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Adriano Carvalho
Resumo:
Este artigo discorre sobre a análise harmônica feita sobre a transcrição
de um acompanhamento de blues tocado pelo guitarrista americano Barry
Galbraith, e a maneira particular do músico em utilizar tétrades na construção
de seus encadeamentos de acordes. Mostra os principais procedimentos de
rearmonização utilizados pelo guitarrista, e fornece um material técnico, que
pode ser transposto para outras situações de repertório, podendo assim,
ampliar o vocabulário harmônico do instrumento.
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transcrição de acordes envolve uma modelos de reestruturação
grande dificuldade do ponto de vista harmônica na Música Popular.
técnico. Sendo assim, visando uma O exemplo abaixo traz uma
maior fidelidade às transcrições, transcrição do comping de um
considerei importante o uso desse chorusiv de Blues em Fá maior,
material. tocado pelo guitarrista americano
O exemplo a seguir é escrito Barry Galbraith.
originalmente para ser tocado com
acompanhamento de seção rítmica. Progressão Harmônica
Dessa forma, a análise levará em Tradicional do Blues:
conta a presença de um baixista na
execução da música. II: F7 I % I % I %
I
I Bb7 I % I F7 I %
Blues em F I
I C7 I Bb7 I F7 I C7
O Blues têm uma importância :II
expressiva na Música Popular do
século XX. Gênero musical cujas Progressão de Blues
origens se remetem aos cantos de Rearmonizada:
trabalho dos negros norte-
americanos, influenciou de forma II: F7 I Bb7 I F7 I Cm7
significativa o jazz e a Música F7 I
Popular Brasileira. No que tange à I Bb7 I Bº I F7 I D7
sua estrutura harmônica, apesar de I
o Blues, tradicionalmente, possuir I Gm7 I C7 I F7 D7 I Gm7 C7
um encadeamento baseado em :II
apenas três acordes, foi
desenvolvida uma enorme
Harmonia tocada por
potencialidade de rearmonizações,
Barry Galbraith:
bem como novas combinações
Obs. As cifras abaixo representam
harmônicas que transformaram esta
as tônicas e as extensões da
música em um dos principais
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harmonia original, e não das
tétrades escritas.
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primeiro caso, as notas ré# e sol#
representariam, respectivamente,
os intervalos de 9ª aumentada e 5ª
aumentada de C. O acorde Neste compasso, observa-se um
resultante seria de C7(#9/#5). Já no tipo de rearmonização muito
segundo caso, as mesmas notas comum no blues, caracterizada pelo
representariam as extensões 13ª uso do acorde do IV grau já no
maior e 9ª maior do acorde de Gb segundo compasso. Aqui, Galbraith
resultando, assim, no acorde fez uso de duas tétrades diferentes
Gb7(13/9). Levando em para substituir o acorde Bb7. No
consideração que este comping foi primeiro caso, utilizou a tétrade de
extraído de uma gravação onde a Dm7b5 (ré-fá-láb-dó), resultando em
seção rítmica era composta por um acorde de Bb7/9 sem
baixo, bateria e guitarra, uma fundamental. Em seguida, explorou
análise exata no sentido de a sonoridade da tétrade Abmaj7b5
descobrir qual acorde foi substituído (láb-dó-mibb-sol) que gera uma
necessitaria da transcrição da linha abertura de Bb7/9/13, sem
melódica do baixo. Porém, para o fundamental. Vale notar que ao
presente estudo, ela é encadear estas duas tétrades, foi
desnecessária já que, como em possível um acréscimo gradativo
ambos os casos a função do acorde das extensões do acorde. Primeiro
é a mesma – preparar a volta ao com a 9ª e em seguida a 13ª.
acorde F7. Tanto o acorde de C7
como Gb7 cumprem essa função e, Compasso 3: Idem ao compasso 1.
em ambos os casos, as dissonâncias
acrescidas aos acordes respeitam as
possíveis extensões harmônicas de
cada um. É importante ressaltar que
esta preparação não é resolvida, o
que não desqualifica a função do Compasso 4:
acorde.
Compasso2:
4
Observa-se, neste compasso, a Compasso 5:
resolução ao acorde F7 cujo
processo de preparação foi descrito
no compasso 1. Em seguida, um
outro procedimento comum de
rearmonização no Blues pode ser
notado. Como no compasso A mesma idéia apresentada no
seguinte (compasso 5), a harmonia compasso 1, sobre gerar movimento
dirige-se para o IV grau da harmônico baseado na relação de
tonalidade, pode-se preparar a preparação e resolução entre os
chegada a este acorde. Já que o acordes, aparece agora no
acorde dominante correspondente compasso 5 sobre o IV grau. Neste
do IV grau (dominante secundário) é caso, verifica-se novamente o uso
o próprio F7v, torna-se necessário da tétrade Dm7b5 substituindo o
que este assuma a função de acorde Bb7 e a utilização da tétrade
dominante. Para isso, Galbraith de Amaj7b5 em 2ª inversão,
aumentou o seu grau de substituindo os possíveis
dissonância utilizando uma tétrade dominantes de Bb7 – F7, dominante
de Ebmaj7b5 (mi-sol-sibb-ré) em 2ª secundário e B7, dominante
inversão – nota lá (sibb substituto. Como neste caso, as
enarmonizada) no baixo. O uso tétrades também não abrigam as
desta tétrade sobre F7 resulta em fundamentais dos acordes, pode-se
um acorde de F7/9/13. Porém, para interpretar esta substituição tanto
que o grau de dissonância fosse do ponto de vista de F7, como de
ainda maior, Galbraith substituiu a B7. No primeiro caso teremos como
9ª maior (sol) pela 9ª aumentada. extensões as notas dó# e sol#,
No mesmo compasso, empregou respectivamente 5ª e 9ª
ainda a tétrade Am7b5 em estado aumentadas. Se analisarmos as
fundamental, originando um acorde alterações sobre o acorde B7, as
de F7/9. O encadeamento destes mesmas notas representarão a 9ª
dois acordes valorizou a linha maior e 13ª maior do acorde.
melódica das notas agudas das
tétrades. Compasso 6:
5
Verifica-se aqui a resolução no I
grau promovida pelo acorde
diminuto no compasso anterior.
Logo em seguida, Galbraith, visando
como ponto de chegada o acorde
A preparação gerada no compasso Gm7 no compasso 8, promove uma
anterior é resolvida, voltando-se ao progressão de acordes que resultará
acorde Bb7, substituído pela tétrade no acorde de D7, dominante
de Dm7b5. Em seguida promove-se secundário de Gm7. Partindo de
a volta ao acorde do I grau por meio Am7b5, utilizou em seguida as
da tétrade de Bº em 3ª inversão, tétrades de Ab7(b5) em estado
nota sol# no baixo. O uso do #IVº é fundamental e Dbmaj7b5 em 2ª
um recurso de preparação originário inversão. O uso destas três tétrades
do Blues o qual predispõe a volta ao originou um importante
I grau da tonalidade. Este recurso procedimento harmônico
pode ser observado em outras caracterizado pela presença de uma
composições que não se nota comum aos acordes, nota
caracterizam na forma Blues. O uso pedal, neste caso localizada na
deste acorde em 3ª inversão “ponta dos acordes”, ou seja, na voz
valoriza a condução melódica da mais aguda.
linha do baixo dos acordes a qual se
dá por movimento cromático
ascendente já que, no compasso
seguinte, Galbraith volta ao I grau Compassos 9 e 10:
com uma tétrade de Am7b5 em
estado fundamental.
Compassos 7 e 8:
Neste compasso inicia-se a cadência
IIm7-V7-I, já no final do chorus. Para
representar o acorde Gm7 (II grau)
foi utilizada a tétrade de G7sus4,
resultando em um acorde de
Gm7/11, sem terça. Embora este
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acorde esteja incompleto do ponto turnaroundvi. Aqui, observa-se
de vista estrutural, o uso deste também a utilização da nota pedal
acorde sobre o II grau é facilmente na “ponta dos acordes”. A cadência
observado. Neste caso a condução harmonizada é representada pela
melódica entre o II e V7 graus seqüência dos graus VI – II – V. No
garante a presença deste acorde primeiro acorde, o uso da tétrade de
sem terça, pois o próximo acorde Ab7 em 3ª inversão, sem 5ª e com
traz no baixo a nota sib, 7ª de C7 13ª, acrescenta ao acorde do VI
(V7) e 3ª menor de Gm7. A tétrade grau, as extensões 7ª, #9 e #11
usada neste caso foi a de (D7/#9/#11). No próximo acorde, a
Bbma7(b5) em estado fundamental tétrade de Fº(maj7) sobre o acorde
na posição fechada, o que resulta do II grau, transforma-o em um
em um acorde de C7/9/13. Em acorde de G7/b9/13. E finalmente,
seguida, Galbraith ainda utiliza duas sobre o acorde do V grau, é
aberturas de acordes “sus” antes da empregada a tétrade de Emaj7(b5),
resolução em F. No primeiro, para originando o acorde C7/#9/#5.
originar o acorde C9sus4, valeu-se Nestes três acordes, a nota mais
da tétrade de Bbm7(#5) em 3ª aguda sempre foi a nota lá bemol,
inversão em drop3. No segundo 11ª aumentada, 9ª menor e 5ª
acorde, também C9sus4, foi aumentada respectivamente.
utilizada a a mesma tétrade de
Bbmj7(#5) só que agora em posição
drop2. A cadência termina na
tétrade de Dm7 em estado
fundamental – drop2, dando origem Considerações sobre a análise.
a um acorde de F6.
Pôde-se verificar, por meio da
Compassos 11 e 12: análise, a utilização das tétrades na
harmonização de todo o chorus do
Blues. Importantes recursos de
rearmonização foram empregados,
desde a substituição de acordes
Os dois últimos compassos são com o intuito de se alcançar
dedicados aos acordes do determinadas extensões não
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encontradas na estrutura básica do
acorde, até a utilização de acordes
estranhos à harmonia original da
peça. As formas encontradas por
Barry Galbraith para gerar maior
movimento harmônico, a maneira
encontrada para preparar o acorde
do II grau nos compassos 7 e 8, as
idéias de substituição de tétrades, e
os encadeamentos com nota pedal,
são exemplos que podem e devem
ser empregados em situações
harmônicas similares.
Notas
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i O termo comping se refere a um tipo de acompanhamento onde se estabelece uma relação mais interativa entre seção
rítmica e solistas. Originalmente, se tratava de uma forma de acompanhamento em que os acordes eram colocados nos
espaços deixados pela melodia, estabelecendo-se assim, um diálogo entre solista e seção rítmica (comp = complemento).
ii A cifragem harmônica é a maneira pela qual representamos um acorde por meio de letras do alfabeto. Basicamente, a
letra representa a fundamental do acorde cujas relações são: A – lá, B – si, C – dó, D – ré, E – mi, F – fá, G – sol.
iii AEBERSOLD, Jamey. Guitar Comping. New Albany, IN: Aebersold Publications, 1986.
iv Termo usado para nos referirmos à estrutura formal da composição.
v Por se tratar de um I grau Blues, o acorde F7, apesar de se configurar em um acorde maior com sétima menor, não possui
função de dominante, e sim de tônica.
vi Cadência I-VI-II-V, normalmente utilizada para preparar o retorno ao I grau da tonalidade.
Referências Bibliográficas