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estatistas sejam encontradas num período anterior. recer uma alternativa a todas as limitações e defici-
Podemos citar como antecedentes concretos das po- ências apontadas [...], parece representar um avanço
líticas de bem-estar o New Deal (Novo Acordo), na para as experiências de construção de tipologias do
Alemanha de Bismark, na lei dos pobres na Ingla- Welfare State”.
terra do século XVIII, na planificação da, extinta, Esping-Andersen não realiza um trabalho per-
União Soviética e nas demais experiências totalitá- feito que respondeu todas as questões sobre este
rias da primeira metade do século XX. problema, mas ao mostrar que o Estado de bem-es-
A bem da verdade, os fatores que originaram tar, durante o seu desenvolvimento, agrupou-se em
o Welfare State são variados e demais conturbados. três modelos diferentes, abriu espaço para a realiza-
Esses fatores são analisados por correntes de pen- ção de pesquisas específicas sobre cada modelo com
samento diferentes, sendo elas: a Teoria da Cida- seus referidos problemas e conquistas. Vale salientar,
dania, a Teoria da Convergência, o Funcionalismo, que o próprio Esping-Andersen (1991, p. 110), afir-
o Marxismo e a perspectiva do serviço social. Não ma: “que não existe um único caso puro”, ou seja,
optamos por uma corrente específica, por exemplo, sua análise é um tipo ideal que tem como finalidade
a Teoria da Cidadania ou o pensamento marxista. captar a realidade.
Pois, compreendemos que todas estas correntes pos- Qual é a tipologia de Esping-Andersen? Ele di-
suem argumentos que descrevem, com relativa se- vide o Welfare State em três modelos.
gurança, a gênese e o desenvolvimento do Estado 1) Modelo Liberal. Nesse regime, predominam
de bem-estar. Entretanto, adota-se uma perspectiva os benefícios proporcionais mediante comprovação
heurística frente a todas essas correntes, isto é, re- de carência, sendo as transferências universais mo-
alizamos um apanhado dos argumentos centrais de destas. Dessa forma, os benefícios, com raras exce-
cada teoria para possibilitar uma compreensão do ções, têm seu foco, sua destinação a uma clientela de
problema. baixa renda, formada, basicamente, por indivíduos
O motivo para se adotar tal postura é que da classe operária. O bem-estar público é mantido
qualquer teoria isolada não explica a totalidade dos em um nível mínimo, a fim de não se constituir em
problemas que envolvem o Welfare State. Tomemos, desestímulo à participação do cidadão no Mercado
como exemplo, o pensamento funcionalista que de Trabalho.
centra sua argumentação na constituição e desen-
volvimento da sociedade industrial, porém não faz Seus benefícios são freqüentemente estigmati-
qualquer menção ao pacto capital-trabalho realiza- zados, pois o Estado incentiva o Mercado a provir
do no pós-segunda guerra ou da necessidade que o e gerir o bem-estar, seja pelo fato de o Estado ga-
Estado possuía e possui de impedir rebeliões e insur- rantir, simplesmente, uma exígua provisão pública
reições por parte da população. direta ou pelo Mercado subsidiar mecanismos e po-
Para compreendermos o desenvolvimento do líticas privadas de bem-estar e de proteção social.
Estado de bem-estar utilizaremos a tipologia estabe- Assim, o grau de desmercadorização dos indivíduos
lecida por Esping-Andersen. Como afirma Aurélio resultante dessas políticas é muito baixo. Os direi-
(1998, p. 56) : “É certo que a tricotomia formulada tos sociais são limitados e o tipo de estratificação
por Esping-Andersen, embora não seja capaz de ofe- estabelecida é “um misto de uma relativa igualdade
mento neoliberal – e na sociedade efetuando uma nados grupos de indivíduos, como do proletariado.
reconstrução da vida cotidiana e das dependências O Estado teria respondido, nem sempre com a ra-
entre as classes e o próprio Estado, assim como a pidez necessária, à emergência dessas novas deman-
dependência interclasse. das. Não obstante, as origens dos programas sociais
Fica, contudo uma pergunta no ar. Quais são – saúde, educação, habitação, etc – deve ser visto a
os fatores que levaram ao desenvolvimento do Wel- partir da complexidade da divisão social do trabalho,
fare State? fruto do processo de industrialização que se iniciou
É perfeitamente possível agrupar os fatores que na Inglaterra no século XVIII. Como o processo de
levaram ao desenvolvimento das políticas estatais industrialização acarretou a especialização dos tra-
de bem-estar em dois blocos de argumentos. 1) os balhadores, os indivíduos foram se tornando, cada
argumentos referentes à constituição do Estado de vez mais, dependentes da sociedade. Nesse sentido,
bem-estar e, 2) Os argumentos que tratam da difu- os serviços sociais seriam a resposta às necessidades
são internacional do Welfare State. individuais ou coletivas, garantindo a sobrevivência
tanto da sociedade como do Capitalismo.
ARGUMENTOS REFERENTES À CONSTITUI- O terceiro argumento é que a provisão públi-
ÇÃO DO ESTADO DE BEM-ESTAR ca de bem-estar teria sua origem na necessidade de
Serão desenvolvimento onze argumentos para dissolver o conflito de classes inerente a mercantili-
explicar a constituição do Estado de bem-estar so- zação do trabalho. O conflito de classes nas socie-
cial. dades industriais, da maneira como foi apreendido
O primeiro argumento é a própria dinâmica por Marx, em O Capital (1996), teria sido substituí-
da Modernidade que levou as instituições tradicio- do por um tipo de conflito de classes que progressi-
nais como a família e a Igreja a perderem a capaci- vamente se institucionalizou, tendo se concentrado
dade de suprir as necessidades dos indivíduos mais nas questões distributivas mais do que naquelas re-
vulneráveis. Com isto, o Estado foi convocado a as- lativas à produção.
sumir a função de garantir determinados padrões O quarto argumento coloca como ponto cen-
mínimos de vida à população. Sobre esta questão tral a natureza competitiva da dinâmica político-
Rosanvallon (1981, p. 22), afirma: “O Estado-pro- partidária das democracias de massa, pois produziu
vidência exprime a idéia de substituir a incerteza da importantes transformações no universo político.
providência religiosa pela certeza da providência es- Esse processo alterou o radicalismo político. Essa al-
tatal”. teração se deu, por um lado, devido à competição
O segundo argumento é a lógica da industria- partidária que exige o fortalecimento da burocracia
lização. Argumenta-se que todas as nações indus- dos partidos e a maximização do apoio eleitoral, es-
trializadas – independente de suas especificidades sencial na busca de uma maioria parlamentar. Por
históricas, políticas e culturais – teriam convergi- outro lado, a ampliação do eleitorado dos partidos
do para determinados aspectos básicos, seguindo os de esquerda – e na Escandinávia da social-demo-
passos do processo evolutivo guiado pelo impacto cracia – tendo como conseqüência o aumento da
do desenvolvimento econômico e tecnológico so- representatividade do operariado, gerou maior he-
bre a estrutura do emprego de uma forma geral. O terogeneidade dos grupos de apoio às políticas de
processo de industrialização teria criado novas de- bem-estar e diminuiu, e em alguns momentos até
mandas de gasto público, uma vez que a família e quebrou, o forte corporativismo dos partidos bur-
as outras instituições tradicionais não podiam mais gueses. O fato de o operariado ter conseguido uma
exercer suas funções de bem-estar e o novo processo maior representação no Parlamento levou ao estabe-
produtivo provocara a marginalização de determi-
lecimento de acordos entre burgueses e proletariado necessários à expansão do setor monopolista são so-
visando à efetivação do Welfare State. cializados via Estado.
O quinto argumento vai dar conta da capa- O crescimento do setor monopolista tende a
cidade de revolta e insubordinação do proletariado. gerar, de um lado, um excedente de produtos, e,
Durante todo o século XIX e na primeira metade de outro lado, uma população excedente. Segundo
do XX o proletariado foi protagonista de grandes O´Connor (apud ARRETCHE, 1995), a população
revoltas no continente europeu. Revoltas essas que excedente no setor monopolista tende a ser absorvi-
provocaram grande prejuízo à burguesia, colocando da por empregos gerados pelo setor estatal e com-
em risco a taxa de lucro. Por esse motivo, o Estado petitivo, ao mesmo tempo em que a disponibilidade
providência é, desde sua origem, uma figura parti- de mão-de-obra tende a rebaixar os salários no inte-
cular da dominação social sobre as classes laboriosas. rior do setor competitivo, fazendo com que os traba-
Classes perigosas, cujos movimentos subversivos – lhadores desde setor sejam, gradualmente, cada vez
do ponto de vista burguês – estão sujeitos àquilo mais, pobres. Esse movimento implica o crescimen-
que Foucault , em Microfísica do poder (1979), classi- to das despesas sociais e do funcionalismo estatal,
ficou como sendo a normalização dos indivíduos ou porque, segundo O´Connor (apud ARRETCHE,
de medicalização, ou seja, as políticas de bem-estar 1995, p. 14) “tais operários [do setor monopolista]
têm a finalidade de disciplinar o operariado e, ao dependem cada vez mais do Estado para satisfazer
mesmo tempo, de leva-lo a colaborar voluntaria- suas necessidades”, que serão satisfeitas sob a forma
mente para o incremento da produção e do lucro de programas sociais – como a contratação de mais
dentro do Sistema Capitalista. funcionários públicos. Por sua vez, o problema do
O sexto argumento é a questão da acumula- excedente de produtos é solucionado pela expansão
ção de capital. Esta visão da crise é desenvolvida por do comércio e do investimento no exterior, inclu-
James O´Connor em seu livro USA: A crise do Esta- sive com o substancial aumento dos gastos milita-
do capitalista (apud ARRETCHE, 1995). Para ele o res. Esta evolução, segundo Rosanvallon (1981, p.
setor privado é o implusionador do crescimento da 22), “traduz, ao nível das representações do Estado,
economia. No interior do setor privado, o setor mo- o movimento no qual a sociedade deixa de se pensar
nopolista é o setor-chave. Entretanto, o setor mono- como um corpo para se conceber como um Merca-
polista não paga os custos do investimento social, do”.
ou seja, gastos necessários ao aumento da produ- O sétimo argumento é com relação à am-
ção. Custos esses necessários à sua expansão. O setor pliação da concepção de democracia. A democracia
monopolista, dado o incremento em produtividade, quando nasceu, na Atenas do século IV a.C., era um
tende a produzir mais produtos do que a capacida- privilégio de uma minoria formada pela aristocracia
de do Mercado para consumi-los. Do mesmo modo, agrária. Quando a democracia renasce com o adven-
este setor faz uso do emprego de tecnologias poupa- to da Revolução Francesa era um privilégio da elite
doras de mão-de-obra, ele tende a produzir formas burguesa. Porém, com o desenvolvimento da Revo-
progressivas de desemprego tecnológico e outras lução Industrial, o aperfeiçoamento da Sociedade
formas de desemprego, como a falência de pequenas Capitalista, da organização sindical, das lutas popu-
e médias empresas, que acompanham o crescimento lares, das pressões realizadas pelos socialistas e pelos
do Capitalismo. Logo, cria-se uma demanda social anarquistas; ela foi lentamente se expandindo. No
enorme e este gasto recai sobre o Estado. Uma vez início do século XIX só quem tinha direito a votar
que os recursos utilizados pelo Estado para custear eram os “homens bons”, isto é, os indivíduos do sexo
os investimentos sociais são arrecadados da popu- masculino e que possuíam uma situação financeira
lação, isto quer dizer que os investimentos sociais que os colocavam dentro do círculo composto pela
elite economicamente dominante. Com o passar do Com o advento da Modernidade e o lento proces-
tempo os direitos políticos, foram, lentamente, se so de formação das nações, o indivíduo passou a ter
universalizando. Tudo isso levou a um movimento um espaço mais amplo, o espaço público, onde ele
evolutivo dentro do campo dos direitos. Do direito pode discursar – fazer uso da palavra – e reivindi-
civil e jurídico – igualdade perante a lei – para o di- car melhores condições de vida. Neste ponto, cria-se
reito político e, finalmente, para o direito social. O um impasse: para quem o povo deve dirigir suas rei-
Welfare State seria a coroação desse movimento reali- vindicações? Visto que o senhor feudal perdeu seus
zado ao longo de mais de trezentos anos de lutas po- poderes, os reis tinham seus poderes enfraquecidos
pulares visando à conquista da plena emancipação. pelas guerras e pelos acordos políticos, a Igreja e os
O oitavo argumento é a questão das crises eco- demais organismos tradicionais tiveram seus poderes
nômicas dentro do Sistema Capitalista. O Capitalis- drasticamente reduzidos e o empreendedor – o capi-
mo tem como uma de suas características centrais talista do século XVIII e XIX – estava preocupado
o movimento cíclico: prosperidade X crise. Ele tem em auferir grandes lucros com a produção. O Estado
um período de crescimento produtivo e aumento na terminou sendo o único elemento disponível. Além
taxa de lucro e, logo em seguida, vem uma reces- do mais, ele era o único elemento capaz de unir os
são que coloca o lucro com uma propensão negativa. vários atores sociais (burguesia, proletariado, cam-
Este movimento vinha acontecendo até a década de pesinato, etc) em torno de interesses comuns como
1930, pois neste período houve a Grande Depres- levar ao pleno desenvolvimento os recursos de um
são, isto é, a maior crise vivida no Capitalismo até Mercado Nacional determinado e garantir a sobera-
aquele momento. Essa crise ameaçou levar a pro- nia nacional frente às investidas de outras nações.
dução e, por conseguinte, o lucro ao ponto zero. Se O décimo argumento é a lógica da burocra-
tal fato tivesse acontecido o Capitalismo Moderno cia estatal. A burocracia estatal tem dois objetivos
enquanto Sistema Econômico-Político estaria acaba- básicos. O primeiro objetivo é a expansão de sua
do. Para evitar e, ao mesmo tempo, prevenir futuras estrutura através da criação de novos cargos pú-
crises econômicas o Sistema Capitalista recorreu ao blicos, contratação de novos funcionários, presta-
Estado – justamente o que recomenda Keynes na ção de serviços os mais variados possíveis, que vão
Teoria geral do emprego, do juro e da moeda (1988) – en- desde o estabelecimento de uma força armada re-
quanto fonte financiadora das empresas em dificul- gular até os serviços básicos de saúde e educação.
dade. O Estado passou a ser uma empresa de porte O segundo objetivo é a melhoria do seu padrão de
capitalista para investir nas áreas onde o capital não vida. Essa melhoria se dá por meio de constantes
tinha recursos para adentrar e como mediador das aumentos de salários. Todavia, para que estes dois
crescentes reivindicações do Movimento Operário. mecanismos possam ter bom êxito é necessário que
Vale salientar que como mediador das reivindica- o Estado garanta as condições de ampliação do capi-
ções populares o Estado se comporta ora sendo uma tal, fundamentalmente porque a saúde financeira do
instância para garantir e efetivar direitos, ora como
guardião dos interesses dos empresários reprimindo,
Na Atenas do século IV a.C. também existia um espaço públi-
duramente, as manifestações do povo. co. A prova disto são os discursos de Sócrates – descritos por
O nono argumento é a constituição do Es- Platão em seus diálogos – na Agora (praça central) ateniense.
Todavia, Sócrates estava infringindo a legislação que reservava
tado-nação. Na Antigüidade passando pela Idade os discursos para a elite política. Este foi um dos motivos dele
Média o indivíduo não tinha uma pátria, no sentido ter sido condenado à morte. Na Modernidade há um processo,
lento e gradual, de conquista do espaço público pela população.
de espaço territorial, para viver. O máximo que ele Ao contrário de Atenas, a praça deixa de ser um espaço privado
possuía era um espaço privado, onde podia estabe- de uma certa classe social e passa a ser o campo, público, de
lecer relações com sua família, parentes e amigos. discussão dos problemas sociais realizados por todas as classes
e grupos sociais.
Estado depende do bom desempenho da economia. conferência de Bretton Woods. Nesta conferência
Faz parte do cálculo econômico da burocracia estatal foi criado o Fundo Monetário Internacional (FMI)
considerar que sua estabilidade e expansão depen- e o Banco Internacional de Reconstrução e De-
dem da manutenção do capital e também da presta- senvolvimento (BIRD). Ela realizou-se em New
ção de serviços de bem-estar social para a população. Hampshie, em 1945, nos Estados Unidos, no Hotel
Logo, na lógica da burocracia o Welfare State é um Monte Washington, em Bretton Woods. Os acordos
ente necessário para a manutenção do seu ethos so- estabelecidos possibilitaram, até a década de 1970
cial. Portanto, segundo Hayek (1983, p. 231) “os quando houve a grande crise do petróleo, a estabi-
burocratas se transformam nos principais represen- lização econômica dos países europeus e dos EUA e,
tantes do povo” para garantir a manutenção, e até a por conseguinte, do avanço das políticas de bem-es-
expansão, dos seus próprios privilégios de classe. tar. Pode-se sintetizar os aspectos fundamentais de
O décimo primeiro e último argumento é Bretton Woods em cinco itens.
a questão das guerras. A Revolução Russa de 1917, 1) O sistema de Bretton Woods proibia as ta-
as duas guerras mundiais bem como a depressão xas de câmbio flutuantes, expressava o valor das
econômica, a qual ocorreu no período entre ambas. moedas em ouro e, simultaneamente, em relação ao
Esses fatos históricos vieram a acelerar a evolução dólar, comprometia-se a manter a conversibilidade
lógica do sistema de bem-estar social, pois criaram do dólar em ouro.
um sentimento – tanto a nível nacional como a nível
do continente, neste caso a Europa – de solidarie- 2) Os Estados Unidos constituíam a única uni-
dade propício ao desenvolvimento de programas de dade política que conservava a liberdade de não ado-
proteção social. tar medidas restritivas em caso de déficit da balança
A Sociedade Européia ficou com medo de haver de pagamentos externos.
uma terceira guerra mundial causada pelo desem- 3) No caso dos Estados Unidos, como os dóla-
prego e pelo caos provocado pelas péssimas condi- res eram identificados com as reservas, o déficit da
ções de vida da população. Outro medo que reinava balança de pagamentos externos colocava à dispo-
na Europa era o do triunfo dos socialistas no leste sição dos bancos centrais – em particular da antiga
europeu, triunfo este que inicialmente esteve liga- República Feral Alemã (RFA) e do Japão – divisas
do, apenas, à Rússia, mas estendeu-se para vários excedentes que eles investiam no bônus do tesou-
países do leste como Polônia e Hungria. E depois ro americano. Assim, o déficit dos pagamentos não
se espalhou por outros continentes como a Ásia, a exercia influência alguma para neutralizar as causas
Revolução Chinesa, e a América Latina, a Revolu- do déficit.
ção Cubana. Então, para afastar o perigo de uma
4) Todos os países comprometiam-se a manter
terceira guerra mundial e do avanço crescente do
as suas moedas estáveis, sujeitas a uma pequena flu-
Socialismo o Estado, nos países europeus, foi inti-
tuação de 1%, em relação às dos demais. Se a moeda
mado a acelerar o estabelecimento das políticas de
de um país começasse a cair sob a pressão de impor-
bem-estar social.
tações excessivas e pequeno volume de exportações,
ARGUMENTOS QUE TRATAM DA DIFUSÃO IN- o seu banco central compraria essa moeda e apoiaria
TERNACIONAL DO ESTADO DE BEM-ESTAR o seu valor em relação às moedas dos outros países.
Caso as reservas do Banco Central, em termos de
Serão desenvolvidos nove argumentos para expli- moedas aceitáveis aos outros países não permitissem
car a difusão internacional do Estado de bem-estar. tais compras, o país poderia recorrer ao FMI para
O primeiro argumento é o Novo Sistema obter ouro, dólares, ou outras moedas aceitáveis a
Monetário, o qual foi acionado com os acordos da
fim de manter o programa de sustentação. Ao fazer per este equilíbrio e assegurar o ressurgimento do
isto, depositaria um montante equivalente de sua pleno emprego”.
própria moeda como garantia. Ao bancar a reconstrução da Europa e o de-
5) O valor máximo que poderia ser empresta- senvolvimento de países da América Latina, como
do por um país junto ao FMI, estava limitado à sua o Brasil, México e Argentina, os EUA estavam ban-
quota (equivalente ao montante de sua contribui- cando, indiretamente, seu próprio desenvolvimen-
ção ao fundo). Uma escala de recursos crescentes to, pois estimulou a sua indústria a crescer, rompeu
com o montante, bem como a duração do emprés- com as altas taxas de desemprego e estabeleceu uma
timo, eram fatores que estimulam o país a eliminar política de pleno emprego alicerçada por medidas de
as circunstâncias que o conduziram á necessidade bem-estar. Para Galbraith (1989), os americanos vi-
de empréstimo pelo FMI quanto à conveniência de veram os trinta anos gloriosos (1944-1974) ou anos
tais medidas. As missões do FMI adquiriram, assim, de ouro, graças aos lucros auferidos com a Segunda
uma grande reputação no panorama internacional. Guerra e o financiamento do Welfare State no conti-
As políticas do FMI – que surgiram para estimu- nente europeu.
lar o crescimento de economias em crise, como, por O terceiro argumento é a Guerra Fria. Esta
exemplo, as do Brasil e Argentina – terminaram se guerra desenvolveu-se entre o Bloco de Países Ca-
transformando em um mecanismo para impedir o pitalista (EUA, Inglaterra, França etc) e o Bloco de
desenvolvimento dessas economias e perpetuar a Paises Socialista (Rússia, Polônia, Cuba etc). Não
submissão às potências capitalistas como, por exem- nos cabe realizar uma análise profunda desse acon-
plo, os EUA e a Inglaterra. tecimento histórico, todavia, de um lado, ele cons-
tituiu num movimento ideológico e militar para
O segundo argumento é o Plano Marshall que conquistar posições estratégicas em todo o planeta.
os americanos implementaram logo após a Segunda Um bom exemplo de como a Guerra Fria difundiu o
Guerra Mundial com a finalidade de sustentar a re- Estado de bem-estar é a guerra da Coréia em 1950,
construção das economias capitalistas européias. Se- justamente no momento em que o Plano Marshall
gundo Galbraith (1989), os EUA pouparam mais de estava sendo desativado. Esta guerra proporcionou
250 bilhões de dólares durante o período de 1939- aos Estados Unidos uma nova modernização no par-
1945. Os americanos foram os grandes vencedores que industrial, além de dar um ânimo às políticas de
da Segunda Guerra Mundial, pois reconstruíram a pleno emprego – o que Navarro (1991) conceitua
sua economia que estava debilitada devido à Gran- de “keynesianismo militar”. Por outro lado, os ame-
de Depressão de 1929, pouparam uma gigantesca ricanos auxiliaram no desenvolvimento do parque
soma em dinheiro que possibilitou o financiamento industrial do Japão, inicialmente por meio da indús-
da Guerra Fria e do Imperialismo na América La- tria bélica, para evitar que esse país aderisse ao Blo-
tina e na África. E, por último, a guerra destruiu co Socialista. Outro exemplo, entre tantos, que deve
as potências européias, Inglaterra, França, Itália e ser mencionado é a guerra do Vietnã. Esta guerra
Alemanha, que rivalizavam com os americanos. Eles proporcionou a continuação do crescimento da in-
implementaram o Pump Priming – gastos do Gover- dústria americana, entretanto quando o litígio foi
no Federal, cujo único objetivo era estimular a eco- encerrado em 1972 com a derrota americana, foram
nomia – a partir dos bilhões de dólares acumulados implementadas políticas para desenvolver aquela re-
durante o litígio. Para Galbraith (1989, p. 227): “O gião da Ásia e impedir o crescente avanço do Socia-
pressuposto passara a ser um equilíbrio de desem- lismo. Neste ponto, é que surgem as políticas que
prego, a intenção e obrigação do governo a ser rom- possibilitaram o crescimento econômico dos tigres
asiáticos como Singapura, Malásia e Taiwan.
O quarto argumento é o neocolonialismo ocorreu um acordo entre aquelas duas classes funda-
estabelecido após a Segunda Guerra. Este pressu- mentais, e a classe trabalhadora, como conseqüên-
punha uma dependência constante dos produtos in- cia, incorporou-se aos benefícios de bem-estar social
dustrializados do centro do Capitalismo e, ao mesmo capitalista.
tempo, a disponibilidade de matérias-primas a baixo O sexto argumento é a necessidade, cada vez
custo. Isto possibilitou o incremento de políticas de mais crescente, de “socializar” os custos da produção
pleno emprego na Europa e na América do Norte, e de abaixar os custos de reprodução da força de tra-
pois a indústria dessas regiões crescia à medida que balho. Para que a população possa usufruir os bens
os países capitalistas exportavam seus produtos para produzidos pela indústria se faz necessário que esta
a África, Ásia e a América Latina. tenha condições para tanto. O Estado ao investir nos
O quinto argumento é o pacto capital e tra- serviços básicos, como saúde e educação, libera os
balho. No caso específico das políticas de bem-es- rendimentos da população para consumir os pro-
tar, isto implicou a coincidência de interesses entre dutos industrializados e evita ou afasta o perigo de
capital e trabalho, ainda que por diferentes razões. uma Revolução Socialista ou outra modalidade de
Ou seja, nos períodos de inovação e crescimento contestação do Sistema Capitalista. Além do mais,
das políticas sociais, ambas as classes fundamentais a taxa de lucro precisa ser mantida em equilíbrio,
– que naquele momento histórico eram a burguesia portanto quando o Estado investe em políticas de
e o proletariado – viam tais políticas como sendo bem-estar está poupando os recursos financeiros do
de seu interesse. A classe trabalhadora aderiu ba- capital e, por conseguinte, contribuindo para a ma-
seada no pressuposto de que qualquer política que nutenção da taxa de lucro.
atenue as dificuldades e modifique o jogo cego das O sétimo argumento é a cultura de massa.
forças de mercado é bem-vinda. A classe capitalis- Com o fim do período das grandes guerras (1914-
ta, porque isto reduz o descontentamento da classe 1945) e com a implantação de políticas de bem-
trabalhadora, provê novas modalidades de integra- estar, a população européia voltou a crescer. Além
ção e controle sobre esta classe, regula os salários, disso, no século XX, o Capitalismo se espalhou ra-
pois o Estado interventor impede que eles cresçam pidamente por regiões ainda inexploradas, como a
demasiadamente ameaçando a taxa de lucro e, por América Latina, um continente que até o início des-
último, oferece ainda benefícios ideológicos e econô- te século era predominantemente agrário, em busca
micos como um operário mais disposto para o traba- de novos mercados consumidores e de matérias-pri-
lho e mais qualificado para exercer sua função. mas mais baratas. Todo este movimento do capital
Em outros termos, em uma conjuntura polí- fez emergir multidões ávidas pelos produtos indus-
tico-ideológica específica, o pós-segunda guerra, a trializados, porém com grande potencial revolucio-
capacidade de pressão dos movimentos sociais, for- nário. Eram, e ainda são, multidões de pobres em
talecida pelo crescimento econômico, e a escassez busca de melhores condições de vida e que poderiam
de mão-de-obra na Europa, criou uma consciência acabar com o sonho de consumo dos americanos e
de classe entre os capitalistas, implicando a refor- europeus. A solução foi implementar, na periferia do
mulação do Estado. Reformulação esta que explica Sistema, as políticas de bem-estar e desenvolver, em
a emergência de um Estado com face social. Ainda todo o mundo, a Indústria Cultural – rádio, disco-
que o caráter contraditório das relações entre capital grafia, cinema, TV e as novas formas de construir a
e trabalho, no Capitalismo, implique que a harmo- arte – que gerou milhões de empregos e contribuiu,
nia aparente de interesses se rompa rapidamente – o segundo Cotrim (2000, p. 226), para “o processo de
que de fato aconteceu na década de 1970. É ine- narcotização da consciência das massas”. Com esse
gável o fato de que, no período entre 1945-1970, processo de narcotização a Cultura de Massa ganha
impulso e o Welfare State recebe mais uma missão: a Banco Central e o papel-moeda, em todos os países
de ser o instrumento de narcotização das multidões capitalistas. Instrumentos indispensáveis para con-
alienadas e empobrecidas do Terceiro Mundo. centrar nas mãos dos governos a direção dos capitais
O oitavo argumento é a crise da superpro- necessários para sustentar os investimentos e para
dução. Em 1929 manifestou-se uma forma de crise regular o ciclo econômico. A partir desse instante,
– a Grande Depressão – que não só teve uma difu- desenvolveram-se os gastos públicos, os aparelhos
são simultânea em quase todos os países capitalistas de reprodução, políticas de pleno emprego, enfim o
desenvolvidos, como também se apresentou como consumo individual e social.
uma crise de superprodução e de subconsumo. Em- Na década de 1970 houve a grande crise do
bora durante a crise se produzisse uma extraordiná- petróleo que levou a Europa, os Estados Unidos e
ria concentração de capital, como bem recomenda o outras áreas do planeta a viverem uma recessão.
pensamento econômico neoclássico, e se deu um po- Esta recessão foi causada pelo aumento de preço do
deroso salto tecnológico, além do desemprego difuso petróleo pela Organização dos Países Exportadores
que criava uma enorme disponibilidade de mão-de- de Petróleo (OPEP). Estes países – na sua grande
obra barata, os mecanismos de mercado, enquanto maioria árabes – queriam aumentar o seu Produ-
tais, não eram suficientes para a retomada dos in- to Interno Bruto (PIB) e, dessa forma, desfrutar do
vestimentos e da produção. A depressão é superada bem-estar dos países do centro do capitalismo. Vale
com a chegada da Segunda Guerra Mundial – pelo salientar que não vamos discutir a influência na cri-
menos nos EUA, pois na Europa só com o fim desta se do petróleo das guerras entre palestinos e israe-
guerra – entretanto, ficou o medo que tais aconte- lenses no Oriente Médio. Entretanto, o aumento do
cimentos viessem a acontecer novamente colocan- petróleo levou os países europeus e os EUA a com-
do em cheque a própria sobrevivência do Sistema prometerem o orçamento nacional com políticas de
Capitalista. Para que isto não voltasse a acontecer, reformulação de suas economias. Esta postura levou
o Estado de bem-estar foi estimulado a crescer por ao comprometimento de uma substancial parcela do
meio da ampliação do número de pessoas atendidas orçamento. A conseqüência disso foi uma crise fis-
por seus programas (saúde, educação, moradia etc) cal que colocou todas as políticas de bem-estar em
e, dessa forma, absorver grande parte da produção decadência. A explicação para a crise do Welfare Sta-
das indústrias. te parece muito simples: foi a crise do petróleo que
O nono e último argumento é o estímulo ao provocou este fato, afirmam os jornalistas nos tele-
consumo. Com o desenvolvimento da produção em jornais em horário nobre. Todavia, existem outros
massa, com a expansão do capital para o Terceiro mecanismos que precisam ser analisados.
Mundo e com o crescente papel dos grandes oligo-
pólios, a acumulação do capital dependia, cada vez FATORES QUE LEVARAM À CRISE DO ESTADO
menos, da possibilidade de atrair a população entre DE BEM-ESTAR
os investimentos e cada vez mais da possibilidade de Segundo Vacca (1991, p. 154), na década de
sustentar os investimentos mediante a expansão do 1970 manifestaram-se “formas de crise que parecem
consumo. Para a produção em série já existia, nas específicas do Estado de bem-estar”. Vamos apre-
grandes indústrias, durante a primeira metade do sentar estas “formas”, descritas por Vacca, em dez
século XX, a organização taylorista do trabalho, po- fatores.
rém não havia ainda uma organização da sociedade O primeiro fator é a crise fiscal, esta é muito
capaz de difundir o consumo. Para este fim foi amol- propagada pela Mídia (TV, rádio, jornal etc). O fato
dada a máquina do Estado. As suas funções se es- é que dentro das estruturas do Estado de bem-estar
tenderam. A conseqüência disso foi o nascimento do o primeiro gerador, visível, de crise é a estratifica-
ção social. A extensão do trabalho dependente torna reúnem camadas intermediárias, corporativas e pro-
árduo comprimir os salários e isolar socialmente a tegidas, essenciais ao sistema de alianças do capital
classe trabalhadora. A conseqüência disso é que nas monopolista, e que por tal motivo obtém do Estado
relações entre salário e lucro desenvolvem-se tensões fluxos de recursos a vários títulos como, por exem-
e conflitos crescentes. As conquistas sociais dos tra- plo, maior facilidade de obtenção de crédito, isenção
balhadores não podem ser facilmente suprimidas e fiscal e transferência de renda. Todos esses arranjos
disto resulta uma crescente inflação de custos e um de classes contribuem apenas para agravar a crise
enrijecimento das bases fiscais do Estado. Ele tem, fiscal do Estado de bem-estar.
cada vez mais, de custear o preço da exclusão social, O terceiro fator é a crise de governabilidade
provocada, em grande parte, pelo crescimento dos que atinge as democracias. Há um forte redimen-
monopólios, e da incapacidade que o empresariado sionamento da soberania territorial. Esse redimen-
possui de bancar políticas de contenção da miséria. sionamento se dá pela crescente internacionalização
Somado a isto, existe o paternalismo e o clientelismo do capital e dos mercados, a invasão dos oligopólios,
dos governantes preocupados em se reeleger ou ele- a interdependência, cada vez maior, das economias
ger algum representante do seu Sistema Político, a ocidentais, promovem novas desigualdades entre
contratação sem critérios de funcionários públicos, a os próprios países capitalistas desenvolvidos e de-
corrupção dentro do Sistema de Arrecadação (fisco), terminam novas formas de dependência dos países
o superfaturamento de obras e os desvios de verbas. menos fortes em relação aos países sede do capital.
Com todos estes problemas, nasce uma crescente di- A manutenção do dólar como regulador do comér-
ficuldade de financiar a demanda, sempre mais difu- cio internacional – o que só beneficia os monopólios
sa, de serviços e de gastos públicos de caráter social. e os bancos que emprestam dinheiro aos países do
As arrecadações estatais se enrijecem, e além de um Terceiro Mundo – o peso crescente dos balanços de
certo limite não podem se multiplicar sem colocar pagamentos no desenvolvimento dos diferentes paí-
em risco a própria existência do Capitalismo. ses e as conseqüências que emergem da nova divisão
O segundo fator é a composição de classes internacional do trabalho que impõem novos víncu-
do Capitalismo Tardio, o Capitalismo da segunda los à relativa e estreita autonomia dos Estados e dos
metade do século XX. Esta composição alimenta mercados nacionais.
tensões contraditórias. De um lado, favorece o con- Todo este movimento leva a duas conseqüências.
sumo afluente de todo tipo de quinquilharia, para A primeira conseqüência é a crise da demo-
satisfazer as exigências de modernização da indús- cracia. Há um rompimento da unidade temporal
tria e dos grupos mais privilegiados em favor de e espacial entre a economia e a política que afeta,
um gasto social improdutivo. Por outro lado, para diretamente, o funcionamento da democracia. Nas
vir de encontro às necessidades elementares das ca- fases iniciais do Capitalismo, a democracia liberal
madas marginais, que são cada vez mais numerosas emergia como uma das mais relevantes expressões
– trabalhadores desempregados, jovens à procu- políticas do Capitalismo Nacional. Num segundo
ra do primeiro emprego, trabalhadores ocasionais, momento, na fase fordista, as lutas dos movimen-
emigrantes, mulheres expulsas do mercado de tra- tos sociais e políticos, e a expansão das forças pro-
balho, idosos, etc – devido ao aumento vertiginoso dutivas convergiram para a criação de uma forma
da população no século XX e das novas técnicas de de democracia mais inclusiva e participativa. Apesar
produção que dispensam mão-de-obra. Além disso, das contradições e de muitos abusos, os princípios
crescem os gastos públicos para sustentar os mé- democráticos tornaram-se presença obrigatória nas
dios e pequenos agricultores, empresas artesanais, sociedades avançadas. Entretanto, atualmente, ve-
pequenas empresas, os subsídios aos alimentos, que mos uma rápida e drástica mudança.
Por causa do aumento da incapacidade do Estado ência direta disso é um processo de erosão da sobe-
de controlar o ambiente econômico e o não-eco- rania do Estado-nação, daqueles países que não são
nômico, sob o pós-Fordismo global as ordens [di-
os protagonistas da globalização, afetando a cida-
reções] que o Estado recebe de seus cidadãos não
podem ser totalmente implementadas conforme dania em suas várias formas. Enquanto as decisões
está previsto na moderna teoria da democracia. O que irão afetar a vida do cidadão são tomadas por
fracionamento da unidade temporal-espacial entre entidades internacionais, como o Clube de Roma, o
a política e a economia, portanto significa uma cri- FMI, o Banco Mundial, o Senado Americano, o Par-
se de representação política. O Estado está aumen-
lamento Europeu e outros, o governo central, des-
tando sua incapacidade de representar os desejos
dos seus cidadãos (BONANO, 1999, p. 65). ses países, vê seu papel profundamente alterado pela
própria aceleração das transformações econômicas e
A conseqüência direta dessa incapacidade é a sociais. Este fato conduz à deformação da racionali-
rejeição do Estado de bem-estar e a mudança de dade política – já não é mais necessário se investir na
suas preocupações básicas. O Estado de bem-estar ciência, mas na recuperação de bancos falidos – e da
é substituído pelo Estado “segurança”, o qual dá as degradação das políticas sociais.
costas para a periferia mergulhada na miséria e nas A segunda conseqüência é a crise da represen-
drogas. Tal fato pode ser percebido com facilidade tatividade dos partidos políticos. No interior dos Es-
pelas atuais preocupações do Estado, as quais são: tados, o crescente desenvolvimento da função dos
garantir aos investidores altos lucros na ciranda fi- partidos e o peso crescente das organizações de in-
nanceira, recuperar bancos falidos ou oferecer aos teresse contribuem para esvaziar as instituições de
oligopólios que se internacionalizaram a “cesta bá- representação. Nas democracias européias o Sistema
sica”, ou seja, isenção de impostos, terrenos doados Parlamentar coincide substancialmente com o sis-
pela União (Governo Federal), tarifas subsidiadas de tema dos partidos. Estes – para poderem ter peso
água, luz e telefone. no Mercado Eleitoral – tendem a penetrar, cada vez
Outro fator desta crise é a globalização. Ela é mais, nos órgãos do Estado e em suas células eco-
antidemocrática porque é hierarquizada, uma es- nômicas.
trutura vertical. Navegam com confiança na aldeia Por força desses processos se dilui a unidade da
global cerca de 500 a 600 grandes empresas que se burocracia. Os órgãos da administração pública e
internacionalizaram, as quais comandam 25% das do Estado são transformados em feudos dos parti-
atividades econômicas mundiais e controlam de 80 dos políticos. Vem daí uma crise sempre maior da
a 90% das inovações tecnológicas. Estas empresas burocracia: esgota-se a aparente neutralidade dos
pertencem aos Estados Unidos, Japão, Alemanha, órgãos e das técnicas administrativas, que consti-
Grã-Bretanha e aos demais países do G-7. Consti- tuía um elemento essencial da motivação, unidade e
tuindo-se um poderoso instrumento de elitização da identidade dos corpos burocráticos. A perda de ho-
economia mundial. mogeneidade incentiva os conflitos políticos no seu
Nessa elitização da economia, a democracia é interior. Perde-se, gradativamente, a noção do servi-
acusada de criar barreiras que impedem o fluxo e o dor da coletividade (servidor público) e a expectati-
crescimento dos capitais, pois ela é “problemática e va de comportamentos homogêneos e leais por parte
perigosamente ingovernável” (LAURELL, 1997, p. dos funcionários.
83), logo a democracia é desnecessária. A conseqü- Todo este movimento acarreta conseqüências
para os próprios partidos. Eles estendem o seu domí-
Segundo o ideário neoliberal a democracia, em si mesma, não
é um valor central. A liberdade e a democracia podem “facil-
mente tornar-se incompatíveis, se a maioria democrática deci-
disse interferir com os direitos incondicionais de cada agente quisesse” (ANDERSON, 1995a, p. 20). Entre a democracia e a
econômico de dispor de sua renda e de sua propriedade como economia, o neoliberalismo fica com a economia.
nio sobre os órgãos públicos e estatais, porém mos- existe o ouro de Moscou para financiá-los – no leste
tram-se cada vez mais incapazes de conferir unidade europeu e a ascensão dos partidos verdes, que atra-
de objetivos e funcionalidade aos órgãos do Estado. em militantes tanto das causas ecológicas como de
Em sociedades complexas, como os EUA, a Inglater- outros setores sociais.
ra e a Alemanha, as decisões fundamentais, referen- Todo este movimento leva ao Welfare State a fi-
tes ao desenvolvimento, à produção, ao consumo, à car distante da população e, com isso, adentrar em
informação e outros, provém, em escala crescente, uma crise profunda.
dos vértices dos grandes aparelhos, os quais tendem O quarto fator de crise é a internacionalização
a se tornarem autônomos. Atingidos por conflitos do intelecto científico. Uma das formas do Estado
de poder cada vez mais acirrados, esses aparelhos bancar políticas de bem-estar encontra-se no incen-
decidem a não precisarem da orientação partidária. tivo e no patrocínio da pesquisa científica. E tam-
Continuidade e mudanças são determinadas sempre bém a partir da centralização do intelecto científico
mais por linhas internas, na base de conflitos de inte- dentro do espaço nacional e sua transformação em
resses, de culturas e de competências que percorrem potência política que o Capitalismo se consolidou,
os aparelhos do Estado. Os partidos se encontram a partir do século XVIII, e pode expandir-se como
envolvidos nesse movimento como membros, indi- uma verdadeira formação mundial graças à assimi-
retos, das estruturas tecno-administrativas e como lação das ciências pelo capital. Fundamentalmente,
mediadores entre os objetivos elaborados por elas e foi essencial a presença do Estado na formação e no
as reivindicações da própria base eleitoral. desenvolvimento do espírito científico. Entretanto,
Na crise dos partidos é preciso frisar que não na segunda metade do século XX verificou-se um
existem mais os partidos de classe estruturados, isto declínio acentuado do Estado na formação e con-
é, os partidos burgueses e os partidos do proleta- trole da inteligência científica. Resumidamente, há
riado. Quanto aos primeiros, a crise de representa- quatro motivos para isto acontecer.
ção se manifesta, sobretudo como impossibilidade O primeiro motivo para tal fato acontecer
de unificar sob a égide do próprio partido os setores são as características intrínsecas da própria ciência
fundamentais das classes economicamente domi- – metodologia, surgimento de novas teorias, novas
nantes e o seu conjunto de alianças. Nos diferentes tecnologias etc – que a conduz a se organizar em
países, os processos de internacionalização envolvem círculos cada vez mais transnacionais. O segundo é
segmentos cada vez maiores da burguesia e tornam a dinâmica dos monopólios que criam seus laborató-
difícil uma função unitária e nacional das classes rios, na maioria das vezes mais bem aparelhados do
dominantes, segundo os moldes e as figuras tradi- que os laboratórios estatais, pagam altos salários aos
cionais. Pelo contrário, percebe-se claramente a sua cientistas e não estão ligados ao espaço territorial de
crescente segmentação e concorrência ao recorrerem uma nação. O terceiro é a própria crise fiscal do Es-
a parceiros internacionais mais fortes para garantir tado que, conseqüentemente, sucateia os laborató-
o seu apoio em troca da imediata, e sempre maior, rios, promove um achatamento salarial e privatiza,
dependência do seu próprio país. em muitos casos, as estruturas científicas. O quarto
Quanto aos partidos trabalhistas e socialis- e último motivo é a crise ética vivida pela ciência em
tas, o elemento fundamental da sua crise vem da nossos dias, pois o que mais preocupa a comunida-
insuficiente capacidade de dominar ou amenizar as
transformações capitalistas no âmbito mundial e de A expressão “ouro de Moscou” faz referência ao financiamen-
to que a extinta União Soviética e seus aliados realizavam
responder-lhes com um programa de propostas na- para que os grupos e partidos de esquerda se organizassem na
cionais e internacionais. Outro elemento da crise dos América Latina e em outros continentes para lutar tanto pela
partidos é a derrocada do Bloco socialista – já não implantação do Socialismo como por melhorias na condição de
vida da população.
de científica internacional são os ganhos financeiros O sexto fator é a crise do Estado-nação. Po-
e não a solução de conflitos humanos. A ciência é demos claramente perceber que há uma ruptura no
regida, atualmente, pelo princípio maquiavélico de acordo entre o Estado-nação e as burguesias nacio-
que o importante são os fins e não os meios (méto- nais. Em primeiro lugar porque uma parcela des-
dos). Neste caso, o fim é o lucro advindo de alguma sa burguesia se internacionalizou e, segundo Lasch
descoberta científica. Expressões como: “cidadania”, (1995, p. 38), “já não aceita mais o lugar comum
“verdade”, “bem-estar social”, estão sendo banidas do espaço nacional”, vendo os “países apenas como
do receituário científico. municipalidade” (FORRESTER, 1997, p. 27). Em
O quinto fator de crise é o extraordinário de- segundo lugar, porque a parcela da burguesia que
senvolvimento das formas e dos meios de comuni- não conseguiu se internacionalizar – por fatores di-
cação. Os veículos de comunicação se integram em versos, como: sucateamento do parque industrial,
um inédito Sistema Planetário, caracterizado por falta de acesso à tecnologia de ponta, perda da con-
desequilíbrios e conflitos crescentes. Eles são, segun- corrência para os oligopólios, etc – tenta se adaptar
do Vacca (1991, p. 159),“o acelerador mais potente à nova ordem estabelecida. Uma das formas de tal
dos processos de unificação e internacionalização dos fato acontecer é negar o espaço nacional, como vem
intercâmbios e completa as polaridades que confi- acontecendo. Afirmam-se espaços como do Mercosul
guram o conjunto de modalidades do desenvolvi- e da União Européia, quando a maioria dos empresá-
mento desigual”. A crescente oferta de informação, rios não tem acesso nem ao Mercosul e nem à União
proveniente do desenvolvimento de uma rede mun- Européia. Fala-se em negócios transnacionais, ou
dial dominada por grandes oligopólios, constitui um vive-se, intensamente, o delírio das bolsas de valores.
dos fatores desagregadores da autonomia dos Esta- Portanto, é preciso ter a consciência de que “sobre o
dos. A informação se transformou no mais recente pano de fundo de todos os processos [...] destaca-se o
produto de consumo oferecido pela indústria, neste fim da economia nacional” (VACCA, 1991, p. 160).
caso a Indústria da Mídia, e também na mais eficaz Tradicionalmente o papel histórico do Estado-
forma de narcotizar a consciência tanto do operaria- nação, é:
do como do resto da população. A Mídia substitui a 1) Aumentar o processo de acumulação de capital;
religião no processo de controle da mente e de legi-
timação da exclusão social. 2) Legitimar a acumulação para aqueles seg-
A Indústria da Mídia se caracteriza por uma mentos da sociedade nacional que não eram bene-
espantosa vitalidade e capacidade de expansão da ficiados pelo Estado. O problema é que, em nossos
forma mercadoria, e pela inédita capacidade de pe- dias, esses dois fatores podem ser postos em práti-
netrar em âmbitos da vida cotidiana e privada do ca sem a participação do Estado. Os grandes oligo-
cidadão, até então subtraídos pela reprodução capi- pólios acumulam capital sem precisar da figura do
talista. O universo privado vai rapidamente desapa- Estado-nação e a burguesia, que não conseguiu se
recendo e, em seu lugar, surge a grande alucinação internacionalizar, vê no mesmo um obstáculo para
da audiência televisiva e dos modismos. Neste con- que tal fim se realize.
texto, o Estado não consegue captar as reais neces- Qual é a conseqüência desse movimento? A pri-
sidades do indivíduo porque tudo se transformou meira conseqüência é que, segundo Bonano (1999,
em mercadoria e o bem-estar social passou a ser um p. 60), uma “releitura completa do período de cres-
sonho distante. O bem-estar passa a ser visto como cimento do pós-segunda guerra nos dá a sensação de
desnecessário, pois o que preenche a existência são que as estruturas de acumulação fracassaram e que
os programas apresentados na Mídia. as políticas sociais precisam ser modificadas”.
A conclusão a que se chega, desses cinco itens, que são demandadas por outros atores sociais: go-
é que não há espaço para a tão badalada democracia vernos, trabalhadores, movimentos sociais, pacifis-
comercial entre todos os países e a conseqüente me- tas, organizações não-governamentais e outros. Em
lhoria do padrão de vida das populações marginali- síntese, as grandes corporações estão fugindo de
zadas de regiões como o Leste Europeu, a América suas responsabilidades sociais, com seus emprega-
Latina e a África. dos e com toda a sociedade. Uma das conseqüências
Outro argumento favorável a globalização são dessa fuga ou simplesmente da “ideologia da mobi-
as estruturas flexíveis, as quais nascem da privatiza- lidade” (BONANO, 1999, p. 58) é o desemprego
ção de empresas públicas, da reestruturação geren- em massa, justamente o contrário do discurso oficial
cial das empresas, do lançamento de novos produtos da globalização, e o agravamento da crise do Welfare
no mercado de consumo e de novas formas e con- State, pois com a queda crescente do índice de em-
dições de trabalho. O problema é que essa flexibi- pregabilidade o Estado arrecada menos impostos e
lidade é ilusória. Por exemplo, para se ter aceso às as políticas sociais, geridas por ele, são cada vez mais
empresas públicas privatizadas depende-se da capa- prejudicadas.
cidade de pagamento – e multidões foram alijadas O oitavo fator de crise é a ideologia. A questão
da prestação de serviços essenciais por não disporem ideológica do Welfare State é de suma importância,
de recursos financeiros – ou do lucro geral. Para Bo- pois existe uma redução das margens de manobra
nano (1999, p. 53), dos diferentes compromissos institucionais, dificul-
dades maiores no seio do movimento operário e nas
As novas estruturas flexíveis prestam-se à racio-
nalização financeira, á concentração de recursos, à políticas interclassistas. Encontra-se em jogo a es-
ultrapassagem de obstáculos, á alocação mais efi- trutura de organização das relações sociais, geradas
ciente das formas de produção, à proteção contra com o pós-segunda guerra, e que resultaram no Es-
possíveis mudanças econômicas e à obtenção de tado de bem-estar. Os antigos equilíbrios entre Es-
mais vantagem através de novos instrumentos fi-
tado e economia de mercado, entre acumulação e
nanceiros e fiscais.
consenso político, se decompõem. As limitações im-
As estruturas flexíveis concentram tanto poder, postas pela crise das políticas do Welfare State levam
como recursos financeiros, nas mãos dos oligopólios ao abandono dos compromissos econômicos e políti-
que se globalizaram na segunda metade do século cos que regulavam o seu funcionamento. Os confli-
XX. Entretanto, cria-se, por meio do constante dis- tos gerados, no próprio movimento operário, põem
curso da globalização, a ilusão que tais estruturas em jogo a sua forma de organização sindical e a sua
são universalizadas e democráticas, porém, segundo inadequação para incorporar, no seu campo de lu-
Dowbor (1995, p. 4), o que realmente existe de uni- tas, os novos movimentos sociais emergentes – gru-
versal e democrático nestas estruturas é o próprio pos ecológicos, movimentos feministas, anti-racista,
“discurso de que tudo se globalizou”. religiosos, os regionalismos, pacifistas, homossexu-
É importante ressaltar a capacidade que os ais, sem-terra, sem-teto, negros, índios, moradores
grupos empresariais adquiriram de movimentar de rua, juventude e menores abandonados, terceira
suas estruturas produtivas. As corporações mudam idade, imigrados, trabalhadores sem sindicato, pro-
suas plantas e seus ativos ao redor do mundo com fissionais do sexo, etc. Tudo isso causa uma crise da
o real objetivo de obterem condições de produção gestão política na sociedade.
mais desejáveis e evitarem limitações e restrições Outra parte fundamental da questão ideológi-
ca é que o padrão de crescimento econômico não se
limitou aos espaços nacionais do centro do Sistema
Nos referimos a “privatização” em sentido geral e não com rela- Capitalista. Houve uma integração de toda a peri-
ção a um país especialmente como, por exemplo, o Brasil.
feria capitalista por meio da internacionalização do Latina, Ásia e da África, os países do chamado Ter-
capital, da formação de um sistema de monopólios, ceiro Mundo. Por meio da cobrança de juros e taxas
dos avanços tecnológicos e do aperfeiçoamento da adicionais os EUA e os países capitalistas avançados
Sociedade de Massa. Essa integração gerou um du- da Europa, como, por exemplo, a Inglaterra, França
alismo sem precedentes – um crescimento rápido e e Alemanha, montaram um fundo para recompor
uma redistribuição da riqueza extremamente desi- suas economias em tempos de crise e de estimulá-las
gual. Desse modo, a crise do Welfare State pode ser quando esta passar.
atribuída a sua própria incapacidade de responder A dívida externa atinge diretamente as políti-
aos novos requisitos da sociedade pós-industrial. cas de bem-estar dos países subdesenvolvidos e em
De um lado, aos requisitos econômicos, políti- desenvolvimento, pois compromete mais de 50%
cos e ideológicos dos espaços social-democratas, de – e em alguns países, como o Brasil, chega a 56%
outro lado, as necessidades geradas pela integração – do orçamento nacional, inviabilizando a estabili-
desigual das periferias capitalistas. A conseqüência é dade social. Este processo coloca os países do Tercei-
a inadequação da estrutura institucional do Estado ro Mundo num círculo vicioso, pois eles precisam,
de bem-estar aos novos anseios da sociedade. Essa constantemente, recorrer aos países do núcleo capi-
inadequação tem dois níveis. O primeiro nível é o talista – para, por exemplo, pagar os juros da dívida
que Leal (1996, p. 24) classifica como o “incômo- – para realizar novos empréstimos e aumentar sua
do da burguesia”, pois no seio da burguesia cresce dívida. Isto abre espaço para as “missões do FMI”
um sentimento cada vez mais anti-estatista e luta-se que tem a finalidade de monitorar e até controlar as
contra a amplitude do Estado na regulação da vida economias endividadas. Essas “missões” não trazem
social. O segundo nível são os novos agentes sociais em seus projetos o estabelecimento do bem-estar
– os movimentos sociais emergentes – passam a in- social. Com isso, o Estado de bem-estar, no Tercei-
tervir diretamente no conjunto da sociedade ques- ro Mundo, entra em decadência. Vale salientar, que
tionando a prática política estatal e as estruturas não nos cabe realizar uma explanação se houve, ou
partidárias existentes. Recusa-se, por parte desses não, um Welfare State no Terceiro Mundo.
movimentos, a “participar e desempenhar os papéis O décimo e último fator é a crise de legi-
clássicos – base eleitoral de partidos políticos, gru- timidade. Esta crise tem dois níveis, o interno e o
pos de pressão corporativistas ou mecanismos de po- externo. A crise interna de legitimidade é apresen-
der” (LEAL, 1996, p. 26). tada por Brunhoff no livro A hora do mercado: crítica
O nono fator de crise é a dívida externa. Esta ao liberalismo (1991). Para ela a própria população,
forma está ligada aos países do Terceiro Mundo. No que se serve deste modelo de Estado, critica-o, pois
pós-segunda guerra os americanos emprestaram al- os serviços , como, por exemplo, saúde e educação,
tas somas de dinheiro para os países europeus e o oferecidos por ele são de má qualidade, muito dife-
Japão com a finalidade de reconstruir o patrimônio rentes da propaganda estatal que mostra serviços de
nacional destruído durante a Segunda Guerra Mun- excelente qualidade, rápido atendimento e profissio-
dial. Com o advento dos anos dourados, os quais nas- nais de alto nível. Essa má qualidade se dá devido
cem com o fim da guerra, em 1945, e vão até 1970, ao investimento equivocado que o Estado realiza.
a economia destes países cresce e a dívida vai sendo Vejamos: o empreguismo, o qual provoca um com-
paga. No entanto, com a chegada da crise do petró- prometimento maciço do orçamento estatal, milita-
leo em 1974 tanto os americanos como os europeus rização do Estado. A doutrina da “defesa do mundo
vão buscar novas formas de financiar o crescimento livre” leva aos Estados centrais do capitalismo a co-
econômico. Uma dessas formas é promover o endi- locar uma grande parcela do orçamento em gastos
vidamento sempre crescente dos países da América militares, deixando a população com serviços bási-
cos sucateados. Desvios de verbas, má administra- consumo pessoal e supérfluo. Este tipo de postura
ção e outros fatores. colocou a legitimidade do Welfare State em cheque.
Outra crítica feita pela população é o cará- O outro nível desta crise é apresentado por
ter incontrolável de sua extensão. A fim de aten- Rosanvallon no livro A crise do Estado-providência
der a inúmeros compromissos eleitorais e interesses (1981). Para Spinelli (1993, p. 204), Rosanvallon é
empresariais, os governantes promovem um cres- o pensador que pode ser considerado como “o mais
cimento exagerado do Welfare State. Este crescimen- original, no sentido de que o seu pensamento dificil-
to acarreta uma redução do espaço privado e um mente pode ser enquadrado em alguma das linhas
avanço, das estruturas estatais, na vida íntima do de análises conhecidas”. De acordo com Rosanvallon
cidadão. Isto vai lentamente reduzindo o direito de (1981), não se deve procurar a chave explicativa do
escolha – a liberdade individual – sobre os assun- desenvolvimento do Estado-providência – esta é
tos referentes à vida, pois, o Estado, com sua rede a expressão que ele usa para designar o Estado de
de tecnocratas, vai decidindo o que é melhor para bem-estar social – na lógica do Capitalismo, porém
a existência do cidadão. A crise interna de legiti- na própria lógica inscrita no enredo do Estado Mo-
midade será um argumento usado pelo pensamento derno, pois ele é um “produto da cultura democráti-
neoliberal para defender uma redução drástica do ca e igualdade moderna” (ROSANVALLON, 1981,
tamanho do Estado – por meio das privatizações – e p. 25). O Estado de bem-estar teria a incumbência
um incremento da plena liberdade de Mercado. de libertar a sociedade da necessidade e do risco.
O nível externo desta crise é apresentado ini- Esta incumbência nasceu do compromisso so-
cialmente por Stewart no livro A moderna economia: cial, o pacto ético proposto por Keynes na Teoria
antes e depois de Keynes (1976). Para Stewart além do geral (1988), realizado no pós-segunda guerra en-
aumento do preço do barril de petróleo no Mercado tre o Estado, a classe patronal e os sindicatos – re-
Internacional existe outro fator, o qual determina presentantes da classe operária. Este pacto consistia
a crise do Estado de bem-estar na década de 1970. em que a classe operária aceitava não contestar as
Este outro fator é a nova geração – nascida a partir relações de produção, especialmente a propriedade
da década de 1960 – que não participou do pacto privada, e renunciava ao postulado da revolução ar-
realizado no pós-segunda guerra. Este pacto possibi- mada; em troca de um Estado social redistributivo
litou uma estabilidade social através da implantação e da existência de um espaço de negociações sociais
de políticas de Welfare. Por tal motivo todos os cida- que lhe permitisse ganhos reais. A partir da década
dãos do continente europeu – visto que a pesquisa de 1970 nascem os questionamentos. Segundo Ro-
foi realizada na Europa – tinham um compromisso sanvallon (1981, p. 26), “O que se coloca em cheque
ético com o pagamento de altos impostos. Estes al- quando se questiona o Estado-providência é o con-
tos impostos mantinham as estruturas de bem-estar trato social, o pacto: as relações da sociedade com o
social. Todavia, esta nova geração não participou de Estado que são objeto de uma indagação”.
todas as angústias e sofrimentos da primeira metade O pacto realizado no pós-segunda guerra – e
do século XX e, por causa disso, não se sente à von- que, teoricamente, perdurou entre 1945-1974 – é
tade com o pagamento de altos impostos. O que ela questionado pelas gerações e pela dinâmica do capi-
desejava – e deseja – era gastar seu dinheiro com um tal que deseja auferir maiores lucros a partir da reti-
rada parcial ou da pura eliminação das políticas de
Hayek (1983, p.158) expressa o incômodo da burguesia refe- bem-estar. Neste contexto, para Rosanvallon (1981,
rente ao pagamento de altas taxas de impostos para manter
os serviços de bem-estar social, da seguinte forma: “Não deve-
mos esperar que algum dia se chegue à unanimidade quanto
a proporção desses serviços [saúde, educação, moradia, etc] e a execução de serviços com os quais eles não concordam seja
tampouco é evidente que coagir os indivíduos a contribuir para justificável do ponto de vista moral”.