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09/11/2012

Marco Mello

Revisão em crise!

Como já comentei em outros artigos, o sistema de


revisão por pares, apesar de ter várias vantagens, tem
também sérios problemas. Esses problemas se tornaram
mais graves nos últimos anos, devido a profundas
mudanças no modo como os artigos são publicados.
Hoje, o peer review está nitidamente em crise e é difícil
enxergar uma saída a curto prazo. Essa crise é sentida
principalmente de duas formas: (i) está cada vez mais
difícil conseguir revisores para um artigo e (ii) a maioria
dos revisores atrasa muito a entrega do parecer ou faz o
serviço nas coxas. Neste artigo, comento cinco fatores
que, na minha opinião, levaram a essa crise e como
poderíamos tentar resolver cada um deles.

1. Os temas de pesquisa estão cada vez mais


especializados.
O conhecimento científico avançou muito nos séculos
XIX e XX, e a quantidade de fatos, hipóteses, teses e
teorias acumuladas em cada campo de estudo cresce
exponencialmente, tendo atingido números astronômicos
nas últimas décadas. Isso fez que com que muitos
cientistas se especializassem cada vez mais em suas
linhas de pesquisa, de modo a conseguirem digerir essa
quantidade enorme de informação e também para
aumentarem a chance de fazerem novas descobertas. Isso
tornou difícil hoje em dia achar revisores para um artigo,
que não sejam co-autores freqüentes, ex-orientadores ou
colegas da mesma universidade ou projeto dos autores. É
comum que bons revisores, especializados num
determinado assunto, acabem recebendo o mesmo
manuscrito tosco duas ou mais vezes de diferentes
revistas: você o mata, mas ele sempre volta, igual a um
highlander…

Possíveis soluções: não criar mais revistas hiper-


especializadas, mas sim aumentar o número de revistas,
sem subdividir as áreas. Ou convidar os revisores
pensando em diversificar as especialidades, por exemplo,
pegando um que entende do táxon, outro que entende do
tema e outro que entende dos métodos. Em alguns casos,
é inevitável ter que convidar colegas próximos do autor.

2. Fazer uma revisão dá trabalho demais e você não


ganha nada por ela.

Para fazer uma boa revisão, você precisa acima de tudo


ter muita familiaridade com o tema. Mesmo assim,
revisar um manuscrito científico dá trabalho e representa
uma grande responsabilidade. Até quem tem grande
experiência gasta no mínimo algumas horas com cada
manuscrito. E, no final das contas, a maioria das revistas
nem mesmo te dá acesso à versão final do trabalho. Haja
espírito altruísta para topar ser revisor! Antigamente, era
até um prazer fazer esse serviço, porque sabíamos que
estávamos contribuindo para manter a qualidade da
literatura científica. Contudo, hoje em dia, já que a
maioria das revistas top está em poder das grandes
editoras internacionais, você ainda vê a editora lucrando
rios de dinheiro com um artigo que nasceu a partir de
pesquisas feitas com verbas públicas e de uma revisão
feita gratuitamente. Some-se a isso a pressão do “publish
or perish”, que gera uma enxurrada de trabalhos feitos
porcamente O resultado disso tudo é que cada vez
menos colegas se dispõem a revisar manuscritos e
aqueles que ainda topam o serviço revisam uma
quantidade bem menor do que antigamente.

Possíveis soluções: pessoas funcionam na base de


incentivos. Então os revisores de artigos deveriam passar
a ser remunerados em dinheiro, quando trabalharem para
editoras comerciais. E a revisão de um modo geral,
independente de quem pede o serviço, deveria passar a
contar pontos em nossos currículos acadêmicos,
ajudando a conseguir bolsas, empregos e projetos.

3. Ninguém tem tempo para revisões.

Para conseguir se estabelecer na carreira de cientista, ou


mesmo para se manter competitivo já depois de ter um
emprego, é preciso trabalhar cada vez mais e mais. A
competição por vagas e verbas é feroz e só piora. O
único jeito tem sido estabelecer prioridades e segui-las.
O problema é: quem vai investir tempo e energia em
revisões, se elas não dão retorno financeiro e nem
científico para quem as faz? Melhor escrever cada vez
mais e mais artigos, pois são eles que garantem o pão
nosso de cada dia.
Possíveis soluções: as mesmas comentadas no tópico
anterior. A revisão tem que gerar algum benefício
concreto para o revisor, que não pode se sentir
explorado.

4. Todo mundo quer publicar na mesma meia dúzia


de revistas.

O Culto Apocalíptico do Fator de Impacto criou um


verdadeiro congestionamento nas revistas bem
ranqueadas no Journal Citation Reports. Mesmo havendo
dezenas de revistas científicas na área de Ecologia, todo
mundo quer publicar nas mais citadas, porque as
agências de fomento do Brasil e de alguns outros países
presumem que a única forma de avaliar a qualidade de
uma revista ou de um cientista é através da mais rasteira
cienciometria numerológica. Como eu já disse várias
vezes, deixamos de fazer o nosso jogo para fazermos o
jogo das editoras internacionais; trocamos a seriedade
pela comodidade. Em última instância, são as editoras
que definem hoje quem é um bom cientista ou não. Em
conseqüência desse engarrafamento, algumas revistas
têm filas de artigos tão longas, que fica difícil conseguir
revisores para todos Em alguns casos estamos falando
de vários artigos com o mesmo tema geral esperando
para serem avaliados pela mesma revista.

Possíveis soluções: o mais lógico seria deixar de cultuar


cegamente o fator de impacto, e voltar a escolher revistas
com base em critérios qualitativos, como escopo,
prestígio, viés etc. Como sei que isso não vai acontecer,
pelo menos a curto prazo, outra solução seria largar o
modelo antiquado de revistas impressas, organizadas em
volumes e números, e passar a publicar artigos apenas
em formato eletrônico e em fluxo contínuo. Isso
eliminaria a desculpa da falto de espaço, que tem gerado
sérios problemas.

5. Alguns colegas estão abusando do papel de


revisores.

A competitividade doentia no meio acadêmico, que antes


era um “privilégio” de áreas com maior inserção no
mercado, como a farmacologia, agora contamina todas as
áreas de pesquisa, desde que a cienciometria virou
religião. Nesse ambiente altamente competitivo, alguns
cientistas com mau caráter aproveitam os pedidos de
revisão para sabotarem competidores. Uma revisão é um
prato cheio para quem deseja arruinar ou pelo menos
atrasar as publicações de colegas ou grupos concorrentes,
a fim de conseguir prioridade ou maior visibilidade.
Assim, independente da qualidade do trabalho, o editor
de uma revista pode acabar recebendo para um mesmo
manuscrito um parecer altamente favorável, um
favorável e outro extremamente desfavorável. Se o editor
tiver personalidade e não tiver preguiça, num caso desses
ele vai botar tudo na balança cuidadosamente e conferir
se alguém exagerou e para qual lado. Mas a realidade,
infelizmente, não é essa atualmente. Como as revistas
mais competitivas dão cotas de rejeição aos seus
editores, de modo a diminuir a fila e fazê-la andar mais
rápido artificialmente, eles ficam felizes com qualquer
desculpa para rejeitar um artigo. Com isso, às vezes
basta um parecer sacana para derrubar um trabalho bom.
E há ainda editores altamente arrogantes, que ficam
“nervosinhos” com autores que questionam suas
decisões. Antigamente, quando a relação autor-editor era
mais direta e a competitividade era menor, o diálogo era
mais aberto e produtivo. Agora, os frios sistemas de
submissão online e a competição insana por espaço em
revistas mataram o diálogo
Possíveis soluções: os editores-chefes das revistas devem
cobrar mais seriedade e comprometimento dos editores
de área, botando numa lista negra os que são
notoriamente mal-intencionados (quando você é da área,
é fácil separar o joio do trigo). E os editores de área
devem deixar a preguiça e a arrogância de lado, e passar
a ouvir as queixas dos autores, que muitas vezes têm
fundamento.

Conclusão

Para os autores, publicar está cada vez mais doloroso.


Para os editores, encontrar revisores está cada vez mais
difícil. Para os revisores, fazer revisões compensa cada
vez menos. Para as grandes editoras, o lucro desonesto à
custa de cientistas tolos só cresce. E, para a comunidade
científica como um todo, o estresse só aumenta. Já está
mais do que na hora de acordarmos e repensarmos
algumas práticas editoriais.

Leituras adicionais

Uma praga da ciência brasileira: os artigos de


segunda
Is peer review just a crapshoot?
The DOs and DON’Ts of Selecting Preferred
Reviewers
Is the staggeringly profitable business of scientific
publishing bad for science?

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