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Em obra datada dos anos 1990, Jon Elster (1994) sustenta que à ciência
não basta conhecer as causas dos fenômenos, mas é necessário sobretudo
entender como as causas operam e se organizam de maneira a produzir
determinados efeitos. Isso requer desvendar a cadeia causal que leva daquilo que
se pretender explicar até a explicação efetiva dos fenômenos abordados. Na mesma
obra, Elster sugere que existem duas formas principais de explicar as ações
humanas que, por sua vez, são as causas dos fenômenos sociais1: a escolha
racional e as normas sociais.
1 . Elster assume que os fenômenos sociais são explicáveis exclusivamente em termos das ações dos
indivíduos: suas intenções, suas crenças, preferências, características, etc. Em outras palavras, Elster se afilia
à tradição do individualismo metodológico, cujo princípio é o de que os elementos constitutivos dos
fenômenos sociais são as ações individuais e de que estas são intencionais.
façam racionalmente, ou seja, mediante a escolha de meios adequados à
consecução dos fins. Isso significa, entre outras coisas, que a teoria da escolha
racional não se detém no exame dos fins. Estes podem variar infinitamente entre os
atores, não cabendo a sua discussão em termos do exercício da racionalidade.
2
. Também denominado, alternativamente, teoria da escolha racional, teoria da public choice.
3
Que é o princípio do individualismo metodológico, característico dessa corrente de pensamento.
preferência satisfeita (4). Todavia, é possível ir um pouco mais longe que os autores
e estabelecer que o custo de um escolha representa não apenas a renúncia à mais
valiosa alternativa, mas o conjunto de todas as coisas às quais alguém tem que
renunciar para obter um benefício.
4
. Op. cit., 1985.
benefícios. Por isso, a escolha racional envolve o valor presente, que é o valor de
um custo futuro, nos termos do momento presente. Todavia, tanto os benefícios
esperados como os custos esperados incorporam risco ou incerteza e isto pesa no
cálculo racional. As vezes, a racionalidade de uma escolha encontra-se no fato de
que o grau de incerteza de uma alternativa é menor que o de outras, cujos
benefícios - se não fosse a incerteza - poderiam ser até maiores.
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Especialmente na área da economia política existe uma extensa discussão sobre esses
conceitos. Eles são apresentados aqui na sua forma mais simplificada, uma vez que abordar a
II
Segundo, porque o ator age de modo a criar novas situações, que permitam
estabelecer opções melhores. Este procedimento implica mudança das regras do
jogo. Neste caso, o observador não vê que o ator está envolvido não apenas no jogo
III
De acordo com Elster (1989), existe nas Ciências Sociais uma tradição de
análise que se baseia na concepção de uma teleologia objetiva, ou seja, os
acontecimentos são explicados por uma finalidade que os guia, sem que existam
evidências de um sujeito intencional ao qual se atribui esta finalidade. Para além das
distinções ideológicas, esta tradição abrange concepções como a "mão invisível" ou
noção de que na ordem social os vícios privados se transformam em virtudes
públicas; passa pela sociologia durkheimeana, que supõe a sociedade como um "ser
sui generis"; está presente na explicação funcionalista que imputa as causas dos
eventos às suas consequências esperadas, inclusive em termos de funções latentes;
e chega até ao marxismo, particularmente não que diz respeito aos supostos de que
a história possui leis próprias e de que a ação politica é ação de classe, orientada
por interesses objetivamente dados.
Explorando as teorias sem ator, Elster aponta três paradigmas:
IV
(i) Para que um ator aja racionalmente, não pode sustentar crenças e preferências
que sejam contraditórias entre si. Se um ator tem crenças contraditórias, não tem
como usar a razão. Por exemplo, se preciso decidir se necessito usar uma roupa de
frio para me proteger do clima, não posso acreditar simultaneamente, em duas
coisas: (a) vai fazer frio; (b) não vai fazer frio. Tenho que escolher o que me parece
mais realista para poder usar a razão. No máximo, posso tentar ser racional
estabelecendo cursos de ação alternativos, para ambas as eventualidades - mas
sem me esquecer que qualquer deles terá custos.
Observe-se que crenças contraditórias impedem a ação racional, mas o
mesmo não acontece com as preferências. Isto porque é sempre possível escolher
entre preferências contraditórias, o que não acontece com as crenças. No caso das
crenças, quando se escolhe uma delas, a outra deixa de existir em termos de
parâmetro que orienta a escolha.
(ii) Para que um ator aja racionalmente, as preferências têm que ser transitivas: Se
eu prefiro A em lugar de B, e B em lugar de C, então prefiro A em lugar de C. Da
mesma forma, se prefiro E em lugar de F, mas também prefiro G em lugar de E,
então prefiro G em lugar de E.
Uma vez que mencionamos a Teoria dos Jogos e seus postulados centrais,
vamos explorá-la um pouco mais. Rapoport (1982) identifica três tipos de interação
social: lutas, jogos e debates. As lutas têm como objetivo eliminar o inimigo, de tal
maneira que deixe de representar ameaça. Os debates têm por finalidade atingir um
grau de persuasão tal que os discordantes não tenham como deixar de aderir aos
argumentos apresentados. As lutas, como os debates, se baseiam exclusivamente
na lógica da competição. os jogos não envolvem nem eliminação, nem persuasão;
nem conflito, nem argumentação: sua finalidade é a de que, usando sua melhor
estratégia, cada parte procure obter as vantagens necessárias para vencer o
adversário e a sua lógica competição, mas pode incluir também a cooperação. E
daí surgem diversos resultados possíveis. De maneira bastante simplificada,
usualmente adota-se a seguinte tipologia de jogos:
a) Jogos de dois jogadores. Podem ser jogos de soma zero ou jogos de soma
variável. Os primeiros são a expressão máxima do conflito, pois, a vitória de um
dos jogadores só pode ocorrer à custa da completa derrota do outro: para que
um ganhe, o outro tem que perder. Os jogos de soma variável são aqueles onde
nem um dos jogadores ganha tudo, nem o outro perde tudo: várias distribuições
alternativas são possíveis.
b.1) Dilema do Prisioneiro: trata-se de um jogo onde dois jogam contra um terceiro.
Os dois primeiros não podem se comunicar, logo, não têm como combinar uma
estratégia comum. Eles podem, em princípio, agir cooperativamente. Mas podem,
também, procurar se proteger não somente do terceiro jogador, mas um do outro, e
buscar maximizar a sua vantagem individual. Quando cada um dos membros desta
dupla de jogadores se comporta como se fosse um jogador isolado, ambos perdem
tudo e o terceiro jogador ganha. Os estudos da ação racional tem mostrado que,
geralmente, é o que acontece: não havendo informação compartilhada, há incerteza
sobre o curso de ação dos nossos parceiros. Assim, cada um de nós passa a pensar
apenas em buscar a própria vantagem. E todos acabam tendo o pior dos resultados.
Ou seja, cada um tentando ser o mais racional isoladamente, termina tendo
resultados absolutamente contrários aos seus interesses. O Dilema do Prisioneiro é
um modelo importante de situações onde o desafio é obter a cooperação em
contextos de incerteza.
b4) Jogo do Imperativo Categórico: é aquele onde cada jogador decide se vai ou não
cooperar não à base de seus interesses instrumentais, mas a partir de convicções
quanto a valores. Também é chamado de “Jogo do Otário” pois o jogador que
coopera por motivações valorativas acaba sendo explorado pelos que não o fazem.
Uma das suas consequências é estimular os outros jogadores a se aproveitar da sua
disposição à cooperação. Entretanto, um resultado possível desse jogo é que o
“Otário” acabe se tornando um “Empresário Político” . Ou seja, alguém que arca
sozinho com os custos da ação coletiva, mas colhe os dividendos por outras vias
que não o próprio jogo no qual está envolvido.
Embora todos esses modelos, expostos dessa maneira, pareçam ser muito
abstratos, são inúmeras as suas aplicações práticas. O Dilema do prisioneiro, por
exemplo, pode ser usado para entender as estratégias das alianças eleitorais
previamente às convenções partidárias. O Jogo da Galinha presta-se ao
entendimento do comportamento dos atores em questões ambientais – onde o custo
da catástrofe é percebido por todos -, mas também se presta à análise de quaisquer
bens que só podem ser produzidos em grandes quantidades não desagregáveis,,
como por exemplo, as obras públicas. O Jogo da Garantia exemplifica bem o que
acontece em acordos de todo tipo, como por exemplo, os arranjos neo-corporativos
como os das câmaras setoriais. E o Jogo do Imperativo Categórico está na base, por
exemplo, de doutrinas como o pacifismo baseado no desarmamento unilateral nas
relações internacionais.
VI
1) O indivíduo faz muitas coisas que não revertem em seu benefício. (A teoria admite
que os indivíduos cometem erros)
2) A teoria supõe indivíduos voltados para seus interesses particulares. (A teoria não
nega que existam objetivos altruistas, apenas sustenta que estes objetivos são
racionalmente perseguidos).
VII
6
Gostaria de agradecer a leitura atenciosa e os comentários de Marcelo Gameiro.
7
Intitula-se “novo” a fim de se distinguir das análises institucionais praticadas nos Estados
Unidos no período anterior à Segunda Guerra Mundial (Limongi, 1994: 3).
8
Alguns ainda incluem o (novo) institucionalismo econômico (Cf. Powell e Dimaggio, 1991) e o
institucionalimo da teoria das organizações (Cf. March e Olsen: 1984).
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Até porque estão brilhantemente elaboradas alhures. Veja os trabalhos de Powell e
Dimaggio(1991) e de Hall e Taylor(1996), citados anteriormente.
originais previam a dificuldade de obtenção de decisões estáveis ao longo do
tempo, caso fosse escolhida a regra de maioria, porque cada legislador possuiria
um ordenamento das preferências distinto dos demais e as alternativas de
políticas públicas e de legislação seriam multi-dimensionais, impedindo a
existência de um certo consenso acerca das propostas. Mesmo que uma decisão
fosse tomada, ela poderia ser revertida posteriormente, assim que uma maioria se
formasse em torno de uma nova alternativa.
Um dos pioneiros deste tipo de interpretação dos resultados coletivas nos
processos decisórios foi Kenneth Arrow (1963), com seu “Teorema da
impossibilidade”. Ele chamou a atenção para o problema das maiorias cíclicas, ou
melhor, da impossibilidade da obtenção de decisões estáveis ao longo do tempo.
Isto ocorreria porque, embora os indivíduos sejam capazes de listarem suas
preferências de maneira ordenada e transitiva10, ao agregá-las poderemos chegar
a uma situação onde elas se tornem intransitivas, impossibilitando a existência
de uma decisão única e estável11.
Embora o teorema de Arrow fosse muito instigante, ao ser aplicado aos
estudos legislativos não encontrava respaldo nas observações empíricas, pois o
que se constatava era uma considerável estabilidade nas decisões. Para uma
explicação desse fenômeno, os analistas começaram a examinar as instituições
que, como afirmaram Hall e Taylor, teriam a função de diminuir “os custos de
transação nas negociações permitindo ganhos de troca entre os legisladores
permitindo a aprovação de legislação possível” e de garantir a estabilidade da
legislação. Desta forma, as instituições resolveriam os problemas de ação coletiva
existentes no seio do legislativo, reduzindo a incerteza relativa aos resultados das
decisões e aos comportamentos dos legisladores mediante a estruturação de
normas e regras de conduta12.
VIII
IX
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No original: “constrained maximization in an institutional setting”.
A partir do que foi acima exposto emergem as seguintes questões: como
estudar as instituições? Quais elementos considerar? Como proceder?
Existem atualmente, na ciência política, vários estudos institucionalistas. De
uma forma geral, eles englobam duas áreas básicas: as instituições políticas
domésticas e as relações internacionais (Powell e DiMaggio, 1991: 5). Contudo,
para um iniciante na área, muitas vezes fica difícil identificar como estes estudos
se distinguem das abordagens tradicionais. Além disso, os interessados em iniciar
estudos institucionalistas, em geral não possuem informação sobre os elementos
a serem considerados e de que forma devem ser tratados.
Para auxiliar na solução desses e outros problemas, Shepsle e Bonchek
(1997) elaboraram, de maneira simples e didática, um arcabouço para o estudo
das instituições, originalmente desenhado para os estudos de política doméstica,
mas também bastante útil para os estudos em relações internacionais.
Os autores propõem a consideração de quatro componentes: 1) a divisão do
trabalho e os procedimentos regulares; 2) A especialização do trabalho; 3) as
jurisdições; e 4) a delegação e o monitoramento.
2) Especialização
Não basta haver divisão do trabalho e o estabelecimento das regras e
procedimentos se as instituições não souberem fazer bom uso das habilidades,
talentos, preferências e interesses dos indivíduo. A instituição capitaliza com a
oferta de capital humano, deve saber tirar proveito disso. Além disso, elas devem
ser estruturas eficientes de produção de especialização (expertise). Vejamos por
quê.
Como foi visto acima, a divisão de trabalho, junto com a elaboração de
normas de funcionamento, permite a maximização das capacidades individuais no
interior das instituições. Em outras palavras, elas passam a produzir melhor e de
forma mais eficiente, utilizando-se do mesmo capital humano. Melhor ainda será
se os indivíduos que operam sob uma determinada instituição puderem se
especializar, pois maximizam suas atividades. Isto é muito benéfico para
instituição já que permite , através dos especialistas, obter a maior quantidade de
informação sobre os objetos de seu interesse, e desta forma, produzir os
resultados desejados, tornando-se mais ágeis e efetivas.
Para o melhor entendimento do conceito de especialização, pode-se
imaginar as relações entre os membros de um partido (políticos) e seu partido
(instituição). O ideal para o partido é que possa lidar com todas as questões
presentes no quotidiano, de modo a apresentar propostas para cada delas,
seguindo as suas diretrizes programáticas. Contudo, a obtenção destas
informações pode ser um problema, pois os partidos não possuem os recursos
(financeiros, humanos, etc.) que desejam. Eles devem buscar meios de resolver o
problema com os orçamentos e estruturas limitadas que possuem. Um mecanismo
para o processamento destes problemas é a divisão do trabalho e a criação de
regras, como salientados anteriormente. Mas isso só não basta porque, embora o
partido possa atuar com maior eficiência, ele obterá melhores resultados se
possuir especialistas em determinadas questões. Estas pessoas são chaves para
produzirem respostas rápidas aos problemas apresentados ao partido, porque
elas são autoridades nos assuntos. Portanto, para o partido é melhor possuir
vários especialistas em questões diversas (Orçamento Público, Legislação, Meio
Ambiente, Economia, etc) do que concentrar-se em um (ou poucos) tema(s) ou ter
vários generalistas. Assim, eles têm a quem confiar um determinado assunto e
não necessitarão de opiniões ou pareceres de pessoas fora do círculo partidário, o
que é sempre delicado, principalmente em se tratando de partidos políticos, pela
falta de engajamento programático.
3) Jurisdição
O terceiro componente tratado por Shepsle e Bonchek, na análise das
instituições, é o delineamento de jurisdições. Estas referem-se ao espaço de
atuação das instituições, ou seja, aos limites de sua ação. Os prefeitos, por
exemplo, só podem utilizar de suas prerrogativas executivas dentro dos limites do
município onde foram eleitos. Esta é sua jurisdição política. Da mesma forma, as
instituições só atuam dentro de uma jurisdição.
Mas se são partes integrantes das instituições, poderíamos nos perguntar
porque seria importante considerar as jurisdições. Em primeiro lugar, as
jurisdições devem ser bem delineadas, para que as instituições operem de
maneira satisfatória. Por exemplo, para que haja separação e harmonia entre os
Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, é preciso que suas atribuições sejam
estabelecidas de forma clara, sem haver sobreposição de jurisdições.
Em segundo lugar, o delineamento das jurisdições é um incentivo à
especialização. Tornar-se um especialista gera custos14 para o indivíduo, pois, no
mínimo, tem que dedicar tempo para isso. Ninguém fará este sacrifício caso
perceba que seu esforço não será utilizado. Os departamentos de uma
universidade são um bom exemplo para o argumento. Eles são divididos em
disciplinas para que os professores possam se especializar. Um professor de
química nunca se esforçaria para ser um bom profissional em sua área, caso a
universidade decidisse recrutar um sociólogo para lecionar química para os
graduandos.
Em último lugar, jurisdições bem desenhadas conferem autonomia decisória
às instituições, pelo menos no que diz respeito à condução de seus trabalhos e ao
estabelecimento de regras internas de funcionamento. Os departamentos
universitários podem decidir autonomamente suas questões internas, desde que
não firam os regulamentos gerais da universidade.
4) Delegação e Monitoramento
Na vida moderna, em geral as pessoas não dispõem de tempo para a
realização de todos os seus interesses. Para contornar o problema, delegam as
mais diversas atribuições a agentes especializados. Os políticos profissionais, por
exemplo, existem para nos representar na arena política, pois não dispomos de
tempo nem interesse para lidarmos com o dia-a-dia do ato de legislar. Nas
empresas, delegamos atividades a outros funcionários para aumentarmos a
capacidade de processá-las. Estabelecemos, assim, uma relação de
agente-principal. O principal é o titular da relação, é quem delega as atividades. O
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Não apenas o custo monetário, como foi enfatizado anteriormente.
agente, por seu turno, está encarregado de defender os interesses do agente, é o
delegado.
Para ilustrar a relação agente-principal, Adam Przeworski (1998) invoca o
exemplo de um cliente e um mecânico. Quando o cliente começa a sentir
problemas em seu carro, comunica ao mecânico, especialista no assunto. Ao
executar o conserto, o mecânico avisa o quanto demorou para sanar o problema e
os reparos feitos. O cliente então paga e vai embora. Nesta exemplo, o principal
era o proprietário que contrata o agente para atuar em defesa de seu interesse: o
conserto do carro.
Um dos problemas da relação agente-principal é o oportunismo pois, ao
mesmo tempo que delegamos, incorremos no risco dos indivíduos, a quem
investimos de autoridade para realização de nossos interesses, utilizem estes
poderes em seu benefício. No exemplo do mecânico, não sabemos se, de fato, ele
trocou as peças indicadas ou apenas apertou alguns parafusos. Os agentes,
justamente por serem especialistas, têm melhor informação sobre os meios de
satisfazer os interesses do principal e dos custos para sua realização. Além do
mais, os agentes também incorrem em custos para realizarem as atividades
afinal de contas eles utilizam seu tempo e recursos. Por isso, os incentivos para
que os agentes utilizem-se do ato da delegação apenas para a realização de seus
interesses pessoais são altos.
O oportunismo é gerado basicamente assimetria de informação entre o
principal e o agente, que se expressa pela sonegação de informações (hidden
information) e pela ação oculta (hidden action) (Kiewiet e McCubbins, 1991). No
primeiro caso, como os agentes adquirem e tomam posse de informações que não
estão disponíveis ao principal ou cujos custos sejam proibitivos para obtê-las, eles
têm incentivos para utilizá-las estrategicamente ou escondê-las (idem: 25).
Exemplificando, numa relação entre um deputado (agente) e seus eleitores
(principal), existem situações onde o deputado possivelmente sabe de (quase)
todos efeitos de uma legislação, mas prefira revelar apenas suas vantagens.
Kiewiet e McCubbins chamam a atenção para uma variante da sonegação de
informações que é a seleção equivocada do agente, ou seleção adversa.
Precisamos escolher agentes para as mais diversas atividades, como vimos
anteriormente. Mas como ter certeza da escolha correta? Não dispomos de
informações sobre todas qualidades e defeitos deste indivíduo prestes a ser
selecionado, portanto, podemos incorrer em uma seleção equivocada, quando o
agente não possui os atributos esperados.
Quanto à ação oculta, ela ocorre porque não podemos fiscalizar e controlar
todos os passos de nossos agentes. Os eleitores não conseguem observar
constantemente se seus representantes eleitos estão atuando em defesa dos seus
interesses. O mesmo ocorre em todas relações agente-principal.
Um problema da ação oculta é a falta de compromisso derivada do risco
moral do principal. Em uma relação agente-principal, existe a possibilidade que o
agente mude seu comportamento, e passe a atuar de maneira distinta. O mesmo
pode ocorrer com o principal. Com isso, os compromissos acordados no
estabelecimento da relação deixam de ter credibilidade. No âmbito das
instituições, o risco moral deriva da tendência de seus membros privilegiarem os
objetivos privados em detrimento dos objetivos públicos das instituições (Shepsle
e Bonchek, 1997: 310).
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Utiliza-se aqui a mesma definição dada para a disjuntiva delegação-abdicação por Kiewiet e
McCubbins (1991). Delegação refere-se ao ato de transferir autoridade e de recursos para agentes
no intuito de promoverem os interesses do principal de forma mais eficiente. Ela se converte em
abdicação quando o agente passa a atuar exclusivamente em prol de seus interesses particulares
em detrimento daqueles do principal.
Um terceiro mecanismo são os procedimentos de monitoramento e de
circulação de informações. Estes destinam-se a resolver o problema da ação
oculta e de sonegação de informações. Estes mecanismos forçam os agentes a
revelarem as informações que dispõem e também suas ações.
O quarto e último mecanismo apresentado pelos autores refere-se aos
controles institucionais. Esta forma de monitoramento foi pensada originalmente
pelos federalistas, que partiam do princípio que uma delegação absoluta de
poderes a apenas uma pessoa ou instituição levaria ao poder arbitrário, agindo
contra os interesses do principal. Para que isso fosse evitado, o “poder deveria
controlar o poder”. O controle institucional estabelece que “quando a autoridade
for delegada a um agente, deve haver pelo menos um outro agente com
autoridade para vetar ou bloquear as ações daquele agente” (Kiewiet e
McCubbins, 1991:34).
Para além destes mecanismos, Adam Przeworski (1998) propõe ainda outros
três:
(1) a criação de múltiplos agentes ou de múltiplos principais com objetivos
dissonantes, para que um controle o outro;
(2) estabelecimento de competição entre agências. Embora este mecanismo tenha
sido elaborado para minorar as dificuldades de operação eficiente das agências do
Estado, ele pode ser também utilizado para o contexto de outras instituições.
(3) Descentralização, para aumentar a accountability, ao aumentar a proximidade
entre o agente e o principal.
Em resumo, o arcabouço de estudo das instituições é útil para o
entendimento da operação das mesmas porque, como mencionam Shepsle e
Boncek, “(...) a divisão e a especialização do trabalho, subscritos pela criação de
subunidades com jurisdições bem delineadas, permitem à instituição
descentralizar suas operações. Isto, por seu turno, facilita a delegação de
autoridade e recursos a especialistas que, por possuírem influência
desproporcional sobre os eventos nos seus respectivos campos de atividades,
também têm incentivos para desenvolver melhor seu expertise. O ato de
delegação, no entanto, gera um problema de controle no qual os especialistas
podem ter oportunidades para perseguir objetivos privados em detrimento dos
objetivos públicos da instituição (...). É provavelmente impossível resolvê-lo
inteiramente, mas as instituições normalmente estabelecem mecanismos tanto
para monitorar o desempenho das subunidades, como para controlar o
comportamento oportunista que fuja aos objetivos institucionais.”
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARROW, Kenneth (1963). Social Choice and Individual Values. New Haven: Yale
University Press.
ELSTER, Jon (1994) Peças e Engrenagens das Ciências Sociais, Rio de Janeiro:
Relume-Dumará.
___________(1989). “Marxismo, Funcionalismo e Teoria dos Jogos”, in Lua Nova.
HALL, Peter A. e TAYLOR, Rosemary C. R. (1996). “Political Science and the
Three New Institucionalisms” in Political Studies, vol. XLIV, nº 5, dezembro,
pp. 936-957.
KIEWIET e MCCUBBINS (1991). The Logic of Delegation. Congressional Parties
and The Appropriation Process. Chicago: Chicago University Press.
LANE, Jan-Erik (1995). The Public Sector. Concepts, Models and Approaches.
Londres: Sage.
LIMONGI, Fernando (1994). “O Novo Institucionalismo e os Estudos Legislativos.
A Literatura Americana Recente” in BIB, n. 37, 1o semestre, pp 3-38.