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A viabilidade dos terceiros partidos no

sistema político dos Estados Unidos

Ricardo José Pereira Rodrigues

Sumário
1. Introdução. 2. Definindo terceiros parti-
dos. 3. Barreiras à formação de terceiros par-
tidos viáveis. 3.1. Barreiras institucionais. 3.2.
Barreiras não institucionais. 3.3. Explicações
fundamentadas na teoria da escolha racional.
3.4. Perspectiva marxista. 4. O Partido Libertário
e o Partido Reformista de Ross Perot: diferentes
tipos de terceiros partidos. 5. As perspectivas
para os terceiros partidos nos Estados Unidos.

1. Introdução
Enquanto os norte-americanos enxer-
gam o sistema bipartidário de competição
eleitoral de seu país como característico da
plena normalidade na política, a estabilida-
de daquele sistema de partidos apresenta-
se como um fenômeno inusitado para
observadores internacionais e para cien-
tistas políticos que adotam a perspectiva
comparada em seus estudos. Alguns com-
parativistas chegam a considerar o sistema
bipartidário dos Estados Unidos como um
caso singular entre os sistemas partidários
ocidentais pela total “ausência de partido
socialista ou democrata social com qual-
quer relevância eleitoral” (MCSWENNEY;
ZVESPER, 1991, p. 78).
O predomínio de dois grandes partidos
Ricardo José Pereira Rodrigues é Doutor no sistema norte-americano tende a obscu-
em Ciência Política pela State University of recer a realidade de que dezenas de partidos
New York, em Albany. Diretor da Consultoria menores existem e participam em eleições
Legislativa da Câmara dos Deputados. estaduais e nacionais nos Estados Unidos

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desde o início do século XIX. Obscurecido auto-intitula um partido, que articula
também tende a ficar o fato de que o voto interesses de uma base eleitoral, que
para terceiros partidos tem sido registrado faz pressão sobre o sistema político
em todas as principais eleições realizadas no e partidário norte-americano usando
país, com os partidos menores capturando métodos eleitorais e/ou políticos e
mais de 5% dos votos em um terço das nunca atinge ou não consegue agru-
eleições realizadas para presidente da Re- par um contigente sustentável da
pública desde 1840, segundo dados de 1996 lealdade de pessoas que compõem o
de Rosenstone, Behr e Lazarus (1996, p. 4). corpo político da nação”.
Por que nenhuma dessas agremiações Para Gillespie, portanto, pouco separa os
partidárias de menor porte chegou a amea- terceiros partidos dos grupos de pressão.
çar o sistema bipartidário norte-americano? Assim como tais grupos, os terceiros
A história demonstra que os partidos maio- partidos estão melhor posicionados para
res, em um determinado momento, podem, articular interesses do que para agregá-los.
de fato, ser substituídos por outros partidos Assim como acontece com os grupos de
durante realinhamentos partidários. En- pressão, o foco dos terceiros partidos tende
tretanto, o caráter bipartidário do sistema a ser muito estreito. A diferença entre os
nunca foi ameaçado. Por quê? Num país terceiros partidos e os grupos de interesse
com grandes diferenças geográficas, onde reside no grau de seu envolvimento em dis-
convivem grupos das mais variadas etnias, putas eleitorais. Apesar de seu interesse em
seria lógico presumir que um sistema parti- resultados eleitorais, os grupos de pressão
dário com apenas dois partidos não viesse não indicam oficialmente candidatos para
a refletir razoavelmente as aspirações cargo eletivo, enquanto é precisamente isso
e preocupações das muitas subculturas que os terceiros partidos realizam.
que ali florescem. Por isso, o lógico seria Em seu livro clássico sobre partidos
esperar que existisse no país um sistema e grupos de pressão, V. O. Key (1964, p.
multipartidário. Mas esse é claramente um 281) classifica os terceiros partidos em dois
caso no qual expectativas não coincidem tipos: os partidos doutrinários de existência
com a realidade. contínua e os terceiros partidos de curta
O presente trabalho busca respostas duração. O primeiro tipo consiste naqueles
para tais perguntas por meio de um levan- “formados para difundir uma doutrina
tamento da literatura dedicada ao estudo de específica... sua longa duração pode ser
terceiros partidos nos Estados Unidos. Nos- mais significativa do que sua coloração
sa análise enfoca as explicações esboçadas doutrinária para diferenciá-los de outras
pela literatura a respeito da durabilidade agremiações partidárias menores”. Exem-
do sistema bipartidário norte-americano, plos de partidos desse tipo nos Estados
da fragilidade dos desafios representados Unidos são o Partido Libertário (Libertarian
por terceiros partidos e do surgimento Party) e o Partido da Proibição (Prohibition
ocasional, em eleições presidenciais nos Party). De acordo com Gillespie (1993, p.
Estados Unidos, de candidatos relevantes 10), esses partidos apresentam um alto grau
filiados a terceiros partidos. de estabilidade e continuidade, mas sua
“longevidade resulta mais do compromisso
de seus ativistas com a doutrina do partido
2. Definindo terceiros partidos
do que de qualquer esperança genuína de
Gillespie (1993, p. 15) define terceiro vitória eleitoral”.
partido como Por sua vez, os partidos de curta du-
“um agregado organizado de líde- ração podem ser subdivididos em dois
res, membros e apoiadores que se grupos: o daqueles formados por um mo-

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vimento de protesto de natureza econômica para Presidente da República nos Estados
e o daqueles produzidos por um processo Unidos, é simplesmente um candidato
de secessão dentro de um dos principais sem partido. Esses candidatos deixam de
partidos. Key afirma que muitos dos mais desfrutar dos benefícios de pertencer a uma
importantes terceiros partidos criados nos legenda partidária, tais como obter identi-
Estados Unidos foram oriundos de sério ficação ideológica ou usar dos recursos de
descontentamento com a economia. Esse foi uma base eleitoral consolidada.
certamente o caso do Partido Populista (Po- De acordo com Mazmanian (1974, p. 27),
pulist Party), nascido da associação entre a formação de terceiros partidos está intrin-
o movimento de protesto contra a política secamente ligada à desordem política. Para
agrária no oeste do país e o movimento ele, “a mais importante pré-condição para o
sindical no leste. O partido criado para dar eleitor norte-americano transferir seu voto
sustentação à candidatura de Ross Perot para candidatos de terceiros partidos é a
também pertence a essa categoria. existência de uma severa crise política”.
Key (1964, p. 290,291) cita o Partido Pro- Mazmanian (1974, p. 66) fundamenta sua
gressista (Progressive Party) e os Dixiecrats afirmação em registros históricos de mais
como exemplos de terceiros partidos oriun- de 150 anos, nos quais fica evidente que
dos da secessão de partidos maiores: terceiros partidos viáveis apenas surgiram
“A candidatura de Theodore Roo- no país em períodos de intenso conflito
sevelt pelo Partido Progressista em nacional. “Em geral, o voto em candidatos
1912 nasceu das divisões no âmbito de terceiros partidos apresentou a mesma
da liderança do Partido Republica- tendência”.
no. De forma semelhante, em 1948, Hazlett II (1992, p. 26) sugere, ainda, que
o Movimento em Prol dos Direitos terceiros partidos também se formam em
dos Estados, também chamado de torno de candidatos célebres e que a maioria
movimento Dixiecrat, originou-se de das pequenas legendas norte-americanas do
rebelião de um contigente do Partido século passado tinha essa configuração.
Democrata contra a facção dominante “Teddy Roosevelt, concorrendo pela
do partido”. chapa progressista nas eleições de
Além desses dois tipos, Gillespie (1993, 1912, recebeu 28% do voto popular.
p. 12,13) adiciona uma terceira variedade. Ele era o coração do Partido Progres-
Trata-se do partido não nacional. Ele quali- sista. O partido era, essencialmente,
fica com este conceito àqueles partidos que, um movimento centrado na perso-
a despeito de exercerem grande influência nalidade cativante do candidato,
na política de certas localidades, atuam podendo mesmo ser visto como um
apenas dentro de suas respectivas áreas movimento baseado na idolatria ao
de origem. Gillespie usa como exemplo candidato”.
o Partido do Trabalhador Rural de Min-
nesota (Minnesota Farmer-Labor Party),
3. Barreiras à formação de
o qual conquistou o status de importante
partido no Estado de Minnesota, mas, na terceiros partidos viáveis
perspectiva nacional, nunca deixou de ser O sistema partidário norte-americano
um partido nanico e sem expressão. funciona por meio de uma série de me-
Uma situação semelhante à dos terceiros canismos, tanto institucionais quanto não
partidos, mas que dela se distingue clara- institucionais, que impedem os terceiros
mente, é a das candidaturas independentes. partidos de conquistarem viabilidade. Gil-
Um candidato independente, que, não lespie (1993, p. 28) chama esses mecanismos
raras vezes, figura nas cédulas de votação de “fatores que ajudam a conduzir os tercei-

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ros partidos à margem” do sistema. Além Essa explicação para o predomínio do
disso, Rosenstone, Behr e Lazarus (1996, bipartidarismo nas eleições dos Estados
p. 15) acreditam que esses mecanismos Unidos tem suas raízes teóricas no trabalho
constrangedores são tão robustos que “o do cientista político francês Maurice Duver-
voto para terceiros partidos apenas se dá ger (1980, p. 253). Duverger foi um dos pri-
nas mais extremas condições”. meiros teóricos a postular que um sistema
A literatura especializada no assunto eleitoral com base na pluralidade de votos
descreve as barreiras impostas aos terceiros favoreceria a existência do bipartidarismo.
partidos sob vários prismas: do ponto de Para ele, pode-se esquematizar seu postu-
vista constitucional e legal, da perspectiva lado na seguinte fórmula: o escrutínio ma-
cultural e social, da questão ideológica e até joritário de um só turno tende ao dualismo
da economia do voto. dos partidos. “De todos os esquemas que
se definiram neste livro, este último é, sem
3.1. Barreiras institucionais dúvida, o que mais se aproxima de uma
A explicação mais comum para o verdadeira lei sociológica”.
predomínio dos dois maiores partidos Segundo Riker (1982, p. 761), Duverger
no sistema político dos Estados Unidos é ofereceu duas teorias para explicar porque
a existência de um sistema eleitoral com a regra da pluralidade de votos destruía as
base em distritos eleitorais uninominais e chances dos terceiros partidos nos Estados
na pluralidade de votos. Esse sistema per- Unidos: um efeito mecânico e um fator
mite a eleição de apenas um candidato por psicológico.
distrito, seja para a Câmara dos Deputados, “O efeito mecânico dá aos políticos
para o Senado Federal, para as Assembleias um incentivo a abandonar os parti-
estaduais ou até para outros cargos eletivos dos que ganham menos do que eles
de nível local, não importando o número de esperavam. Observando os votos
candidatos que concorram a tais cargos. O desperdiçados e os votos que, apesar
vitorioso é sempre o indivíduo com o maior de desperdiçados, contribuiriam indi-
número de votos, mesmo que esse número retamente para a vitória dos partidos
não atinja a maioria absoluta. vistos como as alternativas menos
Ao contrário do sistema de representa- ruins, o fator psicológico dá aos elei-
ção proporcional, no qual uma certa percen- tores um incentivo para votar num
tagem minimamente significativa de votos partido de sua segunda escolha”.
recebida por um dado partido traduz-se em Embora as premissas de Duverger pa-
assentos no Poder Legislativo para aquele reçam conter uma explicação válida para o
partido, no sistema distrital uninominal em que acontece nos Estados Unidos, elas não
um único turno, um partido pode receber podem ser consideradas uma “lei socioló-
20% dos votos em cada estado e, ainda gica” universal. Todos os países de língua
assim, não conquistar um único assento. inglesa fazem eleições distritais com escru-
De acordo com Rosenstone, Behr e Lazarus tínio majoritário de um só turno, em que se
(1996, p. 18), esse tipo de arranjo institucio- elegem candidatos com uma pluralidade
nal não apenas explica o predomínio do de votos. Entretanto, só nos Estados Uni-
bipartidarismo, “também garante que os dos encontra-se um sistema bipartidário
terceiros partidos que apareçam terão vida sem terceiros partidos relevantes. A Grã-
curta”. Quanto tempo pode um terceiro Bretanha e a Austrália têm três partidos
partido sustentar derrotas eleitorais con- importantes. O Canadá e a Índia contam,
tinuadas antes de provocar a desilusão de ambos, com sistemas multipartidários.
seus eleitores, que podem, então, facilmente Uma outra barreira frequentemente
migrar para um dos grandes partidos? citada na literatura é o sistema de seleção

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presidencial norte-americano com seu é um problema surgido no século XX, uma
colégio eleitoral. O sistema baseado no co- vez que, até a adoção da cédula secreta en-
légio eleitoral não favorece os partidos de tre 1888 e 1916, cada partido providenciava
base regional que apenas poderiam ganhar para seus eleitores sua própria cédula de
votos em poucos estados. Isso acontece votação.
porque o procedimento de voto no âmbito “O aumento no número de cargos
do colégio eleitoral deflaciona a força dos eletivos forçou as assembléias legis-
terceiros partidos e inflaciona a margem lativas nos estados a colocar limites
dos partidos majoritários. À exceção dos no número de candidatos, dando aos
estados do Maine e de Nebraska, as leis es- maiores partidos status preferencial,
taduais determinam que os votos eleitorais ao mesmo tempo que tornava difícil
no colégio eleitoral sejam agraciados, em para os partidos menores fazerem
sua totalidade, ao candidato que consiga o parte das cédulas” (Idem).
maior número de votos populares dentro Rosenstone, Behr e Lazarus (1996, p.
de cada estado. Um candidato que venha 19) acreditam que os grandes partidos
a alcançar o segundo lugar no pleito em nacionais desempenharam um papel vital
determinado estado não recebe sequer no estabelecimento de restrições de acesso
um voto desse estado no colégio eleitoral, às cédulas estaduais. Para eles, os partidos
mesmo que o número de votos populares Democrata e Republicano “construíram
recebidos tenha sido elevado. Para ter qual- um labirinto de complexas regras e proce-
quer impacto eleitoral, um partido deve dimentos para dificultar a presença de par-
ganhar eleições dentro dos estados. Como tidos menores e candidatos independentes
resultado, mesmo uma candidatura à pre- nas cédulas para eleições gerais”. Além
sidência de um terceiro partido relevante, disso, os candidatos dos grandes partidos
como foi o caso da de John Anderson em têm lugar garantido nas cédulas, nelas
1980, que conseguiu mais de 6% da votação aparecendo automaticamente, enquanto
popular, não logrou obter um único voto os partidos menores são obrigados a apre-
no colégio eleitoral (ROSENSTONE; BEHR; sentar uma petição às autoridades eleitorais
LAZARUS, 1996, p. 17). estaduais antes de conseguirem incluir seus
Assim, o colégio eleitoral funciona como candidatos nas respectivas cédulas.
uma espécie de guardião do sistema bipar- Uma vez que não há leis eleitorais uni-
tidário norte-americano. Como bem coloca ficadas nos Estados Unidos e fica a cargo
Mazmanian (1974, p. 111), o voto direto de cada estado determinar suas próprias
para presidente eliminaria o caráter de regras de acesso às cédulas, os terceiros
pluralidade, no qual o primeiro candidato partidos confrontam-se, de fato, com enor-
em votos pretere todos os demais, e também mes desvantagens para sequer figurarem
eliminaria a sistemática sobrerrepresenta- nas cédulas em eleições nacionais. Para os
ção dos grandes partidos nacionais. Possi- terceiros partidos participarem de eleições
velmente “viabilizaria um maior número de nacionais, precisam derrubar nada menos
candidaturas de terceiros partidos”. que 50 diferentes conjuntos de barreiras
Ainda figuram como barreiras à viabili- burocráticas, um conjunto para cada esta-
dade de terceiros partidos as restrições de do. Essas barreiras incluem os requisitos de
acesso às cédulas de votação. De acordo prazos diferenciados e números distintos de
com vários autores, um dos grandes obstá- assinaturas de eleitores, que podem variar
culos enfrentados por partidos minoritários de 25 assinaturas, no estado do Tennessee,
no sistema norte-americano é simplesmente a 100 mil assinaturas, na Califórnia.
o de conseguir constar da cédula de vota- Tais restrições traduzem-se em grande
ção. Hazlett II (1992, p. 38) explica que esse ônus para candidatos de terceiros partidos.

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George Wallace, por exemplo, para poder os recursos financeiros disponíveis para os
participar das eleições presidenciais de 1968, grandes e os terceiros partidos.
foi forçado a concorrer com seis diferentes Por fim, o acesso aos meios de comuni-
legendas partidárias em diferentes estados. cação constitui a última barreira institucio-
John Anderson, por outro lado, teve que nal a ser vencida pelos terceiros partidos
gastar mais da metade de todo o dinheiro para viabilizar suas chances na competição
arrecadado em sua campanha, como candi- eleitoral nos Estados Unidos. Trata-se de
dato de terceiro partido, para pagar custas um elemento crucial para qualquer esfor-
legais e despesas relacionadas com petições ço de campanha com pretensões reais no
submetidas aos estados (ROSENSTONE; contexto do sistema eleitoral e partidário
BEHR; LAZARUS, 1996, p. 24). norte-americano, suprindo a necessária
Pesquisadores também concordam que legitimidade para os candidatos. Se a ex-
as leis de financiamento de campanha apre- posição aos meios de comunicação, por
sentam impactos negativos para terceiros si só, não pode garantir a vitória de um
partidos. Hazlett II (1992, p. 43) descrevia candidato, a falta de exposição certamente
a lei federal eleitoral norte-americana como garantirá o fracasso da empreitada.
um instrumento projetado para restringir a A maioria dos autores que analisam o
influência do poder econômico no processo assunto concorda que os candidatos de ter-
eleitoral, mas que, em realidade, tornou-se ceiros partidos não recebem a cobertura dos
uma lei voltada à proteção dos grandes meios de comunicação de massa na mesma
partidos. Os dois maiores partidos recebem extensão em que a recebem candidatos dos
autorização imediata para o financiamento partidos majoritários. Rosenstone, Behr
público nas campanhas presidenciais, en- e Lazarus (1996, p. 33) afirmam existir
quanto partidos de menor porte só recebem uma grande disparidade entre o volume
tais recursos após ocorrida a eleição, retro- de cobertura dispensado pela mídia aos
ativamente, e segundo alguns critérios es- pequenos e aos grandes partidos.
tabelecidos pela lei. Esses critérios incluem “Em 1980, os principais jornais e re-
constar da cédula em pelo menos 10 estados vistas dos Estados Unidos deram a
e obter pelo menos 5% do voto popular Reagan e a Carter aproximadamente
nacional. Rosenstone, Behr e Lazarus (1996, 10 vezes mais cobertura do que a
p. 26) observam que, dos 148 candidatos de todos os outros 11 candidatos de
partidos menores que disputaram eleições terceiros partidos juntos. Essa dispa-
em mais de um estado desde 1840, apenas ridade mostrou-se presente também
10 se qualificariam para o financiamento no noticiário das redes de televisão:
público retroativo previsto na lei. Durante entre janeiro e setembro, o noticiário
as primárias, candidatos vinculados a par- noturno da CBS dedicou 6 horas e
tidos majoritários recebem recursos federais 10 minutos de cobertura a Carter, 3
correspondentes ao que gastaram individu- horas e 9 minutos a Reagan e 1 hora
almente, enquanto os candidatos de parti- e 46 minutos a Anderson”.
dos menores, que não realizam primárias, Ernest Evans (1988, p. 14) explica que a
não têm direito a esses recursos. Para piorar mídia emprega dois argumentos contra a
a situação, mesmo sendo negado aos can- cobertura de terceiros partidos. “Primeiro,
didatos de terceiros partidos os benefícios muitos acreditam que os partidos menores
de subsídios pré-eleitorais federais, eles são constituídos por malucos e radicais,
ainda têm que obedecer aos requisitos da e, como tal, não merecem uma cobertura
lei no que tange à divulgação dos gastos de digna. Segundo, uma vez que os partidos
campanha. Em resumo, a legislação garante menores não têm chances reais de ganhar
que sempre haverá um grande hiato entre a eleição, eles não merecem a atenção da

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mídia”. Rosenstone (1996, p. 350) e seus majoritários ou produzindo uma disposi-
colegas encontraram em seu estudo evidên- ção não partidária.
cias que corroboram a explicação dada por Da mesma forma, Rosenstone, Behr e
Evans. Na opinião deles, os candidatos de Lazarus comentam que os terceiros par-
terceiros partidos recebem pouca atenção tidos tornam-se presas dessas atitudes
dos editores da mídia impressa e televisiva negativas. As pessoas tendem a presumir
porque esses editores não os consideram que os candidatos de terceiros partidos
relevantes para o pleito. “Quase 2 de cada terão um desempenho pobre nas eleições
3 editores de jornal acreditavam que seus e essa presunção tem todos os requisitos
leitores não teriam interesse em candidatos para se tornar uma profecia autorrealizável,
de terceiros partidos em 1980”. Ademais, porque o apoio do eleitorado fica cada vez
segundo os pesquisadores, a mídia faz mais mais difícil de se obter.
do que simplesmente ignorar os terceiros O eleitorado norte-americano também
partidos. “Às vezes, ela mostra-se flagran- apresenta a tendência de enxergar o bipar-
temente hostil para com os candidatos tidarismo no país como um arranjo quase
desses partidos” (Idem, p. 36). sagrado.
O problema que se apresenta com a situa- “Os candidatos de terceiros partidos
ção descrita acima é que tanto os candidatos são vistos como agitadores, causado-
de terceiros partidos quanto o eleitorado, de res de desarmonia do sistema biparti-
uma forma geral, são tratados injustamente. dário americano. Assim, os partidos
A mídia predetermina quem tem chances de menores não estão em pé de igual-
ganhar e, ao fazê-lo, impede que o público dade com os partidos Democrata e
receba informação sobre todos os candida- Republicano; eles devem primeiro
tos e todas as questões em jogo. Isso, como estabelecer sua legitimidade – coisa
afirma Hazlett II (1992, p. 46), fecha o ciclo que eleitores não exigem dos grandes
vicioso dos terceiros partidos. “Sem cober- partidos” (ROSENSTONE; BEHR;
tura adequada dos meios de comunicação, LAZARUS, 1996, p. 39,40).
eles têm pouca chance de divulgar suas Hazlett II (1992) adiciona a essas barrei-
idéias e, como resultado, receber os votos a ras não institucionais mais um obstáculo de
que fariam jus no dia da eleição”. cunho social, que ele chama de a ideia do
“voto desperdiçado”. Esse conceito, que
3.2. Barreiras não institucionais tem seu paralelo no fator psicológico de
Além de barreiras institucionais, vários Duverger, consiste na prática frequente dos
autores sugerem a existência de obstáculos grandes partidos de sublinhar para os elei-
de natureza diversa prevenindo o desen- tores que votar em terceiros partidos que
volvimento de terceiros partidos no sistema têm pouca ou nenhuma chance de ganhar as
partidário dos Estados Unidos. Gillespie eleições é o mesmo que desperdiçar o voto.
(1993, p. 29), por exemplo, postula que a Enquanto a tática garante lealdade para os
própria cultura norte-americana fortalece grandes partidos, ela tem o propósito se-
um processo de socialização política que cundário de questionar a legitimidade dos
alicerça o sistema bipartidário em de- partidos menores, que estariam à margem
trimento de qualquer outra forma de se do sistema e seriam liderados por indivídu-
organizar o sistema partidário. Para ele, os os sem as necessárias credenciais.
terceiros partidos são vítimas de um proces-
3.3. Explicações fundamentadas
so de socialização que sinaliza, para cada
na teoria da escolha racional
nova geração, que desvios multipartidários
do padrão bipartidário são antiamericanos, Há explicações para a falta de viabilida-
gerando a lealdade a um dos dois partidos de e de relevância dos terceiros partidos no
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sistema partidário norte-americano base- ximização de utilidade de atores políticos
adas em teorias econômicas. Duas dessas racionais. A diferença entre ele e Downs
explicações podem ser encontradas nas é que seu modelo de escolha racional é
teorias desenvolvidas por Anthony Downs menos rígido, permitindo a interposição
(1999) e por John Aldrich (1995). do contexto político e de arranjos institu-
A teoria de partidos proposta por Downs cionais nos cálculos racionais de seus atores
(1999, p. 50) centra-se na competição eleito- políticos, e, mais importante, ele conceitua
ral. Presumindo que os atores políticos sejam o objetivo de se conquistar um cargo eletivo
maximizadores de utilidade racionalmente como apenas um entre muitos objetivos
perfeitos e que cada elite partidária tenha dos membros de partido. Aldrich trabalha,
como objetivo a manutenção ou captura de em realidade, com a abordagem conhecida
cargos eletivos, Downs concebe os partidos como o novo institucionalismo, dentro da
como entidades que “formulam políticas a tradição da teoria da escolha racional.
fim de ganhar eleições, e não ganham elei- O partido, para Aldrich (1995, p. 4,5), é
ções a fim de formular políticas”. uma criação de atores políticos. Os políticos
No modelo bipartidário definido por criam, mantêm, exploram, reformam ou
Downs, os partidos alteram deliberada- ignoram os partidos políticos para facilitar
mente suas plataformas para se assemelha- a conquista de seus objetivos. Mas, para
rem ao seu oponente, enquanto, no sistema Aldrich, os partidos também devem ser
multipartidário, os partidos se empenham analisados a partir de sua relação com o
em permanecer o mais ideologicamente eleitorado, com o poder legislativo, com as
distintos dos rivais. Além disso, no bipar- instituições governamentais, de uma forma
tidarismo, os partidos mantêm suas plata- geral, assim como em relação ao contexto
formas indefinidas e ambíguas de forma histórico no qual se inserem.
a encorajar os eleitores a se comportarem Em sua análise do bipartidarismo nos
irracionalmente. Downs conclui que, para Estados Unidos, Aldrich apoia-se no tra-
eleger seus candidatos, um partido, nesse balho de Maurice Duverger (1980). Para
modelo bipartidário, deve conseguir mais Aldrich, a razão de os políticos se filiarem
votos do que qualquer outro partido no a um grande partido, ao invés de se filiarem
sistema. a um menor, é simples: as chances de elei-
“Esse arranjo encoraja os partidos ção são maiores quando se pertence a um
que perdem repetidas vezes a se partido de grande porte. Como Duverger,
fundirem, de modo a conquistar um ele baseia seu modelo dedutivo na “tese
total combinado de votos maior do do voto desperdiçado” e na constatação de
que o total recebido pelo que vence que é do interesse do partido ser um dos
repetidas vezes. Essa amalgamação dois maiores partidos. Assim, os partidos
continua até que cada um dos sobre- buscam recrutar os candidatos mais fortes,
viventes tenha uma chance razoável e esses, por sua vez, buscam reduzir sua
de conquistar a maioria dos votos, escolha a apenas dois partidos.
que é a única maneira de ele ter cer- Do ponto de vista do eleitor, o com-
teza de obter o poder. Desse modo, portamento racional traduz-se em evitar
o resultado do tipo o vencedor- “desperdiçar” seu voto. Portanto, a dificul-
leva-tudo de uma estrutura eleitoral dade de manter um terceiro partido viável
de pluralidade tende a estreitar o no sistema advém do fato de que eleitores
campo a dois partidos concorrentes” confrontados com a antipatia com candida-
(DOWNS 1999, p. 144,145). tos dos dois grandes partidos terminarão
Como Downs, Aldrich vê os partidos escolhendo o menos antipático em vez de
como um resultado dos esforços de ma- escolher seu candidato preferido de um

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terceiro partido. Os candidatos de terceiros grande margem, a assuntos inter-
partidos só apresentam bom desempenho nos do partido na maior parte do
quando os candidatos dos dois grandes país, pelo menos no que se referia a
partidos não oferecem uma alternativa para eleições nacionais, a influência dos
um segmento substancial do eleitorado. eleitores nos cálculos das lideranças
partidárias diminuiu e a influência
3.4. Perspectiva marxista das elites econômicas aumentou
O duopólio no sistema partidário norte- consideravelmente”.
americano também tem sido explicado à luz Segundo os autores, após as eleições de
da teoria marxista. Piven e Cloward (1989), 1896, “as reformas patrocinadas pelo em-
por exemplo, estudaram as mudanças e as presariado gradualmente enfraqueceram
reformas do sistema partidário como um os partidos clientelistas e diminuíram sua
resultado de esforços concentrados das capacidade de mobilizar eleitores” (Idem,
elites econômicas no sentido de proteger o p. 74).
sistema contra o populismo. McSweeney Outrossim, a preponderância das refor-
e Zvesper (1991), por sua vez, estudaram mas patrocinadas pelo empresariado pode
a questão da consciência de classe como ser vista como uma
um impedimento à ascensão de terceiros “reação defensiva aos tumultos po-
partidos viáveis. líticos ocorridos nos Estados Unidos
Muito embora seu livro não trate de no final do século XIX, por um lado, e
terceiros partidos, a análise feita por Piven por outro, como um esforço agressivo
e Cloward do aumento da abstenção nas de ganhar o controle incontestável do
eleições norte-americanas revela, a partir aparelho do estado... Em meados do
dos registros históricos, muito sobre o en- século XIX, o envolvimento gover-
fraquecimento dos partidos de uma única namental nos assuntos econômicos
bandeira e sobre o fortalecimento das duas era intermitente. Mas nas décadas
maiores agremiações partidárias do país no marcadas pelo crescimento industrial
decorrer do século XIX. Para eles, o declínio rápido e não regulamentado logo
dos partidos pequenos de uma só bandeira, após a Guerra Civil, as elites econô-
assim como o aumento da abstenção nas micas começaram a exigir mais do
urnas, isto é, o declínio do elo entre partidos governo” (Ibidem, p. 71).
e eleitorado, está diretamente relacionado Para os autores, fazia sentido para as eli-
ao domínio dos dois partidos majoritários tes empresariais restringir a competição po-
exercido pelas elites econômicas ávidas por lítica a partidos conservadores sob controle
defender o sistema político da ameaça do e construir um marco legal para reduzir a
que acreditam ser radicalismo político. probabilidade de terceiros partidos radicais
Piven e Cloward (1989, p. 67) afirmam ascenderem dentro do sistema.
que, após as eleições de 1896, as elites McSweeney e Zvesper (1991, p. 87)
econômicas do país mobilizaram-se para mostram-se perplexos com a ausência de
assegurar a realização de reformas na arena partidos importantes de esquerda nos Es-
política para reduzir o número crescente de tados Unidos. Para eles, os Estados Unidos
partidos competidores, fenômeno visto por constituem uma exceção entre as democra-
tais elites como gerador de conflito. cias do Ocidente.
“A eliminação da competição parti- “Na maioria das nações ocidentais,
dária facilitou a oligarquia interna tais partidos já detiveram o poder no
e deu sustentação a tal oligarquia governo central. Em um punhado de
por maior tempo. Uma vez que a casos onde isso não aconteceu, como
competição eleitoral reduziu-se, em no Canadá, os partidos da esquerda

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democrata respondem por aproxi- 4. O Partido Libertário e o Partido
madamente um quinto do eleitorado Reformista de Ross Perot:
nacional. Mas nos Estados Unidos diferentes tipos de terceiros partidos
os partidos de esquerda não repre-
sentam uma ameaça aos partidos As diferenças, semelhanças e pecu-
majoritários... Desde 1948, nenhum liaridades que caracterizam os terceiros
candidato filiado a um partido de partidos nos Estados Unidos podem ser
esquerda obteve sequer 1% do voto ilustradas pelo perfil do Partido Libertário
em uma eleição para presidente”. e pelo partido que nasceu da candidatura
Os autores não concordam com a ideia independente de Ross Perot à presidên-
de que a consciência de classe inexista cia em 1992 e 1996. O Partido Libertário
nos Estados Unidos e que um consenso apresenta-se como exemplo de partido
em torno de valores liberais, radicado no doutrinário de continuidade, enquanto o
individualismo, na liberdade, nos direitos Partido Reformista de Ross Perot preenche
à propriedade e na igualdade de oportuni- os requisitos de partido de curta duração.
dade, reine de forma suprema no país. Para Fundado em 1971, o Partido Li-
eles, abundam evidências da existência bertário não pode ser considerado uma
de consciência da classe trabalhadora nos entidade antiga no sistema partidário
Estados Unidos. norte-americano. Desde então, contudo,
“Pesquisas mostram que muitos tem crescido para se tornar o maior terceiro
norte-americanos identificam a si partido de caráter continuado, recebendo
mesmos como uma classe trabalha- uma média de 1% do voto nacional desde
dora, expressam uma preferência por 1984. Outrossim, enquanto organização,
associarem-se com outros membros o partido tem conseguido aumentar seu
de sua própria classe e atribuem alcance, participando em eleições com um
as desigualdades sociais existentes número crescente de candidatos a cargos
no país a causas estruturais e não a eletivos em todos os níveis de governo. De
deficiências pessoais. De fato, a forte acordo com Hazlett II (1992, p. 8), tanto o
militância dos sindicatos pode muito número de filiados como a expressivida-
bem ser interpretada como um com- de eleitoral do partido cresceram de tal
portamento brotado da consciência maneira que, já em 1980, seus candidatos
de classe” (MCSWEENEY; ZVESPER, passaram a figurar nas cédulas de todos
1991, p. 89). os 50 estados da União e o partido recebeu
O que existe, segundo a tese dos autores, quase 900 mil votos populares.
são obstáculos à politização da consciência O que distingue o Partido Liber-
de classe. E, para eles, esses obstáculos são tário de todos os outros terceiros partidos
constituídos por uma mistura de partidos norte-americanos é, talvez, sua posição
de base clientelista, imigração massificada, ideológica. Não se enquadrando entre os
segregação residencial de grupos étnicos rótulos tradicionais da política nos Estados
e um sistema descentralizado de governo Unidos, seja na esquerda ou na direita, o
(Idem). partido ocupa um nicho ideológico muito
Sem a politização da consciência de singular. Mark Paul descreve o partido
classe trabalhadora, simplesmente não há como um amálgama de indivíduos da es-
como esperar que partidos de esquerda, de querda e da direita.
base eminentemente ideológica, finquem “A ideologia prescreve que seus fi-
raiz no sistema partidário norte-americano liados apóiem as liberdades civis e o
e tornem-se uma alternativa viável para os fim do militarismo; também levá-os
eleitores. à defesa de um capitalismo de laissez-

50 Revista de Informação Legislativa


faire mais puro do que o observado na 32 estados e recebendo um total de 173.019
história norte-americana” (HAZLETT votos populares.
II, 1992, p. 61). A campanha do partido nas eleições de
O libertarianismo é diferente do con- 1980 foi concebida para projetar a agremia-
servadorismo, como bem observa David ção para o grupo dos partidos majoritários.
Frum (1994, p. 202). Os seus seguidores A ideia era tornar-se uma alternativa legíti-
creem no máximo de liberdade individual ma e viável aos partidos grandes, figurando
como um fim em si mesmo, sem se preo- nas cédulas de todos os estados da União
cupar com as consequências dessa crença. e recebendo um percentual de votos que
Os libertários se opõem ao intervencionis- desse ao partido um status de permanência
mo do estado e do governo na sociedade. nas cédulas estaduais e viabilizasse a esta-
Para eles, a função primária do governo é bilidade da organização partidária. De fato,
proteger as liberdades e a propriedade dos o partido conseguiu figurar nas cédulas de
indivíduos. todos os estados norte-americanos em 1980.
Alguns afirmam que o partido foi for- Além disso, com fundos de campanha su-
mado após a cisão ocorrida nas fileiras do periores a 3 milhões de dólares, a maioria
conservadorismo tradicional, sobretudo proporcionada por seu candidato David
após as eleições presidenciais de 1968. Koch, o partido ampliou a visibilidade
Segundo Tuccille (1970, p. 10), “o Partido junto ao eleitorado. Mas seu desempenho
Libertário formou-se a partir da união de eleitoral ficou muito aquém do candidato
Republicanos descontentes, Democratas independente John Anderson. O partido
contrariados, anarquistas, socialistas e recebeu um total de 921.299 votos contra
membros do SDS e do movimento de Jo- 5.720.600 votos recebidos por Anderson
vens Americanos pela Liberdade”. Hazlett (HAZLET II, 1992, p. 97). Esse número total
II (1992, p. 77) sublinha que o partido não de votos foi muito reduzido para garantir
nasceu como resposta a uma crise, como a permanência da legenda nas cédulas
foi o caso da maioria dos terceiros partidos em vários estados. Quanto à questão or-
dos Estados Unidos. Para ele, tanto o con- ganizacional, o partido criou um comitê
texto social como os assuntos econômicos permanente de campanha em 1982 para
do final da década de sessenta e início de coordenar os esforços de recrutamento de
setenta não explicam com propriedade os candidatos e de assistência a campanhas
motivos da fundação do partido. estaduais e locais.
Apesar das impressionantes credenciais Dos anos oitenta para cá, contudo, o
que o Partido Libertário detém entre os partido não tem obtido sucesso em vencer
terceiros partidos do tipo doutrinário, não os obstáculos institucionais e não institu-
conseguiu bons resultados em seu desem- cionais que vitimam os terceiros partidos.
penho eleitoral. Em nenhuma das eleições Sem os recursos proporcionados por
que participou, sejam elas nacionais, es- um candidato rico como Koch, o partido
taduais ou locais, o partido logrou ser o tem assistido a um declínio constante de
fiel da balança. Em 1972, ano da primeira seu percentual de voto popular. O que
eleição para presidente de que o partido a experiência com o candidato Koch e
participou, seu fracasso foi completo. Os seus recursos financeiros pessoais parece
candidatos do partido constavam da cédula demonstrar é que dinheiro constitui uma
oficial em apenas dois estados, recebendo importante variável para que terceiros par-
ao todo 3.671 votos (HAZLETT II, 1992, p. tidos possam ultrapassar as barreiras que
93). Em 1976, o partido conseguiu aumen- lhes são impostas pelo sistema partidário
tar sua participação nas cédulas estaduais, dos Estados Unidos. Cabe lembrar que, nas
passando a constar das cédulas oficiais em últimas eleições, os partidos majoritários

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conseguiram bater seus próprios recordes pudesse ser resolvido, seria necessário
em termos de financiamento de campa- reformar todo o sistema político. Na opi-
nha para presidente. Segundo dados do nião de Perot, os grandes partidos haviam
Centro de Política Responsável, o comitê fracassado no objetivo de restringir as con-
de campanha de Barack Obama, pelo Par- tribuições de campanha, haviam fracassado
tido Democrata, conseguiu arrecadar 745 de se afastarem do dinheiro dos grandes
milhões de dólares; o comitê de campanha interesses econômicos. Para Rosenstone,
de John McCain, pelo Partido Republicano, Behr e Lazarus (1996, p. 237,238), a mensa-
arrecadou menos da metade, 368 milhões gem de Perot agradou inicialmente a um
de dólares; enquanto o comitê de campanha grande segmento de eleitores e essa foi a
de Bob Barr, do Partido Libertário, arreca- razão pela qual, em meados de junho, Perot
dou apenas 1 milhão de dólares. Outros despontava com o primeiro lugar na corri-
terceiros partidos que participaram das da presidencial, segundo as pesquisas de
eleições presidenciais de 2008 tiveram arre- opinião, com 39% das intenções de voto.
cadações ainda menores do que a registrada Inicialmente Perot criou sua organiza-
pelo Partido Libertário. O Partido Verde, ção de campanha não como um terceiro
por exemplo, arrecadou 199 mil dólares, partido, mas como um entidade privada.
enquanto o Partido Constitucionalista ar- United We Stand, como era chamada a orga-
recadou 258 mil dólares (2009). nização, foi posteriormente transformada
A experiência histórica de Ross Perot em um grupo sem fins lucrativos dedicado
vem corroborar a hipótese de que o dinhei- à promoção da agenda política de Perot.
ro apresenta-se como a mais importante Na eleição de 1992, Perot capturou qua-
arma dos terceiros partidos para vencer se 19% do voto popular, o que representava
os obstáculos do sistema partidário norte- muito mais do que qualquer terceiro par-
americano. Perot conseguiu derrubar os tido, tinha conquistado em oito décadas.
impedimentos para sua candidatura por Entretanto, a barreira do colégio eleitoral
um terceiro partido em 1992 graças a seu funcionou contra sua candidatura e ele não
acesso a dinheiro, e muito dinheiro. De obteve um único voto no colégio eleitoral.
acordo com Rosenstone, Behr e Lazarus De acordo com Rosenstone, Behr e
(1996, p. 232), Lazarus (1996, p. 243), a candidatura de
“os 73 milhões de dólares que Perot Perot não desempenhou um papel de fiel
despejou na sua candidatura eram da balança em 1992. “Bill Clinton teria
simplesmente a maior soma de sido eleito presidente mesmo que Perot
recursos jamais investida por um não tivesse concorrido... Ele impediu que
candidato de terceiro partido para Clinton recebesse a maioria absoluta dos
uma campanha à Casa Branca. Com votos, ficando Clinton com apenas 43% do
dinheiro, Perot pôde construir uma voto popular”.
organização para a campanha, pôde Lamentavelmente, Perot não buscou
financiar movimentos populares para dar sequência ao sucesso obtido no pleito
acessar as cédulas em todos os esta- com a consolidação de sua legenda como
dos e pôde também comprar tempo terceiro partido viável. Como observou
nas redes de televisão para veicular Wattenberg (1996, p. 214), embora Ross
seus anúncios políticos. Com dinhei- Perot tenha proposto a formação de um
ro veio a credibilidade”. terceiro partido, ele concebeu a agremiação
A campanha eleitoral de Perot em 1992 apenas como um veículo para sua indicação
foi baseada em sua crítica aos dois grandes como candidato à presidência.
partidos dos Estados Unidos. Segundo ele, “Essa organização não preenche os
para que o problema do déficit nacional requisitos de um partido político, já

52 Revista de Informação Legislativa


que não busca controlar o aparelho radicais avanços na questão da liberdade
governamental do país. Trata-se nos Estados Unidos foram propostas de
apenas de um mecanismo para orga- terceiros partidos antes de serem coopta-
nizar o voto de descontentes e, assim, das pelos grandes partidos. Foi o caso do
influenciar o resultado da competição Partido da Proibição no que diz respeito ao
entre os dois maiores partidos, além sufrágio feminino. A lógica por trás dessa
de apresentar-se como veículo para função é bastante simples. Os partidos
um candidato independente concor- majoritários, para assegurarem seu nível
rer às eleições”. de apoio generalizado, evitarão abordar
A experiência de Ross Perot deixa claro as questões que possam dividir e alienar
que as barreiras impostas aos terceiros par- segmentos de seu eleitorado. Os partidos
tidos pelo sistema partidário dos Estados pequenos não têm esse problema, pois con-
Unidos não são nada negligenciáveis. Pe- tam com apoio mínimo do eleitorado.
rot atraiu para sua candidatura um grupo Contudo, devemos ressaltar que o fato
substancial de eleitores insatisfeitos com o de um terceiro partido levantar uma ban-
sistema político e tinha o dinheiro neces- deira que posteriormente é cooptada por
sário para pagar pelos custos associados um partido majoritário não implica que o
à superação da maioria das barreiras que sucesso eleitoral de uma bandeira possa ser
mantêm os terceiros partidos à margem da atribuído unicamente ao esforço do terceiro
política partidária no país. Mesmo assim, partido. Os grupos de interesse são, em
ele não conseguiu superar a barreira do co- geral, mais poderosos patrocinadores de
légio eleitoral. No fim, Perot não represen- reformas e de bandeiras do que os terceiros
tou nenhuma ameaça ao predomínio das partidos e a cooptação de uma questão por
duas grandes legendas do bipartidarismo um partido majoritário pode muito bem
norte-americano. ser uma reação ao trabalho de grupos de
interesse.
Uma segunda função dos terceiros
5. As perspectivas para os terceiros
partidos é prover aos descontentes uma
partidos nos Estados Unidos
avenida de acesso ao sistema. Diversos gru-
A julgar pela lista de barreiras operando pos dentro de grandes partidos encontram
em conjunto contra os terceiros partidos, nos terceiros partidos um refúgio para sua
não seria de se estranhar que a viabiliza- defecção, bem como um canal com o qual
ção desses partidos no sistema partidário pressionam os primeiros a aceitarem uma
norte-americano fosse considerada remota. agenda reformista. Hazlett II (1992, p. 32)
Defensores do status quo afirmam que a ressalta que, apesar dos muitos obstáculos
viabilidade não deveria necessariamente que enfrentam, “os partidos pequenos
ser um objetivo a ser perseguido pelos podem forçar os partidos majoritários a
terceiros partidos, uma vez que essas realizarem importantes mudanças de po-
agremiações políticas já desempenham um lítica, absorvendo novos apoios e evitando
papel importante no sistema. Como Leon a ameaça de serem suplantados por um
Epstein (1967, p. 68) explica, um terceiro terceiro partido”.
partido é, de fato, “um elemento funcional A terceira função é a de desempenhar
na competição entre dois partidos”. Em o papel de válvula de escape do sistema
primeiro lugar, terceiros partidos são canais bipartidário. Com os terceiros partidos
para apresentação de ideias reformistas representando posições radicais no espec-
para o eleitorado, para o governo e para os tro político, tanto de esquerda quanto de
grandes partidos. Como Gillespie (1993, p. direita, os partidos majoritários veem desa-
24) observa, muitos dos mais nobres e mais fogadas as pressões por pureza ideológica.

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Assim, podem manter o amplo escopo de Lowi. Escrevendo a partir da perspectiva de
suas plataformas e evitar divisões internas um ativista do Partido Progressista, ele não
baseadas em ideologia. Não é mera coinci- apenas acredita que o segmento progres-
dência que os dois partidos majoritários nos sista do eleitorado possa ser mobilizado,
Estados Unidos não sejam muito diferentes da mesma forma que os conservadores
um do outro com respeito a ideologia. fizeram com movimentos como o Direito
Finalmente, a literatura especializada à Vida. Para ele, tal mobilização pode ser
cita como uma função dos terceiros par- a semente de um partido mais forte que
tidos a de servir como fiel da balança nas venha a desafiar o atual sistema.
eleições. Se conseguir um bom desempenho Referindo-se às eleições de 1996, Reynol-
eleitoral, um terceiro partido pode vir a ser ds (1997, p. 327) ressalta que as pesquisas
um fator decisivo em uma eleição, ao atrair de opinião mostram que somente 32% do
um número substancial de eleitores dos público está satisfeito com as alternativas
partidos majoritários. de candidatos oferecidas pelos dois grandes
Há estudiosos que se opõem a tal con- partidos. Para Reynolds, “quase dois terços
cepção de terceiros partidos, acreditando do eleitorado gostaria de ver um terceiro
que o sistema atual deveria ser reformado. partido alternativo” na competição. Como
Lowi (1995, p. 50) é, possivelmente, o mais filiado fiel ao Partido Progressista, ele
conhecido dos críticos do bipartidarismo espera que seu partido venha preencher
norte-americano. Para ele, os dois grandes essa lacuna.
partidos dos Estados Unidos atrofiaram Quaisquer que sejam as esperanças dos
“porque ambos estão no poder tempo defensores da alternativa de um terceiro
demais... Os partidos Republicano e De- partido para o atual sistema bipartidário
mocrata encontram-se imobilizados por norte-americano, e a despeito da existência
prometeram coisas demais a gente demais”. de um número substancial de eleitores in-
Segundo Lowi (1995, p. 52), um sistema satisfeitos com os dois grandes partidos, as
tripartidário seria mais coerente, pois os evidências encontradas na literatura da ci-
partidos que competem por uma plurali- ência política sobre o assunto sugerem que
dade de votos apresentariam posições mais mudanças no status quo não virão com faci-
firmes sobre os muitos assuntos da agenda lidade, se é que sejam sequer possíveis.
política. “Num sistema tripartidário, até
os grandes partidos teriam incentivos
fortes para serem mais claramente progra- Referências
máticos... Cada partido seria um partido
ALDRICH, John H. Why parties? the origins and trans-
responsável”. formation of party politics in America. Chicago: The
Lowi não acredita que sua concepção University of Chicago press, 1995.
de um sistema partidário norte-americano BEHR, Roy L.; LAZARUS, Edward H.; ROSEN-
constituído por três partidos seja uma STONE, Steven. Third parties in America: citizen
utopia. Ele observa que uma porção sig- response to major party failure. Princeton: Princeton
nificativa da população não está satisfeita University Press, 1996.
com nenhum dos dois grandes partidos do CENTER FOR RESPONSIBLE POLITICS. Banking on
país. À medida que o compromisso pessoal becoming president. Washington, D.C., 2009. Disponível
do eleitor com o partido declina e a des- em: <www.opensecrets.org/pres08/index/php>.
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aumentar, cresce também o potencial para cans don’t vote. New York: Pantheon Books, 1989.
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Unbounded, compartilha da opinião de 1999.

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