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“ENTRE TEXTOS“

Gramática, Interpretação de Texto e Literatura


Arthur Tahan Miguel Torres, Murilo de Almeida Gonçalves e Lucas Limberti

1/2
hexag
SISTEMA DE ENSINO
1º edição
São Paulo
2016
hexag
SISTEMA DE ENSINO

© Hexag Editora, 2016


Direitos desta edição: Hexag Editora Ltda. São Paulo, 2016
Todos os direitos reservados.

Autores
Arthur Tahan Miguel Torres (Gramática)
Murilo de Almeida Gonçalves (Interpretação de texto)
Lucas Limberti (Literatura)

Diretor geral
Herlan Fellini

Coordenador geral
Raphael de Souza Motta

Responsabilidade editorial
Hexag Editora

Diretor editorial
Pedro Tadeu Batista

Revisores
Delano Malta
Ana Paula Chican de Oliveira

Pesquisa iconográfica
Camila Dalafina Coelho

Programação visual
Hexag Editora

Editoração eletrônica
Arthur Tahan Miguel Torres
Bruno Alves Oliveira Cruz
Camila Dalafina Coelho
Eder Carlos Bastos de Lima
Raphael de Souza Motta

Capa
Hexag Editora

Fotos da capa (de cima para baixo)


http://www.fcm.unicamp.br
Acervo digital da USP (versão beta)
http://www.baia-turismo.com

Impressão e acabamento
Imagem Digital

Todas as citações de textos contidas neste livro didático estão de acordo com a legislação, tendo por fim único e exclusivo o
ensino. Caso exista algum texto, a respeito do qual seja necessária a inclusão de informação adicional, ficamos à disposição
para o contato pertinente. Do mesmo modo, fizemos todos os esforços para identificar e localizar os titulares dos direitos sobre
as imagens publicadas e estamos à disposição para suprir eventual omissão de crédito em futuras edições.
O material de publicidade e propaganda reproduzido nesta obra está sendo usado apenas para fins didáticos, não represen-
tando qualquer tipo de recomendação de produtos ou empresas por parte do(s) autor(es) e da editora.

2016
Todos os direitos reservados por Hexag Editora Ltda.
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CEP: 01302-000
Telefone: (11) 3259-5005
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CARO ALUNO,
O Hexag Medicina é referência em preparação pré-vestibular de candidatos à carreira de Medicina. Desde 2010,
são centenas de aprovações nos principais vestibulares de Medicina no Estado de São Paulo e em todo Brasil.
Ao atualizar sua coleção de livros para 2016, o Hexag considerou o principal diferencial em relação aos
concorrentes: a sua exclusiva metodologia fundamentada em três pontos – período integral, estudo orientado
(E.O.) e salas reduzidas.
O material didático foi, mais uma vez, aperfeiçoado e seu conteúdo enriquecido, inclusive com questões
recentes dos principais vestibulares 2016.
Esteticamente, houve uma melhora em seu layout, na definição das imagens e também na utilização de cores.
No total, são 61 livros, distribuídos da seguinte forma:
§§ 21 livros de Ciências da Natureza e suas tecnologias (Biologia, Física e Química);
§§ 14 livros de Ciências Humanas e suas tecnologias (História e Geografia);
§§ 07 livros de Linguagens, Códigos e suas tecnologias (Gramática, Literatura e Inglês);
§§ 07 livros de Matemática e suas tecnologias;
§§ 04 livros de Sociologia e Filosofia;
§§ 04 livros “Entre Aspas” (Obras Literárias da Fuvest e Unicamp);
§§ 02 livros “Entre Frases” (Estudo da Escrita – Redação);
§§ 02 livros “Entre Textos” (Interpretação de Texto).
O conteúdo dos livros foi organizado por aulas. Cada assunto contém uma rica teoria, que contempla de
forma objetiva o que o aluno realmente necessita assimilar para o seu êxito nos principais vestibulares e Enem,
dispensando qualquer tipo de material alternativo complementar.
Os capítulos foram finalizados com cinco categorias de exercícios, trabalhadas nas sessões de Estudo Orien-
tado (E.O.), como segue:
§§ E.O. Teste I: exercícios introdutórios de múltipla escolha, para iniciar o processo de fixação da matéria
estudada em aula;
§§ E.O. Teste II: exercícios de múltipla escolha, que apresentam grau médio de dificuldade, buscando a con-
solidação do aprendizado;
§§ E.O. Teste III: exercícios de múltipla escolha com alto grau de dificuldade;
§§ E.O. Dissertativo: exercícios dissertativos nos moldes da segunda fase da Fuvest, Unifesp, Unicamp e
outros importantes vestibulares;
§§ E.O. Enem: exercícios que abordam a aplicação de conhecimentos em situações do cotidiano, preparando
o aluno para esse tipo de exame.
A edição 2016 foi elaborada com muito empenho e dedicação, oferecendo ao aluno um material moderno e
completo, um grande aliado para o seu sucesso nos vestibulares mais concorridos de Medicina.

Herlan Fellini
ENTRE TEXTOS

Aula 1 (Gramática): Formação de palavras 6


Aula 1 (I.T.): Formação das palavras aplicada ao texto 28
Aula 2 (Gramática): Verbos: Noções preliminares 40
Aula 2 (I.T.): Verbos aplicados ao texto / Semântica I 62
Aulas 3 e 4 (Gramática): Tempos e modos 76
Aulas 3 e 4 (I.T.): Verbos aplicados ao texto: correlação e argumentação verbal / Semântica II 96
Aula 1 (Gramática)
Formação das palavras
Estrutura das palavras
§§ Radical (morfema lexical): é a parte que tem significado e é comum às palavras cognatas, também
consideradas da mesma família.
Exemplos: terra; terreiro; terrestre; enterrar

§§ Vogal temática: é a vogal que aparece depois do radical, “ajudando” as palavras a receber outro signifi-
cado. Aparece nos verbos, definindo se são de 1a, 2a ou 3a conjugação.
Exemplo: amar = am + a + r, onde “am” é o radical, “a” é a vogal temática de 1a conjugação e “r” é a
desinência de infinitivo.

§§ Tema: é a junção do radical + vogal temática ou desinência nominal.

§§ Desinências: indicam gênero e número, para desinência nominal, e indicam tempo e pessoa, para desinên-
cia verbal. As desinências nominais caracterizam as variações de substantivos, adjetivos e certos pronomes,
quanto ao gênero (masculino e feminino) e número (singular e plural). As desinências verbais indicam as va-
riações dos verbos em pessoa (1a, 2a ou 3a), número (singular e plural), tempo (presente, passado e futuro).

§§ Afixos: são elementos que se juntam ao radical para formar novas palavras. Podem aparecer antes do
radical – prefixos – ou depois do radical – sufixos.

§§ Palavras primitivas: são aquelas que não derivam de outras.


Exemplos: pedra; noite

§§ Palavras derivadas: são aquelas que derivam de outras.


Exemplos: pedreiro; anoitecer

§§ Palavras simples: são aquelas que possuem apenas um radical.


Exemplos: couve; flor

§§ Palavras compostas: são aquelas que possuem mais de um radical.


Exemplo: couve-flor

Processos de formação
Basicamente, as palavras da língua portuguesa são formadas pelos processos de composição e derivação, mas
também por onomatopeia, neologismo e hibridismo.

Formação por composição


Nos processos de formação de palavras por composição, ocorre a junção de dois ou mais radicais. Palavras com
significados distintos formam uma nova palavra com um novo significado.
Exemplo: guarda (flexão do verbo guardar; sentinela) + roupa (vestuário) = guarda-roupa (mobiliário)
São dois os processos de formação por composição:

§§ Composição por justaposição: quando não ocorre a alteração fonética das palavras. A justaposição
também pode ocorrer por hifenização.
Exemplos: girassol (gira + sol); guarda-chuva (guarda + chuva)
7
Fonte: <http://veredasdalingua.blogspot.com.br/2011/09/processos-de-formacao-de-palavras-ii.html>.

§§ Composição por aglutinação: quando ocorre alteração fonética, em decorrência da perda de elementos
das palavras.
Exemplos: aguardente (água + ardente); embora (em + boa + hora)

Formação por derivação


No processo de formação por derivação, a palavra primitiva (primeiro radical) sofre acréscimo de afixos. São cinco
os tipos de formação por derivação.
§§ Derivação prefixal: acréscimo de prefixo à palavra primitiva.
Exemplo: in-capaz
§§ Derivação sufixal: acréscimo de sufixo à palavra primitiva.
Exemplo: papel-aria
§§ Derivação parassintética: acréscimo simultâneo de prefixo e sufixo à palavra primitiva.
Exemplo: en-triste-cer
§§ Derivação regressiva: ocorre redução da palavra primitiva. Nesse processo, formam-se substantivos abs-
tratos por derivação regressiva de formas verbais.
Exemplo: ajuda (substantivo abstrato da derivação regressiva do verbo ajudar)
§§ Derivação imprópria: ocorre a alteração da classe gramatical da palavra primitiva.
Exemplos: (o) jantar – de verbo para substantivo; (um) Judas – de substantivo próprio para comum

Hibridismo
No processo de formação por hibridismo, as palavras compostas ou derivadas são constituídas por elementos
originários de línguas diferentes:

§§ grego + latim: automóvel e monóculo §§ africano + latim: bananal


§§ latim + grego: sociologia, bicicleta §§ africano + grego: sambódromo
§§ árabe + grego: alcaloide, alcoômetro §§ francês + grego: burocracia
§§ tupi + grego: caiporismo

8
Neologismo

Fonte: <http://veredasdalingua.blogspot.com.br/2011/09/processos-de-formacao-de-palavras-ii.html>.

Neologismo é o nome dado ao processo de criação de novas palavras ou palavras da própria língua portuguesa
que adquirem um novo significado. Exemplos:
§§ Originalmente, a palavra bonde significava certo veículo utilizado como meio de transporte. Hoje, na varie-
dade linguística utilizada por falantes inseridos no estilo do funk carioca, foi dado um novo significado para
a palavra bonde: turma, galera.
§§ É comum formar verbos a partir de palavras do meio da informática, como googlar (procurar no Google),
twittar (escrever no Twitter) ou resetar (de reset).
O grande escritor brasileiro João Guimarães Rosa, em sua literatura, criou tantos neologismos, que existe
um dicionário para todas as palavras inventadas por ele, o Dicionário Rosiano.

Onomatopeia
Onomatopeias são as palavras que lembram determinados sons, como tic-tac (relógio) e piuí (trem). A língua
inglesa possui várias onomatopeias: smack, crush, splash.

Fonte: <http://veredasdalingua.blogspot.com.br/2011/09/processos-de-formacao-de-palavras-ii.html>.

9
E.O. Teste I Assinale V na(s) afirmativa(s) verdadeira(s)
e F na(s) falsa(s).
( ) O texto se estrutura em estágios típicos
1. (Ufsm) Para responder à questão, leia o tex- da narrativa, dentre os quais está a com-
to a seguir. plicação, iniciada no momento em que
A LENDA DA MANDIOCA (LENDA DOS ÍNDIOS Mani não se levantou da rede.
TUPI) ( ) No estágio de orientação da narrativa, a
Nasceu uma indiazinha linda, e a mãe e o personagem principal é representada por
pai tupis espantaram-se: meio de um nome próprio e adjetivos que
– Como é 7branquinha 1esta criança! descrevem sua aparência, como “linda”
E era mesmo. Perto dos outros curumins da (ref. 2) e “branquinha” (ref. 7), e seu
taba, parecia um raiozinho de lua. Chama- comportamento, como “silenciosa” (ref. 8)
ram-na Mani. Mani era 2linda, 8silenciosa e e “quieta” (ref. 3).
3
quieta. Comia 4pouco e pouco bebia. Os pais ( ) Palavras como “brotinho” (ref. 9) e “bran-
preocupavam-se. quinha” (ref. 7) contribuem para estabe-
– Vá brincar, Mani, dizia o pai. lecer semelhanças entre a planta então
– Coma um 5pouco mais, dizia a mãe. desconhecida e Mani, ao mesmo tempo
Mas a menina continuava quieta, cheia de so- em que o emprego dos sufixos indicadores
nhos na cabecinha. Mani parecia esconder um de diminutivo corroboram a representa-
mistério. Uma bela manhã, não se levantou da ção de delicadeza e sensibilidade.
rede. O pajé foi chamado. Deu ervas e bebidas a ( ) Ao nomearem a nova planta de “Mani-oca”
menina. Mas não atinava com o que tinha Mani. (ref. 10), os índios utilizaram o proces-
Toda a tribo andava triste. Mas, deitada em sua so de formação de palavras por derivação
rede, Mani sorria, sem doença e sem dor. prefixal.
E sorrindo, Mani morreu. Os pais a enterra- A sequência correta é
ram dentro da própria oca. E regavam sua a) V – F – F – F.
cova todos os dias, como era costume entre os b) V – V – V – F.
índios Tupis. Regavam com lágrimas de sau- c) F – V – V – V.
dade. Um dia perceberam que do túmulo de d) V – F – F – V.
Mani rompia uma plantinha verde e viçosa. e) F – F – V – F.
– Que planta será esta? Perguntaram, admi-
rados. Ninguém a conhecia.
– É melhor deixá-la crescer, resolveram os 2. (Imed) DIA DA PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA
índios.
1
_____ exatos 125 anos, em 15 de novem-
E continuaram a regar o 9brotinho mimoso. A bro de 1889, foi proclamada a república do
planta desconhecida crescia depressa. 6Pou- Brasil.
cas luas se passaram, e ela estava altinha, Na época, o país era governado por D. Pedro
com um caule forte, que até fazia a terra se II e passava por grandes problemas, em ra-
rachar em torno. zão da abolição da escravidão, em 1888.
– A terra parece fendida, comentou a mãe
2
Como os negros não trabalhavam mais nas
de Mani. lavouras, os 3imigrantes começaram a ocupar
– Vamos cavar? seus lugares, plantando e colhendo, mas co-
E foi o que fizeram. Cavaram pouco e, à flor da bravam pelos trabalhos realizados, o que ge-
terra, viram umas raízes grossas e morenas, qua- rou insatisfação nos proprietários de terras.
se da cor dos curumins, nome que dão aos meni- As perdas também foram grandes para os
nos índios. Mas, sob a casquinha marrom, lá es- coronéis, 4pois 5_____ gasto uma enorme
tava a polpa branquinha, quase da cor de Mani.
6
quantidade de dinheiro investindo nos es-
Da oca de terra de Mani surgia uma nova planta! cravos, e o governo, após a abolição, não pa-
– Vamos chamá-la 10Mani-oca, resolveram os gou nenhuma indenização a eles.
índios. A guerra do Paraguai (1864 a 1870) também
– E, para não deixar que se perca, vamos ajudou na luta 7contra o regime monárquico
transformar a planta em alimento! no Brasil. Soldados brasileiros se aliaram aos
Assim fizeram! Depois, fincando outros ra- exércitos do Uruguai e da Argentina, rece-
mos no chão, fizeram a primeira plantação bendo orientações para implantarem a repú-
de mandioca. Até hoje entre os índios do blica no Brasil.
Norte e Centro do Brasil é este um alimento Os movimentos republicanos também já
muito importante. aconteciam no 8país, a 9imprensa trazia po-
E, em todo Brasil, quem não gosta da planti- litização 10_____ população civil, 11para lu-
nha misteriosa que surgiu na casa de Mani? tarem pela libertação do país dos domínios
Fonte: GIACOMO, Maria T. C. de. Lendas brasileiras, n. 7, de Portugal. Com isso, vários partidos teriam
2. ed. São Paulo: Edições Melhoramentos, 1977. (adaptado) sido criados, desde 1870.
10
A Igreja também teve sua participação para Considerando eco como um radical grego
que a república do Brasil fosse proclamada. que significa casa, hábitat, as palavras “eco-
Dois bispos foram nomeados para 12acatarem chatos” e “ecocéticos” são formadas por
as ordens de D. Pedro II, tornando-se seus __________. A primeira representa o gru-
subordinados, 13mas não aceitaram tais im- po dos __________ e a outra, o grupo dos
posições. Com isso, foram punidos com pena __________ no que se refere a atividades
de prisão, levando 14_____ igreja 15_____ ir sustentáveis.
contra o governo. Assinale a alternativa que preenche adequa-
Com as tensões aquecendo o mandato de D. damente as lacunas.
Pedro II, o imperador dirigiu-se com sua fa- a) composição – enfadonhos – descrentes
mília para a cidade de Petrópolis, também b) derivação prefixal – insistentes – desconfiados
no estado do Rio de Janeiro. c) aglutinação – desgostosos – descrentes
16
Porém seu afastamento não foi nada favo- d) neologismo – aborrecidos – preocupados
rável, fazendo com que fosse posto em prá- e) derivação parassintética – insistentes – críticos.
tica um golpe militar, onde o Marechal Deo-
doro da Fonseca conspirava a derrubada de 4. (Espcex Aman) Ao se alistar, não imagina-
D. Pedro II. va que o combate pudesse se realizar em tão
Boatos de que os responsáveis pelo plano curto prazo, embora o ribombar dos canhões
seriam presos fizeram com que a armada já se fizesse ouvir ao longe.
acontecesse, recebendo o apoio de mais de Quanto ao processo de formação das palavras
seiscentos soldados. sublinhadas, é correto afirmar que sejam,
No dia 15 de novembro de 1889, ao passar respectivamente, casos de
pela Praça da Aclamação, o Marechal, com a) prefixação, sufixação, prefixação, aglutina-
espada em punho, declarou que, a partir da- ção e onomatopeia.
quela data, o país seria uma república. b) parassíntese, derivação regressiva, sufixa-
Dom Pedro II recebeu a notícia de que seu ção, aglutinação e onomatopeia.
governo 17havia sido derrubado e um decre- c) parassíntese, prefixação, prefixação, sufixa-
to o expulsava do país, juntamente com sua ção e derivação imprópria.
família. Dias depois, voltaram a 18Portugal. d) derivação regressiva, derivação imprópria,
Para governar o Brasil República, os responsá- sufixação, justaposição e onomatopeia.
veis pela conspiração montaram um governo e) parassíntese, aglutinação, derivação regres-
provisório, mas o Marechal Deodoro da Fonseca siva, justaposição e onomatopeia.
permaneceu como presidente do país. Rui Bar-
bosa, Benjamin Constant, Campos Sales e outros
5. (Ufrgs) O que havia de tão revolucionário
foram escolhidos para formar os ministérios.
na Revolução Francesa? Soberania popular,
Fonte: Jussara de Barros. <http://www.
brasilescola.com> (adaptado).
liberdade civil, igualdade perante a lei – 1as
palavras hoje são ditas com tanta facilidade
Avalie as seguintes afirmações a respeito da que somos incapazes de imaginar seu caráter
palavra imigrantes (ref. 3): explosivo em 1789. Para os franceses do An-
I. É formada apenas por prefixação, assim tigo Regime, 6os homens eram 8desiguais, e
como a palavra imprensa (ref. 9). a desigualdade era uma boa coisa, adequada
II. O prefixo –ante(s) exprime origem. à ordem hierárquica que 2fora posta na natu-
III. Migração, migrar e emigrar são suas cog- reza pela própria obra de Deus. A liberdade
natas. significava privilégio – isto é, literalmente,
Quais estão corretas? 12
“lei privada”, uma prerrogativa 13especial
a) Apenas I. para fazer algo negado a outras pessoas. O
b) Apenas II. rei, como fonte de toda a lei, distribuía pri-
c) Apenas III. vilégios, 3pois havia sido 19ungido como 16o
d) Apenas I e II. agente de Deus na terra.
e) Apenas II e III. Durante todo 17o século XVIII, os filósofos
do Iluminismo questionaram esses 9pressu-
3. (Ufsm adaptada) GUIA VERDE POLITICA- postos, e os panfletistas profissionais conse-
MENTE INCORRETO guiram 14empanar 20a aura sagrada da coroa.
Nem ecochatos nem ecocéticos. Não existem Contudo, a desmontagem do quadro mental
verdades absolutas na sustentabilidade. Há do Antigo Regime demandou violência icono-
sempre alguma sujeira escondida debaixo clasta, destruidora do mundo, revolucionária.
do tapete – e soluções em lugares que nin-
7
Seria ótimo se pudéssemos associar 18a Re-
guém esperava. volução exclusivamente à Declaração dos Di-
HORTA, Maurício. “Guia verde politicamente reitos do Homem e do Cidadão, mas ela nas-
incorreto”. Superinteressante, dez. 2011, p. 57. ceu na violência e imprimiu seus princípios
11
em um mundo violento. Os conquistadores 6. (Insper) PARALIMPÍADAS É A MÃE
da Bastilha 24não se limitaram a destruir Certamente eu descobriria no Google, mas
21
um símbolo do despotismo real. 4Entre eles, me deu preguiça de pesquisar e, além dis-
15
0 foram mortos ou feridos no assalto à pri- so, não tem importância saber quem inven-
tou essa palavra grotesca, que agora a gente
são e, quando os sobreviventes apanharam o
ouve nos noticiários de televisão e lê nos jor-
diretor, cortaram sua cabeça e desfilaram-na nais. O surpreendente não é a invenção, pois
por 25Paris 22na ponta de uma lança. sempre houve besteiras desse tipo, bastando
Como podemos captar esses momentos de lembrar os que se empenharam em não jo-
loucura, quando tudo parecia possível e o garmos futebol, mas ludopédio ou podobá-
mundo se afigurava como uma tábula rasa, lio. O impressionante é a quase universali-
apagada por uma onda de comoção popular dade da adoção dessa palavra (ainda não vi
e pronta para ser redesenhada? Parece in- se ela colou em Portugal, mas tenho dúvidas;
crível que um povo inteiro fosse capaz de se os portugueses são bem mais ciosos de nossa
língua do que nós), cujo uso parece ter sido
levantar e transformar as condições da vida objeto de um decreto imperial e faz pensar
cotidiana. Duzentos anos de experiências em por que não classificamos isso imedia-
com admiráveis mundos 26novos tornaram- tamente como uma aberração deseducadora,
-nos 15céticos quanto ao 10planejamento so- desnecessária e inaceitável, além de subser-
cial. 27Retrospectivamente, a Revolução pode viente a ditames saídos não se sabe de que
parecer um 23prelúdio ao 11totalitarismo. cabeça desmiolada ou que interesse obscuro.
Pode ser. Mas um excesso de visão 28histó- Imagino que temos autonomia para isso e,
rica retrospectiva pode distorcer o panora- se não temos, deveríamos ter, pois jornal,
telejornal e radiojornal implicam deveres sé-
ma de 1789. Os revolucionários franceses
rios em relação à língua. Sua escrita e sua
não eram nossos contemporâneos. E eram fala são imitadas e tidas como padrão e essa
um conjunto de pessoas não excepcionais responsabilidade não pode ser encarada de
em circunstâncias excepcionais. Quando as forma leviana.
coisas se 29desintegraram, eles reagiram Que cretinice é essa? Que quer dizer essa pa-
a uma necessidade imperiosa de dar-lhes lavra, cuja formação não tem nada a ver com
sentido, ordenando a sociedade segundo nossa língua? Faz muitos e muitos anos, o
novos princípios. Esses princípios ainda então ministro do Trabalho, Antônio Magri,
permanecem como uma denúncia da tira- usou a palavra “imexível” e foi gozado a tor-
to e a direito, até porque ele não era bem um
nia e da injustiça. 5Afinal, em que estava
intelectual e era visto como um alvo fácil.
empenhada a Revolução Francesa? Liberda- Mas, no neologismo que talvez tenha criado,
de, igualdade, fraternidade. aplicou perfeitamente as regras de derivação
Adaptado de: DARNTON, Robert. O beijo de Lamourette. da língua e o vocábulo resultante não está
In: ____. O beijo de Lamourette: mídia, cultura e nada “errado”, tanto assim que hoje é encon-
revolução. São Paulo: Cia. das Letras, 2010. p. 30-39. trado em dicionários e tem uso corrente. Já
o vi empregado muitas vezes, sem alusão ao
Na primeira coluna, estão quatro palavras re- ex-ministro. Infutucável, inesculhambável e
tiradas do texto; na segunda coluna, descri- impaquerável, por exemplo, são palavras que
ções relacionadas à formação dessas palavras. não se acham no dicionário, mas qualquer
Associe corretamente as duas colunas. falante da língua as entende, pois estão den-
( ) desiguais (ref. 8) tro do espírito da língua, exprimem bem o
( ) pressupostos (ref. 9) que se pretende com seu uso e constituem
( ) planejamento (ref. 10) derivações perfeitamente legítimas.
( ) totalitarismo (ref. 11) Por que será que aceitamos sem discutir uma
excrescência como “paralimpíada”?
(João Ubaldo Ribeiro, O Estado de S. Paulo, 23/09/2012)
1. contém sufixo que forma substantivos a
partir de verbos O que motivou a indignação do autor com a
2. contém prefixo com sentido de negação palavra “paralimpíadas” foi o(a):
3. contém prefixo que designa anterioridade a) imposição da palavra, formada por um me-
4. contém sufixo que designa movimentos canismo que dispensa elementos conhecidos
ideológicos da língua.
b) aceitação irrestrita do termo por parte da
A sequência correta de preenchimento dos mídia, especialmente pela televisão.
c) fato de que, ao contrário do neologismo
parênteses, de cima para baixo, é
“imexível”, a palavra não foi incorporada aos
a) 4 – 2 – 3 – 1. dicionários.
b) 3 – 1 – 2 – 4. d) tentativa de resgatar palavras arcaicas tal
c) 2 – 3 – 1 – 4. como se fossem decretos imperiais.
d) 1 – 4 – 2 – 3. e) recusa à adoção do neologismo pelos portugue-
e) 1 – 2 – 3 – 4. ses, cuja atitude revela-se conservadora.
12
7. (Espcex Aman) Assinale a alternativa em Non chegou, madre, o meu amado,
que todas as palavras são formadas por pre- e oje est o prazo passado!
fixos com significação semelhante. Ai, madre, moiro d’amor!
a) metamorfose – metáfora – meteoro – malcriado E oje est o prazo saido!
b) apogeu – aversão – apóstata – abster Por que mentiu o desmentido?
c) síncope – simpatia – sobreloja – sílaba Ai, madre, moiro d’amor!
d) êxodo – embarcar – engarrafar – enterrar E oje, est o prazo passado!
e) débil – declive – desgraça – decapitar Por que mentiu o perjurado?
Ai, madre, moiro d’amor!
8. (Ifsp) No português, encontramos varieda- Considerando a terceira estrofe, assinale a
des históricas, tais como a representada na alternativa que apresenta uma palavra for-
cantiga trovadoresca de João Garcia de Gui- mada por parassíntese.
lhade, ilustrada a seguir. a) desmentido
b) prazo
Non chegou, madre, o meu amigo, c) saido
e oje est o prazo saido! d) d’amor
Ai, madre, moiro d’amor! e) moiro
9. (Insper adaptada) Leia a tirinha a seguir.

Os mesmos processos de formação dos termos em negrito aparecem, respectivamente, em


a) anoitecer, votação, inútil, violação e tristemente.
b) retenção, suavidade, desmatamento, infelizmente e firmamento.
c) enlatado, ajuda, remissão, dignidade e abolição.
d) reação, geração, abstenção, lição e afrontamento.
e) n.d.a.

10. (Insper) QUEM NUNCA FOTOXOPOU?


Fala-se hoje em Facebook, Google e iPhone com a mesma combinação de fascínio e terror que um
dia já se falou de Motorola e Nokia. Tudo se move rápido demais no mundo digital, e são poucas as
empresas que conseguem permanecer competitivas ao longo dos anos. Apesar de o Vale do Silício
ter aquele ar hollywoodiano de terra de oportunidades, contam-se nos dedos empresas longevas
como uma Adobe, uma Dell, uma Amazon.
Por ter grande mobilidade, a concentração de poder e influência no mundo digital surge tão rápido
quanto desaparece, a ponto de ser cada vez mais difícil encontrar quem fique na liderança por uma
mísera década. Na virada do século não havia Friendster, Myspace nem Orkut, o grande buscador
era o Yahoo!, seguido pelo Lycos. E a internet móvel estava a cargo de empresas inovadoras como
Palm e Kyocera.
O usuário de produtos digitais é cada vez mais volúvel e pragmático. Novos produtos e serviços
podem até seduzi-lo com propaganda, design e preço. Mas a relação dificilmente será mantida se
a marca não se renovar com a velocidade esperada, pouco importa sua fatia de mercado. Kodak e
Sony que o digam. Mesmo que ainda sejam gigantescas, já não têm o apelo de outrora.
A melhor lição de empresas bem-sucedidas em relacionamentos de longo prazo é a do bom e ve-
lho Photoshop, vendendo saúde em seus 22 anos de idade e 12 plásticas (oops, versões). Como
o Google, ele é sinônimo de categoria e verbo. Mas também é adjetivo, substantivo, pejorativo e
indicativo de retoques fotográficos, mencionado com familiaridade até por quem não faça ideia de
como ele funciona. Ao contrário do AutoCAD, que é oito anos mais velho, mas desconhecido fora
de seu nicho, o Photoshop é unanimidade.
Folha de S. Paulo, 26/03/2012.

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Quanto às variações exploradas a partir do tempo. Ninguém previu que os mesmos Es-
termo “Photoshop”, é correto afirmar que tados Unidos, graças às maravilhas da inter-
a) o neologismo do título foi formado pelo net sempre tão aberta e juvenil, se consoli-
mesmo processo que o termo “design”, pre- dariam como os maiores espiões do mundo,
sente no texto. humilhando potências como a Alemanha e
b) como adjetivo, o valor depreciativo do termo também o Brasil, impondo os métodos de
“fotoxopado” decorre exclusivamente do su- sua inteligência militar sobre a população
fixo “-ado” agregado ao radical. mundial, e guiando ao arrepio da justiça os
c) as palavras formadas a partir do estrangei- bebês engenheiros nota dez em matemáti-
rismo “photoshop” constituem jargões res- ca mas ignorantes completos em matéria de
tritos à área de informática. ética, política e em boas maneiras.
d) a grafia abrasileirada de “fotoxopou”, dife- 3Ninguém previu a febre das notícias inven-
rentemente de “hollywoodiano”, no 1.º pa- tadas, a civilização de perfis falsos, as en-
rágrafo, é uma prova de que o software se xurradas de vírus, os arrastões de números
popularizou no mundo. de cartão de crédito, a empulhação dos re-
e) apesar de não ter sido mencionado no texto, sultados numéricos falseados por robôs ou
também seria possível transformar “Photoshop” gerados por trabalhadores mal pagos em pa-
em advérbio de modo: “fotoxopalmente”. íses do terceiro mundo, o fim da privacidade,
o terrorismo eletrônico, inclusive de Estado.
Marion Strecker. Adaptado de Folha
E.O. Teste II de São Paulo, 29/07/2014.

O termo megahipercorporações é formado


1. (Uerj) O FUTURO ERA LINDO por um processo que enfatiza o tamanho e
A informação seria livre. Todo o saber do o poder das corporações econômicas atuais.
mundo seria compartilhado, bem como a Essa ênfase é produzida pelo emprego de:
música, o cinema, a literatura e a ciência. a) sufixos de caráter aumentativo
O custo seria zero. O espaço seria infinito. b) prefixos com sentido semelhante
A velocidade, estonteante. A solidariedade c) radicais de combinação obrigatória
e a colaboração seriam os valores supremos. d) desinências de significado específico
A criatividade, o único poder verdadeiro. O
bem triunfaria sobre os males do capitalis-
2. (Ifsc) Considere o seguinte poema de Paulo
mo. O sistema de representação se tornaria
Leminski:
obsoleto. Todos os seres humanos teriam
DESENCONTRÁRIOS
oportunidades iguais em qualquer lugar do
planeta. Todos seriam empreendedores e in-
Mandei a palavra rimar,
ventivos. Todos poderiam se expressar livre-
ela não me obedeceu.
mente. Censura, nunca mais. As fronteiras
Falou em mar, em céu, em rosa,
deixariam de existir. As distâncias se torna-
em grego, em silêncio, em prosa.
riam irrelevantes. O inimaginável seria pos-
Parecia fora de si, a sílaba silenciosa.
sível. O sonho, qualquer sonho, poderia se
tornar realidade.
Mandei a frase sonhar,
1Livre, grátis, inovador, coletivo, palavras-
e ela se foi num labirinto.
-chave do novo mundo que a internet inau-
Fazer poesia, eu sinto, apenas isso.
gurou. Por anos esquecemos que a internet
Dar ordens a um exército,
foi uma invenção militar, criada para manter
para conquistar um império extinto.
o poder de quem já o tinha. Por anos fin-
Fonte: LEMINSKI, Paulo. Distraídos Venceremos.
gimos que transformar produtos físicos em Curitiba: Ed. Brasiliense, 1987.
produtos virtuais era algo ecologicamente
correto, esquecendo que a fabricação de com- Assinale a soma da(s) proposição(ões)
putadores e celulares, com a obsolescência CORRETA(S).
embutida em seu DNA, demanda o consumo 01) O texto revela um poeta preocupado com a
de quantidades vexatórias de combustíveis expressão poética, no que diz respeito à se-
fósseis, de produtos químicos e de água, sem leção vocabular e à elaboração das frases.
falar no volume assombroso de lixo não reci- 02) A importância do poema reside no ineditis-
clado em que resultam, incluindo lixo tóxico. mo de sua temática: uma reflexão sobre o
2Ninguém imaginou que o poder e o dinhei- processo de criação do poeta.
ro se tornariam tão concentrados em me- 04) O poeta expressa admiração pela expressão
gahipercorporações norte-americanas como fácil, advinda da inspiração, não necessaria-
o Google, que iriam destruir para sempre mente oriunda de um trabalho meticuloso
tantas indústrias e atividades em tão pouco ou consciencioso com a palavra.
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08) Há uma certa contradição no texto: embora presentes indicam, respectivamente, senti-
o poeta afirme que dá ordens mas não é obe- do de
decido, o poema deixa transparecer controle a) morosidade e intensidade.
do poeta sobre as rimas. b) modo e consequência.
16) O prefixo da palavra utilizada como título do c) rapidez e modo.
poema tem o mesmo sentido dos que apa- d) intensidade e causa.
recem nas seguintes palavras: desinformar, e) afeto e tempo.
desconectar, desolar.
4. (Espcex Aman) Assinale a alternativa que
3. (Unifesp) Leia o texto para responder à contém um grupo de palavras cujos prefixos
questão. possuem o mesmo significado.
VOCÊ CONSEGUIRIA FICAR 99 DIAS SEM O a) compartilhar – sincronizar
FACEBOOK? b) hemiciclo – endocarpo
Uma organização não governamental holan- c) infeliz – encéfalo
desa está propondo um desafio que muitos d) transparente – adjunto
poderão considerar impossível: 1ficar 99 dias e) benevolente – diáfano
sem dar nem uma “olhadinha” no Facebook.
O objetivo é medir o grau de felicidade dos 5. (Unifesp) O NADA QUE É
usuários longe da rede social. Um canavial tem a extensão
O projeto também é uma resposta aos experi- ante a qual todo metro é vão.
mentos psicológicos realizados pelo próprio Tem o escancarado do mar
Facebook. A diferença neste caso é que o tes- que existe para desafiar
te é completamente voluntário. que números e seus afins
Ironicamente, para poder participar, o usuá- possam prendê-lo nos seus sins.
rio deve trocar a foto do perfil no Facebook e Ante um canavial a medida
postar um contador na rede social. métrica é de todo esquecida,
Os pesquisadores irão avaliar o grau de satis- porque embora todo povoado
fação e felicidade dos participantes no 33º povoa-o o pleno anonimato
dia, no 66º e no último dia da abstinência. que dá esse efeito singular:
Os responsáveis apontam que os usuários do de um nada prenhe como o mar.
Facebook gastam em média 17 minutos por (João Cabral de Melo Neto. Museu de tudo e depois, 1988.)
dia na rede social. Em 99 dias sem acesso, a
soma média seria equivalente a mais de 28 No título do poema – O nada que é –, ocor-
horas, 2que poderiam ser utilizadas em “ati- re a substantivação do pronome nada. Esse
vidades emocionalmente mais realizadoras”. processo de formação de palavras também se
(http://codigofonte.uol.com.br. Adaptado.) verifica em:
a) A arquitetura do poema em João Cabral defi-
Considere o enunciado a seguir: ne-lhe o processo de criação.
[...] ficar 99 dias sem dar nem uma “olhadi- b) A poética de João Cabral assume traços do
nha” no Facebook. (ref. 1) Barroco gongórico.
[...] que poderiam ser utilizadas em “ativi- c) Poema algum de João Cabral escapa de seu
dades emocionalmente mais realizadoras”. processo rigoroso de composição.
(ref. 2) d) Em Morte e Vida Severina, João Cabral ex-
Analisando-se o emprego e a estrutura das pressa o homem como coisa.
palavras “olhadinha” e “emocionalmen- e) A poesia de João Cabral tem um quê de des-
te”, é correto afirmar que os sufixos nelas poetização.

6. (Unifesp) Examine a tira.

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O efeito de humor na situação apresentada “estranhamente falho como ser humano”, e
decorre do fato de a personagem, no segun- se sentia desconcertado com a grosseria de
do quadrinho, considerar que “carinho” e Jobs e sua tendência a funcionar “ora no
“caro” sejam vocábulos modo de dizer que você era um merda, ora
a) derivados de um mesmo verbo. no de tentar seduzi-lo”. Jobs, por sua vez,
b) híbridos. via em Gates uma estreiteza enervante.
c) derivados de vocábulos distintos. 2
Suas diferenças de temperamento e perso-
d) cognatos. nalidade 1iriam levá-los para lados opostos
e) formados por composição. da linha fundamental de divisão na era di-
gital. Jobs era um perfeccionista que adora-
7. (Epcar Afa) GATES E JOBS va estar no controle e se comprazia com sua
Quando as órbitas se cruzam índole intransigente de artista; ele e a Apple
7
Em astronomia, quando as órbitas de duas se tornaram exemplos de uma estratégia di-
estrelas se entrecruzam por causa da inte- gital que integrava solidamente o hardware,
ração gravitacional, tem-se um sistema bi- o software e o conteúdo numa unidade in-
nário. Historicamente, ocorrem situações dissociável. Gates era um analista inteligen-
análogas quando uma era é moldada pela te, calculista e pragmático dos negócios e da
tecnologia; dispunha-se a licenciar o softwa-
relação e rivalidade de dois grandes astros
re e o sistema operacional da Microsoft para
orbitando: Albert Einstein e Niels Bohr na
um grande número de fabricantes.
física no século XX, por exemplo, ou Thomas
Depois de trinta anos, Gates desenvolveu
Jefferson e Alexander Hamilton na condução
um respeito relutante por Jobs. “De fato, ele
inicial do governo americano. Nos primeiros
nunca entendeu muito de tecnologia, mas ti-
trinta anos da era do computador pessoal, a
nha um instinto espantoso para saber o que
partir do final dos anos 1970, o sistema es-
funciona”, disse. Mas Jobs nunca retribuiu
telar binário definidor foi composto por dois
valorizando devidamente os pontos fortes de
indivíduos de grande energia, que largaram
Gates. “Basicamente Bill é pouco imaginati-
os estudos na universidade, ambos nascidos vo e nunca inventou nada, e é por isso que
em 1955. acho que ele se sente mais à vontade agora
Bill Gates e Steve Jobs, apesar das ambições na filantropia do que na tecnologia”, disse
semelhantes no ponto de convergência da Jobs, com pouca justiça. “Ele só pilhava des-
tecnologia e dos negócios, 5tinham origens pudoradamente as ideias dos outros.”
bastante diferentes e personalidades radi- (ISAACSON, Walter. Steve Jobs: a biografia. São Paulo:
calmente distintas. Companhia das Letras, 2011. p. 189-191. Adaptado)
À diferença de Jobs, Gates entendia de pro-
gramação e tinha uma mente mais prática,
mais disciplinada e com grande capacidade
de raciocínio analítico. Jobs era mais intui-
tivo, romântico, e dotado de mais instinto
para tornar a tecnologia usável, o design
agradável e as interfaces amigáveis. Com sua
mania de perfeição, era extremamente exi-
gente, além de administrar com carisma e
intensidade indiscriminada. 3Gates era mais
metódico; as reuniões para exame dos pro-
dutos tinham horário rígido, e ele chegava
ao cerne das questões com uma habilidade
ímpar. Jobs encarava as pessoas com uma in-
tensidade cáustica e ardente; Gates às vezes
não conseguia fazer contato visual, mas era
essencialmente bondoso.
4
“Cada qual se achava mais inteligente do
que o outro, mas Steve em geral tratava Bill Assinale a opção correta quanto à análise
como alguém levemente inferior, sobretu- das palavras abaixo, em destaque, retiradas
do em questões de gosto e estilo”, diz Andy do texto.
Hertzfeld. “Bill menosprezava Steve porque a) Os termos indissociável e intransigente são
ele não sabia de fato programar.” Desde o co- formadas somente pelo processo de deriva-
meço da relação, 6Gates ficou fascinado por ção prefixal.
Jobs e com uma ligeira inveja de seu efei- b) As palavras ímpar e saída seguem a regra de
to hipnótico sobre as pessoas. Mas também acentuação gráfica das vogais i e u tônicas
o considerava “essencialmente esquisito” e dos hiatos.

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c) Na frase, “... tinham... personalidades radi- 10. (Ufrgs)
calmente distintas.” (ref. 5), o termo distin- Darwin passou quatro meses no Brasil, em
tas é sinônimo de notáveis. 1832, durante a sua 2célebre viagem a bordo
d) Nas palavras destacadas em “... Gates ficou do Beagle. Voltou impressionado com o que
fascinado por Jobs e com uma ligeira inve- viu: “5Delícia é um termo 17insuficiente para
ja de seu efeito hipnótico...” (ref. 6), há, 19
exprimir as emoções sentidas por 28um na-
respectivamente, dígrafo, dígrafo e encontro turalista a 8sós com a natureza em uma flo-
consonantal. resta brasileira”, escreveu. O Brasil, 11porém,
aparece de forma menos 21idílica em 27seus
8. (Unifesp) CHOVE CHUVA, CHOVE SEM PARAR escritos: “Espero nunca mais voltar a um
O óbvio, o esperado. Nos últimos dias, o co-
12
país escravagista. O estado da enorme po-
mentário que teimou e bateu ponto em qual- pulação escrava deve preocupar todos os que
quer canto de Curitiba, principalmente nos chegam ao Brasil. Os senhores de escravos
botecos, foi um só: querem ver o negro romo outra espécie, mas
– Mas que chuvarada, né? temos todos a mesma origem.”
De olho no nível das águas do pequeno ria- Em vez do gorjeio do 6sabiá, o que Darwin
cho que passa junto à mansão da Vila Piro- guardou nos ouvidos foi 30um som 3terrível
quinha, Natureza Morta procurou o lado bom que 29o acompanhou por toda a vida: “13Até
de tanta chuva ininterrupta. hoje, se eu ouço um grito, 39lembro-me, com
Concluiu que, pelo excesso de uso, dispositi-
22
dolorosa e clara memória, 43de quando pas-
vo sempre operante, o tempo fez a alegria do sei numa casa em Pernambuco e ouvi urros
pessoal que conserta limpador de para-brisa.
14
terríveis. Logo entendi que era algum po-
Desse pessoal e, nem tanto, de quem vende bre escravo que estava sendo torturado,”
guarda-chuva. Afinal, do jeito que a coisa Segundo o 4biólogo Adrian Desmond, “a via-
andava, agravada pelo frio, a freguesia – de gem do Beagie, para Darwin, foi 40menos 41im-
maneira compulsória – praticamente desa- portante pelos 15espécimes coletados do que
pareceu das ruas. pela 16experiência de 25testemunhar os hor-
(Gazeta do Povo, 02.08.2011.)
rores da 23escravidão no Brasil. 47De certa for-
ma, ele escolheu focar na 20descendência co-
Analise as afirmações, com base na frase – mum do homem justamente para mostrar que
Mas que chuvarada, né?
32
todas as raças eram iguais e, 31desse modo,
I. O termo chuvarada, conforme o sufixo enfim, 44objetar 36àqueles que 18insistiam em
que o compõe, indica chuva em grande dizer que os negros pertenciam a uma espécie
quantidade, da mesma forma como ocor- diferente e inferior à dos brancos”. 1Desmond
re com os substantivos papelada e crian- acaba de lançar um estudo que mostra a pai-
çada. xão abolicionista 35do cientista, 26revelada por
II. No contexto, o termo Mas deve ser en-
33
seus 7diários e cartas 42pessoais. “A exten-
tendido como um marcador de oralidade, são de 34seu interesse no combate à ciência
sem valor adversativo. de cunho racista 9é surpreendente, e pude-
III. A frase não é, de fato, uma pergunta, pois mos detectar um ímpeto moral por 10trás de
traz a constatação de uma situação vivi- seu trabalho sobre a evolução humana − urna
da. Portanto, funciona com valor fático, crença na ‘irmandade racial’ que 38tinha 37ori-
principalmente. gem em 45seu ódio 46ao 24escravismo e que o
Está correto o que se afirma em levou a pensar numa descendência comum.”
a) I, apenas. Adaptado de: HAAG, C. O elo perdido tropical.
Pesquisa FAPESP, n. 159, p. 80 - 85, maio 2009.
b) III, apenas.
c) I e II, apenas. Assinale com V (verdadeiro) ou F (falso) as
d) II e III, apenas. afirmações a seguir sobre elementos de for-
e) I, II e III. mação de palavras do texto.
( ) As palavras insuficiente (ref. 17) e insis-
9. (Uel) A questão refere-se ao romance O ou- tiam (ref. 18) apresentam o mesmo pre-
tro pé da sereia, de Mia Couto. fixo em sua formação.
Assinale a alternativa em que as palavras, ( ) A comparação da palavra exprimir (ref.
retiradas do romance, correspondem a ver- 19) com imprimir e da palavra descen-
bos originados de substantivos. dência (ref. 20) com ascendência permi-
a) Anfitriando e parentear. te que se postule um radical comum para
b) Bonitando e descrucificar. cada um dos pares.
c) Anfitriando e desanimista. ( ) As palavras idílica (ref. 21) e dolorosa
d) Bonitando e parentear. (ref. 22) apresentam sufixos que formam
e) Descrucificar e desanimista. adjetivos a partir de substantivos.
17
( ) O emprego de diferentes sufixos para o através de destinos singulares, de situações
mesmo radical em escravidão (ref. 23) e singulares, de épocas singulares”. É essa a
escravismo (ref. 24) serve, no texto, para razão por que as 19obras-primas atravessam
expressar, respectivamente, a ideia de 7
séculos, sociedades e nações.
“situação resultante de uma ação” e de 2
Agora chegamos à parte mais humana da in-
“movimento socioideológico”. clusão: a inclusão do outro para a compreen-
A sequência correta de preenchimento dos são humana. A compreensão nos torna mais
parênteses, de cima para baixo, é: generosos com relação ao outro23, e o crimi-
a) F – V – V – V. noso não é unicamente mais visto como cri-
b) V – F – V – F. minoso, 26como o Raskolnikov de Dostoievsky,
c) V – V – F – F. como o Padrinho de Copolla.
d) F – V – F – V. A literatura, o teatro e o cinema são os me-
e) F – F – V – V. lhores meios de compreensão e de inclusão
do outro. Mas a compreensão se torna provi-
sória, esquecemo-nos depois da leitura, da
E.O. Teste III peça e do filme. Então essa compreensão é
que deveria ser introduzida e desenvolvida
1. (Ufrgs) A questão está relacionada ao texto em nossa vida pessoal e social, porque servi-
abaixo. ria para melhorar as relações humanas, para
1
Hoje os conhecimentos se estruturam de melhorar a vida social.
Adaptado de: MORIN, Edgar. A inclusão: verdade
modo 3fragmentado, 4separado, 5compar-
da literatura. In: RÕSING, Tânia et ai. Edgar Morin:
timentado nas disciplinas. 8Essa situação religando fronteiras. Passo Fundo: UPF, 2004. p.13-18
impede uma visão global, uma visão funda-
mental e uma visão complexa. 13”Complexi- Na primeira coluna, estão palavras retiradas
dade” vem da palavra latina complexus, que do texto; na segunda coluna, descrições rela-
significa a compreensão dos elementos no cionadas à formação de palavras.
seu conjunto. Associe corretamente as duas colunas.
As disciplinas costumam excluir tudo o que ( ) complexidade (refs. 13, 14, 15 e 16)
se encontra fora do 9seu campo de especia- ( ) definição (ref. 17)
lização. A literatura, no entanto, é uma área ( ) insuportáveis (ref. 18) sufixo formador
que se situa na inclusão de todas as dimen- de adjetivos a partir de verbos.
sões humanas. Nada do humano 10lhe é es- ( ) obras-primas (ref. 19)
tranho, 6estrangeiro. 1. Constituída por composição através de
A literatura e o teatro são desenvolvidos justaposição.
como meios de expressão, meios de conhe- 2. Constituída por prefixo com sentido de
cimento, meios de compreensão da 14com- negação e sufixo formador de adjetivos a
plexidade humana. Assim, podemos ver o partir de verbos
primeiro modo de inclusão da literatura: a 3. Constituída por sufixo formador de subs-
inclusão da 15complexidade humana. E va- tantivo a partir de adjetivo.
mos ver ainda outras inclusões: a inclusão da 4. Constituída por sufixo formador de subs-
personalidade humana, a inclusão da subje- tantivo a partir de verbo.
tividade humana, e, também, muito impor- 5. Constituída por aglutinação, tendo em
tante, a inclusão; do estrangeiro, do margi- vista a mudança silábica de um dos ele-
nalizado, do infeliz, de todos que ignoramos mentos do vocábulo.
e desprezamos na vida cotidiana. A sequência correta de preenchimento dos
A inclusão da 16complexidade humana é ne- parênteses, de cima para baixo, é:
cessária porque recebemos uma visão mu- a) 4 - 3 - 2 - 1.
tilada do humano. 11Essa visão, a de homo b) 3 - 4 - 2 - 5.
sapiens, é uma 17definição do homem pela c) 4 - 3 - 1 - 5.
razão; de homo faber20, do homem como tra- d) 3 - 4 - 2 - 1.
balhador; de homo economicus21, movido por e) 3 - 2 - 1 - 5.
lucros econômicos. Em resumo, trata-se de
uma visão prosaica, mutilada, 12que esquece 2. (PUC-RS) Responda à questão com base no
o principal22: a relação do sapiens/demens, texto.
da razão com a demência, com a loucura. ENTRE O ESPAÇO PÚBLICO E O PRIVADO
Na literatura, encontra-se a inclusão dos pro- 12
Excluídos da sociedade, os moradores de
blemas humanos mais terríveis, coisas 18in- rua 26ressignificam o único espaço 13que
suportáveis que nela se tornam suportáveis. lhes foi permitido ocupar, o espaço público,
Harold Bloom escreve: 24”Todas as 25grandes transformando-o em seu “lugar”, um espa-
obras revelam a universalidade humana ço privado. 11Espalhados pelos ambientes
18
coletivos da cidade, 1fazendo comida no as- Estão corretas apenas as afirmativas
falto, arrumando suas camas, limpando as a) I e II.
calçadas como se estivessem dentro de uma b) I e III.
casa: 17assim vivem os moradores de rua. Ao c) I e IV.
andar pelas ruas de São Paulo, vemos essas d) II e III.
pessoas 3dormindo nas 28calçadas, 4passando e) II, III e IV.
por situações constrangedoras, 5pedindo es-
molas para sobreviver. Essa é a realidade das 3. (UFG) DIÁLOGO DA RELATIVA GRANDEZA
pessoas que 2fazem da rua sua casa e nela Sentado no monte de lenha, as pernas aber-
constroem sua 35intimidade. 18Assim, a ideia tas, os cotovelos nos joelhos, Doril examinava
de 33individualização que está nas 31casas, na um louva-deus pousado nas costas da mão.
34
separação das coisas por 30cômodos e quar- Ele queria que o bichinho voasse, ou pulas-
tos que servem para proteger a intimidade se, mas o bichinho estava muito à vontade,
do indivíduo, 14ganha outro sentido. O 6viver vai ver que dormindo – ou pensando? Doril
nas 29ruas, um lugar 19aparentemente 36ina- tocava-o com a unha do dedo menor e ele
bitável, tem sua própria lógica de funciona- nem nada, não dava confiança, parece que
mento, que vai além das possibilidades. nem sentia; se Doril não visse o leve pulsar
A relação que o homem 8estabelece com o es- de fole do pescoço – e só olhando bem é que
paço que ocupa é uma das mais importantes se via – era capaz de dizer que o pobrezinho
para sua sobrevivência. As mudanças de com- estava morto, ou então que era um grilo de
portamento social 15foram 21sempre precedi- brinquedo, desses que as moças pregam no
das de 22mudanças físicas de local. Por 23mais vestido para enfeitar.
que a rua não seja um local para 7viver, já que Entretido com o louva-deus Doril não viu
se trata de um ambiente público, de passa- Diana chegar comendo um marmelo, fruta
gem e não de permanência, ela acaba sendo, azeda e enjoada que só serve para ranger os
25
senão única, a 24mais viável opção. Alguns dentes. Ela parou perto do monte de lenha
pensadores já apontam que a habitação 9é um e ficou descascando o marmelo com os den-
ponto base e 10adquire uma importância para tes mas sem jogar a casca fora, não queria
harmonizar a vida. O pensador Norberto Elias perder nada. Quando ela já tinha comido um
comenta que “o quarto de dormir tornou-se bom pedaço da parte de cima e nada de Do-
uma das áreas mais privadas e íntimas da ril ligar, ela cuspiu fora um pedaço de miolo
vida humana. Suas paredes visíveis e 37in- com semente e falou:
visíveis vedam os aspectos mais ‘privados’, – Está direitinho um macaco em galho de
‘íntimos’, irrepreensivelmente ‘animais’ da pau.
nossa existência à vista de outras pessoas”. Doril olhou só com os olhos e revidou:
O modo como essas pessoas 27constituem o – Macaco é quem fala. Está até comendo ba-
único espaço que lhes foi permitido indi- nana.
ca que conseguiram transformá-lo em “seu – Marmelo é banana, besta?
20
lugar”, que aproximaram, cada um à sua – Não é mais serve.
maneira, 16dois mundos nos quais estamos Ficaram calados, cada um pensando por seu
32
inseridos: o público e o privado. lado. Diana cuspiu mais um caroço.
RODRIGUES, Robson. Moradores de uma terra – Sabe aquele livro de história que o Mirto
sem dono. (fragmento adaptado) In: http:// ganhou?
sociologiacienciaevida.uol.com.br/ESSO/edicoes/32/
artigo194186-4.asp. Acesso em 21/8/2014. – Que Mirto, seu. É Milllton. Mania!
– Mas sabe? Eu vou ganhar um igual. Tia
Analise as afirmações sobre o sentido e a Jura vai mindar.
formação das palavras no texto. – Não é mindar. É me-dar. Mas não é vantagem.
I. Há uma relação de sinonímia entre “res- – Não é vantagem? É muita vantagem.
significam” (ref. 26) e “constituem” (ref. – Você já não leu o de Milton?
27). – Li mas quero ter. Pra guardar e ler de novo.
II. “calçadas” (ref. 28) está para “ruas” (ref. – Vantagem é ganhar outro. Diferente.
29) assim como “cômodos” (ref. 30) está – Deferente eu não quero. Pode não ser bom.
para “casas” (ref. 31). – Como foi que você disse? Diz de novo?
III. A relação entre “Excluídos” (ref. 12) e – Já disse uma vez, chega.
“inseridos” (ref. 32) é a mesma que se – Você disse deferente.
estabelece entre “individualização” (ref. – Foi não.
33) e “separação” (ref. 34). – Foi. Eu ouvi.
IV. As palavras “intimidade” (ref. 35), “ina- – Foi não.
bitável” (ref. 36) e “invisíveis” (ref. 37) – Foi.
têm o mesmo prefixo. – Foi não.
19
– Foooi. Doril olhou o muro, os cafezeiros, as bana-
Continuariam até um se cansar e tapar os neiras, tudo bem maior do que ele, uma ba-
ouvidos para ficar com a última palavra se naneira deve ter mais de dois metros...
Diana não tivesse a habilidade de se retirar Aí ele notou que o louva-deus não estava mais
logo que percebeu a dízima. Com pedacinho na mão. Procurou por perto e achou-o pousado
final do marmelo entre os dedos, ela chegou- num pau de lenha, numa ponta coberta de mus-
-se mais perto do irmão e disse: go. Doril levantou o pau devagarinho, olhou-o de
– Gi! Matando louva-deus! Olhe o castigo! perto e achou que a camada de musgo lembrava
– Eu estou matando, estou? um matinho fechado, com certeza cheio de
– Está judiando. Ele morre. – Quando é que você vai deixar esse bichinho
– Eu estou judiando? sossegado?
– Amolar um bicho tão pequenininho é o Tamanho homem!
mesmo que judiar. Doril largou o pau devagarinho no monte,
Doril não disse mais nada, qualquer coisa limpou as mãos na roupa.
que ele dissesse ela aproveitaria para outra – Você não sabe qual é o meu tamanho.
acusação. Era difícil tapar a boca de Diana, Ela olhou-o desconfiada, com medo de dizer
ô menina renitente. Ele preferiu continuar uma coisa e cair em alguma armadilha. Do-
olhando o louva-deus. Soprou-o de leve, ele ril estava sempre arranjando novidades para
encolheu-se e vergou o corpo para o lado do atrapalhá-la.
sopro, corno faz uma pessoa na ventania. O – Você nem sabe qual é o seu tamanho – in-
louva-deus estava no meio de uma tempesta- sistiu ele.
de de vento, dessas que derrubam árvores e – Então não sei? Já medi e marquei com um
arrancam telhados e podem até levantar urna carvão atrás da porta da sala. Pode olhar lá,
pessoa do chão. Doril era a força que manda- se quiser.
va a tempestade e que podia pará-la quan- Ele sorriu da esperada ingenuidade.
do quisesse. Então ele era Deus? Será que as – Isso não quer dizer nada. Você não sabe o
nossas tempestades também são brincadei- tamanho da marca.
ra? Será que quem manda elas olha para nós – Sei. Mamãe mediu com a fita de costura.
como Doril estava olhando para o louva-deus? Diz que tem um metro e vinte e tantos.
Será que somos pequenos para ele como um – Em metro de anão. Ou metro invisível.
gafanhoto é pequeno para nós, ou menores Ela olhou-o assustada, desconfiada; e não
ainda? De que tamanho, comparando – do de achando o que responder, desconversou:
formiga? De piolho de galinha? Qual será o – Ih, Doril! Você está bobo hoje!
nosso tamanho mesmo, verdadeiro? – Boba é você, que não sabe de nada.
Doril pensou, comparando as coisas em vol- Ela esperou, ele explicou:
ta. Seria engraçado se as pessoas fossem – Você não sabe que nós somos invisíveis, de
criaturinhas miudinhas, vivendo num mun- tão pequenos?
do miudinho, alumiado por um sol do tama- – Sei disso não. Invisível é micuim, que a
nho de uma rodela de confete. gente sente mas não vê.
Diana lambendo os dedos e enxugando no – Pois é. Nós somos como micuins.
vestido. Qual seria o tamanho certo dela? Diana olhou depressa para ela mesma, de-
Um palmo de cabeça, um palmo de peito, pois para Doril.
palmo e meio de barriga, palmo e meio até – Como é que eu vejo eu, vejo você, vejo mi-
o joelho, palmo e meio até o pé... uns seis nha mãe?
palmos e meio. Palmo de quem? Gafanhoto – E você pensa que micuim não vê micuim?
pode ter seis palmos e meio também – mas Diana franziu a testa, pensando. Doril tinha
de gafanhoto. Formiga pode ter seis palmos cada ideia. [...]
e meio – de formiga. E os bichinhos que – Não pode, Doril. A gente é grande. Olha aí,
existem mas a gente não vê, de tão peque- você é quase da altura desse monte de lenha.
nos? Se tem bichos que a gente não vê, não – Está vendo como você não sabe nada? Isso
pode ter bichos que esses que a gente não não é um monte de lenha. É um monte de
vê não veem? Onde é que o tamanho dos bi- pauzinhos menores do que pau de fósforo.
chos começa, e onde acaba? Qual é o maior, – Ora sebo, Doril. Pau de fósforo é deste ta-
e qual o menor? Bonito se nós também so- manho – ela mostrou dois dedinhos separa-
mos invisíveis para outros bichos muito dos, dando tamanho que ela imaginava.
grandes, tão grandes que os nossos olhos – Isso que você está mostrando não é tama-
não abarcam? E se a Terra é um bicho gran- nho de pau de fósforo. Pau de fósforo é qua-
degrandegrandegrande e nós somos pulgas se do seu tamanho.
dele? Mas não pode! Como é que vamos ser Diana ficou pensativa, triste por ter diminu-
invisíveis, se qualquer pessoa tem mais de ído de tamanho de repente. Doril aproveitou
um metro de tamanho? para ensinar mais.
20
– Como você é tapada, Diana. Tudo no mun- mãos, a colher uma simples casquinha de ar-
do é muito pequeno. roz. Doril abriu a boca, fechou os olhos e en-
O mundo é muito pequeno. – Olhou em vol- goliu, o borrifo de xarope desceu queimando
ta procurando uma ilustração. – Está vendo a garganta de formiga.
aquela jaca? Sabe o tamanho dela? VEIGA, J. J. Melhores contos J. J. Veiga. Seleção de J.
– Sei sim. Regula com uma melancia. Aderaldo Castello. 4. ed. São Paulo: Global, 2000. p. 97-102.
– Pronto. Não sabe. É do tamanho de cajá.
No texto, são apresentadas alterações lexi-
Diana olhou a jaca já madura em ponto de
cais como as ocorridas em Milton para Mirto,
cair, qualquer dia caía.
em me-dar para mindar, em diferente para
– Ah, não pode, Doril. Comparar jaca com
cajá? deferente. A passagem de diferente para de-
– Mas é porque você não sabe que cajá não ferente é marcada por
é cajá. a) uma variação na forma da palavra que impli-
– O que é então? ca mudança de significado.
– É bago de arroz. b) um mesmo tipo de processo que ocorre em
Diana olhou em volta aflita, procurando uma Mirto e em mindar.
prova de que Doril estava errado. c) um estranhamento dado pela inexistência
– E coqueiro o que é? da palavra deferente.
– Coqueiro é pé de salsa. d) uma mudança na classe gramatical da pala-
– E eu? vra que sofre a variação.
– Você é formiga de dois pés. e) um registro erudito que é incompatível com
– Se eu sou formiga como é que eu pulo rego a cena narrada na história.
d´água?
– Que rego d´água? 4. (UEL) A questão refere-se ao romance O ou-
– Esse nosso aí. tro pé da sereia, de Mia Couto.
Doril sacudiu a cabeça, sorrindo. A crítica literária tem aproximado o moçam-
– Aquilo não é rego d´água. É risquinho no bicano Mia Couto do brasileiro Guimarães
chão, da grossura de um fio de linha. Rosa, em particular pelo fato de ambos em-
– E... E aquele morro lá longe? pregarem neologismos em suas obras.
– Não é morro. Você pensa que é morro por- No trecho “as mãos calosas, de enxadachim”,
que você é formiga. extraído do conto “Fatalidade”, de autoria
Aquilo é um montinho de terra que cabe do autor brasileiro, o neologismo “enxada-
num carrinho de mão. chim” é construído pelo mesmo processo de
Diana olhou-se de alto a baixo, achou-se formação de palavras utilizado pelo autor
grande para ser formiga. moçambicano para a criação de
– Onde você aprendeu isso? a) vitupérios.
Ela precisava da garantia de uma autoridade b) bebericava.
para aceitar a nova ideia. c) tamanhoso.
– Em parte nenhuma. Eu descobri. d) mudançarinos.
Diana deu um riso de zombaria, como quem e) malfadado.
começa a entender. Tudo aquilo era invenção
dele, coisa sem pé nem cabeça. Como a his- 5. (Fuvest) A questão racial parece um desafio
tória de recado por pensamento. do presente, mas trata-se de algo que existe
A mãe chamou da janela. Doril desceu do desde há muito tempo.
monte de lenha, um pau resvalou e feriu-o Modifica-se ao acaso das situações, das for-
no tornozelo. Ele ia xingar mas lembrou que mas de sociabilidade e dos jogos das forças
pau de fósforo não machuca. A mãe chamou sociais, mas reitera-se continuamente, mo-
de novo, ele saiu correndo e gritou para trás: dificada, mas persistente.
– Quem chegar por último é filho de lesma. Esse é o enigma com o qual se defrontam
Diana correu também, mais para não ficar so- uns e outros, intolerantes e tolerantes, dis-
zinha do que para competir. Pularam uma ba- criminados e preconceituosos, segregados e
cia velha, simples tampa de cerveja emborca- arrogantes, subordinados e dominantes, em
da no chão. Pularam o fio de linha que Diana todo o mundo. Mais do que tudo isso, a ques-
tinha pensado que era um rego d´água. Doril tão racial revela, de forma particularmente
tropeçou num balde furado (isto é, um dedal evidente, nuançada e estridente, como fun-
com alça), subiu de um fôlego os dentes do ciona a fábrica da sociedade, compreenden-
pente que servia de escada para a varanda, e do identidade e alteridade, diversidade e
entrou no caixotinho de giz onde eles mora- desigualdade, cooperação e hierarquização,
vam. A mãe uma formiguinha severa de pano dominação e alienação.
amarrado na cabeça estava esperando na por- Octavio Ianni. Dialética das relações sociais.
ta com uma colher e um vidro de xarope nas Estudos avançados, n. 50, 2004.

21
As palavras do texto cujos prefixos tradu- de que os meios de comunicação tradicionais
zem, respectivamente, ideia de anteriorida- não mais detêm o monopólio da produção
de e contiguidade são e distribuição de mensagens. Considerando
a) “persistente” e “alteridade”. esse “mundo desintermediado”, identifique
b) “discriminados” e “hierarquização”. duas críticas ao jornalismo atual formuladas
c) “preconceituosos” e “cooperação”. pelo autor.
d) “subordinados” e “diversidade”. b) Os processos de formação de palavras envol-
e) “identidade” e “segregados”. vidos no vocábulo “desintermediação” não
ocorrem simultaneamente. Tendo isso em
mente, descreva como ocorre a formação da
E.O. Dissertativo palavra “desintermediação”.

1. (Unicamp) Os textos abaixo foram retirados 3. (Unicamp) Os verbetes apresentados em (II)


da coluna “Caras e bocas”, do Caderno Aliás, a seguir trazem significados possíveis para
do jornal O Estado de São Paulo: algumas palavras que ocorrem no texto inti-
“A INTENÇÃO É SALVAR O BRASIL.” tulado Bicho Gramático, apresentado em (I).
Ana Paula Logulho, professora e entusiasta (I) BICHO GRAMÁTICO
da segunda “Marcha da Família com Deus Vicente Matheus (1908-1997) foi um dos
pela Liberdade”, que pede uma intervenção personagens mais controversos do futebol
militar no país e pretendeu reeditar, no sá- brasileiro. Esteve à frente do paulista Corin-
bado, a passeata de 19 de março de 1964, na thians em várias ocasiões entre 1959 e 1990.
capital paulista, contra o governo do Presi- Voluntarioso e falastrão, o uso que fazia da
dente João Goulart. língua portuguesa nem sempre era aquele
“Será um evento esculhambativo em home- reconhecido pelos livros. Uma vez, querendo
nagem ao outro de São Paulo.” José Caldas, deixar bem claro que o craque do Timão não
organizador da “Marcha com Deus e o Diabo seria vendido ou emprestado para outro clu-
na Terra do Sol”, convocada pelo Facebook be, afirmou que “o Sócrates é invendável e
para o mesmo dia, no Rio de Janeiro. imprestável”. Em outro momento, exaltando
O Estado de São Paulo, 23/03/2014, Caderno a versatilidade dos atletas, criou uma pérola
Aliás, E4. Negritos presentes no original. da linguística e da zoologia: “Jogador tem
que ser completo como o pato, que é um bi-
a) Descreva o processo de formação de palavras cho aquático e gramático”.
envolvido em “esculhambativo”, apontando o (Adaptado de Revista de História da
tipo de transformação ocorrida no vocábulo. Biblioteca Nacional, jul. 2011, p. 85.)
b) Discorra sobre a diferença entre as expressões
“evento esculhambado” e “evento esculham- (II)
bativo”, considerando as relações de sentido §§ Invendável: que não se pode vender ou
existentes entre os dois textos acima. que não se vende com facilidade.
§§ Imprestável: que não tem serventia; inú-
2. (Unicamp) A sobrevivência dos meios de til.
comunicação tradicionais demanda foco ab- §§ Aquático: que vive na água ou à sua su-
soluto na qualidade de seu conteúdo. A in- perfície.
ternet é um fenômeno de desintermediação. §§ Gramático: que ou o que apresenta me-
E que futuro aguardam os meios de comu- lhor rendimento nas corridas em pista de
nicação, assim como os partidos políticos e grama (diz-se de cavalo).
os sindicatos, num mundo desintermediado? (Dicionário HOUAISS (versão digital
on line), houaiss.uol.com.br)
Só nos resta uma saída: produzir informação
de alta qualidade técnica e ética. Ou faze- a) Descreva o processo de formação das pala-
mos jornalismo de verdade, fiel à verdade vras invendável e imprestável e justifique a
dos fatos, verdadeiramente fiscalizador dos afirmação segundo a qual o uso que Vicente
poderes públicos e com excelência na presta- Matheus fazia da língua portuguesa “nem
ção de serviços, ou seremos descartados por sempre era aquele reconhecido pelos livros”.
um consumidor cada vez mais fascinado pelo b) Explique por que o texto destaca que Vicen-
aparente autocontrole da informação na pla- te Matheus “criou uma pérola da linguística
taforma virtual. e da zoologia”.
(Carlos Alberto di Franco, Democracia demanda
jornalismo independente. O Estado de São
Paulo, São Paulo, 14/10/2013, p. A2.) 4. (FGV) Os mecanismos constitucionais que
caracterizam o Estado de direito têm o ob-
a) “Desintermediação” é um termo técnico do jetivo de defender o indivíduo dos abusos
campo da comunicação. Ele se refere ao fato do poder. Em outras palavras, são garantias
22
de liberdade, da assim chamada 1liberdade 5. (Uerj) DESENCONTRÁRIOS
negativa, entendida como esfera de ação Mandei a palavra rimar,
em que o indivíduo não está obrigado por ela não me obedeceu.
quem detém o poder coativo a fazer aqui- Falou em mar, em céu, em rosa,
lo que não deseja ou não está impedido de em grego, em silêncio, em prosa.
fazer aquilo que deseja. Há uma acepção de Parecia fora de si,
liberdade – que é a acepção prevalecente na a sílaba silenciosa.
tradição liberal – segundo a qual “liberda-
de” e “poder” são dois termos 3antitéticos, Mandei a frase sonhar,
que denotam duas realidades em contraste e ela se foi num labirinto.
entre si e são, portanto, incompatíveis: nas Fazer poesia, eu sinto, apenas isso.
relações entre duas pessoas, à medida que Dar ordens a um exército,
se estende o poder (poder de comandar ou para conquistar um império extinto.
de impedir) de uma diminui a liberdade em GÓES, F. e MARINS, A. (orgs.). Melhores poemas
de Paulo Leminski. São Paulo: Global, 2001.
sentido negativo da outra e, vice-versa, à
medida que a segunda amplia a sua esfera Considere a formação da palavra “Desencon-
de liberdade diminui o poder da primei- trários”, título do poema de Paulo Leminski.
ra. Deve-se agora acrescentar que para o Separe seus elementos mórficos. Em segui-
pensamento liberal a liberdade individual da, nomeie o primeiro morfema que a com-
está garantida, mais que pelos mecanismos põe e indique seu significado.
constitucionais do Estado de direito, tam-
bém pelo fato de que ao Estado são reco- 6. (Fuvest) Leia a seguinte fala, extraída de
nhecidas tarefas limitadas à manutenção da uma peça teatral, e responda ao que se pede.
ordem pública interna e internacional. No “Odorico - Povo sucupirano! Agoramente já
pensamento liberal, teoria do controle do investido no cargo de Prefeito, aqui estou
poder e teoria da limitação das tarefas do para receber a confirmação, ratificação, a
Estado procedem no mesmo passo: pode-se autenticação e, por que não dizer, a sagração
até mesmo dizer que a segunda é a 2condi- do povo que me elegeu.”
tio sine qua non da primeira, no sentido de Dias Gomes. “O Bem-Amado: farsa sócio-
que o controle dos abusos do poder é tanto político-patológica em 9 quadros”.
mais fácil quanto mais restrito é o âmbito
em que o Estado pode estender a própria a) A linguagem utilizada por Odorico produz
intervenção, ou mais breve e simplesmen- efeitos humorísticos. Aponte um exemplo
te no sentido de que o Estado mínimo é que comprove essa afirmação. Justifique
mais controlável do que o Estado máximo. sua escolha.
Do ponto de vista do indivíduo, do qual b) O que leva Odorico a empregar a expressão
se põe o liberalismo, o Estado é concebido “por que não dizer”, para introduzir o subs-
como um mal necessário; e enquanto mal, tantivo “sagração”?
embora necessário (e nisso o liberalismo se
distingue do 4anarquismo), o Estado deve 7. (Unicamp) Leia os seguintes artigos do Ca-
se intrometer o menos possível na esfera de pítulo VIII do novo Código Civil (Lei no.
ação dos indivíduos. 10.406, de 10 de janeiro de 2002):
Noberto Bobbio, Liberalismo e democracia. Art. 1.548. É nulo o casamento contraído:
São Paulo: Brasiliense, 2006. I. pelo enfermo mental sem o necessário
discernimento para os atos da vida civil;
a) Considerada no contexto, a expressão “li- II. por infringência de impedimento.
berdade negativa” (ref. 1) deve ser enten- (...)
dida como algo positivo para o indivíduo. Art. 1.550. É anulável o casamento:
Você concorda com essa afirmação? Justifi- I. de quem não completou a idade mínima
que sua resposta. para casar;
b) Considerando o gênero a que pertence o tex- (...)
to, é adequado, do ponto de vista lógico, o VI. por incompetência da autoridade cele-
emprego da expressão latina “conditio sine brante.
qua non” (ref. 2)? Justifique sua resposta. a) Os enunciados que introduzem os artigos
c) É correto afirmar que os prefixos que ocor- 1.548 e 1.550 têm sentido diferente. Expli-
rem nas palavras “antitéticos” (ref. 3) e que essa diferença, comparando, do ponto
“anarquismo” (ref. 4) têm o mesmo sentido de vista morfológico, as palavras NULO e
que os prefixos formadores, respectivamen- ANULÁVEL.
te, das palavras “antediluviano” e “amoral”? b) Segundo o Dicionário Houaiss da Língua
Justifique sua resposta. Portuguesa (2001), INFRINGÊNCIA vem de
23
INFRINGIR (violar, transgredir, desrespeitar) Mas sua mãe, que era linda e com cabelos
“+ência”. Compare o processo de formação pretos e compridos, se doía de tristeza de ter
dessa palavra com o de incompetência, indi- de viver ali.
cando eventuais diferenças e semelhanças. Queixava-se, principalmente nos demorados
meses chuvosos, quando carregava o tempo,
8. (Ufrj adaptada) OS DIFERENTES tudo tão sozinho, tão escuro, o ar ali era mais
Descobriu-se na Oceania, mais precisamente escuro; ou, mesmo na estiagem, qualquer dia,
na ilha de Ossevaolep, um povo primitivo, de tardinha, na hora do sol entrar. – “Oê, ah,
que anda de cabeça para baixo e tem vida o triste recanto...” – ela exclamava. Mesmo as-
organizada. sim, enquanto esteve fora, só com o Tio Terêz,
É aparentemente um povo feliz, de cabeça Miguilim padeceu tanta saudade, de todos e
muito sólida e mãos reforçadas. Vendo tudo de tudo, que às vezes nem conseguia chorar,
ao contrário, não perde tempo, entretanto, e ficava sufocado. E foi descobrir, por si, que,
em refutar a visão normal do mundo. E o que umedecendo as ventas com um tico de cuspe,
eles dizem com os pés dá a impressão de se- aquela aflição um pouco aliviava. Daí, pedia
rem coisas aladas, cheias de sabedoria. ao Tio Terêz que molhasse para ele o lenço;
Uma comissão de cientistas europeus e 4
e Tio Terêz, quando davam com um riacho,
americanos estuda a linguagem desses um 2minadouro ou um poço de grota, sem se
homens e mulheres, não tendo chegado apear do cavalo abaixava o copo de chifre, na
ainda a conclusões publicáveis. Alguns ponta de uma correntinha, e subia um punha-
professores tentaram imitar esses nativos do d’água. Mas quase sempre eram secos os
e foram recolhidos ao hospital da ilha. Os caminhos, nas chapadas, então Tio Terêz ti-
cabecences-para-baixo, como foram deno- nha uma cabacinha que vinha cheia, essa dava
minados à falta de melhor classificação, para quatro sedes; uma cabacinha entrelaçada
têm vida longa e desconhecem a gripe e com cipós, que era tão formosa. – “É para be-
a depressão. ber, Miguilim...” – Tio Terêz dizia, caçoando.
(ANDRADE, Carlos Drummond de. Prosa Seleta. Mas Miguilim ria também e preferia não beber
Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2003. p. 150) a sua parte, deixava-a para empapar o lenço e
refrescar o nariz, na hora do arrocho. Gostava
No texto, identifica-se o povo da ilha de Os- do Tio Terêz, irmão de seu pai.
sevaolep por um neologismo: cabecences- 5
Quando voltou para casa, seu maior pensa-
-para-baixo. mento era que tinha a boa notícia para dar
a) Identifique os processos de formação de à mãe: o que o homem tinha falado – que o
palavras utilizados para a criação desse Mutum era lugar bonito... A mãe, quando ou-
neologismo. visse essa certeza, havia de se alegrar, ficava
b) Considerando o conhecimento que os ob- consolada. Era um presente; e a ideia de po-
servadores têm do povo de Ossevaolep, res- der trazê-lo desse jeito de cor, como uma sal-
ponda: por que se afirma, no texto, que o vação, deixava-o febril até nas pernas. 3Tão
neologismo foi criado “à falta de melhor
grave, grande, que nem o quis dizer à mãe
classificação”?
na presença dos outros, mas insofria por ter
de esperar; e, assim que pôde estar com ela
9. (Uerj) só, abraçou-se a seu pescoço e contou-lhe,
Um certo Miguilim morava com sua mãe, seu estremecido, aquela revelação.
pai e seus irmãos, 6longe, longe daqui, muito GUIMARÃES ROSA. Manuelzão e Miguilim.
depois da Vereda-do-Frango-d’Água e de ou- Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984.
tras veredas sem nome ou pouco conhecidas,
em ponto remoto, no Mutum. No meio dos Vocabulário:
ref. 1: covoão – baixada estreita e profunda
Campos Gerais, mas num 1covoão em trecho
ref. 2: minadouro – olho d’água, quase sempre
de matas, terra preta, pé de serra. nascente de um córrego ou de um ribeirão
Miguilim tinha oito anos. Quando completa-
ra sete, havia saído dali, pela primeira vez: Guimarães Rosa se caracteriza pela lingua-
o Tio Terêz levou-o a cavalo, à frente da sela, gem instigante que encanta e desconcerta,
para ser crismado no Sucuriju, por onde o permitindo ao leitor familiarizar-se com o
bispo passava. Da viagem, que durou dias, potencial criativo da Língua Portuguesa.
ele guardara aturdidas lembranças, emba- Observe o fragmento do texto:
raçadas em sua cabecinha. De uma, nunca “Tão grave, grande, que nem o quis dizer à
pôde se esquecer: alguém, que já estivera mãe na presença dos outros, mas insofria
no Mutum, tinha dito: – “É um lugar bonito, por ter de esperar;” (ref. 3)
entre 7morro e morro, com muita pedreira e Aponte o significado do prefixo da palavra
muito mato, distante de qualquer parte; e lá sublinhada e explicite, em uma frase com-
chove sempre...” pleta, o sentido dessa palavra.
24
1
0. (Ufrj) O EX-CINECLUBISTA a) o dinamismo da língua na criação de novas
Aquele homem meio estrábico, ostentando palavras.
um mau humor maior do que realmente po- b) uma nova realidade limitando o aparecimen-
deria dedicar a quem lhe cruzasse o caminho to de novas palavras.
e que agora entrava no cinema, numa segun- c) a apropriação inadequada de mecanismos de
da-feira à tarde, para assistir a um filme nem criação de palavras por leigos.
tão esperado, a não ser entre pingados aman- d) o reconhecimento da impropriedade semân-
tes de cinematografias de cantões os mais tica dos neologismos.
exóticos, aquele homem, sim, sentou-se na e) a restrição na produção de novas palavras
sala de espera e chorou, simplesmente isso: com o radical grego.
chorou. Vieram lhe trazer um copo d’água
logo afastado, alguém sentou-se ao lado e lhe 2. (Enem PPL)
perguntou se não passava bem, mas ele nada Agora eu era herói
disse, rosnou, passou as narinas pela manga, E o meu cavalo só falava inglês.
levantou-se num ímpeto e assistiu ao melhor A noiva do cowboy
filme em muitos meses, só isso. Ao sair do Era você, além das outras três.
cinema, chovia. Ficou sob a marquise, à es- Eu enfrentava os batalhões,
pera da estiagem. Tão absorto no filme que Os alemães e seus canhões.
se esqueceu de si. E não soube mais voltar. Guardava o meu bodoque
(João Gilberto Noll) E ensaiava o rock para as matinês.
CHICO DUARQUE. João e Maria, 1977 (fragmento).
O vocábulo “ex-cineclubista” resulta da apli-
cação de quatro processos de formação de Nos terceiro e oitavo versos da letra da can-
palavras. Identifique-os, valendo-se de ele- ção, constata- se que o emprego das palavras
mentos constitutivos desse vocábulo. cowboy e rock expressa a influência de outra
realidade cultural na língua portuguesa. Es-

E.O. Enem sas palavras constituem evidências de


a) regionalismo, ao expressar a realidade so-
ciocultural de habitantes de uma determi-
1. (Enem) nada região.
TEXTO I: Um ato de criatividade pode con- b) neologismo, que se caracteriza pelo aportu-
tudo gerar um modelo produtivo. Foi o que guesamento de uma palavra oriunda de ou-
ocorreu com a palavra sambódromo, criativa- tra língua.
mente formada com a terminação -(ó)dromo c) jargão profissional, ao evocar a linguagem
(= corrida), que figura em hipódromo, au- de uma área específica do conhecimento
tódromo, cartódromo, formas que designam humano.
itens culturais da alta burguesia. Não demo- d) arcaísmo, ao representar termos usados em
raram a circular, a partir de então, formas outros períodos da história da língua.
populares como rangódromo, beijódromo, e) estrangeirismo, que significa a inserção de
camelódromo. termos de outras comunidades linguísticas
AZEREDO, J. C. Gramática Houaiss da língua no português.
portuguesa. São Paulo: Publifolha, 2008.

TEXTO II: Existe coisa mais descabida do que 3. (Enem) CARNAVÁLIA


chamar de sambódromo uma passarela para Repique tocou
desfile de escolas de samba? Em grego, -dro- O surdo escutou
mo quer dizer “ação de correr, lugar de cor- E o meu corasamborim
rida”, dai as palavras autódromo e hipódro- Cuíca gemeu, será que era meu, quando ela
mo. É certo que, às vezes, durante o desfile, passou por
a escola se atrasa e é obrigada a correr para mim?
não perder pontos, mas não se desloca com […]
a velocidade de um cavalo ou de um carro de ANTUNES, A.; BROWN, C.; MONTE, M.
Formula 1. Tribalistas, 2002 (fragmento).
GULLAR, F. Disponível em: www1.folha.
uol.com.br. Acesso em: 3 ago, 2012.
No terceiro verso, o vocábulo “corasam-
borim”, que é a junção coração + samba +
Há nas línguas mecanismos geradores de tamborim, refere-se, ao mesmo tempo, a ele-
palavras. Embora o Texto II apresente um mentos que compõem uma escola de samba
julgamento de valor sobre a formação da pa- e a situação emocional em que se encontra o
lavra sambódromo, o processo de formação autor da mensagem, com o coração no ritmo
dessa palavra reflete da percussão.
25
Essa palavra corresponde a um(a) informações com alto teor ético e de qua-
a) estrangeirismo, uso de elementos linguísti- lidade. O autor alerta que para os dias
cos originados em outras línguas e represen- atuais, a única maneira do jornalismo
tativos de outras culturas. sobreviver à internet é primando pela
b) neologismo, criação de novos itens linguís- fidelidade da informação e dos fatos, a
ticos, pelos mecanismos que o sistema da fim de prestar um serviço confiável e es-
língua disponibiliza. sencial à sociedade.
c) gíria, que compõe uma linguagem originada b) O prefixo – des tem o sentido de nega-
em determinado grupo social e que pode vir ção, de ação contrária. O também prefixo
a se disseminar em uma comunidade mais – inter tem o sentido de entre. O radical
ampla. é – mediar. O sufixo – ção é utilizado para
d) regionalismo, por ser palavra característica formar um substantivo a partir de um
de determinada área geográfica. verbo. Sendo assim, o processo de forma-
e) termo técnico, dado que designa elemento ção é de dois prefixos + radical + sufixo,
de área específica de atividade. para a criação do neologismo.
3.
a) Tanto o termo “invendável” quanto “im-
Gabarito prestável” apresenta o prefixo “in” que
agrega valor significativo de negação aos
adjetivos vendável e prestável. Vicente
E.O. Teste I Matheus queria dizer que Sócrates não
era passível de ser emprestável, ou seja,
1. B 2. C 3. A 4. B 5. C seria “inemprestável”, mas usou inade-
quadamente o termo “imprestável” que
6. A 7. B 8. A 9. E 10. E
significa inútil, que não tem serventia.
b) O termo “pérola” designa popular e iro-
nicamente um dito ou um fato um tanto
E.O. Teste II ou quanto tolo, quer pelo conteúdo, quer
1. B 2. 01 + 08 = 09 3. C 4. A 5. E pela forma como é dito. Ao usar o termo
“aquático”, Vicente Matheus associou um
6. D 7. D 8. E 9. A 10. A jogador de futebol a um animal anfíbio
(“pérola da zoologia”), além de lhe con-
ferir características de filólogo, pela rela-
E.O. Teste III ção quase imediata da palavra “gramáti-
1. D 2. A 3. A 4. D 5. C co” com o estudioso da língua (“pérola da
linguística”).
4.
E.O. Dissertativo a) Sim, pois o conceito de “liberdade nega-
1. tiva” traz subjacente a garantia de o indi-
a) Trata-se de uma derivação sufixal: “escu- víduo não ser obrigado a atos indesejados
lhambativo” é uma palavra formada pelo por abuso do poder constituído ou não
acréscimo de um sufixo (-ivo) ao verbo ser impedido de fazer aquilo que deseja,
“esculhambar”. ou seja, supõe um estado de direito em
b) Apesar de derivarem do mesmo verbo que sejam evitadas arbitrariedades por
(“esculhambar”), os adjetivos mencio- parte da esfera estatal.
nados diferem quanto ao seu significa- b) Sim, a expressão “conditio sine qua non”
do. Evento “esculhambado” é sinônimo é adequada ao contexto, erudito e de
de “desorganizado, desmoralizado”; já cunho científico, pois trata-se de uma
evento “esculhambativo” é aquele que expressão latina que remonta aos termos
“desmoraliza, satiriza” o evento anterior. jurídicos do Direito romano e que pode
2. ser traduzido como sem a/o qual não
a) O autor faz críticas implícitas ao jornalis- pode deixar de ser, indispensável.
mo atual, quando diz que só resta ao jor- c) Não, os prefixos gregos ant(i) e a(n) que
nalista que convive rotineiramente com ocorrem nas palavras “antitéticos” e “
a internet: produzir informação de alta anarquismo” expressam oposição e nega-
qualidade técnica e ética, fiel à verdade ção, respectivamente. Já o prefixo latino
dos fatos, verdadeiramente fiscalizadora ante e o de origem mista a das palavras
dos poderes públicos e com excelência “antediliviano” e “amoral” expressam
na prestação de serviços, comentário em anterioridade e ausência.
que se subentende que na era da frugali- A palavra “ desencontrários” é formada
5.
dade virtual, nem todo jornalista produz por derivação, processo através do qual de
26
uma palavra se formam outras, por meio verbo “anular” - por isso com a raiz “nul-
da agregação de certos elementos que lhe ” acrescida do prefixo “a-”. O sufixo em-
alteram o sentido, mas sempre se referin- pregado, “-vel”, significa “passível de”.
do ao valor semântico da palavra primi- b) Infringência = “ato de infringir”; incom-
tiva. Assim, há duas possibilidades para petência = “falta de competência”.
a formação da palavra em questão, con- Há o mesmo prefixo (in-) e o mesmo su-
siderando o radical, prefixos e sufixos e fixo (-ência) nas duas palavras, mas, no
desinências flexionais: des+en+contr+ caso da palavra “Infringência”, ocorre
ário+s;des+en+contr+ari+o+s. “Des” é um derivação sufixal, pois o prefixo faz par-
prefixo que indica negação. te do verbo, “infringir” (“desobedecer,
6. descumprir”), a cujo radical se juntou o
a) O emprego do neologismo agoramente, sufixo “-ência”, formador de substantivo
pois, ao acrescentar o sufixo “-mente” abstrato. Em “incompetência”, ocorre de-
ao vocábulo agora, Odorico cria outro ad-
rivação prefixal, pois o prefixo “in-”, de
vérbio, com a intenção de reforçar o tom
sentido negativo, se junta ao substantivo
persuasivo de seu discurso pretensamen-
competência.
te solene.
8.
b) Já que a palavra sagração pode ser en-
a) composição por justaposição e derivação
tendida como “ato ou efeito de sagrar
rei, bispo etc., em cerimônia religiosa”, sufixal.
ao usar a expressão “por que não dizer” b) Os observadores criaram um neologismo
para introduzir tal substantivo, Odorico superficialmente, pois eles não consegui-
intensifica sua pretensão de homem pú- ram alcançar um conhecimento aprofun-
blico que se julga digno de receber todas dado sobre o povo Ossevaolep.
as honras de seu povo. 9. Movimento para dentro
Uma das possibilidades:
7. §§ O menino sofria por dentro.
a) Conforme o texto: §§ O menino não dava sinais aparentes do
NULO significa “algo sem valor devido à seu sofrimento.
falta de uma formalidade fundamental”; §§ O menino não queria demonstrar à mãe
ANULÁVEL significa “que pode se tornar seu sofrimento.
nulo”. 10. O termo “ex-cineclubista” é resultado de
Diante disso, concluímos que, nos termos quatro processos de formação de palavras:
do artigo 1.548, não tem efeito o casa- redução/abreviação vocabular (cinecinema),
mento contraído por “enfermo mental composição (cine + clube), derivação sufixal
sem discernimento para os atos da vida (cineclube + ista) e derivação prefixal (ex +
civil” ou por pessoa sob impedimento; cineclubista).
nos termos do artigo 1.550, entende-se
que podem ser anulados os casamentos
contraídos por menores ou celebrados por
pessoa não autorizada. As duas palavras E.O. Enem
são adjetivos, sendo que “anulável” se
forma por derivação sufixal, a partir do 1. A 2. E 3. B

27
Aula 1 (I.T.)
Formação das palavras
aplicada ao texto
Morfologia aplicada exploradas das mais diversas maneiras nos vestibulares.
Vejamos os principais elementos de formação de pala-
ao texto vras aplicados ao texto:

Aprendemos na aula de Gramática que a Morfologia é


Conhecendo os sentidos
o campo de estudos linguísticos responsável por estu-
dar os processos de formação de palavras. Isso significa
dos prefixos e sufixos
que, no português, as palavras passam por processos de
A formação de palavras aplicada à interpretação de
“construção” em que são realizados encaixes de sufixos
textos exige dos alunos, muitas vezes, que estes reco-
e prefixos a determinados radicais.
nheçam as relações semânticas estabelecidas por certos
Outra questão importante, que deve ser levada
prefixos e sufixos.
em conta, é o fato de que a Morfologia seria o primei-
ro campo de estudos do português onde encontramos
elementos que operam relações de sentido no cam-
Os neologismos e os
po gramatical. Lembremos: na Fonética e na Fonologia textos literários
– os campos anteriormente estudados – estávamos li-
dando com o estudo de letras e sons que ainda não O neologismo é um fenômeno linguístico que muitas
compunham essas relações de sentido (os grafemas e vezes exerce influência definitiva no processo compre-
ensão textual. Vimos na aula de Gramática que ele se
os fonemas). A partir de agora estamos trabalhando
forma a partir de significados novos dados a palavras
com elementos que trazem consigo variadas acepções
já existentes, e também a partir de elementos já
de sentido. Esses elementos são os morfemas. Basica-
existentes na nossa língua. Esse último caso é mui-
mente, os morfemas funcionam de maneira bem sim-
to comum em textos literários, exigindo do aluno uma
ples. Vejamos:
interpretação dos processos de composição que deram
origem a nova palavra Vejamos os exemplos a seguir:
Prefixo Radical
In Feliz “Alta, sobre a cordilheira de cacundas sinuosas, oscilava
// Certo a maestração chifres.”
// Correto (Guimarães Rosa. Trecho do conto
“O burrinho pedrês”, do livro Sagarana)

O prefixo “in-“ estabelece rela- “Um velho e um miúdo vão seguindo pela estrada. An-
Radicais comportam sentidos
ção semântica (de sentido) de dam bambolentos como se caminhar fosse seu único
de origem
negação.
serviço desde que nasceram”.
(Mia Couto. Trecho do romance “Terra sonâmbula”)
Radical Sufixo
Terror Ismo Os exemplos acima foram retirados de obras lite-
Catolic // rárias com as quais o vestibulando terá que lidar. E nelas
Espirit // encontramos o fenômeno do neologismo. No primeiro
caso temos maestração, cujo significado, no contexto
da narrativa, alude ao fato de que os bois caminhavam
O sufixo “Ismo” estabe-
Radicais comportam como que regidos por um “maestro”; ou como se seus
lece relação semântica
sentidos de origem
de prática ou doutrina. chifres fizessem movimentos coordenados similares a de
um maestro que rege uma ópera. Repare que, estrutu-
Como vimos nos exemplos apresentados, todos ralmente, o neologismo foi criado a partir de elementos
os tipos de morfemas existentes no português (que são que existem em nossa língua: O radical “maestro” + o
o radical, o sufixo e o prefixo) estabelecem relações sufixo “-ação”, cujo sentido expressa movimento. Temos
semânticas, e são essas relações semânticas que são então maestração como “movimentos de maestro”.
29
No segundo exemplo, Mia Couto usa bambolentos para explicitar o modo como os personagens andavam
pela estrada. Eles andavam de maneira “cambaleante” (bambos) e também bastante devagar (lentos). Essa forma-
ção por justaposição é expressa, novamente, por palavras que já existem na língua.

Compreensão textual
Definir o que é o texto não é tarefa fácil. Mesmo quem lida habitualmente com esse material, sabe que não é pos-
sível se estabelecer uma definição segura, pela própria pluralidade e possibilidades de modificação que um texto
pode apresentar.
Tentando ser minimamente abrangente, podemos dizer que o texto engloba as capacidades que o ser
humano tem de se manifestar textualmente, entendendo esse textualmente como uma capacidade propriamente
comunicativa. Por esse motivo, os estudiosos de linguística entendem como “texto” um conjunto de manifestações
comunicativas que envolvem crônicas, romances, poemas, canções, mas não apenas isso; também filmes, escultu-
ras, quadros, tudo isso é considerado “texto”, pois são composições realizadas por meio de signos linguísticos que
podem ser interpretadas.
Com essa definição, vemos que se trata de algo amplo, que exigirá do aluno um aprofundamento nesse
repertório textual, coletando informações não apenas em textos escritos, mas também em filmes, quadros, canções
e quaisquer outros processos comunicativos. Nesse primeiro momento, apresentaremos apenas organizações mais
gerais. Ao longo do curso iremos detalhando os variados elementos verbais e não-verbais que nos permitirão rea-
lizar interpretações de textos mais seguras. A princípio, o que o vestibulando deve saber:
1. Um texto sempre apresentará traços estruturais, ou, em termos mais claros, é sempre importante identificar os
elementos que o autor usou para construir um texto.
2. Habitualmente, os textos apresentam temas, elementos de sentido aos quais você pode/deve se apegar para
conseguir compreendê-lo (compreender sua mensagem)
3. Os textos são dotados de marcas de historicidade. Isso quer dizer que, num texto, você possivelmente
encontrará dados relativos a uma história, a uma cultura, englobando até mesmo fatores sociais bastante
amplos. Isso é o que alguns chamam de contexto.
4. Os textos não possuem apenas historicidade, mas também marcas situacionais. Em outras palavras, não são
apenas fatores sociais e culturais que guiam o texto, mas também situações muito pontuais e específicas.
5. Texto engloba recepção. Não podemos nos esquecer de que o material textual tem como objetivo atingir um
interlocutor que irá ler/ver esse conteúdo. Ter isso em mente é fundamental para percebermos as intenciona-
lidades contidas em um texto.
6. Os textos não são peças isoladas. Muitas vezes os textos estabelecem relações com outros. É necessário
desde já se acostumar a praticar esses processos de relacionamento textual.
7. Entender textos exige repertório. Quanto mais conhecemos estímulos textuais, mais aumentam nossas con-
dições de realizar uma boa interpretação de textos. Esse movimento de acúmulo de informações envolve
não apenas leitura e visualização, mas também acúmulo de conhecimento teórico (gramatical).

30
E.O. Teste I 1. (Uerj) O termo megahipercorporações é for-
mado por um processo que enfatiza o tama-
nho e o poder das corporações econômicas
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO: atuais.
O FUTURO ERA LINDO Essa ênfase é produzida pelo emprego de:
a) sufixos de caráter aumentativo
A informação seria livre. Todo o saber do mun- b) prefixos com sentido semelhante
do seria compartilhado, bem como a música, c) radicais de combinação obrigatória
o cinema, a literatura e a ciência. O custo se- d) desinências de significado específico
ria zero. O espaço seria infinito. A velocidade,
estonteante. A solidariedade e a colaboração
2. (Enem)
seriam os valores supremos. A criatividade,
o único poder verdadeiro. O bem triunfaria TEXTO I
sobre os males do capitalismo. O sistema de Um ato de criatividade pode contudo gerar
representação se tornaria obsoleto. Todos os um modelo produtivo. Foi o que ocorreu com
seres humanos teriam oportunidades iguais a palavra sambódromo, criativamente forma-
em qualquer lugar do planeta. Todos seriam da com a terminação -(ó)dromo (= corrida),
empreendedores e inventivos. Todos pode- que figura em hipódromo, autódromo, cartó-
riam se expressar livremente. Censura, nunca dromo, formas que designam itens culturais
mais. As fronteiras deixariam de existir. As da alta burguesia. Não demoraram a circular,
distâncias se tornariam irrelevantes. O ini- a partir de então, formas populares como
maginável seria possível. O sonho, qualquer rangódromo, beijódromo, camelódromo.
sonho, poderia se tornar realidade. AZEREDO, J. C. Gramática Houaiss da língua
1
Livre, grátis, inovador, coletivo, palavras- portuguesa. São Paulo: Publifolha, 2008.
-chave do novo mundo que a internet inau-
gurou. Por anos esquecemos que a internet TEXTO II
foi uma invenção militar, criada para manter
o poder de quem já o tinha. Por anos fin- Existe coisa mais descabida do que chamar
gimos que transformar produtos físicos em de sambódromo uma passarela para desfile
produtos virtuais era algo ecologicamente de escolas de samba? Em grego, -dromo quer
correto, esquecendo que a fabricação de com- dizer “ação de correr, lugar de corrida”, dai
putadores e celulares, com a obsolescência as palavras autódromo e hipódromo. É certo
embutida em seu DNA, demanda o consumo que, às vezes, durante o desfile, a escola se
de quantidades vexatórias de combustíveis atrasa e é obrigada a correr para não perder
fósseis, de produtos químicos e de água, sem pontos, mas não se desloca com a velocidade
falar no volume assombroso de lixo não reci- de um cavalo ou de um carro de Formula 1.
clado em que resultam, incluindo lixo tóxico. GULLAR, F. Disponível em: www1.folha.
²Ninguém imaginou que o poder e o dinheiro se uol.com.br. Acesso em: 3 ago, 2012.
tornariam tão concentrados em megahipercor-
Há nas línguas mecanismos geradores de
porações norte-americanas como o Google, que
palavras. Embora o Texto II apresente um
iriam destruir para sempre tantas indústrias
julgamento de valor sobre a formação da pa-
e atividades em tão pouco tempo. Ninguém
lavra sambódromo, o processo de formação
previu que os mesmos Estados Unidos, graças
dessa palavra reflete
às maravilhas da internet sempre tão aberta e
a) o dinamismo da língua na criação de novas
juvenil, se consolidariam como os maiores es-
palavras.
piões do mundo, humilhando potências como a
b) uma nova realidade limitando o aparecimen-
Alemanha e também o Brasil, impondo os mé-
to de novas palavras.
todos de sua inteligência militar sobre a popu-
c) a apropriação inadequada de mecanismos de
lação mundial, e guiando ao arrepio da justiça
criação de palavras por leigos.
os bebês engenheiros nota dez em matemática
mas ignorantes completos em matéria de ética, d) o reconhecimento da impropriedade semân-
política e em boas maneiras. tica dos neologismos.
³Ninguém previu a febre das notícias inven- e) a restrição na produção de novas palavras
tadas, a civilização de perfis falsos, as enxur- com o radical grego.
radas de vírus, os arrastões de números de
cartão de crédito, a empulhação dos resulta- TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
dos numéricos falseados por robôs ou gera-
dos por trabalhadores mal pagos em países O Verbo For
do terceiro mundo, o fim da privacidade, o ¹Vestibular de verdade era no meu tempo. ²Já
terrorismo eletrônico, inclusive de Estado. estou chegando, ou já cheguei, à altura da
Marion Strecker Adaptado de Folha de São Paulo, 29/07/2014. vida em que tudo de bom era no meu tempo;
31
meu e dos outros coroas. Acho inadmissível alguns não sabiam ler) e depois se pergunta-
e mesmo chocante (no sentido antigo) um va o que queria dizer uma palavra trivial ou
coroa não ser reacionário. 4Somos uma força outra, qual era o plural de outra e assim por
histórica de grande valor. Se não agíssemos diante. Esse mal sabia ler, mas não perdia a
com o vigor necessário - evidentemente o pose. Não acertou a responder nada. Então,
condizente com a nossa condição 13provecta eu, carrasco fictício, peguei no texto uma
-, tudo sairia fora de controle, mais do que frase em que a palavra “for” tanto podia ser
já está. O vestibular, é claro, jamais voltará do verbo “ser” quanto do verbo “ir”. Pron-
ao que era outrora e talvez até desapareça, to, pensei. Se ele distinguir qual é o verbo,
mas julgo necessário falar do antigo às novas considero-o um gênio, dou quatro, ele passa
gerações e lembrá-lo às minhas coevas (ao e seja o que Deus quiser.
dicionário outra vez; domingo, dia de exer- - Esse “for” aí, que verbo é esse?
cício). 6
Ele considerou a frase longamente, como se
5O
vestibular de Direito a que me submeti, na eu estivesse pedindo que resolvesse a qua-
velha Faculdade de Direito da Bahia, tinha só dratura do círculo, depois ajeitou as abotoa-
quatro matérias: português, latim, francês ou duras e me encarou sorridente.
inglês e sociologia. Nada de cruzinhas, múl- - Verbo for.
tipla escolha ou matérias que não interessas- - Verbo o quê?
sem diretamente à carreira. Tudo escrito tão - Verbo for.
12
ruybarbosianamente quanto possível, com - Conjugue aí o presente do indicativo desse
citações decoradas, preferivelmente. verbo.
Havia provas escritas e orais. A escrita já dava - 9Eu fonho, tu fões, ele fõe - 8recitou ele, im-
nervosismo, da oral muitos nunca se recupe- pávido. - Nós fomos, vós fondes, eles fõem.
raram inteiramente, pela vida afora. Tirava-se 7
Não, dessa vez ele não passou. Mas, se per-
o ponto 10(sorteava-se o assunto) e partia-se severou, deve ter acabado passando e hoje
para o martírio, insuperável por qualquer es- há de estar num posto qualquer do Minis-
porte radical desta juventude de hoje. tério da Administração ou na equipe econô-
O maior público das provas orais era o que já mica, ou ainda aposentado como marajá, ou
tinha ouvido falar alguma coisa do candidato as três coisas. 3Vestibular, no meu tempo,
e vinha vê-lo “dar um show”. Eu dei show de era muito mais divertido do que hoje e, nos
português e inglês. O de português até que dias que correm, devidamente diplomado,
foi moleza, em certo sentido. O professor José ele deve estar fondo para quebrar. Fões tu?
Lima, de pé e tomando um cafezinho, me di- Com quase toda a certeza, não. Eu tampouco
rigiu as seguintes palavras aladas: fonho. Mas ele fõe.
- Dou-lhe dez, se o senhor me disser qual é o RIBEIRO, João Ubaldo. O Conselheiro Come. Nova
sujeito da primeira oração do Hino Nacional! Fronteira: Rio de Janeiro, 2000. p. 20-23.
- As margens plácidas - respondi instantane-
amente e o mestre quase deixa cair a xícara. 3. (Uece) No texto, a expressão “ruybarbosia-
- Por que não é indeterminado, “ouviram, namente” (ref. 12) significa
etc.”? a) a critério de Ruy Barbosa.
- Porque o “as” de “as margens plácidas” não b) ao contrário de Ruy Barbosa.
é craseado. Quem ouviu foram as margens c) à maneira de Ruy Barbosa.
plácidas. É uma anástrofe, entre as muitas d) às expensas de Ruy Barbosa.
que existem no hino. “Nem teme quem te
adora a própria morte”: sujeito: “quem te
adora.” Se pusermos na ordem direta...
- Chega! - 11berrou ele. - Dez! Vá para a gló-
E.O. Teste II
ria! A Bahia será sempre a Bahia!
Quis o irônico destino, uns anos mais tarde, TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
que eu fosse professor da Escola de Adminis-
tração da Universidade Federal da Bahia e me A internet e a morte da imaginação
Jacques Gruman
designassem para a banca de português, com “Nunca entendi essa obsessão por sorrisos em fotografias.
prova oral e tudo. Eu tinha fama de professor Deve ser um conluio com os dentistas.”
carrasco, que até hoje considero injustíssi- (Nora Tausz Rónai)
ma, e ficava muito incomodado com aqueles
rapazes e moças pálidos e trêmulos diante de Reza uma antiga lenda que dois reinos esta-
mim. Uma bela vez, chegou um sem o menor vam em guerra. Os perdedores acabaram con-
sinal de nervosismo, muito elegante, paletó, denados ao confinamento do outro lado dos
gravata e abotoaduras vistosas. A prova oral espelhos, um primitivo mundo virtual em
era bestíssima. Mandava-se o candidato(a) que eram obrigados a reproduzir tudo o que
ler umas dez linhas em voz alta (sim, porque os vencedores faziam. A luta dos derrotados
32
passava a ser como escapar daquela prisão. O que Cartier-Bresson1 esboçaria se esbarrasse
genial Lee Falk inspirou-se nesta narrativa nisso. Ele, que procurava a poesia nos peque-
para criar, na década de 1940, O mundo do nos gestos, no cotidiano que se desdobrava
espelho, para mim uma das mais aterrorizan- em surpresas, nos reflexos impensados, ja-
tes histórias do Mandrake. Espelhos foram, mais empilharia a coleção de sorrisinhos for-
aliás, protagonistas de algumas sequências çados que caracteriza a obsessão pelos clics.
cinematográficas assustadoras. Bóris Karlo- Essa história dos sorrisos foi muito bem
ff, um clássico do gênero, aproveitou muito notada pela Nora Rónai, que citei logo no
bem o medo que, desde crianças carregamos, início. Vivemos a era das aparências. Com a
de que nossos reflexos nos espelhos ganhem multiplicação das imagens, vem a obrigação
autonomia. Ui! Já imaginaram se isso viras- de “estar bem”. Afinal de contas, quem vai
se realidade? Teríamos de conviver com nos- querer se exibir no Facebook ou nas trocas
sos opostos, um estranhamento no mínimo de mensagens com uma ponta de melanco-
desconfortável. Os quadrinhos exploraram o lia ou, pelo menos, um suspiro de realidade?
assunto também na série do Mundo bizarro, O mundinho virtual exige estado de êxtase
do Super-Homem. Era um nonsense pouco permanente. Uma persona que não passa de
habitual no universo previsível dos super- ilusão. Criatividade não quer dizer tristeza,
-heróis. claro, mas certamente precisa incorporá-la
Estava pensando nos estranhamentos do como tijolo construtor da nossa personalida-
mundo moderno quando me deparei com de. O resto é fofoca. Eric Nepomuceno, tra-
uma pequena nota de jornal. Encenava-se a dutor e escritor, fez o seguinte comentário
ópera Carmen, de Bizet, no Theatro Munici- sobre seu amigo Gabriel Garcia Márquez, que
pal do Rio. Suponho que a plateia, que pagou acabara de morrer: “Tudo o que ele escreveu
caro, estava mergulhada na história e na in- é revelador da infinita capacidade de poesia
terpretação da orquestra e dos solistas. Não contida na vida humana. O eixo, porém, foi
é que um cidadão saca seu iPad e passa um sempre o mesmo, ao redor do qual giramos
tempão checando os e-mails, dedinhos ner- todos: a solidão e a esperança perene de en-
vosos para cima e para baixo, com a tela ilu- contrar antídotos contra essa condenação”.
minando a penumbra indispensável para a Nada que essas maquininhas onipresentes
fruição plena do espetáculo? Como esse tipo possam registrar, elas que jamais entende-
de desrespeito está entrando na “normali- riam a fina ironia de Fernando Pessoa no
dade”, apenas uma pessoa esboçou reação. Poema em linha reta, que começa assim:
Uma espécie de angústia semelhante à in- “Nunca conheci quem tivesse levado porra-
continência urinária se espalha como praga da. Todos os meus conhecidos têm sido cam-
nas relações pessoais e no uso dos espaços peões em tudo”. Mais adiante: “Arre, estou
público e privado. Tudo passou a ser urgen- farto de semideuses. Onde é que há gente
te. Todos os torpedos, e-mails e chamadas no nesse mundo?”.
celular viraram prioridade, casos de vida ou A praga narcísica desembarcou nas camas.
morte. Interrompem-se conversas para olhar Leio que nova moda é fazer selfies2 depois
telinhas e telonas, desrespeitando interlocu- do sexo. O casal transa, mas isso não basta.
tores. Como este tipo de patologia tende a É urgente compartilhar! Tira-se uma foto da
se diversificar, já há gente que conversa e aparência de ambos, coloca-se no Instagram
olha o computador ao mesmo tempo, como e ... pronto. O mundo inteiro será testemu-
aqueles lagartos esquisitos cujos olhos se nha de um momento íntimo, talvez o mais
movimentam sem aparente coordenação. íntimo de todos. Meu estranhamento vai ao
Outros participam de reuniões sem desligar paroxismo. É a esse mundo que pertenço?
sua tralha eletrônica (na verdade, não estão Antigamente, era costume dizer que o que
nas reuniões). Especialistas em informática não aparecia na televisão não existia. Atu-
previram que, num futuro não muito distan- alizando a frase: pelo visto, o que não está
te, chips serão implantados no corpo. Estão na rede não existe. É a universalização do
atrasados. Corpos já pertencem a máquinas. movimento apenas muscular, sem sentido,
A vida é controlada a distância e por outros. leviano, rapidamente perecível.
Outro estranhamento vem da inundação de Durante o exílio, o poeta argentino Juan Gel-
imagens, aflição que chamo de galeria dos man passou um bom tempo sem conseguir
sem imaginação. Enxurradas de fotos inva- escrever. A inspiração não vinha. Disse ele:
dem o espaço virtual, a enorme maioria de- “A poesia é uma senhora que nos visita ou
las sem o menor significado e perfeitamente não. Convocá-la é uma impertinência inútil.
descartáveis. O Instagram recebe 60 milhões Durante uns bons quatro anos, o choque do
de fotos por dia, ou seja, quase 700 fotos por exílio fez com que essa senhora não me visi-
segundo! Fico pensando no sorriso irônico tasse”. Quando, finalmente, a senhora chega,
ou, quem sabe, no horror em estado bruto, tudo muda, como narra o poeta: “A visita é
33
como uma obsessão. Uma espécie de ruído 2. (Ufsm) Guia verde politicamente incorreto
junto ao ouvido. Escrevo para entender o Nem ecochatos nem ecocéticos. Não existem
que está acontecendo”. Não consigo imaginar verdades absolutas na sustentabilidade. Há
uma serenidade como essa no mundo virtual. sempre alguma sujeira escondida debaixo do
Tudo nasce e morre antes de ser completa- tapete - e soluções em lugares que ninguém
mente absorvido. Cada novidade passa a ser esperava.
vital, filas se formam nas madrugadas nas HORTA, Maurício. “Guia verde politicamente
incorreto”. Superinteressante, dez. 2011, p. 57.
portas de lojas que começam a vender mode-
los mais avançados de produtos eletrônicos. Considerando eco como um radical grego
Não dá pra esperar um dia, muito menos uma que significa casa, hábitat, as palavras “eco-
hora. O silêncio e a introspecção são guerri- chatos” e “ecocéticos” são formadas por
lheiros no habitat plugado. Estou me alistan- __________. A primeira representa o gru-
do neste exército de Brancaleone.3 po dos __________ e a outra, o grupo dos
1
Henri Cartier-Bresson: (França 1908- __________ no que se refere a atividades
2004), fotógrafo do século XX, considerado sustentáveis.
por muitos como o pai do fotojornalismo. Assinale a alternativa que preenche adequa-
2
fazer selfies: selfie é uma palavra em in- damente as lacunas.
glês, um neologismo com origem no termo a) composição – enfadonhos – descrentes
self-portrait, que significa autorretrato, e é b) derivação prefixal – insistentes – desconfiados
uma foto tirada e compartilhada na inter- c) aglutinação – desgostosos – descrentes
net. Normalmente uma selfie é tirada pela d) neologismo – aborrecidos – preocupados
própria pessoa que aparece na foto, com um e) derivação parassintética – insistentes – críticos.
celular que possui uma câmera incorporada,
com um smartphone, por exemplo.
3
O Incrível Exército de Brancaleone (em E.O. Teste III
italiano: L’armata Brancaleone): é um filme
italiano de 1966, do gênero comédia. Foi TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
dirigido por Mario Monicelli. O Exército de
Brancaleone é considerado um clássico ita- Ora nesse tempo Jacinto concebera uma
liano, que retrata os costumes da cavalaria ideia... Este Príncipe concebera a ideia de que
medieval através da comédia satírica. É um o “homem só é superiormente feliz quando
filme inspirado em Dom Quixote, do espa- é superiormente civilizado”. E por homem
nhol Miguel de Cervantes. civilizado o meu camarada entendia aquele
que, robustecendo a sua força pensante com
Disponível em: <http://www.cartamaior.com.
br/?/Opiniao/A-morte-da-imaginacao/ todas as noções adquiridas desde Aristóte-
30783>. Acesso em: 16 ago. 2014. (Adaptado).
les, e multiplicando a potência corporal dos
seus órgãos com todos os mecanismos inven-
tados desde Teramenes, criador da roda, se
1. (Cefet MG) O emprego do diminutivo nos torna um magnífico Adão, quase onipotente,
termos em destaque NÃO tem valor irônico quase onisciente, e apto portanto a recolher
[...] todos os gozos e todos os proveitos que
em:
resultam de Saber e Poder... [...]
a) “O mundinho virtual exige estado de êxtase
Este conceito de Jacinto impressionara os
permanente.”
nossos camaradas de cenáculo, que [...] es-
b) “Os quadrinhos exploraram o assunto também
tavam largamente preparados a acreditar
na série do Mundo bizarro, do Super-Homem. que a felicidade dos indivíduos, como a das
c) “Nada que essas maquininhas onipresentes nações, se realiza pelo ilimitado desenvolvi-
possam registrar, elas que jamais entende- mento da Mecânica e da erudição. Um desses
riam a fina ironia de Fernando Pessoa no Po- moços [...] reduzira a teoria de Jacinto [...]
ema em linha reta ...” a uma forma algébrica:
d) “Ele, que procurava a poesia nos pequenos
gestos, no cotidiano que se desdobrava em Suma ciência 
surpresas, nos reflexos impensados, jamais 
× =Suma felicidade
empilharia a coleção de sorrisinhos forçados
Suma potência 
que caracteriza a obsessão pelos clics.”
e) “Não é que um cidadão saca seu iPad e passa E durante dias, do Odeon à Sorbona, foi lou-
um tempão checando os e-mails, dedinhos vada pela mocidade positiva a Equação Meta-
nervosos para cima e para baixo, com a tela física de Jacinto.
iluminando a penumbra indispensável para a Eça de Queirós, A cidade e as serras.
fruição plena do espetáculo?”
34
1. (Fuvest) Sobre o elemento estrutural “oni”, do espírito da língua, exprimem bem o que se
que forma as palavras do texto “onipotente” pretende com seu uso e constituem derivações
perfeitamente legítimas.
e “onisciente”, só NÃO é correto afirmar:
Por que será que aceitamos sem discutir uma
a) Equivale, quanto ao sentido, ao pronome
excrescência como “paralimpíada”?
“todos(as)”, usado de forma reiterada no
(João Ubaldo Ribeiro, O Estado de S. Paulo, 23/09/2012)
texto.
b) Possui sentido contraditório em relação ao O que motivou a indignação do autor com a
advérbio “quase”, antecedente. palavra “paralimpíadas” foi o(a):
c) Trata-se do prefixo “oni”, que tem o mesmo a) imposição da palavra, formada por um me-
sentido em ambas as palavras. canismo que dispensa elementos conhecidos
d) Entra na formação de outras palavras da lín- da língua.
gua portuguesa, como “onipresente” e “oní- b) aceitação irrestrita do termo por parte da
voro”. mídia, especialmente pela televisão.
e) Deve ser entendido em sentido próprio, em c) fato de que, ao contrário do neologismo
“onipotente”, e, em sentido figurado, em “imexível”, a palavra não foi incorporada aos
“onisciente”. dicionários.
d) tentativa de resgatar palavras arcaicas tal
2. (Insper) Paralimpíadas é a mãe como se fossem decretos imperiais.
Certamente eu descobriria no Google, mas me e) recusa à adoção do neologismo pelos portu-
deu preguiça de pesquisar e, além disso, não gueses, cuja atitude revela-se conservadora.
tem importância saber quem inventou essa
palavra grotesca, que agora a gente ouve nos
noticiários de televisão e lê nos jornais. O E.O. Dissertativo
surpreendente não é a invenção, pois sempre
houve besteiras desse tipo, bastando lembrar 1. (Unicamp) Os textos abaixo foram retirados
os que se empenharam em não jogarmos fu- da coluna “Caras e bocas”, do Caderno Aliás,
tebol, mas ludopédio ou podobálio. O impres- do jornal O Estado de São Paulo:
sionante é a quase universalidade da adoção “A intenção é salvar o Brasil.” Ana Paula
dessa palavra (ainda não vi se ela colou em Logulho, professora e entusiasta da segun-
Portugal, mas tenho dúvidas; os portugueses da “Marcha da Família com Deus pela Liber-
são bem mais ciosos de nossa língua do que dade”, que pede uma intervenção militar
nós), cujo uso parece ter sido objeto de um no país e pretendeu reeditar, no sábado, a
decreto imperial e faz pensar em por que não passeata de 19 de março de 1964, na capi-
classificamos isso imediatamente como uma tal paulista, contra o governo do Presidente
aberração deseducadora, desnecessária e João Goulart.
inaceitável, além de subserviente a ditames “Será um evento esculhambativo em home-
saídos não se sabe de que cabeça desmiolada nagem ao outro de São Paulo.” José Caldas,
ou que interesse obscuro. Imagino que temos organizador da “Marcha com Deus e o Diabo
autonomia para isso e, se não temos, deverí- na Terra do Sol”, convocada pelo Facebook
amos ter, pois jornal, telejornal e radiojornal para o mesmo dia, no Rio de Janeiro.
implicam deveres sérios em relação à língua.
O Estado de São Paulo, 23/03/2014, Caderno
Sua escrita e sua fala são imitadas e tidas Aliás, E4. Negritos presentes no original.
como padrão e essa responsabilidade não
pode ser encarada de forma leviana. a) Descreva o processo de formação de palavras
Que cretinice é essa? Que quer dizer essa pa- envolvido em “esculhambativo”, apontando o
lavra, cuja formação não tem nada a ver com tipo de transformação ocorrida no vocábulo.
nossa língua? Faz muitos e muitos anos, o então b) Discorra sobre a diferença entre as expressões
ministro do Trabalho, Antônio Magri, usou a pa- “evento esculhambado” e “evento esculham-
lavra “imexível” e foi gozado a torto e a direito, bativo”, considerando as relações de sentido
até porque ele não era bem um intelectual e era existentes entre os dois textos acima.
visto como um alvo fácil. Mas, no neologismo
que talvez tenha criado, aplicou perfeitamente 2. (Unicamp) A sobrevivência dos meios de
as regras de derivação da língua e o vocábulo comunicação tradicionais demanda foco ab-
resultante não está nada “errado”, tanto assim soluto na qualidade de seu conteúdo. A in-
que hoje é encontrado em dicionários e tem uso ternet é um fenômeno de desintermediação.
corrente. Já o vi empregado muitas vezes, sem E que futuro aguardam os meios de comu-
alusão ao ex-ministro. Infutucável, inesculham- nicação, assim como os partidos políticos e
bável e impaquerável, por exemplo, são palavras os sindicatos, num mundo desintermediado?
que não se acham no dicionário, mas qualquer Só nos resta uma saída: produzir informação
falante da língua as entende, pois estão dentro de alta qualidade técnica e ética. Ou fazemos
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jornalismo de verdade, fiel à verdade dos fa- a) Retire dos textos duas marcas que caracte-
tos, verdadeiramente fiscalizador dos pode- rizariam a informalidade pretendida pela
res públicos e com excelência na prestação publicação, explicitando de que tipo elas
de serviços, ou seremos descartados por um são (sintáticas, morfológicas, fonológicas ou
consumidor cada vez mais fascinado pelo lexicais, isto é, de vocabulário).
aparente autocontrole da informação na pla- b) Pode-se afirmar que certas expressões em-
taforma virtual. pregadas no texto, como “tá” e “botar”, se
(Carlos Alberto di Franco, Democracia demanda diferenciam de outras, como “galera” e “gra-
jornalismo independente. O Estado de São na”, quanto ao modo como funcionam na
Paulo, São Paulo, 14/10/2013, p. A2.)
sociedade brasileira. Explique que diferença
a) “Desintermediação” é um termo técnico do é essa.
campo da comunicação. Ele se refere ao fato
de que os meios de comunicação tradicionais 4. (Unicamp) Os verbetes apresentados em (II)
não mais detêm o monopólio da produção a seguir trazem significados possíveis para
e distribuição de mensagens. Considerando algumas palavras que ocorrem no texto inti-
esse “mundo desintermediado”, identifique tulado Bicho Gramático, apresentado em (I).
duas críticas ao jornalismo atual formuladas
pelo autor. I
b) Os processos de formação de palavras envol-
vidos no vocábulo “desintermediação” não Bicho gramático
ocorrem simultaneamente. Tendo isso em
mente, descreva como ocorre a formação da Vicente Matheus (1908-1997) foi um dos
palavra “desintermediação”. personagens mais controversos do futebol
brasileiro. Esteve à frente do paulista Corin-
3. (Unicamp) Reproduzimos abaixo a chamada thians em várias ocasiões entre 1959 e 1990.
de capa e a notícia publicadas em um jornal Voluntarioso e falastrão, o uso que fazia da
brasileiro que apresenta um estilo mais in- língua portuguesa nem sempre era aquele
formal. reconhecido pelos livros. Uma vez, querendo
Governo quer fazer a galera deixar bem claro que o craque do Timão não
pendurar a chuteira mais tarde seria vendido ou emprestado para outro clu-
be, afirmou que “o Sócrates é invendável e
Duro de parar imprestável”. Em outro momento, exaltando
Como a vovozada vive até mais tarde, a in-
a versatilidade dos atletas, criou uma pérola
tenção, agora, é criar regra para aumentar a
da linguística e da zoologia: “Jogador tem
idade mínima exigida para a aposentadoria;
que ser completo como o pato, que é um bi-
objetivo é impedir que o INSS quebre de vez
Página 12 cho aquático e gramático”.
(Adaptado de Revista de História da
Descanso mais longe Biblioteca Nacional, jul. 2011, p. 85.)
O brasileiro tá vivendo cada vez mais – o que
é bom. Só que quanto mais ele vive, mais a II
situação do INSS se complica, e mais o go-
verno trata de dificultar a aposentadoria do Invendável: que não se pode vender ou que
pessoal pelo teto (o valor integral que a pes- não se vende com facilidade.
soa teria direito de receber quando pendura Imprestável: que não tem serventia; inútil.
as chuteiras) – o que não é tão bom. Aquático: que vive na água ou à sua super-
A última novidade que já tá em discussão fície.
lá em Brasília é botar pra funcionar a regra Gramático: que ou o que apresenta melhor
85/95, que diz que só se aposenta ganhan- rendimento nas corridas em pista de grama
do o teto quem somar 85 anos entre idade e (diz-se de cavalo).
tempo de contribuição (se for mulher) e 95 (Dicionário HOUAISS (versão digital
anos (se for homem). on line), houaiss.uol.com.br)
Ou seja, uma mulher de 60 anos só levaria
a grana toda se tivesse trampado registrada a) Descreva o processo de formação das pala-
por 25 anos (60 + 25 = 85) e um homem da vras invendável e imprestável e justifique a
mesma idade, se tivesse contribuído por 35 afirmação segundo a qual o uso que Vicente
(60 + 35 = 95). Matheus fazia da língua portuguesa “nem
Quem quiser se aposentar antes, pode – só sempre era aquele reconhecido pelos livros”.
que vai receber menos do que teria direito b) Explique por que o texto destaca que Vicen-
com a conta fechada. te Matheus “criou uma pérola da linguística
(notícia JÁ, Campinas, 30/06/2012, p.1 e 12.) e da zoologia”.
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TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO: invadiram a Internet. Se em relação às coi-
sas prosaicas se diz que a vingança vem a
BRINCAR COM PALAVRAS - NOS JOGOS VER- cavalo, no caso da poesia a vingança veio
BAIS, EXERCÍCIOS DE LITERATURA a cabo, galopando eletronicamente. Por
1. Você sabe o que é um palíndromo? isto que toda vez que um jovem iniciante
2. É uma palavra ou mesmo uma frase que me procura com a angústia de publicar seu
pode ser lida de frente pra trás e de trás livro, aconselho-o logo: “Meu filho, abra
pra frente mantendo o mesmo senti- uma página sua na Internet para não mais
do. Por exemplo, em português: “amor” se constranger e se sentir constrangido
e “Roma”; em espanhol: “Anita lava la diante dos editores e críticos. Estampe seu
tina”. Ou, então, a frase latina: “Sator texto na Internet e deixe rolar”.
arepo tenet opera rotas”, que não só pode (ROMANO, Affonso de Sant’Anna. O Globo, 15/09/1999.)
ser lida de trás pra frente, mas pode ser
lida na vertical, na horizontal, de baixo
pra cima, de cima pra baixo, girando os 5. (Uerj) Você sabe o que é um palíndromo? (par.
olhos em redor deste quadrado: 1)
SATOR Por que estou dizendo essas coisas? (par. 7)
AREPO Observando os parágrafos compreendidos
TENET entre as perguntas acima, identifique:
OPERA a) a função da linguagem predominante nesses
ROTAS parágrafos e justifique sua reposta;
3. Essa frase latina polivalente foi criada b) o processo de formação de palavras comum
pelo escravo romano Loreius 200 anos an- aos termos OCULTAÇÃO e OCULTISMO e expli-
tes de Cristo, e tem dois significados: “O que a diferença de sentido entre eles.
lavrador mantém cuidadosamente a char-
rua nos sulcos” e/ou “o lavrador sustém
cuidadosamente o mundo em sua órbita”.
Osman Lins construiu o romance “Avalo-
Gabarito
vara” (1973) em torno desse palíndromo.
4. Muita gente sabe o que é um caligrama
- aqueles textos que existiam desde a E.O. Teste I
Grécia em que as letras e frases iam de- 1. B 2. A 3. C
senhando o objeto a que se referiam - um
vaso, um ovo, ou então, como num autor
moderno tipo Apollinaire, as frases do
poema se inscrevendo em forma de cava-
E.O. Teste II
lo ou na perpendicular imitando o feitio 1. B 2. A
da chuva.
5. Mas pouca gente sabe o que é um lipogra-
ma. E.O. Teste III
6. Lipo significa tirar, aspirar, esconder. 1. E 2. A
Portanto, um lipograma é um texto que
sofreu a lipoaspiração de uma letra. O au-
tor resolve esconder essa letra por razões E.O. Dissertativo
lúdicas. Já o grego Píndaro havia escri- 1.
to uma ode, sem a letra “s”. Os autores a) Trata-se de uma derivação sufixal: “escu-
barrocos no século XVII também usavam lhambativo” é uma palavra formada pelo
este tipo de ocultação, porque estavam acréscimo de um sufixo (-ivo) ao verbo
envolvidos com o ocultismo, com a cabala “esculhambar”.
e com a numerologia. b) Apesar de derivarem do mesmo verbo
7. Por que estou dizendo essas coisas? (“esculhambar”), os adjetivos mencio-
8. Culpa da Internet. nados diferem quanto ao seu significa-
9. Esses jogos verbais que vinham sendo fei- do. Evento “esculhambado” é sinônimo
tos desde as cavernas agora foram potencia- de “desorganizado, desmoralizado”; já
lizados com a informática. Dizia eu numa evento “esculhambativo” é aquele que
entrevista outro dia que estamos vivendo “desmoraliza, satiriza” o evento anterior.
um paradoxo riquíssimo: a mais avançada 2.
tecnologia eletrônica está resgatando o uso a) O autor faz críticas implícitas ao jornalis-
lúdico da linguagem e uma das mais arcai- mo atual, quando diz que só resta ao jor-
cas atividades humanas - a poesia. Os po- nalista que convive rotineiramente com
etas, mais que quaisquer outros escritores, a internet: produzir informação de alta
37
qualidade técnica e ética, fiel à verdade b) O termo “pérola” designa popular e iro-
dos fatos, verdadeiramente fiscalizadora nicamente um dito ou um fato um tanto
dos poderes públicos e com excelência na ou quanto tolo, quer pelo conteúdo, quer
prestação de serviços, comentário em que pela forma como é dito. Ao usar o termo
se subentende que na era da frugalidade “aquático”, Vicente Matheus associou um
virtual, nem todo jornalista produz infor- jogador de futebol a um animal anfíbio
mações com alto teor ético e de qualidade. (“pérola da zoologia”), além de lhe con-
O autor alerta que para os dias atuais, a ferir características de filólogo, pela rela-
única maneira do jornalismo sobreviver à ção quase imediata da palavra “gramáti-
internet é primando pela fidelidade da in- co” com o estudioso da língua (“pérola da
formação e dos fatos, a fim de prestar um linguística”).
serviço confiável e essencial à sociedade. 5.
b) O prefixo – des tem o sentido de nega- a) Função metalinguística.
ção, de ação contrária. O também prefixo Uma dentre as justificativas:
– inter tem o sentido de entre. O radical - Os parágrafos explicam os significados
é – mediar. O sufixo – ção é utilizado para das palavras.
formar um substantivo a partir de um - Os parágrafos contêm definição de pala-
verbo. Sendo assim, o processo de forma- vras por outras palavras.
ção é de dois prefixos + radical + sufixo, b) Derivações sufixal ou sufixação.
para a criação do neologismo. OCULTAÇÃO é o ato de ocultar e OCULTIS-
3. MO designa crença, doutrina ou seita.
a) O texto apresenta várias marcas que ca-
racterizam a informalidade pretendida
pela publicação, relativamente à estrutu-
ra das frases (sintáticas), aos fragmentos
mínimos capazes de expressar significa-
do (morfológicas), aos recursos que ex-
ploram o sistema sonoro (fonológicas)
e aos lexicais, relacionados com as uni-
dades significativas, como nos seguintes
casos:
Sintáticas: “Quem quiser se aposentar
antes, pode”, ao invés de quem quiser,
pode aposentar-se antes.
Morfológicas: “vovozada”, pelo acréscimo
do sufixo –ada ao termo vovó.
Fonológicas: “tá” e “pra”, em vez de está
e para.
Lexicais: “galera”, “pendurar a chutei-
ra”, “duro”, “botar pra funcionar”, “gra-
na” e “trampado” com valor semântico
de grupo de pessoas, encerrar atividades,
difícil, colocar em prática, dinheiro e tra-
balhado, respectivamente.
b) Enquanto as expressões “tá” e “botar”
configuram marcas de oralidade presen-
tes nos mais diversos contextos, “gale-
ra” e “grana” são gírias, fenômeno de
linguagem que se origina de um grupo
social restrito e alcança, pelo uso, outros
grupos, tornando-se de uso corrente.
4.
a) Tanto o termo “invendável” quanto “im-
prestável” apresenta o prefixo “in” que
agrega valor significativo de negação aos
adjetivos vendável e prestável. Vicente
Matheus queria dizer que Sócrates não
era passível de ser emprestável, ou seja,
seria “inemprestável”, mas usou inade-
quadamente o termo “imprestável” que
significa inútil, que não tem serventia.
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Aula 2 (Gramática)
Verbos: noções preliminares
Verbo
Verbo é a classe de palavras que, do ponto de vista semântico (morfológico), contém as noções de ação, processo,
estado, mudança de estado e manifestação de fenômenos da natureza. São variáveis e suas flexões marcam:
§§ pessoa: indica o emissor, o destinatário ou o ser sobre o qual se fala. Os pronomes pessoais do caso reto
indicam as pessoas do verbo: eu, tu, ele(a), nós, vós, eles(as);
§§ número: indica se o sujeito gramatical é singular ou plural;
§§ tempo: localiza a ação, processo ou estado em relação ao momento do enunciado. Os tempos verbais
são seis: pretérito mais-que-perfeito, pretérito perfeito, pretérito imperfeito, futuro do pretérito, presente e
futuro (do presente);
§§ modo: indica a atitude do emissor quanto ao fato por ele enunciado, que pode ser de certeza, dúvida,
temor, desejo, ordem etc. Os modos verbais são: indicativo, subjuntivo e imperativo (afirmativo e negativo);
§§ voz: indica se o sujeito gramatical é agente, paciente ou, ao mesmo tempo, agente e paciente da ação;

Conjugações verbais
Conjugar um verbo compreende em adicionar ao seu radical a vogal temática da conjugação ou classe a que per-
tence mais os sufixos modo-temporal e número-pessoal, que lhe são permitidos. Existem três conjugações verbais
na língua portuguesa:
§§ 1a conjugação: indicada pela vogal temática –a– (amar, brincar, falar);
§§ 2a conjugação: indicada pela vogal temática –e– (nascer, crescer, morrer);
§§ 3a conjugação: indicada pela vogal temática –i– (dormir, sorrir, partir).

O verbo pôr e seus derivados são considerados de 2ª conjugação por conta de um processo fonológico que
suprimiu a vogal temática –e–. Em um estágio anterior da língua portuguesa, a sua forma era poer.

Classificação dos verbos

Verbos regulares
Os verbos regulares não sofrem alteração do radical e das desinências nos diferentes tempos, modos e pessoas. O
radical do verbo é obtido pela supressão das terminações do infinitivo (–r):
§§ mand(ar), vend(er), part(ir)
§§ mand(o), vend(o), part(o)

Verbos irregulares
Os verbos irregulares sofrem alteração do radical e das desinências, nos diferentes tempos, modos e pessoas.
§§ fazer: faço, faria, fazia
§§ estar: estou, estive, estarei
§§ saber: sei, soubera, saiba
41
Verbos anômalos
Os particípios abundantes são classificados
em regulares e irregulares.
Os verbos anômalos possuem diferentes radicais:
a. As formas regulares terminadas em –ado,
§§ ser: sou, é, fomos
–ido, não contraídas, mas analíticas, acom-
§§ ir: vou, fui, ia panham os verbos auxiliares ter e haver.
Ele já havia pagado a dívida.
Tínhamos aceitado o convite.
Verbos defectivos b. As formas irregulares, contraídas, acompa-
nham os verbos auxiliares ser e estar.
Os verbos defectivos não possuem todas as formas: O feijão foi cozido na panela de pressão.
§§ reaver (composto de haver, tem apenas as for- “A lâmpada foi acesa”
mas em V): reavemos, reavia, reaverá
§§ precaver: precavenho, precavenha, precavinha
§§ latir: lates, late, latimos
Vozes verbais
§§ colorir: colores, colore, colorimos, coloris O fato expresso pelo verbo pode ser representado em
três formas, em três vozes.
Observação §§ As crianças beijam os pais. “Fato (beijam) pratica-
do pelo sujeito (crianças) = verbo na voz ativa.”
Entre os verbos defectivos estão incluídos os
João cortou árvores. “Fato (cortou) praticado
chamados verbos impessoais, usados apenas na
pelo sujeito (João) = verbo na voz ativa.”
terceira pessoa do singular: chover, trovejar, ventar,
§§ Os pais são beijados pelas crianças. “O sujeito
haver (existir), fazer (refere-se ao clima: faz frio, ao
(pais) é alvo da ação das crianças = verbo na
tempo: faz dez anos).
voz passiva.”
§§ Árvores foram cortadas por João. “O sujeito (ár-
Verbos auxiliares vores) é alvo, sofre a ação de João = verbo na
voz passiva.”
Os verbos auxiliares formam os tempos compostos ou §§ João cortou-se com o machado. “O sujeito
locuções verbais com os verbos principais: (João) é alvo, sofre sua própria ação (cortou-se)
= verbo na voz reflexiva.”
§§ ser (pago)
§§ estar (curado)
§§ ter (estudado)
Voz ativa
§§ haver (prometido)
§§ O fato indicado pelo verbo e exercido pelo sujei-
to (pessoa ou coisa) recai sobre um objeto (pes-
soa ou coisa): Os coletores recolhem diariamente
Verbos abundantes toneladas de lixo./ Os caminhões despejam to-
neladas de lixo.
Os verbos abundantes apresentam mais de uma forma,
especificamente de particípio: §§ As vozes ativa e passiva existem tão somente
com verbos transitivos diretos, que necessaria-
§§ cozido e cozinhado
mente preveem sujeito (agente da ação) e objeto
§§ morto e morrido (alvo da ação): Alberto tirou boas notas./ Os pais
§§ imprimido e impresso amam seus filhos.
42
Voz passiva analítica Na voz reflexiva, a ação desempenhada pelo su-
jeito do verbo incide sobre esse mesmo sujeito, objeto
§§ A voz passiva dos verbos é formada pelo verbo
direto ou indireto representado pelos pronomes pesso-
auxiliar ser, conjugado no tempo e na pessoa
desejados, seguido do particípio do verbo prin- ais oblíquos.
cipal: A árvore foi cortada pelo lenhador./ Mui- § Márcia feriu-se com uma agulha. (Márcia cau-
tas mansões foram alugadas em Brasília./ Muita sou um ferimento em si mesma.)
gente ainda vai ser julgada inocente.
§§ A voz passiva analítica sempre é formada por
tempos compostos – ser + verbo principal tran-
Formas nominais do verbo
sitivo direto –, bem como com os verbos auxilia-
O infinitivo, o particípio (regular e irregular) e o gerún-
res ter e haver: Têm sido (foram) alugadas mui-
dio são chamados formas nominais do verbo porque
tas mansões em Brasília.
podem funcionar como nomes – substantivo, adjetivo.

§§ Infinitivo
Voz passiva sintética O comer demais faz mal. (substantivo)
O viver é bom. (substantivo)
§§ Formada com o verbo principal transitivo direto
na voz ativa, na terceira pessoa do singular ou do §§ Gerúndio
plural, acompanhado da partícula apassivadora Ela bebeu chá fervendo. (advérbio)
se: Aluga-se casa./ Alugam-se casas./ Compra- Fervendo, desligue. (advérbio)
-se apartamento./ Compram-se apartamentos.
§§ Particípio
Persuadem-se alunos com muito empenho.
Problema resolvido. (adjetivo)
A feira foi inaugurada. (adjetivo)
O parque foi inaugurado. (adjetivo)
Voz reflexiva
§§ Necessariamente formada pelos verbos prono-
minais – acompanhados de me, te, se, nos,
Locução verbal
vos, se – cuja ação designada parte do sujeito
A locução verbal é a expressão constituída por verbo
e volta-se para ele mesmo: Eu me feri. (O ato e o
efeito do ferimento partem e voltam para o “eu”, (ou verbos auxiliares) seguido do verbo principal.
sujeito.)/ Tu te feriste./ Ele se machucou./ Nós nos A Europa vem sendo desgastada pela crise.
prejudicamos./ Eles se feriram com faca. O verbo auxiliar “vem” designa a pessoa e o nú-
mero do sujeito “Europa”, bem como o tempo verbal
designado pelo verbo principal “desgastada” – presen-
Morfossintaxe das te do indicativo. O verbo principal está na voz passiva
vozes verbais (ser desgastada).
Hei de fazer algo mais legal.
A passagem dos verbos transitivos diretos da voz ativa
Trata-se de uma locução verbal constituída pelo
para a passiva, e vice-versa, não altera o sentido do que
auxiliar “hei” e o infinitivo impessoal “fazer”, antecedi-
diz a oração. São alteradas apenas as funções sintáticas:
do da preposição “de”.
o sujeito da voz ativa passa a agente da passiva, e o
objeto direto da voz ativa passa a sujeito da passiva ou Andam falando que tudo aquilo foi falso.
sujeito paciente. O gerúndio “falando” ou o infinitivo impessoal,
§§ Meu pai vendeu este barco. precedido da preposição “a” confere à locução ideia de
§§ Este barco foi vendido por meu pai. continuidade, de frequência, reiteração de ação.
43
E.O. Teste I meus troféus. Ali estão meus favoritos da li-
teratura brasileira, João Ubaldo, Veríssimo,
Rubem Fonseca, Nelson Rodrigues, Cony, e
1. (G1 IFSP) Considerando a norma padrão da também os estrangeiros, Saramago, Roth,
Língua Portuguesa, marque (VP), para voz Dostoievski, Tchekhov e muitos outros. Tam-
passiva, (VA), para voz ativa e assinale a al- bém me orgulha uma pequena biblioteca de
ternativa correta. livros com a temática judaica e outra com
I. O jogador marcou um belo gol na última obras que fizeram e fazem parte de minha
semana. ( ) formação antropológica. A reação de quem se
II. O ônibus atrasou bastante na tarde de on- depara com as prateleiras cheias de livros é
tem. ( ) variada, há quem exclame maravilhado com
III. A bola foi atrasada de modo muito forte os títulos ali dispostos, há quem pergunte,
pelo zagueiro. ( ) à la Seinfeld, para que tanto livro, para que
IV. O computador foi desligado inadequada- acumular poeira e traças. No quarto de meu
mente na última vez. ( ) filho, a galeria de troféus aumenta um pou-
a) VA, VP, VP, VA. co a cada mês, somando-se ao folclore brasi-
b) VP, VA, VA, VP. leiro e gibis da Turma da Mônica e Batman
c) VA, VA, VP, VP. estórias da porquinha Olivia em português
d) VP, VP, VA, VA. e espanhol e clássicos da literatura estran-
e) VP, VA, VP, VA. geira, como The cat in the hat. A escola faz
a sua parte, o troca-troca de livros entre os
2. (G1 Cftmg) Leia o texto abaixo para respon- colegas e a ida semanal à biblioteca garante
der à questão. que, pelo menos, dois livros sejam lidos fora
do horário de estudos formal, geralmente à
DÁ PRA DESENHAR?
hora de deitar para dormir.
Marcelo Gruman
Damos importância ao livro e, sobretudo, à
leitura. Claro, para ler um livro, é preciso,
primeiro, saber ler. Cultivamos o hábito da
leitura, cultivamos o intelecto, a leitura como
instrumento para gerar a autonomia, para a
construção da própria trajetória de vida, para
a compreensão e interpretação do mundo que
nos cerca a partir do nosso ponto de vista,
e não de terceiros, uma empobrecida leitura
mastigada, enviesada e, muitas vezes, coalha-
da de preconceitos e estereótipos. A capaci-
dade de ler permite o acesso a mundos até
então desconhecidos, do Saci Pererê, do Lobo
Numa cena de um de meus comediantes fa-
Mau, da Chapeuzinho Vermelho, da Mula Sem
voritos, 1Jerry Seinfeld, seu amigo neurótico
Cabeça. Permite a construção de nossa identi-
George se vê às voltas com a necessidade de
dade, daquilo que somos, ou melhor, que es-
resgatar alguns livros deixados na casa de
tamos, porque aquilo que somos pode mudar
uma moça com quem acabou de terminar um
sempre, é só querermos. Nada mais emocio-
relacionamento. Jerry não vê problema al-
nante do que ver seu filho, de repente, ler o
gum, mas George não gosta da ideia. Jerry,
letreiro de uma loja, pela primeira vez. Um
então, diz para o amigo esquecer os livros,
novo mundo se abre: um mundo de possibili-
perguntando-lhe se realmente precisa deles.
dades infinitas, mundos infinitos.
George diz que sim, que precisa dos livros,
Para mim, o livro tem de ter cheiro, às favas
e Jerry pergunta por quê. George responde
com minha alergia à poeira. Eu preciso ma-
que os livros são seus e que, por isso, pre-
nuseá-lo, tocá-lo, virar suas páginas. O livro
cisa deles. E por que precisa deles?, insiste
é parte constituinte de quem sou, de minha
Seinfeld. George exclama simplesmente “são
identidade, é extensão de meu corpo, está
livros!”. Seinfeld indaga, então: “Que obses-
impregnado de memória, da minha memó-
são é essa com os livros? As pessoas os colo-
ria, da minha história. Livro não é produto
cam em suas casas como se fossem troféus.
biodegradável, descartável, pós-moderno, do
Para que você precisa deles depois de serem
tipo “lavou, está novo”. O livro estabelece li-
lidos?”. E ironiza, finalmente, “Sabe, o legal
gações afetivas. Lembro-me de um colega de
de ler 2Moby Dick pela segunda vez é que
Ahab e a baleia ficam amigos”. faculdade comentando, certa vez, com certa
Quando abro a porta de meu apartamento excitação, que havia encontrado, num sebo,
dou de cara com uma estante cheia de livros, determinado livro que a namorada procu-
rava fazia não sei quanto tempo. O tesouro
44
seria dado como presente de aniversário. Po- Considere o trecho a seguir:
deria ser o Harry Potter ou Cinquenta tons [...] Há não muito tempo, perguntávamos
de cinza, boa literatura, má literatura, o im- (1) a quem não entendia o que falávamos se
portante é ler... gostaria (2) que desenhássemos (3) a expli-
As livrarias no Rio de Janeiro estão desapa- cação. Era uma brincadeira, uma forma de
recendo, sobretudo os sebos, que teimam em infantilizar o interlocutor. Chegou o dia em
comercializar objetos sujos de história. [...] que a piada perdeu a graça, porque deixou
É a tal “civilização digital”. Se não digital, de ser piada.
do 3kindle e do 4IPhone, do ambiente assép- A indicação da desinência modo-temporal
tico, inodoro, impessoal de cadeias livreiras dos verbos 1, 2 e 3, grifados nesse trecho,
como Cultura, Travessa ou Saraiva, padroni- está correta em:
zadas. Chegamos à era da “mcdonaldização” a) (1) pretérito imperfeito do subjuntivo; (2)
do hábito de ler. Sem passado, sem futuro, futuro simples do indicativo; (3) pretérito
um presente contínuo. perfeito do indicativo.
Não bastasse o desprestígio do livro físico, b) (1) pretérito perfeito do indicativo; (2) pre-
vivemos o “triunfo total da não leitura”, térito imperfeito do indicativo; (3) pretérito
conforme o editor de não ficção e litera- imperfeito do indicativo.
tura brasileira da Editora Record, Carlos c) (1) pretérito imperfeito do indicativo; (2)
Andreazza, que resolveu lançar a campa- futuro do pretérito do indicativo; (3) preté-
nha pela “maioridade intelectual”, que rito imperfeito do subjuntivo.
considera uma provocação à onda dos li- d) (1) pretérito mais-que-perfeito do indicati-
vros de colorir. Para ele, o editor também vo; (2) futuro do pretérito do indicativo; (3)
é um educador e tem a obrigação de atrair pretérito perfeito do subjuntivo.
o leitor jovem-adulto, ampliando o público
leitor como uma resposta saudável a esta
3. (G1 IFSP) TINTIM
atração cultural que é “o livro de unir os
Durante alguns anos, o tintim me intrigou.
pontinhos”, como ironicamente o define
Tintim por tintim: o que queria dizer aquilo?
Joaquim Ferreira dos Santos. Andreazza
Imaginei que fosse alguma misteriosa medida
diz que, hoje, somos obrigados a falar re-
de outros tempos que sobrevivera ao sistema
dundâncias bárbaras como “livro para ler”.
métrico, como a braça, a légua, etc. Outro mis-
Uma piada de mau gosto porque livro pres-
tério era o triz. Qual a exata definição de um
supõe leitura.
triz? É uma subdivisão de tempo ou de espa-
[...] Há não muito tempo, perguntávamos a
quem não entendia o que falávamos se gos- ço. As coisas deixam de acontecer por um triz,
taria que desenhássemos a explicação. Era por uma fração de segundo ou de milímetro.
uma brincadeira, uma forma de infantilizar Mas que fração? O triz talvez correspondesse a
o interlocutor. Chegou o dia em que a piada meio tintim, ou o tintim a um décimo de triz.
perdeu a graça, porque deixou de ser piada. Tanto o tintim quanto o triz pertenceriam ao
Fonte: <http://cartamaior.com.br/?/Editoria/
obscuro mundo das microcoisas.
Cultura/Da-pra-desenhar-/39/33645>, texto Há quem diga que não existe uma fração mí-
adaptado. Acesso em: 03 set. 2015 nima de matéria, que tudo pode ser dividido e
subdividido. Assim como existe o infinito para
Vocabulário de apoio: fora – isto é, o espaço sem fim, depois que o
1
Jerome “Jerry” Allen Seinfeld – ator e humorista norte-
Universo acaba – existiria o infinito para den-
americano, atua em Nova Iorque, EUA. tro. A menor fração da menor partícula do últi-
2
Moby Dick – romance do autor estadunidense Herman mo átomo ainda seria formada por dois trizes,
Melville. O nome da obra é o de uma baleia enfurecida, de e cada triz por dois tintins, e cada tintim por
cor branca, que conseguiu destruir baleeiros que a haviam
ferido. Originalmente, foi publicado em três fascículos com
dois trizes, e assim por diante, até a loucura.
o título de Moby-Dick ou A Baleia, em Londres, em 1851, Descobri, finalmente, o que significa tintim.
e, ainda no mesmo ano, em Nova York, em edição integral. É verdade que, se tivesse me dado o trabalho
O livro foi revolucionário para a época, com descrições de olhar no dicionário mais cedo, minha ig-
intricadas e imaginativas das aventuras do narrador –
Ismael, suas reflexões pessoais, e grandes trechos de não norância não teria durado tanto. Mas o ób-
ficção, sobre variados assuntos, como baleias, métodos de vio, às vezes, é a última coisa que nos ocorre.
caça a elas, arpões, a cor branca (de Moby Dick), detalhes Está no Aurelião. Tintim, vocábulo onomato-
sobre as embarcações e funcionamentos, armazenamento de paico que evoca o tinido das moedas.
produtos extraídos das baleias.
3
kindle – leitor de livros digitais desenvolvido pela Originalmente, portanto, “tintim por tin-
subsidiária da Amazon, que permite aos usuários comprar, tim” indicava um pagamento feito minucio-
baixar, pesquisar e, principalmente, ler livros digitais, samente, moeda por moeda. Isso no tempo
jornais, revistas, e outras mídias digitais via rede sem fio.
em que as moedas, no Brasil, tiniam, ao con-
4
iPhone – linha de smartphones (telefones
celulares multifuncionais) concebidos e trário de hoje, quando são feitas de papelão
comercializados pela Apple Inc. e se chocam sem ruído. Numa investigação
45
feita hoje da corrupção no país tintim por 5. (Ufsm)
tintim ficaríamos tinindo sem parar e che-
garíamos a uma nova concepção de infinito.
Tintim por tintim. A menina muito dada
namoraria sim-sim por sim-sim. O gordo in-
controlável progrediria pela vida quindim
por quindim. O telespectador habitual vive-
ria plim-plim por plim-plim. E você e eu va-
mos ganhando nosso salário tin por tin (olha
aí, a inflação já levou dois tins).
Resolvido o mistério do tintim, que não é
uma subdivisão nem de tempo nem de es-
paço nem de matéria, resta o triz. O Aure-
lião não nos ajuda. “Triz”, diz ele, significa
por pouco. Sim, mas que pouco? Queremos
algarismos, vírgulas, zeros, definições para
“triz”. Substantivo feminino. Popular.
“Icterícia.” Triz quer dizer icterícia. Ou tere-
mos que mudar todas as nossas teorias sobre
o Universo ou teremos que mudar de assun-
to. Acho melhor mudar de assunto.
O Universo já tem problemas demais. CHECKUP x INVESTIGAÇÃO
(VERÍSSIMO, Luis Fernando. Comédias para ler Os médicos empregam o termo checkup
na escola. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.)
para se referir a exames que avaliam a
Considere o seguinte trecho: “É verdade que, condição específica – o estado das mamas
se tivesse me dado o trabalho de olhar no di- ou o perfil de colesterol – antes da pre-
cionário mais cedo, minha ignorância não te- sença de sintomas. Mas, quando as quei-
ria durado tanto. Mas o óbvio, às vezes, é a úl- xas já aparecem, fala-se de investigação
tima coisa que nos ocorre”. Os verbos grifados diagnóstica – testes 1são solicitados para
encontram-se conjugados, respectivamente: descobrir o que anda errado. Um exemplo
a) pretérito perfeito do indicativo, futuro do pre- é a endoscopia, que 2é prescrita diante de
térito do indicativo, presente do subjuntivo. reclamações como queimação e dores de
b) pretérito imperfeito do indicativo, pretérito estômago. A seguir, apresenta-se uma se-
perfeito do indicativo, presente do indicativo. leção de testes indispensáveis em algum
c) pretérito mais que perfeito do indicativo, momento da vida.
pretérito imperfeito do indicativo, presente PRESSÃO ARTERIAL
do subjuntivo. É a conferência da pressão do paciente por
d) pretérito imperfeito do subjuntivo, pretérito meio de um aparelho. O exame costuma ser
imperfeito do indicativo, pretérito perfeito feito a partir dos 18 anos – mas deveria ser
do indicativo. requisitado ainda na infância. Precisa ser
e) pretérito imperfeito do subjuntivo, futuro do repetido, no mínimo, uma vez por ano. De-
pretérito do indicativo, presente do indicativo. tecta alterações na pressão arterial e diag-
nostica a hipertensão, fator de risco para
4. (G1 Col. Naval) Em que opção todas as for- infartos e derrames.
mas verbais destacadas estão de acordo com
a norma padrão da língua? HEMOGRAMA
a) Quando vimos o acidente, freiamos imedia- É o exame de sangue que registra o es-
tamente. Outros, contudo, não se precavi- toque de células vermelhas e brancas. É
ram, e mais batidas aconteceram. solicitado desde a infância. A menos que
b) Ainda que eles compossem com afinco, não ob- haja algum motivo, pode ser refeito anu-
teriam as músicas necessárias para o espetáculo. almente. Sinaliza o estado do sangue e do
c) Muitas empresas mantém serviço de aten- sistema imunológico, acusando problemas
dimento ao consumidor, mas quando nós como infecções.
propusemos alterações nos contratos, não COLESTEROL E GLICEMIA
fomos ouvidos. São testes sanguíneos que avaliam a concen-
d) Quando eu intermedeio as discussões, não tração de gorduras e de açúcar na circulação.
aceito que imponham determinadas ideias. Podem ser receitados desde a infância, mas
e) Embora ele não me mantivesse informada depois dos 18 anos a indicação ganha ain-
sobre o contrato, eu intervi na negociação e da mais consistência. Depois dos 40 anos,
obtive sucesso.
46
recomenda-se repeti-los anualmente. Fla- Joca que se formara nos campos do Rio. Dormia
gram altos níveis de colesterol e triglicéri- no clube, mas a sua vida era cada vez mais agi-
des, que favorecem as placas capazes de obs- tada. Onde quer que estivesse, era reconhecido
truir os vasos. Já a medida de glicose acusa a e aplaudido. Os garçons não queriam cobrar as
propensão ao diabete. despesas que ele fazia e até mesmo nos ônibus,
SPONCHIATO, Diogo. “O que É um checkup inteligente”. quando ia descer, o motorista lhe dizia sempre:
Saúde! é vital, mar. 2011, p. 46-47. (adaptado) — Joca, você aqui não paga.
Quando entrava no cinema era reconhecido. Vi-
Com relação aos procedimentos linguísticos
nham logo meninos para perto dele. Sabia que
usados no texto e à estrutura composicio-
agradava muito. No clube tinha amigos. Havia
nal, a alternativa que apresenta uma análise
porém o antigo center-forward2 que se sentiu
INADEQUADA é a seguinte:
roubado com a sua chegada. Não tinha razão.
a) As informações sobre os exames citados es-
Ele fora chamado. Não se oferecera. E o homem
tão organizadas nesta sequência: definição,
se enfureceu com Joca. Era um jogador de fama,
periodicidade e motivo.
que fora grande nos campos da Europa e por
b) O emprego de verbos no presente do Indi-
isso pouco ligava aos que não tinham o seu
cativo corrobora a exposição de afirmações
cartaz. A entrada de Joca, o sucesso rápido, a
gerais que podem ser válidas para casos par-
maravilha de agilidade e de oportunismo, que
ticulares.
caracterizava o jogo do novato, irritava-o até ao
c) A ausência da primeira pessoa do singular
ódio. No dia em que tivera que ceder a posição,
neutraliza a figura do enunciador, indicando
a um menino do Cabo Frio, fora para ele como
que o conteúdo do texto não é mera opinião.
se tivesse perdido as duas pernas. Viram-no
d) O uso das estruturas passivas “são solicita-
chorando, e por isso concentrou em Joca toda a
dos” (ref. 1) e “é prescrita” (ref. 2) inclui os
sua raiva. No entanto, Joca sempre o procurava.
médicos como sujeito paciente.
Tinha sido a sua admiração, o seu herói.
e) A apresentação dos motivos para a realiza-
(Água-Mãe, 1974.)
ção dos exames é Introduzida por verbos que
pertencem ao mesmo padrão frasal. 1
Beque, ou seja, o zagueiro de hoje.
2
Centroavante.
6. (Insper) No site de suporte técnico da Micro-
soft, há a seguinte orientação: No primeiro parágrafo, predominam verbos
Se [o usuário] fazer algumas alterações nas empregados no:
propriedades de site da Web do ASP.NET 2.0 a) pretérito perfeito do modo indicativo.
e clique na guia ASP.NET no Gerenciador b) pretérito imperfeito do modo indicativo.
do IIS, o serviço W3SVC pode ser reiniciado c) presente do modo indicativo.
inesperadamente. d) presente do modo subjuntivo.
(Disponível em http://support.microsoft. e) pretérito mais-que-perfeito do modo indica-
com/kb/953343/pt-br.) tivo.
As formas verbais “fazer” e “clique” estão
mal empregadas e deveriam ser substituídas 8. (Unesp) A questão a seguir focaliza uma
no padrão culto da língua por: passagem de um artigo de José Francisco Bo-
a) fazerem / clicarem telho e uma das ilustrações de Carlo Giovani
b) faça / clica a esse artigo.
c) fizer / clicar
COMPAIXÃO
d) fizerem / clicando
Considerada a maior de todas as virtudes
e) fazem / clicassem
por religiões como o budismo e o hindu-
ísmo, a compaixão é a capacidade huma-
7. (Unesp) A questão a seguir focaliza uma na de compartilhar (ou experimentar de
passagem do romance Água-Mãe, de José
forma parcial) os sentimentos alheios
Lins do Rego (1901-1957).
— principalmente o sofrimento. Mas a
Jogava com toda a alma, não podia compre- onipresença da miséria humana faz da
ender como um jogador se encostava, não se compaixão uma virtude potencialmente
entusiasmava com a bola nos pés. Atirava-se, paralisante. Afogados na enchente das
não temia a violência e com a sua agilidade dores alheias, podemos facilmente cair no
espantosa, fugia das entradas, dos pontapés. desespero e na inação. Por isso, a piedade
Quando aquele back1, num jogo de subúrbio, tem uma reputação conturbada na histó-
atirou-se contra ele, recuou para derrubá-lo, e ria do pensamento: se alguns a aponta-
com tamanha sorte que o bruto se estendeu no ram como o alicerce da ética e da moral,
chão, como um fardo. E foi assim crescendo a outros viram nela uma armadilha, um
sua fama. Aos poucos se foi adaptando ao novo mero acréscimo de tristeza a um Universo
47
já suficientemente amargo. Porém, vale 9. (Uepb) Leia o texto e responda à questão a
lembrar que as virtudes, para funciona- seguir.
rem, devem se encaixar umas às outras: E SE...
quando aliado à temperança, o sentimen- ...A ÁGUA POTÁVEL ACABAR?
to de comiseração pelas dores do mundo As teorias mais pessimistas dizem que a
pode ser um dos caminhos que nos afas- água potável deve acabar logo, em 2050.
tam da cratera de Averno*. Dosando com Nesse ano, ninguém mais tomará banho
prudência uma compaixão potencialmen- todo dia. Chuveiro com água só duas vezes
te infinita, é possível sentirmos de forma por semana. Se alguém exceder 55 litros de
mais intensa a felicidade, a nossa e a dos consumo (metade do que a ONU recomenda),
outros — como alguém que se delicia com seu abastecimento será interrompido. Nos
um gole de água fresca, lembrando-se do mercados, não haveria carne, pois, se não há
deserto que arde lá fora. Isso tudo pode água para você, imagine para o gado. Gas-
parecer estranho, mas o fato é que a de- tam-se 43 mil litros de água para produzir
núncia da compaixão segue um raciocínio 1 kg de carne. 1Mas não é só ela que faltará.
bastante rigoroso. A Região Centro-Oeste do Brasil, maior pro-
O sofrimento — e todos concordam — é algo dutor de grãos da América Latina em 2012,
ruim. A compaixão multiplica o sofrimento não conseguiria manter a produção. Afinal,
do mundo, fazendo com que a dor de uma no País, a agricultura e a agropecuária são,
criatura seja sentida também por outra. E o hoje, as maiores consumidoras de água, com
que é pior: ao passar a infelicidade adiante, mais de 70% do uso. Faltariam arroz, feijão,
ela não corrige, nem remedia, nem alivia a soja, milho e outros grãos.
dor original. Como essa infiltração universal A vida nas metrópoles será mais difícil. Só a
da tristeza poderia ser uma virtude? No sé- grande São Paulo consome atualmente 80,5
culo 1 a.C., Cícero escreveu: “Por que sentir bilhões de litros por mês. A água que abaste-
piedade, se em vez disso podemos simples- ce a região virá de Santos, uma das grandes
mente ajudar os sofredores? Devemos ser cidades do litoral que passarão a investir em
justos e caridosos, mas sem sofrer o que os dessalinização. O problema é que, para obter
outros sofrem”. 1 litro de água dessalinizada, são necessá-
* Os romanos consideravam a cratera vulcânica de Averno, rios 4 litros de água do mar, a um custo de
situada perto de Nápoles, como entrada para o mundo até US$ 0,90 o m2, 2segundo a International
inferior, o mundo dos mortos, governado por Plutão. Desalination Association. Só São Paulo gas-
taria quase RS 140 milhões em dessaliniza-
ção por mês, Como resultado, a água custaria
muito mais do que os R$ 3 por m3 de hoje.
Mas há quem não concorde com esse cenário
caótico. 3“Á água só acaba se você acabar com
o ciclo dela”, diz Antônio Felix Domingues,
da Agência Nacional de Águas. [...]
Rafael Soeiro. In Revista Superinteressante. São
Paulo. Abril. Edição 305, junho/2012, p. 42.

O termo “se”, usado nos fragmentos abaixo,


não estabelece declaração de condicionante em:
a) “Se alguém exceder 55 litros de consumo
[...]”
b) “E se... a água potável acabar?”
c) “Gastam-se 43 mil litros de água para produ-
zir 1 kg de carne.”
d) “[...] se não há água para você, imagine para
o gado.”
e) “Á água só acaba se você acabar com o ciclo
Devido a um problema de revisão, aparece no dela”
artigo uma forma verbal em desacordo com a
chamada norma-padrão. Trata-se do empre-
10. (Ufscar)
go equivocado de
Monsenhor Caldas interrompeu a narração
a) corrige em vez de corrije. do desconhecido:
b) remedia em vez de remedeia. — Dá licença? é só um instante.
c) experimentar em vez de exprimentar. Levantou-se, foi ao interior da casa, chamou
d) alivia em vez de alívia. o preto velho que o servia, e disse-lhe em
e) encaixar em vez de incaixar. voz baixa:
48
— João, vai ali à estação de urbanos, fala da minha parte ao comandante, e pede-lhe que venha cá
com um ou dois homens, para livrar-me de um sujeito doido. Anda, vai depressa.
E, voltando à sala:
— Pronto, disse ele; podemos continuar.
— Como ia dizendo a Vossa Reverendíssima, morri no dia vinte de março de 1860, às cinco horas
e quarenta e três minutos da manhã. Tinha então sessenta e oito anos de idade. Minha alma voou
pelo espaço, até perder a terra de vista, deixando muito abaixo a lua, as estrelas e o Sol; penetrou
finalmente num espaço em que não havia mais nada, e era clareado tão-somente por uma luz difu-
sa. Continuei a subir, e comecei a ver um pontinho mais luminoso ao longe, muito longe. O ponto
cresceu, fez-se sol. Fui por ali dentro, sem arder, porque as almas são incombustíveis. A sua pegou
fogo alguma vez?
— Não, senhor.
— São incombustíveis. Fui subindo, subindo; na distância de quarenta mil léguas, ouvi uma deli-
ciosa música, e logo que cheguei a cinco mil léguas, desceu um enxame de almas, que me levaram
num palanquim feito de éter e plumas.
(Machado de Assis, A segunda vida. Obras Completas, vol. II, p. 440-441.)
O imperativo utilizado por Monsenhor Caldas, ao dar as ordens ao preto velho, emprega:
a) uma forma indireta.
b) a terceira pessoa do singular.
c) a primeira pessoa do plural.
d) a segunda pessoa do singular.
e) a segunda pessoa do plural.

E.O. Teste II
1. (UEG)

Na tirinha, a locutora utiliza o imperativo verbal para desafiar seu interlocutor a lhe apresentar
uma prova de amor. Essas formas imperativas apresentam um caso de variação na pessoa do verbo,
tendo a seguinte configuração:
a) “mate” e “peça” são formas de 2ª pessoa que derivam do presente do modo indicativo e se correlacio-
nam ao pronome de 2ª pessoa “tu”.
b) “prova” e “coloca” são formas de 3ª pessoa que derivam do presente do modo subjuntivo e se correla-
cionam ao pronome de 3ª pessoa “você”.
c) “prova” e “coloca” são formas de 2ª pessoa correlacionadas ao pronome “tu”; “mate” e “peça” são
formas de 3ª pessoa correlacionadas ao pronome “você”.
d) “mate” e “peça” são formas de 2ª pessoa correlacionadas ao pronome “tu”; “prova” e “coloca” são
formas de 3ª pessoa correlacionadas ao pronome “você”.

2. (Ufsm) UMA REVOLUÇÃO EM CINCO MINUTOS


Usar a tecnologia para construir um mundo melhor tem seu lado frívolo. 1Mas, 11felizmente, 2tam-
bém tem um lado bem sério. Principalmente na política. A tecnologia 10pode ajudar governos a
adotar medidas que 3beneficiam a população.
Avanços tecnológicos facilitaram a criação de ferramentas que ajudam não só a promover a cidada-
nia, mas também a vigiar, a reportar e a agir contra a restrição dos direitos civis. Por isso, pode-
-se argumentar que está cada vez mais difícil manter um governo injusto e cada vez mais fácil se
rebelar contra regimes antidemocráticos.
49
6
Se você quiser monitorar os países onde 3. (Uece) A INTERNET E A NEUTRALIDADE DA REDE
há desrespeito à democracia, uma das 4me- A Internet vista, unanimemente, como o
lhores ferramentas é o projeto ChokePoint. território livre, a tecnologia libertadora que,
Inspirado nos acontecimentos no Egito e na em muitos países, permitiu o florescimento
Líbia, o ChokePoint (chokepointproject.net) da cidadania, a ampliação das oportunidades
é uma plataforma que expõe o intercâmbio de educação, o ambiente para novas empre-
de informação entre países. Se houver uma sas e novos empreendedores, para o trabalho
parada súbita no tráfego de dados, o sistema colaborativo em rede.
alerta sobre um provável corte da liberdade Graças a seu ambiente libertário, internacio-
de expressão naquele país. [...] nalmente ajudou a derrubar ditaduras e mo-
E 7se você quiser organizar um protesto? nopólios de mídia, o controle da informação,
Aqui entra a tecnologia também. Em agosto, tanto por governos como por cartéis.
manifestantes contra o governo usaram em
1
No entanto, não se considere um modelo
Londres o API do GoogleMaps para mostrar, consolidado. Em outros momentos da histó-
em tempo real, por quais ruas a polícia esta- ria surgiram novas tecnologias, promovendo
va se aproximando. [...] rupturas, abrindo espaço para a democra-
Mas 8se você não mora em áreas de conflito tização e, no momento seguinte, quedaram
dominadas por novos cartéis e monopólios
e protesto não é seu estilo, há várias ma-
que se formaram.
neiras de usar a tecnologia para 12facilitar 2
Foi assim com o início da telefonia. En-
o engajamento. Em sites como o Change.org
quanto a Bell Co se consolidava, como gran-
(change.org) é possível reunir milhares de
de companhia nacional, surgiram inúmeras
pessoas para assinar uma petição. Em sites
experiências locais, como a Mesa Telephone,
locais, como o FixMyStreet (fixmystreet.
para localidades rurais norte-americanas, de
com) ou eDemocracy (forums.e-democracy.
tecnologia rudimentar porém útil para ligar
org/about), é possível discutir problemas da comunidades agrícolas.
comunidade e acionar as autoridades. 3
Nasceram centenas de outras companhias
É claro que a tecnologia também pode ser por todo o país. Esse mesmo modelo disse-
usada para terrorismo, mas a maioria da minou-se pelo Brasil dos anos 40 em diante,
população é contra esse tipo de atividade. com companhias municipais levando o te-
É 13gratificante saber que 9podemos contar lefone a cidades menores, em um surto de
com a tecnologia para engajar grupos que pioneirismo extraordinário.
vão provocar mudanças, sejam para a denún- Nos Estados Unidos, o movimento dos “inde-
cia de buracos na sua rua ou a derrubada de pendentes” permitiu às comunidades rurais
regimes ditatoriais. O mundo conectado é ca- estreitar laços, criar amizades, sistemas de
paz de construir uma sociedade mais 5justa. informação, da mesma maneira que as redes
Fonte: LARIU, Alessandra. Uma revolução em cinco sociais de agora. Através do telefone desen-
minutos. INFO, Nov. 2011, p.52. (adaptado) volveram noticiários sobre o clima, sobre a
região, relatórios de mercado etc.
O texto é um artigo de opinião que apre-
Os “independentes” chegaram a ter 3 milhões
senta recursos linguísticos típicos de estru-
de aparelhos, contra 2,5 milhões da Bell.
turas dissertativo-argumentativas. Assinale
Com a ajuda do J.P.Morgan, o mais influen-
a alternativa em que o elemento linguístico
te banco da época, a Bell reestruturou-se em
está corretamente analisado no contexto em
torno da AT&T.
que ocorre. Em vez de declarar guerra aos “independen-
a) “Mas” (ref. 1) associado a “também” (ref. 2) tes”, a nova direção propôs um trabalho con-
ressalta o lado “sério” da tecnologia e elimi- junto, facilitando para eles as ligações de
na o lado “frívolo”. longa distância, desde que trocassem seus sis-
b) Os elementos “beneficiam” (ref. 3), “melho- temas rústicos pelos padrões Bell. Quem não
res” (ref. 4) e “justa” (ref. 5) sinalizam ava- aderisse, não teria ligações de longa distância.
liações positivas à sociedade. Como resultado, a AT&T matou a concorrên-
c) O elemento “se” (refs. 6, 7 e 8), introduz cia dos “independentes” e construiu o mais
possibilidades de ações que prescindem do longevo e poderoso monopólio da história,
uso de recursos tecnológicos. só desmembrado na década de 1980.
d) O emprego de “podemos” (ref. 9), em 1ª pes- O mesmo processo de concentração se repe-
soa, marca inclusão da autora e dos leitores tiu no rádio.
na possibilidade de uso da tecnologia para No início, o rádio tornou-se uma ferramen-
engajamento de grupos sociais. ta tão democrática e disseminada quanto a
e) O emprego de “pode” (ref. 10), em 3ª pes- Internet. Não havia controle e qualquer pes-
soa, marca convicção da autora sobre o uso soa, adquirindo um kit de rádio, montava
da tecnologia para a prática de terrorismo. sua estação sem fio.
50
Em 1921 havia 525 estatais transmissoras de ofensas ou ameaças carregadas de ódio a
nos Estados Unidos. Até o final de 1924, alguma etnia, nacionalidade ou origem che-
mais de 2 milhões de aparelhos de rádio. Se- garam 1__________ delegacias gaúchas.
gundo Tim Wu, autor do importante “Impé- Isso significa que, a cada dia e meio, um con-
rios da Comunicação”, antes da Internet os fronto marcado pelo desprezo entre brancos,
rádios foram a maior mídia aberta do século. negros, asiáticos, indígenas ou judeus, entre
4
Repetiu-se o mesmo processo do telefone. gaúchos e não gaúchos, brasileiros e estran-
À medida que aumentava o público e criava geiros, entre pessoas de origens ou culturas
escala, o mercado libertário era enquadrado diferentes desmentiu 2__________ reputação
pelo poder público e a ocupação do espaço de hospitalidade que a população do Estado
entregue a grupos particulares. costuma atribuir 3__________ si. Mas nem
Hoje em dia, as concessões de rádio se torna- mesmo a contabilidade oficial consegue dar
ram ativos de empresas privadas, as rádios a dimensão total do preconceito.
comunitárias são criminalizadas e o exercí- Como 4__________ pouca sistematização na
cio pessoal se restringe aos rádios amadores. coleta de dados sobre esse tipo de violação
Esse é o desafio atual da Internet. Se não no país, é difícil fazer comparações entre os
for garantida a neutralidade da rede - isto Estados. 5Além disso, muitas vezes, uma ci-
é, o direito de qualquer site ou pessoa de ter fra maior de denúncias pode revelar um grau
acesso à rede, sem privilégios - em breve o mais elevado de conscientização e 6mais fa-
grande sonho libertário da Internet terá o cilidade de acesso a órgãos de fiscalização do
mesmo destino do telefone e do rádio. que um maior número de situações de into-
Luís Nassif. Coluna Econômica. 07/09/2013. lerância de fato. Por isso, é difícil supor se
um gaúcho é mais ou menos amistoso que
Atente ao que se diz sobre o seguinte enun- um paulista ou baiano - mas as informações
ciado: “No entanto, não se considere um mo- disponíveis dão conta de um cotidiano de
delo consolidado” (ref. 1). 7
beligerância.
I. Para ser entendido, o enunciador exige a O sociólogo José Luiz Bica de Melo identifica
cooperação do leitor, que deverá, por in- alguns traços culturais do gaúcho que esti-
ferência, saber de qual modelo ele fala. mulam determinadas formas de discrimina-
II. Ao enunciado falta uma expressão que ção: o projeto de desenvolvimento baseado
desempenhe o papel de sujeito da voz na vinda do imigrante europeu, em vez da
passiva do verbo considerar. integração do negro, contribuiu para a for-
III. Dependendo do contexto, a não explicita- mação de estereótipos. Além disso, há uma
ção do sujeito do verbo considerar torna certa tendência 8__________ violência fun-
o enunciado passível de duas leituras: 1. damentada na questão histórica de que 9es-
No entanto, não considere a si mesmo um tabelecemos fronteiras através da guerra e
modelo consolidado. 2. No entanto, não 10
construímos nosso mapa com as patas dos
seja considerado (o modelo da Internet) cavalos. Em muitas das fronteiras invisíveis
como um modelo consolidado. que dividem os habitantes do Pampa, a guer-
Está correto o que se diz em: ra continua.
a) I, II e III. Disponível em:<http://zh.clicrbs.com.
b) II e III apenas. br>(Acesso em 02 abr. 2015).
c) I e II apenas.
d) I e III apenas. Considerando a correlação verbal do texto,
no fragmento textual: “estabelecemos fron-
teiras através da guerra e construímos nosso
4. (G1 Ifsul) A CRESCENTE INTOLERÂNCIA NO
mapa” (ref. 9), os verbos sublinhados estão
RIO GRANDE DO SUL
conjugados na
Marcelo Gonzatto.
a) primeira pessoa do singular do presente do
Atos de intolerância como a agressão racis- indicativo.
ta sofrida pelo ex-árbitro de futebol Márcio b) primeira pessoa do plural do presente do in-
Chagas da Silva, que encontrou bananas dicativo.
lançadas sobre seu carro após apitar um c) primeira pessoa do plural do pretérito per-
jogo do Campeonato Gaúcho, em março de feito do indicativo.
2014, estão entranhados no cotidiano dos d) primeira pessoa do plural do pretérito im-
gaúchos. Embora poucos casos como esse perfeito do indicativo.
ganhem atenção, um estudo inédito revela
que, a cada 36 horas, em média, uma ocor- 5. (Esc. Naval) O REINADO DO CELULAR
rência envolvendo preconceito foi registra- De alto a baixo da pirâmide social, quase to-
da pela Polícia Civil nos últimos sete anos. das as pessoas que eu conheço possuem ce-
Nada menos que 1.677 queixas decorrentes lular. É realmente um grande quebra-galho.
51
Quando estamos na rua e precisamos dar um qualquer motivo, numa esquizofrenia consi-
recado, é só sacar o aparelhinho da bolsa e re- derada, ora, ora, moderna.
solver a questão, caso não dê pra esperar che- Os celulares estão cada dia menores e mais
gar em casa. Pra isso – e só pra isso – serve o fininhos. Mas são eles que estão botando
telefone móvel, na minha inocente opinião. muita gente na palma da mão.
Ao contrário da maioria das mulheres, nunca (MEDEIROS, Martha. O reinado do celular. In:__.
fui fanática por telefone, incluindo o fixo. Montanha Russa; Coisas da vida; Feliz por nada.
Uso com muito comedimento para resolver Porto Alegre, RS: LPM, 2013. p. 369-370.)
assuntos de trabalho, combinar encontros,
“E toda ânsia nos mantém reféns.” (4º §).
cumprimentar alguém, essas coisas realmen-
Em que opção o verbo “manter” está empre-
te rápidas. Fazer visita por telefone é algo
gado corretamente, de acordo com a norma
para o qual não tenho a menor paciência. Por
padrão?
celular, muito menos. Considero-o um exce-
a) O funcionário sabia que, se mantesse o ce-
lente resolvedor de pendências e nada mais.
lular ligado durante o expediente, alguém
Logo, você pode imaginar meu espanto ao
poderia reclamar.
constatar como essa engenhoca se transfor-
b) Meu pai e minha mãe manteem os mesmos
mou no símbolo da neurose urbana. Outro
telefones celulares desde 2012 e não preten-
dia fui assistir a um show. Minutos antes de
dem comprar aparelhos novos este ano.
começar, o lobby do teatro estava repleto de
c) “Pedro, mantenhas teu celular desligado du-
pessoas falando ao celular. “Vou ter que des-
ligar, o espetáculo vai começar agora”. Era rante o filme.” – pediu um colega.
como se todos estivessem se despedindo an- d) “Enquanto mantiverem seus celulares liga-
tes de embarcar para a lua. Ao término do dos, não começaremos a reunião,” reclamou
show, as luzes do teatro mal tinham acendi- o chefe.
do quando todos voltaram a ligar seus celu- e) O fiscal solicitou aos candidatos que mantivés-
lares e instantaneamente se puseram a dis- sem os celulares desligados durante a prova.
car. Para quem? Para quê? Para contar sobre
o show para os amigos, para saber o saldo 6. (G1 IFSP) BUSCANDO A EXCELÊNCIA
no banco, para o tele-horóscopo?? Nunca vi Lya Luft
tamanha urgência em se comunicar à distân-
cia. Conversar entre si, com o sujeito ao lado, Estamos carentes de excelência. A mediocri-
quase ninguém conversava. dade reina, assustadora, implacável e per-
O celular deixou de ser uma necessidade sistentemente. Autoridades, altos cargos,
para virar uma ansiedade. E toda ânsia nos líderes, em boa parte desinformados, de-
mantém reféns. Quando vejo alguém checan- sinteressados, incultos, lamentáveis. Alunos
do suas mensagens a todo minuto e fazendo que saem do ensino médio semianalfabetos
ligações triviais em público, não imagino es- e assim entram nas universidades, que aos
tar diante de uma pessoa ocupada e podero- poucos – refiro-me às públicas – vão se tor-
sa, e sim de uma pessoa rendida: alguém que nando reduto de pobreza intelectual.
não possui mais controle sobre seu tempo, As infelizes cotas, contras as quais tenho es-
alguém que não consegue mais ficar em si- crito e às quais me oponho desde sempre,
lêncio e em privacidade. E deixar celular em servem magnificamente para alcançarmos
cima de mesa de restaurante, só perdoo se o este objetivo: a mediocrização também do
cara estivar com a mãe no leito de morte e ensino superior. Alunos que não conseguem
for ligeiramente surdo. raciocinar porque não lhes foi ensinado,
Isso tudo me ocorreu enquanto lia o livro in- numa educação de brincadeirinha. E, porque
fantil O menino que queria ser celular, de não sabem ler nem escrever direito e com
Marcelo Pires, com ilustrações de Roberto naturalidade, não conseguem expor em letra
Lautert. Conta a historia de um garotinho ou fala seu pensamento truncado e pobre.
que não suporta mais a falta de comunicação [...] E as cotas roubam a dignidade daqueles
com o pai e a mãe, já que ambos não conse- que deveriam ter acesso ao ensino superior
guem desligar o celular nem por um instan- por mérito [...] Meu conceito serve para co-
te, nem no fim de semana – levam o celular tas raciais também: não é pela raça ou cor,
até para o banheiro. O menino não tem vez. sobretudo autodeclarada, que um jovem deve
Aí a ideia: se ele fosse um celular, receberia conseguir diploma superior, mas por seu es-
muito mais atenção. forço e capacidade. [...]
Não é história da carochinha, isso rola pra Em suma, parece que trabalhamos para faci-
valer. Adultos e adolescentes estão viran- litar as coisas aos jovens, em lugar de edu-
do dependentes de um aparelho telefônico cá-los com e para o trabalho, zelo, esforço,
e desenvolvendo uma nova fobia: medo de busca de mérito, uso da própria capacidade
ser esquecido. E dá-lhe falar a toda hora, por e talento, já entre as crianças. O ensino nas
52
últimas décadas aprimorou-se em fazer os Sob o aspecto clínico, era uma viciada gra-
pequenos aprender brincando. Isso pode ser ve, necessitando desesperadamente da ajuda
bom para os bem pequenos, mas já na escola que insistia em recusar. Uma de suas can-
elementar, em seus primeiros anos, é bom ções mais famosas trata exatamente disso.
alertar, com afeto e alegria, para o fato de Amy foi presa fácil do jornalismo de celebri-
que a vida não é só brincadeira, que lazer dades, voltado à escandalização da intimida-
e divertimento são necessários até à saúde, de dos famosos (quanto pior, melhor). Foi
mas que a escola é também preparação para também, num tempo improvável, a herdeira
uma vida profissional futura, na qual have- de Janis Joplin, morta aos 27 em 1970, e de
rá disciplina e limites – que aliás deveriam Billie Holiday, morta aos 44, em 1959, am-
existir em casa, ainda que amorosos. bas por overdose.
Muitos dirão que não estou sendo simpáti- Como suas antecessoras, Amy leva ao extre-
ca. Não escrevo para ser agradável, mas para mo o éthos romântico - do artista que vive
partilhar com meus leitores preocupações em conflito permanente e se rebela contra o
sobre este país com suas maravilhas e suas curso prosaico e besta do mundo. Na sua fi-
mazelas, num momento fundamental em gura atormentada e em constante desajuste,
que, em meio a greves, justas ou desatina- o autoflagelo quase sempre se confunde com
das, [...] se delineia com grande inteligência o ódio às coisas que funcionam. Numa cul-
e precisão a possibilidade de serem punidos tura inteiramente colonizada pelo dinheiro
aqueles que não apenas prejudicaram mone- e que convida à idolatria, fazer sucesso pa-
tariamente o país, mas corroeram sua moral, recia uma espécie de vexame e de vileza, o
e a dignidade de milhões de brasileiros. Está supremo fiasco existencial, contra o qual era
sendo um momento de excelência que nos preciso se resguardar.
devolve ânimo e esperança. Nisso Amy evoca os gênios do romantismo
(Fonte: Revista Veja, de 26.09.2012. Adaptado).
tardio - Lautréamont, Rimbaud e outros po-
Assinale a alternativa em que se apresenta o etas do inferno humano, que tinham plena
emprego da voz passiva analítica. consciência da vergonha de dar certo.
a) (...) a possibilidade de serem punidos aque- (SILVA, Fernando de Barros e. Folha
les que não apenas prejudicaram monetaria-
Se a frase “Nisso Amy evoca os gênios do ro-
mente o país (...).
mantismo tardio” for reescrita na voz passi-
b) Estamos carentes de excelência.
va analítica, a forma verbal correta será
c) (...) as universidades, que aos poucos (...)
a) são evocados.
vão se tornando reduto de pobreza intelec-
b) evocam-se.
tual.
c) foram evocados.
d) (...) não conseguem expor em letra ou fala
d) tinham evocado.
seu pensamento truncado e pobre.
e) (...) parece que trabalhamos para facilitar as e) eram evocados.
coisas aos jovens (...).
8. (Mackenzie)
7. (Insper) A ÚLTIMA ROMÂNTICA A ameaça de uma bomba atômica está mais
Cigarros, isqueiros, copos com drinques co- viva do que nunca. Os conflitos 5étnicos ma-
loridos, garrafas vazias - de vodca, do licor taram quase 200 chineses só no mês de ju-
de coco Malibu... Às flores, velas, retratos e lho. Agora uma boa notícia: a paz mundial
mensagens de praxe os fãs acrescentaram pode estar a caminho. Segundo estimativas
em frente à casa de Amy Winehouse esses de pesquisadores, o mundo está bem menos
objetos que dão prazer, podem viciar e fazem sangrento do que já foi. Cerca de 250 mil
mal à saúde. Para além da homenagem, era pessoas morrem por ano em consequência
uma forma de participar do universo de ex- de algum conflito armado. É bem menos do
cessos da cantora. que no século 20, que teve 800 mil mortes
É curioso o apelo de Amy num mundo con- anuais em sua 2ª. metade e 3,8 milhões por
servador, cada vez mais antitabagista e alerta ano até 1950.
para os riscos das drogas - um mundo onde O que aconteceu? O psicólogo Steven Pinker
vamos sendo ensinados a comprar produtos
6
diz que o aumento do número de demo-
sem gordura trans e onde até as garotas de es- cracias ajudou. Assim como a nossa saúde1:
querda consomem horas dentro da academia. como a expectativa de vida subiu, temos
Numa época em que as pessoas são estimu- mais medo de 3arriscar o pescoço. 4Até a
ladas a abdicar de certos prazeres na expec- globalização teria contribuído2: um mundo
tativa de durar bastante, simplesmente para mais integrado é um mundo mais tolerante,
durar, Winehouse fez o roteiro oposto - in- diz Pinker.
tenso, autodestrutivo, suicida. Revista Superinteressante

53
Os conflitos étnicos mataram quase 200 chi- O seu não ter sequer mãos para se pronun-
neses só no mês de julho. ciar com as mãos.
De acordo com a norma padrão, passando- Penso que a natureza o adotara em árvore.
-se essa frase para a voz passiva analítica, a Porque eu bem cheguei de ouvir arrulos1 de
forma verbal correspondente será: passarinhos
a) foram mortos. que um dia teriam cantado entre as suas fo-
b) estavam sendo mortos. lhas.
c) eram mortos. Tentei transcrever para flauta a ternura dos
d) matou-se. arrulos.
e) morreram. Mas o mato era mudo.
Agora o poste se inclina para o chão − como
9. (Espm) Em meio a um dos depoimentos nas alguém
Comissões Parlamentares de Inquérito em que procurasse o chão para repouso.
Brasília, o então ministro e deputado fede- Tivemos saudades de nós.
ral José Dirceu, ante as acusações, soltou um Manoel de Barros
“eu repilo”, forma verbal da 1a pessoa do Poesia completa. São Paulo: Leya, 2010.
1
arrulos − canto ou gemido de rolas e pombas
singular do presente do indicativo do verbo
REPELIR. Dos verbos a seguir, pertencentes A memória expressa pelo enunciador do tex-
ao grupo do verbo REPELIR, um apresenta to não pertence somente a ele.
conjugação errônea. Assinale-a: Na construção do poema, essa ideia é refor-
a) CERZIR: eu cerzo meu paletó. çada pelo emprego de:
b) ADERIR: eu adiro às suas ideias. a) tempo passado e presente
c) COMPETIR: eu compito com você nessa car- b) linguagem visual e musical
reira. c) descrição objetiva e subjetiva
d) DESPIR: eu dispo a roupa rapidamente. d) primeira pessoa do singular e do plural
e) DISCERNIR: eu discirno um fato do outro.
2. (FGV-RJ) BOCAGE NO FUTEBOL
10. (Fuvest) Os verbos estão corretamente em- Quando eu tinha 3meus cinco, meus seis
pregados apenas na frase: anos, morava, ao lado de minha casa, um ga-
a) No cerne de nossas heranças culturais se en- roto que era 2tido e havido como o anticristo
contram os idiomas que as transmitem de da rua. Sua idade regulava com a minha. E
geração em geração e que assegurem a plu- 6
justiça se lhe faça: — não havia palavrão
ralidade das civilizações. que ele não praticasse. Eu, na minha can-
b) Se há episódios traumáticos em nosso passa- dura pânica, vivia cercado de conselhos, por
do, não poderemos avançar a não ser que os todos os lados: — “Não brinca com Fulano,
encaramos. que ele diz nome feio!”. E o Fulano assumia,
c) Estresse e ambiente hostil são apenas alguns aos meus olhos, as proporções feéricas de
dos fatores que possam desencadear uma ex- um Drácula, de um 1Nero de fita de cinema.
plosão de fúria. Mas o tempo passou. E acabei descobrindo que,
d) A exigência interdisciplinar impõe a cada afinal de contas, o anjo de boca suja estava com
especialista que transcenda sua própria es- a razão. Sim, amigos: — cada nome feio que a
pecialidade e que tome consciência de seus vida extrai de nós é um estímulo vital irresis-
próprios limites. tível. Por exemplo: — os nautas camonianos.
e) O que hoje talvez possa vir a tornar-se uma Sem uma sólida, potente e jucunda pornogra-
técnica para prorrogar a vida, sem dúvida fia, um Vasco da Gama, um Colombo, um Pedro
amanhã possa vir a tornar-se uma ameaça. Álvares Cabral não teriam sido almirantes nem
de barca da Cantareira. O que os virilizava era
o bom, o cálido, o inefável palavrão.
E.O. Teste III Mas, se nas relações humanas em geral, o nome
feio produz esse impacto criador e libertário,
que dizer do futebol? Eis a verdade: — retire-
1. (Uerj) CANÇÃO DO VER -se a pornografia do futebol e nenhum jogo
Fomos rever o poste. será possível. Como jogar ou como torcer se não
O mesmo poste de quando a gente brincava podemos xingar ninguém? O craque ou o torce-
de pique dor é um Bocage. Não o 4Bocage fidedigno, que
e de esconder. nunca existiu. Para mim, o 5verdadeiro Bocage
Agora ele estava tão verdinho! é o falso, isto é, o Bocage de anedota. Pois bem:
O corpo recoberto de limo e borboletas. — está para nascer um jogador ou um torcedor
Eu quis filmar o abandono do poste. que não seja bocagiano. O craque brasileiro não
O seu estar parado. sabe ganhar partidas sem o incentivo constan-
O seu não ter voz. te dos rijos e imortais palavrões da língua. Nós,
54
de longe, vemos os 22 homens 7correndo em Considerando o emprego de algumas formas
campo, matando-se, agonizando, rilhando os verbais no texto, é correto afirmar que
dentes. Parecem dopados e realmente o estão: a) “descarta” (ref. 11) e “descubra” (ref. 12) ex-
— o chamado nome feio é o seu excitante efi- pressam fatos possíveis num futuro próximo.
caz, o seu afrodisíaco insuperável. b) “possa chegar” (ref. 13) pode ser substituído
Nélson Rodrigues, À sombra das chuteiras por “chegasse”, sem prejuízo para o sentido
imortais. São Paulo: Cia. das Letras, 1993. e para a coerência da frase.
c) as ações expressas por “desmontar” (ref. 14)
Tendo em vista o contexto, sobre os seguin-
e “separar” (ref.15) não têm agente determi-
tes trechos, só NÃO é correto afirmar:
nado no texto.
a) “era tido e havido” (ref. 2): trata-se de uma
d) “morreram” (ref. 16) está no pretérito, mas
repetição com valor enfático.
se refere a um fato possível de acontecer no
b) “meus cinco, meus seis anos” (ref. 3): ex-
futuro.
pressa ideia de aproximação.
e) “completaram” (ref. 17) e “completavam”
c) “Bocage fidedigno” / “verdadeiro Bocage”
(ref. 18) traduzem fatos passados repetidos,
(ref. 4 e 5): embora sinônimos, os adjetivos
que se prolongam até o presente.
foram usados com sentidos diferentes.
d) “justiça se lhe faça” (ref. 6): pode ser conside- 4. (Ifsul) Observe.
rada uma construção na voz passiva sintética.
e) “correndo (...), matando-se, agonizando, ri-
lhando” (ref. 7): apenas o primeiro gerúndio
dá ideia de continuidade.

3. (PUC-RS)
Revista de maior circulação no mundo, a
Time mostrou como ficaram 1tênues os limi-
tes entre a ciência e a ficção. Em reportagem
de capa, intitulada “Jovem para sempre”,
não 11descarta 19nas entrelinhas a chance de
que um dia, quem sabe, 3se 12descubra não a
cura das doenças, 8mas a cura da morte.
4Menos sutilmente, estimula a esperança
de que talvez o ser humano 13possa chegar
aos 300 anos. A revista ancora o sonho em
moscas e minhocas que, 5tratadas em labora-
tórios, passaram a viver muitas vezes mais.
A suspeita é de 20que, em algum lugar, seria
possível 14desmontar um 21relógio que deter-
mina o aparecimento de rugas, seios caídos, QUINO, 10 anos com Mafalda. São
Paula, Martins Fontes, 2010
pernas flácidas, queda de cabelo.
6
Ao tentar 15separar fantasias e bom senso, a NÃO ABRA A PORTA...
reportagem estabelece como hipótese realis- Se o enunciado acima passasse para o impe-
ta que, 9a partir das descobertas médicas das rativo afirmativo e o tratamento dado fosse o
próximas três décadas, a expectativa de vida de segunda pessoa, qual das construções es-
suba para 120 anos. Seria a continuação do taria de acordo com a norma culta da língua?
impacto provocado pelo inglês Alexander Fle- a) Abre a porta...
ming, que descobriu o primeiro antibiótico. b) Abres a porta...
Traduzindo: as crianças de hoje se lembra- c) Abra a porta...
riam de seus pais – 10ou seja, nós – como d) Abras a porta...
pessoas que 16morreram jovens porque não
17
completaram 80 22anos. 11Assim como acha- 5. (Espm) EPIGRAMA 2
mos que nossos tataravós morriam cedo por- És precária e veloz, Felicidade.
que não 18completavam 60 anos de idade. Custas a vir e, quando vens, não te demoras.
Os novos mitos nutridos pela tecnologia re- Foste tu que ensinaste aos homens que havia tempo,
forçam o absurdo brasileiro. Dezenas de mi- e, para te medir, se inventaram as horas.
lhares de crianças que não completam 2par-
cos 12 meses de vida morrem anualmente, Felicidade, és coisa estranha e dolorosa:
7
porque simplesmente não têm comida ou Fizeste para sempre a vida ficar triste:
bebem água contaminada. Porque um dia se vê que as horas todas passam,
DIMENSTEIN, Gilberto. Expectativa de vida. In: _____. e um tempo despovoado e profundo persiste.
Aprendiz do futuro. São Paulo: Ática: 2004. (fragmento) (Cecília Meireles)

55
Se as formas verbais (no Presente do Indica-
tivo) dos dois primeiros versos exprimissem
ordem, na mesma pessoa, teríamos respec-
tivamente:
a) sê, custa, vem, não te demores.
b) seja, custa, vem, não se demore.
c) sede, custai, vinde, não vos demoreis.
d) sê, custa, venha, não te demoras.
e) sê, custe, vem, não te demore.

E.O. Dissertativo
1. (Fuvest) Leia este texto.
O tempo personalizou minha forma de falar
com Deus, mas sempre termino a conversa Com base na parte escrita do anúncio, res-
ponda.
com um pai-nosso e uma ave-maria.
a) Qual é a relação temporal que se estabele-
(...) ce entre os verbos “conhecer”, “oferecer”,
“proporcionar” e “alcançar”? Explique.
Metade da ave-maria é uma saudação florea-
b) Complete a frase abaixo, flexionando de for-
da para, só no final, pedir que ela rogue por ma adequada os verbos “oferecer”, “propor-
cionar” e “alcançar”.
nós. No pai-nosso, sempre será um mistério
Conhecer profundamente os negócios de
para mim o “mas” do “não nos deixeis cair nossos clientes é só o primeiro passo que
permite que __________ sempre respostas
em tentação, mas livrai-nos do mal”. Me pare- mais rápidas, __________ decisões mais as-
ce que, a princípio, se o Pai não nos deixa cair sertivas e __________ melhores resultados.
em tentação, já estará nos livrando do mal.
3. (Uerj) Uma senhora
Denise Fraga, www1.folha.uol.com. (...)
br, 07/07/2015. Adaptado.
9
A primeira vez que a vi, tinha ela trinta e
seis anos, posto só parecesse trinta e dous, e
não passasse da casa dos vinte e nove. Casa
a) Mantendo-se a relação de sentido existente
é um modo de dizer. 7Não há castelo mais
entre os segmentos “não nos deixeis cair em vasto do que a vivenda destes bons amigos,
nem tratamento mais 1obsequioso do que o
tentação” / “mas livrai-nos do mal”, a con- que eles sabem dar às suas hóspedes. Cada
junção “mas” poderia ser substituída pela vez que D. Camila queria ir-se embora, eles
pediam-lhe muito que ficasse, e ela ficava.
conjunção e, de modo a dissipar o “mistério” Vinham então novos folguedos, cavalhadas,
a que se refere a autora? Justifique. música, dança, uma sucessão de cousas be-
las, inventadas com o único fim de impedir
b) Sem alterar seu sentido, reescreva o trecho que esta senhora seguisse o seu caminho.
da oração citado pela autora, colocando os − Mamãe, mamãe, dizia-lhe a filha crescen-
do, vamos embora, não podemos ficar aqui
verbos “deixeis” e “livrai” na terceira pessoa toda a vida.
do singular. D. Camila olhava para ela mortificada, depois
sorria, dava-lhe um beijo e mandava-a brin-
car com as outras crianças. Que outras crian-
2. (Fuvest) Examine este anúncio de uma insti- ças? Ernestina estava então entre quatorze
e quinze anos, era muito 2espigada, muito
tuição financeira, cujo nome foi substituído
quieta, com uns modos naturais de senho-
por X, para responder às questões a seguir. ra. Provavelmente não se divertiria com as
56
meninas de oito e nove anos; não importa, folguedos, cavalhadas, música, dança, uma
uma vez que deixasse a mãe tranquila, po- sucessão de cousas belas, inventadas com o
dia alegrar-se ou enfadar-se. Mas, ai triste! único fim de impedir que esta senhora se-
Há um limite para tudo, mesmo para os vin- guisse o seu caminho. (ref. 7)
te e nove anos. D. Camila resolveu, enfim, Observe as formas verbais flexionadas do
despedir-se desses dignos anfitriões, e fê-lo trecho acima: as duas primeiras, há e sabem,
ralada de saudades. Eles ainda 3instaram por estão no tempo presente, ao passo que as
uns cinco ou seis meses de quebra; a bela restantes estão no tempo pretérito.
dama respondeu-lhes que era impossível e, Apresente uma justificativa para o emprego
trepando no 4alazão do tempo, foi alojar-se de cada um desses diferentes tempos verbais
na casa dos trinta. e reescreva o trecho integralmente, passan-
8
Ela era, porém, daquela casta de mulheres do todas as formas verbais pretéritas para o
que riem do sol e dos almanaques. Cor de tempo presente, sem alterar os respectivos
leite, fresca, inalterável, deixava às outras o modos, pessoas e números.
trabalho de envelhecer. Só queria o de exis-
tir. Cabelo negro, olhos castanhos e 5cálidos. 4. (PUC-RJ) Podemos primeiramente distin-
Tinha as espáduas e o colo feitos de enco- guir dois grandes sentidos da palavra liber-
menda para os vestidos decotados, e assim dade.
também os braços, que eu não digo que eram Quando tratamos das relações entre “demo-
os da Vênus de Milo, para evitar uma vulga- cracia e liberdade”, ou quando nos pergun-
ridade, mas provavelmente não eram outros. tamos se em tal país se é livre, ou quando
D. Camila sabia disto; sabia que era bonita, invocamos as liberdades políticas, as liberda-
não só porque lho dizia o olhar sorrateiro des fundamentais, ou ainda quando dizemos
das outras damas, como por um certo ins- de um homem que ele é livre (por oposição
tinto que a beleza possui, como o talento e a um escravo ou a um preso), referimo-nos
o gênio. Resta dizer que era casada, que o ao que se pode chamar liberdade de direito,
marido era ruivo, e que os dois amavam-se isto é, em linhas gerais, a ausência de coer-
como noivos; finalmente, que era honesta. ções externas – as interdições e as obriga-
Não o era, note-se bem, por temperamento, ções – nascidas do Estado, da coletividade ou
mas por princípio, por amor ao marido, e da sociedade. [...]
creio que um pouco por orgulho. Há um segundo sentido, que se pode chamar
Nenhum defeito, pois, exceto o de retardar liberdade de fato, por oposição à de direito:
os anos; mas é isso um defeito? Há, não me não se trata mais de perguntar “é permitido
lembra em que página da 6Escritura, natural- fazer (dizer, pensar)?”, mas “é possível fa-
mente nos Profetas, uma comparação dos dias zer (pensar querer...)?”. Não nos referimos
com as águas de um rio que não voltam mais. mais à ausência de coerções extrínsecas (as
D. Camila queria fazer uma represa para seu leis civis, as obrigações sociais, as regras co-
uso. No tumulto desta marcha contínua en- letivas, as interdições...), mas intrínsecas –
tre o nascimento e a morte, ela apegava-se à aquelas que concernem ao próprio sujeito.
ilusão da estabilidade. Só se lhe podia exigir [...]
que não fosse ridícula, e não o era. Dir-me-á Com efeito, não basta, por exemplo, que eu
o leitor que a beleza vive de si mesma, e que viva num país onde há liberdade de viajar
a preocupação do calendário mostra que esta ao exterior para poder fazê-lo, mesmo se eu
senhora vivia principalmente com os olhos quiser. Posso ser impedido por minha situa-
na opinião. É verdade; mas como quer que ção social ou simplesmente por meus recur-
vivam as mulheres do nosso tempo? sos financeiros: passamos aqui do problema
(...) formal da liberdade política (a questão do
Machado de Assis regime) ao problema da justiça econômica (o
Obra completa. Rio de Janeiro: José Aguilar, 1962.
sistema social), e desta não depende mais
obsequioso − gentil
1
apenas a questão da liberdade “formal” (te-
espigada − crescida
2
mos o direito de fazer?), e sim a questão da
3
instar − insistir
liberdade “material” (temos o meio de fa-
4
alazão − um tipo de cavalo
5
cálidos − calorosos zer?). Pode haver também outros obstáculos
6
Escritura − Bíblia para exercer um direito política e juridica-
Não há castelo mais vasto do que a vivenda mente reconhecido; posso, por exemplo, ser
destes bons amigos, nem tratamento mais deficiente físico, estar doente etc. Seja como
obsequioso do que o que eles sabem dar às for, a característica mais geral dessa liberda-
suas hóspedes. Cada vez que D. Camila que- de como “capacidade de fazer o que se quer”
ria ir-se embora, eles pediam-lhe muito que é ser gradual – ao contrário da precedente
ficasse, e ela ficava. Vinham então novos que existe ou não existe – e proporcional aos
57
meios de que dispõe o sujeito – de qualquer a palavra “lírica”, de onde vem a expressão
ordem que sejam: meios econômicos, físi- “poema lírico”, significava, originalmente,
cos, culturais etc. Quanto maiores os meios certo tipo de composição literária feita para
(riqueza, cultura, saúde, força etc.), mais ser cantada, fazendo-se acompanhar por
se pode fazer o que se quer, e portanto se é instrumento de cordas, de preferência a lira.
mais, nesse sentido. A partir de então, configuraram-se muitos
Texto adaptado de WOLFF, Francis. “A invenção momentos em que a música e a poesia se
materialista da liberdade”. In: NOVAES, uniram. 2Segundo Antônio Medina Rodri-
Adauto (org.). O avesso da liberdade. gues, “a grande poesia medieval quase que
São Paulo: Companhia das Letras, 2002. p. 16-17
foi exclusivamente concebida para o canto.
a) O texto reporta-se a dois conceitos distintos
3
O Barroco, séculos além, fez os primeiros
de liberdade. Identifique-os e, usando suas ensaios operísticos, que iriam recolocar o te-
atro no coração da música. 4Depois Mozart,
próprias palavras, explique a diferença que
com a Flauta mágica ou D. Giovanni, levaria,
existe entre eles.
como sabemos, esta fusão ao sublime”.
b) Sem que haja alteração de sentido, reescre-
Durante muito tempo, a poesia foi destinada
va cada trecho abaixo, observando o início à voz e ao ouvido. Na Idade Média, “trova-
proposto a seguir e fazendo as modificações dor” e “menestrel” eram sinônimos de poe-
necessárias. ta. 5Seria necessário esperar a Idade Moder-
i. Não basta que eu viva num país onde há na para que a invenção da imprensa, 6e com
liberdade de viajar ao exterior para poder ela o triunfo da escrita, acentuasse a distin-
fazê-lo, mesmo se eu quiser. ção entre música e poesia. A partir do século
Não bastava ___________________________ XVI, a lírica foi abandonando o canto para se
ii. Posso ser impedido de viajar ao exterior por destinar, cada vez mais, à leitura silenciosa.
minha situação social. Entretanto, mesmo separado da música, o
Minha situação social ____________________ poema continuou preservando traços da-
quela antiga união. Certas formas poéticas,
5. (G1 CP2) ainda vigentes, como o madrigal, o rondó,
CHUVA NO BREJO a balada e a cantiga aludem diretamente às
(Moraes Moreira)
formas musicais. Se a separação de poetas e
músicos dividiu a história de um gênero e
Olha como a chuva cai outro, a poesia não abandonou de vez a mú-
E molha a folha aqui na telha sica tanto quanto a música não abandonou
Faz um som assim de vez a poesia.
Um barulhinho bom [...]
(Disponível em e-revista.unioeste.br/index.php/
travessias/article/ 2993/2342. Acesso: terça-
Faz um som assim feira, 12 de novembro de 2013) [adaptado]
Um barulhinho bom
“O Barroco (...) fez os primeiros ensaios
Água nova operísticos (...)” (referência 3)
Vida veio ver-te Reescreva o trecho acima transformando-o
Voa passarinho em voz passiva. Faça apenas as modificações
necessárias.
No teu canto canta
Antiga cantiga 7. (FGV) Leia o seguinte texto.
A existência de todo grupo social pressupõe
No teu canto canta a obtenção de um equilíbrio relativo entre
antiga cantiga as suas necessidades e os recursos do meio
(Fonte: http://www.vagalume.com.br/moraes-moreira/ físico, requerendo, da parte do grupo, solu-
chuva-no-brejo.html. Último acesso em 23 nov. 2013) ções mais ou menos adequadas e completas,
das quais depende a eficácia e a própria na-
Transcreva, do texto, uma forma verbal que tureza daquele equilíbrio. As soluções, por
está flexionada no modo imperativo. sua vez, dependem da quantidade e quali-
6. (G1 cp2) MÚSICA E POESIA dade das necessidades a serem satisfeitas.
São estas, portanto, o verdadeiro ponto
Luciano Cavalcanti
de partida, todas as vezes que o sociólogo
A relação entre música e poesia vem desde aborda o problema das relações do grupo
a antiguidade. Na cultura da Grécia Antiga, com o meio físico.
por exemplo, poesia e música eram pratica- Com efeito, as necessidades têm um duplo
mente inseparáveis: a poesia era feita para caráter natural e social, pois se a sua mani-
ser cantada. 1De acordo com a tradição, a festação primária são impulsos orgânicos, a
música e a poesia nasceram juntas. De fato, satisfação destes se dá por meio de iniciativas
58
humanas que vão-se complicando cada vez No poema, observa-se uma tentativa de in-
mais, e dependem do grupo para se configurar. terlocução entre o eu poético e as pessoas
Daí as próprias necessidades se complicarem e do futuro.
perderem em parte o caráter estritamente na- Identifique a marca linguística que revela
tural, para se tornarem produtos da sociedade. essa tentativa de interlocução. Em seguida,
De tal modo a podermos dizer que as socieda- indique a quem o eu poético se refere com o
des se caracterizam, antes de mais nada, pela emprego do pronome “nós”.
natureza das necessidades de seus grupos, e
os recursos de que dispõem para satisfazê-las. 9. (Fuvest) Para Pirandello, o cômico nasce
O equilíbrio social depende em grande parte de uma “percepção do contrário”, como no
da correlação entre as necessidades e sua sa- famoso exemplo de uma velha já decrépita
tisfação. E sob este ponto de vista, as situa- que se cobre de maquiagem, veste-se como
ções de crise aparecem como dificuldade, ou uma moça e pinta os cabelos. Ao se perceber
impossibilidade de correlacioná-las. que aquela senhora velha é o oposto do que
Antonio Candido, “Os parceiros do Rio Bonito”. uma respeitável velha senhora deveria ser,
produz-se o riso, que nasce da ruptura das
a) Segundo o texto, as necessidades dos grupos expectativas, mas sobretudo do sentimento
sociais têm um “duplo caráter”. O que distin- de superioridade. A “percepção do contrá-
gue um caráter do outro? rio” pode, porém, transformar-se num “sen-
b) Atenda ao que se pede: timento do contrário” - quando aquele que
b1) O referente dos pronomes sublinhados ri procura entender as razões pelas quais a
em “satisfazê-las” e “correlacioná-las” é o velha se mascara, na ilusão de reconquistar
mesmo? Explique. a juventude perdida. Nesse passo, a velha
b2) Reescreva a frase “todas as vezes que o da anedota não mais está distante do sujei-
sociólogo aborda o problema das relações do to que percebe, porque este pensa que tam-
grupo com o meio físico”, pondo o verbo na bém poderia estar no lugar da velha - e seu
voz passiva. riso se mistura com a compreensão piedosa
e se transforma num sorriso. Para passar da
atitude cômica para a atitude humorística,
8. (Uerj)
é preciso renunciar ao distanciamento e ao
ODE1 PARA O FUTURO
sentimento de superioridade.
Falareis de nós como de um sonho.
Adaptado de Elias Thomé Saliba, “Raízes do riso”.
Crepúsculo dourado. Frases calmas.
Gestos vagarosos. Música suave. a) Considerando o que o texto conceitua, expli-
Pensamento arguto2. Sutis sorrisos. que brevemente qual a diferença essencial
Paisagens deslizando na distância. entre a “percepção do contrário” e o “senti-
Éramos livres. Falávamos, sabíamos, mento do contrário”.
e amávamos serena e docemente. b) “Ao se perceber que aquela senhora velha é
o oposto do que uma respeitável velha se-
Uma angústia delida3, melancólica, nhora deveria ser, produz-se o riso (...)”.
sobre ela sonhareis. Sem prejuízo para o sentido do trecho aci-
ma, reescreva-o, substituindo SE PERCEBER
E as tempestades, as desordens, gritos, e PRODUZ-SE por formas verbais cujo sujeito
violência, escárnio4, confusão odienta5, seja “nós” e É O OPOSTO por NÃO CORRES-
primaveras morrendo ignoradas PONDE. Faça as adaptações necessárias.
nas encostas vizinhas, as prisões,
as mortes, o amor vendido, 10. (Ufrj) BEM NO FUNDO
as lágrimas e as lutas, no fundo, no fundo,
o desespero da vida que nos roubam bem lá no fundo,
- apenas uma angústia melancólica, a gente gostaria
sobre a qual sonhareis a idade de ouro. de ver nossos problemas
resolvidos por decreto
E, em segredo, saudosos, enlevados6,
falareis de nós - de nós! - como de um sonho. a partir desta data,
JORGE DE SENA aquela mágoa sem remédio
www.letras.ufrj.br é considerada nula
e sobre ela - silêncio perpétuo
1 ode: tipo de poema
2 arguto: capaz de perceber as coisas mais sutis extinto por lei todo o remorso,
3 delida: apagada
4 escárnio: desdém, menosprezo
maldito seja quem olhar pra trás,
5 odienta: que inspira aversão, ódio lá pra trás não há nada,
6 enlevados: maravilhados, extasiados e nada mais
59
mas problemas não se resolvem, do cliente, para depois oferecer propostas
problemas têm família grande, que venham a proporcionar resultados
e aos domingos saem todos a passear positivos e correspondam aos objetivos
o problema, sua senhora positivos do negócio.
e outros pequenos probleminhas b) Os verbos mencionados devem ser con-
(LEMINSKI, Paulo. Distraídos venceremos. jugados no modo subjuntivo, na primei-
3ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1990.) ra pessoa do plural: Conhecer profunda-
mente os negócios de nossos clientes é
O poema de Paulo Leminski estrutura-se em só o primeiro passo que permite que ofe-
três momentos de significação, que podem reçamos sempre respostas mais rápidas,
ser assim caracterizados: hipótese (1ª es- proporcionemos decisões mais assertivas
trofe); decreto (2ª e 3ª estrofes); conclusão e alcancemos melhores resultados.
reflexiva (4ª estrofe). 3.
Com o tempo presente, o narrador se refere
Nomeie o recurso formal que expressa a hi- a verdades gerais e atemporais. Com o tempo
pótese no primeiro momento do texto. passado, ele relata acontecimentos ou episó-
dios situados em alguma época anterior ao
momento da narração.
Gabarito Não há castelo mais vasto do que a vivenda
destes bons amigos, nem tratamento mais
obsequioso do que o que eles sabem dar às
suas hóspedes. Cada vez que D. Camila quer
E.O. Teste I ir-se embora, eles pedem-lhe muito que fi-
que, e ela fica. Vêm então novos folguedos,
1. C 2. C 3. E 4. D 5. D
cavalhadas, música, dança, uma sucessão de
6. D 7. D 8. B 9. C 10. D cousas belas, inventadas com o único fim de
impedir que esta senhora siga o seu cami-
nho.
4.
E.O. Teste II a) O primeiro conceito se refere à liberdade
1. C 2. D 3. A 4. C 5. B de direito, ou seja, à possibilidade de al-
guém agir sem ser impedido por causa de
6. D 7. A 8. A 9. A 10. A restrições externas a ele, como regras e
proibições. O segundo conceito se refere
à liberdade de fato, ou seja, à possibilida-
de de alguém agir sem ser impedido por
E.O. Teste III causa de restrições internas, como saúde
1. D 2. E 3. D 4. A 5. A e meios econômicos.
b)
i. Não bastava que eu vivesse num país onde
houvesse liberdade de viajar ao exterior
para poder fazê-lo, mesmo se eu quises-
E.O. Dissertativo se.
1. ii. Minha situação social pode me impedir de
a) Se a conjunção “mas” fosse substituída viajar ao exterior.
pela conjunção “e”, o estranhamento da 5.
A partir do pronome “teu”, na segunda pes-
autora desapareceria, pois a segunda ora- soa do singular, pode-se perceber que o in-
ção deixaria de constituir oposição à pri- terlocutor do eu lírico é um “tu”. Os verbos
meira e seria entendida como um outro “olha” e “voa” referem-se, portanto, a uma
pedido a Deus: “não nos deixeis cair em segunda pessoa do singular. Dessa forma,
tentação” / “e livrai-nos do mal”. conclui-se que estão conjugados no impera-
b) Se a segunda pessoa do plural dos termos tivo, pois a forma verbal do imperativo para
verbais “deixeis” e “livrai” fosse substi- o “tu” para os verbos “olhar” e “voar” res-
tuída pela terceira pessoa do singular, a pectivamente é “olha” e “voa”.
frase correta seria: não nos deixe cair em 6.
É possível reescrever o trecho tanto na voz
tentação, mas livre-nos do mal. passiva analítica, isto é, verbo ser conjugado
2. no tempo apropriado + particípio do verbo
a) A sequência dos verbos “conhecer”, principal e, nesse caso, teríamos “Os pri-
“oferecer”, “proporcionar” e “alcançar” meiros ensaios operísticos foram feitos pelo
estabelecem uma relação temporal de Barroco”.
continuidade e progressão. Em primeiro Também é possível utilizar a partícula apas-
lugar, é necessário conhecer a atividade sivadora “se” seguida do verbo na terceira
60
pessoa, construindo uma oração na voz pas-
siva sintética e omitindo o agente da passi-
va. Nesse caso, teríamos “Fizeram-se os pri-
meiros ensaios operísticos”.
7.
a) Em síntese, o duplo caráter que caracteri-
za as necessidades dos grupos sociais tem
origem na dualidade entre o que é natu-
ral (satisfação dos “impulsos orgânicos”)
e os recursos disponíveis pelo grupo para
a sua concretização (“dependem do gru-
po para se configurar”).
b)
b1) Na primeira ocorrência, o referente
do pronome “las” é “necessidades” e
na segunda, “as necessidades e sua
satisfação”.
b2) Todas as vezes que o problema das
relações do grupo com o meio físico é
abordado pelo sociólogo.
8. Os verbos conjugados na segunda pessoa do
plural (“falareis” e “sonhareis”) constituem
marca linguística que expressa a tentativa
de interlocução entre o eu lírico e as pessoas
do futuro. O pronome “nós” se refere às pes-
soas que vivem no presente.
9.
a) A “percepção do contrário” consiste no
reconhecimento de uma situação que
contraria o esperado. O “sentimento do
contrário” consiste não só em reconhecer
essa situação oposta, mas também enten-
der os motivos que a provocaram.
b) Ao percebermos que aquela senhora não
corresponde ao que uma velha senhora
deveria ser, rimos (...).
10. O recurso formal que expressa a hipótese é o
futuro do pretérito (“gostaria”).

61
Aula 2 (I.T.)
Verbos aplicados ao texto /
Semântica I
Verbos aplicados ao texto no início do material de Interpretação (já que ela é parte
essencial dos processos interpretativos). A semântica é o
A aplicação de verbos ao texto é realizada de variadas campo de estudos linguísticos que cuida dos significados
maneiras e engloba grande parte dos elementos verbais das palavras e dos textos. Ela está presente em pratica-
que conhecemos no curso de Gramática. Tendo isso em mente todos os outros campos gramaticais (com exceção
mente, iremos dividir os conhecimentos de acordo com dos estudos básicos de fonética e fonologia, ligados à
o andamento das aulas, apresentando ao aluno os vá- ortografia e à acentuação). Pode ter certeza de que, onde
rios campos de análise dos verbos e suas possibilidades há acepções de sentido, há semântica.
de aplicação textual. Além de sua presença em várias áreas da Gra-
mática, a semântica possui seus próprios elementos de
análise, que conheceremos a seguir.
Pessoa verbal e direciona-
mentos
Sinonímia
A articulação dos verbos a partir de pessoas é algo, em
princípio, bem tranquilo de ser trabalhado. Dificilmente Ocorre sinonímia quando temos palavras com significa-
esquecemos quais são as pessoas verbais e a ordem em dos idênticos ou muito semelhantes a outras.
que aparecem:
Cão = cachorro
Eu – Primeira pessoa do singular Jerimum = abóbora
Tu – Segunda pessoa do singular
Ele – Terceira pessoa do singular A sinonímia tem forte relação com a paráfra-
Nós – Primeira pessoa do plural se (possibilidades de se reconstruir uma frase ou texto
Vós – Segunda pessoa do plural com outras palavras similares) e ajuda nos processos de
Eles – Terceira pessoa do plural coesão textual (por meio de sinônimos, evitamos a
repetição de termos em um texto).
No entanto, essas articulações de pessoa precisam ser
trabalhadas também pela perspectiva de direcionamen-
tos, ou, em termos mais claros, é preciso lembrar que
as pessoas verbais não só apontam para indivíduos no
Antonímia
mundo, como também evidenciam relações de sentido
Ocorre antonímia quando temos palavras com significa-
entre eles. A primeira pessoa do singular (eu), por exem-
dos contrários a outras.
plo, não marca simplesmente um indivíduo sozinho que
fala, mas pode marcar colocações de desejos íntimos Bonito ≠ feio
(aspirações subjetivas). Já a primeira e a segunda pes- Alto ≠ baixo
soa juntas são exploradas numa ideia de estabeleci-
mento de relações, ou mesmo de composição de um
“nós”. Enfim, as pessoas verbais mostram possibilida- Homonímia
des de interpretação semântica bastante amplas.
Ocorre homonímia quando temos palavra de grafia
igual ou pronúncia igual, mas com significação diferen-
Semântica I – Elementos de te. Isso nos dá três tipos de homônimos:
análise 1. Homônimo homófono heterógrafo (pronúncia
igual – grafia diferente)
Já que se fala a todo o momento de semântica no cur- Ex.: Acento (marca gráfica de tonalidade). As-
so de Gramática, nada melhor do que apresentá-la logo sento (local para se sentar)
63
2. Homônimo homógrafo heterófono (escrita igual – pronúncia diferente)
Ex.: Jogo (substantivo). Jogo (verbo)

3. Homônimo homófono homógrafo (pronúncia igual – escrita igual)


Ex.: Rio (substantivo). (eu) Rio (verbo)

Paronímia
Temos parônimos quando as palavras são muito parecidas, mas o sentido geral é diferente.
Ex.: Comprimento (largura) x Cumprimento (saudação)
Ex.: Discriminar (separar) x Descriminar (absolver)

Polissemia
Temos polissemia em palavras que preservam sua classe gramatical, mas que possuem significados múltiplos.

Ex.: Natureza (meio ambiente) x Natureza (essência de algo)


Ex.: Banco (local onde se senta) x Banco (instituição financeira)

Hiperonímia e hiponímia
São fenômenos que operam relações de abrangência entre palavras (palavras que englobam outras, ou que são
englobadas). As palavras que englobam são conhecidas como hiperônimos; as englobadas como hipônimos.
Ex.: “Comprei um bacalhau para preparar na semana santa. Esse peixe é bastante salgado” (peixe é uma
palavra mais abrangente, que dá conta de bacalhau e de outros diversos peixes, portanto podemos afirmar que
peixe é hiperônimo de bacalhau, e bacalhau é hipônimo de peixe)
Ex.: Ouve um aumento da gasolina. Esse fato deixou os brasileiros irritados (fato é uma palavra que dá
conta de aumento da gasolina, portanto podemos afirmar que fato é hiperônimo do trecho sublinhado.

64
E.O. Teste I IV. “Aceitar-se, aceitar ser aceito, aceitar as
críticas, é sabedoria, bom senso e tera-
pia.”
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO: V. “Não viva sempre triste!”
Se não quiser adoecer ( ) O presente do indicativo aparece nos
Por Dr. Dráuzio Varela enunciados II, III e IV com o objetivo de
exprimir um fato verdadeiro e que não
“Fale de seus sentimentos” pertence a uma época determinada.
Emoções e sentimentos que são escondidos, ( ) No enunciado I, o verbo “falar” encontra-
reprimidos, acabam em doenças como: gas- -se no presente do subjuntivo e expres-
trite, úlcera, dores lombares, dor na coluna. sa um fato incerto, mas que apresenta a
Com o tempo, a repressão dos sentimentos expectativa do locutor de que venha a se
degenera até em câncer. Então vamos de- realizar.
sabafar, confidenciar, partilhar nossa inti- ( ) Com o objetivo de manter o paralelismo
midade, nossos segredos, nossos pecados. verbal, se colocássemos a primeira forma
O diálogo, a fala, a palavra é um poderoso verbal do período III no pretérito perfei-
remédio e excelente terapia. to do indicativo, teríamos que usar a for-
ma verbal “fôssemos” na segunda oração.
“Busque soluções” ( ) O particípio do verbo “aceitar”, no enun-
Pessoas negativas não enxergam soluções e ciado IV, foi utilizado na formação da voz
aumentam os problemas. Preferem a lamen- passiva.
tação, a murmuração, o pessimismo. Melhor ( ) O verbo “viver”, na frase V, encontra-se
é acender o fósforo que lamentar a escuri- flexionada na 2ª pessoa do singular do
dão. Pequena é a abelha, mas produz o que imperativo negativo.
de mais doce existe. Somos o que pensamos. a) F - V - F - F - V
O pensamento negativo gera energia negati- b) V - F - V - V - F
va que se transforma em doença. c) V - F - V - F - F
d) F - F - F - V - V
“Aceite-se”
A rejeição de si próprio, a ausência de auto- 2. (Enem 2015)
estima, faz com que sejamos algozes de nós
mesmos. Ser eu mesmo é o núcleo de uma
vida saudável. Os que não se aceitam são
invejosos, ciumentos, imitadores, competi-
tivos, destruidores. Aceitar-se, aceitar ser
aceito, aceitar as críticas, é sabedoria, bom
senso e terapia.

“Não viva SEMPRE triste!”


O bom humor, a risada, o lazer, a alegria re-
cuperam a saúde e trazem vida longa. A pes-
soa alegre tem o dom de alegrar o ambiente
em que vive.
“O bom humor nos salva das mãos do dou-
tor”. Alegria é saúde e terapia.
(Trechos retirados de Pensador.uol.com.Br/autor/dr_
drauzio_varela. Acesso em 11 de abril de 2015, às 11h.)

1. (G1 - epcar (Cpcar) 2016)Observe as formas


verbais empregadas nos enunciados abaixo e
assinale V para as proposições verdadeiras e
F para as falsas. A seguir, marque a sequên-
cia correta.
I. “Se não quiser adoecer, fale de seus sen-
timentos.” A rapidez é destacada como uma das qua-
II. “Pessoas negativas não enxergam solu- lidades do serviço anunciado, funcionando
ções e aumentam os problemas.” como estratégia de persuasão em relação ao
III. “A rejeição de si próprio, a ausência de consumidor do mercado gráfico. O recurso
autoestima, faz com que sejamos algozes da linguagem verbal que contribui para esse
de nós mesmos.” destaque é o emprego
65
a) do termo “fácil” no início do anúncio, com sentido. Não tenho nenhum carinho espe-
foco no processo. cial por gramáticos. Na minha vida inteira
b) de adjetivos que valorizam a nitidez da im- sempre fui violento [no ataque às regras do
pressão. idioma], porque a língua é a falada, a ou-
c) das formas verbais no futuro e no pretérito, tra é apenas uma forma de você registrar a
em sequência. fala. Se todo mundo erra na crase é a regra
d) da expressão intensificadora “menos do que” da crase que está errada, como aliás está. Se
associada à qualidade. você vai a Portugal, pode até encontrar uma
e) da locução “do mundo” associada a “melhor”, reverberação que indica a crase. Não aqui.
que quantifica a ação. Aqui, no Brasil, a crase não existe.

TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO: Língua – Mas a fala brasileira é mutante e


díspar, cada região tem sua peculiaridade.
Em agosto de 2005, a Revista Língua fez Como romper regras da língua sem cair no
uma entrevista com Millôr Fernandes, o es- vale-tudo?
critor escolhido para ser o homenageado da Millôr – 5Se não houver norma, não há como
FLIP 2014. Eis, aqui, alguns trechos dessa transgredir. A língua tem variantes, mas te-
entrevista. mos de ensinar a escrever o padrão. Quem
Língua – Fazer humor é levar a sério as pala- transgride tem nome ou peito, que o faça e
vras ou brincar com elas? arque com as consequências. Mas insisto que
Millôr – Humor, você tem ou não tem. Pode a escrita é apenas o registro da língua fala-
ser do tipo mais profundo, mais popular, da. De Machado de Assis pra cá, tudo mudou.
mas tem de ter. 1Você vai fazendo e, sem A língua alemã fez reforma ortográfica há
querer, a coisa sai engraçada. Dá para per- 50 anos, correta. Aqui, na minha geração,
ceber quando a construção é forçada. Tenho já foram três reformas do gênero, uma mais
uma capacidade muito natural de perceber maluca que a outra. 6Botaram acento em
bobagem e destruir a coisa. “boemia”, escreveram “xeque” quando toda
língua busca lembrar o árabe shaik, insisti-
Língua – Com que língua você mais gosta de
ram que o certo é “veado” quando o Brasil
trabalhar?
inteiro pronuncia “viado”. Como chegaram
Millôr – Não aprendi línguas até hoje (ri-
a tais conclusões? Essas coisas são idiotas e
sos). 3Gosto de trabalhar com o português,
cabe a você aceitar ou não. Veja o caso da cra-
embora inglês seja a que eu mais leio. Nunca
se. A crase, na prática, não existe no portu-
tive temor de nada. Deve-se julgar as obras
guês do Brasil. Já vi tábuas de mármore com
pelo que elas têm de qualidade, não por se-
crase errada. Se todo mundo erra, a crase é
rem de fulano ou beltrano. Shakespeare fez
quem está errada. Se vamos atribuir crase ao
muita besteira, mas tem três ou quatro obras
masculino “dar àquele”, por que não fazer
perfeitas, e Macbeth é uma delas.
o mesmo com “dar alguém”? 2Não podemos.
Língua – Na sua opinião, quais vantagens o Disponível em: http://revistalingua.uol.com.br/textos/97/
português possui em comparação a outras millor-fernandeso-senhor-das-palavras-247893-1.
línguas que você conhece? asp. Acesso em: 13/06/2014. Adaptado.
Millôr – A principal vantagem é a de ser a
minha língua. Ninguém fala duas línguas. 3. (Upe 2015)Acerca da flexão de alguns dos
Essa ideia de um espião que fala múltiplas verbos empregados no texto, assinale a al-
línguas não passa de mentira. Vai lá no meio ternativa CORRETA.
do jogo dizer “salame minguê, um sorvete a) Nos trechos: “Você vai fazendo” (ref. 1) e
colorê...” ou “velho guerreiro”. Os modis- “Não podemos” (ref. 2), as formas verbais
mos da língua, as coisas ocasionais, não são sublinhadas indicam que os processos ver-
acessíveis a quem não é nativo. Toda pessoa bais expressos foram concluídos.
tem habilidade só no seu idioma. Você pode b) No trecho: “Gosto de trabalhar com portu-
aprender uma, dez, sei lá quantas expres- guês, embora inglês seja a que eu mais leio.”
sões de outra língua, mas ainda existirão ou- (ref. 3), o modo indicativo da forma verbal
tras mil – 4como é que se vai fazer? A língua sublinhada é requerido pela conjunção “em-
portuguesa tem suas particularidades. Como bora”.
outras também. Aprendi desde cedo a ter o c) No trecho: “Como é que se vai fazer?” (ref.
cuidado de não rimar ao escrever uma frase. 4), percebe-se o emprego de dois verbos (su-
Sobretudo em “-ão”. blinhados) para indicar um tempo situado
em momento futuro.
Língua – Quais as normas mais loucas ou d) Em: “Se não houver norma, não há como
mais despropositadas da língua portuguesa? transgredir.” (ref. 5), a forma verbal subli-
Millôr – Toda pesquisa de linguagem é pe- nhada assinala uma afirmação categórica,
rigosa porque tem o caráter de induzir o ou seja, expressa uma certeza.
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e) Em: “Botaram acento em ‘boemia’, escreve- TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
ram ‘xeque’” (ref. 6), a maneira como estão
pluralizadas as formas verbais destacadas in- O leão e a raposa
dica uma ação ainda por acontecer. Um 11leão envelhecido, 1não podendo mais
procurar alimento por sua própria conta,
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO: julgou que devia arranjar um jeito de fazer
isso. E, então, foi a uma caverna, deitou-se
e se fingiu de doente. Dessa forma, quan-
do 8recebia a visita de outros 13animais, ele
4
os pegava e 5os comia. Depois que muitas
14
feras 6já tinham morrido, uma 12raposa,
ciente da armadilha, parou a 9certa distân-
cia da caverna e perguntou ao leão como ele
estava. Como ele 2respondesse: “Mal!” e lhe
3
perguntasse 10por que ela não entrava, dis-
se a raposa: “Ora, eu entraria 7se não visse
marcas de muitos entrando, mas de ninguém
saindo”.
Esopo - escritor grego do século VI a.C.

5. (Mackenzie 2012) Assinale a alternativa


correta.
a) O fragmento não podendo mais procurar ali-
mento por sua própria conta (ref. 1) apre-
senta a causa da decisão assumida pelo leão.
b) A narrativa contém apenas discurso indire-
to, aquele em que o narrador faz uma pará-
frase da fala dos personagens.
c) O uso do subjuntivo em respondesse (ref. 2)
e perguntasse (ref. 3) denota a mesma ideia
de hipótese presente em “O que você faria se
ganhasse na loteria?”.
d) O pronome os (ref. 4 e 5), nas duas ocor-
rências, evidencia que a relação de coesão
é estabelecida com elemento que será apre-
sentado no texto apenas após os pronomes.
e) A partícula já (ref. 6) denota temporalidade
relacionada exatamente a um momento pre-
sente, como em “Faça isso já, agora mesmo!”.
4. (Uepb 2014)Em “Relações onde o que vale/é
o afeto/Eu te tenho/Tu me tens [...]”, pode-
-se afirmar que a intencionalidade do locu- E.O. Teste II
tor, em relação aos termos em destaque, é:
I. Evidenciar de forma explicativa um enca- TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
deamento que justifica o enunciado ante-
rior. O texto é um excerto de Baú de Ossos (volu-
II. Criar uma relação de força argumentati- me 1), do médico e escritor mineiro Pedro
Nava. Inclui-se essa obra no gênero memo-
va, por meio do uso do verbo pronominal
rialístico, que é predominantemente narra-
“TER”.
tivo. Nesse gênero, são contados episódios
III. Estabelecer uma reiteração temática, uti-
verídicos ou baseados em fatos reais, que fi-
lizando recursos linguísticos para inten-
caram na memória do autor. Isso o distingue
sificar o sentido.
da biografia, que se propõe contar a história
Analise as proposições e marque a alterna-
de uma pessoa específica.
tiva que apresenta, apenas, a(s) correta(s).
a) III 1
O meu amigo Rodrigo Melo Franco de An-
b) II drade é autor 2do conto “Quando minha avó
c) I e II morreu”. Sei por ele que é uma história auto-
d) I biográfica. 3Aí Rodrigo confessa ter passado,
e) I e III aos 11 anos, por fase da vida em que 4se
67
sentia profundamente corrupto. Violava as outro sem alterar o sentido da sentença. Hi-
promessas feitas de noite a Nossa Senhora; perônimo é um vocábulo ou um sintagma
mentia desabridamente; faltava às aulas de sentido mais genérico em relação a ou-
para tomar banho no rio e pescar na Barro- tro. Ele abarca vocábulos de sentidos menos
ca com companheiros vadios; furtava 5prati- genéricos ou mais específicos. Hipônimo é
nhas de dois mil-réis... 6Ai! de mim que mais um vocábulo menos geral ou mais especí-
cedo que o amigo também 7abracei a senda fico, cujo sentido é abarcado pelo sentido
do crime e enveredei pela do furto... 8Aman- do hiperônimo. Considere a ordem em que
te das artes plásticas desde cedo, educado foram distribuídos os vocábulos do excerto
no culto do belo, eu não pude me conter. transcrito a seguir e assinale a opção cor-
Eram duas coleções de postais pertencentes reta: “abracei a senda do crime e enveredei
a minha prima Maria Luísa Palleta. Numa, pela do furto...” (ref. 7).
toda a vida de Paulo e Virgínia – do idílio a) Os vocábulos roubo e furto são sinônimos e
infantil ao navio desmantelado na proce- um pode substituir o outro, indistintamen-
la. Pobre Virgínia, dos cabelos esvoaçantes! te, em qualquer contexto.
Noutra, a de Joana d’Arc, desde os tempos b) Crime é hiperônimo de furto. Isso significa
de pastora e das vozes ao da morte. Pobre que o sentido do vocábulo crime é mais ge-
Joana dos cabelos em chama! Não resisti. nérico do que o sentido do vocábulo furto.
Furtei, escondi e depois de longos êxtases, c) Nesse contexto, a inversão da posição dos
com medo, joguei tudo fora. Terceiro roubo, vocábulos crime e furto seria aceitável:
terceira coleção de postais – a que um car- “abracei a senda do furto e enveredei pela
camano, chamado Adriano Merlo, escrevia a
do crime”.
uma de minhas tias. Os cartões eram fabulo-
d) Sendo vereda um caminho estreito e enve-
sos. Novas contemplações solitárias e piquei
redar, seguir por uma vereda, seria lógico
tudo de latrina abaixo. Mas o mais grave foi
dizer “abracei a vereda do crime e enveredei
o roubo de uma nota de cinco mil-réis, do
pelo caminho do furto”.
patrimônio da própria Inhá Luísa. De posse
dessa fortuna nababesca, comprei um livro e
uma lâmpada elétrica de tamanho desmedi- TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
do. Fui para o parque Halfeld com o butim de
minha pirataria. Joguei o troco num bueiro. Viagens, cofres mágicos com promessas so-
Como ainda não soubesse ler, rasguei o livro nhadoras, não mais 5revelareis 6vossos te-
e atirei seus restos em um tanque. 9A lâm- souros intactos! Hoje, quando ilhas poliné-
pada, enorme, esfregada, não fez aparecer sias afogadas em concreto se transformam
nenhum gênio. Fui me desfazer de mais esse em porta-aviões ancorados nos mares do Sul,
cadáver na escada da Igreja de São Sebastião. quando as favelas corroem a África, quando
10
Lá a estourei, tendo a impressão de ouvir a aviação 9avilta a floresta americana antes
os trovões e o morro do Imperador desaban- mesmo de poder 7destruir-lhe a virgindade,
do nas minhas costas. Depois dessa série de de que modo poderia a pretensa 10evasão da
atos gratuitos e delitos inúteis, voltei para viagem conseguir outra coisa que não 14con-
casa. 11Raskólnikov. O mais estranho é que frontar-nos 15com as formas mais miseráveis
houve crime, e não castigo. Crime perfeito. de nossa existência histórica?
Ninguém desconfiou. Minha avó não deu por 18
Ainda 22assim, compreendo a paixão, a lou-
falta de sua cédula. 12Eu fiquei por conta das cura, o equívoco das narrativas de viagem.
Fúrias de um remorso, que me perseguiu Elas 16criam a ilusão daquilo 1__________
toda a infância, veio comigo pela vida afo- não existe mais, mas 2__________ ainda de-
ra, com a terrível impressão de que eu pode- veria existir. Trariam nossos modernos Mar-
ria reincidir porque vocês sabem, 13cesteiro cos Polos, das mesmas terras distantes, desta
que faz um cesto... 14Só me tranquilizei anos vez em forma de fotografias e relatos, as es-
depois, já médico, quando li num livro de peciarias morais 3_________ nossa sociedade
Psicologia que só se deve considerar roubo experimenta uma necessidade aguda ao se
o que a criança faz com proveito e dolo. O sentir 11soçobrar no tédio?
furto inútil é fisiológico e psicologicamente É assim que me identifico, viajante procu-
normal. Graças a Deus! Fiquei absolvido do rando em vão reconstituir o exotismo com o
meu ato gratuito... auxílio de fragmentos e de destroços. 19En-
(Pedro Nava. Baú de ossos. Memórias 1. p. 308 a 310.)
tão, 26insidiosamente, a ilusão começa a te-
cer suas armadilhas. Gostaria de ter vivido
no tempo das verdadeiras viagens, quando
1. (Uece 2016)Sinônimo é um vocábulo que, um espetáculo ainda não estragado, conta-
em determinado texto, apresenta significa- minado e maldito se oferecia em todo o seu
do semelhante ao de outro e que pode, em esplendor. 20Uma vez 12encetado, o jogo de
alguns contextos, ser usado no lugar desse conjecturas não tem mais fim: quando se
68
deveria visitar a Índia, em que época o estu- esmolas para sobreviver. Essa é a realidade
do dos selvagens brasileiros poderia levar a das pessoas que 2fazem da rua sua casa e
conhecê-los na forma menos alterada? Teria nela constroem sua 35intimidade. 18Assim, a
sido melhor chegar ao Rio no século XVIII?
ideia de 33individualização que está nas 31ca-
Cada década para 23trás 29permite 27salvar
um costume, 28ganhar uma festa, 17partilhar sas, na 34separação das coisas por 30cômodos
uma crença suplementar. e quartos que servem para proteger a intimi-
21
Mas conheço bem demais os textos do pas- dade do indivíduo, 14ganha outro sentido. O
sado para não saber que, me privando de um 6viver nas 29ruas, um lugar 19aparentemente
século, renuncio a perguntas dignas de enri- 36
inabitável, tem sua própria lógica de fun-
quecer minha reflexão. E eis, diante de mim,
cionamento, que vai além das possibilidades.
o círculo intransponível: quanto menos as
culturas tinham condições de se comunicar A relação que o homem 8estabelece com o
entre si, menos também os emissários 8res- espaço que ocupa é uma das mais importan-
pectivos eram capazes de perceber a riqueza tes para sua sobrevivência. As mudanças de
e o significado da diversidade. No final das comportamento social 15foram 21sempre pre-
contas, sou prisioneiro de uma 32alternativa: cedidas de 22mudanças físicas de local. Por
30ora viajante antigo, confrontado com um 23
mais que a rua não seja um local para 7vi-
prodigioso espetáculo do qual quase tudo lhe
escapava 24— ainda pior, inspirava troça ou ver, já que se trata de um ambiente públi-
desprezo 25—, 31ora viajante moderno, cor- co, de passagem e não de permanência, ela
rendo atrás dos vestígios de uma realidade acaba sendo, 25senão única, a 24mais viável
desaparecida. Nessas duas situações, sou opção. Alguns pensadores já apontam que a
perdedor, pois eu, que me lamento diante habitação 9é um ponto base e 10adquire uma
das sombras, talvez seja impermeável ao ver- importância para harmonizar a vida. O pen-
dadeiro espetáculo que está tomando forma
sador Norberto Elias comenta que “o quarto
neste instante, mas 4__________ observação,
meu grau de humanidade ainda 13carece da de dormir tornou-se uma das áreas mais pri-
sensibilidade necessária. 33Dentro de alguma vadas e íntimas da vida humana. Suas pare-
centena de anos, neste mesmo lugar, outro des visíveis e 37invisíveis vedam os aspectos
viajante pranteará o desaparecimento do mais ‘privados’, ‘íntimos’, irrepreensivel-
que eu poderia ter visto e que me escapou. mente ‘animais’ da nossa existência à vista
Adaptado de: LÉVI-STRAUSS, C. Tristes trópicos.
de outras pessoas”.
São Paulo: Cia. das Letras, 1996. p. 38-44.
O modo como essas pessoas 27constituem o
único espaço que lhes foi permitido indi-
2. (Ufrgs 2015)Assinale a alternativa que apre- ca que conseguiram transformá-lo em “seu
senta o sinônimo adequado para a respecti- 20
lugar”, que aproximaram, cada um à sua
va palavra do texto, considerando o contexto maneira, 16dois mundos nos quais estamos
em que esta é empregada. 32
inseridos: o público e o privado.
a) avilta (ref. 9) - degrada
RODRIGUES, Robson. Moradores de uma terra
b) evasão (ref. 10) - falta sem dono. (fragmento adaptado) In: http://
c) soçobrar (ref. 11) - definhar sociologiacienciaevida.uol.com.br/ESSO/edicoes/32/
d) encetado (ref. 12) - preparado artigo194186-4.asp. Acesso em 21/8/2014.
e) carece (ref. 13) - prescinde

TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO: 3. (Pucrs 2015)Analise as afirmações sobre o


sentido e a formação das palavras no texto.
Entre o espaço público e o privado I. Há uma relação de sinonímia entre “res-
12
Excluídos da sociedade, os moradores de significam” (ref. 26) e “constituem” (ref.
rua 26ressignificam o único espaço 13que 27).
lhes foi permitido ocupar, o espaço público, II. “calçadas” (ref. 28) está para “ruas” (ref.
transformando-o em seu “lugar”, um espa- 29) assim como “cômodos” (ref. 30) está
ço privado. 11Espalhados pelos ambientes para “casas” (ref. 31).
coletivos da cidade, 1fazendo comida no as- III. A relação entre “Excluídos” (ref. 12) e
falto, arrumando suas camas, limpando as “inseridos” (ref. 32) é a mesma que se
calçadas como se estivessem dentro de uma estabelece entre “individualização” (ref.
casa: 17assim vivem os moradores de rua. Ao 33) e “separação” (ref. 34).
andar pelas ruas de São Paulo, vemos essas IV. As palavras “intimidade” (ref. 35), “ina-
pessoas 3dormindo nas 28calçadas, 4passan- bitável” (ref. 36) e “invisíveis” (ref. 37)
do por situações constrangedoras, 5pedindo têm o mesmo prefixo.
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Estão corretas apenas as afirmativas 5. (Ufrn 2012)A figura é uma capa da revis-
a) I e II. ta Planeta. Em sua chamada principal, cujo
b) I e III. tema é o crescimento populacional,
a) o emprego dos tempos verbais presente e
c) I e IV.
futuro estabelece uma relação de projeção
d) II e III. entre a realidade atual e os desafios a serem
e) II, III e IV. enfrentados.
b) os termos “água”, “ar” e “combustíveis”
mantêm uma relação de sinonímia com a ex-
4. (Fuvest 2014)Leia o seguinte texto, que faz pressão “recursos naturais”.
parte de um anúncio de um produto alimen- c) os termos “estudos” e “desafios” mantêm
tício: uma relação de oposição com o conteúdo
probabilístico da matéria.
EM RESPEITO A SUA NATUREZA, SÓ TRA- d) o emprego dos verbos nascer e ser, no tempo
BALHAMOS COM O MELHOR DA NATUREZA futuro, estabelece uma relação de contradi-
Selecionamos só o que a natureza tem de ção com a afirmativa “Somos 7 bilhões”.
melhor para levar até a sua casa. Porque faz
parte da natureza dos nossos consumidores
querer produtos saborosos, nutritivos e, aci-
E.O. Teste III
ma de tudo, confiáveis.
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
www.destakjornal.com.br, 13/05/2013. Adaptado.
O gosto da surpresa
Procurando dar maior expressividade ao tex- Betty Milan
to, seu autor Psicanalista e escritora

a) serve-se do procedimento textual da sinoní- Nada é melhor do que se surpreender, olhar


mia. o mundo com olhos de criança. Por isso as
b) recorre à reiteração de vocábulos homônimos. pessoas gostam de viajar. Nem o trânsito,
c) explora o caráter polissêmico das palavras. nem a fila no aeroporto, nem o eventual
d) mescla as linguagens científica e jornalística. desconforto do hotel são empecilhos neste
caso. Só viajar importa, ir de um para outro
e) emprega vocábulos iguais na forma, mas de
lugar e se entregar à cena que se descortina.
sentidos contrários. Como, aliás, no teatro.
O turista compra a viagem baseado nas ga-
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO: rantias que a agência de turismo oferece,
mas se transporta em busca de surpresa.
Porque é dela que nós precisamos mais. Isso
explica a célebre frase “navegar é preciso,
viver não”, erroneamente atribuída a Fer-
nando Pessoa, já que data da Idade Média.
Agora, não é necessário se deslocar no espa-
ço para se surpreender e se renovar. Olhar
atentamente uma flor, acompanhar o seu
desenvolvimento, do botão à pétala caída,
pode ser tão enriquecedor quanto visitar um
monumento histórico.
Tudo depende do olhar. A gente tanto pode
olhar sem ver nada quanto se maravilhar,
uma capacidade natural na criança e que o
adulto precisa conquistar, suspendendo a
agitação da vida cotidiana e não se deixan-
do absorver por preocupações egocêntricas.
Como diz um provérbio chinês, a lua só se
reflete perfeitamente numa água tranquila.
O que nós vemos e ouvimos depende de nós.
A meditação nos afasta do clamor do cotidia-
no e nos permite, por exemplo, ouvir a nossa
respiração. Quem escuta com o espírito e não
com o ouvido, percebe os sons mais sutis.
70
Ouve o silêncio, que é o mais profundo de d) personificação para opor o mundo real pobre
todos os sons, como bem sabem os músicos. ao mundo virtual rico.
Numa de suas músicas, Caetano Veloso diz e) antonímia para comparar a rede mundial de
que “só o João (Gilberto) é melhor do que computadores com a rede caseira de descan-
o silêncio”. Porque o silêncio permite entrar so da família.
em contato com um outro eu, que só existe
quando nos voltamos para nós mesmos. TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
Há milênios, os asiáticos, que valorizam a E Jerônimo via e escutava, sentindo ir-se-lhe
longevidade, se exercitam na meditação, toda a alma pelos olhos enamorados.
enquanto nós, ocidentais, evitamos o desli- Naquela mulata estava o grande mistério, a
gamento que ela implica. Por imaginarmos
síntese das impressões que ele recebeu che-
que sem estar ligado não é possível existir,
gando aqui: ela era a luz ardente do meio-
ignoramos que o afastamento do circuito
-dia; ela era o calor vermelho das sestas da
habitual propicia uma experiência única de
fazenda; era o aroma quente dos trevos e das
nós mesmos, uma experiência sempre nova.
baunilhas, que o atordoara nas matas brasi-
Desde a Idade Média, muitos séculos se pas- leiras; era a palmeira virginal e esquiva que
saram. Mas o lema dos navegadores continua se não torce a nenhuma outra planta; era o
atual. Surpreender-se é preciso. A surpresa veneno e era o açúcar gostoso; era o sapoti
é a verdadeira fonte da juventude, promessa mais doce que o mel e era a castanha do caju,
de renovação e de vida. que abre feridas com o seu azeite de fogo;
(Veja, Editora Abril, edição 2184 – ano ela era a cobra verde e traiçoeira, a lagar-
43 – nº 39, 29/09/2010, p. 116) ta viscosa, a muriçoca doida, que esvoaçava
havia muito tempo em torno do corpo dele,
1. (G1 - ifal 2011)No trecho: “...suspendendo a assanhando-lhe os desejos, acordando-lhe as
agitação da vida cotidiana e não se deixando fibras embambecidas pela saudade da terra,
absorver por preocupações egocêntricas”, as picando-lhe as artérias, para lhe cuspir den-
palavras grifadas mantêm, com os vocábulos tro do sangue uma centelha daquele amor
“absolver” e “personalistas”, uma relação de: setentrional, uma nota daquela música feita
a) homonímia e sinonímia, respectivamente. de gemidos de prazer, uma larva daquela nu-
b) sinonímia e homonínia, respectivamente. vem de cantáridas que zumbiam em torno da
c) antonímia e paronímia, respectivamente. Rita Baiana e espalhavam-se pelo ar numa
d) antonímia e sinonímia, respectivamente. fosforescência afrodisíaca.
e) paronímia e sinonímia, respectivamente. Aluísio Azevedo, O cortiço.

2. (Enem 2012)
3. (Fuvest 2015)O conceito de hiperônimo (vo-
cábulo de sentido mais genérico em relação a
outro) aplica-se à palavra “planta” em rela-
ção a “palmeira”, “trevos”, “baunilha” etc.,
todas presentes no texto. Tendo em vista a
relação que estabelece com outras palavras
do texto, constitui também um hiperônimo
a palavra
a) “alma”.
b) “impressões”.
c) “fazenda”.
d) “cobra”.
e) “saudade”.
O efeito de sentido da charge é provocado
pela combinação de informações visuais e
recursos linguísticos. No contexto da ilustra- TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
ção, a frase proferida recorre à
Em agosto de 2005, a Revista Língua fez
a) polissemia, ou seja, aos múltiplos sentidos
uma entrevista com Millôr Fernandes, o es-
da expressão “rede social” para transmitir a
critor escolhido para ser o homenageado da
ideia que pretende veicular.
FLIP 2014. Eis, aqui, alguns trechos dessa
b) ironia para conferir um novo significado ao
entrevista.
termo “outra coisa”.
c) homonímia para opor, a partir do advérbio Língua – Fazer humor é levar a sério as pala-
de lugar, o espaço da população pobre e o vras ou brincar com elas?
espaço da população rica. Millôr – Humor, você tem ou não tem. Pode
71
ser do tipo mais profundo, mais popular, arque com as consequências. Mas insisto que
mas tem de ter. 1Você vai fazendo e, sem a escrita é apenas o registro da língua fala-
querer, a coisa sai engraçada. Dá para per- da. De Machado de Assis pra cá, tudo mudou.
ceber quando a construção é forçada. Tenho A língua alemã fez reforma ortográfica há
uma capacidade muito natural de perceber 50 anos, correta. Aqui, na minha geração,
bobagem e destruir a coisa. já foram três reformas do gênero, uma mais
maluca que a outra. 6Botaram acento em
Língua – Com que língua você mais gosta de
“boemia”, escreveram “xeque” quando toda
trabalhar?
língua busca lembrar o árabe shaik, insisti-
Millôr – Não aprendi línguas até hoje (ri-
ram que o certo é “veado” quando o Brasil
sos). 3Gosto de trabalhar com o português,
inteiro pronuncia “viado”. Como chegaram
embora inglês seja a que eu mais leio. Nunca
a tais conclusões? Essas coisas são idiotas e
tive temor de nada. Deve-se julgar as obras
cabe a você aceitar ou não. Veja o caso da cra-
pelo que elas têm de qualidade, não por se-
se. A crase, na prática, não existe no portu-
rem de fulano ou beltrano. Shakespeare fez
guês do Brasil. Já vi tábuas de mármore com
muita besteira, mas tem três ou quatro obras
crase errada. Se todo mundo erra, a crase é
perfeitas, e Macbeth é uma delas.
quem está errada. Se vamos atribuir crase ao
Língua – Na sua opinião, quais vantagens o masculino “dar àquele”, por que não fazer
português possui em comparação a outras o mesmo com “dar alguém”? 2Não podemos.
línguas que você conhece? Disponível em: http://revistalingua.uol.com.br/textos/97/
Millôr – A principal vantagem é a de ser a millor-fernandeso-senhor-das-palavras-247893-1.
asp. Acesso em: 13/06/2014. Adaptado.
minha língua. Ninguém fala duas línguas.
Essa ideia de um espião que fala múltiplas
4. (Upe 2015)Quanto aos aspectos semânticos
línguas não passa de mentira. Vai lá no meio
e efeitos de sentido alcançados pelo vocabu-
do jogo dizer “salame minguê, um sorvete
lário utilizado no texto, assinale a alternati-
colorê...” ou “velho guerreiro”. Os modis-
va CORRETA.
mos da língua, as coisas ocasionais, não são
a) Os dois empregos do hiperônimo “coisa” (1º
acessíveis a quem não é nativo. Toda pessoa
parágrafo) expressam o mesmo tom pejorativo.
tem habilidade só no seu idioma. Você pode
b) Recursos de ironia, como “risos” e vocábulos
aprender uma, dez, sei lá quantas expres-
coloquiais (“fulano”, “besteira”), marcam o
sões de outra língua, mas ainda existirão ou-
2º parágrafo: o leitor deve compreender que,
tras mil – 4como é que se vai fazer? A língua
na verdade, Millôr fala diversas línguas e con-
portuguesa tem suas particularidades. Como
sidera perfeita toda a obra de Shakespeare.
outras também. Aprendi desde cedo a ter o
c) No texto, “a fala brasileira é mutante e dís-
cuidado de não rimar ao escrever uma frase.
par” (5º parágrafo) equivale a “a fala brasi-
Sobretudo em “-ão”.
leira é inconstante e disparatada”, ou seja,
Língua – Quais as normas mais loucas ou “sem normas ou regras”.
mais despropositadas da língua portuguesa? d) Vocábulos como “língua”, “português”,
Millôr – Toda pesquisa de linguagem é peri- “idioma”, “gramáticos”, entre outros, per-
gosa porque tem o caráter de induzir o senti- tencem a um mesmo campo semântico e
do. Não tenho nenhum carinho especial por contribuem, assim, para a construção da
gramáticos. Na minha vida inteira sempre unidade de sentido ao longo do texto.
fui violento [no ataque às regras do idioma], e) Vocábulos como “destruir” (1º parágrafo),
porque a língua é a falada, a outra é apenas “despropositadas” (4º parágrafo), “acessí-
uma forma de você registrar a fala. Se todo veis” (3º parágrafo) e “induzir” (4º parágra-
mundo erra na crase é a regra da crase que fo) apresentam prefixos de traço semântico
está errada, como aliás está. Se você vai a com valor de negação: “des-”, “a-” e “in-”.
Portugal, pode até encontrar uma reverbe-
ração que indica a crase. Não aqui. Aqui, no
Brasil, a crase não existe.
E.O. Dissertativo
Língua – Mas a fala brasileira é mutante e
díspar, cada região tem sua peculiaridade. 1. (Ufmg 2008)Analise este “slogan” de uma
Como romper regras da língua sem cair no empresa gráfica:
vale-tudo?
Millôr – 5Se não houver norma, não há como O NOSSO PRODUTO É UMA BOA IMPRESSÃO
transgredir. A língua tem variantes, mas te-
mos de ensinar a escrever o padrão. Quem EXPLIQUE de que modo se explora, nesse
transgride tem nome ou peito, que o faça e “slogan”, a polissemia.
72
2. (Unicamp 2006) Na sua coluna diária do Jor- Quem tem mais de trinta anos e estudou
nal “Folha de S. Paulo” de 17 de agosto de português e não a famigerada comunicação
2005, José Simão escreve: “No Brasil nem a e expressão se lembra dos primeiros versos:
esquerda é direita!”.
a) Nessa afirmação, a polissemia da língua pro- Minha terra tem palmeiras
duz ironia. Em que palavras está ancorada Onde canta o sabiá,
essa ironia? As aves, que aqui gorjeiam,
b) Quais os sentidos de cada uma das palavras Não gorjeiam como lá.
envolvidas na polissemia acima referida? Pois bem. Lá ia o expositor à mesa ressaltan-
c) Comparando a afirmação “No Brasil nem a do que a grande força deste poema estava no
esquerda é direita” com “No Brasil a esquer- fato de que era um texto sem qualquer adje-
da não é direita”, qual a diferença de sen- tivo. Disse isto, conferindo tal observação ao
tido estabelecida pela substituição de ‘nem’ grande Ayres da Matta Machado.
por ‘não’?
Mal se pronunciou esta frase, ouviu-se do
3. (Unicamp 2005)Em um jornal de circulação fundo do auditório um vozeirão contestando
restrita, vemos, na capa, a seguinte chama- e reclamando:
da: - Perdão, mas esta ideia é minha.
A plateia voltou-se estupefata.
Inspire
saúde! Era Mestre Aurélio, que levantando-se da
Sem fumar, poltrona e encaminhando-se desassombra-
respire damente para o palco continuou falando:
aliviado! - Sim, esta ideia é minha. Tive poucas, não
sei se terei outras e tenho que defendê-las.
No interior do Jornal, a matéria começa da
seguinte forma: “Desperte o não-fumante Isto posto assumiu seu imprevisto lugar à
que há em você!”, seguida logo adiante de cabeceira das ideias e fez um brilhante apar-
“O fumante passivo - aquele que não fuma, te que virou uma conferência.
mas frequenta ambientes poluídos pela fu-
maça do cigarro - também tem sua saúde Outra estorinha sobre Aurélio já é clássica.
prejudicada.” Tendo que ir à Academia, uniformizado com
(“Jornal da Cassi” - Publicação da Caixa espada e chapéu, ficou ali na Glória aguar-
de Assistência dos Funcionários do Banco do dando táxi, até que um parou. O motorista
Brasil, ano IX, n0. 40, junho/julho de 2004). fascinado com a sua indumentária, olhando
pelo retrovisor, de repente indagou:
Levando em consideração os trechos citados,
- Ainda que mal pergunte: sois algum reis?
observamos, na chamada da capa, um inte-
ressante jogo polissêmico. A construção da frase era estranha, mas o
a) Apresente dois sentidos de ‘Inspire’ em ‘Ins- motorista estava jogando até com a possi-
pire saúde!’. Justifique. bilidade de “folia-de-reis” tendo em vista a
b) Apresente dois sentidos de ‘aliviado’ em ‘res- semelhança entre a fantasia dos acadêmicos
pire aliviado!’. Justifique. e a do folclore.
Aurélio explicou que não, falou da Acade-
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO: mia. O chofer não entendeu muito bem. Mas
quando Aurélio lhe pediu para se apressar,
O HOMEM DAS PALAVRAS porque estava atrasado, o outro atalhou con-
fiante:
De Aurélio Buarque de Holanda, que nos dei- 1_
Pode deixar, doutor, que do jeito que o se-
xou esta semana, guardo algumas lembran- nhor está vestido, nada começa antes do se-
ças. Todas alegres. nhor chegar.
Uma vez, por exemplo, estávamos num con- (SANT’ANNA, Affonso Romano de. Porta de colégio
gresso de escritores em Brasília. Assentados e outras crônicas. 2ª ed. São Paulo: Ática, 1997.
no auditório ouvíamos as doutas palavras p. 53-56. Coleção Para Gostar de Ler. 16 Vol.)
que eram ditas no palco onde alguém procla-
mava as virtudes de um texto literário. 2A 4. (Ufrrj 2007)A sinonímia e o emprego de
rigor, o texto em questão era a Canção do pronomes são alguns dos recursos possíveis
Exílio, de Gonçalves Dias, que até dez anos para estabelecer a coesão textual evitando,
atrás todos os brasileiros sabiam de cor, não inclusive, a repetição de palavras em um tex-
exatamente por causa da ditadura mais re- to. Atualmente, um termo bastante empre-
cente, mas porque era texto que aparecia em gado para codificar o conceito “profissional
todas as antologias escolares. que dirige táxi” é “taxista”.
73
Aponte os três vocábulos usados pelo autor
do texto “O homem das palavras” para se re-
E.O. Dissertativo
1. A palavra “impressão” possui dois sentidos:
ferir a essa acepção. um relacionado à qualidade do trabalho (no
caso, a impressão gráfica) feito pela empresa
5. (Fuvest 2015)Leia o seguinte texto: gráfica e outro relacionado à imagem positi-
va que o material em si passará ao cliente.
Mal traçadas 2.
a) A ironia está presente nas palavras “es-
Canadá planeja extinguir os carteiros querda” e “direita”.
No mundo inteiro, os serviços de correio ten- b) Esquerda: “tendência política ligada a
tam se adaptar à disseminação do e-mail, do reivindicações populares, trabalhistas,
Facebook, do SMS e do Skype, que golpea- socialistas ou comunistas”. Direita: “ten-
ram quase até a morte os hábitos tradicio- dência política conservadora ou reacio-
nais de correspondência, mas em nenhum nária em relação às reformas sociais”
lugar se chegou tão longe quanto no Canadá. e, como adjetivo, “correta, honesta.” A
Em dezembro, o Canada Post anunciou nada polissemia criada pelo autor ironiza os
menos que a extinção do carteiro tal como o partidos de esquerda que não agem com
conhecemos. A meta é acabar com o anda- honestidade.
rilho uniformizado que, faça chuva ou faça c) “Nem”, no contexto, expressa a ideia de
sol, distribui envelopes de porta em porta adição e significa “inclusive não”, “tam-
e, às vezes, até conhece os rostos por trás bém não”, ou seja, dá uma ideia de que
dos nomes dos destinatários. Os adultos de todos são desonestos, inclusive a esquer-
amanhã se lembrarão dele tanto quanto os da. Já o sentido de “não” é apenas de ne-
de hoje se recordam dos leiteiros, profetizou gação e entende-se que a esquerda não é
o blog de assuntos metropolitanos do jornal honesta.
Toronto Star, conformado à marcha inelutá- 3.
a) Inspirar, em “Inspire saúde”, pode sig-
vel da modernidade tecnológica.
nificar: “sorver, absorver”, introduzindo
Claudia Antunes, http://revistapiaui.
estadao.com.br. Adaptado.
(ar) nos pulmões, e “infundir, incutir”.
No sentido 1, o sujeito é o receptor ou
a) Qual é a relação de sentido existente entre o beneficiário da ação; no sentido 2, ele é o
título “Mal traçadas” e o assunto do texto? agente responsável pela disseminação da
b) Sem alterar o sentido, reescreva o trecho saúde.
“conformado à marcha inelutável da moder- b) Aliviado, em “Respire aliviado”, pode ter
nidade tecnológica”, substituindo a palavra o significado de se estar livre dos males
“conformado” por um sinônimo e o adjeti- causados pelo fumo e tranquilo em rela-
vo “inelutável” pelo verbo lutar, fazendo as ção aos males que o fumo poderia causar
nos outros. O primeiro significado tem a
modificações necessárias.
ver com o físico, e o segundo tem a ver
Exemplo: “marcha inevitável da modernida-
com o moral.
de tecnológica” = marcha da modernidade
4. Os três vocábulos usados pelo autor para se
tecnológica que não se pode evitar.
referir a “taxista” são: “motorista”, “cho-
fer” e “outro”.

Gabarito 5.
a) A expressão essas mal traçadas linhas
tornou-se um clichê do universo episto-
lar em extinção já no Canadá. O título, de
certa forma, ironiza essa mudança que se
E.O. Teste I aponta e mais uma profissão familiar às
1. B 2. C 3. C 4. E 5. A pessoas que se vai substituída pela tecno-
logia.
b) Resignado à marcha da modernidade tec-
nológica contra a qual não se pode lutar...
E.O. Teste II
1. B 2. A 3. A 4. C 5. A

E.O. Teste III


1. E 2. A 3. B 4. D

74
Aulas 3 e 4 (Gramática)

Tempos e modos
Modos verbais
Os modos verbais traduzem a intencionalidade com que se emprega a forma verbal. São classificados em indica-
tivo (fato), subjuntivo (desejo, hipótese) e imperativo (ordem, apelo).
§ indicativo: apresenta o fato real, positivo, de maneira convicta.
Elas gostam de correr.
Você comprou aquele carro.
§ subjuntivo: apresenta um fato provável, desejável ou duvidoso.
Quando for o momento, talvez eu jogue.
Tomara eu aprenda gramática!
§ imperativo: manifesta uma ordem, conselho, súplica, exortação do emissor. Pode ser afirmativo ou negativo.
Se beber, não dirija!
Dorme, que já está na hora!

FORMAÇÃO DO IMPERATIVO
imperativo afirmativo presente do subjuntivo imperativo negativo
não existe primeira pessoa que eu ame não existe primeira pessoa
ama (tu) que tu ames não ames (tu)
ame (ele/ela/você) que ele/ela/você ame não ame (ele/ela/você)
amemos (nós) que nós amemos não amemos (nós)
amai (vós) que vós ameis não ameis (vós)
amem (eles/elas/vocês) que eles/elas/vocês amem não amem (eles/elas/vocês)

Tempos verbais
Quando lemos, falamos ou escrevemos, posicionamo-nos em um determinado tempo. No momento do enunciado,
os verbos ocorrem (presente), ocorreram (passados) ou ocorrerão (futuro), dependendo no modo verbal.

Tempos do modo indicativo


§ Presente § Pretérito perfeito
§ Indica processo no momento da fala: Faço mi- § Indica um processo, algo já realizado, concluí-
nhas escolhas. (atualmente, agora) do, terminado, sem necessidade de referência a
§ Indica processo habitual, constante, fato real, outra ação anterior nem contemporânea: João
verdade: Ela cumpre seus acordos. (ação habitual) saiu ontem./ Fiz as compras./ Cheguei.
§ Indica processo ocorrido antes da declaração
§ Indica processo ocorrido até o momento da
expressa pelo verbo: Em 1939, Hitler invadiu
declaração: Moro com meus colegas.
a Polônia.
§ Em narrativas históricas (presente histórico),
§ É frequente o emprego do pretérito perfeito
em lugar do pretérito perfeito: Colombo chega
composto – presente do indicativo do verbo au-
à América e, em 1492, conquista o Novo Mundo. xiliar ter ou haver e particípio do verbo principal:
§ Em acontecimento próximo no lugar do futuro: Eu tenho lido bastante.
Não posso almoçar contigo amanhã. § Indica ato habitual: Os alunos têm estudado muito.
§ Em expressões condicionais (se...), em lugar do § Indica fato ocorrido até o momento da declara-
subjuntivo: Se tudo corre bem, podemos viajar. ção: Tenho comprado muitos carros iguais a este.
77
§ Pretérito imperfeito § Forma polida de presente para denotar um de-
§ Indica um processo ocorrido anteriormente ao sejo: Eu precisaria namorar aquela moça.
momento da declaração, mas contemporâneo a § O futuro do pretérito composto expresso – ver-
outro fato passado: Eu ouvia samba, quando se bo auxiliar ter ou haver no futuro do pretérito e
deu o estouro./ Ele comia, quando da sua chegada. particípio do verbo principal: Eu teria dito (diria)
§ É empregado para indicar processo em desen- umas verdades a você!
volvimento: Eu dançava, quando ele entrou. § Indica fato que teria acontecido no passado
§ Indica processo em continuidade, habitual, mediante certa condição: Teria sido diferente se
constante, frequente: Eu residia nesta casa. eu a amasse. (Ciro dos Anjos)
§ Indica processo idealizado, não realizado: § Indica possibilidade de um fato passado: Teria
Pretendíamos ir à Bahia, mas o frio repentino sido melhor não escrever nada. (Ruben Braga)
não permitiu. § Indica incerteza sobre fatos passados em cer-
§ Como manifestação de cortesia, de polidez em tas frases interrogativas: Ele só teria falado ou
lugar do presente do indicativo ou do imperati- também...?
vo: Queria só um abraço. § Futuro (do presente)
§ Em lugar do futuro do pretérito do indicativo: § Indica a ação ainda não ocorrida, mas já decla-
Se ele pagasse, já estávamos (em vez de estarí- rada pelo verbo: Ora (direis) ouvir estrelas!/ E eu
amos) na França. vos direi: amai para entendê-las!
§ Pretérito mais-que-perfeito § Empregado para indicar um fato aproxima-

§ Indica uma ação passada, um fato concluído que do ou para enfatizar uma expressão: Na África,

aconteceu antes de outro fato (ambos no passado):


quantos não estarão mortos de fome!
§ Indica incerteza, probabilidade, dúvida, suposi-
O trem partira quando ele enfim chegou./ Ela esti-
ção: Há uma várzea em meu sonho, mas não sei
vera presente à toda reunião./ Ele dançara muito.
onde será. (Augusto Meyer)
§ Em construções exclamativas: Quem lhe dera
§ Indica fatos de realização provável: Vem, dizia
tê-la nos braços naquela tarde!
ele na última carta; se não vieres depressa, acha-
§ Em lugar do pretérito imperfeito do subjuntivo:
rás tua mãe morta. (Machado de Assis)
Nadou como se estivera (estivesse) à beira da morte.
§ Como forma polida, em vez do presente: Mas
§ É bastante frequente o emprego do mais-que-
como foi que aconteceram? E eu lhe direi: sei lá,
-perfeito composto – imperfeito do verbo auxiliar
aconteceram: eis tudo. (Drummond)
ter ou haver e particípio do verbo principal: Eu
§ É frequente o emprego do futuro do presente
tinha falado bastante./ Já havia ocorrido o pior.
composto – futuro do presente do verbo auxi-
§ Futuro do pretérito liar ter ou haver e particípio do verbo principal:
§ Exprime ação futura em relação ao passado, Quando você chegar, eu já terei ido.
ação que teria ocorrido em relação a um fato já § Indica ação futura a ser consumada antes
ocorrido no passado: Eu iria, se você chegasse de outra: Quando o guarda chegar, já teremos
a tempo. fugido.
§ Designa ações posteriores à época em que se § Indica possibilidade de um fato passado: Terá
fala: Ainda ficaria. Esperaria a noite. (Marques passado o fura dentro de oito dias cão? (Ciro
Rabelo) dos Anjos)
§ Designa incerteza, probabilidade, dúvida, su- § Indica certeza de uma ação futura: Se não vol-
posição sobre fatos passados: Seriam mais ou tarmos em algumas horas, teremos perdido a
menos dez horas quando chegaram. (Lobato) oportunidade.
78
Tempos do modo subjuntivo
§ Presente
§ Expressa hipótese, desejo, suposição, dúvida: Tomara que você tenha boas festas!/ Bons ventos o levem!
§ Pretérito imperfeito
§ É empregado nas orações subordinadas da oração principal, em que verbo esteja no pretérito imperfeito
do indicativo: Ela desejava que todos morressem./ Esperei que eles fizessem os trabalhos direito./ Apreciaria
que você me beijasse.
§ Pretérito mais-que-perfeito (composto)
§ Verbo auxiliar ter ou haver no pretérito imperfeito do subjuntivo seguido do particípio do verbo principal:
Imaginei que ele tivesse trazido a grana. (fato anterior a outro, ambos no passado)
§ Futuro simples
§ Designa fato provável, eventualidade futura: Quando ela vier, encontrará uma bagunça.
§ Futuro composto
§ Verbo auxiliar ter ou haver no futuro do subjuntivo, seguido do particípio do verbo principal. Designa fato
futuro como encerrado em relação a outro também no futuro: Só deixarei esta casa, quando ele tiver trazido
todos os meus pertences./ Quando eu tiver encontrado o vestido, avisarei a você.

Modo imperativo
Embora a palavra “imperativo” esteja ligada à ideia de comando, ordem, não é para comandar ou ordenar que,
na maioria das vezes, servimo-nos dele. O imperativo também é empregado para designar pedido, convite, con-
selho, súplica.
Faça isso agora, amor! (pedido)
Faça-nos uma visita! (convite)
Meu filho, faça sempre o melhor! (conselho)
Senhor, faça-nos esse milagre! (súplica)

79
E.O. Teste I I. No texto 1, são usadas duas frases nomi-
nais cuja disposição permite inferir que
a melhora da saúde é consequência da di-
1. (Ufsm) Diante do aumento de doenças re- minuição do consumo de sal.
lacionadas à alta ingestão de sódio, diver- II. No texto 2, as reticências, depois de “Es-
sas entidades têm lançado campanhas para colha”, servem para indicar uma inter-
redução do consumo de sal, veiculadas em rupção da frase e, antes de “a opção com
diferentes mídias, como exemplificam os menos sal”, sinalizam o complemento da
textos a seguir. frase interrompida.
TEXTO 1 III. No texto 2, o uso dos verbos “consumi-
mos”, “está” e “compramos” no modo
indicativo contribui para compor uma
informação que justifica o apelo à leitu-
ra do rótulo e à escolha de produtos com
menos sal.
Está(ão) correta(s):
a) apenas I.
b) apenas III.
c) apenas I e II.
d) apenas II e III.
e) I, II e III.

2. (Ufsm) Super-heróis ajudam crianças a acei-


tar quimioterapia
Hospital cria tratamento infantil com aces-
sórios da Liga da Justiça e oferece gibi sobre
a luta do Batman contra o câncer como ins-
piração a crianças com a doença.
TEXTO 2 Batman está com câncer, mas os vilões nem
tiveram tempo de comemorar a revelação
feita na edição extra da história em quadri-
nhos (HQ). Logo após o diagnóstico, o herói
mascarado já 3começou a receber uma 5“Su-
perfórmula” contra a doença e, apesar de ter
perdido cabelo e emagrecido um pouco, está
forte para voltara combater o mal.
Na vida real, todos os pacientes infantis aten-
didos no Centro de Referência AC.Camargo,
em São Paulo, também 4passaram a ter aces-
so ao tratamento que, no gibi, promete sal-
var a vida do homem-morcego.
Parceria firmada há 20 dias entre o
AC.Camargo, a Warner e a agência JWT trans-
formou o 6° andar da unidade hospitalar na
nova sede da Liga da Justiça. O QG de super-
-heróis instalado no hospital tem 15 vagas
ocupadas por heróis mirins que precisam de
uma ajudinha externa da medicina para vol-
tar à ativa. Natan Henrique Roseno, 7 anos,
e Porthos Martinez, 13, são os integrantes
mais recentes da ala infantil.
Após lerem 6a HQ com a trajetória vitoriosa
de Batman, os meninos estavam confiantes
de que a Superfórmula também 1vai ajudá-
-los a vencer a leucemia diagnosticada em
ambos. [...]
Os produtores desses textos escolheram di- Todos os quartos e acessórios utilizados no
ferentes recursos linguísticos para alertar os tratamento dos pacientes da oncologia pe-
leitores sobre o consumo de sal. Considere as diátrica receberam a adaptação em cores,
afirmativas acerca desses recursos: símbolos e adereços de personagens como
80
Mulher-Maravilha, Batman, Lanterna Verde Cantos espontâneos do coração, vibrações
e Superman. doridas da lira interna que agitava um so-
A chefe da 7oncologia pediátrica do nho, notas que o vento levou, – como isso
AC.Camargo, Cecília Maria de Lima da Costa, dou a lume essas harmonias.
explica que usar os adereços é uma fórmula de São as páginas despedaçadas de um livro
8
apresentar o câncer às crianças de uma ma- não lido...
neira lúdica e didática, já que elas precisam E agora que despi a minha musa saudosa dos
entender o tratamento para aceitá-lo melhor. véus do mistério do meu amor e da minha
“A quimioterapia tem efeitos colaterais que solidão, agora que ela vai seminua e tími-
não são agradáveis (como enjoos, apetite da por entre vós, derramar em vossas almas
desregulado, queda de cabelos). Se a crian- os últimos perfumes de seu coração, ó meus
ça não entende que o medicamento é um amigos, recebei-a no peito, e amai-a como
benefício, apesar de todos esses sintomas, o consolo que foi de uma alma esperançosa,
pode ficar confusa e resistente”, afirma a que depunha fé na poesia e no amor – esses
especialista. dois raios luminosos do coração de Deus.
Enxergar a vilã quimioterapia como a moci- AZEVEDO, Álvares de. Lira dos vinte anos. In:
nha Superfórmula 9faz toda a diferença para Obra completa. Organização de Alexei Bueno.
Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2000. p. 120.
os meninos e as meninas, dizem os próprios
heróis-mirins. [...] “Fica menos confuso na No prefácio, a cena enunciativa coloca o au-
cabeça da gente. Porque às vezes eu não gos- tor e o leitor em um mesmo tempo e espa-
to dos remédios, dá um nó no estômago. Mas ço. Quais elementos linguísticos contribuem
sei que eles 2vão me ajudar e saber disso aju- para esse efeito no diálogo?
da”, diz um dos garotos. a) As vozes em terceira pessoa e a palavra “pri-
ARANHA, Fernanda. Minha Saúde. iG São Paulo. mavera”.
Disponível em: <www.saude.ig.com.br/2013-06-06/
super-herois-ajudam-criancas-a-aceitar-quimioterapia.
b) Os enunciados negativos e o termo “lira”.
html> Acesso em: 06. jun. 2013. (adaptado). c) As orações adversativas e o substantivo
“poeta”.
Assinale verdadeira (V) ou falsa (F) nas afir- d) Os argumentos explicativos e o adjetivo
mativas a seguir. “pobre”.
( ) No título e subtítulo da notícia, o uso dos e) As frases imperativas e o advérbio “agora”.
verbos no presente do indicativo suge-
re que o tratamento criado pelo hospi- 4. (Ufsc) TEXTO I
tal AC.Camargo perdura no momento da Fora Leonardo algibebe em Lisboa, sua pá-
enunciação. tria; aborrecera-se porém do negócio, e vie-
( ) As expressões “vai ajudá-los” (ref. 1) e ra ao Brasil. Aqui chegando, não se sabe por
“vão me ajudar” (ref. 2) apresentam uma proteção de quem, alcançou o emprego de
estrutura gramatical frequente na lingua- que o 1vemos empossado, e que exercia [...]
gem Informal para indicar futuridade, o desde tempos remotos. Mas viera com ele no
que corresponderia, na norma-padrão, a “os mesmo navio, não sei fazer o quê, uma certa
ajudará” e “me ajudarão” respectivamente. Maria da hortaliça, quitandeira das praças de
( ) Os aspectos verbais de “começou a rece- Lisboa, saloia rechonchuda e bonitona. [...]
ber” (ref. 3) e “passaram a ter acesso” Ao sair do Tejo, estando a Maria encostada à
(ref. 4) indicam diferentes condições de borda do navio, o Leonardo fingiu que passa-
saúde em que se encontram o super-herói va distraído por junto dela, e com o ferrado
e as crianças com câncer internadas no sapatão assentou-lhe uma valente pisadela
AC.Camargo. no pé direito. A Maria, 2como se já esperasse
A sequência correta é: por aquilo, sorriu-se como envergonhada do
a) F – F – V. gracejo, e deu-lhe também em ar de disfar-
b) V – F – F. ce um tremendo beliscão nas costas da mão
c) F – V – F. esquerda. Era isto uma declaração em forma,
d) V – V – F. segundo os usos da terra: levaram o resto do
e) V – V – V. dia de namoro cerrado; ao anoitecer passou-
-se a mesma cena de pisadela e beliscão, com
3. (UFG) PREFÁCIO a diferença de serem desta vez um pouco
São os primeiros cantos de um pobre poe- mais fortes; e no dia seguinte 3estavam os
ta. Desculpai-os. As primeiras vozes do sabiá dois amantes tão extremosos e familiares,
não têm a doçura dos seus cânticos de amor. que pareciam sê-lo de muitos anos.
É uma lira, mas sem cordas; uma primavera, Quando saltaram em terra começou a Maria
mas sem flores; uma coroa de folhas, mas a sentir certos enojos: foram os dois morar
sem viço. juntos; e daí a um mês manifestaram-se
81
claramente os efeitos da pisadela e do belis- Saiu-se mal de tudo isso; porque, se tratava
cão; sete meses depois teve a Maria um filho, da cura de alguém, para si arranjava enfer-
formidável menino de quase três palmos de midade e bem grave.
comprido, gordo e vermelho, cabeludo, es- TAUNAY, A. d’E. Inocência. 3. ed. São
perneador e chorão; o qual, logo depois que Paulo: FTD, 1996. p. 57-58; 72.
nasceu, mamou duas horas seguidas sem lar-
Quanto aos fatos gramaticais, marque a(s)
gar o peito. E este nascimento é certamente
proposição(ões) CORRETA(S) relativamente
de tudo o que temos dito o que mais nos in-
aos textos acima.
teressa, porque o menino de quem falamos é
01) A forma verbal “vemos” (ref. 1), no presente
o herói desta história.
do indicativo, provoca um efeito de proximi-
ALMEIDA, M. A. Memórias de um Sargento de
Milícias. 3. ed. São Paulo: FTD, 1996. p. 16-17. dade entre o escritor e o leitor. É como se,
no ato da leitura, leitor e escritor estivessem
TEXTO II juntos a observar os eventos da história.
4
Mandara Pereira acender uma vela de sebo. 02) O uso do pretérito imperfeito do subjuntivo
Vinda a luz, aproximaram-se ambos do leito em “como se já esperasse por aquilo” (ref. 2)
da enferma que, achegando ao corpo e pu- confere ao evento um grau de certeza maior
xando para debaixo do queixo uma coberta do que se conseguiria com o uso do pretérito
de algodão de Minas, se encolheu toda, e imperfeito do indicativo – “como já esperava
voltou-se para os que entravam. por aquilo”.
– Está aqui o doutor, disse-lhe Pereira, que 04) Em “estavam os dois amantes tão extremosos
vem curar-te de vez. e familiares, que pareciam sê-lo de muitos
– Boas-noites, dona, saudou Cirino. anos” (ref. 3), a forma “sê-lo” é uma combi-
Tímida voz murmurou uma resposta, ao pas- nação do verbo ser com o pronome oblíquo
so que o jovem, no seu papel de médico, se átono “o”, o qual se refere a “amantes”.
sentava num escabelo junto à cama e tomava 08) No texto II, na descrição de Inocência (§ 6
o pulso à doente. e 7) o autor utiliza alguns verbos no preté-
Caía então luz de chapa sobre ela, iluminan- rito imperfeito (era, irradiava, parecia), os
do-lhe o rosto, parte do colo e da cabeça, co- quais poderiam ser conjugados no pretérito
berta por um lenço vermelho atado por trás perfeito (foi, irradiou, pareceu) sem que isso
da nuca. implicasse mudança de sentido.
Apesar de bastante descorada e um tanto ma- 16) A forma verbal “mandara” (ref. 4) corres-
gra, era Inocência de beleza deslumbrante. ponde à terceira pessoa do singular do pre-
Do seu rosto irradiava singela expressão térito mais-que-perfeito do indicativo do
de encantadora ingenuidade, realçada pela verbo mandar e equivale a tinha mandado.
meiguice do olhar sereno que, a custo, pare-
cia coar por entre os cílios sedosos a franjar- 5. (Ufrgs) Havia naquele cemitério uma sepul-
-lhe as pálpebras, e compridos a ponto de tura em torno _____ 4a imaginação popular
projetarem sombras nas mimosas faces. tecera lendas. Ficava ao lado da capela, perto
[...] dos grandes jazigos, e 8consistia numa lápide
Ligeiramente enrubesceu Inocência e des- cinzenta, com a inscrição já _____ apagada
cansou a cabeça no travesseiro. por baixo duma cruz em alto-relevo. Seus de-
– Por que amarrou esse lenço? perguntou em votos acreditavam que a alma cujo corpo ali
seguida o moço. jazia tinha o dom de obrar 5milagres como os
– Por nada, respondeu ela com acanhamento. de Santo Antônio. Floriano leu a inscrição:
– Sente dor de cabeça? Antônia Weber – Toni – 1895-1915. Talvez
– Nhor-não. ali estivesse o ponto de partida de seu pró-
– Tire-o, pois: convém não chamar o sangue; ximo romance...
solte, pelo contrário, os cabelos. Um jovem novelista visita o cemitério de
Inocência obedeceu e descobriu uma espes- sua terra e fica particularmente interessado
sa cabeleira, negra como o âmago da cabiú- numa sepultura singela a que a superstição
na e que em liberdade devia cair até abaixo popular 9atribui poderes milagrosos. Vem-
da cintura. Estava enrolado em bastas tran- -lhe então o desejo de, 6através da magia da
ças, que davam duas voltas inteiras ao redor ficção, trazer de volta à vida aquela morta
do cocoruto. obscura. 11Sai à procura de habitantes mais
[...] antigos e a eles pergunta: “Quem foi Antô-
Não se descuidou Cirino, antes de se retirar, nia Weber?” Alguns nada sabem. Outros con-
de novamente tomar o pulso e, à conta de tam o pouco de que 10se lembram. Um teuto-
procurar a artéria, assentou toda a mão no -brasileiro sessentão (Floriano já começava
punho da donzela, envolvendo-lhe o braço e a visualizar as personagens, a inventar a
apertando-o docemente. intriga), ao ouvir o nome da defunta, fica
82
perturbado e fecha-se num mutismo ressen- 6. (Fuvest) Todo o barbeiro é tagarela, e prin-
tido. 12“Aqui há drama”, diz o escritor para si cipalmente quando tem pouco que fazer;
próprio. 13E conclui: “Este homem talvez te- começou portanto a puxar conversa com o
nha amado Antônia Weber...”. Ao cabo de vá- freguês. Foi a sua salvação e fortuna.
rias tentativas, consegue arrancar dele 7uma O navio a que o marujo pertencia viajava
história fragmentada, cheia de reticências para a Costa e ocupava-se no comércio de
que, entretanto, o novelista vai preenchen- negros; era um dos combóis que traziam for-
do com trechos de depoimentos de terceiros. necimento para o Valongo, e estava pronto
Por fim, de posse de várias peças do quebra- a largar.
cabeça, põe-se a armá-lo e o resultado é o — Ó mestre! disse o marujo no meio da con-
romance duma tal Antônia Weber, natural de versa, você também não é sangrador?
Hannover e que emigrou com os pais para o — Sim, eu também sangro...
Brasil e estabeleceu-se em Santa Fé, onde... — Pois olhe, você estava bem bom, se quises-
Mas qual! – exclamou Floriano, parando se ir conosco... para curar 1a gente a bordo;
à sombra dum plátano e passando o lenço morre-se ali que é uma praga.
pela testa úmida. Ia cair de novo nos alça- — 2Homem, eu da cirurgia não entendo
pões que seu temperamento lhe armava. 14Os 3
muito...
críticos não negavam mérito a seus roman- — Pois já não disse que sabe também sangrar?
ces, mas afirmavam que em suas histórias — Sim...
_____ o cheiro do suor humano e da terra: — Então já sabe até demais.
achavam que, quanto à forma, eram tecnica- No dia seguinte 4saiu o nosso homem pela
mente bem escritas; quanto ao conteúdo, po- barra fora: a 6fortuna tinha-lhe dado o meio,
rém, tendiam mais para o artifício que para cumpria sabê-lo aproveitar; de oficial de
a arte, fugindo sempre ao drama essencial. barbeiro dava um salto mortal a médico de
Pouco lhe importaria o que outros pensas- navio negreiro; restava unicamente saber
sem se ele próprio não estivesse de acordo fazer render a nova posição. Isso ficou por
com essas restrições. Chegara à conclusão de sua conta.
que, embora a perícia não devesse ser me- Por um feliz acaso logo nos primeiros dias
nosprezada, para fazer bom vinho era neces- de viagem adoeceram dois marinheiros; cha-
sário antes de mais nada ter uvas, e uvas de mou-se o médico; ele fez tudo o que sabia...
boa qualidade. No caso do romance a uva era sangrou os doentes, e em pouco tempo esta-
o tema – o tema legítimo, isto é, algo que vam bons, perfeitos. Com isto ganhou imen-
o autor pelo menos tivesse sentido, se não sa reputação, e começou a ser estimado.
propriamente vivido. Chegaram com feliz viagem ao seu destino;
Adaptado de: VERISSIMO, Erico. O tempo e o vento: o retrato. tomaram o seu carregamento de gente, e vol-
v. 2. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. p. 331-333. taram para o Rio. Graças à 5lanceta do nos-
so homem, nem um só negro morreu, o que
Considere as três propostas de reescrita muito contribuiu para aumentar-lhe a sólida
de trechos do texto; as propostas envolvem reputação de entendedor do riscado.
transposição do presente histórico para o pre- Manuel Antônio de Almeida, Memórias
térito, e do discurso direto para o indireto. de um sargento de milícias.
I. Sai à procura de habitantes mais antigos
e a eles pergunta: “Quem foi Antônia We- Para expressar um fato que seria consequên-
ber?” (ref. 11) cia certa de outro, pode-se usar o pretérito
Saiu à procura de habitantes mais anti- imperfeito do indicativo em lugar do futuro
gos e a eles perguntou quem tinha sido do pretérito, como ocorre na seguinte frase:
Antônia Weber. a) “era um dos combóis que traziam forneci-
II. “Aqui há drama”, diz o escritor para si mento para o Valongo”.
próprio. (ref. 12) b) “você estava bem bom, se quisesse ir conos-
O escritor disse para si próprio que ali co”.
havia drama. c) “Pois já não disse que sabe também san-
III. E conclui: “Este homem talvez tenha grar?”.
amado Antônia Weber...”. (ref. 13) d) “de oficial de barbeiro dava um salto mortal
E concluiu que aquele homem talvez ame a médico de navio negreiro”.
Antônia Weber. e) “logo nos primeiros dias de viagem adoece-
Quais propostas estão corretas? ram dois marinheiros”.
a) Apenas I.
b) Apenas II. 7. (Mackenzie) A ameaça de uma bomba atô-
c) Apenas III. mica está mais viva do que nunca. Os confli-
d) Apenas I e II. tos 5étnicos mataram quase 200 chineses só
e) I, II e III. no mês de julho. Agora uma boa notícia: a
83
paz mundial pode estar a caminho. Segundo Numas volatas sonoras,
estimativas de pesquisadores, o mundo está o Azulão lhe respondeu:
bem menos sangrento do que já foi. Cerca “Caro Amigo! Eu prezo muito
de 250 mil pessoas morrem por ano em con- esta garganta sublime
sequência de algum conflito armado. É bem e esta voz maravilhosa...
menos do que no século 20, que teve 800 mil este dom que Deus me deu!
mortes anuais em sua 2ª metade e 3,8 mi-
lhões por ano até 1950. Quando, há pouco, eu descantava,
O que aconteceu? O psicólogo Steven Pinker pensando não ser ouvido
6
diz que o aumento do número de democra- nestes matos por ninguém,
cias ajudou. Assim como a nossa saúde1: como 2
um Sabiá*, que me escutava,
a expectativa de vida subiu, temos mais medo num capoeirão, escondido,
de 3arriscar o pescoço. 4Até a globalização te- gritou de lá: — meu colega,
ria contribuído2: um mundo mais integrado é bravos! Bravos... muito bem!
um mundo mais tolerante, diz Pinker.
Revista Superinteressante Pergunto agora a você:
quem foi um dia aplaudido
Os conflitos étnicos mataram quase 200 chi- pelo príncipe dos cantos
neses só no mês de julho. de celestes harmonias,
De acordo com a norma padrão, passando- (irmão de Gonçalves Dias,
-se essa frase para a voz passiva analítica, a um dos cantores mais ricos...)
forma verbal correspondente será: — que caso pode fazer
a) foram mortos. das vaias dos tico-ticos?”
b) estavam sendo mortos. * Nota do editor: Simbolicamente, Rui Barbosa está
c) eram mortos. representado neste Sabiá, pois foi a “Águia de Haia” um dos
d) matou-se. maiores admiradores de Catulo e prefaciador do seu livro
e) morreram. Poemas bravios.
Poemas escolhidos, s/d.

Na fala do papagaio, na referência 1, uma


E.O. Teste II das formas verbais não apresenta, como de-
veria, flexão correspondente à mesma pes-
1. (Unesp) Para responder à questão, leia o soa gramatical das demais. Trata-se de:
poema de Catulo da Paixão Cearense (1863- a) continuas.
1946). b) dize.
c) canta.
O AZULÃO E OS TICO-TICOS d) recebes.
e) estás.
Do começo ao fim do dia,
um belo Azulão cantava, TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES:
e o pomar que atento ouvia 4
À porta do Grande Hotel, pelas duas da
o seus trilos de harmonia, tarde, 14Chagas e Silva 6postava-se de pa-
cada vez mais se enflorava. lito à boca, como 19se tivesse descido do
restaurante lá de cima. Poderia parecer,
Se um tico-tico e outras aves pela estampa, que somente ali se comesse
vaiavam sua canção... bem em Porto Alegre. 8Longe 21disso! A Rua
mais doce ainda se ouvia da Praia que 23o diga, ou 22melhor, que o
a flauta desse Azulão. dissesse. 24O faz de conta do 7inefável per-
sonagem 5ligava-se mais à 25importância,
Um papagaio, surpreso à moldura que aquele portal lhe conferia.
de ver o grande desprezo, 15
Ele, que tanto marcou a rua, tinha 27fran-
do Azulão, que os desprezava, co acesso às poltronas do saguão em que
um dia em que ele cantava se refestelavam os importantes. Andava
e um bando de tico-ticos 28
dentro de um velho fraque, usava grava-
numa algazarra o vaiava, ta, chapéu, bengala sob o braço, barba cur-
lhe perguntou: 1“Azulão, ta, polainas e 10uns olhinhos apertados na
olha, dize-me a razão 1
__________ bronzeada. O charuto apagado
por que, quando estás cantando na boca, para durar bastante, 29era o 9toque
e recebes uma vaia final dessa composição de pardavasco vin-
desses garotos joviais, do das Alagoas.
tu continuas gorgeando Chagas e Silva chegou a Porto Alegre em
e cada vez canta mais?!” 1928. 16Fixou-20se na Rua da Praia, que
84
percorria com passos lentos, carregando um b) Ele, que tanto marcou a rua (ref. 15) - A rua,
ar de 12indecifrável importância, tão ao jeito que tanto foi marcada por ele
dos grandes de então. 17Os estudantes toma- c) Fixou-se na Rua da Praia (ref. 16) - Foi fixa-
ram conta dele. Improvisaram comícios na do na Rua da Praia
praça, carregando-o nos braços e 11fazendo-o d) Os estudantes tomaram conta dele (ref. 17)
discursar. Dava discretas mordidas 33e con- - Ele foi tomado conta pelos estudantes
sentia em que lhe pagassem o cafezinho. e) Essas casas punham ao alcance dos gourmets
Mandava imprimir sonetos, que “trocava” virtuosíssimos ‘’secos e molhados” (ref. 18) -
por dinheiro. Os gourmets eram postos ao alcance de virtu-
Não era de meu propósito 31ocupar-me do osíssimos “secos e molhados” por essas casas
“doutor” Chagas 34e, sim, de como se comia
bem na Rua da Praia de antigamente. Mas 4. (Ufrgs)
ele como que me puxou pela manga e levou- 1
Hoje os conhecimentos se estruturam de
-me a visitar casas por onde sua imaginação modo 3fragmentado, 4separado, 5compar-
de longe esvoaçava. timentado nas disciplinas. 8Essa situação
Porto Alegre, sortida por tradicionais arma- impede uma visão global, uma visão funda-
zéns de especialidades, 30dispunha da me- mental e uma visão complexa. 13”Complexi-
lhor matéria-prima para as casas de pasto. dade” vem da palavra latina complexus, que
18
Essas casas punham ao alcance dos gour- significa a compreensão dos elementos no
mets virtuosíssimos “secos e molhados” seu conjunto.
vindos de Portugal, da Itália, da França e da As disciplinas costumam excluir tudo o que
Alemanha. Daí um longo e 2__________ perí- se encontra fora do 9seu campo de especia-
odo de boa comida, para regalo dos homens lização. A literatura, no entanto, é uma área
de espírito e dos que eram mais estômago que se situa na inclusão de todas as dimen-
que outra coisa. sões humanas. Nada do humano 10lhe é es-
Na arte de comer bem, talvez a 26dificuldade tranho, 6estrangeiro.
fosse a da escolha. Para qualquer lado que A literatura e o teatro são desenvolvidos
o passante se virasse, encontraria salões or- como meios de expressão, meios de conhe-
namentados 3__________ maiores ou meno- cimento, meios de compreensão da 14com-
res, tabernas 35ou simples tascas. A Cidade plexidade humana. Assim, podemos ver o
32
divertia-se também 13pela barriga. primeiro modo de inclusão da literatura: a
Adaptado de: RUSCHEl, Nilo. Rua da Praia. Porto inclusão da 15complexidade humana. E va-
Alegre: Editora da Cidade, 2009. p. 110-111. mos ver ainda outras inclusões: a inclusão da
personalidade humana, a inclusão da subje-
tividade humana, e, também, muito impor-
2. (Ufrgs) Considere as afirmações abaixo, a
tante, a inclusão; do estrangeiro, do margi-
respeito dos tempos verbais utilizados no
nalizado, do infeliz, de todos que ignoramos
texto.
e desprezamos na vida cotidiana.
I. Os verbos era (ref. 29) e dispunha (ref. 30)
A inclusão da 16complexidade humana é ne-
estão conjugados no mesmo tempo e modo.
cessária porque recebemos uma visão mu-
II. Todos os verbos do primeiro parágrafo
tilada do humano. 11Essa visão, a de homo
estão conjugados no pretérito imperfeito
sapiens, é uma 17definição do homem pela
do indicativo, porque fazem referência a
razão; de homo faber20, do homem como tra-
rotinas e hábitos do passado.
balhador; de homo economicus21, movido por
III. Os verbos ocupar-me (ref. 31) e divertia-
lucros econômicos. Em resumo, trata-se de
-se (ref. 32) estão conjugados no modo
uma visão prosaica, mutilada, 12que esquece
subjuntivo.
o principal22: a relação do sapiens/demens,
Quais estão corretas?
da razão com a demência, com a loucura.
a) Apenas I.
Na literatura, encontra-se a inclusão dos pro-
b) Apenas II.
blemas humanos mais terríveis, coisas 18in-
c) Apenas III.
suportáveis que nela se tornam suportáveis.
d) Apenas I e II.
Harold Bloom escreve: 24”Todas as 25grandes
e) I, II e III.
obras revelam a universalidade humana
através de destinos singulares, de situações
3. (Ufrgs) Assinale a alternativa que apresenta singulares, de épocas singulares”. É essa a
a correta passagem de segmento do texto da razão por que as 19obras-primas atravessam
voz ativa para a voz passiva. 7
séculos, sociedades e nações.
a) Chagas e Silva postava-se de palito à boca 2
Agora chegamos à parte mais humana da in-
(ref. 14) - Chagas e Silva era postado de pa- clusão: a inclusão do outro para a compreen-
lito à boca são humana. A compreensão nos torna mais
85
generosos com relação ao outro23, e o crimi- A relação que o homem 8estabelece com o espaço
noso não é unicamente mais visto como cri- que ocupa é uma das mais importantes para sua
minoso, 26como o Raskolnikov de Dostoievsky, sobrevivência. As mudanças de comportamento
como o Padrinho de Copolla. social 15foram 21sempre precedidas de 22mudan-
A literatura, o teatro e o cinema são os melhores ças físicas de local. Por 23mais que a rua não
meios de compreensão e de inclusão do outro. seja um local para 7viver, já que se trata de um
Mas a compreensão se torna provisória, esque- ambiente público, de passagem e não de perma-
cemo-nos depois da leitura, da peça e do filme. nência, ela acaba sendo, 25senão única, a 24mais
Então essa compreensão é que deveria ser intro- viável opção. Alguns pensadores já apontam que
duzida e desenvolvida em nossa vida pessoal e a habitação 9é um ponto base e 10adquire uma
social, porque serviria para melhorar as relações importância para harmonizar a vida. O pensa-
humanas, para melhorar a vida social. dor Norberto Elias comenta que “o quarto de
Adaptado de: MORIN, Edgar. A inclusão: verdade dormir tornou-se uma das áreas mais privadas e
da literatura. In: RÕSING, Tânia et ai. Edgar Morin:
religando fronteiras. Passo Fundo: UPF, 2004. p.13-18
íntimas da vida humana. Suas paredes visíveis
e 37invisíveis vedam os aspectos mais ‘privados’,
Considere as seguintes afirmações, refe- ‘íntimos’, irrepreensivelmente ‘animais’ da nos-
rentes ao uso de tempos e modos verbais sa existência à vista de outras pessoas”.
no texto. O modo como essas pessoas 27constituem o
I. O emprego do presente na forma verbal único espaço que lhes foi permitido indi-
revelam (ref. 27) reforça o caráter gene- ca que conseguiram transformá-lo em “seu
ralizador da afirmação, já sinalizado pelo 20
lugar”, que aproximaram, cada um à sua
emprego de Todas (ref. 28). maneira, 16dois mundos nos quais estamos
II. Os usos de futuro do pretérito em deveria 32
inseridos: o público e o privado.
(ref. 29) e serviria (ref. 30) contribuem RODRIGUES, Robson. Moradores de uma terra
para mostrar que o autor conclui a argumen- sem dono. (fragmento adaptado) In: http://
tação com soluções possíveis e desejáveis. sociologiacienciaevida.uol.com.br/ESSO/edicoes/32/
artigo194186-4.asp. Acesso em 21/8/2014.
III. A presença no texto de verbos nos modos
indicativo e subjuntivo confere sentidos de Quanto ao emprego dos verbos no texto, NÃO
certeza e de possibilidade à argumentação. é correto afirmar que:
Quais estão corretas? a) “fazer” tem sentido diferente nas referên-
a) Apenas I.
cias 1 e 2.
b) Apenas II.
b) “dormindo” (ref. 3), “passando” (ref. 4) e
c) Apenas I e II.
“pedindo” (ref. 5) indicam ações não con-
d) Apenas I e III.
cluídas no presente.
e) I, II e III.
c) “viver” nas ocorrências marcadas pelas refe-
rências 6 e 7 tem valor de substantivo.
5. (PUC-RS) Responda à questão com base no d) “estabelece” (ref. 8) expressa uma realidade
texto.
permanente.
ENTRE O ESPAÇO PÚBLICO E O PRIVADO
e) “é” (ref. 9) e “adquire” (ref. 10) pertencem a
12
Excluídos da sociedade, os moradores de rua
orações sintaticamente paralelas.
26
ressignificam o único espaço 13que lhes foi
permitido ocupar, o espaço público, transfor-
mando-o em seu “lugar”, um espaço privado. 6. (Unesp) A questão toma por base uma mo-
11
Espalhados pelos ambientes coletivos da ci- dinha de Domingos Caldas Barbosa (1740-
dade, 1fazendo comida no asfalto, arrumando 1800).
suas camas, limpando as calçadas como se es- PROTESTOS A ARMINDA
tivessem dentro de uma casa: 17assim vivem
os moradores de rua. Ao andar pelas ruas de
1
Conheço muitas pastoras
São Paulo, vemos essas pessoas 3dormindo nas Que beleza e graça têm,
28
calçadas, 4passando por situações constrange- Mas é uma só que eu amo
doras, 5pedindo esmolas para sobreviver. Essa é Só Arminda e mais ninguém.
a realidade das pessoas que 2fazem da rua sua
casa e nela constroem sua 35intimidade. 18As- Revolvam meu coração
sim, a ideia de 33individualização que está nas 2
Procurem meu peito bem,
31
casas, na 34separação das coisas por 30cômodos Verão estar dentro dele
e quartos que servem para proteger a intimida- Só Arminda e mais ninguém.
de do indivíduo, 14ganha outro sentido. O 6viver De tantas, quantas belezas
nas 29ruas, um lugar 19aparentemente 36inabitá- Os meus ternos olhos veem,
vel, tem sua própria lógica de funcionamento, Nenhuma outra me agrada
que vai além das possibilidades. Só Arminda e mais ninguém.
86
Estes suspiros que eu solto Revolução exclusivamente à Declaração dos
3
Vão buscar meu doce bem, Direitos do Homem e do Cidadão, mas ela
É causa dos meus suspiros nasceu na violência e imprimiu seus princí-
Só Arminda e mais ninguém. pios em um mundo violento. Os conquistado-
res da Bastilha 24não se limitaram a destruir
Os segredos de meu peito 21
um símbolo do despotismo real. 4Entre eles,
Guardá-los nele convém, 15
0 foram mortos ou feridos no assalto à pri-
4
Guardá-los aonde os veja são e, quando os sobreviventes apanharam o
Só Arminda e mais ninguém. diretor, cortaram sua cabeça e desfilaram-na
por 25Paris 22na ponta de uma lança.
Não cuidem que a mim me importa Como podemos captar esses momentos de
5
Parecer às outras bem, loucura, quando tudo parecia possível e o
Basta que de mim se agrade mundo se afigurava como uma tábula rasa,
Só Arminda e mais ninguém. apagada por uma onda de comoção popular
e pronta para ser redesenhada? Parece in-
Não me alegra, ou me desgosta crível que um povo inteiro fosse capaz de se
Doutra o mimo, ou o desdém, levantar e transformar as condições da vida
Satisfaz-me e me contenta cotidiana. Duzentos anos de experiências
Só Arminda e mais ninguém. com admiráveis mundos 26novos tornaram-
-nos 15céticos quanto ao 10planejamento so-
Cantem os outros pastores cial. 27Retrospectivamente, a Revolução pode
Outras pastoras também, parecer um 23prelúdio ao 11totalitarismo.
Que eu canto e cantarei sempre Pode ser. Mas um excesso de visão 28histó-
Só Arminda e mais ninguém. rica retrospectiva pode distorcer o panora-
(Viola de Lereno, 1980) ma de 1789. Os revolucionários franceses
não eram nossos contemporâneos. E eram
Assinale a alternativa que indica duas estro-
um conjunto de pessoas não excepcionais
fes em que o termo “Arminda” surge como
em circunstâncias excepcionais. Quando as
paciente da ação expressa pelo verbo da ora-
coisas se 29desintegraram, eles reagiram
ção de que faz parte.
a uma necessidade imperiosa de dar-lhes
a) Primeira e terceira estrofes.
sentido, ordenando a sociedade segundo
b) Sétima e oitava estrofes.
novos princípios. Esses princípios ainda
c) Primeira e oitava estrofes.
permanecem como uma denúncia da tira-
d) Terceira e quarta estrofes.
e) Terceira e quinta estrofes.
nia e da injustiça. 5Afinal, em que estava
empenhada a Revolução Francesa? Liberda-
de, igualdade, fraternidade.
7. (Ufrgs) O que havia de tão revolucionário
Adaptado de: DARNTON, Robert. O beijo de Lamourette.
na Revolução Francesa? Soberania popular, In: ____. O beijo de Lamourette: mídia, cultura e
liberdade civil, igualdade perante a lei – revolução. São Paulo: Cia. das Letras, 2010. p. 30-39.
1
as palavras hoje são ditas com tanta facili-
dade que somos incapazes de imaginar seu Considere as seguintes afirmações acerca do
caráter explosivo em 1789. Para os fran- emprego de tempos verbais no texto.
ceses do Antigo Regime, 6os homens eram I. O emprego do pretérito imperfeito ao
8
desiguais, e a desigualdade era uma boa longo do primeiro parágrafo, a partir da
coisa, adequada à ordem hierárquica que referência 6, dá aos eventos narrados um
2
fora posta na natureza pela própria obra caráter de continuidade, estabelecendo
de Deus. A liberdade significava privilégio as características do Antigo Regime como
– isto é, literalmente, 12“lei privada”, uma um pano de fundo.
prerrogativa 13especial para fazer algo ne- II. O emprego do pretérito perfeito no se-
gado a outras pessoas. O rei, como fonte de gundo parágrafo representa o passado de
toda a lei, distribuía privilégios, 3pois ha- modo pontual.
via sido 19ungido como 16o agente de Deus III. O emprego do pretérito na forma subjun-
na terra. tiva que ocorre na referência 7 é exigido
Durante todo 17o século XVIII, os filósofos por sua relação com o futuro do pretérito
do Iluminismo questionaram esses 9pressu- do indicativo em Seria, na mesma linha.
postos, e os panfletistas profissionais conse- Quais estão corretas?
guiram 14empanar 20a aura sagrada da coroa. a) Apenas I.
Contudo, a desmontagem do quadro mental b) Apenas II.
do Antigo Regime demandou violência icono- c) Apenas III.
clasta, destruidora do mundo, revolucionária. d) Apenas I e III.
7
Seria ótimo se pudéssemos associar 18a e) I, II e III.
87
8. (Ufrn) A questão a seguir refere-se ao frag- foi ontem! Era fevereiro; eu vinha 21abomba-
mento de Capitães da Areia reproduzido abaixo. do da 18troteada.
O TRAPICHE 2O
lhe, ali, à sombra daquela mesma 16rebolei-
SOB A LUA, NUM VELHO TRAPICHE ABANDO- ra de mato que está nos vendo, desencilhei;
NADO, as crianças dormem. e estendido nos pelegos, a cabeça no lombi-
Antigamente aqui era o mar. Nas grandes e ne- lho, com o chapéu sobre os olhos, fiz uma
gras pedras dos alicerces do trapiche as ondas 13
sesteada morruda.
ora se rebentavam fragorosas, ora vinham se Despertando, ouvindo o ruído manso da
bater mansamente. A água passava por baixo água fresca rolando sobre o pedregulho, tive
da ponte sob a qual muitas crianças repousam ganas de me banhar; até para quebrar a lom-
agora, iluminadas por uma réstia amarela de beira... E fui-me à água que nem 22capincho!
lua. Desta ponte saíram inúmeros veleiros car- 3
Depois, daquela 19vereda andei como 10três
regados, alguns eram enormes e pintados de léguas, chegando à estância cedo, obra assim
estranhas cores, para a aventura das travessias de braça e meia de sol.
marítimas. Aqui vinham encher os porões e 4
Ah! Esqueci de 25dizer-lhe que andava comi-
atracavam nesta ponte de tábuas, hoje comidas. go um cachorrinho brasino, um cusco muito
Antigamente diante do trapiche se estendia o esperto e boa vigia. Era das crianças, mas
mistério do mar oceano, as noites diante dele às vezes 26dava-lhe para acompanhar-me, e
eram de um verde escuro, quase negras, daque- depois de sair da 11porteira, nem por nada
la cor misteriosa que é a cor do mar à noite. fazia 27caravolta, a não ser comigo.
Hoje a noite é alva em frente ao trapiche. É Durante a troteada reparei que volta e meia
que na sua frente se estende agora o areal do o cusco parava na estrada e latia, e troteava
cais do porto. Por baixo da ponte não há mais sobre o 17rastro − parecia que estava me cha-
rumor de ondas. A areia invadiu tudo, fez o mando! Mas como eu não ia, ele tomava a
mar recuar de muitos metros. Aos poucos, alcançar-me, e logo recomeçava...
lentamente, a areia foi conquistando a frente Pois nem lhe conto! Quando botei o pé em
do trapiche. Não mais atracaram na sua pon- terra na 20estância e já 8dava as boas tardes
te os veleiros que iam partir carregados. Não ao dono da casa, aguentei um tirão seco no
mais trabalharam ali os negros musculosos coração... não senti o peso da guaiaca! Tinha
que vieram da escravatura. Não mais cantou perdido as trezentas onças de ouro.
na velha ponte uma canção um marinheiro E logo passou-me pelos olhos um darão de
nostálgico. A areia se estendeu muito alva cegar, depois uns 14coriscos... depois tudo fi-
em frente ao trapiche. E nunca mais enche- cou cinzento... 29De meio assombrado me fui
ram de fardos, de sacos, de caixões, o imenso repondo quando ouvi que indagavam:
casarão. Ficou abandonado em meio ao areal, − Então, patrício? Está doente?
mancha negra na brancura do cais. − 5Não senhor, não é doença; é que sucedeu-
AMADO, Jorge. Capitães da Areia. São Paulo: -me uma 28desgraça; perdi uma dinheirama
Companhia das Letras, 2009. p. 25. do meu patrão...
Em relação aos tempos verbais presentes no
23
− A la fresca!
fragmento, o narrador emprega − É verdade... antes morresse que isso!
a) o pretérito perfeito e o presente, tempos bá- Nisto o cusco brasino deu uns pulos ao fo-
sicos da narração, para simular a presença do cinho do cavalo, como querendo lambê-lo,
leitor na realidade degradante do trapiche. e logo correu para a estrada, aos latidos. E
b) o pretérito imperfeito e o presente nos tre- olhava-me, e vinha e ia, e tornava a latir...
Adaptado de Simões Lopes Neto. Trezentas onças. In:
chos narrativos, para construir uma imagem
BETANCUR, P. (Org.). Obra completa de Simões Lopes
decadente do trapiche. Neto. Porto Alegre: Sulina, 2003. p. 307-308.
c) o pretérito perfeito e o presente, tempos bá-
sicos da descrição, para relatar o processo Assinale a alternativa que fornece apenas
contínuo, do passado até o presente, de in- substituições corretas e contextualmente equi-
vasão da areia no trapiche. valentes às formas verbais viajava (ref. 6), de-
d) o pretérito imperfeito e o presente nos tre- via (ref. 7) e dava (ref. 8), respectivamente.
chos descritivos, para construir duas ima- a) tinha viajado – planejava – ia dando
gens do trapiche contrastantes entre si. b) estava viajando – planejava – ia dando
c) estava viajando – ia – tinha dado
9. (Ufrgs) d) tinha viajado – ia – tinha dado
1
Eu troteava, nesse tempo. De uma feita que e) tinha viajado – ia – ia dando
6
viajava de escoteiro, com a 9guaiaca 12em-
panzinada de 15onças de ouro, vim varar aqui 10. (FGV) “Se queres ser bom juiz, ouve o que
neste mesmo passo, 24por me ficar mais per- cada um diz.” Esse provérbio popular vem
to da estância onde 7devia pousar. Parece que enunciado na 2ª pessoa do singular. Se o
88
transferirmos para a forma de tratamento [Palha] — De Vassouras? Não; viemos aqui
você, mais familiar a muitos paulistas, a so- passar uma semana. Moro mesmo na Corte.
lução que atende à norma culta será a apre- Não teria jeito para lavrador, 2conquanto
sentada na alternativa: ache que é uma posição boa e honrada.
a) Se quiseres ser bom juiz, ouvi o que cada Da lavoura passaram ao gado, à escrava-
um diz. tura e à política. Cristiano Palha maldis-
b) Se quiser ser bom juiz, ouve o que cada se o governo, que introduzira na fala do
um diz. trono uma palavra relativa à propriedade
c) Se quereis ser bons juízes, ouvi o que cada servil; mas, com grande espanto seu, Ru-
um diz. bião não acudiu à indignação. Era plano
d) Se queres ser bom juiz, ouça o que cada deste vender os escravos que o testador
um diz. lhe deixara, exceto um pajem; se alguma
e) Se quer ser bom juiz, ouça o que cada coisa perdesse, o resto da herança cobri-
um diz. ria o desfalque. Demais, a fala do trono,
que ele também lera, mandava respeitar
a propriedade atual. Que lhe importavam
E.O. Teste III escravos futuros, se os não compraria? O
pajem ia ser forro, logo que ele entrasse
1. (UFU) Assinale a alternativa cujo termo su- na posse dos bens. Palha desconversou, e
blinhado exprime um fato que NÃO pertence passou à política, às câmaras, à guerra do
a um tempo determinado. Paraguai, tudo assuntos gerais, ao que Ru-
a) Em 2014, uma tendência se consolidou: bião atendia, mais ou menos. Sofia escu-
produtos digitais estão cada vez mais sen- tava apenas; movia tão somente os olhos,
do vendidos do mesmo jeito que a maioria que sabia bonitos, fitando-os ora no mari-
das churrascarias serve carne: em sistemas
do, ora no interlocutor.
de rodízio. Mas isso não quer dizer que o
— Vai ficar na Corte 3ou volta para Barbace-
modelo esteja decidido. (Superinteressante,
na? perguntou o Palha no fim de vinte minu-
tos de conversação.
ed. 34, fev. 2015, p. 20)
— 4Meu desejo é ficar, e fico mesmo, acudiu
b) As inovações dão fôlego à civilização: quan-
Rubião; estou cansado da província; 5quero
do um novo passo da ciência origina um
gozar a vida. Pode ser até que vá à Europa,
produto disruptor, surgem mercados que ali-
mas não sei ainda.
mentam a economia. (Veja, 3 dez. 2014)
Os olhos do Palha brilharam instantanea-
c) Especialistas têm desenvolvido treinos que
mente.
ajudam a restaurar o equilíbrio. A reabilita-
Machado de Assis, Quincas Borba.
ção vestibular, por exemplo, envolve ativi-
dades para os olhos e a cabeça que buscam Empregou-se o presente com ideia de futuro
estimular o cérebro a lidar com sinais distor- no seguinte excerto do texto:
cidos que vêm da orelha interna. (Mente e a) “ela ia entre vinte e sete e vinte e oito” (ref. 1).
Cérebro, Ano XXI, No 265, p.31) b) “conquanto ache” (ref. 2).
d) A busca por inovar, uma capacidade (até c) “ou volta para Barbacena” (ref. 3).
onde se sabe) exclusiva do Homo sapiens, d) “Meu desejo é ficar” (ref. 4).
é o motor das engrenagens da civilização. e) “quero gozar a vida” (ref. 5).
Inovações, sempre nascidas para solucio-
nar necessidades pulsantes da humanidade,
3. (Ufrgs) Assinale a alternativa que contém a
levam a transformações definitivas no modo
correta passagem de um segmento que ocor-
como produzimos e dão início a mudanças
re em voz passiva no texto para a voz ativa.
profundas nas relações humanas. (Veja, 3
a) dizemos as palavras hoje com tanta facilida-
dez. 2014)
de... (ref. 1)
b) que a própria obra de Deus pusera na natu-
reza. (ref. 2)
2. (FGV) CAPÍTULO XXI c) pois o agente de Deus na terra o ungira. (ref. 3)
Na estação de Vassouras, entraram no trem d) Entre eles, 150 feriram-se ou mataram-se no
Sofia e o marido, Cristiano de Almeida e assalto à prisão... (ref. 4)
Palha. Este era um rapagão de trinta e dois e) Afinal, em que se empenhou a Revolução
anos; 1ela ia entre vinte e sete e vinte e oito. Francesa? (ref. 5)
Vieram sentar-se nos dois bancos fronteiros
ao do Rubião [...]. 4. (Unesp) A questão a seguir toma por base
[Rubião] — O senhor é lavrador? uma passagem do romance regionalista Vi-
[Palha] — Não, senhor. das secas, de Graciliano Ramos (1892-1953).
[Rubião] — Mora na cidade? CONTAS
89
Fabiano recebia na partilha a quarta parte conhecia o seu lugar. Um cabra. Ia lá puxar
dos bezerros e a terça dos cabritos. Mas como questão com gente rica? Bruto, sim senhor,
não tinha roça e apenas se limitava a semear mas sabia respeitar os homens. Devia ser
na vazante uns punhados de feijão e milho, ignorância da mulher, provavelmente devia
comia da feira, desfazia-se dos animais, não ser ignorância da mulher. Até estranhara as
chegava a ferrar um bezerro ou assinar a contas dela. Enfim, como não sabia ler (um
orelha de um cabrito. bruto, sim senhor), acreditara na sua velha.
Se pudesse economizar durante alguns me- Mas pedia desculpa e jurava não cair noutra.
ses, levantaria a cabeça. Forjara planos. Toli- (Graciliano Ramos. Vidas secas. São Paulo:
ce, quem é do chão não se trepa. Consumidos Livraria Martins Editora, 1974.)
os legumes, roídas as espigas de milho, re-
corria à gaveta do amo, cedia por preço baixo No fragmento apresentado, de Vidas secas,
o produto das sortes. as formas verbais mais frequentes se enqua-
Resmungava, rezingava, numa aflição, ten- dram em dois tempos do modo indicativo.
tando espichar os recursos minguados, en- Marque a alternativa que indica, pela or-
gasgava-se, engolia em seco. Transigindo dem, o tempo verbal predominante no se-
com outro, não seria roubado tão descarada- gundo parágrafo e o que predomina no
mente. Mas receava ser expulso da fazenda. quinto parágrafo.
E rendia-se. Aceitava o cobre e ouvia conse- a) pretérito perfeito – pretérito imperfeito.
lhos. Era bom pensar no futuro, criar juízo. b) presente – pretérito imperfeito.
Ficava de boca aberta, vermelho, o pescoço c) presente – pretérito perfeito.
inchando. De repende estourava: d) futuro do pretérito – presente.
– Conversa. Dinheiro anda num cavalo e nin- e) pretérito imperfeito – pretérito perfeito.
guém pode viver sem comer. Quem é do chão
não se trepa. 5. (Unifesp)
Pouco a pouco o ferro do proprietário quei- [Sem-Pernas] queria alegria, uma mão que o
mava os bichos de Fabiano. E quando não acarinhasse, alguém que com muito amor o
tinha mais nada para vender, o sertanejo fizesse esquecer o defeito físico e os muitos
endividava-se. Ao chegar a partilha, estava anos (talvez tivessem sido apenas meses ou
encalacrado, e na hora das contas davam-lhe semanas, mas para ele seriam sempre longos
uma ninharia. anos) que vivera sozinho nas ruas da cidade,
Ora, daquela vez, como das outras, Fabiano hostilizado pelos homens que passavam, em-
ajustou o gado, arrependeu-se, enfim deixou purrado pelos guardas, surrado pelos mole-
a transação meio apalavrada e foi consultar ques maiores. Nunca tivera família. Vivera na
a mulher. Sinha Vitória mandou os meni- casa de um padeiro a quem chamava “meu pa-
nos para o barreiro, sentou-se na cozinha, drinho” e que o surrava. Fugiu logo que pôde
concentrou-se, distribuiu no chão sementes compreender que a fuga o libertaria. Sofreu
de várias espécies, realizou somas e dimi- fome, um dia levaram-no preso. Ele quer um
nuições. No dia seguinte Fabiano voltou à carinho, u’a mão que passe sobre os seus olhos
cidade, mas ao fechar o negócio notou que e faça com que ele possa se esquecer daquela
as operações de Sinha Vitória, como de cos- noite na cadeia, quando os soldados bêbados
tume, diferiam das do patrão. Reclamou e o fizeram correr com sua perna coxa em volta
obteve a explicação habitual: a diferença era de uma saleta. Em cada canto estava um com
proveniente de juros. uma borracha comprida. As marcas que fica-
Não se conformou: devia haver engano. Ele ram nas suas costas desapareceram. Mas de
era bruto, sim senhor, via-se perfeitamen- dentro dele nunca desapareceu a dor daquela
te que era bruto, mas a mulher tinha miolo. hora. Corria na saleta como um animal perse-
Com certeza havia um erro no papel do bran- guido por outros mais fortes. A perna coxa se
co. Não se descobriu o erro, e Fabiano perdeu recusava a ajudá-lo. E a borracha zunia nas
os estribos. Passar a vida inteira assim no suas costas quando o cansaço o fazia parar.
toco, entregando o que era dele de mão bei- A princípio chorou muito, depois, não sabe
jada! Estava direito aquilo? Trabalhar como como, as lágrimas secaram. Certa hora não
negro e nunca arranjar carta de alforria! resistiu mais, abateu-se no chão. Sangrava.
O patrão zangou-se, repeliu a insolência, Ainda hoje ouve como os soldados riam e
achou bom que, o vaqueiro fosse procurar como riu aquele homem de colete cinzento
serviço noutra fazenda. que fumava um charuto.
Aí Fabiano baixou a pancada e amunhecou. (Jorge Amado. Capitães da areia.)
Bem, bem.
Não era preciso barulho não. Se havia dito O zigue-zague temporal ligado à vida de
palavra à toa, pedia desculpa. Era bruto, Sem-Pernas, empregado no fragmento para
não fora ensinado. Atrevimento não tinha, a composição da personagem, é construído
90
de maneira muito precisa, por meio da utili- a racionalidade instrumental e habilitem o
zação alternada de diversos tempos verbais. sujeito frente às possibilidades da compe-
Indique a alternativa em que há, respectiva- tência comunicativa” (referência 1)
mente, um tempo verbal que expressa fatos b) Com relação à frase abaixo, faça o que é pe-
ocorridos num tempo anterior a outros fatos dido a seguir.
do passado e um tempo verbal usado para “A escola deve assumir o compromisso com o
marcar o caráter hipotético de certas ações desenvolvimento das estruturas mentais do
ou o desejo de que se realizassem. sujeito para que ele seja capaz de operar em
a) Vivera na casa de um padeiro (...) – uma níveis de abstração elevada.”
mão que o acarinhasse (...) I. Determine o valor semântico do verbo auxi-
b) Em cada canto estava um com uma borracha liar dever na locução “deve assumir”.
comprida. – Sofreu fome. II. Indique um outro verbo auxiliar que man-
c) Nunca tivera família. – A perna coxa se recu- tenha o mesmo sentido da expressão subli-
sava a ajudá-lo. nhada e que forme uma locução verbal com
d) A princípio chorou muito (...) – Mas de o verbo operar:
dentro dele nunca desapareceu a dor da-
quela hora. 2. (Unesp) A questão toma por base um trecho
e) Ele quer um carinho (...) – Um dia levaram- da conferência “Sobre algumas lendas do
-no preso. Brasil”, de Olavo Bilac (1865-1918), e um
soneto do mesmo autor, utilizado por ele
para ilustrar seus argumentos.
E.O. Dissertativo Sendo cada homem todo o universo, tem
dentro de si todos os deuses, todas as po-
1. (PUC-RJ) A tarefa de desenvolver as ca- testades superiores e inferiores que dirigem
pacidades intelectuais e morais do sujeito o universo. (Tudo, se existe objetivamente,
universal, como condição de aprimoramento é porque existe subjetivamente; tudo existe
da personalidade do indivíduo, juntamen- em nós, porque tudo é criado e alimentado
te com a inserção social e a reprodução dos por nós). E esta consideração nos leva ao as-
conteúdos culturais da tradição, formam o sunto e à explanação do meu tema. Existem
esteio da intencionalidade educativa mo- em nós todas as entidades fantásticas, que,
derna. A escola deve assumir o compromisso segundo a crença popular, enchem a nossa
com o desenvolvimento das estruturas men- terra: são sentimentos humanos, que, sain-
tais do sujeito para que ele seja capaz de do de cada um de nós, personalizam-se, e
operar em níveis de abstração elevada. 1Essa começam a viver na vida exterior, como mi-
é uma condição necessária para que os pro- tos da comunhão.
cessos de tomada de consciência superem Tupã, demiurgo criador, e o seu Anhangá,
a racionalidade instrumental e habilitem o demiurgo destruidor. É o eterno dualismo,
sujeito frente às possibilidades da compe- governando todas as fases religiosas, toda
tência comunicativa. a história mitológica da humanidade. Já
Cabe à escola favorecer uma aprendizagem entre os persas e os iranianos, na religião
crítica do conhecimento científico, promo- de Zoroastro, havia um deus de bondade,
ver a discursividade dos alunos e a discus- Ormuz, e um deus de maldade, Ahriman. A
são pública das formas de racionalidade religião de Manés, na Babilônia, não criou
subjacentes aos processos escolares. [...] A a ideia do dualismo; acentuou-a, precisou-
construção de uma razão que se descentra é -a; a base da religião dos maniqueus era
condição necessária para que o sujeito reco- a oposição e o contraste da luz e da tre-
nheça outras razões e seja capaz de agir com va: o mundo visível, segundo eles, era o
competência no discurso argumentativo, resultado da mistura desses dois elemen-
fundamental para a racionalidade comunica- tos eternamente inimigos. Mas em todos
tiva que opera nas bases de um pensamento os grandes povos, e em todas as pequenas
refletido, tornando conscientes os seus es- tribos, sempre houve, em todos os tempos,
quemas de ação. a concepção desse conflito: e esse conflito
Texto adaptado de LIMA, João Francisco Lopes perdura no catolicismo, fixado na concep-
de. A reconstrução da tarefa educativa: uma
ção de Deus e do Diabo. Os nossos índios
alternativa para a crise e a desesperança. Porto
Alegre: Editora Mediação, 2003, p. 103. sempre tiveram seu Tupã e o seu Anhan-
gá... Ora, o selvagem das margens do Ama-
a) Reescreva o trecho a seguir sem a palavra zonas, do São Francisco e do Paraná com-
“que”. Faça as modificações necessárias. preende os dois demiurgos, porque os sente
“Essa é uma condição necessária para que os dentro de si mesmo. E nós, os civilizados
processos de tomada de consciência superem do litoral, compreendemos e contemos em
91
nós esses dois princípios antagônicos, Deus cãozinho doente, com todo o corpo feri-
e o Diabo. Cada um de vós tem uma arena do; gastas, as mechas brancas do pelo; o
íntima em que a todo o instante combatem olhar dorido e profundo, com esse lustro
um gênio do bem e um gênio do mal: de lágrima que há nos olhos das pessoas
muito idosas. Com um grande esforço aca-
Não és bom, nem és mau: és triste e humano... ba de levantar-se. Eu não lhe digo nada;
Vives ansiando em maldições e preces, não faço nenhum gesto. Envergonha-me
Como se, a arder, no coração tivesses haver interrompido o seu sono. Se ele es-
O tumulto e o clamor de um largo oceano. tava feliz ali, eu não devia ter chegado. Já
que lhe faltavam tantas coisas, que ao me-
Pobre, no bem como no mal, padeces; nos dormisse: também os animais devem
E, rolando num vórtice vesano*, esquecer, enquanto dormem...
Oscilas entre a crença e o desengano, Ele, porém, levantava-se e olhava-me.
Entre esperanças e desinteresses. Levantava-se com a dificuldade dos enfer-
mos graves: acomodando as patas da fren-
Capaz de horrores e de ações sublimes, te, o resto do corpo, sempre com os olhos
Não ficas das virtudes satisfeito, em mim, como à espera de uma palavra ou
Nem te arrependes, infeliz, dos crimes: de um gesto. Mas eu não o queria vexar
nem oprimir. Gostaria de ocupar-me dele:
E, no perpétuo ideal que te devora, chamar alguém, pedir-lhe que o examinas-
Residem juntamente no teu peito
se, que receitasse, encaminhá-lo para um
Um demônio que ruge e um deus que chora...
tratamento... Mas tudo é longe, meu Deus,
* Vesano: louco, demente, delirante, insensato.
(Últimas conferências e discursos, 1927.)
tudo é tão longe. E era preciso passar. E
ele estava na minha frente inábil, como
E nós, os civilizados do litoral, compreende- envergonhado de se achar tão sujo e doen-
mos e contemos em nós esses dois princípios te, com o envelhecido olhar numa espécie
[...]. de súplica.
Qual a forma infinitiva do verbo destacado e Até o fim da vida guardarei seu olhar no
em que tempo e modo está flexionado? meu coração. Até o fim da vida sentirei
esta humana infelicidade de nem sempre
3. (Fuvest) Leia este aviso, comum em vários poder socorrer, neste complexo mundo
lugares públicos: dos homens.
Então, o triste cãozinho reuniu todas as
suas forças, atravessou o patamar, sem ne-
nhuma dúvida sobre o caminho, como se
fosse um visitante habitual, e começou a
descer as escadas e as suas rampas, com as
plantas em flor de cada lado, as borbole-
tas incertas, salpicos de luz no granito, até
o limiar da entrada. Passou por entre as
grades do portão, prosseguiu para o lado
a) As pessoas que não gostam de ser filmadas esquerdo, desapareceu.
prefeririam uma mensagem que dissesse o Ele ia descendo como um velhinho andrajoso,
contrário. Para atender a essas pessoas, re- esfarrapado, de cabeça baixa, sem firmeza e
escreva o aviso, usando a primeira pessoa do sem destino. Era, no entanto, uma forma de
plural e fazendo as modificações necessárias. vida. Uma criatura deste mundo de criaturas
b) Criou-se, recentemente, a palavra “gerun- inumeráveis. Esteve ao meu alcance; talvez
dismo”, para designar o uso abusivo do ge- tivesse fome e sede; e eu nada fiz por ele;
rúndio. Na sua opinião, esse tipo de desvio amei-o, apenas, com uma caridade inútil,
ocorre no aviso acima? Explique. sem qualquer expressão concreta. Deixei-
-o partir, assim humilhado, e tão digno, no
4. (UFC) UM CÃO, APENAS entanto, como alguém que respeitosamente
Subidos, de ânimo leve e descansado pas- pede desculpas de ter ocupado um lugar que
so, os quarenta degraus do jardim − plan- não era seu.
tas em flor de cada lado; borboletas incer- Depois pensei que nós todos somos, um dia,
tas; salpicos de luz no granito −, eis-me no esse cãozinho triste, à sombra de uma porta.
patamar. E a meus pés, no áspero capacho E há o dono da casa, e a escada que desce-
de coco, à frescura da cal do pórtico, um mos, e a dignidade final da solidão.
cãozinho triste interrompe o seu sono, (MEIRELES, Cecília. ILUSÕES DO MUNDO: CRÔNICAS.
levanta a cabeça e fita-me. É um triste Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982, p. 16-17)

92
Cecília Meireles escreveu: “Eu não lhe DIGO É sempre no meu trato o amplo distrato.
nada...” (1o parágrafo) Sempre na minha firma a antiga fúria.
a) Acrescentando apenas um prefixo ao verbo Sempre no mesmo engano outro retrato.
em maiúsculo na frase anterior, forme ou-
tros cinco verbos que lhe sejam cognatos.
b) Escolha QUATRO destes verbos e escreva uma É sempre nos meus pulos o limite.
frase com cada um dos escolhidos, observan- É sempre nos meus lábios a estampilha.
do a conjugação adequada. É sempre no meu não aquele trauma.

5. (Unesp) APELO Sempre no meu amor a noite rompe.


Amanhã faz um mês que a Senhora está
Sempre dentro de mim meu inimigo.
longe de casa. Primeiros dias, para dizer a
verdade, não senti falta, bom chegar tarde, E sempre no meu sempre a mesma ausência.
esquecido na conversa de esquina. Não foi (ANDRADE, Carlos Drummond de. OBRAS COMPLETAS.
ausência por uma semana: o batom ainda no Rio de Janeiro, Aguilar, 1967, p. 81)
lenço, o prato na mesa por engano, a ima-
gem de relance no espelho. Os três primeiros versos instauram uma re-
Com os dias, Senhora, o leite primeira vez lação entre passado/presente/futuro, sendo
coalhou. A notícia de sua perda veio aos que a ideia de “presente” é retomada no res-
poucos: a pilha de jornais ali no chão, nin- tante do poema. Analise a primeira relação e
guém os guardou debaixo da escada. Toda mostre como a ideia de presente permanece
a casa era um corredor deserto, e até o ca-
nas demais estrofes.
nário ficou mudo. Para não dar parte de
fraco, ah, Senhora, fui beber com os ami-
gos. Uma hora da noite eles se iam e eu
ficava só, sem o perdão de sua presença e E.O. Enem
todas as aflições do dia, como a última luz
na varanda. 1. (Enem) Em junho de 1913, embarquei para
E comecei a sentir falta das pequenas brigas a Europa a fim de me tratar num sanatório
por causa do tempero na salada − o meu jeito
suíço. Escolhi o de Clavadel, perto de Davos-
de querer bem. Acaso é saudade, Senhora?
Às suas violetas, na janela, não lhes poupei -Platz, porque a respeito dele me falara João
água e elas murcham. Não tenho botão na Luso, que ali passara um inverno com a se-
camisa, calço a meia furada. Que fim levou o nhora. Mais tarde vim a saber que antes de
saca-rolhas? Nenhum de nós sabe, sem a Se- existir no lugar um sanatório, lá estivera por
nhora, conversar com os outros: bocas raivo-
algum tempo Antônio Nobre. “Ao cair das fo-
sas mastigando. Venha para casa, Senhora,
por favor. lhas”, um de seus mais belos sonetos, talvez
(TREVISAN, Dalton. “II - Os Mistérios de o meu predileto, está datado de “Clavadel,
Coritiba”, In: OS DESASTRES DO AMOR - Rio outubro, 1895”. Fiquei na Suíça até outubro
de Janeiro, Civilização Brasileira, 1968)
de 1914.
“As suas violetas, na janela, não lhes poupei BANDEIRA, M. Poesia completa e prosa.
água e elas murcham.” Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1985.
Observando o período acima, responda:
a) Que tipo de relação se estabelece entre as No relato de memórias do autor, entre os
duas orações através da conjunção “E”? recursos usados para organizar a sequência
b) Como pode ser justificado o emprego do dos eventos narrados, destaca-se a:
segundo verbo do período no presente, en-
a) construção de frases curtas a fim de conferir
quanto o primeiro apresenta-se no pretérito?
dinamicidade ao texto.
b) presença de advérbios de lugar para indicar
6. (Unesp) O ENTERRADO VIVO a progressão dos fatos.
É sempre no passado aquele orgasmo, c) alternância de tempos do pretérito para or-
é sempre no presente aquele duplo, denar os acontecimentos.
é sempre no futuro aquele pânico.
d) inclusão de enunciados com comentários e
É sempre no meu peito aquela garra. avaliações pessoais.
É sempre no meu tédio aquele aceno. e) alusão a pessoas marcantes na trajetória de
É sempre no meu sono aquela guerra. vida do escritor.
93
2. (Enem) futuro já chegou”, “maravilhas tecnológicas”
e “conexão total com o mundo” “fetichizam”
novos produtos, transformando-os em objetos
do desejo, de consumo obrigatório. Por esse
motivo carregamos hoje nos bolsos, bolsas e
mochilas o “futuro” tão festejado.
Todavia, não podemos reduzir-nos a meras víti-
mas de um aparelho midiático perverso, ou de
um aparelho capitalista controlador. Há perver-
são, certamente, e controle, sem sombra de dúvi-
da. Entretanto, desenvolvemos uma relação sim-
biótica de dependência mútua com os veículos
de comunicação, que se estreita a cada imagem
compartilhada e a cada dossiê pessoal transfor-
mado em objeto público de entretenimento.
Não mais como aqueles acorrentados na
caverna de Platão, somos livres para nos
aprisionar, por espontânea vontade, a esta
relação sadomasoquista com as estruturas
midiáticas, na qual tanto controlamos quan-
to somos controlados.
SAMPAIO, A. S. “A microfísica do espetáculo”.
A rapidez é destacada como uma das qua- Disponível em: http://observatoriodaimprensa.
com.br. Acesso em: 1 mar. 2013 (adaptado).
lidades do serviço anunciado, funcionando
como estratégia de persuasão em relação ao Ao escrever um artigo de opinião, o produ-
consumidor do mercado gráfico. O recurso tor precisa criar uma base de orientação lin-
da linguagem verbal que contribui para esse guística que permita alcançar os leitores e
destaque é o emprego: convencê-los com relação ao ponto de vista
a) do termo “fácil” no início do anúncio, com defendido. Diante disso, nesse texto, a esco-
foco no processo. lha das formas verbais em destaque objetiva
b) de adjetivos que valorizam a nitidez da im- a) criar relação de subordinação entre leitor e au-
pressão. tor, já que ambos usam as novas tecnologias.
c) das formas verbais no futuro e no pretérito, b) enfatizar a probabilidade de que toda popu-
em sequência. lação brasileira esteja aprisionada às novas
d) da expressão intensificadora “menos do que” tecnologias.
associada à qualidade. c) indicar, de forma clara, o ponto de vista de
e) da locução “do mundo” associada a “me- que hoje as pessoas são controladas pelas
lhor”, que quantifica a ação. novas tecnologias.
d) tornar o leitor copartícipe do ponto de vista
3. (Enem) NOVAS TECNOLOGIAS de que ele manipula as novas tecnologias e
Atualmente, prevalece na mídia um discurso por elas é manipulado.
de exaltação das novas tecnologias, principal- e) demonstrar ao leitor sua parcela de respon-
mente aquelas ligadas às atividades de tele- sabilidade por deixar que as novas tecnolo-
comunicações. Expressões frequentes como “o gias controlem as pessoas.

4. (Enem)

94
A linguagem da tirinha revela habilitarem o sujeito frente às possibili-
a) o uso de expressões linguísticas e vocabulá- dades da competência comunicativa.
rio próprios de épocas antigas. b) I. O verbo auxiliar na locução “deve assu-
b) o uso de expressões linguísticas inseridas no mir” apresenta valor semântico de obriga-
registro mais formal da língua. ção; II. O sentido da expressão verbal “seja
c) o caráter coloquial expresso pelo uso do capaz” seria mantido se o auxiliar fosse
tempo verbal no segundo quadrinho. substituído por possa (possa operar).
d) o uso de um vocabulário específico para si- 2.
O termo verbal “contemos” pertence ao ver-
tuações comunicativas de emergência. bo “conter” e está flexionado na primeira
e) a intenção comunicativa dos personagens: a pessoa do plural do tempo presente (expres-
de estabelecer a hierarquia entre eles. sa o momento da enunciação) do modo indi-
cativo (apresenta a ação como um fato real).
3.
Gabarito a) “Sorriamos, nós não estamos sendo fil-
mados!”
b) O uso do gerúndio na oração “você está
E.O. Teste I sendo filmado” é pertinente, pois expres-
sa uma ação prolongada que acontece no
1. E 2. D 3. E 4. 01 + 04 + 16 = 21 momento em que é enunciada.
4.
5. D 6. B 7. A
a) condizer, desdizer, predizer, contradizer,
bendizer.
b) Sua versão não condiz com a da testemu-
E.O. Teste II nha. Os jornais predisseram as mudanças
1. C 2. A 3. B 4. C 5. C econômicas. As provas contradizem sua
versão. Eu vos bendigo.
6. C 7. E 8. D 9. B 10. E 5.
a) De oposição.
b) A ação de colocar água já se esgotou, mas
E.O. Teste III a ação de murchar persiste no presente.
1. A 2. C 3. B 4. E 5. A O presente se mostra na impossibilidade do
6.
eu-lírico vencer seus limites, daí o “pânico”.

E.O. Dissertativo
1.
a) Essa é uma condição necessária para os
processos de tomada de consciência su-
E.O. Enem
perarem a racionalidade instrumental e 1. C 2. C 3. D 4. C

95
Aulas 3 e 4 (I.T.)
Verbos aplicados ao texto:
correlação e argumentação
verbal / Semântica II
A correlação verbal §§ Pretérito imperfeito do subjuntivo + futuro do
pretérito do indicativo
Entende-se por correlação verbal o movimento que re- Ex.: Se você comprasse os ingredientes, eu faria
aliza a manutenção da coerência entre variadas formas a macarronada.
verbais que vão aparecendo ao longo de uma frase ou §§ Pretérito mais-que-perfeito composto do subjun-
de um texto. Ao regular os verbos que aparecem em tivo + futuro do pretérito composto do indicativo
uma sentença, a correlação evita que ocorram proble- Ex.: Se você tivesse comprado os ingredientes,
mas como esse: eu teria feito a macarronada.
Se eu chegasse em casa mais cedo, eu or- §§ Futuro do subjuntivo + futuro do presente do
ganizarei meu quarto
indicativo
É possível perceber que a correlação temporal Ex.: Quando você chegar, descansarei um pouco.
da frase apresentada é problemática, pois a forma che-
§§ Futuro do subjuntivo + futuro do presente com-
gasse está no modo subjuntivo, o que, do ponto de vis-
posto do indicativo
ta semântico, implica dúvida ou possibilidade. E a forma
Ex.: Quando você chegar, já terei saído.
verbal que aparece na sequência está no futuro do in-
dicativo, denotando algo que se fará com certeza. Esse
choque entre tempos interfere diretamente nos proces-
sos de interpretação de textos. A forma correta seria: Semântica II
Se eu chegasse em casa mais cedo, eu or- denotação e conotação
ganizaria meu quarto
É dentro do campo da semântica que verificamos tam-
bém os processos de denotação e conotação, fenôme-
Os grupos de nos linguísticos que nos permitem entender a amplitude
correlação verbal de significação existente em nossa língua, ou, em ter-
mos mais claros, é o estudo da denotação e da conota-
§§ Presente do indicativo + presente do subjuntivo
ção que nos permite perceber o quanto os significados
Ex.: Preciso que você me faça um favor.
podem variar por conta do interesse dos interlocutores.
§§ Pretérito perfeito do indicativo + pretérito im- Vejamos alguns exemplos:
perfeito do subjuntivo
Filho, você tem que comer todo seu jantar,
Ex.: Eu pedi para que ele comprasse ovos.
ou não terá sobremesa.
§§ Presente do indicativo + pretérito perfeito com- O piloto fez o adversário comer poeira.
posto do subjuntivo
É possível perceber nas frases apresentadas que
Ex.: Espero que ele não tenha chegado atrasado.
o verbo ‘comer’ foi usado com dois sentidos diferentes.
§§ Pretérito imperfeito do indicativo + mais-que- Na primeira, temos comer sendo usado na sua acepção
-perfeito composto do subjuntivo mais comum, que é alimentar-se. Já no segundo caso, te-
Ex.: Queria que ele tivesse comprado flores. mos o verbo comer sendo usado para “figurar” a ideia
§§ Futuro do pretérito + pretérito mais-que-perfeito de alguém comendo poeira, mas não porque isso esteja
composto do subjuntivo ocorrendo de verdade, e sim porque se tenta passar a
Ex.: Gostaria que ele viesse visitar os amigos ideia de que o piloto passou tão rápido pelo adversário,
com maior frequência. que levantou poeira, e quem está atrás a teria “comido”.
§§ Futuro do subjuntivo + futuro do presente do No primeiro caso, a palavra comer foi usada em
indicativo seu sentido dito literal, ou, o sentido padrão (primeiro)
Ex.: Se você comprar os ingredientes, eu ficarei dessa palavra. Quando isso ocorre, temos uma palavra
agradecida. em sentido denotativo. Já no segundo exemplo, o verbo
97
comer foi usado em sentido figurado, tentando figurar/re-
presentar uma situação (alguém comendo poeira). Quan-
_________________ comprar _________________
do isso ocorre, temos uma palavra em sentido conotativo.

Sentido denotativo argumento


externo
argumento
interno

Como vimos anteriormente, entende-se por sentido de- O diagrama apresentado tem como objetivo de-
notativo o sentido primeiro de uma palavra. Seu sentido monstrar que o verbo “comprar”, para fazer sentido,
básico, de dicionário. Entender bem o funcionamento solicita dois argumentos, um interno e outro externo.
do sentido denotativo nos ajudará, mais adiante, a en- Em termos mais claros, quando eu digo “eu comprei”,
tender como são operados alguns processos de inter- temos a sensação de que falta algo para complemen-
pretação em gêneros textuais do português, como os tar o sentido, no caso, a coisa comprada (o ideal seria
textos científicos e também os jornalísticos, que são tex- dizermos “eu comprei um tênis”, por exemplo). Re-
tos cujo objetivo é transmitir informações exatas e pre- parem que se mudamos a perspectiva em relação aos
cisas para o leitor. Um texto denotativo evita palavras às argumentos, continuamos tendo o mesmo problema.
quais se possam atribuir sentidos variados. Pensando no Quando dizemos “compraram um tênis”, a informação
que aprendemos na aula anterior, os textos denotativos continua incompleta, pois necessitamos saber quem
evitam trabalhar com textos polissêmicos. “compraram” o tênis (o ideal seria dizermos “eles com-
praram o tênis”, por exemplo).
O que concluímos disso: os verbos, para expres-
Sentido conotativo sarem corretamente seus sentidos, precisam receber
seus devidos argumentos, caso contrário, ficaremos com
Entende-se por sentido conotativo aquele que explora a sensação de que as informações estão incompletas. E
mais: quando um verbo pede argumento interno, temos
os múltiplos significados que uma palavra pode ter.
um movimento que se chama transitividade (o verbo
Em um texto conotativo não importa muito o sentido
transita em direção a seu argumento interno). Se nesse
primeiro da palavra, e sim a sua capacidade de “su-
“transito” entre o verbo e o argumento interno não há
gerir” interpretações variadas. Os gêneros que habitu- interrupções no caminho, essa transitividade será direta.
almente trabalham com conotações são os literários Vejamos mais dois acontecimentos:
(prosa, poesia, crônica, entre outros) e as canções.
Mas também podemos encontrar em outros tipos de
gênero, dependendo das intenções do autor. Costu- ______________ concordar com ______________
mam ser textos de natureza mais complexa, que exi-
gem um trabalho de leitura mais profundo, para que
se possa apreender o que o autor quis expressar nas argumento argumento
entrelinhas da mensagem. Trabalha-se aqui com co- externo interno

nhecimentos amplos de vocabulário.



_________________ chegar X
Argumentação verbal
A argumentação verbal é um processo operado pelos argumento argumento
externo interno
verbos do qual verificamos suas exigências para a satis-
fação de sentido. Sim, o verbo exige a presença de cer- Nos diagramas apresentados temos outros dois
tos elementos que funcionam como complementadores tipos de processos argumentativos. No primeiro caso,
de sentido. Vejamos como isso funciona: conseguimos perceber que o verbo “concordar”, além
98
de solicitar seus argumentos internos e externos, ele exige, para perfeito entendimento, uma preposição (com). Se
dissermos simplesmente que “José concorda as regras”, mesmo havendo os argumentos necessários, a falta da
preposição (com) deixa uma falha na oração. Ou seja, há verbos que solicitam não só argumentos, mas também
preposições. Isso é o que vai demarcar a transitividade de caráter indireta.
No segundo caso, fica evidenciado o fato de que há verbos que não solicitam argumentos internos, como
“chegar”, pois conseguimos perceber que, ao dizermos “O professor chegou” temos uma informação que é com-
pleta, e que precisou apenas de um argumento externo. Como não houve a necessidade de trânsito para o argu-
mento interno, podemos dizer que o verbo “chegar” é intransitivo.

99
E.O. Teste I teste de validade. Essas coisas de que se vale
em geral a ciência.
O mal que há nessa “democratização” dos ve-
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO: ículos é que se formam crenças sem funda-
mento, mudam-se as opiniões das pessoas,
AGORA TODO MUNDO TEM OPINIÃO
afirmam-se absurdos em que muita pessoa
ingênua acaba acreditando. Sim, porque es-
Meu amigo Adamastor, o gigante, me apa-
tudar, comprovar metodicamente, testar a
receu hoje de manhã, muito cedo, aqui na
validade, tudo isso dá muito trabalho.
biblioteca, e disse que vinha a fim de um
O Adamastor não estava muito convencido
cafezinho. 1Mentira, eu sei. 2Quando ele vem
da 17justeza dos meus argumentos, mas o
tomar um cafezinho é porque está com algu-
café tinha terminado e ele se despediu.
ma ideia borbulhando em sua mente.
Texto de Menalton Braff, publicado em 03 de
E estava. 3Depois do primeiro gole e antes do abril de 2015. Disponível em: <http://www.
segundo, café muito quente, ele afirmou que cartacapital.com.br/cultura/agora-todo-mundo-tem-
concorda plenamente com a democratização opiniao-7377.html>. Acesso em: 20 abr. 2015.
da informação. Agora, com o advento da in-
ternet, qualquer pessoa, democraticamente,
pode externar aquilo que pensa. 1. (G1 - ifsul) A significação das palavras não é
4
Balancei a cabeça, na demonstração de uma fixa. Elas podem variar, estabelecendo novos
quase divergência, e seu 5espanto também conceitos por meio de associações, depen-
me espantou. Como assim, ele perguntou, dendo de seu emprego em uma frase. Des-
está renegando a democracia6? Pedi com mo- sa forma, na construção de sentido de um
dos a meu amigo que não 7embaralhasse as texto, as palavras podem ser empregadas em
coisas. Democracia não é um termo 8divina- sentido denotativo/literal e/ou conotativo/
tório, que se aplique sempre, em qualquer figurado.
situação. Analisando o texto, qual alternativa apre-
Ele tomou o segundo gole com certa avidez e senta palavra que foi empregada com senti-
9
queimou a língua. do conotativo?
Bem, voltando ao assunto, nada contra a de- a) espanto (referência 5).
mocratização dos meios para que se divul- b) divinatório (referência 8).
guem as opiniões, as mais diversas, mais c) enxurrada (referência 13).
esdrúxulas, mais inovadoras, e tudo o mais. d) justeza (referência 17).
É um direito que toda pessoa tem10: emitir
opinião. TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
O que o Adamastor não sabia é que uns dias
O PADEIRO
atrás andei consultando uns filósofos, al-
guns antigos, outros modernos, desses que Levanto cedo, faço a higiene pessoal, ponho
tratam de um 11palavrão que sobrevive até os a chaleira no fogo para fazer café e abro a
dias atuais: gnoseologia. Isso aí, para dizer porta do apartamento − mas não encontro o
teoria do conhecimento. pão costumeiro. No mesmo instante me lem-
Sim, e daí?12, ele insistiu. bro de ter lido alguma coisa nos jornais da
O mal que vejo, continuei, não está na 13en- véspera sobre a “greve do pão dormido”. De
xurrada de opiniões as mais isso ou aquilo resto não é bem uma greve, é um lockout,
na internet, e principalmente com a chegada greve dos patrões, que suspenderam o traba-
do Facebook. Isso sem contar a imensa quan- lho noturno; acham que obrigando o povo a
tidade de textos 14apócrifos, muitas vezes até tomar seu café da manhã com pão dormido
opostos ao pensamento do presumido autor, conseguirão não sei bem o que do governo.
falsamente presumido. A graça está no fato Está bem. Tomo meu café com pão dormi-
de que todos, agora, têm opinião sobre tudo. do, que não é tão ruim assim. E enquanto
− Mas isso não é bom? tomo café vou me lembrando de um homem
O gigante15, depois da maldição de Netuno16, modesto que conheci antigamente. Quando
tornou-se um ser impaciente. vinha deixar pão à porta do apartamento ele
O fato, em si, não tem importância alguma. apertava a campainha, mas, para não inco-
O problema é que muita gente lê a enxur- modar os moradores, avisava gritando:
rada de bobagens que aparecem na internet – Não é ninguém, é o padeiro!
não como opinião, mas como conhecimento. Interroguei-o uma vez: como tivera a ideia
O Platão, por exemplo, afirmava que opinião de gritar aquilo?
(doxa) era o falso conhecimento. O conhe- Ele abriu um sorriso largo. Explicou que
cimento verdadeiro (episteme) depende de aprendera aquilo de ouvido. Muitas vezes lhe
estudo profundo, comprovação metódica, acontecera bater a campainha de uma casa e
100
ser atendido por uma empregada ou por uma quem quer ou quem se atreve, mas sabe-se
outra pessoa qualquer, e ouvir uma voz que também 3que muita gente entra forçada por
vinha lá de dentro perguntando quem era; amigos e pessoas queridas, meio que contra
e ouvir a pessoa que o atendera dizer para a vontade, pressionada pela vergonha de
dentro: “não é ninguém, não senhora, é o manifestar sentimentos de prudência ou o
padeiro”. Assim ficara sabendo que não era puro medo. Mas, uma vez que se entra, 5que
ninguém... se aperta a trava de segurança e a geringon-
Ele me contou isso sem mágoa nenhuma, ça se põe em movimento, a situação se tor-
e se despediu ainda sorrindo. Eu não quis na irremediável. Bate um frio na barriga, o
detê-lo para explicar que estava falando com corpo endurece, as mãos cravam nas alças do
um colega, ainda menos importante. Naque-
banco, a respiração se torna cada vez mais
le tempo eu também, como os padeiros, fazia
difícil e forçada, o coração descompassa, um
trabalho noturno. Era pela madrugada que
calor estranho arde no rosto e nas orelhas,
deixava a redação do jornal, quase sempre
ondas de arrepio descem do pescoço pela es-
depois de uma passagem pela oficina - e
muitas vezes saía já levando na mão um dos pinha abaixo.
exemplares rodados, o jornal ainda quenti- Nicolau Sevcenko: A corrida para o século
XXI: no loop da montanha-russa.
nho da máquina, como pão saído do forno.
Ah, eu era rapaz, eu era rapaz naquele tem-
po! E às vezes me julgava importante por-
3. (G1 - ifce) Sobre as expressões do primeiro
que no jornal que levava para casa, além de
período “uma das sensações mais intensas e
reportagens ou notas que eu escrevera sem
perturbadoras” e “um passeio na montanha-
assinar, ia uma crônica ou artigo com o meu
-russa”, uma análise possível, correta e coe-
nome. O jornal e o pão estavam bem cedi-
nho na porta de cada lar; e dentro do meu rente é a de que
coração eu recebi uma lição daquele homem a) do ponto de vista semântico-referencial, ou
entre todos útil e entre todos alegre; “não é seja, no nível denotativo, têm significados
ninguém, é o padeiro!”. diferentes, isto é, denotam ou referem o
E assoviava pelas escadas. mesmo objeto; já, do ponto de vista sintáti-
(Rubem Braga, Ai de ti, Copacabana. Rio de co, são idênticas: enquanto a primeira assu-
Janeiro: Editora do Autor, 1960. Adaptado) me a função do sujeito, a segunda assume a
do predicativo do sujeito.
b) do ponto de vista semântico-referencial, ou
2. (G1 - ifsp) A expressão − pão dormido − foi seja, no nível denotativo, são equivalentes,
empregada com sentido isto é, denotam ou referem o mesmo objeto;
a) denotativo, indicando que os padeiros, por já, do ponto de vista sintático, não se equi-
causa da greve, adulteraram a receita do pão. valem: enquanto a primeira assume a função
b) denotativo, indicando que o pão entregue
do sujeito, a segunda assume a do predicati-
aos moradores estava fora de validade.
vo do sujeito.
c) conotativo, indicando que o pão a ser consu-
c) do ponto de vista semântico-referencial, ou
mido não estava fresco.
seja, no nível denotativo, são corresponden-
d) conotativo, indicando que os padeiros redu-
ziram o trabalho noturno durante a greve. tes, mas denotam ou referem objetos dis-
e) conotativo, indicando que a massa do pão tintos; já, do ponto de vista sintático, são
precisa descansar para que o fermento aja. divergentes: enquanto a primeira assume a
função do predicativo do sujeito, a segunda
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO: assume a do sujeito.
d) do ponto de vista semântico-referencial, ou
EMOÇÕES NA MONTANHA-RUSSA seja, no nível denotativo, não são corres-
(FRAGMENTO) pondentes, pois não denotam nem referem
o mesmo objeto; já, do ponto de vista sin-
Uma das sensações mais intensas e pertur-
badoras 4que se pode experimentar, neste tático, são divergentes: enquanto a primeira
nosso mundo atual, é um passeio na monta- assume a função do adjunto adnominal, a
nha-russa. Só não é nem um pouco recomen- segunda assume a do complemento nominal.
dável para quem tenha problemas com os e) do ponto de vista semântico, uma refere o
nervos ou com o coração, nem para aqueles objeto em nível denotativo e a outra refere
com o sistema digestivo sensível. A própria o mesmo objeto, mas em nível conotativo;
decisão de entrar na brincadeira já requer já, do ponto de vista sintático, são idênti-
alguma coragem, a gente sabe 1que a emo- cas: enquanto a primeira assume a função do
ção pode ser forte até demais e 2que podem adjunto adnominal, a segunda assume a do
decorrer consequências imprevisíveis. Entra adjunto adverbial.
101
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO: facilmente percebida como um sinal vazio,
sem referente real, tem no Segundo e Tercei-
O silêncio é a matéria significante por ex- ro Mundo o peso de uma 8descrição confiável
celência, um continuum significante. O real de um modo de vida possível. Em grande me-
da comunicação é o silêncio. E como o nosso dida, ela determina o horizonte de expecta-
objeto de reflexão é o discurso, chegamos a tivas que impulsiona a 4migração.
uma outra afirmação que sucede a essa: o si- Hans Magnus Enzensberger. O vagão humano (fragmento).
lêncio é o real do discurso. In: Veja 25 anos - reflexões para o futuro
O homem está “condenado” a significar.
Com ou sem palavras, diante do mundo, há 5. (PUC-RS) Quanto ao sentido de certas pala-
uma injunção à “interpretação”: tudo tem vras do texto, é correto afirmar que
de fazer sentido (qualquer que ele seja). O ( ) o verbo “migrar” (ref. 3) e o substantivo
homem está irremediavelmente constituído “migração” (ref. 4) podem ser entendi-
pela sua relação com o simbólico. dos, neste texto, como “emigrar” e “emi-
Numa certa perspectiva, a dominante nos gração”.
estudos dos signos, se produz uma sobrepo- ( ) “substância” (ref. 5) pode ser substituí-
sição entre linguagem (verbal e não-verbal) da por seu sinônimo “conteúdo”.
e significação. ( ) “lendas” (ref. 6) está empregada no sen-
Disso decorreu um recobrimento dessas duas tido conotativo.
noções, resultando uma redução pela qual ( ) “desenvolvimento” (ref. 7) e “descrição”
qualquer matéria significante fala, isto é, (ref. 8) são formadas com o prefixo “des”.
é remetida à linguagem (sobretudo verbal) Preencha os parênteses com V (para verda-
para que lhe seja atribuído sentido. deiro) e F (para falso). A sequência correta
Nessa mesma direção, coloca-se o “império de cima para baixo, é
do verbal” em nossas formas sociais: traduz- a) V - F - F - V
-se o silêncio em palavras. Vê-se assim o b) F - V - F - V
silêncio como linguagem e perde-se sua es- c) F - F - V - V
pecificidade, enquanto matéria significante d) V - V - F - F
distinta da linguagem. e) F - V - F - F
(Eni Orlandi. As formas do silêncio, 1997.)

TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:


4. (Unifesp) No segundo parágrafo do texto, O texto é um excerto de Baú de Ossos (volu-
empregam-se as aspas no termo “condena- me 1), do médico e escritor mineiro Pedro
do” para Nava. Inclui-se essa obra no gênero memo-
a) atribuir-lhe um segundo sentido, equivalen- rialístico, que é predominantemente narra-
te a culpado. tivo. Nesse gênero, são contados episódios
b) reforçar-lhe o sentido contextual, equiva- verídicos ou baseados em fatos reais, que fi-
lente a predestinado. caram na memória do autor. Isso o distingue
c) marcá-lo com sentido conotativo, equivalen- da biografia, que se propõe contar a história
te a reprovável. de uma pessoa específica.
d) enfatizar-lhe o sentido denotativo, equiva- 1
O meu amigo Rodrigo Melo Franco de An-
lente a desgraçado. drade é autor 2do conto “Quando minha avó
e) destituí-lo do sentido literal, equivalente a morreu”. Sei por ele que é uma história au-
buliçoso. tobiográfica. 3Aí Rodrigo confessa ter pas-
sado, aos 11 anos, por fase da vida em que
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
4
se sentia profundamente corrupto. Vio-
lava as promessas feitas de noite a Nossa
Ninguém 3migra sem a promessa de algo Senhora; mentia desabridamente; faltava
melhor. No passado, lendas e boatos com- às aulas para tomar banho no rio e pes-
punham a mídia da esperança. A Terra Pro- car na Barroca com companheiros vadios;
metida, a lendária Atlântida, El Dorado ou o furtava 5pratinhas de dois mil-réis... 6Ai!
Novo Mundo forneceram 1histórias mágicas de mim que mais cedo que o amigo tam-
que motivaram muitos a partir. Hoje o so- bém 7abracei a senda do crime e enveredei
nho chega através da mídia global até o mais pela do furto... 8Amante das artes plásticas
remoto povoado do mundo em 7desenvolvi- desde cedo, educado no culto do belo, eu
mento. 2Essas imagens contêm menos 5subs- não pude me conter. Eram duas coleções de
tância, menos realidade do que as 6lendas de postais pertencentes a minha prima Maria
outrora; no entanto, seus efeitos são incom- Luísa Palleta. Numa, toda a vida de Paulo e
paravelmente mais poderosos. A publicida- Virgínia – do idílio infantil ao navio des-
de, que nos países ricos de onde provém é mantelado na procela. Pobre Virgínia, dos
102
cabelos esvoaçantes! Noutra, a de Joana ( ) Em linguagem não metafórica, teríamos
d’Arc, desde os tempos de pastora e das vo- algo como o que segue: comecei a praticar
zes ao da morte. Pobre Joana dos cabelos crimes, mais especificamente o furto.
em chama! Não resisti. Furtei, escondi e de- ( ) O verbo abraçar (“abracei”), usado tam-
pois de longos êxtases, com medo, joguei bém em sentido figurado, fortalece a me-
tudo fora. Terceiro roubo, terceira coleção táfora do caminho, pois, dentre as várias
de postais – a que um carcamano, chamado acepções desse verbo, estão as de envol-
Adriano Merlo, escrevia a uma de minhas ver, tomar como seu, adotar.
tias. Os cartões eram fabulosos. Novas con- Está correta, de cima para baixo, a seguinte
templações solitárias e piquei tudo de la- sequência:
trina abaixo. Mas o mais grave foi o roubo a) V, F, F, V, V, V.
de uma nota de cinco mil-réis, do patrimô- b) F, F, V, V, F, F.
nio da própria Inhá Luísa. De posse dessa c) V, V, V, F, F, F.
fortuna nababesca, comprei um livro e uma d) V, V, F, V, V, V.
lâmpada elétrica de tamanho desmedido.
Fui para o parque Halfeld com o butim de TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
minha pirataria. Joguei o troco num buei-
ro. Como ainda não soubesse ler, rasguei o BEM NO FUNDO
livro e atirei seus restos em um tanque. 9A 1
no fundo, no fundo,
lâmpada, enorme, esfregada, não fez apare- bem lá no fundo,
cer nenhum gênio. Fui me desfazer de mais 2
a gente gostaria
esse cadáver na escada da Igreja de São Se- de ver 3nossos problemas
bastião. 10Lá a estourei, tendo a impressão resolvidos por decreto
de ouvir os trovões e o morro do Imperador
desabando nas minhas costas. Depois dessa a partir desta data,
série de atos gratuitos e delitos inúteis, vol- aquela mágoa sem remédio
tei para casa. 11Raskólnikov. O mais estra- é considerada nula
nho é que houve crime, e não castigo. Crime e sobre ela − silêncio perpétuo
perfeito. Ninguém desconfiou. Minha avó extinto por lei todo o remorso,
não deu por falta de sua cédula. 12Eu fiquei maldito seja quem olhar pra trás,
por conta das Fúrias de um remorso, que lá pra trás não há nada,
me perseguiu toda a infância, veio comigo e nada mais
pela vida afora, com a terrível impressão de
que eu poderia reincidir porque vocês sa- mas problemas não se resolvem,
bem, 13cesteiro que faz um cesto... 14Só me problemas têm família grande,
tranquilizei anos depois, já médico, quando e aos domingos saem todos a passear
li num livro de Psicologia que só se deve o problema, sua senhora
considerar roubo o que a criança faz com e outros pequenos probleminhas
proveito e dolo. O furto inútil é fisiológico LEMINSKI, Paulo. Toda poesia. São
Paulo: Cia. das Letras, 2013.
e psicologicamente normal. Graças a Deus!
Fiquei absolvido do meu ato gratuito...
(Pedro Nava. Baú de ossos. Memórias 1. p. 308 a 310.) 7. (Uerj) a gente gostaria
de ver nossos problemas
resolvidos por decreto (ref. 2)
6. (Uece) No trecho “abracei a senda do crime
e enveredei pela do furto...” (ref. 7), foi em-
A expressão sublinhada tem sentido figura-
pregada linguagem figurada. Assinale V ou
do que, no contexto, corresponde a:
F, conforme seja verdadeiro ou falso o que se
a) imediatamente e sem esforço
diz sobre esse trecho.
b) legalmente e com garantias
( ) O sentido primeiro do vocábulo “senda”
c) gradativamente e sem contestação
é caminho.
d) surpreendentemente e com restrições
( ) No texto, o vocábulo “senda” foi empre-
gado para indicar aquilo que é feito ha-
bitualmente; prática observada; hábito, TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
rotina.
( ) O trecho foi composto com duas metáfo- A(s) questão(ões) a seguir toma(m) por
ras: uma expressa pelo vocábulo “senda” base uma passagem do artigo “Os operários
da música livre”, de Ronaldo Evangelista.
e outra pelo vocábulo “furto”.
( ) O substantivo “senda” e o verbo enve- Desde o final do século 20, toda a engrenagem
redar (“enveredei”) formam uma única industrial do mercado musical passa por in-
metáfora, a metáfora do caminho. tensas transformações, como o surgimento e
103
disseminação de novas tecnologias, em grande c) sindicato de grandes músicos brasileiros que
parte gratuitas, como os arquivos MP3s, as re- visa impedir a ascensão e o sucesso de músi-
des de compartilhamento destes arquivos, me- cos mais jovens.
canismos torrents, sites de armazenamento de d) grupos anarquistas constituídos para tumul-
conteúdo, ferramentas de publicação on-line tuar e desmoralizar os músicos mais jovens e
— tudo à disposição de quem quisesse dividir a música popular brasileira.
com os outros suas canções e discos favoritos. e) organização que emprega métodos imorais e
A era pós-industrial atingiu toda a indústria ilegais para impor seus interesses em deter-
do entretenimento, mas o braço da música foi minada atividade.
quem mais sofreu, especialmente as grandes
gravadoras multinacionais, as chamadas ma-
jors, que sofreram um declínio em todas as eta-
pas de seu antigo negócio, ao mesmo tempo em E.O. Teste II
que rapidamente se aperfeiçoavam ferramen-
tas baratas e caseiras de produção que diminu-
íam a distância entre amadores e profissionais. 1. (Uepb) Do texto, abaixo, é possível concluir
A era digital é também chamada de pós-in- que o termo “chatear” foi usado:
dustrial porque confronta o modelo de pro-
dução que dominava até o final do século 20.
Esse modelo industrial é baseado na repe-
tição, em formatar e embalar. Por trás dis-
so, a ideia é obter a máxima produção — o
que, para produtos em geral, funciona muito
bem. Quando esses parâmetros são aplicados
à arte, a venda do produto (por exemplo, o
disco) depende do conteúdo (a canção). A
canção que vai resultar nessa “produção má-
xima” é buscada por meio de um equilíbrio
entre criatividade e uma fórmula de sucesso
que desperte o interesse do público. Como es- a) De maneira ambígua, sem nenhuma pista
tudos ainda não conseguiram decifrar como que possa ajudar na busca dos sentidos do
direcionar a criatividade de uma maneira que termo.
certamente despertará esse interesse (e ma- b) De forma figurada, exemplificando unica-
ximizará a produção), a opção normalmente mente a polissemia da linguagem.
costuma ser pela solução mais simples. c) Com o sentido literal do termo, ocasionando
“Cada um tem descoberto suas fórmulas e uma redundância.
possibilidades, pois tudo tende a ser cada d) Com mais de um sentido, cuja alteração se
vez menos homogêneo”, opina o baiano Lu- faz perceber pelos recursos linguísticos e vi-
cas Santtana, que realizou seus discos recen- suais que servem de pistas para o entendi-
tes às próprias custas.“Claro que ainda existe mento do texto.
uma distância em relação aos artistas chama- e) De forma equivocada, pois não existe um
dos mainstream”, continua. “Mas você muda destinatário declarado a quem se dirige a
o tamanho da escala e já está tudo igual em mensagem.
termos de business. A pergunta é se essa ge-
ração faz uma música para esse grande mer- TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
cado ou se ela está formando um novo públi-
co. Outra pergunta é se o grande mercado na FILOSOFAR PARA PRESERVAR
verdade não passa de uma imposição de uma O modelo consumista de produção da atuali-
máfia que dita o que vai ser popular.” dade é ecocida em sua natureza e antiecoló-
(Galileu, março de 2013. Adaptado.) gico em sua finalidade
Alfeu Trancoso
(ambientalista e professor de Filosofia da PUC Minas)
8. (Unesp) Em seu depoimento no artigo, o
músico Lucas Santtana sugere que o grande Filosofar é fazer pensar, refletir sobre como
mercado talvez não passe da imposição de gerenciar melhor nossas escolhas cotidia-
uma máfia. O termo máfia, nesse caso, foi nas. Essa arte do bem pensar deve orientar
empregado no sentido de nossas emoções e condecorar nossas con-
a) domínio dos partidos políticos sobre o mer- quistas. Pensar para não sofrer, eis um dos
cado musical, privilegiando tudo o que inte- lemas centrais dessa atividade interrogante
resse apenas ao poder público. que tem por finalidade nos fazer encontrar
b) organização criminosa com origem na Itália, a sabedoria do feliz. Por ser uma arte, to-
com poderosas ramificações pelo mundo inteiro. dos a desejam, mas apenas uns poucos a
104
atingem. E esses são os sábios, aqueles que da mesma rede interativa que forma o tecido
conseguem monitorar com destreza as arti- da vida na Terra.
manhas do viver, fugindo das seduções do Disponível em: <http://www.revistaecologico.
efêmero e dos negativismos atuais. Sabemos com.br>. Acesso em: 10 set. 2013.
que muita gente não gosta de pensar, mas
podemos aprender a gostar dessa atividade,
já que todo amor é um aprendizado, fruto de 2. (G1 - cftmg) A passagem em que as palavras
um persistente esforço. Não existe gratuida- foram empregadas em sentido literal é
de na vida. Toda pessoa doadora sabe disso. a) “Não existe gratuidade na vida.”
Ela dá porque recebe, ama porque é amada. b) “A roda acelerada desde o século XIX não
Há outro desafio fundamental para a vida pode parar.”
que o ser humano teima em não assumir em c) “(...) e não para satisfazer o poço sem fundo
sua amplitude: as implicações ecológicas da dos nossos desejos.”
nossa relação com o planeta. Conseguimos d) “(...) somos fios da mesma rede interativa
avanços significativos na esfera da política que forma o tecido da vida na Terra.”
e da educação, em geral, mas na área dos
sistemas econômicos pouca coisa foi con-
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
quistada. O sistema global de produção con-
tinua agindo como se os objetivos a alcançar
fossem os mesmos de 200 anos atrás. O fre- O FUTURO ERA LINDO
nesi do crescimento a qualquer custo atinge
todos os recantos da Terra. A roda acelera- A informação seria livre. Todo o saber do
da desde o século XIX não pode parar. Para mundo seria compartilhado, bem como a
haver riqueza, é preciso produzir, consumir, música, o cinema, a literatura e a ciência.
obter lucro, criar mais trabalho, produzir e O custo seria zero. O espaço seria infinito.
repetir tudo de novo numa ciranda sem fim. A velocidade, estonteante. A solidariedade
Acreditam que, quanto mais consumirmos, e a colaboração seriam os valores supremos.
mais trabalho criamos,mais o país pode se A criatividade, o único poder verdadeiro. O
desenvolver. O modelo consumista de pro- bem triunfaria sobre os males do capitalis-
dução da atualidade é ‘ecocida’ em sua na- mo. O sistema de representação se tornaria
tureza e antiecológico em sua finalidade. O obsoleto. Todos os seres humanos teriam
planeta não mais suporta tamanha pressão oportunidades iguais em qualquer lugar do
sobre os seus já limitados recursos. Os ecolo- planeta. Todos seriam empreendedores e in-
gistas lançam pelos quatro cantos do mundo ventivos. Todos poderiam se expressar livre-
seus gritos de alarme. Mas os donos do poder mente. Censura, nunca mais. As fronteiras
industrial tapam os ouvidos a essas lamenta- deixariam de existir. As distâncias se torna-
ções. É impossível pensarmos em crescimen- riam irrelevantes. O inimaginável seria pos-
to e sustentabilidade num sistema em que a sível. O sonho, qualquer sonho, poderia se
obsolescência é planejada e o desperdício é o tornar realidade.
motor da reposição. Quase todos agem como 1
Livre, grátis, inovador, coletivo, palavras-
se os recursos fossem ilimitados. É lógico que
-chave do novo mundo que a internet inau-
todos nós precisamos consumir, mas consu-
gurou. Por anos esquecemos que a internet
mo para suprir nossas necessidades e não
foi uma invenção militar, criada para manter
para satisfazer o poço sem fundo dos nossos
o poder de quem já o tinha. Por anos fin-
desejos. Todo o sistema global de produção
gimos que transformar produtos físicos em
atual aposta na ideia de que o supérfluo é
produtos virtuais era algo ecologicamente
mais importante do que o necessário.
correto, esquecendo que a fabricação de com-
Concluindo, podemos afirmar que a reflexão
putadores e celulares, com a obsolescência
filosófica nos ajuda a encontrar uma luz no
meio do túnel antes que o dique se rompa e a embutida em seu DNA, demanda o consumo
inundação esmague todos. Filosofar é apon- de quantidades vexatórias de combustíveis
tar expectativas e, nesse aspecto, todas as fósseis, de produtos químicos e de água, sem
pessoas de bom senso devem, com urgência, falar no volume assombroso de lixo não reci-
utilizar a reflexão para propor novos cami- clado em que resultam, incluindo lixo tóxico.
nhos ou uma saída para o impasse civilizató- 2
Ninguém imaginou que o poder e o dinhei-
rio em que nos encontramos. Urge lutarmos ro se tornariam tão concentrados em me-
por uma sociedade mais verde, mais intera- gahipercorporações norte-americanas como
tiva com a natureza. Devemos saber que a o Google, que iriam destruir para sempre
luta ecológica não é somente uma luta para tantas indústrias e atividades em tão pou-
a preservação da espécie humana, mas de to- co tempo. Ninguém previu que os mesmos
das as espécies do planeta, já que somos fios Estados Unidos, graças às maravilhas da
105
internet sempre tão aberta e juvenil, se con- lugares extremos. Agora não se trata mais
solidariam como os maiores espiões do mun- de espaço. Trata-se de tempo. E o verbo é o
do, humilhando potências como a Alemanha mesmo.
e também o Brasil, impondo os métodos de POSSENTI, Sírio. Analogias. Disponível em: <http://
sua inteligência militar sobre a população cienciahoje.uol.com.br/colunas/palavreado/
mundial, e guiando ao arrepio da justiça os analogias>. Acesso em 23 mai. 2014.
bebês engenheiros nota dez em matemáti-
ca mas ignorantes completos em matéria de
4. (Ufpr 2016) O verbo “ir” tem, ainda, ou-
ética, política e em boas maneiras.
tro uso corrente não contemplado no texto:
3
Ninguém previu a febre das notícias inven- pode ser uma partícula unicamente grama-
tadas, a civilização de perfis falsos, as en- tical responsável por marcar o tempo futuro
xurradas de vírus, os arrastões de números do verbo principal da oração. Assinale a al-
de cartão de crédito, a empulhação dos re- ternativa representativa desse uso.
sultados numéricos falseados por robôs ou a) Enquanto aguardamos o telefonema da Joa-
gerados por trabalhadores mal pagos em pa- na, o Luís vai ao mercado e compra os salga-
íses do terceiro mundo, o fim da privacidade, dos para o café.
o terrorismo eletrônico, inclusive de Estado. b) O período de inscrição para o concurso foi
Marion Strecker divulgado: vai de novembro a dezembro.
Adaptado de Folha de São Paulo, 29/07/2014. c) Já noticiaram: o técnico vai divulgar o nome
dos jogadores convocados nesta semana.
d) Amanhã, este carro vai para a oficina, para
3. (Uerj 2016) O primeiro parágrafo expõe
reparos no freio e na lataria.
projeções passadas sobre possibilidades de
e) Você já guardou tudo? Vai que ele chegue
um futuro regido pela internet.
sem avisar...
O recurso linguístico que permite identificar
que se trata de projeção e não de fatos do
passado TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
é o uso da:
a) forma verbal Crônica parafraseada de
b) pontuação informal uma Síria em guerra
c) adjetivação positiva
d) estrutura coordenativa Ela abre os olhos. Não fosse o cheiro horrível
de morte, o silêncio seria até agradável, mas
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO: o olfato a lembra que não há paz 1– nem
pessoas, vizinhos, crianças. A trégua na ma-
Dependendo do contexto em que são empre- nhãzinha não traz esperança. Tão somente
gados, termos como “aí”, “até” e “ir” ora lhe permite descansar o corpo, mas não a
denotam espaço, ora denotam tempo. Esses mente. As lembranças da noite anterior ain-
variados sentidos que as palavras podem as- da produzem sobressaltos. Bombas, casas
sumir nem sempre são precisamente especi- caindo e soldados gritando.
ficados no dicionário. Levanta-se, bebe o pouco da água que restou
Talvez o exemplo mais interessante para do copo ao lado da cama. Já não é tão lim-
ilustrar a indicação de tempo ou de espaço pa, nem farta como antes. Sempre um gosto
com a mesma palavra seja o verbo “ir”. O amargo misturado com
sentido primeiro (aceitemos isso para efei- Abre a geladeira, e só encontra comida enla-
to de raciocínio) do verbo “ir” é de desloca- tada e congelada. E mesmo não tão congela-
mento: “alguém vai de A a B” quer dizer que da assim, já que os cortes diários de eletrici-
alguém se desloca do ponto A ao ponto B. dade derretem as camadas de gelo.
Trata-se de espaço. Os sobrinhos ainda dormem, e ela tenta orar.
Dizemos também, por exemplo, que a Ban- Não consegue. A mente desconcentra-se fa-
deirantes vai de Piracicaba a S. Paulo. Mas é cilmente. Em uma prece fragmentada, pede
claro que a rodovia não se desloca: ela come- a Deus descanso e trégua. E faz a oração sem
ça em uma cidade e termina em outra. Não pensar muito. Não precisa; é a mesma oração
há sentido de deslocamento nessa oração, das últimas semanas.
mas ainda estamos no domínio do espaço. Ela não quer sair de casa. Não é teimosia, é
Agora, veja-se outro caso: também dizemos falta de opção. 2“Para onde ir?”, pergunta,
que o período colonial vai de 1500 a 1822 com uma voz desesperançosa. Está tão con-
(ou a 1808, conforme o ponto de vista). fusa que não consegue imaginar saídas.
Nesse exemplo, ninguém se desloca, nem se Nem a piedade de enterrar os mortos o go-
informa sobre dois pontos do espaço, dois verno permite. Cadáveres estão espalhados
106
pelas ruas. As forças de Assad 3impediram c) Especialistas têm desenvolvido treinos que
de sepultar ou mesmo remover os restos ajudam a restaurar o equilíbrio. A reabilita-
mortais. Ou seja, mesmo viva, ela não tem ção vestibular, por exemplo, envolve ativi-
como fugir da morte escancarada diante de dades para os olhos e a cabeça que buscam
seus olhos. Não é fácil acreditar na vida, estimular o cérebro a lidar com sinais distor-
quando a realidade grita o contrário. cidos que vêm da orelha interna. (Mente e
Se não podem sepultar os mortos, os sobre- Cérebro, Ano XXI, No 265, p.31)
viventes tentam ao menos ajudar a curar as d) A busca por inovar, uma capacidade (até
feridas dos machucados. Não podem levá-los onde se sabe) exclusiva do Homo Sapiens,
aos hospitais da cidade, já que há um medo é o motor das engrenagens da civilização.
generalizado de que o governo prenda os fe- Inovações, sempre nascidas para solucionar
ridos como se fossem prisioneiros de guerra. necessidades pulsantes da humanidade, le-
Resta improvisar atendimento nos campos. vam a transformações definitivas no modo
Não bastasse a precariedade do atendimen- como produzimos e dão início a mudanças
to, não há medicamentos suficientes. profundas nas relações humanas. (Veja, 3
Rebeca, de 32 anos, é trabalhadora autôno- dez. 2014)
ma. Ou melhor, 4era. Agora já não sabe mais
o que é e o que faz em sua cidade Damasco, TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
capital da Síria.
Crônica parafraseada do depoimento de uma
1
Hoje os conhecimentos se estruturam de
moradora da capital da Síria (identificada modo 3fragmentado, 4separado, 5compar-
apenas pela letra “R”) ao jornal Folha de timentado nas disciplinas. 8Essa situação
São Paulo, de quarta-feira, dia 25. A Síria impede uma visão global, uma visão funda-
está em revolta há 16 meses contra a dita- mental e uma visão complexa. 13”Complexi-
dura de Bashar al-Assad. Nos últimos dias, o dade” vem da palavra latina complexus, que
confronto contra os rebeldes se acirrou e as significa a compreensão dos elementos no
mortes aumentaram. seu conjunto.
As disciplinas costumam excluir tudo o que
Disponível em: <http://ultimato.com.br/sites/
fatosecorrelatos/2012/07/26/cronica-parafraseada- se encontra fora do 9seu campo de especia-
de-uma-siria-em-guerra/> Acesso em: 14 set. 2015. lização. A literatura, no entanto, é uma área
que se situa na inclusão de todas as dimen-
sões humanas. Nada do humano 10lhe é es-
5. (G1 - ifsul 2016) Considerando a flexão das tranho, 6estrangeiro.
formas verbais impediram (ref. 3) e era (ref. A literatura e o teatro são desenvolvidos
4), é correto afirmar que como meios de expressão, meios de conhe-
a) os dois verbos estão conjugados no pretérito cimento, meios de compreensão da 14com-
imperfeito do modo indicativo. plexidade humana. Assim, podemos ver o
b) os dois verbos estão conjugados no pretérito primeiro modo de inclusão da literatura: a
perfeito do modo indicativo. inclusão da 15complexidade humana. E va-
c) o verbo impedir está conjugado no pretérito mos ver ainda outras inclusões: a inclusão da
perfeito do indicativo, e o ser, no pretérito personalidade humana, a inclusão da subje-
imperfeito do indicativo. tividade humana, e, também, muito impor-
d) o verbo impedir está conjugado no pretérito tante, a inclusão; do estrangeiro, do margi-
imperfeito do subjuntivo, e o ser, no futuro nalizado, do infeliz, de todos que ignoramos
do subjuntivo. e desprezamos na vida cotidiana.
A inclusão da 16complexidade humana é ne-
cessária porque recebemos uma visão mu-
6. (Ufu 2015) Assinale a alternativa cujo termo tilada do humano. 11Essa visão, a de homo
em negrito exprime um fato que NÃO per- sapiens, é uma 17definição do homem pela
tence a um tempo determinado. razão; de homo faber20, do homem como tra-
a) Em 2014, uma tendência se consolidou: pro- balhador; de homo economicus21, movido por
dutos digitais estão cada vez mais sendo lucros econômicos. Em resumo, trata-se de
vendidos do mesmo jeito que a maioria das uma visão prosaica, mutilada, 12que esquece
churrascarias serve carne: em sistemas de o principal22: a relação do sapiens/demens,
rodízio. Mas isso não quer dizer que o mo- da razão com a demência, com a loucura.
delo esteja decidido. (Superinteressante, ed. Na literatura, encontra-se a inclusão dos pro-
34, fev. 2015, p. 20) blemas humanos mais terríveis, coisas 18in-
b) As inovações dão fôlego à civilização: quando suportáveis que nela se tornam suportáveis.
um novo passo da ciência origina um produ- Harold Bloom escreve: 24”Todas as 25grandes
to disruptor, surgem mercados que alimen- obras revelam a universalidade humana
tam a economia. (Veja, 3 dez. 2014) através de destinos singulares, de situações
singulares, de épocas singulares”. É essa a
107
razão por que as 19obras-primas atravessam pelas ruas de São Paulo, vemos essas pesso-
7
séculos, sociedades e nações. as 3dormindo nas 28calçadas, 4passando por
2
Agora chegamos à parte mais humana da situações constrangedoras, 5pedindo esmo-
inclusão: a inclusão do outro para a com- las para sobreviver. Essa é a realidade das
preensão humana. A compreensão nos torna pessoas que 2fazem da rua sua casa e nela
mais generosos com relação ao outro23, e o constroem sua 35intimidade. 18Assim, a ideia
criminoso não é unicamente mais visto como
de 33individualização que está nas 31casas, na
criminoso, 26como o Raskolnikov de Dostoie- 34
separação das coisas por 30cômodos e quar-
vsky, como o Padrinho de Copolla.
tos que servem para proteger a intimidade
A literatura, o teatro e o cinema são os me-
lhores meios de compreensão e de inclusão do indivíduo, 14ganha outro sentido. O 6viver
do outro. Mas a compreensão se torna provi- nas 29ruas, um lugar 19aparentemente 36ina-
sória, esquecemo-nos depois da leitura, da bitável, tem sua própria lógica de funciona-
peça e do filme. Então essa compreensão é mento, que vai além das possibilidades.
que deveria ser introduzida e desenvolvida A relação que o homem 8estabelece com o
em nossa vida pessoal e social, porque servi- espaço que ocupa é uma das mais importan-
ria para melhorar as relações humanas, para tes para sua sobrevivência. As mudanças de
melhorar a vida social. comportamento social 15foram 21sempre pre-
Adaptado de: MORIN, Edgar. A inclusão: verdade cedidas de 22mudanças físicas de local. Por
da literatura. In: RÕSING, Tânia et ai. Edgar Morin:
religando fronteiras. Passo Fundo: UPF, 2004. p.13-18
23
mais que a rua não seja um local para 7vi-
ver, já que se trata de um ambiente públi-
co, de passagem e não de permanência, ela
7. (Ufrgs 2015) Considere as seguintes afir- acaba sendo, 25senão única, a 24mais viável
mações, referentes ao uso de tempos e mo- opção. Alguns pensadores já apontam que a
dos verbais no texto. habitação 9é um ponto base e 10adquire uma
I. O emprego do presente na forma verbal importância para harmonizar a vida. O pen-
revelam (ref. 27) reforça o caráter gene- sador Norberto Elias comenta que “o quarto
ralizador da afirmação, já sinalizado pelo de dormir tornou-se uma das áreas mais pri-
emprego de Todas (ref. 28).
vadas e íntimas da vida humana. Suas pare-
II. Os usos de futuro do pretérito em deveria
des visíveis e 37invisíveis vedam os aspectos
(ref. 29) e serviria (ref. 30) contribuem
mais ‘privados’, ‘íntimos’, irrepreensivel-
para mostrar que o autor conclui a argu-
mentação com soluções possíveis e dese- mente ‘animais’ da nossa existência à vista
jáveis. de outras pessoas”.
III. A presença no texto de verbos nos modos O modo como essas pessoas 27constituem o
indicativo e subjuntivo confere sentidos único espaço que lhes foi permitido indi-
de certeza e de possibilidade à argumen- ca que conseguiram transformá-lo em “seu
tação. 20
lugar”, que aproximaram, cada um à sua
Quais estão corretas? maneira, 16dois mundos nos quais estamos
a) Apenas I. 32
inseridos: o público e o privado.
b) Apenas II. RODRIGUES, Robson. Moradores de uma terra
c) Apenas I e II. sem dono. (fragmento adaptado) In: http://
d) Apenas I e III. sociologiacienciaevida.uol.com.br/ESSO/edicoes/32/
e) I, II e III. artigo194186-4.asp. Acesso em 21/8/2014.

TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO: 8. (Pucrs 2015) Quanto ao emprego dos verbos
TEXTO 1 no texto, NÃO é correto afirmar que
a) “fazer” tem sentido diferente nas referências
Entre o espaço público e o privado 1 e 2.
b) “dormindo” (ref. 3), “passando” (ref. 4) e
12
Excluídos da sociedade, os moradores de
rua 26ressignificam o único espaço 13que “pedindo” (ref. 5) indicam ações não con-
lhes foi permitido ocupar, o espaço público, cluídas no presente.
transformando-o em seu “lugar”, um espaço c) “viver” nas ocorrências marcadas pelas refe-
privado. 11Espalhados pelos ambientes cole- rências 6 e 7 tem valor de substantivo.
tivos da cidade, 1fazendo comida no asfalto, d) “estabelece” (ref. 8) expressa uma realidade
arrumando suas camas, limpando as calça- permanente.
das como se estivessem dentro de uma casa: e) “é” (ref. 9) e “adquire” (ref. 10) pertencem a
17
assim vivem os moradores de rua. Ao andar orações sintaticamente paralelas.
108
E.O. Teste III Foi quando madama deu o último vexame.
Olhou pela janela (ela pedira para ficar do
lado da janelinha para ver a paisagem) e gri-
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO: tou:
– Puxa vida!!!
A estranha passageira Todos olharam para ela, inclusive eu. Mada-
Stanislaw Ponte Preta ma apontou para a janela e disse:
– Olha lá embaixo.
– O senhor sabe? É a primeira vez que eu via- Eu olhei. E ela acrescentou: – Como nós esta-
jo de avião. Estou com zero hora de voo - e mos voando alto, moço.
riu nervosinha, coitada. Olha só... o pessoal lá embaixo parece for-
Depois pediu que eu me sentasse ao seu miga.
lado, pois me achava muito calmo e isto iria Suspirei e lasquei:
fazer-lhe bem. Lá se foi a oportunidade de – Minha senhora, aquilo são formigas mes-
ler o romance policial que eu comprara no mo. O avião ainda não levantou voo.
aeroporto, para me distrair na viagem. Sus- <http://atividadeslinguaportuguesa.blogspot.com.
pirei e me fiz de educado respondendo que br/2013/08/a-estranha-passageira-estanislaw-
estava às suas ordens. ponte.html> Acesso em: 26.02.2015. Adaptado.
Afinal estava ali pronta para viajar. Os outros
* azougue: indivíduo que expressa
passageiros estavam já se divertindo às mi-
ligeireza; quem é muito rápido.
nhas custas, a zombar do meu embaraço ante
as perguntas que aquela senhora me fazia
aos berros, como se estivesse em sua casa, 1. (G1 - cps 2015) “O comandante já esquen-
entre pessoas íntimas. A coisa foi ficando tara os motores e a aeronave estava parada,
ridícula: esperando ordens para ganhar a pista de de-
– Para que esse saquinho aí? – foi a pergunta colagem. Percebi que minha vizinha de ban-
que fez, num tom de voz que parecia que ela co apertava os olhos e lia qualquer coisa.”
estava no Rio e eu em São Paulo. As formas verbais em destaque foram em-
– É para a senhora usar em caso de necessi- pregadas no modo indicativo e a respeito
dade – respondi baixinho. delas é correto afirmar que
Tenho certeza de que ninguém ouviu minha a) esquentara está no pretérito mais-que-per-
resposta, mas todos adivinharam qual foi, feito e expressa incerteza sobre os fatos.
porque ela arregalou os olhos e exclamou: b) esquentara está no pretérito imperfeito e ex-
– Uai... as necessidades neste saquinho? pressa convicção sobre fatos futuros.
No avião não tem banheiro? Alguns passa- c) percebi está no pretérito perfeito e expressa
geiros riram, outros – por fineza – fingiram ação concluída no passado.
ignorar o lamentável equívoco da incômoda d) apertava está no pretérito perfeito e expressa
passageira de primeira viagem. Mas ela era ação habitual e repetitiva.
um azougue* (...) e não parava de badalar. e) percebi está no pretérito imperfeito e expres-
Olhava para trás, olhava para cima, mexia na sa ação que perdura até o presente.
poltrona e quase levou um tombo, quando
puxou a alavanca e empurrou o encosto com TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
força, caindo para trás e esparramando em-
brulhos por todos os lados. A garagem de casa
O comandante já esquentara os motores e a 1
Com o portão enguiçado, e num 2convite a
aeronave estava parada, esperando ordens 3
ladrões de livros, a 4garagem de casa lembra
para ganhar a pista de decolagem. Percebi uma biblioteca pública permanentemente
que minha vizinha de banco apertava os aberta para a rua. 5Mas não são 6adeptos de
olhos e lia qualquer coisa. Logo veio a per- literatura 7os indivíduos que ali se abrigam
gunta: da chuva ou do sol a pino de verão. 8Esses
– Quem é essa tal de emergência que tem desocupados 9matam o tempo jogando porri-
uma porta só pra ela? nha, ou lendo os jornais velhos que mamãe
Expliquei que emergência não era ninguém, amontoa num canto, sentados nos degraus
a porta é que era de emergência, isto é, em do escadote com que ela alcança as pratelei-
caso de necessidade, saía-se por ela. ras altas. 10Já quando fazem o obséquio de
Madama sossegou e os outros passageiros me liberar o espaço, de tempos em tempos
já estavam conformados com o término do entro para olhar as estantes onde há de tudo
“show”. Mesmo os que mais se divertiam um pouco, em boa parte remessas de editores
com ele resolveram abrir jornais, revistas ou estrangeiros que têm apreço pelo meu pai.
se acomodarem para tirar uma pestana du- 11
Num reduto de literatura tão sortida, como
rante a viagem. bem sabem os habitués de sebos, fascina a
109
perspectiva de por puro acaso dar com um li- 2. (Uece 2015) Lendo o texto com atenção, ve-
vro bom. 12Ou by serendipity, como dizem os rifica-se que quase todos os verbos estão no
ingleses quando na caça a um tesouro se tem presente do indicativo. Amparado por essa
a felicidade de deparar com outro bem, mais constatação, assinale o que estiver correto
precioso ainda. Hoje revejo na mesma prate- sobre o enunciador do texto.
leira velhos conhecidos, algumas dezenas de a) Ele enuncia, isto é, expressa-se, de um lugar
livros turcos, ou búlgaros ou húngaros, que no passado, valendo-se de lembranças.
papai é capaz de um dia querer destrinchar. b) Ele enuncia de um lugar no presente, obser-
Também continua em evidência o livro do vando o que acontece a sua volta.
poeta romeno Eminescu, que papai ao menos c) Ele enuncia de um lugar no passado, lançan-
13
tentou ler, como é fácil inferir das folhas do mão das informações dos parentes.
cortadas a espátula. Há uma edição em alfa- d) Ele enuncia de um lugar no presente, criando
beto árabe das Mil e Uma Noites que ele não a ilusão de que escreve enquanto vive.
14
leu, mas cujas ilustrações 15admirou longa-
mente, como denunciam os filetes de cinzas TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
na junção das suas páginas coloridas. Hoje
tenho experiência para saber quantas vezes O que havia de tão revolucionário na Revolu-
meu pai 16leu um mesmo livro, posso quase ção Francesa? Soberania popular, liberdade
medir quantos minutos ele se 17deteve em civil, igualdade perante a lei – 1as palavras
cada página. 18E não costumo perder tempo hoje são ditas com tanta facilidade que so-
com livros que ele nem sequer 19abriu, en- mos incapazes de imaginar seu caráter ex-
tre os quais uns poucos eleitos que mamãe plosivo em 1789. Para os franceses do Anti-
20
teve o capricho de empilhar numa ponta de go Regime, 6os homens eram 8desiguais, e a
prateleira, confiando numa futura redenção. desigualdade era uma boa coisa, adequada à
Muitas vezes a vi de manhãzinha compade- ordem hierárquica que 2fora posta na natu-
cida dos livros estatelados no escritório, com reza pela própria obra de Deus. A liberdade
especial carinho pelos que trazem a foto do significava privilégio – isto é, literalmente,
autor na capa e que papai despreza: parece
12
“lei privada”, uma prerrogativa 13especial
disco de cantor de rádio. para fazer algo negado a outras pessoas. O
(Chico Buarque. O irmão alemão. 1 ed. São Paulo.
rei, como fonte de toda a lei, distribuía pri-
Companhia das letras. 2014. p. 60-61. vilégios, 3pois havia sido 19ungido como 16o
Texto adaptado com o acréscimo do título.) agente de Deus na terra.
Durante todo 17o século XVIII, os filósofos
A obra O irmão alemão, último livro de Chi- do Iluminismo questionaram esses 9pressu-
co Buarque de Holanda, tem como móvel da postos, e os panfletistas profissionais conse-
narrativa a existência de um desconhecido guiram 14empanar 20a aura sagrada da coroa.
irmão alemão, fruto de uma aventura amo- Contudo, a desmontagem do quadro mental
rosa que o pai dele, Sérgio Buarque de Ho- do Antigo Regime demandou violência icono-
landa, tivera com uma alemã, lá pelo final clasta, destruidora do mundo, revolucionária.
da década de 30 do século passado. Exata- 7
Seria ótimo se pudéssemos associar 18a Re-
mente quando Hitler ascende ao poder na volução exclusivamente à Declaração dos Di-
Alemanha. Esse fato é real: o jornalista, his- reitos do Homem e do Cidadão, mas ela nas-
toriador e sociólogo Sérgio Buarque de Ho- ceu na violência e imprimiu seus princípios
landa, na época, solteiro, deixou esse filho em um mundo violento. Os conquistadores da
na Alemanha. Na família, no entanto, não Bastilha 24não se limitaram a destruir 21um
se falava no assunto. Chico teve, por acaso, símbolo do despotismo real. 4Entre eles, 150
conhecimento dessa aventura do pai em uma foram mortos ou feridos no assalto à prisão
reunião na casa de Manuel Bandeira, por co- e, quando os sobreviventes apanharam o di-
mentário feito pelo próprio Bandeira. retor, cortaram sua cabeça e desfilaram-na
Foi em torno da pretensa busca desse pre- por 25Paris 22na ponta de uma lança.
tenso irmão que Chico Buarque desenvolveu Como podemos captar esses momentos de
sua narrativa ficcional, o seu romance. loucura, quando tudo parecia possível e o
Sobre a obra, diz Fernando de Barros e Sil- mundo se afigurava como uma tábula rasa,
va: “o que o leitor tem em mãos [...] não é apagada por uma onda de comoção popular
um relato histórico. Realidade e ficção es- e pronta para ser redesenhada? Parece in-
tão aqui entranhadas numa narrativa que crível que um povo inteiro fosse capaz de se
embaralha sem cessar memória biográfica e levantar e transformar as condições da vida
ficção”. cotidiana. Duzentos anos de experiências
110
com admiráveis mundos 26novos tornaram- nobreza, representado pela Rainha Leonor
-nos 15céticos quanto ao 10planejamento so- Teles, cingira o Mestre de Avis com a coroa
cial. 27Retrospectivamente, a Revolução pode lusitana. Era ela, portanto, quem devia me-
parecer um 23prelúdio ao 11totalitarismo. recer do novo rei o melhor das suas atenções.
Pode ser. Mas um excesso de visão 28histórica Esgotadas as possibilidades do reino com as
retrospectiva pode distorcer o panorama de pródigas dádivas reais, restou apenas o re-
1789. Os revolucionários franceses não eram curso da expansão externa para contentar os
nossos contemporâneos. E eram um conjunto insaciáveis companheiros de D. João I.
de pessoas não excepcionais em circunstân- Caio Prado Júnior, Evolução política do Brasil. Adaptado.
cias excepcionais. Quando as coisas se 29de-
sintegraram, eles reagiram a uma necessida-
de imperiosa de dar-lhes sentido, ordenando 4. (Fuvest 2012) No contexto, o verbo “enche”
a sociedade segundo novos princípios. Esses indica
princípios ainda permanecem como uma de- a) habitualidade no passado.
núncia da tirania e da injustiça. 5Afinal, em b) simultaneidade em relação ao termo “ascen-
que estava empenhada a Revolução France- são”.
c) ideia de atemporalidade.
sa? Liberdade, igualdade, fraternidade.
d) presente histórico.
Adaptado de: DARNTON, Robert. O beijo de Lamourette.
In: ____. O beijo de Lamourette: mídia, cultura e e) anterioridade temporal em relação a “reino
revolução. São Paulo: Cia. das Letras, 2010. p. 30-39. lusitano”.

3. (Ufrgs 2014) Considere as seguintes afirma- TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:


ções acerca do emprego de tempos verbais As questões a seguir tomam por base uma
no texto. passagem do romance regionalista Vidas se-
I. O emprego do pretérito imperfeito ao cas, de Graciliano Ramos (1892-1953).
longo do primeiro parágrafo, a partir da
referência 6, dá aos eventos narrados um Contas
caráter de continuidade, estabelecendo
as características do Antigo Regime como Fabiano recebia na partilha a quarta parte
um pano de fundo. dos bezerros e a terça dos cabritos. Mas como
II. O emprego do pretérito perfeito no se- não tinha roça e apenas se limitava a semear
gundo parágrafo representa o passado de na vazante uns punhados de feijão e milho,
modo pontual. comia da feira, desfazia-se dos animais, não
III. O emprego do pretérito na forma subjun- chegava a ferrar um bezerro ou assinar a
tiva que ocorre na referência 7 é exigido orelha de um cabrito.
por sua relação com o futuro do pretérito Se pudesse economizar durante alguns me-
do indicativo em Seria, na mesma linha. ses, levantaria a cabeça. Forjara planos. Toli-
Quais estão corretas? ce, quem é do chão não se trepa. Consumidos
a) Apenas I. os legumes, roídas as espigas de milho, re-
b) Apenas II. corria à gaveta do amo, cedia por preço baixo
c) Apenas III. o produto das sortes.
d) Apenas I e III.
Resmungava, rezingava, numa aflição, ten-
e) I, II e III.
tando espichar os recursos minguados, en-
gasgava-se, engolia em seco. Transigindo
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO: com outro, não seria roubado tão descarada-
mente. Mas receava ser expulso da fazenda.
Não era e não podia o pequeno reino lusita- E rendia-se. Aceitava o cobre e ouvia conse-
no ser uma potência colonizadora à feição lhos. Era bom pensar no futuro, criar juízo.
da antiga Grécia. O surto marítimo que en- Ficava de boca aberta, vermelho, o pescoço
che sua história do século XV não resultara inchando. De repende estourava:
do extravasamento de nenhum excesso de – Conversa. Dinheiro anda num cavalo e nin-
população, mas fora apenas provocado por guém pode viver sem comer. Quem é do chão
uma burguesia comercial sedenta de lucros, não se trepa.
e que não encontrava no reduzido território Pouco a pouco o ferro do proprietário quei-
pátrio satisfação à sua desmedida ambição. mava os bichos de Fabiano. E quando não
A ascensão do fundador da Casa de Avis ao tinha mais nada para vender, o sertanejo
trono português trouxe esta burguesia para endividava-se. Ao chegar a partilha, estava
um primeiro plano. Fora ela quem, para se encalacrado, e na hora das contas davam-lhe
livrar da ameaça castelhana e do poder da uma ninharia.
111
Ora, daquela vez, como das outras, Fabiano
ajustou o gado, arrependeu-se, enfim deixou
E.O. Dissertativo
a transação meio apalavrada e foi consultar
a mulher. Sinha Vitória mandou os meni- 1. (UFG) A frase abaixo foi extraída de um
nos para o barreiro, sentou-se na cozinha, anúncio que “vende” produto para pele:
concentrou-se, distribuiu no chão sementes
de várias espécies, realizou somas e dimi- Hoje você é uma uva.
nuições. No dia seguinte Fabiano voltou à Mas cuidado, uva passa.
cidade, mas ao fechar o negócio notou que (Cláudia, ago.1996)
as operações de Sinha Vitória, como de cos-
a) Comente a superposição de funções gramati-
tume, diferiam das do patrão. Reclamou e
cais que recai sobre a palavra ‘passa’.
obteve a explicação habitual: a diferença era
proveniente de juros. b) Explique os efeitos persuasivos provocados
Não se conformou: devia haver engano. Ele por essa superposição.
era bruto, sim senhor, via-se perfeitamen- c) Discorra sobre a função da linguagem que
te que era bruto, mas a mulher tinha miolo. predomina na frase.
Com certeza havia um erro no papel do bran-
co. Não se descobriu o erro, e Fabiano perdeu
os estribos. Passar a vida inteira assim no 2. (Fuvest) Leia este texto.
toco, entregando o que era dele de mão bei- O ano nem sempre foi como nós o conhece-
jada! Estava direito aquilo? Trabalhar como mos agora. Por exemplo: no antigo calendário
negro e nunca arranjar carta de alforria! romano, abril era o segundo mês do ano. E na
O patrão zangou-se, repeliu a insolência, França, até meados do século XVI, abril era
achou bom que, o vaqueiro fosse procurar
o primeiro mês. Como havia o hábito de dar
serviço noutra fazenda.
presentes no começo de cada ano, o primeiro
Aí Fabiano baixou a pancada e amunhecou.
dia de abril era, para os franceses da épo-
Bem, bem.
Não era preciso barulho não. Se havia dito ca, o que o Natal é para nós hoje, um dia de
palavra à toa, pedia desculpa. Era bruto, alegrias, salvo1 para quem ganhava meias ou
não fora ensinado. Atrevimento não tinha, uma água-de-colônia barata. Com a introdu-
conhecia o seu lugar. Um cabra. Ia lá puxar ção do calendário gregoriano, no século XVI,
questão com gente rica? Bruto, sim senhor, primeiro de janeiro passou a ser o primeiro
mas sabia respeitar os homens. Devia ser dia do ano e, portanto, o dia dos presentes. E
ignorância da mulher, provavelmente devia primeiro de abril passou ser um falso Natal –
ser ignorância da mulher. Até estranhara as o dia de não se ganhar mais nada.
contas dela. Enfim, como não sabia ler (um Por extensão, o dia de ser iludido. Por exten-
bruto, sim senhor), acreditara na sua velha. são, o Dia da Mentira.
Mas pedia desculpa e jurava não cair noutra.
Luís F. Veríssimo, As mentiras que os
(Graciliano Ramos. Vidas secas. São Paulo:
homens contam. Adaptado.
Livraria Martins Editora, 1974.)

a) Tendo em vista o contexto, é correto afirmar


5. (Unesp 2011) No fragmento apresentado, que o trecho “meias ou uma água-de-colônia
de Vidas secas, as formas verbais mais fre-
barata” deve ser entendido apenas em seu
quentes se enquadram em dois tempos do
sentido literal? Justifique sua resposta.
modo indicativo.
b) Crie uma frase que contenha um sinônimo
Marque a alternativa que indica, pela ordem,
o tempo verbal predominante no segundo da palavra “salvo” (ref. 1), mantendo o sen-
parágrafo e o que predomina no quinto pa- tido que ela tem no texto.
rágrafo.
a) pretérito perfeito – pretérito imperfeito. TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
b) presente – pretérito imperfeito.
c) presente – pretérito perfeito. Examine este anúncio de uma instituição fi-
d) futuro do pretérito – presente. nanceira, cujo nome foi substituído por X,
e) pretérito imperfeito – pretérito perfeito. para responder às questões a seguir.
112
[...]
Com efeito, não basta, por exemplo, que eu
viva num país onde há liberdade de viajar
ao exterior para poder fazê-lo, mesmo se eu
quiser. Posso ser impedido por minha situa-
ção social ou simplesmente por meus recur-
sos financeiros: passamos aqui do problema
formal da liberdade política (a questão do
regime) ao problema da justiça econômica (o
sistema social), e desta não depende mais
apenas a questão da liberdade “formal” (te-
mos o direito de fazer?), e sim a questão da
liberdade “material” (temos o meio de fa-
zer?). Pode haver também outros obstáculos
para exercer um direito política e juridica-
mente reconhecido; posso, por exemplo, ser
deficiente físico, estar doente etc. Seja como
for, a característica mais geral dessa liberda-
de como “capacidade de fazer o que se quer”
é ser gradual – ao contrário da precedente
que existe ou não existe – e proporcional aos
meios de que dispõe o sujeito – de qualquer
3. (Fuvest 2016) Com base na parte escrita do ordem que sejam: meios econômicos, físi-
anúncio, responda. cos, culturais etc. Quanto maiores os meios
a) Qual é a relação temporal que se estabele- (riqueza, cultura, saúde, força etc.), mais
ce entre os verbos “conhecer”, “oferecer”, se pode fazer o que se quer, e portanto se é
“proporcionar” e “alcançar”? Explique. mais, nesse sentido.
Texto adaptado de WOLFF, Francis. “A invenção materialista
b) Complete a frase abaixo, flexionando de for- da liberdade”. In: NOVAES, Adauto (org.). O avesso da
ma adequada os verbos “oferecer”, “propor- liberdade.
cionar” e “alcançar”. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. p. 16-17
Conhecer profundamente os negócios de
nossos clientes é só o primeiro passo que a) O texto reporta-se a dois conceitos distintos
permite que __________ sempre respostas de liberdade. Identifique-os e, usando suas
mais rápidas, __________ decisões mais as- próprias palavras, explique a diferença que
sertivas e __________ melhores resultados. existe entre eles.
b) Sem que haja alteração de sentido, reescre-
va cada trecho abaixo, observando o início
4. (Pucrj 2014) Podemos primeiramente dis- proposto a seguir e fazendo as modificações
tinguir dois grandes sentidos da palavra li- necessárias.
berdade. i) Não basta que eu viva num país onde há
Quando tratamos das relações entre “demo- liberdade de viajar ao exterior para poder
cracia e liberdade”, ou quando nos pergun- fazê-lo, mesmo se eu quiser.
tamos se em tal país se é livre, ou quando Não bastava __________________________
invocamos as liberdades políticas, as liberda- ii) Posso ser impedido de viajar ao exterior por
des fundamentais, ou ainda quando dizemos minha situação social.
de um homem que ele é livre (por oposição Minha situação social __________________
a um escravo ou a um preso), referimo-nos
ao que se pode chamar liberdade de direito,
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
isto é, em linhas gerais, a ausência de coer-
ções externas – as interdições e as obriga- Diálogo da relativa grandeza
ções – nascidas do Estado, da coletividade ou
da sociedade. [...] Sentado no monte de lenha, as pernas aber-
Há um segundo sentido, que se pode chamar tas, os cotovelos nos joelhos, Doril examinava
liberdade de fato, por oposição à de direito: um louva-deus pousado nas costas da mão.
não se trata mais de perguntar “é permitido Ele queria que o bichinho voasse, ou pulas-
fazer (dizer, pensar)?”, mas “é possível fa- se, mas o bichinho estava muito à vontade,
zer (pensar querer...)?”. Não nos referimos vai ver que dormindo – ou pensando? Doril
mais à ausência de coerções extrínsecas (as tocava-o com a unha do dedo menor e ele
leis civis, as obrigações sociais, as regras co- nem nada, não dava confiança, parece que
letivas, as interdições...), mas intrínsecas – nem sentia; se Doril não visse o leve pulsar
aquelas que concernem ao próprio sujeito. de 1fole do pescoço – e só olhando bem é que
113
se via – 7era capaz de dizer que o pobrezinho louva-deus. Soprou-o de leve, ele encolheu-
estava morto, ou então que era um grilo de -se e vergou o corpo para o lado do sopro,
brinquedo, desses que as moças pregam no como faz uma pessoa na ventania. O louva-
vestido para enfeitar. -deus estava no meio de uma tempestade de
Entretido com o louva-deus, Doril não viu vento, dessas que derrubam árvores e arran-
Diana chegar comendo um marmelo, fruta cam telhados e podem até levantar uma pes-
azeda enjoada que só serve para ranger os soa do chão. Doril era a força que mandava a
dentes. Ela parou perto do monte de lenha tempestade e que podia pará-la quando qui-
e ficou descascando o marmelo com os den- sesse. Então ele era Deus? 6Será que as nossas
tes mas sem jogar a casca fora, não queria tempestades também são brincadeira? Será
perder nada. Quando ela já tinha comido um que quem manda elas olha para nós como
bom pedaço da parte de cima e nada de Do- Doril estava olhando para o louva-deus? Será
ril ligar, ela cuspiu fora um pedaço de miolo que somos pequenos para ele como um gafa-
com semente e falou: nhoto é pequeno para nós, ou menores ain-
– Está direitinho um macaco em galho de da? De que tamanho, comparando – do de
pau. formiga? De piolho de galinha? Qual será o
Doril olhou só com os olhos e revidou: nosso tamanho mesmo, verdadeiro?
– Macaco é quem fala. Está até comendo ba- José J. Veiga. A máquina extraviada. Rio
nana. de Janeiro: Editora Prelo, 1968.
– Marmelo é banana, besta? 1
fole − papo
– Não é mas serve. 2
dízima − refere-se à dízima periódica, algo sem fim
Ficaram calados, cada um pensando por seu 3
judiar − maltratar
lado. Diana cuspiu mais um caroço.
4
renitente − teimosa
– Sabe aquele livro de história que o Mirto
ganhou? 5. (Uerj 2014) era capaz de dizer que o pobre-
– Que Mirto, seu. É Milllton. Mania! zinho estava morto, (ref. 7)
– Mas sabe? Eu vou ganhar um igual. Tia Continuariam até um se cansar e tapar o ou-
Jura vai mindar. vido para ficar com a última palavra, (ref. 8)
– Não é mindar. É me-dar. Mas não é vanta- qualquer coisa que ele dissesse (ref. 9)
gem.
– Não é vantagem? É muita vantagem. Será que as nossas tempestades também são
– Você já não leu o de Milton? brincadeira? (ref. 6)
– Li mas quero ter. Pra guardar e ler de novo. Nestas quatro passagens, retratam-se situações
– Vantagem é ganhar outro. Diferente. hipotéticas, apenas imaginadas pelo narrador
– Deferente eu não quero. Pode não ser bom. ou pelos personagens. Caracterize a forma lin-
– Como foi que você disse? Diz de novo? guística usada em cada uma para exprimir supo-
– Já disse uma vez, chega. sição em lugar de certeza.
– Você disse deferente.
– Foi não. TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
– Foi. Eu ouvi.
– Foi não. Tempo: cada vez mais acelerado
– Foi. Pressa. Ansiedade. E a sensação de que nun-
– Foi não. ca é possível fazer tudo — além da certe-
– Fooooi. za de que sua vida está passando rápido
8
Continuariam até um se cansar e tapar o demais. Essas são as principais consequên-
ouvido para ficar com a última palavra, se cias de vivermos num mundo em que para
Diana não tivesse tido a habilidade de se tudo vale a regra do “quanto mais rápido,
retirar logo que percebeu a 2dízima. Com o melhor”. “Para nós, ocidentais, o tempo é li-
pedacinho final do marmelo entre os dedos near e nunca volta. Por isso queremos ter a
ela chegou-se mais perto do irmão e disse: sensação de que estamos tirando o máximo
– Gi! Matando louva-deus! Olhe o castigo! dele. E a única solução que encontramos é
– Eu estou matando, estou? acelerá-lo”, afirma Carl Honoré. “É um equí-
– Está 3judiando. Ele morre. voco. A resposta a esse dilema é qualidade,
– Eu estou judiando? não quantidade.”
– Amolar um bicho tão pequenininho é o Para James Gleick, Carl está lutando uma
mesmo que judiar. batalha invencível. “A aceleração é uma
Doril não disse mais nada, 9qualquer coisa escolha que fizemos. Somos como crianças
que ele dissesse ela aproveitaria para outra descendo uma ladeira de skate. Gostamos
acusação. da brincadeira, queremos mais velocidade”,
Era difícil tapar a boca de Diana, ô menina diz. O problema é que nem tudo ao nosso re-
4
renitente. 5Ele preferiu continuar olhando o dor consegue atender à demanda. Os carros
114
podem estar mais rápidos, mas as viagens
demoram cada vez mais por culpa dos con-
E.O. Teste III
gestionamentos. Semáforos vermelhos con- 1. C 2. D 3. E 4. D 5. E
tinuam testando nossa paciência, obrigan-
do-nos a frear a cada quarteirão. 1Mais sorte
têm os pedestres, que podem apertar o botão E.O. Dissertativo
que aciona o sinal verde — uma ótima opção 1.
para despejar a ansiedade, mas com efeito a) A palavra “passa” pode ser entendida de
muitas vezes nulo. Em Nova York, esses sis-
duas maneiras: como um ADJETIVO, es-
temas estão desligados desde a década de
pecificando um tipo de “uva” (uva-passa
1980. Mesmo assim, milhares de pessoas o
= murcha), e também pode ser entendida
utilizam diariamente.
como sendo o VERBO “passar”, indican-
É um exemplo do que especialistas chamam
do que as uvas passam através do tempo,
de “botões de aceleração”. Na teoria, deixam
dando ideia de envelhecimento.
as coisas mais rápidas. Na prática, servem
para ser apertados e só. Confesse: que raios b) Tenta-se convencer o leitor de que o en-
fazemos com os dois segundos, no máximo, velhecimento é algo inevitável, e que,
que economizamos ao acionar aquelas teclas portanto, deve-se fazer uso de cremes hi-
que fecham a porta do elevador? E quem dis- dratantes.
se que apertá-las, duas, quatro, dez vezes, c) Encontramos duas funções da linguagem:
vai melhorar a eficiência? a primeira é a poética, por conta do jogo
Elevadores, aliás, são ícones da pressa em formal com as palavras uva x uva-passa
tempos velozes. Os primeiros modelos se mo- x passa (verbo). Também temos função
viam a vinte centímetros por segundo. Hoje, apelativa (ou conativa), pois tenta-se
o mais veloz sobe doze metros por segundo. persuadir o leitor sobre a necessidade de
E, mesmo acelerando, estão entre os maiores compra do produto.
focos de impaciência. Engenheiros são obri- 2.
gados a desenvolver sistemas para conter a) Não, a referência a “meias ou uma água-
nossa irritação, como luzes ou alarmes cuja -de-colônia barata” é usada ironicamente
única função é aplacar a ansiedade da espe- em sentido figurado, aludindo a um pre-
ra. Até onde isso vai? sente banal, adquirido sem grande envol-
SÉRGIO GWERCMAN vimento ou preocupação em causar satis-
Adaptado de <super.abril.com.br>. fação à pessoa a quem vai ser oferecido.
b) Qualquer frase que contivesse os termos
“exceto”, “à exceção de” ou “afora” man-
6. (Uerj 2013) O autor do texto aborda uma
teria a noção de exclusão que a palavra
situação que diz respeito a toda a sociedade,
“salvo” expressa no terceiro período do
envolvendo tanto ele como o leitor.
texto, como por exemplo: Todos os países
Nomeie a marca linguística empregada para
indicar a inclusão do autor e dos seus leito- da América Latina possuem faixa litorâ-
res na situação. Em seguida, transcreva um nea, exceto Bolívia e Paraguai.
trecho que exemplifique sua resposta. 3.
a) A sequência dos verbos “conhecer”,
“oferecer”, “proporcionar” e “alcançar”
estabelecem uma relação temporal de
Gabarito continuidade e progressão. Em primeiro
lugar, é necessário conhecer a atividade
do cliente, para depois oferecer propostas
E.O. Teste I que venham a proporcionar resultados
positivos e correspondam aos objetivos
1. C 2. C 3. B 4. B 5. D positivos do negócio.
6. D 7. A 8. E b) Os verbos mencionados devem ser conju-
gados no modo subjuntivo, na primeira
pessoa do plural: Conhecer profunda-
mente os negócios de nossos clientes é
E.O. Teste II só o primeiro passo que permite que ofe-
1. D 2. A 3. A 4. C 5. C reçamos sempre respostas mais rápidas,
proporcionemos decisões mais assertivas
6. A 7. C 8. C e alcancemos melhores resultados.
115
4.
a) O primeiro conceito se refere à liberdade
de direito, ou seja, à possibilidade de al-
guém agir sem ser impedido por causa de
restrições externas a ele, como regras e
proibições. O segundo conceito se refere
à liberdade de fato, ou seja, à possibilida-
de de alguém agir sem ser impedido por
causa de restrições internas, como saúde
e meios econômicos.
b)
i. Não bastava que eu vivesse num país
onde houvesse liberdade de viajar ao ex-
terior para poder fazê-lo, mesmo se eu
quisesse.
ii. Minha situação social pode me impedir
de viajar ao exterior.
A expressão era capaz exprime dúvida. En-
5.
quanto o verbo no futuro do pretérito mais
a preposição: continuariam até... exprimem
uma suposição por parte do narrador. A ex-
pressão qualquer coisa mais verbo no presen-
te do subjuntivo: que ele dissesse... expri-
mem uma situação de dúvida e de incerteza,
juntamente com o verbo será no exemplo
logo abaixo: Será que as nossas tempestades
também são brincadeira?
Logo, pode-se concluir que os recursos utili-
zados pelo narrador para indicar hipóteses
estão indicados, sobretudo pelos tempos ver-
bais.
6 A marca linguística que indica a inclusão
do autor e dos seus leitores na situação é o
uso de termos verbais na primeira pessoa do
plural e dos pronomes “nos” e “nosso(a)”:
“Essas são as principais consequências de
vivermos num mundo”; “ O problema é que
nem tudo ao nosso redor consegue atender
à demanda”; “Semáforos vermelhos continu-
am testando nossa paciência, obrigando-nos
a frear a cada quarteirão”; “que raios faze-
mos com os dois segundos, no máximo, que
economizamos ao acionar aquelas teclas que
fecham a porta do elevador?”; “ para conter
nossa irritação”. Também o imperativo do
termo verbal “Confesse” sugere igualmente
a inclusão do autor e dos leitores na situa-
ção.

116
LITERATURA

Aulas 1 e 2: A arte literária e o estudo dos gêneros 118


Aulas 3 e 4: Trovadorismo: a literatura da Idade Média 142
Aulas 5 e 6: Humanismo e Classicismo 162
Aulas 7 e 8: Classicismo: Camões épico e lírico 182
Aulas 9 e 10: Quinhentismo e Barroco 200
Aulas 11 e 12: Gregório de Matos Guerra, o Boca do Inferno 222
Aulas 13 e 14: Padre Antônio Vieira 238
Aulas 15 e 16: Arcadismo / Bocage (Portugal) 256
© Suchota/Shutterstock

Aulas 1 e 2
A arte literária e
o estudo dos gêneros
O que é arte?

Esse é um conceito historicamente muito discutido. Um estudo de Literatura que se pretenda aprofundado deve
levar em consideração os sentidos da arte e notadamente a análise técnica dela. A palavra literatura é de origem
latina e significa “arte de escrever”. Portanto, conjugar essa relação entre arte e escrita é o primeiro passo para
dar corpo à maneira de divulgar os valores culturais que estruturam uma sociedade e uma civilização. Entender
os conhecimentos científicos, filosóficos, místicos e artísticos de um dado contexto é de fato conhecer o próprio
homem e compreender sua identidade.
O filósofo Aristóteles considerava que a arte era uma maneira de “imitar” (mimesis, do grego) a realidade
do homem, que, em seus vários suportes, cria essa possibilidade de fazê-lo pensar sua própria vida, autoconhecer-
-se, encontrar-se como ser humano, observar criticamente a realidade, divertir-se e sonhar.
Da Antiguidade Clássica à Idade Moderna e Contemporânea, a arte se manifesta em vários suportes – mú-
sica, pintura, literatura, dança, escultura e teatro. Funciona como elemento transformador da consciência humana.
O artista, esse criador, cria e recria realidades, expressa valores estéticos com beleza, harmonia e equilíbrio e
estrutura-se à luz de um contexto de circulação, de transformação, de um agente e de um público.
No decorrer dos tempos, esses conceitos foram se transformando sem perder sua lógica. Seja na perfeição
e harmonia das formas da Antiguidade Clássica (período greco-latino), seja no teocentrismo medieval, com suas
relações de vassalagem, seja no século XIX, com suas utopias românticas, seja nas vanguardas artísticas do século
XX. Emoções humanas, alegrias e angústias, ideologias, religião, luta social e cultura sempre perpassaram e fre-
quentaram os conceitos estéticos da arte e da literatura.

A Literatura é um mundo aberto ao mesmo tempo


às múltiplas reflexões sobre a história do mundo,
sobre as ciências naturais, sobre as ciências socioló-
gicas, sobre a antropologia cultural, sobre os prin-
cípios éticos, sobre política, economia, ecologia (...)
MORIN, Edgar. Meus demônios. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1997.

119
O que nos leva a ir ao cinema, ao show, à biblio- “Tudo o que nos rodeia e que foi cria-
teca, ao museu e, principalmente, a ler um livro? A res- do pela mão do homem, todo o mundo
posta está no reflexo da própria condição humana, no da cultura, diferentemente do mun-
processo de identificação do homem com a arte. Essa do da natureza, tudo isso é produto da
imaginação e da criação humana.”
atitude transforma só pelo fato de estarmos refletindo,
VYGOTSKY, Lev S. Pensamento e linguagem.
primeira condição da arte. Esse ponto de partida, inde- São Paulo: Martins Fontes, 1987.
pendente de sua presumível qualidade, é uma forma de
compreender o mundo que nos cerca. O essencial em Literatura é estabelecer uma relação
É impossível não se identificar com o eu lírico, a voz de sentido entre as palavras e os leitores, para tanto, os escri-
do poema, ao lermos versos como este, de Manuel Bandeira: tores se valem de uma série de recursos técnicos que elevam
essa linguagem ao conceito de arte, diferindo, por exemplo,
O Bicho de um texto informativo ou instrucional, o texto literário
(Manuel Bandeira) deve explorar o potencial significativo e sonoro das palavras,
bem como os aspectos ora denotativos, em sua literalidade
Vi ontem um bicho de dicionário, ora no sentido conotativo em que as palavras
Na imundice do pátio adquirem novo sentido a fim de produzir efeito artístico.
Catando comida entre os detritos. O poder de explorar os sentidos colocam essas
Quando achava alguma coisa, palavras em situações inusitadas, criando imagens com
Não examinava nem cheirava: as figuras de linguagem nas quais o escritor “desenha”
Engolia com voracidade. para o leitor comparações que concretizam as emoções.
O bicho não era um cão, Como no uso da metáfora, que aproxima dois elementos
Não era um gato, num contexto específico transferindo de um para outro
Não era um rato. suas características. Como no exemplo a seguir, de Má-
O bicho, meu Deus, era um homem. rio Quintana, em que a “inspiração” é comparada por
metáfora a “um pássaro que pousa no livro que lês”.

Os poemas são pássaros que chegam


Comunicação e linguagem não se sabe de onde e pousam
no livro que lês.
A Literatura leva em consideração o emprego de ima- Quando fechas o livro, eles alçam voo
gens criadas a partir das palavras. como de um alçapão.
Eles não têm pouso
“A palavra está sempre carre- nem porto;
gada de um conteúdo ou senti- alimentam-se um instante em cada
par de mãos e partem.
do ideológico ou vivencial.”
E olhas, então, essas tuas mãos vazias,
BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem.
São Paulo: Hucitec, 1998. no maravilhado espanto de saberes
que o alimento deles já estava em ti...
Poesia completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2005, p. 469.
Essa linguagem artística respeita alguns parâme-
tros, alguns condicionamentos sociais e culturais, que
lhe oferecem a dimensão de suas verdades e o melhor
Prosa e poesia
modo de se dizer. A análise literária cabe construir um
processo de comunicação segundo o qual “o que” está Prosa e poesia são dois elementos constitutivos desse processo
sendo dito tenha estreita relação com o “como” está de comunicação literária que ganham formas diferentes. A pro-
sendo dito. É dessa simbiose que se estabelece uma es- sa é mais referencial e se vale do uso do texto corrido organiza-
tética específica, atrelada a um contexto específico, e se do da esquerda para a direita no papel ocidental sem preocu-
nomeia uma dada escola literária específica. pação com a forma, apenas com o conteúdo e a linhas cheias.
120
Já o poema está primordialmente preocupado com a forma e
adquire, no decorrer da história, várias estruturas a partir da lógica do
verso, que é a linha do poema, e de um conjunto deles, denominado
estrofe. Estão imersos num trabalho de ritmo e rimas que podem ou
não seguir padrões de tamanho e convenção. O termo “poesia”, “po-
ética” e “poeta” derivam do grego poíesis, poiêtikê, poiêtês, que em
soma significam criar.

O que é gênero literário?


Gênero é o modo como se veicula a mensagem literária, o padrão a
ser utilizado na composição artística. Há grandes diferenças de con-
teúdo e forma entre textos. Um poema não se confunde com um
conto, e um romance segue padrões bastante próprios em relação a
uma peça de teatro, por exemplo.
Na Antiguidade Clássica, Aristóteles conceituou conteúdo como
elemento constitutivo da representação das paixões, das ações e do
comportamento humano. A forma desse conteúdo, a princípio aplicada
apenas à poesia, compreende três gêneros: épico, lírico e dramático.

Odisseu e Penélope

O gênero épico
Épico é derivado do grego épos que, entre outras coisas, significa
palavra, verso, discurso. Esse gênero, também chamado de epopeia, nasceu A estrutura do poema épico
com a Ilíada e a Odisseia, de Homero. Oriundo das tradições orais, elas É dividido em partes, chamadas cantos,
que, por sua vez, são divididos em:
contam histórias que auxiliam o homem a entender a trajetória de seus po-
vos. É característica das narrativas mais antigas a simbolização dos ideais Proposição:
coletivos de um povo na figura de um herói imerso numa grande aventu- O texto apresenta o tema e o herói.
ra, numa guerra ou num acontecimento histórico. O eu-lírico da epopeia
Invocação:
relaciona-se diretamente com a sociedade. A imagem do herói é consti- O texto pede inspiração à musa (divin-
tuída de uma representação de seu povo, cujo comportamento exemplar dade inspiradora da poesia).
vai caracterizá-lo como figura predestinada a cumprir determinada missão.
Narração:
Narrados de maneira elevada e com vocabulário grandilo- Narração das aventuras do herói.
quente e solene, os assuntos históricos sofrem influência do imaginá-
Conclusão ou Epílogo:
rio e não se privam de recorrer à imaginação bem como à mitologia.
Encerramento das aventuras e conclu-
Na cena inicial da Odisseia, de Homero, é possível identificar são dos feitos heroicos.
características primordiais do texto épico, como o pedido de inspira-
ção do poeta às musas para contar a história de Odisseu, que passou
por terríveis provações até desfazer as muralhas de Troia:

Musa, reconta-me os feitos do herói astucioso que muito


peregrinou, dês que esfez as muralhas sagradas de Troia;
muitas cidades dos homens viajou, conheceu seus costumes,
como no mar padeceu sofrimentos inúmeros na alma,
para que a vida salvasse e a de seus companheiros a volta.
Homero. Odisseia. Tradução de: Carlos Alberto Nunes.
5. ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 1997. Coleção Universidades.

121
As epopeias são divididas em “clássicas ou primárias” ou de “imitação ou secundárias”.

Epopeias clássicas ou primárias

A estrutura dos poemas de Homero serviu de inspiração para outros


poetas, como o latino Virgílio, em Eneida (19 a.C.), e Camões, em
Os Lusíadas (1572). A Odisseia e a Ilíada, de Homero, são textos
clássicos que inspiraram e sistematizaram regras e estruturas formais
para os demais.
Nesse tipo de texto, os deuses são apresentados como seres
reais que são tomados por sentimentos humanos e podem tanto pre-
judicar como ajudar o herói, dependendo do seu estado emocional e
preponderância do tema narrado. Outro aspecto importante é perceber
a preocupação do poeta em relacionar as ações do herói com o povo a
Enéias foge em direção a península Itálica. que pertence a fim de criar uma divulgação da identidade pátria.

Epopeias de imitação ou secundárias

Entre os anos 30 e 19 a.C., o poeta latino Virgílio escreveu a Eneida,


considerada a “epopeia nacional dos romanos”. No classicismo re-
nascentista, o português Luís de Camões escreveu Os Lusíadas, um
dos mais conhecidos poemas épicos de imitação. Nele, são reveladas
as aventuras e peripécias do herói Vasco da Gama, primeiro nave-
gante que cruzou o Cabo da Boa Esperança, ao sul da África, e levou
os portugueses às Índias por uma nova rota comercial.

As transformações do herói
1. Na Ilíada e na Odisseia, o herói é guiado pelas divindades.
2. Na Eneida e em Os Lusíadas, o herói é representante de um povo.
3. Em Robson Crusoé e em O conde de Monte Cristo, o herói é humano
e individual.

O gênero lírico
Esse gênero nasceu na Grécia antiga, cujos poemas eram acompanhados musicalmente pela lira. É o gênero
centrado na expressão do “eu poético” ou “eu poemático” – voz que fala no poema, não necessariamente corres-
pondente à voz do autor.
Menos grandiosos que os da epopeia, seus temas dizem respeito ao mundo interior do eu lírico, aos senti-
mentos, ao individualismo, às relações consigo mesmo. Pronomes e verbos vêm normalmente na primeira pessoa
do singular e predominam as emoções, rimas, ritmo, sonoridade das palavras, metáforas, repetições, entre outras
figuras de linguagem, que trazem aos versos musicalidade e suavidade.
O gênero lírico é subdividido em: soneto, elegia, ode, madrigal, écloga etc. São formas poéticas mais afeitas
ao gênero lírico.
122
§§ Soneto – forma lírica bastante conhecida, é Que crime outrora feito, que pecado
composta de catorze versos, com dois quartetos Nos impôs esta estéril provação
e dois tercetos. Que é indistintamente nosso fado
Como o pressente nosso coração?
Soneto da fidelidade (...)
(Vinicius de Moraes)
Como – longínquo sopro altivo e humano! –
Essa tarde monótona e serena
De tudo ao meu amor serei atento
Em que, ao morrer, o imperador romano
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Disse: Fui tudo, nada vale a pena.
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.
§§ Ode – poema lírico de exaltação e homenagem,
Quero vivê-lo em cada vão momento
originado na Grécia antiga também, destina-
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
do ao canto. Composto de estrofes e de versos
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento iguais em tom alegre, entusiástico e de louvação.

E assim, quando mais tarde me procure


Ode do gato
Quem sabe a morte, angústia de quem vive (Pablo Neruda)
Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa me dizer do amor (que tive): Os animais foram
Que não seja imortal, posto que é chama imperfeitos,
Mas que seja infinito enquanto dure. compridos de rabo, tristes
de cabeça.
§§ Elegia – poema em tom triste e fúnebre origi- Pouco a pouco se foram
nado na Grécia antiga. Caracterizam as digres- compondo,
fazendo-se paisagem,
sões moralizantes destinadas a ajudar ouvintes
adquirindo pintas, graça voo.
ou leitores a suportar momentos difíceis da vida,
O gato,
como a morte de um ente querido ou de uma só o gato
personalidade pública. apareceu completo
e orgulhoso:
Elegia na sombra nasceu completamente terminado,
Fernando Pessoa (2 jun. 1935)
anda sozinho e sabe o que quer.

Lenta, a raça esmorece, e a alegria O homem quer ser peixe e pássaro,


É como uma memória de outrem. Passa a serpente quisera ter asas,
Um vento frio na nossa nostalgia o cachorro é um leão desorientado,
E a nostalgia torna-se desgraça. o engenheiro quer ser poeta,
a mosca estuda para andorinha,
Pesa em nós o passado e o futuro. o poeta trata de imitar a mosca,
Dorme em nós o presente. E a sonhar mas o gato
A alma encontra sempre o mesmo muro, quer ser só gato
E encontra o mesmo muro ao despertar. e todo gato é gato
Quem nos roubou a alma? Que bruxedo do bigode ao rabo,
De que magia incógnita e suprema do pressentimento à ratazana viva,
Nos enche as almas de dolência e medo da noite até os seus olhos de ouro.
Nesta hora inútil, apagada e extrema? Não há unidade
Os heróis resplandecem a distância como ele,
Num passado impossível de se ver não tem
Com os olhos da fé ou os da ância. a lua nem a flor
Lembramos névoa, sombras a esquecer. tal contextura:
123
é uma coisa Tudo sei, a vida e o seu arquipélago,
só como o sol ou o topázio, o mar e a cidade incalculável,
e a elástica linha em seu contorno a botânica
firme e sutil é como o gineceu com os seus extravios,
a linha da proa de uma nave. o pôr e o menos da matemática,
Os seus olhos amarelos os funis vulcânicos do mundo,
deixaram uma só ranhura a casca irreal do crocodilo,
para jogar as moedas da noite. a bondade ignorada do bombeiro,
Oh pequeno o atavismo azul do sacerdote,
imperador sem orbe, mas não posso decifrar um gato.
conquistador sem pátria, Minha razão resvalou na sua indiferença,
mínimo tigre de salão, nupcial os seus olhos têm números de ouro.
sultão do céu
das telhas eróticas, §§ Madrigal – composição poética elegante, cujos
o vento do amor temas invocam atos heroicos e pastoris.
na intempérie
reclamas
Madrigal melancólico
quando passas (Manuel Bandeira)
e pousas
quatro pés delicados O que eu adoro em ti,
no solo, Não é a tua beleza.
cheirando, desconfiando A beleza, é em nós que ela existe.
de todo o terrestre,
porque tudo A beleza é um conceito.
é imundo E a beleza é triste.
para o imaculado pé do gato. Não é triste em si,
Mas pelo que há nela de fragilidade e de incerteza.
Oh fera independente
da casa, arrogante O que eu adoro em ti,
vestígio da noite, Não é a tua inteligência.
preguiçoso, ginástico Não é o teu espírito sutil,
e alheio, Tão ágil, tão luminoso,
profundíssimo gato, – Ave solta no céu matinal da montanha.
polícia secreta Nem é a tua ciência
dos quartos, Do coração dos homens e das coisas.
insígnia O que eu adoro em ti,
de um desaparecido veludo, Não é a tua graça musical,
certamente não há Sucessiva e renovada a cada momento,
enigma na tua maneira, Graça aérea como o teu próprio pensamento.
talvez não sejas mistério, Graça que perturba e que satisfaz.
todo o mundo sabe de ti e pertences
ao habitante menos misterioso O que eu adoro em ti,
talvez todos o acreditem, Não é a mãe que já perdi.
todos se acreditem donos, Não é a irmã que já perdi.
proprietários, tios E meu pai.
de gato, companheiros, O que eu adoro em tua natureza,
colegas, Não é o profundo instinto maternal
discípulos ou amigos do seu gato. Em teu flanco aberto como uma ferida.
Eu não. Nem a tua pureza. Nem a tua impureza.
Eu não subscrevo. O que eu adoro em ti – lastima-me e consola-me!
Eu não conheço o gato. O que eu adoro em ti, é a vida.
124
§§ Écloga – poema ambientado no campo, pastoril §§ Agudas – entre palavras oxítonas:
e bucólico. dó e só; fez e vez; ti e vi

Écloga IV (v.52-59) §§ Preciosas – entre palavras combinadas:


(Virgílio)
múmia e resume-a; réstea e veste-a;
águia e alague-a; estrela e vê-la
Vê como, com os séculos por vir, tudo se alegra.
A última parte desta vida seja-me tão longa,
§§ Versos brancos – verso sem rimas.
que para dizer os feitos não me falte alento!
O trácio Orfeu não poderá vencer-me nestes cantos,
Irene no Céu
nem Lino, ainda que a Orfeu a mãe Calíope socorra
(Manuel Bandeira)
e por seu tumo a Lino dê assistência o belo Apolo.
Se competir comigo o próprio Pã, por juiz a Arcádia, Irene preta
dar-se-á por vencido o próprio Pã, por juiz a Arcádia. Irene boa
Irene sempre de bom humor.
Natureza das rimas
Imagino Irene entrando no céu:
§§ Ricas – entre palavras de classes gramaticais – Licença, meu branco! E São Pedro bonachão:
– Entra, Irene. Você não precisa pedir licença.
diferentes:
Cristina e ensina
Classificação das rimas
§§ Pobres – entre palavras de mesma classe
§§ Monossílabos: uma sílaba.
gramatical:
Precisava esconder sua afeição... §§ Dissílabos: duas sílabas.
Na Idade Média, uma imortal paixão
§§ Trissílabos: três sílabas.
§§ Toantes – entre sons vocálicos repetidos:
hora e bola; saltava e mata §§ Tetrassílabos: quatro sílabas.

§§ Aliterantes – entre sons consonantais idênti- §§ Pentassílabos: cinco sílabas ou redondilha menor.
cos ou semelhantes:
vozes, veladas, veludosas, vozes/ §§ Hexassílabos: seis sílabas.
vagam nos velhos vórtices velozes
§§ Heptassílabos: sete sílabas ou redondilha maior.
§§ Consoantes – entre sons e letras repetidos:
terra e serra; §§ Octossílabos: com oito sílabas.

amoníaco e zodíaco;
§§ Eneassílabos: nove sílabas.
rutilância e infância

§§ Decassílabos: dez sílabas.


§§ Esdrúxulas – entre palavras proparoxítonas:
É um flamejador, dardânico
§§ Hendecassílabos: onze sílabas.
uma explosão de rápidas ideias,
que com um mar de estranhas odisseias §§ Dodecassílabos: doze sílabas ou alexandrino.
saem-lhe do crânio escultural, titânico!...
(Cruz e Sousa) §§ Verso bárbaro: mais de doze sílabas.
125
Disposição das rimas no poema vo/a/vas
com as/ fa/ces
§§ Mistas – sem posição regular: em/ ro/sas
for/mo/sas
De uma, eu sei, entretanto 1,
de/ vi/vo
Que cheguei a estimar 2
car/mim
Por ser tão desgraçada 3!
(Casimiro de Abreu)
Tive-a hospedada 3 a um canto 1
Do pequeno jardim 4;
Era toda riscada 3
De um traço cor de mar 2 §§ Trissílabos – três sílabas:
E um traço carmesim 4. Vem/ a au/ro/ra
(Alberto de Oliveira) pre/ssu/ro/sa
cor/ de/ ro/sa
que/ se/co/ra
§§ Emparelhadas (AABB): de/ car/mim
No rio caudaloso que a solidão retalha A, as/ es/tre/las
na funda correnteza na límpida toalha A, que e/ram/ be/las
deslizam mansamente as garças alvejantes B; têm/ des/mai/os
nos trêmulos cipós de orvalho gotejantes B... já/ por/ fim
(Fagundes Varela) (Gonçalves Dias)

§§ Interpoladas ou opostas (ABBA): §§ Tetrassílabos – quatro sílabas:

Mais de mil anos-luz já separado A, O in/ver/no/ bra/da


Naquela hora, do meu pensamento B. for/çan/do as/ por/tas
O filme de uma vida, ínfimo momento B, Oh!/ Que/ re/voa/da
O derradeiro instante havia impregnado A. de/ fo/lhas/ mor/tas
o/ vem/to es/pa/lha
§§ Alternadas ou cruzadas (ABAB): por/ so/bre o/ chão/...
(Alphonsus de Guimarães)
Amor, essência da vida A,
é uma expressão de Deus B.
Alma, não fique perdida A!
Ele luz os dias seus B. §§ Pentassílabos ou redondilha menor – cinco
sílabas:
Classificação dos versos Meu/ can/to/ de/ mor/te,
Gue/rrei/ros/ ou/vi
§§ Monossílabos – uma única sílaba: Sou/ fi/lho/ das/ sel/vas
Ru/a Nas/ sel/vas/ cres/ci;
tor/ta Gue/rrei/ros/ des/cen/do
Lu/a Da/ tri/bo/ tupi
mor/ta (Gonçalves Dias)

Tu/a
por/ta
§§ Hexassílabos – seis sílabas:
§§ Dissílabos – duas sílabas: E o/ ca/va/lei/ro/ pa/ssa
Tu,/ on/tem an/te a/ som/bria/ por/ta
na/ dan/ça da/ lú/gu/bre/ des/gra/ça
que/ can/sa (Alphonsus de Guimarães)

126
§§ Heptassílabos ou redondilha maior – sete O gênero dramático
sílabas:
An/tes/ de a/mar,/ eu/ di/zi/a A característica e a finalidade primordiais do gênero
pa/ra/ cor/tar/ na/ ra/iz
dramático (do grego drân: agir) é ser levado à represen-
es/ta/ cons/tan/te a/go/ni/a
pre/ci/so a/mar/ al/gum/ di/a tação, à “ação”.
a/man/do,/ se/rei/ fe/liz.
(Menotti del Picchia)

§§ Octossílabos – oito sílabas:


No ar/ so/sse/ga/do, um/ si/no/ can/ta
Um/ si/no/ can/ta/ no ar/ som/bri/o
(Olavo Bilac)

§§ Eneassílabos – nove sílabas:


Ó/ gue/rrei/ros/ da/ ta/ba sa/gra/da,
Ó/ gue/rrei/ros/ da/ tri/bo tu/pi
Fa/lam/ deu/ses/ nos/ can/tos/ de/ pia/ga!
Ó/ gue/rrei/ros,/ meus/ can/tos/ ou/vi!
(Gonçalves Dias)

§§ Decassílabos ou Medida Nova – dez sílabas:


Compreende o gênero teatral, cuja encenação,
A/mo/-te, ó/ cruz, /no/ vér/ti/ce/ fir/ma/da
no entanto, escapa à alçada da literatura propriamente.
§§ Hendecassílabos – onze sílabas: O eu poético relaciona-se com um tu/vós, segunda pes-
Não/ te/nho/ na/da/ com i/sso/ nem/ vem/ fa/lar soa do discurso, a plateia. O texto dramático pressupõe
Eu/ não/ con/si/go en/ten/der/ sua/ ló/gi/ca
essa plateia, que o vivencia e tem probabilidade de fruir
Mi/nha/ pa/la/vra/ can/ta/da/ po/de es/pan/tar
E a/ seus/ ou/vi/dos/ pa/re/cer/ e/xó/ti/ca. emoções mediante a representação do texto.
(Caetano Veloso) Caracterizam o gênero dramático a ausência de
narrador, o discurso direto – estrutura dialogada – e as

§§ Dodecassílabos ou Alexandrinos – doze rubricas – instruções que sinalizam ao diretor e aos ato-
sílabas: res a postura no palco, o tom de voz etc.
A/ ca/sa/ que/ foi/ mi/nha,/ ho/je é/ ca/sa/ de/ Deus. Em vez do narrador, o texto dramático conta a
Traz/ no/ topo u/ma/ cruz./ A/li/ vi/vi/ com os/ meus
história pretendida mediante diálogo entre os persona-
(Aberto de Oliveira)
gens, que estabelecem com o público uma relação direta,
a fim de comprometê-lo emocionalmente com a história
§§ Bárbaros – mais de doze sílabas: contada e os personagens dela. O termo teatro deriva do
Nun/ca /co/nhe/ci /quem/ ti/ve/sse/ le/va/do/ po/rra/da. grego théatron, que significa “ver”, “contemplar”.
To/dos os/ meus/ co/nhe/ci/dos/ têm/ si/do/ cam/pe/ões/
[em/ tudo. Esse gênero subdivide-se em tragédia, comédia,
(Fernando Pessoa) drama, auto e farsa.
127
§§ Tragédia
Conta histórias, cujos resultados são destrutivos e irreversíveis. Em geral, baseada em mitos e histórias já
conhecidas do público, a tragédia pretende causar no espectador terror, piedade, catarse, enfim: “descarga
de desordens emocionais ou afetos desmedidos a partir da experiência estética oferecida pelo teatro, mú-
sica e poesia”. Personagens lutam contra forças mais poderosas que elas, que, em princípio, são vencidas
regularmente com a morte. Sugestão: Édipo Rei, de Sófocles.

§§ Comédia
Enfatiza o comportamento ridículo do ser humano, mediante exposição e crítica de costumes sociais. Suges-
tões: O doente imaginário, de Molière; A tempestade, de Shakespeare; e Lisístrata, de Aristófanes.

§§ Drama
A peça funde tragédia e comédia sem, no entanto,
que a história caminhe para resultados irreversíveis.
Em geral, trata de fatos do cotidiano com final feliz
ou não, mas com trajetória intrigante, de difícil solu-
ção. Sugestões: Leonor de Mendonça, de Gonçalves
Dias; e Macário, de Álvares de Azevedo.

§§ Auto
Peça teatral curta regularmente com temática reli-
giosa e moralizante e com finalidade catequética,
que discute conceitos abstratos e simbólicos. Su-
gestão: O auto da barca do inferno, de Gil Vicente.

§§ Farsa
Peça teatral de crítica social que apresenta personagens e situações caricaturadas sem preocupação com o
questionamento de valores. Sugestão: A farsa de Inês Pereira, de Gil Vicente.

O gênero narrativo
Oriunda do gênero épico, a narrativa organiza uma história levando em consideração aspectos primordiais de sua
estrutura: apresentação, desenvolvimento, clímax e desfecho.
Os gêneros narrativos apresentam-se como:
§§ Conto
Narrativa curta centrada em um único acontecimento. Apresenta uma ação que se encaminha para uma
tensão (clímax) entre personagens, delimitados num tempo e espaço reduzidos. Sugestões: Amor, de Clarice
Lispector; O menino do boné cinzento, de Murilo Rubião; e A causa secreta, de Machado de Assis.
§§ Novela
Narrativa situada entre a brevidade do conto e a longevidade do romance. Sugestões: A hora e a vez de
Augusto Matraga, de Guimarães Rosa; e Os crimes da rua Morgue, de Edgar Allan Poe.
§§ Crônica
Narrativa breve baseada na vida cotidiana, delimitada por tempo cronológico curto, em linguagem coloquial
e leve toque de humor e crítica. Sugestões: Comédias da vida privada – 101 crônicas escolhidas, de Luís
Fernando Veríssimo.
128
§§ Romance
Narrativa longa que discorre sobre um grande conflito central que dá origem a outros secundários, compre-
endendo vários personagens em constante conflito psicológico, envolvidos pela trama que caminha para
um clímax. Sugestões: Grande sertão: veredas, de Guimarães Rosa; São Bernardo, de Graciliano Ramos; e
O senhor dos anéis, de J.R.R. Tolkien.
§§ Anedota
Relato de um acontecimento curioso ou engraçado. Como o provérbio, a anedota, além da tradição oral,
vem inserida em textos literários. Sugestão: O asno de ouro, do escritor latino Apuleio, é uma constelação
de pequenas aventuras picantes.
§§ Apólogo
Historinha entre objetos inanimados com moral implícita ou explícita. Um apólogo, de Machado de Assis,
trata da conversa entre uma agulha e uma linha que discutem sobre a mais importância delas. Observe o
último parágrafo em que está implícita a moral:
“Parece que a agulha não disse nada; mas um alfinete, de cabeça grande e não menor experiência, mur-
murou à pobre agulha:
– Anda, aprende, tola. Cansas-te em abrir caminho para ela e ela é que vai gozar da vida, enquanto aí ficas
na caixinha de costura. Faze como eu, que não abro caminho para ninguém. Onde me espetam, fico.
Contei esta história a um professor de melancolia, que me disse, abanando a cabeça:
– Também eu tenho servido de agulha a muita linha ordinária!”
§§ Fábula
Difere do apólogo, uma vez que seus personagens são animais. Esse gênero teve ilustres cultores na litera-
tura ocidental, como Esopo, Fedro e La Fontaine, cujas fábulas estão reunidas em doze livros.

129
E.O. Teste I Então ela será tua alegria,
E será ela só tua ventura...
A vida é vã como a sombra que passa
1. O gênero dramático, entre outros aspectos, Sofre sereno e de alma sombranceira
apresenta como característica essencial:
Sem um grito sequer tua desgraça.
a) a presença de um narrador.
Encerra em ti tua tristeza inteira
b) a estrutura dialógica.
c) o extravasamento lírico. E pede humildemente a Deus que a faça
d) a musicalidade. Tua doce e constante companheira...
e) o versilibrismo. Manuel Bandeira

2. O soneto é uma das formas poéticas mais


tradicionais e difundidas nas literaturas oci- 4. Pelo entendimento que se faz do poema, po-
dentais; expressa, quase sempre, conteúdo: de-se perceber que:
a) dramático. a) O poema tenta convencer as pessoas que
b) satírico. têm um mal a se acostumar com ele, amar a
c) lírico. dor e sofrer em silêncio, sem fazer alarde.
d) épico. b) O poema tenta convencer as pessoas a denun-
e) cronístico. ciar todo e qualquer mal que as atormenta.
c) Há uma tentativa insistente do poeta em
3. Leia o poema abaixo, de Gregório de Matos mudar o comportamento das pessoas que
Guerra. têm um mal, no sentido de que elas preci-
sam buscar socorro e solidariedade dos in-
Soneto
divíduos, porque a sociedade sempre tem
Rubi, concha de perlas peregrina, piedade dos enfermos.
Animado cristal, viva escarlata,
d) Há um desejo do poeta em buscar a solidarie-
Duas safiras sobre lisa prata,
dade e compreensão das pessoas em relação à
Ouro encrespado sobre prata fina.
dor que ele sente, pois, segundo ele, a vida é
Este o rostinho é de Caterina; um bem precioso que precisa ser preservado.
E porque docemente obriga, e mata,
e) O poeta, sendo modernista, na verdade, está
Não livra o ser divina em ser ingrata,
somente jogando com as palavras, para dar
E raio a raio os corações fumina.
um efeito sonoro e rímico.
Viu Fábio uma tarde transportado
Bebendo admirações, e galhardias,
5. Analisando quanto ao gênero literário, pode-
A quem já tanto amor levantou aras:
mos dizer que o poema “Renúncia” tem um
Disse igualmente amante, e magoado: caráter:
Ah muchacha gentil, que tal serias, a) romanesco.
Se sendo tão formosa não cagaras!
b) objetivista.
MATOS, Gregório de. Antologia.
Porto Alegre: L&MP, 2006, p. 165. c) lírico.
d) dramático.
Aponte o gênero literário a que pertence e) épico.
o texto.
a) Crônica 6. Analisando a passagem “procura curtir sem
b) Poesia erótico-irônica
queixa o mal que te crucia” (versos 1 e 2),
c) Poesia religiosa
percebe-se:
d) Paródia sacra
e) Poesia encomiástica a) Um sentido contraditório, pois quando se
fala em “curtir”, imagina-se uma coisa boa.
b) Que o poeta apela para as pessoas se queixa-
Com base no poema abaixo, responda às rem das coisas ruins da vida.
questões de 4 a 6.
c) Um sentido convergente, pois o poeta deixa
Renúncia claro que em todo bem há sempre um frag-
Chora de manso e no íntimo... Procura mento de mal.
Tentar curtir sem queixa o mal que te crucia: d) Que as pessoas devem viver também o mal,
O mundo é sem piedade e até riria mas devem se queixar sempre dele.
Da tua inconsolável amargura. e) Um sentido contraditório, pois o poeta deixa
Só a dor enobrece e é grande e é pura. claro que não se pode viver o bem e o mal ao
Aprende a amá-la que a amarás um dia. mesmo tempo.
130
Leia o trecho do poema para responder às 9. Gênero dramático é aquele em que o artista usa
questões 7 e 8. como intermediária entre si e o público a repre-
Moça de Goiatuba sentação. A palavra vem do grego drao (fazer)
e quer dizer ação. A peça teatral é, pois, uma
Mal rompeu o dia – a moça composição literária destinada à apresentação
Foi levar café com leite por atores em um palco, atuando e dialogando
Para o filho do patrão, entre si. O texto dramático é complementado
Sentada à beira da cama, pela atuação dos atores no espetáculo teatral e
Como fez sempre, esperava, possui uma estrutura específica, caracterizada:
Como fez sempre, que o moço 1) pela presença de personagens que devem
lhe reclamasse mais pão. estar ligados com lógica uns aos outros e à ação;
Mas o moço não queria 2) pela ação dramática (trama, enredo), que
nem pão nem café com leite. é o conjunto de atos dramáticos, maneiras
Queria – e com que paixão de ser e de agir das personagens encadeadas
dentro dos olhos! – queria-lhe à unidade do efeito e segundo uma ordem
os peitinhos em botão. composta de exposição, conflito, complica-
Daí o moço pediu-lhe ção, clímax e desfecho;
que se deitasse com ele 3) pela situação ou ambiente, que é o con-
junto de circunstâncias físicas, sociais, espi-
um pouco... que assim veria
rituais em que se situa a ação;
que era bom o colchão. 4) pelo tema, ou seja, a ideia que o autor
Mas a moça riu e disse (dramaturgo) deseja expor, ou sua interpre-
que não tinha precisão, tação real por meio da representação.
pois era dia e de noite Adaptado de: COUTINHO, A. Notas de teoria literária.
tinha dormido um tantão. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1973.
Daí o moço pediu-lhe
que ela tirasse o vestido Considerando o texto e analisando os ele-
depois a combinação mentos que constituem um espetáculo tea-
tral, conclui-se que:
depois deitasse na cama
a) a criação do espetáculo teatral apresenta-se
que era bem quente o colchão.
como um fenômeno de ordem individual, pois
Mas a moça riu e disse
não é possível sua concepção de forma coletiva.
não estar com frio não
b) o cenário onde se desenrola a ação cênica
que o vestido que vestia
é concebido e construído pelo cenógrafo de
tirar não podia não
modo autônomo e independente do tema da
que a patroa foi quem disse
peça e do trabalho interpretativo dos atores.
que devia ter vergonha
c) o texto cênico pode originar-se dos mais
e cobrir-se com vestido,
variados gêneros textuais, como contos, len-
calcinha e combinação...
das, romances, poesias, crônicas, notícias,
E se foi, deixando moço
imagens e fragmentos textuais, entre outros.
a se torcer de paixão.
d) o corpo do ator na cena tem pouca impor-
E quando foram chamá-lo,
tância na comunicação teatral, visto que o
o moço tinha dormido
mais importante é a expressão verbal, base
e não acordou mais não.
da comunicação cênica em toda a trajetória
[...]
do teatro até os dias atuais.
SOUZA, Afonso Félix de. Nova antologia poética.
Goiânia: Cegraf UFG, 1991, p. 78. e) a iluminação e o som de um espetáculo cê-
nico independem do processo de produção/
recepção do espetáculo teatral, já que se tra-
7. Uma característica incomum ao gênero lírico ta de linguagens artísticas diferentes, agre-
presente neste trecho do poema é: gadas posteriormente à cena teatral.
a) a representação da totalidade da vida.
b) a expressão direta de personagens. 10. “Na serra de Ibiapaba, numa de suas encos-
c) a narração de uma história. tas mais altas, encontrei um jegue. Estava
d) o uso da prosa. voltado para o lado e me pareceu que descor-
e) o emprego da prosa poética. tinava o panorama. Mas quando me aproxi-
mei, percebi que era cego.”
Oswaldo França Júnior, em As Laranjas Iguais.
8. Um elemento da poesia moderna encontrado
neste trecho do poema é: O fragmento é representante do gênero:
a) o tema cotidiano. a) lírico.
b) o humor irônico. b) épico.
c) as rimas inconstantes. c) narrativo.
d) a métrica irregular. d) dramático.
e) a experimentação linguística. e) Nenhuma das opções acima.
131
E.O. Teste II TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
O momento do amor
(João do Rio)
1. Assinale V (verdadeiro) ou F (falso). Sobre
literatura, gênero e estilo literários, pode-se O conselheiro é um homem encantador.
dizer que: Baudelaire dizia: “Cá temos um homem que
( ) tanto no verso quanto na prosa pode fala do seu coração – deve ser um canalha”.
haver poesia. O conselheiro não fala do seu coração, mas
( ) todo momento histórico apresenta um é um homem sensível. Com 75 anos, teso,
conjunto de normas que caracteriza suas bem vestido, correto, possuidor de doze ne-
manifestações culturais, constituindo o tos e cinco bisnetos, a sua conversa é sempre
estilo da época. cheia de alegria e de mocidade. Outra noite,
( ) o texto literário é aquele em que predo- estávamos no seu salão, e de repente rompeu
minam a repetição da realidade, a lingua- na rua um “zépereira”.
gem linear, a unicidade de sentido. O conselheiro exclamou:
( ) no gênero lírico, os elementos do mundo – Eh! Eh! As coisas esquentam!
Como o conselheiro é idoso, pensei vê-lo ata-
exterior predominam sobre os do mundo
car os costumes e o carnaval. Para gozar da
interior do eu poético.
sua simpatia, refleti:
– Temos cada vez mais a dissolução da moral!
2. Relacione as espécies literárias abaixo com
– Quem lhe fala nisso? – indagou o conse-
suas respectivas características dispostas sub-
lheiro. Talvez por ter sido sempre um ho-
sequentemente e assinale a alternativa correta: mem moral nunca precisei de descompor os
I. Poema lírico costumes para julgar-me sério. Sabe o que eu
II. Conto sinto quando ouço um “zé-pereira”?
III. Crônica – Francamente, conselheiro...
IV. Romance – Sinto que chega o grande momento do
V. Texto teatral amor no rio...
– De fato, a liberdade dos costumes.
( ) Modalidade de texto literário que oferece
– Heim?
uma amostra da vida através de um epi- – Sim, os préstitos, as cortesãs, a promiscui-
sódio, um flagrante ou instantâneo, um dade, as meninas de pijama cantando versos
momento singular e representativo; pos- pouco sérios, os lança-perfumes, a bacanal...
sui economia de meios narrativos e den- – Meu filho, quando se chega a uma certa
sidade na construção das personagens. idade, o resultado é tudo. Se quisermos ver
( ) À intensidade expressiva desse tipo de nos três dias de carnaval a folia como de-
pravação, posso garantir que as brincadeiras
texto literário, à sua concentração e ao
de antanho com o entrudo, os banhos d’água
seu caráter imediato, associa-se, como
fria, o porta-voz eram livres como as de hoje
traço estético importante, o uso do ritmo com os lança-perfumes, os confetes e as ser-
e da musicalidade. pentinas. Mas não se trata disso. Trata-se de
( ) Essa modalidade de texto literário pren- coisa mais séria. Eu casei aos 18 anos, isto
de-se a uma vasta área de vivência, faz- é, há quase 58 anos fiz a loucura de tomar
-se geralmente de uma história longa e por esposa a minha querida Genoveva. Mas,
apresenta uma estrutura complexa. passado o primeiro ano, essa alucinação cau-
sou-me tal pasmo que resolvi estudar-lhe as
( ) Nos textos do gênero, o narrador parece
causas. E descobri.
estar ausente da obra, ainda que, muitas
– Quais foram?
vezes, se revele nas rubricas ou nos diá- – Uma só: o momento do amor!
logos; neles impõe-se rigoroso encadea- – Conselheiro!
mento causal. – Há uma época no Rio absolutamente amo-
( ) Espécie narrativa entre literatura e jor- rosa, quer no tempo da monarquia, quer na
nalismo, subjetiva, breve e leve, na qual República. Consultei estatísticas, observei,
muitas vezes autor, narrador e protago- indaguei, procedi a inquéritos pessoais...
Sabe qual é essa época? A do carnaval! Note
nista se identificam.
você como aumentam os casamentos nos
a) II – I – V – III – IV meses seguintes ao carnaval. A maioria das
b) II – I – IV – V – III inclinações, dos namoros que terminam em
c) II – I – III – V – IV casório, começam no carnaval. Três meses
d) I – II – V – III – IV depois estava casado. Cinco dos meus fi-
e) I – IV – II – V – III lhos namoraram no carnaval. Minha filha
132
Berenice com 30 anos arranjou o marido que aquele paninho que dá brilho final nos sa-
lhe faz a vida feliz, no carnaval. Nove dos patos e com ele enxugou o próprio suor, que
meus netos seguiram a regra... era abundante. Com o mesmo pano, executou
– Mas, conselheiro, se é verdade o que V. Exa. com maestria aqueles movimentos rápidos
diz, era o caso de fazer uns quatro carnavais em torno da biqueira, mas a todo o instante
por ano... o usava para enxugar-se — caso contrário, o
– Não daria resultado, meu amigo. O carna- suor inundaria o meu cromo italiano.
val é uma embriaguez d´alegria. Quem se E foi assim que a testa e a calva do valente
embriaga uma vez por ano não está acostu- filho do povo ficaram manchadas de graxa e
mado. Quem se embriaga quatro, raciocina o meu sapato adquiriu um brilho de espelho,
na bebedeira. Veneza acabou pelo abuso da à custa do suor alheio. Nunca tive sapatos
máscara. Nós acabaríamos pelo abuso do “zé- tão brilhantes, tão dignamente suados.
-pereira”. Mas uma vez por ano é bem o verão Na hora de pagar, alegando não ter nota
impetuoso do desejo, o momento do amor. menor, deixei-lhe um troco generoso. Ele
Depois suspirando: me olhou espantado, retribuiu a gorjeta me
– Aproveite-o você. Eu infelizmente não pos- desejando em dobro tudo o que eu viesse a
so mais. A velhice é como o maître d’hotel precisar no resto dos meus dias.
da vida. Indica ao cliente o prato ótimo do Saí daquela cadeira com um baita sentimento
cardápio e não o come. de culpa. Que diabo, meus sapatos não esta-
vam tão sujos assim, por 45 míseros tostões
fizera um filho do povo suar para ganhar seu
3. (FEI-SP) O texto pertence ao gênero conheci-
pão. Olhei meus sapatos e tive vergonha da-
do por:
quele brilho humano salgado como lágrimas.
a) conto.
CONY, Carlos Heitor. In: Eu aos pedaços: memórias.
b) romance. São Paulo: Leya, 2010, p. 114-115.
c) crônica.
d) reportagem.
e) novela. 4. (UECE) Atente à caracterização do engraxate.
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO Segundo o cronista, ele era gordo e calvo.
O texto a seguir foi extraído do livro de me- Essa caracterização:
mórias do escritor e jornalista carioca, que I. está, de algum modo, relacionada com as
nasceu em 1926, Carlos Heitor Cony. Um livro ideias principais do texto.
de memórias é “relato que alguém faz, fre- II. tem uma função textual.
quentemente, na forma de obra literária, a III. atende a uma necessidade de coerência
partir de acontecimentos históricos dos quais interna do texto.
participou ou foi testemunha, ou que estão Estão corretas as complementações conti-
fundamentados em sua vida particular”. Não das em:
deve ser confundido com autobiografia. a) I, II e III.
b) I e II, apenas.
O suor e a lágrima
c) II e III, apenas.
Fazia calor no Rio, quarenta graus e qualquer d) I e III, apenas.
coisa, quase quarenta e um. No dia seguinte,
os jornais diriam que fora o dia mais quente 5. (Enem) A substituição do “haver” por “ter”
deste verão que inaugura o século e o milê- em construções existenciais, no português
nio. Cheguei ao Santos Dumont, o voo estava do Brasil, corresponde a um dos processos
atrasado, decidi engraxar os sapatos. Pelo mais característicos da história da língua
menos aqui no Rio são raros esses engraxa- portuguesa, paralelo ao que já ocorrera em
tes, só existem nos aeroportos e em poucos relação à ampliação do domínio de ter na
lugares avulsos. área semântica de “ posse”, no final da fase
Sentei-me naquela espécie de cadeira canô- arcaica. Mattos e Siva (2001:136) analisa as
nica, de coro de abadia pobre, que também vitórias de “ter” sobre “haver” e discute a
pode parecer o trono de um rei desolado de emergência de “ter” existencial, tomando
um reino desolante. O engraxate era gordo e por base a obra pedagógica de João de Bar-
estava com calor — o que me pareceu óbvio. ros. Em textos escritos nos anos quarenta e
Elogiou meu sapato, cromo italiano, fabri- cinquenta do século XVI, encontram-se evi-
cante ilustre, os Rossetti. Uso-o pouco, em dências, embora raras, tanto de “ter existen-
parte para poupá-lo, em parte porque quan- cial”, não mencionado pelos clássicos estu-
do posso estou sempre de tênis. dos de sintaxe histórica, quanto de “haver”
Ofereceu-me o jornal que eu já havia lido como verbo existencial com concordância,
e começou seu ofício. Meio careca, o suor lembrado por Ivo Castro, e anotado como
encharcou-lhe a testa e a calva. Pegou “novidade” no século XVIII por Said Ali.
133
Como se vê, nada é categórico e um purismo associadas a utilidades práticas, mágicas,
estreito só revela um conhecimento deficien- curativas, religiosas, sexuais, guerreiras?
te da língua. Há maios perguntas que res- Pode ser que essas suposições tenham algo
postas. Pode-se conceber uma norma única de utópico, projetado sobre um passado pré-
e prescritiva? É válido confundir o bom uso -babélico, tribal, primitivo. Ao mesmo tem-
e a norma da própria língua e dessa forma po, cada novo poema do futuro que o pre-
fazer uma avaliação crítica e hierarquizante
sente alcança cria, com sua ocorrência, um
de outros usos e, através deles, dos usuários?
pouco desse passado. Lembrome de ter lido,
Substitui-se uma norma por outra?
certa vez, um comentário de Décio Pignatari,
Adaptado de: CALLOU, D. A propósito de norma,
correção e preconceito linguístico: do presente para o em que ele chamava a atenção para o fato de,
passado. In: Cadernos de Letras da UFF, n. 36, 2008. tanto em chinês como em tupi, não existir o
Disponível em: <www.uff.br>. Acesso em: 26 fev. 2012.
verbo ser, enquanto verbo de ligação. Assim,
Para a autora, a substituição de “haver” por o ser das coisas ditas se manifestaria nelas
“ter” em diferentes contextos evidencia que: próprias (substantivos), não numa partícula
a) o estabelecimento de uma norma prescinde verbal externa a elas, o que faria delas lín-
de uma pesquisa histórica. guas poéticas por natureza, mais propensas
b) os estudos clássicos de sintaxe histórica en- à composição analógica.
fatizam a variação e a mudança na língua. Mais perto do senso comum, podemos aten-
c) a avaliação crítica e hierarquizante dos usos tar para como colocam os índios americanos
da língua fundamenta a definição da norma. falando, na maioria dos filmes de cowboy
d) a adoção de uma única norma revela uma ati- − eles dizem “maçã vermelha”, “água boa”,
tude adequada para os estudos linguísticos. “cavalo veloz”; em vez de “a maçã é verme-
e) os comportamentos puristas são prejudiciais
lha”, “essa água é boa”, “aquele cavalo é ve-
à compreensão da constituição linguística.
loz”. Essa forma mais sintética, telegráfica,
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO aproxima os nomes da própria existência
Sobre a origem da poesia − como se a fala não estivesse se referin-
A origem da poesia se confunde com a ori- do àquelas coisas, e sim apresentandoas (ao
gem da própria linguagem. mesmo tempo em que se apresenta). No seu
Talvez fizesse mais sentido perguntar quan- estado de língua, no dicionário, as palavras
do a linguagem verbal deixou de ser poesia. intermedeiam nossa relação com as coisas,
Ou qual a origem do discurso não poético, impedindo nosso contato direto com elas. A
já que, restituindo laços mais íntimos entre linguagem poética inverte essa relação, pois,
os signos e as coisas por eles designadas, vindo a se tornar, ela em si, coisa, oferece
a poesia aponta para um uso muito primá- uma via de acesso sensível mais direto entre
rio da linguagem, que parece anterior ao nós e o mundo. (...)
perfil de sua ocorrência nas conversas, nos Já perdemos a inocência de uma linguagem
jornais, nas aulas, conferências, discussões, plena assim. As palavras se desapegaram
discursos, ensaios ou telefonemas. Como se das coisas, assim como os olhos se desape-
ela restituísse, através de um uso específico garam dos ouvidos, ou como a criação se de-
da língua, a integridade entre nome e coi- sapegou da vida. Mas temos esses pequenos
sa − que o tempo e as culturas do homem oásis − os poemas − contaminando o deserto
civilizado trataram de separar no decorrer da referencialidade.
da história. Arnaldo Antunes. <www.arnaldoantunes.com.br>.
A manifestação do que chamamos de poesia
hoje nos sugere mínimos flashbacks de uma
possível infância da linguagem, antes que a 6. (UERJ) No último parágrafo, o autor se re-
representação rompesse seu cordão umbili- fere à plenitude da linguagem poética, fa-
cal, gerando essas duas metades − significan- zendo, em seguida, uma descrição que cor-
te e significado. Houve esse tempo? Quando responde à linguagem não poética, ou seja, à
não havia poesia porque a poesia estava em linguagem referencial.
tudo o que se dizia? Quando o nome da coi- Pela descrição apresentada, a linguagem re-
sa era algo que fazia parte dela, assim como ferencial teria, em sua origem, o seguinte
sua cor, seu tamanho, seu peso? Quando os traço fundamental:
laços entre os sentidos ainda não se haviam a) o desgaste da intuição.
desfeito, então música, poesia, pensamento, b) a dissolução da memória.
dança, imagem, cheiro, sabor, consistência c) a fragmentação da experiência.
se conjugavam em experiências integrais, d) o enfraquecimento da percepção.
134
E.O. Teste III TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
Filme-enigma de Christopher Nolan gera
discussões sobre significado e citações ocul-
1. (Enem) Ouvir estrelas
tas ou óbvias em sua trama onírica
“Ora, (direis) ouvir estrelas! Certo,
perdeste o senso!” E eu vos direi, no entanto
que, para ouvi-las, muita vez desperto
e abro as janelas, pálido de espanto...
E conversamos toda noite, enquanto
a Via-Láctea, como um pálio aberto,
cintila. E, ao vir o Sol, saudoso e em pranto,
inda as procuro pelo céu deserto.
Direis agora: “Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido Certa vez o sábio taoísta Chuang Tzu sonhou
tem o que dizem, quando estão contigo?” que era uma borboleta. Ao acordar, entretan-
E eu vos direi: “Amai para entendê-las! to, ele não sabia mais se era um homem que
Pois só quem ama pode ter ouvido sonhara ser uma borboleta ou uma borboleta
Capaz de ouvir e de entender estrelas”. que agora sonhava ser um homem.
BILAC, Olavo. Ouvir estrelas. In: Tarde. 1919. Será que Dom Cobb está sonhando? Será
que a vida real é esta mesma ou somos nós
Ouvir estrelas
que sonhamos?
Ora, direis, ouvir estrelas! Vejo Alguns podem ir ao cinema para assistir “A
que estás beirando a maluquice extrema.
Origem”, de Christopher Nolan (“Batman - O
No entanto o certo é que não perco o ensejo
Cavaleiro das Trevas”) e achar tão chato que
De ouvi-las nos programas de cinema.
vão sonhar de verdade, dormindo na fase de
Não perco fita; e dir-vos-ei sem pejo
que mais eu gozo se escabroso é o tema. sono REM. Mas outros estão sonhando acor-
Uma boca de estrela dando beijo dados. Em blogs, sites e grupos de discussão,
é, meu amigo, assunto p’ra um poema. os já fanáticos pelo filme de Nolan apontam
Direis agora: Mas, enfim, meu caro, referências (de mitologia grega), veem ci-
As estrelas que dizem? Que sentido tações (de “Lost”), tecem teorias malucas e
têm suas frases de sabor tão raro? conspiratórias (o sonho dentro do sonho).
Amigo, aprende inglês para entendê-las, Alguns acusam o diretor de copiar filmes os
Pois só sabendo inglês se tem ouvido mais variados, de “Blade Runner” (1982) a
Capaz de ouvir e de entender estrelas. “eXistenZ” (1999), de se inspirar em “2001
TIGRE, Bastos. Ouvir estrelas. In: BECKER, I. Humor e
humorismo: Antologia. São Paulo: Brasiliense, 1961.
- Uma Odisseia no Espaço” (1968) e até de
roubar a ideia de um quadrinho do Tio Pati-
A partir da comparação entre os poemas, nhas de 2002.
verifica-se que: O fato é que Nolan acertou o alvo. E ele sabia
a) no texto de Bilac, a construção do eixo te- do potencial “nerdístico” de seu filme. Tanto
mático se deu em linguagem denotativa, en- é que cogitou mudar a canção que toca no
quanto no de Tigre, em linguagem conotativa. filme todo, “Non, Je Ne Regrette Rien”, com
b) no texto de Bilac, as estrelas são inacessíveis, Edith Piaf, porque uma das atrizes escala-
distantes, e no texto de Tigre, são próximas, das, Marion Cotillard, havia vivido a cantora
acessíveis aos que as ouvem e as entendem. francesa em um filme de 2007. (...)
c) no texto de Tigre, a linguagem é mais formal, Além da música, uma boa diversão de “A
mais trabalhada, como se observa no uso de Origem” é identificar os objetos impossí-
estruturas como “dir-vos-ei sem pejo” e “en- veis deixados por Nolan ao longo do filme.
tendê-las”. A escada de Penrose, criada pelo psiquiatra
d) no texto de Tigre, percebe-se o uso da lin- britânico Lionel Penrose, aparece diversas
guagem metalinguística no trecho “Uma vezes na tela - e também inspirou o quadro
boca de estrela dando beijo/é, meu amigo, que tenta explicar facetas do longa.
assunto p’ra um poema.” Melhor ir ver o filme e não pensar em es-
e) no texto de Tigre, a visão romântica apresen- cadas...
tada para alcançar as estrelas é enfatizada na No que você está pensando agora?
última estrofe de seu poema com a recomen- (http://www1.folha.uol.com.br/fsp/
dação de compreensão de outras línguas. ilustrad/ fq1908201010.htm)

135
2. (Insper) O texto permite afirmar que o po- 4. A que gênero literário pertence o texto?
tencial “nerdístico” do filme:
a) está associado às marcas de metalinguagem. Identifique a que gênero pertencem os tex-
b) advém da trama onírica que induz ideias tos das questões 5, 6 e 7. Aponte duas carac-
subliminares. terísticas que justifiquem sua resposta.
c) resulta das fortes referências intertextuais.
d) origina-se da mistura entre realidade e ficção. 5. Oh! que saudades que tenho
e) decorre da associação entre o sonho e a es- Da aurora da minha vida,
cada de Penrose. Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais!
(Casimiro de Abreu)
E.O. Dissertativo
Leia as estrofes do poema “O prato azul- 6. Lavínia: (sacode Vicente) Vicente! Não ouve
-pombinho”, de Cora Coralina para respon- o apito do trem? Desistiu de ir?
der às questões 1 e 2. Vicente: Não. Eu vou. Preciso ir. Eu mando
notícias.
Minha bisavó – que Deus a tenha em glória –
Lavínia: Amanhã mesmo?
sempre contava e recontava
Vicente: Amanhã. Adeus.
em sentidas recordações
Lavínia: Adeus.
de outros tempos
(Jorge de Andrade, Beijam-se com amor.)
a estória de saudade
daquele prato azul-pombinho.
Era uma estória minuciosa. 7. A casa inteira recebeu a carta com muita
Comprida, detalhada. alegria. Ricardo vinha do Recife passar uns
Sentimental. dias com eles. Há anos que se fora. Ainda
Puxada em suspiros saudosistas quase menino, sumira-se do engenho sem
e ais presentes. ninguém saber para onde. Ricardo fugiu.
E terminava, invariavelmente, (José Lins do Rego)
depois do caso esmiuçado:
“– Nem gosto de lembrar disso...”
É que a estória se prendia 8. A que gênero literário pertence o poema
aos tempos idos em que vivia abaixo? Justifique sua resposta.
minha bisavó
que fizera deles seu presente e seu futuro. A Rua dos Cataventos
[...] Da vez primeira em que me assassinaram,
CORALINA, Cora. Melhores poemas de Cora Coralina. Seleção Perdi um jeito de sorrir que eu tinha.
de Darci F. Denófrio. São Paulo: Global, 2004, p. 47. Depois, a cada vez que me mataram,
Foram levando qualquer coisa minha.
De acordo com a leitura dos fragmentos, explicite:
Hoje, dos meu cadáveres eu sou
1. A lembrança a que o eu poético faz alusão. O mais desnudo, o que não tem mais nada.
Arde um toco de Vela amarelada,
2. Como são construídos os traços épico e lírico. Como único bem que me ficou.

Texto para as próximas duas questões. Vinde! Corvos, chacais, ladrões de estrada!
A um passarinho Pois dessa mão avaramente adunca
Para que vieste Não haverão de arracar a luz sagrada!
Na minha janela Aves da noite! Asas do horror! Voejai!
Meter o nariz? Que a luz trêmula e triste como um ai,
Se foi por um verso A luz de um morto não se apaga nunca!
(...) (Mário Quintana)
Não sou mais poeta
Ando tão feliz!
A questão seguinte toma por base a Tragédia
(Vinicius de Moraes)
em um ato, assinada pelo escritor, tradutor
e desenhista Millôr Fernandes (1924-) e pu-
3. Segundo o texto, qual é a condição funda- blicada pela primeira vez em “O pif-paf” (O
mental para a condição poética? Cruzeiro, 1945).
136
O capitalismo mais reacionário atropelam-me, aturdem-me, sequestram-me.
Tragédia em um ato Já esqueci a língua em que comia,
Personagens: o patrão e o empregado em que pedia para ir lá fora,
Época: atual em que levava e dava pontapé,
Ato único a língua, breve língua entrecortada
do namoro com a priminha.
Empregado – Patrão, eu queria lhe falar se- O português são dois; o outro, mistério.
riamente. Há quarenta anos que trabalho na ANDRADE, Carlos Drummond de. Esquecer para
empresa e até hoje só cometi um erro. lembrar. Rio de Janeiro: José Olympio, 1979.
Patrão – Está bem, meu filho, está bem.
Mas de agora em diante tome mais cuidado. 1. Explorando a função emotiva da linguagem,
(Pano rápido) o poeta expressa o contraste entre marcas de
In: FERNANDES, Millôr. Trinta anos de mim variação de usos da linguagem em:
mesmo. Rio de Janeiro: Nórdica, 1974, p. 15.
a) situações formais e informais.
b) diferentes regiões do país.
9. (Vunesp) A tragédia, no sentido clássico, é c) escolas literárias distintas.
uma obra fortemente dramática, inspirada d) textos técnicos e poéticos.
na lenda ou na história, e que põe em cena e) diferentes épocas.
personagens envolvidos em situações que
desencadeiam desgraças. Em sua função po- 2. Lusofonia
ética, destina-se também a infundir o terror rapariga: s.f., fem. de rapaz: mulher nova;
e a piedade. Considerando essa definição, re- moça; menina; (Brasil), meretriz.
leia o texto de Millôr Fernandes e, a seguir:
§§ interprete por que apenas esse diálogo Escrevo um poema sobre a rapariga que está
entre os dois personagens poderia carac- sentada no café, em frente da chávena de
terizar uma tragédia, segundo o autor; e café, enquanto alisa os cabelos com a mão.
§§ interprete um sentido conotativo da ex- Mas não posso escrever este poema sobre essa
pressão “meu filho”, nas palavras do per- rapariga porque, no brasil, a palavra rapariga
sonagem patrão. não quer dizer o que ela diz em portugal. En-
tão, terei de escrever a mulher nova do café,
10. (Fuvest) Considere a seguinte relação de
a jovem do café, a menina do café, para que
obras: Auto da barca do inferno, Memórias
a reputação da pobre rapariga que alisa os
de um sargento de milícias, Dom Casmurro
cabelos com a mão, num café de lisboa, não
e Capitães da areia. Entre elas, indique as
fique estragada para sempre quando este po-
duas que, de modo mais visível, apresentam
ema atravessar o atlântico para desembarcar
intenção de doutrinar, ou seja, o propósito
no rio de janeiro. E isto tudo sem pensar em
de transmitir princípios e diretivas que in-
áfrica, porque aí lá terei de escrever sobre a
tegram doutrinas determinadas. Divida sua
moça do café, para evitar o tom demasiado
resposta em duas partes:
continental da rapariga, que é uma palavra
a) para a primeira obra escolhida;
que já me está a pôr com dores de cabeça até
b) para a segunda obra escolhida, conforme já
porque, no fundo, a única coisa que eu que-
vem indicado na respectiva página de res-
postas. Justifique sucintamente cada uma ria era escrever um poema sobre a rapariga
de suas escolhas. do café. A solução, então, é mudar de café, e
limitar-me a escrever um poema sobre aquele
café onde nenhuma rapariga se pode sentar à
E.O. Enem mesa porque só servem café ao balcão.
JÚDICE, N. Matéria do Poema. Lisboa: D. Quixote, 2008.

Leia o texto “Aula de português” e faça o que O texto traz em relevo as funções metalin-
se pede: guística e poética. Seu caráter metalinguís-
tico justifica-se pela:
A linguagem a) discussão da dificuldade de se fazer arte ino-
na ponta da língua vadora no mundo contemporâneo.
tão fácil de falar b) defesa do movimento artístico da pós-mo-
e de entender. dernidade, típico do século XX.
A linguagem
c) abordagem de temas do cotidiano, em que a
na superfície estrelada de letras,
sabe lá o que quer dizer? arte se volta para assuntos rotineiros.
Professor Carlos Góis, ele é quem sabe, d) tematização do fazer artístico, pela discus-
e vai desmatando são do ato de construção da própria obra.
o amazonas de minha ignorância. e) valorização do efeito de estranhamento causado
Figuras de gramática, esquipáticas, no público, o que faz a obra ser reconhecida.
137
3. Texto I: Chão de esmeralda 4. Dario vinha apressado, guarda-chuva no bra-
Me sinto pisando ço esquerdo e, assim que dobrou a esquina,
Um chão de esmeraldas diminuiu o passo até parar, encostando-se à
parede de uma casa. Por ela escorregando,
Quando levo meu coração
sentou-se na calçada, ainda úmida da chuva,
À Mangueira
e descansou na pedra o cachimbo.
Sob uma chuva de rosas
Dois ou três passantes rodearam-no e inda-
Meu sangue jorra das veias
garam se não se sentia bem. Dario abriu a
E tinge um tapete
boca, moveu os lábios, não se ouviu resposta.
Pra ela sambar
O senhor gordo, de branco, sugeriu que devia
É a realeza dos bambas sofrer de ataque.
Que quer se mostrar Adaptado de: TREVISAN, D. Uma vela para Dario. Cemitério
Soberba, garbosa de Elefantes. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1964.
Minha escola é um cata-vento a girar
É verde, é rosa No texto, um acontecimento é narrado em
Oh, abre alas pra Mangueira passar linguagem literária. Esse mesmo fato, se re-
BUARQUE, C.; CARVALHO, H.B. Chico Buarque de Mangueira. latado em versão jornalística, com caracte-
Marola Edições Musicais Ltda. BMG. 1997. Disponível em: rísticas de notícia, seria identificado em:
<www.chicobuarque.com.br>. Acesso em: 30 abr. 2010. a) Aí, amigão, fui diminuindo o passo e tentei
me apoiar no guarda-chuva... mas não deu.
Texto II Encostei na parede e fui escorregando. Foi
Quando a escola de samba entra na Marquês mal, cara! Perdi os sentidos ali mesmo. Um
de Sapucaí, a plateia delira, o coração dos povo que passava falou comigo e tentou me
componentes bate mais forte e o que vale é a socorrer. E eu, ali, estatelado, sem conseguir
emoção. Mas, para que esse verdadeiro espe- falar nada! Cruzes! Que mal.
b) O representante comercial Dario Ferreira, 43
táculo entre em cena, por trás da cortina de
anos, não resistiu e caiu na calçada da Rua
fumaça dos fogos de artifício, existe um ver- da Abolição, quase esquina com a Padre Viei-
dadeiro batalhão de alegria: são costureiras, ra, no centro da cidade, ontem por volta do
aderecistas, diretores de ala e de harmonia, meio-dia. O homem ainda tentou apoiar-se
pesquisador de enredo e uma infinidade de no guarda-chuva que trazia, mas não conse-
profissionais que garantem que tudo esteja guiu. Aos populares que tentaram socorrê-lo
perfeito na hora do desfile. não conseguiu dar qualquer informação.
AMORIM, M.; MACEDO, G. O espetáculo dos bastidores. c) Eu logo vi que podia se tratar de um ataque.
Revista de Carnaval 2010: Mangueira. Rio de Eu vinha logo atrás. O homem, todo apru-
Janeiro: Estação Primeira de Mangueira, 2010. mado, de guarda-chuva no braço e cachimbo
na boca, dobrou a esquina e foi diminuindo
Ambos os textos exaltam o brilho, a beleza, a o passo até se sentar no chão da calçada. Al-
tradição e o compromisso dos dirigentes e de gumas pessoas que passavam pararam para
todos os componentes com a escola de sam- ajudar, mas ele nem conseguia falar.
ba Estação Primeira de Mangueira. Uma das d) Vítima
diferenças que se estabelece entre os textos Idade: entre 40 e 45 anos
é que: Sexo: masculino
a) o artigo jornalístico cumpre a função de Cor: branca
transmitir emoções e sensações, mais do que Ocorrência: Encontrado desacordado na Rua
a letra de música. da Abolição, quase esquina com Padre Viei-
b) a letra de música privilegia a função social ra. Ambulância chamada às 12h34min por
de comunicar a seu público a crítica em re- homem desconhecido. A caminho.
e) Pronto-socorro? Por favor, tem um homem
lação ao samba e aos sambistas.
caído na calçada da rua da Abolição, quase
c) a linguagem poética, no Texto I, valoriza esquina com a Padre Vieira. Ele parece des-
imagens metafóricas e a própria escola, en- maiado. Tem um grupo de pessoas em vol-
quanto a linguagem, no Texto II, cumpre a ta dele. Mas parece que ninguém aqui pode
função de informar e envolver o leitor. ajudar. Ele precisa de uma ambulância rápi-
d) ao associar esmeraldas e rosas às cores da es- do. Por favor, venham logo!
cola, o Texto I acende a rivalidade entre esco- TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
las de samba, enquanto o Texto II é neutro. O canto do guerreiro
e) o Texto I sugere a riqueza material da Manguei- Aqui na floresta
ra, enquanto o Texto II destaca o trabalho na Dos ventos batida,
escola de samba. Façanhas de bravos
138
Não geram escravos,
Que estimem a vida
E.O. Teste II
Sem guerra e lidar. 1. V-V-F-F 2. A 3. C 4. A
- Ouvi-me, Guerreiros, 5. E 6. C
- Ouvi meu cantar. Valente na guerra,
Quem há, como eu sou?
Quem vibra o tacape
Com mais valentia?
E.O. Teste III
1. D 2. C
Quem golpes daria
Fatais, como eu dou? - Guerreiros, ouvi-me;
- Quem há, como eu sou?
(Gonçalves Dias) E.O. Dissertativo
1. A lembrança a que o eu poético faz alusão é
Macunaíma (Epílogo)
o “prato azul-pombinho”.
Acabou-se a história e morreu a vitória. 2. O traço “épico” se constrói pelo ato de a bi-
Não havia mais ninguém lá. Dera tangolo- savó contar e recontar estórias minuciosas e
mângolo na tribo Tapanhumas e os filhos detalhadas de outros tempos. Já o traço “líri-
dela se acabaram de um em um. Não havia co” é construído a partir de uma perspectiva
mais ninguém lá. Aqueles lugares, aqueles subjetiva, atrelada às emoções.
campos, furos puxadouros arrastadouros 3. A condição fundamental do texto está pautada
meios-barrancos, aqueles matos misteriosos, na ideia de infelicidade, tristeza e angústia.
tudo era solidão do deserto... Um silêncio 4. O texto pertence ao gênero lírico.
imenso dormia à beira do rio Uraricoera. Ne- 5. Gênero lírico. A temática abordada parte de
nhum conhecido sobre a terra não sabia nem um “eu” e nela seu estado subjetivo se vale
de uma emoção, de um estado da alma.
falar da tribo nem contar aqueles casos tão
6. Gênero dramático. Os personagens estabele-
pançudos. Quem podia saber do Herói?
cem diálogo por meio de suas falas, as rubri-
(Mário de Andrade)
cas. Há ausência de narrador.
7. Gênero narrativo. Há um narrador que conta
uma história. Além disso, há uma menção
5. Considerando-se a linguagem desses dois a estruturas básicas deste gênero: persona-
textos, verifica-se que: gens, espaço e tempo.
a) a função da linguagem centrada no receptor 8. Gênero lírico. O uso da primeira pessoa
está ausente tanto no primeiro quanto no (mundo interior) e a utilização da musica-
segundo texto. lidade por intermédio da escolha fonética
b) a linguagem utilizada no primeiro texto é co- (rima, ritmo etc.).
loquial, enquanto, no segundo, predomina a 9. O diálogo poderia caracterizar tragédia, uma
linguagem formal. vez que se centra em um conflito a partir de
c) há, em cada um dos textos, a utilização de uma situação que pode desencadear desgra-
pelo menos uma palavra de origem indígena. ça. A sensibilidade do leitor pode recair so-
bre o terror e a piedade após o contato com
d) a função da linguagem, no primeiro texto,
a cena. No sentido conotativo, a expressão
centra-se na forma de organização da lin-
“meu filho” por parte do patrão demonstra
guagem e, no segundo, no relato de infor- uma postura paternalista assumida por ele.
mações reais. 10.
e) a função da linguagem centrada na pri- a) Na peça Auto da Barca do Inferno, clas-
meira pessoa, predominante no segundo sificada pelo autor como auto de mora-
texto, está ausente no primeiro. lidade, Gil Vicente defende os princípios
cristãos e critica alegoricamente a so-
ciedade do seu tempo. Escrita no perí-
Gabarito odo de transição da Idade Média para a
Idade Moderna, revela o bifrontismo do
homem daquele tempo, dividido entre
o temor a Deus e a exaltação do homem
E.O. Teste I livre (medievalismo vs humanismo). A
crítica severa é reveladora de sua postu-
1. B 2. C 3. B 4. A 5. C ra moderna, enquanto que os princípios
que a regem estão voltados para Deus.
6. A 7. C 8. A 9. C 10. C Trata-se de uma farsa alegórica, pois os
139
personagens-tipo, representantes das di-
versas camadas sociais, provocam o riso
do público quando se indignam com a
condenação que os leva ao inferno, pois
todos se julgam merecedores do paraíso
divino.
b) Em Capitães da areia, Jorge Amado nar-
ra a história de um grupo de meninos
abandonados que vivem na orla litoral da
cidade de Salvador. O contexto histórico
do Brasil, ditadura Vargas, marcado pela
censura e perseguições políticas, moti-
va o autor a desenvolver uma narrativa
cujos personagens anseiam por liberdade
e justiça através de ações reveladoras de
revolta de onde pode emergir o banditis-
mo e a criminalidade ou o engajamento
político na luta de classes. A greve dos
condutores de bonde, a atuação do es-
tudante universitário no trapiche e a
filiação partidária de Pedro Bala, entre
outras, revelam o engajamento de Jorge
Amado à ideologia socialista, defensora
da revolução proletária como meio de os
excluídos obterem justiça social.

E.O. Enem
1. A 2. D 3. C 4. B 5. C

140
Disponível em: <http://www.ricardocosta.com/tags/trovadorismo>

da Idade Média
Aulas 3 e 4
Trovadorismo: a literatura
Contexto
Todo o imaginário feudal de príncipes, princesas, reis e seus
reinados são elementos fundamentais para situar o trovado-
rismo na história. Os castelos e sua nobreza, os cavaleiros e
seus duelos em guerras e torneios compõem o cenário da
Idade Média, quando se desenvolve essa primeira escola lite-
rária após a queda do Império Romano.
Com a tomada de Constantinopla pelos turcos, em
1453, capital do Império Romano do Oriente, tem início a
Idade Média. Morto o imperador Carlos Magno, em 814, o
poder central ficara enfraquecido e a sociedade passara a se
organizar em torno de grandes propriedades de terra, com o
poder centralizado na figura do senhor feudal.
A Literatura portuguesa tem início, de fato, com o
trovadorismo. Antes disso, há documentos de produções na
região e na Península Ibérica, mas não de fato portuguesa.

O nascimento da literatura portuguesa


Entre 1139 e 1140, Portugal separou do reino de Leão e
Castela para se tornar um estado independente. D. Afonso
Henriques assumiu o reinado e lutou pela manutenção da
independência de Portugal frente aos intentos de Castela.
Essa separação política não rompeu os profundos laços eco-
nômicos, sociais e culturais com o resto da Península Ibérica.
O mais forte desses laços era a língua: o galego-português.
Em 1179, o Papa Alexandre II reconhece a independência do
Reino Lusitano.
A origem do trovadorismo é essencialmente provençal,
do sul da França, e galega, de Castela, em pleno feudalismo,
precisamente nos séculos XII ao XIII.
O primeiro texto literário galego-português foi a
Cantiga da Ribeirinha, também conhecida como Canti-
ga da Guarvaia, de Paio Soares Taveirós. Supõe-se ter sido
composta em 1198 ou 1189, o mais antigo texto e marca do
início do trovadorismo português.

Religião e cultura
A Igreja católica cresceu, acumulou vastas extensões de terra, enriqueceu e concentrou um significativo poder reli-
gioso e secular. Essa herança conviveu com mudanças na ordem social que tiveram expressão também significativa
na literatura do período.
143
Uma importante manifestação do poder da Igreja medieval foi seu controle quase absoluto da produção cultural.
Como a circulação dos textos dependia da sua reprodução manuscrita, quase sempre feita sob encomenda, a
divulgação da cultura tornava-se ainda mais difícil, uma vez que o número de cópias em circulação era bem pequeno.
O uso do latim como língua literária, outra herança do longo período de dominação romana na Europa,
também contribuía para dificultar o acesso aos textos. Poemas e canções eram compostos em latim por monges
eruditos que vagavam de feudo em feudo para divulgarem suas composições. A maior parte dessa produção abor-
dava temas religiosos.

Cantiga da Ribeirinha Cantiga da Ribeirinha (tradução)


No mundo non me sei parelha, Não há no mundo ninguém que se compare
mentre me for’ como me vay, a mim em infelicidade, enquanto a minha vida
ca já moiro por vos e¡ ay continuar assim, porque morro por vós e, ai,
mia senhor branca e vermelha, minha senhora branca e de faces rosadas,
queredes que vos retraya quereis que vos retrate quando vos vi sem manto.
quando vus eu vi em saya! Mau dia foi esse em que me levantei,
¡Mao dia me levantei porque vos vi tão bela! [ou seja: melhor seria
que vus enton non vi fea! se vos tivesse visto feia].

E, mia senhor, des aquel di’ , jay! E, minha senhora, desde aquele dia, ai,
me foi a mi muyn mal, tudo para mim foi muito mal,
e vos, filha de don Paay mas vós, filha D. Paio
Moniz, e ben vus semelha Moniz, parece-vos muito bem que eu tenha
d’aver eu por vós guarvaya e vós uma garvaia [manto de luxo] quando
pois eu, mia senhor, d’alfaya nunca recebi de vós o simples
nunca de vos ouve nem ei valor de uma correia.
valia dua correa.
(Paay Soares Taveiros)

144
O poder feudal
A sociedade medieval organizou-se em torno dos gran-
des proprietários de terra, os senhores feudais.
Uma pequena corte passou a se reunir com esse
senhor feudal. Dela faziam parte membros da nobreza,
cavaleiros, camponeses livres e servos. Estavam unidos
por uma relação de dependência pessoal: a vassalagem.
O servilismo dos vassalos a seu suserano e dos
fieis a Deus deu origem ao princípio básico da litera-
tura medieval: a afirmação da total subserviência de
um trovador à sua dama, em se tratando dos temas da
poesia, ou de um cavaleiro à sua donzela, no caso das
novelas de cavalaria.

Circulação e os agentes do discurso


O objetivo da maioria das manifestações artísticas medievais era persuadir as pessoas ao temor a Deus e submetê-
-las à soberania da Igreja. Teatro, pintura, escultura e literatura e toda manifestação artística estava a serviço dos
ensinamentos religiosos e do comportamento cristão.
Nas cortes dos senhores feudais, centros de atividade artística da Europa medieval, exibiam-se jograis: re-
citadores, cantores e músicos ambulantes, contratados pelo senhor para divertir a corte. As cantigas apresentadas
pelos jograis eram quase sempre compostas por nobres, autodenominados trovadores, uma vez praticantes da arte
de trovar. Trovador, do francês trouver, significa encontrar e refere-se ao compositor da cantiga, quem encontra a
música que se encaixa no poema.
Em razão disso, enquanto nos mosteiros e nas abadias circulavam os textos escritos em latim, nos castelos e
nas cortes circulava a literatura oral, produzida em língua local, voltada para o deleite dos homens e das mulheres
da nobreza com o intuito de legitimar o novo papel social assumido pelos cavaleiros.
145
O código do amor cortês
Os termos que definiam as relações feudais foram trans-
postos para as cantigas, caracterizando a linguagem do
trovadorismo: a mulher era a senhora, o homem era o seu
servidor. Eram muito prezadas a generosidade, a lealdade
e, acima de tudo, a cortesia.
As cantigas de amor do trovadorismo desenvolvem
um mesmo tema: o sofrimento provocado pelo amor não
correspondido – a “coita de amor”. Como o princípio do
amor cortês é a idealização da dama pelo trovador, os textos
não manifestam a expectativa de correspondência amorosa.
As cantigas satíricas passeiam por muitos temas,
sempre expressando um olhar crítico para a conduta de
nobres, homens e mulheres, nas esferas individual e so-
cial. É bastante comum os trovadores ridicularizarem um
nobre que se envolve com uma serviçal ou que não per-
cebe a traição da esposa.

A vassalagem impressa na linguagem


Outra característica dessa produção literária manifesta-se na obediência a regras no uso de termos que definiam
a vassalagem amorosa. Empregava-se uma série de termos e expressões para nomear a dama: senhor, mia senhor,
senhor fremosa, em razão da posição que ela ocupava socialmente.
Além disso e em razão das castas imóveis e da sociedade organizada mediante trocas, os cidadãos não
ascendiam socialmente e não desenvolviam a intelectualidade. Quase a totalidade da população era analfabeta, o
que contribuiu muito para que a literatura se vinculasse à tradição oral, unindo poesia e música.

146
Tipos de cantiga
As cantigas trovadorescas são divididas em dois grupos: as líricas, que falam de sentimento e são subdivididas em
cantigas de amor e de amigo, e as cantigas satíricas, intencionalmente críticas e cômicas, também subdivididas em
cantigas de escárnio e de maldizer.

Cantigas de amor
Líricas
Cantigas de amigo
Cantigas

Cantigas de escárnio
Satíricas
Cantigas de maldizer

Líricas
A poesia lírica diz respeito à lira, instrumento musical da Antiguidade clássica que acompanhava as canções, ex-
pressando sentimentos.

Cantiga de amor

As cantigas de amor são especialmente dedicadas à mulher amada pelo trovador, amor esse que não era corres-
pondido. Ela pertence a uma classe superior à sua. Em função da imobilidade social das castas, esse amor era
proibido e dava origem à “coita”, que significa sofrimento.
Os trovadores se valem de um eu lírico masculino que é pobre e declara seu amor impossível, por isso sofri-
do e submisso à dama. A chamada “vassalagem amorosa”.
Possui poucas repetições de versos e ausência de paralelismo por se propor mais elevada e de estru-
tura complexa em linguagem refinada, normalmente de
origem provençal.
O eu lírico apresentado é masculino, ou seja,
o trovador expressa seus sentimentos em relação à mu-
lher amada que é, invariavelmente, de classe superior à
do trovador.
A linguagem usada é mais refinada, evitam-se os
refrões e as repetições, e, por serem assim mais sofisticadas,
chamavam-se cantigas de maestria ou mestria.
Os termos usados pelo trovador para se referir à mu-
lher amada são sempre no masculino: mia senhor, fremosa
senhor, mia don (dona).
O trovador se queixa da indiferença da mulher ama-
da, coita amorosa.
O amor é sempre cortês, mesmo porque a distância
social entre o amante e a amada não permitia que houvesse
atrevimentos de qualquer ordem.
147
Cantiga d’amor Cantiga de amor (tradução)
Quantos an gran coita d’amor Quantos o amor faz padecer
eno mundo, qual og’ eu ei, penas que tenho padecido
querrian morrer, eu o sei, querem morrer e não duvido
o averrian én sabor. que alegremente queiram morrer.
Mais mentr’ eu vos vir’, mia senhor, Porém enquanto vos puder ver,
sempre m’eu querria viver, vivendo assim eu quero estar
e atender e atender! e esperar, e esperar!
Pero já non posso guarir, Sei que a sofrer estou condenado
ca já cegan os olhos meus e por vós cegam os olhos meus.
por vos, e non me val i Deus Não me acudis; nem vós, nem Deus
nen vos; mais por vos non mentir, Mas, se sabendo-me abandonado,
enquant’eu vos, mia senhor, vir’, ver-vos, senhora, me for dado.
sempre m’eu querria viver, vivendo assim eu quero estar
e atender e atender! e esperar, e esperar!
E tenho que fazen mal-sen Esses que veem tristemente
quantos d’amor coitados son desamparada sua paixão
de querer sa morte, se non querendo morrer, loucos estão.
ouveron nunca d’amor ben Minha fortuna não é diferente;
com’eu faç’. E, senhor, por én porém eu digo constantemente:
sempre m’eu querria viver, vivendo assim eu quero estar
e atender e atender! e esperar e esperar!
(Garcia de Guilhade)

Cantiga de amigo

As cantigas de amigo falam de uma relação amorosa


concreta que aconteceu entre pessoas simples, que vi-
vem no campo e parte de um eu lírico feminino. O tema
central dessas cantigas é o desejo, o que leva a crer
que a relação amorosa já aconteceu, diferentemente
das de amor que são impossibilitadas pelas castas so-
ciais diferentes.
De origem galega (Ibérica), ela é mais popular e
por isso mais repetitiva, possui muitos refrões e para-
lelismo com uma estrutura simples e um amor terreno.
Esta voz feminina expressa desejo pela ausên-
cia do amigo (namorado ou amado) e relaciona-se
com elementos da natureza para clamar seu retorno.
O ambiente campesino corrobora para construir esse
sentimento que é sempre compartilhado com a mãe, as
amigas e damas de companhia.
Além disso, em função de sua temática, elas são
também divididas em:
148
§§ Alvas §§ Pastorelas
Levantou-s’a velida (a bela) Oi (ouvi) oj’eu ua pastor andar.
Levantou-s’à alva; du (onde) cavalgava per ua ribeira,
e vai lavar camisas
e o pastor estava i senlheira. (sozinha)
e no alto (no rio)
vai-las lavar à alva (de madrugada) a ascondi-me póla escuitar...
(D. Dinis) (Airas Nunes de Santiago)

§§ Bailias
1. O eu lírico das cantigas de amigo é sempre
E no sagrado em vigo
bailava corpo velido (uma linda moça) amor ei! feminino, canta a saudade do amado distante.
(Martim Codax) 2. Há uso de repetições de palavras, de ver-
§§ Romarias sos inteiros.
Pois nossas madres van a San Simon de Val 3. O homem amado é de classe superior à da
de Prados candeas queimar (pagar promessas) mulher que canta.
nós, as menininhas, punhemos d’andar (vamos 4. O amigo/amado, a que se referem as cantigas,
[passear) deve ser entendido como amante/namorado.
§§ Barcarolas ou Marinhas 5. A mulher queixa-se [à natureza] de ter perdido o
Vi eu, mia madr’, andar amado ou se distanciado dele.
as barcas e no mar,
6. Geralmente tais cantigas são dialogadas.
e moiro de amor!
(Nuno Fernandes Tomeol) 7. A cantiga de amigo se vale de descrição.

Cantiga de amigo Cantiga de amigo (tradução)


– Ai flores, ai flores do verde piño, – Ai, flores do verde pinheiro,
se sabedes novas do meu amigo? sabeis notícias do meu namorado?
Ai, Deus, e u é? Ai, Deus, onde está?
Ai flores, ai flores do verde ramo, Ai flores, ai flores, do verde ramo,
se sabedes novas do meu amado? Sabeis notícias do meu amado?
Ai, Deus, e u é? Ai, Deus, onde está?
Se sabedes novas do meu amigo, Sabeis notícias do meu namorado,
aquel que mentiu do que pôs comigo? Aquele que mentiu sobre o que combinou comigo?
Ai, Deus, e u é? Ai, Deus, onde está?
Se sabedes novas do meu amado, Sabeis notícias do meu amado,
aquel que mentiu do que mi á jurado? Aquele que mentiu sobre o que jurou?
Ai, Deus, e u é? Ai, Deus, onde está?
– Vós me perguntades pelo voss’ amigo? Vós perguntais pelo vosso namorado?
E eu ben vos digo que é san’e vivo E eu bem vos digo que está são e vivo:
Ai, Deus, e u é? Ai, Deus, onde está?
Vós me perguntades pelo voss’ amado? Vós perguntais pelo vosso amado?
E eu ben vos digo que é viv’ e sano: E eu bem vos digo que está vivo e são.
Ai, Deus, e u é? Ai, Deus, onde está?
E eu ben vos digo que é san’e vivo, E eu bem vos digo que está são e vivo
e será vosc’ant’o prazo saído. e estará convosco antes do prazo combinado:
Ai, Deus, e u é? Ai, Deus, onde está?
E eu ben vos digo que é viv’e sano, E eu bem vos digo que está vivo e são
e será vosc’ant’o prazo passado. e estará convosco antes de terminar o prazo:
Ai, Deus, e u é? Ai, Deus, onde está?
(Dom Dinis)

149
Satíricas En Santiago seend’albergado,
en mia pousada chegaron romeus
preguntei-os e disseron: “par Deus,
As cantigas satíricas fazem críticas ao comporta-
muito levade-lo caminh’ errado,
mento das pessoas em suas ações sociais, usavam o
ca, se verdade quiserdes achar,
humor e o vocabulário chulo para denunciar alguns outro caminho conven a buscar,
nobres e damas. ca non saben aqui d’ela mandado.
Além disso, a sátira se estendia a instituições
sociais, censurava os males da sociedade ou dos indiví- Cantigas de maldizer
duos, quase tudo com tom sarcástico, irônico e obsceno.
Elas podem ser de escárnio ou de maldizer. Nas cantigas de maldizer, o trovador utiliza um voca-
bulário agressivo para fazer uma crítica direta e clara,
Cantigas de escárnio identificando o nome das pessoas satirizadas. Essa lin-
guagem de baixo calão, os palavrões e até vocabulá-
A principal característica da cantiga de escárnio é o fato rio erótico aconteciam, pois eram proferidas nas ruas,
de ela ser indireta, especialmente por ser declamada praças públicas e feiras livres. Os significados eram
no ambiente palaciano. O efeito satírico que caracteriza explícitos e não poupavam nenhuma instituição social:
essas cantigas é obtido por meio de ironias, trocadilhos atacam o clero, as freiras, os fidalgos e toda a sorte de
e jogos semânticos. De modo geral, ridicularizam o com- pessoas que, dentro de suas classes, indiquem decadên-
portamento de nobres ou denunciam as mulheres que cia moral.
não seguem o código do amor cortês.
A sátira indireta sublima o nome da pessoa cri- Maldizer
ticada e sempre explora os duplos sentido e os troca- (Afonso Eanes do Coton)

dilhos. Seus significados normalmente são implícitos,


velados e comedidos. Marinha, o teu folgar
tenho eu por desacertado,
Escárnio (sirventes – moral) e ando maravilhado
(Airas Nunes, clérigo compostelano) de te não ver rebentar;
pois tapo com esta minha
Por que no mundo mengou a verdade, boca, a tua boca, Marinha;
punhei un dia de a ir buscar; e com este nariz meu,
e, u por ela fui preguntar tapo eu, Marinha, o teu;
disseron todos: “alhur lá buscade, com as mãos tapo as orelhas,
ca de tal guisa se foi a perder os olhos e as sobrancelhas,
que non podemos en novas haver tapo-te ao primeiro sono;
nen já non anda na irmandade.” com a minha piça o teu cono;
Nos mosteiros dos frades regrados e como o não faz nenhum,
a demandei e disseron-m’assi: com os colhões te tapo o cu.
“non busquedes vós a verdad’ aqui, E não rebentas, Marinha?
ca muitos anos havemos passados
que non morou nosco, per boa fé,
nen sabemos ond’ela agora esté Três cancioneiros
e d’al havemos maiores cuidados.”
E en Cistel, u verdade soía Três cancioneiros concentram boa parte da produção
sempre morar, disseron-me que non conhecida dos séculos XII, XIII e XIV: Cancioneiro da
morava i, havia gran sazon, Ajuda, Cancioneiro da Biblioteca Nacional e Cancionei-
nen frade d’i já a non conhocia, ro da Vaticana.
nen o abade outro si estar Os cancioneiros são manuscritos, coletâneas de
sol non queria que fôss’i pousar, cantigas com características variadas e escritas por di-
e anda já fora da abadia. versos autores. Os mais importantes são:
150
Cancioneiro da Ajuda Cancioneiro da Vaticana
Coleção de poesias em galego-português do final do Compilado na Itália no século XV – encontra-se na Bi-
século XIII, influenciadas pela lírica provençal. Recebe o blioteca do Vaticano.
nome de “da Ajuda” por se conservar na biblioteca do Chama-se da Vaticana porque foi encontrado na
Palácio Nacional da Ajuda, em Lisboa. Biblioteca do Vaticano, em Roma, onde foi preservado.
É o mais antigo de todos e é também o menos
completo, compreende apenas cantigas anteriores ao Levad’, amigo, que dormides as manhãas frias;
reinado do “rei trovador”, D. Dinis. todalas aves do mundo d’amor dizian:
leda m’ and’ eu.
Ondas do mar de Vigo,
Levad’, amigo, que dormide’-las frias manhãas;
Se vistes meu amigo?
todalas aves do mundo d’amor cantavan:
E, ai Deus, ele virá logo?
leda m’ and’ eu.
Ondas do mar levado,
se vistes meu amado? Toda-las aves do mundo d’ amor diziam;
E ai, Deus ele virá logo? do meu amor e do voss’ en ment’ avian:
Se vistes meu amigo, leda m’ and’ eu.
aquele por quem suspiro? Toda-las aves do mundo d’ amor cantavan;
E, ai Deus, ele virá logo? do meu amor e do voss’ i enmentavan:
Se vistes meu amado, leda m’ and’ eu.
por quem tenho muito cuidado?
E, ai Deus, ele virá cedo? Do meu amor e do voss’ en ment’avian;
vós lhi tolhestes os ramos en que siian:
Cancioneiro da Biblioteca Nacional leda m’ and’ eu.
Do meu amor e do voss’ i enmentavam;
Antes chamado de Cancioneiro Colocci-Brancuti – foi vos lhi tolhestes os ramos en que pousavam
compilado na Itália por volta de 1525-1526. Adquirido leda m’ and’ eu.
pelo Estado Português e depositado na Biblioteca Na-
Vós lhi tolhestes os ramos en que siian
cional de Lisboa, em 1924.
e lhis secastes as fontes en que bevian:
Essa coletânea de cantigas trovadorescas é tam-
leda m’ and’ eu.
bém conhecida como Collocci-Brancuti.
Vós lhi tolhestes os ramos en que pousavam
Em gram coita, senhor, e lhis secastes as fontes u se banhavan:
que peior que mort’é, leda m’ and’ eu.
vivo, per boa fé, No final do século XIII, Portugal conheceu os
e polo voss’amor
“cantares” de D. Dinis (1261-1325), comumente conhe-
esta coita sofr’eu
cido como “o rei trovador”. Seus poemas encontram-se
por vós, senhor, que eu
vi polo meu gran mal; coletados no Cancioneiro da Vaticana e no da Biblioteca
e melhor mi será Nacional. D. Dinis é autor de uma das mais conhecidas
de morrer por vós já; cantigas medievais portuguesas: Ai flores, ai flores
e, pois meu Deus non val, do verde pinho.
esta coita sofr’eu
por vós, senhor, que eu
polo meu gran mal vi,
e mais mi val morrer
ca tal coita sofrer
pois por meu mal assi
esta coita sofr’eu
por vós, senhor, que eu
vi por gran mal de mi
pois tan coitad’and’eu.
151
Existem repetições, expedientes típicos das cantigas de amigo: a moça enamorada dirige-se à natureza
(pinheiros) e essa lhe responde às perguntas sobre o namorado.
Esta é a mais famosa cantiga de d. Dinis, tendo gerado, inclusive, a epígrafe de Fernando Pessoa.

As novelas de cavalaria

As novelas de cavalaria são os primeiros romances, ou seja, longas narrativas em verso, surgidas no século
XII. Elas contam as aventuras vividas pelos cavaleiros andantes e tiveram origem no declínio do prestígio da poesia
dos trovadores.
Estão organizadas em três ciclos, de acordo com o tema que desenvolvem e com o tipo de herói
que apresentam:

§§ Ciclo Clássico: novelas que narram a guerra de Troia e as aventuras de Alexandre, o Grande. O ciclo recebe
essa denominação porque seus heróis vêm do mundo clássico mediterrâneo.

§§ Ciclo arturiano ou bretão: histórias envolvendo o rei Arthur e os cavaleiros da Távola Redonda. Nessas
novelas, podem ser identificados vários núcleos temáticos: a história de Percival, a história de Tristão e Isol-
da, as aventuras dos cavaleiros da corte do rei Arthur e a demanda do Santo Graal.

§§ Ciclo carolíngio ou francês: histórias sobre o rei Carlos Magno e os 12 pares de frança.
Dos três ciclos, o arturiano permanece como um dos temas literários mais explorados, sendo objeto de
romances, poemas, filmes e óperas até hoje.
No trecho a seguir, extraído de A demanda do Santo Graal, Galaaz chega à Távola Redonda.

Como Galaaz entrou no paço e acabou o assento perigoso.


(A demanda do Santo Graal, manuscrito do século XIII)

Eles [...] olharam e viram que todas as portas do paço se fecharam e todas as janelas, mas não escureceu
por isso o paço, porque entrou um tal raio de sol, que por toda a casa se estendeu. E aconteceu então uma grande
maravilha, não houve quem no paço não perdesse a fala; e olhavam-se uns aos outros e nada podiam dizer, e não
houve alguém tão ousado, que disso não ficasse espantado; mas não houve quem saísse do assento, enquanto
152
isto durou. Aconteceu que entrou Galaaz armado de
loriga e brafoneiras e de elmo e de suas divisas de
veludo vermelho; e, após ele, chegou o ermitão, que
lhe rogara que o deixasse andar com ele, e trazia
um manto e uma gamacha de veludo vermelho em
seu braço.
Mas tanto vos digo que não houve no paço
quem pudesse entender por onde Galaaz entrara, que
em sua vinda não abriram porta nem janela. Mas do
ermitão não vos digo, porque o viram entrar pela por-
ta grande. E Galaaz, assim que chegou ao meio do
paço, disse de modo que todos ouviram:
– A paz esteja convosco.
E o homem bom pôs as vestes que trazia sobre
um tapete, e foi ao rei Arthur e disse-lhe:
– Rei Arthur, eu trago o cavaleiro desejado,
aquele que vem da alta linhagem do rei Davi e de
José de Arimateia, pelo qual as maravilhas desta terra
e das outras terão fim.
E com isto que o homem bom disse, ficou o rei
muito alegre. E disse:
– Se isto é verdade, sede bem-vindo. E bem vindo seja o cavaleiro, porque este é o que há de dar cabo às
aventuras do santo Graal. Nunca foi feita nesta corte tanta honra como lhe nós faremos; e quem quer que ele seja,
eu queria que lhe fosse muito bem, pois de tão alta linhagem vem como dizeis.
– Senhor, disse o ermitão, cedo o vereis em bom começo.
Então fê-lo vestir os panos que trazia e foi assentá-lo no assento perigoso. E disse:
– Filho, agora vejo o que muito desejei, quando vejo o assento perigoso ocupado.
[...]
O cavaleiro de quem Merlim e todos os profetas falaram. O rei, assim que viu no assento perigoso o cavalei-
ro de quem Merlim e todos os profetas falaram na Grã-Bretanha, então bem soube que aquele era o cavaleiro por
quem seriam acabadas as aventuras do reino de Logres, e ficou com ele tão alegre e tão feliz que bendisse a Deus:
Deus, bendito sejas tu que te aprouve de tanto viver eu que, em minha casa, visse aquele de quem todos os
profetas desta terra e das outras profetizaram, tão longo tempo há já.
[...]

153
E.O. Teste I a) as cantigas de amor recriaram o mesmo am-
biente palaciano das cortes galegas.
b) “a literatura do amor cortês” refletiu a ver-
1. É correto afirmar sobre o Trovadorismo que: dade sobre a vida privada medieval.
a) os poemas são produzidos para ser encenados. c) a servidão amorosa e a idealização da mu-
b) as cantigas de escárnio e maldizer têm te- lher foi o grande tema da poesia produzida
máticas amorosas. por vilões.
c) nas cantigas de amigo, o eu lírico é sempre d) o amor cortês foi uma prática literária que aos
feminino. poucos modelou o perfil do homem civilizado.
d) as cantigas de amigo têm estrutura poética e) nas cantigas medievais mulheres e homens sub-
complicada. metem-se às maneiras refinadas da cortesia.
e) as cantigas de amor são de origem nitida-
mente popular. TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES
Cantiga de Amor
2. Leia atentamente o texto abaixo.
Senhora minha, desde que vos vi,
Com’ousará parecer ante mi lutei para ocultar esta paixão
o meu amigo, ai amiga, por Deus, que me tomou inteiro o coração;
e com’ousará catar estes meus mas não o posso mais e decidi
olhos se o Deus trouxer per aqui, que saibam todos o meu grande amor,
pois tam muit’há que nom veo veer a tristeza que tenho, a imensa dor
mi e meus olhos e meu parecer? que sofro desde o dia em que vos vi.
Com’ousará parecer ante mi de Dom Dinis.
Disponível em: <http://pt.wikisource.org/
Já que assim é, eu venho-vos rogar
wiki/Com%27ousar%C3%A1_pare- que queirais pelo menos consentir
cer_ante_mi>. Acesso em: 5 dez. 2012. que passe a minha vida a vos servir (...)
Afonso Fernandes (www.caestamosnos.
per = por; tam = tão; nom = não; veer = ver; org/ efemerides/118. Adaptado)
mi = mim, me parecer = semblante

Sobre o fragmento anterior, pode-se afirmar 4. Observando-se a última estrofe, é possível


que pertence a uma cantiga de: afirmar que o apaixonado:
a) amor, pois o eu lírico masculino declara a a) se sente inseguro quanto aos próprios senti-
uma amiga o sentimento de amor que tem mentos.
por ela. b) se sente confiante em conquistar a mulher
b) amigo, pois o eu lírico feminino expressa a amada.
uma amiga a falta de seu amigo por quem c) se declara surpreso com o amor que lhe de-
sente amor. dica a mulher amada.
c) amor, pois o eu lírico é feminino e acha que
d) possui o claro objetivo de servir sua amada.
seu amor não deve voltar para os seus braços.
e) conclui que a mulher amada não é tão pode-
d) amigo, pois o eu lírico masculino entende
rosa quanto parecia a princípio.
que só Deus pode trazer de volta sua amiga
a quem não vê há muito tempo.
e) amor, pois o eu lírico feminino não consegue 5. Uma característica desse fragmento, tam-
enxergar o amor que sente por seu amigo. bém presente em outras cantigas de amor do
Trovadorismo, é:
a) a certeza de concretização da relação amorosa.
3. “A literatura do amor cortês, pode-se acres-
b) a situação de sofrimento do eu lírico.
centar, contribuiu para transformar de al-
gum modo a realidade extraliterária, atua c) a coita de amor sentida pela senhora amada.
como componente do que Elias (1994)* cha- d) a situação de felicidade expressa pelo eu lírico.
mou de processo civilizador. Ao mesmo tem- e) o bem-sucedido intercâmbio amoroso entre
po, a realidade extraliterária penetra pro- pessoas de camadas distintas da sociedade.
cessualmente nessa literatura que, em parte,
nasceu como forma de sonho e de evasão.” TEXTOS PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
Revista de Ciências Humanas, Florianópolis, EDUFSC, v. 41, n. 1
Texto I
e 2, p. 83-110, Abril e Outubro de 2007 pp. 91-92) (*) Cf. ELIAS, Ao longo do sereno
N. O Processo Civilizador. Rio de Janeiro: Zahar, 1994, v.1. Tejo, suave e brando,
Num vale de altas árvores sombrio,
Interprete o comentário acima e, com base Estava o triste Almeno
nele e em seus conhecimentos acerca do li- Suspiros espalhando
rismo medieval galego-português, marque a Ao vento, e doces lágrimas ao rio.
alternativa correta: (Luís de Camões, Ao longo do sereno.)

154
Texto II 8. Assinale a alternativa INCORRETA a respeito
Bailemos nós ia todas tres, ay irmanas, das cantigas de amor.
so aqueste ramo destas auelanas a) O ambiente é rural ou familiar.
e quen for louçana, como nós, louçanas, b) O trovador assume o eu lírico masculino: é o
homem quem fala.
se amigo amar,
c) Têm origem provençal.
so aqueste ramo destas auelanas
d) Expressam a “coita” amorosa do trovador,
uerrá baylar. por amar uma dama inacessível.
(Aires Nunes. In: Nunes, J.J., Crestomatia arcaica.) e) A mulher é um ser superior, normalmente
pertencente a uma categoria social mais ele-
Texto III
vada que a do trovador.
Tão cedo passa tudo quanto passa!
morre tão jovem ante os deuses quanto
9. Assinale a alternativa INCORRETA a respeito
Morre! Tudo é tão pouco! do Trovadorismo em Portugal:
Nada se sabe, tudo se imagina. a) Durante o Trovadorismo, ocorreu a separação
Circunda-te de rosas, ama, bebe entre a poesia e a música.
E cala. O mais é nada. b) Muitas cantigas trovadorescas foram reuni-
(Fernando Pessoa, Obra poética.) das em livros ou coletâneas que receberam o
nome de cancioneiros.
Texto IV c) Nas cantigas de amor, há o reflexo do rela-
Os privilégios que os Reis cionamento entre senhor e vassalo na socie-
Não podem dar, pode Amor, dade feudal: distância e extrema submissão.
Que faz qualquer amador d) Nas cantigas de amigo, o trovador (sempre
Livre das humanas leis. um homem) escreve o poema assumindo o
mortes e guerras cruéis, papel feminino.
Ferro, frio, fogo e neve,
Tudo sofre quem o serve. 1
0. As narrativas que envolvem as lutas dos cru-
zados envolvem sempre um herói muito en-
(Luís de Camões, Obra completa.)
gajado na luta pela cristandade, podendo ser
Texto V a um só tempo frágil e forte, decidido e ter-
As minhas grandes saudades no, furioso e cortes. No entanto, com relação
à mulher amada, esse herói é sempre:
São do que nunca enlacei.
a) indiferente.
Ai, como eu tenho saudades
b) infiel.
Dos sonhos que não sonhei! (...) c) devotado.
(Mário de Sá Carneiro, Poesias.) d) indelicado.
e) ausente.
6. (Unifesp) A alternativa que indica texto que
faz parte da poesia medieval da fase trova-
doresca é: E.O. Teste II
a) I.
b) II.
TEXTO PARA AS PRÓXIMAS DUAS QUESTÕES
c) III.
d) IV. Texto I
e) V. Ondas do mar de Vigo,
se vistes meu amigo!
7. Sobre a poesia trovadoresca em Portugal, é E ai Deus, se verrá cedo!
INCORRETO afirmar que: Ondas do mar levado,
a) refletiu o pensamento da época, marcada se vistes meu amado!
pelo teocentrismo, o feudalismo e valores E ai Deus, se verrá cedo!
altamente moralistas. (Martim Codax)
Obs.: verrá = virá; levado = agitado
b) representou um claro apelo popular à arte,
que passou a ser representada por setores Texto II
mais baixos da sociedade. Me sinto com a cara no chão, mas a verdade
c) pode ser dividida em lírica e satírica. [precisa
d) em boa parte de sua realização, teve influ- ser dita ao menos uma vez: aos 52 anos eu
ência provençal. [ignorava
e) as cantigas de amigo, apesar de escritas por a admirável forma lírica da canção paralelística
trovadores, expressam o eu lírico feminino. (…).
155
O “Cantar de amor” foi fruto de meses de 4. (Fuvest) Interpretando historicamente a re-
[leitura lação de vassalagem entre homem amante/
dos cancioneiros. Li tanto e tão seguidamente mulher amada, ou mulher amante/homem
[aquelas amado, pode-se afirmar que:
deliciosas cantigas, que fiquei com a cabeça a) o Trovadorismo corresponde ao Renascimento.
cheia de “velidas” e “mha senhor” e “nula ren”; b) o Trovadorismo corresponde ao movi-
sonhava com as ondas do mar de Vigo e com mento humanista.
[romarias
c) o Trovadorismo corresponde ao Feudalismo.
a San Servando. O único jeito de me livrar da
obsessão era fazer uma cantiga. d) o Trovadorismo e o Medievalismo só pode-
(Manuel Bandeira) riam ser provençais.
e) tanto o Trovadorismo como o Humanismo
1. Assinale a afirmativa correta sobre o texto I. são expressões da decadência medieval.
a) Nessa cantiga de amigo, o eu lírico masculino
manifesta a Deus seu sofrimento amoroso. 5. Endechas à escrava Bárbara
b) Nessa cantiga de amor, o eu lírico feminino Aquela cativa,
dirige-se a Deus para lamentar a morte do que me tem cativo
ser amado.
porque nela vivo,
c) Nessa cantiga de amigo, o eu lírico masculi-
no manifesta às ondas do mar sua angústia já não quer que viva.
pela perda do amigo em trágico naufrágio. Eu nunca vi rosa
d) Nessa cantiga de amor, o eu lírico masculi- em suaves molhos,
no dirige-se às ondas do mar para expressar que para meus olhos
sua solidão. fosse mais formosa.
e) Nessa cantiga de amigo, o eu lírico feminino Uma graça viva,
dirige-se às ondas do mar para expressar sua que neles lhe mora,
ansiedade com relação à volta do amado. para ser senhora
2. No texto II, o autor: de quem é cativa.
a) manifesta sua resistência à obrigatoriedade Pretos os cabelos,
de ler textos medievais durante o período de onde o povo vão
formação acadêmica. perde opinião
b) utiliza a expressão “cabeça cheia” para de- que os louros são belos.
preciar as formas linguísticas do galaico-por- Pretidão de Amor,
tuguês, como “mha senhor” e “nula ren”. tão doce a figura,
c) relata circunstâncias que o levaram a compor que a neve lhe jura
um poema que recupera a tradição medieval.
que trocara a cor.
d) emprega a palavra “cancioneiros” em subs-
tituição a “poetas”, uma vez que os textos Leda mansidão
medievais eram cantados. que o siso acompanha;
e) usa a expressão “deliciosas cantigas” em sen- bem parece estranha,
tido irônico, já que os modernistas considera- mas bárbara não.
ram medíocres os estilos do passado. endechas = versos em redondilha menor (cinco sílabas);
molhos = feixes; leda = risonha; Vão = fútil.
3. Marque V, para verdadeiro, e F, para falso.
( ) As cantigas de maldizer e de escárnio Em sua obra, Camões continua a tradição da
pertencem à lírica trovadoresca. conduta amorosa das cantigas medievais.
( ) As cantigas de amigo possuem um am- Nela, a mulher amada era considerada:
biente palaciano e o eu lírico é feminino, a) responsável pelas contradições e insatisfa-
apesar de serem escritas por homem. ções do homem.
( ) As cantigas de amor possuem um am- b) símbolo do amor erótico.
biente palaciano e suas características c) incapaz de levar o homem a atingir o Bem.
principais são a vassalagem amorosa e a d) um ser impuro e prejudicial ao homem.
coita de amor. e) uma pessoa superior, fonte de virtudes.
( ) A canção da Ribeirinha iniciou o trovado-
rismo português. 6. Senhor feudal
( ) As cantigas de amigo, em geral, possuem Se Pedro Segundo
um eu lírico feminino, apesar de serem Vier aqui
escritas por homens. A temática princi- Com história
pal, quase sempre, é o sofrimento da mu- Eu boto ele na cadeia.
lher pelo amado que partiu. (Oswald de Andrade)

156
O título do poema de Oswald remete o leitor TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES
à Idade Média. Nele, assim como nas canti- Cantiga de Amor
gas de amor, a ideia de poder retoma o con- (Afonso Fernandes)
ceito de:
a) fé religiosa. Senhora minha, desde que vos vi,
b) relação de vassalagem. lutei para ocultar esta paixão
c) idealização do amor. que me tomou inteiro o coração;
d) saudade de um ente distante. mas não o posso mais e decidi
e) igualdade entre as pessoas. que saibam todos o meu grande amor,
a tristeza que tenho, a imensa dor
7. (G1 - ifsp 2016) A poesia do Trovadorismo que sofro desde o dia em que vos vi.
português tem íntima relação com a música,
pois era composta para ser entoada ou can- Já que assim é, eu venho-vos rogar
tada, sempre acompanhada de instrumental, que queirais pelo menos consentir
como o alaúde, a viola, a flauta, ou mesmo que passe a minha vida a vos servir (...)
com a presença do coro. (www.caestamosnos.org/efemerides/118. Adaptado)
A respeito dessa escola literária, assinale a
alternativa correta.
a) Os principais trovadores utilizavam a guitarra 9. Observando-se a última estrofe, é possível
elétrica para acompanhar a exibição. afirmar que o apaixonado:
b) As composições dividem-se em dois grandes a) se sente inseguro quanto aos próprios senti-
grupos: líricas e satíricas. mentos.
c) Os principais trovadores são: Padre Antônio b) se sente confiante em conquistar a mulher
Viera e Camões. amada.
d) O Trovadorismo é uma escola literária con- c) se declara surpreso com o amor que lhe de-
temporânea. dica a mulher amada.
e) São exemplos de Cantigas Satíricas as Canti- d) possui o claro objetivo de servir sua amada.
gas de Amor e de Amigo. e) conclui que a mulher amada não é tão pode-
rosa quanto parecia a princípio.
8. (ESPM) O amor cortês foi um gênero pratica-
do desde os trovadores medievais europeus. 10. Uma característica desse fragmento, tam-
Nele a devoção masculina por uma figura fe-
bém presente em outras cantigas de amor do
minina inacessível foi uma atitude constante.
Trovadorismo, é:
A opção cujos versos confirmam o exposto é:
a) a certeza de concretização da relação amorosa.
a) Eras na vida a pomba predileta
b) a situação de sofrimento do eu lírico.
(...) Eras o idílio de um amor sublime.
c) a coita de amor sentida pela senhora amada.
Eras a glória, - a inspiração, - a pátria,
d) a situação de felicidade expressa pelo eu lírico.
O porvir de teu pai!
e) o bem-sucedido intercâmbio amoroso entre
(Fagundes Varela)
pessoas de camadas distintas da sociedade.
b) Carnais, sejam carnais tantos desejos,
Carnais sejam carnais tantos anseios,
Palpitações e frêmitos e enleios
Das harpas da emoção tantos arpejos...
E.O. Teste III
(Cruz e Sousa) 1. Assinale a afirmativa correta com relação ao
c) Quando em meu peito rebentar-se a fibra, Trovadorismo.
Que o espírito enlaça à dor vivente, Texto I
Não derramem por mim nenhuma lágrima Ondas do mar de Vigo,
Em pálpebra demente. se vistes meu amigo!
(Álvares de Azevedo) E ai Deus, se verrá cedo!
d) Em teu louvor, Senhora, estes meus versos Ondas do mar levado,
E a minha Alma aos teus pés para cantar-te, se vistes meu amado!
E os meus olhos mortais, em dor imersos, E ai Deus, se verrá cedo!
Para seguir-lhe o vulto em toda a parte. (Martim Codax)
Obs.: verrá = virá; levado = agitado
(Alphonsus de Guimaraens)

e) Que pode uma criatura senão, Texto II


entre criaturas, amar? Me sinto com a cara no chão, mas a verdade
amar e esquecer [precisa
amar e malamar, ser dita ao menos uma vez: aos 52 anos eu
amar, desamar, amar? [ignorava
(Manuel Bandeira) a admirável forma lírica da canção paralelística
157
(…). b) amor, em que se mostra o amor de Deus
O “Cantar de amor” foi fruto de meses de com o cavalo que, abandonado pelo dono,
[leitura comeu a erva que cresceu graças à chuva e
dos cancioneiros. Li tanto e tão seguidamente ao bom tempo.
[aquelas c) escárnio, na qual se conta a divertida his-
deliciosas cantigas, que fiquei com a cabeça tória do cavalo que, graças ao bom tempo e
cheia de “velidas” e “mha senhor” e “nula ren”; à chuva, alimentou-se, recuperou-se e pôde,
sonhava com as ondas do mar de Vigo e com então, fugir do dono que o maltratava.
[romarias d) amigo, em que se mostra que o dono do ca-
a San Servando. O único jeito de me livrar da valo não lhe buscou cevada nem o ferrou por
obsessão era fazer uma cantiga. causa do mau tempo e da chuva que Deus
(Manuel Bandeira) mandou, mas mesmo assim o cavalo pôde
recuperar-se.
a) Um dos temas mais explorados por esse es- e) mal-dizer, satirizando a atitude do dono que
tilo de época é a exaltação do amor sensual ferrou o cavalo, mas esqueceu-se de alimen-
entre nobres e mulheres camponesas. tá-lo, deixando-o entregue à própria sorte
b) Desenvolveu-se especialmente no século XV para obter alimento.
e refletiu a transição da cultura teocêntrica
para a cultura antropocêntrica. 3. (Fuvest) Sobre o Trovadorismo em Portugal,
c) Devido ao grande prestígio que teve durante é correto afirmar que:
toda a Idade Média, foi recuperado pelos po- a) sua produção literária está escrita em galego
etas da Renascença, época em que alcançou ou galêgo-português e divide-se em: poesia
níveis estéticos insuperáveis. (cantigas) e prosa (novelas de cavalaria).
d) Valorizou recursos formais que tiveram não b) utilizou largamente o verso decassílabo por-
apenas a função de produzir efeito musical, que sua influência é clássica.
como também a função de facilitar a memo- c) a produção poética daquela época pode ser di-
rização, já que as composições eram trans- vidida em lírico-amorosa e prosa doutrinária.
mitidas oralmente. d) as cantigas de amigo têm influência provençal.
e) Tanto no plano temático como no plano ex- e) a prosa trovadoresca tinha claro objetivo de
pressivo, esse estilo de época absorveu a in- divertir a nobreza, por isso têm cunho satírico.
fluência dos padrões estéticos greco-romanos.
4. (Fuvest) O Trovadorismo, quanto ao tempo
2. (Unifesp) Leia a cantiga seguinte, de Joan em que se instala:
Garcia de Guilhade. a) tem concepções clássicas do fazer poético.
b) é rígido quanto ao uso da linguagem que,
Un cavalo non comeu
geralmente, é erudita.
á seis meses nen s’ergueu
c) estabeleceu-se num longo período que dura
mais prougu’a Deus que choveu,
10 séculos.
creceu a erva,
d) tinha como concepção poética a epopeia, a
e per cabo si paceu,
louvação dos heróis.
e já se leva!
e) reflete as relações de vassalagem nas canti-
Seu dono non lhi buscou
gas de amor.
cevada neno ferrou:
mai-lo bon tempo tornou,
creceu a erva, 5. Assinale a afirmação falsa sobre as cantigas
e paceu, e arriçou, de escárnio e mal dizer:
a) A principal diferença entre as duas modali-
e já se leva!
dades satíricas está na identificação ou não
Seu dono non lhi quis dar
da pessoa atingida.
cevada, neno ferrar;
b) O elemento das cantigas de escárnio não é
mais, cabo dum lamaçal
temático, nem está na condição de se omitir
creceu a erva,
a identidade do ofendido. A distinção está
e paceu, e arriç’ar,
no retórico do “equívoco”, da ambiguidade e
e já se leva!
da ironia, ausentes na cantiga de maldizer.
(CD Cantigas from the Court of Dom Dinis.
harmonia mundi, usa, 1995.) c) Os alvos prediletos das cantigas satíricas
eram os comportamentos sexuais (homosse-
A leitura permite afirmar que se trata de xualidade, adultério, padres e freiras libidi-
uma cantiga de: nosos), as mulheres (soldadeiras, prostitu-
a) escárnio, em que se critica a atitude do dono tas, alcoviteiras e dissimuladas), os próprios
do cavalo, que dele não cuidara, mas graças poetas (trovadores e jograis eram frequente-
ao bom tempo e à chuva, o mato cresceu e o mente ridicularizados), a avareza, a corrup-
animal pôde recuperar-se sozinho. ção e a própria arte de trovar.
158
d) As cantigas satíricas perfazem cerca de uma 3. (Fuvest) “Coube ao século XIX a descober-
quarta parte da poesia contida nos cancionei- ta surpreendente da nossa época lírica. Em
ros galego-portugueses. Isso revela que a li- 1904, com a edição crítica e comentada do
berdade da linguagem e a ausência de precon- Cancioneiro da Ajuda, por Carolina Michaëlis
ceito ou censura (institucional, estética ou de Vasconcelos, tivemos grande visão de
pessoal) eram componentes da vida literária conjunto do valiosíssimo espólio descober-
no período trovadoresco, antes de a repressão to.” (Costa Pimpão)
inquisitorial atirá-las à clandestinidade. a) Qual é essa “primeira época lírica” portu-
e) Algumas composições satíricas do Cancionei- guesa?
ro Geral e algumas cenas dos autos gilvicen- b) Que tipos de composições poéticas se culti-
tinos revelam a sobrevivência, já bastante vam nessa época?
atenuada, da linguagem livre e da violência As questões 4, 5 e 6 tomam por base uma
verbal dos antigos trovadores. cantiga do trovador galego Airas Nunes, de
Santiago (século XIII), e o poema Confessor
Medieval, de Cecília Meireles (1901-1964).
E.O. Dissertativo Cantiga
Bailemos nós já todas três, ai amigas,
1. Os textos abaixo são de cantigas medievais So aquestas avelaneiras frolidas [floridas],
e foram adaptados para o português atual. E quem for velida [formosa], como nós, velidas,
Identifique cada uma de acordo com as ca- Se amigo amar,
racterísticas das cantigas de amor, de amigo, So aquestas [estas] avelaneiras frolidas
de escárnio ou de maldizer. Verrá [virá] bailar.
a) A dona que eu sirvo e que muito adoro mos- Bailemos nós já todas três, ai irmanas [irmãs],
trai-ma, ai Deus! pois eu vos imploro se não, So aqueste [este] ramo destas avelanas,
dai-me a morte. E quem for louçana, como nós, louçanas
(Bernardo de Bonaval) [formosa],
Se amigo amar,
b) Trovas não fazeis como provençal mas como
So aqueste ramo destas avelanas [avelaneiras]
Bernardo, o de Bonaval. O vosso trovar não
Verrá bailar.
é natural.
Por Deus, ai amigas, mentr’al [enquanto ou-
Ai de vós, com ele e o Demo aprendestes.
tras coisas] non fazemos,
Em trovardes mal, vejo eu o sinal das loucas So aqueste ramo frolido bailemos,
ideias em que empreendestes. Por isso, D. E quem bem parecer [tiver belo aspecto],
Pero, em Vila-Real, como nós parecemos Se amigo amar,
Fatal foi a hora em que tanto bebestes. So aqueste ramo so lo que bailemos
(D. Afonso X, o Sábio) Verrá bailar.
c) Ai flores, ai flores do verde ramo, se sabe- SANTIAGO, Airas Nunes de. In: SPINA, Segismundo.
Presença da Literatura Portuguesa – I. Era Medieval.
des novas do meu amado? Ai, Deus, onde 2. ed. São Paulo: Difusão Europeia do Livro, 1966.
ele está?
(D. Dinis) Confessor Medieval (1960)
Irias à bailia com teu amigo,
d) Ai, dona feia, foste-vos queixar de que nun- Se ele não te dera saia de sirgo [seda]?
ca vos louvei em meu trovar; e umas trovas Se te dera apenas um anel de vidro
vos quero dedicar em que louvada de toda Irias com ele por sombra e perigo?
maneira sereis; tal é o meu louvar: dona Irias à bailia sem teu amigo,
feia, velha e sandia! Se ele não pudesse ir bailar contigo?
(João Garcia de Guilhade) Irias com ele se te houvessem dito
Que o amigo que amavas é teu inimigo?
Sem a flor no peito, sem saia de sirgo,
2. “Ua dona, nom digu’eu qual, Irias sem ele, e sem anel de vidro?
non agoirou ogano mal Irias à bailia, já sem teu amigo,
polas oitavas de Natal: E sem nenhum suspiro?
ia por as missa oir e MEIRELES, Cecília. Poesias completas de Cecília Meireles.
ouv’un corvo carnaçal, v.8. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1974.
e non quis da casa sair...”
(Joan Airas de santiago, século XIII) 4. As cantigas que focalizam temas amorosos
apresentam-se em dois gêneros na poesia
O fragmento acima pertence a uma cantiga trovadoresca: as “cantigas de amor”, em que
de escárnio. Por que não pode ser classifica- o eu-poemático representa a figura do namo-
do como uma cantiga de maldizer? rado (o “amigo”), e as “cantigas de amigo”,
159
em que o eu-poemático representa a figura E me vingar a qualquer preço
da mulher amada (a “amiga”) falando de seu Te adorando pelo avesso
amor ao “amigo”, por vezes dirigindo-se a Pra mostrar que ainda sou tua
ele ou dialogando com ele, com outras “ami- a) Quais os sentimentos que podemos ver nessa
gas” ou, mesmo, com um confidente (a mãe, música?
a irmã etc.). De posse desta informação: b) A pessoa, que “fala” na música, é um ho-
a) Classifique a cantiga de Airas Nunes em um mem ou uma mulher? Justifique.
dos dois gêneros, apresentando a justificati-
va dessa resposta. TEXTOS PARA AS 2 PRÓXIMAS QUESTÕES
b) Identifique, levando em consideração o pró- Sedia la fremosa seu sirgo torcendo
prio título, a figura que o eu poemático do (Estêvão Coelho)
poema de Cecília Meireles representa.
Sedia la fremosa seu sirgo torcendo,
Sa voz manselinha fremoso dizendo
5. (Unesp) A leitura da cantiga de Airas Nunes
Cantigas d’amigo.
e do poema “Confessor Medieval”, de Cecí-
lia Meireles, revela que este poema, mesmo Sedia la fremosa seu sirgo lavrando,
tendo sido escrito por uma poeta moder- Sa voz manselinha fremoso cantando
nista, apresenta intencionalmente algumas Cantigas d’amigo.
características da poesia trovadoresca, como - Par Deus de Cruz, dona, sey que avedes
o tipo de verso e a construção baseada na Amor muy coytado que tan ben dizedes
repetição e no paralelismo. Cantigas d’amigo.
Releia com atenção os dois textos e, em seguida: Par Deus de Cruz, dona, sey que andades
a) considerando que o efeito de paralelismo em D’amor muy coytada que tan ben cantades
cada poema se torna possível a partir da re- Cantigas d’amigo.
tomada, estrofe a estrofe, do mesmo tipo de
frase adotado na estrofe inicial (no poema - Avuytor comestes, que adevinhades.
de Airas Nunes, por exemplo, a retomada da (Cantiga nº 321 - Cancioneiro da Vaticana)
frase imperativa), aponte o tipo de frase que
Estava a formosa seu fio torcendo
Cecília Meireles retomou de estrofe a estrofe
(paráfrase de Cleonice Berardinelli)
para possibilitar tal efeito.
b) estabeleça as identidades que há entre o ter- Estava a formosa seu fio torcendo,
ceiro verso da cantiga de Airas Nunes e o Sua voz harmoniosa, suave dizendo
terceiro verso do poema de Cecília Meireles Cantigas de amigo.
no que diz respeito ao número de sílabas e Estava a formosa sentada, bordando,
às posições dos acentos. Sua voz harmoniosa, suave cantando
Cantigas de amigo.
6. (Unesp) Tanto na cantiga como no poema de - Por Jesus, senhora, vejo que sofreis
Cecília Meireles verificam-se diferentes per- De amor infeliz, pois tão bem dizeis
sonagens: um eu-poemático, que assume a Cantigas de amigo.
palavra, e um interlocutor ou interlocutores
Por Jesus, senhora, eu vejo que andais
a quem se dirige. Com base nesta informa-
Com penas de amor, pois tão bem cantais
ção, releia os dois poemas e, a seguir indique
Cantigas de amigo.
o interlocutor ou interlocutores do eu-poe-
mático em cada um dos textos. - Abutre comeste, pois que adivinhais.
In: BERARDINELLI, Cleonice. Cantigas de
trovadores medievais em Português moderno. Rio
7. Leia a música e responda as questões. de Janeiro: Organ. Simões, 1953, p. 58-59.
Atrás da Porta
Quando olhaste bem nos olhos meus 8. (Unesp) Considerando-se que o último ver-
E o teu olhar era de adeus so da cantiga caracteriza um diálogo entre
Juro que não acreditei, eu te estranhei personagens; considerando-se que a palavra
Me debrucei sobre teu corpo e duvidei “abutre” grafava-se “avuytor”, em portu-
E me arrastei e te arranhei guês arcaico; e considerando-se que, de acor-
E me agarrei nos teus cabelos do com a tradição popular da época, era pos-
Nos teu peito, teu pijama sível fazer previsões e descobrir o que está
Nos teus pés ao pé da cama oculto, comendo carne de abutre, mediante
Sem carinho, sem coberta estas três considerações:
No tapete atrás da porta a) Identifique o personagem que se expressa em
Reclamei baixinho discurso direto, no último verso do poema;
Dei pra maldizer o nosso lar b) Interprete o significado do último verso, no
Pra sujar teu nome, te humilhar contexto do poema.
160
9. (Unesp) O paralelismo é um dos recursos 4.
estilísticos mais comuns na poesia líricoa- a) O eu lírico feminino se dirige às amigas,
morosa trovadoresca. Consiste na ênfase de por isso o poema de Airas Nunes pode ser
uma ideia central, às vezes repetindo ex- considerado uma “cantiga de amigo”.
pressões idênticas, palavra por palavra, em b) No poema de Cecília Meireles, o título do
séries de estrofes paralelas. A partir destas poema indica um eu lírico que é um pa-
observações, releia o texto de Estêvão Coelho dre com quem a moça se confessa.
e responda: 5.
a) O poema se estrutura em quantas séries de a) A oração subordinada adverbial condicio-
estrofes paralelas? Identifique-as. nal foi retomada, estrofe a estrofe, pela
b) Que ideias centrais são enfatizadas em cada autora. Estas orações aparecem no segun-
série paralelística? do verso (primeira estrofe) e, de corpo
inteiro, (segunda e terceira estrofes).

Gabarito Além disso, aparecem na penúltima es-


trofe em estrutura mais simples em con-
dicional determinada pela da preposição
“sem”.
b) No que diz respeito à metrificação, os
E.O. Teste I versos indicados em ambos os textos são
1. C 2. B 3. D 4. D 5. B iguais, logo chamados de hendecassíla-
bos. Eles são acentuados nas quintas e
6. B 7. B 8. A 9. A 10. C nas décimas primeiras sílabas.
6.
O eu lírico feminino na cantiga se dirige a
duas moças (amigas e irmãs), estabelecen-
do com elas interlocução de sua fala. Já no
E.O. Teste II poema, o eu lírico apresenta-se como um
1. E 2. C 3. F-F-V-V-V 4. C 5. A homem, um confidente que faz perguntas
à moça apaixonada, mantendo com ela uma
6. B 7. B 8. D 9. D 10. B lógica de interlocução.
7.
a) Os sentimentos abordados na canção es-
tão atrelados ao sofrimento frente à par-
E.O. Teste III tida da pessoa amada.
1. D 2. A 3. A 4. E 5. B b) É tipicamente uma cantiga de amigo,
pois, ao falar da pessoa amada, o eu lírico
se revela como uma mulher, apesar de ter
sido escrita por um homem.
E.O. Dissertativo 8.
a) A personagem que se expressa em discur-
1.
a) cantiga de amor so direto é a “mulher”.
b) cantiga de maldizer b) A personagem considera o poeta um vi-
c) cantiga de amigo dente, pois ele descobre no último verso
d) cantiga de escárnio o seu sofrimento amoroso.
2.
O fragmento não pode ser considerado uma 9.
cantiga de maldizer, pois não é direta. Não é a) O poema se estrutura em duas séries: as
possível identificar a pessoa criticada, além duas primeiras estrofes e as duas estrofes
de apresentar vocabulário comedido. seguintes.
3. b) Na primeira estrofe, o foco se dá nos afa-
a) O Trovadorismo. zeres da mulher. Já na segunda, a temá-
b) As cantigas líricas e satíricas. tica recai sobre seu sofrimento.

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© Peter Paul Rubens/Wikimedia Commons

Aulas 5 e 6

Humanismo e Classicismo
Humanismo

DORÉ, Gustave. Demônios confrontando Dante e Virgílio. Ilustração


para o livro A divina Comédia (Inferno), de Dante Alighieri, publicado
em 1885 – Biblioteca de Artes Decorativas (Paris, França). A ilustra-
ção reflete a confiança dos humanistas. Dante e Virgílio enfrentam os
demônios por meio da razão, que os ajuda a afastar as “trevas” do
pensamento vinculado à Idade Média.

Cronologia do Humanismo
Início: Nomeação de Fernão Lopes,
em 1418, como o cronista-mor da Torre “[...] os humanistas consideravam a Antiguidade
do Tombo. afastada deles no tempo (tudo o que fosse velho ti-
Fim: Em 1527, com a chegada do po- nha para eles um interesse especial), mas espiritual-
eta Sá de Miranda, da Itália, com a Medida mente próxima, ao passo que a Idade Média estava
Nova (verso decassílabo). mais próxima no tempo, mas extremamente distan-
te em muitos aspectos [...].”
DRESDEN, Sem. O Humanismo no renascimento.
Tradução de Daniel Gonçalves. Porto: Inova. p. 55.

Contexto
O Humanismo foi um movimento artístico e intelec-
tual que se estabeleceu como uma transição entre o
teocentrismo da Idade Média e o pensamento antro-
pocêntrico do Renascimento, que surgiu na Itália no
final da Idade Média (século XIV). A organização so-
cial passou por uma reformulação, e nas áreas mais
longínquas, aos feudos medievais passaram a surgir
pequenas cidades que funcionavam independentes do
Monteriggioni - Burgo (Itália) poder absoluto dos monarcas, eram os burgos e seus
habitantes, os burgueses.
A lógica dos humanistas era colocar em primeiro plano o próprio ser humano, o que os afastava do teocen-
trismo medieval. Muitos camponeses, atraídos pelas promessas de prosperidade, transferiram-se para os burgos,
estas cidades ou vila medievais normalmente muradas e associadas a um mosteiro ou castelo, onde começaram a
trabalhar como pequenos mercadores.
Em função da substituição da sociedade do escambo e das trocas pelo surgimento do comércio e, primor-
dialmente, da moeda, o homem se viu rompendo com a lógica feudal das castas imóveis. Diante da possibilidade
de ascensão social passaram a investir mais em si, num individualismo que colocava o próprio homem e sua busca
por poder e acúmulo em primeiro plano, surgindo, assim, a burguesia.
163
cantados como seguia a tradição oral das cantigas. A
partir do início da produção de livros na Europa, so-
bretudo com Johann Gutenberg, por volta de 1450, a
Literatura ganha com obras que permitem ao escritor
se valer de novos recursos técnicos da escrita e da lin-
guagem e não ficarem presos à oralidade e à memória
como faziam até então. Para se ter uma ideia, surge na
Alemanha em 1455, a Bíblia de Gutenberg, o primeiro
livro impresso.
Lucca – Burgo (Itália)
Portugal e sua produção
Essas transformações que começaram a ocorrer
na Europa do fim da Idade Média fizeram com que a Os reis e nobres da Dinastia de Avis (1385-1580) tor-
vida nas cidades fosse retomada e o comércio inten- naram Portugal, mais poderoso e rico com o início da
sificado, provocando maior interação entre pessoas de expansão marítima em Portugal que surge ao mesmo
diferentes segmentos da sociedade. A riqueza passou
tempo em que se funda a Torre do Tombo, em 1418,
a ser associada ao capital obtido pelo comércio e não
que foi um importante centro de registro e documen-
mais pela terra, como ocorria na sociedade feudal.
tação da época. Destaca-se a figura de Fernão Lopes,
Com o enriquecimento da burguesia, em função
nomeado o cronista-mor da Torre do Tombo, em 1434,
do comércio, surge a necessidade de um investimento
na própria formação cultural para que pudesse contar e sendo responsável por escrever e catalogar as Crôni-
administrar a riqueza acumulada. A arte ganha com isso, cas historiográficas. Surge uma poesia desvinculada da
pois com a formação intelectual, fruto da lógica comer- música, chamada de Poesia Palaciana, com Garcia de
cial, o burguês passa a investir em cultura, aprende a ler Resende e sua compilação de poetas no “Cancioneiro
e a contar, algo que, até então, só era feito pela Igreja Geral”, de 1516.
e pelos grandes soberanos. Aos poucos, os leigos come- Destaca-se, também, a figura de Gil Vicente na
çam a conquistar um papel importante na produção e, produção teatral sendo um importante representante
principalmente, na circulação de cultura, arte literária.
da cultura e sociedade da época.
A busca por uma formação levou à redescoberta
de textos e autores da Antiguidade clássica, considera-
da uma fonte de saber a respeito do ser humano, resga-
tava-se, assim, a visão antropocêntrica, característica da
Crônica historiográfica
cultura greco-latina. (Fernão Lopes)
Projeto literário Fernão Lopes é importante, pois é a partir do registro de
suas crônicas historiográficas que se marca o início do
O abandono da subordinação ao Clero e o resgate dos
Humanismo em Portugal. Dezesseis anos após ter sido
valores clássicos fazem com que ganhe força um olhar
nomeado o guarda-mor da Torre do Tombo, em 1434,
mais racional sobre o mundo, buscando na Ciência
ele é nomeado cronista-mor do reino. Ele foi o primeiro
uma explicação para os fenômenos até então atribui-
grande prosador da Literatura Portuguesa e contribui
dos a Deus.
O contexto de produção é o mesmo do Trovado- decisivamente para o desenvolvimento da Língua Portu-
rismo, mas em função do desenvolvimento intelectual guesa moderna, ao criar uma visão de mundo indepen-
vindo da ampliação cultural promovida pela burguesia, dente das imposições do clero.
os textos passam a ser escritos para ser lidos e não mais Lopes escreveu três crônicas:
164
§§ Crônica de El-Rei D. Pedro I: compilação e crítica dos principais
acontecimentos do reino de D. Pedro I. Nesse volume, encontra-se o
relato do episódio da morte de Inês de Castro, amante do rei, assas-
sinada a mando de D. Afonso IV, pai de D. Pedro.

§§ Crônica de El-Rei D. Fernando: reconstituição do período que


se inicia com o casamento de D. Fernando com Dona Leonor Teles e
encerra-se com a Revolução de Avis.

§§ Crônica de El-Rei D. João: dividida em duas partes; a primeira


começa com a morte de D. Fernando, em 1383, e termina com a
revolução que leva D. João ao trono português; na segunda parte, é
descrito o reinado de D. João até 1411. Fernão Lopes distinguia-se
dos demais cronistas pela importância que dava ao povo. Essa opção
do cronista exemplifica o seu espírito humanista.

Poesia palaciana (Garcia de Resende)


A grande novidade da poesia palaciana é que ela se desvinculou da
tradição oral das cantigas trovadorescas e foi escrita para ser lida e
declamada. Ela consistia em composições coletivas, produzidas para
serem apresentadas nos salões da nobreza onde aconteciam os Se-
rões. Do ponto de vista temático, esses poemas ainda idealizavam o
amor e suas desilusões, mas sem o exagero trovadoresco. Do ponto
de vista formal, a mudança é nítida no que diz respeito à constituição
de uma Língua Portuguesa sem tantas influências provençais e gale-
gas, fato esse que contribuiu para o aperfeiçoamento da linguagem
com técnicas como as aliterações, o jogo de palavras, a conotação e a
ambiguidade. Além disso, explorou-se do metro fixo das Redondilhas
(Medida Velha).
Por conta do desenvolvimento do contexto de circulação lite-
rária, ou seja, com mais pessoas sabendo ler, mais se consumia lite-
ratura, portanto surgiram alguns escritores como Bernadim Ribeiro,
Duarte de Brito, Nuno Pereira, porém o mais importante foi Garcia de
Resende, pois ficou responsável, além de escrever, por compilar boa
parte da poesia humanista portuguesa. Esses poemas foram organi-
Inês de Castro, sob o olhar de Garcia de Resende. zados em um único volume, o Cancioneiro Geral, em 1516.

Medida Velha
Redondilhas maiores: versos com metrificação de 7 síla-
bas poéticas.
Redondilhas menores: versos com metrificação de 5 síla-
bas poéticas.

165
A poesia reunida por Garcia de Resende no Exemplo de poema compilado no Cancioneiro Geral:
Cancioneiro Geral traz algumas diferenças importan-
Entre mim mesmo e mim
tes em relação à lírica dos trovadores galego-portu-
não sei que se ergueu
gueses, no que se refere ao uso de formas poéticas
que tão meu inimigo sou.
regulares, como: Uns tempos com grande engano
§§ a trova: composta de duas ou mais quadras de vivi eu mesmo comigo,
versos de sete sílabas e rimas ABAB; agora no maior perigo
se me descobre maior dano.
§§ o vilancete: composto de um mote (motivo de
Caro custa um desengano,
dois ou três versos) seguido de voltas ou glosas embora este não me tenha matado
(estrofes em que o mote é desenvolvido) de sete quão caro que me custou!
versos; De mim me sou feito outro,
§§ a cantiga: composta de um mote de quatro ou entre o cuidado e cuidado
está um mal derramado,
cinco versos de uma glosa de oito ou dez versos,
que por mal grande me veio.
com repetição total ou parcial do mote no fim
Nova dor, novo receio
da glosa;
foi este que me tomou,
§§ a esparsa: composta de uma única estrofe de assim me tem, assim estou.
oito, nove ou dez versos de seis sílabas métricas. (Bernardim Ribeiro)

O teatro de Gil Vicente


O grande nome do teatro no Humanismo é Gil Vicente que é con-
siderado o pai do teatro em Portugal. Escrita em 1502, sua primei-
ra peça foi Auto da Visitação, em homenagem à rainha D. Maria
pelo nascimento de seu filho, o futuro rei D. João III. Em seus 71
anos de vida, Gil Vicente se manteve em cena durante 34 anos
e testemunhou muitas modificações ocorridas em Portugal, viu
seu país sair de uma sociedade agrária e tornar-se uma potência
naval, comercial e militar.
Acredita-se que ele tenha nascido por volta de 1495. Pou-
co se conhece de sua vida particular e acredita-se que tenha se
mantido distante de exageros e modismos, mas sabe-se que ele
legou à sociedade uma vasta obra teatral com forte caráter mo-
ralizante em que a religião aparece como padrão e referência de
comportamento, a partir da qual se julgam as virtudes e os erros
dos humanos.
Viveu a transição dos valores medievais para os renascen-
tistas, trazendo de um lado a crença teocêntrica na providência di-
vina e, de outro, a crítica de costumes como a audácia humanista
fundindo o antigo ao moderno.
166
“Ridendo castigat mores” §§ Autos pastoris (éclogas): gênero a que per-
tencem algumas das primeiras obras do autor.
A arte teatral vicentina tem caráter moralizante, ao en- Algumas dessas peças têm caráter religioso,
focar os desvios comportamentais dos sujeitos inseridos como o auto pastoril português;
num contexto em que a religião católica era o padrão §§ Autos de moralidade: gênero em que Gil
de comportamento. No entanto, sua crítica sempre se Vicente se celebrizou. Suas peças mais conhe-
voltava para os sujeitos e não para as instituições, prin- cidas são autos de moralidade, como é o caso
cipalmente as religiosas. da trilogia das barcas (Auto da barca do inferno,
A evidente intenção na maioria de suas obras Auto da barca do purgatório e Auto da barca da
é criar o riso crítico, usando a máxima latina ridendo glória) e do Auto da alma.
castigat mores, ou seja, rindo castiga-se a moral
§§ Farsas: peças de caráter crítico, utilizam como
sem fazer distinção de classe, seja rico, pobre, plebeu
personagens tipos populares e desenvolvem-se
ou nobre, todos eram sua matéria-prima e recebiam a
em torno de problemas da sociedade. As mais
mesma força de suas críticas.
populares são a Farsa de Inês Pereira, história de
O teatro vicentino coloca no centro da cena erros
uma jovem que vê no casamento a sua chance
de ricos e pobres, nobres e plebeus. O autor denuncia
de ascensão social, e O velho da horta, que ridi-
os exploradores do povo, como o fidalgo, o sapateiro e culariza a paixão de um velho casado por uma
o agiota do Auto da barca do inferno; ridiculariza os jovem virgem.
velhos que se interessam por mulheres mais jovens, na
farsa O velho da horta. O velho da horta (1512)
Um recurso muito explorado por Gil Vicente é o
uso de alegorias, ou seja, de representações, por meio A farsa gira em torno dos amores de um velho e uma mo-
de personagens ou objetos, de ideias abstratas, geral- cinha que vai até sua horta “buscar cheiros pra panela”.
mente relacionadas aos vícios e às virtudes humanas. O velho a corteja e apaixona-se por ela. Uma
Assim, no Auto da barca do inferno, o agiota traz consi- alcoviteira, aproveitando-se da situação, põe-se a tirar a
go uma bolsa cheia de moedas que representa, alegori- fortuna do Velho e o deixa na miséria.
camente, a sua ganância. Leia um trecho:
Outro recurso são os tipos sociais, nos quais são
[...]
elencadas figuras que formam um quadro da socieda-
Entra a moça na horta e diz o velho: Senhora, benza-vos
de portuguesa da época como papas, fidalgos, juízes,
Deus!
onzeneiros, alcoviteiras, prostitutas, espertalhões, tolos, MOÇA: Deus vos mantenha, senhor.
mulheres ambiciosas, clérigos, frades etc. VELHO: Onde se criou tal flor? Eu diria que nos céus.
Afastou-se totalmente dos gêneros de grande MOÇA: Mas no chão.
prestígio na Antiguidade Clássica no teatro, ou seja, a VELHO: Pois damas se acharão que não são vosso sa-
tragédia e a comédia caracterizadas por três unidades: pato!
MOÇA: Ai! Como isso é tão vão, e como as lisonjas são-
ação, tempo e lugar. Gil Vicente, ao contrário, caracteri-
de barato!
za sua obra pela amplitude temática, maior duração da
VELHO: Que buscais vós cá, donzella, senhora, meu co-
ação cênica, maior número de atores em cena e despre-
ração?
ocupação com grande cenário para que possa justapor
MOÇA: Vinha ao vosso hortelão, por cheiros para a pa-
espaços com mais facilidade. Além disso, misturava no nella.
registro de fala tanto o erudito como o popular, o dito VELHO: E a isso vinde vós, meu paraíso. Minha senhora,
“elevado” com o “baixo”. e não a aí?
As obras de Gil Vicente costumam ser divididas MOÇA: Vistes vós! Segundo isso, nenhum velho não
em três tipos: tem siso natural.
167
VELHO: Ó meus olhinhos garridos, minha rosa, meu arminho!
MOÇA: Onde he vosso ratinho? Não tem os cheiros colhidos?
VELHO: Tão depressa vinde vós, minha condensa, meu amor, meu coração!
MOÇA: Jesus! Jesus! Que cousa he essa? E que prática tão avessa da razão! Falai, falai doutra maneira! Mandai-
-me dar a hortaliça.
VELHO: Grão fogo de amor me atiça, ó minha alma verdadeira!
MOÇA: E essa tosse? Amores de sobreposse serão os da vossa idade; o tempo vos tirou a posse.
VELHO: Mais amo que se moço fosse com a metade.
MOÇA: E qual será a desastrada que atende vosso amor?
VELHO: Ó minha alma e minha dor, quem vos tivesse furtada!
MOÇA: Que prazer! Quem vos isso ouvir dizer cuidará que estais vós vivo, ou que estais para viver!
VELHO: Vivo não no quero ser, mas cativo!
[...]

A farsa de Inês Pereira (1523)

A farsa de Inês Pereira é considerada a mais complexa peça de Gil Vicente. Ao apresentá-la, o teatrólogo português diz:

“A seguinte farsa de folgar foi representada ao


muito alto e mui poderoso rei D. João, o terceiro do
nome em Portugal, no seu Convento de Tomar, na
era do Senhor 1523. O seu argumento é que, por-
quanto duvidavam certos homens de bom saber,
se o Autor fazia de si mesmo estas obras, ou se as
furtava de outros autores, lhe deram este tema so-
bre que fizesse: é um exemplo comum que dizem:
Mais vale asno que me leve que ca-
valo que me derrube.
E sobre este motivo se fez esta farsa”.

A obra pode ser dividida em cinco partes: a primeira é um retrato da rotina na qual se insere a protagonista;
a segunda reflete a situação da mulher na sociedade da época, cujos registros são dados pela mãe de Inês, pela
própria Inês e por Lianor Vaz; a terceira mostra o comércio casamenteiro, representado pelos judeus comerciantes e
pelo arranjo matrimonial-mercantil de Inês com Brás da Mata; a quarta considera o casamento, o despertar para a
realidade, contrapondo-a ao sonho que embalava as fantasias da protagonista e, finalmente, a quinta parte reflete
a realidade brutal da qual Inês, experiente e vivida, procura tirar proveito próprio. A peça apresenta uma situação
concreta, com uma personagem bem delineada psicologicamente e um fio condutor melhor configurado que as
produções anteriores de Gil Vicente.
O enredo é simples: uma jovem sonhadora procura, por meio do casamento com um homem que saiba tan-
ger viola, fugir à rotina doméstica. Despreza a proposta de Pero Marques, filho de um camponês rico, homem tolo
e ingênuo, e aceita se casar com Brás da Mata, escudeiro pelintra e pobretão. No entanto, os sonhos da heroína
são logo desfeitos, porque o marido revela sua verdadeira personalidade, maltratando-a e explorando-a. Brás da
Mata vai para a África e lá vem a falecer. Inês, ensinada pela dura experiência, toma consciência da realidade e
aceita se casar com Pero Marques, seu primeiro pretendente. Depressa também a jovem aceita a corte de um falso
ermitão. A farsa termina com o marido (cantado por ela como cuco, gamo e cervo, tradicionalmente concebidos
como símbolos do homem traído) levando-a às costas (asno que me carregue) até a gruta em que vive o ermitão,
para um encontro nada ingênuo.
168
Leia um trecho: Ambos os comandantes aguardam os mortos, que são
as almas que seguirão ao paraíso ou ao inferno.
INÊS PEREIRA: Quien con veros pena y muere qué hará Os mortos começam a chegar e um fidalgo é o
cuando no os viere? 1 primeiro. Ele representa a nobreza, e é condenado ao
FALADO: Renego deste lavrar e do primeiro que o usou 2 inferno por seus pecados, tirania e luxúria. O diabo or-
ao diabo que o eu dou que tam mau é d’aturar. dena ao fidalgo que embarque. Este, arrogante, julga-se
Oh, Jesus! Que enfadamento, e que raiva, e que tor- merecedor do paraíso, pois deixou muita gente rezando
mento, que cegueira, e que canseira! 3 Eu hei-de buscar por ele. Recusado pelo anjo, encaminha-se, frustrado,
maneira d’algum outro aviamento 4. para a barca do inferno; mas tenta convencer o diabo a
Coitada, assi hei-de estar encerrada nesta casa como deixá-lo rever sua amada, pois esta “sente muito” sua
panela sem asa que sempre está num lugar? falta. O diabo destrói seu argumento, afirmando que ela
E assi hão-de ser logrados 5 dou dias amargurados, que
o estava enganando.
eu possa estar cativa 6 em poder de desfiados? 7 Um agiota chega a seguir e é condenado ao in-
Antes o darei ao Diabo que lavrar mais nem pontada 8;
ferno por ganância e avareza. Tenta convencer o anjo a
já tenho a vida cansada de jazer sempre dum cabo. 9
ir para o céu pedindo ao diabo que o deixe voltar para
Todas folgam e eu não, todas vêm e todas vão onde
pegar a riqueza que acumulou, mas é impedido e acaba
querem, senão eu. Hui! E que pecado é o meu, Oh que
na barca do inferno.
dor de coração!
O terceiro indivíduo a chegar é o parvo (um tolo,
Esta vida é mais que morta. Sou eu coruja ou corujo,
ingênuo). O diabo tenta convencê-lo a entrar na barca
ou sou algum caramujo 10, que não sai senão à porta?
do inferno; quando o parvo descobre qual é o destino
E quando me dão algum dia licença, como a bugia 11,
dela, vai falar com o anjo. Este, agraciando-o por sua
que possa estar à janela é já mais que a Madanela 12
humildade, permite-lhe entrar na barca do céu.
quando achou a aleluia.
A alma seguinte é a de um sapateiro, com todos
os seus instrumentos de trabalho. Durante sua vida en-
1. Quem, vendo-vos, sofre e morre que fará se vos não vir?
2. Amaldiçoada seja o trabalho doméstico e quem o inventou. ganou muitas pessoas, e tenta enganar também o dia-
3. Que trabalho cansativo e sem propósito. bo. Como não consegue, recorre ao anjo, que o condena
4. Aviamento: solução.
5. Lograr: desfrutar, aproveitar. como alguém que roubou do povo.
6. Ao afirmar que desfruta (aproveita) os dias presa em casa, O frade é o quinto a chegar cantarolando com
sempre bordando e costurando, Inês autoironiza a vida enfado-
nha a que está submetida.
sua amante. Sente-se ofendido quando o diabo o con-
7. Desfiados: tercidos para bordar e costurar. vida a entrar na barca do inferno, pois, sendo represen-
8. Que vá tudo ao Diabo, não darei nem mais um ponto no
tante religioso, crê que teria perdão. Foi, porém, conde-
bordado.
9. Estou cansada de estar sempre cativa, condenada às mesmas nado ao inferno por falso moralismo religioso.
e repetitivas tarefas, como as panelas que estão sempre depen- Brísida Vaz, feiticeira e alcoviteira, é recebida
duradas em uma mesma posição.
10. Ao comparar-se à coruja e ao caramujo, Inês ressalta,
pelo diabo, que lhe diz que seu o maior bem são “seis-
respectivamente, os seguintes lamentos: não participa da vida centos virgos postiços”. Virgo é hímen, representa a
social e é prisioneira da própria casa.
virgindade. Compreendemos que essa mulher prostituiu
11. Bugia: macaca.
12. Madanela: Madalena, personagem bíblica. muitas meninas virgens, e “postiço” nos faz acreditar
que enganara seiscentos homens, dizendo que tais me-
ninas eram virgens. Brísida Vaz tenta convencer o anjo
Auto da barca do inferno (1514) a levá-la na barca do céu inutilmente. Ela é condenada
por prostituição e feitiçaria.
O Auto da barca do inferno representa o juízo final cató- A seguir, é a vez do judeu, que chega acom-
lico de forma satírica e com forte apelo moral. O cenário panhado por um bode. Encaminha-se direto ao diabo,
é uma espécie de porto, onde se encontram duas barcas: pedindo para embarcar, mas até o diabo recusa-se a
uma com destino ao inferno, comandada pelo diabo, e a levá-lo. Ele tenta subornar o diabo, porém este, com
outra, com destino ao paraíso, comandada por um anjo. a desculpa de não transportar bodes, o aconselha a
169
procurar outra barca. O judeu fala, então, com o anjo, das falas que podemos classificar a condição social de
porém não consegue aproximar-se dele: é impedido, cada um dos personagens.
acusado de não aceitar o cristianismo. Por fim, o diabo Leia um trecho:
aceita levar o judeu e seu bode, mas não dentro de sua
barca, e, sim, rebocados. Vêm Quatro Cavaleiros cantando, os quais trazem cada
Durante o reinado de dom Manuel, de 1495- um a Cruz de Cristo, pela qual Senhor e acrescenta-
1521, muitos judeus foram expulsos de Portugal, e os mento de Sua santa fé católica morreram em poder dos
que ficaram tiveram que se converter ao cristianismo, mouros. Absoltos a culpa e pena per privilégio que os
sendo perseguidos e chamados de “cristãos novos”. Ou que assi morrem têm dos mistérios da Paixão d’Aquele
seja, Gil Vicente segue, nessa obra, o espírito da época. por Quem padecem, outorgados por todos os Presiden-
O corregedor e o procurador, representantes do tes Sumos Pontífices da Madre Santa Igreja. E a cantiga
judiciário, chegam, a seguir, trazendo livros e processos. que assi cantavam, quanto a palavra dela, é a seguinte:
Quando convidados pelo diabo para embarcarem, co- CAVALEIROS: À barca, à barca segura, barca bem guar-
meçam a tecer suas defesas e encaminham-se ao anjo. necida, à barca, à barca da vida! Senhores que traba-
Na barca do céu, o anjo os impede de entrar: são con- lhais pela vida transitória, memória , por Deus, memória
denados à barca do inferno por manipularem a justiça deste temeroso cais! À barca, à barca, mortais, Barca
em benefício próprio. Ambos farão companhia à Brísida bem guarnecida, à barca, à barca da vida! Vigiai-vos,
Vaz, revelando certa familiaridade com a cafetina – o pecadores, que, depois da sepultura, neste rio está a
que nos faz crer em trocas de serviços entre eles. ventura de prazeres ou dolores! À barca, à barca, se-
O próximo a chegar é o enforcado, que acredita nhores, barca mui nobrecida, à barca, à barca da vida!
E passando per diante da proa do batel dos danados
ter perdão para seus pecados, pois em vida foi julgado
assi cantando, com suas espadas e escudos, disse o Ar-
e enforcado. Mas também é condenado a ir ao inferno
rais da perdição desta maneira:
por corrupção.
DIABO: Cavaleiros, vós passais e não perguntais onde
Por fim, chegam à barca quatro cavaleiros que
vais?
lutaram e morreram defendendo o cristianismo. Estes
1o CAVALEIRO: Vós, Satanás, presumis? Atentai com
são recebidos pelo anjo e perdoados imediatamente.
quem falais!
2o CAVALEIRO: Vós que nos demandais? Sequer conhe-
O bem e o mal
ce-nos bem: morremos nas Partes d’Além, e não quei-
rais saber mais.
Todos os personagens que têm como destino o infer-
DIABO: Entrai cá! Que cousa é essa? Eu não posso en-
no chegam trazendo consigo objetos terrenos, repre-
tender isto!
sentando seu apego à vida; por isso, tentam voltar. Os
CAVALEIROS: Quem morre por Jesus Cristo não vai em
personagens a quem se oferece o céu são cristãos e
tal barca como essa!
puros. O mundo aqui ironizado é maniqueísta: o bem e Tornaram a prosseguir, cantando, seu caminho direito à
o mal, o bom e o ruim são metades de um mundo moral barca da Glória, e, tanto que chegam, diz o Anjo:
simplificado. O Auto da barca do inferno faz parte de ANJO: Ó cavaleiros de Deus, a vós estou esperando, que
uma trilogia (Autos da barca da glória, do inferno e do morrestes pelejando por Cristo, Senhor dos Céus! Sois
purgatório). Escrito em versos de sete sílabas poéticas, livres de todo mal, mártires da Santa Igreja, que quem
possui apenas um ato, dividido em várias cenas. A lin- morre em tal peleja merece paz eternal.
guagem entre os personagens é coloquial – e é através E assim embarcam.

170
Classicismo

BOTTICELLI, Sandro. O Nascimento da Vênus – Galeria degli Ufizzi – Firenze.

Contexto
Nos séculos XV e XVI, a visão teocêntrica do mundo,
que caracterizou a Idade Média, cede lugar ao antro-
Cronologia do Classicismo
pocentrismo, ou seja, o Homem e a Ciência vão para Início (1527): Chegada de Sá de Mi-
o centro dos acontecimentos e do universo. O Renas- randa à Portugal, com a Medida Nova.
cimento marca o apogeu dessa era, que se propõe a Fim (1580): Morte de Camões e união
iluminar com a razão as trevas da civilização medieval. da Península Ibérica.

Comércio

O fascínio pela vida nos meios urbanos fez com que a sociedade buscasse cada vez mais os prazeres que o dinheiro
podia propiciar. O comércio entre as nações da Europa cresceu e a burguesia mercantil não aceitava que a produ-
ção agrária estivesse voltada apenas para a subsistência e desejava buscar o comércio exterior entre as nações.

Renascimento

O Renascimento foi uma decorrência natural do Hu-


manismo. O seu significado nas artes é reflexo de
transformações radicais sucedidas no Oriente, ao se
emancipar do velho sistema feudal. A certeza de que
o ser humano é uma força racional, capaz de dominar
e de transformar o Universo, levou o europeu a uma
identificação com a cultura clássica, que valorizava a
vida terrena. O mundo, as pessoas e a vida passaram a
ser vistos sob o prisma da razão.
Firenze (Itália) – Palco do Renascimento

171
O palco
A Itália foi especialmente onde essa tendência apareceu com mais
intensidade, sendo o palco deste retorno ao mundo da Antiguidade
Clássica, ou seja, fez renascer os ideais de valorização dos gregos
e latinos, desde meados do século XIII, os esforços individuais, de
perfeição, superioridade humana e a razão como parâmetro de ob-
servação e interpretação da realidade.

“Monalisa”, de Leonardo da Vinci. Pintura, escultura e arquitetura


Museu do Louvre, Paris, França.

Na pintura, um dos principais traços do Renascimento foi a noção de


perspectiva e a tematização de elementos da Antiguidade Clássica,
bem como a humanização do tema sacro. A técnica era levada em
conta acima de tudo, o sombreado realçava a ideia de volume dos
corpos e o início da utilização da tela e da tinta a óleo.
Na escultura, o que mais chama a atenção é a busca pela
representação ideal do homem, normalmente retratado nu a fim de
exaltar as formas humanas.
A arquitetura também teve influência dos traços clássicos, re-
tratando a figura humana e o conceito de beleza dos templos cons-
truídos de maneira harmônica normalmente coberta por uma cúpula.
Entre os artistas mais importantes da arte renascentista estão
Leonardo da Vinci (1452-1519), Michelangelo (1475-1564) e Rafael
“Pietà”, de Michelangelo. Sanzio (1483-1520).

Literatura

O poeta Dante Alighieri, autor da Divina comédia, introduziu o ver-


so decassílabo – chamado de “a medida nova”, em contraponto à
redondilha, considerada como “medida velha”. O poeta Francesco
Petrarca, criador do soneto, influenciou vários poetas europeus, entre
o quais o inglês William Shakespeare e os portugueses Luís Vaz de
Camões e Sá de Miranda.

172
Leia um soneto de Francesco Petrarca: O marco de seu início se dá em 1527, quando
o poeta Sá de Miranda retorna de sua incursão de es-
Se a minha vida do áspero tormento tudos pela Itália renascentista e introduz em Portugal
E tanto afã puder se defender, novas formas de composição. Ele trouxe a postura amo-
Que por força da idade eu chegue a ver rosa, o soneto e principalmente a forma fixa do ver-
Da luz do vosso olhar o embaciamento,
so decassílabo chamado de Medida Nova, o Dolce Stil
E o áureo cabelo se tornar de argento, Nuovo (o doce estilo novo) criado pelo escritor italiano
E os verdes véus e adornos desprender, Francesco Petrarca.
E o rosto, que eu adoro, empalecer,
Que em lamentar me faz medroso e lento,
E tanta audácia há de me dar o Amor,
Tendências fundamentais
Que vos direi dos martírios que guardo, §§ Criação e imitação
Dos anos, dias, horas o amargor. Retomado do princípio aristotélico da mimese,
Se o tempo é contra este querer em que ardo, ou seja, reproduzir os comportamentos humanos
Que não o seja tal que à minha dor por intermédio da arte.
Negue o socorro de um suspiro tardo.
§§ Racionalismo
Sá de Miranda O desenvolvimento de um raciocínio completo
sobre os temas abordados, inclusive o amor. Na
Em Portugal, considera-se como marco inicial do Clas- poesia essa tentativa de conciliar razão e emo-
sicismo o ano de 1527, data em que o poeta Sá de Mi- ção se apresentou por meio de uma figura de
randa regressou da Itália, de onde trouxe as inovações linguagem chamada “paradoxo”.
literárias do Renascimento italiano, introduzindo-as em §§ Humanismo e ideal de beleza
Portugal. O encerramento desse primeiro período clás- Recriação da natureza humana por meio de um
sico ocorre em 1580, ano da morte de Camões e do ideal de beleza, proporção, harmonia e simetria.
domínio espanhol sobre Portugal.
§§ Universalismo
Além do Classicismo, há dois outros períodos
A busca por novos territórios, expansão marítima.
clássicos: o Barroco, momento em que Portugal é do-
O homem quer se colocar acima da natureza e
minado e governado pela Espanha, e o Arcadismo, automaticamente acima de Deus. O planeta Terra
que avança até a segunda década do século XIX. passa a ser um espaço de dominação humana.

Características do Classicismo
O Classicismo queria recuperar a “classe” dos autores
antigos a partir do cultivo dos valores greco-latinos, in-
clusive da mitologia pagã, própria dos antigos. Isso levou
os poetas renascentistas a recorrer às entidades mitoló-
gicas para pedir inspiração, simbolizar emoções, exempli-
ficar comportamentos. Pastores, deuses, deusas e ninfas
estão presentes nas obras de arte e na literatura renas-
centista de uma forma natural, convivendo até mesmo
com tradições cristãs, herdadas da época medieval.
É hora de o ser humano se orgulhar de suas con-
quistas terrenas. O homem descobre que a Terra é redon-
da e passa ter um olhar universalista para a realidade.
173
E.O. Teste I 3. Gil Vicente escreveu o Auto da Barca do In-
ferno em 1517, no momento em que eclodia
na Alemanha a Reforma Protestante, com a
1. As diferenças etárias são, muitas vezes, causa crítica veemente de Lutero ao mau clero do-
de violência simbólica. Considerando isso, as- minante na Igreja. Nesta obra, há a figura do
sinale os versos em que as frases expressam, frade, severamente censurado como um sa-
de forma explícita, o tema básico de O Velho da cerdote negligente. Indique a alternativa cujo
Horta, fundamentado neste tipo de violência. conteúdo NÃO se presta a caracterizar, na re-
a) Branca Gil: Todos os santos marteirados ferida peça, os erros cometidos pelo religioso.
Socorrei ao marteirado a) Não cumprir os votos de celibato, mantendo
Que morre de namorado. a concubina Florença.
b) Moça: E essa tosse? b) Entregar-se a práticas mundanas, como a dança.
Amores de sobreposse c) Praticar esgrima e usar armamentos de guer-
Serão os de vossa idade: ra, proibidos aos clérigos.
O tempo vos tirou a posse. d) Transformar a religião em manifestação for-
c) Branca Gil: Eu folgo ora de ver mal, ao automatizar os ritos litúrgicos.
Vossa mercê namorado; e) Praticar a avareza como cúmplice do fidalgo,
Que o homem bem criado e a exploração da prostituição em parceria
Té na morte o há de ser. com a alcoviteira.
d) Velho: Porém, amiga,
Se nesta minha fadiga 4. O teatro de Gil Vicente caracteriza-se por ser
Vós não sois medianeira, fundamentalmente popular. E essa caracte-
Não sei que maneira siga, rística manifesta-se, particularmente, em
Nem que faça, nem que diga, sua linguagem poética, como ocorre no tre-
Nem que queira. cho a seguir, de o Auto da Barca do Inferno.
e) Parvo: Dono, dizia minha dona, Ó Cavaleiros de Deus,
Que fazeis vós cá te a noite? A vós estou esperando,
Que morrestes pelejando
2. Gil Vicente, criador do teatro português, re- Por Cristo, Senhor dos Céus!
alizou uma obra eminentemente popular. Sois livres de todo o mal,
Seu Auto da Barca do Inferno, encenado em Mártires da Madre Igreja,
1517, apresenta, entre outras característi- Que quem morre em tal peleja
cas, a de pertencer ao teatro religioso alegó- Merece paz eternal.
rico. Tal classificação justifica-se por:
No texto, fala final do Anjo, temos no con-
junto dos versos:
a) variação de ritmo e quebra de rimas.
b) ausência de ritmo e igualdade de rimas.
c) alternância de redondilha maior e menor e
simetria de rimas.
d) redondilha menor e rimas opostas e emparelhadas.
e) igualdade de métrica e de esquemas das pa-
lavras que rimam.

5. Considerando a peça Auto da Barca do In-


ferno como um todo, indique a alterna-
tiva que melhor se adapta à proposta do
a) ser um teatro de louvor e litúrgico em que o teatro vicentino.
sagrado é plenamente respeitado. a) Preso aos valores cristãos, Gil Vicente tem
b) não se identificar com a postura anticleri- como objetivo alcançar a consciência do
cal, já que considera a Igreja uma instituição homem, lembrando-lhe que tem uma alma
modelar e virtuosa.
para salvar.
c) apresentar estrutura baseada no maniqueísmo
cristão, que divide o mundo entre o Bem e o Mal, b) As figuras do Anjo e do Diabo, apesar de ale-
e na correlação entre a recompensa e o castigo. góricas, não estabelecem a divisão manique-
d) apresentar temas profanos e sagrados e reve- ísta do mundo entre o Bem e o Mal.
lar-se radicalmente contra o catolicismo e a c) As personagens comparecem nesta peça de
instituição religiosa. Gil Vicente com o perfil que apresentavam
e) aceitar a hipocrisia do clero e, criticamente, na terra, porém apenas o Onzeneiro e o Par-
justificá-la em nome da fé cristã. vo portam os instrumentos de sua culpa.
174
d) Gil Vicente traça um quadro crítico da so- a) I.
ciedade portuguesa da época, porém poupa, b) II.
por questões ideológicas e políticas, a Igreja c) II e III.
e a Nobreza.
d) I e II.
e) Entre as características próprias da drama-
e) I e III.
turgia de Gil Vicente, destaca-se o fato de
ele seguir rigorosamente as normas do tea-
9. Diabo, Companheiro do Diabo, Anjo, Fidalgo,
tro clássico.
Onzeneiro, Parvo, Sapateiro, Frade, Florença,
Brísida Vaz, Judeu, Corregedor, Procurador,
6. O argumento da peça Farsa de Inês Pereira, Enforcado e Quatro Cavaleiros são personagens
de Gil Vicente, consiste na demonstração do de Auto da barca do inferno, de Gil Vicente.
refrão popular “Mais quero asno que me car- Analise as informações a seguir e selecione a
regue que cavalo que me derrube”. Identi- alternativa incorreta, cujas características não
fique a alternativa que NÃO corresponde ao descrevam adequadamente a personagem:
provérbio, na construção da farsa: a) Onzeneiro idolatra o dinheiro, é agiota e
a) A segunda parte do provérbio ilustra a expe- usurádo; de tudo que juntara, nada leva para
riência desastrosa do primeiro casamento. a morte, ou melhor, leva a bolsa vazia.
b) O escudeiro Brás da Mata corresponde ao ca- b) Frade representa o clero decadente e é sub-
valo, animal nobre, que a derruba. jugado por suas fraquezas: mulher e esporte;
c) O segundo casamento exemplifica o primeiro leva a amante e as armas de esgrima.
termo, asno que a carrega. c) Diabo, capitão da barca do inferno, é quem
d) O asno corresponde a Pero Marques, primeiro apressa o embarque dos condenados; é dissi-
pretendente e segundo marido de Inês. mulado e irônico.
e) Cavalo e asno identificam a mesma per- d) Anjo, capitão da barca do céu, é quem elogia
sonagem em diferentes momentos de sua a morte pela fé; é austero e inflexível.
vida conjugal. e) Corregedor representa a justiça e luta pela
aplicação íntegra e exata das leis; leva pa-
péis e processos.
7. Em relação ao Auto da Barca do Inferno de Gil
Vicente, considere as seguintes afirmações.
1
0. Em meados do século XIV, a poesia trovado-
1. Trata-se de um grande painel que satiriza
resca entra em decadência, surgindo, em seu
a sociedade portuguesa de seu tempo.
lugar, uma nova forma de poesia, totalmente
2. Representa a transição da Idade Média distanciada da música, apresentando ama-
para o Renascimento, guardando traços durecimento técnico, com novos recursos es-
dos dois períodos. tilísticos e novas formas poemáticas, como a
3. Sugere que o Diabo, ao julgar justos e pe- trova, a esparsa e o vilancete.
cadores, tem poderes maiores que Deus. Assinale a alternativa em que há um trecho
Quais estão corretas? representativo de tal tendência.
a) Apenas I. a) Non chegou, madre, o meu amigo,
b) Apenas I e II. e oje est o prazo saido!
c) Apenas I e III. Ai, madre, moiro d’amor!
d) Apenas II e III. b) Êstes olhos nunca perderán,
e) I, II e III. senhor, gran coita, mentr’eu vivo fôr;
e direi-vos fremosa, mia senhor,
8. (Fuvest) Considere as seguintes afirmações so- dêstes meus olhos a coita que han:
bre o Auto da Barca do Inferno, de Gil Vicente: choran e cegan, quand’alguém non veen,
I. O auto atinge seu clímax na cena do Fi- e ora cegan por alguen que veen.
dalgo, personagem que reúne em si os c) Meu amor, tanto vos amo,
vícios das diferentes categorias sociais que meu desejo não ousa
anteriormente representadas.
desejar nehua cousa.
II. A descontinuidade das cenas é coerente
Porque, se a desejasse,
com o caráter didático do auto, pois faci-
logo a esperaria,e se eu a esperasse,
lita o distanciamento do espectador.
sei que vós anojaria:
III. A caricatura dos tipos sociais presentes
no auto não é gratuita nem artificial, mas mil vezes a morte chamo
resulta da acentuação de traços típicos. e meu desejo não ousa
Está correto apenas o que se afirma em: desejar-me outra cousa.
175
d) Amigos, non poss’eu negar a) na França.
a gran coita que d’amor hei, b) na Alemanha.
ca me vejo sandeu andar, c) na Espanha.
e con sandece o direi:
d) em Portugal.
os olhos verdes que eu vi
me fazen ora andar assi. e) na Itália.
e) Ai! dona fea, foste-vos queixar
por (que) vos nunca louv’em meu cantar; 5. “Nós outros pintores queremos pelos movi-
mais ora quero fazer um cantar, mentos do corpo mostrar os movimentos da
em que vos loarei toda via; alma (...) Convém, portanto que os pintores
e vedes como vos quero loar. tenham um conhecimento perfeito dos movi-
dona fea, velha e sandia! mentos do corpo e os aprendam da natureza
para imitar, por mais difícil que seja os múl-
tiplos movimentos da alma.”
E.O. Teste II ALBERTI, L.B. Della Pintura, livro II; 1453.
In: TENENTI, Alberto. Florença na época dos
Médici. São Paulo: Perspectiva, 1973.
1. (Fuvest) Indique a afirmação correta sobre o
Auto da Barca do Inferno, de Gil Vicente: Este fragmento de texto referente à arte re-
a) É intrincada a estruturação de suas cenas, nascentista ajuda a explicar:
que surpreendem o público com o inespera- a) a influência do pensamento religioso na pin-
do de cada situação. tura renascentista que objetivava a manu-
b) O moralismo vicentino localiza os vícios não tenção do teocentrismo.
nas instituições, mas nos indivíduos que as b) a desvinculação entre arte e religião a partir
fazem viciosas. da negação da existência da alma.
c) É complexa a crítica aos costumes da época, c) a aliança entre arte e religião na medida em
já que o autor é o primeiro a relativizar a que a arte representaria a concretização dos
distinção entre o Bem e o Mal. conceitos religiosos.
d) A ênfase desta sátira recai sobre as persona- d) a proibição da igreja de que os pintores re-
gens populares, as mais ridicularizadas e as presentassem o ser humano.
mais severamente punidas. e) a necessidade do estudo da anatomia para a
e) A sátira é aqui demolidora e indiscriminada, produção de obras cada vez mais perfeitas.
não fazendo referência a qualquer exemplo
de valor positivo.
6. Identifique a alternativa que não contenha
ideais clássicos de arte.
2. Em relação a Gil Vicente, é incorreto dizer que:
a) Universalismo e racionalismo.
a) recebeu, no início de sua intensa atividade
literária, influência de Juan del Encina. b) Formalismo e perfeccionismo.
b) sua primeira produção teatral foi “Auto dos c) Obediência às regras e modelos e contenção
Reis Magos”. do lirismo.
c) suas obras se caracterizaram, antes de tudo, d) Liberdade de criação e predomínio dos im-
por serem primitivas e populares. pulsos pessoais.
d) suas obras surgiram para entretenimento e) Valorização do homem (do aventureiro, do
nos ambientes da corte portuguesa. soldado, do sábio e do amante) e verossimi-
lhança (imitação da verdade e da natureza).
e) seu teatro caracterizou-se por observações
satíricas às camadas sociais da época.
7. O Classicismo propriamente dito, tem por li-
3. (Fuvest) Caracteriza o teatro de Gil Vicente: mites cronológicos, em Portugal, as datas de:
a) A revolta contra o cristianismo. a) 1500 e 1601.
b) A obra escrita em prosa. b) 1434 e 1516.
c) A elaboração requintada dos quadros e cená- c) 1502 e 1578.
rios apresentados. d) 1527 e 1580.
d) A preocupação com o homem e com a religião. e) 1198 e 1434.
e) A busca de conceitos universais.
8. O culto aos valores universais – o Belo, o
4. Inspirando-se na Antiguidade Clássica (Grécia- Bem, a Verdade e a Perfeição – e a preocupa-
-Roma), o Renascimento valorizava o homem, ção com a forma aproximaram o Classicismo
refletindo mesmo uma visão antropocêntrica do de duas escolas literárias posteriores. Apon-
mundo. Esse movimento teve origem: te a alternativa que identifica essas escolas:
176
a) Barroco e Simbolismo. 2. (Insper)
b) Arcadismo e Parnasianismo. Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
c) Romantismo e Modernismo. muda-se o ser, muda-se a confiança;
d) Trovadorismo e Humanismo. todo o mundo é composto de mudança,
tomando sempre novas qualidades.
e) Realismo e Naturalismo.
Continuamente vemos novidades,
diferentes em tudo da esperança;
9. Não se relaciona à medida nova:
do mal ficam as mágoas na lembrança,
a) versos decassílabos. e do bem (se algum houve), as saudades.
b) influência italiana. O tempo cobre o chão de verde manto,
c) predileção por formas fixas. que já coberto foi de neve fria, e, enfim,
d) sonetos, tercetos, oitavas e odes. converte em choro o doce canto.
e) cultura popular, tradicional. E, afora este mudar-se cada dia,
outra mudança faz de mor espanto,
1
0. São características das obras do Classicismo: que não se muda já como soía*.
a) o individualismo, a subjetividade, a idealiza- (Luís Vaz de Camões)
ção, o sentimento exacerbado. *soía: imperfeito do indicativo do verbo soer,
que significa costumar, ser de costume
b) o egocentrismo, a interação da natureza com
o eu, as formas perfeitas. Assinale a alternativa em que se analisa cor-
c) o contraste entre o grotesco e o sublime, a retamente o sentido dos versos de Camões.
valorização da natureza, o escapismo. a) O foco temático do soneto está relacionado
d) a observação da realidade, a valorização do à instabilidade do ser humano, eternamente
eu, a perfeição da natureza. insatisfeito com as suas condições de vida e
e) a retomada da mitologia pagã, a pureza das com a inevitabilidade da morte.
formas, a busca da perfeição estética. b) Pode-se inferir, a partir da leitura dos dois
tercetos, que, com o passar do tempo, a re-

E.O. Teste III cusa da instabilidade se torna maior, graças


à sabedoria e à experiência adquiridas.
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO c) Ao tratar de mudanças e da passagem do
Tanto de meu estado me acho incerto tempo, o soneto expressa a ideia de circu-
que em vivo ardor tremendo estou de frio; laridade, já que ele se baseia no postulado
sem causa, juntamente choro e rio; da imutabilidade.
o mundo todo abarco e nada aperto. [...] d) Na segunda estrofe, o eu lírico vê com pessi-
Se me pergunta alguém por que assim ando,
mismo as mudanças que se operam no mun-
respondo que não sei; porém suspeito
do, porque constata que elas são geradoras
que só porque vos vi, minha Senhora.
de um mal cuja dor não pode ser superada.
(Camões)
e) As duas últimas estrofes autorizam concluir
1. Assinale a alternativa correta acerca do texto. que a ideia de que nada é permanente não
a) O fragmento exemplifica traço estilístico ca- passa de uma ilusão.
racterístico da estética barroca que, de certa
forma, já está latente na lírica camoniana: a 3. (Enem) LXXVIII (Camões, 1525?-1580)
linguagem marcada por paradoxos. Leda serenidade deleitosa,
b) Nesses versos, o poeta, embora renascentis- Que representa em terra um paraíso;
ta, afasta-se dos cânones estéticos da época,
Entre rubis e perlas doce riso;
como, por exemplo, o ideal de beleza artísti-
ca associado à harmonia da composição. Debaixo de ouro e neve cor-de-rosa;
c) Observa-se, nas estrofes, a retomada de alguns Presença moderada e graciosa,
expedientes retóricos típicos da Idade Média, Onde ensinando estão despejo e siso
como, por exemplo, o confessionalismo amo- Que se pode por arte e por aviso,
roso em linguagem ostensivamente emotiva. Como por natureza, ser fermosa;
d) O texto é exemplo eloquente de que Camões Fala de quem a morte e a vida pende,
inovou a lírica portuguesa ao tematizar o Rara, suave; enfim, Senhora, vossa;
platonismo amoroso, caracterizado pela
Repouso nela alegre e comedido:
“coita de amor” e ausência de contato direto
entre amante e amada. Estas as armas são com que me rende
e) Nos versos, confirma-se a tese de que, na E me cativa Amor; mas não que possa
obra camoniana, o amor é concebido como Despojar-me da glória de rendido.
graça divina, apesar de ser representado CAMÕES, L. Obra completa.
como uma intensa experiência erótica. Rio de janeiro: Nova Aguilar, 2008.

177
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
Reinando Amor em dois peitos,
tece tantas falsidades,
que, de conformes vontades,
faz desconformes efeitos.
Igualmente vive em nós;
mas, por desconcerto seu,
vos leva, se venho eu,
me leva, se vindes vós.
(Camões)

5. Assinale a alternativa CORRETA acerca do texto.


a) Exemplifica o padrão poético do Classicismo
renascentista, na medida em que tematiza o
amor, utilizando-se da chamada “medida nova”.
SANZIO, R. (1483-1520) “A mulher com o unicórnio”. b) Embora apresente versos redondilhos, de
Roma, Galleria Borghese. Disponível em: www. tradição medieval, a linguagem dos versos
arquipelagos.pt. Acesso em: 29 fev. 2012. revela contenção emotiva, traço estilístico
valorizado na Renascença.
A pintura e o poema, embora sendo produ-
tos de duas linguagens artísticas diferentes, c) Revela influência das cantigas medievais,
participaram do mesmo contexto social e pela sonoridade das rimas e linguagem emo-
cultural de produção pelo fato de ambos: tiva própria da “coita de amor”.
a) apresentarem um retrato realista, eviden- d) É um texto do Humanismo, pois traz uma re-
ciado pelo unicórnio presente na pintura e flexão filosófica sobre o sentimento amoro-
pelos adjetivos usados no poema. so, afastando-se, assim, da influência greco-
b) valorizarem o excesso de enfeites na apresen- -romana.
tação pessoa e na variação de atitudes da mu- e) Antecipa o estilo barroco do século XVII
lher, evidenciadas pelos adjetivos do poema. devido à sua linguagem prolixa, em que se
c) apresentarem um retrato ideal de mulher mar- notam ousadas inversões sintáticas e metá-
cado pela sobriedade e o equilíbrio, eviden- foras obscuras.
ciados pela postura, expressão e vestimenta
da moça e os adjetivos usados no poema.
d) desprezarem o conceito medieval da idea- E.O. Dissertativo
lização da mulher como base da produção
artística, evidenciado pelos adjetivos usados 1. (Unicamp) Os excertos abaixo foram extraídos
no poema. do Auto da barca do inferno, de Gil Vicente.
e) apresentarem um retrato ideal de mulher (...) FIDALGO: Que leixo na outra vida
marcado pela emotividade e o conflito inte- quem reze sempre por mi.
rior, evidenciados pela expressão da moça e DIABO: (...) E tu viveste a teu prazer,
pelos adjetivos do poema. cuidando cá guarecer
por que rezem lá por ti!(...)
4. (Uespi) Filho do Classicismo português, Luís ANJO: Que querês?
Vaz de Camões sofreu influência de vários FIDALGO: Que me digais,
autores da Antiguidade. Quanto aos escrito- pois parti tão sem aviso,
res que foram lidos e que terminaram por se a barca do paraíso
formar o gosto classicista do poeta lusitano, é esta em que navegais.
podemos incluir: ANJO: Esta é; que me demandais?
FIDALGO: Que me deixes embarcar.
1. Virgílio sô fidalgo de solar,
2. Horácio é bem que me recolhais.
3. Padre Antônio Vieira ANJO: Não se embarca tirania
4. Petrarca neste batel divinal.
FIDALGO: Não sei por que haveis por mal
5. Carlos Magno
Que entr’a minha senhoria.
Estão corretas apenas: ANJO: Pera vossa fantesia
a) 2, 3 e 5. mui estreita é esta barca.
b) 3, 4 e 5. FIDALGO: Pera senhor de tal marca
c) 1, 2 e 4. nom há aqui mais cortesia? (...)
d) 1, 2 e 3. ANJO: Não vindes vós de maneira
e) 2, 4 e 5. pera ir neste navio.
178
Essoutro vai mais vazio: 3. (Fuvest) E chegando à barca da glória, diz ao
a cadeira entrará Anjo:
e o rabo caberá BRÍSIDA: Barqueiro, mano, meus olhos, pran-
e todo vosso senhorio. cha a Brísida Vaz!
Vós irês mais espaçoso ANJO: Eu não sei quem te cá traz...
com fumosa senhoria, BRÍSIDA: Peço-vo-lo de giolhos!
cuidando na tirania Cuidais que trago piolhos,
do pobre povo queixoso; anjo de Deus, minha rosa?
e porque, de generoso, Eu sou Brísida, a preciosa,
desprezastes os pequenos, que dava as môças aos molhos.
achar-vos-eis tanto menos A que criava as meninas
quanto mais fostes fumoso. (…) para os cônegos da Sé...
SAPATEIRO: (...) E pera onde é a viagem? Passai-me, por vossa fé,
DIABO: Pera o lago dos danados. meu amor, minhas boninas,
SAPATEIRO: Os que morrem confessados, olhos de perlinhas finas! (...)
onde têm sua passagem? VICENTE, Gil. Auto da barca do inferno.
DIABO: Nom cures de mais linguagem! (Texto fixado por S. Spina)
Esta é a tua barca, esta!
(...) E tu morreste excomungado: a) No excerto, a maneira de tratar o Anjo, em-
não o quiseste dizer. pregada por Brísida Vaz, relaciona-se à ati-
Esperavas de viver, vidade que ela exercera em vida? Explique
calaste dous mil enganos... resumidamente.
tu roubaste bem trint’anos b) No excerto, o tratamento que Brísida Vaz
o povo com teu mester. (...) dispensa ao Anjo é adequado à obtenção do
SAPATEIRO: Pois digo-te que não quero! que ela deseja – isto é, levar o Anjo a permi-
DIABO: Que te pês, hás-de ir, si, si! tir que ela embarque? Por quê?
SAPATEIRO: Quantas missas eu ouvi,
não me hão elas de prestar? 4. (Unicamp) Leia agora as seguintes estrofes,
DIABO: Ouvir missa, então roubar, que se encontram em passagens diversas de
é caminho per’aqui. a Farsa de Inês Pereira, de Gil Vicente:
VICENTE, Gil. Auto da barca do inferno.
In: BERARDINELLI, Cleonice (Org.). Antologia INÊS: Andar! Pero Marques seja!
do teatro de Gil Vicente. Rio de Janeiro: Nova Quero tomar por esposo
Fronteira; Brasília: INL, 1984, p. 57-59 e 68-69. quem se tenha por ditoso
de cada vez que me veja.
a) Por que razão específica o fidalgo é condenado Por usar de siso mero,
a seguir na barca do inferno? E o sapateiro? asno que leve quero,
b) Além das faltas específicas desses persona- e não cavalo folão;
gens, há uma outra, comum a ambos e bastan- antes lebre que leão,
te praticada à época, que Gil Vicente condena. antes lavrador que Nero.
Identifique essa falta e indique de que modo PERO: I onde quiserdes ir
ela aparece em cada um dos personagens. vinde quando quiserdes vir,
estai quando quiserdes estar.
Com que podeis vós folgar
2. (Unicamp) Leia o diálogo a seguir, de Auto que eu não deva consentir?
da Barca do Inferno. (Nota: folão, no caso, significa “bravo”, “fogoso”)
DIABO: Cavaleiros, vós passais
e não perguntais onde is? a) A fala de Inês ocorre no momento em que
CAVALEIRO: Vós, Satanás, presumis? aceita casar-se com Pero Marques, após o
Atentai com quem falais! malogrado matrimônio com o escudeiro. Há
OUTRO CAVALEIRO: Vós que nos demandais? um trecho nessa fala que se relaciona lite-
Siquer conhecê-nos bem. ralmente com o final da peça. Que trecho
Morremos nas partes d’além, é esse? Qual é o pormenor da cena final da
e não queirais saber mais. peça que ele está antecipando?
VICENTE, Gil. Auto da Barca do Inferno. b) A fala de Pero, dirigida a Inês, revela uma
In: BERARDINELLI, Cleonice. (Org.). Antologia
atitude contrária a uma característica atri-
do Teatro de Gil Vicente. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira; Brasília: INL, 1984, p. 89. buída ao seu primeiro marido. Qual é essa
característica?
a) Por que o cavaleiro chama a atenção do Diabo? TEXTO PARA AS PRÓXIMAS DUAS QUESTÕES
b) Onde e como morreram os dois Cavaleiros? Tanto de meu estado me acho incerto,
c) Por que os dois passam pelo Diabo, sem se Que em vivo ardor tremendo estou de frio;
dirigir a ele? Sem causa, justamente choro e rio,
179
O mundo todo abarco e nada aperto. a) Cite uma característica típica e uma caracte-
É tudo quanto sinto, um desconcerto; rística atípica da poesia épica, presentes na
Da alma um fogo me sai, da vista um rio; estrofe. Justifique.
Agora espero, agora desconfio, b) Relacione o conteúdo dessa estrofe com o mo-
Agora desvario, agora acerto. mento vivido pelo Império Português por vol-
Estando em terra, chego ao Céu voando; ta de 1572, ano da publicação de Os Lusíadas.
Numa hora acho mil anos, e é jeito
Que em mil anos não posso achar uma hora. TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
Se me pergunta alguém por que assim ando, Cessem do sábio Grego e do Troiano
As navegações grandes que fizeram;
Respondo que não sei; porém suspeito
Cale-se de Alexandre e de Trajano
Que só porque vos vi, minha Senhora.
A fama das vitórias que tiveram;
(Luís Vaz de Camões)
Que eu canto o peito ilustre Lusitano,
A quem Neptuno e Marte obedeceram.
5. Identifique no texto características formais
Cesse tudo o que a Musa antiga canta,
que permitem incluí-lo no Classicismo. Que outro valor mais alto se alevanta.
6. Camões utiliza-se, neste soneto, do verso de- 9. (Unesp) A oitava anterior constitui a tercei-
cassílabo. Suponha que alguém lhe provasse ra estrofe de Os Lusíadas, de Luís de Camões,
tal fato com a seguinte escansão: poema épico publicado em 1572, obra máxi-
Es/ tan/ do/ em/ te/ rra, ma do Classicismo português. O tipo de verso
1 2 3 4 5 6
que Camões empregou é de origem italiana
che/ go ao/céu/ voan/ do
7 8 9 10
e fora introduzido na Literatura Portuguesa
Você concordaria ou não? Por quê? algumas décadas antes, por Sá de Miranda.
Quanto ao conteúdo, o poema Os Lusíadas
7. (Fuvest) toma como ponto de referência um episódio
Quando da bela vista e doce riso, da História de Portugal. Baseado nestes co-
mentários e em seus próprios conhecimen-
tomando estão meus olhos mantimento, 1
tos, releia a estrofe citada e indique:
tão enlevado sinto o pensamento
que me faz ver na terra o Paraíso. a) o tipo de verso utilizado (pode mencionar sim-
plesmente o número de sílabas métricas); e
Tanto do bem humano estou diviso, 2
b) o episódio da História de Portugal que serve
que qualquer outro bem julgo por vento;
de núcleo narrativo ao poema.
assi, que em caso tal, segundo sento, 3
assaz de pouco faz quem perde o siso. 1
0. (Fuvest)
Em vos louvar, Senhora, não me fundo, 4 Tu, só tu, puro amor, com força crua,
porque quem vossas cousas claro sente, Que os corações humanos tanto obriga,
sentirá que não pode merecê-las. Deste causa à molesta morte sua,
Que de tanta estranheza sois ao mundo, Como se fora pérfida inimiga.
que não é d’estranhar, Dama excelente, Se dizem, fero Amor, que a sede tua
que quem vos fez, fizesse Céu e estrelas. Nem com lágrimas tristes se mitiga,
(Camões, ed. A.J. da Costa Pimpão)
É porque queres, áspero e tirano,
Tuas aras banhar em sangue humano.
1. Tomando mantimento = tomando consciência (Camões. Os Lusíadas. episódio de Inês de Castro)
2. Estou diviso = estou separado, apartado molesta = lastimosa, funesta; pérfida = desleal, traidora;
3. Sento = sinto fero = feroz, sanguinário, cruel; mitiga = alivia, suavi-
4. Não me fundo = não me empenho za, aplaca; ara = altar, mesa para sacrifícios religiosos.
a) Caracterize brevemente a concepção de mu- a) Considerando-se a forte presença da cultura
lher que este soneto apresenta. da Antiguidade Clássica em Os Lusíadas, a
b) Aponte duas características desse soneto que se pode referir o vocábulo “Amor”, gra-
que o filiam ao Classicismo, explicando-as fado com maiúscula, no 5o verso?
sucintamente. b) Explique o verso “Tuas aras banhar em san-
gue humano”, relacionando-o à história de
8. (Fuvest)
Inês de Castro.
Não mais, musa, não mais, que a lira tenho
Destemperada e a voz enrouquecida,
E não do canto, mas de ver que venho Gabarito
Cantar a gente surda e endurecida.
O favor com que mais se acende o engenho
Não no dá a pátria, não, que está metida E.O. Teste I
No gosto da cobiça e na rudeza 1. B 2. C 3. E 4. E 5. A
Duma austera, apagada e vil tristeza.
(Luis de Camões. Os Lusíadas.)
6. E 7. B 8. C 9. E 10. C

180
E.O. Teste II 4.
a) O trecho “asno que me leve quero”. O per-
1. B 2. B 3. D 4. E 5. E sonagem Pero Marques age como “asno”
6. D 7. D 8. B 9. E 10. E duas vezes: a primeira quando serve de
cavalgadura e a segunda, por não saber
da traição de Inês.
E.O. Teste III b) O primeiro marido de Inês, o Brás da Mata
não a tratava bem, agia de modo agressi-
1. A 2. D 3. C 4. C 5. B vo, já Pero dava a ela total liberdade.
c) Com o objetivo de levar uma vida mais
ligada aos prazeres, Inês abandona seus
E.O. Dissertativo ideais Esta é uma sátira moral da socie-
1. dade portuguesa da época.
a) O fidalgo está vestido com um longo manto 5. As características formais são de um “sone-
vermelho e vem acompanhado de um criado to”, com versos decassílabos (dez sílabas).
que segura uma cadeira, símbolos da vaida- 6. Não, pois a escansão apresentada contém er-
de e a arrogância. O sapateiro, por sua vez, ros que descaracterizam o verso decassílabo.
transporta o avental e as formas para fazer Portanto, o correto é: Es/ tan/ do em/ te/
sapatos, símbolos da exploração interesseira rra/ che/ go ao/ céu/ vo/ an(do).
da classe burguesa comercial. Motivos pelos 7.
quais são condenados à barca do inferno.
a) A beleza é convertida em Beleza pura,
b) Ambos personagens acreditavam que os ri- logo a mulher é vista não como compa-
tuais recomendados pela Igreja Católica para nheira, mas como um ser angelical que
salvação da alma eram garantias para en- leva ao “mundo das ideias” e à divindade.
trar no céu, o que é contrariado pelo diabo.
b) É característica do Classicismo o soneto
O fidalgo argumenta de que deixou na terra
composto por dois quartetos e dois terce-
alguém rezando por ele “Que leixo na outra
tos e a medida nova (versos decassílabos).
vida/quem reze sempre por mi” – e o sapa-
Além disso, há no texto figuras de lingua-
teiro diz ter ido à missa e se confessado antes
gem como o hipérbato e a seleção lexical.
de morrer, o que para ele garantiria sua en-
trada no céu – “Os que morrem confessados,/ 8.
onde têm sua passagem?”, “Quantas missas a) Uma das características do texto épico é a
eu ouvi,/ não me hão elas de prestar?”. menção a figuras da mitologia, ou seja, seres
2. sobrenaturais que intervêm para o engrande-
cimento da ação que narra os feitos heroicos
a) O cavaleiro alega ter sacrificado a vida em
de um povo de forma grandiloquente. Outro
nome de Deus e do Cristianismo, por isso
aspecto é o formal, com os versos decassíla-
estava assegurada sua entrada na barca
bos dispostos em esquema ABABABABCC.
do anjo e ida para o paraíso.
b) Portugal atinge o ponto culminante da
b) Os cavaleiros morreram em luta contra
sua economia no final do século XVI, em
os que não acreditavam no Cristianismo,
pleno desenvolvimento mercantilista de-
numa Cruzada.
corrente da expansão marítima. No entan-
c) Não se dirigem ao diabo, pois tem certeza to, uma crise dinástica que tem início no
que sua entrada no céu está garantida, reinado de D. Sebastião e que se intensifica
uma vez que lutaram nas cruzadas em de- após sua morte na batalha de Alcácer-Qui-
fesa dos Cristianismo. bir, provocará o início do declínio do Im-
3. pério e que piora com o domínio espanhol
a) A personagem Brísida Vaz era alcovitei- sobre Portugal até meados do século XVII,
ra, portanto era uma espécie de cafetina a chamada União da Península Ibérica.
e agenciava mulheres para a prostituição. 9.
Logo, sua linguagem demonstra caracte- a) Decassílabo.
rísticas de sua atividade, pois ela escolhe
b) A viagem de Vasco da Gama às Índias.
palavras e termos específicos de quem quer
seduzir o Anjo. Por exemplo, “meu amor”, 10.
“olhos de perlinhas finas”, “anjo de Deus”, a) “A” maiúsculo na palavra “amor” para tor-
“minha rosa”, “minhas boninas”. nar divino e personificar tal sentimento.
b) O tratamento com o anjo deixa claro o b) Inês de Castro derramou sangue por cau-
apego ao universo pecaminoso da sedu- sa do seu grande amor, a ideia explicitada
ção e prostituição, portanto a postura de se apoia no sentimento de amor, mas sua
Brísida Vaz é inadequada. concretização exige sacrifício e sangue.
181
© José Veloso Salgado

Aulas 7 e 8
Classicismo: Camões
épico e lírico
Luis Vaz de Camões
Camões teria nascido em 1524 ou 1525, provavelmente
na cidade de Lisboa (talvez Coimbra ou Santarém), des-
cendente de uma família de pequena nobreza. Estudou
numa das mais conceituadas instituições de Portugal,
a Universidade de Coimbra. Em sua juventude, torna-
-se um leitor convulso de Homero, Virgílio, Ovídio e Pe-
trarca. Lutando contra os mouros em 1549, acabou por
perder a vista direita.
Sua biografia é um tanto quanto nebulosa e
cheia de confusões. Em 1552, foi preso por ter brigado
com Gonçalo Jorge, que era oficial da corte, e sai perdo-
ado da cadeia contanto que servisse militarmente Por-
tugal na Índia. Em 1556, é nomeado “provedor-mor dos
bens de defuntos ausentes” em Macau, então colônia
de Portugal. Durante nove anos que passou na cadeia,
começou a escrever Os Lusíadas. Acusado de desviar
bens enquanto provedor-mor, vai para Goa a fim de se
defender das acusações. Na viagem, seu navio naufraga
na foz do Rio Mekong (Indochina) e diz a lenda que ele
se salvou nadando, deixando sua companheira chinesa,
Dinamene morrer afogada, com a desculpa de salvar o manuscrito de Os Lusíadas, que já estava em sua fase final.
Viveu na miséria, foi preso outra vez, agora em Moçambique por causa de dívidas e voltou a Lisboa no ano de 1569
por conta de amigos que o ajudaram.
Em 1572, publica Os Lusíadas, sua obra prima, e recebe uma pensão anual de 15 mil réis oferecida por Dom
Sebastião. Morre pobre em 10 de junho de 1580. Curiosamente, o herói da poesia portuguesa expira com o início
do declínio do poderio imperial de Portugal, mesmo ano da União da Península Ibérica, quando o país fica sob o
domínio da coroa espanhola.
Em 1595, é publicada a obra Rimas, com uma compilação de sua obra lírica, de versos redondilhos elabo-
rados à maneira medieval e também seus sonetos decassílabos de influência petrarquiana.
Leia o poema que Camões escreveu por ocasião da morte de Dinamene:
Alma minha gentil, que te partiste
Tão cedo desta vida descontente,
Repousa lá no Céu eternamente,
E viva eu cá na terra sempre triste.
Se lá no assento Etéreo, onde subiste,
Memória desta vida se consente,
Não te esqueças daquele amor ardente,
Que já nos olhos meus tão puro viste.
E se vires que pode merecer-te
Alg’a cousa a dor que me ficou
Da mágoa, sem remédio, de perder-te,
Roga a Deus, que teus anos encurtou,
Que tão cedo de cá me leve a ver-te,
Quão cedo de meus olhos te levou.
CAMÕES, Luís Vaz de. In: Sonetos.

183
Camões épico

Engenho e arte
A obra épica Os Lusíadas, publicada no reinado de Dom Sebastião
em 1572, é a mais importante epopeia em língua portuguesa, teve
como modelos estruturais as epopeias da Antiguidade: a Ilíada e a
Odisseia, do poeta grego Homero, e a Eneida, do poeta latino Virgílio.
Entretanto, Camões introduziu uma novidade, pois, em Os Lusíadas,
o herói é coletivo, ou seja, é o povo português; ao contrário do
que ocorre nas epopeias modelares, em que um relevante herói indi-
vidual se sobressai (a exemplo de Aquiles, Ulisses e Eneias). Essa mo-
dalidade de escrita passou a ser chamada de epopeia secundária.
Na narrativa épica camoniana, o herói Vasco da Gama, co-
mandante da expedição que buscou o caminho marítimo para as
Índias, tem seu espaço compartilhado com os portugueses, o povo
heroico português, como o próprio título da epopeia indica.
Camões era cristão e desejava cantar em seu poema também
a expansão da fé cristã no mundo. Por isso, a presença de Deus e a
referência a milagres e santos do cristianismo são constantes em sua Disponivel em:<https://commons.wi-
kimedia.org/wiki/File:Camoes_2.jpg.
obra. Contudo, como nas epopeias que Camões tomou por modelo Acessado em: Dez.2015
– Odisseia, Ilíada e Eneida –, há nela também a presença dos deuses
do Olimpo. Eles interferem na narrativa de Os Lusíadas procurando
auxiliar ou prejudicar os portugueses no cumprimento de seus ob-
jetivos. Enquanto Vênus e Marte, por exemplo, tentam protegê-los,
outros deuses, como Netuno e Baco, procuram impedir o cumprimen-
to da rota planejada – o primeiro porque zela pelo seu poderio nos
mares, e o segundo, pelo seu domínio no Oriente.
Os Lusíadas conseguiu conciliar, portanto, o maravilhoso pa-
gão (fruto do gosto renascentista pelo estudo da cultura pagã) e o
maravilhoso cristão (ideologia pessoal do autor). Isso, porém, valeu a
Camões problemas com a Inquisição e tratamento com muita reserva
por parte dos críticos de sua época.

Estrutura da obra
A obra de Camões apresenta 8.816 versos decassílabos, divididos
em 1.102 estrofes, todas em oitava-rima, organizada em dez cantos.
Cada canto, na epopeia, corresponde a um capítulo das obras em
prosa. Além disso, existem outras cinco partes:
184
1. Proposição (canto I, estrofes 1 a 3) No canto II, depois de terem passado por dificul-
O poeta apresenta o que vai cantar, ou seja, o tema dos dades no mar, os portugueses, com o auxílio de Vênus,
feitos heroicos dos ilustres barões de Portugal, o herói aportam na África, onde são recebidos pelo rei de Me-
Vasco da Gama e o destino da viagem. linde, que pede a Vasco da Gama que conte a história
de Portugal. Esse é o pretexto encontrado por Camões
As armas e os barões assinalados
para pôr na fala de sua personagem as histórias que
Que, da ocidental praia lusitana,
Por mares nunca dantes navegados envolvem a fundação do Estado português: a Revolução
Passaram ainda além da Taprobana de Avis, a morte de Inês de Castro e a partida dos portu-
Em perigos e guerras esforçados, gueses para o Oriente.
Mais do que prometia a força humana, Esse relato de Vasco da Gama se estende até o
E entre gente remota edificaram canto IV, momento em que os portugueses seguem via-
Novo reina, que tanto sublimaram;
gem. Nele, três episódios merecem destaque:
barões = homens ilustres
ocidental praia lusitana = Portugal
Taprobana = ilha de Ceilão, limite oriental do mundo conhecido
§§ o de Inês de Castro, amante do príncipe D. Pe-
dro assassinada a mando do rei (canto III);

2. Invocação (canto I, estrofes 4 e 5) §§ o das críticas do velho da praia do Restelo


O poeta invoca as Tágides, ninfas do rio Tejo, pedindo a (canto IV); e
elas para inspirá-lo na composição da obra. §§ do gigante Adamastor (canto V), que é uma
E vós, Tágides minhas, pois criado personificação dos perigos enfrentados pelos na-
Tendes em mim um novo engenho ardente, vegantes aos transporem o Cabo das Tormentas.
Daí-me agora um som alto e sublimado, Por fim, A ilha dos amores (canto IX), com o
Um estilo grandíloquo e corrente,
erotismo de seus símbolos revelando os portugueses a
3. Dedicatória ou oferecimento contemplar a “Máquina do Mundo”.
(canto I, estrofes 6 a 18)
O poeta dedica seu poema a D. Sebastião, rei de Portu-
Episódio de “Inês de Castro”
gal na época em que o poema foi publicado, visto como
(canto III, estrofes 118 a 135)
a esperança de propagação da fé cristã e continuação
dos grandes feitos de Portugal.

Ouvi: vereis o nome engrandecido


Daqueles de quem sois senhor superno
E julgareis qual é mais excelente,
Se ser do mundo rei, se de tal gente.
superno = supremo

4. Narração (canto I, estrofe 19


até canto X, estrofe 144)
“A morte de Inês de Castro”, de Karl Briullov, século XIX.
O poeta relata a viagem propriamente dita dos portu-
gueses ao Oriente. Essa é, portanto, a parte mais longa
do relato e vários são os episódios que nela se desta- O rei Afonso retorna a sua terra natal, depois do intento
cam. O desenrolar dos fatos começa In Media Res, ou vitorioso sobre os mouros esperando ser recebido com
seja, no meio da ação, quando Vasco da Gama e sua es- honras de vitória e, principalmente, de paz, mas é obri-
quadra se dirigem ao Cabo da Boa Esperança. A seguir, gado a contornar uma revolta popular com o triste e
alguns dos mais importantes relatos da obra. memorável caso da desventura de dona Inês de Castro.
185
Este é considerado um episódio lírico interno ao texto épico, em que uma verdadeira história de amor por-
tuguesa é inserida em Os Lusíadas com o claro intuito de registrar esta que foi uma das histórias de amor mais
bonitas e verdadeiras já contadas pela humanidade. Leia um trecho:

Traziam-na os horríficos algozes


Ante o Rei, já movido a piedade;
Mas o povo, com falsas e ferozes
Razões, a morte crua o persuade,
Ela, com tristes e piedosas vozes,
Saídas só da mágoa e saudade
Do seu Príncipe e filhos, que deixava
Que mais que a própria morte magoava,

Episódio do “Velho do Restelo” (canto IV, estrofes 90 a 104)

O episódio do Velho do Restelo representa um conflito ideológico aos intentos portugueses. Como toda lógica nar-
rativa, o desenrolar da aventura passa por processos conflituosos e, nesse caso, ele assume forma de um conflito
entre a visão conservadora, daquele que fica, no caso o velho que com seu cajado maldiz as grandes navegações,
e os ideias universalistas dos argonautas portugueses.
O velho simboliza os ideais medievais e, com suas palavras, diz que aqueles que quiserem fama e glória
acima dos valores religiosos e, sobretudo católicos, seriam punidos com um futuro negativo. Os portugueses en-
frentam este posicionamento e conquistam os mares apesar das críticas do velho. No entanto, sabe-se que o velho
tem sua razão quanto à ambição dos reis portugueses que colocam acima de qualquer coisa “fama” e “glória”
e que levariam Portugal a sua futura derrocada. O velho é aquele que fica, que é terra, que conserva posição em
detrimento da fluidez prática do lançar-se ao mar de Vasco da Gama e sua esquadra. Leia um trecho:

Qual vai dizendo: – Ó filho, a quem eu tinha


Só pra refrigério e doce amparo
Desta cansada já velhice minha
Que em choro acabará, penosos e amaro
Por que me deixas, mísera e mesquinha?
Por que de mim te vás, o filho caro,
A fazer o funéreo enterramento
Onde sejas de peixe mantimento?
[...]
Mas um velho, de aspeito venerado,
Que ficava nas praias, entre a gente,
Postos os olhos em nós, meneando
Três vezes a cabeça, descontente,
A voz pesada um pouco alevantando,
Que nós o mar ouvimos claramente,
Torre de Belém, Lisboa, Portugal.
Co’um saber só de experiências feito,
Tais palavras tirou do experto peito:

Episódio “O gigante Adamastor” (canto V, estrofes 37 a 60)

Nesse episódio, a esquadra de Vasco da Gama está contornando a África, quando um gigante monstruoso emerge
do mar, proferindo ameaças e profecias de naufrágios das naus, em decorrência do atrevimento de Vasco da Gama
e de sua tripulação ter invadido aquele território de domínio do gigante, nunca antes navegado.
186
Vasco da Gama não se intimida e inicia um diá- E disse: – “Ó gente ousada, mais que quantas
logo com o gigante que se identifica como Adamastor. No mundo cometeram grandes cousas,
Ele conta que era um Titã e que um dia se apaixonou Tu, que por guerras cruas, tais e tantas,
por Tétis, mulher do deus Peleu. Enganado por ela, caiu E por trabalhos vãos nunca repousas,
em uma armadilha, após submetê-la a uma “amor for- Pois os vedados términos quebrantas
çoso”, foi condenado por Netuno e como castigo foi E navegar meus longos mares ousas,
transformado em uma enorme e imóvel montanha. Que eu tanto tempo há já que guardo e tenho,
Adamastor é, na verdade, uma personificação do Nunca arados de estranho ou próprio lenho;
Cabo das Tormentas. O episódio representa a superação [...]
do medo, dos perigos do mar e das crendices medie- – “Eu sou aquele oculto e grande Cabo
vais pelos portugueses que circulavam socialmente. É A quem chamais vós outros Tormentório,
representativo do ponto de vista do engrandecimento Que nunca a Ptolomeu, Pompónio, Estrabo,
do povo português que, apesar do temor e do desco- Plínio, e quantos passaram, fui notório.
nhecimento, enfrentou os obstáculos e os perigos do Aqui toda a Africana costa acabo
mar, vencendo-os e triunfando. Neste meu nunca visto Promontório,
Que para o Pólo Antártico se estende,
[...] A quem vossa ousadia tanto ofende.
Porém já cinco Sóis eram passados cinco sóis = cinco dias; esquálida = suja, desalinhada;
Que dali nos partíramos, cortando colosso = uma das setes maravilhas do mundo, a está-
tua do deus Apolo, em Rodes, na Grécia; Tormentório =
Os mares nunca de outrem navegados, Cabo das Tormentas; Ptolomeu = astrônomo grego; Pom-
Prosperamente os ventos assoprando, pónio = geógrafo romano; Estrabo = geógrafo grego.
Quando uma noite, estando descuidados
Na cortadora proa vigiando,
Uma nuvem, que os ares escurece, Episódio “A Ilha dos Amores”
Sobre nossas cabeças aparece. (canto IX, estrofes 68 a 95)
Tão temerosa vinha e carregada,
Que pôs nos corações um grande medo;
Bramindo, o negro mar de longe brada,
Como se desse em vão nalgum rochedo.
– “Ó Potestade (disse) sublimada:
Que ameaço divino ou que segredo
Este clima e este mar nos apresenta,
Que mor cousa parece que tormenta?”
[...]
Não acabava, quando uma figura
Se nos mostra no ar, robusta e válida,
De disforme e grandíssima estatura;
O rosto carregado, a barba esquálida,
Os olhos encovados, e a postura
Medonha e má, e a cor terrena e pálida;
Cheios de terra e crespos os cabelos,
As Nereidas (Ninfas) da Ilha dos Amores
A boca negra, os dentes amarelos.
Tão grande era de membros, que bem posso Nos cantos de VI a IX, os portugueses chegam a Calicu-
Certificar-te que este era o segundo te, na Índia, e têm problemas com os mouros. Preparam-
De Rodes estranhíssimo Colosso,
-se, então, para voltar a Portugal; porém, devido a seus
Que um dos sete milagres foi do mundo.
esforços e à sua coragem, são premiados por Vênus, que
Cum tom de voz nos fala, horrendo e grosso,
Que pareceu sair do mar profundo. lhes oferece uma passagem pela Ilha dos Amores, onde
Arrepiam-se as carnes e o cabelo, podem livremente amar as ninfas, lideradas por Tétis.
A mi e a todos, só de ouvi-lo e vê-lo! Além disso, a Ilha dos Amores celebra a virilidade dos
187
argonautas portugueses com o erotismo de seus símbo- delineia um lirismo amoroso platônico, relacionado in-
los levando-os a refletir sobre “Máquina do Mundo”. dissoluvelmente a uma mulher inacessível, Laura, a que
Todo o fervor religioso em defesa dos portugueses que dedicou perto de 360 sonetos, no seu Cancioneiro.
tentavam impor aos infiéis mouros sua fé cristã não im-
pediu a utilização do erotismo no episódio que foi bene-
ficiado por uma deusa pagã, a Venus, que durante todo A lírica amorosa
o poema protege os portugueses, em contraposição a
Baco (o Dionísio dos gregos), que tinha tudo para ser O tema amoroso é explorado na lírica camoniana sob
favorável a essa situação, por ser o deus do vinho, mas dupla perspectiva. Com frequência, aparece o amor sen-
que, na obra, é constituído com inimigo dos portugue- sual, próprio da sensualidade renascentista, inspirada
ses, uma vez que seu desregramento e representação no paganismo da cultura greco-latina. Predomina, po-
por chifres e rabo o aproximava da imagem do diabo rém, o amor neoplatônico, espécie de extensão e apro-
utilizada pela igreja católica. fundamento da tradição da poesia medieval portuguesa
ou da poesia humanista italiana, em que o amor e a
Oh, que famintos beijos na floresta!
mulher se configuram como idealizados e inacessíveis.
E que mimoso choro que soava
Na poesia lírica camoniana, tal qual no modelo
Que afagos tão suaves! Que ira honesta,
Que em risinhos alegres se tornava! legado por Petrarca, o amor é um sentimento que eleva
O que mais passam na manha e na sesta, o homem, tornando-o capaz de atingir o Bem, a Beleza
Que Vênus com prazeres inflamava, e a Verdade, de acordo com a filosofia platônica. Para
Melhor é experimentá-lo que julgá-lo, Platão, a realidade se divide em “mundo dos sentidos” e
Mas julgue-o quem não pode exeprimentá-lo. “mundo das ideias”. No mundo sensorial, nada é pere-
A Ilha dos Amores, na visão de Jorge Golaço. ne; no mundo das ideias, tudo é terno, imutável. O amor
ideal, de acordo com Platão, é um sentido essencialmen-
5. Epílogo te puro e desprovido de paixões, ao passo que estas são
É a conclusão do poema (estrofes 145 a 156 do can- essencialmente cegas, materiais, efêmeras e falsas.
to X), em que o poeta demonstra cansaço e, em tom Em Camões, percebe-se o conflito entre o sen-
melancólico e pessimista, aconselha ao rei e ao povo timento espiritual, idealizado, e o sentimento de ma-
português que sejam fiéis à pátria e ao cristianismo. nifestação carnal. O amor é, dessa forma, complexo,
contraditório. Esse duplo enfoque do amor é bastante
Camões lírico acentuado no soneto Amor é fogo que arde sem se ver.

Amor é fogo que arde sem se ver,


é ferida que dói, e não se sente;
“Tu, só tu, puro amor” é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer.
A obra lírica de Camões compreende poemas feitos na É um não querer mais que bem querer;
medida velha e na medida nova. A medida velha obede- é um andar solitário entre a gente;
ce à poesia de tradução popular, na forma e no conteú- é nunca contentar-se de contente;
é um cuidar que ganha em se perder.
do. São exploradas as redondilhas, de cinco ou de sete
sílabas (menor ou maior, respectivamente). É querer estar preso por vontade;
é servir a quem vence, o vencedor;
Quanto à medida nova, os poemas em medida
é ter com quem nos mata, lealdade.
nova são relacionados à tradição clássica: sonetos, éclo-
gas, elegias, oitavas, sextinas. Quanto ao conteúdo, a Mas como causar pode seu favor
nos corações humanos amizade,
poesia lírica clássica se relaciona com o petrarquismo.
se tão contrário a si é o mesmo Amor?
Francesco Petrarca foi o responsável por fixar a forma
“Amor é fogo que arde sem se ver”.
do soneto, no século XIV; o conteúdo de sua poesia In: CAMÕES, Luís Vaz de. Lírica. São Paulo: Cultrix, 1976.

188
Dessa forma, o amor que uma pessoa sente por outra não
passa de uma manifestação particular e imperfeita de algo superior,
universal e perfeito: o Amor-ideal, grafado com A maiúsculo.
É dessa concepção que advém o amor neoplatônico dos
humanistas e renascentistas: quanto mais o amor por uma pessoa
estiver desvinculado de prazeres físico-sensoriais e se aproximar do
amor-ideal, maior e mais puro será. É o que se observa nas 1a e 2a
estrofes do soneto de Camões:

Transforma-se o amador na cousa amada,


por virtude do muito imaginar;
não tenho, logo, mais que desejar,
pois em mim tenho a parte desejada.
Se nela está minha alma transformada,
que mais deseja o corpo de alcançar?
Em si somente pode descansar,
pois consigo tal alma está ligada.
Na voz de Renato Russo, da Legião Urbana, o soneto
Mas esta linda e pura semideia, “Amor é fogo que arde sem se ver” adquiriu uma nova
interpretação, que caiu no gosto dos jovens.
que, como um acidente em seu sujeito,
assim como a alma minha se conforma,
está no pensamento como ideia:
[E] o vivo e puro amor de que sou feito,
como a matéria simples busca a forma.
(Lírica, cit., p.109)

Nessas estrofes iniciais do poema, a realização amorosa se


dá por meio de imaginação. Não é preciso ter a pessoa amada fisi-
camente, basta tê-la em pensamento. Tendo-a em si, na imaginação,
o eu lírico se transforma na pessoa dama, confunde-se com ela e,
dessa forma, já a tem.
Observe, porém, que, nas duas últimas estrofes, o poeta aban-
dona o neoplatonismo e, com uma comparação, manifesta seu de-
sejo físico pela mulher amada: do mesmo modo que toda matéria
busca uma forma, o seu amor puro, amor-ideia, busca o objeto desse
amor, ou seja, a mulher real.
Esses sentimentos contraditórios, bem como certo pessimismo
existencial que marca a poesia lírica de Camões, fogem ao espírito
harmonioso e racional do Renascimento e prenunciam o movimento
literário do século XVII: o Barroco. Esse período de transição entre
Renascimento e o Barroco é chamado, nas artes plásticas, de Manei-
rismo; por isso, alguns críticos consideram como traços maneiristas
certas características da lírica de Camões.
189
Um amor para sempre
O soneto Sete anos de pastor Jacó servia, é uma amostra marcante do amor platônico, que tem duração idealizada,
independentemente de realização física. Esse poema de Camões narra o episódio bíblico em que Jacó trabalha para
Labão, visando casar-se com sua filha Raquel, mas acaba recebendo a irmã dela, Lia.

Sete anos de pastor Jacob servia


Labão, pai de Raquel, serrana bela;
Mas não servia ao pai, servia a ela,
E a ela só por prêmio pretendia.
Os dias, na esperança de um só dia,
Passava, contentando-se com vê-la;
Porém o pai, usando de cautela,
Em lugar de Raquel lhe dava Lia.
Vendo o triste pastor que com enganos
Lhe fora assim negada a sua pastora,
Como se a não tivera merecida;
Começa de servir outros sete anos,
Dizendo: – Mais servira, se não fora
Para tão longo amor tão curta a vida!
“Sete anos de pastor Jacó servia”.
n: CAMÕES, Luis Vaz de. Lírico. São Paulo: Cultrix, 1976.

No primeiro quarteto, o pastor Jacó serve a Labão porque deseja Raquel. O segundo quarteto mostra o
desejo frustrado de Jacó, quando Labão lhe entrega a irmã mais velha, Lia. Humilde, por um amor ideal, platônico,
o pastor se dispõe a trabalhar outros sete anos, e assim indefinidamente para comprovar sua fidelidade amorosa.

A mutabilidade e o mundo desconcertante


A perfeição do mundo das ideias é contrastada por Camões com as imperfeições do mundo terreno. Em sua obra lírica, nota-se
que a vida humana está condicionada a essas imperfeições, enquanto o espírito busca outros horizontes. Desse contraponto,
resulta uma visão pessimista da vida, que brota dos problemas existenciais do próprio poeta, de suas frustrações e atribuições.

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,


Muda-se o ser, muda-se a confiança;
Todo o Mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.
Continuamente vemos novidades,
Diferentes em tudo da esperança;
Do mal ficam as mágoas na lembrança,
E do bem, se algum houve, as saudades.
O tempo cobre o chão de verde manto,
Que já coberto foi de neve fria,
E em mim converte em choro o doce canto.
E, afora este mudar-se cada dia,
Outra mudança faz de mor espanto:
Que não se muda já como soía.
CAMÕES, Luís Vaz de. 200 Sonetos. Porto Alegre: L&PM. 1998.

190
E.O. Teste I b) “Inês de Castro” caracteriza, dentro da epo-
peia camoniana, o gênero lírico porque é um
episódio que narra os amores impossíveis
1. Assinale com V (verdadeiro) ou F (falso) as
entre Inês e seu amado Pedro.
afirmações a seguir, relacionadas aos Cantos
c) Restelo era o nome da praia em frente ao
I a V da epopeia Os Lusíadas, de Camões.
templo de Belém, de onde partiam as naus
( ) A presença do elemento mitológico é
portuguesas nas aventuras marítimas.
uma forma de reconhecimento da cultura
d) tanto “Inês de Castro” quanto “O Velho do
clássica, objeto de admiração e imitação
Restelo” são episódios que ilustram poeti-
no Renascimento.
camente diferentes circunstâncias da vida
( ) A disputa entre os deuses Vênus e Baco,
portuguesa.
da mitologia clássica, é um recurso lite-
e) o Velho, um dos muitos espectadores na
rário de que Camões faz uso para criar o
praia, engrandecia com sua fala as façanhas
enredo de Os Lusíadas.
dos navegadores, a nobreza guerreira e a
( ) Do Canto I ao Canto V, leem-se as peripé-
máquina mercantil lusitana.
cias da viagem dos portugueses até sua
chegada à Índia, quando eles tomam pos-
4. Com os versos “Cantando espalharei por toda
se daquela terra. a parte,/ Se a tanto me ajudar o engenho e
( ) No Canto II, lê-se a narração da viagem a arte.”, Camões explica que o propósito de
dos portugueses a Melinde, cujo rei pede a Os Lusíadas é divulgar os feitos portugue-
Camões que conte a história de Portugal. ses. Sobre esse poema épico, só é INCORRETO
afirmar que:
A sequência correta de preenchimento dos
a) se trata da maior obra literária do quinhen-
parênteses, de cima para baixo, é:
tismo português.
a) V – V – V – F
b) Camões sofre a clara influência dos clássicos
b) V – F – F – V
greco-latinos.
c) F – V – F – V
c) há forte presença do romantismo, devido
d) F – F – V – F
ao nacionalismo.
e) V – V – F – F
d) como epopeia moderna, há momentos de crí-
tica à nação e ao povo.
2. Assinale a alternativa que completa correta- e) louva não apenas o homem português, mas
mente a afirmação seguinte: o homem renascentista.
O movimento desenvolveu-se no apogeu po-
lítico de Portugal; consiste numa concepção TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
artística baseada na imitação dos modelos Antes de concluir este capítulo, fui à jane-
clássicos gregos e latinos. Nele, o pensa- la indagar da noite por que razão os sonhos
mento lógico predomina sobre a emoção, e hão de ser assim tão tênues que se esgarçam
a estrutura da composição poética obedece ao menor abrir de olhos ou voltar de corpo,
a formas fixas, com a introdução da medida e não continuam mais. A noite não me res-
nova, que convive com a medida velha das pondeu logo. Estava deliciosamente bela, os
formas tradicionais. morros 1palejavam de luar e o espaço morria
Trata-se do: de silêncio. Como eu insistisse, declarou-
a) Modernismo. -me que os sonhos já não pertencem à sua
b) Barroco. jurisdição. Quando eles moravam na ilha
c) Romantismo. que Luciano lhes deu, onde ela tinha o seu
d) Classicismo. palácio, e donde os fazia sair com as suas
e) Realismo. caras de vária feição, dar-me-ia explicações
possíveis. Mas os tempos mudaram tudo. Os
3. Dos episódios “Inês de Castro” e “O Velho sonhos antigos foram aposentados, e os mo-
dernos moram no cérebro da pessoa. Estes,
do Restelo”, da obra Os Lusíadas, de Luiz de
ainda que quisessem imitar os outros, não
Camões, NÃO é possível afirmar que:
poderiam fazê-lo; a ilha dos Sonhos, como
a) “O Velho do Restelo”, numa antevisão pro-
a dos Amores, como todas as ilhas de todos
fética, previu os desastres futuros que se
os mares, são agora objeto da ambição e da
abateriam sobre a Pátria e que arrastariam a rivalidade da Europa e dos Estados Unidos.
nação portuguesa a um destino de enfraque- Machado de Assis. Dom Casmurro.
cimento e marasmo. 1. palejavam: tornavam pálidos

191
5. Assinale a alternativa que apresenta frag- A respeito do episódio da Ilha dos Amores (Can-
mento da epopeia camoniana, extraído do to IX), responda às próximas duas questões.
episódio “A ilha dos amores”, a que o texto
faz referência. 7. Sobre este famoso trecho de Os Lusíadas é
a) Volve a nós teu rosto sério,/ Princesa do correto afirmar que:
Santo Gral,/ Humano ventre do Império,/
a) trata-se de um recurso ardiloso de Vênus
Madrinha de Portugal.
para impedir que os portugueses tivessem
b) Ali, em cadeiras ricas, cristalinas,/ Se assen-
tam dous e dous, amante e dama;/ Noutras, sucesso no seu empreendimento e, assim, se
à cabeceira, de ouro finas,/ Está co’a bela igualassem aos deuses.
deusa o claro Gama. b) trata-se de uma cilada de Baco contra os
c) Se encontrares louvada uma beleza,/ Marília, portugueses, pois todos os nautas que se
não lhe invejes a ventura,/ que tens quem entregaram aos prazeses da ilha encontra-
leve à mais remota idade/ a tua formosura. ram a morte.
d) Este lugar delicioso, e triste,/ Cansada de c) é um episódio com um forte sentido cris-
viver, tinha escolhido/ Para morrer a míse- tão, pois o amor aí tem um sentido nitida-
ra Lindóia. mente espiritual.
e) Choraram da Bahia as ninfas belas,/ Que na- d) trata-se de um episódio com um sentido eró-
dando a Moema acompanhavam;/ E vendo tico, pois, por influência de Vênus, Tétis e
que sem dor navegam delas,/ À branca praia
suas ninfas oferecem aos nautas uma recom-
com furor tornavam.
pensa pelos trabalhos por que têm passado.
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO e) Baco e Vênus resolvem, finalmente, unir
seus esforços contra os humanos, convecen-
As questões adiante baseiam-se no poema
do Tétis e suas ninfas a usar seu poder de
épico Os Lusíadas, de Luís Vaz de Camões, do
sedução para aprisionarem os portugueses
qual se reproduzem, a seguir, três estrofes.
na ilha.
Mas um velho, de aspeito venerando,
Que ficava nas praias, entre a gente, 8. (Fuvest) Leia o trecho de Memorial do con-
Postos em nós os olhos, meneando vento, de José Saramago.
Três vezes a cabeça, descontente,
A voz pesada um pouco alevantando, Já vai andando a récua dos homens de Arga-
Que nós no mar ouvimos claramente, nil, acompanham-nos até fora da vila as in-
C’um saber só de experiências feito, felizes, que vão aclamando, qual em cabelo,
Tais palavras tirou do experto peito: Ó doce e amado esposo, e outra protestando,
Ó filho, aquém eu tinha só para refrigério e
“Ó glória de mandar, ó vã cobiça doce amparo desta cansada já velhice minha,
Desta vaidade a quem chamamos Fama!
não se acabavam as lamentações, tanto que
Ó fraudulento gosto, que se atiça
os montes de mais perto respondiam, quase
C’uma aura popular, que honra se chama!
Que castigo tamanho e que justiça movidos de alta piedade.
Fazes no peito vão que muito te ama! Em muitas passagens do trecho transcrito, o
Que mortes, que perigos, que tormentas, narrador cita textualmente palavras de um
Que crueldades neles experimentas! episódio de Os Lusíadas, visando a criticar o
Dura inquietação d’alma e da vida mesmo aspecto de vida de Portugal que Ca-
Fonte de desamparos e adultérios, mões, nesse episódio, já criticara. O episódio
Sagaz consumidora conhecida camoniano citado e o aspecto criticado são,
De fazendas, de reinos e de impérios! respectivamente:
Chamam-te ilustre, chamam-te subida, a) O Velho do Restelo; posição subalterna da
Sendo digna de infames vitupérios; mulher na sociedade tradicional portuguesa.
Chamam-te Fama e Glória soberana, b) Aljubarrota; a sangria populacional pro-
Nomes com quem se o povo néscio engana.” vocada pelos empreendimentos coloniais
portugueses.
6. Entre os versos “Chamam-te ilustre, cha-
c) Aljubarrota; o abandono dos idosos decor-
mam-te subida,/ Sendo digna de infames
vitupérios”, a relação que se estabelece é de: rente dos empreendimentos bélicos, maríti-
a) oposição. mos e santuários.
b) explicação. d) O Velho do Restelo; o sofrimento popular de-
c) causa. corrente dos empreendimentos dos nobres.
d) modo. e) Inês de Castro; e o sofrimento feminino cau-
e) conclusão. sado pelas perseguições das Inquisições.
192
9. (Fuvest) Sobre o episódio do Velho do Reste- Mar Português
lo, assinale a alternativa correta: (Fernando Pessoa)
a) O discurso do Velho do Restelo tem significa-
do complexo, na medida em que sua opinião Ó mar salgado, quanto do teu sal
se apresenta de maneira obscura: ele conde- São lágrimas de Portugal!
na certos aspectos da expansão ultramarina Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
ao mesmo tempo em que exalta o poderio Quantos filhos em vão rezaram!
bélico de Portugal. Quantas noivas ficaram por casar
b) Trata-se de um episódio de intensidade dra- Para que fosses nosso, ó mar!
mática, dadas as circunstâncias em que a Valeu a pena? Tudo vale a pena
cena ocorre e ao conteúdo do discurso pro- Se a alma não é pequena.
ferido pela personagem, que nada mais é do Que quer passar além do Bojador
que a opinião do próprio autor da epopéia. Tem que passar além da dor.
c) A veemência do discurso do Velho do Restelo Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
reside no apelo feito pelo próprio aspecto Mas nele é que espelhou o céu.
físico do personagem, que indica a sabedo-
ria acumulada por quem se tornou, com o
Os Lusíadas
decorrer dos anos, humilde e resignado.
(Camões)
d) Embora surja como uma voz discordante em
relação ao propósito de exaltação das Nave- Ó glória de mandar , ó vã cobiça
gações apresentado pelo narrador épico, o Desta vaidade a quem chamamos Fama!
discurso do Velho do Restelo mostra-se coe- Ó fraudulento gosto, que se atiça
rente com uma ideologia defensora da vida C´uma aura popular que honra se chama!
junto à Pátria e à Família.
Que castigo tamanho e que justiça
e) A opinião do Velho do Restelo em relação às
Fazes no peito vão que muito te ama!
Navegações é, ao mesmo tempo, reacionária,
Que mortes, que perigos, que tormentas,
uma vez que defende a conservação dos va-
Que crueldades neles experimentas!
lores humanitários e familiares, e arrojada,
já que o personagem prevê com sabedoria os Os textos de Fernando Pessoa e de José Sa-
desastres que resultariam das viagens. ramago são intertextuais em relação ao epi-
sódio do Velho do Restelo. Refletindo sobre
10. a visão destes dois autores lusos, assinale
Fala do Velho do Restelo ao Astronauta
a correta:
(José Saramago)
a) Saramago não faz referências críticas aos va-
Aqui na terra a fome continua lores éticos ou existenciais, detendo-se na
A miséria e o luto questão da guerra e do progresso.
A miséria e o luto e outra vez a fome b) Fernando Pessoa estabelece uma relação irô-
Acendemos cigarros em fogos de napalm
nica com o texto camoniano, pois parodia
E dizemos amor sem saber o que seja.
o tom grandiloquente da fala do Velho do
Mas fizemos de ti a prova da riqueza,
Restelo, valendo-se de apóstrofes.
Ou talvez da pobreza, e da fome outra vez,
c) Os versos de Fernando Pessoa se assemelham
E pusemos em ti nem eu sei que desejos
aos do episódio do Velho de Restelo pela au-
De mais alto que nós, de melhor e mais puro,
sência de personificação.
No jornal soletramos de olhos tensos
Maravilhas de espaço e de vertigem. d) Saramago e Fernando Pessoa não se valeram
Salgados oceanos que circundam da perfeição formal camoniana, o que in-
Ilhas mortas de sede onde não chove. valida o teor intertextual, que compreende
Mas a terra, astronauta, é boa mesa apenas estrutura e conteúdo.
(E as bombas de napalm são brinquedos) e) Saramago apresenta uma crítica universali-
Onde come brincando só a fome zante que retoma o alerta feito pelo Velho
Só a fome, astronauta, só a fome do Restelo, atualizando-o.
193
E.O. Teste II 3. Assinale a alternativa correta sobre o texto I.
a) Expressa as vivências amorosas do “eu” líri-
co em linguagem emotivo-confessional.
TEXTOS PARA AS PRÓXIMAS TRÊS QUESTÕES.
b) Apresenta índices de linguagem poética
Texto I marcada pelo racionalismo do século XVI.
Amor é fogo que arde sem se ver; c) Conceitua o amor de forma unilateral, re-
É ferida que dói e não se sente; velando o intenso sofrimento do coração
É um contentamento descontente; apaixonado.
É dor que desatina sem doer. d) Notam-se, em todos os versos, imagens poé-
É um não querer mais que bem querer; ticas contraditórias, criadas a partir de subs-
É solitário andar por entre a gente; tantivos concretos.
É nunca contentar-se de contente;
e) Conceitua positivamente o amor corres-
É cuidar que se ganha em se perder;
pondido e, negativamente, o amor não cor-
(Camões)
respondido.

Texto II TEXTOS PARA AS PRÓXIMAS DUAS QUESTÕES


Amor é fogo? Ou é cadente lágrima?
Pois eu naufrago em mar de labaredas CANTIGA
Que lambem o sangue e a flor da pele acendem Vi chorar uns claros olhos
Quando o rubor me vem à tona d’água. Quando deles me partia.
E como arde, ai, como arde, Amor, Oh! que mágoa! Oh! que alegria
Quando a ferida dói porque se sente,
E o mover dos meus olhos sob a casca VOLTAS
Vê muito bem o que devia não ver. (...)
(Ilka Brunhilde Laurito) O bem que Amor me não deu,
No tempo que o desejei,
Quando dele me apartei,
1. Assinale a alternativa correta sobre o texto II. Me confessou que era meu.
a) A liberdade formal dos quartetos, associada
Agora que farei eu,
à contenção emotiva, é índice da influência
Se a fortuna me desvia
parnasiana.
De lograr esta alegria?
b) Por seguir os princípios estéticos clássicos,
(Camões – Lírica)
sua expressão é de teor mais universalista
que individualista. Mudando andei costume, terra e estado,
c) O caráter reflexivo das interrogativas iniciais Por ver se se mudava a sorte dura;
impede que a linguagem seja marcada por
A vida pus nas mãos de um leve lenho.
índices de emotividade.
Mas, segundo o que o Céu me tem mostrado,
d) Recupera, do estilo camoniano, a preferência
Já sei que deste meu buscar ventura
por imagens paradoxais, como, por exemplo,
Achado tenho já que não a tenho.
mar de labaredas.
(Camões – Lírica)
e) Vale-se de recursos estilísticos conquistados
pelos modernistas, como, por exemplo, ver-
sos decassílabos e expressão coloquial.
4. A partir da leitura dos dois fragmentos, assi-
nale a afirmativa inaceitável:
2. Assinale a alternativa correta.
a) Há diversidade formal e temática na lírica de
a) O texto I, com sua regularidade formal, re-
Camões, devido à sua relação tanto com a tra-
cupera do texto II o rígido padrão da estéti-
dição popular quanto com a cultura clássica.
ca clássica.
b) Nos dois textos encontramos a ação do des-
b) Os dois textos, ao negarem uma concepção
carnal do amor, enaltecem o platonismo tino se opondo à felicidade do poeta.
amoroso. c) A expressão “fortuna”, do primeiro fragmen-
c) O texto I e o texto II são convergentes no to, é equivalente, no plano semântico, à ex-
que se refere à concepção do sentimento pressão “ventura”, do segundo.
amoroso. d) A forma do primeiro fragmento expressa a
d) O texto II contesta o texto I no que se refere relação entre a lírica de Camões e a tradição
ao ponto de vista sobre o amor. poética medieval peninsular.
e) Os dois textos convergem quanto à forma e à e) O terceiro verso do segundo fragmento é uma
linguagem, mas divergem quanto ao conteúdo. metáfora clara da instabilidade da vida do poeta.
194
5. Em relação aos textos anteriores, SÓ SE PODE c) As redondilhas de Camões seguem os mol-
AFIRMAR que: des da poesia palaciana do Cancioneiro
a) o amor realizado é o tema do primeiro poe- Geral de Garcia de Resende e, mesmo na
ma, e a harmonia entre o poeta e o mundo é medida velha, o poeta superou seus con-
o tema do segundo. temporâneos e antecessores.
d) A lírica na medida velha, tradicional, me-
b) as expressões “oh que alegria” e “achado te-
dieval, vale-se dos motes glosados, das re-
nho já” mostram que, finalmente, o poeta dondilhas e são de cunho galante, alegre
encontra a harmonia. madrigalesco.
c) as expressões “me partia” e “me apartei”, e) A principal diferença entre a poesia lírica e
no primeiro fragmento, são equivalentes, no a poesia épica é formal e manifesta-se na
plano semântico. utilização de versos de diferentes metros.
d) a forma do segundo fragmento expressa a
relação entre a lírica de Camões e o trovado- 10. Não são modalidade da medida nova:
rismo medieval. a) canção e elegia.
e) o verso “me confessou que era meu” indica b) soneto e ode.
que o poeta encontrou a felicidade. c) erceto e oitava.
d) écloga e sextina.
6. (Fuvest) Na lírica de Camões: e) trova e vilancete.
a) o metro usado para a composição dos sone-
tos é a redondilha maior.
b) encontram-se sonetos, odes, sátiras e autos. E.O. Teste III
c) cantar a Pátria é o centro das preocupações.
d) encontra-se uma fonte de inspiração de mui- 1. Assinale com V (verdadeiro) ou F (falso) as
tos poetas brasileiros do século XX. afirmações a seguir, referentes ao “Canto V”
e) a Mulher é vista em seus aspectos físicos, de “Os Lusíadas”, de Luís de Camões.
despojada de espiritualidade.
( ) Vasco da Gama conta ao rei africano a
partida da terra portuguesa, onde a tri-
7. Não se relaciona à medida nova:
pulação deixa o coração e as mágoas.
a) versos decassílabos.
( ) Ao descrever Adamastor, Vasco da Gama
b) influência italiana.
c) predileção por formas fixas. cita, entre as características do gigante, a
d) sonetos, tercetos, oitavas e odes. barba esquálida, os olhos encovados e os
e) cultura popular, tradicional. cabelos crespos.
( ) Paulo da Gama, irmão de Vasco, narra a
8. Assinale a incorreta sobre Camões: viagem dos lusos até Melinde.
a) Sua obra compreende os gêneros épico, líri- ( ) O aventureiro Fernão Veloso, ao ser ata-
co e dramático. cado por etíopes, volta correndo para jun-
b) A lírica de Camões permaneceu praticamente to dos companheiros, cena que empresta
inédita. Sua primeira compilação é póstuma, humor ao poema épico.
datada de 1595, e organizada sob o título ( ) O poeta Luís de Camões assume a narra-
de As Rimas de Luis de Camões, por Fernão ção do poema para elogiar a tenacidade
Rodrigues Lobo Soropita. portuguesa.
c) Sua lírica compõe-se exclusivamente de re-
dondilhas e sonetos. A sequência correta de preenchimento dos
d) Apesar de localizada no período clássico-re- parênteses, de cima para baixo, é:
nascentista, a obra possui citações barrocas. a) F – F – V – F – V
e) Representa o amadurecimento de língua b) V – F – F – V – V
portuguesa, sua estabilização e a maior ma- c) F – V – F – V – F
nifestação de sua excelência literária. d) V – V – F – V – F
e) F – F – V – F – F
9. Ainda sobre Camões, assinale a incorreta:
a) Não há um texto definitivo de lírica camo- 2. Sobre o poema Os Lusíadas, é incorreto afir-
niana. Atribuem-se-lhe cerca de 380 compo- mar que:
sições líricas, destacando-se os cerca de 200 a) quando a ação do poema começa, as naus
sonetos, alguns de autoria controversa.
portuguesas estão navegando em pleno Oce-
b) Camões teria reunido sua lírica sob o titu-
lo de O Parnaso Lusitano, que se perdeu, e ano Índico, portanto no meio da viagem.
do qual há algumas referências nas cartas b) na Invocação, o poeta se dirige às Tágides,
do poetas. ninfas do rio Tejo.
195
c) Na ilha dos Amores, após o banquete, Tétis
conduz o capitão ao ponto mais alto da ilha,
E.O. Dissertativo
onde lhe descenda a “máquina do mundo”. TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
d) Tem como núcleo narrativo a viagem de Vas-
Partimo-nos assim do santo templo
co da Gama, a fim de estabelecer contato
Que nas praias do mar está assentado,
marítimo com as Índias.
Que o nome tem da terra, para exemplo,
e) É composto em sonetos decassílabos, man-
Donde Deus foi em carne ao mundo dado.
tendo em 1.102 estrofes o mesmo esquemas Certifico-te, ó Rei, que se contemplo
de rimas. Como fui destas praias apartado,
Cheio dentro de dúvida e receio,
3. O desejo de criar um novo mundo, um rei- Que a penas nos meus olhos ponho o freio.
no feliz não se concretizou. Em vez disso, (Camões, Os Lusíadas, Canto 4º - 87.)
os navegadores praticaram atos violentos no
processo das conquistas. Em que versos o Gi-
gante Adamastor refere-se a essa violência: 1. (UFSCar) O trecho faz parte do poema épico
a) Sabes que quantas naus esta viagem “Os Lusíadas”, escrito por Luís Vaz de Ca-
Que tu fazes, fizeram, de atrevidas, mões e narra a partida de Vasco da Gama,
Inimiga terão estas paragem. para a viagem às Índias.
b) Chamei-me Adamastor, e fui na guerra a) Em que estilo de época ou época histórica se
situa a obra de Camões?
Contra o que vibra os raios da Vulcano
b) Para dizer que o nome do templo é Belém, Ca-
c) Mas, conquistando as ondas do oceano
mões faz uso de uma perífrase: “Que o nome
Fui capitão domar por onde andava
tem da terra, para exemplo,/ Donde Deus foi
A armada de Netuno, que eu buscava
em carne ao mundo dado”. Em que outro tre-
d) Ouve os danos de mim que apercebidos
cho dessa estrofe Camões usa outra perífrase?
Estão a te sobejo atrevimento
Por todo o largo mar e pela terra 2. (Fuvest)
Que inda hás de subjulgar com dura guerra. Oh! Maldito o primeiro que, no mundo,
e) Comecei a sentir o Fado inimigo Nas ondas vela pôs em seco lenho!
Por meus atrevimentos, o castigo. Digno da eterna pena do Profundo,
Se é justa a justa Lei que sigo e tenho!
4. Os gêneros literários são empregados com fi- Nunca juízo algum, alto e profundo,
nalidade estética. Leia os textos a seguir. Nem cítara sonora ou vivo engenho,
Busque Amor novas artes, novo engenho, Te dê por isso fama nem memória,
Para matar-me, e novas esquivanças; Mas contigo se acabe o nome e a glória.
Que não pode tirar-me as esperanças, (Camões, “Os Lusíadas”)
Que mal me tirará o que eu não tenho.
a) Considerando esse trecho da fala do velho
(Camões, L. V. de. Sonetos. Lisboa: Livraria
do Restelo no contexto da obra a que per-
Clássica Editora. 1961. Fragmento.)
tence, explique os dois primeiros versos, es-
Porém já cinco sóis eram passados clarecendo o motivo da maldição que, neles,
Que dali nos partíramos, cortando é lançada.
Os mares nunca doutrem navegados, b) Nos quatro últimos versos, está implicada
Prosperamente os ventos assoprando, uma determinada concepção da função da
arte. Identifique essa concepção, explican-
Quando uma noite, estando descuidados
do-a brevemente.
Na cortadora proa vigiando,
Uma nuvem, que os ares escurece,
Sobre nossas cabeças aparece. 3. (Unesp) O racionalismo é uma das caracte-
(Camões, L. V. Os Lusíadas. Abril Cultural, rísticas mais frequentes da literatura clássi-
1979. São Paulo. Fragmento.) ca portuguesa. A logicidade do pensamento
quinhentista repercutiu no rigor formal de
Assinale a alternativa que apresenta, respec-
seus escritores, e no culto à expressão das
tivamente, a classificação dos textos.
a) Épico e lírico. “verdades eternas”, sem que isto implicasse
b) Lírico e épico. tolhimento da liberdade imaginativa e poé-
c) Lírico e dramático. tica. Com base nestas observações, releia os
d) Dramático e épico. dois textos apresentados e:
196
a) aponte um procedimento literário de Camões A ONDA
que comprove o rigor formal do classicismo; a onda anda
b) indique o dado da passagem bíblica que, por aonde anda
ter sido omitido por Camões, revela a prática a onda?
da liberdade poética e confere maior carga a onda ainda
sentimental ao seu modo de focalizar o mes- ainda onda
mo episódio. ainda anda
aonde?
4. aonde?
“Amor é fogo que arde sem se ver; a onda a onda
É ferida que dói e não se sente BANDEIRA, Manuel. Estrela da vida inteira. Rio
de Janeiro: José Olympio, 1966. p. 286.
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer;”
Lírica de Camões, seleção, prefácio e Notas de 7. (Unesp) O poema épico de Camões, entre ou-
MASSAUD MOISÉS, São Paulo: Cultrix, 1963.
tros ingredientes da epopeia clássica, apre-
“Terror de te amar num sítio tão frágil como senta o chamado ‘maravilhoso’, que consiste
o mundo. na intervenção de seres sobrenaturais nas
Mal de te amar neste lugar de imperfeição ações narradas. Quando tais seres perten-
Onde tudo nos quebra e emudece cem ao universo da Mitologia Clássica, diz-se
Onde tudo nos mente e nos separa.” ‘maravilhoso pagão’; quando pertencem ao
SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN, “Terror universo do Cristianismo, diz-se ‘maravilho-
de te amar”. In: Antologia Poética. so cristão’. Com base nesta informação:
Dos dois textos transcritos, o primeiro é de a) identifique o tipo de ‘maravilhoso’ presente
Luís Vaz de Camões (século XVI) e o segun- na oitava de Os Lusíadas; e
do, de Sophia de Mello Breyner Andresen b) comprove sua resposta com exemplos da
(século XX). Compare-os, discutindo, através própria estrofe.
de critérios formais e temáticos, aspectos
em que ambos se aproximam e aspectos em 8. (Fuvest) Responda às seguintes questões so-
que ambos se distanciam um do outro. bre “Os Lusíadas”, de Camões:
a) Identifique o narrador do episódio no qual
5. (Fuvest) Os paradoxos do sentimento amoroso está inserida a fala do Velho do Restelo.
constituem um dos temas favoritos de sua po- b) Compare, resumidamente, os principais valo-
esia lírica, exercitada sobretudo nos sonetos. res que esse narrador representa, no conjun-
a) De que poeta se trata? to de “Os Lusíadas”, aos valores defendidos
b) Indique um texto do poeta em que este sen- pelo Velho do Restelo, em sua fala.
timento contraditório se manifesta.
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
6. (Fuvest) Camões escreveu obra épica ou lírica? Cessem do sábio Grego e do Troiano
Justifique sua resposta, exemplificando com As navegações grandes que fizeram;
obras do autor. Cale-se de Alexandre e de Trajano
A fama das vitórias que tiveram;
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO Que eu canto o peito ilustre Lusitano,
A(s) questão(ões) seguintes tomam por base a A quem Neptuno e Marte obedeceram.
oitava estrofe do “Canto VI” de OS LUSÍADAS, Cesse tudo o que a Musa antiga canta,
de Luís de Camões (1524?-1580), e o poema A Que outro valor mais alto se alevanta.
ONDA, de Manuel Bandeira (1886-1968).
9. (Unesp) A oitava anterior constitui a terceira
OS LUSÍADAS, VI, 8
No mais interno fundo das profundas Cavernas estrofe de OS LUSÍADAS, de Luís de Camões,
altas, onde o mar se esconde, poema épico publicado em 1572, obra máxi-
Lá donde as ondas saem furibundas, ma do Classicismo português. O tipo de verso
Quando às iras do vento o mar responde, Netuno que Camões empregou é de origem italiana
mora e moram as jucundas Nereidas e outros e fora introduzido na Literatura Portuguesa
Deuses do mar, onde As águas campo deixam algumas décadas antes, por Sá de Miranda.
às cidades Que habitam estas úmidas Deidades.
In: CAMÕES, Luís de. Os Lusíadas. Lisboa:
Quanto ao conteúdo, o poema OS LUSÍADAS
Imprensa Nacional, 1971. p. 195. toma como ponto de referência um episódio
197
da História de Portugal. Baseado nestes co- “caravela fendida no mar”, e marco co-
mentários e em seus próprios conhecimen- memorativo das navegações portugue-
tos, releia a estrofe citada e indique: sas, erigido à saída do Rio Tejo, em esti-
lo manuelino.
a) o tipo de verso utilizado (pode mencionar
2.
simplesmente o número de sílabas métricas); a) Trata-se do do canto V de “Os Lusíadas”
b) o episódio da História de Portugal que serve em que Camões engrandece as conquistas
de núcleo narrativo ao poema. de Portugal na África e na Índia. O eu lí-
A respeito do epílogo de Os Lusíadas, respon- rico é o Velho do Restelo que, no início,
da às próximas duas questões. logo nos dois primeiros versos, amaldiçoa
quem primeiro içará velas a uma embar-
Não mais, musa, não mais, que a lira tenho
cação, para com ela se atirar aos mares da
Destemperada e a voz enrouquecida,
conquista, do poder e da glória. O que se
E não do canto, mas de ver que venho
vê é uma postura que repudia a expansão
Cantar a gente surda e endurecida.
mercantil portuguesa, opondo-se à “justa
O favor com que mais se acende o engenho lei” e que só traria desgraça a Portugal.
Não nos dá a pátria, não, que está metida b) Os quatro últimos versos da estrofe mos-
No gosto da cobiça e na rudeza tram o desejo condenatório de que aquele
Duma austera, apagada e vil tristeza (...) que se aventurar aos mares jamais viesse
a ter recompensa da glória ou da posteri-
10. dade. Dons estes que nada valem quando
a) Indique os sentidos que os substantivos “favor”
isentos da moral e da virtude. Logo, veri-
e “engenho” possuem no verso 5.
fica-se que, para o Velho, a concepção do
b) Faça um breve teor do texto, comparando-o
valor da arte está atrelada aos princípios
com o teor da proposição.
éticos e à tradição.
3.
Gabarito a) A opção pelos versos decassílabos e a es-
trutura rímica petrarquiana.
b) O poeta Camões omite que Jacó casou-se com
Lia e, depois de uma semana, com Raquel.
E.O. Teste I 4.
Aproximam-se de duas maneiras, uma pela
1. E 2. D 3. E 4. C 5. B temática do amor e outra pela utilização de
anáforas. E distanciam-se pela metrificação
6. A 7. D 8. D 9. D 10. E
(versos decassílabos em Camões e livres em
Andresen) e pela maneira que a temática do
amor é abordada (em Camões o amor é im-
E.O. Teste II pessoal, e em Andresen é pessoal).
1. D 2. D 3. B 4. C 5. C 5.
6. D 7. E 8. C 9. E 10. E a) Luis Vaz de Camões
b) “Amor é fogo que arde sem se ver”
6.
O poeta Luis Vaz de Camões escreveu tan-
E.O. Teste III to obra épica quanto lírica. O poema épico
Os Lusíadas, foi publicado em 1572 e narra
1. D 2. E 3. D 4. B
a viagem de Vasco da Gama às Índias, bem
como a História de Portugal e de seus reis. Os
poemas líricos - sonetos, elegias, cantigas,
E.O. Dissertativo redondilhas e estão contemplados em sua
1. fase lírica e estão compilados na obra Rimas,
a) A obra de Luis Vaz de Camões situa-se no de 1595 (publicação póstuma).
período renascentista português (Classi- 7.
cismo) do século XVI (1527-1580). a) Em função da presença de figuras mitoló-
b) O verso “santo templo / Que nas praias gicas, trata-se do “maravilhoso pagão”.
do mar está assentado” é uma outra re- b) “Netuno mora e moram as jucundas Ne-
ferência perifrástica à Torre de Belém, reidas e outros Deuses do mar, onde”.
198
8. portuguesas, pois achava que aquilo tudo
a) O narrador do episódio em questão é Vas- era apenas desejo de poder. O Velho pode
co da Gama, o herói do poema, que, em ser entendido como manifestação do ide-
dada altura da fábula, assume a função al da Dinastia de Borgonha presa à ordem
de personagem-narrador. feudal, logo ainda teocêntrica e vincula-
b) O herói Vasco da Gama representa o herói da à economia agrária.
épico da aventura lusitana e especialmen- 9.
te a lógica de expansão marítima e co- a) Decassílabo.
mercial do Império Lusitano, que implica b) A viagem de Vasco da Gama às Índias.
a dilatação da fé cristã e do comércio oci- 10.
dental. Vasco da Gama representa o proje- a) O substantivo “favor” significa: condição
to político da Dinastia de Avis, que aplica favorável propícia, “inspiração”. Já “en-
genho” é capacidade de criar, realizar,
os valores racionalistas e as conquistas da
produzir com arte, com talento.
ciência no desenvolvimento do comércio.
b) O epílogo faz a crítica a uma “gente surda
O Velho do Restelo, que é uma perso- e endurecida” de hoje, ao da proposição,
nagem alegórica, representa os valo- que exalta o “ilustre feito humano” de
res medievais contrários às navegações ontem.

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Aulas 9 e 10

Quinhentismo e Barroco
Observe, na tabela abaixo, os períodos literários do Brasil-colônia.

Quinhentismo (1500-1601) Barroco (1601-1768) Neoclassicismo (1768-1836)

O primeiro documento escrito foi a Carta de


Publicação do poema épico Prosopopeia, de Publicação de Obras Poéticas, de Cláudio
Pero Vaz de Caminha, destinada a Dom Ma-
Bento Teixeira. Manuel da Costa.
nuel, rei de Portugal.

Florescimento da chamada literatura de


Poesias lírica, religiosa e satírica, de Atuação do Grupo Mineiro em Vila Rica,
informação, cujo objetivo era descrever
Gregório de Matos, em Salvador, Bahia. Minas Gerais.
para a Corte portuguesa a terra descoberta.

Desenvolvimento da literatura de ca- Oratória doutrinária do padre Antônio


Poesia árcade de Cláudio Manuel da Cos-
tequese, com a finalidade de doutrinar Vieira, em Salvador, Maranhão, e outras áre-
ta (sonetos).
os indígenas. as do Nordeste brasileiro.

Tomás Antônio Gonzaga escreve Marília de


Textos de teatro com teor catequético. Sermões, do padre Antônio Vieira
Dirceu.

Poesia épica indianista: O Uraguai, de


Produção de poesia religiosa. Conceptismo e cultismo. Basílio da Gama, e Caramuru, de Santa
Rita Durão.

José de Anchieta é o principal expoente da


Contexto de reformas religiosas. A natureza é a base temática.
literatura catequética.

Quinhentismo ou Literatura colonial


A literatura brasileira
floresceu em duas fases
O período é didaticamente chamado de Quinhentis-
mo brasileiro e os documentos produzidos durante
esse tempo não podem ser considerados literatura ar-
tística, mas manifestações literárias, uma vez que
não são criações de caráter artístico, e sim produtos de
observações ora objetivas, ora subjetivas.
Esse primeiro período da história da nossa lite-
ratura, chamado Quinhentismo, começou em 1500, ano
em que Pero Vaz de Caminha, escrivão da frota de
Pedro Álvarez Cabral, enviou a Dom Manuel I a famosa
Carta. Ela comunica ao soberano o “achamento” (esse
era o termo usado na época) das terras brasileiras. No
século XVI, os textos produzidos no Brasil ligam-se a
Descobrimento, de Cândido Portinari (1956).
duas necessidades práticas principais da empresa colo-
nizadora portuguesa: fornecer informação sobre a nova
terra e converter os indígenas ao cristianismo. Nessa literatura de valor principalmente documental, encontram-se
elementos importantes para a compreensão das origens históricas e literárias do Brasil.
A primeira fase corresponde ao período do Brasil colonial, durante os séculos XVII e XVIII. Naquela época,
uma da primeiras vozes da literatura brasileira foi a do poeta Gregório de Matos e Guerra, instalado em Salva-
dor, no século XVII. Durante o século XVIII, Minas Gerais acompanhou a produção de poetas sediados em Vila Rica
(atual Ouro Preto), Mariana, São João Del Rei, cidades vinculadas ao ciclo do ouro e pedras preciosas.
A segunda fase da literatura brasileira nasceu na época do Brasil independente, a partir de 1822.
201
Não se pode falar em uma literatura “do Brasil”, como característica do país naquele período, mas em
literatura “no Brasil”, uma literatura ligada ao Brasil, que denota as ambições e as intenções do homem europeu.
Divide-se em literatura informativa e literatura jesuítica. O Quinhentismo serviu de inspiração literária para
alguns poetas e escritores do Romantismo – Gonçalves Dias, José de Alencar – e do Modernismo – Oswald de
Andrade, Murilo Mendes.

Literatura de informação
A expansão ultramarina europeia levou inúmeros viajantes às terras recém-descobertas ou exploradas da Ásia, Áfri-
ca e América, com a missão de produzir relatórios informativos sobre essas terras e aspectos exóticos e pitorescos
de seus habitantes. Estes relatórios, denominados “crônicas de viagem”, têm caráter mais histórico do que literário,
e a linguagem é predominantemente referencial ou denotativa.
A Carta, de Pero Vaz de Caminha, considerada o primeiro documento da literatura no Brasil, inaugurou a
chamada literatura informativa: manifestações literárias de considerável valor histórico e profundo caráter docu-
mental sobre o Brasil, escritas por cronistas e viajantes estrangeiros. Descrevem e informam sobre a nova colônia
portuguesa, salientando a conquista material e a exaltação da terra nova. Estes relatos visavam a satisfazer a
curiosidade e a imaginação dos europeus.
Na literatura informativa encontram-se do-
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cumentos, cartas e relatórios de navegantes, admi-


nistradores, missionários e autoridades eclesiásticas.
Descrevem e exaltam a flora, a fauna e os índios do
Brasil, bem como o exotismo e a exuberância de um
mundo tropical. Também predomina o registro referen-
cial da linguagem que reflete tal louvor à terra com o
emprego exagerado de adjetivos no superlativo, bem
como modelos clássicos e renascentistas que tendem
à erudição.
Os textos informativos formam um painel da
vida dos anos iniciais do Brasil-colônia, dando notícias
dos primeiros contatos entre os europeus e a realidade
da nova terra. A opulência da flora e da fauna impres-
sionou vivamente o colonizador, enquanto o modo de
vida dos indígenas foi motivo de muita curiosidade e de
incompreensão – os colonizadores nunca abandonaram
sua concepção de que eram donos de uma cultura supe-
rior no interior do próprio sistema colonial. Estes textos
cumpriam, acima de tudo, uma finalidade prática.
Índio tapuia. Eckhout, A. (1610-1666)
§ Carta, de Pero Vaz da Caminha, escrita em 1500;
§ Diário de navegação, de Pero Lopes de Souza, escrito entre 1530 e 1532, durante a expedição de Martim
Afonso de Sousa;
§ História da Província de Santa Cruz e Tratado da Terra do Brasil, de Pero de Magalhães Gandavo, ou Gân-
davo, publicados, respectivamente, em 1576 e 1826;
§ Tratado descritivo do Brasil em 1587 ou Notícias do Brasil, de Gabriel Soares de Sousa, publicado em 1851.
202
§ Diálogos das grandezas do Brasil (1618), atribuídos a Ambrósio Fernandes Brandão, e a História do Brasil
(1627), de Frei Vicente do Salvador, publicados no século XVII.

Para a história da literatura brasileira, a literatura informativa adquire importância principalmente como
fonte de temas e formas para momentos literários posteriores: o Romantismo e o Modernismo.

Pero Vaz de Caminha

Escrivão da frota de Pedro Álvares Cabral, Caminha escreveu a Dom Manuel, rei de Portugal, no dia 1o de maio de
1500, a Carta – de inestimável valor histórico e de razoável valor literário –, em que comunica o descobrimento
do Brasil.

Lendo a Carta

A Carta enviada ao rei Dom Manuel é uma espécie de “certidão de nascimento” do Brasil, pois foi o primeiro do-
cumento escrito nestas terras. É o texto que marca o princípio da literatura brasileira.
A Carta de Caminha, embora escrita nos primórdios da colonização (1500), só veio a ser impressa em 1817,
na Corografia Brasílica, pela imprensa Régia do Rio de Janeiro.

Primeiro trecho
Senhor, posto que o Capitão-mor desta vossa frota, e assim os outros Capitães escrevam a Vossa Alteza a
notícia do achamento desta vossa terra nova, que nesta navegação agora se achou, não deixarei de também dar
disso minha conta a Vossa Alteza, assim como eu melhor puder, ainda que – para o bem contar e falar – o saiba
pior que todos faze! [...] Tome Vossa Alteza, porém, minha ignorância por boa vontade, e creia bem por certo que,
para aformosear nem afear, não porei aqui mais do que aquilo que vi e me pareceu.
[...]
Então seguimos nosso caminho por este mar de longo até terça-feira de Oitavas de Páscoa, que foram 21
dias de abril, quando topamos alguns sinais de terra [...] a saber: Em primeiro lugar um monte grande, muito alto
e redondo e outras serras mais baixas ao sul dele; e terra rasa, com grandes arvoredos. Ao mesmo monte alto
pôs o Capitão o nome de Monte Pascoal; e à terra – Terra de Vera Cruz. © Tonyjeff/Wikimedia Commons

Segundo trecho
Dali avistamos homens que andavam pela praia,
obra de sete ou oito, segundo disseram os navios pe-
quenos, por chegarem primeiro. Então lançamos fora
os batéis e esquifes, e vieram logo todos os capitães
das naus a esta nau do Capitão-mor, onde falaram
entre si. E o Capitão-mor mandou em terra no batel
a Nicolau Coelho para ver aquele rio. E tanto que ele
começou de ir para lá, acudiram pela praia homens,
quando aos dois, quando aos três, de maneira que, ao
chegar o batel à boca do rio, já ali havia dezoito ou vin-
te homens. Eram pardos, todos nus, sem coisa alguma

203

Carta original de Pero Vaz de Caminha.


que lhes cobrisse suas vergonhas. Nas mãos traziam arcos com suas setas. Vinham todos rijos sobre o batel; e
Nicolau Coelho lhes fez sinal que pousassem os arcos. E eles os pousaram.
Ali não pôde deles haver fala, nem entendimento de proveito, por o mar quebrar na costa. Somente deu-lhes
um barrete vermelho e uma carapuça de linho que levava na cabeça e um sombreiro preto. Um deles deu-lhe um
sombreiro de penas de ave, compridas, com uma copazinha de penas vermelhas e pardas como de papagaio; e
outro deu-lhe um ramal grande de continhas brancas, miúdas, que querem parecer de aljaveira, as quais peças
creio que o Capitão manda a Vossa Alteza, e com isto se volveu às naus por ser tarde e não poder haver deles
mais fala, por causa do mar. [...]

Terceiro trecho
A feição deles é serem pardos, maneira de avermelhados, de bons rostos e bons narizes, bem feitos. Andam
nus, sem nenhuma cobertura. Nem estimam de cobrir ou de mostrar suas vergonhas; e nisso têm tanta inocên-
cia como em mostrar o rosto. Ambos traziam os beiços de baixo furados e metidos neles seus ossos brancos e
verdadeiros, de comprimento duma mão travessa, da grossura dum fuso de algodão, agudos na ponta como um
furador. Metemnos pela parte de dentro do beiço; e a parte que lhes fica entre o beiço e os dentes é feita como
roque de xadrez, ali encaixado de tal sorte que não os molesta, nem os estorva no falar, no comer ou no beber.
Os cabelos seus são corredios. E andavam tosquiados, de tosquia alta, mais que de sobrepente, de boa gran-
dura e rapados até por cima das orelhas. E um deles trazia por baixo da solapa, de fonte a fonte para detrás, uma
espécie de cabeleira de penas de ave amarelas, que seria do comprimento de um coto, mui basta e mui cerrada,
que lhe cobria o toutiço e as orelhas. E andava pegada aos cabelos, pena e pena, com uma confeição branda
como cera (mas não o era), de maneira que a cabeleira ficava mui redonda e mui basta, e mui igual, e não fazia
míngua mais lavagem para a levantar.
O Capitão, quando eles vieram, estava sentado em uma cadeira, bem vestido, com um colar de ouro mui
grande ao pescoço, e aos pés uma alcatifa por estrado. Sancho de Tovar, Simão de Miranda, Nicolau Coelho, Aires
Correia, e nós outros que aqui na nau com ele vamos, sentados no chão, pela alcatifa. Acenderam-se tochas. En-
traram. Mas não fizeram sinal de cortesia, nem de falar ao Capitão nem a ninguém. Porém um deles pôs olho no
colar do Capitão, e começou de acenar com a mão para a terra e depois para o colar, como que nos dizendo que
ali havia ouro. Também olhou para um castiçal de prata e assim mesmo acenava para a terra e novamente para
o castiçal como se lá também houvesse prata.
CAMINHA, Pero Vaz de. Carta ao rei D. Manuel.
In: VOGT, Carlos; LEMOS, J.A. Guimarães de. Ironistas e viajantes.
São Paulo: Abril Educação, s.d. Coleção Literatura Comentada.

Pero de Magalhães Gândavo

Autor de O Tratado da Terra do Brasil e da História da Província de Santa Cruz, compostas em louvor ao clima, à
terra e à paisagem, e que estimulam a imigração do leitor.
“Uma planta se dá também nesta Província, que da ilha de São Tomé, com a fruita da qual se ajudam muitas
pessoas a sustentar a terra. Esta planta é mui tenra e não muito alta, não tem ramos senão umas folhas que serão
seis ou sete palmos de comprido. A fruita dela se chama banana. Parecem-se na feição com pepinos, criam-se em
cachos. Esta fruita é mui saborosa, e das boas, que há na terra: tem uma pele como de figo (ainda que mais dura)
a qual lhe lançam fora quando a querem comer: mas faz dano à saúde e causa febre a quem se desmanda nela.”
GÂNDAVO, Pero de Magalhães. História da Província de Santa Cruz.

204
Leia também este trecho da História da Província Santa Cruz, e observe que Gândavo faz aqui um invertida
noção sobre a língua dos indígenas, além de fazer uma descrição minuciosa sobre o tipo físico do silvícola.

Estes índios são de cor baça, e cabelo corredio;


têm o rosto amassado, e algumas feições dele à manei-
ra de chinês. Pela maior parte são bem dispostos, rijos
e de boa estatura; gente mui esforçada, e que estima
pouco morrer, temerária na guerra, e de muito pouca
consideração: são desagradecidos em grande maneira,
e mui desumanos e cruéis, inclinados a pelejar, e vinga-
tivos por extremo.
Vivem todos mui descansados sem terem outros
pensamentos senão comer, beber, e matar gente, e por
isso engordam muito, mas com qualquer desgosto pelo
conseguinte tornam a emagrecer, e muitas vezes pode
deles tanto a imaginação que se algum deseja a morte,
ou alguém lhe mete em cabeça que há de morrer tal dia
ou tal noite não passa daquele termo que não morra.
São mui inconstantes e mudáveis: creem de ligei-
ro tudo aquilo que lhes persuadem por dificultoso e im-
possível que seja, e com qualquer dissuasão facilmente
o tornam logo a negar. São mui desonestos e dados à
sensualidade, e assim se entregam aos vícios como se
Ilustração que retrata Pero Magalhães de
neles não houvera razão de homens: ainda que todavia Gândavo descrevendo animais novos.
em seu ajuntamento os machos e fêmeas têm o devido
resguardo, e nisto mostram ter alguma vergonha.
A língua de que usam, toda pela costa, é uma: ainda que em certos vocábulos difere n’algumas partes; mas
não de maneira que se deixem uns aos outros de entender: e isto até a altura de vinte e sete graus, que daí por
diante há outra gentilidade, de que nós não temos tanta notícia, que falam já outra língua diferente. Esta de que
trato, que é geral pela costa, é mui branda, e a qualquer nação fácil de tomar. Alguns vocábulos há nela de que
não usam senão as fêmeas, e outros que não servem senão para os machos: carece de três letras, convém a saber,
não se acha nela F, nem L, nem R, coisa digna de espanto porque assim não tem Fé, nem Lei, nem Rei e desta
maneira vivem desordenadamente sem terem além disto conta nem peso, nem medida.
GÂNDAVO, Pero de Magalhães. In: VOGT, Carlos; LEMOS. J.A. Guimarães de, Op. Cit.

Primeira missa no Brasil.


Literatura de formação Victor Meirelles (1861).
© Victor Meirelles/Wikimedia Commons

ou jesuítica
Ao lado da prosa informativa, ocorreram ma-
nifestações em poesia e teatro escritas por
jesuítas, com a finalidade de catequizar os
índios. A essa produção chamamos de litera-
tura de formação, em decorrência do aspecto
didático que apresenta.
205
Padre José de Anchieta (1534-1597)

Nessa categoria, merece destaque o pa-

© Benedito Calixto/Wikimedia Commons


dre jesuíta que veio ao Brasil para desen-
volver o trabalho missionário de conver-
ter os índios ao Cristianismo. Em 1554,
fundou a cidade de São Paulo. Escreveu
poemas, crônicas, sermões e textos tea-
trais, ora didáticos, ora lírico-religiosos.
Anchieta dominava bem latim, es-
panhol, português e tupi. Sua linguagem
era simples e direta. Escreveu a primeira
gramática tupi-guarani: Arte de gramática
da língua mais usada na costa brasileira.
Dentre suas obras, sobressaem os
autos Quando no Espírito Santo, se rece- Padre José de Anchieta
beu uma relíquia das onze mil Virgens;
Na Vila de Vitória; Auto de São Lourenço; e o poema De Beata Virgine Dei Madre Maria (À beata Virgem Maria
Mãe de Deus).
Veio ao Brasil com a segunda leva de jesuítas na esquadra de Duarte da Costa, segundo Governador-geral
do Brasil. Em 1554, participou da fundação do colégio, onde também foi professor, na Vila de São Paulo de Pirati-
ninga, núcleo da futura cidade que receberia o nome de São Paulo. Exerceu o cargo de provincial dos jesuítas, entre
os anos de 1577 e 1587. Escreveu cartas, sermões, poesias, a gramática da língua mais falada na costa brasileira
(o tupi) e peças de teatro, tornando-se representante do Teatro Jesuítico no Brasil.
Sua obra é considerada a primeira manifestação literária em terras brasileiras. A coleção das obras completas do padre
José de Anchieta é dividida em três gêneros: poesia, prosa e obras sobre Anchieta, que somam um total de dezessete volumes.
Leia abaixo A Santa Inês, um dos poemas mais conhecidos de José de Anchieta.

Cordeirinha linda, Nossa culpa escura Vinde mui depressa


como folga o povo fugirá depressa, ajudar o povo,
porque vossa vinda pois vossa cabeça pois com vossa vinda
lhe dá lume novo! vem com luz tão pura. lhe dais lume novo.

Cordeirinha santa, Vossa formosura Vós sois, cordeirinha,


de Iesu querida, honra é do povo, de Iesu formoso,
Vossa santa vinda porque vossa vinda mas o vosso esposo
o diabo espanta lhe dá lume novo. já vos fez rainha,

Por isso vos canta, Virginal cabeça Também padeirinha


com prazer, o povo, pola fé cortada sois de nosso povo,
porque vossa vinda com vossa chegada, pois, com vossa vinda,
lhe dá lume novo. já ninguém pereça. lhe dais lume novo.
PORTELA, Eduardo (Org.). José de Anchieta: poesia. Rio de Janeiro: Agir, 1959.

O poema manifesta o confronto entre o bem e o mal com bastante simplicidade. A chegada de Santa
Inês espanta o diabo e, graças a ela, o povo revigora sua fé. Os versos de cinco sílabas (redondilha menor) dão
ritmo ligeiro ao texto, retomando a métrica das cantigas medievais. A linguagem é clara, as ideias são facilmente
compreensíveis e o ritmo traz musicalidade ao poema, o que contribui para envolver o leitor/ouvinte, bem como
sensibilizá-lo para a mensagem religiosa.
206
Bosques
“Todo o Brasil é um jardim em frescura e bosque
Disponível em <http://warburg.chaa-unicamp.com.br>.

e não se vê em todo o ano árvores nem erva seca. Os


arvoredos se vão às nuvens de admirável altura e gros-
sura e variedade de espécies. Muitos dão bons frutos e
o que lhes dá graça é que há neles muitos passarinhos
de grande formosura e variedade e em seu canto não
dão vantagem aos rouxinóis, pintassilgos, colorinos, e
canários de Portugal e fazem uma harmonia quando
um homem vai por este caminho, que é para louvar
ao Senhor, e os bosques são tão frescos que os lindos
e artificiais de Portugal ficam muito abaixo. Há mui-
tas árvores de cedro, áquila, sândalos e outros paus de
bom olor e várias cores e tantas diferenças de folhas e
flores que para a vista é grande recreação e pela muita
variedade não se cansa de ver”
José de Anchieta. Cartas, informações, fragmentos históricos e
sermões. Informação da Província do Brasil para nosso padre –
1585. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1933, p. 430-431.
Padre Anchieta, óleo sobre tela, 54 × 46 cm. Cândido Portinari (1954).

O texto revela uma visão exuberante da natureza do Brasil, semelhante à manifestada na Carta, de Pero Vaz
de Caminha. Os aspectos enfatizados contemplam a flora e a fauna, a grandeza e a variedade do arvoredo e o
encantamento pelos pássaros. A riqueza e a vitalidade do Brasil contrastam com as paisagens de Portugal. Entre
as riquezas do Brasil arroladas no texto, apenas o sândalo, originário da Índia, provavelmente não existia aqui. O
deslumbramento pela natureza do Novo Mundo marcou época tanto no período Brasil-colônia até o período pós-
-Independência.

Padre Manuel de Nóbrega

A pedido de Dom João III, integrou a escala de Tomé de Sousa, primeiro Governador-geral do Brasil, o padre Ma-
nuel da Nóbrega, que chefiou o primeiro grupo de jesuítas vindos para o Brasil, em 1549.
Ferrenho defensor da liberdade dos índios, favoreceu os aldeamentos, cultivou a música como auxiliar da
evangelização, promoveu o ensino primário nas escolas de ler e escrever e fundou, pessoalmente, os colégios de
Salvador, Pernambuco e São Paulo, origem da futura cidade, e do Rio de Janeiro, onde exerceu o cargo de reitor.
Depois de colaborar com a expulsão dos estrangeiros da baía de Guanabara, contribuiu para a valorização do poder
central e para a unificação política do território nacional.
Seus pensamentos estão expressos nas Cartas, nos Apontamentos e, sobretudo, no Diálogo sobre a conver-
são do Gentio, de sua autoria.

207
Barroco ou Seiscentismo

© Michelangelo Merisi da Caravaggio/Wikimedia Commons


Contexto
Os embates religiosos

O movimento denominado Barroco


ou Seiscentismo aconteceu no se-
gundo período clássico e designou ge-
nericamente todas as manifestações
artísticas produzidas no século XVII
até meados do século XVIII. O estilo
barroco sucede o movimento religioso
conhecido como Reforma Protes-
tante, liderado pelo teólogo alemão A dúvida de São Tomé. Caravaggio.

Martinho Lutero (1483-1546).


A proposta de reformar ensinos teológicos e A Reforma Protestante foi um movimento
comportamentos morais da Igreja, baseados exclusiva- reformista cristão, iniciado em 1517 por Martinho
mente no ensino bíblico, provocou a reação da Igreja Lutero. Ele apresentou 95 teses, mediante as quais
católica, àquelas alturas já sem muito espaço e poder. A protestava contra a Igreja católica. À luz delas, pro-
Reforma dividiu os cristãos. Na tentativa de evitar a per- pôs uma reforma baseada em cinco princípios:
1. somente a fé;
da de fiéis, a Igreja fortaleceu o Tribunal da Inquisição,
2. somente a Escritura;
que passou a investigar crimes contra a fé católica e deu
3. somente Cristo;
início à Contrarreforma, com a fundação da Compa- 4. somente a graça; e
nhia de Jesus pelo espanhol Inácio de Loyola. 5. somente a glória de Deus.
Nas artes, em reação ao primeiro período clás- Lutero denunciou os abusos e equívocos do
sico que revolucionou o teocentrismo medieval, à luz catolicismo da época, entre eles atos de corrupção,
como venda de indulgências a troco do perdão dos
e sob inspiração dos valores terrenos e humanistas da
pecados e da salvação eterna. O protestantismo nas-
Antiguidade greco-romana, triunfou o Barroco, que se
ceu em decorrência da resistência à Igreja católica.
opôs ao Humanismo Renascentista em busca do elo
perdido da tradição cristã.

O contexto português: a união da península Ibérica

Em 1580, Portugal foi anexado à Espanha, em ra-


zão do desaparecimento do rei português dom Se-
Sucessivamente, três reis espanhóis adotaram
bastião – que não deixou descendentes diretos –, o nome Felipe (I, II e III). Foi em dezembro de 1640,
na batalha de Alcácer-Quibir, na África, em 1578. que Portugal retomou sua independência, quando
O rei espanhol Felipe II, um dos parentes mais pró- o duque de Bragança foi coroado rei, com o nome
ximos de dom Sebastião, foi proclamado monar- de dom João IV, e cujo reinado durou até 1656.

ca dos lusitanos e deu início à dinastia Filipina


em Portugal, que se estendeu até 1640.
208
Na Europa seiscentista, Portugal e Espanha configuraram o modelo de absolutismo católico, que patrocinou
a Contrarreforma, recrudesceu a perseguição aos infiéis pela Inquisição e exigiu obediência ao Index Librorum
Prohibitorum, uma relação de livros proibidos publicada pela Igreja católica.
Sob dominação filipina, o Barroco português foi significativamente influenciado pelo espanhol, principal
foco irradiador dessa estética que expressa a espiritualidade e o teocentrismo medievais misturados ao racionalis-
mo e ao antropocentrismo herdados do Renascimento.

A arte barroca
© Michelangelo Merisi da Caravaggio/Wikimedia Commons

O barroco português ocorre em uma Eu-


ropa impactada pelas grandes navega-
ções dos anos 1500, pelas conquistas,
pela explosão da Reforma Protestante
e pelo poder monárquico absolutista.
Ele traduz o drama do homem “entre
o céu e a Terra”, atormentado pela fé,
pela existência após a morte, pelo jul-
gamento de atos praticados durante o
“trânsito terreno”.
No final dos anos quinhentos
e início dos anos seiscentos, convivem
dois modos de ver o mundo: o paga-
A ceia em Emaús. Caravaggio. nismo renascentista em decadência e
a religiosidade barroca emergente. A expressão plástica barroca caracteriza-se pela exacerbação dos tons mais
altos e mais coloridos e das texturas mais ricas: mais decoração, mais luz e sombra em busca deliberada de efeitos.

Cultismo e conceptismo

Duas tendências de estilo, no entanto, manifestam-se no Bar- O todo sem a parte não é todo,
roco: o cultismo e o conceptismo. Aquele, mais próprio A parte sem o todo não é parte,
da poesia e este, da prosa, sem, no entanto, excluírem-se no Mas se a parte o faz todo, sendo parte,
conjunto da criação literária . Uma mesma obra tanto pode Não se diga, que é parte, sendo todo.
pender para uma delas quanto apresentar traços de ambas as
tendências. Em todo sacramento esta deus todo,
E todo assiste inteiro em qualquer parte,
§ Cultismo – preferência pelo rebuscamento formal da lin-
E feito em partes todo em toda a parte,
guagem em jogos de palavras, figuras de linguagem, verná-
Em qualquer parte sempre fica o todo.
culo preciosista, efeitos sensoriais – cor, som, forma, volume,
sonoridade, imagens eloquentes e fantasiosas. Conhecer é O braço de Jesus não seja parte,
descrever mediante sensações nada econômicas. Metáfo- Pois que feito Jesus em parte todo,
ras, antíteses, sinestesias, trocadilhos, dicotomias e hipérba- Assiste cada parte em sua parte.
tos povoam os textos barrocos. A realidade é retratada de
forma indireta, centrada na habilidade verbal do escritor. Não se sabendo parte deste todo,
A tendência do Barroco cultista também recebeu o Um braço, que lhe acharam, sendo parte,
nome de gongorismo, cujo escritor mais eloquente Nos disse as partes todas deste todo.
foi o poeta espanhol Luis de Gôngora.
209
§ Conceptismo (do espanhol concepto, ideia) – linguagem pautada no raciocínio e no pensamento lógico,
em analogias, histórias ilustrativas etc. Argumentos centrados na inteligência e na razão em busca da con-
cisão e da coesão, sempre disciplinados pela lógica e seus mecanismos oferecidos pelos silogismos e sofis-
mas. Tal tendência também recebeu o nome de quevedismo, graças ao estilo marcante do poeta espanhol
Francisco Gómez de Quevedo.

[...]
“Pinta-se o amor sempre menino, porque ainda que passe dos setes anos [..] nunca chega à idade de uso
da razão. Usar de razão e amar são duas coisas que não se juntam. A alma de um menino que vem a ser? Uma
vontade com afetos e um entendimento sem uso. Tal é o amor vulgar. Tudo conquista o amor, quando conquista
uma alma; porém o primeiro rendido é o entendimento. Ninguém teve a vontade, febricitante, que não tivesse o
entendimento frenético. O amor deixara de variar, se for firme, mas não deixara de tresvariar, se é amor. Nunca
o fogo abrasou a vontade, que o fumo não cegasse o entendimento. Nunca houve enfermidade no coração, que
não houvesse fraqueza no juízo.”
(Padre Antonio Vieira. Sermão do Mandato)

Características do Barroco literário


O Barroco se traduz como uma arte tensa que oscila entre opostos, marcada pela crise de valores, contradições en-
tre o espírito cristão, antiterreno e teocêntrico e o espírito renascentista, antropocêntrico, racionalista e mundano.

Conflitos e descontentamentos existenciais

A indefinição entre o divino e o terreno traduz-se em conflito e descontentamento existencial humano. São comuns
os temas pessimistas, as advertências sobre a brevidade da vida, a ênfase na dor e na vergonha de permanecer em
pecado. A relação com a vida terrena é pessimista, só minorada com a crença na vida celeste. O tema da penitência
é constantemente enfatizado pelo martírio da dor.

Ideias em confronto

No Barroco predomina o gosto pela apro-


© Divulgação

ximação de realidades em oposição; a sub-


missão e a vida recatada propostas pela
Igreja contrarreformista em contraposição
aos desejos humanos e materiais; à pos-
sibilidade de ascensão social propiciada
pelo momento histórico, contrapõe-se a
impossibilidade da estrutura social fecha-
da. Temas constantemente contraditórios,
oscilantes entre matéria e amor, carne e
Cristo bailarino. Madeira com vestígios de policromia. Aleijadinho (1781-1790). espírito, amor ideal e amor humano.
210
Tendência ao dualismo e mínio político da Espanha. Dois aspectos ressaltam a
ao culto do contraste produção literária desse período: o esforço dos portu-
gueses de preservar sua cultura e língua e a Contrar-

Disponível em <http://interata.squarespace.com>
reforma, que deu à produção literária amplo caráter
religioso, por exemplo as obras do padre Antônio Vieira,
principal escritor português do século XVII.
Em 1580, dois fatos significativos marcaram a
vida cultural e política de Portugal: a morte de Camões e
a passagem do país ao domínio espanhol (1580-1640).
A literatura e as artes portuguesas foram in-
Detalhe preciosista de igreja barroca. fluenciadas pelas manifestações culturais espanholas,
que conheceram nesse período o “século de ouro” –
No intuito de aproximar opostos, a visão do universo Cervantes, Gôngora, Quevedo, Lope de Vega e Calderón
dualista é, ao mesmo tempo, mística e sensual, religiosa de La Barca são importantes escritores desse período. O
e erótica, espiritual e humana. O homem vive em con-
florescimento do Barroco em Portugal não se deu com
flito com o mundo. Para traduzi-lo, abundam antíteses,
a mesma intensidade que na Espanha. Como forma de
metáforas, sinestesias e hipérboles.
resistência política ao domínio espanhol, os escritores
O estilo barroco europeu do século XVII recebeu
portugueses procuraram preservar a língua e a cultu-
denominações particulares em cada país:
ra lusitanas. Assumiram uma postura saudosista, valo-
rizando personagens e escritores do passado heroico
Nasce o Sol, e não dura mais que um dia,
recente: Vasco da Gama, Dom Sebastião, Camões.
Depois da luz, se segue a noite escura,
Influenciado pela Contrarreforma, o Barroco
Em tristes sombras morre a formosura,
Em contínuas tristezas, a alegria.
português também ganhou fortes matizes religiosos,
Gregório de Matos bem como em todos os países ibéricos. A atuação da
Companhia de Jesus e do Tribunal da Inquisição, ins-
taurado em Portugal em meados do século XVI, com-
§ Espanha – gongorismo, originado do nome do
pletaram o quadro cultural lusitano daquele período
poeta Luis de Gôngora (1561-1627).
religioso e austero.
§ Inglaterra – eufuísmo, derivado do nome da
obra Euphues, or the anatomy of wit, do escritor
John Lyly (1554-1606).
O Barroco no Brasil
§ Itália – marinismo, derivado do nome de
Gianbattista Marino (1569-1625). O marco inicial do Barroco brasileiro data de 1601,
§ França – preciosismo, em razão do exagero quando Bento Teixeira, publicou o poema épico
da forma preciosista, afetada e extremamente Prosopopeia, com estrofes em oitava rima e versos de-
rebuscada na corte do rei Luis XIV. cassílabos, tal qual Os Lusíadas, de Camões, cujo mode-
lo ele seguiu de perto.
§ Alemanha – silesianismo, estilo característico
dos escritores da região da Silésia. Embora naquela época não houvesse um público
leitor significativo no Brasil, a poesia barroca ganhou
impulso com a fundação de várias academias literárias
O Barroco em Portugal entre os anos de 1720 e 1750. Vicejaram por todo o sé-
culo XVII e início do século XVIII, mas foram sufocadas
O Barroco português conviveu com um país que vivia pela fundação da academia chamada Arcádia Ultra-
uma crise de identidade, uma vez que estava sob o do- marina, em 1768, e pela ascensão da poesia árcade.
211
Aleijadinho
Peculiaridades do
© Divulgação

Barroco brasileiro

Embora o Barroco brasileiro esteja li-


gado aos modelos lusitano e espanhol,
peculiaridades diferenciam-no destes.
Durante todo o século XVII, sob o
domínio espanhol, continuavam a che-
gar ao Brasil imigrantes atraídos pela ri-
queza, portugueses e demais europeus
interessados na exploração da terra. Foi
o caso dos franceses que tentaram do-
minar o Maranhão, no começo do sé-
culo XVII.
A presença estrangeira mais marcante, no entanto, foi a dos holandeses. Enviado pela Companhia das
Índias Ocidentais com o fim de controlar o comércio do açúcar nordestino, o general de origem alemã Johann
Maurits, conhecido como conde Maurício de Nassau, desembarcou no Brasil, em Recife, em 1637, quando já se
estabilizara o domínio holandês nas colônias portuguesas, iniciado em 1624.
Nassau trouxe consigo uma equipe cultural com pintores, arquitetos, escritores, naturistas, médicos, astrólo-
gos etc., com o objetivo de documentar as terras ocupadas pela Holanda e angariar investimentos europeus para
a produção açucareira.
Com Nassau, Recife sofreu uma verdadeira reformulação urbana: jardins, lagos, palácio para sua acomoda-
ção na ilha de Antônio Vaz, uma cidade inteira a seu gosto. A cidade Maurícia, ao lado de Recife, entre a foz do rio
Capibaribe e Beberibe, emergiu sob sua administração.
As marcas desse tempo ficaram registradas em pinturas e desenhos de Frans Post, encarregado das paisa-
gens e feitos do Governador-geral, e Albert Eckout, responsável pelo registro dos tipos humanos, da fauna e flora
da “Nova Holanda”, nome de Pernambuco naquela época.
Frans Post tinha apenas 24 anos quando chegou ao Brasil. Morador de Recife entre 1637 e 1644, acompa-
nhou a movimentada campanha do governador, documentando a paisagem e registrando portos e fortificações do
Maranhão à Bahia.

Um Barroco miscigenado

O mundo colonial brasileiro do século XVII não foi influenciado apenas pelo Barroco português, mas, sobretudo,
foi pressionado economicamente, graças à imensa exploração de riquezas naturais, de ouro, principalmente. Em
razão disso, o Barroco brasileiro tornou-se uma manifestação miscigenada das culturas europeia, negra e nativa. Os
espaços do Brasil colonial que lhe serviram de cenário foram principalmente o Nordeste e o estado de Minas Gerais.
Ligado ao ciclo da cana-de-açúcar, o Barroco nordestino aproximou-se da aristocracia rural, exuberante e
pomposa, e refletiu-se na riqueza das construções eclesiásticas e nas amplas acomodações das casas-grandes.
A cidade de Salvador, na Bahia, ainda conta com cerca de 80 igrejas e vários solares e casarões inspirados
no Barroco.
No século XVIII, o Barroco mineiro sobrepujou o da metrópole portuguesa, notadamente nas cidades au-
ríferas de Minas Gerais. Naquela região, sobressaíram as notáveis obras do escultor e arquiteto Antonio Francisco
Lisboa (1730-1814), o Aleijadinho, cujo trabalho pautou-se pela experiência de materiais locais – pedra-sabão e
madeira. O pintor Manuel da Costa Ataíde (1762-1830) deixou mostras de seu talento em pinturas e afrescos nos
tetos e laterais de igrejas mineiras.
212
E.O. Teste I TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
A partida de Belém, como Vossa Alteza sabe,
foi segunda-feira, 9 de março. [...] E domin-
1. “A feição deles é serem pardos, um tanto
go, 22 do dito mês, às dez horas, pouco mais
avermelhados, de bons rostos e bons nari-
ou menos, houvemos vista das ilhas de Cabo
zes, bem feitos. Andam nus, sem cobertura
Verde, ou melhor, da ilha de S. Nicolau [...]. E
alguma. Nem fazem mais caso de encobrir
assim seguimos nosso caminho por este mar
ou deixa de encobrir suas vergonhas do que
de longo, até que, terça-feira das Oitavas de
de mostrar a cara. Acerca disso são de grande
Páscoa, que foram vinte e um dias de abril,
inocência. Ambos traziam o beiço de baixo
estando da 8dita ilha obra de 660 léguas, se-
furado e metido nele um osso verdadeiro,
gundo os pilotos diziam, 1topamos alguns si-
de comprimento de uma mão travessa, e da
nais de terra, os quais eram muita quantida-
grossura de um fuso de algodão, agudo na
de de 5ervas compridas, a que os 4mareantes
ponta como um furador.”
chamam 6botelho [...]. E quarta-feira seguin-
Carta de Pero Vaz de Caminha. Disponível em: <www.
dominiopublico.com.br>. Acesso em: 4 dez. 2012.
te, pela manhã, topamos aves a que chamam
7
fura-buxos. Neste dia, a horas de véspera,
O trecho acima pertence a um dos primei- 2
houvemos vista de terra! 9Primeiramente
ros escritos considerados como pertencentes dum grande monte, mui alto e redondo [...];
à literatura brasileira. Do ponto de vista da ao monte alto o capitão pôs o nome de 3O
evolução histórica, trata-se de literatura: Monte Pascoal, e à terra, A Terra de Vera Cruz.
a) de informação. Carta de Pero Vaz de Caminha ao rei de Portugal
b) de cordel.
c) naturalista.
d) ambientalista. 3. Assinale a alternativa CORRETA acerca do texto.
e) árcade. a) Trata-se de documento histórico que inau-
gura, em Portugal, um novo gênero literário:
2. O movimento literário que retrata as ma- a literatura epistolar.
nifestações literárias produzidas no Brasil b) Exemplifica a literatura produzida pelos je-
à época de seu descobrimento e durante o suítas brasileiros na colônia e que teve como
século XVI, é conhecido como Quinhentismo objetivo principal a catequese do silvícola.
ou Literatura de Informação. c) Apesar de não ter natureza especificamente
Analise as proposições em relação a este período. artística, interessa à história da literatura
I. A produção literária no Brasil, no século brasileira na medida em que espelha a lin-
XVI, era restrita às literaturas de viagens guagem e a respectiva visão de mundo que
e jesuíticas de caráter religioso. nos legaram os primeiros colonizadores.
II. A obra literária jesuítica, relacionada às d) Pertence à chamada crônica histórica, pro-
atividades catequéticas e pedagógicas, duzida no Brasil durante a época colonial,
raramente assume um caráter apenas ar- com objetivos políticos: criar a imagem de
tístico. O nome mais destacado é o do pa- um país soberano, emancipado, em condi-
dre José de Anchieta.
ções de rivalizar com a metrópole. É um dos
III. O nome Quinhentismo está ligado a um
referencial cronológico − as manifesta- exemplos de registros oficiais escritos por
ções literárias no Brasil tiveram início em historiadores brasileiros durante o século
1500, época da colonização portuguesa − XVII, nos quais se observam, como caracte-
e não a um referencial estético. rística literária, traços do estilo barroco.
IV. As produções literárias neste período
prendem-se à literatura portuguesa, in- 4. Assinale com V (verdadeiro) ou F (falso) as
tegrando o conjunto das chamadas lite- afirmações a seguir sobre a Literatura de In-
raturas de viagens ultramarinas, e aos
formação no Brasil.
valores da cultura greco-latina.
V. As produções literárias deste período ( ) A carta de Pero Vaz de Caminha, enviada ao
constituem um painel da vida dos anos rei D. Manuel I, circulou amplamente entre
iniciais do Brasil colônia, retratando os a nobreza e o povo português da época.
primeiros contatos entre os europeus e a ( ) Os textos informativos apresentavam, em
realidade da nova terra. geral, uma estrutura narrativa, pois esta
Assinale a alternativa correta. se adaptava melhor aos objetivos dos au-
a) Somente as afirmativas I, IV e V são verdadeiras. tores de falar sobre coisas que viam.
b) Somente a afirmativa II é verdadeira. ( ) Os textos que informavam sobre o Novo
c) Somente as afirmativas I, II, III e V são ver- Mundo despertavam grande curiosidade
dadeiras. entre o público europeu, estando os de
d) Somente as afirmativas III e IV são verdadeiras. Américo Vespúcio entre os mais divulga-
e) Todas as afirmativas são verdadeiras. dos no início do século XVI.
213
( ) Pero de Magalhães Gandavo é o autor dos uma ‘folha’ que você carregaria dobrada no
textos “Tratado da Terra do Brasil” e “His- bolso. Ela seria capaz de mostrar o jornal do
tória da Província Santa Cruz a que Vulgar- dia – com vídeos, fotos e notícias 8atualiza-
mente chamamos de Brasil”.
das –, o livro que você estivesse lendo ou
A sequência correta de preenchimento dos qualquer informação antes impressa. Tudo
parênteses, de cima para baixo, é:
ali. Desde os anos 70, está no ar a 5ideia de
a) V – F – V – V.
b) V – F – F – F. papel eletrônico, mas as últimas novidades
c) F – V – V – V. são de duas semanas atrás. Cientistas holan-
d) F – F – V – V. deses anunciaram que estão perto de criar
e) V – V – F – F. uma tela com ‘quase todas’ as propriedades
do papel: 3leveza, flexibilidade, 4clareza, etc.
5. Todas as alternativas são corretas sobre o Pa- A novidade que deixa o invento um pouco
dre José de Anchieta, EXCETO:
mais palpável está nos transistores. No papel
a) Foi o mais importante jesuíta em atividade
do futuro, eles não serão de 6silício, mas de
no Brasil do século XVI.
b) Foi o grande orador sacro da língua portu- plástico – que é maleável e barato.
guesa, com seus sermões barrocos. Os holandeses dizem já ter um protótipo que
c) Estudou o tupi-guarani, escrevendo uma car- mostra imagens em movimento em uma tela
tilha sobre a gramática da língua dos nativos. de duas polegadas, ainda que de qualidade
d) Escreveu tanto uma literatura de caráter in- 1
’meia-boca’.
formativo como de caráter pedagógico. 2
Mas não vá celebrando o fim do desmata-
e) Suas peças apresentam sempre o duelo entre
anjos e diabos. mento e do peso na mochila. A expectativa
é que um papel eletrônico mais ou menos
6. Sobre José de Anchieta é incorreto afirmar que: convincente apareça só daqui a cinco anos.
a) cultivou especialmente os autos, buscan- Folha de S. Paulo, 17 dez. 2001. Folhateen, p. 10.
do, na alegoria, tornar mais acessíveis às
mentes indígenas os conceitos e os dogmas
do cristianismo. 8. (IFCE) Em uma das opções, a afirmação refe-
b) no teatro, o “Auto de São Lourenço” des- re-se ao Barroco.
taca-se como obra catequética de influên- a) O homem se mostra feliz consigo mesmo e se
cia medieval. acha o centro do mundo.
c) na poesia lírica encontram-se suas mais belas b) As mensagens dos textos revelam que o ho-
composições, expressivas de uma fé profunda. mem está angustiado e dividido entre o bem
d) apesar de pautada na língua e na cultura do e o mal, a matéria e o espírito.
índio, sua produção literária não se caracteri- c) O estilo era simples e, nos textos, prevalecia
za como literatura já tipicamente brasileira. a objetividade.
e) sua obra teatral, marcadamente alegórica
d) Os textos traziam mensagens de otimismo e
e antirreligiosa, moldou-se nos padrões re-
baseavam-se no princípio de “gozar a vida”.
nascentistas.
e) Os escritores, embora vivessem na cidade,
recomendavam a vida no campo.
7. (IFSP) O culto exagerado da forma, o rebus-
camento, a riqueza de pormenores, o conflito
entre o profano e o sagrado são características: 9. (FGV) Foi um movimento literário do século
a) do Renascimento. XVII, nascido da crise de valores renascen-
b) da Ilustração. tistas. Caracteriza-se na literatura pelo culto
c) do Realismo. dos contrastes, a preocupação com o porme-
d) do Barroco.
nor e a sobrecarga de figuras como a metáfo-
e) do Simbolismo.
ra, as antíteses, hipérboles e alegorias. Essa
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO linguagem conflituosa reflete a consciência
VELHO PAPEL PODE ESTAR COM OS ANOS dos estados contraditórios da condição hu-
CONTADOS mana. Trata-se do:
Já imaginou, daqui a algumas décadas, seu
a) Romantismo.
neto lhe perguntando o que era papel? Pois
é, alguns pesquisadores já estão trabalhando b) Trovadorismo.
para que esse dia chegue logo. c) Humanismo.
A suposta ameaça 7à fibra natural não é o d) Realismo.
desajeitado e-book, mas o papel eletrônico, e) Barroco.
214
1
0. (UFRGS) Assinale com V (verdadeiro) ou F Sempre se há de sentir o que se fala.”
(falso) a afirmações abaixo sobre os dois Está(ão) correta(s):
grandes nomes do barroco brasileiro. a) apenas I.
( ) A obra poética de Gregório de Matos os- b) apenas I e II.
cila entre os valores transcendentais e c) apenas III.
os valores mundanos, exemplificando as d) apenas I e III.
tensões do seu tempo. e) apenas II e III.
( ) Os sermões do Padre Vieira caracteriza-
mse por uma construção de imagens des- TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
dobradas em numerosos exemplos que vi- UMAS E OUTRAS
sam a enfatizar o conteúdo da pregação. Se uma nunca tem sorriso É pra melhor se
( ) Gregório de Matos e o Padre Vieira, em reservar E diz que espera o paraíso
seus poemas e sermões, mostram exacer- E a hora de desabafar
bados sentimentos patrióticos expressos A vida é feita de um rosário
em linguagem barroca. Que custa tanto a se acabar
( ) A produção satírica de Gregório de Matos e o Por isso, às vezes ela para
tom dos sermões do Padre Vieira represen- E senta um pouco pra chorar
tam duas faces da alma barroca no Brasil. Que dia! Nossa!
( ) O poeta e o pregador alertam os contem- Pra que tanta conta
porâneos para o desvio operado pela retó- Já perdi a conta de tanto rezar. Se a outra
rica retumbante e vazia. não tem paraíso
A sequência correta de preenchimento dos Não dá muita importância, não. Pois já for-
parênteses, de cima para baixo, é: jou o seu sorriso
a) V – F – F – F – F. E fez do mesmo profissão
b) V – V – V – V – F. A vida é sempre aquela dança
c) V – V – F – V – F. Onde não se escolhe o par
d) F – F – V – V – V. Por isso, às vezes ela cansa
e) F – F – F – V – V. E senta um pouco pra chorar
Que dia! Puxa!
Que vida danada
E.O. Teste II Tem tanta calçada pra se caminhar. Mas toda
santa madrugada
Quando uma já sonhou com Deus
1. A chamada atividade literária das primeiras E a outra, triste enamorada.
décadas de nossa formação histórica carac- Coitada, já deitou com os seus,
terizou-se por seu cunho pragmático estrito, O acaso faz com que essas duas,
seja a circunscrita ao parâmetro jesuítico, Que a sorte sempre separou,
seja a decorrente de viagens de reconheci- Se cruzem numa mesma rua
mento e informação da terra. Olhando-se com a mesma dor.
São representantes dos dois tipos de ativida- Que dia! Nossa!
de literária referidos no excerto acima: Pra que tanta conta
a) Gregório de Matos e Cláudio Manuel da Costa. Já perdi a conta de tanto rezar...
b) Antônio Vieira e Tomás Antônio Gonzaga. Que dia! Puxa!
c) José de Anchieta e Gabriel Soares de Sousa. Que vida danada
d) Bento Teixeira e Gonçalves de Magalhães. Tem tanta calçada para se caminhar.
e) Basílio da Gama e Gonçalves Dias. Outro dia! Puxa!
Que vida comprida
2. (UFSM) A desarmonia e a contradição são Pra que tanta vida
Pra gente viver...
características predominantes no Barroco.
Que dia...
Observe os fragmentos poéticos de Gregório
BUARQUE DE HOLANDA, Chico. “Umas e
de Matos, a seguir transcritos, e verifique outras”. In: Grandes sucessos de Chico Buarque.
qual(quais) confirma(m) essas características. LP, Premier/RGE, 1962. l.2. faixa 6.
I. “Amanheceu o dia prometido,/famoso,
alegre, claro e prazenteiro;/bom dia, dis-
se eu, para viagem.” 3. (CFTCE) Há, no texto, uma característica tí
II. “O ódio é da alma infame companhia/a pica do estilo de época chamado:
paz deixou-a Deus à cristandade;/mas ar- a) Barroco.
rastar por força uma vontade,/em vez de b) Trovadorismo.
caridade é tirania.” c) Arcadismo.
III. “De que pode servir falar quem cala?/ d) Classicismo.
Nunca se há de falar o que se sente,/ e) Literatura de Informação ou dos Jesuítas.
215
4. (CFTMG) O Barroco, estilo dominante no sé- 8. (Santa Casa) A preocupação com a brevidade
culo XVII, relaciona-se à(ao): da vida induz o poeta barroco a assumir uma
a) ideal do liberalismo e da democracia no atitude que:
Ocidente. a) descrê da misericórdia divina e contesta os
b) evolucionismo, com sua doutrina de seleção valores da religião.
natural. b) desiste de lutar contra o tempo, menospre-
c) Contra-Reforma, na tentativa de retomar a zando a mocidade e a beleza.
tradição cristã. c) se deixa subjugar pelo desânimo e pela apa-
d) reaproximação do autor com a natureza se- tia dos céticos.
rena e bucólica. d) se revolta contra os insondáveis desígnios
de Deus.
5. (CFTMG) São características do Barroco, exceto: e) quer gozar ao máximo seus dias, enquanto a
a) sentimento repleto de contradições. mocidade dura.
b) soberania da razão em detrimento do conflito.
c) linguagem obscura e expressão indireta das
9. Com referência ao Barroco, todas as alterna
ideias.
tivas são corretas, exceto:
d) tempo interligado ao fim da beleza e ao
a) O Barroco estabelece contradições entre es-
tema da morte.
pírito e carne, alma e corpo, morte e vida.
b) O homem centra suas preocupações em seu
6. (UFV) Considere as afirmações que se se-
guem. Todas elas vinculam a poesia de Gre- próprio ser, tendo em mira seu aprimora-
gório de Matos aos princípios estéticos e ide- mento, com base na cultura greco-latina.
ológicos do Barroco brasileiro, EXCETO: c) O Barroco apresenta, como característica
a) A vertente lírica da poética de Gregório de marcante, o espírito de tensão, conflito en-
Matos cultuou o amor feito de pequenos tre tendências opostas: de um lado, o teo-
afetos, da meiga ternura e dos torneios gen- centrismo medieval e, de outro, o antropo-
tis, tendo como cenário o ambiente campes- centrismo renascentista.
tre e pastoril. d) A arte barroca é vinculada à Contrarreforma.
b) O “Boca do Inferno” insurgiu-se não só con- e) O Barroco caracteriza-se pela sintaxe obscu-
tra os desmandos administrativos e políti- ra, uso de hipérbole e de metáforas.
cos da Bahia do século XVII, mas contra o
próprio ser humano, que, na concepção do 1
0. No Brasil, o Barroco foi introduzido por
poeta, é por natureza corrupto e mau. qual poeta:
c) Os poemas religiosos de Gregório de Matos a) Gregório de Matos.
fundiram a contemplação da divindade, o b) Mário de Andrade.
complexo de culpa, o desejo de arrependi- c) Bento Teixeira.
mento e o horror de ser pó, sensações, enfim, d) Camões.
frequentes no atormentado espírito barroco. e) Bocage
d) O significado social do Barroco brasileiro foi
marcante, uma vez que a poesia de Gregório
de Matos revestiu-se de alto sentido crítico
aos vícios e violências da sociedade colonial.
E.O. Teste III
e) A produção literária de Gregório de Matos
1. (Fatec) “...milhões de palavras ditas com es-
dividiu-se entre a temática lírico-religiosa e
uma visão crítica das mazelas sociais oriun- forço de pensamento.”
das do processo de colonização no Brasil. Essa passagem do texto faz referência a um
traço da linguagem barroca presente na obra
7. Escolha a alternativa que completa de forma de Vieira; trata-se do:
correta a frase abaixo: a) gongorismo, caracterizado pelo jogo de ideias.
A linguagem _____, o paradoxo, _____ e o re- b) cultismo, caracterizado pela exploração da
gistro das impressões sensoriais são recursos sonoridade das palavras.
linguísticos presentes na poesia _____. c) cultismo, caracterizado pelo conflito entre
a) simples – a antítese – parnasiana fé e razão.
b) rebuscada – a antítese – barroca d) conceptismo, caracterizado pelo vocabulário
c) objetiva – a metáfora – simbolista preciosista e pela exploração de aliterações.
d) subjetiva – o verso livre – romântica e) conceptismo, caracterizado pela exploração
e) detalhada – o subjetivismo – simbolista das relações lógicas, da argumentação.
216
2. Assinale a alternativa INCORRETA. ( ) O Barroco é o primeiro grande período
a) Na obra de José de Anchieta, encontram-se artístico no Brasil. Nas artes plásticas há
poesias seguindo a tradição medieval e textos destaque para a figura do Aleijadinho; na
para teatro com clara intenção catequista. Literatura, para o poeta Gregório de Ma-
b) A literatura informativa do Quinhentismo tos Guerra.
brasileiro empenha-se em fazer um levan- ( ) O Neoclassicismo, movimento estético
tamento da terra, daí ser predominante- propenso a um retorno aos ideais es-
mente descritiva. pirituais e artísticos do Renascimento,
c) A literatura seiscentista reflete um dualis- corresponde a uma tendência contrária
mo: o ser humano dividido entre a matéria e ao barroquismo.
o espírito, o pecado e o perdão. ( ) No texto barroco, a linguagem é retorci-
d) O Barroco apresenta estados de alma ex- da, com bastantes jogos verbais, enfati-
pressos através de antíteses, paradoxos, in- zando a prolixidade e o estilo confuso.
terrogações. ( ) No texto neoclássico, a linguagem é ra-
e) O Conceptismo caracteriza-se pela linguagem cional, as imagens são conhecidas e repe-
rebuscada, culta, extravagante, enquanto o tidas (chavões, lugares-comuns).
Cultismo é marcado pelo jogo de ideias, se- ( ) No Barroco, tanto quanto no Neoclassicis-
guindo um raciocínio lógico, racionalista. mo, os poetas abordaram aspectos como
dúvida, angústia e tédio, sob a forma de
3. O soneto a seguir é representativo da estética: um sentimentalismo lacrimoso.
Não vira em minha vida a formosura,
Ouvia falar nela cada dia, 5. (UEL) O século XVI deve ser reconhecido, na
E ouvida me incitava, e me movia história da literatura brasileira, como um
A querer ver tão bela arquitetura: período de:
a) manifestações literárias voltadas basicamen-
Ontem a vi por minha desventura te para a informação sobre a colônia e para a
Na cara, no bom ar, na galhardia catequese dos nativos.
De uma mulher, que em anjo se mentia; b) amadurecimento dos sentimentos nacio-
De um sol, que se trajava em criatura: nalistas que logo viriam a se expressar no
Romantismo.
Matem-me, disse eu, vendo abrasar-me,
c) exaltação da cultura indígena, tema cen-
Se esta cousa não é, que encarecer-me
tral dos poemas épicos de Basílio da Gama e
Sabia o mundo, e tanto exagerar-me!
Santa Rita Durão.
Olhos meus, disse então por defender-me, d) esgotamento do estilo e dos temas barrocos,
Se a beleza heis de ver para matar-me, superados pelos ideais estéticos do Arcadismo.
Antes olhos cegueis, do que eu perder-me. e) valorização dos textos cômicos e satíricos,
a) barroca. em que foi mestre Gregório de Matos.
b) simbolista.
c) romântica.
d) parnasiana. E.O. Dissertativo
e) árcade.
1. Leia estes trechos:
4. (UFPE) Observe: TRECHO 1
“Descoberto em 1500, no século que, em Colombo sabe perfeitamente que as ilhas já
Portugal, dominava o Classicismo, o Brasil, têm nome, de uma certa forma, nomes na-
por muitas causas, não teve condições de dar turais (mas em outra acepção do termo) as
início à colonização e ao processo cultural. palavras dos outros, entretanto, não lhe in-
Entre as raras manifestações literárias do sé- teressam muito, e ele quer rebatizar os luga-
culo, destaca-se o teatro jesuítico. res em função do lugar que ocupam em sua
A obra de colonização do Brasil, iniciada descoberta, dar-lhes nomes justos a nomea-
propriamente por Martim Afonso em 1530, ção, além disso, equivale a tomar posse.
já pelos inconvenientes do sistema, já por TODOROV, Tzevetan. A conquista da América.
outros motivos fáceis de entender, mais di- São Paulo: Martins Fontes, 1993. p. 27.
ficultosa se tornaria, não fosse a colaboração
oportuna e decisiva dos jesuítas.” TRECHO 2
(Faraco e Moura, em Língua e Literatura) [...] e a quarta-feira seguinte, pela manhã,
topamos aves a que chamam fura-buchos
A partir de então, surgem dois movimentos e neste dia, a horas de véspera, houvemos
que ainda não podem ser considerados lite- vista de terra, a saber: primeiramente dum
ratura propriamente brasileira. grande monte mui alto e redondo, e de outras
217
serras mais baixas ao sul dele, e de terra chã TEXTO PARA AS QUESTÕES 8 E 9
com grandes arvoredos: ao qual monte alto o MULHER AO ESPELHO
Capitão pôs nome o Monte Pascoal, e à terra Hoje, que seja esta ou aquela, pouco me
a Terra da Vera Cruz. importa.
CAMINHA. Pero Vaz de. Carta ao Rei Dom ManueI. Quero apenas parecer bela, pois, seja qual
Belo Horizonte: Crisálida, 2002. p. 17. for, estou morta. Já fui loura, já fui more-
na, já fui Margarida e Beatriz. Já fui Maria
Explicite, comparando os dois trechos, a re-
e Madalena.
lação existente entre os atos de nomear e
Só não pude ser como quis.
tomar posse.
Que mal faz, esta cor fingida do meu cabelo,
e do meu rosto, se tudo é tinta: o mundo, a
2. A partir da leitura do texto Carta a el-Rei vida, o contentamento, o desgosto? Por fora,
Dom Manuel sobre o achamento do Brasil, serei como queira a moda, que me vai ma-
responda: como é a descrição dos primeiros tando. Que me levem pele e caveira ao nada,
índios feita por Pero Vaz de Caminha no li- não me importa quando. Mas quem viu, tão
toral brasileiro? dilacerados, olhos, braços e sonhos seus, e
morreu pelos seus pecados, falará com Deus.
3. A respeito de Padre Anchieta, responda: Falará, coberta de luzes, do alto penteado
além da vinda para o Brasil para auxiliar na ao rubro artelho. Porque uns expiram sobre
catequização dos índios mediante a compo- cruzes, outros, buscando-se no espelho.
sição de peças de teatro, qual a outra maior MEIRELES, Cecília. Poesias Completa. Rio de
contribuição com relação à difusão da educa- Janeiro: Civilização Brasileira, 1973.
ção dos índios tupis feita pelo jesuíta? A temática e alguns procedimentos caracte-
rísticos do Barroco no século XVII foram re-
4. Quais foram as duas manifestações literárias tomados no poema de Cecília Meireles.
do Quinhentismo no Brasil?
8. O questionamento das concepções do senso
5. Quem começou a literatura de informação? comum quanto à vaidade sugere uma preo-
Qual era o seu objetivo? cupação também existente entre os autores
barrocos. Identifique, no poema, um aspecto
6. Como os jesuítas se aproximaram dos po- da vaidade apresentado negativamente e ou-
vos indígenas? tro apresentado positivamente.

7. (UFV) Leia atentamente o texto: 9. O jogo de oposições entre conceitos era um


Que és terra, homem, e em terra hás de tor- dos recursos característicos da literatura
nar-te, barroca. Indique um contraste próprio do
Barroco que predomina no texto.
Te lembra hoje Deus por sua Igreja;
De pó te faz espelho, em que se veja
A vil matéria, de que quis formar-te. 1
0. Explique quais são as diferenças entre as
Lembra-te Deus, que és pó para humilhar-te, modalidades barrocas do cultismo e do
E como o teu baixel sempre fraqueja conceptismo.
Nos mares da vaidade, onde peleja,
Te põe à vista a terra, onde salvar-te.
Alerta, alerta, pois, que o vento berra. E.O. Enem
Se assopra a vaidade e incha o pano,
Na proa a terra tens, amaina e ferra. 1. Leia estes trechos:
Todo o lenho mortal, baixel humano, TEXTO I
Se busca a salvação, tome hoje terra, Andaram na praia, quando saímos, oito ou dez
Que a terra de hoje é porto soberano. deles; e daí a pouco começaram a vir mais. E
MATOS, Gregório de. Poemas escolhidos. pareceme que viriam, este dia, à praia, qua-
São Paulo: Cultrix, 1997. p. 309. trocentos ou quatrocentos e cinquenta. Al-
guns deles traziam arcos e flechas, que todos
Gregório de Matos expressou em sua obra trocaram por carapuças ou por qualquer coi-
toda a tensão do século XVII, ao abordar sa que lhes davam. […] Andavam todos tão
os temas predominantes do Barroco. Iden- bem-dispostos, tão bem feitos e galantes com
tifique no poema elementos que atestam o suas tinturas que muito agradavam.
comprometimento do poeta com o respectivo CASTRO, S. A carta de Pero Vaz de Caminha.
momento literário. Porto Alegre: L&PM, 1996 (fragmento).

218
TEXTO II Com contornos assimétricos, riqueza de deta-
lhes nas vestes e nas feições, a escultura bar-
roca no Brasil tem forte influência do rococó
europeu e está representada aqui por um dos
profetas do pátio do Santuário do Bom Jesus
de Matosinho, em Congonhas, (MG), esculpi-
do em pedra-sabão por Aleijadinho. Profun-
damente religiosa, sua obra revela:
a) liberdade, representando a vida de mineiros
à procura da salvação.
b) credibilidade, atendendo a encomendas dos
nobres de Minas Gerais.
c) simplicidade, demonstrando compromisso com
a contemplação do divino.
d) personalidade, modelando uma imagem sa-
PORTINARI, C. O descobrimento do Brasil. 1956. Óleo
sobre tela, 199 × 169 cm. Disponível em: <www.
cra com feições populares.
portinari.org.br>.Acesso em: 12 jun. 2013. e) singularidade, esculpindo personalidade do
reinado nas obras divinas.
Pertencentes ao patrimônio cultural brasi-
leiro, a carta de Pero Vaz de Caminha e a
obra de Portinari retratam a chegada dos
portugueses ao Brasil. Da leitura dos textos,
Gabarito
constata-se que:
a) a carta de Pero Vaz de Caminha representa
uma das primeiras manifestações artísticas
dos portugueses em terras brasileiras e pre- E.O. Teste I
ocupa-se apenas com a estética literária. 1. A 2. C 3. C 4. D 5. B
b) a tela de Portinari retrata indígenas nus com
corpos pintados, cuja grande significação é 6. E 7. D 8. B 9. E 10. C
a afirmação da arte acadêmica brasileira e a
contestação de uma linguagem moderna.
c) a carta, como testemunho histórico-político,
mostra o olhar do colonizador sobre a gente
da terra, e a pintura destaca, em primeiro
E.O. Teste II
plano, a inquietação dos nativos. 1. C 2. E 3. A 4. C 5. B
d) as duas produções, embora usem linguagens
6. A 7. B 8. E 9. B 10. C
diferentes – verbal e não verbal –, cumprem
a mesma função social e artística.
e) a pintura e a carta de Caminha são mani-
festações de grupos étnicos diferentes, pro-
duzidas em um mesmo momentos histórico, E.O. Teste III
retratando a colonização. 1. E 2. E 3. A 4. V V V V F 5. A

2.

E.O. Dissertativo
1.
Além da acepção de “dar nome aos seres”,
o verbo “nomear” pode ser entendido como
designar alguém para um cargo, dar direi-
to de posse. É com este sentido que Todorov
Tzevetan o utiliza para analisar o compor-
tamento do colonizador ao apoderar-se das
terras que pertenciam a povos com culturas
e linguagens diferentes. Ao substituir os no-
mes originais dos aborígines pelos dos do-
minadores, impõe-se ao dominado a neces-
sidade do ensino da nova língua que passa
BARDI, P.M. Em torno da escultura no Brasil. a ser usada como instrumento para posse do
São Paulo: Banco Sudameris Brasil, 1989. novo território.
219
2. A primeira menção aos índios se inicia no
trecho “E dali avistamos homens que anda-
vam pela praia, uns sete ou oito, segundo
disseram os navios pequenos que chegaram
primeiro.” A partir de então, Caminha pro-
cede com a descrição dos nativos e se mostra
impressionado com a beleza e com o aspecto
diferente dos índios, principalmente no que
concerne ao vestuário, ao cabelo, à cor da
pele e aos adereços do corpo. Caminha tam-
bém se mostra impressionado com o fato de
que os índios não pareciam incomodados ao
mostrar suas partes íntimas o que, segundo
Caminha, era um sinal de inocência.
3. Uma das maiores contribuições do Padre An-
chieta foi a elaboração da primeira gramáti-
ca da língua tupi (a mais falada pelos índios
na costa brasileira) para auxiliar os catequi-
zadores na evangelização.
4. O Quinhentismo pode ser identificado em
duas etapas: A literatura de informação pro-
duzida pelos navegantes para relatar suas
viagens, e a literatura jesuítica que tinha o
objetivo de catequizar os povos indígenas.
5. A literatura de informação começou com a
Carta de Pero Vaz Caminha para o rei de Por-
tugal D. Manuel, relatando sobre as caracte-
rísticas da nova terra.
6. Os jesuítas se aproximaram dos índios usan-
do peças teatrais, criando cantigas e tradu-
zindo textos para a língua tupi e/ou guarani.
7. O poeta tem consciência de que o mundo ter-
reno é efêmero e vão; o sentimento de nuli-
dade diante do poder divino.
8. A moda que destrói o corpo e a alma de quem
a segue.
A consciência da destruição pela vaidade
elevará o indivíduo até Deus.
9. Um dentre os contrastes:
§§ vida e morte
§§ juventude e velhice
§§ essência e aparência
10. O Cultismo consiste em o jogo de palavras,
preciosismo vocabular, erudição e rebusca-
mento da forma. O conceptismo pauta-se em
argumentos que se centram na razão, conci-
so, ordenado sob os mecanismos da lógica.

E.O. Enem
1. C 2. D

220
© Filipe Frazao/Shutterstock

Aulas 11 e 12
Gregório de Matos Guerra,
o Boca do Inferno
O primeiro poeta brasileiro: adequação e irreverência
Gregório de Matos (1633-1696) é o maior poeta
barroco brasileiro e um dos fundadores da poesia lírica
e satírica no Brasil. Nasceu em Salvador, estudou no Co-
légio dos Jesuítas e depois em Coimbra (Portugal), onde
cursou Direito, tornou-se juiz e ensaiou seus primeiros
Disponível em: <http://imirante.globo.com>

poemas satíricos. De volta ao Brasil, em 1681, exerceu


os cargos de tesoureiro-mor e de vigário-geral, apesar
de sempre ter se recusado a vestir-se como clérigo.
Graças às suas sátiras, foi perseguido pelo go-
vernador baiano Antônio de Souza Menezes, o Braço
de Prata. Depois de se casar com Maria dos Povos e
exercer a advocacia, saiu pelo Recôncavo baiano como
cantor itinerante, dedicando-se às sátiras e aos poemas
erótico-irônicos, o que lhe custou alguns anos de exílio
em Angola. Voltou doente ao Brasil e, impedido de en-
trar na Bahia, morreu em Recife.
Ao contrário de padre Antônio Vieira, Gregó-
rio foi de encontro a uma tendência generalizadora da
época, alastrando-se e acolhendo a poesia religiosa, os
costumes e a reflexão moral.
Em relação aos temas, convivem em seus poe-
mas e nas vontades de seus fiéis um desenfreado sen-
timento de sensualismo, erotismo e paixão idealizada.
Seus poemas são dados ao gosto pelo jogo de palavras
e das brincadeiras.

Cronologia biográfica

Gregório de Matos viveu durante o ciclo da cana-de-


-açúcar e fez parte da elite, à qual ele mesmo se contra-
pôs, ao se indignar com o atraso da sociedade patriar-
cal brasileira depois de voltar de Portugal.
Disponível em: <http://imirante.globo.com>

Ele nada publicou em vida. Depois de sua mor-


te, seus manuscritos foram reunidos em um códice, cuja
capa trazia o brasão da Coroa portuguesa com a se-
guinte insígnia: Inéditas poezias do douto Gregório de
Ilustração de Carybé para o livro Bahia: imagens da terra e do povo. Mattos Guerra.
223
§§ 1636 – Em 20 de dezembro, Gregório de Matos Guerra nasce em Salvador, Bahia.
§§ 1650 – Viaja para Lisboa aos 14 anos.
§§ 1652 – Incentivado pelo pai, matricula-se na Universidade de Lisboa.
§§ 1661 – Forma-se na universidade e casa-se com dona Michaela de Andrade.
§§ 1662 – Conclui o bacharelado em Coimbra.
§§ 1663 – Nomeado juiz de fora em Alcácer do Sal, no Alentejo.
§§ 1672 – Nomeado procurador da cidade da Bahia.
§§ 1674 – Deixa o cargo de procurador.
§§ 1678 – Fica viúvo.
§§ 1691 – Casa-se, pela segunda vez, com Maria dos Povos.
§§ 1694 – Degredado para Angola.
§§ 1696 – Morre no estado de Pernambuco, porque foi proibido de voltar a Salvador.

O “língua de trapo”
Gregório de Matos primou pela irreverência, ao afrontar Ao mesmo desembargador Belchior da Cunha Brochado
os valores e a falsa moral da sociedade baiana de seu com o poema Rosa tumultuada, de Manuel Bandeira
tempo, cujo comportamento era considerado indecoro- (poeta do século XX).
so; irreverente como poeta lírico, ao seguir e ao mesmo
tempo quebrar os modelos barrocos europeus; como po-
eta satírico, ao denunciar as contradições da sociedade
baiana de século XVII, alvejando os grupos sociais – go-
vernantes, fidalgos, comerciantes, escravos, mulatos etc.
A linguagem empregada agrega ao código da língua
portuguesa vocábulos indígenas e africanos, bem como
palavras de baixo calão.
Pelo fato de não ter publicado nenhuma obra em
vida, seus poemas foram transmitidos oralmente, até
meados do século XIX, quando então foram reunidos
em livro por Varnhagen.
Esse trabalho enfrentou alguns problemas de
natureza autoral. Os copistas não necessariamente
obedeceram a critérios científicos para tal. Há contro-
vérsias sobre a autoria de alguns poemas atribuídos
a ele e é comum que um mesmo texto apresente va-
riações de vocabulário ou de sintaxe, dependendo da
edição consultada.
Apesar disso, a obra de Gregório de Matos vem
sendo reconhecida como a que iniciou uma tradição en-
tre nós, bem como superou os limites do próprio barro- 1. Erobo: mitologia, nome das trevas infernais, “onde nunca chega o dia”.
Entenda-se: já que tanto garbo tanta energia são gentil glória desta terra,
co. Em pleno século XVII, o poeta chegou a ser um dos que sejam também alegria da terra mais remota (isso é, o Erebo).
precursores da poesia moderna brasileira do século XX. Poemas escolhidos de Gregório de Matos. Seleção e prefácio de José
Exemplo desse pioneirismo é a semelhança do poema Miguel Wisnik. São Paulo: Companhia das Letras, 2010, p. 205.

224
Manuel Bandeira. Estrela da tarde. 3. ed.
São Paulo: Global, 2012, p. 139.

Foi apelidado de Boca de Inferno, graças à sua poesia satírica, dirigida aos governantes corruptos, a reli-
giosos licenciosos e às hipocrisias da sociedade. Seus mais de 700 poemas de todos os gêneros e estilos poéticos
(exceto o épico) permaneceram inéditos até o século XX. Entre os anos de 1923 e 1933, a Academia Brasileira de
Letras organizou e publicou seis volumes deles: I. Poesia sacra; II. Poesia lírica; III. Poesia graciosa; IV e V. Poesia
satírica; e VI. Últimas.

Poesia satírica
Não poupa aspecto algum do sistema e do poder, o que faz dele um poeta maldito. Provoca os políticos e ridiculari-
za os que viviam para bajular e louvar os poderosos, traços que contribuíram para o “abrasileiramento” do Barroco
importado da Europa.
Crítico social mordaz, vive em uma sociedade de competição na qual vence quem for mais esperto e/ou
desonesto. Este soneto vem precedido da seguinte expedição:

“Contemplando nas coisas do mundo desde o


seu retiro, lhe atira com seu ápage, como quem a nado
escapou da tormenta”.
Disponível em: <http://www.cella.com.br>

Neste mundo é mais rico o que mais rapa:


Quem mais limpo se faz, tem mais carepa
Com sua língua, ao nobre o vil decepa:
O velhaco maior sempre tem capa.

Mostra o patife da nobreza o mapa:


Quem tem mão de agarrar, ligeiro trepa:
Quem menos falar pode, mais increpa:
Quem dinheiro tiver, pode ser Papa.

A flor baixa se inculca por tulipa:


Bengala hoje na mão, ontem garlopa:
Mais isento se mostra o que mais chupa.

Para a tropa do Trapo vazo a tripa,


E mais não digo, porque a Musa topa
Em apa, epa, ipa, opa, upa.
ápage: desaprovação, raiva; carepa: caspa, sujeita; vil: reles, ordinário;
decepa: destrói; increpa: censura; inculca: finge, insinua; garlopa: tra-
balhador braçal
Caricatura de Gregório de Matos
225
“Para a tropa do trapo vazo a tripa é uma Poesia lírica: sacra e amorosa
expressão idiomática que se aproxima de não
quero mais dar importância a esse bando de mi- A poesia lírica de Gregório de Matos é idealista, às ve-
zes emocional, às vezes conceitual, mas frequente-
seráveis”
mente preocupada em entender contradições, como
WISNIK, José Miguel. Poemas escolhidos de Gregório de Matos.
São Paulo: Cultrix, 1976. ensina o professor Antônio Candido. A lírica sacra res-
salta o senso do pecado ao lado do desejo do perdão.
Neste poema, há uma crítica impiedosa à incom-
A Jesus Cristo Nosso Senhor
petência, à promiscuidade e à desonestidade. O poema
Pequei, Senhor; mas não porque hei pecado,
vem precedido da seguinte explicação:
Da vossa alta clemência me despido;
“Torna a definir o poeta os maus modos de Porque, quanto mais tenho delinquido,
obrar na governança da Bahia, principalmente naquela Vos tenho a perdoar mais empenhado.
universal fome, que padecia a cidade”. Se basta a vos irar tanto pecado,
A abrandar-vos sobeja um só gemido:
Epílogo Que a mesma culpa, que vos há ofendido,
Vos tem para o perdão lisonjeado.
Que falta nesta cidade?... Verdade. Se uma ovelha perdida e já cobrada
Que mais por sua desonra?... Honra. Glória tal e prazer tão repentinho
Falta mais que se lhe ponha?... Vergonha. Vos deu, como afirmais na Sacra História:
O demo a viver se exponha,
Por mais que a fama a exalta, Eu sou, senhor, a ovelha desgarrada,
Nesta cidade onde falta Cobrai-a; e a não queirais, Pastor divino,
Verdade, honra, vergonha. Perder na vossa ovelha a vossa glória.
[...] despido: despeço; delinquido: cometido delito; empenhado: comprometido

E que justiça a resguarda?... Bastarda. WISNIK, José Miguel. Poemas escolhidos de Gregório de Matos.
São Paulo: Cultrix, 1976.
É grátis distribuída?... Vendida.
Que tem, que a todos assusta?... Injusta. O lirismo amoroso é contraditório, marcado pela
Valha-nos Deus, o que custa ambiguidade da mulher, vista como uma dualidade entre
O que El-Rei nos dá de graça, matéria e espírito. Neste soneto dedicado à dona Ângela
Que anda a justa na praça de Souza Paredes, o eu-lírico está diante do dilema: qual
Bastarda, vendida, injusta. a finalidade da beleza, se ela leva à perdição? Que papel
[...] tem o anjo (a mulher admirada), se causa a desventura?
O açúcar já se acabou?... Baixou.
Não vira em minha vida a formosura,
E o dinheiro se extinguiu?... Subiu.
Ouvia falar dela a cada dia
Logo já convalesceu?... Morreu.
E ouvida, me incitava e me movia
À Bahia aconteceu
A querer ver tão bela arquitetura:
O que a um doente acontece,
Cai na cama, o mal lhe cresce, Ontem a vi, por minha desventura
Baixou, subiu, morreu. Na cara, no bom ar, na galhardia
A câmara não acode?... Não pode. De uma mulher, que em Anjo se mentia
Pois não tem todo o poder?... Não quer. De um Sol, que se trajava em criatura:
É que o governo a convence?... Não vence. Matem-me, disse eu vendo abrasar-me,
Quem haverá que tal pense, Se esta a coisa não é, que encarecer-me
Que uma câmara tão nobre, Sabia o mundo e tanto exagerar-me:
Por ver-se mísera e pobre,
Não pode, não quer, na vence. Olhos meus, disse então por defender-me,
DIMAS, Antônio. Gregório de Matos.
Se a beleza heis de ver para matar-me,
São Paulo: Abril Educação, 1981. Antes olhos cegueis, do que eu perder-me
226
Poesia lírica filosófica
A lírica filosófica de Gregório de Matos revela um poeta que, tal qual os clássicos, transmite um forte senso do “des-
concerto do mundo”, ocupa-se com a transitoriedade da vida, o escoamento do tempo e a fragilidade do homem.

À instabilidade das coisas no mundo

Nasce o Sol, e não dura mais que um dia,


Mas no Sol, e na Luz falta a firmeza,
Depois da luz se segue a noite escura,
Na formosura não dê Constância,
Em tristes sombras morre a formosura,
E na alegria sinta-se a tristeza,
Em contínuas tristezas, a alegria.
Começa o mundo enfim pela ignorância,
Porém, se acaba o Sol, por que nascia?
Se é tão formosa a Luz, por que não dura? E tem qualquer dos bens por natureza.
Como a beleza assim se transfigura? A firmeza somente na inconstância.
Como o gosto da pena assim se fia? MATOS, Gregório de. Obra completa. São Paulo: Cultura, 1943.

O tema desse soneto detém-se no estado transitório da condição humana. A antítese repete-se na tentativa
de aproximação entre duas ideias naturalmente opostas.
Na segunda estrofe, todos os versos interrogam o eu-poético, bem como o deixam perplexo diante do mis-
tério do universo.
Essa é uma visão de mundo que corresponde à arte barroca: o homem é um ser instável em face da reali-
dade que lhe faz apelos dirigidos aos sentidos, dirigidos ao espírito.

No cinema
Em pleno século XVII, surge na Bahia o poeta Gregório de Mattos (Waly Salomão), que com sua obra e vida trágicas
anuncia o perfil tenso e dividido do povo brasileiro. Com sua produção literária, o poeta cria situações descon-
fortáveis aos poderosos da época, que passam a combatê-lo até transformar sua vida em um verdadeiro inferno.
© Divulgação

Cena do filme Gregório de Mattos (2002).


227
E.O. Teste I 3. A desarmonia e a contradição são caracterís-
ticas predominantes no Barroco. Observe os
fragmentos poéticos de Gregório de Matos,
1. (Unesp) a seguir transcritos, e verifique qual(quais)
A cada canto um grande conselheiro, confirma(m) essas características.
Que nos quer governar cabana, e vinha, I. “Amanheceu o dia prometido,/ famoso,
Não sabem governar sua cozinha, alegre, claro e prazenteiro;/ bom dia, dis-
E podem governar o mundo inteiro. se eu, para viagem.”
(...) II. “O ódio é da alma infame companhia/ a
Estupendas usuras nos mercados, paz deixou-a Deus à cristandade;/ mas
Todos, os que não furtam, muito pobres, arrastar por força uma vontade,/ em vez
E eis aqui a Cidade da Bahia. de caridade é tirania.”
Gregório de Matos. “Descreve o que era realmente naquelle III. “De que pode servir falar quem cala?/
tempo a cidade da Bahia de mais enredada por menos Nunca se há de falar o que se sente,/
confusa”. In: Obra poética (Org. James Amado), 1990. Sempre se há de sentir o que se fala.”
Está(ão) correta(s):
O poema, escrito por Gregório de Matos no
a) apenas I.
século XVII:
b) apenas I e II.
a) representa, de maneira satírica, os gover-
c) apenas III.
nantes e a desonestidade na Bahia colonial. d) apenas I e III.
b) critica a colonização portuguesa e defende, de e) apenas II e III.
forma nativista, a independência brasileira.
c) tem inspiração neoclássica e denuncia os TEXTO PARA AS PRÓXIMAS DUAS QUESTÕES
problemas de moradia na capital baiana. Pequei, Senhor, mas não porque hei pecado,
d) revela a identidade brasileira, preocupação Da vossa alta piedade me despido,
constante do modernismo literário. Porque, quanto mais tenho delinquido,
e) valoriza os aspectos formais da construção Vos tenho a perdoar mais empenhado.
poética parnasiana e aproveita para criticar Gregório de Matos, “A Jesus Cristo Nosso Senhor”
o governo. hei pecado = tenho pecado
delinquido = agido de modo errado
TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 3 QUESTÕES
Neste mundo é mais rico, o que mais rapa: 4. É traço relevante na caracterização do estilo
Quem mais limpo se faz, tem mais carepa; de época a que pertence o texto:
Com sua língua, ao nobre o vil decepa: a) a progressão temática que constrói forças de
O Velhaco maior sempre tem capa. tensão entre pecado e salvação.
Mostra o patife da nobreza o mapa: b) a linguagem musical que sugere os enigmas
do mundo onírico do poeta.
Quem tem mão de agarrar, ligeiro trepa;
c) os aspectos formais, como métrica, cadência
Quem menos falar pode, mais increpa:
e esquema rímico, que refletem o desequilí-
Quem dinheiro tiver, pode ser Papa.
brio emocional do eu lírico.
A flor baixa se inculca por tulipa; d) a fé incondicional nos desígnios de Deus,
Bengala hoje na mão, ontem garlopa, única via para o conhecimento verdadeiro
Mais isento se mostra o que mais chupa. e redentor.
e) a força argumentativa de uma poesia com
Para a tropa do trapo vazo a tripa marcas exclusivas de ideais antropocêntricos.
E mais não digo, porque a Musa topa
Em apa, epa, ipa, opa, upa. 5. Na estrofe, o poeta:
MATOS, Gregório de. Poemas. a) dirige-se ao Senhor para confessar os peca-
Belo Horizonte: Autêntica Ed., 1998. p. 56.
dos e submete-se à penitência para obter a
Glossário: carepa = caspa, sujeira;
galorpa = instrumento utilizado redenção espiritual.
pelos carpinteiros para aplainar madeira; b) invoca Deus para manifestar, com muito respei-
increpar = censurar to e humildade, a intenção de não mais pecar.
c) estabelece um diálogo de igual para igual
com a divindade, sugerindo sua pretensão
2. O poema pode ser considerado exemplar da de livrar-se do castigo e da piedade de Deus.
estética barroca porque: d) onfessa-se pecador e expressa a convicção
a) explora o conflito entre fé e razão. de que será abençoado com a graça divina.
b) estrutura-se sob a forma do soneto. e) arrepende-se dos pecados cometidos, acredi-
c) satiriza autoridades governamentais da época. tando que, assim, terá assegurada a salvação
d) manifesta o rebuscamento próprio do Cultismo. da alma.
228
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO Mas oh do meu segredo alto conceito!
I. “A cada canto um grande conselheiro, Pois não chegam a vir à boca os tiros
Que nos quer governar cabana e vinha; Dos combates que vão dentro no peito.
Não sabem governar sua cozinha, Considere as seguintes afirmações.
E podem governar o mundo inteiro.” I. O poema é um exemplo da poesia satírica
II. “Há coisa como ver um Paiaiá de Gregório de Matos, a qual lhe valeu a
Mui prezado de ser Caramuru, alcunha de “Boca do Inferno”, por escar-
Descendente do sangue de tatu necer de pessoas, situações e costumes de
Cujo torpe idioma e Cobepá” seu tempo.
III. “Rubi, concha de perlas peregrina, II. Na segunda estrofe, o poema expressa a
Animado cristal, viva escarlata, oposição entre essência e aparência, sus-
Duas safiras sobre lisa prata, tentando que o sofrimento é ocultado aos
Ouro encrespado sobre prata fina. olhos do mundo.
Este o rostinho é de Caterina.” III. Segundo as duas últimas estrofes do po-
ema, a opção pelo silêncio com relação à
IV. “Ardor em coração firme nascido!
dor e às angústias internas contrapõe-se
Pranto por belos olhos derramado!
aos ruídos da natureza.
Incêndio em mares de água disfarçado!
Rio de neve em fogo convertido!” Quais estão corretas?
a) Apenas I.
6. Conforme afirma o crítico literário Alfredo b) Apenas II.
Bosi, são conhecidas as críticas “de Gregório c) Apenas I e II.
de Matos contra algumas autoridades da colô- d) Apenas II e III.
nia, mas também palavras de desprezo pelos e) I, II e III.
mestiços e de cobiça pelas mulatas. A situação
de “intelectual” branco não bastante presti- 9. (UFSM) A respeito da poesia de Gregório de
giado pelos maiores da terra ainda mais lhe Matos, assinale a alternativa INCORRETA.
pungia o amor próprio e o levava a estiletar às a) Tematiza motivos de Minas Gerais, onde o
cegas todas as classes da nova sociedade.” poeta viveu.
Essa afirmação pode ser comprovada apenas b) A lírica religiosa apresenta culpa pelo peca-
pelos fragmentos: do cometido.
a) I e II. c) As composições satíricas atacam governan-
b) I e IV. tes da colônia.
c) II e III. d) O lirismo amoroso é marcado por sensível
d) III e IV. carga erótica.
e) Apresenta uma divisão entre prazeres terre-
7. O poeta Gregório de Matos tornou-se impor- nos e salvação eterna.
tante na representação da literatura barroca
brasileira porque: 10. (ITA) Leia o texto abaixo e as afirmações que
a) enfatizou a produção poética satírica em de- se seguem:
trimento da religiosa. Que falta nesta cidade? Verdade.
b) pautou sua vida pelo respeito às normas e Que mais por sua desonra? Honra.
costumes sociais e estéticos. Falta mais que se lhe ponha? Vergonha.
c) criticou membros do clero e do poder políti- O demo a viver se exponha,
co e exaltou índios e mulatos. Por mais que a fama a exalta,
d) apropriou-se de formas e temas do barroco Numa cidade onde falta
europeu, adequando-os ao contexto local. Verdade, honra, vergonha.
Matos, G. de. Os melhores poemas de Gregório de
8. (UFRGS) Leia o seguinte soneto de Gregório Matos Guerra. Rio de Janeiro: Record, 1990.
de Matos. I. mantém uma estrutura formal e rítmica
Largo em sentir, em respirar sucinto, regular.
Peno, e calo, tão fino, e tão lento, II. enfatiza as ideias opostas.
Que fazendo disfarce do tormento, III. emprega a ordem direta.
Mostro que o não padeço, e sei que o sinto. IV. refere-se à cidade de São Paulo.
O mal, que fora encubro, ou me desminto, V. emprega a gradação.
Dentro no coração é que o sustento: Então, pode-se dizer que são verdadeiras:
Com que, para penar é sentimento, a) apenas I, II, IV.
Para não se entender, é labirinto. b) apenas I, II, V.
Ninguém sufoca a voz nos seus retiros; c) apenas I, III, V
Da tempestade é o estrondo efeito: d) apenas I, IV, V.
Lá tem ecos a terra, o mar suspiros. e) todas.
229
E.O. Teste II d) lamenta a inexistência de instituições reli-
giosas, pois elas organizariam moralmente a
cidade.
1. (UEPA) e) descreve as condições do local, mostrando
Nasce o Sol, e não dura mais que um dia: que os habitantes vivem rusticamente e com
Depois da luz se segue a noite escura, poucos recursos.
Em tristes sombras morre a formosura,
Em contínuas tristezas a alegria.
3. (UCS) As obras literárias marcam diferentes
Gregório de Matos Guerra
visões de mundo, não apenas dos autores,
Assinale a alternativa que contém uma ca mas também de épocas históricas distintas.
racterística da comunicação poética, típica do Reflita sobre isso e leia os fragmentos dos
estilo Barroco, existente no quarteto acima. poemas de Gregório de Matos e de Tomás An-
a) Reflexão sobre o caráter humano da divindade. tônio Gonzaga.
b) Associação da natureza com a permanência Arrependido estou de coração, de coração
da realidade espiritual. vos busco, dai-me abraços, abraços, que me
c) Presença da irreverência satírica do poeta rendem vossa luz.
com base no paradoxo. Luz, que claro me mostra a salvação, a salva-
d) Utilização do pleonasmo para reforçar a su- ção pretendo em tais abraços, misericórdia,
perioridade do cristianismo sobre o protes- amor, Jesus, Jesus!
tantismo. (MATOS, Gregório. Pecador contrito aos pés
e) Uso de ideias contrastantes com base no re- do Cristo crucificado. In: TUFANO, Douglas.
curso da antítese. Estudos de literatura brasileira. 4 ed. rev. e
ampl. São Paulo: Moderna, 1988. p. 66.)

2. (IFSP) Leia o soneto do escritor barroco Gre- Minha bela Marília, tudo passa;
gório de Matos. a sorte deste mundo é mal segura;
DESCRIÇÃO DA CIDADE DE SERGIPE D’EL-REI se vem depois dos males a ventura,
vem depois dos prazeres a desgraça.
Três dúzias de casebres remendados, Estão os mesmos deuses
Seis becos, de 1mentrastos entupidos, sujeitos ao poder do ímpio fado:
Quinze soldados, rotos e despidos, Apolo já fugiu do céu brilhante,
Doze porcos na praça bem criados. já foi pastor de gado.
(GONZAGA, Tomás António. Lira XIV. In: TUFANO, Douglas
Dois conventos, seis frades, três letrados, Estudos de literatura brasileira. 4 ed. rev. e ampl. São Paulo:
Um juiz, com bigodes, sem ouvidos,
Três presos de piolhos carcomidos, Moderna, 1988. p. 77.)
Por comer dois meirinhos esfaimados.
Em relação aos poemas, analise a veracidade
As damas com sapatos de baeta, 2 (V) ou a falsidade (F) das proposições abaixo.
Palmilha de tamanca como frade, ( ) O poema de Gregório de Matos apresenta
Saia de 3chita, cinta de raqueta. um sujeito lírico torturado pelo peso de
seus pecados e desejoso de aproximar-se
O feijão, que só faz 4ventosidade Farinha de do Divino.
pipoca, pão que greta, ( ) Tomás Antônio Gonzaga, embora perten-
De Sergipe d’El-Rei esta é a cidade. ça ao mesmo período literário de Gre-
(DIMAS, Antônio. Gregório de Matos. gório de Matos, revela neste poema um
São Paulo: Nova Cultural, 1988.) sujeito lírico consciente da brevidade da
1mentrasto: tipo de erva
vida.
2baeta: tecido felpudo ( ) Em relação às marcas de religiosidade, a
3chita: tecido de algodão de pouco valor visão antagônica que se coloca entre os
4ventosidade: que provoca flatulência dois poemas reflete, no Barroco, a influ-
Pela leitura do soneto, é correto afirmar que ência do cristianismo e, no Arcadismo, a
o poeta: da mitologia grega.
a) critica veladamente o governo português
por ter escolhido essa cidade para ser a sede Assinale a alternativa que preenche correta-
administrativa da colônia. mente os parênteses, de cima para baixo.
b) escreve esse poema para expor as angústias a) V – V – V
vividas durante o período em que cumpria a b) V – F – F
primeira ordem de desterro. c) V – F – V
c) comenta a elegância e a sensualidade das damas, d) F – F – F
visto que sempre apreciou as mulheres brasileiras. e) F – V – F
230
4. (UFPR) Considerando a poesia de Gregório de que éreis uma aldeia pobre
Matos e o momento literário em que sua obra e hoje sois rica cidade.
se insere, avalie as seguintes afirmativas:
1. Apresentando a luta do homem no emba- Então vos pisavam índios,
te entre a carne e o espírito, a terra e o e vos habitavam cafres,
céu, o presente e a eternidade, os poemas hoje chispais fidalguias,
religiosos do autor correspondem à sen- arrojando personagens.
sibilidade da época e encontram paralelo Nota: entenda-se “Bahia” como cidade.
na obra de um seu contemporâneo, Padre Gregório de Matos
Antônio Vieira.
Vocabulário
2. Os poemas erótico-irônicos são um exem-
alarves – que ou quem é rústico, abrutado,
plo da versatilidade do poeta, mas não são
grosseiro,
representativos da melhor poesia do autor,
ignorante; que ou o que é tolo, parvo, es-
por não apresentarem a mesma sofistica- túpido. ressábios – sabor; gosto que se tem
ção e riqueza de recursos poéticos que os depois.
poemas líricos ou religiosos apresentam. cafres – indivíduo de raça negra.
3. Como bom exemplo da poesia barroca, a
poesia do autor incrementa e exagera al-
5. (UFF) Todas as afirmativas sobre a constru-
guns recursos poéticos, deixando sua lin-
ção estética ou a produção textual do poema
guagem mais rebuscada e enredada pelo
de Gregório de Matos (Texto) estão adequa-
uso de figuras de linguagem raras e de
das, EXCETO uma. Assinale-a.
resultados tortuosos.
a) Existem antíteses, características de textos
4. A presença do elemento mulato nessa
no período barroco.
poesia resgata para a literatura uma di-
b) Há uma personificação, pois a Bahia, ser
mensão social problemática da sociedade
inanimado, é tratada como ser vivo.
baiana da época: num país de escravos,
c) A ausência de métrica aproxima o poema do
o mestiço é um ser em conflito, vítima
Modernismo.
e algoz em uma sociedade violentamente d) O eu lírico usa o vocativo, transformando a
desigual. Assinale a alternativa correta. Bahia em sua interlocutora.
a) Somente as afirmativas 1 e 2 são verdadeiras. e) Há diferença de tratamento para os habitan-
b) Somente as afirmativas 1, 2 e 3 são verdadeiras. tes locais e os estrangeiros.
c) Somente as afirmativas 1, 3 e 4 são verdadeiras.
d) Somente as afirmativas 2 e 4 são verdadeiras. TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 3 QUESTÕES
e) Somente as afirmativas 3 e 4 são verdadeiras. Triste Bahia! Oh quão dessemelhante
Estás, e estou do nosso antigo estado!
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO Pobre te vejo a ti, tu a mi empenhado,
Senhora Dona Bahia, Rica te vejo eu já, tu a mi abundante.
nobre e opulenta cidade,
madrasta dos naturais A ti trocou-te a máquina mercante,
e dos estrangeiros madre: Que em tua larga barra tem entrado,
A mim foi-me trocando, e tem trocado
Dizei-me por vida vossa Tanto negócio, e tanto negociante.
em que fundais o ditame
de exaltar os que aqui vêm, Deste em dar tanto açúcar excelente
e abater os que aqui nascem? Pelas drogas inúteis, que abelhuda
Simples aceitas do sagaz Brichote.
Se o fazeis pelo interesse
de que os estranhos vos gabem, Oh se quisera Deus, que de repente
isso os paisanos fariam Um dia amanheceras tão sisuda
com conhecidas vantagens. Que fora de algodão o teu capote!
MATOS, Gregório de. Poesias selecionadas.
E suposto que os louvores 3. ed. São Paulo: FTD, 1998. p. 141.
em boca própria não valem,
se tem força esta sentença,
6. (UEL) No que diz respeito à relação entre o
mor força terá a verdade.
eu lírico e a Bahia, considere as afirmativas
O certo é, pátria minha, a seguir.
que fostes terra de alarves, I. Na primeira estrofe, o eu lírico identifi-
e inda os ressábios vos duram ca-se com a Bahia, pois ambos sofrem a
desse tempo e dessa idade. perda de um antigo estado.
II. Na primeira estrofe, a Bahia aparece per-
Haverá duzentos anos, sonificada, fato confirmado no momento
nem tantos podem contar-se, em que ela e o eu lírico se olham.
231
III.
Na terceira estrofe, constata-se que a Assinale a alternativa correta.
Bahia não está isenta da culpa pela perda a) Somente as afirmativas I e IV são corretas.
de seu antigo estado. b) Somente as afirmativas II e III são corretas.
IV. Na quarta estrofe, o eu lírico conclui que c) Somente as afirmativas III e IV são corretas.
a lamentável situação da Bahia está em d) Somente as afirmativas I, II e III são corretas.
conformidade com a vontade divina. e) Somente as afirmativas I, II e IV são corretas.
Assinale a alternativa correta.
a) Somente as afirmativas I e II são corretas.
9. (CFTMG) O poeta Gregório de Matos tornou-
b) Somente as afirmativas II e IV são corretas.
-se importante na representação da literatu-
c) Somente as afirmativas III e IV são corretas.
ra barroca brasileira porque:
d) Somente as afirmativas I, II e III são corretas.
e) Somente as afirmativas I, III e IV são corretas. a) enfatizou a produção poética satírica em de-
trimento da religiosa.
b) pautou sua vida pelo respeito às normas e
7. (UEL) A partir da leitura do texto, considere
as afirmativas a seguir. costumes sociais e estéticos.
I. O poema faz parte da produção de Gregório c) riticou membros do clero e do poder político
de Matos caracterizada pelo cunho satíri- e exaltou índios e mulatos.
co, visto que ridiculariza vícios e imperfei- d) apropriou-se de formas e temas do barroco
ções e assume um tom de censura. europeu, adequando-os ao contexto local.
II. As figuras do desconsolado poeta, da tris-
te Bahia e do sagaz Brichote são imagens TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES
Segue neste soneto a máxima de bem viver
poéticas utilizadas para expressar a exis-
que é envolver-se na confusão dos néscios
tência de um triângulo amoroso. para passar melhor a vida.
III. O poema apresenta a degradação da Bahia
e do eu-lírico, em virtude do sistema de SONETO
trocas imposto à Colônia, o qual privile- Carregado de mim ando no mundo,
E o grande peso embarga-me as passadas,
giava os comerciantes estrangeiros.
Que como ando por vias desusadas,
IV. Os versos “Que em tua larga barra tem
Faço o peso crescer, e vou-me ao fundo.
entrado” e “Deste em dar tanto açúcar
excelente” conferem ao poema um tom O remédio será seguir o imundo
erótico, pois, simbolicamente, sugerem a Caminho, onde dos mais vejo as pisadas,
Que as bestas andam juntas mais ousadas,
ideia de solicitação ao prazer.
Do que anda só o engenho mais profundo.
Assinale a alternativa correta.
a) Somente as afirmativas I e II são corretas. Não é fácil viver entre os insanos,
b) Somente as afirmativas I e III são corretas. Erra, quem presumir que sabe tudo,
Se o atalho não soube dos seus danos.
c) Somente as afirmativas III e IV são corretas.
d) Somente as afirmativas I, II e IV são corretas. O prudente varão há de ser mudo,
e) Somente as afirmativas II, III e IV são corretas. Que é melhor neste mundo, mar de enganos,
Ser louco c’os demais, que só, sisudo.
MATOS, Gregório de. Poemas escolhidos.
8. (UEL) Sobre figuras de linguagem no poema,
São Paulo: Cultrix, 1989. p. 253.
considere as afirmativas a seguir.
I. A descrição do eu lírico e da Bahia confi-
gura uma antítese entre o estado antigo 1
0. (UEG)
e o atual de ambos.
II. A antítese é verificada na oposição en-
tre as expressões “máquina mercante” e
“drogas inúteis”, embora ambas se refi-
ram à Bahia.
III. Os versos 3 e 4 são exemplos do papel re-
levante da gradação no conjunto do poe-
ma, pois enumeram estados de espírito
do eu lírico.
IV. Os versos “Um dia amanheceras tão sisu-
da / Que fora de algodão o teu capote!”
configuram exemplos de personificação e Aleijadinho, Cristo do carregamento da
metáfora, respectivamente. Cruz. “Enciclopédia Barsa”, 1998

232
Pequei, Senhor; mas não porque hei pecado, e) Pequei Senhor; mas não porque hei pecado,
Da vossa alta clemência me despido; Da vossa alta clemência me despido;
Porque quanto mais tenho delinquido, Porque quanto mais tenho delinquido,
Vos tenho a perdoar mais empenhado. Vos tenho a perdoar mais empenhado.
Obra poética de Gregório de Matos. Rio Gregório de Matos)
de Janeiro: Record: 1990.

Durante o período colonial brasileiro, as princi-


2. (UFES) O poema abaixo do “Boca de Inferno”
pais manifestações artísticas, populares ou eru-
representa uma fase e um estilo da literatu-
ditas, foram, assim como nos demais aspectos da
ra brasileira. Leia o poema e as afirmativas
vida cotidiana, marcadas pela influência da reli-
seguintes e assinale a alternativa CORRETA.
giosidade. Nesse sentido, com base na análise da
presença da religiosidade na obra de Aleijadinho Seis horas enche e outras tantas vaza
e Gregório de Matos, é CORRETO afirmar: A maré pelas margens do oceano,
a) Ambas são modelos da arte barroca, uma E não larga a tarefa um ponto no ano,
vez que se inspiram mais na temática cristã Porquanto o mar rodeia, e o sol abrasa.
do que em elementos oriundos da mitologia
greco-romana. Desde a esfera primeira opaca, ou rasa,
b) A presença da temática religiosa em ambos A Lua com impulso soberano
deve-se à influência protestante holandesa Engole o mar por um secreto cano,
na região da Bahia e de Minas Gerais. E quando o mar vomita, o mundo arrasa.
c) No trecho do poema, tem-se a expressão de Muda-se o tempo, e suas temperanças,
um pecador que, embora creia em Deus, não Até o céu se muda, a terra, os mares,
tem certeza de que obterá o perdão divino. E tudo está sujeito a mil mudanças.
d) A pobreza estética da obra de Aleijadinho e
Matos deriva da censura promovida pela San- Só eu, que todo o fim de meus pesares
ta Inquisição às obras artísticas no Brasil. Eram de algum minguante as esperanças,
Nunca o minguante vi de meus azares.
I. O poema, do período Barroco e autoria
E.O. Teste III de Gregório de Matos, tem como temática
os males da vida do poeta, salientando a
1. (UEL) O Barroco manifesta-se entre os séculos constante transformação das coisas, res-
XVI e XVII, momento em que os ideais da Re- saltando que num mundo de eternas mu-
forma entram em confronto com a Contra Re- danças só a sua dor permanece.
forma católica, ocasionando no plano das artes II. A primeira estrofe do poema expressa a
uma difícil conciliação entre o teocentrismo e consciência de mudança e do constante
o antropocentrismo. A alternativa que contém movimento da vida, contrastando com a
os versos que melhor expressam este conflito é: última, que afirma a permanência de to-
a) Um paiá de Monal, bonzo bramá, dos os males do poeta.
Primaz da Cafraria do Pegu, III. O poema, construído em decassílabo sá-
Que sem ser do Pequim, por ser do Açu, fico, com hipérbatos e metáforas, tem na
Quer ser filho do sol, nascendo cá. personificação da Lua a expressão do cul-
(Gregório de Matos) tismo, uma prática barroca referente aos
astros celestes oriunda da ContraReforma.
b) Temerária, soberba, confiada, IV. As rimas cdc/dcd criam uma simetria com
Por altiva, por densa, por lustrosa, as palavras rimadas, reafirmando a temá-
A exaltação, a névoa, a mariposa, tica central do poema e harmonizando tais
Sobe ao sol, cobre o dia, a luz lhe enfada. palavras de forma que os tercetos desta-
(Botelho de Oliveira) quem a condição desesperançada do poeta.
a) Nenhumas das afirmativas está correta.
c) Fábio, que pouco entendes de finezas!
b) Apenas uma das afirmativas está correta.
Quem faz só o que pode a pouco obriga:
c) Apenas duas das afirmativas estão corretas.
Quem contra os impossíveis se afadiga,
d) Apenas três das afirmativas estão corretas.
A esse cede amor em mil ternezas.
e) Todas as afirmativas estão corretas.
(Gregório de Matos)

d) Luzes qual sol entre astros brilhadores, 3. (UFSM) Leia a estrofe de Gregório de Matos:
Se bem rei mais propício, e mais amado; “Ardor em firme coração nascido;
Que ele estrelas desterra em régio estado, pranto por belos olhos derramado;
Em régio estado não desterras flores. incêndio em mares de água disfarçado;
(Botelho de Oliveira) rio de neve em fogo convertido.”
233
Assinale a alternativa em que os dois versos
indicados apresentam metáforas de lágrimas.
E.O. Dissertativo
a) versos 1 e 2
b) versos 2 e 4 TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES
c) versos 2 e 3 TEXTO I
d) versos 3 e 4 Largo em sentir, em respirar sucinto,
e) versos 1 e 3 Peno, e calo, tão fino e tão atento,
Que fazendo disfarce do tormento,
Mostro que o não padeço, e sei que o sinto.
4. (Fatec) No colégio dos padres, Gregório de
Matos escreveu: O mal que fora encubro, ou que desminto,
“Quando desembarcaste da fragata, meu Dentro no coração é que o sustento:
dom Braço de Prata, cuidei, que a esta cidade Com que para penar é sentimento,
tonta, e fátua*, mandava a Inquisição algu- Para não se entender, é labirinto.
ma estátua, vendo tão espremida salvajola* Ninguém sufoca a voz nos seus retiros;
visão de palha sobre um mariola*”. Da tempestade é o estrondo efeito:
Sorriu, e entregou o escri- Lá tem ecos a terra, o mar suspiros.
to a Gonçalo Ravasco. Mas oh! Do meu segredo alto conceito!
Gonçalo leu-o, gracejou, en- Pois não chegam a vir à boca os tiros
tregou-o ao vereador. Dos combates que vão dentro do peito.
O papel passou de mão em mão. Gregório de Matos Guerra. Sonetos.
“A difamação é o teu deus”,
disseram, sorrindo.
TEXTO II
(Ana Miranda, “Boca do Inferno”)
O TEMPO NÃO PARA
(*fátua: tola;*salvajola: variante de
“selvagem”; *mariola: velhaco)
Disparo como um sol.
Sou forte sou por acaso
O trecho ilustra: Minha metralhadora cheia de mágoas
a) a poesia erótica de Gregório de Matos, ins- Eu sou um cara
pirada na vida nos prostíbulos da cidade da Cansado de correr na direção contrária
Sem pódio de chegada ou beijo de namorada
Bahia e que deu origem à alcunha do poeta,
Eu sou mais um cara
“Boca do Inferno”.
Mas se você achar que eu tô derrotado
b) a poesia lírica de Gregório de Matos, volta- Saiba que ainda estou rolando os dados
da para a temática filosófica, em linguagem Porque o tempo... o tempo não para
marcada pelos recursos da estética barroca. Dias sim... dias não eu vou sobrevivendo sem
c) a poesia satírica de Gregório de Matos, dedi- um arranhão
cada à descrição fiel da sociedade da época, Da caridade de quem me detesta
utilizando recursos expressivos característi- A tua piscina tá cheia de ratos
cos do barroco português. Tuas ideias não correspondem aos fatos
d) a poesia erótica de Gregório de Matos, carac- O tempo não para
terizada pela crítica aos comportamentos e Eu vejo o futuro repetir o passado
Eu vejo um museu de grandes novidades
às autoridades baianas da época colonial.
O tempo não para... não para... não... não
e) a poesia satírica de Gregório de Matos, que
para
representa, no conjunto de sua obra, uma Eu não tenho data pra comemorar
fuga aos moldes barrocos e ataca, no linguajar Às vezes os meus dias são de par em par
baiano da época, costumes e personalidades. Procurando agulha num palheiro
Nas noites de frio é melhor nem nascer
5. (UEL) Incêndio em mares d’água disfarçado, Nas de calor se escolhe é matar ou morrer
Rio de neve em fogo convertido. E assim nos tornamos brasileiros
Nesses versos de Gregório de Matos ocorre Te chamam de ladrão, de bicha, maconheiro
um procedimento comum ao estilo da poesia Transformam um país inteiro num puteiro
Pois assim se ganha mais dinheiro
barroca, qual seja:
Cazuza
a) a imitação direta dos elementos naturais.
b) a submissão da sintaxe às regras da clareza.
c) a interpenetração de elementos contrastan tes. 1. O poeta Gregório de Matos e o compositor Ca-
d) a ordem casual e descontrolada das palavras. zuza, como homens de seus tempos, apresen-
e) a exaltação da paisagem nativa. tam, em certos aspectos, atitudes distintas
234
em relação aos conflitos existenciais. O pri- 5. Destaque do texto de Gregório de Matos um
meiro reconhece a existência dos conflitos par de versos que tenha “uma figura de oposi-
que o atormentam. O segundo, além de reco- ção” muito comum ao Barroco, classificando-a.
nhecer conflitos pessoais, expõe as mazelas
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
que cercam o ser humano em geral.
A questão seguinte se baseia num soneto de
Transcreva, DE CADA AUTOR (TEXTO I e TEX-
Gregório de Matos (1623?-1696) e na crôni-
TO II), DOIS VERSOS SEGUIDOS que confir-
ca O SONETO, de Carlos Heitor Cony (1926-).
mem tal afirmativa.
AO CONDE DE ERICEYRA D. LUIZ DE MENE-
2. As estéticas literárias não se confinam a de- ZES PEDINDO LOUVORES AO POETA NÃO LHE
terminados tempos e a determinados auto- ACHANDO ELLE PRESTIMO ALGUM.
res na expressão do sentimento e da visão de Um soneto começo em vosso gabo;
mundo. De uma forma ou de outra, os poetas Contemos esta regra por primeira,
Gregório de Matos e Cazuza (séculos XVI e Já lá vão duas, e esta é a terceira,
XX, respectivamente) discutem as contradi- Já este quartetinho está no cabo.
ções que, atemporalmente, cercam a existên-
cia humana. Na quinta torce agora a porca o rabo:
A sexta vá também desta maneira,
Transcreva DOIS VERSOS SEGUIDOS DO TEXTO
Na sétima entro já com grã canseira,
I E DOIS VERSOS SEGUIDOS DO TEXTO II que
E saio dos quartetos muito brabo.
comprovem o caráter contraditório da visão
de mundo de cada autor. Agora nos tercetos que direi?
Direi, que vós, Senhor, a mim me honrais,
3. (Fuvest) A poesia lírica de Gregório de Matos Gabando-vos a vós, e eu fico um Rei.
subdivide-se em amorosa e religiosa. Nesta vida um soneto já ditei,
a) Quais são os dois modos contrastantes de ver Se desta agora escapo, nunca mais;
a mulher, em sua lírica amorosa? Louvado seja Deus, que o acabei.
b) Como aparece em sua lírica religiosa a ideia In: MATOS, Gregório de. Obra poética. 2ª ed. Rio
de Deus e do pecado? de Janeiro: Record, 1990, vol. I, p. 129-130.

TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES O SONETO


“Pobre terra da Bruzundanga! Velha, na sua Era magro, feio, merecia o superlativo: era
maior parte, como o planeta, toda a sua mis- magérrimo e feiíssimo. Usava óculos, fumava
são tem sido criar a vida, e a fecundidade de piteira, a voz rachada, andava mal ves-
para os outros, pois nunca os que nela nasce- tido, mas tinha – milagre jamais explicado
– um carrinho inglês que sempre estava de
ram, os que nela viveram, os que a amaram
bateria arriada e precisava ser empurrado.
e sugaram-lhe o leite, tiveram sossego sobre
Trabalhava num vespertino, seu texto era
o seu solo!” barroco, cobria festividades cívicas e reli-
(Lima Barreto, Os Bruzundangas) giosas. Era – segundo o meu pai – uma boa
alma, embora fosse ruim de corpo. Um dia,
“Senhora Dona Bahia,
me levou para um canto da redação e reci-
nobre e opulenta cidade, tou-me um soneto de sua lavra, os olhos fais-
madrasta dos Naturais, cando de lascívia contrariada.
E dos Estrangeiros madre. Esqueci o soneto minutos depois. Guardei por
Dizei-me por vida vossa, uns tempos o final, aquilo que os parnasia-
em que fundais o ditame nos chamavam de “chave de ouro”. Transcri-
de exaltar, os que aí vêm, to em papel talvez não impressione. Dito por
e abater, os que ali nascem?” ele, num canto empoeirado da redação, com
sua voz rachada, a piteira nas mãos trêmu-
(Gregório de Matos. Poesias selecionadas).
las, era uma apoteose da dor: “Passei bem
Lima Barreto e Gregório de Matos estão junto a ela. E decerto ela nem soube que eu
distantes, cronologicamente, na Literatura passei tão perto e nem suspeita que eu segui
chorando!”. O verso quebrado e a exclamação
Brasileira. Mas os autores podem ser aproxi-
final faziam parte da poética e das redações
mados pelo teor satírico que imprimiram às
daquele tempo.
suas obras. Tome os fragmentos citados para Chamava-se Cardim. Domingos da Silva Car-
responder às questões seguintes: dim se não me engano. Casara-se com uma
viúva tão feia e magra como ele, também bo-
4. Fale sobre o tema que aproxima os dois textos. níssima alma. Não tinham filhos.
235
Por isso ou aquilo, Cardim apaixonava-se com 1
0. (Fuvest) A poesia lírica de Gregório de Matos
frequência e, quanto menos correspondido, subdivide-se em amorosa e religiosa.
mais apaixonado ficava. Deve ter feito outros a) Quais são os dois modos contrastantes de ver
sonetos, circulou pela redação um poema a mulher, em sua lírica amorosa?
pornográfico e anônimo que desde o redator- b) Como aparece em sua lírica religiosa a ideia
chefe até o contínuo que ia buscar café na es- de Deus e do pecado?
quina atribuíram ao estro do Cardim. Cardim
morreu como um passarinho – naquele tempo
era comum esse tipo de morte. O tempo pas- Gabarito
sou, esqueci dele, mas nunca esqueci aquele
final de lascívia contrariada. Outro dia, bes-
tamente, depois de um dia inglório e triste,
cara mais uma vez quebrada, me surpreendi E.O. Teste I
recitando em causa própria: e ela nem soube 1. A 2. D 3. E 4. A 5. D
que eu passei tão perto e nem suspeita que
eu segui chorando! 6. A 7. D 8. D 9. A 10. B
In: CONY, Carlos Heitor. Folha de S.Paulo.
Cad. 1, p. 2, Opinião, 6/7/97.

6. (Unesp) Em sua crônica, Carlos Heitor Cony


E.O. Teste II
apresenta, com fino humor, um antigo cole- 1. E 2. E 3. C 4. C 5. C
ga e poeta, um tipo bastante curioso, dado
a cultivar sonetos. O cronista, num processo 6. D 7. B 8. A 9. D 10. A
de reminiscência, aborda a personalidade do
poeta, as características de seu estilo e suas
produções poéticas. Observe, numa leitura
do texto, esse processo de caracterização da E.O. Teste III
personagem e, em seguida, responda:
1. E 2. D 3. D 4. E 5. C
a) Ao referir-se ao discurso da personagem, o
cronista afirma que “seu texto era barro-
co”. Considerando as características do es-
tilo de época denominado barroco, em que
se inscreve a poesia de Gregório de Matos, E.O. Dissertativo
explique o que Cony quis dizer a respeito do 1.
estilo de Domingos da Silva Cardim. TEXTO I
b) Semelhantemente ao que fez Gregório em Pois não chegam a vir à boca os tiros
seu poema, embora de modo mais direto, Dos combates que vão dentro do peito.
ao apresentar e descrever Domingos da Silva TEXTO II
Cardim, o cronista assume uma atitude de A tua piscina está cheia de ratos
deboche, que por vezes beira ao escárnio. Tuas ideias não correspondem aos fatos.
Transcreva duas frases da crônica em que se 2.
caracteriza tal atitude. TEXTO I
Largo em sentir, em respirar sucinto.
(UFRJ) O soneto de Gregório de Matos apre- Peno, e calo, tão fino e tão atento.
senta, em sua construção, um conflito entre TEXTO II
o eu-lírico e o mundo. Cansado de correr na direção contrária
Sem pódio de chegada ou beijo de namorada.
7. Em que consiste esse conflito? 3.
a) A mulher divinizada e a mulher mais ter-
8. Qual foi a solução proposta? rena e sensual.
b) Como homem, Gregório reconhece-se pe-
9. O Barroco faz um uso particular de metá- cador e Deus representa a possibilidade
foras para concretizar abstrações. No texto, de redenção dos pecados.
encontram-se vocábulos cujos significados
4.
Ambos fazem crítica à realidade do país: a
constroem imagens vinculadas à travessia
exaltação do estrangeirismo em detrimento
do eu-lírico no mundo. Retire do texto qua- do nacionalismo.
tro vocábulos desse campo semântico, sendo
dois verbos e dois substantivos. 5.
Em “exaltar” e “abater”, tem-se a antítese.
236
6. 8.
A solução proposta é render-se ao mundo.
a) O cronista, ao mencionar barroco, resgata
a ideia do rebuscamento da forma em de- 9.
Os vocábulos que constroem imagens vincu-
trimento do conteúdo. Usando da ironia, ladas ao campo semântico de travessia são os
mostra que a poesia de Cardim, prestava- seguintes: ando, vou-(me), seguir, andam,
se às funções “menores” da poesia. anda, erra (verbos); passadas, vias, cami-
b) O escárnio encontra-se em “...embora fos- nho, pisadas, atalho (substantivos).
se ruim de corpo”; “Casara-se com uma 10.
viúva tão feia e magra como ele”. Há ou- a) A mulher divinizada e a mulher mais ter-
tras frases. rena e sensual.
7.
O eu lírico encontra-se em crise, pois se b) Como homem, Gregório reconhece-se pe-
sente completamente deslocado em relação cador e Deus representa a possibilidade
à coletividade. de redenção dos pecados.

237
Disponível em: <https://literaturanomeiodomundo.wordpress.com>

Padre Antônio Vieira


Aulas 13 e 14
Padre Antônio Vieira e o convencimento da fé cristã
Disponível em: <http://estoriasdahistoria12.blogspot.com.br>

Antônio Vieira (1608-1697) é a principal ex-


pressão do Barroco em Portugal. Sua obra perten-
ce tanto à literatura portuguesa quanto à brasilei-
ra. Compreende um vasto campo temático que vai
da religião à política, passando pela diplomacia
num desfile de sua mais interessante capacidade:
a de orador e pregador da fé cristã.
Português de origem, Vieira tinha sete anos
quando veio com a família para o Brasil. Na Bahia,
estudou com os jesuítas e espontaneamente in-
gressou na Companhia de Jesus, iniciando seu
noviciado com apenas 15 anos. A maior parte
de sua obra foi escrita no Brasil. Desempenhou
várias atividades como religioso, conselheiro de
Dom João IV, rei de Portugal, e como mediador de
Portugal em conflitos econômicos e políticos com
outros países.
Disponível em: <http://www.colegioweb.com.br>

O homem de ação e lábia


Embora religioso, Vieira nunca restringiu sua atu-
ação à pregação religiosa. Seus sermões estive-
ram a serviço das causas políticas que abraçava e
defendia, o que o levou a se indispor com muita
gente: pequenos comerciantes que escravizavam
índios e até com a Inquisição. Atacava os senho-
res de escravos, bem como cobrava de Lisboa as
determinações que tolhiam a liberdade dos índios;
questionava os capitães-mor pela desobediência
às determinações religiosas. Isso e muito mais
foram fatores determinantes para sua expulsão,
bem como a de outros jesuítas do Brasil.
Valendo-se do púlpito – único meio de
propagação de ideias às multidões no Nordeste
brasileiro do século XVII –, Vieira pregou a índios,
brancos, negros, brasileiros, africanos, portugue-
ses, dominadores e dominados. Suas ideias polí-
ticas impregnavam a catequese jesuíta em defesa
do índio e do domínio português sobre a colônia
Pregação de Vieira por ocasião da invasão holandesa.
239
Disponível em: <http://redememoria.bn.br>
© Divulgação

Medalha Padre Antônio Vieira, esculpida por Dorita Castelo Branco.

Vieira na redução das tribos de Marajó, 1657. Theodoro Braga (1917).

Embora Vieira defendesse os índios da escravidão, seus sermões eram reticentes em relação à escravização
dos negros. Limitavam-se a descrever a situação a que eram submetidos os negros e a apontar a perspectiva de
uma pós-morte que compensasse os sofrimentos em vida. “A realidade na qual Vieira procura interferir não é
diretamente a exterior, mas a interior, tentando mudar as convicções tanto dos negros como dos brancos. Por isso
nestes sermões ele se dirige aos dois, ora a um, ora a outro, sabendo que o ouvem continuamente” comenta o
historiador Luiz Roncari (Literatura brasileira – dos primeiros cronistas aos últimos românticos. 2. ed. São Paulo:
Edusp/FDE, 1995. p. 167).
Observe tal postura neste fragmento do “Sermão Vigésimo Sétimo”.

“Umas religiões são de descalços, outras de calçados; a


Disponível em: <http://www.spelltraducoes.com.br>

vossa é de descalços e despidos. O vosso hábito é da mesma cor;


porque não vos vestem as peles das ovelhas e camelos, como a
Elias, mas aquelas com que vos cobriu ou descobriu a natureza,
expostos aos calores do sol e frios das chuvas. A vossa pobreza é
mais pobre que a dos menores, e a vossa obediência mais sujei-
ta dos que nós chamamos mínimos. As vossas abstinências mais
merecem nome de fome, que de jejum, e as vossas vigílias não
são de uma hora à meia-noite, mas de toda a noite sem meio. A
vossa regra é uma ou muitas, porque é a vontade e vontades de
vosso senhores. Vós estais obrigados a eles, porque não podeis
deixar o seu cativeiro, e eles não estão obrigados a vós, porque
vos podem vender a outro, quando quiserem. Em uma só reli-
gião se acha este contrato, para que também a vossa seja nisto
singular. Nos nomes do vosso tratamento não falo, porque não
são de reverência nem de caridade, mas de desprezo e afronta.
Enfim, toda a religião tem fim e vocação, graça particular. A gra-
ça da vossa são açoutes e castigos” [...].
240
Padre visionário tempo a expressão máxima do Barroco em prosa sacra
e uma das principais expressões ideológicas e literárias
Vieira também foi sonhador e profeta, chegou a escre- da Contrarreforma. Pregou no Brasil, em Portugal e na
ver três obras nesse sentido: História do futuro, Espe- Itália, sempre com grande repercussão.
rança de Portugal e Clavis Prophetarum. Entre sua vasta produção de mais de duzentos
Baseado em textos bíblicos e nos textos profé- sermões e quinhentas cartas, destacam-se:
ticos do poeta português Bandarra, ele acreditava na
ressurreição do rei Dom João IV, seu protetor, morto em
1656. Essas ideias constam em Esperança de Portugal. §§ Sermão da sexagésima, proferido na Capela Real
Em razão delas, entre 1665 e 1667, foi processado e de Lisboa, em 1655, cujo tema é a arte de pregar.
preso pela Inquisição e teve cassado seu direito à pala- §§ Sermão pelo bom sucesso das armas de Portu-
vra em Portugal. gal contra as de Holanda, proferido na Bahia em
1640, posiciona-se contra à invasão holandesa.
§§ Sermão de Santo Antônio (aos peixes), proferi-
do no Maranhão, em 1654, ataca a escraviza-
ção de índios.
§§ Sermão do mandato, proferido na Capela Real
de Lisboa, em 1645, desenvolve o tema do
amor místico.
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© Divulgação

Caricatura de Vieira

Constam desse processo também acusações de


envolvimento com cristãos-novos – judeus convertidos
ao cristianismo por medo de perseguição. Em vez de
atacar os judeus, como se fazia nos países católicos
pressionados pela Inquisição, Vieira defendia a perma-
nência e a entrada deles em Portugal como forma de
estimular o comércio naquele país. Paralelamente, pre-
vendo um “Terceiro Estado” da Igreja, tinha interesse Púlpito da igreja de Nossa Senhora da Ajuda,
em Salvador (BA), de onde Vieira pregou.
em fazer um acordo teológico secreto com os judeus.

Sermão da sexagésima
O orador Metalinguagem

As qualidades de Vieira como orador são incomparáveis. Proferido na Capela Real de Lisboa, em 1655, é tam-
Dotado de boa formação jesuítica à estética barroca em bém conhecido como Sermão da Palavra de Deus.
voga, pronunciou sermões que se tornaram ao mesmo A arte de pregar é seu tema. Com o objetivo de analisar
241
“por que não frutifica a Palavra de Deus na Terra?”, propõe-se a demonstrar que os verdadeiros culpados são os
pregadores que usam da palavra apenas com um objetivo ornamental, sem desenvolver eficazmente uma argu-
mentação capaz de frutificar nos ouvintes.
“Ora, suposto que a conversão das almas por meio da pregação depende destes três concursos: de Deus, do
pregador e do ouvinte, por qual deles devemos entender a falta? Por parte do ouvinte, ou por parte do pregador,
ou por parte de Deus?”
Excluindo a culpa de Deus e inocentando os ouvintes, a culpa recai nos pregadores, conforme se percebe
no desenrolar da argumentação:
“Primeiramente, por parte de Deus, não falta e nem pode faltar. Esta proposição é de fé, definidas no
Concílio Tridentino e no nosso Evangelho a temos.” [...]
“Os pregadores deitam a culpa nos ouvintes, mas não é assim. Se for por parte dos ouvintes, não fizera a
Palavra de Deus muito grande fruto, mas não fazer nenhum fruto e nenhum efeito, não é por parte dos ouvintes.
Provo.” [...]
“Sabeis, cristãos, por que não faz fruto a Palavra de Deus? Por culpa dos pregadores. Sabeis, pregadores,
por que não faz fruto a Palavra de Deus? Por culpa nossa.”
Leia com atenção e prazer alguns trechos do “Sermão da Sexagésima”.

Trecho I

Será porventura o estilo que hoje se usa nos púlpitos? Um estilo tão empeçado, um estilo tão dificultoso, um
estilo tão afetado, um estilo tão encontrado a toda a arte e a toda a natureza? Boa razão é também esta. O estilo
há de ser muito natural. Por isso, Cristo comparou o pregar ao semear: [...] Compara Cristo o pregar ao semear,
porque o semear é uma arte que tem mais de natureza que de arte. Nas outras artes tudo é arte: na música tudo
se faz por compasso, na arquitetura tudo se faz por regra, na aritmética tudo se faz por conta, na geometria tudo
se faz por medida. O semear não é assim. É uma arte sem arte; caia onde cair. Vede como semeava o nosso lavra-
dor do Evangelho. ‘Caía o trigo nos espinhos e nascia’ [...] ‘Caía o trigo nas pedras e nascia’ [...] ‘Caía o trigo na
terra boa e nasci’. Ia o trigo caindo e ia nascendo.

Trecho II
[...] o pregar há de ser como quem semeia, e não como quem ladrinha ou azuleja. Não fez Deus o céu em
xadrez de estrelas, como os pregadores fazem o sermão em xadrez de palavras. Se de uma parte está branco, de
outra há de estar negro; se de uma parte está dia, de outra há de estar noite; se de uma parte dizem luz, da outra
hão de dizer sombra; se de uma parte dizem desceu, da outra hão de dizer subiu. Basta que não havemos de ver
num sermão duas palavras em paz? Todas hão de estar sempre em fronteira com o seu contrário? [...]

Trecho III
Não nego nem quero dizer que o sermão não haja de ter variedade de discursos, mas esses hão de nascer
todos da mesma matéria e continuar e acabar nela. Quereis ver tudo isto com os olhos? Ora vede. Uma árvore
tem raízes, tem tronco, tem ramos, tem folhas, tem varas, tem flores, tem frutos. Assim há de ser o sermão: há
de ter raízes fortes e sólidas, porque há de ser fundado no Evangelho; há de ter um tronco, porque há de ter um
só assunto e tratar uma só matéria; deste tronco hão de nascer diversos ramos, que soa diversos discursos, mas
nascidos da mesma matéria e continuados nela; estes ramos hão de ser secos, senão cobertos de folhas, porque
os discursos hão de ser vestidos e ornados de palavras. [...]

242
Trecho IV

Mas dir-me-eis: padre, os pregadores de hoje não pregam do Evangelho, não pregam das Sagradas Escri-
turas? Pois como não pregam a palavra de Deus? – esse é o mal. Pregam palavras de Deus, mas não pregam a
Palavra de Deus.

O Sermão da Sexagésima é a peça maior da oratória do Padre Vieira, mas outros também se destacaram.

Sermão pelo bom sucesso das armas


de Portugal contra as de Holanda
O Sermão pelo bom sucesso das armas de Portu-
gal contra as de Holanda foi proferido na Bahia, na
igreja de Nossa Senhora da Ajuda, em 1640. O orador
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chama o povo ao combate contra os holandeses, dese-
nhando a figura dos flamengos, protestantes, como here-
ges. A Bahia estava para cair sob o jugo dos holandeses.

Trecho I
(...) Pequei, que mais Vos posso fazer? E
que fizestes vós, Job, a Deus em pecar? Não Lhe
fiz pouco; porque Lhe dei ocasião a me perdoar, e
perdoando-me, ganhar muita glória. Eu dever-Lhe-
-ei a Ele, como a causa, a graça que me fizer; e Ele
dever-me-á a mim, como a ocasião, a glória que
alcançar. (...). Em castigar, vencei-nos a nós, que
somos criaturas fracas; mas em perdoar, vencei-Vos
a Vós mesmo, que sois todo-poderoso e infinito. Só
esta vitória é digna de Vós, porque só vossa justiça
pode pelejar com armas iguais contra vossa mise-
ricórdia; e sendo infinito o vencido, infinita fica a
glória do vencedor.

Interior da igreja de Nossa Senhora da Ajuda,


em Salvador (BA), onde o padre Vieira proferiu
o Sermão contra os holandeses.

Trecho II
Não hei de pregar hoje ao povo, não hei de falar com os homens, mais alto hão de sair as minhas palavras
ou as minhas vozes: a vosso peito divino se há de dirigir todo o sermão.

243
Sermão de Santo Antônio
rede de pescar, Sagenae missae in mare, diz que
(aos peixes) os pescadores ‘recolheram os peixes bons e lança-
ram fora os maus’: Elegerunt bonos in vasa, malos
Sermão de Santo Antônio, também chamado de autem foras miserunt. E onde há bons e maus, há
Sermão aos peixes, foi pregado em São Luís do Ma- que louvar e que repreender. Suposto isto, para que
ranhão, em 1654, e refere-se a colonos que aprisiona- procedamos com clareza, dividirei, peixes, o vosso
vam indígenas. sermão em dois pontos: no primeiro louvar-vos-ei
Três dias antes do embarque escondido para Lis- as vossas virtudes, no segundo repreender-vos-ei
boa, na festa de Santo António – 13 de junho de 1654 os vossos vícios. E desta maneira satisfaremos às
–, em São Luís do Maranhão, Vieira causou surpresa: em obrigações do sal, que melhor vos está ouvi-las vi-
vez de tematizar os milagres de Santo Antônio, detona a vos, que experimentá-las depois de mortos.
situação que estava vivendo, a pressão contra sua pes-
soa e alerta aos ouvintes que se não quisessem ouvi-lo
que fossem como Santo Antônio, pregaria aos peixes, Trecho II
que estavam ali a poucos passos. Os vícios e as virtudes Este é, peixes, em comum o natural que em
dos homens são elencados na busca por uma legislação todos vós louvo, e a felicidade de que vos dou o
mais justa aos índios. parabém, não sem inveja. Descendo ao particular,
O sermão exalta as qualidades dos peixes, infinita matéria fora se houvera de discorrer pelas
como a obediência, e critica a soberba e o oportunis- virtudes de que o Autor da natureza a dotou e fez
mo. O principal defeito que ele aponta é a intensida- admirável em cada um de vós. De alguns somente
de e a voracidade, uma vez que os peixes devoram farei menção. E o que tem o primeiro lugar entre
uns aos outros, especialmente os maiores, que de- todos, como tão celebrado na Escritura, é aque-
voram os menores. Vieira exalta os peixes que, por le santo peixe de Tobias a quem o texto sagrado
sua natureza, não podem ser sacrificados vivos a não dá outro nome que de grande, como verda-
Deus e sacrificam-se então, em respeito e reverência. deiramente o foi nas virtudes interiores, em que
só consiste a verdadeira grandeza. Ia Tobias cami-
nhando com o anjo S. Rafael, que o acompanhava,
Trecho I
e descendo a lavar os pés do pó do caminho nas
Vos estis sal terrae. Haveis de saber, irmãos margens de um rio, eis que o investe um grande
peixes, que o sal, filho do mar como vós, tem duas peixe com a boca aberta em ação de que o que-
propriedades, as quais em vós mesmos se experi- ria tragar. Gritou Tobias assombrado, mas o anjo
mentam: conservar o são e preservá-lo para que se lhe disse que pegasse no peixe pela barbatana e
não corrompa. Estas mesmas propriedades tinham o arrastasse para terra; que o abrisse e lhe tirasse
as pregações do vosso pregador Santo António, as entranhas e as guardasse, porque lhe haviam de
como também as devem ter as de todos os prega- servir muito. Fê-lo assim Tobias, e perguntando que
dores. Uma é louvar o bem, outra repreender o mal: virtude tinham as entranhas daquele peixe que lhe
louvar o bem para o conservar e repreender o mal mandara guardar, respondeu o anjo que o fel era
para preservar dele. Nem cuideis que isto pertence bom para sarar da cegueira e o coração para lançar
só aos homens, porque também nos peixes tem seu fora os demônios: Cordis eius particulam, si super
lugar. Assim o diz o grande Doutor da Igreja S. Basí- carbones ponas, fumus eius extricat omne genus
lio: Non carpere solum, reprehendereque possumus daemoniorum: et fel valet ad ungendos oculos, in
pisces, sed sunt in illis, et quae prosequenda sunt quibus fuerit albugo, et sanabuntur. Assim o disse o
imitatione: ’Não só há que notar, diz o Santo, e que anjo, e assim o mostrou logo a experiência, porque,
repreender nos peixes, senão também que imitar sendo o pai de Tobias cego, aplicando-lhe o filho
e louvar.’ Quando Cristo comparou a sua Igreja à aos olhos um pequeno do fel, cobrou inteiramente
a vista; e tendo um demônio, chamado Asmodeu,

244
morto sete maridos a Sara, casou com ela o mesmo Tobias; e queimando na casa parte do coração, fugiu dali o
Demônio e nunca mais tornou. De sorte que o fel daquele peixe tirou a cegueira a Tobias, o velho, e lançou os
demônios de casa a Tobias, o moço. Um peixe de tão bom coração e de tão proveitoso fel, quem o não louvará
mais? Certo que se a este peixe o vestiram de burel e o ataram com uma corda, parecia um retrato marítimo de
Santo António.
© Wikimedia Commons

Trecho III
Ah peixes, quantas invejas vos tenho a essa
natural irregularidade! Quanto melhor me fora não
tomar a Deus nas mãos, que tomá-lo indignamen-
te! Em tudo o que vos excedo, peixes, vos reco-
nheço muitas vantagens. A vossa bruteza é melhor
que a minha razão e o vosso instinto melhor que
o meu alvedrio. Eu falo, mas vós não ofendeis a
Deus com as palavras; eu lembro-me, mas vós não
ofendeis a Deus com a memória; eu discorro, mas
vós não ofendeis a Deus com o entendimento; eu
quero, mas vós não ofendeis a Deus com a vontade.
Vós fostes criados por Deus, para servir ao homem,

NO CINEMA e conseguis o fim para que fostes criados; a mim


criou-me para o servir a ele, e eu não consigo o fim
para que me criou. Vós não haveis de ver a Deus, e
Diante dos juízes, o padre António Vieira revê o seu pas-
podereis aparecer diante dele muito confiadamen-
sado: a juventude no Brasil, os anos do noviciado na
te, porque o não ofendestes; eu espero que o hei de
Bahia, o seu papel na defesa da causa dos índios e os
ver; mas com que rosto hei de aparecer diante do
seus primeiros êxitos no púlpito. A Inquisição proibiu-o seu divino acatamento, se não cesso de o ofender?
de falar. Mais tarde, no reinado de D. Pedro II, o prega- Ah que quase estou por dizer que me fora melhor
dor foi mandado para Roma, onde obteve reputação e ser como vós, pois de um homem que tinha as mes-
sucesso tais que o papa o ilibou do jugo da Inquisição. mas obrigações, disse a Suma Verdade, que ‘melhor
A rainha Cristina da Suécia, que vivia em Roma depois lhe fora não nascer homem‘: Si natus non fuisset
de ter abdicado do trono, acolheu-o na corte e o fez seu homo ille. E pois os que nascemos homens, respon-
confessor. No entanto, a saudade de Portugal levou-o demos tão mal às obrigações de nosso nascimento,
de volta. O acolhimento frio recebido do novo rei D. Pe- contentai-vos, peixes, e dai muitas graças a Deus
dro levou-o a partir de novo para o Brasil, onde passou pelo vosso.
os últimos anos da sua vida.
(Disponível em: <http://www.ccb.pt>. Acesso em: 14 dez. 2014).

“Palavra e utopia”. Dir. Manoel de Oliveira, 2000, 130 min.


245
E.O. Teste I 2. Pelo trecho reproduzido, pode-se concluir
que o Sermão da Sexagésima trata da:
a) problemática da pregação religiosa, conside-
1. Um dos recursos utilizados pelo padre Antô- rando as figuras dos pregadores e dos fiéis.
nio Vieira em seus sermões consiste na “agu- b) necessidade do engajamento dos fiéis nas
deza” – maneira de conduzir o pensamento batalhas contra os holandeses.
que aproxima objetos e/ou ideias distantes, c) perseguição sofrida pelo pregador em função
diferentes, por meio de um discurso artifi- de apoio que emprestava a índios e negros.
cioso, que se costuma chamar de “discurso d) exortação que o pregador fazia em favor de
engenhoso”. seu projeto de criar a Campanha das Índias
Assinale a alternativa em que, no trecho Ocidentais.
transcrito do Sermão da Sexagésima, o autor e) condenação aos governantes locais que de-
utiliza esse recurso. sobedeciam os princípios do mercantilismo
a) Lede as histórias eclesiásticas, e achá-las-eis seiscentista.
todas cheias de admiráveis efeitos da pre-
gação da palavra de Deus. Tantos pecadores 3. Leia o seguinte fragmento, extraído do “Ser-
convertidos, tanta mudança de vida, tanta mão de Santo Antônio”, de Pe. Vieira.
reformação de costumes; os grandes despre- “(...) o pão é comer de todos os dias, que
zando as riquezas e vaidades do Mundo; os sempre e continuamente se come: isto é o que
reis renunciando os cetros e as coroas; as padecem os pequenos. São o pão cotidiano
mocidades e as gentilezas metendo-se pelos dos grandes; e assim como o pão se come com
desertos e pelas covas [...] tudo, assim com tudo e em tudo são comidos
b) Miseráveis de nós, e miseráveis de nos- os miseráveis pequenos, não tendo, nem fa-
sos tempos, pois neles se veio a cumprir a zendo ofício em que os não carreguem, em que
profecia de S. Paulo: [...] “Virá tempo, diz os não multem, em que os não defraudem, em
S. Paulo, em que os homens não sofrerão que os não comam, traguem e devorem (...)”
a doutrina sã.” [...] “Mas para seu apetite No trecho, observa-se que Vieira
terão grande número de pregadores feitos a I. constrói a argumentação por meio da
montão e sem escolha, os quais não façam analogia, o que constitui um traço carac-
mais que adular-lhes as orelhas.” terístico da prosa vieiriana.
c) Para um homem se ver a si mesmo são neces- II. finaliza com uma gradação crescente a
sárias três coisas: olhos, espelho e luz. [...] fim de dar ênfase à voracidade da explo-
Que coisa é a conversão de uma alma, se- ração sofrida pelos pequenos.
não entrar um homem dentro de si e ver-se
III. afirma, ao estabelecer uma comparação
a si mesmo? Para esta vista são necessários
entre os humildes e o pão, alimento de
olhos, é necessária luz e é necessário espe-
consumo diário, que a exploração dos pe-
lho. O pregador concorre com o espelho, que
quenos é aceitável porque cotidiana.
é a doutrina; Deus concorre com a luz, que
Está(ão) correta(s):
é a graça; o homem concorre com os olhos,
que é o conhecimento. a) apenas I.
d) Quando Davi saiu a campo com o gigante, b) apenas I e II.
ofereceu-lhe Saul as suas armas, mas ele não c) apenas III.
as quis aceitar. Com as armas alheias nin- d) apenas II e III.
guém pode vencer, ainda que seja Davi. As e) I, II e III.
armas de Saul só servem a Saul, e as de Davi TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
a Davi, e mais aproveita um cajado e uma Os ouvintes ou são maus ou são bons; se são
funda própria, que a espada e a lança alheia. bons, faz neles grande fruto a palavra de
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO Deus; se são maus, ainda que não faça ne-
Por isto são maus ouvintes os de entendimen- les fruto, faz efeito. A palavra de Deus é tão
fecunda, que nos bons faz muito fruto e é
tos agudos. Mas os de vontades endurecidas
tão eficaz, que nos maus, ainda que não faça
ainda são piores, porque um entendimento
fruto, faz efeito; lançada nos espinhos não
agudo pode-se ferir pelos mesmos fios e ven-
frutificou, mas nasceu até nos espinhos; lan-
cer-se uma agudeza com outra maior; mas çada nas pedras não frutificou, mas nasceu
contra vontades endurecidas nenhuma coisa até nas pedras. Os piores ouvintes que há na
aproveita a agudeza, antes dana mais, por- Igreja de Deus são as pedras e os espinhos.
que quando as setas são mais agudas, tanto E por quê? - Os espinhos por agudos, as pe-
mais facilmente se despontam na pedra. Oh! dras por duras. Ouvintes de entendimentos
Deus nos livre de vontades endurecidas, que agudos e ouvintes de vontades endurecidas
ainda são piores que as pedras. são os piores que há. Os ouvintes de enten-
(Sermão da Sexagésima, de Pe. Antônio Vieira) dimentos agudos são maus ouvintes, porque
246
vêm só a ouvir sutilezas, a esperar alanta- a) Gongorismo – exaltação vital – Cultismo –
rias, a avaliar pensamentos, e às vezes tam- preciosismo
bém a picar quem os não pica. b) Conceptismo – fé – preciosismo – Gongorismo
Mas os de vontades endurecidas ainda são c) Barroco – depressão vital – Conceptismo –
piores, porque um entendimento agudo pode- Cultismo
-se ferir pelos mesmos fios, e vencer-se uma d) Conceptismo – depressão vital – Gongorismo
agudeza com outra maior; mas contra vonta- – preciosismo
des endurecidas nenhuma coisa aproveita a e) Barroco – fé – Cultismo – Conceptismo
agudeza, antes dana mais, porque quanto as
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
setas são mais agudas, tanto mais facilmente
O pregar há-de ser como quem semeia, e não
se despontam na pedra. E com os ouvintes de
como quem ladrilha ou azuleja. Ordenado,
entendimentos agudos e os ouvintes de von-
mas como as estrelas. (...) Todas as estrelas
tades endurecidas serem os mais rebeldes, é
estão por sua ordem; mas é ordem que faz
tanta a força da divina palavra, que, apesar
influência, não é ordem que faça lavor. Não
da agudeza, nasce nos espinhos, e apesar da
fez Deus o céu em xadrez de estrelas, como
dureza, nasce nas pedras.
os pregadores fazem o sermão em xadrez de
(Padre Antônio Vieira, Sermão da
Sexagésima. Texto editado.)
palavras. Se de uma parte há-de estar branco,
da outra há-de estar negro; se de uma parte
está dia, da outra há-de estar noite; se de
4. Considere as afirmações seguintes sobre o uma parte dizem luz, da outra hão-de dizer
texto de Vieira. sombra; se de uma parte dizem desceu, da
I. Trata-se de texto predominantemente ar- outra hão-de dizer subiu. Basta que não ha-
gumentativo, no qual Vieira emprega as vemos de ver num sermão duas palavras em
metáforas do espinho e da pedra para re- paz? Todas hão-de estar sempre em fronteira
ferir-se àqueles em que a palavra de Deus com o seu contrário? Aprendamos do céu o es-
não prospera. tilo da disposição, e também o das palavras.
II. Nota-se no texto a metalinguagem, pois (Vieira, Sermão da Sexagésima)
o sermão trata da própria arte da prega-
ção religiosa.
III.
À vista da construção essencialmente 6. No texto, Vieira critica um certo estilo de fa-
fundada no jogo de ideias, fazendo pro- zer sermão, que era comum na arte de pre-
gredir o tema pelo raciocínio, pela lógica, gar dos padres dominicanos da época. O uso
o texto caracteriza-se como conceptista. da palavra “xadrez” tem o objetivo de
IV. Efeito da Revolução Industrial, que refor- a) defender a ordenação das ideias em um
çou a perspectiva capitalista e o individu- ser mão.
alismo, esse texto traduz a busca da natu- b) fazer alusão metafórica a um certo tipo
reza (pedras, espinhos,...) como refúgio de tecido.
para o eu lírico religioso. c) comparar o sermão de certos pregadores a
V. Vincula-se ao Barroco, movimento esté- uma verdadeira prisão.
tico entre cujos traços destaca-se a osci- d) mostrar que o xadrez se assemelha ao semear.
lação entre o clássico (de matriz pagã) e e) criticar a preocupação com a simetria do
o medieval (de matriz cristã), a qual se ser mão.
traduz em estados de conflito religioso.
Estão corretas apenas as afirmações:
7. OS HOLANDESES NO BRASIL
a) I, II e III.
A carta que João Fernandes Vieira, um dos
b) I, III e V.
heróis da Restauração Pernambucana, escre-
c) II, III e IV.
veu em 1654 ao rei de Portugal dom João IV
d) II, III, IV e V.
relatando o fim do domínio holandês no Bra-
e) I, II, III e V.
sil foi entregue na segunda-feira 18 à Univer-
sidade Federal de Pernambuco. O documento
5. (UFRGS) Assinale a alternativa que preenche pertencia ao professor inglês Charles Ralph,
adequadamente as lacunas do texto abaixo, um dos principais estudiosos do período da
na ordem em que aparecem. expansão portuguesa, falecido no ano pas-
Padre Antônio Vieira é um dos principais au- sado. Pela primeira vez, o documento ficará
tores do __________, movimento em que o ho- guardado no Brasil.
mem é conduzido pela __________ e que tem, (Isto É, n. 1656, 27 jun. 2001)
entre suas características, o __________, com
seus jogos de palavras, de imagens e de cons- Quando, em 1640, os holandeses apertaram
trução, e o __________, o uso de silogismo, o cerco à cidade da Bahia, ameaçando invadi-
processo racional de demonstrar uma asserção. -la pela segunda vez, Padre Antônio Vieira,
247
em seu “Sermão pelo bom sucesso das armas os grandes comem os pequenos, não bastam
de Portugal contra as de Holanda”, bradava cem pequenos, nem mil, para um só grande
aos céus, suplicando a proteção de Deus para [...]. Os homens, com suas más e perversas
a cidade de Salvador. cobiças, vêm a ser como os peixes que se co-
Assinale a alternativa que apresenta um mem uns aos outros. Tão alheia cousa é não
fragmento desse Sermão. só da razão, mas da mesma natureza, que,
a) Há de tomar o pregador uma só matéria, sendo criados no mesmo elemento, todos ci-
há de defini-la para que se conheça, há de dadãos da mesma pátria, e todos finalmente
dividi-la para que se distinga, há de prová-la irmãos, vivais de vos comer.
com a Escritura, há de declará-la com a ra- VIEIRA, Antônio. Obras completas do padre Antônio Vieira:
zão, há de confirmá-la com o exemplo, há de sermões. Prefaciados e revistos pelo Pe. Gonçalo Alves.
amplificá-la com as causas, com os efeitos, Porto: Lello e Irmão – Editores, 1993. v. III, p. 264-265.
com as circunstâncias, com as conveniências
O texto de Vieira contém algumas caracte-
que se hão de seguir, com os inconvenientes
rísticas do Barroco. Dentre as alternativas a
que se devem evitar [...]
seguir, assinale aquela em que NÃO se con-
b) Este foi, Cristãos, o amor de Cristo, esta a
firmam essas tendências estéticas:
ciência e as ciências com que nos amou, e
a) A utilização da alegoria, da comparação,
esta a ignorância e ignorâncias sobre que
como recursos oratórios, visando à persua-
somos amados [...]. Sirva-nos a sua ciência
são do ouvinte.
de espertador, para nunca deixar de amar;
b) A tentativa de convencer o homem do sécu-
sirva-nos a nossa ignorância de estímulo,
lo XVII, imbuído de práticas e sentimentos
para sempre amar mais e mais a quem tanto
comuns ao semipaganismo renascentista, a
nos amou [...]
c) Enquanto Páris, ignorante de si e da fortu- retomar o caminho do espiritualismo medie-
na do seu nascimento, guardava as ovelhas val, privilegiando os valores cristãos.
do seu rebanho nos campos do monte Ida, c) A presença do discurso dramático, recorren-
dizem as histórias humanas que era objeto do ao princípio horaciano de “ensinar delei-
dos seus cuidados Enone, uma formosura rús- tando” – tendência didática e moralizante,
tica daqueles vales. Mas quando o encoberto comum à Contra-Reforma.
príncipe se conheceu e soube que era filho de d) O tratamento do tema principal – a denúncia
Príamo, rei de Tróia, como deixou o cajado e à cobiça humana – através do conceptismo,
o surrão, trocou também de pensamento [...]
ou jogo de ideias.
d) Semeou uma semente só, e não muitas, por-
e) O culto do contraste, sugerindo a oposição
que o sermão há de ter uma só matéria, e
bem × mal, em linguagem simples, concisa,
não muitas matérias. Se o lavrador semeara
direta e expressiva da intenção barroca de
primeiro trigo, e sobre trigo semeara cen-
resgatar os valores greco-latinos.
teio, e sobre o centeio semeara milho grosso
e miúdo, e sobre o milho semeara cevada,
que havia de nascer? – Uma mata brava, 9. Leia o trecho de um sermão, do Padre Antô-
uma confusão verde [...] nio Vieira:
Será porventura o estilo que hoje se usa nos
e) Que a larga mão com que nos destes tantos
púlpitos um estilo tão empeçado, um estilo
domínios e reinos não foram mercês de vossa
tão dificultoso, um estilo tão afetado, um es-
liberalidade, senão cautela e dissimulação de tilo tão encontrado a toda parte e a toda a na-
vossa ira, para aqui fora e longe de nossa Pá- tureza? O estilo há de ser muito fácil e muito
tria nos matardes, nos destruirdes, nos aca- natural. Compara Cristo o pregar e o semear,
bardes de todo. Se esta havia de ser a paga porque o semear é uma arte que tem mais de
e o fruto de nossos trabalhos, para que foi o natureza que de arte.
trabalhar, para que foi o servir, para que foi O objetivo do autor é:
o derramar tanto e tão ilustre sangue nestas a) destacar que a naturalidade – propriedade
conquistas? [...] da natureza – pode tornar mais claro o estilo
das pregações religiosas.
8. Leia atentamente o fragmento do sermão do b) salientar que o estilo usado na igreja, naque-
Padre Antônio Vieira: la época, não era afetado nem dificultoso.
A primeira cousa que me desedifica, peixes, c) argumentar que a lição de Cristo é desneces-
de vós, é que comeis uns aos outros. Grande sária para os objetivos da pregação religiosa.
escândalo é este, mas a circunstância o faz d) lamentar o fato de os sermões serem dirigi-
ainda maior. Não só vos comeis uns aos ou- dos dos púlpitos, excluindo da audiência as
tros, senão que os grandes comem os peque- pessoas que ficavam fora da igreja.
nos. Se fora pelo contrário era menos mal. e) mostrar que, segundo o exemplo de Cristo,
Se os pequenos comeram os grandes, bastara pregar e semear afetam o estilo, porque são
um grande para muitos pequenos; mas como práticas inconciliáveis.
248
1
0. Assinale a alternativa CORRETA a respeito do ( ) Por meio da analogia, Vieira compara
Padre Antônio Vieira: como os peixes são pescados e como os
a) Em função de seu zelo para com Deus, utili- homens perdem-se, ambos vítimas de um
zava-o para justificar todos os acontecimen- engano.
tos políticos e sociais. ( ) Os fatos narrados no fragmento apresen-
b) Dada sua espiritualidade, demonstrava de- tam semelhanças com o enredo de uma
sinteresse por assuntos mundanos. fábula, no sentido de que seu conteúdo é
c) Procurava adequar os textos bíblicos às rea- utilizado para ilustrar um princípio moral.
lidades de que tratava. A sequência correta é:
d) Mostrou-se tímido diante dos interesses a) V – F – F
dos poderosos. b) F – V – F
e) Embora vivesse no Brasil, por sua formação c) F – V – V
lusitana, não se ocupou de problemas locais.
d) F – F – V
e) V – V – V

E.O. Teste II TEXTOS PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES


Leia o trecho do Sermão pelo bom sucesso
das armas de Portugal contra as de Holanda,
1. (UFSM) Padre Antônio Vieira, em seu Sermão do Padre Antônio Vieira, e o soneto de Gre-
de Santo Antônio ou dos Peixes, vale-se da gório de Matos Guerra a seguir.
fauna aquática, especialmente a da costa SERMÃO PELO BOM SUCESSO DAS ARMAS DE
brasileira, para dar força e vida às suas pa- PORTUGAL CONTRA AS DE HOLANDA
lavras, como se vê no fragmento a seguir. Ou- Pede razão Jó a Deus, e tem muita razão de a
tra coisa muito geral, que não tanto me dese- pedir – responde por ele o mesmo santo que
difica, quanto me lastima, em muitos de vós, o arguiu – porque se é condição de Deus usar
é aquela tão notável ignorância e cegueira de misericórdia, e é grande e não vulgar a
que em todas as viagens experimentam os glória que adquire em perdoar pecados, que
que navegam para estas partes. Tome um ho- razão tem, ou pode dar bastante, de os não
mem do mar um anzol, ata-lhe um pedaço de perdoar? O mesmo Jó tinha já declarado a
pano cortado e aberto em duas ou três pon- força deste seu argumento nas palavras ante-
tas, lança-o por um cabo delgado até tocar cedentes, com energia para Deus muito forte:
na água, e em o vendo o peixe, arremete cego Peccavi, quid faciam tibi? Como se dissera:
a ele e fica preso e boqueando até que, assim Se eu fiz, Senhor, como homem em pecar,
suspenso no ar, ou lançado no convés, aca- que razão tendes vós para não fazer como
ba de morrer. Pode haver maior ignorância e Deus em me perdoar? Ainda disse e quis dizer
mais rematada cegueira que esta? Enganados mais: Peccavi, quid faciam tibi? Pequei, que
por um retalho de pano, perder a vida? Dir- mais vos posso fazer? E que fizestes vós, Jó,
a Deus em pecar? Não lhe fiz pouco, porque
-me-eis que o mesmo fazem os homens.
lhe dei ocasião a me perdoar, e, perdoando-
Não vô-lo nego. Dá um exército batalha con-
-me, ganhar muita glória. Eu dever-lhe-ei a
tra outro exército, metem-se os homens pelas ele, como a causa, a graça que me fizer, e ele
pontas dos piques, dos chuços e das espadas, dever-me-á a mim, como a ocasião, a glória
e por quê? Porque houve quem os engodou e que alcançar.
lhes fez isca com dois retalhos de pano. A vai-
dade entre os vícios é o pescador mais astuto A JESUS CRISTO NOSSO SENHOR
e que mais facilmente engana os homens. E
Pequei, Senhor, mas não porque hei pecado,
que faz a vaidade? Põe por isca nas pontas
Da vossa piedade me despido;
desses piques, desses chuços e dessas espadas
dois retalhos de pano, ou branco, que se cha- Porque, quanto mais tenho delinquido,
ma hábito de Malta; ou verde, que se chama Vos tenho a perdoar mais empenhado.
de Aviz; ou vermelho, que se chama de Crista Se basta a vos irar tanto um pecado,
e de Santiago; e os homens por chegarem a A abrandar-vos sobeja um só gemido:
passar esse retalho de pano ao peito, não re- Que a mesma culpa, que vos há ofendido,
param em tragar e engolir o ferro.
Vos tem para o perdão lisonjeado.
A partir da leitura do fragmento, assinale
verdadeira (V) ou falsa (F) em cada afirma- Se uma ovelha perdida e já cobrada
tiva a seguir. Glória tal e prazer tão repentino
( ) A referência aos peixes, no fragmento Vos deu, como afirmais na sacra história,
e no sermão como um todo, deve-se ao
“milagre da multiplicação dos peixes’, re- Eu sou, Senhor, a ovelha desgarrada:
alizado por Jesus Cristo, o que serve de Cobrai-a, e não queirais, pastor divino,
ponto de partida para o texto de Vieira. Perder na vossa ovelha a vossa glória
249
2. (UFRGS) Assinale a alternativa correta a res- vencer-se uma agudeza com outra maior; mas
peito dos textos. contra vontades endurecidas nenhuma coisa
a) Os autores, ao remeterem aos exemplos bí- aproveita a agudeza, antes dana mais, por-
blicos de Jó e da ovelha perdida, elogiam a que quando as setas são mais agudas, tanto
autoridade divina capaz de perdoar os peca- mais facilmente se despontam na pedra. Oh!
dos, mesmo que à custa de sua glória e de Deus nos livre de vontades endurecidas, que
seu discernimento. ainda são piores que as pedras.
b) Jó, de acordo com Vieira, argumenta que há (Sermão da Sexagésima, de Pe. Antônio Vieira.)
tanta glória em perdoar como em não perdo-
ar, enquanto, para Gregório, o perdão conce-
dido ao pecador renitente é a prova da glória 4. (UFSM) A afirmação “um entendimento
de Deus. agudo pode-se ferir pelos mesmos fios e
c) Os autores, ao remeterem aos exemplos bí- vencer-se uma agudeza com outra maior”
blicos de Jó e da ovelha perdida, inibem a confrontada com os versos “[ó Madre Na-
autoridade divina que se vê constrangida a tureza] troca desta alma a fria morbideza/
aceitar os argumentos de dois pecadores. nessa ubérrima seiva soberana”, de Castro
d) Jó, de acordo com Vieira, considera que a Alves, possibilita afirmar:
ocasião e a sorte impediram que a graça di- I. Os dois registros postulam a transfor-
vina se manifestasse, enquanto para Gregó- mação do homem, o primeiro pela fé na
rio a graça divina não sofre restrições. palavra divina, o segundo pela crença na
e) Os autores, ao remeterem aos exemplos bí- força da natureza.
blicos de Jó e da ovelha perdida, reforçam II. Enquanto o primeiro registro afirma a
seus argumentos a favor do perdão como ga- força persuasiva da palavra e da ideia, o
rantia da glória divina. segundo sugere que a fertilidade do am-
biente natural é uma força poderosa que
3. (UFRGS) Considere as seguintes afirmações pode agir sobre a vontade humana.
sobre os dois textos. III. O primeiro autor, barroco, vê a dificul-
I. Tanto Padre Vieira quanto Gregório de dade de moldar certas inteligências, en-
Matos dirigem-se a Deus mediante a se- quanto o segundo enxerga a submissão
gunda pessoa do plural (vós, vos): Gre- da vontade humana diante da natureza.
gório argumenta que o Senhor está em- Está(ão) correta(s):
penhado em perdoá-lo, enquanto Vieira a) apenas I.
dirige-se a Deus (E que fizestes vós...) b) apenas I e III.
para impedir que Jó seja perdoado. c) apenas II e III.
II. Padre Vieira vale-se das palavras e do d) apenas II.
exemplo de Jó, figura do Velho Testamen- e) I, II e III.
to, para argumentar que o homem abu-
sada misericórdia divina ao pecar, e que 5. (UFRGS) Considere as seguintes afirmações
Deus, de acordo com a ocasião e os argu- sobre o padre Antônio Vieira.
mentos fornecidos por Jó, inclina-se para I. Possui um estilo antigongórico, concep-
o castigo no lugar do perdão. tista, caracterizado pela clareza e pelo
III. Tanto Padre Vieira como Gregório de Matos rigor sintático, dialético e lógico.
argumentam sobre a misericórdia e a gló- II. Recusa, como cultista, o elemento ima-
ria divinas: assim como Jó, citado por Viei- gístico, transformando-o em mero ins-
ra, declara que Deus lhe deverá a glória por trumento de convencimento dos fiéis.
tê-lo perdoado; Gregório compara-se à ove- III. Recontextualiza passagens do Evangelho,
lha desgarrada que, se não for recuperada, uma vez que as vincula às ideias que quer
pode pôr a perder a glória de Deus. expressar, explorando a analogia.
Quais estão corretas? Quais estão corretas?
a) Apenas I. a) Apenas I.
b) Apenas III. b) Apenas II.
c) Apenas I e II. c) Apenas I e III.
d) Apenas II e III. d) Apenas II e III.
e) I, II e III. e) I, II e III.
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES
Leia o trecho a seguir. Será porventura o estilo que hoje se usa nos
Por isto são maus ouvintes os de entendimen- púlpitos? Um estilo tão empeçado¹, um estilo
tos agudos. Mas os de vontades endurecidas tão dificultoso, um estilo tão afeta do, um es-
ainda são piores, porque um entendimen- tilo tão encontrado toda a arte e a toda a na-
to agudo pode-se ferir pelos mesmos fios e tureza? Boa razão é também essa. O estilo há
250
de ser muito fácil e muito natural. Por isso que eles fazem, que fazer o que eles dizem.
Cristo comparou o pregar ao semear, porque Ou é porque o sal não salga, e os pregadores
o semear é uma arte que tem mais de nature- se pregam a si e não a Cristo; ou porque a
za que de arte (...) Não fez Deus o céu em xa-
terra se não deixa salgar, e os ouvintes, em
drez de estrelas, como os pregadores fazem o
sermão em xadrez de palavras. Se uma parte vez de servir a Cristo, servem a seus apetites.
está branco, da outra há de estar negro (...) Não e tudo isto verdade? Ainda mal.”
Como hão de ser as palavras? Como as estre- (Pregado em São Luiz do Maranhão, ano de 1654.)
las. As estre las são muito distintas e muito
claras. Assim há de ser o estilo da pregação, Nesse fragmento, não há:
a) organização textual marcada por paralelis-
muito distinto e muito claro.
mos sintáticos.
(Sermão da Sexagésima, Pe. Antonio Vieira)
b) reflexão construída a partir de uma imagem
1. empeçado: com obstáculo, com empecilho. metafórica.
c) intenção moralizante contra a depravação de
costumes.
6. (ESPM) A expressão que traduz a ideia de d) argumentação elogiosa aos evangelizadores.
rebusca mento no estilo é:
a) “púlpitos”.
b) “semear”.
c) “céu”.
E.O. Teste III
d) “xadrez de palavras”.
e) “estrelas”. TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES:
Era ele que erguia casas
7. (ESPM) Assinale a incorreta sobre o texto de Onde antes só havia chão.
Padre Vieira: Como um pássaro sem asas
a) vale-se do estilo conceptista do Barroco, Ele subia com as casas
Que lhe brotavam da mão.
voltando-se para a argumentação e raciocí-
(...)
nio lógicos.
Olhou em torno: gamela
b) ataca duramente os pregadores cultistas, de- Banco, enxerga, caldeirão
vido ao estilo pomposo, de difícil acesso, e Vidro, parede, janela
aos exageros da ornamentação. Casa, cidade, nação!
c) critica o sermão que está preocupado com a Tudo, tudo o que existia
suntuosidade linguística e estilística. Era ele quem o fazia
d) defende a pregação que tenha naturalidade, Ele, um humilde operário
clareza e distinção. Um operário que sabia
e) mostra que, seguindo o exemplo de Cristo, Exercer a profissão.
pregar e semear afetam o estilo, por que am- (Vinícius de Morais, O Operário em Construção)
bas são práticas da natureza.
(...) Em um engenho sois imitadores de Cris-
to crucificado (...) A Paixão de Cristo parte
8. (CFTMG) Sermão de Santo Antônio VOS ESTIS
foi de noite sem dormir, parte do dia sem
SAL TERRAE. SÃO MATEUS, VS. L3
descansar, e tais são as vossas noites e os
“Vós, diz Cristo, Senhor nosso, falando com os
vossos dias. Cristo despido, e vós despidos;
pregadores, sois o sal da terra: e chama-lhes Cristo sem comer, e vós famintos; Cristo em tudo
sal da terra, porque quer que façam na terra, maltratado, e vós maltratados em tudo. (...)
o que faz o sal. O efeito do sal e impedir a (Padre Vieira, Sermão XIV do Rosário)
corrupção; mas quando a terra se vê tão cor-
rupta como esta a nossa, havendo tantos nela
1. (ESPM) Sabendo-se que o texto do Padre
que tem oficio de sal, qual será, ou qual pode
Vieira é representativo da estética barroca,
ser a causa desta corrupção? Ou é porque o assinale a opção que contenha dado não con-
sal não salga, ou porque a terra se não deixa dizente com o período literário em questão:
salgar. Ou é porque o sal não salga, e os pre- a) O fragmento apresenta anáforas, ou seja, repe-
gadores não pregam a verdadeira doutrina; tição de palavras no início de frases ou orações.
ou porque a terra se não deixa salgar, e os ou- b) Há presença de ideias antitéticas.
c) A religiosidade é marcante na citação da fi-
vintes, sendo verdadeira a doutrina que lhes
gura divina.
dão, a não querem receber. Ou é porque o sal
d) O estilo conceptista – argumentativo, dis-
não salga, e os pregadores dizem uma cousa sertativo – está evidente no excerto.
e fazem outra; ou porque a terra se não deixa e) A imagem grotesca, apelante ao feio, apare-
salgar, e os ouvintes querem antes imitar o ce nas figuras de Cristo e do escravo.
251
2. (ESPM) Vieira e Vinícius, autores de épocas se foi torcendo do meio para cima, ficando o
diferentes, comparam Cristo ao trabalhador. pé imóvel, até que os braços se puseram de
Marque a opção que contenha afirmação norte a sul, abertos para os que pelejavam.
INADEQUADA em relação a seus textos: (Padre Vieira, Cartas do Brasil, p. 91.)
a) Vinícius enaltece o trabalho braçal e menos-
preza o lado intelectual da figura divina. O trecho apresentado faz parte de uma carta
b) Vinícius e Vieira exaltam o trabalho árduo que o Padre Vieira escreveu para seu supe-
respectivamente do operário e do escravo. rior em Lisboa, quando estava no Brasil, du-
c) A figura divina de Cristo é invocada por am- rante a primeira invasão holandesa ocorrida
bos os autores; ela faz analogia com o traba- na Bahia em 1624.
lhador comum.
d) O primeiro texto exalta o trabalho do ope- 1. Como Vieira caracteriza os holandeses?
rário, tratando-o como um fazedor de mila-
gres, a exemplo de Cristo; o segundo ressalta 2. Qual a visão de mundo de Vieira, naquele
a situação de sofrimento do cativo. contexto histórico, em relação à providência
e) Apesar de religioso, o padre Vieira dá ênfase divina na luta entre o invasor e as pessoas
a uma questão social: as mazelas oriundas da terra? Responda utilizando algum exem-
do sistema escravocrata. plo do texto.

3. (UFLavras) Assinale a alternativa CORRETA a 3. Vieira escreveu também um famoso sermão,


respeito do Padre Antônio Vieira: em 1640, exortando os portugueses a lutar
a) Em função de seu zelo para com Deus, utili- contra os holandeses, diante da iminente
zava-o para justificar todos os acontecimen- chegada à Bahia de uma esquadra invasora.
tos políticos e sociais. Aqui vai um pequeno trecho desse sermão:
b) Dada sua espiritualidade, demonstrava de- “Não hei de pedir pedindo, senão protestan-
sinteresse por assuntos mundanos. do e argumentando; pois esta é a licença e
c) Procurava adequar os textos bíblicos às rea- liberdade que tem quem não pede favor, se-
lidades de que tratava. não justiça. Se a causa fora só nossa, e eu
d) Mostrou-se tímido diante dos interesses dos viera a rogar só por nosso remédio, pedira
poderosos. favor e misericórdia. Mas como a causa, Se-
e) Embora vivesse no Brasil, por sua formação nhor, é mais vossa que nossa, e como venho a
lusitana, não se ocupou de problemas locais. requerer por parte de vossa honra e glória, e
pelo crédito de vosso nome – Propter nomem
4. (FEI) Podemos reconhecer neste trecho do tuum – razão é que peça só razão, justo é que
Padre Antônio Vieira: peça só justiça”.
a) O caráter argumentativo típico do estilo bar- (Fundação Biblioteca Nacional.)
roco (século XVII).
b) A pureza de linguagem e o estilo rebuscado a) Como ficou conhecido esse sermão?
do escritor árcade (século XVIII). b) A quem se dirige Vieira nesse trecho do ser-
c) Uma visão de mundo centrada no homem, mão? Justifique com algum exemplo do tex-
própria da época romântica (princípio do sé- to apresentado.
culo XIX).
d) O racionalismo comum dos escritores da es- 4. O trigo que semeou o pregador evangélico,
cola realista (final do século XIX). diz Cristo que é a palavra de Deus. Os espi-
e) A consciência da destruição da natureza nhos, as pedras, o caminho e a terra boa, em
pelo homem, típica de um escritor moderno
que o trigo caiu, são os diversos corações dos
(século XX).
homens. Os espinhos são os corações embara-
çados com cuidados, com riquezas, com delí-
E.O. Dissestativo cias; e nestes afoga-se a palavra de Deus. As
pedras são os corações duros e obstinados; e
nestes seca-se a palavra de Deus, e se nasce,
TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES não cria raízes. Os caminhos são os corações
Tinham eles (os holandeses) saído na ilha de
inquietos e perturbados com a passagem e
Itaparica, fronteira à Bahia, e aqui, levados
tropel das coisas do mundo, umas que vão,
de furor herético, deram muitos golpes numa
cruz que à porta de uma ermida estava arvo- outras que vêm, outras que atravessam, e to-
rada. Tornando poucos dias depois, os nossos, das passam; e nestes é pisada a palavra de
como era costume, os esperaram, e, encon- Deus, porque ou a desatendem, ou a despre-
trando com eles ao saltar em terra, a cruz, zam. Finalmente, a terra boa são os corações
que antes estendia os braços de leste a oeste, bons, ou os homens de bom coração; e nestes
252
prende e frutifica a palavra divina, com tan- no verão cobertas de pó: dá um pé-de-vento,
ta fecundidade e abundância, que se colhe levanta-se o pó no ar e que faz? O que fa-
cento por um... zem os vivos, e muito vivos. NÃO AQUIETA O
(Padre Vieira, Sermão da Sexagésima) PÓ, NEM PODE ESTAR QUEDO: ANDA, CORRE,
VOA; ENTRA POR ESTA RUA, SAI POR AQUE-
Pode-se dizer que os sermões de Vieira re- LA; JÁ VAI ADIANTE, JÁ TORNA ATRÁS; TUDO
vestem-se de um jogo intelectual no qual se ENCHE, TUDO COBRE, TUDO ENVOLVE, TUDO
vê o prazer estético do autor para pregar a PERTURBA, TUDO TOMA, TUDO CEGA, TUDO
palavra de Deus, por meio de uma linguagem PENETRA, EM TUDO E POR TUDO SE METE,
altamente elaborada. SEM AQUIETAR NEM SOSSEGAR UM MOMENTO,
Explique que comparação conduz o fio argu- ENQUANTO O VENTO DURA. Acalmou o vento:
mentativo do Padre Vieira neste trecho. cai o pó, e onde o vento parou, ali fica; ou
dentro de casa, ou na rua, ou em cima de um
5. (Fuvest) Dê argumentos que permitam con- telhado, ou no mar, ou no rio, ou no monte,
siderar o Padre Antônio Vieira como um ex- ou na campanha. Não é assim? Assim é.
poente tanto da Literatura Portuguesa quan- (VIEIRA, Antônio. Trecho do Cap. V do Sermão da Quarta-
to da Literatura Brasileira. Feira de Cinza. Apud: Sermões de Padre Antônio Vieira. São
Paulo: Núcleo, 1994, p.123-124.)
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
1. Hic jacet: aqui jaz.
Navegava Alexandre em uma poderosa arma-
da pelo Mar Eritreu a conquistar a Índia, e
como fosse trazido à sua presença um pirata (UFSCar) Em Padre Vieira fundem-se a for-
que por ali andava roubando os pescadores, mação jesuítica e a estética barroca, que se
repreendeu-o muito Alexandre de andar em materializam em sermões considerados a
tão mau ofício; porém, ele, que não era me- expressão máxima do Barroco em prosa reli-
droso nem lerdo, respondeu assim: – Basta, giosa em língua portuguesa, e uma das mais
senhor, que eu, porque roubo em uma barca, importantes expressões ideológicas e literá-
sou ladrão, e vós, porque roubais em uma rias da Contrarreforma.
armada, sois imperador? – Assim é. O roubar
pouco é culpa, o roubar muito é grandeza;
2
o roubar com pouco poder faz os piratas, o 7. Comente os recursos de linguagem que con-
roubar com muito, os 1Alexandres. Mas Sê- ferem ao texto características do Barroco.
neca, que sabia bem distinguir as qualida-
des e interpretar as significações, a uns e 8. (UFSCar) Antes de iniciar sua pregação,
outros definiu com o mesmo nome: “Eodem Vieira fundamenta-se num argumento que,
loco pone latronem et piratam, quo regem do ponto de vista religioso, mostra-se incon-
animum latronis et piratae habentem”. Se o testável. Transcreva esse argumento.
Rei de Macedônia, ou qualquer outro, fizer o Segundo o “Novo Dicionário Aurélio Básico da
que faz o ladrão e o pirata, o ladrão, o pirata Língua Portuguesa”, “sermão” é um “discur-
e o rei, todos têm o mesmo lugar, e merecem
so religioso geralmente pregado no púlpito”.
o mesmo nome.
(Fragmento do Sermão do bom ladrão, de Pe. Antonio Vieira)
9. De que forma o autor reproduz, no texto escri-
to, características próprias do discurso falado?
6. (PUC-RJ) Uma das mais importantes carac-
terísticas da obra do Padre Antonio Vieira 1
0. O texto apresenta uma relação de oposição
refere-se à presença constante em seus ser- entre estaticidade e movimento. Indique, no
mões das dimensões social e política, soma- trecho destacado em maiúsculo, qual dessas
das à religiosa. Comente esta afirmativa em ideias é abordada e a forma de construção de
função do texto apresentado. período utilizada para exprimi-la.
TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES
Ora, suposto que já somos pó, e não pode dei-
xar de ser, pois Deus o disse, perguntarme-eis, Gabarito
e com muita razão, em que nos distinguimos
logo os vivos dos mortos? Os mortos são pó,
nós também somos pó: em que nos distingui-
mos uns dos outros? Distinguimo-nos os vivos
dos mortos, assim como se distingue o pó do
E.O. Teste I
pó. Os vivos são pó levantado, os mortos são 1. C 2. A 3. B 4. E 5. E
pó caído, os vivos são pó que anda, os mortos
são pó que jaz: Hic jacet1. Estão essas praças 6. E 7. E 8. E 9. A 10. C

253
E.O. Teste II mundo antigo, com a do pirata saqueador
mostram uma crítica aos valores morais e
1. C 2. E 3. B 4. C a visão ideológica do autor.
5. C 6. D 7. E 8. D 4. Na alegoria do Padre Antônio Vieira, a com-
paração, ou melhor, a metáfora básica, que
sustenta todo o desenvolvimento do trecho e
as demais comparações, é aquela extraída do
E.O. Teste III texto bíblico e usada como epígrafe do ser-
1. D 2. A 3. C 4. A mão: “Semen est verbum Dei” − “a palavra
de Deus é semente”.

5.
Vieira passou a maior parte de sua vida en-
tre Portugal, onde nasceu, e Brasil. Tanto lá
E.O. Dissertativo como aqui compôs textos de fina retórica,
1.
Na carta, Vieira caracteriza os holandeses tratando de temas que interessavam à colô-
como hereges e iconoclastas. nia e à metrópole.

2.
A contextualização histórica da carta de 6.
Há no texto um bom exemplo da preocupa-
Vieira deve levar em conta dois dados im- ção do Padre Antonio Vieira com temas de
portantes: a disputa militar que opunha Ho- caráter social e de dimensão política. A apro-
landa a Portugal e a luta da Igreja Católica ximação e a comparação da figura de Alexan-
(representada por Portugal) contra o Protes- dre Magno, grande conquistador do mundo
tantismo (representado pela Holanda). Da antigo, com a do pirata saqueador mostram
perspectiva de Vieira, os interesses de Por- uma crítica aos valores morais e a visão ide-
tugal coincidiam com os da Igreja, por isso a ológica do autor.
providência divina agiria em favor de brasi-
7.
O Barroco é o movimento marcado pela opo-
leiros e portugueses. No texto, a ação da pro-
sição de ideias; assim, no poema encontram-
vidência se mostra no milagre que se opera
-se antíteses (“pó levantado”/ “pó caído”;
na cruz: agredida pelos holandeses (“deram
paradoxos (“Distinguimo-nos os vícios dos
muitos golpes numa cruz”), ela se move so-
mortos, assim como se distingue o pó do
zinha (“a cruz [...] se foi torcendo do meio
pó”); anáforas (pronome indefinido “tudo”)
para cima, ficando o pé imóvel”).
polissíndetos (ou) e outros.
3.
a) Trata-se do “Sermão pelo Bom Sucesso das 8.
O argumento é: “Ora, pressuposto que já so-
Armas de Portugal contra as de Holanda”. mos pó, e não pode deixar de ser, pois Deus
o disse”...
b) O autor se dirige a Deus, como porta-voz
da religião católica, a única que, para ele, 9.
O sermão aponta características do discurso
tinha legitimidade para representar a von- falado, pois faz:
tade de Deus. O sermonista pede ajuda na − o uso da primeira pessoa do plural (nós)
luta contra os holandeses, associados ao − o uso do termo “ora”
protestantismo. A referência mais direta − o uso de pronomes demonstrativos: “entra
ao interlocutor aparece no vocativo “Se- por esta rua, sai por aquela...”
nhor” da seguinte passagem: “Mas como a − uso de interrogações, criando uma inter-
causa, Senhor, é mais vossa que nossa (...)”. locução.
Há no texto um bom exemplo da preocu-
pação do Padre Antonio Vieira com temas 10. Há uma apresentação dinâmica dos fatos
de caráter social e de dimensão política. A pelo emprego dos verbos de ações (movi-
aproximação e a comparação da figura de mento). Orações coordenadas criam a ideia
Alexandre Magno, grande conquistador do de rapidez.

254
© Friedrich August von Kaulbach/Wikimedia Commons

(Portugal)
Arcadismo / Bocage
Aulas 15 e 16
O século das luzes
Disponível em: <http://vignette2.wikia.nocookie.net>

O século XVIII foi palco de uma série de transformações culturais e sociopolíticas na Europa: ascensão da burguesia
e decadência da aristocracia; ruptura definitiva com o mundo medieval; nascimento do Iluminismo.
Para acompanhar o desenvolvimento das grandes nações europeias e satisfazer os interesses da burguesia,
Portugal empreendeu diversas reformas econômicas, políticas, culturais e educacionais.
As manifestações da estética arcádica tiveram início no Brasil na segunda metade do século XVIII. A ativida-
de mineradora – já intensa desde 1700 – determinara mudanças na organização e na dinâmica da vida brasileira.
Houve um aumento considerável na circulação de mercadorias e dinamização das regiões que abasteciam com
gado as Minas Gerais (Sul e Nordeste).
Vila Rica, atual Ouro Preto, tornou-se centro eco- © Carlos Julião/Wikimedia Common

nômico e gerador de cultura, e o Rio de Janeiro transfor-


mou-se em polo de produção e divulgação de ideias na
Colônia, substituindo Salvador.
A descoberta do ouro em Minas Gerais coinci-
diu com o declínio da lavoura da cana-de-açúcar, e o
deslocamento do centro econômico do Nordeste para a
região mineira provocou importantes mudanças sociais.
Uma delas foi a substituição da vida rural pela urbana.
Formou-se uma camada média da população
influenciada pelos ideais burgueses. A atividade mine-
radora, explorada pelos portugueses e mantenedora da
riqueza de Portugal, foi a responsável pela “derrama”,
precursora do movimento da Inconfidência.
A “derrama” era a cobrança imediata e única de
impostos determinada pela Corte portuguesa à Colônia,
Extração de diamantes. Aquarela, 1776, Carlos Julião.
referente à extração de ouro.
257
Com o crescimento das cidades, apareceu no Brasil o trabalho não escravo, desvinculado das atividades agrí-
colas e da mineração. Eram artesãos, burocratas, profissionais liberais, literatos – esboço de uma classe média que,
disposta a defender seus próprios interesses, adotou a ideologia liberal burguesa vinda da França: o Iluminismo. A
difusão do pensamento iluminista – que apregoava a liberdade de propriedade e a igualdade de poderes, criticando
o Estado absolutista – tinha como palavras de ordem: liberdade, igualdade, fraternidade. Em 1789, esse espírito
culminou na Revolução Francesa, que modificou o conceito de classe social elevando os burgueses ao topo do
poder.

Arcadismo
A partir da segunda metade do século XVIII, ao lado das profundas transformações sociais e econômicas que anun-
ciavam revoluções intelectuais nas sociedades europeias, desenvolve-se um novo estilo literário, o arcadismo, que
propunha uma volta à natureza, à vida simples do campo em reverência ao bucolismo.
Opondo-se aos dilemas, exageros e rebuscamentos do Barroco, o Arcadismo retornou aos modelos greco-
-latinos e à sua mitologia em busca de simplicidade e harmonia.
A palavra arcadismo foi inspirada em Arcádia, uma lendária região grega habitada por pastores que cultiva-
vam a poesia e a música, viviam de modo simples e espontâneo e celebravam o amor e a natureza.
Os poetas do arcadismo adotavam pseudônimos pastoris em homenagem à vida simples dos pastores da
Arcádia, que viviam em comunhão com a natureza. Em decorrência dessa retomada dos modelos clássicos, o Ar-
cadismo foi chamado também de Neoclassicismo, um novo Classicismo.
De origem italiana, o arcadismo foi inaugurado com a fundação da Arcádia Romana, em 1690, com a
finalidade de combater o Barroco. Da Itália difundiu-se para outros países, inclusive Portugal, e da Metrópole por-
tuguesa passou à Colônia. Em Portugal, a data inicial do Arcadismo é 1756, ano da fundação da Arcádia Lusitana,
encerrada em 1825, ano da publicação do poema Camões, de Almeida Garrett, que deu início ao Romantismo.

Arcadismo em Portugal
© Husond/Wikimedia Common

Depois que a nação portuguesa alcançou o


apogeu, entre os séculos XV e XVI, o país viveu
um período de declínio político, econômico e
cultural que se estendeu por todo o século XVII.
Com a chegada das ideias iluministas no século
XVII, contudo, Portugal renovou-se e moderni-
zou-se. Na literatura, a figura mais expressiva
foi Manuel Maria Du Bocage, um dos me-
lhores poetas portugueses de todos os tempos.
Ao chegarem a Portugal, nas primei-
ras décadas do século XVIII, as ideias ilumi-
nistas entusiasmaram intelectuais, artistas e
Palácio de Queluz, onde vivia a família real portuguesa, durante o verão (século XVIII). até mesmo o rei D. João V e seu sucessor,
D. José I, que desejavam modernizar o país.
Um projeto de reformas políticas, econômicas, educacionais e culturais voltado tanto a satisfazer os inte-
resses da burguesia mercantil e colonialista quanto a equiparar Portugal novamente às grandes nações europeias,
foi posto em prática. À frente desse projeto esteve (na condição de ministro e com amplos poderes) o Marquês de
Pombal, também adepto das ideias iluministas.
258
Iluminismo português
Pombal e Verney: a missão de racionalizar Portugal
Pombal contou com o apoio de diversos intelectuais e cientistas portugueses com formação estrangeira. Nesse
grupo destacou-se o padre Luis Antônio Verney, cujo projeto de reforma pedagógica, aplicado parcialmente por
Pombal, mudou de modo significativo o cenário científico português.
As ideias de Verney foram expostas na obra o “Verdadeiro método de estudar”, publicada em 1746. Nela,
o escritor ataca a orientação que os jesuítas davam à educação e condena a arte de Camões, em cujas antíteses
via traços da estética barroca.
Essas críticas deram origem a um amplo debate sobre a necessidade de renovar a cultura portuguesa. Em
torno da questão estética da literatura, foram publicados inúmeros tratados, envolvendo temas como o belo e a
verdade na arte. Em decorrência desse período de efervescência cultural, foi fundada a Arcádia Lusitana, em 1756,
considerada o marco introdutório do Arcadismo em Portugal.

Arcádias
As Arcádias eram academias literárias,

© Thomas Cole/Wikimedia Common


espécies de agremiações que tinham por
objetivo promover debates permanentes
sobre a criação artística, avaliar critica-
mente a produção de seus filiados e fa-
cilitar a publicação de suas obras.
Portugal contou com duas im-
portantes academias árcades: a Arcá-
dia Lusitana, que efetivamente deu
início ao movimento árcade em Por-
tugal, e a Nova Arcádia (1790), que
contou com o maior poeta português
Sonho de Arcádia. Óleo sobre tela. Thomas Cole, 1838.
do século XVIII: Bocage.
O gênero literário predominante durante o Arcadismo português foi a poesia, embora tenha havido criação
em todos os gêneros. Apesar da vasta produção do período, poucas são as obras que hoje interessam ao leitor
moderno, particularmente ao leitor brasileiro.

Manuel Maria Barbosa du Bocage


Cronologia biográfica
1765 – Nasceu em Setúbal, Portugal, Manuel Maria Du Bocage.
1775 – Morte de sua mãe.
1781 – Fugiu de casa e tornou-se soldado.
1783 – Mudou-se para Lisboa, onde se engajou na Armada Real Portuguesa e participou da vida boêmia
da cidade.
1786 – Depois de uma viagem em que passou pelo Brasil, chegou a Goa, na Índia, uma das colônias
portuguesas.
1790 – Voltou para Portugal.
259
1791 – Foi convidado para participar da quem o poeta dedica muitos versos, o que leva a crer que
Nova Arcádia. tenha sido ela o grande amor de sua vida. Idílios marítimos,
1797 – Depois de preso sucessivamente, foi li- Rimas (três volumes) e Parnaso bocagiano reúnem a pro-
bertado e transferido para o Convento do Ora- dução literária de Bocage. Os sonetos da obra Rimas são
torianos, onde foi, aparentemente, levado ao o ponto alto de sua produção, comparável a de Camões. A
abandono da irreverência. solidão, a desilusão amorosa, o sentimento de desamparo
1799 – Publicou sua segunda obra de poesias, e a dor de viver contagiaram de tal maneira sua poesia que
também com o título de Rimas. ela acabou se afastando da estética árcade – racional e
pouco dramática – para se enveredar pelo campo dramá-
1804 – Publicação de uma terceira série de Ri-
tico e confessional, fato que inseriu Bocage num contexto
mas, com apoio e elogios da marquesa de Alo-
pré-romântico.
ma, que passou a protegê-lo.
1805 – Morreu em 21 de dezembro, como Magro, de olhos azuis, carão moreno,
tradutor. Bem servido de pés, meão de altura,
Disponível em: <http://quadrogiz.blogspot.com.br>
Triste de facha, mesmo de figura,
Nariz alto no meio e não pequeno;
.................................................................
Devoto incensador de mil deidades
(Digo, de moças mil) num só momento,
E somente no altar amando os frades.
Hermâni Cidade. Bocage – a obra e o homem. 3. ed.
Lisboa: Arcádia, 1978. p. 25-26.
deidade: deusa
facha: rosto
meão: mediano

Nesses versos, o poeta procura descrever a si


mesmo. Neles, fica um aspecto marcante da vida e da
Manuel Maria Barbosa du Bocage obra do autor: “Devoto incensador de mil deidades”,
isto é, bajulador ou conquistador de mil moças.
A trajetória de vida do poeta português Bocage (1765-
Além das inúmeras experiências amorosas,
1805) foi muito parecida com a de Camões. Envolveu-
-se em polêmicas e em aventuras, dedicou-se à vida bo- Bocage também viveu aventuras nas colônias portugue-
êmia, cultivou grandes amores e ingressou na carreira sas da Índia (Goa) e da China (Macau). Como o au-
militar, mas desertou e fugiu para a China. tor de Os Lusíadas, Bocage também se incorporou em
Bocage passou para a história da literatura portugue- companhias militares, lutou na guerra, naufragou, amou
sa como um poeta erótico, embora sua poesia lírica árcade muitas mulheres, foi preso e morreu na miséria. Cons-
seja superior. A Rimas, de 1791, valeu-lhe o convite para a ciente dessas coincidências, Bocage perseguia o modelo
Nova Arcádia, onde usava o pseudônimo Elmano Sadino da vida e da obra de seu mestre.
(Elmano é um anagrama de Manoel, e Sadino é relativo ao rio Camões, grande Camões, quão semelhante
Sado, que corta a cidade de Setúbal, onde o escritor nasceu). Acho teu fado ao meu, quando os cotejo!
Sua produção literária revela a ânsia pelo locus .................................................................
amoenus, que simboliza a fuga da vida citadina (fugere ur- Modelo meu tu és... Mas, oh tristeza!...
bem). Prende-se aos valores literários do Arcadismo, cuja Se te imito nos transes da Ventura,
presença feminina é marcante com constantes citações de Não te imito nos dons da natureza.
Marílias, Ritálias, Márcias, Gertrúrias. Há estudiosos que Hermâni Cidade. Ob. Cit., p. 149.
apontam Maria Margarida Rita Constâncio Alves como a fado: sorte, destino
grande paixão do poeta e a quem são atribuídos os dois ventura: sorte, destinho

primeiros pseudônimos pastoris: Marília e Ritália. Outra fi- Foi na lírica, em especial nos sonetos, que Boca-
gura muito presente em sua obra é Gertrúria, na verdade, ge atingiu o ponto alto de sua obra, embora também
Gertrudes Homem de Noronha, conterrânea de Setúbal e a tenha se destacado como poeta satírico e erótico.
260
Bocage e a transição habitado também pelo eu-lírico, num gesto de total de-
sespero e descontrole emocional.
Bocage é considerado o melhor escritor português do O poema compõe um painel oposto ao universo
século XVIII. Ao lado de Camões e de Antero de Quen- claro e equilibrado do Arcadismo. Em vez do equilíbrio,
tal, é um dos três maiores sonetistas de toda a litera- o pessimismo e a morte como saída para a angústia de
tura portuguesa. Contudo, o título de melhor escritor viver; em vez de racionalismo, o predomínio absoluto da
da época não significa que Bocage tenha sido o mais emoção; em vez de objetividade, o subjetivismo.
perfeito árcade, papel que talvez caiba a Filinto Elísio.
Nascemos para amar: a Humanidade
A importância conferida à obra de Bocage advém prin-
Vai, tarde ou cedo, aos laços da ternura.
cipalmente da tradução do momento transitório em Tu és doce atrativo, oh formosura,
que o escritor viveu, um período marcado por mudan- Que encanta, que seduz, que persuade.
ças profundas, como a Revolução Francesa (1789) e o
florescimento do Romantismo. Na totalidade, sua obra Enleia-se por gosto a liberdade;
não é árcade nem romântica. É uma obra de transição, E depois que a paixão na alma se apura,
Alguns então lhe chamam desventura,
que apresenta simultaneamente aspectos de ambos os
Chamam-lhe alguns então felicidade.
movimentos literários.
A fase inicial da poesia de Bocage é marcada Qual se abisma nas lôbregas tristezas,
por formas e temas próprios do Arcadismo: ambiente Qual em suaves júbilos discorre,
bucólico – o fugere urbem –, o ideal de vida simples e Com esperanças mil na ideia acesas.
alegre – aurea mediocritas –, a simplicidade e a clareza
Amor ou desfalece, ou para, ou corre;
das ideias e da linguagem etc. E, segundo as diversas naturezas,
Oh retrato da morte, oh noite amiga Um porfia, este esqueceu, aquele morre.
Por cuja escuridão suspiro há tanto! Hermâni Cidade. Ob. Cit., p. 144.

Calada testemunha do meu pranto, desventura: infelicidade


enlear: atar, prender
De meus desgostos secretária antiga! lôbrego: sombrio, escuro, funesto
porfiar: insistir
Pois manda Amor que a ti somente os diga,
Dá-lhes agasalho no teu manto;
Meu ser evaporei na lida insana
Ouve-se, como costumas, ouve, enquanto
Do tropel das paixões que me arrastava;
Dorme a cruel, que a delirar me obriga.
Ah! Cego eu cria, ah! mísero eu sonhava
E vós, oh cortesãos da escuridade, Em mim quase imortal a essência humana.
Fantasmas vagos, mochos piadores,
De que inúmeros sóis a mente ufana
Inimigos, como eu, da claridade!
Existência falaz me não dourava!
Em bandos acudi aos meus clamores; Mas eis sucumbe a natureza, escrava
Quero a vossa medonha sociedade, Do mal que a vida em sua origem dana.
Quero fartar meu coração de horrores.
Prazeres, sócios meus e meus tiranos!
Hermâni Cidade. Ob. Cit., p.141-142.
Esta alma que sedenta em si não coube,
Mocho: coruja No abismo vos sumiu desenganos.
Pio: piedoso
Observe que não há aqui o convencionalismo Deus, oh Deus!... Quando a morte à luz me roube,
amoroso e o racionalismo dos árcades. O eu-lírico, não Ganhe um momento o que perderam anos,
correspondido pela “cruel” amada, fala abertamente de Saiba morrer o que viver não soube.
seus sentimentos em relações à morte, compondo um Hernâni Cidade. Ob. Cit., p. 113.
falaz: enganoso
quadro macabro. Quadro esse completado pelos demais
lida: luta
“membros” da corte noturna – corujas, fantasmas – e ufano: orgulhoso
261
Já Bocage não sou!... À cova escura
Meu estro vai parar, desfeito em vento... Dicas!
Eu aos Céus ultrajei! O meu tormento
Leve me torne sempre a terra dura. §§ Valorização da vida no campo (bucolismo)
§§ Crítica à vida urbana
Conheço agora já quão vã figura §§ Objetividade
Em prosa e verso fez meu louco intento. §§ Idealização da mulher amada
Musa!... Tivera algum merecimento, §§ Inutilia truncat (cortar o inútil)
Se um raio de razão seguisse pura! §§ Locus amoenus (lugar agradável)
Eu me arrependo. A língua quase fria §§ Convencionalismo amoroso
Brade em alto pregão à mocidade §§ Aurea mediocritas (mediocridade áurea ou
Que atrás do som fantástico corria: ouro medíocre)
§§ Linguagem simples
– Outro Aretino fui... A santidade §§ Emprego frequente de pseudônimos
Manchei!... Oh! Se me cresce, gente ímpia, §§ Pastoralismo
Rasga meus versos, crê na eternidade!
Aretino: poeta satírico italiano
estro: inspiração, imaginação
ímpio: impiedoso, cruel

262
E.O. Teste I 3. Pode-se afirmar que se destaca no poema:
a) o racionalismo, característica do Barroco.
b) o conceptismo, característica do Arcadismo.
1. “Sobre Bocage, sabemos que foi um ho-
mem situado entre dois mundos, entre as c) o cultismo, característica do Barroco.
regras rígidas de um Arcadismo decadente, d) o teocentrismo, característica do Barroco.
refletindo um mundo racional, ordenado e e) o pastoralismo, característica do Arcadismo.
concreto, e a liberdade de um Romantismo
ascendente, quando a literatura se abre à in- 4. “É o período que caracteriza principalmente
dividualidade e à renovação”. a segunda metade do século XVIII, tingindo
(www.lpm-editores.com.br – 03.09.11)
as artes de uma nova tonalidade burguesa.
O comentário acima nos permite concluir Vive-se o Século das Luzes, o Iluminismo
que Bocage sofreu a violência simbólica burguês, que prepara o caminho para a Re-
quando uma regra pastoril e neoclássica, volução Francesa.”
disfarçada de gosto e verdade inquestioná- O texto acima refere-se ao:
veis, impediu parcialmente a expressão de
a) Romantismo.
sua liberdade criadora. Interprete os versos
abaixo e assinale os que tematizam a resis- b) Simbolismo.
tência a tal regra. c) Barroco.
a) Só eu (tirano Amor! tirana Sorte!) d) Realismo.
Só eu por Nise ingrata aborrecido e) Arcadismo.
Para ter fim meu pranto espero a morte.
b) Ó trevas, que enlutais a Natureza, 5. Associe os movimentos literários aos seus
Longos ciprestes desta selva anosa,
respectivos exemplos.
Mochos de voz sinistra e lamentosa,
Que dissolveis dos fados a incerteza; (1) Barroco
c) Das terras a pior tu és, ó Goa, (2) Arcadismo
Tu pareces mais ermo que cidade, ( ) “Pequei, Senhor, mas não porque hei pe-
Mas alojas em ti maior vaidade cado
Que Londres, que Paris ou que Lisboa. Da vossa Alta piedade me despido Porque
d) Ó retrato da Morte! Ó Noite amiga, quanto mais tenho delinquido
Por cuja escuridão suspiro há tanto!
Vos tenho a perdoar mais empenhado.”
Calada testemunha de meu pranto,
De meus desgostos secretária antiga! ( ) Em lugar delicioso e triste, Cansada de vi-
e) Razão, de que me serve o teu socorro ver, tinha escolhido Para morrer a mísera
Mandas-me não amar, eu ardo, eu amo; Lindóia.
Dizes-me que sossegue: eu peno, eu morro. Lá reclinada, como que dormia,
Na branda relva e nas mimosas flores, ...”
TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES ( ) “Nasce o sol, e não dura mais que um dia,
“Eu, Marília, não sou algum vaqueiro,
Depois da luz se segue a noite escura,
Que viva de guardar alheio gado;
De tosco trato, de expressões grosseiro, Em tristes sombras nasce a formosura,
Dos frios gelo e dos sóis queimado. Em contínuas tristezas, a alegria.”
Tenho próprio casal e nele assisto; ( ) “Ah! minha Bela, se a Fortuna volta,
Dá-me vinho, legume, fruta, azeite; Se o bem, que já perdi, alcanço e provo;
Das brancas ovelhinhas tiro o leite, Por essas brancas mãos, por essas faces
E mais as finas lãs de que me visto. Te juro renascer um homem novo
Graças, Marília bela,
Amar no céu a Jove e a ti na terra.”
Graças à minha estrela!
( ) “Neste mundo é mais rico, o que mais
(fredb.sites.uol.com.br/lusdecam.htm, adaptado)
rapa:
Quem mais limpo se faz, tem mais carepa:
2. A análise do trecho permite afirmar que o Com sua língua ao nobre o vil decepa:
eu-lírico: O Velhaco maior sempre tem capa. “
a) valoriza os trajes ricos da cidade.
A sequência encontrada foi:
b) despreza a vida humilde.
a) 1, 2, 1, 2, 1.
c) manifesta preocupação religiosa.
d) valoriza os benefícios de sua vida no campo. b) 1, 1, 2, 1, 2.
e) apresenta a vida na cidade como mais dese- c) 1, 2, 1, 2, 2.
jável do que a vida no campo. d) 2, 2, 1, 1, 2.
263
TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES 9. Coloque no parêntese B ou A conforme a ca-
Leia o poema de Bocage para responder às racterística seja do Barroco ou do Arcadismo.
questões. ( ) predominância da ordem inversa
Olha, Marília, as flautas dos pastores ( ) expressão de sentimentos universais e
Que bem que soam, como estão cadentes! não individuais
Olha o Tejo a sorrir-se! Olha, não sentes ( ) utilização de vocabulário simples
( ) grande número de antíteses
Os Zéfiros brincar por entre flores?
( ) preferência por temas religiosos
A sequência correta é:
Vê como ali, beijando-se, os Amores a) A, A, B, B, B.
Incitam nossos ósculos ardentes! b) A, B, B, A, B.
Ei-las de planta em planta as inocentes, c) B, A, B, A, B.
As vagas borboletas de mil cores. d) A, A, A, B, B.
e) B, A, A, B, B.
Naquele arbusto o rouxinol suspira,
Ora nas folhas a abelhinha para, 10. Leia:
Ora nos ares, sussurrando, gira: Eu quero uma casa no campo
onde eu possa ficar do tamanho da paz e te-
Que alegre campo! Que manhã tão clara! nha somente a certeza dos limites do corpo
Mas ah! Tudo o que vês, se eu te não vira, e nada mais
Mais tristeza que a morte me causara. Eu quero carneiros e cabras pastando solenes
no meu jardim
6. (Unifesp)A descrição que o eu-lírico faz do (Tavito e Zé Rodrix)

ambiente é uma forma de mostrar à amada O fragmento anterior, extraído de uma can-
que o amor: ção popular, aborda um tema muito comum
a) acaba quando a morte chega. à poesia de certa época literária no Brasil.
b) tem pouca relação com a natureza. Após identificá-la, marque a opção não con-
c) deve ser idealizado, mas não realizado. dizente com o período da Literatura a que a
d) traz as tristezas e a morte. letra nos remete:
e) é inspirado por tudo o que os rodeia. a) Ao campo me recolho e reconheço
Que não há maior bem que a soledade.
7. (Unifesp) O emprego de “Mas”, na última b) Mas morreste sem lutas, sem protestos,
Sem um grito sequer!
estrofe do poema, permite entender que:
Como a ovelha no altar, como a criança
a) todo o belo cenário só tem tais qualidades se
No ventre da mulher!
a mulher amada fizer parte dele.
c) Tenho próprio casal e nele assisto;
b) a ausência da mulher amada pode levar o dá-me vinho, legume, fruta, azeite;
eu-lírico à morte. das brancas ovelhinhas tiro o leite
c) a morte é uma forma de o eu-lírico deixar de e mais as finas lãs de que me visto.
sofrer pela mulher amada. d) Sou pastor, não te nego; os meus montados
d) a mulher amada morreu e, por essa razão, o São esses que aí vês; vivo contente
eu-lírico sofre. Ao trazer entre a relva florescente
e) o eu-lírico sofre toda manhã pela ausência A doce companhia dos meus gados.
da mulher amada. e) Aquele pastor amante,
Que nas úmidas ribeiras
Desse cristalino rio
8. Leia os versos abaixo:
Guiava as brancas ovelhas
“Se não tivermos lãs e peles finas, podem mui
bem cobrir as carnes nossas as peles dos cordei-
ros mal curtidas, e os panos feitos com as lãs E.O. Teste II
mais grossas. Mas ao menos será o teu vestido
por mãos de amor, por minhas mãos cosido.” 1. (ESPM)
Camões, grande Camões, quão semelhante
A característica presente na poesia árcade, Acho teu 1fado ao meu quando os cotejo!
presente no fragmento acima, é: Igual causa nos fez perdendo o Tejo 2Arros-
a) aurea mediocritas. tar co sacrílego gigante (...)
b) cultismo. Ludíbrio, como tu, da sorte dura,
c) ideias iluministas. Meu fim demando ao Céu, pela certeza
d) conflito espiritual. De que só terei paz na sepultura (...)
e) carpe diem. (Bocage)

264
1
fado = destino d) A saudade é representada no poema pelas ima-
2
arrostar = encarar, afrontar gens do cárcere e do poeta preso por grilhões.
Assinale a afirmação correta sobre o poema. e) O eu lírico e a pátria celebram a chegada da
O eu lírico: liberdade como um sol que surge no hori-
a) Expressa inveja de Camões por não ter tido zonte.
igual sepultura.
b) Compara-se a Camões, fazendo um desa bafo 4. (Espcex) Considerando a imagem da mulher
enfático da amargura pela infelicida de ao nas diferentes manifestações literárias, po-
longo de uma existência. de-se afirmar que:
c) Segue o princípio clássico do relatar experi- a) nas cantigas de amor, originárias da Proven-
ências humanas negativas aplicáveis a todos. ça, o eu-lírico é feminino, mostrando o ou-
d) Alterna versos alexandrinos (ou dodecas sí- tro lado do relacionamento amoroso.
labos) com versos decassílabos. b) no Arcadismo, a louvação da mulher é feita
e) Dirige-se ao “Céu” e ao “Tejo” com a inten- a partir da escolha de um aspecto físico em
ção de aliar-se aos elementos da natureza. que sua beleza se iguale à perfeição da na-
tureza.
TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES c) no Realismo, a mulher era idealizada como
Liberdade, onde estás? Quem te demora? misteriosa, inatingível, superior, perfeita,
Quem faz que o teu influxo em nós não caia? como nas cantigas de amor.
Porque (triste de mim!), porque não raia d) a mulher moderna é inferiorizada socialmen-
Já na esfera de Lísia* a tua aurora? te e utiliza a dissimulação e a sedução, mui-
Da santa redenção é vinda a hora tas vezes desencadeando crises e problemas.
A esta parte do mundo, que desmaia. e) a mulher barroca foi apresentada como ar-
Oh!, venha... Oh!, venha, e trêmulo descaia quétipo da beleza, evidenciando o poder
Despotismo feroz, que nos devora! por ela conquistado, enquanto os homens
Eia! Acode ao mortal que, frio e mudo, viviam uma paz espiritual.
Oculta o pátrio amor, torce a vontade,
E em fingir, por temor, empenha estudo. 5. (UEPA) LXII
Movam nossos grilhões tua piedade; Torno a ver-vos, ó montes; o destino
Nosso númen tu és, e glória, e tudo, Aqui me torna a pôr nestes oiteiros;
Mãe do gênio e prazer, ó Liberdade! Onde um tempo os gabões deixei grosseiros
(Bocage)
Pelo traje da Corte rico e fino.
Lísia = Portugal
MOISÉS, Massaud. A Literatura Portuguesa Através
Aqui estou entre Almendro, entre Corino,
dos Textos. São Paulo: Cultrix, 2006, p.239. Os meus fiéis, meus doces companheiros,
Vendo correr os míseros vaqueiros
Atrás de seu cansado desatino.
2. (UEPA) O poema de Bocage organiza uma si-
tuação comunicativa interna em que se veri- Se o bem desta choupana pode tanto,
ficam os seguintes elementos fundamentais Que chega a ter mais preço, e mais valia,
da comunicação: emissor, receptor (contido Que da cidade o lisonjeiro encanto;
no próprio texto) e mensagem. No poema es-
tes elementos são: Aqui descanse a louca fantasia;
a) eu lírico, liberdade e crítica ao despotismo. E o que ‘té agora se tornava em pranto,
b) poema, liberdade e crítica ao despotismo. Se converta em afetos de alegria.
c) eu lírico, povo português e crítica ao despo-
tismo. O campo como locus amoenus, livre de mazelas
d) eu lírico, liberdade e língua portuguesa. sociais e morais, foi o grande tema literá-
e) eu lírico, leitor e crítica ao despotismo. rio à época neoclássica, quando a literatura
também expressou uma resistência à Cidade,
3. (UEPA) A leitura do soneto bocageano per- considerada então violento símbolo do poder
mite afirmar que há entre a subjetividade monárquico e da corrupção moral. Interprete
do poeta e as questões sociais de Portugal as opções abaixo e assinale aquela em que
uma ampla interação comunicativa. Marque se sintetiza o modo de resistência expresso
a alternativa que comprova este comentário. nos versos de Cláudio Manuel da Costa acima
a) O eu lírico pede ao país que tenha, como ele, transcritos.
paciência para suportar o despotismo. a) apego à metrificação tradicional
b) A pátria personificada que desmaia, é com b) bucolismo e paralelismo
parável ao eu lírico frio e mudo. c) aurea mediocritas
c) O despotismo é a redenção muito esperada d) inutilia truncat
pelo eu lírico e pela sociedade portuguesa. e) fugere urbem
265
TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
“Eu, Marília, não sou algum vaqueiro, Que Texto extraído de Formação da Literatura
viva de guardar alheio gado; Brasileira, de Antonio Candido.
De tosco trato, de expressões grosseiro, No Brasil, o homem de estudo, de ambição
Dos frios gelo e dos sóis queimado. e de sala, que provavelmente era, encontrou
Tenho próprio casal e nele assisto; condições inteiramente novas. Ficou talvez
Dá-me vinho, legume, fruta, azeite; mais disponível, e o amor por Dorotéia de
Das brancas ovelhinhas tiro o leite, Seixas o iniciou em ordem nova de senti-
E mais as finas lãs de que me visto. mentos: o clássico florescimento da prima-
Graças, Marília bela, vera no outono.
Graças à minha estrela! Foi um acaso feliz para a nossa literatura
(fredb.sites.uol.com.br/lusdecam.htm, adaptado) esta conjunção de um poeta de meia idade
com a menina de dezessete anos. O quaren-
tão é o amoroso refinado, capaz de sentir
6. (IFSP) Pode-se afirmar que se destaca no po- poesia onde o adolescente só vê o embara-
ema: çoso cotidiano; e a proximidade da velhice
a) o racionalismo, característica do Barroco. intensifica, em relação à moça em flor, um
b) o conceptismo, característica do Arcadismo. encantamento que mais se apura pela fuga
c) o cultismo, característica do Barroco.
d) o teocentrismo, característica do Barroco. do tempo e a previsão da morte:
e) o pastoralismo, característica do Arcadismo. Ah! enquanto os destinos impiedosos não
voltam contra nós a face irada, façamos, sim,
façamos, doce amada, os nossos breves dias
7. (IFSP) A análise do trecho permite afirmar
mais ditosos.
que o eu lírico:
a) valoriza os trajes ricos da cidade.
b) despreza a vida humilde. 9. (Unifesp) Nos versos apresentados por Anto-
c) manifesta preocupação religiosa. nio Candido, fica evidente que o eu lírico:
d) valoriza os benefícios de sua vida no campo. a) Reconhece a amada como única forma de
e) apresenta a vida na cidade como mais dese- não sofrer pela morte.
jável do que a vida no campo. b) Se mostra frustrado e angustiado pela possi-
bilidade de morrer.
c) Considera o presente desagradável, tanto
8. (CFTMG)
quanto a morte iminente.
Torno a ver-vos, o montes; o destino
d) Se entrega ao amor da amada para burlar o
Aqui me torna a por nestes oiteiros;
tempo e atrasar a morte.
Onde um tempo os gabões deixei grosseiros
e) Convida a amada a aproveitar o presente, já
Pelo traje da Corte rico, e fino.
que a morte é inevitável.
Aqui estou entre Almendro, entre Corino,
Os meus fiéis, meus doces companheiros,
Vendo correr os míseros vaqueiros E.O. Teste III
Atrás de seu cansado desatino.
1. (CFTCE) “O novo mercado tende a despre-
Se o bem desta choupana pode tanto, zar o funcionário formado à moda antiga...”
Que chega a ter mais preço, e mais valia, (ref. 31). Moda antiga nos reporta a proces-
Que da cidade o lisonjeiro encanto; sos rudimentares de trabalho e à vida cam-
pesina cujos registros são, mais propriamen-
Aqui descanse a louca fantasia;
te, depreendidos da literatura:
E o que te agora se tornava em pranto,
a) árcade.
Se converta em afetos de alegria.
b) informativa.
Com relação a esse poema, não é correto afir- c) quinhentista.
mar que: d) barroca.
a) manifesta o contraste entre natureza rústica e) seiscentista.
e sofisticação cultural.
b) defende o preceito árcade do fugere urbem, 2. (Unifest) Leia os versos do poeta português
valorizando o bucolismo como ideal de vida. Bocage.
c) dirige-se a pastora amada pelo eu-lírico Vem, oh Marília, vem lograr comigo
como determina a convenção típica da poe- Destes alegres campos a beleza,
sia da época. Destas copadas árvores o abrigo.
d) revela resquícios de procedimentos caracte- Deixa louvar da corte a vã grandeza;
rísticos da estética barroca, no uso de antí- Quanto me agrada mais estar contigo,
teses e no gosto por oposições. Notando as perfeições da Natureza!
266
Nestes versos: Juízo II. “Procurando libertar a língua de
a) o poeta encara o amor de forma negativa por termos espúrios, restituindo-lhe uma so-
causa da fugacidade do tempo. briedade castiça e o rigor de sentido, é a
b) a linguagem, altamente subjetiva, denuncia revitalização do pastoralismo e bucolismo.”
características pré-românticas do autor. a) se o primeiro se referir ao BARROCO e o se-
c) a emoção predomina sobre a razão, numa gundo, ao ARCADISMO.
ânsia de se aproveitar o tempo presente. b) se o primeiro se referir ao ARCADISMO e o
d) o amor e a mulher são idealizados pelo poe- segundo, ao BARROCO.
ta, portanto, inacessíveis a ele. c) se ambos se referirem ao BARROCO.
e) o poeta propõe, em linguagem clara, que se d) se ambos se referirem ao ARCADISMO.
aproveite o presente de forma simples junto e) se ambos se referirem à LITERATURA DOS JE-
à natureza. SUÍTAS no Brasil.

3. (FGV) Assinale a alternativa que apresenta


ERRO na correlação autor-obra-época, relati- E.O. Dissertativo
vamente à literatura portuguesa.
a) Pe. Antônio Vieira - Sermão da Quarta-feira TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES
de Cinzas - Século XVII. As questões seguintes tomam por base um
b) Gil Vicente - Auto da Barca do Inferno - Sé- soneto do poeta neoclássico português Boca-
culo XVI. ge (Manuel Maria Barbosa du Bocage, 1765-
c) Manuel Maria Barbosa du Bocage - Nova Ar- 1805) e diálogos de uma sequência do filme
Bye Bye Brasil (1979), escrito e dirigido pelo
cádia - Século XVIII.
cineasta brasileiro Carlos Diegues.
d) Camilo Peçanha - Clepsidra - Século XIX/XX.
e) Almeida Garrett - Viagens na Minha Terra -
CONVITE A MARÍLIA
Século XIX.
Já se afastou de nós o Inverno agreste
Envolto nos seus úmidos vapores;
4. (ESPM) Em todas as alternativas a seguir, há A fértil primavera, a mãe das flores
versos característicos do Arcadismo, exceto O prado ameno de boninas veste:
em:
a) Eu vi o meu semblante numa fonte: Varrendo os ares o sutil nordeste
Dos anos inda não está cortado; Os torna azuis; as aves de mil cores
Os Pastores, que habitam este monte, Adejam entre Zéfiros e Amores,
Respeitam o poder do meu cajado; E toma o fresco Tejo a cor celeste:
b) Ah! enquanto os Destinos impiedosos
Não voltam contra nós a face irada, Vem, ó Marília, vem lograr comigo
Façamos, sim façamos, doce amada, Destes alegres campos a beleza,
Os nossos breves dias mais ditosos; Destas copadas árvores o abrigo:
c) Os teus cabelos são uns fios d’ouro;
Teu lindo corpo bálsamos vapora. Deixa louvar da corte a vã grandeza:
Ah! não, não fez o Céu, gentil Pastora, Quanto me agrada mais estar contigo
Para glória de Amor igual tesouro; Notando as perfeições da Natureza!
d) Se estou, Marília, contigo, (BOCAGE. Obras de Bocage. Porto:
Não tenho um leve cuidado; Lello & Irmão, 1968, p. 142.)
Nem me lembra se são horas
BYE BYE BRASIL
De levar à fonte o gado;
Mulher Nordestina: - Meu santo, minha fa-
e) Ó florestas! ó relva amolecida,
mília foi embora, meu santo. Filho, nora,
A cuja sombra, em cujo doce leito
neto..., fiquei só com o meu velho que mor-
É tão macio descansar nos sonhos! reu na semana passada. Agora, quero ver o
Arvoredo do vale! derramai-me meu povo. Meu santo, me diga, onde é que
Sobre o corpo estendido na indolência eles foram, meu santo?
O tépido frescor e o doce aroma!.
Lord Cigano: - E eu sei lá? Como é que eu vô
5. Leia com atenção os juízos estéticos trans saber? Quer dizer... eu sei... eu... Eu tô ven-
critos abaixo e marque: do. Eu estou vendo a sua família, eles estão
Juízo I. “Intérprete dos anseios do homem a muitas léguas daqui.
seiscentista solicitado por ideais em con- Mulher Nordestina: - Vivos?
flito. O fusionismo é a sua tendência domi-
nante - tentativa de conciliar, incorporando Lord Cigano: - É, vivos, se acostumando ao
contrários.” lugar novo.
267
Mulher Nordestina: - A gente se acostuma Mas o meu mundo é belo e diferente:
com tudo... Onde é que eles estão agora, meu vivo do amor ou vivo de poesia...
santo? E assim eu viverei eternamente,
se não morrer por outra Ana Maria.
Lord Cigano: - Ah, pera aí, deixa eu ver! Eu (1962, disco RGE In História da música popular brasileira,
tô vendo: eles estão num vale muito ver- fascículo número 41, São Paulo, Abril Cultural, 1971.)
de onde chove muito, as árvores são muito
compridas e os rios são grandes feito o mar.
Tem tanta riqueza lá, Que.. ninguém precisa TEXTO II
trabalhar. Os velhos não morrem nunca e os RETRATO PRÓPRIO (SONETO LXXXI)
jovens não perdem sua força. É uma terra tão Bocage
verde... Altamira!
Magro, de olhos azuis, carão moreno,
(In: filme BYE BYE BRASIL (1979). Produzido por Lucy
Barreto. Escrito e dirigido por Carlos Diegues.) bem servido de pés, meão na altura,
triste de facha, o mesmo de figura,
Os escritores clássicos gregos e latinos pro- nariz alto no meio, e não pequeno:
duziram certas fórmulas de expressão que,
retomadas ao longo dos tempos, chegaram Incapaz de assistir num só terreno,
até nossa modernidade. Uma dessas fórmu- mais propenso ao furor do que à ternura
las é a chamada tópica do lugar ameno, ou bebendo em níveas mãos por taça escura
de zelos infernais letal veneno:
seja, a evocação literária de um recanto ide-
al, delicado, geralmente bucólico, cuja paz e
Devoto incensador de mil deidades
tranquilidade servem de palco ao idílio dos (digo, de moças mil) num só momento,
amantes e ao sossego da vida. Simboliza o e somente no altar amando os frades:
porto almejado ou o retorno à felicidade per-
dida. Tomando por base este comentário, re- Eis Bocage, em quem luz algum talento;
leia os textos em pauta e, a seguir, responda saíram dele mesmo estas verdades
as questões abaixo: num dia em que se achou mais pachorrento.
(In Obras de Bocage, Porto, Lello & Irmão, 1968, p. 497.)
1. Aponte, na sequência de “Bye Bye Brasil”,
Os dois textos pertencem a artistas bastan-
dois elementos da paisagem descrita por
te afastados entre si, no tempo. Trata-se de
Lord Cigano que caracterizam Altamira como
Bocage (Manuel Maria Barbosa du Bocage -
um lugar ameno;
1765-1805), poeta neoclássico português,
e Juca Chaves (Jurandyr Chaves - 1938),
2. Localize, no segundo terceto de Bocage, o compositor, intérprete e showman brasilei-
verso em que se estabelece relação opositiva ro. Ambos líricos e sentimentalistas, muitas
com a tópica do lugar ameno. vezes são ásperos em críticas e sátiras so-
ciais. Lendo-se os poemas (o de Juca é letra
TEXTOS PARA A PRÓXIMA QUESTÃO de uma de suas canções), verificamos que
apresentam pontos em comum, embora se-
TEXTOI
jam inconfundíveis pelo estilo e atitudes.
AUTORRETRATO
Juca Chaves 3. (Unesp) Observando o que cada poeta diz de
si próprio na primeira quadra, verificamos
Simpático, romântico, solteiro, que um deles privilegia um tipo de carac-
autodidata, poeta, socialista. terísticas pessoais, enquanto o outro varia
Da classe 38, reservista, a natureza das características que enumera.
de outubro, 22, Rio de Janeiro. Com base nesta observação, releia atenta-
mente ambas as estrofes e, a seguir, comen-
Com a bossa de qualquer bom brasileiro, pos- te as características pessoais enfatizadas por
suo o sangue quente de um artista, Juca Chaves e Bocage.
Sou milionário em senso de humorista,
mas juro que estou duro e sem dinheiro. TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 3 QUESTÕES
RECREIOS CAMPESTRES NA
Há quem me julgue um poeta irreverente, COMPANHIA DE MARÍLIA
mentira, é reação da burguesia, Olha, Marília, as flautas dos pastores
que não vive, vegeta falsamente, Que bem que soam, como estão cadentes!
num mundo de doente hipocrisia. Olha o Tejo a sorrir-se! Olha, não sentes
Os Zéfiros brincar por entre as flores?
268
Vê como ali beijando-se os Amores SONETO
Incitam nossos ósculos ardentes! Podre meu Pai! A Morte o olhar lhe vidra.
Ei-las de planta em planta as inocentes, Em seus lábios que os meus lábios osculam
As vagas borboletas de mil cores! Micro-organismos fúnebres pululam Numa
fermentação gorda de cidra.
Naquele arbusto o rouxinol suspira,
Duras leis as que os homens e a hórrida hi-
Ora nas folhas a abelhinha para,
dra A uma só lei biológica vinculam,
Ora nos ares sussurrando gira: E a marcha das moléculas regulam,
Com a invariabilidade da clepsidra!...
Que alegre campo! Que manhã tão clara!
Mas ah! Tudo o que vêz, se eu te não vira, Podre meu Pai! E a mão que enchi de beijos
Mais tristeza que a morte me causara. Roída toda de bichos, como os queijos Sobre
(Bocage, OBRAS DE BOCAGE, Porto: Lello a mesa de orgíacos festins!...
& Irmão Editores, 1968. p. 152)
Amo meu Pai na atômica desordem
Entre as bocas necrófagas que o mordem
4. (Unesp) No soneto acima citado de Manuel E a terra infecta que lhe cobre os rins!
Maria Barbosa du Bocage (1765-1805), veri- (Augusto dos Anjos. Eu. 1935.)
ficam-se características do estilo neoclássi-
IDEALISMO E REALISMO
co, de que Bocage é o máximo representante
Eu sou pois associado a estes dois movimen-
em Portugal. Indique duas dessas caracte- tos, e se ainda ignoro o que seja a ideia nova,
rísticas, exemplificando cada uma delas com sei pouco mais ou menos o que chamam aí a
palavras, expressões ou passagens do poema. escola realista. Creio que em Portugal e no
Dois versos seguidos deste poema, contras- Brasil se chama realismo, termo já velho em
tados com outros doze, revelam que o poeta 1840, ao movimento artístico que em Fran-
ça e em Inglaterra é conhecido por “natu-
pode ter duas reações diferentes e opostas ralismo” ou “arte experimental”. Aceitemos,
ante a paisagem que descreve, de acordo com porém, realismo, como a alcunha familiar e
a ocorrência ou não de um determinado fato. amiga pela qual o Brasil e Portugal conhe-
Partindo deste dado, responda as questões cem uma certa fase na evolução da arte.
abaixo: (...)
Não - perdoem-me - não há escola realis-
ta. Escola é a imitação sistemática dos pro-
5. Quais os dois versos a que nos referimos? cessos dum mestre. Pressupõe uma origem
individual, uma retórica ou uma maneira
6. O que nos revela o poeta neles? consagrada. Ora o naturalismo não nasceu
da estética peculiar dum artista; é um movi-
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO
mento geral da arte, num certo momento da
sua evolução. A sua maneira não está consa-
SONETO grada, porque cada temperamento individu-
Os teus olhos gentis, encantadores, al tem a sua maneira própria: Daudet é tão
Tua loira madeixa delicada, diferente de Flaubert, como Zola é diferen-
Tua boca por Vênus invejada, te de Dickens. Dizer “escola realista” é tão
Onde habitam mil cândidos amores: grotesco como dizer “escola republicana”. O
naturalismo é a forma científica que toma
a arte, como a república é a forma política
Os teus braços, prisão dos amadores, que toma a democracia, como o positivismo
Os teus globos de neve congelada, é a forma experimental que toma a filosofia.
Serão tornados breve a cinza!... a nada!... Tudo isto se prende e se reduz a esta fórmu-
Aos teus amantes causarão horrores!... la geral: que fora da observação dos factos
e da experiência dos fenômenos, o espírito
não pode obter nenhuma soma de verdade.
Céus! e hei-de eu amar uma beleza, Que à Outrora uma novela romântica, em lugar de
cinza reduzida brevemente estudar o homem, inventava-o. Hoje o ro-
Há-de servir de horror à Natureza!... mance estuda-o na sua realidade social. Ou-
trora no drama, no romance, concebia-se o
Ah! mandai-me uma luz resplandecente, Que jogo das paixões a priori; hoje, analisa-se a
posteriori, por processos tão exactos como
minha alma ilumine, e com pureza Só ame os da própria fisiologia. Desde que se desco-
um Deus, que vive eternamente. briu que a lei que rege os corpos brutos é a
(José da Natividade Saldanha. Poemas mesma que rege os seres vivos, que a cons-
oferecidos aos amantes do Brasil. 1822.) tituição intrínseca duma pedra obedeceu às
269
mesmas leis que a constituição do espírito apresentar em sua obra a mescla de traços
duma donzela, que há no mundo uma fe- do Neoclassicismo e do Romantismo. Releia
nomenalidade única, que a lei que rege os
movimentos dos mundos não difere da lei seu poema e, em seguida:
que rege as paixões humanas, o romance, em
lugar de imaginar, tinha simplesmente de 7. Indique uma característica do Neoclassicis-
observar. O verdadeiro autor do naturalismo mo nas duas primeiras estrofes do soneto;
não é pois Zola - é Claude Bernard. A arte
tornou-se o estudo dos fenômenos vivos e
não a idealização das imaginações inatas... 8. Identifique, no conteúdo dos dois tercetos,
(Eça de Queirós. “Cartas Inéditas de Fradique uma atitude do eu poemático típica do Ro-
Mendes”. In: Obras de Eça de Queirós.)
mantismo.
PREFÁCIO INTERESSANTÍSSIMO
24
Belo da arte: arbitrário, convencional, tran- 9. (UFV) Ao evidenciar as tendências do Arca-
sitório - questão de moda. Belo da natureza: dismo brasileiro, Antônio Cândido conclui:
imutável, objetivo, natural - tem a eternida- A poesia pastoral, como tema, talvez este-
de que a natureza tiver. Arte não consegue ja vinculada ao desenvolvimento da cultu-
reproduzir natureza, nem este é seu fim. To- ra urbana, que, opondo as linhas artificiais
dos os grandes artistas, ora consciente (Ra- da cidade à paisagem natural, transforma o
fael das Madonas, Rodin do Balzac, Beetho-
campo num bem perdido, que encarna facil-
ven da Pastoral, Machado de Assis do Brás
mente os sentimentos de frustração.
Cubas), ora inconscientemente (a grande
(CÂNDIDO, Antônio. “Formação da literatura
maioria) foram deformadores da natureza.
brasileira.” São Paulo: Martins, 1959. p.54. v.I)
Donde infiro que o belo artístico será tanto
mais artístico, tanto mais subjetivo quanto A partir de uma reflexão sobre a afirmativa
mais se afastar do belo natural. Outros infi-
transcrita acima, fale sobre as manifestações
ram o que quiserem. Pouco me importa.
da Natureza na poesia árcade:
*
25
Nossos sentidos são frágeis. A percepção
das coisas exteriores é fraca, prejudicada 10. Assinale a alternativa em que os versos evi-
por mil véus, provenientes das nossas ta- denciam ideais do Arcadismo e justifique
ras físicas e morais: doenças, preconceitos, sua resposta:.
indisposições, antipatias, ignorâncias, he- a) Meu canto de morte, Guerreiros, ouvi:
reditariedade, circunstâncias de tempo, de Sou filho das selvas,
lugar, etc... Só idealmente podemos conce- Nas selvas cresci;
ber os objetos como os atos na sua inteireza Guerreiros, descendo
bela ou feia. A arte que, mesmo tirando os Da tribo tupi.
seus temas do mundo objetivo, desenvolve- b) Torno a ver-vos, ó montes; o destino
-se em comparações afastadas, exageradas, Aqui me torna a pôr nestes oiteiros;
sem exatidão aparente, ou indica os objetos, Onde um tempo os gabões deixei grosseiros
como um universal, sem delimitação quali- Pelo traje da Corte rico, e fino.
ficativa nenhuma, tem o poder de nos con- c) São uns olhos verdes, verdes,
duzir a essa idealização livre, musical. Esta Uns olhos de verde-mar,
idealização livre, subjetiva, permite criar Quando o tempo vai bonança;
todo um ambiente de realidades ideais onde Uns olhos cor de esperança,
sentimentos, seres e coisas, belezas e defei- Uns olhos por que morri;
tos se apresentam na sua plenitude heroica, Que ai de mi!
que ultrapassa a defeituosa percepção dos Nem já sei qual fiquei sendo
sentidos. Não sei que futurismo pode existir Depois que os vi!
em quem quase perfilha a concepção estética d) Hão de chorar por ela os cinamomos,
de Fichte. Fujamos da natureza! Só assim a Murchando as flores ao tombar do dia.
arte não se ressentirá da ridícula fraqueza Dos laranjais hão de cair os pomos,
da fotografia... colorida. Lembrando-se daquela que os colhia.
(Mário de Andrade. “Pauliceia Desvairada”. e) Longe do estéril turbilhão da rua,
In: Poesias completas. 1987.)
Beneditino, escreve! No aconchego
(UNESP) José da Natividade Saldanha é Do claustro, na paciência e no sossego,
considerado um poeta de transição, por Trabalha, e teima, e lima, e sofre, e sua!
270
E.O. Enem c) “Os meus fiéis, meus doces companheiros,”
(v. 6)
d) “Vendo correr os míseros vaqueiros” (v. 7)
TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES e) “Que, da Cidade, o lisonjeiro encanto.” (v.
Torno a ver-vos, ó montes: o destino 11)
Aqui me torna a pôr nestes outeiros,
Onde um tempo os gabões deixei grosseiros
Pelo traje da Corte, rico e fino.
Gabarito
Aqui estou entre Almendro, entre Corino,
Os meus fiéis, meus doces companheiros,
Vendo correr os míseros vaqueiros
Atrás de seu cansado desatino. E.O. Teste I
1. E 2. D 3. E 4. E 5. A
Se o bem desta choupana pode tanto,
Que chega a ter mais preço, e mais valia 6. E 7. A 8. A 9. E 10. B
Que, da Cidade, o lisonjeiro encanto.

Aqui descanso a louca fantasia,


E o que até agora se tornava em pranto
Se converta em afetos de alegria. E.O. Teste II
Cláudio Manoel da Costa. In: Domício Proença 1. B 2. A 3. B 4. B 5. E
Filho. A poesia dos inconfidentes. Rio de
Janeiro: Nova Aguilar, 2002, p. 78/9. 6. E 7. D 8. C 9. E

1. Considerando o soneto de Cláudio Manoel


da Costa e os elementos constitutivos do Ar-
cadismo brasileiro, assinale a opção correta
E. O. Teste III
acerca da relação entre o poema e o momen- 1. A 2. E 3. C 4. E 5. A
to histórico de sua produção.
a) Os “montes” e “outeiros”, mencionados na
primeira estrofe, são imagens relacionadas à
Metrópole, ou seja, ao lugar onde o poeta se E.O. Dissertativo
vestiu com traje “rico e fino”. 1.
“vale muito verde... as árvores são muito com-
b) A oposição entre a Colônia e a Metrópole, pridas e os rios são grandes feito o mar”...
como núcleo do poema, revela uma contra- 2.
Em “Deixa louvar da corte a vã grandeza” o
ção vivenciada pelo poeta, dividido entre a poeta contrapõe a natureza ao artificialismo
civilidade do mundo urbano da Metrópole e dos palácios.
a rusticidade da terra da Colônia. 3.
Bocage enfatiza a descrição de traços físicos
c) O bucolismo presente nas imagens do poe- grotescos de sua figura. Juca Chaves negli-
ma é elemento estético do Arcadismo que gencia a descrição física, procurando desta-
evidencia a preocupação do poeta árcade em car atributos pessoais agradáveis e atrativos.
realizar uma representação literária realista 4.
Pastoralismo: “Olha, Marília, as flautas dos
da vida nacional. pastores”.
d) A relação de vantagem da “choupana” sobre Utilização dos “locos amoenus”: “Que alegre
a “Cidade”, na terceira estrofe, é formulação campo! Que manhã tão clara!”
literária que reproduz a condição histórica 5.
“Mas ah! Tudo o que vês, se eu te vira, Mais
paradoxalmente vantajosa da Colônia sobre tristeza que a morte me causara.”
a Metrópole. 6.
Que a sua felicidade está condicionada à pre-
e) A realidade de atraso social, político e eco- sença da amada. Sem ela não é possível a
nômico do Brasil Colônia está representada postura epicurista típica dos árcades.
esteticamente no poema pela referência, na 7.
A seleção vocabular e a organização sintá-
última estrofe, à transformação do pranto tica. Também, há a imagem convencional
em alegria da figura feminina (os “olhos gentis, en-
cantadores”, a “loira madeixa delicada”) e
2. Assinale a opção que apresenta um verso do a aproximação com Vênus, divindade pagã,
soneto de Cláudio Manoel da Costa em que o invejosa dos encantos e promessas da boca
poeta se dirige ao seu interlocutor. da amada.
a) “Torno a ver-vos, ó montes: o destino” (v. 1) 8.
A presença da morte, o horror ao aniquila-
b) “Aqui estou entre Almendro, entre Corino,” mento e o desejo de redenção espiritual são
(v. 5) constantes do Romantismo que se expressam
271
no poema com subjetivismo intenso, enfaticamente pelas apóstrofes que traduzem ou a emoção de
quem diz, ou a intenção de emocionar quem ouve. A concepção espiritualista, a crença em Deus,
eterno e onipotente.
9. Os árcades tinham por ideal unir a literatura, o homem e a natureza em uma poesia pastoril. A
natureza - centrada nos campos, prados - é que permitiria ao homem elevar seus sentimentos de
amor e libertar-se dos valores corrompidos pelo progresso. Os árcades propunham uma vida sim-
ples, bucólica, longe da cidade.
10. A alternativa que contém um poema do Arcadismo é a B, pois o campo surge como grande tema
literário à época neoclássica, quando a literatura também expressou a fuga da cidade. O poema é
um trecho de um soneto de Cláudio Manuel da Costa, importante escrito árcade brasileiro.

E.O. Enem
1. B 2. A

272

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