Académique Documents
Professionnel Documents
Culture Documents
***
Queridos irmãos e irmãs:
Santa Gertrudes a Grande, sobre quem eu gostaria de vos falar hoje, leva-nos
também ao mosteiro de Helfta esta semana; lá nasceram algumas das obras-
primas da literatura religiosa feminina latino-germânica. A esse mundo pertence
Gertrudes, uma das místicas mais famosas, única mulher da Alemanha que
tem o apelativo de "a Grande", pela sua estatura cultural e evangélica: com a
sua vida e o seu pensamento, ela incidiu de forma singular na espiritualidade
cristã. É uma mulher excepcional, dotada de talentos naturais particulares e de
extraordinários dons da graça, de profundíssima humildade e ardente zelo pela
salvação do próximo, de íntima comunhão com Deus na contemplação e
disponibilidade para socorrer os necessitados.
Ela nasceu em 6 de Janeiro de 1256, festa da Epifania, mas não se sabe nada
sobre os seus pais nem sobre o lugar de nascimento. Gertrudes escreve que o
próprio Senhor lhe revela o sentido desse seu primeiro desapego; afirma que o
Senhor teria dito: "Eu a escolhi como minha morada e alegro-me porque tudo o
que há de belo nela é obra minha (...). Precisamente por esta razão, afastei-a
de todos os seus parentes, para que ninguém a amasse por motivo de
consanguinidade e eu fosse a única razão do afecto que a move" (As
revelações, I, 16, Sena, 1994, p. 76-77).
Aos 5 anos, em 1261, entrou no mosteiro, como era costume naquela época,
para a formação e o estudo. Lá transcorreu toda a sua existência, da qual ela
mesma indica as etapas mais significativas. Nas suas memórias, recorda que o
Senhor a preservou com paciência generosa e infinita misericórdia,
esquecendo dos anos da sua infância, adolescência e juventude, transcorridos
– escreve – "em tal cegueira de mente, que eu teria sido capaz (...) de pensar,
dizer ou fazer, sem nenhum remorso, o que me desse vontade, aonde quer que
fosse, se Tu não me tivesses preservado, seja com um horror inerente pelo mal
e uma natural inclinação ao bem, seja com a vigilância externa dos demais. Eu
ter-me-ia comportado como uma pagã (...) e isso mesmo Tu querendo que,
desde a infância, desde o meu quinto ano de idade, eu habitasse no santuário
abençoado da religião, para ser educada entre os teus amigos mais devotos"
(Ibid., II, 23 140s).
Em particular, dois favores lhe foram mais queridos que qualquer outro, como
escreveu a própria Gertrudes: "Os estigmas das tuas chagas, que imprimiste
em mim como jóias preciosas no coração, e a profunda e saudável ferida de
amor com que o marcaste. Tu me inundaste com estes Teus dons de tanta
alegria que, ainda que eu tivesse de viver mil anos sem nenhum consolo, nem
interior nem exterior, a sua lembrança bastaria para reconfortar-me, iluminar-
me, encher-me de gratidão. Quiseste também introduzir-me na inestimável
intimidade da Tua amizade, abrindo-me de muitas formas esse sacrário
nobilíssimo da Tua divindade, que é o Teu Coração divino (...). A esse cúmulo
de benefícios, acrescentaste o de dar-me por advogada a Santíssima Virgem
Maria, tua Mãe, e de ter-me recomendado frequentemente seu afecto como o
mais fiel dos esposos poderia recomendar à sua própria mãe sua esposa
querida" (Ibid., II, 23, p. 145).
Parece-me óbvio que estas não são somente coisas do passado, históricas,
mas que a existência de Santa Gertrudes continua sendo uma escola de vida
cristã, de recto caminho, que nos mostra que o centro de uma vida feliz, de
uma vida verdadeira, é a amizade com Jesus, o Senhor. E essa amizade
aprende-se no amor pela Sagrada Escritura, no amor pela liturgia, na fé
profunda, no amor a Maria, de forma que se conheça cada vez mais realmente
o próprio Deus e, assim, a verdadeira felicidade, a meta da nossa vida.
Obrigado.