério, 155 ss
Cecilia, S., 143 b 183, 214, 334 s Oalieno, 153
Celestino, pp., 489 Crónica de Arbela, 107 - de Caes., 343, 351, 566
- de Edessa, 596 b Oálio, 77
Celéstio, 533 ss Ctistólatras, 505 b Oalo, 150
Celibato, 36, 197, 652 Culto das imagens, 731 Escolástica, S., 697 c
Celso, 135 a, 171 Esseus, 36, 680 Gamaliel, 63 67
Culto divino, 701 55
Cenobitismo, 678 55 Estêvão, S., 63 s, 67, 69, 84 Oelasio I, pp. 667 672
Dâmaris, 76 . Estêvão, Papa, 203 b, 204 Oen.dio, 549 '625 '
Cerinta, 92, 296 Giróvagos, 688 b
Cesário de Arles, 550, 693 Dâmaso I, Papa, 464, 470" 475, Estílíco, 407
Ceciliano de Cart., 524, 526 606 b, 666 b, 667, 671, 704 Estilita5, 690 Onosticismo" 299 SS
Demétrio de AJex., 349 55 . Eucaristia, 61, 205, 702 Onósticos, <90
Ciitas, 421 Go rdiano III 145
Circuncisão, 723 Décio, imp., 120, 146 s, 149. Eudóxia, imp" 556, 58B b
Cipriano, S., 152, 190, 203 b, 204, Diaconato, 182 EuJógia, 208 Graciano, i~p. 404 466 604 "
336, 362, 369 SS, 523 Diaco nisas, 184, 226, 646 Eunômio de Cizico, 459 Oregório I, Papa, 633 5 655 6&.1'
Cirilo de Jer., 593, 707 c Diáconos, 62, 226 Euquério, S., 622 671, 675 708 '"
Cirilo de Alex., 488 ss, 509, 513, Diatessa ron, 277 Eusébio de Ces., 444, 55 1 b, - lIumin., í07 414
Didaqué, 245 s, 248 567 ss - Nazianz., 464 466 469 ' 470
516, 575
Cisma acaciano, 502, 666 b, 673
- antioqueno, 473
Didascalia apost., 182
Dídimo, o Cego, 574
Dies natalis , 220 c
•I - de Dorileu, 488, 4Q5
- de Nicam., 440 c, 442, 444,
447, 454 -
55 1 b, 576 '581 ~5 6Ü6 '
707 c ' ,
Niss., 464, 466 469 551 b
b,
- Iu ciferiano, 478
_ meleciano, 440, 442, 446, 450 Dies stationis, 207, 219 - de Vere., 648, 692 576, 584 s, 707' c, 719 '
- romano, 476, 477 Dioceses, J85 Eustacianos, 473 5S - Taumat., 351, 357
Claudio, imp., 77, 83, 85 Diocleciano, 155 ss Eustácio de Ant., 444, 448, 473 - de Tours, 627
Uiodoro de Tarso, 486,. 492, - de Seb., 684 Guerra jud., 33
Cláudio II, 153 c
Clemente, S., Papa, 82, 87, 191, 586 s Eust6quio, 606 a, 607 b, 685 Héjira, 419 c
249 ss Diogneto, 279 s Eutiques, 494 ss Helenistas, 62
_ de Alex., 46, 86, 140, 345 ss Dionisin, Papa, 152 s, 191, 327, Evágrio Pôntico, 573, 642 Hen6ticon, 501
Clínicos, 196, 200, 650 356 Exarcado, 187 Hérac1as, 349, 355
Concilio de jer., 85, 873 Dionísio de Alex., 147, 191, 204,.. Excomunhão, 210 b Heráclio, imp., 508 55
_ de Calced., 436, 498, 644, 647, 327, 337, 355 5 Exorcistas, 183, 646 Hermeneuta5, 647
653 .ss, 663, 666, 688 b Dionísio Areop., 76, 97 Fabiano, pp., 148, 334 Hérmias, 282
- de Consto I, 435, 467, 469 58, Dionísio de Cor., 87 Fariseus, 35, 55 Herodes Agrip,\, 85
484 c, 655, 666 Dionísio Exig., 51 ,. 631 Fausto de Mileve, 612 _ . Antipas, 33
- de Consl. II, 561 Dióscoro Alex., 495 55
Indlces I"di"" Allabélico

_ M., 32 8, 51 Julio I, Papa, 453, 666, 671 A1armoutfet I 693 Nestórlo, 436, 487 55 541
_ Africaoo, 360 M"ronitas, 520 Niceta de Remis., 380: 605 b
Meterias, 116 Justlniallo I, 409, 503, 552, 557 Mar8ilien&e8, v. Semipe'agianos Nicolaitas~ 92, 308
Hé.apla, 353 b 558 .8, 649, 633, 655, 666
Hiérocles, 156 b, 172 c Martinho I, Papa, 513 5, 676 s Noeto, 323
Hipólito, 144, 325 s, 342 - l1,519 s '- de Braga, 694 Novacianismo, 96, 214
Hitarlão, S., 417, 683 J1I8tina de Pádua, S., 1!l8 h de Tours, 483, 693
_ Novaciano, 152 b 21. o~.
Justino, S., 112 b, 136, 273 SS MÁrtjrea, 166 373, 523 " .,.,.. ..,
Hilário de Arles, 547 5, 622 b,
_ I, imp., 502 Mar,tir:ológi09, 728
658 Oblatos, 687
_ de Poitiers, 602 s Laclãncio, 317 s Massa · Cândid., 152 Oficio divino, 709
H ipácia, 410 Lapsos, U7 Matrimónio, ZZ8 Ofil .., 308
Homeus, 459 Latroelnio de EI., 496, 499, 591, Maleus, S., 94 Omar, 420, 427
Homeusianos, 459 b, 460 ss 599 Matiaa, S., 58 Omladas, 420, 428 8
Honorato, S., 622, 693 Lauras, 683 Maurldo, S., 1!l8 Optato de Mileve, 530
Honório I, pp., 510 55, 516, 676 Leandro de ' Sev., S'I 63=' - imp., 675 e Origenes, 85, 104, 140, 148, 3.5.
_ (mp" 407, 540 Leão I, Papa, 495 55, 620, 658, Maxêncio, imp., 159 8,162 348 55, 551 ...
Hormisdas, Papa, 502, ôú6 b, 667 671 s, 715 Maximiano) impOI J5!}159 Origenismo, 438, 5.51 S8
Hósio de Córdova, 443, 455, 457 _ II, Papa, 51'8 Maximino Daja, 151' 159 ss Orósio, 538, 619
_ (, ímp., 50CI - Trácio 141, 144 ' Ostiário, 183, 646
Ibas de Edessa, 496 b, 558 5,
561, 599 l..ecionários, 106 b Máximo, S., 512 b, 514 b, 517, Otman, 420, 421
Legião tebaica, 158 643
Ildefonso de Tol., S., 635 - de Turim, 628 Pacõmio, S., 237, 679, li85
Inácio, S., 87, 132, 190, 255 55 Leitor) 183 Padres da Igreja, 238. 2014 55
Leôncio de BI•. , 638 Melãnia, S. , 608, 685, 732
Index, 90 Melelades, Papa, 283, ~27 Paládio, 642 '
Inês, S., 158 Leônidas, S., 140, 348 Pancrácio, S. 152
Libânio, 397, 406 MeJecian06 antioq., 474 ss
Infalibilidade, 461, 518 Libelo de paz, 217 b, 336 b Melédo de Anlioq., 47() 474 Pá "filo de Ces., 160 351 358
Inocêncio I, Papa, 538, 672 551,567 ,~I
Libério, pp., 457 8S, 476 5, 671 Melito de Sardes 284 '
lreneu, S., 88, 90, 97, 136, 190, Melquisedequlano~, 321 b Panteão, 42
223 b, 340 5 Liber Pontif., 90, 632 Panteno, 94, 102, 104, 345 3
Liclnio, imp., 159 ss, 390, 443 Menandro, 295
Isidoro de Sev., 635 Menas de Conetant., 504 b.• 557 Pápias, 86, 91, 266
Islamismo, 419 S5 Litanias, 725 Paróquias, 182, 185 644
Liturgia, 206, 703 65 b, 560
ja.cob Baradai, 506 Mcnsúrjo, 524- Páscoa, 220, 222, 264
Lourenço, S., 152
Jacob Dissec.lo, 413 Lucas, S., 75, 78, SO s, 94 Mesr6pio, S., 414, 600 s Pastor de Hermas, 267 S8
Jacob de Nisibis, 596 c Messalianos, 480 Patriarca eucum., 655 669
Lúcia, S., 158 Patriarcado, J~7 '
Jacobitas, 506 Luciano de Antioquia, 160, 111, Metódjo de 01., 160, 361
januário, S., J58 322, 359, 439 b Metropolita, 186 Paula, S., 606 c, 685
Jejum, 219, 221 Minúcio Félix, 363 Pautíno de Aotjoq., 473 9S, 6()6
Lúcido, presb" 549 -~ de MiJão, 534
Jerarquia ecl., 253 Luclfero de Cágl., 475, 478 Missa, 206 b, 702
Jerõnimo, S., 538, 553, 606 ss, Lúcio I, Papa, ISO S Moavija, 420, 428 - de Nola, 692
612 _ rei, 100 Monacato, 231 ss, 67B ss Paulo, S., ap., 65 ss, 85 87 89
João, Apost., 60, 63, 65, 73, 91, 124 b ' , ,
Macário M., 682 b Monarquianjsmo, 153 b, 3J9 5s
128 439 ' - de Samósala, 154, 322, 439 b
João Bat. , S., 33, 52 Macedonianismo, 435, 468 5S - de Teba., 235
Macedó nio, 459 b, 469 Mônica, S., 611 58
João IV, Papa, 512, 517 Monolisilismo, 436, 484 c 485 Pecados capitaiS, 210 b
Macrina, S., 585, 685
_ de Antioquia, 489 b, 490 ss
Manes, 314 SS, 612 Monoteletismo, 436, 507 s~ Pedro, S., 56, 58 8S, 83 S8, "124 b
_ Cassiano, 421, 546, 549, 693 Montanistas, 328 56 - de Alex., 160
_ Climaco, 640 Maniqueísmo, 314 55, 647 - Crisólogo, 628
Maomé, 419 55 .Montecassino, 697 c
_ Crisóstomo, 555 s, 587 55, 707 - Mongo, 500 s
_ de Jerus., 534, 553 Maratônio, 469 NnasseftOl, 308 Pelagianismo, 437, 532 59
_ Marcos, 70 s, 94, 102 Marcelino, pp., 158 b, 160 b Natal, 722 Pelágio I, Papa, 561
_ Moxo, 641 Marcelo r. Papa, 160 b Nazarenos, 292 - - 11, 633
_ e Paulo, S5., 399 c Marcelo de Anelra, 444, 452 " Nectário d. Constant. 470 .~ her., 532 ss
Joviano, imp., 402 455, 479 Neopi1agorismo, 170 ' Penitência, 210 99
Judaizantes, 290 s, 439 b Marciano, imp., 497 ~, 5(XI Neoplatonismo, 172, 302 s~ 349 Penitenciários 217 714
Marciao, 202 b, 264, 305, 311 •• b, 396 b, 400 Penitentes, 2,'6
Julianistas, 505 Marco Aurélio, 46, 135
#

Juliano Apost., 394, 397 S5, Nero, 121 Pentecost'ts, 220


Marcos, S., v. João Marcos Nerva, 129 fi Perpétua, S. 140
464 s Mario Mercator, 542, 619
_ de Eclanurn, 541 Nestorianismo, 485 SoS Pilatos, 84 '
Indice Alfabético 311
3.10 indices
· ~'r.u lal1o (2'), 208, 333, 520, Tetrateísmo, 505 c
Piônio, 148 - II, 412 b h':I~,661, 687 Tiago Maior, S., 85, 98
Plácido, S., 697 b Sarabaita5, 688 SillHI, 75 - Menor, S., 73, 79, 93, IRt
Plínio, o Moço, 106 131 Sebastião, S., 158 Silvério, Papa, 504 Tibério, imp., 52, 84
Platino, 172 J
Serill-arianismo, 454 55, 459· b, Silve,lre I, Papa 443 708 Timóteo, 75, 78, 181
Pneumatomaquismo, 467, 469 55
Policarpo, S" 91, 134 b 223,
460 55 Simaco, pref., b,404 613 Tiridates 111, 107
Semipelagianismo, 437, 543 'Ss Simão, o Estilita, 417, 690 Tito, S., 78, 181
'26355' Sêneca, 45 c, 46, 77, 121 o Mago, 293 s - imp., 126
Polícrates, 223 b o Moço, 690 - Flávio Clem., 128
Septuaginta
Ponciano, Papa, 144 326 Símbolo apost., 202 Títuli, 185
Pôncio Pilatos, 67 ' Sérgio I, Papa, 521
- de Constant., 509 55, 516 nic., 444 Tomé, 5., 94
Pórcio Festo, 79, 81 Simeão, S., 103 132 Tonsura, 651
Porlírio, 154 b, 172 - Paulo, 138
Simonianos, 93 ' Trajano, imp., 130 58
Potino, S., 136 Setímio Sev., 141
Sineelo, 647 Três Capítulos, 438 551 558 's
P,r edestinação, 537, 543 5S Setitas, 308 Sintício, S., 682 c 660 " ,
Pregação, 707 Severiano5, 505 Sirício, Papa, 183 671 715 Triteístas, 505 c
Presbitério, l7S Severino, Papa, 512 Sistema sinodal ~s 661 l,Irbano I, 143 b, 326
Primado, 188 55, 253 c, 455 657 Severo, imp:, 159 Soforônio, S., 5'10 S5 641
665SB ' I Sínodo (v. Concílio) Ursula, S., 158
S(')stenes, 77 '
Primicério, 647 Sínodo de Agde, 686, 706 Sotero, Papa, 87 136 Valente, imp., 403, 465 5, 579
Privilégios, 653 - de Alex. (362), 469 Studion , 691 ' Valentim, 3m
Priscila,-77, 89 - de Anc. (314), 216 233 b, Su bdiacon ato, 183 652 Valentiniano I, 403, 604
Priscilianismo, 483, 533 c 713 ' Subiaco, 697 ' - II, 405 55
Prodo, her., 88, 332 - de Anc. (358) 460 . ~ubintroductas, 254, 446, 652 b - III, 408
- de Cízico, 488 - de Antioq. (268), 322 Subordtnacianos 318 354 439 b Valcntiniano5, 307
Prosélitos, 40 - de Antioq. (341), 453 551 s "J , Valeriano, imp., 151, 153
Próspero, S., 547 55 619 - de Arles (314), 97, 100, 194, Suf~agàneo, 186 Venâncio Fort., 627
Protopasquitas, 222 ~ 204 b, 527, 658 Sunttas, 421 Veneração das relíquias, 730
Ps.eudo:..Dionisio, 636 s - de Arles (353), 457 - dos santos, 728
Pseudo-Clementinas, 254 b, 298 - de Bostra, 104 Tabenisi, 679, 681, 685 Vesp'3s iano, 126
Pulquéria, S., 409, 497 s Taciano, 277, 310 V ~S1es litúrgicas, 710
- de Carl. (397), 653
- de Car!. (411), 535 Tarcísio, S., 152 Vlccdomini 647
Quadrato, 271 .' Teodato de Biz., 321
Qualidades dos c1ér., 245 - de Cart. (418), 539 b Vicente de' Lerins 549 622 b
- "ad quere.", 556
- o Moço, 321 b Vi covaro, 697 ' ,
Quarenta Mártires, 163 Teodoreto de Ciro, 82, 489 b,
Quaresma, 724 - de Cons!. (330), 452 Vigíllo,
674
Papa, !504 b ' 557 b 560
- de Cons!. (448), 495 495 5, 558 5, 561, 591 s, 690 < , ,

Quartodecimanos, 222 b, 223 b Teodora, imp. , 503 s


Quatro Coroados, 99, 160 - de Dióspol., 538 Virgens, 585
- de Elvira, 98, 195, 1975, 219, Teodoro, Papa, 512 Visão de Constant 165
Q'uestão de Honório 5t7 5 - Asquidas, 557 ss
- de Libério, 458 'S5 228, 233 b, 652 Vito r I, Papa, 140;' 223 b, 321
- de Laodic., 644 - de Mopsv., 486, 492, 532 5, Vitorino de Petau 99 160 375
Quiliasmo, 330 55, 356 54 1, 558, 561, 586
Qujnissexto, v. 2' Trulano - de Milão (316), 528 Vivário, 630. 700 ' , ,
Teodósio Magno, 504 s, 467, 604 Vulgata, 607 b
Q-uirino, 5., 99, 160 - de Milão (355), 457
- de Orleans (511), 725 c,720
Rabulas de Edessa, 492, 599 - II, 409, 489 55, 495 55 542 Xeres de la Frontera 429
Reclusos, 689 - d. Orleans (529), 649 b, 550 556 720 " Xisto 11, Papa, 152, '204
- de Orleans (533), 663
Rescrito de Adriano. 133
- de Rimini, 462 5 Tcófil~ de Alex., 552 ss 588 Zefirino, pp., 140, 324 5
- de Marco Aur., 135 b -- de Antioq., 281, 608' Zenão, imp., 492
- de Trajano, 131 s - de Roma (430), 489
- de Sárdica, 455, 661 666 b, Terapeutas, 36, 680 Zósimo, Papa, 539 5
Romano, o Cantor, 639 Tertuliano, 88, 333, 362, 364 S5
Rufino, 553, 608 s 668 '
Sabas, S., 683 - de Seleucia, 462 s
Sabelianismo, 324, 356 - de Sirmio (1'),457
Sabélio, 324, 326 s - de Sírmio (2'), 460
Sacramentários, 105 - de Sírmio (3'), 460
Saduceus, 34, 55 - de Tiro, 451
Salvia11o, 625 Sinodo de Toledo (589), 715
Samaritanos, 37 - de Toledo (633), 687, 711
Sapor I, 153 - de Toledo (681), 649 .
INDICE OERAl.

Prefá<io . . . . . . . . .. .. . . .... ... ... . .. ... . .... .. .... .... .. .

INTRODUÇÃO
II \. Conceito e lim, importância e método <kl história ecle-
siástica . . . .......... .... ...... . ..... .. ........... It
II2. llivi8l0 d. história eclesiéstica . ..... .. .. .... .... ...... 14
8 3. fontes da história eclesiástica .. ............ . .. .... . . .. 16
§ <lo Ci~ncia5 auxHiares da história eclesiástica ..... '... '. . . . H/
§ !:lo O desenvolvimento da historiograiia eclesiástica . ", ', . . 21

ANTIGUIDADE CRISTA

PRIMEIRA tPOCA
DESDE A FUNDAÇÃO DA IGREJA ATB AO EDITO DE
MILÃO (1:313)

Capitulo I
FUNDAÇÃO, PROPA GAÇ ÃO E PERSEGUIÇ.a.O DA IGREJA
§ 6. Preparação do mundo para o cristianismo ., . ..... . 27
§ 7. ~sus Cristo . . . . .. . ......... ' ...... . ... . .. . . .. . 37
§ 8. A Igreja de Jerusalém .. .. . ............ . ......... . .. 41
§ 9. Cristianismo helénico : São Paul o, a Igreja de Antioquia 44
§ 10. A Igreja de Roma, São Pedro ... . .. , ...... ...... ... . 52
§ II. São João e os outros apóstolos ................... . 57
§ 12. A propagação do cristianismo nos primeiros três séculos fifi
§ 13. Causas da rápida propagaçáo do cristi.nismo e a reação
dos adversários . . . ..' ..... . ...... .... .... ~ . . .. . 64
§ 14. Principios das perseguições no primeiro século .... ... . 69
§ 15. Perseguições parciais no sécu10 11 ..... , .. , ...... ' ,. n
§ 16. A perseguição de Setimio Severo e o primeiro perkKlo
de paz . . . ..... . .......................... ..... .. 76
§ 17. A perseguição sistemática e segundo perfodo de paz ... . fl()
§ 18. Último combate e vitória final do cristisl1Í8mo ... ... , .. 84
li 19. lmport~ncía apologética daa.perseguições ... . .. ....... . &l
§ 20. Poltmki'\s contra o cristiani,mo .' . . ..... , .. .. .... , .. , !lO

I
314
Indices
indice Geral 315
Capitulo II
A CONSTITUIÇÃO DA IGREJA Capitulo 1/
§ 2l. A jerarquia eclesiástica .. . .. , ., .. . . ,., . . . .. .. ...... 92 CONTROVERSIAS TEOLóGIC AS
§ 22. Organização das dioceses e províncias eclesiásticas .. .. 96 .§ 44 O arianismo . . . , ' .. . . , . , . .. , , .. , ~ . , . 193
§ 23. O primado do bis po de Roma . . . . . ... . . . .. .. . . 97 .§ 45: O macedonianismo e controvérsias contempora!1eas . .. .
§ 24. Educaçã o, eleição, sustento e qualidades do clero 99 204
§' 46. O a polinansmo
, e a controvérsia nestoriana .. . . . . . . . . . 209
CapitulO III • § 47. O monofis itismo , . . . , . . . . . , . , , .... . : , , , . . . . . . , . 214
§ 4B. O monoteletism o . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . .. ... . 219
'CULTO, DISCIPLINA E VIDA RELIGI OSO-MORAL DA IGREJA § 49. O dortatismo .... . . . ... . . . . . . .. . 224
§ 25. Batis mo, síinbàJo batismal e oposição herética . ... , . . . . 101 § 5(}, O pelagianismo . . . . . . .. .' ' . , . , . , .•. . . , . . ' .. 228
§ 26. Eucaristia, ágape e diSciplina .,do arcano .,.,... ..... 104 § 51. O predestinacianisrno e senl1~ela glanls mo . . . . , . .. , ., ., . 232
§ 27. A pe nitência . . . ... . .... . . . . •. '. 106
§ 52. O origenism o e os T rês Capltulos , ... . . , ... . . . ' . ' . . . . 235
§ 28. Os ·te.mpos 'santos e'.a' discussão ' da .Páscoa ' .. _• . , ,' " ,. 11.()
§ 29. A v.ida. religioso-moral . . .. .. .... . . .. ~ . . . . . . • . . • . . . . . 113 Capítulo 111
§ 29a. Princlpios do .Illonaca to ' " ;... .. ,--. ... ... . '. . . . . .. . . ]1.6 CI f: NCIAS E LITERATURA EC LESIÁSTICA
Capitulo IV ~i~~~ ~~~:!s~ímento . d~' 'te'o'l~~i~ . ~r~g~~ "'e; ' ~~~~l~' .~I~'x~ndrjna 240
2A2

~ 55: florescimen to da literatura teoló gica no oCidente; ESCrIto-


LITERATURA E Cl t NClAS ECLESIÁSTICAS, HERESIAS , 54 A escola anhoqllcna e olltros escntores o.n entals . 250
E CISMAS
.§ 30. Desenvolvimento da ' lJteratura eclesiástica nos tres pri- res helenizantes ' .. , . , . . . , . , . , . , . . , ... , . . . , . 256
§ 56. San to Agostinh o e a su a ~sc~la . . . .:. ; " . . . . . . , . . 260
meiros séculos ' . . . ... ' . . .. " .... . .. . ... ' . ". . . . 118
§ 57, Os últimos escritores da antIg uIdade cn sta . . . , . . . . . .
§ 3 l. Os Padres apostólicos . ' ........ . . " . .. . . .. . '. , /20 266
§ 32. Utera tura apologética do século ' II " " " " " " " " " 130
§ 33, Heresias efi\ geral, os· jUdaizantes . . , . , . . . . . , ..... ,... 137 Capítulo IV
§ 34. O g nosticisi"no : Vis ta geral, a gnosis ale xandrina e siriaca ' 140 CLE RO E MONACATO, CULTO E DISCIPLIN A
§ 35. O maniqueismo ou gnosticismo párseo . .. , . . . .. , . . " .. 146
§ 36. Controversias trinitárias . . . . . " .. , . . . ,. , ...... , . . . , 148 § 58. O clero secular, novos oficios ecl esiásti cos , . . 273
§ 37. Montanis mo, quiliasmo e cisma de Novacian o . . . ' , . . , 152 § 59, Cons titui ção patriarcal, sistema sino dal ... , . . . . , . .••. . . 276
S 38, Literatura anti-herética, antignósticos is olados . .. " . , ' . . /55 § 60. O papado e o prim ado romano 280
§ 3 9. A' escola 'ca tequética de Alexandria e' outros escritores § 61. O mo nacato . . , 284
§ 61a , Monacato ocidental 289
gregos. . . . ' . .. . . .. . . '. . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . 15$ § 62. Cul to e diSciplina
§ 4(). Escritores latinos dos séculos. II e III ... . ..... . ..... .. 165 292
Tabelas crollolô gicas 303
. SEGUNDA ÉPOCA Jndice alfabético . , 305

DESENVOLVIMENTO DA . IGREJA NO IMPtR/O CRIS-


TÃO; TEMPO DAS CONTROVÉRSIAS DOGMÁTICAS
(313-692).
Vista g-eral
.
. . . .. . . . . . . . . . . . 173 j
Capitulo .{ l
A IGREJA E O ESTADO
-§ 41. A Igreja no império romano ......... ..... .. ..... .. 175
·§.c 42. A Igreja fora do império . . ... . . . . . ... .... . .. . .. . .. . 185 i
§43. O .islamismo . . . . . . .. c • • ' ••• • ••• • ••• " •• • '.' • • • • • 187

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