Académique Documents
Professionnel Documents
Culture Documents
E estes tribunals adquirem poderes de julgamento ao lado dos poderes de atuação. Eles
têm poderes para julgar as decisões relativas às matérias em que decidiam. Portanto cria-
se também aqui a promiscuidade entre administração e justiça que tinha existido no
sistema francês e que também vai ser (?). Mas mais, estes tribunals também têm poderes
de autotutela executória, têm poderes de execução coativa das suas decisões nos termos
da lei, exatamente como hoje em dia acontece nos sistemas de direito francês. Há a
previsão para estes órgãos especiais de poderes de autotutela e, portanto, o sistema
aproxima-se muito. E esta aproximação vai fazer com que surja aqui um problema no
quadro do segundo período da história do contencioso administrativo. Este segundo
período é o período do batismo ou o período da jurisdicionalização parcial do
contencioso administrativo. Esta segunda fase está ligada ao surgimento do estado
social, às transformações da administração que se tornou prestadora, passou a atuar em
todos os domínios da vida da sociedade, isto implicou um contencioso mais efetivo e
implicou a mudança de natureza do contencioso administrativo. Mas apesar da
mudança de natureza até ao estado pós social, até aos anos 70 nos diferentes países da
europa e até se quiserem à constituição fundamental/lei fundamental de Bona alemã
que se seguiu à segunda guerra mundial e que mudou outra vez o modelo do
contencioso administrativo, este sistema de jurisdicionalização continuava por um lado
a ser limitado em termos de âmbito de aplicação, não se aplicava a toda a comunidade
administrativa, por outro lado os poderes do juiz não eram iguais aos de qualquer outro
juiz, ainda eram apenas os poderes de anulação em relação às decisões administrativas
que correspondiam ao exercício da função.
Mas como é que isto surgiu? Curiosamente há aqui uma evolução que tem muito
jurisprudencialismo. Vimos há pouco que em França foi a partir de 1889, portanto já
no final do século XIX que surgiu o acórdão (?) que pôs termo ao sistema do (?)-juiz.
Mas não foi em 1889 que nasceu o contencioso administrativo. Há uma realidade que
é continuada e permanente e que praticamente só acaba nos nossos dias, só é
reconhecida enquanto tal em 1980, já num outro momento da história do contencioso
administrativo por uma decisão do conselho constitucional. O que é que aconteceu,
entretanto? É que o concelho de estado foi ganhando progressivamente maior
autonomia e protagonismo e como foi ganhando esta autonomia ele passou a ser
considerado como um tribunal, passou a ser reconhecido enquanto tal. E este
reconhecimento teve consagração legislativa. A primeira coisa que se fez foi separar a
seção administrativa da seção contenciosa. Se os senhores forem visitar o louvre e a seguir
virem o palais royal, que está imediatamente a seguir, o louvre já integrado no palácio real
mas o edifício chamado palácio real fica atrás (tem magníficos jardins e aquelas estátuas
do buda e coisas desse tipo) verão que a porta do lado direito dá acesso à seção
administrativa e a porta do lado esquerdo dá acesso à seção contenciosa. Não há
possibilidade de comunicarem os dois lados do edifício, não é possível passar da seção
administrativa para a seção contenciosa, é preciso vir à rua. E esta metáfora é a metáfora
do que existe hoje em França que é, haver de um lado um órgão de administração onde
há entidades da administração, funcionando e aplicando o direito administrativo e
funcionando com as regras da hierarquia administrativa de acordo com a lógica
administrativa e do outro lado há juízes. A seção contenciosa é hoje um tribunal tal
como lhe é reconhecido pelo conselho constitucional. Mas foi transformando-se em
tribunal a pouco e pouco. A explicação que os franceses encontram mais acabada para
isto é falar num milagre. (?) fala num milagre e segundo ele o milagre é de uma
administração que era toda poderosa e que aceitou transformar-se, que aceitou limitar-
se. Mas eu diria que o senhor (?) é um homem de pouca fé. Porque há aqui dois milagres
pelo menos. Há um milagre da transformação da administração, mas não é só a
administração enquanto dona do direito que aceita a sua autolimitação, é a
administração transformar-se num sujeito de direito igual aos outros. E é um sujeito de
direito que estabelece relações com particulares, relações que são reguladas pelo direito
administrativo. E, portanto, a transformação é muito maior do que aquela que (?)
conseguia adivinhar.
Mas há um outro milagre em simultâneo que é a transformação de um quase tribunal
num verdadeiro tribunal. Inicialmente era uma quase tribunal, era um órgão da
administração. Mas a pouco e pouco ele foi-se separando da administração e foi-
se transformando num verdadeiro tribunal. Começou primeiro por autonomizar-
se em termos orgânicos a seção contenciosa da seção administrativa. Depois,
alterou-se, em termos formais, de um lado aplicam-se regras do poder judicial e
do outro, regras da administração e, naturalmente, são funções distintas. Mas isto
que depois foi sendo reconhecido pelas leis em 1910 e 1920, progressivamente,
eis que se criaram outros tribunais, na primeira instância deixou de se ter o
presidente da câmara como ministro e apareceram verdadeiros tribunais de
primeira instância, os tribunais administrativos de circulo, é uma tradição similar
à nossa. Surgiram vários tribunais, os tribunais ganharam o poder de execução
das decisões, ou seja, a pouco e pouco a transformação foi fazendo com que o
conselho de estado se transformasse num verdadeiro tribunal e isto vai ser
reconhecido em 1980 já numa fase terminal pelo conselho constitucional.
Reparem um conselho constitucional. Em frança os tribunais começam por ser
conselho e depois transformam-se em tribunais. E é muito curioso como o
conselho de Estado se vai transformar ajudando na transformação do conselho
constitucional que hoje em dia é também um verdadeiro tribunal constitucional.
Aquilo que em 1980 o tribunal constitucional francês vai nos dizer é que não há
qualquer dúvida que a jurisdição administrativa é autónoma e independente. E
que esta independência radica onde? “Créme de la créme” Ironia das ironias, da lei
de separação entre a administração e justiça, de 1789, que dizia precisamente o
contrário. RISOS
É de novo a tentativa de reconstruir a história por parte da realidade francesa vendo em
1789 algo que não aconteceu em 1789. Mas o que interessa aqui é que se chegou
a boa conclusão de considerar de forma definitiva e indiscutível que a jurisdição
administrativa é uma jurisdição (?)
E portanto há aqui uma transformação que em frança resulta desta evolução. E há aqui
um duplo milagre: um milagre da administração se tornar num sujeito de direito
que enquanto sujeito de direito, e não dono de direito, estabelece relações com
outros particulares. E o segundo milagre, que é um órgão administrativo ser
transformado num tribunal.
[Brincadeira]
O tribunal administrativo francês é, à semelhança dos self made men, é um self made court,
um tribunal que se construiu a si mesmo. Foi em resultado da sua atuação que
foi sendo progressivamente reconhecido como um verdadeiro tribunal
Ora bem mas se esta for a realidade francesa, a mais tardia(1889-seculo XX), nos outros
países, que receberam por lei o contencioso francês, a sua jurisdicionalização
também vai ocorrer por lei.
No inicio do seculo, em frança e em espanha, 1906 e 1904, em italia o conselho de
estado passa a integrar o poder jurisdicional, em espanha cria se uma realidade
que continua a ser separada.
Há uma originalidade espanhol. Um unicio órgão de topo, é o supremo tribunal que é
comum, embora haja uma sala dedicada ao contencioso administrativo. Há
tribunais administrativos da 1ª e da 2ª instância mas ao nível supremo, a nível do
órgão de topo há só um supremo tribunal, com uma câmara, sala, de contencioso
administrativo.
Isto aconteceu logo com a Lei de Santa Maria de Pareto de inicio do sèculo (XX),
juntamente com o alvor do Estado social. Na Alemanha já tínhamos visto as
experiencias que vinham das republicas, dos estados do sul da Alemanha,ainda
nos finais do seculo xviii. A constituição de wagner vai instaurar um sistema
jurisdicional autonomo. Depois há aquele eclipse do nazismo e a seguir a segunda
guerra volta de novo os sistemas dos tribunais administrativos. E portanto há
aqui uma evolução que é feita pela lei, mas fazendo a ponte para o sistema
britânico.
Parece a partida no sistema britanico que as coisas estavam a andar ao contrario! As
vezes eu brinco dizendo que enquanto que o sistema francês teve uma infância
tardia o sistema francês teve uma senilidade precoce risos. Não fez os disparates
na altura em que devia ter feito.
O que é que vai acontecer no sistema britânico? Por um lado o sistema britanico vai
adquirir com os tribunals, órgãos administrativos com poder de julgamento, vai
adquirir poderes de autotutela excutiva, aproximando se da experinecia francesa,
que, na altura, estava-se a transformar.
Em 1910, em Inglaterra, encontram as datas no divã das reformas onde isto aconteceu,
1910, 1920 etc…. Vai se afirmar o principio de que a ultima palavra tem que
caber ao court. Os tribunals decidiam mas a decisão ultima cabia a um tribunal.
Ora se isso era assim estávamos perto do sistema francês, era uma espécie de
recurso. No sistema anglo-saxónico chama-se a isto de judicial review, algo muito
próximo do sistema francês. Assim, o sistema francês insere-se nesta segunda
fase da historia do contencioso na família francesa, que é a de jurisdicionalização.