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08/11/2018 Quando um colonialismo oculta outro

Quando um colonialismo oculta outro


por Bruno Guigue

Que as crianças iemenitas morram de


fome aos milhares, que os palestinos
caiam sob as balas do ocupante, que
a Síria seja um campo de ruínas e que
a Líbia mergulhe no caos, isso já
quase não nos comove. Manifesta-se,
faz-se greve, protesta-se? Não
realmente. Nem manifestações
significativas, nem debates dignos
deste nome. O crime neocolonial
passa como uma carta nos correios. E
contudo, se sofrêssemos o que os
nossos governos infligem a povos que
nada nos fizeram, o que diríamos
nós? Se uma aliança criminosa nos condenasse a morrer de fome ou de cólera, como no
Iémen? Se um exército de ocupação abatesse nossa juventude porque ela ousa protestar,
como na Palestina? Se potências estrangeiras armassem milícias para destruir nossa
república, como na Síria? Se uma coligação estrangeira houvesse bombardeado nossas
cidades e assassinado nossos dirigentes, como na Líbia?

A tendência dos países ditos civilizados de jogar um véu pudico sobre suas próprias
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torpezas não é nova. Como é característico, a democracia ocidental vê mais facilmente a


palha no olho do vizinho do que a trave que se aloja no seu. De direita, de esquerda ou do
centro, vive-se num mundo ideal, um universo feliz onde a consciência está sempre do
seu lado. Sarkozy destruiu a Líbia, Hollande a Síria, Macron o Iémen, mas jamais haverá
tribunal internacional para julgá-los. Medidos pela vara da nossa bela democracia, estes
massacres não são senão insignificâncias. Uma aberração passageira, a rigor, mas a
intenção era boa. Como democracias poderiam desejar outra coisa senão a felicidade de
todos? O discurso oficial dos ocidentais, sobretudo aquele destinado ao eleitor médio,
traduz sempre a segurança inquebrantável de pertencer ao campo do bem. "Sofrem de
opressão, ditadura, obscurantismo? Não se inquietem, enviaremos os bombardeiros!".

Acontece entretanto que na volta de uma frase, no segredo das negociações


internacionais, seja levantado um canto de véu, subrepticiamente. Assiste-se então a uma
forma de confissão e eis que um vigarista confessa o crime esboçando um sorriso
malicioso. Em 2013, no momento em que a França intervinha no Sahel, Laurent Fabius,
ministro francês dos Negócios Estrangeiros, apela ao seu homólogo russo para obter o
apoio da Rússia na ONU. Lavrov espanta-se então com esta iniciativa francesa contra
jihadistas que Paris havia apoiado aquando da intervenção na Líbia, em 2011: "C'est la
vie!", responde-lhe o ministro francês. Semear o terror para abater um Estado soberano?
É "a vida" segundo Fabius. Mas que este criminoso se tranquilize: nenhum juiz lhe pedirá
contas. O Tribunal Penal Internacional (TPI) é um tribunal para os indígenas: está
reservado aos africanos. As pessoas como Fabius têm a arte de passar entre as gotas da
chuva.

Alimentados por um discurso que lhes diz que o seu país está sempre do lado bom, os
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franceses parecem a anos-luz do caos que os seus próprios dirigentes contribuem para
construir. Os problemas do mundo não os afectam senão quando hordas de miseráveis se
acumulam às suas portas. E são numerosos os que concedem seus votos – como muitos
europeus – àqueles que pretendem poupar-lhes esta invasão. Naturalmente, esta defesa
da "sua casa" deveria logicamente ser acompanhada da recusa de ingerência na casa dos
outros: de que valeria um patriotismo que autorizasse o forte a ingerir-se nos assuntos
do fraco? Ora, a experiência mostra que estes "patriotas" raramente estão na linha de
frente do combate pela independência nacional fora do mundo pretensamente civilizado.
Quais os partidos da direita europeia, por exemplo, apoiam o direito dos palestinos à
autodeterminação nacional? Manifestamente, eles não têm pressa de honrar os seus
próprios princípios.

Mas isto não é tudo. Pode-se mesmo perguntar se estes pretensos patriotas o são
verdadeiramente para si próprios: quantos deles, com efeito, são favoráveis à saída do
seu próprio país da NATO, esta máquina de arregimentar as nações europeias? Tal como
para a pergunta anterior, a resposta é clara: nenhum. Estes "nacionalistas" acusam a
União Europeia pela sua política migratória, mas este é a única amostra de seu repertório
patriótico, verdadeiro disco arranhado com sotaques monocórdicos. Incham os músculos
diante dos migrantes, mas são muito menos viris frente aos EUA, bancos e multinacionais.
Se levassem a sua soberania a sério, questionariam a sua pertença ao "campo ocidental"
e ao "mundo livre". Mas sem dúvida será demasiado pedir-lhes isso.

Nesta incoerência generalizada, a França é um verdadeiro caso exemplar. Uma certa


direita – ou extrema-direita, como se queira – critica com satisfação as intervenções no
estrangeiro, mas de maneira selectiva. O Rassemblement National, por exemplo,
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denuncia a ingerência francesa na Síria, mas aprova a repressão israelense contra os


palestinos. O direito dos povos a disporem de si mesmos seria de geometria variável? De
facto, este partido faz exactamente o inverso do que faz uma pretensa esquerda, que
apoia os palestinos – em palavras – e aprova a intervenção ocidental contra Damasco,
considerando mesmo que não se faz o suficiente e que seria preciso bombardear este
país mais severamente. O drama é que estas duas incoerências gémeas – e em espelho
– cegam o povo francês. Mede-se esta cegueira no resultado, quando se vê esquerdistas
desejarem o derrube de um Estado laico por mercenários da CIA (em nome da
democracia e dos direitos humanos) e nacionalistas apoiarem a ocupação e a repressão
sionistas na Palestina (em nome da luta contra o terrorismo e o islamismo radical).

É verdade que este cruzamento entre pseudo-patriotas e pseudo-progressistas também


tem uma dimensão histórica. Ele transporta ao seu modo a herança envenenada dos
tempos coloniais. Assim, a direita nacionalista critica o neocolonialismo ocidental na Síria,
mas considera insuportável mencionar os crimes coloniais passados cometidos pela
França na Indochina, na Argélia ou em Madagáscar. Supõe-se que isso não é voluntário,
mas a esquerda universalista contemporânea – em nome dos direitos humanos – faz
exactamente o inverso: ela acusa o velho colonialismo da "Argélia Francesa", mas
aprova a intervenção neocolonial na Síria contra um estado soberano que conquistou sua
independência ao ocupante francês em 1946. Em suma, a direita ama loucamente o
colonialismo no passado, a esquerda ama-o apaixonadamente no presente. O círculo está
fechado e, definitivamente, todos estão de acordo. Vítima principal: a lucidez colectiva.

A França é um dos raros países em que um colonialismo oculta um outro, o velho, aquele
que mergulha suas raízes na ideologia pseudo-civilizadora do homem branco,
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encontrando-se como que regenerado pelo sangue novo do belicismo dos "direitos do
homismo". Este colonialismo, por sua vez, é um pouco como o antigo colonialismo
"acessível aos caniches", para parafrasear Céline. Ele pretende fazer-nos chorar antes de
lançar os mísseis. Em todo o caso, a conivência implícita entre os colonialistas de todas
as plumagens – os velhos e os jovens, os arqueo e os neo – é uma da razões da errância
francesa no cenário internacional desde que rompeu com uma dupla tradição, gaulista e
comunista, que muitas vezes lhe permitiu – não sem erros – arrumar a sua própria casa:
a primeira por convicção anticolonialista, a segunda por inteligência política. Dia virá, sem
dúvida, em que se dirá, para fazer a síntese, que se a França semeou o caos na Líbia, na
Síria e no Iémen era, no fundo, para "partilhar a sua cultura", como afirmou François Fillon
a propósito da colonização francesa dos séculos passados. No país dos direitos do
homem, tudo é possível, mesmo atirar areia para os olhos.

05/Novembro/2018

O original encontra-se em www.legrandsoir.info/quand-un-colonialisme-en-cache-


un-autre.html

Este artigo encontra-se em https://resistir.info/ .


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