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TERRA, ÁGUA E TERRITÓRIO: CONFLITOS NA BACIA DO RIO PARAÍBAi

Rodrigo Brito da Silvaii


Universidade Federal da Paraíba-UFPB
rodrigogeo@live.com

Maria Franco Garciaiii


Universidade Federal da Paraíba-UFPB
mmartilho@gmail.com

Resumo

A luta pela terra e pela água na Paraíba não é um fenômeno recente, ela é concomitante ao
processo de formação territorial do próprio estado. Hoje, a concentração de terras e capitais e o
acesso a água nas mãos de uma minoria junto à existência de uma grande quantidade de famílias
de trabalhadores rurais, sem terras, camponeses e posseiros é a expressão da luta de classes e
dos conflitos territoriais no estado. Nos municípios que configuram a Bacia Hidrográfica do Rio
Paraíba essa disputa não é diferente. Neste trabalho apresentamos uma análise dos conflitos no
campo nos 85 dos municípios desse território, a partir dos dados fornecidos pelos relatórios
anuais da Comissão Pastoral da Terra (CPT), no período de 2002 a 2010, do CENSO
Agropecuário de 2009 e da Base de dados Cidades@ do IBGE de 2011.

Palavras- chave: Bacia hidrográfica. Conflito territorial. Questão agrária. Questão da água.
Paraíba.

Introdução

A pesquisa que apresentamos na continuação nos coloca diante de diferentes formas que
os conflitos sociais assumem no território. O recorte dessa manifestação é a Bacia
Hidrográfica do Rio Paraíba, no estado homônimo. Ocupa o segundo lugar em extensão
no estado com uma área total de 20.071,83 Km², o que representa 38% do seu território.
A bacia está composta pela sub-bacia do Rio Taperoá e dividida em três regiões: Alto
Paraíba, Médio Paraíba e Baixo Paraíba. Uma das características deste território é a sua
alta densidade demográfica, já que nela estão incluídas as cidades mais populosas do
estado, como a própria capital, João Pessoa e Campina Grande, o segundo maior centro
urbano. Trata-se de uma bacia estadual que tem toda sua rede de drenagem nos limites
político-administrativos do estado. Os 85 (oitenta e cinco) municípios que configuram
seu território se localizam nas mesorregiões da Borborema, do Agreste e do Litoral, por
isso é considerada uma das mais importantes do Semi-árido nordestino (AESA, 2008).
Nossa proposta é compreender a dinâmica das ocupações de terra protagonizas pelos
movimentos sociais de trabalhadores rurais; o significado da constituição de

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acampamentos de famílias sem terra em luta pela Reforma Agrária na Bacia; as formas
de violência contra os trabalhadores rurais, seja pelo próprio aparelho do Estado por
meio de despejos e desocupações, seja pelas milícias armadas a serviço dos grandes
proprietários de terras e latifundiários; as relações de trabalho e exploração dos
cortadores de cana-de-açúcar nos grandes empreendimentos do agronegócio na Zona da
Mata no Baixo Curso do Rio Paraíba e; as tensões e disputas pelo uso e acesso á água
na Bacia. Para isso, nos apoiamos no levantamento de dados secundários e na
construção de uma base que nos possibilite a criação de um Sistema de Informações
Geográficas (SIG) voltado para a análise dos conflitos territoriais na Bacia. Um dos
resultados parciais deste trabalho é a produção de mapas temáticos e cartogramas com a
espacialização dos conflitos.
Segundo a CPT-Nacional (2011) os conflitos por terra e água, desde a perspectiva do
trabalho, ou seja, dos trabalhadores rurais e camponeses, são ações de restistencia e
enfrentamento pela posse, uso e propriedade da terra e da água e pelo seu acesso.
Analisar o impato dos conflitos sobre o território e, nomeadamente, na vida das famílias
de trabalhadores e camponeses envolvidos é o desafio final da pesquisa na que está
inserido este trabalho.

Água, terra e trabalho: dimensões da questão agrária na Bacia do Rio Paraíba

Água e terra são elementos vitais. A água, e o seu ciclo, estão intimamente ligados ao
nascimento e conservação das diferentes formas de vida que configuram o espaço
geográfico, entre elas a vida humana. Todavia, as barreiras físicas, político-
administrativas e econômico-sociais que impossibilitam o acesso socialmente justo a
esse recurso vital, tornam fenômenos de origem natural, tais como as enchentes ou a
ocorrência de secas, fatos sociais.
Atendendo a essas condições, neste trabalho concordamos com os autores que defendem
que a análise da “questão da água” para uma determinada região, não pode se restringir
ao balanço entre a sua oferta e a sua demanda (REBOUÇAS,1997). Deve, no entanto,
colocar á luz da leitura crítica as relações que se estabelecem entre os diferentes
recursos hídricos presentes nesse território com outros recursos vitais, como a própria
terra, e com determinações sociais e históricas que se materializam nesse recorte
territorial, todavia tramadas em escalas espaço-temporais outras (SMITH, 2003).

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Da mesma forma a “questão da terra” ou se preferimos a “questão agrária” nos remete a
uma problemática social em volta de um recurso natural limitado. Mas sobretudo, de
uma forma da natureza primeira, ou originária, útil ao desenvolvimento da vida em uma
mercadoria com um valor de troca no mercado capitalista de terra. Troca esta que, por
ser capitalista, essencialmente é uma troca desigual e injusta, reflexo de uma sociedade
organizada em classes desiguais e injustas. Essa constatação leva-nos a refletir sobre a
natureza da propriedade privada da terra no Brasil, que tem a sua origem na forma de
propriedade histórica do capitalismo.
A divisão social do trabalho e a propriedade privada são expressões idênticas para Marx
e Engels (2007). A divisão inicia-se na família, com a diferencia de tarefas por gêneros,
prossegue na distinção entre agricultura e pastoreio, entre ambas e o comercio,
conduzindo á separação entre o campo e a cidade. Todavia, em cada uma das distinções
operam novas divisões sociais do trabalho. Quando Marx se refere á divisão do trabalho
não se reduz a uma simples divisão de tarefas, senão que chama a atenção sobre a
separação entre as condições e os instrumentos de trabalho, ou meios de produção, e o
próprio trabalho, ou forças produtivas. Assim as diferentes formas de propriedade que
se desenvolveram na historia da humanidade, remetem as diferentes formas de relação
entre os meios de produção e as forças produtivas, ou seja, as diferentes formas de
divisão social do trabalho. A propriedade privada capitalista é uma dessas formas
históricas que realiza uma separação radical entre proprietários dos meios de produção e
os despossuídos desses meios, os trabalhadores. A sociedade para Marx (2004) se
constitui a partir de condições materiais de produção e da divisão social do trabalho.
Assim, mudanças históricas dessas condições de produção ou dessas formas de
propriedade, dependem da ação concreta dos homens no tempo. A origem da
propriedade privada da terra no Brasil é decorrente do processo de formação territorial
colonial, que submeteu á terá sob a lógica da exploração econômica capitalista. Seu
marco jurídico foi a Lei de Terras de 1845 que legitimou a compra e venda como forma
de acesso à terra. Todavia, no caso brasileiro a constituição da propriedade privada da
terra se fundamenta na concepção de que o desenvolvimento e avanço do capitalismo no
campo se faz de forma desigual, combinada e contraditória e tem na sua raiz o caráter
rentista (MARTINS, J.S: 1994). Isto quer dizer que a concentração privada da terra no
Brasil atua como processo de concentração de riqueza e, portanto, de capital. Para este
autor, no Brasil:

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(...) o capital transformou-se em proprietário da terra [...] agora e aqui
estamos diante de um modelo antidemocrático de desenvolvimento
capitalista, apoiado num pacto político, gestado durante a ditadura militar,
que casou numa só figura única latifundiários e capitalistas (1994, pág.15)

Diante dessas condições, no nosso estudo concordamos com Oliveira, A. U. (2009)


quando nos alerta sobre a necessidade de entender os novos mecanismos usados pelo
capital para sujeitar a renda da terra aos seus desígnios, sem, necessariamente, ter que se
apropriar de forma direta da propriedade da terra.
Recapitulando, água e terra são discutidas neste trabalho, nem como recursos naturais
nem como apenas recursos econômicos e sim como condições de existência social.
Entretanto, reforçamos a idéia de que para entender como ambas se relacionam é
necessário colocar em discussão a própria sociedade. Assim, desde o ponto de vista
metodológico recusamos as determinações físico–ambientais que servem de base para
discursos da “cultura da seca” para a região Nordeste no Brasil, onde se localiza a nossa
área de pesquisa, e nos amparamos nas análises que procuram compreender a relação
homem – natureza a partir da mediação do trabalho. Por ser a forma histórica
contemporânea o capitalismo é no seu contexto que a relação social entre o capital e o
trabalho é estudada, e esta relação social em relação ao desigual uso e acesso à terra e
água das classes envolvidas. Relações sociais que entendemos constituem o motor dos
conflitos territoriais em curso já que, se bem que as condições físico-climáticas que
predominam no Nordeste, e especificamente na Bacia do Rio Paraíba no seu Alto e
Médio curso, podem, relativamente dificultar a vida, não entanto, não podem ser
responsabilizadas pelo quadro de pobreza, exclusão, espoliação, exploração e
manipulação de um grande número de famílias de trabalhadores do semi-árido
paraibano.

O semi-árido na Bacia do Rio Paraíba

A zona de incidência das secas foi regionaliza por primeira vez pela Superintendência
do Desenvolvimento do Nordeste, SUDENEiv, na década de 1950 e definida como o
Polígono das Secas. Tal delimitação foi modificada no decorrer do tempo com o
objetivo de incluir municípios que apresentavam características similares e que não
foram contemplados, mas que demandavam o mesmo tratamento nas políticas de
crédito e benefícios fiscais conferidos ao semi-árido. Para muitos autores a delimitação
desse polígono respondeu, na sua origem, a critérios mais políticos do que ecológicos

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(REBOUÇAS, 1997). A última modificação dos municípios do semi-árido foi feita em
2005 pelo Ministério de Integração Nacional (MI), quem assumiu essa atribuição depois
da extinção da SUDENE em 2001. Essa nova delimitação está representada na Figura
02 (pág.07). Uma das questões que levaram ao MI a modificar esse perímetro
ampliando-o foi a constatação da insuficiência do índice pluviométrico como critério
exclusivo de seleção de municípios, como tinha sido considerado até o momento v.
Segundo o relatório do MI sobre a Nova Delimitação o semi-árido Brasileiro da
Secretaria de Políticas e Desenvolvimento Regional (2006):

(...) conhecimentos acumulados sobre o clima permitem concluir não ser a


falta de chuvas a responsável pela oferta insuficiente de água na região, mas
sua má distribuição, associada a uma alta taxa de evapotranspiração, que
resultam no fenômeno da seca, a qual periodicamente assola a população da
região (grifo nosso).

A nova delimitação além dos 1.031 já existentes passaram a fazer parte 102 novos, o
que representa um acréscimo de 8,66% da área total, que passou a ser de 969.589,4
Km2. Entre outros benefícios concedido aos municípios do “novo semi-árido” está a
disposição de crédito com juros de 1% ao ano, com prazo de pagamento de 10 anos e
carência de 03, para os pequenos agricultores familiares contemplados pelo Programa
Nacional de Assistência à Agricultura Familiar (PRONAF).
Na Paraíba dos 223 municípios que compõem o território estadual, desde a antiga
delimitação, 170 municípios se encontram no semi-árido, o significa 76,3 % do número
de municípios do estado e 86,6% dos Km2 de área total. Desses 170 municípios 61
encontram-se na Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba, repartidos entre a Sub-bacia do
Taperoá e o Alto e Médio Paraíba.

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Figura 02: Nova delimitação do semi-árido brasileiro, 2005

Fonte: MI, 2006

A importância territorial da região semi-árida na Bacia fica clara na Tabela 01 e no


Gráfico 01 a seguir:

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Tabela 01: Municípios da bacia hidrográfica do rio Paraíba segundo a sua
localização na região semi-árida e zona da mata
MUNICÍPIOS
MUNICÍPIOS LOCALIZADOS NO SEMIARIDO LOCALIZADOS NA
ZONA DA MATA
Alcantil Junco do Seridó Teixeira Araçagi
Amparo Lagoa Seca Tenório Bayeux
Areial Livramento Umbuzeiro Cabedelo
Aroeiras Massaranduba Zabelê Caldas Brandão
Assunção Mogeiro TOTAL 61 Cruz do Espirito Santo
Barra de Santa Rosa Montadas Gurinhém
Barra de Santana Monteiro João Pessoa
Barra de São Miguel Natuba Juarez Távora
Boa Vista Olivedos Juripiranga
Boqueirão Ouro Velho Lucena
Cabaceiras Parari Mari
Cacimba de Areia Pocinhos Mulungu
Cacimbas Prata Pedras de Fogo
Camalaú Puxinanã Pilar
Campina Grande Queimadas Riachão do Poço
Caraúbas Riachão do Bacamarte Santa Rita
Caturité Riacho de Santo Antônio Santo André
Congo Salgadinho São João do Cariri
Coxixola Salgado de São Félix São José dos Cordeiros
Cubati Santa Cecília São José dos Ramos
Desterro São Domingos do Cariri São Miguel de Taipú
Fagundes São João do Tigre Sapé
Gado Bravo São Sebastião do Serra Redonda
Umbuzeiro
Gurjão Seridó Sobrado
Ingá Serra Branca TOTAL 24
Itabaiana Soledade

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Grafico 01: Número de municipios da bacía hidrográfica do río paraíba segundo a
sua localização na região semi-árida e zona da mata

Fonte: MI, 2006


Org.: SILVA, R.B.

A Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba recorte territorial de pesquisa

A Paraíba é um dos menores estados em extensão territorial do Brasil, todavia está


dividido em onze bacias hidrográficas: Rio Paraíba, Rio Abiaí, Rio Gramame, Rio
Miriri, Rio Mamanguape, Rio Camaratuba, Rio Guaju, Rio Piranhas, Rio Curimataú,
Rio Jacu e Rio Trairi. As cinco últimas são de domínio federal o que significa que a
sua gestão não se corresponde com nenhum dos estados por onde passam, que no
mínimo são dois (PARAÍBA, 2006).
A Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba está dividida, como apontamos anteriormente e
podemos observar na Figura 03 a seguir, na sub-bacia do Rio Taperoá e em três regiões
hidrográficas: Alto, Médio e Baixo Paraíba. Nesse recorte ocorrem, predominantemente,
dois sistemas aqüíferos: o sistema Paraíba-Pernambuco no Baixo curso e o sistema
cristalino no Médio e no Alto curso, ambos na região semi-árida do estado.
No que se refere á regionalização da gerencia das bacias hidrográficas no estado, o
território foi dividido em quatro áreas. A bacia do Rio Paraíba é contemplada, no curso
Baixo, pela atuação da Área I, que tem a sua sede em João Pessoa e pela Área II, com
sede em Campina Grande, que contempla as ações de gestão das águas no Alto e Médio
Paraíba.

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A Agencia Executiva de Gestão de Águas do Estado da Paraíba (AESA), criada em
2005, confere a essas áreas de gerencia as atribuições de administrar o uso, a oferta e a
preservação dos recursos hídricos; manter o cadastro atualizado dos usuários de água e
das obras hidráulicas; receber os processos de solicitação de outorga de utilização de
água e de implementação de obras e serviços de oferta hídrica; encaminhar processos
para penalizar infratores da legislação sobre utilização dos recursos hídricos; apoiar e
colaborar com a implantação de organizações de usuários de água e; fiscalizar os
serviços de manutenção e operação dos reservatórios de água. (PARAÍBA, 2006).

Figura 02: Bacia hidrográfica do rio Paraíba

Fonte: AESA, 2010

Os conflitos territoriais na Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba

Para a Comissão Pastoral da Terra (CPT), fonte dos dados sobre os conflitos territoriais
que apresentaremos neste item, os conflitos são principalmente ações de resistência a
embates. Essas respostas sociais acontecem tanto no espaço agrário como no urbano. Os
sujeitos que protagonizam tais conflitos são tanto coletividades, como podem ser as

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classes sociais antagônicas (capitalistas x trabalhadores) quanto sujeitos que
individualmente protagonizam distensões, desencontros e brigas por interesses
individuais. Também os conflitos podem ser gerados a partir da ausência ou a má gestão
de política publica, como é o caso dos enfrentamentos entre posseiros e sem terras com
empreiteiras na transposição do Rio São Francisco. Todavia, para a CPT (2010) os
conflitos por terra são:

(...) ações de resistência e enfrentamento pela posse, uso e propriedade da


terra e pelo acesso quando envolvem posseiros, assentados, quilombolas,
parceiros, pequenos arrendatários, pequenos proprietários, ocupantes, sem
terra, seringueiros, quebradeiras de coco babaçu, castanheiros, faxinalenses,
etc. (pág. 07)

No processo de pesquisa identificamos as seguintes ocorrências de conflitos territoriais:


ocupações de terras, ocupações de prédios e espaços públicos, acampamentos e
existência de áreas em litígio. As manifestações, ameaças de morte e os assassinatos de
trabalhadores e lideranças camponesas são desdobramentos do embate das classes em
conflito no campo. A categoria de conflitos por terra, ainda engloba ocupações e os
acampamentos, a primeira sendo classificada como ações coletivas de famílias sem
terra, reivindicam as terras que não cumprem a sua função social, e acampamentos, são
locais de luta fruto de ações coletivas, geralmente localizadas no campo, mas também
existentes em áreas urbanas, os as famílias sem terra, organizada em movimentos
sociais, reivindicam assentamentos. Também são registradas diversas formas de
violência praticadas contra trabalhadores e trabalhadoras dentre elas: assassinatos,
tentativas de assassinatos, ameaças de morte, prisões e outras.
Constrangimento, agressão física ou moral, exercida sobre os trabalhadores e seus
aliados é caracterizado como violência, que é encontrada em diferentes tipos de
conflitos sociais do campo. Nos municípios da bacia hidrográfica do Rio Paraíba essa
disputa acontece.
A ocupação do território brasileiro e conseqüentemente paraibano se deu historicamente
de forma desigual. Isso reflete no elevado índice de concentração de terra, e a sua
manutenção no decorrer das décadas, como mostra a Tabela 02 a seguir:
Podemos observar como o indicador de distribuição da terra em 15 anos apenas reflete a
“manutenção da desigualdade”.A análise do Índice de GINI, utilizado para medir os
contrastes na distribuição do uso da terra, permite observar as variações ocorridas entre
os anos de 1985 a 2006. Quanto mais próximo do um (1) este índice se encontra maior é

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a concentração de terra. Zero (0) indica que a distribuição é clara, sem concentração de
terra.

Tabela 02 – Evolução do índice de GINI no Brasil e na Paraíba – 1985/2006


1985 1995 2006
Brasil 0,857 0,856 0,872
Paraíba 0,842 0,834 0,822
Fonte: IBGE, Censo Agropecuário 1985/2006.
Org.: SILVA, Rodrigo Brito da.

Esses dados revelam a extrema concentração fundiária oriunda do processo histórico de


formação do espaço agrário paraibano. Uma estrutura fundiária concentrada em mãos de
poucos produtores e/ou proprietários significa a existência de um número enorme de
famílias sem terra ou com pouca terra onde viver e trabalhar. Diante dessa condição de
existência as famílias de trabalhadores se organizam em movimentos sociais, ou nas
comissões mais combativas da Igreja Católica, e ocupam terras improdutivas e/ou
devolutas visando a sua conquista e constituição de territórios de Reforma Agrária. A
ocupação de terras ocorre seguida de acampamentos. Entendemos que esses territórios
de luta almejam conquistar territórios de vida e trabalho, como os assentamentos de
Reforma Agrária, e não apenas o lucro.
Caracterizados por uma grande confiança, os acampados constroem dia apos dia, com
suas relações políticas com o Estado, o desejo de conseguir sua terra. As famílias
acampam sem nenhuma estrutura, esperando que a terra seja desapropriada para que ela
possa cumprir o seu papel social com o seu trabalho garantir a subsistência da sua
família. Só nos municípios que compõe a bacia 640 famílias estavam vivendo, até o
momento desta pesquisa, em acampamentos com condições precárias. Podemos
observar a espacialização desses acampamentos e a quantidade de famílias segundo
município nos Mapas 01 e 02 a seguir:

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Mapa 01- Espacialização dos acampamentos nos municípios da bacia hidrográfica
do rio Paraíba- PB, 2010

Fonte: CPT, 2010


Autor: SILVA, Rodrigo Brito da.

Famílias camponesas que resistem em abandonar a sua condição e forma de vida


continuam dia após dia na esperança de serem assentadas, e não só sair do barraco como
também de poder trabalhar, produzir o seu próprio alimento.
Durante a pesquisa, constatamos que o acampamento com maior número de famílias,
registrado segundo os dados da CPT, é o acampamento, ao lado da Fazenda Santo
André dos Angicos no município de São Miguel de Taipú- PB, com 280 (duzentas e
oitenta) famílias acampadas.
A espacialização das famílias sem terra em situação de acampamento pode se observada
no Mapa 02:

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Mapa 2 – Número de famílias acampadas segundo município na bacia hidrográfica
do rio Paraíba- PB, 2010

Fonte: CPT, 2010


Autor: SILVA, Rodrigo Brito da.

Os conflitos por terra de vida e de trabalho acontecem de forma violenta. É constante a


tentativa de intimidação das lideranças que reivindicam melhores condições de trabalho,
tanto pelo próprio aparelho do Estado por meio de despejos e desocupações, como pelas
milícias armadas a serviço dos grandes proprietários de terra e latifundiários que não vê
limites para conseguir os seus objetivos chegando a usar de formas cruéis. Os que lutam
pela Reforma Agraria são corajosos, pois levam a vida sobre o risco de serem
assassinados, e são ameaçados famílias inteiras e também, todos os tipos de liderança,
dos sem terra, ao ex-superintendente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma
Agrária (INCRA) no nosso recorte temporal, foi registrado a ameaça dentre muitos do
Frei Anastácio Ribeiro, ex-superintendente do INCRA-PB e hoje deputado estadual da
Paraíba, mostrando mais uma vez a audácia dos grandes proprietários e não ter limites
para conseguir seus objetivos. Comparecem na Tabela 03:

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Tabela 03 – Lideranças políticas e trabalhadores rurais ameaçados de morte nos
anos de 2000 a 2010
MUNICÍPIO NOME DA VITIMA DATA OCUPAÇÃO
Sobrado Antonio Epitácio da Costa 19/09/2000 Sem Terra
Sobrado João Vitor de Oliveira Neto 19/09/2000 Sem Terra
Sobrado Josenilton Carreiro de Melo 19/09/2000 Sem Terra
Sobrado Manoel Paulo 19/09/2000 Sem Terra
Sobrado Roberto Costa Araújo 19/09/2000 Sem Terra
Itabaiana Almir Muniz da Silva 29/06/2002 Liderança
Itabaiana Francisco Moreira da Silva 01/08/2002 Posseiro
Itabaiana Francisco Moreira Filho 01/08/2002 Posseiro
Itabaiana Genildo Alves 01/08/2002 Posseiro
Itabaiana Moacir Muniz da Cruz 01/08/2002 Posseiro
Itabaiana Pedro Muniz da Silva 01/08/2002 Posseiro
Itabaiana Severino Inácio F. da Silva 01/08/2002 Posseiro
João Pessoa Frei Anastácio Ribeiro 18/06/2002 Politico
João Pessoa Pe.Luiz Couto 23/08/2002 Politico
Santa Rita Ivanildo Soares 13/06/2002 Posseiro
Santa Rita José Gomes 13/06/2002 Posseiro
Santa Rita Josias Pereira Nunes 13/06/2002 Posseiro
Ingá João Luiz da Silva Filho 13/06/2002 Posseiro
Mogeiro Frei Anastácio 26/05/2003 Político
Santa Rita Ivanildo Soares da Silva 28/01/2003 Posseiro
Ingá Severino Luiz da Silva 08/12/2007 Liderança
Ingá José Luiz da Silva 09/12/2007 Assentado
Ingá José Luís e família 01/01/2008 Posseiro
Ingá Posseiro da Faz. Salgadinho 04/01/2009 Posseiro

Fonte: CPT
Org.: SILVA, Rodrigo Britoda.

Nem todos que são ameaçados, são assassinados. no que tange a ocorrência de
assassinatos na Bacia, porém nenhum tipo de assassinato deve ser ignorado. Contudo
sabemos bem que esse tipo de prática é bastante ‘comum’ quando falamos de conflitos
territoriais, e que muitos processos ainda estão em andamento, além disso, os
camponeses que são assassinados vítimas de “acidentes”, pese a isso para mascarar os
dados foram registrados três (3) homicídios, em todos os municípios da Bacia. A
espacialização dos assassinatos no campo na Bacia pode ser observada no Mapa 03:

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Mapa 03 - Espacialização das ocorrências de assassinatos por município da bacia
hidrográfica do rio Paraíba- PB

Fonte: CPT, 2010


Autor: SILVA, Rodrigo Brito da.

Na Bacia, como foi apresentado, os conflitos são muitos variados, colocando mais de
4.222 famílias que se encontra sem terra ou em situação de litígio, em confronto direto
com os grandes proprietários de terra, numa área de 22064 km² bem mais que isso, pois
a dificuldade em conseguir dados contínuos é muito difícil, além dos que não foram
registrados, a maioria dos dados fornecidos estão incompletos, impossibilitando a
visualização exata da real situação do campo na Paraíba, esses números em apenas 18
municípios, famílias sem terra, sem comida, sem educação, lutando pela necessidade e
para garantir sua reprodução social, tudo isto dentro de imensidões de terras
improdutivas que estão servindo apenas como forma de reserva de valor e para
especulação imobiliária, terra parada também gera lucro e como ela não morre, não
precisa se preocupar com o tempo, quanto mais a falta de terra para compra aumenta
mais valor as terras para venda tem. E mesmo quando o camponês, sendo obrigado a
trabalhar em fazendas para conseguir a subsistência dele e da família, as leis trabalhistas

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são esquecidas e dão lugar a leis internas da fazenda, os que detêm os meios de
produção estabelecem as leis e salários precários, muito abaixo do que é necessário

Mapa 04 – espacialização dos municípios com famílias em conflito na bacia


hidrográfica do rio Paraíba- PB

Fonte: CPT, 2010


Autor: SILVA, Rodrigo Brito da.

Considerações

Desde articulações com as formas primitivas, passando pelas colônias de produtos


tropicais, ao trabalho escravo na produção que o desenvolvimento capitalista no campo,
se deu voltado ao mercado internacional, e com a abolição da escravidão (1888) a
principal mercadoria agora era e é até hoje a terra, os produtos do tipo “exportação”
como café e a soja, plantados de acordo com as necessidades do mercado Europeu
provocou um prejuízo ao produtos “alimentícios” como o arroz e feijão, esse
“desenvolvimento” acelerado privilegiou poucos e penalizou os trabalhadores rurais, a
maneira como o país está se desenvolvendo tem causado vários danos aos níveis de
renda dos trabalhadores rurais com o desenvolvimento da produção capitalista na

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agricultura tende a haver a utilização de adubos, inseticidas e uma clara robotização, se
tornando a produção mais intensiva sobre o controle do capital. Só a terra não pode ser
produzida a livre arbítrio do capital por isso, que desde que o Brasil foi “descoberto” os
conflitos por terra constrói nossa história “manchada de sangue” e tão recente. No inicio
da colonização se fez grandes doações de terra, para a produção visando o exterior logo
a explicação para os latifúndios,
No inicio do século XIX, a extinção do regime de sesmarias aliada à ausência de outra
legislação regulando a posse das terras devolutas, provocando uma rápida expansão dos
sítios de pequenos produtores, agora interessada num mercado comprador para seus
produtos manufaturados, e não apenas interessado em vender escravos o Brasil proíbe o
tráfico negreiro em 1850, nesse mesmo ano uma nova legislação foi criada definindo o
acesso á propriedade a Lei de Terras, como ficaria conhecida, todas as terras devolutas
só poderiam ser apropriadas mediante a compra e venda e que o governo destinaria os
rendimentos obtidos nessas transições para financiar a vinda de colonos da Europa,
matavam-se assim, dois coelhos com uma só cajadada. (SILVA, J. G, 2007)
Nesse período o crescimento de pequenos proprietários de terra é grande, esses
pequenos produtores têm a escolha de produzir apenas para sua reprodução social, ou
com o desenvolvimento das indústrias no campo brasileiro, fornecer matérias primas a
essas indústrias nascente, uma vez que os latifúndios ainda detém o monopólio doa
produtos de exportação.
A Reforma Agrária só será realizada quando a economia brasileira entrar numa crise
profunda, e a classe dominante não tiver nenhuma saída para superar o desemprego e
conseqüentemente a falta de consumo, consumo esse que faz o sistema capitalista
respirar, hoje o protagonista desta luta tanto na Paraíba como no Brasil, é o MST
(Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) desde sua fundação, o Movimento
Sem Terra se organiza em torno de três objetivos principais: Lutar pela terra, Lutar por
Reforma Agrária, Lutar por uma sociedade mais justa e fraterna. Buscam solucionar os
graves problemas estruturais do nosso País.Como também o CPT ( Comissão Pastoral
da Terra), com ação combativa, contra os latifúndios, a favor do acesso a terra para
trabalhar. Dentro do recorte e a partir dos dados, até o momento é possível perceber que
os municípios que compõem a bacia são organizados, no sentido dos movimentos
sociais e não estão acomodados, pois o numero de manifestações, por exemplo, mais de
150 divididos em vários tipos de reivindicações, como: reforma agraria, combate a

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injustiça e a violência, desapropriação, educação, saúde entre outros. Pelos dados
estimasse por volta de 109,633 entre camponeses e simpatizantes que foram as ruas para
reivindicar seus direitos, principalmente na capital do Estado João Pessoa-PB e em mais
27 estados, os manifestantes foram a diferentes locais, bloquearam estradas, marcharam,
e principalmente ocuparam locais de pode político como: Assembléia Legislativa,
Prefeitura, Centro Administrativo, Câmara Municipal. E os movimentos também tem
suas manifestações que estão em seus calendários e que acontece todos os anos,
exemplo: Romaria da Terra (MST) que luta por injustiças e violência, Protesto Sem
Terrinha (MST), Dia do Trabalhador Rural (CPT,MST) e vários outros que foram
registrados em nossa pesquisa.
Na fase de pesquisa que nos encontramos, e a partir da sistematização dos dados
apresentados neste trabalho, podemos considerar que a classe trabalhadora e camponesa
se expresa hoje na Paraíba, na condição de posseiros, meeiros, assentados de Reforma
Agrária, acampados sem-terra, pequenos arrendatarios, pequenos proprietarios e
ocupantes sem terras. Os dados mostram que, na última década, a incidência de conflitos
na bacia envolveu á classe trabalhadora e camponesa organizada, a partir dos movimentos
sociais e as facções combativas da Igreja Católica, frente aos interesses das oligarquias
rurais dos proprietários tradicionais de terra, junto aos seus aliados de classe, os grandes
grupos capitalistas proprietários do agro negócio da cana-de-açúcar na região da Mata
Paraibana. Todavia, isso não significa que os conflitos territoriais na Bacia estejam
restritos a esta região. O acesso e uso de água no semi-árido se configura um dos embates
de classe que envolve pequenos proprietários e assentados de Reforma Agrária e grupos
empresariais capitalistas voltados para o agro negócio monocultor de grãos.

Notas
______________
i
Este trabalho forma parte do Projeto de construção do Laboratório de Estudos Integrados sobre Água e
Território na Universidade Federal da Paraíba, Campus de João Pessoa, UFPB. Trata-se de uma parceria
entre a UFPB e a Universidad de Sevilla (Espanha), US, financiada pela Agencia Española de
Cooperación Internacional, AECI.
ii
Aluno do Curso de Graduação em Geografia da UFPB, bolsista da AECI e membro do CEGeT-PB
iii
Professora do DGEOC/PPGG da UFPB. Orientadora e Coordenadora do CEGeT-PB
iv
O Polígono das secas foi definido na seca de 1951-52 com 936.993 km2, como área de atuação do
Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS). A Superintendência do Desenvolvimento do
Nordeste (SUDENE) foi criada na seca de 1957-58, com área de atuação de 1.641.000 km2. A SUDENE

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representava uma forma de abordagem técnico-econômica, à medida que a solução hidráulica, perseguida
desde a Colônia que consistiu em construir açudes e perfurar poços, tornou-se luta perdida devido ao seu
manejo político clientelista, atendendo interesse específico de grupos dominantes.
v
A precipitação media anual deveria ser inferior a 800 milímetros.

Referências

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